Trabalhadora acusada de furto de carne será indenizada
A 11ª Câmara do TRT-15 deu parcial provimento ao recurso da reclamante, funcionária de uma renomada rede de supermercados,
dispensada por justa causa, acusada de ter furtado produtos da loja em que trabalhava, e fixou em R$ 15 mil a indenização por
danos morais por entender que a empresa agiu com desrespeito ao princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III, da
Constituição Federal), caracterizando-se como verdadeiro abuso no exercício do poder diretivo (artigo 2º CLT).
A reclamante relatou nos autos do processo trabalhista que foi acusada injustamente de separar produtos da empresa para levar
embora, e que em seu armário foram encontradas peças de carne e pacotes de espetinho, além de uma peça de carne em sua bolsa.
A trabalhadora negou o furto e se mostrou surpreendida com o fato, segundo ela, uma situação armada para que fosse prejudicada.
A empresa chamou a polícia, o que resultou na prisão da trabalhadora por furto. Em sua defesa, a reclamada informou que a
empregada vinha sofrendo fiscalização pela suspeita de subtração de produtos, sem pagamento. Segundo constou dos autos, no dia
7/9/2012 a gerente comercial da empresa presenciou a reclamante retirando dois pacotes de torrada das prateleiras e escondendo
no balcão de congelados da peixaria. Por conta de tal atitude, a gerente teria acionado o fiscal da loja e dois repositores, sendo que
no mesmo dia presenciaram a autora se deslocando por diversas vezes ao banheiro/vestiário. No final do mesmo dia, a gerente
comercial aguardou a reclamante no vestiário (escondida) e a viu colocar coisas no armário. Quando a trabalhadora percebeu a
presença da gerente, ela fechou seu armário, pegou sua mochila e se dirigiu para o estacionamento, onde um fiscal insistiu com ela
para que abrisse a mochila, onde foram encontradas, embaixo de roupas, peças de carne (picanha), queijo e peito de peru.
O juízo da 2ª Vara do Trabalho de Campinas acolheu a tese da empresa e confirmou a justa causa imposta pela empregadora, em
face do auto de exibição/apreensão/entrega dos produtos apreendidos com a reclamante e lavrado por autoridade policial e,
também, pelo fato de a trabalhadora não ter conseguido provar o que ela mesma havia narrado na inicial. Para o relator do
acórdão, desembargador João Batista Martins César, o reconhecimento da demissão da justa causa, pelo Judiciário, pode acarretar
grandes prejuízos profissionais para o empregado e por isso é imprescindível que haja prova contundente acerca dos fatos graves
aduzidos pela empresa. No caso dos autos, porém, segundo o acórdão, não existe a prova irrefutável acerca do ilícito atribuído à
trabalhadora.
O colegiado considerou, principalmente, o fato de o acesso aos vestiários ser por um corredor com recepção e câmeras onde
sempre está um fiscal da loja, que quase nunca deixava o local. A afirmação foi feita por uma testemunha, que também afirmou
acreditar que, pela presença do fiscal nesse corredor, não é possível entrar no vestiário com mercadorias da loja, especialmente as
de grande volume. A testemunha se referiu ao comportamento um pouco instável da gerente, com quem ela [testemunha] já teve
desavenças, e lembrou, por fim, que achou estranho o ocorrido, pois o armário da reclamante sempre ficava aberto.
O colegiado ressaltou ainda o fato que, ao ser contratado pela empresa, o funcionário é obrigado a levar um cadeado com duas
chaves, das quais uma fica em seu poder e outra com a gerência. Para o relator do acórdão, a afirmação pelo preposto da
reclamada de que havia vigilância nos corredores de acesso e que a demandante não era a única a ter acesso a seu próprio armário,
afasta qualquer raciocínio que enseje a conclusão de que foi ela que introduziu no armário mercadorias que ali foram encontradas
ou mesmo que as mercadorias encontradas em sua mochila (que ficava guardada no armário), no estacionamento da reclamada,
foram acondicionados naquele acessório pela recorrente, pois para isso precisa adentrar as instalações do vestiário, passando por
câmeras e fiscais da reclamada.
Nem mesmo a existência de Boletim de Ocorrência e do Auto de Exibição/Apreensão/Entrega dos produtos apreendidos têm o
condão de provar de forma patente a prática de ilícito pela empregada, mesmo porque foram embasados nas informações
prestadas pelos funcionários da reclamada, destacou o colegiado.
Por fim, a 11ª Câmara salientou que uma consulta na rede mundial de computadores a respeito dos expedientes que culminaram
no alvará de soltura juntado aos autos revelou a inexistência de ação criminal ou outro procedimento em que a trabalhadora figure
como ré, o que indica que não houve continuidade na ação penal, o que configura a falta de condenação naquela esfera da justiça.
Por tudo isso, a decisão colegiada da 11ª Câmara converteu a dispensa da trabalhadora para a modalidade sem justa causa,
deferindo, entre outros, o pagamento de indenização por danos morais. O acórdão chamou de inaceitável e temerária a conduta da
empresa por meio de seus prepostos, submetendo a trabalhadora a vigilância mais severa do que aquela dispensada a outros
profissionais da mesma unidade, bem como a atitude da gerente comercial, ao ficar ‘escondida no vestiário para flagrar atitude
errada e, ainda, a perseguição da empregada para além das divisas da loja (no estacionamento), impondo-lhe a abertura de
acessório próprio (mochila). No entendimento do colegiado, a empresa expôs a trabalhadora à curiosidade alheia, questionando
sua honestidade perante seus colegas de trabalho e toda a comunidade.
Em seu pedido original, a trabalhadora requereu R$ 500 mil a título de dano moral. O valor, porém, foi adequado, observados os
imperativos da razoabilidade, para R$ 15 mil, atendendo ao mesmo tempo a duas finalidades concomitantes e distintas:
compensação da vítima e punição/dissuasão do agressor. (Processo 0000105-82.2013.5.15.0032)
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região
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