MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da ___ Vara Cível da Comarca de Carazinho:
O MINISTÉRIO PÚBLICO, por seus agentes signatários, no uso de suas
atribuições legais, com fundamento nos artigos 127, caput, e 129, II e III, da
Constituição Federal, no artigo 25, IV, da Lei Federal nº 8.625/93, nos artigos 1º, IV, e
5º, caput, da Lei Federal nº 7.347/85, e com base no Procedimento nº 16315-900/07-9,
do Conselho Superior do Ministério Público, vem a Vossa Excelência ajuizar a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA, com PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, contra
MST – MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM
TERRA, sociedade de fato dotada de personalidade judiciária, a ser
citada na pessoa dos integrantes daquele movimento que se encontram
acampados nos locais conhecidos como “Acampamento Jandir” e
“Acampamento Serraria”, Coqueiros do Sul – RS, bem como na sede de
Porto Alegre – RS, sita na Av. Farrapos, antigo Clube da Cidadania, na
pessoa de quem lá estiver administrando seus interesses,
JANDIR CELSO WIEBRANTZ, RG nº 1005305551, brasileiro,
separado, funcionário público, CPF nº 274006700/34, residente e
1
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domiciliado na Av. Júlio de Mailhos, 1.374, Pontão – RS, ou na Rua Rua
Hugo Kochemborger, Coqueiros do Sul – RS, ou na Av. Presidente
Vargas, s/nº, Coqueiros de Sul - RS (endereço constante da matrícula do
Registro de Imóveis), com endereço profissional na Prefeitura Municipal
de Pontão – RS, sita na Av. Júlio de Mailhos, 1.613, Pontão – RS,
DORMELIO FRANCIOZI, brasileiro, casado, produtor rural, CPF nº
443254790/15, residente e domiciliado na localidade de Brilhante, no
interior de Ronda Alta, CEP n.º 99.670-000, ou no “Acampamento
Jandir”, Coqueiros do Sul,
ALCEU LAMB, brasileiro, maior, agricultor, inscrito no CPF nº
204.295.760-72, residente na Rua Pedro Rheinheimer, s/nº, Centro,
Coqueiros do Sul/RS, CEP 99528-000,
CLACÍ DALILA BECKER LAMB, residente residente na Rua Pedro
Rheinheimer, s/n, Centro, Município de Coqueiros do Sul/RS, CEP nº
99.528-0000,
ARNO MAIER, brasileiro, aposentado, casado, CTPS nº 071352,
expedida pela DRT/RS em 08/03/1976, inscrito no CPF sob n.º
145.649.710-34, residente e domiciliado na rua Marcílio Dias, n.º 913,
Bairro Vila Maria, Sarandi - RS, CEP 99560-000,
NAMIR COSTA MAIER, brasileira, casada, CPF n.º 231.342.910-53,
residente e domiciliada na Rua Marcílio Dias, n.º 913, Bairro Vila Maria,
no Município de Sarandi/RS, CEP nº 99.560-000, e
BANCO BRADESCO S/A, pessoa jurídica de direito privado, Agência
Carazinho, com sede na Avenida Flores da Cunha, nº 1939, Centro,
Carazinho - RS, CEP nº 99500-000, pelos seguintes fatos e fundamentos:
2
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1. DOS FATOS.
As ações do MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, há
muito preocupam e chamam a atenção da sociedade gaúcha, razão pela qual o Egrégio
Conselho Superior do Ministério Público instaurou o Procedimento Administrativo nº
16315-0900/07-9, determinando a designação de membros desta instituição para que
efetuassem levantamento de dados acerca da situação do movimento neste Estado.
Foram designados os Promotores de Justiça Luciano de Faria Brasil e Fábio Roque
Sbardelotto, que realizaram notável trabalho inteligência1, culminando com a
elaboração de relatório2 apontando fatos e apresentando sugestões, todas aprovadas por
unanimidade por aquele órgão da Administração Superior do Ministério Público. Na
seqüência, os Promotores de Justiça Luís Felipe de Aguiar Tesheiner e Benhur Biancon
Junior foram designados para o encaminhamento das conclusões do Expediente,
passando a aprofundar as investigações e a formular ações judiciais e extrajudiciais,
inclusive esta ação civil pública.
Embora alguns fatos aqui mencionados já sejam de superficial
conhecimento público, o Ministério Público, amparado em farta documentação e nas
provas colhidas, passa a fazer uma análise sistematizada do histórico, ações, estratégias,
táticas, teoria, pensamento e dos objetivos da Via Campesina, do MST, de entidades
congêneres e dos seus apoiadores, bem como do impacto e do ônus social que tais
atividades provocam.
1
O art. 1º, § 2º, da Lei nº 9.883/99, que instituiu o Sistema Brasileiro de Inteligência e criou a ABIN,
definiu a inteligência como sendo “a atividade que objetiva a obtenção, análise e disseminação de
conhecimentos dentro e fora do território nacional sobre fatos e situações de imediata ou potencial
influência sobre o processo decisório e a ação governamental e sobre a salvaguarda e a segurança da
sociedade e do Estado”.
2
Fls. 107/227.
3
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1.1. BREVE HISTÓRICO DO MST E DOS MOVIMENTOS
AGRÁRIOS.
Os movimentos de protesto no campo brasileiro principiaram nos anos
50, com a constituição e a multiplicação de sindicatos de trabalhadores rurais e, na
seqüência, com a formação das chamadas Ligas Camponesas, notadamente no nordeste.
Com o crescimento daquelas organizações, outros atores, como o Estado, os partidos
políticos e a Igreja Católica, entraram vigorosamente em cena, disputando o controle do
processo de organização dos “pobres do campo”3.
No Rio Grande do Sul, esse processo de organização e protesto adquiriu
contornos radicais com a formação, em 1960, do MASTER (Movimento dos
Agricultores Sem Terra), organizado para ser o instrumento de reforma agrária no
Estado. A atmosfera de crescente radicalização ideológica manifestava-se em atos como
o reconhecimento daquela entidade como de “utilidade pública” e o apoio do governo
do Estado aos “acampamentos” de sem-terra. No nordeste, na mesma época, Francisco
Julião, líder das Ligas Camponesas, sublevava o campo e incentivava a violência contra
os proprietários de terras, criando um clima de guerra civil.
Como resultado dessa agressividade, a questão agrária tornou-se um fator
que contribuiu para o movimento político-militar de 1964. A pacificação do campo foi
promovida com a supressão dos movimentos organizados e com a introdução de
legislação de teor reformista, como, v.g., o “Estatuto da Terra”.
1.2. A EMERGÊNCIA DO MST.
Os movimentos de protesto no meio rural começaram a reviver no final
da década de 70. Sobre o tema, explica o Professor Zander Navarro4:
3
Conforme NAVARRO, Zander. “Mobilização sem emancipação” – as lutas sociais dos sem-terra no
Brasil. Publicado em SANTOS, Boaventura de Souza (org.). Produzir para viver. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2002, pp. 189-232.
4
ZANDER SOARES DE NAVARRO é professor do Departamento de Sociologia da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS e pesquisador do Instituto de Estudos sobre Desenvolvimento, na
Inglaterra. Doutorou-se em sociologia na Universidade de Sussex, Inglaterra, e fez pós-doutorado no
Massachussetts Institute of Technology (MIT), nos EUA. Formado em agronomia, já atuou ativamente no
MST.
4
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Os determinantes principais que contribuíram para a emergência e o
desenvolvimento desses novos movimentos sociais rurais, iniciando-se pelo Sul do
Brasil (e no Rio Grande do Sul em particular), entre o final da década de 1970 e os anos
posteriores, poderiam compor uma longa lista, incorporando desde aspectos
relacionados à história da participação política naquele estado, à existência de uma
“cultura de organização” que as comunidade rurais tradicionalmente apresentam ou,
ainda, elementos reativos como a oposição ao controle exercido pelas elites locais.
Nesta seção se argumentará, contudo, que esses movimentos sociais na região citada
resultaram principalmente de três fatores: a liberalização política do período, nos anos
finais do ciclo militar; as mudanças estruturais na economia agrária dos estados que
modernizaram sua agricultura (basicamente, o Centro-Sul do Brasil) e seus impactos
sociais, além da ação de setores progressistas da Igreja Católica, inspirados inicialmente
pela exacerbação dos conflitos no campo, que cresceram exponencialmente nos anos
setenta e, posteriormente, já na década seguinte, emoldurados pelos aparatos discursivos
propostos pela Teologia da Libertação, fatores que, como seria esperado, exerceram
influência diferenciada no tempo e no espaço agrário (Navarro, 1996). A materialização
dos efeitos combinados desses três fatores, particularmente nos estados sulistas, deve-se
às características específicas da agricultura nesta região brasileira. São estados com
forte presença de agricultores familiares e onde a Igreja Católica tem presença
igualmente expressiva em termos mediadores e estruturas físicas, provavelmente sem
comparação com outros estados brasileiros (em vista da histórica presença exatamente
entre as comunidade rurais, aí recrutando filhos de agricultores para a carreira religiosa
e, também, contando com o apoio material das famílias rurais para construir igrejas,
casas paroquiais, seminários e, inclusive, a sua manutenção ao longo do tempo). O
processo de modernização agrícola dos anos setenta integrou a maior parte dessas
famílias rurais aos diferentes circuitos econômicos e financeiros e, quando esgotado,
criou decrescentes problemas de reprodução social, fazendo inevitável uma aliança
entre o braço rural da Igreja Católica, representado pela Comissão Pastoral da Terra
(com seus mediadores oriundos, precisamente, da agricultura familiar) e as nascentes
organizações populares do período, como as entidades sindicais e os movimentos
sociais, como o MST. Somente após a sua consolidação nos estados do Sul, durante a
maior parte dos anos oitenta, é que foi possível, gradualmente, para estas novas
organizações, ampliar seu raio de ação para os demais estados, o que ocorreu na
segunda metade daquela década e, em especial, a partir dos anos noventa5.
Agregadas certas condições objetivas (modernização tecnológica da
produção primária, liberalização política e atuação da Igreja Católica) às condições
culturais específicas da Região Sul (a “cultura de organização” apontada por Navarro),
delineou-se a possibilidade de eclosão de um movimento contestatório no campo
brasileiro. O MST veio preencher esse espaço na cena política nacional, articulando um
discurso fortemente anticapitalista e esquerdista.
5
Op. cit., pp.189-232.
5
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
1.3. A EVOLUÇÃO DO MST.
Segundo Zander Navarro, pode-se dividir a história do MST em quatro
momentos principais6:
a) o primeiro é o dos anos de formação, do início da década de 1980 até
1985, quando os primeiros grupos de sem-terra foram organizados, principalmente no
Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Nesse período, o MST contou com a forte presença
de mediadores religiosos ligados a grupos da Igreja Católica, inclusive como dirigentes
do próprio movimento e, no geral, selecionou ações de pressão que não tinham caráter
de enfrentamento, optando freqüentemente pela negociação e tendo como interlocutor
principal os governos estaduais.
b) a segunda etapa ocorreu entre os anos de 1986 e 1993. Neste período,
as ações do Movimento gradualmente tornaram-se principalmente confrontacionais
(simbolizadas, inclusive na mudança do slogan principal, de “Terra para quem nela
trabalha” para “Ocupar, resistir, produzir”), com vários episódios de enfrentamento
com policiais, em virtude de uma nova orientação interna, que privilegiava esta tática de
luta – particularmente, a partir da recusa dos sem-terra em submeter-se à direção
assumida até então por mediadores da Igreja Católica. A partir desta fase, portanto,
inverte-se a relação entre os mediadores religiosos, o quais, se antes definiam a
orientação geral do movimento, passaram gradualmente a atuar como quadros auxiliares
da organização, permanecendo na órbita do MST apenas os quadros mais radicalizados
do clero católico. No Rio Grande do Sul, um episódio que bem ilustra esta fase foi o
“conflito da Praça da Matriz”, ocorrido no centro de Porto Alegre, em agosto de 1990,
quando os sem-terra enfrentaram a Brigada Militar e mataram um soldado7, em
incidente cuja violência surpreendeu fortemente a opinião pública deste Estado.
c) o terceiro momento engloba os anos mais recentes, iniciando-se em
1994, quando o MST viu-se envolvido em um conjunto novo de fatos políticos, como a
nova realidade dos assentamentos, agora em grande número, que exigia respostas
rápidas quanto à organização da produção e dos produtores nestas áreas. O fato
6
Segue-se o modelo analítico adotado por Zander Navarro (Op. cit., pp.189-232).
http://veja.abril.com.br/idade/exclusivo/reforma_agraria/arquivo/150890.html (acesso em 20 de junho
de 2008).
7
6
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marcante, no entanto, é que o MST, a partir daquele ano, estabeleceu-se definitivamente
em São Paulo, o Estado mais influente da Federação, conseguindo consolidar-se e
descobrindo um campo privilegiado de atuação, o Pontal do Paranapanema. Outra razão
para a crescentes força política e capacidade de pressão do MST derivou de alguns
eventos trágicos de enfrentamento entre a força pública e os militantes do MST. O mais
conhecido foi o incidente de Eldorado dos Carajás, ocorrido em abril de 1996. Esses
eventos trouxeram momentaneamente a opinião pública para o lado da organização dos
sem-terra. Nesse contexto, o III Congresso Nacional do MST modificou novamente o
seu slogan, agora para “Reforma agrária: uma luta de todos”.
d) uma quarta fase, correspondente ao momento atual do MST, iniciada a
partir de 1998, quando as dificuldades para a ação da organização ampliaram-se. Há um
crescente isolamento do MST em relação às demais organização populares do campo e
até mesmo em relação a algumas entidades urbanas antes aliadas, refletindo o
extremismo do conjunto de recentes escolhas políticas da organização.
1.4. OUTROS MOVIMENTOS DE CONTESTAÇÃO NO CAMPO.
A disciplina estrita a que o MST submete sua militância8 haveria
necessariamente de gerar dissidências. Segundo informações colhidas em revista de
circulação nacional9, estima-se que cerca de setenta entidades participem de
acampamentos e invasões de terra no país. Entre elas, há sindicatos, associações e, no
mínimo, 27 movimentos autônomos10 inspirados no MST. A maioria dos movimentos
têm atuação apenas local, mas alguns lograram alcançar projeção na mídia.
8
Existe um interessante estudo acadêmico acerca da marcha em direção a Brasília promovida pelo MST,
em 1997. A autora relata o controle quase militarizado do evento, as fortes penalidades existentes e a
condução do processo de forma inteiramente centralizada. Descrevendo o caso de expulsão de um
integrante da marcha, por suposta transgressão das normas, a autora afirma: “(...) Há muitas formas de
coibir a expressão, e distintos modos de controle social (...) o desacordo tendia a ser compreendido como
indisciplina e, segundo a gravidade, podia redundar em expulsão (...) Esse temor tornou-se presente na
Marcha Nacional; no entanto, é cotidiano nos acampamentos do MST: muitos sem-terra dispõem-se de
tudo para neles garantir por um tempo a subsistência da família e a sobrevivência do sonho da
terra (...) O poder silencioso do medo, que faz calar, tornar-se-ia ainda mais opressivo nos últimos dias
da Marcha Nacional”. (CHAVES, Christine de Alencar. A marcha nacional dos sem-terra. Rio de
Janeiro: Relume Dumará, UFRJ: Núcleo de Antropologia da Política, 2000, p. 217-218, grifou-se).
9
http://veja.abril.com.br/idade/exclusivo/reforma_agraria/personagens_movimentos.html (acesso em 28
de maio de 2008).
10
Segundo informações do Superintendente Regional do INCRA, seriam 19 movimentos no país.
7
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Os movimentos mais importantes, além do MST, são os que seguem:
a) MLST (Movimento de Libertação dos Sem-Terra) – Criado em 1994,
tem acampamentos em seis Estados - Maranhão, Rio Grande do Norte, Pernambuco,
Bahia, Minas Gerais e São Paulo. Formado por militantes de extrema esquerda, o
movimento é ainda mais radical que o MST. Prega abertamente a tomada do poder pela
força e defende a eclosão da revolução socialista a partir do campo. Apesar do
radicalismo retórico, sua prática não difere muito da do MST. Alguns pesquisadores
consideram o surgimento desse movimento como o produto de uma “guerra de egos”
dentro do MST11. Além do criticismo existente entre as lideranças dos movimentos12, já
houve inclusive confronto armado entre o MST e o MLST 13.
b) MLT (Movimento de Luta pela Terra) – Apareceu em 1994, no sul da
Bahia, com o desemprego provocado pela crise das fazendas de cacau da região. Está
organizado em quatro Estados: Minas Gerais, Bahia, Sergipe e Pará. Reúne 4.000
famílias, das quais 1.000 já foram assentadas. Adota as mesmas táticas do MST:
invasões, acampamentos de beira de estrada e ocupações de prédios públicos.
c) MAST (Movimento dos Agricultores Sem-Terra) – Surgiu em 1998,
na região do Pontal do Paranapanema, em São Paulo, e mais tarde se ampliou para o
interior do Paraná. Foi fundado por militantes da Social Democracia Sindical, uma
central sindical de direita, e por dissidentes do MST. Hoje, representa 800 famílias. De
todos, é o movimento de sem-terra mais moderado: opõe-se às ocupações de terra, não
reclama da estrutura agrária do país e defende uma reforma negociada.
d) MTL (Movimento Terra, Trabalho e Liberdade) – Fundado em 2002, é
um movimento com indiscutível caráter político, pois apela aos estudantes e
trabalhadores das cidades para que se unam a fim de implantar “um novo modelo
econômico e social”. O MTL atua, basicamente, no Triângulo Mineiro e Sudoeste de
11
http://www.usp.br/agen/repgs/2003/pags/019.htm (acesso em 02 de junho de 2008).
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u79406.shtml (acesso em 02 de junho de 2008).
13
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u79289.shtml (acesso em 02 de junho de 2008).
12
8
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Goiás. Sua base de apoio parece ligada a grupos de inspiração trotskista, como se pode
perceber das lideranças que compareceram ao III Encontro Nacional do Movimento14.
Nenhum desses movimentos, entretanto, tem a penetração territorial e o
aparato de organização do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) que,
por ser o maior e mais antigo, está presente em 23 Estados e tem dezenas de milhares de
famílias acampadas em todo o país. A presença de tais movimentos deve ser referida
com a finalidade de proporcionar uma melhor percepção do mosaico de forças que
compõem os movimentos em prol da reforma agrária no Brasil.
1.5. FINANCIAMENTO DAS ATIVIDADES DO MST.
Um tema de abordagem tradicionalmente difícil e controversa tem sido o
do financiamento das atividades do MST. De onde provém os recursos que sustentam
o movimento? A resposta não é simples, mas a solução foi apontada em entrevista de
página inteira concedida pelo Professor ZANDER NAVARRO ao jornal “O Estado de
São Paulo” em 29 de abril de 2007. A matéria jornalística, sintomaticamente, intitulase “Não existiria nenhum abril vermelho sem recursos públicos”.
Cumpre, pois, reproduzir alguns trechos:
Muitas atividades do MST são financiadas com recursos públicos, por meio
de convênios com entidades controladas para organização, como a Associação
Nacional de Cooperativas Agrícolas. O senhor acha que esse dinheiro é bem
empregado?
A partir dos anos 90, o financiamento do MST oriundo das doações de igrejas
européias começou a escassear, ao mesmo tempo em que se descobriu a porta das burras
do Estado. São dois os estratagemas. Primeiramente, mantêm sob estrutura não formal o
MST - que não é registrado, não tem estatuto, não tem processos públicos de escolha de
sua direção e não presta contas de nada. Isso permite proteger suas lideranças em todo o
País, ocorrendo alguma ilegalidade. Algo bizarro, porque o MST vive cobrando
democracia e transparência no comportamento das demais organizações políticas do
País.
E o segundo estratagema?
O outro caminho é registrar dezenas de organizações, sobre as quais ninguém
ouviu falar (cooperativas, associações, organizações de técnicos). Essas últimas, por
serem regulares, preparam projetos para obter fundos públicos. Como o MST tem
14
http://www.mtl.org.br.
9
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milhares de simpatizantes dentro do Estado (o que é mérito político da organização), a
aprovação sempre é facilitada. Como não há fiscalização, a criatividade, digamos assim,
permite um uso bastante heterodoxo dos recursos.
Inclusive o financiamento de ações como o “abril vermelho”?
Sim. Sem esses fundos não existiria nenhum “abril vermelho”. Mas existem
outras formas de acesso. Por exemplo, concentrar esforços para eleger representantes no
Legislativo, que depois serão marionetes da cúpula do MST. Um deputado estadual
sustenta pelo menos 10 militantes em tempo integral. Um deputado federal sustenta pelo
menos o triplo. Militantes colocados em cargos públicos farão o mesmo, sempre que
puderem. Se não ocorressem desvios e fosse uma organização realmente democrática e
aberta, por que o MST resistiria a abrir suas contas?
Esse financiamento estatal do MST pode ser percebido na própria
atuação do INCRA e na prestação de auxílio aos acampados. Há o fornecimento de
lonas e de cestas básicas originárias do Programa de Segurança Alimentar e
Nutricional do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Apenas em
julho de 2007 foram 2.742 cestas básicas, se computados os acampamentos antes
referidos e os assentamentos do último ano.
O Ministério Público encaminhou um questionamento ao Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome, acerca da existência ou não de alguma
fonte de financiamento ou ajuda, direta ou indireta, aos participantes do MST
acampados no Rio Grande do Sul.
A resposta do Ministério foi no seguinte sentido15:
1. a Ação de Distribuição de Alimentos a Grupos Populacionais
Específicos – CONAB, atende acampados em situação de insegurança
alimentar e nutricional que estão à espera da reforma agrária do Estado
do Rio Grande do Sul;
2. que a participação ou não dos acampados no Movimento SemTerra, ou qualquer outro movimento social, não é prerrogativa para que
as famílias recebam as cestas de alimentos provenientes da ação
supracitada;
3. que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, por
meio de sua Ouvidoria Agrária Nacional, é o órgão responsável pela
indicação de atendimento às famílias acampadas que se encontram em
situação de insegurança alimentar e nutricional, indicando também
comunidades quilombolas, comunidades de terreiros, comunidades
15
Fls. 82/83.
10
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
indígenas e os atingidos por barragens, em todo o Brasil;
4. que cada cesta de alimentos pesa 22 kg e é composta por: 10 kg
de arroz, 3 kg de feijão, 1 kg de fubá, 2 kg de farinha de trigo, 2 litros de
óleo de soja, 2 kg de açúcar, 1 kg de macarrão e 1 kg de leite em pó; que
a previsão de entrega às famílias não é mensal, e sim de três vezes ao
longo de um ano;
Segue abaixo quadro informativo com o número de cestas básicas
distribuídas aos acampados do Rio Grande do Sul em 2005, 2006 e 2007 (até julho):
2005
Número de famílias atendidas
Quantidade de cestas distribuídas
2.500
22.964
2006
2007
2.831
2.831
20.384
13.537
Essa conexão entre MST e recursos públicos foi examinada pelo
Congresso Nacional. A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito criada através do
Requerimento n.º 13/2003, também chamada “CPMI da Terra”, teve por objetivo
realizar amplo diagnóstico sobre a estrutura fundiária e o problema habitacional
brasileiro, e investigar as crescentes ações de ocupações de áreas rurais e urbanas,
registradas em todo o País, bem como os movimentos de resistência às ocupações.
Uma das características mencionadas no relatório final da CPMI16 é que
o MST é um grupo econômico e que, embora apresente uma estrutura bem formada, a
ausência de personalidade jurídica é proposital, para evitar que seu patrimônio seja
atingido em ações judiciais. Os recursos financeiros, segundo levantamento feito pela
CMPI, provêm da ANCA e da CONCRAB, referidos como “braços financeiros do
MST”. Seguem algumas evidências analisadas pela Comissão:
a)
A ANCA e a CONCRAB compartilham o mesmo endereço, que
não por coincidência, vem a ser o mesmo endereço pelo MST no timbre
do ofício enviado a esta CPMI;
b)
Quando o Governo Fernando Henrique Cardoso cortou recursos
de convênios da CONCRAB, em 2000/2002, o MST e seus dirigentes
16
Fls. 815/1150.
11
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
afirmaram que se tratava de perseguição ao Movimento (informação
obtida nos artigos disponíveis no site do MST);
c)
O MST recebe doações do exterior mediante transferências
financeiras destinadas à ANCA e à CONCRAB (informação obtida nos
sites de doadores estrangeiros e confirmada pelos dados do SISBACEN,
que chegaram posteriormente à CPMI);
d)
Os depósitos referentes à aquisição de publicações e materiais
diversos do MST são realizados na conta corrente 117.138-0, que a
ANCA mantém junto ao Banco Bradesco, na agência 0136-8
(informação disponível no site do MST e confirmada, posteriormente,
pelos dados bancários da entidade).
e)
O domínio do MST na Internet está registrado em nome da ANCA,
ali constando seu CNPJ e endereço (informação disponível do site da
FAPESP);
f)
O site na Internet da CONCRAB encontra-se dentro do domínio
do MST, que, como já afirmado, pertence à ANCA (informação
disponível no site da FAPESP);
g)
O MST reconhece, expressamente, a CONCRAB como seu braço
operacional junto às diversas cooperativas agrárias (informação
disponível no site do MST); e
h)
O logotipo da CONCRAB é análogo ao do MST (círculo contendo
mapa do Brasil e casal de agricultores), diferenciando-se apenas pelas
inscrições ao redor do círculo.
Além desses fatos, deve-se apontar as seguintes constatações:
i)
Ao reivindicar recursos federais, ANCA e CONCRAB apresentam
planos de trabalho em que descrevem como suas as instalações do MST
nos assentamentos (escolas, professores, etc.);
j)
Ao prestar contas aos órgãos e entidades federais, ANCA e
CONCRAB citam como seus eventos que foram organizados pelo MST;
k)
ANCA e CONCRAB têm uma estrutura física extremamente enxuta
e recursos humanos escassos (uma sede em São Paulo, uma filial em
Brasília, nove auxiliares administrativos e três faxineiras), o que não
permitiria o recebimento de mais de R$ 30 milhões em convênios, a não
ser que o executor fosse o próprio MST;
l)
Advogados do MST são pagos pela ANCA;
m)
Recursos de um convênio federal com a ANCA foram desviados
para a organização da festa de comemoração dos 20 anos do MST;
n)
Dirigentes da ANCA e da CONCRAB ocupam postos de direção
nacional no MST; e
o)
Funcionários da ANCA trabalham para a CONCRAB, inclusive
movimentando recursos desta entidade – e vice-versa - funcionários da
CONCRAB trabalham para a ANCA, realizando atividades financeiras.
Outros dados importantes foram observados pela CPMI da Terra:
12
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
1)
Além da ANCA, CONCRAB e suas filiais estaduais, municipais e
locais (AESCA/AECA, CCA, cooperativas de produção e cooperativas de
crédito, associações de assentados), outras entidades também integram a
estrutura do MST, ligando-se direta ou indiretamente às “entidadesmães”;
2)
As “escolas do MST”: verificou-se que o ITERRA, localizado em
Veranópolis/RS, tem como sócios-fundadores a ANCA e a CONCRAB. O
sigilo bancário dessa entidade foi transferido para a CPMI da Terra, e
constatou-se que as irregularidades identificadas nas entidades paulistas
se repetem com surpreendente freqüência e similaridade na escola
gaúcha além de haver grande e suspeita circulação de recursos entre a
escola e seus sócios.
A Escola Florestan Fernandes é denominada de “Universidade do
MST”. Analisando o CNPJ dessa escola verifica-se que se trata de uma
filial do ITERRA, ou seja, a universidade do MST pertence,
indiretamente, à ANCA e à CONCRAB, os sócios-fundadores da sede.
Outras escolas de grande porte do MST não puderam ser investigadas
com maior profundidade, mas é certo que existem ao menos uma dezena
de instituições dessa natureza que foram direta ou indiretamente criadas
pela ANCA e pela CONCRAB.
3) Gráficas e Editoras: em pelo menos um caso a ligação é notória: o
Jornal Brasil de Fato, que publica, em nome do MST, o periódico de
mesmo nome.
Uma das pessoas que fazia o serviço bancário da ANCA e da CONCRAB
é, na verdade,funcionário do Jornal Brasil de Fato. Esse
“compartilhamento” de empregados só se admite como lícito se ANCA,
CONCRAB e Brasil de Fato foram considerados um grupo econômico
(CLT, art. 3.º).
Gráfica e Editora Peres: benesses em subordinação da ANCA e da
CONCRAB, em diversos convênios federais, levantavam forte suspeita de
pertencer à estrutura do MST.
Fato curioso para a Comissão: ao mesmo tempo que a Gráfica e Editora
Peres recebeu benefícios da ANCA e da CONCRAB, políticos de
esquerda receberam doações ou contrataram serviços dessa empresa
durante o período eleitoral de 2002, conforme mostra o site do TSE, no
sistema de prestação de contas eleitorais ali disponibilizado. O presente
fato não pôde ser apurado, pois houve uma “blindagem” das entidades
por membros da Comissão que temiam pelos avanços que a investigação
poderia ter. Os responsáveis pela ANCA e pela Sociedade Editorial
Brasil de Fato, empresa que edita a revista do MST, foram intimados
pela CPI para justificar os elevados saques em dinheiro feitos em nome
das pessoas jurídicas mencionadas, compareceram na data marcada,
mas extrapolaram o uso do direito de permanecer em silêncio.
13
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Destacou a Comissão, ainda, que a regra n.º 73 das Normas Gerais do
MST prevê que todos os bens coletivos, móveis e imóveis do Movimento deverão ser
colocados em nome da Associação Nacional de Cooperação Agrícola. Isso afasta a
simples parceria, consoante definido pelos dirigentes da MST.
A CPMI da Terra apontou também diversas outras irregularidades,
especialmente relativas à utilização, por parte do MST, de patrimônio alheio e de
dinheiro público para a prática dos seus atos, inclusive por meio de convênios:
a)
uso de tratores para invasões e apropriação de dinheiro que seria
destinado à construção de casas;
b)
cobrança de pedágio sobre empréstimo e de comissões de venda
sobre aquisições de insumos agrícolas e materiais de construção;
c)
apropriação de área destinada a assentamento de agricultores;
d)
Irregularidades em convênios apuradas através de auditorias.
Realizou-se também auditoria no Estado do Rio Grande do Sul 17:
A equipe de auditoria do Rio Grande do Sul examinou 27 convênios
celebrados com o Iterra pelo Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária (INCRA), Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE), Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica
do Ministério da Educação (MEC), Ministério da Saúde (FNS),
Ministério do Trabalho e Emprego (TEM), totalizando R$ 9.431.328,01.
(...)
8.6.2.4. Problemas no Incra
Autos de Processo não são localizados pelo Incra
O processo do convênio n.º 376.571 (R$ 610.985,00 para a formação em
nível de 2º grau, com habilitação administração de cooperativas) não foi
localizado pelo INCRA, o que inviabilizou a análise dos pareceres
técnicos, sobre o projeto/plano de trabalho, e jurídico, sobre as minutas
do convênio e seus aditivos, bem como o cumprimento dos requisitos
legais para celebração.
Atraso na Liberação de Verbas
Verificou-se que, como regra, o Incra não cumpre os cronogramas de
desembolso, integrantes dos planos de trabalho dos convênios. Em
média, há uma atraso de 2,5 meses para o repasse de cada parcela,
tendo-se observado retardamentos de até 9 meses.
Para dar um falso amparo legal aos repasses atrasados, o Incra celebra,
rotineiramente, aditivos para prorrogação de prazos de vigência de
17
Fls. 1035 e ss.
14
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
convênios. Mas os cronogramas físicos-financeiros são mantidos. Ou
seja, o órgão “dá um jeito” de repassar ao Iterra os recursos previstos.
Mas, a lei estabelece que não se pode pagar por serviços já executados.
Assim, o efeito do descompasso entre o programado e o executado é o
impasse imposto ao beneficiário dos recursos em decidir pela restituição
dos recursos, ou apresentação de uma execução financeira fictícia.
O Iterra não titubeou e optou pela apresentação de papéis que não
comprovam, em absoluto, a aplicação dos recursos federais nos objetos
dos respectivos convênios.
Na maioria das vezes, os falsos comprovantes de despesas apresentados
consistiram em notas emitidas pelo próprio Iterra, ou em recibos dos
alunos do Instituto, papéis que não comprovam, é claro, a contratação
de serviços de terceiros ou a aquisição de materiais.
O relatório do TCU registra que “mesmo que os repasses fossem
efetuados de forma tempestiva, o valor das despesas efetivamente
realizadas com alimentação e hospedagem ficam bem aquém dos valores
registrados nas notas fiscais emitidas pelo próprio Iterra.
Emissão de cheque único para pagamento a vários credores
Nas relações de pagamentos efetuados, insertas nas prestações de
contas, observou-se pagamentos a vários credores com um mesmo
cheque. Em geral, tais despesas correspondem a pagamentos de
passagens usadas por alunos e por instrutores e de honorários destes. O
INCRA/RS autorizou esta prática, tendo em vista os pequenos valores
envolvidos, conforme ata de reunião realizada em 03/12/99.
Contudo, essa prática dificulta a demonstração do vínculo entre os
recursos repassado e a despesa realizada. Esse tipo de falha ainda que
possa ser considerada formal deve ser objeto de correção, pois dificulta
a comprovação da aplicação dos recursos federais no objeto do
convênio.
O art. 20 da IN STN 01/97 determina que somente são permitidos saques
mediante cheque nominativo ao credor ou ordem bancária. A redação
atual do dispositivo incluiu a possibilidade de saques mediante
transferência eletrônica e destacou que no caso de pagamento seja
identificado o credor.
Notas fiscais emitidas pelo próprio convenente
A comprovação da aplicação dos recursos ocorreu, em sua maior parte,
mediante notas fiscais de prestação de serviço emitidas pelo próprio
Iterra, destinadas à comprovação de despesas com alimentação e
hospedagem (diárias) de assessores/professores e alunos, além de
pequenas despesas com fotocópias, material de consumo e expediente e
locação de computadores.
Cada nota fiscal assim emitida corresponde a um cheque da conta
específica, que recebeu R$ 3.717.495,50 da União entre 1999 e 2003,
emitiu nesse período notas fiscais e recibos no total de R$ 2.284.662,65
(61%) para comprovar a aplicação dos recursos.
Esse tipo de comprovação vem sendo acolhida pelo INCRA, trazendo
como resultado a aprovação sistemática de prestações de contas
15
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
constituídas de documentos precários, com objetivo de dar aparência de
legalidade à execução financeira.
O art. 30 da IN STN 01/97 determina que as despesas serão
comprovadas mediante documentos fiscais emitidos em nome do
convenente e não pelo próprio convenente.
O total das notas fiscais de prestação de serviço emitidas pelo próprio
Iterra é de R$ 2.284.662,65.
Recibos assinados pelo próprios alunos
Mais recentemente, em substituição ao procedimento referido no item
anterior, a comprovação das despesas com hospedagem/alimentação
(diárias) passou a ser efetuada mediante recibos assinados pelo alunos e
assessores/professores.
Em 2004 a entidade recebeu R$ 2.137.672,51 e já comprovou R$
843.267,40 (40%) mediante recibos assinados pelos alunos/instrutores.
A tendência desse percentual é de crescimento, com expectativa de que
seja tingido o percentual de 60% que vem sendo praticado no período de
1999 a 2003.
Embora alterada a sistemática de comprovação, não houve alteração
significativa na situação fática.
O relatório aduz que cada conjunto de recibos referentes a diárias de
uma etapa de convênio corresponde a um cheque da conta específica do
convênio que é sacado pela própria entidade.
Ou seja, simula-se que o Iterra sacou o dinheiro no caixa e o distribuiu
entre alunos e distribuidores. O problema é que o saque ocorre depois
dos cursos e, durante os cursos, eles recebem hospedagem e alimentação
fornecida pelo próprio Itetrra.
O que era de se esperar era o Iterra apresentar, por exemplo, notas
fiscais referentes a compras de supermercado destinadas à preparação
de comida para os hóspedes.
O relatório concluiu que não é admissível a comprovação de despesas
com diárias mediantes recibos emitidos pelo alunos e instrutores, pois
eles foram, na verdade, meros beneficiários de alimentação/hospedagem
fornecida pelo convenente, sem receber qualquer dinheiro sacado pelo
Iterra das contas de convênio.
Em outras palavras, os recibos de alunos e instrutores são falsos.
Como no caso anterior, o acolhimento dessa modalidade de
comprovação traz como resultado a aprovação sistemática de prestações
de contas constituídas de documentos precários, com o objetivo de dar
aparência de legalidade à execução financiera.
Vale registrar também que, quanto à qualidade dos serviços oferecidos,
houve críticas dos participantes: “Aparentemente a Escola não estava
devidamente preparada para o curso”; “Faltou qualidade nutricional e
criatividade no cardápio”.
Superfaturamente de diárias, alimentação e estadia
A equipe de auditoria do TCU verificou, mediante dados extraídos dos
registros contábeis da entidade, considerando todas as contas passíveis
de registrar despesas relacionadas a diárias, alimentação e estadia, que
16
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
os cursos efetivamente incorridos pelo Iterra são significativamente
inferiores aos valores apresentados pelo Instituto nas prestações de
contas.
(...)
Superfaturamento das diárias: R$ 1.741.468,94
Superfaturamento com alimentação e estadia R$ 438154,39, em 2002.
Nesse ponto, a equipe do TCU conclui pelo que já se suspeitava na
CPMI da Terra em relação aos convênios federais firmados com as
entidades ligadas ao MST: “Na prática, verifica-se que o Iterra vem
sendo financiado com recursos públicos federais oriundos de convênios.
O superávit em favor do Iterra resulta na realização de despesas não
relacionados ao objeto dos convênios e que não correspondem a
benefícios para os alunos com alimentação e instalações compatíveis
com os valores de diárias atestados pelo Iterra.
Liberação irregular de parcela
No convênio nº 488.326 (R$ 795.8000,00 para Especialização em
educação do campo e desenvolvimento) ocorreu a liberação da 2ª
parcela de recursos sem a aprovação de prestação de contas parcial
relativa à primeira etapa.
O convênio foi assinado pelo Presidente do INCRA e previa a liberação
de recursos em três parcelas. A primeira (R$ 170.430,00) foi creditada
na conta bancária do Iterra em 30/12/03. A prestação de contas
referente a primeira parcela foi apresentada em 18/02/04.
Essa prestação de contas não foi analisada, estando registrada no
SIAFI, em 27/07/05, na situação “A APROVAR”.
O art. 51 do Decreto 93.872/86 determina que a entrega dos recursos
destinados ao cumprimento do objetivo do convênio devem ter por base o
cronograma de execução, condicionando-se as entregas subseqüentes ao
regular emprego da parcela anteriormente liberada.
Duas versões de comprovantes de pagamentos
A facilidade que o Iterra tem para produzir falsos comprovantes de
despesas chega ao ponto de se verificar que, no convênio n.º 488.326, o
Iterra apresentou duas versões de relações de pagamentos, indicando
comprovantes de despesas para três cheques.
(...)
A equipe do TCU entende que as despesas indicadas na Tabela 6 devem
ser impugnadas, “pois não é admissível que a prestação de contas seja
construída, ora com uns, ora com outros documentos, ao alvedrio do
convenente, a fim de adequar as supostas despesas à movimentação da
conta específica.
Falhas na utilização da conta-corrente de convênio
Diante das grosseiras irregularidades detectadas pela Cecex/RS, outras
parecem pouco significar.
Uma irregularidade que seria greve, se não houvesse o absurdo descrito
anteriormente, é o fato de o Iterra haver uma única conta-corrente para
dois convênios. O convênio n.º 424.906 teve seus recursos movimentados
na conta específica do Banco do Brasil, agência 604-1, conta 7257-5 até
17
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
21/03/2005. Contudo, em 23/12/2004, foi firmado novo convênio (nº
516.927), informando a mesma conta-corrente. No extrato bancário do
primeiro convênio, consta o crédito da parcela de R$ 75.000,00 do
segundo convênio.
Assim como nos convênios da OCB, o convenente Iterra se absteve de
aplicar os recursos de convênios em caderneta de poupança,
acarretando perda de rendimentos financeiros.
Conclusão dos Analistas do TCU
A equipe de auditoria concluiu que o processo de fiscalização deve ser
convertido em tomada de contas especial, para que, no prazo de quinze
dias, o Iterra apresente sua defesa ou recolha aos cofres públicos a
importância de R$ 3.144.920,05, mais atualização monetária e juros de
mora.
A equipe propõe, também, a audiência do Presidente do Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária, Sr. Rolf Hackbart, para
que justifique sua autorização para transferência da 2ª parcela do
convênio nº 488.326, sem que tenha sido aprovada a prestação de contas
parcial referente à 1ª parcela do acordo.
Se não for devidamente justificada a liberação de recursos, o
responsável poderá ser multado pelo TCU.
(...)
Os benefícios esperados da auditoria são, de acordo com os analistas do
TCU, os seguintes:
a)
obrigação de ressarcimento de R$ 3.144.920,02 (valor histórico),
referentes aos convênio examinados;
b)
ressarcimento de valores da ordem de R$ 295.500,00 (valor
histórico) referente à impugnação de despesas nas próximas prestações
de contas;
c)
economia de R$ 1.430.370,00, em caso de denúncia dos convênios
vigentes;
d)
melhores controles referentes às prestações de contas dos
convênios, e;
e)
aperfeiçoamento de procedimentos do PRONERA.
O TCU procedeu à auditoria em diversos Estados e constatou que ANCA
e CONCRAB atuam como agentes financeiros do MST (fl. 231) tendo em
vista o desvio de recursos que eram destinados à reforma agrária,
educação, saúde, pesquisa.
A equipe de auditoria listou algumas propostas para tentar punir e
solucionar as irregularidades praticadas pelo MST em razão de desvio
de verbas, principalmente em decorrência do mal uso de convênios (fl.
238/239). Há, ainda, uma conclusão sobre indícios de formação de
quadrilha (fl. 239), suspeita de desvio de recursos para o “Abril
Vermelho” (fl. 240), além de despesas absurdas pagas pela União que
chocaram a equipe de auditoria, e os analistas, que com cuidado,
18
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
narraram alguns fatos que impressionaram (fl. 237):
De modo semelhante, ninguém se deu ao trabalho de avaliar a tiragem
de 20.000 exemplares de cada um dos cadernos de educação,
denominados Alfabetização de Jovens e adultos – Matemática,
Alfabetização de Jovens e Adultos – Didática da Linguagem e Como
fazer a escola que queremos – Planejamento. Ora, se o MST afirma
contar com 4.000 educadores, qual a justificativa para a impressão de
20 mil exemplares de material para formação pedagógica? O caderno
Alfabetização de Jovens e Adultos – Didática da Linguagem encontra-se
a venda na loja do MST pelo preço de R$ 4,00 (informação disponível no
site www.mst.org.br).
Note-se que o preço informado no fim do parágrafo não guarda relação
direta com a falta de análise técnica da proposta. É possível que a
equipe tenha desconfiado que o excesso de cadernos impressos seja
vendido na Internet. Dessa forma, a equipe insinua, entrelinhas, a
apropriação indébita de R$ 64 mil (16 mil cadernos), já que apenas 4
mil seriam aproveitados pelos educadores do MST.
Resumindo, a equipe de auditoria do TCU identificou diversas
irregularidades na execução dos convênios firmados pela administração
federal com as entidades ligadas ao MST, principalmente, as maiores
delas: Anca, Concrab e Iterra (fl. 243):
a)
danos aos cofres públicos;
b)
irregularidades nos convênios de assistência jurídica e
assentados;
c)
indícios de favorecimento na celebração de convênios da Anca e
da Concrab;
d)
A Anca e a Concrab atuam como agentes financeiros do MST;
e)
Desvio de finalidade na celebração de convênios;
f)
Suspeitas de desvio de recursos para o “Abril Vermelho”.
Verifica-se, pois, que seja pela malversação de verbas públicas conforme
apontado nas conclusões da CPMI da Terra, seja pelo repasse de dinheiro público
efetuado diretamente pelo INCRA na forma de distribuição de lonas, cestas básicas e
outros auxílios, o financiamento estatal das atividades do MST é bastante claro.
Além da proveniência pública de boa parte dos recursos utilizados pelo
MST, não se pode olvidar aquela que foi a sua fonte inicial de renda: a doação de
recursos por entidades estrangeiras, notadamente organizações não-governamentais
ligadas a instituições religiosas, como a organização Caritas, mantida pela Igreja
19
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Católica na Alemanha. No ano de 2003 o jornalista Ricardo Westin, da “Folha de São
Paulo”, publicou uma reportagem com o título “ONGs estrangeiras financiam parte
das atividades do MST”. Pela relevância do tema, transcreve-se a matéria 18:
02/11/2003 - 08h00
ONGs estrangeiras financiam parte das atividades do MST
RICARDO WESTIN
da Folha de S.Paulo
O cofre administrado pelo MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)
recebe doações vindas do exterior que, a cada ano, somam o equivalente a pelo
menos R$ 752 mil.
O MST mantém suas fontes de renda em segredo, mas um levantamento feito pela
Folha mostra que no mínimo oito ONGs e agências de cooperação internacional
ajudam a financiar o principal movimento social do país.
Entre elas, estão a alemã Caritas (doa o equivalente a R$ 396 mil por ano), a canadense
Développement et Paix (R$ 162 mil), a britânica Christian Aid (R$ 143 mil) e a
americana Grassroots International (R$ 51 mil) --as duas primeiras são ligadas à Igreja
Católica; a terceira, a igrejas protestantes.
Outras organizações ajudam a engrossar a lista de "patrocinadores", mas a Folha não
teve acesso a informações sobre as cifras. São a FMST (Friends of the MST), dos EUA,
a Frövännerna, da Suécia, o Conselho Mundial de Igrejas, com sede na Suíça, e a Mani
Tese, da Itália.
Os dirigentes, além de não revelar os nomes das entidades estrangeiras, tratam de
minimizar o peso do apoio internacional em seu orçamento.
"Não temos cifra exata, mas, nos últimos anos, a média [de doações vindas do exterior]
não representa mais que 5% do financiamento do MST", afirma Geraldo Fontes, diretor
do setor de Relações Internacionais do MST.
Esse dinheiro, no entanto, não é destinado apenas aos trabalhadores rurais que vivem
em assentamentos e acampamentos.
Parte desses milhares de reais também sustenta outra face do movimento, menos
conhecida. Ajuda a manter uma complexa hierarquia burocrática de
coordenações, direções e secretarias (nacionais, estaduais e regionais), que, com
tentáculos em quase todo o país, só não alcança quatro Estados (Amazonas,
Roraima, Acre e Amapá).
Nos primeiros momentos do MST, nos anos 80, o principal mediador dos recursos
vindos de fora eram igrejas, por meio de organizações como a Cese (Coordenadoria
Ecumênica de Serviço), da Bahia. Hoje o movimento já é suficientemente conhecido no
exterior para manter relações diretas com seus "parceiros".
O setor de Relações Internacionais do MST foi criado em 1989 e, segundo Geraldo
18
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u54996.shtml (acesso em 02 de junho de 2008) – os
grifos são do Ministério Público.
20
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Pontes, conta com o trabalho de 53 militantes.
O dinheiro estrangeiro pode chegar ao MST nacional ou diretamente aos Estados. A
Grassroots, por exemplo, lida diretamente com os sem-terra do Maranhão e de
Pernambuco.
A ONG americana destina à secretaria estadual de Pernambuco, em Caruaru, cerca de
R$ 28 mil por ano. A verba garante a contratação de um advogado para cuidar dos
interesses dos sem-terra na Justiça e dois "cursos de formação" anuais para líderes
pernambucanos a respeito de direitos humanos.
"Esse dinheiro faria muita falta. Garante toda a assessoria jurídica do MST em
Pernambuco", conta Severino Ramos, da coordenação estadual do movimento.
Prestação de contas
Em todos os casos, o MST é obrigado a fazer periodicamente uma prestação de contas.
"Nunca tivemos problemas com isso", diz Wolfgang Hees, da Caritas, que
frequentemente vem ao Brasil. Os R$ 400 mil que a ONG alemã destina aos sem-terra
são depositados num fundo, que é administrado em conjunto pelo MST, pela CPT
(Comissão Pastoral da Terra) e pela Caritas brasileira.
Fora essas doações que são depositadas regularmente no caixa dos sem-terra, neste
momento o MST conta com uma ajuda milionária vinda da parceria entre a
Caritas, a francesa Frères des Hommes e até a União Européia para levantar seu
centro de formação política e técnica de militantes em Guararema (SP).
A futura Escola Nacional Florestan Fernandes deverá consumir até a inauguração,
prevista para o ano que vem, o equivalente a mais de R$ 7,3 milhões. Do total, cerca
de R$ 2,5 milhões são bancados pelo próprio MST.
Se as doações externas representam cerca de 5% do caixa do movimento, chega-se a
uma receita de no mínimo R$ 15 milhões por ano. Também procurando relativizar a
importância desse orçamento, Mário Lill, da coordenação do Rio Grande do Sul, diz que
o MST não é rico.
"Às vezes, cria-se uma paranóia a respeito do dinheiro. Fazemos um trabalho pobre e
sofrido. O que nos move é mais a dignidade que o dinheiro".
Com essas informações, pode-se compor, de forma aproximada, o
mosaico das fontes de financiamento do MST: 1. financiamento estatal direto, com
distribuição de cestas básicas, lonas e auxílio logístico. 2. financiamento estatal indireto,
com repasse de verbas por meio de convênios entre órgãos públicos e entidades ligadas
ao MST. 3 financiamento privado internacional, com verbas oriundas de ONGs
estrangeiras ligadas a instituições religiosas e de agências de cooperação internacional.
21
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
1.6. A REDE INTERNACIONAL DE APOIO.
É importante notar que o MST dispõe de ampla rede de apoio
internacional, o que permite um fluxo permanente no levantamento de fundos, assim
como a manutenção de um clima de solidariedade e simpatia para com o movimento.
Não por acaso, o próprio movimento, para facilitar o acesso de estrangeiros dispõe de
uma página na Internet totalmente em inglês (Brazil’s Landless Workers Movement19),
demonstrando profissionalismo em gestão de informações e em relações públicas.
Além disso, a rede de apoio também se apresenta organizada, mostrando
ao público estrangeiro uma visão de Brasil frontalmente crítica à atuação do Poder
Público e inteiramente de acordo com os objetivos estratégicos do MST. Refira-se, à
guisa de exemplos, a atuação do “Comité de Apoyo de Madrid”20, e a campanha de
levantamento de fundos feita nos Estados Unidos da América pela organização “Friends
of the MST”, que dispõe de sete núcleos naquela nação (San Francisco, Seattle,
Louisville, Chicago, Boston, New York e Washington)21. Além dos dois exemplos
citados, existem dezenas de organizações de apoio ao redor do mundo, emprestando
suporte ideológico e mesmo apoio material, quando necessário.
19
http://www.mstbrazil.org.
http://www.mstmadrid.org.
21
Conforme notícia do jornal Zero Hora em 18 de julho de 2007, o Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST) iniciou, no domingo, uma campanha de levantamento de fundos nos Estados Unidos.
Um e-mail pedindo doações foi disseminado pelo país pelos sete núcleos do grupo - San Francisco,
Seattle, Louisville, Chicago, Boston, Nova York e Washington - sob o selo do Friends of MST (Amigos
do MST). De acordo com a solicitação, as doações podem ser feitas online, por cartão de crédito, cheque,
dinheiro ou ordem postal, a serem enviados a uma caixa postal em Santa Cruz, na Califórnia. A quantia,
diz o pedido, poderá ser descontada na declaração do imposto de renda nos EUA. O dinheiro deverá ser
utilizado para bancar a Escola Nacional Florestan Fernandes, construída pelo grupo em Guararema (SP).
“A Escola Nacional já está servindo ao seu propósito de promover o pensamento, o planejamento e a
organização de ativistas do MST e seus líderes eleitos e de, ao mesmo tempo, desenvolver o seu
treinamento político, técnico e ideológico” - diz o material que acompanha a solicitação. Em entrevista a
O Globo, o norte-americano Miguel Carter, professor da American University e coordenador do grupo em
Washington, afirmou que se trata da primeira universidade camponesa da América Latina: “Nossa
perspectiva é a de levantar um bom volume de recursos, pois tanto os membros do ‘Amigos do MST’
quanto outras pessoas procuradas por nós apóiam a luta contra o apartheid social que existe no Brasil”.
Os núcleos da Amigos do MST são formados por universitários, representantes de ONGs, pequenos
empresários e profissionais brasileiros e norte-americanos. Anualmente eles costumam fazer marchas em
Washington. O grupo sugere uma doação mínima de US$ 25 (cerca de R$ 50). “O MST está contando
com a ajuda de seus amigos ao redor do mundo”, diz um trecho do material. O texto informa que, ao
longo de cinco anos, 112 assentamentos e 230 acampamentos do MST em 20 dos 27 Estados brasileiros
enviaram mais de 1,5 mil voluntários para construir a Escola Nacional Florestan Fernandes. A construção
20
22
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Outro tipo de apoio é prestado pela organização La Via Campesina, que
se define como um movimento internacional de camponeses, pequenos e médios
proprietários, sem-terras, mulheres do campo, povos indígenas, jovens do campo e
trabalhadores rurais22. Embora pretenda defender bandeiras como soberania alimentar e
agricultura familiar, a Via Campesina tem atuado como um guarda-chuva debaixo do
qual se abrigam movimentos agrários radicais em diversos países, constituindo uma
organização-pólo – o MST é filiado a essa entidade. No Brasil, a Via Campesina foi
responsável pelo recente episódio de vandalismo contra o viveiro da Aracruz Celulose
S/A, ocasião em que foram destruídas cinco milhões de mudas23.
1.7. ESTRATÉGIA DO MST. RELATÓRIO DE INTELIGÊNCIA
DA BRIGADA MILITAR.
A estratégia do MST e de seus apoiadores tem sido objeto de
acompanhamento e análise por parte dos serviços de inteligência em atuação no país. A
seguir, transcreve-se o relatório da Brigada Militar24 elaborado em 02 de junho de 2006
pelo então Comandante do CRPO Planalto, Cel. QOEM Waldir João Reis Cerutti, que
se apresenta devidamente instruído por documentos e faz alusão à situação do
movimento no entorno da Fazenda Coqueiros (também conhecida como Fazenda
Guerra):
1. A via Campesina – organização internacional com intensa
atuação na região Norte, como de resto, em todo o Estado, vincula-se ao
Movimento dos Sem Terra (MST), Movimento dos Pequenos
Agricultores (MPA), Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MAB),
dentre outros que se instalaram em torno da Fazenda Coqueiros, de
propriedade de Félix Tubino Guerra, montando 04 (quatro)
acampamentos, graficados em mapa em anexo, com cerca de 4.500
(quatro mil e quinhentos) acampados, ao todo.
foi financiada com vendas do livro Terra, com texto do escritor português José Saramago, fotografias de
Sebastião Salgado e um disco de Chico Buarque, além de contribuições do Exterior.
22
http://www.viacampesina.org.
23
http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI909064-EI306,00.html (acesso em 02 de junho de 2008 a denúncia criminal relativa aqueles fatos, ajuizada na Comarca de Barra do Ribeiro, consta nas fls.
1779/1794).
24
Fls. 551/602.
23
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Existem dois acampamentos na BR 386 e outros dois
acampamentos em áreas contíguas à Fazenda Coqueiros; um destes
últimos encontra-se em área arrendada denominado acampamento
JANDIR – ocupada no ano de 2004 e o outro, recentemente adquirido
por particular e cedido graciosamente ao MST, denominado
acampamento SERRARIA (que demonstrado maior agressividade),
encontra-se encravado em dita fazenda.
3. Todos acampamentos funcionam como vasos comunicantes,
havendo intensa troca de acampados, de um para outro, além de
receberem seguidamente novos militantes, recrutados entre a população
menos favorecida das cidades maiores, bem como oriundos dos
assentamentos da região. Acresço que essa movimentação visa dar
condições estratégicas para as lideranças efetivarem a prática de ações
delituosas em determinados pontos específicos, em verdadeiras ações
paramilitares, utilizando-se a estrutura destes acampamentos como base
para suas incursões criminosas.
4. Cada acampamento possui sua liderança local, ligada às
lideranças regionais, que por sua vez se ligam às lideranças estaduais,
tudo vinculado ao movimento internacional “Via Campesina”. As ações
são todas coordenadas estrategicamente e normalmente tem cunho
político, porém causam grande dano patrimonial e moral aos atingidos,
suas famílias e funcionários, nas ações que desencadeiam na área.
5. Os Acampamentos estão sendo mantidos por diversas fontes,
inclusive com verbas públicas do Governo Federal, através do INCRARS, com seguida remessa de toneladas de gêneros alimentícios
provenientes de programas como o FOME-ZERO, adquiridos com
recursos públicos da também estatal CONAB (Companhia Brasileira de
Abastecimento), tudo comprovado com Nota Fiscal. Além disso, há
fontes internacionais que também mantém o movimento e, segundo
informações de inteligência, até as próprias FARC, que dominam parte
do território colombiano.
6. Recentemente em ação do Ministério Público, durante
investigações sobre as ações delituosas do movimento Via-Campesina,
foi encontrado em um estabelecimento ligado a tal movimento, na cidade
de Passo Fundo, grande quantidade de dinheiro, em moeda corrente de
diversos países.
7. Comprovando o envolvimento internacional, temos também o
registro de diversas visitas de estrangeiros aos acampamentos, bem como
estrangeiros orientando as ações, como é caso do indivíduo conhecido
como Hugo Castelhano.
8. As ações delituosas do movimento na região são facilmente
observadas através dos diversos registros e prisões já homologados,
caracterizando-se principalmente, por invasões, esbulhos, turbações,
crimes ambientais, posse ilegal de armas, roubos, furtos e, supostamente,
exploração de menores.
9. As maiores ações envolvem uma organização típica, a saber: são
feitas em sigilo, da madrugada para o amanhecer, com atuação de um
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grupo precursor armado, com grande movimentação de pessoas e
invejável estrutura, contando com lideranças estaduais de renome. Tais
ações necessitam de grande aporte financeiro para sua execução.
10. Os setores de inteligência obtiveram informações da estratégia
de atuação do movimento na região, que seria incentivada pelas FARC
(Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), copiando o modelo
adotado em tal país. Como é do conhecimento público, as FARC
dominam grande parte daquele país e adotam o método de controle
através do domínio territorial, começando suas ações pela guerrilha rural;
nas regiões dominadas, o controle é total , as zonas são fechadas, pouco
ou nada restando de autoridade aos governos central e local; em tais
zonas o exército e a polícia não entram, tornando-se regiões fora da lei,
onde a única lei é a ditada pelo crime organizado. Nestas regiões as
FARC tem como fonte de renda o tráfico de drogas e de armas, a venda
de proteção a traficantes produtores de drogas, a empresários
comerciantes e fazendeiros, tanto no campo como nas cidades existentes
em sua “Zona de Domínio”. Dedica-se tal “instituição”, também a toda
sorte de crimes, como seqüestro de pessoas, em larga escala. Atualmente,
cerca de 2.000 (duas mil) pessoas são mantidas, permanentemente, em
cárcere privado decorrente de seqüestro, só sendo liberadas mediante
pagamento de elevados resgates patrimoniais ou mediante o
cumprimento de determinadas exigências pelas autoridades
governamentais. Em caso de não cumprimento das exigências e/ou
pagamento do resgate, as vítimas são trucidadas pelos seqüestradores.
11. Análises de nosso sistema de inteligência permitem supor que o
MST esteja em plena fase executiva de um arrojado plano estratégico,
formulado a partir de tal “convênio”, que inclui o domínio de um
território em que o governo manda nada ou quase nada e o MST e Via
Campesina, tudo ou quase tudo.
12. Na região do Estado do Rio Grande do Sul compreendida entre
os municípios de Palmeira das Missões, Irai, Nonoai, Encruzilhada
Natalino, Pontão e Passo Fundo, existem nada menos do que 31 (trinta e
um) assentamentos do MST e diversas reservas indígenas; no vale do Rio
Uruguai existem diversos aproveitamentos hidrelétricos (alguns prontos e
outros ainda em execução), onde age um grupo denominado de MAB
(Movimento dos Atingidos por Barragens), congênere do MST e que,
igualmente, adotam métodos violentos de reivindicação como o
movimento maior (o MST). Registram-se ações do MAB, entre outras,
nas usinas hidrelétricas de Barra Grande, Machadinho e Itá.
13. Dentre os assentamentos referidos, destacam-se os dois maiores
e mais conhecidos: os das Fazendas SARANDI e ANONI, nos
municípios de SARANDI, RONDA ALTA e PONTÃO. Mais à OESTE
da região mencionada, existe com número de assentamentos do MST, em
municípios como BOA VISTA DO INCRA, CRUZ ALTA, JÓIA e
TUPANCIRETÃ.
14. As informações acima prestadas permitem concluir que o
arrojado plano estratégico do MST, sob orientação de operadores
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estrangeiros como as FARC, é adotar nesta rica produtiva região do
nosso Estado, o método de controle territorial branco tão lucrativamente
adotado pelas FARC na Colômbia. O fechamento do território consistiria
em domínio de leste para oeste, a partir da linha norte-sul, representada
no mapa em anexo pela rodovia RS-324, que vai de Passo Fundo a
Nonoai e de lá até a ponte do Goio-En, que dá acesso ao município de
Santa Catarina
15. Estima-se que a primeira etapa da ação visando obter
pretendido domínio territorial branco seria tentar controlar o território
entre as rodovias RS-324 (Passo Fundo, Pontão, Ronda Alta, Goio-En) e
BR-386 (Carazinho, Sarandi e prolongamento por estrada estadual que
também conduz à ponte do Rio GoioEn), estendendo com pontos até a
fronteira com o Uruguai o que já lhes daria o controle sobre estas
importantes rodovias norte-sul, de grande importância estratégica para
fins de controle de área e liberdade de movimentos. Ressalte-se que já se
verificou invasão às margens da BR-354. No município de Nonoai
(dentro da área visada), na faixa de domínio da citada rodovia e na
Fazenda de propriedade de Alberto Tagliari, ocorrendo o cumprimento
de Ordem Judicial de reintegração de posse, no entanto os invasores
retirados prometeram tornar a invadir a área e depredar a propriedade,
pois é até assinalado como ponto indispensável de fixação.
16. Outro componente que merece ser observado é a afirmação
divulgada pela imprensa nacional, de João Pedro Stédille, Líder nacional
do MST, no sentido de que o objetivo do MST não é mais somente a
reforma agrária, justificando e enaltecendo as ações criminosas ocorridas
contra a Aracruz Celulose e Monsanto, demostrando que as ações até
então desenvolvidas serão intensificadas e potencializadas, com níveis
cada vez maiores de danos.
17. Uma das maiores propriedades rurais existentes no trecho entre
estas rodovias, objeto do plano estratégico referido, é a Fazenda
Coqueiros, com cerca de 7.000 (sete mil) hectares, de forma
aproximadamente triangular, sendo que seu ponto mais a leste fica a
cerca de 13 (treze) quilômetros a oeste da Cidade de Pontão, onde existe
acesso rodoviário ligando tal cidade ao Distrito de Xadrez, pertencente ao
atual município de Coqueiros do Sul. O ponto mais ao Sul de tal fazenda
fica a 06 Km da cidade de Carazinho, sendo que o acesso à Carazinho é
por estrada municipal que liga tal município à Xadrez e, deste Distrito,
bifurca-se: o ramal direito conduz a PONTÃO e o outro (na direção
norte) conduz à sede do Município de COQUEIROS DO SUL e também
dá acesso à FAZENDA ANONI (assentamento do MST) situada a
aproximadamente 20 Km da divisa da Fazenda Coqueiros. O acesso
rodoviário principal à sede do município de Coqueiros do Sul dista
poucos quilômetros da divisa Norte da Fazenda Coqueiros (Rio Turvo),
sendo que, em linha reta, a distância é de 02 (dois) KM. Já do lado
OESTE, a fazenda Coqueiros não faz divisa com a BR-386, mas fica
perto dela, havendo apenas uma estreita faixa de terra de alguns
proprietários, que são, do Sul para o Norte: Família Bocorni,
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representado pela Sra. Genny Bocorni sucessores de Alfredo Bratz,
representado pelo genro e administrador Dr. Reneu Ries e, ainda, a
propriedade de 2.300 hectares, hoje denominada Sazão Agropecuária
S.A, administrada pelo Sr. Antônio Chaves Barcellos, residente em Porto
Alegre. Através de cada uma destas propriedades, em caminhadas com
duração máxima de meia hora, a partir de qualquer ponto da BR-386, é
possível atingir a divisa Oeste da Fazenda Coqueiros, bem como
mobilizar assentados do norte do estado para participarem de ações e
saírem do teatro de operações antes da chegada da polícia.
18. Para a execução da primeira parte do arrojado plano estratégico
antes referido, é imprescindível a tomada, a qualquer preço, da Fazenda
Coqueiros e outras propriedades situadas em seu caminho, por
localizarem-se entre as duas rodovias asfaltadas mencionadas (RS-324 e
BR-386), embora não divise com nenhuma delas.
19. O MST e seu afilhado o MPA, ambos integrantes da chamada
Via Campesina, organismo internacional antes citado, instalam em torno
da Fazenda Coqueiros nada menos do que 04 (quatro) acampamentos,
identificados no mapa em anexo, onde mantêm cerca de 4.500 (quatro
mil e quinhentas) pessoas, sendo que todo este efetivo é movimentado,
constantemente, de um para outro acampamento, recebendo com grande
freqüência novos ocupantes, vindos de outros municípios a até de outros
estados e países. Dois deste acampamentos, denominados de
ACAMPAMENTO DO JANDIR (no mapa indicado sob #1) e
ACAMPAMENTO SERRARIA (no mapa indicado sob #3) estão
contíguos às terras da fazenda, em áreas dela desmembradas. Sendo que
o ACAMPAMENTO DO JANDIR foi localizado em terras de Jandir
Viebrantz, alugado ao MST pelo diretor do movimento, SÍLVIO
LUCIANO DOS SANTOS, desde a época da primeira invasão (ano de
2004) e deste acampamento saíram os grupos precursores para as
segunda e terceira invasões, bem como inúmeras outras turbações de
posse e toda sorte de ilícitos contra os proprietários e seus empregados.
20. Os outros dois acampamentos estão à margem da BR-386
sendo que o mais próximo da Fazenda Coqueiros (no mapa indicado sob
#2) localiza-se no acostamento da rodovia (à direita, no sentido
Carazinho - Sarandi), pouco adiante do posto de pedágio. Este
acampamento fica próximo da Fazenda Coqueiros e do acampamento #1,
ao qual tem acesso através de matos existentes na propriedade de Geny
Bocorni, havendo intenso trânsito de acampados entre um e outro
acampamento, fato devidamente monitorado pela Brigada Militar e
registrado em ocorrência policial, já tendo sido efetuadas prisões por tal
ato.
21. No acampamento designado como “Acampamento do
Pedágio”, existem também acampados do MPA (Movimento dos
Pequenos Agricultores), movimento dos egressos do MST que já foram
assentados, mas continuam agindo no movimento, integrante da
internacional “Via Campesina”. Neste acampamento detectou-se indícios
de treinamentos de guerrilha rural, com instrutores de fora do estado e do
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país.
22. O outro acampamento (no mapa indicado sob #4) localiza-se,
também, às margens da BR-386, mas já no vizinho município de
SARANDI, um pouco mais afastado, mas de onde partiu o efetivo maior
para a 3ª grande invasão contra a Fazenda Coqueiros, quando uma coluna
liderada pelo Deputado Frei Sérgio Gorgen, entrou em choque com a
Brigada Militar, no início de setembro de 2004, no início da estrada que
liga Carazinho a Coqueiros.
23. Também há informações que o movimento está negociando
uma área, próxima ao município de Pontão, contígua à Fazenda
Coqueiros, para dar continuidade ao seu intento, cercando assim toda
área. Além disso, repito, a localização geográfica da Fazenda Coqueiros
– entre as BR-386, BR-285 e RS-324 – é fundamental para o movimento.
24. Verifica-se que os acampados são usados como massa de
manobra, recebendo em troca alimentação, cestas básicas, e promessa de
15 (quinze) hectares de terra por família. Alguns acampados são
foragidos da Justiça ou tem longa ficha criminal, para dar suporte as
ações delituosas; além disso, recebem treinamento de operações em
combate a Polícia com utilização de armas, em manejo de artefatos
explosivos (coquetéis molotov) e em técnicas e táticas de fortificação das
áreas invadidas, com utilização de estacas panjo e armadilhas, além de
diversas outras táticas, com ensinamento inclusive para as crianças. As
instalações que se verificam nas últimas invasões permitem bem
demonstrar o uso de algumas técnicas de guerrilha (fotografias em
anexo).
25. Ademais, em vários momentos, neste ano, em que houve
necessidade de emprego de efetivo da Brigada Militar para fazer cessar
as atividades criminosas desenvolvidas pelos acampados, houve visível
intenção destes de resistirem com uso de força, ocasião em que se
apresentavam armados de armas brancas, coquetéis molotov e armas de
fogo dissimuladas em suas vestes (mas perfeitamente perceptíveis por
homens experimentados no combate ao crime); ressalta-se que, em tais
ocasiões, muitos acampados apresentavam-se visivelmente embriagados
e proferiam ameaças de morte e provocações aos agentes da lei, não
acorrendo um conflito sangrento em razão de, ainda, não ter ocorrido
agressões físicas diretas de parte à parte, o que por certo, desencadearia o
conflito que se quer evitar.(grifei).”.
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1.8. ESTRATÉGIA DO MST. RELATÓRIO DO ESTADO MAIOR
DA BRIGADA MILITAR. AÇÕES PRATICADAS PELO MST NO RS.
Também acerca da estratégia do MST, cabe transcrever o seguinte
Relatório do Estado Maior da Brigada Militar25:
1.1 INTRODUÇÃO
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no RS realiza
mobilizações, manifestações e deslocamentos para chamar a atenções da mídia.
A partir do ano de 2003 os movimentos sociais rurais organizaram-se em torno
de um objetivo comum, qual seja: fazer que o Governo Federal e dos Estados agilizem o
processo de Reforma Agrária. Entre as ações realizadas surgiu o movimento
denominado “Abril Vermelho”, por parte dos Sem Terra e o “Maio Verde” por conta
dos Produtores Agrícolas, onde estes passaram a adotar uma postura mais ostensiva e
organizada contrária as ações até então desenvolvidas pelo MST. Desta forma, houve o
risco de um recrudescimento com possibilidade de confronto entre os dois grupos, tendo
que por diversas vezes a Brigada Militar e outros Órgãos de Segurança Pública ter que
se posicionar de forma a evitar o contato entre os manifestantes, para evitar que
houvesse grave perturbação da Ordem Pública.
Com os dados obtidos é possível alinhar uma construção histórica da situação,
que tem por diversas vezes mobilizado os órgãos de Segurança Pública e os Poderes
Constituídos do Estado.
2. DESENVOLVIMENTO
2.1 - CRONOLOGIA DOS FATOS:
RS
2.1.1 – FAZENDA GUERRA ou COQUEIROS em COQUEIROS DO SUL-
1) 02 DE ABRIL DE 2004 – Ocorre a 1ª invasão na Fazenda Coqueiros. A
propriedade é comumente conhecida por FAZENDA GUERRA ou FAZENDA
COQUEIROS e foi invadida pela primeira vez no dia 02 de abril de 2004, por
aproximadamente 600 (seiscentos) sem terra que chegaram ao local em 13 (treze)
ônibus, 07 (sete) caminhões, 15 (quinze) veículos tipo passeio e 02 (duas) motocicletas,
oriundos dos acampamentos de Julio de Castilhos e Palmeira das Missões. Durante o
deslocamento, foram abordados no Município de Sarandi, onde informaram a Polícia
Rodoviária Federal que deslocariam para colheita da maça no município de Vacaria. Em
seguida abandonaram a rodovia principal e deslocando por uma estrada de chão batido,
chegaram até as terras da fazenda onde concretizaram a invasão.
A Fazenda Guerra possui sete mil hectares e está situado no Distrito de Xadrez,
município de Coqueiro do Sul, que fica distante cerca de 15 Km da cidade de
Carazinho. A área invadida está subdividida em propriedades pertencentes aos irmãos
FÉLIX TUBINO GUERRA e VERA GUERRA e do marido desta, CARLOS
BARCELOS. Segundo dados dos meios de comunicação está dividida em 1,3 mil de
mata nativa, 2 mil em lavoura de soja e restante em lavoura de milho e criação de gado.
O advogado da família, tão logo tenha se concretizado a invasão, reuniu a
documentação necessária com vistas a entrar com o pedido de reintegração de posse.
25
Fls. 1895/1974.
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2) 15 DE ABRIL DE 2004 – Nesta data, um outro grupo de Sem Terras que
estavam em marcha pela BR-386 em direção a Carazinho, arrendaram a propriedade de
JANDIR WIEBRANS, ex-vereador de Coqueiros do Sul, propriedade esta, situada ao
lado da Fazenda Coqueiros, tendo como objetivo montar um acampamento no local,
ficando assim, próximos aos demais Sem Terra que haviam invadido a fazenda no dia
02 de abril de 2004.
3) 11 a 13 DE MAIO DE 2004 - A Brigada Militar passou a reunir efetivo e
meios necessários para realizar a desocupação na Fazenda Coqueiros, cumprindo
determinação judicial, uma vez que fora expedido Mandado de Reintegração de
posse. Entretanto, no dia 12 de maio de 2004, deputados estaduais gaúchos
simpatizantes do movimento, reuniram-se com o juiz da 1ª Vara da Comarca de
Carazinho, para pedir a prorrogação do prazo da desocupação da Fazenda Guerra. Esta
solicitação acabou motivando a realização de uma audiência pública no dia 17 de
maio de 2004, a fim de formalizar o acordo que possibilitou a saída dos invasores, sem
que houvesse a necessidade da ação policial. O governo federal propôs liberar R$ 50
milhões para assentamentos dos sem terra. Logo depois da audiência a Via
Campesina realizou ato público no centro de Carazinho afirmando que não faria
novas invasões nos próximos 30 dias, período em que parte da verba deveria ser
liberada. Os Invasores concordaram em deixar a propriedade, tendo o INCRA
indicado local para assentamento das famílias.
4) 26 DE JULHO DE 2004 – Passados aproximadamente dois meses da
primeira invasão, ocorre a 2ª invasão na Fazenda Coqueiros, onde aproximadamente
trezentos (300) manifestantes, acampados em uma área arrendada pelo MST, lindeira a
Fazenda e pertencente a JANDIR CELSO WIEBRANTZ, acabaram por invadi-la
novamente. Eles transpuseram a cerca que separa as duas propriedades, onde utilizando
três (03) tratores e três juntas de bois passaram a lavrar a terra para o plantio de milho.
Esta invasão tinha como objetivo pressionar o Governo Federal a adquirir terras
para novos assentamentos, conforme havia sido prometido em maio de 2004. A
Brigada Militar montou barreiras junto às entradas que levavam à área invadida,
evitando desta forma que novos integrantes pudessem se juntar aos primeiros,
aumentando o contingente, o que poderia ser um agravante em caso de necessidade de
ação policial para a retirada dos invasores.
No julgamento do agravo de instrumento impetrado pelo proprietário FELIX
TUBINO GUERRA e outros ao Tribunal de Justiça do Estado, foi concedida a liminar,
fixando o prazo de dez (10) dias para a desocupação da área invadida, sob pena de
reintegração compulsória.
Ao tomarem conhecimento da decisão judicial, os sem terra derrubaram a
cerca divisória entre as duas propriedades e ampliaram a ocupação da área. Os
invasores na época manifestavam a intenção de resistir, montando barricadas e
armadilhas, a exemplo do que fizeram quando da invasão anterior.
5) 04 DE AGOSTO DE 2004 - Os integrantes da Via Campesina desocuparam
a Fazenda Guerra sem necessidade de atuação da Brigada Militar.
Nas fotos a seguir, é possível perceber de que forma os invasores articulam-se de
forma a resistir a uma possível ação por parte da tropa da Brigada Militar. Salienta-se
que tais técnicas são ensinadas como táticas de guerrilha.
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Segurança do Acampamento: Estacas e cercas de bambu pontiagudas.
6) 02 DE DEZEMBRO DE 2004 - Como forma de manter constante pressão
sobre os proprietários da fazenda, os sem terras incendiaram pequenas faixas de
terra, da Fazenda Coqueiros, queimando parte da colheita.
7) 03 DE JANEIRO DE 2005 – Os Sem terra divididos em dois grupos
realizaram a colheita nas terras da Fazenda Coqueiros. Enquanto um grupo
procedia à colheita, outro montava guarda e em caso do comparecimento de
efetivo policial escondiam-se no mato próximo ao acampamento, onde estavam
concentrados cerca de 400 (quatrocentos) sem terra portando foices e facões.
8) 04 DE FEVEREIRO DE 2005 – Nesta data, por volta das 0800 horas, sob a
proteção da Brigada Militar, com um efetivo de cerca de 350 Policiais Militares
mobilizados no Comando Regional de Polícia Ostensiva do Planalto (CRPO/Planalto),
Batalhão de Operações Especiais de Santa Maria (BOE/SM) e Batalhão de Operações
Especiais de Porto Alegre (BOE/PA), 03 (três) colheitadeiras deram início a colheita da
roça de milho de 54 hectares. Os acampados observavam o fato e gritavam palavras de
ordem e comentavam que as máquinas iriam parar. Durante a colheita 02 (duas)
colheitadeiras quebraram, tendo sido encontradas no seu interior espigas de milho
recheadas com ferro, tipo o utilizado em obra da construção civil. No mesmo dia às
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1000 horas, os manifestantes entraram na roça de milho e foram até as lonas pretas que
estavam no chão e onde estava o milho debulhado e pisotearam em cima, jogaram o
milho para o alto e fizeram gestos provocando a tropa que permanecia em linha
protegendo o trabalho das colheitadeiras. No período da tarde, as colheitadeiras
começaram a trabalhar na roça, junto ao mato nativo próximo ao acampamento, tendo
sido apedrejadas. Novamente foi acionado o efetivo da Brigada e com a proteção dada,
a colheita transcorreu normalmente o resto da tarde.
09) 08 DE JANEIRO DE 2006 - O ano de 2006 iniciou com os sem terra
colocando fogo em torno das 1800 horas, na área que fica lindeira ao acampamento. O
efetivo da Brigada Militar que se encontrava na localidade de Xadrez foi acionado,
juntamente com os Bombeiros, e conseguiram apagar o fogo por volta das 2115 horas
do mesmo dia. Foram queimados aproximadamente 20 hectares de área, sendo 10
hectares cultivados com soja e outros 10 hectares com capoeira (mata rasteira).
10) 25 DE JANEIRO DE 2006 - Além das queimadas, as ações de furto de
produtos cultivados na propriedade também continuaram acontecendo, tanto que em 25
de janeiro de 2006, por volta das 1700 horas, o capataz da Fazenda Guerra,
comunicou à Guarnição da Brigada Militar em Xadrez que aproximadamente 30
(trinta) integrantes do MST, acampados em área vizinha à Fazenda, entraram àquela
propriedade e colheram parte do milho plantado, nas proximidades da cerca que
divide a área. A Guarnição da Brigada Militar de Xadrez compareceu ao local para
averiguar a denúncia, constatando a veracidade das informações, momento em que os
sem terra fugiram para o mato localizado na área arrendada pelo MST tendo sido
escutado um disparo de arma de fogo do seu interior. Neste dia o acampamento do
MST contava com aproximadamente 200 (duzentas) pessoas, tendo os demais
deslocado para reforçar uma invasão praticada por integrantes do MST na faixa de
domínio da RS 406 em Nonoai.
11) 28 DE FEVEREIRO DE 2006 - O MST, com apoio do Movimento dos
Pequenos Agricultores (MPA), invadiu pela terceira vez a Fazenda Guerra, sendo esta
uma das maiores invasões dos últimos anos, envolvendo mais de mil (1000) pessoas
de vários acampamentos do interior do Estado.
Nesta invasão houve ações taticamente organizadas, como se fosse uma
operação paramilitar. O evento criminoso ocorreu às 0500h, contando com
aproximadamente mil (1000) pessoas, integrantes do MST e do MPA oriundos dos
acampamentos montados em Sarandi, Pontão, Não-Me-Toque e Nonoai, sendo a
maior parte das pessoas do antigo acampamento de Nonoai. Os infratores não se
preocuparam com a existência de benfeitorias e com a família de um funcionário
residente no local, cuja residência foi invadida por grupo que demonstrou ter
treinamento especializado neste tipo de ação. Este grupo se apoderou de uma
espingarda calibre 12. O funcionário e seus familiares foram liberados para saírem do
local.
A ação preparada pelo MST utilizou para chegar até a Fazenda Coqueiros,
aproximadamente 60 (sessenta) ônibus, 01 (uma) carreta, 35 (trinta e cinco)
caminhões e 20 (vinte) veículos de passeio, sendo que os veículos de carga efetuaram
transporte de material de logística (barracas, colchões, caixas d’água, alimentos, etc).
Após a invasão continuaram as ações de hostilidade contra os funcionários e
policiais militares que patrulhavam nas imediações.
Depois de instalados os invasores tomaram posse das madeiras (tábuas) da
serraria existente no local, passando a utilizá-las para a construção de barracos.
Constatou-se também a chegada de grande quantidade de mantimentos, através da
carreta Volvo N10, placas IGE 9381 (Palmeira das Missões). Além disso, efetuaram
ligação clandestina de luz (gato) para utilização de energia elétrica da rede que cruza
pelo local invadido.
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As fotos a seguir ilustram a grande capacidade de logística que possui o
Movimento.
Chegada na Fazenda Guerra
Chegada na Fazenda Guerra
Barracos montados pelo MST com madeira da serraria da Fazenda Guerra
Após a invasão de 28 de Fevereiro de 2006 o MST desencadeou uma série de ações,
como se pode ver a seguir:
- UTILIZAÇÃO DE CRIANÇAS - Uma das medidas mais comuns utilizadas
pelos integrantes do MST é a colocação de crianças e mulheres como escudos
humanos à frente das manifestações. Esta atitude visa minar a ação das forças de
segurança pública que tentam fazer cumprir as ordens manifestamente legais. Fatos
anteriores já mostravam esta intenção do MST, pois no dia 11 de maio de 2004, o MST
rejeitou a notificação sobre proteção das crianças durante as ações do Movimento.
Quando acampados na Fazenda Coqueiros, negaram-se a assinar notificação do
Conselho Tutelar que recomendava que as crianças presentes na Fazenda fossem
protegidas, caso a Brigada Militar usasse a força para desocupar a área invadida. O
mandado orientava os pais a preservarem integridade física dos filhos na ação de
despejo sob pena de responsabilização criminal. Os líderes do acampamento do
MST receberam a notificação, mas não quiseram assiná-la.
- AGRESSÕES A POLICIAIS MILITARES
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No dia 28 de fevereiro de 2006, por volta das 0430 horas, pouco antes da invasão
da fazenda, a Guarnição da Viatura prefixo 3253 (do OPM de Coqueiros do Sul),
composta pelos Sgt CRUZ e Sgt FRANÇA, efetuava o policiamento ostensivo e ao
perceber a movimentação de veículos iniciou acompanhamento.
Próximo da encruzilhada que liga o Distrito de Xadrez aos Municípios de
Coqueiros do Sul e Pontão, saiu do interior de uma mata, aproximadamente 60
(sessenta) integrantes do MST e MPA, que cercaram a guarnição, e de posse de
foices cortaram os pneus, arrancaram a tampa de combustível, a antena do rádio
VHF, riscaram na lataria as letras “MST”, levaram o microfone do rádio
transceptor VHF e duas baterias de celular dos Policiais. Após arrastaram a
Viatura para uma vala, encostando-a em um barranco, onde permaneceram junto à
mesma até a passagem do comboio formado por ônibus, caminhões e veículos leves.
Em 28 de Fevereiro de 2006 houve um registro de duas ocorrências na Delegacia de
Polícia de Carazinho por parte do proprietário e três funcionários da Madeireira Cagliari
instalada dentro da Fazenda Coqueiros em Coqueiros do Sul - As ocorrências de nº 1107
(Outros crimes contra a liberdade individual) e 1108/2006 informando sobre apropriação de armas
de fogo (roubo/furto): A primeira – 01 Espingarda marca Boito, Pump, 01 cano, Cal 12, nº
E3839903; A segunda – Esp marca Boito, Cal 28, 02 canos, nº 22997, e 01 revólver marca Taurus,
Cal 38, nº 0, infratambor K830 e com referência aos danos na Vtr BM 3253 (Fiat Palio), foi
confeccionado COP nº 624649 e BA-BM nº 2937298.
As vítimas relataram que durante a madrugada foram surpreendidos por grupo de 10 (dez)
pessoas (sem terras invasores da Fazenda Coqueiros) armadas, ameaçaram e trancaram as vítimas
em uma peça da madeireira onde permaneceram até de manhã, quando saíram para registrar a
ocorrência. Os sem terras furtaram vários objetos, equipamentos agrícolas e as referidas armas
citadas acima.
12) 02 DE MARÇO DE 2006 – por volta das 1000 horas, os invasores
interromperam o fornecimento de energia elétrica da usina existente na sede da
fazenda visando prejudicar os funcionários e os policiais militares. Mas, também
houve prejuízos a aproximadamente 1.500 (mil e quinhentas) pessoas do próprio
movimento. Destas 400 (quatrocentas) eram crianças, sendo 250 (duzentas e
cinqüenta) em idade escolar e 150 (cento e cinqüenta) com menos de 6 (seis) anos de
idade.
13) 04 DE MARÇO DE 2006 – Nesta data, mais uma vez foi possível
constatar que tanto o MPA quanto o MST não têm a preocupação em cumprir as ordens
judiciais, pois acreditam na intervenção política de parlamentares solidários a seu Movimento. Isto
ficou evidente quando deixaram de cumprir a Determinação Judicial expedida pelo Dr.
ORLANDO FACCINI NETO, Juiz de Direito da Comarca de Carazinho, o qual determinou
prazo de 24 horas para a desocupação da área invadida. Ao tomarem conhecimento da ordem
judicial os representantes do MST rasgaram o documento, havendo um principio de tumulto e
revolta, o que foi logo controlado pelo efetivo Policial Militar.
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14) 06 DE MARÇO DE 2006 - Ao longo dos anos, tem-se visto que é comum
a participação de autoridades públicas junto aos movimentos sociais, inclusive se
dirigindo diretamente as áreas invadidas. Neste sentido, em 06 de março de 2006
chegou à sede da BM, na Fazenda Guerra, o Deputado Estadual FREI SÉRGIO,
acompanhado pelos Prefeitos de Pontão e de Coqueiros do Sul a fim de participar de
reunião com o Comando da Operação Policial, que já preparava algumas medidas para
o cumprimento do Mandado de Reintegração de Posse.
Ao término da reunião o Comandante da Operação informou aos presentes que
iria revistar os caminhões, ônibus e pessoas a fim de verificar se não estava saindo
material pertencente à fazenda, momento em que o FREI SÉRGIO e o Prefeito de
Coqueiros do Sul deslocaram até o interior do acampamento para dar conhecimento
das exigências às lideranças dos invasores.
15) 11 DE MARÇO DE 2006 - Os líderes do MST cientes das providências
que a Brigada Militar adotaria, orientaram os invasores a fugirem para uma
área de terra de 05 hectares localizada a poucos metros de onde estavam
acampados. Na fuga os manifestantes entraram em uma área errada, a Chácara
do Sr MOACIR CAVAL, situada também ao lado da Fazenda Guerra.
Diante disto os Sem Terra foram intimados pelo Comandante da Operação
Policial Militar para retornarem a Fazenda Guerra, a fim de serem revistados, o que
não foi acatado. Os integrantes do MST permaneceram reunidos na área da chácara,
onde haviam entrado por engano. Após os Sem Terra conseguiram deslocar para o
local certo, a área lindeira da Chácara de MOACIR CAVAL. A nova área foi
comprada previamente pelo movimento, pois sua posição estratégica era
importante, uma vez que se avizinhava a desocupação da Fazenda e eles precisariam
se manter próximos ao alvo. A compra foi realizada pelo Sr. ARNO MAIER, que a
cedeu aos manifestantes, diferentemente da arrendada do Sr. JANDIR CELSO
WIEBRANTZ, anteriormente citada.
Os invasores abandonaram na Fazenda Coqueiros vários utensílios, alguns
casebres e lonas pretas. As guarnições da Brigada Militar realizaram as vistorias no
acampamento abandonado encontrando em uma das casas antes ocupada pelos
invasores, aproximadamente mil e quinhentas (1.500) garrafas de cachaça, e
alimentos variados estocados tais como: arroz, feijão e farinha de trigo, os quais
foram apreendidos para serem entregues ao Poder Judiciário local.
Os mais de 1500 Sem Terra instalaram-se na área de 5 hectares que
receberem em situação de cedência por parte do Sr. MAIER, onde permaneceram
precariamente acampados pois não havia material suficiente para acomodarem-se,
inclusive com pouca água e a alimentação.
O filho de ARNO MAIER, VLADIMIR MAIER, 41 anos, apoiador do
movimento, estava acampado em Coqueiros do Sul, com o grupo responsável pela
invasão da Fazenda Guerra. Após a desocupação do local, ele se mudou para o sítio
comprado pelo pai.
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Segurança do Acampamento: Estacas pontiagudas feitas de madeira
- PESSOAS PRESAS
Durante a operação de desocupação da Fazenda Guerra 03 (três) pessoas,
(dois homens e uma mulher) que não conseguiram fugir do acampamento foram
presas pela Brigada Militar e conduzidas para a Delegacia de Polícia. Segundo o
Comandante da Operação os motivos das prisões se deram pela a prática do delito
de furto de objetos, danos ao patrimônio público causado pela depredação de
uma viatura e de cárcere privado de dois policiais no dia da ocupação da área,
embora a coordenadora do MST, ANA SOARES, negasse todas as acusações.
16) 14 DE MARÇO DE 2006 – Por volta das 1923h, houve o comunicado de
que uma criança, que estava no acampamento do MST havia morrido. A criança de
cinco meses morreu no Hospital de Caridade de Carazinho. A menina estava no
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acampamento do Movimento do (MST) em Coqueiros do Sul e apresentava sinais de
desidratação, diarréia e vômito.
Também foi verificado na época que outras três crianças estavam internadas com
os mesmos sintomas. O hospital encaminhou relatório ao Conselho Tutelar de
Coqueiros do Sul para que o caso fosse remetido à Justiça. As crianças
permaneceram internadas até o dia 15 de março de 2006, no Hospital de Carazinho. O
que mais preocupou as autoridades, sociedade e meios de comunicação em geral foram
às informações repassadas pela mãe da menina. Ela informou que a demora em levar
o bebê ocorreu porque os coordenadores do acampamento não autorizaram a
saída dos integrantes. Um dos médicos plantonistas do hospital disse que os
pacientes internados não corriam risco de morte.
Dia 16 de março de 2006, por volta das 1945h, houve o pronunciamento da
equipe médica do Hospital de carazinho. A médica responsável pelo atendimento,
disse que a morte de bebê poderia ter sido evitada. A certidão de óbito confirma
que a morte foi causada por insuficiência respiratória aguda. A médica ressaltou
que cuidados simples como o respeito da mãe ao período de amamentação
evitaria a morte.
- PRESENÇA DE ESTRANGEIROS NOS ACAMPAMENTO
No dia 17 de março de 2006, foi percebido que os homens responsáveis pela
segurança do MST recebiam as instruções dentro de um dos acampamentos por parte de
estrangeiros. O depoimento à Polícia Civil de um comerciante que teve contato com os
sem terras no início de março reforçou a suspeita da presença de estrangeiros no grupo
que invadiu a Fazenda Guerra. Os indícios da presença de estrangeiros junto ao MST
em Coqueiros aumentaram depois que um familiar do dono da propriedade, que fica ao
lado do acampamento, declarou que teve contato com dois homens com sotaque
estrangeiro.
Os guardas do acampamento tinham uma equipe com cerca de 30 (trinta) homens
armados com foices e facões liderados por HUGO CASTELHANO, sendo este um
dos líderes do MST no acampamento. De nacionalidade colombiana, ele seria o
encarregado das escalas nas guaritas e o mentor das estratégias de resistência do
grupo em caso de retirada compulsória pela polícia. O outro estrangeiro não foi
identificado. Também foi observado que no interior do acampamento, havia 03 (três)
mulheres com sotaque estrangeiro, e segundo comentários seriam Suecas
pertencentes a uma ONG de movimento social europeu e estariam no Estado em um
grupo de 15 (quinze) pessoas entre Suecos, Franceses e Americanos. A intenção deste
grupo seria a produção de um documentário. As demais pessoas estariam espalhadas
nos diversos acampamentos do Estado.
17) 21 DE MARÇO DE 2006 - O Delegado da Polícia Civil de Carazinho,
DANILO FLORES, anunciou que indiciaria 800 (oitocentos) integrantes do MST,
que participaram na invasão da Fazenda Guerra, em pelo menos oito delitos. Foi
instaurado Inquérito Policial para a apuração dos delitos cometidos pelos sem terra
desde o dia 28 de fevereiro, quando a área sofreu a terceira invasão. Para a Polícia
Civil, os sem serra foram responsáveis por furtos, roubos, esbulho possessório,
cárcere privado, formação de quadrilha, danos contra o patrimônio privado e
crimes ambientais. Na investigação consta os fatos envolvendo a Fazenda e os estragos
feitos em um sítio ao lado da área onde acampara o MST.
Alguns dos delitos praticados pelos integrantes do MST e MPA ocorreram
enquanto estavam acampados em área cedida e lindeira a Fazenda Guerra. Armados
com foices e facões, com o corpo pintado e alguns usando toucas ninjas, cortaram
aproximadamente 140 (cento e quarenta) árvores da Fazenda e bloquearam a
estrada vicinal que liga o município de Coqueiros do Sul ao de Carazinho, próximo
a Base da Brigada Militar do Distrito de Xadrez.
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Simultaneamente um grupo do MST tentou junto à sede da Fazenda, derrubar
uma torre de madeira construída por eles mesmos durante a invasão do local, e era
utilizada como ponto de observação pela Brigada Militar. O efetivo policial do local
apoiado pelo BOE/PF controlou a situação e os manifestantes retornaram para o
acampamento na área cedida.
18) 02 DE ABRIL DE 2006 - Às 1430h na lavoura de plantação de soja
pronta para a colheita da Fazenda Guerra, localizada atrás do acampamento do MST,
ocorreram vários focos de incêndio que atingiram de 130 a 150 hectares,
aproximadamente. Foram acionados os Bombeiros de Carazinho que controlaram e
apagaram o fogo.
19) 17 DE ABRIL DE 2006 – Integrantes do movimento entraram na serraria
da Fazenda Coqueiros, onde se apossaram de madeiras lá existentes e construíram
dezenove barracos ornamentados com cruzes, próximo a cerca que faz divisa com a
área do acampamento. Para a realização deste ato, os acampados derrubaram a cerca
de arame que havia sido colocada após a sua retirada pela BM quando da última
invasão (11 de Março de 2006), bem como, derrubaram uma araucária.
20) 18 DE ABRIL DE 2006 - Os Sem terras haviam construíram 19 barracos
dentro das terras da Fazenda, para lembrar o massacre em Eldorado dos Carajás no Pará.
Durante à tarde os sem terras pegaram madeiras da serraria que fica dentro da
Fazenda e fizeram fogueiras. Um veículo Kombi com compras foi revistado pela BM,
que encontro além de alimentos e pregos, 180 garrafas de cachaça, como foi
apresentada nota fiscal das mercadorias os produtos foram liberados pelos PM.
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Veículo transportando bebida alcoólica
21) 19 DE ABRIL DE 2006 pela parte da tarde, uma Tropa do BOE de Passo
Fundo, deslocou até a Fazenda Coqueiros, no Município de Coqueiros do Sul a fim de
dar condições de segurança para que os funcionários da Fazenda pudessem desmanchar
os dezenove barracos.
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Com a chegada do efetivo no local, houve resistência, sendo necessário a
tropa posicionar-se em linha e avançar em direção aos manifestantes com o
objetivo de forçá-los a sair da fazenda em direção a área de onde estão acampados,
momento em que os integrantes do MST reagiram arremessando pedaços de
madeira contra a tropa e “Coquetel Molotov”, gerando vários focos de incêndio
nas madeiras e casas que serviam de depósito da serraria.
22) 14 DE JULHO DE 2006 – durante a madrugada, integrantes do MST, do
Acampamento JANDIR, ao lado da Fazenda Guerra, cortaram aproximadamente 6
Km de cerca e às 1000h, cerca de 100 (cem) pessoas invadiram a lavoura da
fazenda, montaram 02 (duas) barracas de lona preta, com o propósito de plantarem
30 (trinta) hectares de milho. A divulgação para a imprensa da ação nas terras da
Fazenda Guerra por parte de integrantes do MST, foi feita por VANDERLAN
FAGUNDES, um dos líderes regionais do Movimento dos Sem Terra.
23) 18 DE JULHO DE 2006 – aproximadamente 50 (cinqüenta) integrantes
do MST, por volta de 0730h, entre homens e mulheres, oriundos do acampamento
Jandir, cortaram a cerca lindeira ao arrendamento e entraram na lavoura da Fazenda,
onde iniciaram plantação de milho com o uso de máquinas manuais. Também, no
local iniciaram a construção de barracos.
Durante o dia utilizaram a estratégia de passar para as terras da Fazenda,
sempre que o policiamento se afastava, de onde saíam quando o policiamento se
aproximava. Às 1730h, os invasores da lavoura deixaram o local sem a necessidade de
intervenção de Força Policial. Retornaram para o local onde mantém um
acampamento por mais de três anos.
24) 20 DE JULHO DE 2006 - por volta das 0630h, um efetivo de cerca de 80
policiais militares integrantes do BOE, POE e OPM de Passo Fundo, chegaram na
Fazenda Coqueiros, para apoiar a retirada de barracas montadas na lavoura, em
razão de interdito proibitório concedido quando da invasão propriedade.
Quando da chegada do efetivo, foi constatada a presença de dois integrantes
do MST vigiando o local de cima da torre de madeira, MIGUEL RODRIGUES
(25/09/1967) e NADIR PINTO DA SILVA (26/03/1957), que estavam armados de
foice e facão. Foram desarmados, presos e posteriormente conduzidos até a
Delegacia de Polícia de Carazinho.
Ao iniciar a operação, foram arremessadas pedras e bolinhas de gude do
acampamento, sendo necessário o uso de bombas de gás por parte da tropa. Os objetos
lançados pelos integrantes do MST atingiram viaturas e até o equipamento de filmagem
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de um repórter que estava no local. Uma bola de gude arremessada por estilingue
atingiu o Cap Martinelli, provocando lesões leves.
No local de interdito proibitório, funcionários da Fazenda Guerra, utilizando uma
máquina retroescavadeira desmontaram 10 (dez) barracas desabitadas e uma torre de
madeira.
Após a conclusão da Operação, por volta das 1000h, o efetivo que deixava o
local foi alvo de pedras arremessadas por integrantes do MST. A Vtr 136 foi
atingida por uma pedra quebrando um dos vidros. Estiveram presentes durante a
operação, repórteres da RBS, Correio do Povo e Rede Pampa. Foi também
realizado levantamento de degradação ambiental pelo efetivo do 3º BABM.
Retirada das barracas na área de interdito proibitório
25) 25 DE JULHO DE 2006 - aproximadamente às 0500h da manhã,
integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), acampados no
acampamento JANDIR, cortaram aproximadamente 5 Km de cerca. A cerca está
localizada junto à estrada de acesso ao município de Coqueiros do Sul.
O Proprietário da Fazenda, Feliz Tubino Guerra, registrou o fato na
Delegacia de Policia.
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Acampamento JANDIR junto a Fazenda Guerra
26) 14 DE AGOSTO DE 2006 - Por volta das 1530h, quando em patrulhamento
pela estrada principal de acesso a Coqueiros do Sul, próximo ao acampamento do
JANDIR, uma patrulha da Brigada Militar formada Por 10 Policiais Militares em 03
viaturas, comandados pelo 1º Ten QTPM DAVID GOTS DA ROCHA, foram cercados
por aproximadamente 60 (sessenta) integrantes do MST, as quais jogaram pedras na
guarnição. A fim de controlar a situação e salvaguardar a integridade física dos Policiais
Militares, bem como, proteger o patrimônio do Estado (viaturas), foi necessária a
utilização de munição antimotim.
Ao comandar manobras evasivas a fim de garantir o retorno das viaturas a Base
da Brigada Militar no distrito de Xadrez, o Oficial PM foi atingido com uma pedrada
no rosto causando-lhe lesão superficial e a viatura Prefixo 1123 teve seu pára-brisa
traseiro quebrado por uma pedra.
Após estes fatos a Guarnição retornou a localidade de Xadrez, não sendo
possível identificar quem atingiu o Tenente e a viatura. Ninguém foi preso. O oficial
ferido foi submetido a exame médico e liberado. Foi efetuado registro da ocorrência
na Polícia Civil de Carazinho sob nº 4740/06 e BA 095602.
27) 22 DE AGOSTO DE 2006 - por volta das 0930h, aproximadamente 200
(duzentos) integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST),
acampados no Jandir, ultrapassaram a divisa da Fazenda, ocupando aproximadamente
02 hectares da referida propriedade.
Os sem terras estavam divididos em três grupos dentro da área, bem
como, dispunham de material de uso pessoal, (mochilas, colchões e cobertores),
porém não apresentavam disponibilidade de logística para maiores construções
(barracas).
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Os invasores iniciaram a construção de uma torre de observação na
parte mais alta da área ocupada.
Na mesma data, aproximadamente às 1510h, os integrantes do MST
entraram a área da serraria da fazenda e atearam fogo em 01 (uma) casa e nos
escombros de outras três abandonadas no local, queimadas anteriormente pelo
mesmo movimento, sendo 01 (uma) grande e 03 (três) pequenas. O fogo
espalhou-se também pelas matas vizinhas. Foram acionados os bombeiros da
cidade de Carazinho, que ao chegaram no local nada puderam fazer, haja vista
que as chamas já tinham consumido totalmente as residências.
Caminhão dos Bombeiros da
cidade de Carazinho
Área da serraria da Fazenda Guerra onde foi
queimada 01 (uma) casa e 03 (três) escombros,
sendo 01 (uma) grande e 03 (três) pequenas.
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Doze barracas montadas pelos integrantes do MST na lavoura da Fazenda Guerra
Após o incêndio, aproximadamente 180 (cento e oitenta) pessoas
montaram cerca de 12 (doze) barracas, a 500 metros dentro da fazenda na
lavoura da Fazenda Coqueiros. Outras 50 (cinqüenta) pessoas ficaram
acampadas na área da serraria da fazenda.
28) 23 DE AGOSTO DE 2006 - a Brigada Militar mobilizou
aproximadamente 160 (cento e sessenta) Policiais Militares da região de
Passo Fundo e Santa Maria, a fim de ser realizado ação de Reintegração de
Posse, face Interdito Proibitório para o local invadido.
Ao chegarem no local foi constatado que a maioria dos invasores
havia deixado o local na noite do dia 22 para 23 de agosto de 2006, restando
apenas 100 (cem) pessoas dentro da lavoura e 04 (quatro) pessoas na torre de
observação construída pelos mesmos durante a invasão do dia 22 de agosto de
2006.
No meio do dia os sem terra que estavam na lavoura, atearam fogo em
algumas barracas construídas pelos mesmos e após deslocaram até o
acampamento do movimento.
O fogo ateado pelos integrantes do MST nas barracas, espalhou-se
pela palha de milho seca atingindo aproximadamente 5 hectares. Não foi
necessária a presença dos bombeiros, pois o fogo extinguiu-se naturalmente.
Aproximadamente às 1835h, o Comando deu por término a Operação
na Fazenda Coqueiros, sendo dispensados os efetivos que deslocaram em apoio
ao CRPO/Planalto. Ficaram no local apenas o efetivo orgânico de Xadrez, 17
Policiais Militares.
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29) 20 DE OUTUBRO DE 2006 - aproximadamente às 1530h, integrantes do
MST acampados próximo ao córrego do cabrito, “antiga serraria da Fazenda Guerra”,
entraram em área da Fazenda Coqueiros com uma junta de bois e araram
aproximadamente 1.000 (mil) metros de terra, também construíram no local 02
(duas) barracas.
O proprietário da fazenda registrou o fato na Delegacia de Polícia de
Carazinho, sendo confeccionado BA Nº 3818489.
Dois dias após, em 22 de outubro de 2006, aproximadamente às 1930h, o
capataz da Fazenda Coqueiros, DÁRIO CAGLIARI, comunicou a integrantes da
Brigada Militar de Xadrez, que havia vários focos de incêndio em uma plantação
de milho com cobertura de aveia, próximo ao acampamento do MST
(acampamento JANDIR). Foi deslocada para o local uma guarnição da Brigada
Militar, a qual tentou controlar os focos de incêndio, mas em virtude do fogo ter se
alastrado por uma grande área, foi solicitado apoio do Corpo de Bombeiros de
Carazinho, os quais extinguiram por completo o incêndio. Os bombeiros estimaram
em aproximadamente 25 hectares o total de área queimada.
Esteve no local o capataz da Fazenda Coqueiros, o qual não soube precisar a
extensão dos danos causado na lavoura de milho, optando por efetuar o registro na
DP de Carazinho na manhã de 23 de outubro.
A lavoura destruída pelo incêndio está localizada aproximadamente 1.000 (mil),
metros do acampamento do MST.
FOTOS DA QUEIMADA NA LAVOURA DE MILHO
Área queimada na plantação de milho.
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Área queimada na plantação de milho.
30) 27 DE OUTUBRO DE 2006 - foi reiniciado o plantio, e aproximadamente
às 0930h, cerca de 100 integrantes do MST, saíram do acampamento JANDIR,
armados com foices, facões e porretes, investiram contra os funcionários da
Fazenda, os quais estavam iniciando o plantio a cerca de 300 metros do acampamento.
Em conseqüência da eminente agressão, fugiram do local abandonando os caminhões
carregados de sementes de soja e insumos.
Em ato continuo os integrantes do MST atearam fogo nos caminhões, sendo
que um deles foi totalmente queimado incidindo em perda total do veículo e da
carga, o montante de 3.200 Kg de semente de soja. No outro veículo a carga não foi
danificada, todavia o caminhão foi totalmente incendiado acarretando a perda total do
mesmo.
O Comando do CRPO/PLANALTO determinou o deslocamento para a Base
de Xadrez, de um efetivo composto por 10 (dez) integrantes do BOE-PF, 07 (Sete),
integrantes do 13º BPM e 10 (Dez), integrantes 3º RPMon, em apoio ao efetivo de 11
(onze), na Base de Xadrez.
Por volta de 1400h, a Polícia Civil de Carazinho, com o apoio da Brigada
Militar, compareceu no local do crime. A perícia foi solicitada ao Instituto Geral
de Perícias (IGP).
Caminhões queimados durante ataque do MST–28 de outubro de 2006
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31) 15 DE NOVEMBRO DE 2006 – A Brigada Militar, de Xadrez, tomou
conhecimento que uma lavoura da Fazenda Guerra localizada próximo ao acampamento
JANDIR, havia sido queimada, totalizando uma área de aproximadamente 01
hectare. O local da queimada é próximo de onde integrantes do MST haviam
queimado dois caminhões de propriedade da Fazenda Guerra. Quando Policiais
Militares chegaram ao local do incêndio foram avistados entre 50 (cinqüenta) a 60
(sessenta) pessoas, as quais observavam as chamas do interior do acampamento
JANDIR. Com a chegada da Brigada Militar foram ouvidos alguns silvos de
apitos, em tese, de algum coordenador do acampamento, o que fez com que os
acampados se recolhessem aos barracos, não sendo mais vistos.
O Corpo de Bombeiros do Distrito de Xadrez foi acionado, compareceu no
local e apagou o incêndio, evitando que as chamas se espalhassem por outras áreas da
lavoura.
Queima da Lavoura da Fazenda Guerra
Queima da Lavoura da Fazenda Guerra
32) 29 DE NOVEMBRODE 2006 - por volta das 0800h, aproximadamente
100 (cem) integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) do
Acampamento do JANDIR, entraram na fazenda e capinaram uma lavoura plantada com
soja. Às 0930h, construíram no local 03 barracas de lona preta, mas não chegaram a
utiliza-las. Às 1200h os invasores abandonaram a lavoura e deslocaram para o
acampamento JANDIR.
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Barracas montadas em 29 de novembro de 2006, pelos colonos acampados no Acampamento
JANDIR do MST, limítrofe a Fazenda Guerra em Coqueiros do Sul.
33) 30 DE NOVEMBRO DE 2006 - às 1400h, comandados pelo Comandante
do CRPO/PLANALTO, cerca de 70 Policiais Militares do BOE/PF, cercaram a área
onde se encontravam apenas barracas montadas pelos sem terras. Uma retroescavadeira
e um trator removeram as barracas deixadas pelos integrantes do MST junto à serraria e
a lavoura dentro da propriedade pertencente à Fazenda Coqueiros. Os funcionários da
Fazenda refizeram a cerca que divide o acampamento das terras da Fazenda
Coqueiros, pois havia sido derrubada pelos sem terras.
34) 12 DE FEVEREIRO DE 2007 - O proprietário da FAZENDA
COQUEIROS em Coqueiros do Sul, Sr FÉLIX GUERRA, solicitou apoio à Brigada
Militar, para realizar a pulverização com defensivos agrícola na lavoura localizada
próxima ao acampamento JANDIR.
As 0800h, um efetivo PM de 51 homens, devidamente comandados
inicialmente pelo Comandante do 38º Batalhão de Polícia Militar, iniciaram o
isolamento da área não tendo êxito, devido a reação dos acampados os quais
encontravam-se em torno de 90 pessoas entre homens, mulheres e crianças e
faziam o uso de estilingues para o arremesso de pedras contra a guarnição e
funcionários da fazenda obrigando-os a recuar. Por volta de 1030h chegou no
local o Cmt BOE-PF o qual passou a comandar a operação, inicialmente tentando
dialogar com os acampados para o cumprimento da missão sem que fosse preciso
recorrer ao uso da força, porém não foi obtido êxito na negociação, tendo os
acampados do interior de um mato existente nas proximidades, onde seria
passado o veneno, usando estilingues, jogando pedras contra os tratores,
funcionários da Fazenda e a tropa BM, tendo um dos PM do Pelotão Hipo, sido
atingido por uma pedra. Para contê-los foi usado meios não letais (75 disparos
cal.12 munição anti-motim, lançamento de 12 granadas de efeito moral e gás
lacrimogêneo) no intuito de dispersar os agressores. Com a ação da BM, os sem terras
permaneceram no acampamento, tendo desta forma sido realizada a operação com 04
(quatro) tratores para aplicação de defensivos agrícolas na lavoura, a qual foi
encerrada por volta de 1400h.
35) 16 DE FEVEREIRO DE 2007 –
Nesta data, por volta de 1600h, no
acampamento do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), na BR 386, KM
162 (Próximo ao Pedágio da COVIPLAN em Almirante Tamandaré do Sul), foi
queimado pelos acampados, o que restou das barracas e lonas, sendo que no local
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estavam no máximo 10 pessoas.
MPA - Atearam fogo no que restou das barracas
Barraca sendo desmontada (acampamento MPA BR 386 km 162)
Os acampamentos de Almirante Tamandaré do Sul e Sarandi migraram
para os Acampamentos em Coqueiros do Sul, junto à área de 08 ha arrendadas de
JANDIR e o acampamento de Sepé Tiarajú, próximo a Serraria da Fazenda
Guerra, e iniciaram a montagem de barracas nas áreas arrendadas, sendo que na
área do JANDIR estavam presentes em torno de 400 pessoas e no Sepé Tiarajú,
aproximadamente 100 pessoas. Os líderes do movimento continuaram a
arregimentar pessoas para engrossar o número de manifestantes. Instalaram duas
barreiras na área onde os fatos se deram, próximas a base da BM nos acessos á fazenda.
36) 04 DE ABRIL DE 2007 – 40 (quarenta) integrantes do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), do Acampamento JANDIR, entraram na
plantação de soja da Fazenda Guerra, lindeira ao acampamento (foto abaixo) e com
foices cortaram em torno de 02 hectares de soja, não sendo possível precisar a
quantidade de soja colhida.
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Divisa da Fazenda
Guerra
Estrada Ramanho
Antonio Piva
A ação dos sem-terras perdurou por aproximadamente 40 minutos, não havendo
confronto com os Policiais Militares.
37) 07 DE ABRIL DE 2007 – pela segunda vez na semana, aproximadamente
40 (quarenta) integrantes do MST do Acampamento do JANDIR, entraram na plantação
de soja da Fazenda Coqueiros, lindeira ao acampamento e colheram certa quantidade de
soja, não sendo possível precisar a área que foi cortada. Por volta das 1200h, houve
pausa para o almoço e às 1500h reiniciaram a colheita, com o aumento de integrantes,
sendo entre homens e mulheres em torno de 100 (cem) pessoas. A soja cortada foi
deixada sob o solo. Às 1630h, os sem terras retornaram para o acampamento JANDIR.
MST colhendo na Lavoura de soja – Fazenda Coqueiros
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
38) 11 DE ABRIL DE 2007 – 150 sem terras em três caminhões, invadiram
pela 4ª vez a sede da Fazenda Guerra. Divididos em três grupamentos invadiram
simultaneamente a residência onde se encontrava instalado o efetivo da Brigada
Militar, o galpão utilizado para deposito de sementes, oficina e estacionamento do
maquinário agrícola, e o terceiro grupamento invadiu a residência de um
empregado da fazenda. A ação foi dotada de uso de força, sendo arrombadas portas
e janelas, e utilizados artefatos explosivos de fabricação caseira. Instantes após a
invasão da propriedade, um comboio formado por seis ônibus vindos de Coqueiros
do Sul e Carazinho, deixaram no local em torno de 300 (trezentas) sem-terras
(homens mulheres e crianças). Um grupo composto por 150 (cento e cinqüenta)
sem-terras (homens, mulheres e crianças), que estavam instalados no
acampamento Sepé Tiarajú localizado próximo da antiga serraria deslocaram a
pé, se juntando aos demais. Os sem-terras eram oriundos dos Acampamentos
JANDIR, SEPÉ TIARAJÚ, BEIRA CAMPO (BR 386), apoiados por assentados da área
9 da FAZENDA ANONNI. Durante a invasão os sem terras apossaram-se dos
materiais da fazenda deixados pelos Policiais Militares que estavam no local. 400
Policiais foram mobilizados para o local para realizar a reintegração de posse, o
que motivou os invasores a deixarem o local no mesmo dia da invasão.
39) 12 DE ABRIL DE 2007 – Em 12 de abril de 2007, houve confronto entre
sem terras e um efetivo da BM, 04 (quatro) Policiais Militares que permaneceram no
distrito de Xadrez.
Atendendo solicitação de FELIX TUBINO GUERRA, o efetivo da BM
acompanhou funcionários da Fazenda Coqueiros, até a lavoura próxima do
Acampamento Osiel Alves (JANDIR), onde iriam retirar um caminhão da
propriedade que fora queimado durante uma das investidas já mencionadas
anteriormente. Ao chegarem no local, foram cercados por cerca de 300 (trezentos)
acampados que se postaram em linha de frente para os Policiais Militares a uma
distancia de aproximadamente trezentos metros, momento que foram efetuados
disparos de arma de fogo do interior do mato em direção a guarnição, que
revidaram com 06 (seis) disparos de espingarda calibre 12. Logo após saiu do
acampamento o veiculo VW gol de cor vermelha placas IGH 4020, em alta velocidade.
O veiculo foi acompanhado e abordado próximo a Base da BM no distrito de
Xadrez, onde foram identificados: IVAN EDENILTON MARROZO DE
OLIVEIRA, RG 6028661608, EVANDRO PACHECO, DANIEL SIDINEI
MAFALDA, RG 1051396057, este com um ferimento proveniente de arma de fogo
na nádega, a principio sem gravidade tendo sido conduzido ao Hospital de
Carazinho. Os ocupantes do veiculo eram oriundos do município de São Jose das
Missões. Foram conduzidos a DP de Carazinho. Daniel Mafalda alegou que estava com
problemas para caminhar, foi trazido para o Hospital Cristo Redentor em POA, onde
ficou internado, sendo liberado mais tarde e retornado para Coqueiros do Sul. O referido
simulava problema para caminhar para culpar a BM no incidente por ocasião do
confronto em Coqueiros do Sul.
40) 1º DE MAIO DE 2007 – Em 01 e 03 de Maio de 2007, foi constatado
abigeato nas terras da Fazenda Guerra, onde foi localizado pelo administrador da
Fazenda, no município de Coqueiros do Sul, nas proximidades do Acampamento
OSIEL ALVES (JANDIR), 03 (três) cabeças de gado abatidas (carcaças) e 02 (dois)
animais feridos por arma branca. Na mesma data, pela parte da manhã, o Administrador
encontrou mais 02 (duas) reses abatidas com duas perfurações similares a arma de fogo
na região da cabeça. Foi confeccionado registro na DP de Carazinho. Não foram
identificados os autores do fato.
41) 11 DE MAIO DE 2007 –
foram constatadas novas ocorrências de
abigeato na Fazenda Guerra onde a Brigada Militar tomou conhecimento que foi
localizado pelo administrador da Fazenda Guerra, (03) três cabeças de gado feridas
por arma branca e com perfurações similares a arma de fogo, sendo que uma delas
estava morta e outra foi sacrificada devido aos ferimentos, sendo que mais tarde,
51
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
funcionários da Fazenda Guerra localizaram outras 03 (três) reses feridas por arma
de fogo e da mesma forma que as encontradas anteriormente. Enquanto os
funcionários faziam esta conferência, foram realizados contra eles
aproximadamente 10 (dez) disparos de arma de fogo, não tendo sido atingido
nenhuma pessoa. Não foi possível visualizar os autores dos disparos. O fato foi
registrado na DP de Carazinho.
42) 16 DE SETEMBRO DE 2007 –
Em 16 de setembro de 2007, por
volta das 0030h, o Srº Wagner e Ari funcionários que residem na sede da Fazenda
Coqueiros, notaram que os cachorros estavam inquietos. Entraram em contato com o
efetivo da Brigada em Xadrez, que compareceram ao local efetuando, mas nada de
anormal foi constatado.
Por volta das 0300h, houve duas explosões, onde dois tratores que estavam
estacionados atrás do galpão principal, tiveram danos provocados por explosivos.
A Brigada Militar isolou o local, e permaneceu aguardando a chegada da perícia
para o levantamento.
A sede fica localizada a 300 metros do Acampamento Sepé Tiaraju (lado da
antiga Serralharia da Fazenda Coqueiros).
No pátio onde ocorreu o fato, havia 07 tratores, duas plantadeiras e 01
colheitadeira.
O Advogado do Srº Felix Tubino Guerra, deslocou a Delegacia de
Policia da Cidade de Carazinho, onde confeccionou o registro de Nº 6897/2007, a
Brigada Militar confeccionou BA BM nº 2567964.
52
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Tratores danificados na Faz. Coqueiros
43) 19 DE SETEMBRO DE 2007 –
Atualmente na região do Planalto existem 03 (três) acampamentos do MST:
No município de Sarandi: ACAMPAMENTO BR-386 KM-139 (BEIRA
CAMPO)
a. Número de barracas: 40
b. Número de homens: 35
c. Número de mulheres: 25
d. Número de crianças: 20
Total = 70 adultos
53
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No município de Coqueiros do Sul: ACAMPAMENTO OZIEL ALVES:
área pertencente a JANDIR, arrendada pelo MST.
a. Número de barracas: 180
b. Número de homens: 190
130
c. Número de mulheres:
d. Número de crianças: 100
Total = 320 Adultos
No município de Coqueiros do Sul: ACAMPAMENTO SEPÉ TIARAJU:
(também conhecido como acampamento da “serraria” ou “Passo Cabrito”); área
arrendada pelo MST, junto a Fazenda Coqueiros, município de Coqueiros do Sul:
a. Número de barracas: 50
b. Número de homens: 80
60
c. Número de mulheres:
d. Número de crianças: 35
Total = 140 adultos
1.9. ESTRATÉGIA E TÁTICAS DE ATUAÇÃO DO MST.
ORGANIZAÇÃO. DOUTRINA E PENSAMENTO. ANÁLISE DE FONTES
PRIMÁRIAS E SECUNDÁRIAS.
A estratégia “confrontacional” adotada pelo MST reflete-se em seu
modelo de organização e em sua estratégia prática de atuação. O movimento estruturase como um verdadeiro Estado paralelo, contando com “instituições internas” que
regem todos os aspectos das vidas dos militantes que residem nos acampamentos. Para
a elucidação do tema, é de suma valia o material apreendido pela Brigada Militar de
Carazinho e que consta nas fls. 1167/1419 destes autos. Não se trata de estudo
acadêmico ou de interpretações realizadas por terceiros acerca do assunto, o que
constituiria fontes secundárias, mas de material que circula entre os acampados,
54
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
verdadeira fonte primária.
Alguns trechos do material merecem destaque:
- Nas fls. 1174/1179 encontra-se o regimento interno do acampamento,
estabelecendo as quatro instâncias decisórias internas: coordenação,
núcleos, direção e assembléia geral.
- No capítulo II do regimento encontra-se o dever de todo acampado
participar de todas as ações do acampamento.
- A partir da fl. 1192 está juntada cópia de agenda com anotações de
lavra dos próprios sem-terra, documento único pela possibilidade que
enseja de compreender a estratégia do movimento a partir da visão dos
protagonistas, militantes do MST.
- Na fl. 1232, encontra-se uma avaliação de tópicos positivos e negativos
na atuação do movimento. Entre os comportamentos avaliados
positivamente, encontram-se itens como “as crianças resistiram” e “DH
[sic] atirou bem”. Entre os itens tidos como negativos, aponta-se a
“Brigada passando por dentro do ocupado nosso [sic]” e “pessoas com
foices juntas nas horas das imagens”.
- Na fl. 1262 há anotações explícitas sobre estratégia. Os apontamentos
relacionam
Judiciário,
latifúndio,
Brigada
Militar
e
meios
de
comunicação social. Fala-se em “luta massiva e prolongada”, “matando
eles no cansaço”.
- Na fl. 1273 há uma apresentação do que é o MST, definido como um
grupo que tem por objetivo “a construção de uma nova sociedade”. Na
mesma página há a divisão de tarefas por setores: saúde, infra [sic], DH
55
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
[sic], educação, secretaria, produção e finanças.
- Na fl. 1274 há uma lista de nomes, presumivelmente de figuras
históricas importantes para o movimento. Na lista constam, entre outros,
os seguintes nomes: Che Guevara, Paulo Freire, Rosa Luxemburgo, Sepé
Tiarajú, José Martí, Chico Mendes, Olga Benario, Florestan Fernandes
e Zumbi dos Palmares.
- Nas fls. 1287/1288 existem letras de canções do movimento, com
fraseologia de cunho revolucionário (“poder popular”, “sufocando com
força nossos opressores”, “pátria livre, operária, camponesa”).
- Nas fls. 1320/1321 encontra-se referência a uma obra de Anton
Makarenko, pedagogo soviético, sendo que o exemplar pertence ao
ITERRA.
- Para sair do acampamento é necessária uma liberação. Na fl. 1389 é
narrado o caso de um acampado que falsificou essa liberação.
- Na fl. 1391 fica definido que o acampado que desistir de pertencer ao
acampamento não mais poderá a ele retornar, e que só poderá ingressar
em outros acampamentos no prazo de seis meses.
- Na fl. 1395, novamente em tópico sobre estratégia, as ações do MST
em relação à Fazenda Coqueiros (chamada no texto de Guerra) são
definidas como ações sobre uma área símbolo. A expressão reaparece na
fl. 1410.
O material demonstra o caráter paramilitar do movimento, que dispõe:
(1) de uma organização interna hierarquizada, que emula em alguns
56
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
pontos a estrutura estatal;
(2) de uma pauta de ações que privilegia o combate e a criação de
espaços territoriais onde a força pública não possa ingressar;
(3) de uma estratégia de atrito prolongado contra o Estado e os
empreendedores privados (“matando eles no cansaço”);
(4) de uma percepção de que as instituições públicas (Poder Judiciário,
Brigada Militar) e os empreendedores privados (produtores rurais, meios
de comunicação) são oponentes do movimento;
(5) de um “panteão” de ícones inspiradores do movimento, a maior parte
ligada a movimentos revolucionários ou de contestação aberta à ordem
vigente;
(6) de uma fraseologia agressiva, abertamente inspirada nos slogans dos
países do antigo bloco soviético (“pátria livre, operária, camponesa”);
(7) de um controle rígido sobre os acampados, não só na obrigatoriedade
de tomar parte nas ações de confronto, como inclusive na liberdade de ir
e vir.
A lista de características acima deduzida apenas vem certificar a
assertiva de ZANDER NAVARRO, no sentido de que a direção nacional do MST
aderiu a um “ideário leninista, ainda que simplificado”26. A concepção de partido
exposta por Lênin no “Que Fazer?” propõe um modelo de organização formado por
revolucionários profissionais, atuando simultaneamente na legalidade e na ilegalidade27
26
NAVARRO, Zander. “Mobilização sem emancipação” — as lutas sociais dos sem-terra no Brasil.
Publicado em SANTOS, Boaventura de Sousa (org). Produzir para viver. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2002, p. 189-232, grifou-se.
27
Segundo Florestan Fernandes (que viria a emprestar seu nome para Escola Nacional do MST, ainda em
fase de implementação), Lênin “propõe nada mais nada menos que a alternativa do anti-Estado, a
57
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
– exatamente como faz o MST. É nesse espírito leninista que deve ser compreendida a
opção do MST pela extralegalidade, recusando inclusive a personalização jurídica,
enquanto que, ao mesmo tempo, utiliza-se dos instrumentos legais para, e.g., promover
o assentamento de seus militantes em áreas desapropriadas.
Acerca dos objetivos do MST, vale transcrever o seguinte excerto da
obra do professor e filósofo Denis Lerrer Rosenfield28:
Segundo uma declaração do MST, de 1995, em Brasília, o MST proclama
como seus objetivos: a) ‘Construir uma sociedade sem exploradores e onde o trabalho
tem supremacia sobre o capital’, ou seja, estamos diante da retórica marxista,
apresentada como uma forma aparentemente humanista, palatável, portanto, para a
opinião pública, tendo, na verdade, como meta a instauração de uma sociedade
socialista no molde daquelas que permearam o século XX em suas vertentes totalitárias.
Trata-se do velho truque de apresentar o socialismo como uma idéia moral para
contrapô-lo a uma realidade imperfeita, no caso o capitalismo, com o benefício
adicional de que uma idéia desse tipo seria imaculada, jamais podendo ser suja por
nenhuma realidade; b) ‘A terra é um bem de todos’, isto é, de novo conta a idéia de que
a terra é um bem coletivo, sendo a propriedade privada uma perversão. Estamos diante
da idéia religiosa do ‘comunismo primitivo’; c) ‘Difundir os valores humanistas e
socialistas nas relações sociais’, ou seja, de novo conta o truque de identificar
humanismo com socialismo, como se ser contra o socialismo significasse ser contra o
humanismo. A armadilha está montada: os críticos do socialismo seriam os críticos da
verdadeira humanidade, uma espécie de bárbaros!
As decisões do 4º Congresso Nacional, realizado em 2000, em Brasília,
afirmam os pontos, propriamente, políticos de um ‘projeto popular’: a) ‘Preparar
militantes e constituir brigadas para fazer ocupações massivas permanentemente’. Isto é,
estamos em presença de um tipo de organização política que se dá todos os meios
logísticos e de preparação de militantes para ‘ocupações massivas’ permanentes, o que
implica uma estrutura de tipo paramilitar que age à margem da lei, precipitando
conflitos agrários que sirvam para preparar uma forma de instabilidade institucional; b)
‘Combater o modelo das elites, que representa os produtos transgênicos’, caso em que
eles agem para inviabilizar tanto a pesquisa quanto uma empresa estrangeira,
normalmente a Monsanto. Os seus objetivos ditos anti-imperialistas seriam assim
alcançados, ao mesmo tempo em que investiriam contra a capacitação científicotecnológica das universidades brasileiras, confinando-as ao atraso. Ressalte-se, ainda, o
pouco caso do MST com questões ecológicas em suas invasões, assentamentos e
acampamentos, enquanto, ideologicamente, é alardeado o seu compromisso com uma
natureza preservada. Destroem reservas e alardeiam defendê-las!; c) ‘Articular-se com
os trabalhadores e setores sociais da cidade para fortalecer a aliança entre o campo e a
cidade, priorizando as categorias interessadas na construção de um projeto político
popular’, ou seja, leia-se por projeto político popular o projeto de implantação do
socialismo no Brasil, com a abolição da propriedade privada e da democracia, que se
viabilizaria por intermédio de uma aliança operário-camponesa, seguindo a trajetória
dos partidos comunistas do século XX; d) ‘Desenvolver ações contra o imperialismo,
combatendo a política dos organismos internacionais a seu serviço como: o FMI, a
organização de um Estado dentro de outro Estado, ou seja, a organização da revolução”
(FERNANDES, Florestan. Apresentação. Apud LÊNIN, V.I. Que fazer? São Paulo: Hucitec, 1986, p. X,
grifou-se).
28
Rosenfield, Denis Lerrer, A Democracia Ameaçada – O MST, o teológico-político e a liberdade, Ed.
Topbooks, Rio de Janeiro, 2006, pp. 301/305 e 334/335.
58
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
OMC, o Banco Mundial e a Alca. Lutar pelo não pagamento da dívida externa’. Isto é, o
mundo se estruturaria politicamente pela luta imperialista, focada nos organismos
internacionais ou nos tratados que seriam suas formas de expressão. Note-se que o
governo Lula, nesse meio-tempo, pagou integralmente a dívida que o país tinha com o
FMI, contrapondo-se, nesse sentido, à política do MST e das alas mais à esquerda do
próprio PT.
A proposta do MST, intitulada ‘A reforma agrária necessária’, é
suficientemente clara em seus objetivos: a) Trata-se de construir uma ‘nova sociedade:
igualitária e socialista’. A reforma agrária situa-se no contexto de uma luta pelo
socialismo, não estando voltada, portanto, para a melhoria das condições de vida dos
trabalhadores dentro de uma economia de mercado, da democracia e no respeito ao
estado de direito. Para eles, trata-se de alterar ‘a atual estrutura capitalista de
organização da produção’. As condições de mudança do capitalismo no sentido de uma
maior justiça social são francamente desprezadas, por serem meramente reformistas; b)
‘Difundir a prática dos valores humanistas e socialistas’, reiterando, assim, a sua
posição de identificar humanismo e socialismo, como se os seus adversários fossem
‘subumanos’ ou ‘anti-humanos’, em um contexto pedagógico, já vimos, de um total
silêncio sobre as atrocidades cometidas pelos agentes do socialismo real, sob cujos
moldes agem os novos agentes do MST e da CPT; c) ‘A terra deve ser entendida como
um bem da natureza a serviço de toda a sociedade’, ou seja, a idéia tantas vezes
reiterada da existência de um estado idílico da sociedade, anterior à introdução da
propriedade privada, que seria tanto querido por Deus como descoberto por Marx e
Engels; d) Dentro de sua lógica anticapitalista, o MST procura ‘impedir que bancos,
empresas estrangeiras, grupos industriais nacionais, que não dependem da agricultura,
possuam terras’. Entendem-se aqui melhor as invasões de propriedades rurais,
empresas, altamente produtivas, que são objeto desse tipo de violência. O cultivo de
árvores por grandes grupos da área da celulose, por exemplo, é um alvo dessas ações; e)
Chama particularmente a atenção a concepção subjacente a um conjunto de propostas
caracterizado por embasar-se em um Estado provedor que tudo pode e é capaz de fazer.
É como se tudo dependesse de sua onipotência, desde créditos subsidiados até a
comercialização dos produtos, passando por projetos sociais e educacionais dos mais
diferentes tipos, como se os seus recursos fossem inesgotáveis e contas não devessem
ser prestadas aos contribuintes; f) O programa é todo enfocado desde uma perspectiva
de lutas de classes que tudo perpassa, inclusive a estrutura jurídica da sociedade. Numa
sociedade vista sob essa ótica, a lei nada mais seria que um reflexo das ações das classes
dominantes: ‘As classes dominantes, que controlam os governos e as leis, congregadas
pelos interesses dos latifundiários, da burguesia e do capital estrangeiro, possuem ainda
uma enorme força para manterem por muito tempo a atual situação’.
José de Souza Martins sustenta, por sua vez, a tese de que os pobres do campo
teriam as suas lutas baseadas numa espécie de ludismo agrícola, havendo forte
semelhança com os movimentos dos trabalhadores ingleses do século XIX, que se
revoltaram contra as máquinas, introduzidas, em escala crescente, pelo capitalismo
industrial, que então se desenvolvia. O ponto em questão reside em que haveria um
combate aos meios de uma transformação social e econômica em curso, numa espécie
de confusão da causa com o efeito. O resultado seria uma reação de tipo conservador,
que procuraria fazer regredir esse processo socioeconômico, numa volta ao passado,
alicerçada numa posição anticapitalista. A sedução do comunismo primitivo como
ideologia e, mesmo, como prática política aí encontraria a sua razão de ser. Ocorre,
entretanto, que a ideologia do MST e da CPT é uma ideologia de cunho marxista vulgar,
revolucionária, que se aproveita da situação dos pobres para introduzir na prática
política uma outra demanda, a demanda socialista, como se o comunismo primitivo
correspondesse longinquamente ao estado vigente anterior à introdução do novo
maquinário agrícola. Isso explicaria a oposição, diria de princípio, dessas organizações
político-religiosas contra o agronegócio, por ter ele modificado a forma de propriedade
rural, tornando-a uma empresa, e o modo de sua exploração, por intermédio do
maquinário e da biotecnologia”.
59
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
(...)
Enquanto o Estado brasileiro, com o fim do regime ditatorial, foi ampliando os
seus espaços de liberdade, de diálogo e de política, setores da sociedade civil, como os
movimentos sociais, foram se tornando cada vez mais autoritários e corporativistas. A
exigência de uma universalidade foi progressivamente se perdendo em proveito de
particularismos que adotaram uma conotação messiânica e revolucionária. José de
Souza Martins assinala que eles passaram a ‘negar a política, o debate e a
corresponsabilidade’, vindo a se organizar como se Estado fossem. É o caso do ‘MST e
seu empenho em estabelecer uma soberania particularista nas porções do território que
presume conquistar, no pressuposto de que são territórios ‘liberados’; similar ao que
fundou a ação do PcdoB nos anos cinqüenta’. Ora, esses territórios ‘liberados’ são os
acampamentos e assentamentos, com suas regras e formas de organização próprias, em
que os dirigentes exercem, inclusive, funções policiais e judiciárias. Territórios onde
não se entra sem visitas controladas, com escolas próprias, que difundem a ideologia do
‘movimento’, com distribuição de alimentos também controlada por esses dirigentes,
em cumplicidade com um governo que propicia esse tipo de ação à margem do Estado.
Temos, aí, a situação paradoxal de um Estado que financia e propicia formas nãoestatais de organização. O MST vive contra o Estado, sendo, porém, por ele financiado.
1.10.
TREINAMENTO
EM
TÉCNICAS
DE
GUERRILHA.
PRESENÇA DE ESTRANGEIROS NOS ACAMPAMENTOS.
A investigação em torno do MST deixou claro que aquele movimento
recebeu treinamento em técnicas de guerrilha, inclusive ministrado por estrangeiros,
razão pela qual suas ações são realizadas de forma plenamente organizada. As atitudes
mais recentes do MST em relação à Brigada Militar revelam, inclusive, a utilização de
técnicas de contra-inteligência por parte dos seus integrantes. Por outro lado, em
relatório datado de 02 de junho de 2006, o Comandante do CRPO Planalto já
observara29 que, tipicamente, as ações do MST são feitas em sigilo, de madrugada para
o amanhecer, com atuação de um grupo precursor armado, grande movimentação de
pessoas e invejável estrutura.
De fato, não foi diferente por ocasião da última grande invasão da
Fazenda Coqueiros, realizada no dia 14 de janeiro de 2008, quando duas vanguardas
armadas do MST, ambas formadas por integrantes encapuzados, invadiram
simultaneamente a fazenda em dois locais distintos, rendendo os empregados. A seguir,
19 (dezenove) ônibus e um caminhão com faixas e bandeiras do MST chegaram ao local
29
“9. As maiores ações envolvem uma organização típica, a saber: são feitas em sigilo, da madrugada
para o amanhecer, com atuação de um grupo precursor armado, com grande movimentação de pessoas e
60
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
trazendo um enorme contingente de invasores, consolidando o domínio da área30.
Também a ação desencadeada no dia 26 de janeiro de 2008, quando
membros do movimento cercaram um tratorista, apontaram-lhe armas de fogo,
obrigaram-no a fugir e colocaram artefatos explosivos no trator, revela a utilização de
técnicas militares para a consecução dos objetivos do MST31.
No que se refere a utilização de técnicas e táticas para fortificação de
áreas invadidas, abundam fotografias comprovando que os integrantes do movimento
receberam treinamento específico. A seguir, seguem amostras da utilização de estacas
panjo, armadilhas, torres de observação32 e outros artefatos:
invejável estrutura, contando com lideranças estaduais de renome. Tais ações necessitam de grande aporte
financeiro para sua execução” (fl. 553).
30
Conforme declarações prestadas na Delegacia de Polícia de Carazinho (fls. 624/631).
31
Conforme BO nº 670 (fl. 1545) e auto de apreensão da fl. 632.
32
A referida torre de observação, pelos critérios das “Diretrizes Nacionais Para Execução de Mandados
Judiciais de Manutenção e Reintegração de Posse Coletiva”, editadas pela Ouvidoria Agrária Nacional
em 22/02/2008, pode ser considerada “benfeitoria”, não cabendo à força pública sua destruição ou
remoção. Além disso, de acordo com o item 7 daquele documento, “A polícia não permitirá, nem mesmo
com utilização de mão de obra privada, desfazimento de benfeitorias existentes no local ou a
desmontagem de acampamento durante o cumprimento da ordem judicial” (fls. 1773/1778).
61
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Tais fatos denotam o treinamento recebido pelo MST e a disposição para
o enfrentamento.
A presença de estrangeiros orientando as ações do MST nos
acampamentos e invasões, por sua vez, restou igualmente evidenciada, conforme
excerto do Relatório do Comando do CRPO Planalto que se transcreve:
7. Comprovando o envolvimento internacional, temos também o
registro de diversas visitas de estrangeiros aos acampamentos, bem como
estrangeiros orientando as ações, como é caso do indivíduo conhecido
como Hugo Castelhano33.
O Estado Maior da Brigada Militar igualmente registrou tais atividades,
cabendo transcrever o seguinte trecho do Relatório nº 1124-100-PM2-200734:
No dia 17 de março de 2006, foi percebido que os homens responsáveis pela
segurança do MST recebiam as instruções dentro de um dos acampamentos por parte de
estrangeiros. O depoimento à Polícia Civil de um comerciante que teve contato com os
sem terras no início de março reforçou a suspeita da presença de estrangeiros no grupo
que invadiu a Fazenda Guerra. Os indícios da presença de estrangeiros junto ao MST
em Coqueiros aumentaram depois que um familiar do dono da propriedade, que fica ao
lado do acampamento, declarou que teve contato com dois homens com sotaque
estrangeiro.
Os guardas do acampamento tinham uma equipe com cerca de 30 (trinta) homens
armados com foices e facões liderados por HUGO CASTELHANO, sendo este um
dos líderes do MST no acampamento. De nacionalidade colombiana, ele seria o
encarregado das escalas nas guaritas e o mentor das estratégias de resistência do
grupo em caso de retirada compulsória pela polícia. O outro estrangeiro não foi
identificado. Também foi observado que no interior do acampamento, havia 03 (três)
mulheres com sotaque estrangeiro, e segundo comentários seriam Suecas
pertencentes a uma ONG de movimento social europeu e estariam no Estado em um
grupo de 15 (quinze) pessoas entre Suecos, Franceses e Americanos. A intenção deste
grupo seria a produção de um documentário. As demais pessoas estariam espalhadas
nos diversos acampamentos do Estado.
33
34
Fl. 553.
Fl. 1906 – os grifos constam no original.
62
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
1.11.
ESCOLAS:
ORGANIZAÇÃO
E
CONTEÚDO
PEDAGÓGICO.
O INCRA mantém um programa específico de educação para os
assentados, conforme depoimento do Superintendente Regional do Instituto Nacional
de Colonização e Reforma Agrária35:
O INCRA possui um programa chamado PRONERA, decorrente de uma Conferência
realizada em 1998. Este programa é executado pelo INCRA, tendo como objetivo a
escolarização de nível médio, alfabetização, curso de segundo grau regular, supletivo de
1º grau, curso superior, especialização e pós-graduação de assentados. Este programa já
formou mais de 300.000 pessoas no Brasil inteiro. Todos os cursos são aprovados pela
Secretaria Estadual, Conselho Estadual de Educação e Ministério da Educação. Em
Veranópolis há uma Escola chamada Antônio de Castro, mantida pelo ITERRA,
contendo ensino técnico e médio regular. A Escola é aprovada pelo Conselho Estadual
de Educação. Os assentados interessados dirigem-se às instituições de ensino e com ela
apresentam um projeto à Comissão Pedagógica do PRONERA. Se aprovado, o projeto é
encaminhado ao INCRA que efetua um convênio com a instituição. O encargo de
escolher corpo docente é da instituição conveniada. O INCRA libera um valor de R$
15,00 reais de diária por aluno para a permanência em turno integral na Escola em
Veranópolis.
Resta, pois, o tema do conteúdo pedagógico das escolas mantidas e/ou
gerenciadas pelo MST, seja em assentamentos controlados pelo movimento, seja em
acampamentos. Na já referida entrevista concedida por ZANDER NAVARRO ao
jornal “O Estado de São Paulo” em 29 de abril de 2007, a questão foi abordada:
O MST diz que investe na emancipação política e intelectual do homem do campo.
Um dos orgulhos do movimento são suas escolas, os centros de formação de
professores, os currículos especiais, os convênios com universidades.
Seria preciso existir possibilidade de visitas e acompanhamento sem controle prévio às
escolas dos assentamentos - o que o MST jamais permitiria, porque levaria à
desmoralização dessas atividades. Há exceções, notáveis, mas na maior parte dos casos
é um exercício primaríssimo de doutrinação da meninada. É um absurdo chamar de
educação o que está sendo feito nos assentamentos rurais quando prevalece o tom
monocórdio da cartilha única. Pedagogia sem desenvolver o pensamento crítico e sem
apresentar diversas leituras sobre o mundo pode ser chamada de educação?
A temática provocou tanta polêmica que já foi objeto de reportagem
especial em revista de circulação nacional. Com efeito, a revista “Veja”, na edição n.º
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MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
1870, de 8 de setembro de 2004, publicou matéria intitulada “Madraçais do MST” –
alusão à formação dogmática que existe em tais escolas, de rigidez comparável,
segundo a reportagem, às escolas de doutrinação dos fundamentalistas islâmicos.
Segue o texto da reportagem (grifou-se):
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) criou sua própria
versão das madraçais – os internatos religiosos muçulmanos em que crianças aprendem
a recitar o Corão e dar a vida em nome do Islã. Nas 1.800 escolas instaladas em
acampamentos e assentamentos do MST, crianças entre 7 e 14 anos de idade
aprendem a defender o socialismo, a "desenvolver a consciência revolucionária" e
a cultuar personalidades do comunismo como Karl Marx, Ho Chi Minh e Che
Guevara. "Sem-terrinha em ação, pra fazer a revolução!", gritam os alunos, de mãos
dadas, ao final de eventos e apresentações. Pelo menos 1.000 dessas escolas são
reconhecidas pelos conselhos estaduais de educação – o que significa que têm status
idêntico a qualquer outro estabelecimento de ensino da rede pública e que seus
professores são pagos com dinheiro do contribuinte. Elas nasceram informais, fruto da
necessidade de alfabetizar e educar os filhos de militantes do movimento – que chegam
a ficar durante anos acampados nas fazendas que invadem, à espera da desapropriação.
No fim dos anos 80, atendendo a uma reivindicação do MST, o governo passou a
integrar essas escolas improvisadas à rede pública. Parte delas funciona nas antigas
sedes das fazendas invadidas, parte foi construída pelos Estados e municípios. Ao todo,
as escolas do MST abrigam 160.000 alunos e empregam 4.000 professores.
A reportagem de VEJA visitou duas delas, ambas no Rio Grande do Sul.
Tanto a escola Nova Sociedade, em Nova Santa Rita, quanto a Chico Mendes, em
Hulha Negra, exibem, nas classes e no pátio, a bandeira do MST; no currículo,
abordagens ausentes da cartilha do Ministério da Educação e que transmitem a ideologia
sem-terra. Os professores utilizam, por exemplo, uma espécie de calendário
alternativo que inclui a celebração da revolução chinesa, a morte de Che Guevara
e o nascimento de Karl Marx. O Sete de Setembro virou o "Dia dos Excluídos", e a
Independência do Brasil é grafada entre aspas. "Continuamos dependentes dos
países ricos", justifica o professor de história da escola Nova Sociedade, Cícero
Marcolin. No ano passado, seus alunos aproveitaram o Dia da Independência, ou
"independência", para sair em passeata pelas ruas da cidade carregando faixas com
críticas à Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Na escola Chico Mendes,
professores exibem vídeos que atacam as grandes propriedades e enaltecem as virtudes
da agricultura familiar, modelo que o MST gostaria de ver esparramado no território
nacional: "A pequena propriedade é oprimida pelos grandes latifúndios, que só fazem
roubar emprego do povo", diz um dos filmes. A mesma fita é usada para ensinar aos
alunos que os produtos transgênicos "contêm veneno". A reportagem de VEJA assistiu a
uma dessas aulas. No fim da exibição do filme, o professor pergunta quem da classe
come margarina. A maioria das crianças levanta o braço. Tem início o sermão:
"Margarina é à base de soja, que pode ser transgênica e, por isso, ter ve-ne-no!" A
atividade seguinte foi uma encenação teatral. No pátio, carregando bandeiras do MST,
crianças entoaram uma música que dizia: "Traga a bandeira de luta / Deixe a bandeira
passar / Essa é a nossa conduta / Deixe fluir para mudar". Para encerrar, deram o grito
de guerra conclamando para a revolução.
O MST implementou um sistema de ensino paralelo, sobre o qual o poder
público não exerce quase nenhum controle. O Ministério da Educação desconhece
35
Fls. 19/22.
64
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
até mesmo quantas são e onde estão exatamente as escolas públicas com a grife do
movimento. E as secretarias estaduais e municipais de ensino, embora sustentem as
escolas, enfrentam dificuldades até para fazer com que professores não ligados aos semterra sejam aceitos nas salas de aula. "O MST torna a vida do educador que vem de fora
um inferno", diz Gislaine do Amaral Ribeiro, coordenadora estadual das escolas de
assentamentos na região de Bagé, Rio Grande do Sul. Nos assentamentos, pelo menos a
metade do corpo docente vem do MST. Já nos acampamentos, todos os professores
pertencem ao movimento. Muitos não têm o curso de magistério completo – prérequisito básico para a contratação na rede pública –, e alguns não chegaram sequer a
terminar o ensino fundamental. "A realidade é que há pessoas atuando como
profissionais da educação nessas escolas sem o mínimo de preparo para exercer a
função", reconhece o secretário estadual de Educação do Rio Grande do Sul, José
Fortunati. O governo gaúcho diz que está de mãos atadas diante da situação, porque
herdou um grande número de professores contratados pelo governo anterior, do PT. Pela
proximidade com o MST, a antiga gestão teria sido mais complacente na contratação do
corpo docente. A secretaria diz estar pleiteando junto ao MEC verbas para implantar um
programa para dar a esses professores o nível básico de estudo para que possam
lecionar.
Em seu Caderno de Educação de número 8, o MST deixa claro que a educação
que pretende dar a seus alunos deve ter "o compromisso em desenvolver a consciência
de classe e a consciência revolucionária". A rigor, nada impede que uma organização
como o MST queira propagar sua ideologia para crianças que mal aprenderam a
escrever o próprio nome. O problema é fazer isso dentro do sistema de ensino público e
com dinheiro do contribuinte. A legislação brasileira preserva a autonomia das escolas,
desde que cumpram o currículo exigido pelos Estados e estejam em consonância com a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996, que prega o "pluralismo de idéias" e o
"apreço à tolerância" – elementos básicos para que as crianças desenvolvam o raciocínio
e o espírito crítico. Não são os critérios adotados no território dos sem-terra. "Essas
escolas estão aprisionando as crianças num modelo único de pensamento", observa
a pedagoga Sílvia Gasparian Colello, da Universidade de São Paulo.
Um modelo, acrescente-se, falido do ponto de vista histórico e equivocado do
ponto de vista filosófico. Está-se falando, evidentemente, do marxismo. Falido porque
levou à instauração de regimes totalitários que implodiram social, política e
economicamente. Equivocado porque, embora se apresente como ciência e ponto final
da filosofia, nada mais é do que messianismo. De fato, o marxismo não passa de uma
religião que, como todas as outras, manipula os dados da realidade a partir de
pressupostos não verificáveis empiricamente. E, assim também como as religiões,
rejeita violentamente a diferença. "Burgueses não pegam na enxada / Burgueses não
plantam feijão / E nem se preocupam com nada / Arrasam aos poucos a nação", diz a
letra de uma das canções ensinadas aos "sem-terrinha". Da mesma forma que os
internos das madraçais, as crianças do MST são treinadas para aprender aquilo que os
adultos que as cercam praticam: a intolerância.
Essa forma de doutrinação já havia sido constatada no Rio Grande do
Sul, tendo sido objeto de reportagem publicada no jornal Zero Hora, edição do dia 10
de novembro de 2002. Transcreve-se o seguinte excerto daquela matéria, intitulada “A
escola que forma líderes do MST”36:
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MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
O paraíso socialista idealizado por Lênin, Fidel e Che Guevara tem uma
legião de seguidores entre alunos de uma escola encravada em Veranópolis, a 130
quilômetros de Porto Alegre.
Na Josué de Castro, vinculada ao Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST), tudo é coletivo – do pão às hortas. A maioria dos 348 alunos da
escola, para espanto de muitos moradores da cidade serrana, dedica parte do dia a
cantar hinos com motivação revolucionária e, em ocasiões festivas, homenageia
ícones de regimes comunistas.
Foi assim em 7 de setembro de 200, quando Veranópolis promoveu um desfile
da Semana da Pátria com o tema ‘O século 20’. Enquanto outras escolas abordavam
questões relativas ao Brasil e vestiam os alunos com adereços verde-amarelos, a do
MST desfilou sob a bandeira vermelha da extinta União Soviética, seguida de um
estandarte com a figura do revolucionário russo Vladimir Lênin. Alguns estudantes
usavam bonés camuflados, outros levavam cartazes com lemas da Revolução Russa,
como ‘Terra, Pão e Liberdade’. Uma militante carregava numa mão uma foice e, na
outra, um martelo. Alunos gritavam ‘Ocupar, produzir, fora burguesia’.
Zero Hora visitou a escola, chamada Josué de Castro e situada em um seminário
desativado do capuchinhos. O local é sede do Instituto Técnico de Capacitação e
Pesquisa da Reforma Agrária (Iterra), ligado ao MST. O endereço é dividido com uma
universidade e com uma escola privada.
Na Josué de Castro, uns aprendem magistério, outros, técnica em administração
cooperativista. São aulas teóricas na manhã e, à tarde, práticas. À noite, assembléias de
discussão política. Entre outras atividades, os alunos recebem noções da vida daqueles a
quem o MST chama ‘Lutadores do Povo’, pessoas que pegaram em armas pela causa da
reforma agrária, como Fidel Castro e Che Guevara.
Proliferam entre os estudantes camisetas com a célebre foto do Che retratada por
Alberto Korda e dizeres como ‘Não há fronteira nessa luta de morte’ ou o conhecido
‘Hay que endurecer...’.
- É a parte mística da formação. Aí acontecem também as rodas de violão e as
canções e hinos – diz Antônio Júlio Menezes Neto, doutor em Sociologia pela
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que por dois anos fez incursões à Josué
de Castro, resultantes em uma tese de doutorado.
Ele explica: a José de Castro foi criada para formar líderes. Os estudantes são
indicados pelo movimento, geralmente pinçados entre filhos de acampados que
mostram liderança. A idéia é dar conhecimento técnico e ideológico para os jovens semterra de todo o país. Simpatizante do MST, Menezes rejeita o termo ‘lavagem cerebral’:
segundo ele, os jovens já ingressam com posicionamento próprio.
Em um enfoque acadêmico, pondera ZANDER NAVARRO:
São inúmeras as evidências comprobatórias do limitado foco educacional das
escolas de formação política do Movimento. Claramente, sob os vários mecanismos
doutrinários utilizados, a ênfase não era (e não tem sido) na formação política
universalista dos jovens sem-terra participantes mas, pelo contrário, reforçar a
“mística” do MST, criando uma geração de militantes cegamente voluntaristas.
Não surpreende, assim, que as camadas intermediárias do Movimento, em sua ação
política, ajam de forma rigidamente dogmática e uniforme, presas a um conjunto de
preceitos políticos mínimo, do qual não podem abrir mão, pois se enfraqueceriam na
interlocução e nas disputas políticas, pela falta de capacidade política mais abrangente.
Também sem surpresa, resultante de uma formação política tão limitada, a diversidade
36
Fls. 2145/2147.
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MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
desaparece nos esquemas de interpretação utilizados pelos quadros da organização, pois
tal complexidade seria incompatível com a extrema simplicidade da formação política
37
dos militantes sem-terra.
Prossegue o Professor ZANDER NAVARRO, no mesmo texto:
O objetivo da formação política de jovens agricultores sem-terra nas escolas do
Movimento situa-se, como antes referido, em campo inteiramente distinto — em
resumo, pretende-se tão somente produzir a adesão a uma compreensão “total” e
fechada da política que, de fato, sequer procura situar-se concretamente em
relação ao desenvolvimento político brasileiro recente, pois volta-se inteiramente
“para dentro”, já que é destinada precipuamente a manter a disciplina, a
motivação e a coesão entre seus militantes intermediários. Algumas vezes, a
mistificação ideológica pode atingir o patético, na tentativa de reforçar a perspectiva
polarizada do mundo e o maniqueísmo das interpretações políticas. O jornal do
Movimento, por exemplo, é talvez o melhor espelho das mudanças operadas. Até 1986
uma publicação plural, naquele ano sofreu a intervenção da direção nacional e foi
transformado em “instrumento de agitação de massas”, no melhor estilo do
receituário leninista. Seus jornalistas, por desconfiança, foram afastados e substituídos
por “repórteres populares”, tal reorientação passando a refletir-se nas páginas da
publicação. Como ilustração da nova opção ideológica, cite-se, por exemplo, entre
dezenas de possibilidades de distorção deliberada dos fatos, a maneira como o jornal,
em sua seção de “fatos diversos”, tratou a prisão do lutador norte-americano Mike
Tyson, em 1991, acusado (e posteriormente condenado, inclusive com sua confissão) de
estupro. Na perspectiva “política” do jornal, tal fato simplesmente não ocorreu e a
prisão de Tyson ocorreu, isto sim, em face da histórica discriminação racial existente
naquele país, razão que teria sido a única para ser preso e condenado, segundo o que o
periódico, na ocasião, publicou, provavelmente para surpresa de seus leitores mais
informados. Neste caso, como na maior parte da agenda política organizada pela
direção do Movimento, igualmente fruto de um discurso inspirado pelos setores
ligados à Comissão Pastoral da Terra, que lhe serve como suporte de legitimação
religioso, o recurso é à polarização extremada entre o “bem” e o “mal”.
Curiosamente, mesmo em meio à crescente complexidade social e cultural do país, bem
como à ampliação do arco político e ideológico, vencido o ciclo militar do passado, os
instrumentos mobilizadores do MST jamais conseguiram ultrapassar os estreitos limites
de uma perspectiva marcada por pólos antípodas que opõe o virtuoso e o maléfico,
distantes por certo de qualquer correspondência real. Preso a esta armadura de visível
simplificação ideológica, que tem fins meramente instrumentais, não surpreende que a
organização raramente tenha conseguido estabelecer alianças ou agendas comuns sequer
38
com as demais organizações populares do campo brasileiro.
37
Conforme NAVARRO, Zander. “Mobilização sem emancipação” — as lutas sociais dos sem-terra no
Brasil. Publicado em SANTOS, Boaventura de Sousa (org). Produzir para viver. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2002, p. 189-232, nota n. 11, grifou-se.
38
Op. cit., p. 189-232.
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
1.12. A SITUAÇÃO DOS MOVIMENTOS AGRÁRIOS NO RIO
GRANDE DO SUL.
A situação no Rio Grande do Sul aponta para a predominância absoluta
do MST nos acampamentos. Aos acampados, o INCRA fornece lona e efetua o repasse
de cestas básicas originárias do Programa de Segurança Alimentar e Nutricional do
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (“Fome Zero”). Confira-se o
depoimento prestado ao Ministério Público pelo Superintendente Regional do Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA no Rio Grande do Sul, MOZAR
ARTUR DIETRICH, que compareceu ao Ministério Público acompanhado do
Superintendente Regional Substituto, JOSÉ RUI CANCIAN TAGLIAPIETRA39:
Pelo Sr. Mozar, inicialmente, houve o fornecimento de uma relação de acampamentos
do MST no Estado, contendo também o número de famílias, de cestas básicas e lonas
fornecidas. Esta relação está na primeira folha da documentação entregue. (...) Os
comparecentes também fornecem, neste momento, uma relação de acampamentos
independentes, não ligados ao MST, sua localização, número de famílias, cestas
fornecidas e lonas, objeto da segunda folha da relação. A terceira lista, é dos
assentamentos do último ano. O Sr. Mozar informa que no total são 19 grupos no Brasil
que lutam pela terra. A Via Campesina possui outro papel, pois unifica lutas ligadas à
reforma agrária e à agricultura familiar. É uma espécie de articulação política dos
movimentos. O MPA é um movimento de pequenos agricultores não é ligado ao MST e
à FETAG, mas integra a Via Campesina. São ligados à FETRAFSUL. Neste momento,
também é feita a entrega de uma relação de controle de entrega de cestas de alimentos
aos integrantes do MST e assentamentos feita no mês passado. O Sr. Mozar informa que
há um cadastro de 2005 dos acampados. Não está atualizado, pois ao final de 2005
houve tentativa de recadastramento e os funcionários do INCRA foram hostilizados,
com resistência dos acampados. No ano de 2006 não houve cadastramento. No presente
ano deverá haver um novo recadastramento. Não há resistência do MST para este
trabalho na atualidade. Os comparecentes informam que há um cadastro em poder do
INCRA contendo 25.000 pessoas que se cadastraram pelo correio durante o governo do
Presidente Fernando Henrique Cardoso. Informam que no último ano o INCRA
retirou mais de 200 famílias acampadas nas proximidades da Fazenda Coqueiros.
Porém, quanto mais o INCRA assenta, mais aumenta o número de acampados. No
ano de 2006, foram assentadas 858 famílias. Porém, encerrou o ano com 2.750 famílias
acampadas em dezembro. No início de 2006 eram menos de 2.000 famílias acampadas.
O Sr. Mozar informa que o relacionamento com os atores envolvidos com o problema
da reforma agrária é de “marisco”, isto é, a autarquia é cobrada por todos os envolvidos.
Os focos de litígio atualmente existentes no Estado são a Fazenda Coqueiros, Nova
Santa Rita, São Gabriel e Pedro Osório. Há também acampamentos grandes em
Santana do Livramento e em Bossoroca. Quanto à Fazenda Coqueiros, há o
encaminhamento de pedido de desapropriação por interesse social genérico pela Lei
4.132, que está sendo analisado pela Chefia da Casa Civil. Em São Gabriel, na área é
identificada por Fazenda Soutal, há tentativa de desapropriação pelo INCRA por
descumprimento da função social da propriedade, pois este deve preencher quatro
39
Fls. 19/22.
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MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
requisitos, isto é, o cumprimento e observação da legislação ambiental, geração do bem
estar social pelo proprietário e seus funcionários, a produção racional e adequada, que
se confunde com produtividade, e o cumprimento das obrigações trabalhistas. Em Pedro
Osório, a proprietária da Fazenda da Palma foi notificada para avaliação do
cumprimento da função social. Entretanto, houve ocupação do MST, o que levou à
retirada do INCRA. Em Nova Santa Rita, o proprietário ofertou a Fazenda ao INCRA
para venda. Porém, o INCRA somente paga por meio de TDAs. Em virtude de invasão
recente com depredação, houve um recuo no negócio. O INCRA está efetuando
vistorias de cumprimento da função social em propriedades no Estado. Há quatro
equipes para tanto. Nesta semana estão sendo notificadas mais de 10 propriedades. Há
uma boa chance de as áreas não cumprirem a função social e, se isso se confirmar, serão
encaminhadas para desapropriação sanção. O INCRA também está efetuando
levantamento para fins de ação discriminatória em áreas devolutas ou federais ocupadas
indevidamente. Houve, também, neste momento, a entrega de três listas de projetos de
assentamentos realizados pelo INCRA, pelo Estado do Rio Grande do Sul e em
conjunto INCRA-Governo do Estado do Rio Grande do Sul. Informa o Sr. Mozar que
há um enorme número de famílias que foram assentadas em conjunto entre o INCRA e
o Estado do Rio Grande do Sul que ainda não conseguiu a sua infra-estrutura necessária
e crédito, estando ainda pendentes de regularização em função de inadimplemento por
parte do Estado de seus compromissos. O Estado do Rio Grande do Sul não está
atuando em áreas de quilombos, sem-terra e índios” (os grifos são do Ministério
Público).
Verifica-se, assim, pelos dados complementares fornecidos pelo INCRA
quando do comparecimento de seus representantes na sede do Ministério Público, que
existem 2.262 famílias acampadas no Estado do Rio Grande do Sul, sendo que desse
número, 2.170 famílias estão ligadas ao MST. Dos 20 (vinte) acampamentos situados
no Estado do Rio Grande do Sul, 13 (treze) são controlados pelo MST e 7 (sete) são
acampamentos “independentes”, isto é, não ligados a nenhum dos grandes movimentos
agrários.
1.13. FOCOS RECENTES DE CONFLITOS: NOVA SANTA RITA,
COQUEIROS DO SUL, PEDRO OSÓRIO E SÃO GABRIEL.
O MST tem seus marcos históricos em locais como Fazenda Annoni e
Encruzilhada Natalino. Hoje, entretanto, os focos de conflitos mais intensos no Rio
Grande do Sul encontram-se nas cidades de Pedro Osório, Coqueiros do Sul, São
Gabriel e Nova Santa Rita.
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
1.14. NOVA SANTA RITA. A GRAVE SITUAÇÃO EM TORNO
DA FAZENDA GRANJA NENÊ.
A Granja Nenê é uma fazenda altamente produtiva de aproximadamente
1.246 (mil, duzentos e quarenta e seis) hectares, situada no Município de Nova Santa
Rita (19 km de Porto Alegre), ao lado do rio Caí e próxima à BR 386, esta chamada
de “Estrada da Produção”, rodovia de extrema importância e pela qual passa a maior
parte da produção agrícola oriunda do norte do Estado. Em condições normais, a
Granja, que está na família das proprietárias há mais de 80 (oitenta) anos, produz
arroz, hortigranjeiros ecológicos, gado de corte e ovinos. Ao seu lado, situa-se um
acampamento do MST, hoje conhecido como Assentamento Montepio. Anteriormente
existia uma fazenda de mesmo nome no local onde está instalado o acampamento,
porém integrantes do MST passaram a atacá-la e invadí-la, motivando a aquisição
daquelas terras pelo INCRA e a posterior realização de um assentamento no local,
situado nas margens da BR 386. Não satisfeito com a instalação de um enorme
contingente de sem-terras no Assentamento Montepio, o MST passou a proferir
ameaças de invasão à Granja Nenê, ensejando a busca e o deferimento de um interdito
proibitório. Apesar da medida deferida pelo Poder Judiciário vedando a invasão da
Granja, em 11 de abril de 2007 o movimento concretizou a invasão da fazenda com
aproximadamente 600 (seiscentos) integrantes, sendo que, quando retirados pela
Brigada Militar, instalaram um acampamento do MST no Assentamento Montepio,
separado da Granja por apenas uma estrada, situação que permanece até hoje. Afora a
irregularidade desse procedimento, qual seja, a instalação de um acampamento no
assentamento, impende observar que as terras do assentamento apresentam uma
produção agrícola praticamente nula, insignificante quando comparada com a
produção das fazendas próximas, em especial com a da Granja Nenê. De qualquer
forma, instalados nas terras vizinhas, os membros do MST passaram a atacar a Granja
de vários modos: invadindo a área corriqueiramente, derrubando árvores e furtando
sua madeira, provocando incêndios, atirando pedras nos veículos que se dirigem à
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
sede, proferindo insultos e ameaças contra as proprietárias e seus empregados,
matando gado para retirada parcial da carne, ferindo animais para deixá-los morrer,
ameaçando destruir a colheita, destruindo máquinas e equipamentos agrícolas, etc.
Tais ações criminosas possuem um óbvio objetivo: aterrorizar as proprietárias,
inviabilizar a produção da fazenda e motivar sua compra ou desapropriação pelo
governo. Nesse sentido, as ações estão apresentando um notável resultado, porquanto
as proprietárias, segundo publicado na imprensa, já venderam todo o gado e
manifestaram a intenção de vender as terras para o INCRA40.
Ocorre que o interesse do MST por aquela área não decorre do
acaso, mas sim da sua formidável importância estratégica. Com efeito, pelas terras
da Granja passam três dutos fazendo ligação entre a REFAP – Refinaria Alberto
Pasqualini S/A, empresa do sistema Petrobrás, e o Pólo Petroquímico, a saber:
ORSUL 14, destinado ao transporte de cerca de 320.000 toneladas mensais de nafta e
condensado, matérias-primas da COPESUL – Companhia Petroquímica do Sul;
ORSUL 10, destinado ao transporte de cerca de 8.000 toneladas mensais de propeno
da REFAP ao Pólo Petroquímico; ORSUL 6, destinado ao envio de componentes de
gasolina e GLP da COPESUL para a REFAP, atualmente sem movimentação, porém
com retorno de operação previsto para o futuro. As referidas tubulações são vitais para
a operação do Pólo Petroquímico como um todo, uma vez que a totalidade da matériaprima por ele utilizada passa por aqueles dutos. Eventual interrupção de seus cursos
implicaria
na
parada
total
das
atividades
daquele
complexo
industrial,
comprometendo, inclusive, o abastecimento de combustíveis em todo o Estado do Rio
Grande do Sul41. O impacto econômico de uma ação nessa escala é inestimável.
Também uma via férrea utilizada para o transporte de gasolina passa
através das terras da Granja Nenê, constituindo um importante modal logístico para o
Pólo Petroquímico de Triunfo42.
A área da Granja é igualmente atravessada por torres de alta tensão, vitais
para o abastecimento do Pólo Petroquímico e da região metropolitana de Porto
40
Conforme publicado no jornal Correio do Povo, edição de 19 de fevereiro de 2008, p. 12 (fl. 2025).
Conforme informações da COPESUL (fls. 1809/1810), REFAP (fl. 1811), TRANSPETRO (fls.
1812/1814) e SULGÁS (fls. 1821/1823).
42
Fl. 1810.
41
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Alegre43. A CEEE-GT – Companhia Estadual de Geração e Transmissão de Energia
Elétrica, opera naquele local seis linhas de transmissão que fazem parte do Sistema
Elétrico do Estado do Rio Grande do Sul e dos Sistema Interligado Nacional – SIN,
fazendo conexão com a subestação de Nova Santa Rita. Esta possui uma capacidade
total de transformação de 1200 MVA44, sendo que eventual falha nas linhas causaria
um colapso no abastecimento da região metropolitana da capital gaúcha. Outra linha
que passa na Granja Nenê é a LT 69 kV Pólo Petroquímico – Esteio, de propriedade da
AES Sul, que abastece parte dos municípios de Nova Santa Rita, Canoas e Esteio e
transmitiu, em 2007, o volume de 376 GWh de energia. Aquela linha opera em anel
com a LT Esteio – Cachoeirinha, razão pela eventual interrupção da transmissão
implicaria no desligamento também da energia destinada àquela cidade .
Note-se que a Fazenda Granja Nenê situa-se nas margens do rio Caí, o
que, por si só, constitui uma posição geográfica privilegiada do ponto de vista militar.
Com efeito, o abastecimento de água constitui elemento fundamental para a logística
das operações visando o completo domínio de um território. Além disso, tendo em
vista que desemboca no Delta do Jacuí e, a seguir, segue em seqüência para o rio
Guaíba, Lagoa dos Patos e Oceano Atlântico, eventual ataque às suas águas afetaria
não apenas Porto Alegre e região metropolitana, mas também significativa parte do
território deste Estado.
Juntamente com as terras do Assentamento Montepio, já sob o domínio
do MST, o domínio da área da fazenda em questão tornaria fácil para o movimento
também interditar a “Estrada da Produção” (BR 386), igualmente provocando enorme
prejuízo à economia gaúcha.
Seguem fotografias acerca dos fatos aqui mencionados45:
43
Fls. 1815/1818.
A título de comparação, cabe observar que o consumo médio de todo o Estado do Rio Grande do Sul é
de aproximadamente 3500 MVA.
45
Fls. 465/476.
44
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PÓRTICO DE ENTRADA DA GRANJA NENÊ
Granja Nenê
PÓLO PETROQUÍMICO; RIO CAÍ; SEDE DA GRANJA NENÊ.
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TUBULAÇÕES DE NAFTA NAS MARGENS DO RIO CAÍ.
Município de Nova Sta
Rita e ESTEIO
De onde vem a nafta
PÓLO PETROQUÍMICO
De TRIUNFO-RS
onde vai a Nafta
para
PÓLO PETROQUIMICO, SEDE DA GRANJA NENÊ; TUBULAÇÕES.
Limite final da
Granja Nenê
Sede da Granja
Rio Caí
Pólo
Petroquímico
De Triunfo
Tubulações de
Nafta
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
TUBULAÇÕES DE NAFTA E PLACAS DE AVISO NAS TERRAS DA GRANJA NENÊ
PLACAS DE ADVERTÊNCIA DENTRO DAS TERRAS DA GRANJA
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
TUBULAÇÕES DE NAFTA DENTRO DAS TERRAS DA GRANJA NENÊ
PONTE VIA FÉRREA PARA O PÓLO PETROQUÍMICO
PASSA NAS TERRAS DA GRANJA NENÊ
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TORRES DE ALTA TENSÃO NAS TERRAS DA GRANJA NENÊ
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BR-386 ACESSO À GRANJA NENÊ – NOVA STA RITA-RS
ACESSOS A GRANJA
NENÊ PELA BR-386
BR-386 Km-437
Parte limite das terras da
GRANJA NENÊ
Portanto, no momento em que o MST lograr êxito em obter o
território da Granja Nenê, as seguintes possibilidades estarão ao seu pleno
alcance: a) parar o Pólo Petroquímico do Sul; b) comprometer o abastecimento
de combustíveis em todo o Estado; c) provocar um colapso no abastecimento de
energia elétrica da região metropolitana de Porto Alegre; c) afetar o
abastecimento de água em significativa parte do Estado do Rio Grande do Sul, a
partir do controle do Rio Caí; d) manter a ocupação por prazo praticamente
indefinido, dado o abastecimento permanente de água; e) interromper o trânsito
na “Estrada da Produção” (BR 386).
Verifica-se, deste modo, a enorme importância econômica, tática e
estratégica das terras almejadas pelo MST naquela área e que o INCRA pretende
comprar e colocar em suas mãos46.
46
O Ministério Público Estadual do Rio Grande do Sul encaminhará ao Ministério Público Federal cópia
desta ação e dos documentos que a instruem, objetivando a avaliação das atuação daquela autarquia
federal junto à Fazenda Granja Nenê.
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1.15. PEDRO OSÓRIO.
Em Pedro Osório, militantes do MST iniciaram movimentações e
ameaças em torno da Fazenda Palma, o que ensejou o deferimento de um interdito
proibitório no dia 29 de janeiro de 2007. Apesar da decisão judicial, integrantes do
movimento invadiram a fazenda em 11 de abril de 2007. Retirados do local, no dia 27
do mesmo mês aproximadamente 100 (cem) sem-terras oriundos do Assentamento
Novo Pedro Osório voltaram a invadir a área. Em 9 de agosto de 2007, uma audiência
pública com integrantes do MST e produtores rurais terminou em confronto entre os
dois grupos. Seis membros do MST foram presos e liberados mais tarde, e quatro
policiais e 22 sem-terra ficaram levemente feridos e foram encaminhados para a Santa
Casa do município. Conforme notícia publicada na imprensa47, a audiência, que seria
realizada em um salão paroquial na cidade, iria discutir os conflitos agrários na
localidade. Segundo a Brigada Militar, os sem-terra tentaram impedir a entrada de
produtores rurais na sala onde ocorreria o evento. Houve empurra-empurra e agressões
entre os dois grupos, de acordo com a Brigada, e os policiais intervieram. Segundo os
policiais, havia cerca de 150 sem-terra e outros 150 produtores rurais no local. Em
razão do confronto, a audiência acabou cancelada. Segundo a Brigada Militar, 70
policiais atuaram na ação. Enquanto isso, a atmosfera de tensão prossegue.
1.16. SÃO GABRIEL.
Os eventos em São Gabriel iniciaram em maio de 2003, quando a União
Federal decretou a desapropriação dos 13.222 (treze mil, duzentos e vinte e dois)
hectares da Fazenda Southall, para fins de reforma agrária. Em junho do mesmo ano, o
Supremo Tribunal Federal concedeu uma liminar suspendendo os efeitos do decreto,
motivando o início de uma marcha de aproximadamente 700 (setecentos) sem-terra em
direção a São Gabriel, marcha essa acompanhada pela Polícia Rodoviária Federal e
por ruralistas. Seguiram-se audiências públicas, marchas e contra-marchas, com a
Brigada Militar atuando para evitar conflitos de maiores proporções. Em 14 de agosto
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de 2003, o STF anulou a desapropriação da fazenda, porém o MST manteve na RS 630
um acampamento denominado “Filhos de Sepé”, utilizado como base para incursões
contra a propriedade de Alfredo Southall. No dia 05 de março de 2008, foi invadida a
Fazenda Tarumã em Rosário do Sul, tendo restado ferido o Comandante Regional da
Fronteira Oeste, Cel. Lauro Binsfeld, e sido presa Irma Maria Ostroski, líder da Via
Campesina. Em protesto, integrantes do MST instalados no acampamento de São
Gabriel bloquearam a RS 630.
O local continuou como foco permanente de tensão até que, no dia 14 de
abril de 2008, através do Relatório de Inteligência nº 381-110408-100/PM2, da
Brigada Militar, obteve-se informes de que o MST, desde 10 de abril de 2008, vinha
realizando deslocamento de seus integrantes em direção ao acampamento localizado
na RS 630, km 12, em São Gabriel, sendo que a operação estaria dentro das ações que
o Movimento desenvolve no chamado “Abril Vermelho”. Com efeito, na mesma data
o MST concretizou a invasão da Estância do Céu, mais conhecida como Fazenda
Southall, nela praticando inúmeras barbáries (algumas fotografias constam no item
1.22).
1.17. O CERCA À FAZENDA COQUEIROS.
1.17.1. ANTECEDENTES.
A Região Noroeste do Rio Grande do Sul, historicamente, serviu de base
territorial para a instalação do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra – MST em
nosso Estado. Nela é que, por primeiro, ocorreram manifestações do aludido
movimento, ainda embrionário no Estado.
A aludida Região é marco histórico e geográfico do nascedouro do
próprio MST, a partir de manifestações passadas nos municípios de Nonoai, Sarandi e
Ronda Alta, em nosso Estado, no final da década de 1970. Naquele período, é
perfeitamente factível apontar a ocorrência de fatos históricos que geraram a semente
do nascimento do Movimento Sem Terra.
47
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u318999.shtml (acesso em 02 de junho de 2008).
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Um retrospecto histórico nos reporta ao ano de 1978, quando índios
Kaingang da reserva no município de Nonoai expulsaram mais de mil famílias de
posseiros que lá viviam desde 1968, arrendando suas terras por intermédio da FUNAI.
Sem terem destino definido, parte das famílias expulsas pelos índios ocuparam a
Fazenda Macali, mas, logo em seguida, também de lá foram expulsas. Em setembro de
1979, a Fazenda Macali foi novamente ocupada, juntamente com outra área vizinha, a
Fazenda Brilhante, ambas no Município de Ronda Alta - RS. Diante dessa realidade,
João Pedro Stédile, então funcionário da Secretaria da Agricultura do Rio Grande do
Sul e o pároco de Ronda Alta, começaram a organização das famílias de posseiros
expulsos da reserva Nonoai. Outro grupo de famílias, na mesma época, ocupou a
Fazenda Annoni, no Município de Sarandi - RS, e logo foi despejado. Em
conseqüência, tais famílias deram início ao chamado acampamento de “Encruzilhada
Natalino”. No local, situado no encontro das estradas que levam a Passo Fundo, Ronda
Alta e Sarandi (daí a denominação “Encruzilhada”), o primeiro acampado a erguer
uma barraca chamava-se Natalino (por isso o nome Encruzilhada Natalino). Ao início,
no ano de 1981, o acampamento tinha em torno de 600 famílias, situando-se em área
de servidão pública, entre a cerca e o leito da estrada. Aos aludidos movimentos, já no
ano de 1984, seguiu-se o nascimento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra - MST, decorrente do I Encontro Nacional do Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra, ocorrido em Cascavel - PR em 1984. Este encontro, aliás, tornou-se
o marco oficial do surgimento do MST, janeiro de 1984. No ano de 1985, em suma, o
MST, após promover a ocupação, conseguiu a desapropriação da Fazenda Annoni.
Nela foram assentadas mais de 300 famílias.
A relação entre os fatos narrados e a realidade vivida na Fazenda
Coqueiros, no Município de Coqueiros do Sul, é umbilical e indissociável.
Na atualidade, entre os municípios gaúchos de Palmeira das Missões,
Iraí, Nonoai, Encruzilhada Natalino, Pontão, Carazinho e Passo Fundo, notadamente,
há uma grande quantidade de acampamentos do MST. Em especial, percebe-se que o
assentamento ocorrido na Fazenda Annoni situa-se geograficamente muito próximo da
Fazenda Coqueiros, em Coqueiros do Sul, ambas com grande extensão territorial.
Nesse contexto, diante dos fatos que vêm ocorrendo, com a mobilização
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de diversas frentes do MST existentes no Estado em direção à Fazenda Coqueiros,
percebe-se nitidamente uma estratégia de ocupação territorial da Região Noroeste do
Estado, sendo a aludida área de terras no município de Coqueiros do Sul estratégica
para a consolidação de tal desiderato, certamente não apenas pela sua extensão
territorial de 7,1 mil hectares.
1.17.2. EVOLUÇÃO DOS ACONTECIMENTOS.
A cronologia dos fatos envolvendo o Movimento dos Sem Terra e a
Fazenda Coqueiros iniciou no dia 02 de abril de 2004, data em que ocorreu a primeira
invasão. Naquela data, aproximadamente 400 integrantes do MST chegaram ao local,
invadindo o imóvel. Já no dia 15 de abril de 2004, novo grupo de membros do MST
aportou ao local, passando a arrendar uma propriedade de Jandir Wiebrantz, situada ao
lado da Fazenda Coqueiros, montando um acampamento no local e lá permanecendo
até o momento. Aliás, na atualidade, nas cercanias da Fazenda Coqueiros, o MST
montou três acampamentos. No município de Sarandi, o acampamento às margens da
BR-386, no município de Coqueiros do Sul, fazendo divisa com a Fazenda Coqueiros,
o acampamento em área pertencente a Jandir Wiebrantz, antes referido, e o
acampamento identificado por Sepé Tiarajú, também conhecido por acampamento
“Serraria” ou “Passo Cabrito”, em área arrendada pelo MST.
Percebe-se que, a partir da primeira invasão ocorrida no ano de 2004,
sucederam-se diversos outros atos dessa mesma natureza, de grandes ou menores
proporções.
Há, nitidamente, motivação intransigente do MST no sentido de compelir
os órgãos públicos a desapropriar a Fazenda Coqueiros.
Veja-se que, para tanto, a organização não mede esforços, fazendo uso de
métodos de pressão verdadeiramente criminosos. Diversamente do que se vê em
outros movimentos sociais, o MST elegeu a via ilícita para desenvolver suas
postulações. Isso ocorre desde sua organização informal, passando pelo desrespeito a
decisões judiciais, métodos de intimidação, inquietação, enfrentamento com o sistema
de segurança mediante uma estratégia coordenada, inclusive com a utilização de
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táticas de guerrilha.
As atividades desenvolvidas pelo MST no sentido da obtenção da
desapropriação da Fazenda Coqueiros têm gerado a necessidade de intensa demanda
na área da segurança pública da região, ocorrendo 06 (seis) boletins de atendimento no
ano de 2004, 27 (vinte e sete) no ano de 2005, 29 (vinte e nove) no ano de 2006 e 41
(quarenta e um) no ano de 200748.
Afigura-se importante, também, em complemento, conferir destaque à
manifestação do então Comandante-Geral da Brigada Militar, Coronel Nilson Nobre
Bueno, prestada no dia 26 de setembro de 2007, quando apontou sua preocupação com
o rumo que as atividades do MST tem tomado, além da necessidade de grandes
investimentos de recursos humanos e financeiros por parte do Estado, que já está com
seus cofres combalidos49:
Pelo Comandante foi manifestada a preocupação da Brigada Militar com os fatos
que estão ocorrendo no Estado envolvendo o MST. Foi dito que está havendo uma
grande movimentação do aludido Movimento de várias partes do Estado em direção à
Fazenda Coqueiros em Carazinho, o que tem gerado a necessidade de muita atenção da
Brigada Militar para evitar um conflito com os fazendeiros. Desde muito tempo tem
sido enorme o investimento de recursos humanos e financeiros por parte da Brigada
Militar para atender o Movimento dos Sem Terra. Em especial, no presente momento,
está havendo necessidade de mobilização muito grande da Brigada Militar com o
deslocamento de efetivo para acompanhar a movimentação do MST em direção à
Fazenda Coqueiros e há uma grande preocupação, pois será necessário destino de um
grande efetivo para eventualmente mediar o encontro do Movimento nas proximidades
da Fazenda Coqueiros em breve. Esta movimentação da Brigada Militar está gerando
grandes gastos financeiros para o Estado. O Comandante informa que em Pedro Osório,
recentemente, houve um conflito do MST com os fazendeiros no qual houve a
necessidade de intervenção da Brigada Militar. Na ocasião houve feridos por parte do
MST, dos fazendeiros e da membros da Brigada Militar, sendo instaurado inquérito para
apuração dos fatos.
Em complemento e na mesma linha de entendimento do Comandante
Geral da Brigada Militar, ressalte-se a preocupação do Comandante do Batalhão da
Brigada Militar de Carazinho com os fatos envolvendo o MST na região. Referiu
Aderli Maximino Dal Bosco, Tenente Coronel da Brigada Militar QOEM50:
48
Fls. 1421/1551.
Fls. 86/87.
50
Fls. 69/70.
49
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Que assumiu o comando da Brigada Militar na região no mês de maio de 2004,
porém já estava atuando no mês de abril do mesmo ano quando ocorreu a primeira
invasão do MST na Fazenda Coqueiros. Desde então, a Brigada Militar vem mantendo
um contingente de soldados no local bastante variado dependendo da necessidade.
Houve a formação de um destacamento do Distrito de Xadrez com um contingente em
torno de dez soldados. Esse destacamento foi instalado em razão do Movimento dos
Sem-Terra estar instalado nas proximidades do local. Esses policiais recebem diárias no
valor de, em torno, de R$ 40,00. Em 11 de abril do corrente ocorreu a última invasão,
tendo sido mobilizados cerca de 490 policiais militares para a operação de retirada.
Também neste caso houve pagamento de diárias pois houve necessidade de trazer
policiais de outras cidades, inclusive do Batalhão de Operações Especiais. Com isso, a
presença do MST naquela região está acarretando custos elevados ao Estado do Rio
Grande do Sul. Além disso, o índice de criminalidade na região aumentou muito,
elevando a atividade da Brigada Militar. Não apenas abigeatos, mas também outros
delitos cresceram em número na região. Destaca também que, com a vinda de policiais
militares de outras regiões, acentua-se a deficiência de efetivo na Brigada Militar que já
é pequeno. Além das turbações que ocorrem com certa freqüência, o depoente informa
terem havido cerca de sete invasões à Fazenda Coqueiros. Informa que a postura dos
“sem-terra” é de hostilidade em relação á Brigada Militar, nas operações e no
patrulhamento. Em várias oportunidades, viaturas foram apedrejadas, uma viatura foi
retira em uma barreira e os Policiais Militares ficaram em cárcere privado por cerca de
duas horas, sem falar no uso de armas de fogo. Já foram registrados disparos de armas
de fogo por parte dos “sem-terra”. Informa que o MST utiliza estratégia de combate,
sendo que na ocupação de uma serraria, o grupo precursor invadiu a propriedade com
armas, para dominar a situação antes da chegada do contingente maior dos “sem-terra”.
Nas operações de retirada por parte da Brigada Militar, as defesas dos acampamentos
compõe-se de paliçadas, lanças, buracos no chão para que os cavalos tropecem, uso de
Coquetéis Molotov. Além disso, o depoente tem notícia de que os “sem-terra” recebem
treinamento especializado para essas atividades. Destaca que, se a Brigada Militar
quisesse ingressar nos acampamentos, necessitaria de um contingente muito maior,
treinado para a tarefa. Informa que, no ano passado, o juiz de direito da Comarca de
Carazinho autorizou uma operação de busca e apreensão no acampamento “Jandir”, mas
quando a operação encontrava-se na fase final do planejamento chegou uma contraordem da Secretaria de Segurança. O depoente considera bastante importante que seja
realizada uma operação desse tipo, restabelecendo a presença do Estado do Rio Grande
do Sul dentro dos acampamentos. Hoje a única presença é da União, fornecendo
alimentos, inclusive cachaça. Informa que a Brigada Militar está como depositária de
cerca de duas mil garrafas de cachaça que foram apreendidas em uma operação. Os
alimentos apreendidos foram reclamados pelo INCRA.
Do depoimento do Tenente Coronel Dal Bosco, Comandante do Batalhão
da Brigada Militar de Carazinho, é relevante destacar a mantença de contingente de
policiais com atuação exclusiva na região ocupada pelo MST nos limites da Fazenda
Coqueiros, o que enfraquece o efetivo já carente para a realização do policiamento nas
demais localidades de abrangência do Batalhão. Em épocas de conflito, há o
deslocamento de policiais de outras regiões do Estado, com o incremento das
despesas, notadamente por meio de diárias, deslocamento, etc. Informou que há uma
postura de hostilidade dos “sem-terra” com relação à Brigada Militar. Este fato foi
constatado em virtude do apedrejamento em várias oportunidades das viaturas,
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inclusive sendo retida uma viatura em uma barreira e os Policiais Militares mantidos
em cárcere privado por cerca de duas horas, além da utilização de armas de fogo pelos
integrantes do MST.
Preocupante, sobremaneira, a informação do aludido Tenente no sentido
de que o MST utiliza estratégia de combate, sendo que na ocupação de uma serraria,
o grupo precursor invadiu a propriedade com armas, para dominar a situação antes
da chegada do contingente maior dos “sem-terra”. Nas operações de retirada por
parte da Brigada Militar, as defesas dos acampamentos compõe-se de paliçadas,
lanças, buracos no chão para que os cavalos tropecem, uso de Coquetéis Molotov.
Além disso, o depoente tem notícia de que os “sem-terra” recebem treinamento
especializado para essas atividades.
Por derradeiro, é fundamental apontar as informações prestadas pelo
Capitão Anibal Menezes da Silveira, Comandante do Batalhão da Brigada Militar de
São Gabriel, onde também há acampamento do MST reivindicando a desapropriação
da Fazenda Southall. Não é diversa a preocupação deste integrante da Brigada
Militar51:
Que no ano de 2004 houve a primeira presença do MST em São Gabriel, ocasião
em que se deu a chamada “Marcha do Abril Vermelho”. Na ocasião, inicialmente o
movimento se estabeleceu em uma propriedade particular, na periferia da cidade, cedida
por um simpatizante. Logo a seguir, passaram a ocupar uma área às margens da RS 630,
lá permanecendo até o ano de 2006. Não tem lembrança precisa mas acredita que por
volta da metade do ano de 2006 os acampados do MST saíram do município de São
Gabriel. No presente ano, no mês de abril, novamente retornaram, saindo de Santana do
Livramento em uma marcha e acampando em uma propriedade particular próxima à
Fazenda Southal. O depoente estima que há um número em torno de 300 pessoas do
MST acampadas neste local. No dia 18 de abril do corrente ano, houve um incidente
entre o MST e a Brigada Militar quando o Movimento efetuou uma manifestação
comemorativa ao Massacre em Eldorado dos Carajás e, após, pretendia-se dirigir em
direção à Fazenda Southal, contrariando decisão judicial no sentido de que deveriam
retornar ao acampamento de origem. Na ocasião houve um embate físico com o
Movimento dos Sem Terra, ocorrendo lesões em policiais e um participante do
Movimento. O policiamento em São Gabriel é feito com o efetivo do esquadrão.
Quando há ações do MST, e se faz necessário, ocorre um reforço no policiamento
provindo do Comando Regional e do BOE de Santa Maria. Nessas ocasiões, há
despesas para o Estado, tais como diárias e alimentação. Quando da movimentação do
MST em 2004, o depoente informa que efetuaram uma revista nos seus membros e um
dos participantes era foragido do presídio de Uruguaiana. Quando da manifestação
ocorrido no último dia 18, houve uma revista nos participantes, sendo apreendidas
várias foices, encontrado um coquetel Molotov, além de diversas estacas pontiagudas.
51
Fls. 73/74.
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Perguntado ao depoente se os membros do MST que se encontram em São Gabriel
aparentam ter algum preparo para confronto físico ou armado, a exemplo de uma
guerrilha, o depoente responde que por ocasião do dia 18 de abril do corrente ano,
quando a Brigada Militar estava efetuando um cordão de isolamento para assegurar que
os participantes do MST retornassem ao acampamento por decisão judicial, pôde
perceber que ocorreu uma atitude premeditada de alguns participantes que enfrentaram
o pelotão da cavalaria com uma técnica organizada e sem improviso. Em determinado
momento, alguns dos participantes levantaram duas taquaras com uma lona preta em
frente à cavalaria fazendo com que os cavalos se assustassem e, com isso, passaram a
enfrentar os policiais que estavam na retaguarda. Em virtude da crise que este fato gerou
e do perigo de um embate físico com proporções muito graves, o depoente determinou
que o policiamento recuasse. Com isso, os membros do MST também recuaram. O
declarante informa que mantém um patrulhamento constante no local, inclusive de
inteligência, mas não há um efetivo fixo.
Mais uma vez, além dos aspectos já levantados, destaca-se a ratificação
da notícia do uso de técnicas de guerrilha por parte de integrantes do MST.
1.17.3. O ACAMPAMENTO “JANDIR”.
O acampamento Jandir, também conhecido como “Acampamento Oziel
Alves”, possui uma área de aproximadamente 8 (oito) hectares, faz divisa com a
Fazenda Coqueiros e nele estão instaladas cerca de 90 (noventa) pessoas. Situa-se na
estrada de ligação entre os municípios de Carazinho e Coqueiros do Sul, ficando a 2
(dois) km da primeira cidade
Os proprietários da área são Alceu Lamb e Jandir Celso Wiebrantz.
Jandir, ex-vereador de Coqueiros do Sul, arrendou a área para Dormelio Franciozi, este
na verdade um preposto do MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e
do MPA - Movimento dos Pequenos Agricultores, ambos integrantes da Via
Campesina.
A base do MST situada no acampamento Jandir é freqüentemente
utilizada para ações criminosas em Coqueiros do Sul, especialmente contra a Fazenda
Coqueiros.
1.17.4. O ACAMPAMENTO “SERRARIA”.
Também conhecido como “Sepé Tiarajú” ou “Passo do Cabrito”, o
Acampamento Serraria abriga um total de aproximadamente 50 (cinqüenta) pessoas,
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sendo 25 (vinte e cinco) homens, 15 (quinze) mulheres e 10 (dez) crianças. A área
apresenta 3 (três) hectares e nela estão montadas 70 (setenta) barracas.
Situa-se a 4 (quatro) km de Carazinho, na estrada de ligação entre aquele
Município e o Distrito de Xadrez, este pertencente a Coqueiros do Sul. Também
lindeiro à Fazenda Coqueiros, fica bastante próximo da sede daquela propriedade e é
igualmente utilizado de forma reiterada para ações criminosas na região.
O proprietário das terras do Acampamento Serraria é Arno Maier,
também preposto dos movimentos Via Campesina, MST e MPA.
1.18. CRIMES PRATICADOS NO ÂMBITO NA FAZENDA
COQUEIROS E EM SUAS ADJACÊNCIAS (FORMAÇÃO DE QUADRILHA,
ESBULHO
POSSESSÓRIO,
DESOBEDIÊNCIA,
FURTO,
ROUBO,
SEQÜESTRO, AMEAÇA, DANO QUALIFICADO, INCÊNDIO, CRIMES
AMBIENTAIS, CRIMES CONTRA A SEGURANÇA NACIONAL E OUTROS).
Através da análise dos inúmeros fatos apontados nesta inicial, verifica-se
que os integrantes do MST e, em especial, aqueles residentes nos acampamentos Jandir
e Serraria, não hesitam em praticar inúmeros crimes visando atingir seus objetivos. As
ocorrências policiais juntadas52, as denúncias já oferecidas pelo Ministério Público53 e
as inúmeras notícias jornalísticas constantes nos autos evidenciam que os acampados
elegeram a prática do ilícito como forma de luta.
Dentre os crimes praticados, destaca-se, por óbvio, o esbulho
possessório, cujo tipo penal vai a seguir transcrito:
Art. 161 § 1º, II, do Código Penal:
Esbulho possessório
II - invade, com violência a pessoa ou grave ameaça, ou mediante concurso de mais de
duas pessoas, terreno ou edifício alheio, para o fim de esbulho possessório.
§ 2º - Se o agente usa de violência, incorre também na pena a esta cominada.
Afora esse delito, diversas outras infrações penais são corriqueiramente
praticados pelos integrantes do MST e entidades afins: lesões corporais (art. 129 do
52
Fls. 1421/1551.
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Código Penal), furto (art. 155), roubo (art. 157), constrangimento ilegal (art. 146),
seqüestro (privação de liberdade – art. 148), ameaça (art. 147), violação de domicílio
(art. 150), dano qualificado (art. 163, parágrafo único, I e II), resistência (art. 329),
desobediência (art. 330), formação de quadrilha (art. 288), incêndio (art. 250), tentativa
de homicídio (art. 121, c/c art. 14, II), alteração de limites (art. 161, caput) e crimes
ambientais (Lei nº 9.605/98).
Vale observar o seguinte quadro, que demonstra os registros de
ocorrências relativas a ilícitos penais praticados pelos membros do MST na Fazenda
Coqueiros e em suas adjacências:
Data
Fato
12/05/2004 Furto e dano em veículo.
Crimes(s)
Furto
14/06/2006 Corte de cerca, derrubada de árvores Furto, crime
e furto de arame.
ambiental e
dano
23/06/2004 Integrantes do MST invadiram a Esbulho
fazenda, iniciaram a plantação de possessório e
uma horta e roubaram uma máquina roubo
fotográfica do proprietário.
14/07/2004 Furto de gado – abigeato.
Furto
21/07/2004 Furto de gado – abigeato.
Furto
26/07/2004 Integrantes do MST derrubaram Esbulho
parte da cerca e invadiram a fazenda. possessório e
dano
11/08/2004 Após reintegração de posse, um Lesões
e
funcionário conduzindo um trator se corporais
aproximou do acampamento do dano.
MST, lindeiro à propriedade, para
lavrar a área antes invadida, tendo
sido apedrejado pelos acampados.
Restou lesionado e o trator foi
danificado.
14/08/2004 Furto de gado – abigeato.
Furto
01/09/2004 MST invadiu a fazenda em dois Esbulho
locais distintos.
possessório
06/09/2004 Furto de gado – abigeato.
Furto
10/09/2004 Acampados do MST desobedeceram Desobediênci
um interdito proibitório, derrubaram a,
esbulho
a
cerca
e
ingressaram
na possessório e
propriedade.
dano.
53
Fls. 727/813.
Local
Boletim de
Ocorrência
ou Boletim
de
Atendimento
Fazenda Coqueiros 2047
Fazenda Coqueiros 36072
Fazenda Coqueiros 2699
Fazenda Coqueiros 3152
Fazenda Coqueiros 3284
Fazenda Coqueiros 870551
Fazenda Coqueiros 3677
Fazenda Coqueiros 3799
Fazenda Coqueiros 611221
Fazenda Coqueiros 4116
Fazenda Coqueiros 4206
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17/11/2004 Furto de gado – abigeato.
21/11/2004 Incendiaram um pontilhão de
madeira da fazenda.
22/11/2004 Furto de gado – abigeato.
02/12/2004 MST incendiou 5 hectares de soja,
1,5 hectare de capoeira, um taquaral
e 50 metros de palanque (cerca).
03/02/2005 Integrantes do MST desobedeceram
um interdito proibitório, derrubaram
a cerca, ingressaram na propriedade
e destruíram cerca de 1 hectare de
milho.
04/02/2005 Membros do MST, instalados em
acampamento lindeiro, apedrejaram
veículos do proprietário da fazenda.
11/02/2005 No momento em que estava
plantando soja, homens, mulheres e
crianças do acampamento do MST
atacaram o tratorista com pedras e
esferas de metal atiradas com
bodoques (estilingues), derrubaramno e agrediram-no com pontapés,
quebrando-lhe a clavícula. A
seguir, deram pauladas na lataria do
trator, quebraram os faróis, o cano
de combustível, colocaram terra no
cárter, furaram os pneus da
plantadeira e quebraram as caixas de
sementes.
28/02/2005 Incendiaram cerca de 2 hectares de
uma área de reflorestamento.
31/07/2005 Cortaram 12 partes da cerca, cada
uma com cerca de 800 (oitocentos)
metros.
19/08/2005 Furtaram a bateria de um trator.
Furto
Incêndio
Fazenda Coqueiros 5585
Fazenda Coqueiros 5641
Furto
Incêndio
Fazenda Coqueiros 5675
Fazenda Coqueiros 613342
25/08/2005 Furto de gado – abigeato.
28/08/2005 Acampados do MST cortaram parte
da cerca e ameaçaram funcionários
da fazenda.
03/09/2005 Furto de gado (abigeato) e de uma
corrente.
16/09/2005 Furtaram
gado
(abigeato),
e
danificaram um trator e cortaram
17/09/2005 uma cerca de arame.
Foram
encontrados cartuchos de arma de
fogo no local.
24/09/2005 Furto de gado – abigeato.
08/01/2006 Acampados do MST colocaram fogo
em cerca de 20 (vinte) hectares da
fazenda.
25/01/2006 Flagrados furtando milho, os
acampados do MST efetuaram
disparos de arma de fogo contra uma
guarnição da BM.
Furto
Ameaça
dano.
Desobediênci Fazenda Coqueiros 1243881
a,
esbulho
possessório e
dano.
Dano
Lesões
corporais
dano.
Fazenda Coqueiros 39339 e
BA 1462240
e
Fazenda Coqueiros 632 e
BA 1779622
Incêndio
dano.
Dano
e Fazenda Coqueiros 995
Furto
Fazenda Coqueiros 256304 e
BA 1458096
Fazenda Coqueiros 464951
e Fazenda Coqueiros 41443
Fazenda Coqueiros 613280
Furto
Furto e dano.
Furto
Incêndio
Fazenda Coqueiros 41444 e
BA 1815441
Fazenda Coqueiros BA 1816129
Fazenda Coqueiros 613321
Fazenda Coqueiros 27371 e
BA 1467568
Furto
e Fazenda Coqueiros 1466138
resistência.
BA 097041
89
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
01/02/2006 Danificaram
4
máquinas
a
colheitadeiras que realizavam a
03/02/2006 colheita
de
milho,
afixando
previamente nas espigas, com fios e
arames, barras de ferro com bitola de
16 mm e comprimento entre 20 e 30
cm
28/02/2006 Membros do MST invadiram uma
madeireira situada dentro da
fazenda, renderam os funcionários
apontando-lhes
revólveres
e
espingardas e, passo seguinte,
subtraíram equipamentos agrícolas,
uma arma de fogo e um talonário de
notas fiscais.
11/03/2006 Grupo do MST invadiu a chácara e
furtou alimentos, eletrodomésticos,
bois, galinhas, roupas, armas de fogo
e destruíram uma plantação de
mandioca. Posteriormente, os líderes
do movimento ameaçaram o
proprietário para que não registrasse
o fato.
02/04/2006 Furto de gado – abigeato.
03/04/2006 MST queimou cerca de 3 hectares da
fazenda.
11/04/2006 Furtaram a bateria da colheitadeira,
invadiram a fazenda e ameaçaram
funcionários que estava trabalhando.
17/04/2006 Acampados do MST invadiram a
serraria da fazenda, destruíram as
cercas de acesso e derrubaram uma
araucária e outras árvores nativas.
19/04/2006 Invadiram a fazenda e, quando
retirados pela BM, atearam fogo na
madeira e na vegetação nativa.
23/04/2006 Membros do MST invadiram a
fazenda, atearam fogo em 3 casas lá
existentes e, ante a aproximação da
BM, apedrejaram a guarnição.
24/04/2006 Colocaram fogo em uma casa de
madeira.
25/04/2006 Atearam fogo em uma casa de
madeira e no posto da BM.
25/04/2006 Furto de gado – abigeato – e de uma
aparelho de CD instalado em uma
colheitadeira.
Dano
Fazenda Coqueiros BA 1467570
Roubo
Fazenda Coqueiros 1107
Furto
ameaça.
Furto
Incêndio
e Chácara
Céu, 1350
situada ao lado da
Fazenda
Coqueiros.
Fazenda Vitória, 1860
próximo à Fazenda
Coqueiros.
Fazenda Coqueiros 1873
Furto, ameaça Fazenda Coqueiros 2065
e
esbulho
possessório.
Crime
Fazenda Coqueiros 2168
ambiental e
dano.
Esbulho
Fazenda Coqueiros 2195
possessório e
incêndio.
Incêndio
e Fazenda Coqueiros 050218
resistência.
Incêndio
dano.
Incêndio
dano.
Furto
e Fazenda Coqueiros 052029 e
BA 3239762
e Fazenda Coqueiros 050219 e
BA 3239763
Fazenda Vitória, 2328
próximo à divisa
com a Fazenda
Coqueiros
26/04/2006 Flagrados pela BM furtando madeira Tentativa de Fazenda Coqueiros 65159 e
da serraria, abandonaram o local e furto.
BA 3241255
avisaram aos policiais de que
retornariam para concretizar o furto.
28/04/2006 Furto de gado – abigeato.
Furto
Fazenda Coqueiros BA 3286021
90
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
30/04/2006 Furtaram gado e atearam fogo em
1,5 hectare de soja, em galpões da
serraria da fazenda e em madeira que
estava estocada.
03/05/2006 Invadiram a fazenda, desmancharam
um galpão, furtaram sua madeira e
reconstruíram
o
galpão
no
acampamento do MST.
04/05/2006 Furtaram cerca de 5 m³ de madeira.
05/05/2006 Derrubaram diversas árvores nativas,
atearam fogo nas margens do açude,
cortaram parte da cerca e invadiram
a área.
16/05/2006
05/06/2006
20/06/2006
22/06/2006
14/07/2006
18/07/2006
19/07/2006
Furto
incêndio.
e Fazenda Coqueiros 2387
Furto e
Fazenda Coqueiros BA 3286024
desobediência
Furto
Fazenda Coqueiros
Crime
Fazenda Vitória,
ambiental,
lindeira à Fazenda
incêndio,
Coqueiros.
dano
e
esbulho
possessório.
Invadiram a área com um trator.
Esbulho
Fazenda Coqueiros
possessório.
Mataram um novilho com um tiro de Dano
Fazenda Coqueiros
espingarda calibre 12 na cabeça.
Integrantes
do
acampamento Esbulho
Fazenda Coqueiros
“Jandir” do MST invadiram a possessório e
fazenda, construíram 3 torres de ameaça.
observação
e
ameaçaram
os
funcionários.
Aproximadamente 70 integrantes do Ameaça
Fazenda Coqueiros
MST, armados com foices, facões,
paus e pedras, cercaram uma viatura
da BM e ameaçaram virá-la e
queimá-la.
Derrubaram 12 (doze) km de cerca e Esbulho
Fazenda Coqueiros
moirões, derrubaram árvores e possessório,
construíram torres de observação dano,
dentro da fazenda.
desobediência
e
crime
ambiental.
Invadiram a fazenda e quando Esbulho
Fazenda Coqueiros
saíram levaram moirões da cerca possessório,
anteriormente derrubada.
desobediência
e furto.
Abateram gado, furtaram parte da Furto
e Fazenda Coqueiros
carne e queimaram cerca de 5 incêndio.
hectares de milho e mata nativa.
20/07/2006 Grupo do MST invadiu a fazenda
brandindo foices e passou a gritar
palavras de guerra. Posteriormente,
incendiou cerca de 15 hectares de
milho, mata nativa e da área de
reflorestamento. Ante a aproximação
da BM, apedrejaram a viatura.
24/07/2006 Invadiram a área e danificaram 5
(cinco) km de cerca nova.
31/07/2006 Furto de gado – abigeato.
05/08/2006 Danificaram cerca de 3,5 km de
Esbulho
possessório,
desobediência
, incêndio e
dano.
2495
2498
2765
BA 645096
3491
BA 1788594
1793608 e
BA 2939595
4164 e
BA 1817240
4196 e
BAs
1817241,
1817242 e
1817243.
Fazenda Coqueiros 4193,
4195 e 4260.
Desobediênci Fazenda Coqueiros 4333
a e dano.
Furto
Fazenda Coqueiros 4451
Dano
Fazenda Coqueiros 4549
91
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
cerca.
07/08/2006 Ameaçaram um funcionário do Ameaça
INCRA que fora ao local para fazer
o recadastramento rural da área.
09/08/2006 Destruíram a cerca junto ao
acampamento “Jandir”, invadiram a
fazenda, construíram guaritas de
observação e duas privadas de
madeira na área invadida.
09/08/2006 Furtaram gado e, ante a aproximação
de uma guarnição da BM,
apedrejaram a viatura.
09/08/2006 Furtaram gado – abigeato – e
danificaram a cerca.
14/08/2006 Membros do MST cercaram 3
viaturas da BM, apedrejaram-nas e
causaram lesões corporais em um
tenente.
22/08/2006 Invadiram a fazenda, colocaram
bandeiras do MST e construíram
uma guarita de observação no local.
22/08/2006 Atearam fogo em cinco casas da
fazenda, instalaram uma barraca de
lona na divisa com o acampamento
do MST e passaram a lavrar uma
faixa de terra.
22/08/2006 Furto de gado – abigeato.
23/08/2006 Durante uma invasão, incendiaram
48 hectares de resteva de aveia.
25/08/2006 Invadiram a fazenda e passaram a
lavrar a terra.
26/09/2006 Furto de gado – abigeato.
28/09/2006 Dispararam foguetes contra um
funcionário da fazenda.
02/10/2006 Furto de gado – abigeato.
18/10/2006 Retiraram uma cabeça de gado da
fazenda, tendo o animal sido
atingido na cabeça por um disparo
de arma de fogo e sido localizado
em outra propriedade
20/10/2006 Invadiram a área e passaram a lavrar
a terra.
Dano,
desobediência
e
esbulho
possessório.
Acampamento
4572
“Jandir”, ao lado
da
Fazenda Coqueiros
Fazenda Coqueiros 4663
Furto, dano e Fazenda Coqueiros 4664
resistência.
Furto e dano.
Lesões
corporais
dano.
e
Fazenda Vitória, 4970
ao lado da Fazenda
Coqueiros
Fazenda Coqueiros 4740
Esbulho
Fazenda
possessório e Coqueiros, divisa
desobediência com acampamento
“Jandir”.
Esbulho
Fazenda
possessório,
Coqueiros, divisa
desobediência com
o
e incêndio.
acampamento
“Serraria”.
Furto
Fazenda Coqueiros
Incêndio
Fazenda Coqueiros
Esbulho
possessório.
Furto
Crime
de
perigo.
Furto
Tentativa de
furto e dano.
4884
4893
4933
4915
Fazenda Coqueiros 4969
Fazenda Coqueiros 5640
Fazenda Coqueiros 5953
Fazenda Coqueiros 5775
Fazenda Coqueiros 6116
Esbulho
Fazenda Coqueiros
possessório e
desobediência
20/10/2006 Colocaram artefatos de metal Desobediênci Acesso à Fazenda
(miguelitos) no acesso à fazenda a
Coqueiros
para perfurar pneus de veículos.
22/10/2006 Atearam fogo em 30 (trinta) hectares Incêndio
e Fazenda Coqueiros
de milho.
dano.
27/20/2006 Membros do MST, armados com Ameaça,
Fazenda Coqueiros
facões, fundas, foices e porretes de incêndio
e
madeira, cercaram e apedrejaram os dano.
funcionários que estavam plantando
6213
6215
6214
6324
92
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
27/10/2006
15/11/2006
27/11/2006
29/11/2006
10/01/2007
10/01/2007
a
15/01/2007
02/02/2007
13/03/2007
04/04/2007
06/04/2007
07/04/2007
07/04/2008
11/04/2007
soja no local, obrigando-os a fugir.
Caminhões carregados de sementes e
adubos e uma semeadeira ficaram no
local e foram incendiados.
Furto de gado – abigeato.
Invadiram a fazenda e atearam fogo
em cerca de 4 hectares.
Danificaram cerca de 2,3 km (dois
quilômetros e trezentos metros) de
cerca, furtaram gado e instalaram 3
armadilhas de arame.
Invadiram a fazenda e passaram a
capinar.
Furto
Incêndio
Fazenda Coqueiros 6338
Fazenda Coqueiros 6782
Furto e dano.
Fazenda Coqueiros 7252
Esbulho
Fazenda Coqueiros 7012
possessório e
desobediência
Derrubaram 50 m de cerca e Dano
e Fazenda Coqueiros 297
mataram um boi.
tentativa de
furto.
Furtaram partes de transformadores Furto, dano e Fazenda Coqueiros 746
da usina elétrica da fazenda, ameaça.
danificaram equipamentos, furtaram
cerca de 300 m de fio de cobre e um
boi e investiram contra funcionários
da fazenda e contra uma guarnição
da BM.
Cerca de 150 membros do MST Esbulho
Fazenda Coqueiros BA 091958
invadiram a fazenda, passaram a possessório,
lavrar a terra e colocaram gado para desobediência
pastar no local. Derrubaram 48 , furto e dano.
árvores de pinus, utilizando motoserra e machados.
Integrantes do MST destruíram o Furto e dano Fazenda Coqueiros 2048
prédio e os equipamentos da usina
elétrica da fazenda, bem como
furtaram objetos.
Invadiram a fazenda e colheram Esbulho
Fazenda Coqueiros 2655
cerca de 5 (cinco) hectares de soja.
possessório,
desobediência
e furto.
Invadiram a fazenda, colheram soja Esbulho
Fazenda Coqueiros 2873
e abandonaram o local, indo em possessório,
direção ao acampamento “Jandir”.
desobediência
e furto.
Invadiram a fazenda e destruíram Esbulho
Fazenda Coqueiros 2887
aproximadamente 40 hectares de possessório,
soja.
desobediência
e dano.
Invadiram a fazenda e furtaram uma Esbulho
Fazenda Coqueiros 2888
cabeça de gado..
possessório,
desobediência
e furto.
Invadiram a fazenda, ocuparam a Esbulho
Fazenda Coqueiros 3698, 3574 e
2889.
sede, os galpões e as casas dos possessório,
empregados, furtaram objetos e dano,
BA 1465459
danificaram os imóveis. Furtaram desobediência
também pertences dos policiais e furto
93
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
militares da guarnição da BM,
incluindo capacetes e fardamentos
completos.
11/04/2007 Membros do MST invadiram um
alojamento da BM instalado na
fazenda, expulsaram os policiais
militares do local e furtaram suas
fardas e outros objetos.
12/04/2007 Atacaram policiais que estavam
dentro da fazenda, ameaçaram-nos e
desferiram-lhes tiros.
12/04/2007 Cortaram
árvores
nativas
e
construíram barracos.
20/04/2007
20/04/2007
30/04/2007
01/05/2007
11/05/2007
22/05/2007
31/05/2007
04/06/2007
09/06/2007
19/06/2007
22/06/2007
24/06/2007
02/07/2007
02/07/2007
Furto, ameaça Fazenda Coqueiros 2832
e
desobediência
Ameaça
resistência
e Fazenda Coqueiros 2855
Crime
Fazenda Coqueiros 2867
ambiental e
furto.
Ingressaram na fazenda, incendiaram Incêndio,
Fazenda Coqueiros 3072
cerca de 8 a 10 hectares de soja desobediência
BA 1464931
pronta para a colheita.
e dano.
Serraram cerca de 50 % da parte de
baixo de uma ponte, provavelmente
com moto-serra.
Mataram um boi com o emprego de Dano
Fazenda Coqueiros 3213
arma de fogo.
Ingressaram
na
fazenda
e Incêndio,
Fazenda Coqueiros 3365 e
incendiaram aproximadamente 2 desobediência
BA 1810021
hectares de soja pronta para a e dano.
colheita.
Invadiram a área, furtaram 3 cabeças Furto, dano e Fazenda Coqueiros 3408
de gado e feriram 5 novilhas desobediência
mediante golpes de facões e foices e
disparos de arma de fogo.
Ingressaram na área, efetuaram Tentativa de Fazenda Coqueiros 3695
disparos contra os funcionários, homicídio,
mataram um boi, feriram outro e desobediência
causaram danos na vegetação nativa. , dano e crime
ambiental.
Invadiram a fazenda, furtaram 5 bois Furto,
Fazenda Coqueiros 4025
e feriram outros 2.
desobediência
e dano.
Feriram 2 bois a tiros.
Dano
Fazenda Coqueiros 4212
Furto de gado – abigeato.
Furto
e Fazenda Coqueiros 4275 e
desobediência
BA 1817167
Destruíram uma porteira da cerca.
Dano
Fazenda Coqueiros 4464
Desferiram tiros no gado e nos Tentativa de Fazenda Coqueiros 4671 e
policiais militares.
homicídio,
BA 5544170
desobediência
e dano.
Furtaram madeira e construíram um Furto,
Fazenda Coqueiros 4941
pontilhão.
esbulho
possessório e
desobediência
Furtaram gado – abigeato.
Furto
Fazenda Coqueiros 4943
Derrubaram 50 (cinqüenta árvores). Dano e crime Fazenda Coqueiros 4990
ambiental.
Invadiram a fazenda.
Esbulho
Fazenda Coqueiros 4991
possessório e
94
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
27/08/2007 Furtaram 3,8 km (três quilômetros e
oitocentos metros) de cerca e
palanques e incendiaram pastagens
31/08/2007 Furtaram aproximadamente 2 (dois)
km de cerca, incluindo arame,
palanques e trama.
16/09/2007 Explodiram os tratores.
20/09/2007
21/11/2007
21/11/2007
22/11/2007
25/11/2007
02/12/2007
10/12/2007
15/12/2007
19/12/2007
19/12/2007
19/12/2007
20/12/2007
14/01/2008
14/01/2008
26/01/2008
desobediência
Furto, dano, Fazenda Coqueiros 6404
incêndio
e
desobediência
Furto
Fazenda Coqueiros 6496
Dano
Fazenda Coqueiros 6897
qualificado e
explosão.
Destruíram 7,5 km (sete mil e Dano
Fazenda Coqueiros 7015
quinhentos metros) de cerca.
Colocaram fogo em 14 hectares da Dano
e Fazenda Coqueiros 8562
lavoura de milho.
incêndio.
Furto de gado – abigeato.
Furto
Fazenda Coqueiros 8573
Colocaram gado para pastar nas Esbulho
Fazenda Coqueiros 8572
terras da fazenda.
possessório,
desobediência
e furto.
Furtaram aproximadamente 450 m Furto
Fazenda Coqueiros 8685
de cerca.
Furtaram 300 m de cerca.
Furto
Fazenda Coqueiros 8889
Queimaram 25 (vinte e cinco) Incêndio
e Fazenda Coqueiros 9228
hectares de milho.
dano.
Queimaram 8 hectares de milho, 21 Incêndio,
Fazenda Coqueiros 9285
hectares de floresta de pinus, 6 dano
hectares de eucalipto e 6 hectares de qualificado e
braquiaria.
crime
ambiental.
Incendiaram 25 hectares de milho e Incêndio,
Fazenda Coqueiros 9432
de floresta.
dano
qualificado e
crime
ambiental.
Destruíram 1,2 km de cerca e Furto e dano. Fazenda Coqueiros 9433
furtaram parte do arame.
Furtaram madeira das árvores Furto e crime Fazenda Coqueiros 9434
nativas.
ambiental.
Queimaram a lavoura de milho.
Incêndio
Fazenda Coqueiros 9458
Inicialmente, uma vanguarda armada Esbulho
Fazenda Coqueiros 332
invadiu a sede da fazenda rendendo possessório,
os funcionários mediante o emprego desobediência
roubo
de armas de fogo, prenderam-nos no e
banheiro,
ameaçaram-nos
e qualificado.
subtraíram-lhes dinheiro e objetos. A
seguir, cerca de 700 integrantes do
MST, em 12 ônibus, invadiram a
área e lá ficaram.
Incendiaram cerca 4 hectares de Incêndio
e Fazenda Coqueiros 358
floresta de pinus.
dano.
Cercaram um tratorista, apontaram- Ameaça,
Fazenda Coqueiros 670
lhe armas de fogo e obrigaram-no a tentativa de
fugir. A seguir, colocaram artefatos explosão
e
explosivos no trator e acionaram o dano.
pavio, porém o dispositivo falhou.
95
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
07/02/2008 Colheram
e
furtaram
aproximadamente 60 sacos de milho.
07/03/2008 Efetuaram disparos de arma de fogo
contra
um
funcionário.
Posteriormente, disseram-lhe que
iriam invadiram a fazenda e “pegar”
todos os funcionários, porque
“aquela terra é nossa”. O funcionário
ficou
amedrontado
e
pediu
demissão.
26/03/2008 Colocaram uma armadilha de arames
para prender gado, tendo um boi
ficado preso, ferido e desidratado.
26/03/2008 Construíram dentro da área da
fazenda uma guarita de controle.
Utilizaram madeira nativa cortada
nos matos existentes no local.
Furto
Ameaça
crime
perigo.
Fazenda Coqueiros 1138
e Fazenda Coqueiros 1806
de
Dano
e Fazenda Coqueiros 2355
desobediência
Esbulho
Fazenda Coqueiros
possessório,
desobediência
, furto e crime
ambiental.
07/04/2008 Durante a noite, efetuaram diversos Disparo
de Acampamento
disparos de arma de fogo dentro do arma de fogo. Serraria, ao lado da
Acampamento Serraria.
Fazenda Coqueiros
17/04/2008 Adultos e crianças do MST saíram Esbulho
Fazenda Coqueiros
do Acampamento Jandir, invadiram possessório e
parte da fazenda, construiram desobediência
barracas, colocaram cruzes e uma
bandeira do movimento.
30/04/2008 Cortaram 2500 metros de cerca, Furto,
Fazenda Coqueiros
abateram dois bois a tiros sem nada desobediência
levar da carne, feriram um animal na ,
crueldade
cabeça e mataram e furtaram a carne contra
de outro boi.
animais
e
disparo
de
arma de fogo.
2357
2734
2931
3992
As denúncias já oferecidas54 pelo Ministério Público junto ao Poder
Judiciário Estadual dessa Comarca igualmente denotam a ação criminosa dos sem-terra
no âmbito da Fazenda Coqueiros, conforme demonstrativo que segue:
Fato (s)
Crime (s)
Data
Furto qualificado (14 vezes); 12/05/2004 a
roubo
qualificado
pelo 05/05/2006
emprego de arma, concurso
de pessoas e restrição de
liberdade (2 vezes); dano
qualificado;
incêndio
qualificado (2 vezes); crimes
ambientais (cinco vezes).
Membros do MST, Porte
de
munição
e 11/04/2007
quando retirados da receptação qualificada.
Inúmeros
delitos
contra a liberdade
pessoal, contra o
patrimônio e contra
a flora praticados
por invasores do
MST.
54
Fls. 727/813.
Local
Fazenda
Coqueiros;
Passo
dos
Cabritos
Fazenda
Coqueiros
Número de
denunciados
4
3
96
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
fazenda invadida,
estavam na posse de
munição e de 3
colchões furtados
da Brigada Militar.
Integrantes
do
MST, sabendo que
existia
interdito
proibitório vedando
a
invasão
da
Fazenda Coqueiros,
descumpriram
a
ordem judicial.
Preso pela BM
furtando gado, o
membro do MST
atribuiu-se
falsa
identidade
para
evitar
sua
identificação
e
ocultar antecedentes
criminais.
Após uma invasão
promovida
pelo
MST,
cumprindo
mandado de busca e
apreensão
no
acampamento
policiais
localizaram
uma
espingarda
sem
numeração
e
objetos furtados da
Fazenda Coqueiros.
Integrante do MST,
no exercício de
atividade comercial,
adquiriu, recebeu e
transportou 3.660
kg de milho furtado
da
Fazenda
Coqueiros
Desobediência
Furto qualificado
identidade.
e
11/04/2007
Fazenda
Coqueiros
61
falsa 30/06/2007
Fazenda
Coqueiros
1
Porte de arma e receptação.
17/01/2008
Acampamento
“Serraria”.
1
Receptação qualificada.
07/02/2008
Acampamento
“Jandir”.
1
Também o Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra
membros do MST55, em razão de crimes contra a segurança nacional perpetrados no
entorno da Fazenda Coqueiros entre os anos de 2004 e 2006:
55
Ação Penal nº 2007.71.18.000178-3 (RS), da Justiça Federal de Carazinho – RS, atualmente tramitando
sob sigilo.
97
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Fato
Enquadramento penal
Integraram grupamentos que tinham por objetivo a mudança do
Estado de Direito, por meios violentos e com emprego de grave
ameaça.
Tentaram mudar, com emprego de violência e grave ameaça, a
ordem vigente e o Estado de Direito.
Devastaram, saquearam, roubaram, seqüestraram, mantiveram em
cárcere privado, incendiaram e depredaram, por inconformismo
político.
Incitaram os demais acampados do MST à subversão,
conclamando-os a resistir à ação da Brigada Militar e a usar de
violência e grave ameaça contra os policiais. Além disso, também
incitaram os acampados a cometer uma série de crimes na região, a
fim de forçar o Governo Federal a desapropriar aquela fazenda.
Art. 16 da Lei nº 7.170/83.
Art. 17, caput, da Lei nº
7.170/83.
Art. 20, caput, da Lei nº
7.170/83.
Art. 23, I, da Lei nº 7.170/83.
Convém lembrar que o número de processos penais desencadeados pelo
Ministério Público somente não é maior porque os crimes de esbulho possessório e dano
em sua forma simples são de ação penal privada, dependendo do ajuizamento de ação
por parte da própria vítima. Além disso, os crimes de lesões corporais leves e ameaça
dependem de representação e são considerados pela Lei de menor potencial ofensivo,
cabendo transação penal no âmbito do Juizado Especial Criminal.
1.19. DANOS EM OUTRAS TERRAS DA REGIÃO.
O Ministério Público salienta que os danos provocados pelo MST em
ações desencadeadas a partir dos acampamentos Jandir e Serraria não se restringem à
Fazenda Coqueiros, mas incluem outras propriedades da região. Em especial, observase a grande destruição provocada pelo movimento na chácara pertencente a Moacir
Cavol, situada na localidade de Passo dos Cabritos, Distrito de Xadrez.
De fato, a propriedade de Moacir passou a ser invadida e depredada pelos
membros do MST a partir do ano de 2006. Dentre outras ações criminosas, os
acampados arrancaram milho e mandioca plantados, furtaram gado, galinhas, arames e
ferramentas, mataram filhotes de perus, patos e gansos, atearam fogo nas cercas,
arrombaram portas, derramaram óleo diesel nos móveis, quebraram janelas, vidros, etc.
Cumpre registrar que o proprietário recebeu insistentes tentativas de compra por parte
dos membros do MST, que afirmaram estar dispostos a pagar à vista pelas terras e que
98
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
“dinheiro não é problema”. O grande interesse do movimento por aquela área deve-se
ao fato de que faz divisa com a Fazenda Coqueiros e nela existe uma nascente de água.
Cabe observar, ainda, que os integrantes do MST desviaram em direção ao seu
acampamento a referida nascente de água e que, após Moacir Cavol ter registrado o fato
na Delegacia de Polícia local, disseram-lhe que “não custava nada matar um”56.
Outra propriedade de Coqueiros do Sul foi recentemente atacada, mais
precisamente no dia 04 de junho de 2008. Naquela data, na Fazenda Vitória, que faz
divisa com a Fazenda Coqueiros, duas máquinas semeadeiras foram danificadas, sendo
que em uma delas quebraram todos os canos de distribuição de sementes, esvaziaram
pneus e cortaram mangueiras hidráulicas, enquanto na outra danificaram 13 (treze)
tampões das caixas de adubo57. No item 1.18, constam outras ações criminosas
praticadas contra a mesma propriedade.
1.20. DANOS AMBIENTAIS.
As diversas ocorrências acima referidas (item 1.18.) evidenciam que os
integrantes do MST não têm nenhum respeito ou consideração pela produção agrícola
ou pelo meio ambiente, não se constrangendo em cortar a flora nativa ou em promover
incêndios em vastas áreas plantadas.
Acerca de fatos dessa natureza, o Ministério Público ajuizou a ação civil
pública nº 1050006285958, ora em tramitação na 3º Vara Cível de Carazinho, em
decorrência do dano provocado em 3,74 hectares da área de preservação permanente da
Fazenda Coqueiros, ocorrido por ocasião de invasão realizada naquele local. Convém
observar que, afora o movimento ter provocado o dano ambiental em questão, suas
lideranças não aceitaram repará-lo, recusando proposta de Compromisso de
Ajustamento ofertada pelo órgão ministerial.
Na mesma Vara tramita a ação civil pública de nº 1060004278759,
ajuizada pelo Ministério Público contra o MST, em razão de este ter, no dia 02 de
56
O termo de declarações, registros de ocorrências e fotografias constam nas fls. 1858/1891.
Fl. 2128.
58
Fls. 656/662.
59
Fls. 1975/1983.
57
99
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
dezembro de 2004, dolosamente queimado três áreas da Fazenda Coqueiros, atingindo
um total de 9,42 hectares de lavoura e vegetação típica de banhado.
No período compreendido entre fevereiro e março de 2006, o movimento
ocupou a Fazenda Coqueiros e novamente causou notável degradação ambiental, ao
cortar grande quantidade de vegetação nativa, depositar significativo montante de lixo
doméstico, inclusive garrafas de cachaça, bem como ao queimar lixo e borracha. Tais
fatos motivaram o ajuizamento da ação civil pública de nº 1060005104260, a final
julgada procedente, tendo o MST sido condenado a indenizar os danos causados e a
pagar as custas processuais61.
Tramita na 1º Vara Cível desta Comarca a ação civil pública de nº
1070006825762, promovida pelo Ministério Público em razão do corte de árvores
nativas, consistentes em canela, branquilho, timbó e taquara, efetuado pelo MST por
ocasião da invasão da Fazenda Coqueiros realizada no dia 20 de julho de 2006.
Convém observar que, além dos danos causados no âmbito da Fazenda
Coqueiros e em suas adjacências, o MST, entre os anos de 2004 e 2007, causou
significativo prejuízo ambiental às margens da BR 386, em frente à propriedade de
Reneu Alberto Ries, ao provocar corte de vegetação nativa e queimadas em área de
preservação permanente, em especial o corte seletivo de espécies de angico, açoitacavalo, coqueiro, araucária, canela, grápia, pitangueira, camboatá, timbó, cedro, araçá,
dentre outras, com pequeno, médio e grande porte. Tais fatos ensejaram o ajuizamento
da ação civil pública de nº 1070005925863, que corre na 2º Vara Cível de Carazinho.
Seguem algumas fotografias referentes a danos ambientais causados pelo
MST na Fazenda Coqueiros:
Lavoura incendiada (15/11/2006):
60
Fls. 664/671.
A sentença, de lavra da Dra. Marlene Marlei de Souza, Juíza de Direito, condenou o MST a pagar a
quantia de R$ 3.783,00, devidamente corrigida, ao Fundo Municipal do Meio Ambiente (fls. 613/617).
62
Fls. 672/682.
63
Fls. 683/694.
61
100
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Árvores derrubadas (02/07/2007):
Floresta incendiada (15/12/2007):
1.21. CUSTOS DO ESTADO DIRETAMENTE RELACIONADOS
COM AS AÇÕES DO MST EM COQUEIROS DO SUL. AMOSTRAGEM.
A título de referência, vale analisar uma amostra do prejuízo diretamente
sofrido pelos cofres do Estado em decorrência das inúmeras ações criminosas
promovidas pelo MST em Coqueiros do Sul.
Apenas
na
operação
desencadeada
em
razão
da
invasão
da
Fazenda Coqueiros efetuada no dia 14/01/2008, as despesas da Brigada Militar
decorrentes da utilização de 74 (setenta e quatro) viaturas próprias, pagamento de
101
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
diárias, combustível, locação de transporte, alimentação, etc., totalizou R$ 81.481,57
(oitenta e um mil, quatrocentos e oitenta e um reais e cinqüenta e sete centavos)64.
As reiteradas ações delituosas do MST no entorno da Fazenda Coqueiros
exigiram que o Comando da Brigada Militar formasse um destacamento nas
proximidades, mais especificamente no Distrito de Xadrez, com um contingente regular
de cerca de 10 (dez) policiais, objetivando coibir os crimes regularmente cometidos
pelos integrantes do movimento. Isso implica um custo mensal fixo de R$ 22.962,00
(vinte e dois mil, novecentos e sessenta e dois reais), sendo R$ 20.482,00 (vinte mil,
quatrocentos e oitenta e dois reais) referentes às despesas com recursos humanos e R$
2.487,00 (dois mil, quatrocentos e oitenta e sete reais) com recursos materiais65.
Note-se que os custos aqui mencionados são apenas parciais, pois não
estão consideradas as despesas suportadas pela Polícia Civil, com outras unidades da
BM, etc. Não bastasse isso, cumpre salientar que os policiais em questão são retirados
de centros urbanos com graves problemas de segurança pública, o que agrava a
instabilidade social e impõe um pesado ônus também aos moradores das grandes
cidades.
Por outro lado, o Ministério Público observa que já existe jurisprudência
determinando que o Estado indenize proprietários de terras em função de invasões
promovidas pelo MST, o que demonstra a necessidade de tomar medidas tendentes a
evitar novos danos ao erário. Nesse sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INVASÃO DE
PROPRIEDADE RURAL POR MEMBROS DO MST. DANOS MATERIAIS.
OMISSÃO
GENÉRICA.
FALHA
NA
SEGURANÇA
PÚBLICA.
RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA. DEVER DE INDENIZAR. 1. Com base
nos elementos probatórios trazidos aos autos, perfeitamente configurados os danos
materiais sofridos pelos demandantes e o nexo de causalidade entre a conduta omissiva
do ente público (falha no planejamento preventivo e execução dos serviços de
segurança) e o fato ilícito (invasão e depredação da Estância Capivara). Os prejuízos
patrimoniais foram bem caracterizados, mormente pelo acervo fotográfico trazido aos
autos, assim como pelos testemunhos e reportagens jornalísticas realizadas sobre os
fatos, evidenciando a mortandade de semoventes, a danificação e subtração de bens
móveis e a depredação do próprio imóvel. 2. A culpa em sentido estrito, na modalidade
negligência, também restou patente, haja vista a omissão do Poder Público no seu dever
constitucional de prestar segurança pública diante de um fato concreto e
geograficamente delimitado, permitindo que centenas de famílias integrantes do MST se
64
65
Fls. 1824/1825.
Fl. 1826.
102
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
dirigissem à fazenda invadida, sem qualquer acompanhamento da Polícia Militar, sendo
que os colonos carregavam diversos instrumentos agrícolas passíveis de serem
utilizados como armas. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. OMISSÃO
ESPECÍFICA. DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. 3. De outra banda,
quanto à omissão específica, no descumprimento da ordem judicial de reintegração de
posse, vislumbra-se que o Estado, tendo em mãos o mandado de reintegração, não
logrou reunir efetivo suficiente da Brigada Militar para cumpri-lo em tempo hábil,
contrariando a determinação do Poder Judiciário. DANOS MORAIS.
CONFIGURAÇÃO. REDUÇÃO DO QUANTUM. 4. A existência de danos morais é
manifesta, face à gravidade do fato e por todos os reflexos decorrentes do trauma vivido
pelos autores, que tiveram suas vidas expostas à mídia durante a invasão da Estância da
Capivara, como denotam os vários recortes de jornais encadernados nos autos. 5.
Reduzida a indenização relativa aos danos morais para patamar mais condizente com os
princípios da razoabilidade e proporcionalidade, fixando-se o quantum no valor de R$
25.000,00 (vinte e cinco mil reais) a cada um dos autores, pois não obstante existir
diferença entre as frações de terra de cada um deles como ressaltado na sentença, o
sofrimento psíquico atingiu a todos igualmente. INDENIZAÇÃO PELA
DESVALORIZAÇÃO DO IMÓVEL. IMPOSSIBILIDADE. 6. O pedido de
indenização por danos decorrentes da desvalorização da Fazenda da Capivara, alienada
ao Estado, deve ser afastado, porquanto os demandantes anuíram expressamente com o
valor da avaliação efetuada no ato da negociação do imóvel rural com o Estado e o
INCRA, sendo que a referida avaliação teve por base laudo do INCRA elaborado com
base em critérios científicos e levando em consideração o valor de mercado.
APELAÇÃO DO RÉU PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO DOS AUTORES
DESPROVIDA (Apelação e Reexame Necessário Nº 70018362483, Sexta Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em
29/11/2007).
No mesmo sentido: Apelação Cível nº 70023461031, 9ª Câmara Cível do
TJRS, Rel. Des. Odoné Sanguiné, julgado em 30/04/2008, e Apelação Cível nº
595135542, 2ª Câmara Cível do TJRS, Rel. Des. Élvio Schuch Pinto, julgado em
06/12/1995.
Assim, recursos públicos tão escassos em nosso Estado são retirados de
outras áreas para coibir as ações criminosas do MST e indenizar os danos por ele
causados, impondo à toda coletividade um grave ônus decorrente das pretensões
daquele movimento político.
1.22.
INVASÕES
DO
MST.
MODO
DE
OPERAÇÃO.
DESTRUIÇÃO PROVOCADA.
Conforme já observado (itens 1.7 e 1.10), as invasões do MST são
realizadas com o emprego de um grupo precursor armado que, após consolidar o
domínio da área, é substituído por enorme contingente de membros do movimento. Já
103
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
no início das invasões propriamente ditas, o MST chama a imprensa e, imediatamente,
às vezes ainda antes da chegada da polícia, começa a espalhar falsas notícias de abusos
por parte da Brigada Militar, acionando jornais, políticos, ONGs, etc. A utilização de
homens armados nas invasões, além de registrada pelo Comandante do CRPO Planalto
no ano de 200666, foi recentemente objeto reportagem especial do jornal Zero Hora, na
edição do dia 18/05/2008, sob o título “Polícia investiga ação de milícias”67, que se
transcreve:
Milícia costuma ser o termo utilizado pelo MST para definir jagunços bancados
por fazendeiros para hostilizar os sem-terra. A Polícia Civil gaúcha, no entanto, tem
recebido denúncias da possível existência de uma milícia ligada ao próprio MST.
Tramitam em delegacias do Estado 19 inquéritos e ocorrências policiais relatando
invasões de terra que foram antecedidas por um esquadrão precursor armado, que se
encarrega de atemorizar os proprietários, antes do ingresso nas fazendas das famílias de
sem-terra. Pelo menos 11 desses relatos falam que os invasores portavam armas de
fogo: em Tupanciretã, Júlio de Castilhos (duas vezes), Coqueiros do Sul (duas vezes),
Cruz Alta, Santana do Livramento, São Borja (duas vezes), Eldorado do Sul e São
Jerônimo.
Em 6 de outubro de 2003, um casal de fazendeiros de Júlio de Castilhos disse
que toda sua família foi mantida refém durante cinco horas por um grupo que se
identificou como sendo do MST. Eles portavam revólveres e espingardas. Horas depois,
a propriedade foi invadida por sem-terra.
Em abril de 2002, em São Jerônimo, os caseiros de uma fazenda relataram que
integrantes do MST, armados, eram os precursores da invasão realizada por 350 semterra naquela manhã. Um ano antes, em Jóia, membros de uma milícia formada por
colonos sem-terra foram presos por suposto envolvimento na morte do agricultor Pedro
Milton da Luz Pedroso, 49 anos.
Nas invasões, afora a prática do crime de esbulho possessório
propriamente dito e dos demais ilícitos penais cometidos para a consecução dos seus
objetivos, alguns fatos são bastante reveladores da mentalidade que move os integrantes
do MST. Nesse sentido, um recente episódio ocorrido no Rio Grande do Sul constitui
uma amostra relativa ao estado em que os membros do movimento deixam os locais
após as desocupações. No dia 14 de abril de 2008, a Fazenda Southall (um dos focos de
conflito neste Estado, conforme item 1.16.) foi invadida pelo MST. Apesar da existência
de um interdito proibitório que vedava tal conduta, foi deferida a reintegração de posse
e concedido prazo para a desocupação da área, fixado como sendo até às 10h00min do
66
67
Fl. 553.
Fls. 2093/2098.
104
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
dia 18 do mesmo mês. Cabe transcrever os seguintes excertos do relatório68 elaborado
pelo Ouvidor-Geral da Segurança Pública e Ouvidor Agrário do Estado, Dr. Adão José
Corrêa Paiani, que acompanhou a desocupação efetuada:
Dia 18/04/2008:
00:20 horas – Após contato com os advogados do movimento para construção
do acordo proposto, foi combinado que encontraríamos os líderes do MST na residência
do Dr. Abib, advogado do MST, juntamente com todas as principais lideranças do
movimento. Dirigimo-nos, então, para a residência do mesmo onde estavam presentes o
MST e o INCRA, que definiram pela não aceitação do acordo. Naquele momento foi
nos mostrado um vídeo feito internamente pelo MST na periferia do
acampamento, mostrando técnicas de intimidação contra a BM, realizadas e
gravadas na tarde do dia 17/04. Nesta gravação podemos perceber que os
integrantes do MST estavam preparados para o enfrentamento e que não tinham o
menor receio de resistir a qualquer investida por parte da polícia ou dos próprios
ruralistas. Podemos perceber que ali existiam diversas armas rudimentares como:
foices, lanças, machados, facões, paus, escudos feitos de madeira, etc.
(...)
10:00 horas – Chegada ao acampamento da Brigada Militar onde fomos
recepcionados pelo Cel. Binsfild, comandante da operação, onde, completamente
irresignado, nos comunicou que não foi enviado o contingente de reforço prometido e
que seria impossível haver qualquer identificação, eis que não havia efetivo para tal.
Percebemos que realmente o efetivo ali no local era bastante inferior ao necessário para
um operação daquela natureza, sendo que foi-nos esclarecido pelo Cel. Binsfild que o
mesmo solicitou 400 homens para garantir a operação de desapropriação, e não havia
sido disponibilizado nenhum reforço. Percebemos, também, um abalo moral muito forte
no contingente que ali estava, eis que era visível e notório que os mesmos não
conseguiriam fazer frente a qualquer investida ou conflito violento do MST ou dos
ruralistas.
(...)
14:20 horas – Retiram-se da fazenda os últimos cinco ônibus e dois caminhões
da fazenda Southal em São Gabriel. Na medida em que os integrantes do MST saíam
da propriedade ora invadida, os mesmos simplesmente chacotaram todos ali
presentes, principalmente a Brigada Militar e os proprietários da fazenda,
gritando: - Nós ganhamos! Ganhamos dos porcos! A Fazenda Southal é nossa! A
gente volta! Neste momento, também irresignados por ter sido alvo das chacotas
do MST, pudemos perceber o semblante de desolação e humilhação ao qual a
Brigada Militar e os proprietários da fazenda, foram obrigados a suportar sem
poder oferecer qualquer reação por completa falta de contingente que garantisse a
ordem do local. A manifestação dos invasores gerou nos presentes uma sensação de
mal estar que só seria suprimida pelas atrocidades que veríamos logo a seguir
quando da entrada nas dependências da fazenda.
(...)
15:30 horas – A ouvidoria adentra as dependências da sede da Fazenda
acompanhada do Ten. Cel. João Zazicki, que nos acompanhou em vários momentos de
nossa avaliação. Encontramos vários armamentos rudimentares, mas bem
organizados quando as suas táticas e estratégias de utilização. Vimos lanças feitas
de taquara sendo utilizadas de barreira de proteção contra a cavalaria, botijões de
gás dentro desta barreira para ser utilizado de combustível para atear fogo a esta
barreira em caso de invasão da força policial, posto de observação feito de madeira
para poder fazer uma vigilância à distância, botijas de 20L com óleo diesel e pano
68
Fls. 645/651.
105
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
para servir de estopim fazendo uma ‘bomba molotov’, pedras feitas de telhas da
residência para poder atirar contra quem os ameaçasse, estacas de madeira e
bambu cravadas no solo com arames de cerca espalhados ao seu redor para que os
cavalarianos ou soldados a pé pudessem tropeçar ou emaranhar-se nos fios e cair
sobre as estacas afiadas, entre outras. A barreira de proteção feita de taquaras e
partes da casa (portões internos, janelas, banheira e até a pia da cozinha, foi feita
ao redor de toda a propriedade, tornando-a um verdadeiro ‘forte apache’ do
MST, construído em pouco menos de duas horas de acordo com o relato dos
próprios peões que lá residem. Dentro da casa os estragos e as atrocidades
encontradas foram bem mais significativas. Encontramos a residência
praticamente destruída com diversos vestígios de vandalismo, dentre eles: fezes
espalhadas por toda a casa, boa parte da residência estava destelhada, vários livros
rasgado e espalhado pelo chão, janelas quebradas e arrancadas das paredes,
garrafas e vidros quebrados e espalhados pelo chão, móveis quebrados, paredes
pichadas, banheiros quebrados, restos de animais espalhados pela propriedade,
venenos e defensivos agrícolas espalhados por toda a residência. Porém, o que mais
chamou a atenção de todos, inclusive comovendo a grande maioria dos presentes,
foi ter encontrado no poço de água alguns animais boiando sendo que dois gatos
aparecem com vestígios de extrema crueldade, estando um deles trespassado com
uma estaca na altura do abdômen, demonstrando que os mesmos foram vítimas de
severas crueldades. Visualizamos, também, um cavalo agonizando com a sua anca
deslocada o que estava impossibilitando o seu deslocamento. Testemunhas
afirmam que o mesmo teve o seu ferimento devido a um espancamento com paus
pelos integrantes do MST. Bezerros ‘guachos’ berrando no campo. Relato do
próprio dono da propriedade que acompanhou a movimentação do MST nos dias
que antecederam a desocupação, diz que os invasores inundaram o ‘banheiro’ dos
animais, à noite, e obrigaram os bovinos a passar pelo líquido e enfrentar a noite
fria completamente molhados e ao relento. Diz a BM que esta prática de crueldade
contra os animais deste porte é usual e que tem o intuito de matar os animais com
pneumonia. A Ouvidoria fez o registro de 190 fotos de alta resolução, as quais seguem
em anexo ao presente relatório sendo que estas passam a fazer parte integrante do
mesmo” (sic – os grifos são do Ministério Público).
A seguir, seguem algumas fotos feitas pela Ouvidoria e pela Brigada
Militar:
Nesta foto, a sede ainda aparece com o telhado intacto.
106
MINISTÉRIO PÚBLICO
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Momento da retirada.
Sede da fazenda, já com o telhado da varanda destruído.
107
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Nas fotos abaixo, verifica-se que haviam sido armadas estacas panjo
(com fezes humanas nas pontas) e colocados botijões de gás e óleo diesel. Caso a
Brigada Militar se aproximasse, a barreira seria incendiada.
108
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Destruição na sede da fazenda. Vê-se fezes humanas espalhadas no local.
109
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
A fotografia abaixo é do poço de abastecimento de água, no qual foram
jogados gatos e outros animais mortos:
Note-se que a destruição provocada na Fazenda Southall, longe de ser
uma exceção, constitui regra nas invasões promovidas pelo Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra.
É interessante observar o resultado de uma busca e apreensão autorizada
pela Justiça e promovida pela Brigada Militar no acampamento de São Gabriel, após a
invasão da Fazenda Southall. Conforme noticiado pelo jornal Zero Hora na edição de
18/05/2008, em reportagem com o título “Cadernos de luta do MST”69, foram
apreendidos cadernos e outros documentos nos quais constavam anotações relativas ao
cotidiano dos acampados, orientações dos líderes e resumos das discussões internadas.
Transcreve-se alguns excertos da reportagem, com menção aos documentos
apreendidos:
Como arregimentar apoio
(...) orientação sobre como proceder nas cidades vizinhas e sobre a função de
doações de alimentos nos bairros próximos dos acampamentos:
Muito importante o trabalho nos bairros, como doar alimentos, panfletear, para
cair rápido nos meios de comunicação".
Respostas padrão
69
Fls. 2093/2098.
110
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Uma das atas estabelece uma orientação aos acampados sobre como responder
ao cadastro do Incra, que vai determinar quem está apto ou não a receber cesta básica
alimentar:
É o cadastro da bóia, não precisa se intimidar...
Tem de dizer que não tem bem familiar, não tem renda porque não trabalha.
Quem não tem documento, dizer que a Brigada roubou.
Se tem passagem na Polícia? Não.
Se já era agricultor? Sim.
O que fazia há cinco anos atrás? Nada, por isso estou aqui...
Tempo de acampamento? Dizer que tem mais de um ano... E assim por diante".
Quem tira guarda
O uso de crianças para fazer guarda nos acampamentos não é rotina, mas
acontece. Já o de mulheres é cotidiano, como mostram esses trechos do diário:
Crianças pegando plantão, 10h às 12h, de 1h30min às 6h".
“... guarda: de menor, não tira guarda, por motivo se o Conselho (Tutelar)
chega e vê um de menor na guarda, causa problema..."
(...)
Pedras, trincheiras e bombas
Pouco antes do despejo de uma das invasões, novas orientações são anotadas
num diário:
Resistência do cenário: mais pedras, ferros nas trincheiras, alguns pontos
estratégicos... cavalo apavora...
Zinco como escudo. Bombas... tem um pessoal que é preparado. Manter a linha.
Retorno do Pelotão 13: fazer trincheira lá atrás. Se protejam atrás, porque o
pelotão que tome cuidado, atiram foguete..."
(...)
Uma invasão
Trecho de um caderno faz uma avaliação de uma invasão de propriedade da
família Southall no mês de abril, quando o MST promoveu uma série de ações pelo
Brasil:
Nível está bom. Repercussão da ocupação está boa em sete Estados. Em
Pernambuco, 23 ocupações. Oposição da PM. Ação rápida. Muita arma no
acampamento. Imprensa"
(...)
Medo de flagrante
No dia 29 de abril, a recomendação para evitar prisões na hora em que a BM
fosse revistar o acampamento em busca de objetos saqueados:
Se tiver algo que trouxe da Southall, favor consumir. Senão vai preso em
flagrante".
Saliente-se que, afora os documentos mencionados na reportagem
jornalística, a diligência policial resultou na apreensão de “coquetéis Molotov”,
foguetes, foices, facões, estilingues escudos, e outros objetos, bem como na prisão de
foragidos, na localização de uma menor com registro de desaparecimento e na
constatação da existência de crianças sem registros de nascimento70. Em protesto contra
a diligência cumprida pela Brigada Militar, o MST imediatamente desencadeou 14
(catorze) ações de bloqueio de rodovias no Estado do Rio Grande do Sul, mobilizando
70
Fls. 2134/2135.
111
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
aproximadamente 1140 (um mil, cento e quarenta) integrantes em suas ações71. Tais
fatos demonstram a agilidade e mobilidade que o movimento já atingiu para o
desenvolvimento das suas ações.
1.23. O DESPREZO PELO PODER JUDICIÁRIO E PELAS
DEMAIS INSTITUIÇÕES DO ESTADO.
As ações do MST demonstram o total desprezo daquele movimento em
relação aos poderes constituídos, em especial no que diz respeito ao Poder Judiciário.
Uma forte evidência dessa atitude pode ser encontrada no famoso
discurso de JOÃO PEDRO STÉDILE, liderança nacional do MST, em evento da
EMATER, atacando o Poder Judiciário e o Ministério Público:
“(...) o terceiro aspecto na ação do governo é a legislação, é o poder judiciário.
Muita gente tem dito em palestras que, ‘ah, o problema do Brasil é que o poder
judiciário vai ser um problema’ [para a implantação da reforma agrária]. Vocês sabem
melhor do eu (...) o poder judiciário no Brasil é um capacho do poder executivo, é
uma tropa de puxa-saco, não existe nenhuma independência do poder judiciário com o
poder executivo, a começar pelo Supremo Tribunal Federal (...) se os caras são
indicados pelo presidente da república, algum deles vai criticar o presidente? (...) Então,
um judiciário que começa desde o Supremo com essas características, o juizinho lá nós
compramos ele com um churrasco, né, o preço vem baixando, promotor de justiça
72
então, deus o livre (...)”
Em Coqueiros do Sul, um fato emblemático demonstra o desprezo do
movimento no que tange às decisões judiciais. Com efeito, em razão de uma invasão
promovida pelo MST, no dia 04 de março de 2006 Oficiais de Justiça procuraram
71
Fls. 2136/2138.
72
Conforme manifestação de JOÃO PEDRO STÉDILE (maio de 1994), em exposição pública realizada
no “II Encontro Estadual da Equipe de Reforma Agrária da Emater/RS”, evento realizado na cidade
gaúcha de Veranópolis, promovido pela referida empresa pública de extensão rural do Rio Grande do Sul
(transcrição ad litteram retirada da gravação da palestra). Apud NAVARRO, Zander. “Mobilização sem
emancipação” — as lutas sociais dos sem-terra no Brasil. Publicado em SANTOS, Boaventura de Sousa
(org). Produzir para viver. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 189-232 – os grifos são do
Ministério Público.
112
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
integrantes do movimento para intimá-los da decisão de reintegração de posse deferida
pelo Dr. Orlando Faccini Neto e para citá-los quanto à ação possessória ajuizada, tendo
uma das líderes rasgado o mandado judicial. Transcreve-se parte da certidão dos
Oficiais73:
CERTIFICAMOS, nós OFICIAIS DE JUSTIÇA servindo de PLANTÃO, que,
nesta data, imediatamente ao recebimento do mandado, nos dirigimos até o local objeto
da ação de reitegração de posse (...) tivemos necessidade de aguardar reforço policial
para nos acompanhar até o local onde se encontravam os requeridos (...) permitiram
apenas a presença dos três Oficiais de Justiça, ficando a Brigada Militar a
aproximadamente vinte metros para trás (...), procedemos a leitura da ordem judicial e
do respeitável despacho, deixando todos os presentes integrantes da parte requerida
cientes da ordem judicial (...), porém ninguém aceitou em asssinar a ordem judicial. Ato
contínuo, efetuamos nas mesmas circunstâncias a citação determinada, ficando da
mesma forma as partes requeridas a tudo muito bem cientes, receberam a contrafé que
lhes oferecemos, mas novamente se negaram a assinar. Inclusive, uma senhora, que se
dizia como líder dos integrantes do MST, recebeu a contrafé e imediatamente as rasgou,
ainda na frente dos Oficiais de Justiça. A partir desse momento os ânimos ficaram
exaltados por parte dos integrantes do MST, batendo facões, foices e outros utensílios
ferrosos, fazendo muito barulho e aos gritos exigiram a saída dos Oficiais de Justiça e
dos integrantes da Brigada Militar. Quase que começa um conflito armados no qual com
certeza os integrantes do Judiciário e da BM sairiam em prejuízo, talvez com a perda da
própria vida. Sob muita tensão, conseguiu-se efetuar a retirada do local, sem registro de
qualquer incidente pessoal (sic).
Em nível nacional, recentes episódios ocorridos no Pará igualmente
revelam a total desconsideração do movimento quanto às decisões judiciais. Apesar de
intimados de uma liminar obtida pela mineradora Vale junto à 41ª Vara Cível do
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que proíbe tanto o MST quanto João Stédile, um
de seus líderes, de "incitar e de promover a prática de atos violentos contra as
instalações" da empresa ou que “importem na interrupção de suas atividades”, no dia
15/04/2008 mais de 2 (dois) mil integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST) e da Via Campesina se concentraram às margens da Estrada de Ferro
Carajás (EFC), em Parauapebas, porém trocando as camisetas vermelhas por outras de
73
Fl. 1772.
113
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
cor amarela, do Movimento dos Trabalhadores em Mineração (MTM), visando burlar as
restrições impostas pela Justiça74. Com efeito, já no dia 17 do mesmo mês, integrantes
do movimento, juntamente com garimpeiros, bloquearam a Ferrovia de Carajás e
impediram a passagem de trens da empresa Vale. A liberação da estrada de ferro exigiu
o emprego de 200 (duzentos) policiais militares, além de policiais civis e federais75.
Vale transcrever, ainda, o quadro elaborado pela liderança do MST e
apreendido em uma invasão ocorrida em São Jerônimo – RS no ano de 2002, que expõe
com clareza o pensamento emessista relativamente aos diversos poderes e instituições
estatais76:
NEUTRALIZAÇÃO DAS “TRINCHEIRAS” DA BURGUESIA BRASILEIRA
Conforme o gramcismo, o “grupo dominante” da burguesia brasileira se protege em
algumas “trincheiras” que precisarão ir sendo eliminadas através da desmoralização,
perda da credibilidade, perda de prestígio, do “denuncismo”, da dissidência interna,
do “patrulhamento”, da penetração de intelectuais orgânicos, do constrangimento,
da inibição, etc. VEJAMOS ABAIXO ALGUNS EXEMPLOS:
“Trincheiras”
“Idéia-Força”
“Temas Explorados”
JUDICIÁRIO
- Instrumento de opressão - Favorecimento dos ricos
- Parcialidade
- Privilégio dos burgueses
- Ineficiência
- Impunidade dos ricos (e dos
- Improbidade
“colarinhos brancos”)
- Lentidão funcional
- Corrupção e privilégio dos
magistrados
CONGRESSO
- Ineficiência
- Privilégios e ociosidade
- Improbidade
- Escândalos e barganhas
- Parasitismo
- Falta de espírito público
EXECUTIVO
- Ineficiência
- Conduta autoritária e abuso
- Autoritarismo
de autoridade
- Improbidade
- Corrupção e escândalos
PARTIDO POLÍTICO Falta
de - “Fisiologismo”
representatividade
- Falta de programa
- Legenda de “aluguel”
- Corrupção e escândalos
- Ambição pessoal
- Verbas de campanha
- Fascismo
FORÇAS ARMADAS - Ineficiência
- Destinação
74
http://oglobo.globo.com/pais/mat/2008/04/14/no_para_integrantes_do_mst_usam_amarelo_no_lugar_do_
vermelho_para_fugir_de_restricoes_impostas_pela_justica-426829526.asp (acesso em 02/06/2008).
75
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/agrofolh/fa1804200802.htm ((acesso em 02/06/2008).
76
Fl. 1743.
114
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
- Desnecessidade
- Ônus para o País
- Fascismo
- Ineficiência
- Truculência
- Improbidade
APARELHO
POLICIAL
IGREJA CATÓLICA
- Anacronismo da moral
cristã
- Opressão moral e
intelectual
- Aliança com o poder
CAPITALISMO
- Divisão de classes e
exploração do proletariado
urbano e camponeses
- Má divisão da renda
- Acidentes de trabalho
- Golpismo, ditadura e tortura
- Serviço militar obrigatório
- Reforma e extinção das PMs
- Violência
- Corrupção escândalos
- Envolvimento no crime
organizado
Celebato
clerical
e
escândalos sexuais
- Inflexibilidade doutrinária
(aborto,
homossexuais,
controle
da
natalidade,
indissolubilidade
do
casamento)
- A Inquisição e o papel
político-histórico
- Devoções populares e culto
de leigos (fora d/igrejas)
- Greves e protesto
Domínio
econômico
(ambição e abuso)
- Injustiça social
Neo-liberalismo
e
globalizaçaõ
- Desemprego
Acerca precisamente desse documento, escreveu o professor e filósofo
Denis Lerrer Rosenfield:
Um outro documento, de uma folha, elaborado pelo próprio MST para suas
ações políticas, adota uma via propriamente gramsciana. Sua disposição gráfica,
dividida horizontalmente por partes, permite colocar as metas e as etapas que devem ser
seguidas para que o Brasil venha a ser uma sociedade como a ‘cubana’, digna de tantos
elogios. Uma etapa, cujo título é ‘Neutralização das trincheiras da burguesia brasileira’,
propõe, em vez do uso imediato de armas, a utilização de um outro tipo de ‘armas’, o
que advém das palavras e discursos, segundo um trabalho lento e meticuloso de
enfraquecimento das instituições republicanas. A democracia seria, então, nada mais do
que um instrumento que serviria para a sua própria eliminação. Reproduzo o primeiro
parágrafo: ‘Conforme o gramcismo, o grupo dominante da burguesia brasileira se
protege em algumas trincheiras que precisarão ir sendo eliminadas através da
desmoralização, perda da credibilidade, perda de prestígio, do denuncismo, da
dissidência interna, do patrulhamento, da penetração de intelectuais orgânicos, do
constrangimento, da inibição, etc’.
O MST afirma seguir os ensinamentos de Gramsci, com o uso explícito de seus
conceitos. Trata-se de travar uma batalha pela formação da cabeça das pessoas, de modo
que a mensagem revolucionária possa ser progressivamente implantada. Se instituições
115
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
republicanas perdem a sua credibilidade e o seu prestígio, o império da transgressão e
das invasões pode ser mais facilmente aceito. Os intelectuais se colocariam – ou são
colocados – nessa posição de instrumentos da ação revolucionária, que ganharia, assim,
credibilidade. Os que se opõem a esse movimento são, então, ‘constrangidos’ e
‘inibidos’, como se ser contra o MST fosse ser de ‘direita’, contra a ‘justiça social’. O
objetivo de tal estratégia consiste em calar a contestação.
Observe-se igualmente o vocabulário militar utilizado. Nesse documento, a
palavra ‘trincheira’ aparece no próprio título, e nas cartilhas ‘pedagógicas’, voltadas
para as crianças, a palavra ‘guerra’ é a de uso mais freqüente. Aliás, será que jovens
preparados para a guerra, acostumados com a violência das invasões, tendo Fidel e
Guevara como ídolos, estão sendo valorizados? Os exemplos dados para essa guerra de
captura das mentes são vários. Destacarei, primeiramente, as três ‘trincheiras’:
Judiciário, Congresso e Forças Armadas. Cada uma delas tem um série de ‘IdéiasForça’, sendo seguidas de ‘Temas Explorados’. As ‘idéias’ são as armas que preparam o
terreno para o descrédito das instituições republicanas, enquanto os ‘temas’
correspondem ao modo de inviabilizá-las concretamente, comprometendo de uma forma
definitiva a democracia.
(...)
Todas essas colocações se inscrevem em um mesmo menosprezo das instituições
que são pilares de uma democracia e de um Estado que cumpra com suas obrigações
constitucionais. A concepção que as orienta é a de um marxismo vulgar de cunho
gramsciano, que reduz as instituições republicanas à mera expressão da luta de classes.
Os alvos escolhidos privilegiam, cada um, seja o capitalismo (burgueses, ricos), seja a
representatividade política e estatal (parcialidade, parasitismo, ineficiência, fascismo).
Segundo essa concepção, a democracia nada mais seria que formal, e o
capitalismo, o regime socioeconômico a ser destruído. Em um procedimento típico
dessa forma de autoritarismo revolucionário, os adversários são considerados
‘fascistas’. Numa outra ‘trincheira’, a dos ‘partidos políticos’, estes são também
qualificados de ‘fascistas’. Ou seja, uma mentalidade fascista-comunista, seguindo o
molde do marxismo vulgar, cunha instituições republicanas como ‘fascistas’ com o
propósito explícito de vir a estabelecer uma sociedade totalitária no país. A fachada do
‘social’ é apenas a apresentação que torna mais palatável, para o estágio presente da
opinião pública, a veiculação de concepções que têm como fim combater as idéias
democráticas. É como se o MST estivesse dizendo: ‘essas instituições não servem para
nada’77.
1.24. A ESTRATÉGIA GLOBAL.
As ações praticadas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra, Via Campesina e movimentos afins, conjugadas com a interpretação dos
discursos de suas lideranças, dos relatos de indivíduos que já neles atuaram, das
informações contidas nas publicações do próprio MST, dos materiais apreendidos nos
acampamentos e das informações obtidas pelos serviços de inteligência do Estado,
revelam que está em avançado estágio de execução no Brasil um verdadeiro movimento
revolucionário, de inspiração marxista-leninista, tendo como exemplo o modelo
77
Op. cit., pp. 328/330.
116
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
revolucionário cubano e sob orientação de operadores estrangeiros, tais como as FARC.
No Rio Grande do Sul, prepondera atualmente a atuação do Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, integrante da Via Campesina. Todavia, diversos
grupos atuam no mesmo sentido dentro do território nacional, em ações conjugadas ou
não. No momento, os operadores desses grupos buscam sedimentar o domínio de vastas
áreas territoriais, nelas instalando um Estado paralelo.
Já existem regiões do Brasil dominadas por grupos rebeldes. A imprensa
recentemente noticiou a ação de integrantes da chamada LCP – Liga dos Camponeses
Pobres, organização radical de extrema esquerda que adotou a luta armada como
estratégia para chegar ao poder, reunindo atualmente cerca de 540 (quinhentos e
quarenta) combatentes em 20 (vinte) acampamentos localizados em 3 (três) Estados,
dominando uma área de aproximadamente 500.000 (quinhentos mil) hectares. Segundo
reportagem publicada em revista de circulação nacional, o grupo em questão foi
treinado pelas FARC e matou mais de 22 (vinte e duas) pessoas apenas no ano
passado78.
Neste Estado, o domínio da região compreendida entre as rodovias RS
324 (Passo Fundo, Pontão, Ronda Alta e Goio En) e BR 386 (Carazinho, Sarandi e
prolongamento por estrada estadual que também conduz à Ponte do Rio Goio En, divisa
com SC), estendendo pontos até a fronteira com o Uruguai, conferiria ao MST o
controle de importantes rodovias. Não por acaso, uma das maiores propriedades rurais
situadas entre as mencionadas rodovias e objeto da cobiça daquele movimento é
precisamente a Fazenda Coqueiros, que apresenta aproximadamente 7.000 (sete mil)
hectares e formato triangular. O ponto mais ao leste daquelas terras fica a 13 (treze) km
a oeste da Cidade de Pontão, o ponto mais ao sul situa-se a 6 (seis) km de Carazinho
(com acesso facilitado à Fazenda Annoni, onde já existe um grande assentamento do
MST) e o mais a oeste fica separado apenas por uma estreita faixa de terra da BR 386.
A Brigada Militar observa que, através desses locais, em caminhadas com duração
máxima de meia hora a partir de qualquer ponto da BR 386, é possível atingir a divisa
oeste da Fazenda Coqueiros, mobilizar assentados do norte do Estado para participar de
ações e sair do teatro de operações antes da chegada da polícia. Para tanto, é
117
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
imprescindível a tomada da Fazenda Coqueiros e de outras propriedades situadas em
seu caminho, por localizarem-se entre as rodovias RS 324, BR 285 e BR 386.
Nesse contexto, outra região de enorme importância do ponto de vista
militar é a de Nova Santa Rita, em especial a da Fazenda Granja Nenê, em vista de sua
privilegiada posição geográfica e porque seu controle permitiria ao movimento atacar,
de forma contudente, a infra-estrutura do Estado (item 1.14).
Também
as
áreas
das
Fazendas
Southall
e
Palma,
situadas,
respectivamente, na região da campanha e zona sul do Estado, foram escolhidas pelo
MST de forma criteriosa, seja pela necessidade de distribuir os locais de ocupação no
Estado, de modo a abrangê-lo em áreas entendidas como vitais, seja porque são extensas
propriedades que permitiriam grandes concentrações de pessoas, facilitando a
manutenção da coesão do grupo e a pregação de seus ideários.
Desde que o MST reivindicou pela primeira vez a desapropriação das
áreas mencionadas e apesar de todas as decisões judiciais em sentido contrário, o
movimento nunca abandonou a determinação de obtê-las. De fato, seus integrantes
fixaram-se nas proximidades daquelas terras e constituíram bases com ares de
definitividade, visando manter constante monitoramento dos locais, bem como infligir
aos proprietários das fazendas temor e constante desgaste.
Em razão da gravidade do quadro em exame, impõe-se uma drástica
mudança na forma de trato das questões relativas ao MST e movimentos afins, máxime
porque há enorme interesse da sociedade em que os objetivos almejados por aquelas
organizações nas áreas apontadas não se concretizem, circunstâncias que legitimam a
atuação do Ministério Público na espécie e exigem uma resposta contundente por parte
do Poder Judiciário.
78
Revista ISTO É, edições 2003 e 2004. http://www.terra.com.br/istoe/edicoes/2003/artigo75560-1.htm e
http://www.terra.com.br/istoe/edicoes/2004/artigo75944-1.htm (acesso em 02/06/2008 - fls. 1724/1740).
118
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
1.25.
FUNÇÃO
SOCIAL
DA
PROPRIEDADE.
FAZENDA
COQUEIROS X ACAMPAMENTOS DO MST.
Ninguém questiona, nem mesmo o MST, que a Fazenda Coqueiros é
produtiva. Trata-se, na verdade, de verdadeira empresa rural79, cumpridora de sua
função social, geradora de empregos formais e pagadora de impostos, tanto que a
possibilidade de sua desapropriação foi afastada pelo governo federal80.
A fazenda, que é dividida em Fazenda Coqueiros I e Fazenda Coqueiros
II, possui uma área total de 7.155,09 hectares, sendo que seus proprietários preservam
vastas áreas de matas nativas, capões de Floresta Ombrófila Mista repletos de
araucárias, que abrigam uma rica fauna silvestre e são parte do Bioma Mata Atlântica,
protegido pela Lei nº 11.428/06. Também encontram-se naquele local representantes da
Floresta Decidual e Semidecidual do Algo Uruguai.
O imóvel apresenta 1.431,2 ha de Reserva Legal (20 % da área total),
incluindo áreas de preservação permanente, onde vivem as seguintes espécies nativas:
araucária, açoita-cavalo, aroeira, angico branco, angico, araçá do mato, bugre,
branquilho, cabriúva, camboatã, canela amarela, canela do brejo, canela pinho, canela
de veado, canela louro, canela preta, cangerana, caroba, caúna, cedro, cipós diversos,
cocão, coronilha, esporão de galo, erva mate, farinha seca, figueira, fumo brabo, grápia,
guabiju, guajuvira, guamirim, ipê, jerivá, leiteiro, louro, mamica de cadela, olho de
pombo, pata de vaca, pessegueiro brabo, rabo de bugiu, sabugueiro, sete-capotes, timbó,
tarumã, uvaia, vassourão, pau flor/veludinho, dentre outras.
A fauna da Fazenda Coqueiros é rica em animais silvestres. Nela vivem
capivaras, bugios, tatus, corujas, gaviões, veados, quatis, furões, pombas, nambus,
jacus, seriemas, jaguatiricas, preás, cotias, pacas, ratões do banhado, perdizes,
periquitos, etc.
São cultivados na Coqueiros cerca de 530 (quinhentos e trinta) hectares
de pinus, manejados mediante o desbaste de 1/3 das árvores e manutenção dos outros
79
O laudo técnico de verificação e estimativa consta nas fls. 1552/1678.
Em nota ao jornal Diário da Manhã, que circula em Carazinho – RS, edição do dia 10 de abril de 2008,
a assessoria do Ministro do Desenvolvimento Agrário informou que a “área não será desapropriada nem
comprada pelo Governo. Esta é a posição oficial do Ministro Guilherme Cassel e do Ministério do
Desenvolvimento Agrário” (fls. 2049/2050).
80
119
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
2/3, visando a manutenção do equilíbrio ambiental. Somadas, as áreas nativas e as
plantações de pinus representam um verdadeiro “oásis” no Planalto Médio gaúcho, um
“pulmão verde” que favorece a formação de um microclima benéfico ao regime de
chuvas da região, protege os mananciais hídricos, preserva a fauna e ajuda na retenção
de carbono no solo. Cerca de 40 % (quarenta por cento) da área da fazenda é coberta por
matas nativas ou oriundas de florestamento.
Os administradores da fazenda seguem um plano diversificado de rotação
de culturas, conduzidas sob o Sistema Plantio Direto – sistema de plantio ecológico que
protege o meio ambiente. No verão, a rotação inclui o plantio de soja e de milho. No
inverno, são cultivados centeio, trigo, triticale, aveia branca e cevada. Para a recria e o
engorde de gado bovino, são utilizadas como pastagens o campo nativo, a aveia preta
(Avena strignosa), o azevém (Lolium multiflorum), a braquiária e o milheto (Pennisetum
americanum).
A título de amostragem, no período compreendido entre 01/07/2005 e
30/06/2006 foram utilizados 576,9 ha para culturas permanentes; plantados 4.078,8 ha
de culturas de verão, produzindo 5.666,31 t de soja e 5.210,4 t de milho; foram
utilizados 1.173,7 ha para pastagens, sendo que na Fazenda I houve a permanência
média anual de 1.013 uA (unidades animais) e na Fazenda II a média anual de rebanho
bovino foi de 395,41 uA.
De acordo com o laudo técnico de verificação, o grau de utilização da
terra (GUT) da Fazenda Coqueiros I é de 95 % (é considerada produtiva a propriedade
que atinge 80 %), enquanto o GUT da Fazenda Coqueiros II é de 96,4 %. Já no que se
refere ao grau de eficiência na exploração (GEE), a Coqueiros I apresenta o índice de
172,30 % (a Lei exige apenas 100 %) e a Coqueiros II apresenta 207,35 %81.
Convém salientar que a Fazenda Coqueiros não possui área aproveitável
não utilizada. Estima-se que 60 (sessenta) famílias dependam diretamente das atividades
daquela propriedade.
Por outro lado, há uma total ausência de produção nas terras utilizadas
pelo MST nos Acampamentos Jandir e Serraria, cabendo salientar que o Poder Público
não se preocupa em verificar a produtividade daquelas áreas.
81
Art. 6º, § § 1º e 2º, da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993.
120
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Os acampamentos são utilizados, isso sim, essencialmente como bases
operacionais para viabilizar o cometimento e a ocultação de crimes no âmbito da
Fazenda Coqueiros e em suas adjacências. Com efeito, é com especial devoção que os
integrantes do MST se dedicam a destruir a produção agrícola e pecuária daquela
propriedade rural modelo.
Deste modo, a determinação insculpida no inciso XXIII do art. 5º da
Constituição Federal, no sentido de que a propriedade atenderá a sua função social, resta
indiscutivelmente atendida no âmbito da Fazenda Coqueiros, enquanto, ao inverso, o
MST apresenta à sociedade um notável exemplo, digno de figurar nos anais
doutrinários, de uso nocivo da propriedade nas áreas por ele ocupadas.
1.26. USO NOCIVO DA PROPRIEDADE.
A análise sistematizada dos elementos de convicção apresentados revela
que as terras nas quais estão instalados os acampamentos Jandir e Serraria estão sendo
utilizadas de forma perniciosa, com o indiscutível propósito de servir como ponta-delança para invasões e ataques reiterados na região de Coqueiros do Sul, em ações de
inquietação que visam objetivos totalmente ilícitos. O MST espera, desse modo, tornar
aquela propriedade rural economicamente inviável, improdutiva, aterrorizar seus
proprietários e os que nela trabalham, criando um fato social, econômico e político que
gere a venda da fazenda ou sua desapropriação pelo INCRA, com posterior entrega da
área ao movimento. A Via Campesina (entidade a qual o MST é filiado, conforme item
1.6) e o próprio Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra consolidariam, dessa
forma, o domínio de uma grande área naquela região estratégica.
É evidente que o interesse do MST pela Fazenda Coqueiros em razão da
sua localização geográfica (item 1.7) deve constituir o principal motivo para que suas
pretensões sejam obstaculizadas. Todavia, impende ter em conta que, afora as ações
cometidas contra a Fazenda Coqueiros (item 1.17) e contra outras terras da região (item
1.19), os integrantes do movimento, sempre a partir dos acampamentos Jandir e
Serraria, praticam crimes contra a Segurança Nacional (item 1.18), provocam grande
121
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
degradação ambiental (item 1.19) e exigem o dispêndio de vultosas quantias de dinheiro
público para reprimir suas ações ilícitas (item 1.20).
Assim, as ações do MST e de seus membros causam inegáveis prejuízos
à toda coletividade, constituindo um notável exemplo de descumprimento da função
social prevista na Constituição Federal e de uso nocivo das propriedades por eles
ocupadas.
1.27.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS.
RISCOS
AO
ESTADO
DEMOCRÁTICO E DE DIREITO.
Conforme fartamente demonstrado, o Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra não constitui um movimento social, mas, isso sim, um movimento
político. A análise sistematizada de seu programa e de suas ações não deixa dúvidas de
que se trata de uma verdadeira organização revolucionária, que faz da prática criminosa
um meio para desestabilizar a ordem vigente e revogar o regime democrático adotado
pela Constituição Federal.
De forma violenta, utilizando-se da tolerância, da pluralidade e das
liberdades do regime democrático, o MST conspira contra esse mesmo regime,
objetivando eliminar a economia de mercado, a democracia representativa e a
propriedade privada, todas acolhidas e garantidas pela Constituição Federal vigente.
Embora represente uma minoria, procura impor à sociedade brasileira a sua agenda e o
seu modelo de organização socioeconômica, não se preocupando em respeitar a
legislação e as decisões judiciais, consideradas “burguesas” e maculadas pelo
capitalismo.
Importa lembrar que nos acampamentos e assentamentos do MST não há
presença do Estado, a não ser sob a forma de subvenções diretas ou indiretas aos seus
integrantes. Embora não respeite as leis e deboche das ordens judiciais, o movimento
procura ocupar os espaços próprios de um regime democrático, elegendo representantes
junto ao parlamento e demais poderes constituídos. Seguindo os ensinamentos
122
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
leninistas82, procura atuar na legalidade e na ilegalidade, sempre se eximindo de obter
personalidade jurídica mas, ainda assim, conseguindo financiamento público para suas
atividades criminosas.
Verifica-se, por parte do Estado e da sociedade como um todo, que a
ameaça constituída pelo MST está sendo subestimada, atitude que seguramente trará
graves implicações no futuro caso não ocorra uma significativa mudança de postura, em
especial por parte dos órgãos estatais incumbidos da repressão ao ilícito, tanto no
âmbito criminal quanto no cível.
Atualmente, mesmo quando as instituições se dispõem a agir, as ações do
movimento são sempre tratadas de forma esparsa e isolada, quando são concebidas e
executadas pelo MST de forma global e estratégica. Por outro lado, as autoridades
estatais muitas vezes temem ser taxadas de autoritárias ou repressoras quando querem e
tentam refrear o MST, enquanto este, em suas várias ações violentas, busca o confronto
também com o objetivo de produzir mártires e chamar a atenção da imprensa, tanto
nacional quanto estrangeira. Somando-se esse conjunto de circunstâncias ao já apontado
apoio dos órgãos governamentais e de ONGs simpáticas aos seus objetivos, o
movimento acaba dispondo de um amplo espaço para o desenvolvimento de ações,
intimidando de forma efetiva grande número de autoridades públicas constituídas que
poderiam defender a legalidade.
Por óbvio, não se questiona que muitas pessoas humildes, com interesse
restrito à obtenção de terras, atuam no MST. Contudo, uma vasta parcela dos integrantes
do movimento e a totalidade das suas lideranças são constituídas por militantes
doutrinados, pessoas que fazem da “luta pela terra” o mote para desenvolver uma
revolução marxista-leninista. Há muito o MST abandonou o discurso relativo à
desapropriação do latifúndio improdutivo para motivar suas ações, em que pese muitos
desavisados continuem vinculando uma coisa com a outra.
Transcreve-se algumas ponderações do professor e filósofo Denis Lerrer
Rosenfield, pelo seu acerto e adequação à espécie:
82
“os revolucionários que não sabem combinar as formas ilegais de luta com todas as formas legais são
péssimos revolucionários.” Lênin, Vladimir Ilitch, - Esquerdismo, Doença Infantil do Comunismo,
Capítulo X, escrito entre abril e maio de 1920.
123
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
A questão agrária é uma questão de justiça e não pode ser identificada com as
movimentações políticas do MST. Embora essa organização política, e antes e
concomitantemente a ela a CPT, tenha tido o mérito de chamar a atenção para um
problema que exige uma resposta social, a sua forma de encaminhamento de uma
reforma agrária de tipo socialista termina por inviabilizar a solução do problema social e
agrário que pretende defender. Logo, devemos sair de uma falsa equação, a de
identificar a solução de uma questão agrária, de justiça social, à satisfação de demandas
de uma organização política, cujo objetivo não é a justiça, mas a instauração de uma
sociedade de tipo socialista no Brasil. Quem fizer esse jogo terminará caindo numa
armadilha montada por essa própria organização política, como se os seus críticos
fossem de ‘direita’, ‘conservadores’, ‘elitistas’, logo inumanos e insensíveis à pobreza
existente no campo e nas cidades brasileiras83.
De qualquer forma, ainda que se considerasse a questão dos Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra um problema exclusivamente social, certo é que os
proprietários da Fazenda Coqueiros não têm o dever de suportar sozinhos o ônus em
questão, nem se pode deixar que o movimento, ao seu bel-prazer, escolha as áreas que
deverão ser desapropriadas e aqueles que devem arcar com os custos de suas
conveniências.
No caso da Fazenda Coqueiros, fica claro que o MST ambiciona suas
terras não apenas com o intuito de incrementar as atividades do movimento, mas
especialmente com o objetivo de dominar uma posição estratégica do ponto de vista
geográfico-militar.
Para atingir tais objetivos, o movimento utiliza os acampamentos Jandir e
Serraria de forma nitidamente perniciosa e anti-social, contrariando, indiscutivelmente,
a função social da propriedade. Empregando tais acampamentos como verdadeiras bases
de operações, a estratégia adotada consiste em amedrontar os proprietários e
empregados que lá trabalham e, em especial, inviabilizar as atividades da fazenda,
tornando-a deficitária e improdutiva. Espera, desta forma, tornar a situação
insustentável, a ponto de compelir os proprietários a vender as terras ao INCRA por
qualquer preço e/ou obrigar aquela autarquia federal a desapropriar a fazenda para fins
de reforma agrária, entregando-lhes a área.
O Estado Democrático e de Direito presume a busca pelo poder e por
eventuais mudanças na forma de organização social através de eleições e alterações
legislativas, dentro do sistema constitucional adotado pela maioria do povo brasileiro,
83
Op. cit., p. 374)
124
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
através dos seus legítimos representantes. A utilização da força para esses fins configura
grave violação das normas de convivência social harmônica, devendo ser severamente
reprimida mediante todas as formas disponibilizadas pelo sistema legal e constitucional.
Longe de constituir um problema restrito aos proprietários da Fazenda
Coqueiros, a manutenção do MST naqueles acampamentos impõe um prejuízo à toda
coletividade, em especial porque: 1) o movimento ambiciona a área para dominar
um local de grande importância estratégica do ponto de vista militar; 2) utiliza os
acampamentos como locais para facilitar a prática e a ocultação de crimes,
ensejando um notável gasto público para reprimi-los; 3) utiliza os locais para
atacar a produção agropecuária, provocando enorme redução no recolhimento de
impostos, na oferta de trabalho formal e nas divisas obtidas através das
exportações; 4) provoca reiterados danos ao meio ambiente; 5) os ataques
efetuados não se limitam à Fazenda Coqueiros, mas incluem outras propriedades
da região; 6) os danos causados pelo MST são de responsabilidade do Estado,
conforme jurisprudência, impondo um ônus à toda coletividade; 7) as áreas rurais
utilizadas pelos acampados não apresentam produção de mínimo relevo,
contrariando a expressa disposição contida no art. 5º, XXIII, da Constituição
Federal, no sentido de que a propriedade atenderá a sua função social.
Assim, os constantes e reiterados ataques do MST à Fazenda Coqueiros
afetam toda a coletividade e colocam em cheque os fundamentos do Estado
Democrático e de Direito, exigindo um esforço coordenado de todos os Poderes e
instituições estatais para que, com o emprego de todas as possibilidades jurídicas
amparadas pela legislação vigente, impeçam o enfraquecimento da organização social
adotada pela sociedade brasileira a partir da Constituição Federal.
2. DO DIREITO.
2.1. LEGITIMIDADE ATIVA.
A legitimidade do Ministério Público para o ajuizamento da presente
ação decorre expressamente do texto constitucional. Com efeito, o legislador
125
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
constituinte estabeleceu como incumbência desta instituição a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis,
bem como definiu como suas funções, dentre outras, as de zelar pelo efetivo respeito
dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na
Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia, assim como a da
promoção do inquérito civil e da ação civil pública, para a proteção do meio ambiente e
de outros interesses difusos e coletivos. Transcrevem-se os dispositivos em questão:
Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à
função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis.
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
(...)
II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços
de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição,
promovendo as medidas necessárias a sua garantia;
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a
proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros
interesses difusos e coletivos.
O artigo 82, III, do Código de Processo Civil, por sua vez, estabelece que
compete ao Ministério Público intervir nas ações que envolvam litígios coletivos pela
posse de terra rural.
Ora, restou fartamente demonstrado ao longo desta inicial que as ações
da Via Campesina, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e de outros
movimentos afins colocam em inegável risco a ordem jurídica, as bases do Estado
Democrático de Direito e diversos interesses sociais. Os danos provocados pelas
atividades daqueles movimentos e as ameaças que representam transcendem direitos
individuais, evidenciando a existência de interesse público em torno das questões
suscitadas.
Assim, resta indiscutível a legitimidade do Ministério Público para a
busca de provimentos judiciais que possam evitar a continuidade dos ataques
perpetrados pelos movimentos referidos na presente ação.
126
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
2.2. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CABIMENTO.
Tendo em vista que, como demonstrado, os acampamentos do MST
causam prejuízo à toda coletividade, também não há que se questionar o cabimento de
ação civil pública na espécie.
Acerca do assunto, vale apontar os seguintes julgados, que igualmente
tratam de atividades provocadoras de danos à coletividade:
APELAÇÃO CÍVEL. CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IGREJA EVANGÉLICA
PENTECOSTAL CRUZADA UNIVERSAL. CULTOS RELIGIOSOS. BARULHO
EXCESSIVO. PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO DA VIZINHANÇA. DANO
AMBIENTAL. POLUIÇÃO SONORA. PROBLEMAS EXISTENTES DESDE 1997.
ESGOTAMENTO DAS VIAS EXTRAJUDICIAIS DE COMPOSIÇÃO DO
CONFLITO.
TUTELA
ANTECIPADA
CONCEDIDA
NA
ORIGEM.
DETERMINAÇÃO DE SUSPENSÃO DAS ATIVIDADES NA SEDE DA IGREJA.
MANUTENÇÃO DA VEDAÇÃO DE REALIZAÇÃO DE CULTOS RELIGIOSOS.
PERMISSÃO PARA PRÁTICA DE ATIVIDADES DE CARÁTER ASSISTENCIAL
À COMUNIDADE. HONORÁRIOS ADVCATÍCIOS FIXADOS AO PROCURADOR
DO APELANTE JÁ QUE VEDADA A FIXAÇÃO AO MINISTÉRIO PÚBLICO.
RECURSO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO. 1. É de salientar, que os fatos
aqui esposados remontam a 1997, tendo tramitado, na Comarca, processo criminal
contra o agravante por incurso nas sanções do art. 65, do Decreto-Lei n.º 3.688/41, por
perturbação ao sossego da vizinhança, no qual foi tentada composição resultada
infrutífera por intransigência do recorrente, e no qual restou condenado a pena de multa.
2. Dessa feita, restou comprovado nos autos que as atividades religiosas da agravante
causam efetivo dano ambiental, de modo que correta a sentença da origem no sentido de
proibir a realização dos cultos religiosos até a realização das obras imprescindíveis e
suficientes à solução do dano ambiental. 3. Honorários advocatícios devidos aos
procuradores dos apelantes, na medida em que vedada a fixação de verba honorária a
favor do Ministério Público. 4. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA (Apelação
Cível nº 70022134357, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Wellington Pacheco Barros, Julgado em 30/01/2008).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. BARES 24
HORAS. TUTELA DO MEIO AMBIENTE. Pleito visando a limitação do horário de
funcionamento de dois bares 24 horas do Município de Bagé por estarem,
alegadamente, causando transtornos à vizinhança e arredores. Ausência de autorização
para funcionamento de um dos estabelecimentos (‘Rota Conveniências’), recomendando
a concessão da medida liminar requerida pelo Ministério Público até o julgamento final
da ação civil pública. Não constatação, quanto ao outro estabelecimento (‘Officina
Beer’) de irregularidade que impusesse, nesta fase, a limitação, devendo prosseguir a
ação civil pública para comprovação das alegações de incômodo apontadas. DECISÃO
MANTIDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO (Agravo de Instrumento
nº 70011430030, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo de
Tarso Vieira Sanseverino, Julgado em 14/07/2005).
127
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITOS DE VIZINHANÇA. AÇÃO
CIVIL PÚBLICA. USO ANORMAL DA PROPRIEDADE. PROMOÇÃO E
EXECUÇÃO DE ENSAIOS E BAILES CARNAVALESCOS. TERMO DE ACORDO
FIRMADO COM O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, OBJETIVANDO
CONTER O ALTO NÍVEL DE PROPAGAÇÃO DO SOM GERADO PELAS
ATIVIDADES
DA
DEMANDADA.
OBRIGAÇÃO
NÃO
CUMPRIDA
INTEIRAMENTE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO JUDICIAL QUE SUSPENDEU
AS ATIVIDADES MUSICAIS, ATÉ QUE ULTIMADAS AS MEDIDAS
ASSUMIDAS PELA RÉ. PROVIDÊNCIA QUE VISA RESGUARDAR OS
VIZINHOS DA TRANSGRESSÃO DAS NORMAS DE BOA VIZINHANÇA.
Recurso de agravo de instrumento ao qual se nega seguimento (Agravo de Instrumento
nº 70010447514, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Pedro Celso Dal Pra, Julgado em 03/12/2004).
ACÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO DE VIZINHANÇA. TUTELA
ANTECIPADA VISANDO A PROIBIR REALIZACAO DE EVENTOS COM
MUSICA SEM PRÉVIA PROTECÃO ACÚSTICA APROVADA PELO ORGAO
COMPETENTE. TRATANDO-SE DE EVENTO FESTIVO PROMOVIDO POR
ASSOCIAÇÃO, COM MÚSICA, DEVE O PROPRIETÁRIO TER O CUIDADO DE
NÃO CAUSAR INCÔMODO AOS VIZINHOS, DEVENDO EXECUTAR PROJETO
DE PROTEÇÃO ACÚSTICA, SENDO CORRETA A DECISÃO JUDICIAL QUE
CONDICIONOU A REALIZAÇÃO DE TAIS EVENTOS À REALIZAÇÃO DO
REFERIDO PROJETO. AGRAVO DESPROVIDO (Agravo de Instrumento nº
599495082, Primeira Câmara de Férias Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Carlos Eduardo Zietlow Duro, Julgado em 29/12/1999).
APELAÇÃO CÍVEL. EXPLORAÇÃO COMERCIAL DE JOGOS
ELETRÔNICOS. CESSAÇÃO DE ATIVIDADE ILÍCITA. – Legitimidade ativa: o
Ministério Público, uma vez detectada a possibilidade de lesão a interesses coletivos,
possui legitimidade e interesse para a defesa de tal bem jurídico, o que encontra assento
no art. 127 da Constituição Federal. Precedentes dessa Corte. Preliminar afastada.
Mérito – A exploração comercial de máquinas eletrônicas de divertimento constitui jogo
de azar não autorizado e , portanto, subsume-se no tipo descrito no art. 50, §3º, da Lei
das Contravenções Penais, dispositivo que permanece em vigor. – O art. 471 do Código
de Processo Civil não tem o condão de vincular o magistrado a decisões proferidas em
outros feitos, tratando da hipótese de preclusão, de caráter endoprocessual, que não
aproveita a tese do resguardo da segurança jurídica, que em verdade somente poderia
ser garantida pela coisa julgada, e mesmo assim com temperamentos. – A existência de
tributação sobre a atividade não lhe confere licitude, independendo o fato gerador da
validade jurídica dos atos praticados pelo contribuinte, como dispõe o art. 118, I, do
Código Tributário Nacional. Precedentes dessa Corte e do Superior Tribunal de Justiça.
DERAM PROVIMENTO À APELAÇÃO (Apelação Cível nº. 70014907968, Terceira
Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Luiz Pozza, Julgado em
22/03/2007).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DE CESSAÇÃO DE ATIVIDADE
ILÍCITA. Caça-níquel. Preliminar de incompetência do juízo cível e de carência de
ação. Rejeição. Competência do juízo cível para processar e julgar a ação inibitória.
Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e de deste Tribunal. Legitimidade do
Ministério Público em ajuizar demanda para proteger direitos coletivos. Caráter ilícito
das atividades. Reconhecimento. À unanimidade, rejeitaram as preliminares e, no
mérito, negaram provimento ao apelo (Apelação Cível n.º 70016234049, Vigésima
Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francisco José Moesch,
Julgado em 14/03/2007).
128
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Inquestionável, pois, a adequação da ação ora proposta.
Note-se que, acerca do uso anormal ou nocivo da propriedade, o Código
Civil estabelece:
Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o
direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao
sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de
propriedade vizinha.
Parágrafo único. Proíbem-se as interferências considerando-se a
natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que
distribuem as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância
dos moradores da vizinhança.
Sobre o uso nocivo da propriedade, leciona Sílvio de Salvo Venosa:
O homem em ilha deserta não é, em princípio, atingido pelo Direito. Tudo pode e
nada deve, a não ser a sua própria moral. Qualquer restrição que sofra é de ordem
exclusivamente psíquica. Contudo, vivendo em sociedade, surge a relação jurídica,
sendo obrigado a obedecer a preceitos necessários para harmonização coletiva. (...)
Enfatizemos, como visto, que vizinhança não se confunde com contigüidade. Os atos de
vizinhança são todos os que atingem um número mais ou menos amplo de imóveis em
determinada área, ou apenas o prédio ou algum prédio vizinho. O espectro legal não
pode ser delimitado previamente. Não se afasta também a intervenção de órgãos
públicos e privados na defesa da vizinhança, nem a atividade do Ministério Público,
com os instrumentos legais que lhes são conferidos, mormente tendo em vista a nova lei
protetiva do consumidor e do meio ambiente. Nesse sentido, a Constituição dispõe, no
art. 127: ‘O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional
do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos
interesses sociais e individuais indisponíveis.’ Há situações de vizinhança que têm
nítido caráter de proteção coletiva.” (p. 276/277). “Com freqüência, os julgados buscam
no conceito de exercício normal do direito os fundamentos para a solução dos conflitos
de vizinhança. Foi esse conceito trazido expressamente para o presente Código. O
princípio do uso normal é aplicação da teoria do abuso de direito, sem dúvida.” “Cabe
ao juiz examinar se preponderará o interesse individual ou coletivo. Não se confunde,
por outro lado, o interesse de uma comunidade restrita, que pode coincidir com o
interesse individual, com o interesse social. Bom-senso é o que se exige do julgador,
quando a lei lhe outorga a confiança da discricionariedade. Nunca se deve esquecer que
essa discricionariedade é do Poder Judiciário e não do juiz isoladamente.
(...)
As limitações ao direito de vizinhança (...) são normas de interesse geral e não
apenas dirigidas a prédios definidos e determinados (Venosa, Sílvio de Salvo. Direito
civil: direitos reais, 6ª ed., São Paulo: Atlas, 2006, pp. 276/280).
Vale transcrever também o seguinte excerto da obra de Orlando Gomes:
Dentre as limitações impostas ao direito de propriedade, merecem especial
atenção as que a lei estabelece, tendo em vista os conflitos que podem resultar da
proximidade dos prédios. Tais limitações não se editam no interesse dos particulares. É
129
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DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
o interesse social de harmonizar interesses particulares dos proprietários vizinhos que
justifica as normas restritas do exercício do direito de propriedade. A vizinhança é um
fato que, em Direito, possui significado mais largo do que na linguagem comum.
Consideram-se prédios vizinhos os que podem sofrer repercussão de atos propagados de
prédios próximos ou que com estes possam ter vínculos jurídicos. São direitos de
vizinhança os que a lei estatui por força desse fato.
(...)
Direitos de vizinhança são limitações impostas por normas jurídicas a
propriedades individuais, com o escopo de conciliar interesses de proprietários vizinhos,
reduzindo os poderes inerentes ao domínio de modo a regular a convivência social” (J.
Daibert, Direito das Coisas, 2a ed., Rio de Janeiro, Ed. Forense, 1979, p. 212).
(...)
O mau uso da propriedade pode acarretar para o vizinho um dano ou um
incômodo, pouco importando que os provoque o proprietário em pessoa ou qualquer
possuidor, como, por exemplo, o inquilino do prédio. (...) O conceito de uso nocivo da
propriedade determina-se relativamente, mas não se condiciona à intenção do ato
praticado pelo proprietário. O propósito de prejudicar, ou incomodar, pode não existir e
haver mau uso da propriedade. Importa, pois, distinguir, com Josserand, os atos
abusivos dos atos excessivos, embora uns e outros se compreendam no conceito de mau
uso da propriedade. Os atos abusivos são os que o proprietário pratica no exercício
culposo de seu direito, frustando-lhe a destinação econômica e social, e dos quais
advém prejuízo ao vizinho. Os atos excessivos, os que realiza com finalidade legítima,
mas que causam dano anormal. Assim, a anormalidade em tema de relações de
vizinhança não diz respeito apenas ao exercício do direito de propriedade, mas, também,
às conseqüências do uso, ao prejuízo ou ao incômodo que o proprietário possa causar ao
vizinho (Gomes, Orlando. Direitos Reais, Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 187/196).
2.3. CABIMENTO DE TUTELA INIBITÓRIA.
A tutela inibitória postulada na presente ação encontra amparo no art.
461 e seus parágrafos do Código de Processo Civil, que se transcreve:
Art.461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação
de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação
ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o
resultado prático equivalente ao do adimplemento.
(...)
§ 3º. Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo
justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz
conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o
réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer
tempo, em decisão fundamentada.
§ 4º. O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na
sentença, impor multa diária ao réu, independentemente do pedido do
autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo
razoável para o cumprimento do preceito.
§ 5º. Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do
resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento,
130
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por
tempo de atraso, busca e apreensão remoção de pessoas e coisas,
desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário
com requisição de força policial (...)”.
Conforme aponta Marinoni84, “a tutela inibitória é essencialmente
preventiva, pois que é sempre voltada para o futuro, destinando-se a impedir a prática de
um ilícito, sua repetição ou continuação”.
Não há dúvida de que a permanência de integrantes do MST, Via
Campesina e demais integrantes de movimentos afins nas proximidades da Fazenda
Coqueiros deve ser compreendida em sua estratégia global de atuação, no escopo de
praticar atos contrários aos Direito, como forma de pressão para a sua desapropriação,
muito embora haja ordem judicial consistente em interdito proibitório vedando aqueles
ataques.
Apresenta-se imprescindível que o Estado, na sua plenitude, assuma
papel efetivo na solução da questão posta. Para alcançar esse desiderato, exsurge do
ordenamento jurídico pátrio que a tutela inibitória seja alcançada sob a forma
mandamental e executiva, conforme preconiza Marinoni85. Com efeito, a tutela
executiva, assim como a inibitória mandamental, configura tutela genuinamente
preventiva. A diferença é que a última atua mediante coerção indireta e assim visa
convencer o demandado, ao passo que a primeira é atual, através de meios executivos
que não levam em consideração a vontade do réu.
Na espécie, faz-se imperiosa a determinação que os integrantes do MST e
demais sem terra integrantes de movimentos de contestação no campo mantenham
desocupadas as áreas por eles utilizadas para ataques reiterados contra a Fazenda
Coqueiros e outras propriedades da região de Coqueiros do Sul.
Afigura-se imprescindível, para a hipótese de descumprimento da medida
pelos réus, a fixação de multa, conforme faculta o § 4º do artigo 461 do Código de
Processo Civil.
84
MARINONI, Luiz Guilherme. Manual do Processo de Conhecimento, 4ª ed., RT, São Paulo, 2005,
p.428.
85
Op. cit., p.434.
131
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Entretanto, para o êxito da tutela inibitória, além da determinação por
meio de coerção indireta, com fixação de multa (tutela inibitória mandamental), como
antes referido, também exige-se, para efetivação da tutela específica, a determinação,
com fundamento no § 5º do art. 461 do Código de Processo Civil, para que as forças
policiais, em especial a Brigada Militar, efetuem a desocupação daquelas áreas no caso
de descumprimento da determinação judicial por parte dos acampados.
2.4. DIREITO DE PROPRIEDADE. FUNÇÃO SOCIAL. ESBULHO
POSSESSÓRIO.
O direito de propriedade é garantido pelo inciso XXII do art. 5º da
Constituição Federal, sendo que no seguinte inciso XXIII o legislador constituinte
estabeleceu que a propriedade atenderá a sua função social.
Ora, conforme já salientado, a Fazenda Coqueiros atende integralmente à
ordem constitucional, ao contrário dos vizinhos acampamentos Jandir e Serraria, que
pouco ou nada produzem e são utilizados como locais para reiterados ataques contra a
terra produtiva.
Convém observar que o Supremo Tribunal Federal já decidiu que o
esbulho possessório, mesmo tratando-se de propriedades alegadamente improdutivas,
constitui ato revestido de ilicitude jurídica:
EMENTA: (...) REFORMA AGRÁRIA - NECESSIDADE DE SUA
IMPLEMENTAÇÃO - INVASÃO DE IMÓVEIS RURAIS PRIVADOS E DE
PRÉDIOS PÚBLICOS - INADMISSIBILIDADE - ILICITUDE DO ESBULHO
POSSESSÓRIO - LEGITIMIDADE DA REAÇÃO ESTATAL AOS ATOS DE
VIOLAÇÃO POSSESSORIA - RECONHECIMENTO, EM JUÍZO DE DELIBAÇÃO,
DA VALIDADE CONSTITUCIONAL DA MP Nº 2.027-38/2000, REEDITADA,
PELA ÚLTIMA VEZ, COMO MP Nº 2.183-56/2001 - INOCORRÊNCIA DE NOVA
HIPÓTESE DE INEXPROPRIABILIDADE DE IMÓVEIS RURAIS - MEDIDA
PROVISÓRIA QUE SE DESTINA, TÃO-SOMENTE, A INIBIR PRÁTICAS DE
TRANSGRESSÃO À AUTORIDADE DAS LEIS E À INTEGRIDADE DA
CONSTITUIÇÃO
DA
REPÚBLICA
ARGÜIÇÃO
DE
INCONSTITUCIONALIDADE
INSUFICIENTEMENTE
FUNDAMENTADA
QUANTO A UMA DAS NORMAS EM EXAME - INVIABILIDADE DA
IMPUGNAÇÃO GENÉRICA - CONSEQÜENTE INCOGNOSCIBILIDADE
PARCIAL DA AÇÃO DIRETA - PEDIDO DE MEDIDA CAUTELAR CONHECIDO
EM PARTE E, NESSA PARTE, INDEFERIDO. POSSIBILIDADE DE CONTROLE
JURISDICIONAL DOS PRESSUPOSTOS CONSTITUCIONAIS (URGÊNCIA E
RELEVÂNCIA) QUE CONDICIONAM A EDIÇÃO DE MEDIDAS PROVISÓRIAS.
132
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
(...) Configuração, na espécie, dos pressupostos constitucionais legitimadores das
medidas provisórias ora impugnadas. Conseqüente reconhecimento da
constitucionalidade formal dos atos presidenciais em questão. RELEVÂNCIA DA
QUESTÃO FUNDIÁRIA - O CARÁTER RELATIVO DO DIREITO DE
PROPRIEDADE - A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE - IMPORTÂNCIA DO
PROCESSO DE REFORMA AGRÁRIA - NECESSIDADE DE NEUTRALIZAR O
ESBULHO POSSESSÓRIO PRATICADO CONTRA BENS PÚBLICOS E CONTRA
A PROPRIEDADE PRIVADA - A PRIMAZIA DAS LEIS E DA CONSTITUIÇÃO
DA REPÚBLICA NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO. - O direito de
propriedade não se reveste de caráter absoluto, eis que, sobre ele, pesa grave hipoteca
social, a significar que, descumprida a função social que lhe é inerente (CF, art. 5º,
XXIII), legitimar-se-á a intervenção estatal na esfera dominial privada, observados,
contudo, para esse efeito, os limites, as formas e os procedimentos fixados na própria
Constituição da República. - O acesso à terra, a solução dos conflitos sociais, o
aproveitamento racional e adequado do imóvel rural, a utilização apropriada dos
recursos naturais disponíveis e a preservação do meio ambiente constituem elementos
de realização da função social da propriedade. A desapropriação, nesse contexto enquanto sanção constitucional imponível ao descumprimento da função social da
propriedade - reflete importante instrumento destinado a dar conseqüência aos
compromissos assumidos pelo Estado na ordem econômica e social. - Incumbe, ao
proprietário da terra, o dever jurídico- -social de cultivá-la e de explorá-la
adequadamente, sob pena de incidir nas disposições constitucionais e legais que
sancionam os senhores de imóveis ociosos, não cultivados e/ou improdutivos, pois só se
tem por atendida a função social que condiciona o exercício do direito de propriedade,
quando o titular do domínio cumprir a obrigação (1) de favorecer o bem-estar dos que
na terra labutam; (2) de manter níveis satisfatórios de produtividade; (3) de assegurar a
conservação dos recursos naturais; e (4) de observar as disposições legais que regulam
as justas relações de trabalho entre os que possuem o domínio e aqueles que cultivam a
propriedade. O ESBULHO POSSESSÓRIO - MESMO TRATANDO-SE DE
PROPRIEDADES ALEGADAMENTE IMPRODUTIVAS - CONSTITUI ATO
REVESTIDO DE ILICITUDE JURÍDICA. - Revela-se contrária ao Direito, porque
constitui atividade à margem da lei, sem qualquer vinculação ao sistema jurídico, a
conduta daqueles que - particulares, movimentos ou organizações sociais - visam, pelo
emprego arbitrário da força e pela ocupação ilícita de prédios públicos e de imóveis
rurais, a constranger, de modo autoritário, o Poder Público a promover ações
expropriatórias, para efeito de execução do programa de reforma agrária. - O processo
de reforma agrária, em uma sociedade estruturada em bases democráticas, não pode ser
implementado pelo uso arbitrário da força e pela prática de atos ilícitos de violação
possessória, ainda que se cuide de imóveis alegadamente improdutivos, notadamente
porque a Constituição da República - ao amparar o proprietário com a cláusula de
garantia do direito de propriedade (CF, art. 5º, XXII) - proclama que "ninguém será
privado (...) de seus bens, sem o devido processo legal" (art. 5º, LIV). - O respeito à lei
e à autoridade da Constituição da República representa condição indispensável e
necessária ao exercício da liberdade e à prática responsável da cidadania, nada podendo
legitimar a ruptura da ordem jurídica, quer por atuação de movimentos sociais (qualquer
que seja o perfil ideológico que ostentem), quer por iniciativa do Estado, ainda que se
trate da efetivação da reforma agrária, pois, mesmo esta, depende, para viabilizar-se
constitucionalmente, da necessária observância dos princípios e diretrizes que
estruturam o ordenamento positivo nacional. – O esbulho possessório, além de
qualificar-se como ilícito civil, também pode configurar situação revestida de tipicidade
penal, caracterizando-se, desse modo, como ato criminoso (CP, art. 161, § 1º, II; Lei nº
4.947/66, art. 20). - Os atos configuradores de violação possessória, além de
instaurarem situações impregnadas de inegável ilicitude civil e penal, traduzem
hipóteses caracterizadoras de força maior, aptas, quando concretamente ocorrentes, a
infirmar a própria eficácia da declaração expropriatória. Precedentes. O RESPEITO À
LEI E A POSSIBILIDADE DE ACESSO À JURISDIÇÃO DO ESTADO (ATÉ
133
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
MESMO PARA CONTESTAR A VALIDADE JURÍDICA DA PRÓPRIA LEI)
CONSTITUEM VALORES ESSENCIAIS E NECESSÁRIOS À PRESERVAÇÃO DA
ORDEM DEMOCRÁTICA. - A necessidade de respeito ao império da lei e a
possibilidade de invocação da tutela jurisdicional do Estado - que constituem valores
essenciais em uma sociedade democrática, estruturada sob a égide do princípio da
liberdade - devem representar o sopro inspirador da harmonia social, além de significar
um veto permanente a qualquer tipo de comportamento cuja motivação derive do intuito
deliberado de praticar gestos inaceitáveis de violência e de ilicitude, como os atos de
invasão da propriedade alheia e de desrespeito à autoridade das leis da República.
RECONHECIMENTO, EM JUÍZO DE DELIBAÇÃO, DA LEGITIMIDADE
CONSTITUCIONAL DA MP Nº 2.027-38/2000, REEDITADA, PELA ÚLTIMA VEZ,
COMO MP Nº 2.183-56/2001. - Não é lícito ao Estado aceitar, passivamente, a
imposição, por qualquer entidade ou movimento social organizado, de uma agenda
político-social, quando caracterizada por práticas ilegítimas de invasão de propriedades
rurais, em desafio inaceitável à integridade e à autoridade da ordem jurídica. - O
Supremo Tribunal Federal não pode validar comportamentos ilícitos. Não deve
chancelar, jurisdicionalmente, agressões inconstitucionais ao direito de propriedade e à
posse de terceiros. Não pode considerar, nem deve reconhecer, por isso mesmo,
invasões ilegais da propriedade alheia ou atos de esbulho possessório como
instrumentos de legitimação da expropriação estatal de bens particulares, cuja
submissão, a qualquer programa de reforma agrária, supõe, para regularmente efetivarse, o estrito cumprimento das formas e dos requisitos previstos nas leis e na
Constituição da República. - As prescrições constantes da MP 2.027-38/2000, reeditada,
pela última vez, como MP nº 2.183-56/2001, precisamente porque têm por finalidade
neutralizar abusos e atos de violação possessória, praticados contra proprietários de
imóveis rurais, não se mostram eivadas de inconstitucionalidade (ao menos em juízo de
estrita delibação), pois visam, em última análise, a resguardar a integridade de valores
protegidos pela própria Constituição da República. O sistema constitucional não tolera a
prática de atos, que, concretizadores de invasões fundiárias, culminam por gerar considerada a própria ilicitude dessa conduta - grave situação de insegurança jurídica,
de intranqüilidade social e de instabilidade da ordem pública (...) (ADI - MC 2.213/DF,
86
Rel. Min. Celso de Mello, julgada em 04/04/2002 - Informativo 262) .
Desta forma, resta evidente que as ações do MST e da Via Campesina em
Coqueiros do Sul não encontram qualquer amparo no sistema legal e constitucional
brasileiro.
2.5. ESTADO. DEVER DE PRESTAR SEGURANÇA PÚBLICA.
Em seu art. 144, a Constituição afirma que constitui dever do Estado
garantir segurança pública aos cidadãos, assim como preservar a ordem pública e a
incolumidade das pessoas e do patrimônio. Em que pese tal dispositivo, os esforços até
o momento despendidos pelo Estado têm sido insuficientes não apenas para garantir o
86
Fonte: sítio do STF, acesso em 11/04/2008:
http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp
134
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
regular cumprimento da Lei nas regiões sob atuação do MST, mas igualmente para
defender de forma efetiva o Estado Democrático de Direito.
No item 1.21, o Ministério Público já apontou o julgado de nº
70018362483, da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do RS, datado de 29/11/2007 e
relatado pelo Des. Tasso Caubi Soares Delabary, no qual o Estado foi condenado a
indenizar os proprietários da Estância Capivara, situada em Hulha Negra, em razão da
conduta omissiva do ente público (falha no planejamento preventivo e execução dos
serviços de segurança) que permitiu a ocorrência de danos materiais e morais derivados
de invasões promovidas pelo MST naquele local. No voto do Relator consta menção ao
seguinte acórdão:
RESPONSABILIDADE
DO
ESTADO
POR
DEFICIÊNCIA
NO
PLANEJAMENTO PREVENTIVO E EXECUÇÃO DE SERVIÇOS DE
SEGURANÇA. MOVIMENTO MULTITUDINÁRIO: INVASÃO DE ‘COLONOS
SEM TERRA’ A PROPRIEDADE PARTICULAR, E DANOS CONSEQÜENTES,
PREVISÍVEIS, QUE NÃO FORAM EVITADOS POR DEFICIÊNCIA NO
PLANEJAMENTO PREVENTIVO E EXECUCÃO DE SERVIÇOS DE
SEGURANÇA A CARGO DO ESTADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA DE DANOS
MATERIAIS E MORAIS JULGADA PROCEDENTE. PROVIMENTO PARCIAL DO
RECURSO. VOTO VENCIDO (Apelação Cível nº 595135542, 2ª Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do RS, Rel. Des. Élvio Schuch Pinto, julgado em 06/12/1995).
No mesmo sentido julgou recentemente a 9ª Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Sul, em julgamento datado de 30 de abril de 2008:
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO DE
INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. INVASÃO DE
PROPRIEDADE RURAL POR MEMBROS DO MOVIMENTO DOS SEM TERRA.
1. OMISSÃO GENÉRICA EM FORNECER SEGURANÇA PÚBLICA.
RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO ESTADO. DEVER DE INDENIZAR. I.
Comprovada a omissão do Poder Público em fornecer segurança adequada diante de
invasão de integrantes do MST à propriedade rural. Incidência da teoria da faute du
service, a configurar a responsabilidade subjetiva do Estado. II. Demonstrada a culpa,
na modalidade negligência, diante da omissão do Poder Público no seu dever de prestar
segurança pública. 2. OMISSÃO ESPECÍFICA DO ESTADO. DESCUMPRIMENTO
DE ORDEM JUDICIAL DETERMINANDO A PRESENÇA DA BRIGADA
MILITAR DURANTE O CUMPRIMENTO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE.
OMISSÃO QUE SE EQUIPARA À CAUSAÇÃO POSITIVA DO FATO DANOSO.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. DEVER DE INDENIZAR. I. A
omissão específica ocorre quando o Estado, omitindo-se, deixa de evitar um resultado
concreto, quando tinha o dever de agir. Assim, a não-evitação de um resultado concreto,
quando tal era possível, equipara-se à causação positiva do mesmo, quando havia o
dever de evitá-lo. 3. DANO MORAL. Evidenciados os pressupostos para a
responsabilidade civil do réu, o dano moral dispensa prova concreta para a sua
caracterização, que origina o dever de indenizar. Suficiente a prova da existência do ato
135
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
ilícito, pois o dano moral existe in re ipsa. Precedentes desta Corte e do STJ. Conforme
doutrina abalizada sobre a matéria, a indenização por dano moral deve representar para
a vítima uma satisfação capaz de amenizar de alguma forma o sofrimento impingido e
de infligir ao causador sanção e alerta para que não volte a repetir o ato. Com efeito, a
eficácia da contrapartida pecuniária está na aptidão para proporcionar tal satisfação em
justa medida, de modo que não signifique um enriquecimento sem causa para a vítima e
produza impacto bastante no causador do mal a fim de dissuadi-lo de novo atentado. 4.
Manutenção do valor da indenização a título de danos morais, bem como a incidência
de correção monetária pelo IGP-M. 5. Tratando-se de reexame necessário, a
devolutividade é plena, não podendo a reforma restringir-se ao benefício da Fazenda
Nacional, o que seria inconstitucional por ferir a isonomia das partes. Os juros de mora
devem ser fixados em percentual de 12% ao ano sobre o valor da indenização por danos
morais. 6. DANO MATERIAL. Estando suficientemente comprovadas as despesas
havidas pelos autores em decorrência da invasão, é devida a indenização pelos danos
materiais, a serem apurados em liquidação de sentença. 7. Quantum indenizatório
mantido a título de danos materiais, inclusive a incidência de correção monetária a
contar de cada desembolso e, quanto aos animais mortos, armas e telefone celular, a
contar da invasão da fazenda, bem como juros moratórios a contar do prejuízo, sendo de
6% ao ano, até 10/01/2003, e de 12% ao ano, a partir desta data. DESPROVERAM A
APELAÇÃO E REFORMARAM PARCIALMENTE A SENTENÇA EM REEXAME
NECESSÁRIO. UNÂNIME (Apelação Cível nº 70023461031, 9ª Câmara Cível do
TJRS, Rel. Des. Odoné Sanguiné, j. 30/04/2008).
Assim, faz-se necessária a retirada dos membros do MST das suas bases
operacionais, também com o objetivo de evitar os danos ao erário que advirão de sua
permanência naqueles locais.
2.6. RESTRIÇÃO DA PROPRIEDADE. POSSIBILIDADE DE
AVERBAÇÃO.
Para impedir o uso anormal ou nocivo das terras nas quais estão situados
os acampamentos Jandir e Serraria, cabe a imposição de restrições ao direito de
propriedade. De fato, conforme já exaustivamente demonstrado, os danos causados
pelas atividades do MST a partir daquelas áreas transcendem as fazendas e moradores
da região de Coqueiros do Sul, atingindo toda a sociedade. Apresenta-se cabível, pois, a
interferência do Poder Judiciário na espécie, a fim de que limite a utilização perniciosa e
anti-social daquelas propriedades, restringindo o direito de uso e gozo e determinando,
por conseqüência, suas desocupações por parte dos acampados.
O provimento judicial almejado pelo Ministério Público consiste,
essencialmente, em restrições que impossibilitem o MST, Via Campesina e movimentos
afins de continuarem utilizando as áreas dos acampamentos Jandir e Serraria para
136
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
ataques reiterados em Coqueiros do Sul. Note-se que ambos os acampamentos possuem
área inferior ao módulo rural da região, razão pela qual inexiste qualquer motivo
razoável para a permanência de mais de uma família naqueles locais. Assim, diversas
medidas restritivas são cabíveis, estando descritas no item 4 - Do Pedido, letra a.
Impende salientar que tais restrições são passíveis de averbação nas
respectivas matrículas dos imóveis, a teor do disposto no art. 167, II, 5, da Lei Federal
n.º 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos): “No Registro de Imóveis, além da matrícula,
serão feitos (...) a averbação (...) de outras circunstâncias que, de qualquer modo,
tenham influência no registro ou nas pessoas nele interessadas".
É pacífico o entendimento doutrinário no sentido de que o mencionado
dispositivo não é taxativo, mas meramente exemplificativo, tanto que o art. 246 do
mesmo diploma legal assevera: "além dos casos expressamente indicados no item II do
art. 167, serão averbadas na matrícula (...) outras ocorrências que, por qualquer modo,
alterem o registro".
2.7. LEGITIMIDADE PASSIVA.
2.7.1. Acampamento Serraria. Arno Maier e Namir Costa Maier.
Arno Maier é o proprietário da área rural de 5,1 ha na qual está instalado
o Acampamento Serraria, estando o imóvel cadastrado sob n.º 21.740, Livro n.º 2 do
Registro Geral do Ofício do Registro de Imóveis da Comarca de Carazinho - RS87.
Embora figure como único proprietário, Arno Maier é casado com Namir
Costa Maier pelo regime da comunhão universal de bens. É cediço que a ação judicial
envolvendo direito real imobiliário deve ser promovida contra ambos os cônjuges, em
litisconsórcio passivo necessário, conforme determinam os arts. 1.647, II, do Código
Civil88, e 10, § 1º, inciso I, do Código de Processo Civil89, razão pela qual ambos estão
legitimados para figurar no pólo passivo da presente ação.
87
Fls. 1756/1757.
Art. 1.647. “Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro,
exceto no regime da separação absoluta: I – alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; II – pleitear
como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; (...).”
88
137
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
2.7.2. Acampamento Jandir. Alceu Lamb, Clací Dalila Becker Lamb,
Jandir Celso Wiebrantz e Dormelio Franciozi. Banco Bradesco S/A.
O chamado Acampamento Jandir está situado no imóvel de 161.000,00
m², objeto da matrícula n.º 7.644, Livro n.º 2 do Registro Geral, do Ofício do Registro
de Imóveis de Carazinho - RS (R.4)90, cujos proprietários são Alceu Lamb e Jandir
Celso Wiebrantz, tocando a cada um a área ideal de 80.095,00 m². Alceu Lamb é casado
pelo regime da comunhão universal de bens com Clací Dalila Becker Lamb (AV.5), daí
a legitimidade desta para figurar no presente feito como demandada, juntamente com
seu marido, em litisconsórcio passivo necessário (art. 1.647, II, do CC/02 e art. 10, § 1º,
inciso I, do CPC ).
Jandir Celso Wiebrantz, condômino de Alceu Lamb, arrendou sua área
para Dormelio Franciozi91 pelo prazo de 03 (três) anos (até 25/04/2010), decorrendo
deste contrato a legitimidade de ambos para que figurem como demandados nesta ação.
Convém observar que o mencionado contrato de arrendamento apresenta-se eivado de
nulidade absoluta, cabendo a declaração ex officio. De fato, o artigo 1.314, parágrafo
único, do Código Civil, estabelece que "nenhum dos condôminos pode alterar a
destinação da coisa comum, nem dar posse, uso ou gozo dela a estranhos, sem o
consentimento dos outros". Trata-se de requisito formal para a validade do negócio
jurídico que não foi observado na espécie, já que Alceu Lamb não participou da
celebração do contrato. Descumprida a exigência legal, exsurge a nulidade do contrato,
na forma preconizada pelo art. 166, inciso IV, do Código Civil: "é nulo o negócio
jurídico quando: (...) IV - não revestir a forma prescrita em lei".
A fração ideal de Alceu Lamb relativamente ao imóvel mencionado foi
hipotecada
(hipoteca cedular em 1º, 2º, 3º e 4º graus) ao Banco Bradesco S/A
(conforme R.7, R.8, R.11 e R.12 da matrícula). Em que pese o Ministério Público não
vislumbre qualquer prejuízo ao banco no caso de procedência dos pedidos formulados
89
Art. 10, § 1º - “Ambos os cônjuges serão necessariamente citados para as ações: I – que versem sobre
direitos reais imobiliários (...)”.
90
Fls. 1747/1752.
91
Fls. 1751/1752.
138
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
na presente ação, haverá, em tese, restrição ao direito de propriedade, razão pela aquela
instituição bancária deve integrar o pólo passivo deste feito para que manifeste eventual
interesse.
2.7.3. MST. Personalidade judiciária.
Não há que se questionar a legitimidade do MST – Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra, para integrar o pólo passivo da presente ação,
porquanto constitui entidade dotada de personalidade judiciária. Nesse sentido, podem
ser apontados os seguintes precedentes jurisprudenciais:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. MOVIMENTO DOS
TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA – MST. FALTA DE
PERSONALIDADE
JURÍDICA.
LEGITIMIDADE
PASSIVA.
POSSIBILIDADE. PERSONALIDADE JUDICIÁRIA. Agravo Provido
(TJRS, Agravo de Instrumento nº 70005527601, 17ª Câmara Cível, Rel.
Des. Alexandre Mussou Moreira, julgado em 11/02/2003).
Consta no acórdão:
A existência do MST é fato para o qual não se pode virar as costas.
Trata-se de movimento articulado, com representatividade política e
social, na busca da reforma agrária.
Não há quem desconheça diversas ocupações promovidas pelo
Movimento, bem como assentamentos criados por força de suas ações.
Também não se desconhecem suas lideranças, as quais, não raro, prestam
declarações à mídia impressa, radiofônica e televisiva.
(...)
Assim, sem adentrar no mérito das ações e posições assumidas pelo
Movimento, a verdade é que sua existência é uma realidade.
Conforme bem assinalado pelo Procurador de Justiça que atua
junto a esta Câmara, Dr. ARMANDO ANTÔNIO LOTTI, em seu
Parecer, às fls. 97/100:
(...)
“Dentro deste contexto, é caso de conferir ao referido movimento,
ao menos, personalidade judiciária, pois, embora não dotado – até
mesmo intencionalmente (vide certidão da fl. 83) – de personalidade
jurídica, como é notório, ativamente de negociações com órgãos
públicos, obtém empréstimos e, inclusive, quando lhe convém, litiga em
139
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
juízo (‘v.g.’: agravo de instrumento nº 70.000.186.333, cuja ementa
adiante será transcrita). Aliás, o Superior Tribunal de Justiça, pela 4ª
Turma, já se pronunciou no sentido de que ‘podem litigar em juízo ‘as
pessoas formais’, as sociedades de fato, ainda sem personalidade
jurídica’ (Resp. nº 1.551-MG, relator Ministro Athos Gusmão Carneiro,
D.J.U. em 09.04.90, p. 2.743). Noutra oportunidade, o mesmo Superior
Tribunal de Justiça consagrou que ‘o legislador de 1973, ao atribuir, no
art. 12 – VII do CPC, capacidade para ser parte às sociedades sem
personalidade jurídica, colimou, embora com desapego com o rigor
científico, tornar menos gravosa a situação processual dos que com tais
sociedades irregulares litigam’ (Resp. nº 14.180-0/SP, 4ª Turma, relator
Ministro Sálvio de Figueiredo, D.J.U. em 28.06.93, p. 12.895). Esta
Corte, com relação ao MST, de forma específica, manifestou-se, como
anteriormente referido, pela sua legitimidade ativa em razão de ser
dotado de personalidade judiciária, a saber:
“PROCESSUAL CIVIL. PERSONALIDADE JUDICIÁRIA.
COMUNIDADE DE FATO. INEXISTÊNCIA. FALTA DE
INTERESSE DE AGIR.
“1. O direito à tutela jurídica do estado compete a todos, pessoas
naturais e jurídicas, nacionais e estrangeiros, cidadãos ou não, e inclusive
a entes sem personalidade jurídica, a exemplo da comunidade de fato
designada de ‘Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra’- MST,
que ostenta, portanto, personalidade judiciária. No entanto, só lhe
compete, nos termos do art. 1º, parágrafo único, do Decreto nº 2.250/97,
indicar imóvel para fins de reforma agrária, não lhe reconhecendo a
ordem jurídica direito a pleitear vistoria judicial de imóveis para tal
efeito.
“2. Agravo de Instrumento provido.” (grifou-se, Agravo de
Instrumento nº 70.000.186.833, 4ª Câmara Cível, relator Desembargador
Araken de Assis, julgado em 29.12.1999).
“Assim, tenho que o MST ´parte legítima para figurar no pólo
passivo do interdito proibitório manejado pelo agravante, devendo a
referida sociedade de fato ser citada no endereço declinado à fl. 05 deste
instrumento (prédio cedido pelo “Clube da Cidadania” – fl. 89), na
pessoa de quem lá estiver administrando seus interesses (artigo 12,
inciso VII, do CPC), pois, a despeito da ausência de personalidade,
responde pelos atos que vem praticar frente a terceiros, encontrando
supedâneo, também, a “legitimatio ad causam” em debate, no “princípio
da responsabilidade incidente sobre a massa patrimonial e sua
repercussão no acervo dos indivíduos componentes” (Pereira, Caio
Mário da Silva. Instituições de Direito Civil, vol. I, ps. 296 e 297, 5ª
edição, Forense, Rio de janeiro, 1980).
No mesmo sentido:
REINTEGRAÇÃO DE POSSE. MST. PERSONALIDADE JUDICIÁRIA.
RECONHECIDA. DAER. INVASÃO. FAIXA DE DOMÍNIO RODOVIÁRIA. BEM
140
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PÚBLICO. ESBULHO CARACTERIZADO. REINTEGRAÇÃO DE POSSE.
MEDIDA LIMINAR CONSOLIDADA. 1. PRELIMINAR DE INEXISTÊNCIA DO
LEGITIMADO PASSIVO: O §2º do art. 12 do CPC, determina que ¿as sociedades sem
personalidade jurídica, quando demandadas, não poderão opor a irregularidade de sua
constituição¿. No caso dos autos, ao MST se confere ¿personalidade judiciária¿ e se
admite o ingresso na lide, muito embora não esteja regularmente constituído. 2. DO
MÉRITO: o apelado caracterizou devidamente o esbulho possessório. Por isso, procede
o pedido deduzido nesta demanda. O esbulho se deu na faixa de domínio da ERS-630,
por integrantes do MST, que foram desalojados de área próxima. Ademais, o Poder
Público mobilizou-se e conseguiu separar área de terra de 1.800 ha no município de
Santana do Livramento para assentar as famílias e os trabalhadores sem terra.
REJEIÇÃO DA QUESTÃO PRELIMINAR E NÃO PROVIMENTO AO RECURSO
(Apelação Cível nº 70014901128, 20ª Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Rel.
Des. Carlos Cini Marchionatti, julgado em 28/06/2006).
PROCESSUAL CIVIL. PERSONALIDADE JUDICIÁRIA. COMUNIDADE
DE FATO. INEXISTÊNCIA. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. 1. O DIREITO A
TUTELA JURIDICA DO ESTADO COMPETE A TODOS, PESSOAS NATURAIS E
JURIDICAS, NACIONAIS E ESTRANGEIROS, CIDADAOS OU NAO, E
INCLUSIVE A ANTES SEM PERSONALIDADE JURÍDICA, A EXEMPLO DA
COMUNIDADE DE FATO DESIGNADA DE "MOVIMENTO DOS
TRABALHADORES SEM TERRA"" (MST), QUE OSTENTA, PORTANTO,
PERSONALIDADE JUDICIÁRIA. NO ENTANTO, SÓ LHE COMPETE, NOS
TERMOS DO ART. 1º, PARÁGRAFO ÚNICO, DO DECRETO 2250/97 INDICAR
IMÓVEL PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA, NÃO LHE RECONHECENDO A
ORDEM JURÍDICA DIREITO A PLEITEAR VISTORIA JUDICIAL DE IMÓVEIS
PARA TAL EFEITO. 2. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO (Agravo de
Instrumento nº 70000186833, 4ª Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Rel. Des.
Araken de Assis, julgado em 29/12/1999).
3. DO PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE
TUTELA.
Os elementos de convicção colhidos pelo Ministério Público e ora
apresentados ao Poder Judiciário demonstram, com certeza e segurança, a utilização
perniciosa e anti-social dos acampamentos Jandir e Serraria, verdadeiras bases
operacionais destinadas à prática de crimes e ilícitos civis causadores de enormes
prejuízos não apenas aos proprietários da Fazenda Coqueiros, mas à toda sociedade.
Convém lembrar que as terras em questão, ambas inferiores ao módulo rural da região,
foram escolhidas e arrendadas já com o propósito de servirem aos fins escusos
apontados nesta inicial, não sendo utilizadas para qualquer produção agropecuária digna
de nota, razão pela qual descumprem a função social da propriedade.
141
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Em que pese mantidos basicamente às expensas do Poder Público, os
acampamentos constituem sérios focos de tensão na região, impondo enormes gastos ao
Estado e causando risco permanente de confronto em decorrência das ações
desencadeadas a partir daqueles locais, inclusive com grande probabilidade de perda
de vidas humanas e enormes prejuízos ambientais.
Não bastasse isso, várias crianças são mantidas naqueles acampamentos,
sendo submetidas à doutrinação emessista, utilizadas nas linhas de vanguarda para
refrear reações durante invasões e, desta forma, estando constantemente expostas a
riscos ilegais, desnecessários e evitáveis.
Por outro lado, dado que a presença do MST no entorno da Fazenda
Coqueiros apresenta importância estratégica e simbólica para aquele movimento
político-revolucionário, existe a necessidade de afirmação do Estado Democrático de
Direito, da força das instituições que o compõem e, em especial, da legislação
constitucional e infraconstitucional vigente.
Nesse contexto, faz-se imprescindível a imediata desocupação dos
acampamentos Jandir e Serraria por parte dos integrantes do MST, como forma de
evitar prejuízos sociais e individuais irreparáveis.
Estão presentes na espécie, pois, os requisitos previstos no art. 273 do
Código de Processo Civil para a concessão da medida de antecipação da tutela
postulada nesta ação, razão pela qual o Ministério Público requer seja determinada a
imediata desocupação daquelas áreas pelos acampados.
4. DO PEDIDO.
Ante o exposto, o Ministério Público requer:
a) como medida de ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, que esse juízo
determine que os acampados desocupem imediatamente os imóveis objeto das
matrículas nºs 7.644 (Acampamento Jandir) e 21.740 (Acampamento Serraria), ambas
do Livro n.º 2 – Registro Geral, do Ofício do Registro de Imóveis da Comarca de
Carazinho – RS;
b) ainda como ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, seja determinado às
142
MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
forças policiais, em especial à Brigada Militar, efetuem a desocupação forçada dos
acampamentos referidos no item anterior, caso os acampados não cumpram a ordem
judicial de imediata desocupação daquelas áreas;
c) seja expedido mandado inibitório proibindo aos réus Arno Maier,
Namir Costa Maier, Alceu Lamb, Clací Dalila Becker Lamb, Jandir Celso Wiebrantz,
Dormelio Franciozi e Banco Bradesco S/A e seus sucessores, a qualquer título, bem
como a eventuais proprietários, possuidores ou detentores das áreas objeto das
matrículas nºs 7.644 e 21.740, ambas do Livro nº 2 – Registro Geral, do Ofício do
Registro de Imóveis da Comarca de Carazinho – RS, de praticar os atos a seguir
relacionados naqueles imóveis:
c.1) instalar, autorizar ou permitir, por ação ou omissão, a formação de
acampamentos do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra ou
Movimento Sem Terra), MLST (Movimento de Libertação dos Sem-Terra), MLT
(Movimento de Luta pela Terra), MAST (Movimento dos Agricultores Sem-Terra),
MTL (Movimento Terra, Trabalho e Liberdade), MPA (Movimento dos Pequenos
Agricultores), MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens), LCP (Liga dos
Camponeses Pobres), LOC (Liga Operária e Camponesa), MTD (Movimento dos
Trabalhadores Desempregados), MMTR (Movimento das Mulheres Trabalhadoras
Rurais), PJR (Pastoral da Juventude Rural), Via Campesina ou de entidades afins; c.2)
instalar, autorizar ou permitir, por ação ou omissão, a utilização daqueles locais por
mais de uma família; c.3) promover, autorizar ou permitir, por ação ou omissão, a
reunião de ‘sem-terras” e integrantes de movimentos afins no local; c.4) promover,
autorizar ou permitir, por ação ou omissão, a utilização dos locais como pontos para
aliciar ou arregimentar “sem-terras” ou integrantes de movimentos afins; c.5) utilizar
as propriedades como locais de representação ou propaganda do MST (Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra ou Movimento Sem Terra), MLST (Movimento
de Libertação dos Sem-Terra), MLT (Movimento de Luta pela Terra), MAST
(Movimento dos Agricultores Sem-Terra), MTL (Movimento Terra, Trabalho e
Liberdade), MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores), MAB (Movimento dos
Atingidos por Barragens), LCP (Liga dos Camponeses Pobres), LOC (Liga Operária e
Camponesa), MTD (Movimento dos Trabalhadores Desempregados), MMTR
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MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
(Movimento das Mulheres Trabalhadoras Rurais), PJR (Pastoral da Juventude Rural),
Via Campesina ou de entidades afins; c.6) promover, autorizar ou permitir, por ação
ou omissão, a utilização das propriedades como locais para o início ou fim de
marchas; c.7) promover, autorizar ou permitir, por ação ou omissão, a utilização
daquelas áreas como pontos para manifestações de “sem-terras”, de movimentos afins
ou de seus simpatizantes.
d) a expedição de mandado ao Registro de Imóveis de Carazinho - RS,
para fazer constar nas matrículas nºs 7.644 e 21.740, ambas do Livro nº 2 – Registro
Geral, a existência dos mandados referidos no item anterior (item c);
e) a cominação de multa diária aos réus, no valor de R$ 10.000,00 (dez
mil reais) por dia, para o caso de descumprimento das vedações referidas no item c;
f) seja tornada definitiva a liminar de desocupação dos acampamentos,
conforme itens a e b;
g) a produção de provas por todos os meios em direito admitidos,
especialmente testemunhal, documental, pericial e outros previstos em Lei;
h) a citação dos réus.
Valor da causa: o de alçada.
Carazinho, 11 de junho de 2008.
Luís Felipe de Aguiar Tesheiner
Promotor de Justiça
Benhur Biancon Junior
Promotor de Justiça
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1 Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da ___ Vara Cível da