Pastagens e Forragens
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S U M Á R I O
Páginas
Situação e Perspectivas da Produção de Forragens e Pastagens no Entre Douro e Minho.
Nuno Moreira
1–10
Da Forragem à Pastagem Semeada (com Retrocesso à Pastagem Natural). Teodósio A.
Salgueiro
11–27
Efeito da Aplicação ao Solo de Compostado de Resíduos Sólidos Urbanos Sobre a Concentração em Metais Pesados da Cevada e do Milho. Manuel Souteiro Gonçalves, António
Videira da Costa, Cristina M. Sempiterno
27–40
Teores de Cobre e Zinco numa Pastagem Instalada num Solo Tratado com Lama Residual
Urbana com Elevado Teor de Cobre. Hermínia Domingues, Odete Monteiro, Filipe Pedra,
Maria da Graça Serrão
41–52
Gleditsia Triacanthos – Leguminosa Arbórea com Interesse Forrageiro. Caracterização
Química e Nutricional. Arminda Martins Bruno-Soares, Benilde Martins Pereira, José
Manuel Abreu
53–68
Composição Botânica da Dieta Alimentar de Bovinos em Pastoreio – Método da Análise
Micro-histológica de Fezes. Jerónimo Côrte-real Santos, Ana Catarina Ferreira
69–78
Fitoestrogénios da Luzerna e suas Implicações na Alimentação de Vacas Leiteiras. Luísa
M. Chambel Leitão, M. Conceição Castilho, José M. Abreu
79–90
Produção e Valor Nutritivo da Consociação de Cereais Forrageiros com Ervilhaca (Vicia
Benghalensis L.). Valdemar Carnide, Miguel A. M. Rodrigues, Luis M. M. Ferreira,
Henrique Guedes-Pinto
91–102
pastagens
e
forragens
pastagens e forragens
Conclusões da XXIII Reunião de Primavera da SPPF. S. Torcato – Guimarães 103–106
(16 a 19 de Abril de 2002)
Sociedade Portuguesa de Pastagens e Forragens
23
2002
MONTAGEM CAPA.indd 1
produtor
design sistemas gráficos
grafica europam
orçamento 27057
de 21 mar. 2005
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Sociedade Portuguesa de Pastagens
e Forragens
Maio 2005
edição 23 Pastagens 750 exemplares +
de Forragens
50 separatas
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FORMATO ACABADO
PAPEL
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ACABAMENTO
cadernos
160X240 MM
capa:
cromocard 260 g
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ior 70 gr.
800 exemplares
750 normal +
50 separatas por
capítulo com 2
pontos de arame
miolo colado a
capa mole sem
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7 cad. de 16 pags 1 /1 cor miolo
112 pgs. + capa. 1 / 1 cor capa
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Pastagens e Forragens
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Situação e Perspectivas da Produção de Forragens e Pastagens no Entre Douro e Minho.
Nuno Moreira
1–10
Da Forragem à Pastagem Semeada (com Retrocesso à Pastagem Natural). Teodósio A.
Salgueiro
11–27
Efeito da Aplicação ao Solo de Compostado de Resíduos Sólidos Urbanos Sobre a Concentração em Metais Pesados da Cevada e do Milho. Manuel Souteiro Gonçalves, António
Videira da Costa, Cristina M. Sempiterno
27–40
Teores de Cobre e Zinco numa Pastagem Instalada num Solo Tratado com Lama Residual
Urbana com Elevado Teor de Cobre. Hermínia Domingues, Odete Monteiro, Filipe Pedra,
Maria da Graça Serrão
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Gleditsia Triacanthos – Leguminosa Arbórea com Interesse Forrageiro. Caracterização
Química e Nutricional. Arminda Martins Bruno-Soares, Benilde Martins Pereira, José
Manuel Abreu
53–68
Composição Botânica da Dieta Alimentar de Bovinos em Pastoreio – Método da Análise
Micro-histológica de Fezes. Jerónimo Côrte-real Santos, Ana Catarina Ferreira
69–78
Fitoestrogénios da Luzerna e suas Implicações na Alimentação de Vacas Leiteiras. Luísa
M. Chambel Leitão, M. Conceição Castilho, José M. Abreu
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Produção e Valor Nutritivo da Consociação de Cereais Forrageiros com Ervilhaca (Vicia
Benghalensis L.). Valdemar Carnide, Miguel A. M. Rodrigues, Luis M. M. Ferreira,
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Conclusões da XXIII Reunião de Primavera da SPPF. S. Torcato – Guimarães 103–106
(16 a 19 de Abril de 2002)
Sociedade Portuguesa de Pastagens e Forragens
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PASTAGENS E FORRAGENS
Revista da Sociedade Portuguesa de Pastagens e Forragens
VOLUME 23
Este número foi subsidiado pela
Fundação para a Ciência e Tecnologia
Elvas
2002
AVALIADORES EXTERNOS
AO CORPO DE REDACÇÃO E À DIRECÇÃO DA SPPF
Carlos Carmona Belo
David Gomes Crespo
J. Quelhas dos Santos
J. Ramalho Ribeiro
Nuno Moreira
Teodósio Salgueiro
DIRECTORA
Noémia Farinha
– Instituto Politécnico de Portalegre
CORPO DE REDACÇÃO
M.M.Tavares de Sousa
– Instituto Nacional de Investigação Agrária e das Pescas
Maria Ermelinda Lourenço
– Universidade de Évora
Noémia Farinha
– Instituto Politécnico de Portalegre
REVISÃO FINAL DOS TEXTOS
Maria Alice Madeira da Silva
EDIÇÃO, REDACÇÃO E ADMINISTRAÇÃO
Sociedade Portuguesa de Pastagens e Forragens
A/c ENMP
Apartado 6
7350-951 ELVAS
ISSN 0870-6263
Dep. Legal n.º 12 350/86
Tiragem: 725 exemplares
PREÇO DESTE VOLUME
11,25€
As teorias expostas no presente
volume são da inteira responsabilidade dos seus autores.
Esta revista é distribuída gratuitamente aos sócios da SPPF, devendo todos os pedidos de
aquisição ser feitos directamente para o Editor. Igualmente será objecto de permuta com
outras publicações periódicas, nacionais ou estrangeiras, de interesse para esta Sociedade.
"Pastagens e Forragens", vol. 23, 2002, p. 1–10.
SITUAÇÃO E PERSPECTIVAS DA PRODUÇÃO DE
FORRAGENS E PASTAGENS NO ENTRE DOURO E MINHO*
NUNO MOREIRA
Departamento de Fitotecnia e Engenharia Rural
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro – Apartado 1013
5001-911 – VILA REAL
RESUMO
A região do Entre Douro e Minho (EDM) destaca-se no conjunto do país por
concentrar um terço do efectivo nacional de vacas leiteiras, cuja alimentação é baseada no cultivo de forragens anuais, ocupando as forragens e pastagens a larga maioria
da SAU (superfície agrícola utilizada) regional.
O milho silagem e o azevém anual, com superfícies cultivadas anualmente de 37 e 51 mil hectares respectivamente, mais de metade das correspondentes
áreas de cultivo no país, são as principais culturas forrageiras da região.
Apesar desta marcada especialização da região do EDM, regista-se uma acentuada diversidade regional, já que apenas quatro dos cinquenta e dois concelhos da
região, Barcelos, Vila do Conde, Póvoa de Varzim e Vila Nova de Famalicão, concentram mais de metade do efectivo regional de vacas leiteiras (56%) e da área cultivada
com milho silagem (51%). Representam assim o modelo de produção intensiva e
especializada de leite, com uma superfície forrageira total que excede a SAU, dada a
prática generalizada de duas culturas forrageiras anuais sucessivas.
Em contraposição, outras sub-áreas regionais, com destaque para o Alto
Minho, a região de Basto e concelhos também interiores a Sul do Douro, revelam
tipos de produção extensivos com quase nula representação de vaca leiteira (0,7%)
e do milho silagem (0,6%), nos quais predominam explorações de muito pequena
dimensão com efectivos de “outras vacas” e pequenos ruminantes, alimentados predominantemente em pastagens permanentes (seis concelhos apenas agrupam 51% da
área regional de pastagens permanentes).
Perspectiva-se para o futuro próximo a continuada redução do número de
explorações que se dedicam à produção pecuária de ruminantes, e a especialização
em sentidos diversos dos actuais modelos intensivo e extensivo regionalmente diferenciados.
Por um lado, a produção forrageira intensiva que suporta as explorações
leiteiras especializadas, deverá aproveitar o desenvolvimento das potencialidades a
explorar no valor alimentar e na produtividade de novas variedades de milho para
* Conferência proferida na XXIII Reunião de Primavera da SPPF. Guimarães, Abril
de 2002
1
silagem, ajustar as datas de sementeira e a tecnologia da cultura de Inverno às exigências ambientais e de alimentação do efectivo, e reduzir custos de produção, pela
maior divulgação da sementeira directa, da racionalização dos fertilizantes utilizados
e da generalização da contratação de serviços de cultivo.
Por outro lado, as perspectivas de evolução nas sub-regiões de produção extensiva de carne deverão orientar-se para privilegiar a exploração de produtos com
tipicidade regional ou/e o desenvolvimento possível do modo de produção biológico,
o qual poderá potenciar a utilização de leguminosas quer como culturas forrageiras
quer em pastagens.
PALAVRAS-CHAVES: Forragens; Pastagens; Perspectivas; Produção.
FORAGES AND GRASSLAND IN THE NORTHWEST OF PORTUGAL:
PRESENT AND PERSPECTIVES
ABSTRACT
The Entre Douro e Minho region, Northwest corner of Portugal, is the main dairy
region of the country, with one third of the portuguese herd of dairy cows, based in a
double-cropping forage system using nearly all of its agriculture surface area.
Maize silage and a winter cover crop of ryegrass with 37 and 51 thousand hectares respectively are the most important forage crops and represent more than half
of the cultivated area in Portugal for these crops.
This region, with 52 councils, has a great diversity, with four councils concentrating 56% of the dairy cows and 51% of the maize silage area for the region,
representing an intensive and specialized dairy production system.
On the other hand, there is a group of six councils on the North and Southeast
part of the region where dairy farming almost doesn’t exist, with less than 1% of the dairy
cows and also only 0.6% of the maize silage crop area for the region, where you find a
traditional system of mixed farming with small holdings raising suckler cows, sheep or
goat flocks, and using 51% of the total area of permanent grasslands in the region.
The near future perspectives are the continuing tendency to reduce the number
of farms that raise animals together with a specialization of the intensive dairy and
the traditional system moving in different directions.
The intensive double-cropping forage system that is the support of the dairy
farms will look for new opportunities to explore an improved yield potential and feeding value for new maize silage varieties, for early seeding of the maize silage and the
winter cover crop, for the adaptation to environmental restrictions, aiming to reduce
production costs, as may be the case of direct seeding, rational fertilization and the
use of custom contracts for cultivation and harvesting.
In the case of the traditional and more extensive farms, they will look for the
typification of their regional products and for the possible development of organic
farming that may create an opportunity for the use of forage legumes.
KEYWORDS: Forage; Grassland; Production; Perspectives.
2
PASTAGENS E FORRAGENS 23
1 – INTRODUÇÃO
O objectivo desta comunicação é contribuir para a análise da
situação de produção de forragens e pastagens na região do Entre
Douro e Minho e perspectivar possíveis evoluções num futuro próximo.
Este trabalho é feito fundamentalmente a partir dos dados dos recenseamentos gerais da agricultura (RGA) realizados pelo Instituto Nacional
de Estatística (INE), em particular dos dados mais recentes resultantes
do RGA 99. Resulta ainda da experiência pessoal e de diversos contactos
com agricultores e técnicos da região.
A região do EDM, situada no Noroeste do país, tem um clima de
forte influência atlântica, com valores elevados de precipitação anual e
temperaturas relativamente amenas, apresentando variações regionais muito
ligadas à sua disposição em anfiteatro, com uma faixa litoral ou de várzea
de clima mais ameno, uma zona intermédia ou de meia encosta, e uma
zona serrana ou de montanha mais interior (1). Estas zonas agro-ecológicas
pela ordem apresentada revelam características mais acentuadas de altitude,
relevo, precipitação, baixas temperaturas e geadas (1).
No seu conjunto a região do EDM apresenta uma SAU de 215,7
mil hectares, apenas 5,6% da correspondente área do país, mas uma área
irrigável de 148,3 mil hectares (68,8% da SAU), representando 18,8% da
superfície irrigável do país (2).
Salienta-se, por outro lado, uma acentuada divisão da propriedade,
com um total de 67,5 mil explorações com um valor médio de SAU por
exploração de 3,19 ha (9,78 ha de média nacional) e um correspondente
número médio de blocos por exploração de 4,67 (2).
2 – A REGIÃO DO ENTRE DOURO E MINHO
NO CONTEXTO NACIONAL DA PRODUÇÃO
E UTILIZAÇÃO DAS FORRAGENS E PASTAGENS
A extensão e a importância relativa das culturas forrageiras e das
pastagens na SAU, no conjunto do país e para as diversas regiões agrárias
autónomas, podem ser apreciadas no quadro 1.
Como se pode observar as forragens e pastagens no seu conjunto ocupam
mais de metade da SAU do país, constituindo a mais importante (extensa)
ocupação do solo agrícola e, no caso do Entre Douro e Minho, a superfície
PASTAGENS E FORRAGENS 23
3
forrageira total (SFT) representa mesmo 95% da SAU, em boa medida devido
à prática frequente de duas culturas forrageiras anuais sucessivas, cultura
principal e cultura secundária. Porém, mesmo as estimativas de ocupação por
diferença em relação às restantes culturas realizadas na região, de forma a
retirar este efeito de sobreposição anual de áreas cultivadas, apontam para
uma ocupação anual equivalente a 70% da SAU (aprox. 150 mil hectares).
QUADRO 1 – Áreas (ha) de culturas forrageiras e pastagens no contexto da SAU das
diversas regiões agrárias e autónomas em Portugal
Culturas forrageiras
Prados temporários
Entre Douro e Minho
Prados
Superfície forr.
P. permanentes Total (SFT)
SAU
SFT/SAU
×100 (%)
134 360
71 533
205 893
215 675
95*
Trás-os-Montes
43 196
107 673
150 869
457 881
33
Beira Litoral
70 034
19 896
89 930
169 779
53
Beira Interior
98 546
175 831
274 377
418 977
66
Ribatejo e Oeste
63 259
126 077
189 336
447 853
42
Alentejo
149 008
818 302
967 310
1 924 043
50
Algarve
6 894
11 721
18 615
101 932
18
Madeira
147
517
664
5 645
12
Açores
13 927
105 273
119 200
121 308
98
Totais
579 371
1 436 823
2 016 194
3 863 093
52
* Este valor surge especialmente sobreavaliado pela prática frequente nesta região de duas culturas forrageiras no ano
Fonte: Infoline - hppt://www.ine.pt/prodserv/Rga/index_rga.asp
Merece ainda destaque o facto do Entre Douro e Minho, no caso
dos “prados e pastagens permanentes”, representar apenas 5% da sua área
no conjunto do país, mas nas culturas forrageiras e prados temporários
de exploração predominante por corte, contribuir com 23,2% da área de
cultivo nacional, revelando que a nível da região estas últimas têm uma
importância preponderante nos sistemas de produção.
Uma análise ao conjunto das culturas forrageiras recenseadas pode
ser feita com base na observação do quadro 2, onde se regista uma importância reduzida no país e na região dos prados temporários e o grande
relevo das forragens anuais. No EDM merecem destaque as áreas cultivadas
com azevém anual e com milho silagem, representando em ambos os casos
mais de metade das respectivas áreas de cultivo no total do país. Para
além destas culturas regista-se ainda algum significado regional das consociações forrageiras anuais, em particular de cereais praganosos e azevém.
4
PASTAGENS E FORRAGENS 23
QUADRO 2 – Áreas (× 1000 ha) de pastagens temporárias e de culturas forrageiras nas
regiões agrárias e autónomas de Portugal
Culturas
Prados temporários
Culturas forrageiras
Sachadas
Consociações anuais
Azevém anual
Aveia forrageira
Milho silagem
Milharada
Sorgo forrageiro
Outras cult. forrageiras
Forragens para semente
Portugal
Totais
37,2
542,1
9,9
98,6
90,3
151,7
70,8
37,2
18,9
64,7
6,3
EDM
TM
BL
BI
RO
Alent.
7,9
126,4
28,5
51,0
3,1
37,2
4,3
0,2
2,0
5,9
2,6
40,6
5,5
1,6
1,1
15,0
3,5
4,3
0,7
8,7
-
2,6
67,4
2,1
17,1
14,3
10,7
12,0
7,9
1,0
2,3
0,2
2,3
96,2
2,0
7,1
4,7
31,7
1,6
18,3
3,2
27,4
-
8,2
55,0
0,1
7,3
6,5
28,7
5,0
0,8
2,7
4,0
0,1
12,8
136,3
0,1
33,2
12,6
58,2
2,6
1,3
10,8
17,6
-
Alg. Aço. Mad.
0,8
6,1 13,9
0,7 3,1
0,2
4,1
0,1 8,8
0,1
0,2
0,7 2,1
-
0,1
0,1
-
Fonte: INE: RGA 99
A produção forrageira do Entre Douro e Minho sustenta uma produção
animal com claro predomínio da produção bovina leiteira, e com uma reduzida
participação dos pequenos ruminantes, os quais representam apenas cerca de
10% do efectivo regional de ruminantes em termos de exigências alimentares
(quadro 3). No contexto nacional o EDM possui cerca de um terço do efectivo
das vacas leiteiras e apenas 6% do efectivo de pequenos ruminantes (quadro 3).
Esta região destaca-se ainda por apresentar dos mais altos encabeçamentos
médios (CN/SFT), juntamente com as outras duas regiões em que predomina
a produção bovina leiteira, a Beira Litoral e os Açores (quadro 3).
QUADRO 3 – Efectivos de ruminantes e sua importância relativa (em cabeças normais
– CN) no contexto da SFT e das diversas regiões agrárias e autónomas
de Portugal (RGA – 1999)
Regiões
Entre Douro e Minho
Trás-os-Montes
Beira Litoral
Beira Interior
Ribatejo e Oeste
Alentejo
Algarve
Madeira
Açores
Totais
Bovinos
Total
320 918
79 340
153 379
55 207
159 317
392 268
12 008
4 355
238 396
1 415 188
Vacas
Ovinos
Outras vacas
leiteiras
Total
114 399
47 062
140 883
17 556
25 604
325 519
59 008
13 160
189 734
15 026
9 175
453 786
28 478
19 744
263 238
20 830
203 163 1 476 342
839
4 271
68 217
907
318
7 095
98 688
18 765
4 951
355 731
341 262 2 929 765
Caprinos
Total
66 202
73 522
82 470
107 962
46 562
119 949
22 351
9 160
9 063
537 241
CN*
CN/SFT
300 852
125 495
168 356
127 723
157 359
552 782
22 354
5 455
204 699
1 665 075
1,46
0,83
1,87
0,47
0,83
0,57
1,20
1,72
0,83
* O cálculo baseou-se nos seguintes coeficientes de conversão: vacas leiteiras - 1,25; outras vacas - 1,0; restantes bovinos - 0,5; ovinos e caprinos - 0,15 CN
Fonte: Infoline - hppt://www.ine.pt/prodserv/Rga/index_rga.asp
PASTAGENS E FORRAGENS 23
5
3 – A DIVERSIDADE SUB-REGIONAL
Apesar da especificidade que a caracterização geral da região do EDM
atrás apresentada revela, regista-se uma marcada diversidade sub-regional
quanto à produção de forragens e pastagens e à pecuária que ela suporta.
Num total de 52 concelhos em que a região se divide, há apenas
quatro concelhos, Barcelos, Vila do Conde, Póvoa de Varzim e Vila Nova
de Famalicão, que concentram 56% do efectivo regional de vacas leiteiras e a maioria da área de cultivo de milho silagem na região (50,9%),
apresentando por outro lado valores desprezíveis relativamente às áreas de
pastagens permanentes (0,3%) e aos efectivos regionais de “outras vacas”
(6,3%), ovinos (2,5%) e caprinos (1,5%) (quadro 4). Trata-se de concelhos
que representam o modelo de produção forrageira intensiva, com o milho
silagem como cultura principal, praticando duas culturas forrageiras anuais
com muito elevada produtividade por unidade de área (≈ 30 t MS ha-1
ano-1), e suportando uma produção leiteira especializada (3).
A importância das culturas forrageiras e a intensificação do cultivo
nestes quatro concelhos podem ser documentadas pelo facto de 88%
da SAU ser “terra arável limpa” e de o total da superfície cultivada
com pastagens temporárias e culturas forrageiras ser muito superior
à SAU (148%), pela generalizada prática de duas culturas forrageiras
anuais sucessivas, cultura principal e cultura secundária (quadro 4).
QUADRO 4 – Efectivos de ruminantes (n.º) e ocupação da superfície agrícola utilizada
(SAU) por forragens e pastagens (ha) nos quatro concelhos com maior
concentração de produção leiteira no EDM
Barcelos
Vila Nova de Póvoa de
Famalicão
Varzim
Vila do
Conde
Sub-totais
Totais
EDM
114 399
Vacas leiteiras
26 790
8 890
9 495
18 845
64 020
Outras vacas
1 354
1 145
316
127
2 942
47 062
Ovinos
1 729
796
235
740
3 500
140 883
439
277
91
168
975
66 202
SAU
12 230
6 381
3 388
6 039
28 038
215 675
Terra arável limpa
10 451
5 173
3 278
5 825
24 727
109 422
Caprinos
Pastagens permanentes
Milho silagem
Totais das superfícies
c/ pastagens temporárias e
culturas forrageiras
72
66
20
38
196
70 736
8 129
3 440
2 258
5 115
18 942
37 213
17 894
8 273
4 662
10 679
41 508
134 360
Fonte: INE, RGA 99
6
PASTAGENS E FORRAGENS 23
Em acentuado contraste com esta produção intensiva é possível
identificar sub-áreas na região com uma produção de tipo extensivo, como
sejam concelhos mais interiores e “periféricos” do Alto Minho, da região de
Basto ou da margem sul do rio Douro, como o conjunto de seis concelhos
de que se apresentam valores no quadro 5.
Este conjunto de seis concelhos possui cerca de um terço dos efectivos
regionais de “outras vacas” e de caprinos, e um quarto do efectivo de
ovinos, assim como uma contribuição maioritária para a área de pastagens
permanentes (50,9%) do EDM (quadro 5).
Em contraste ainda com o grupo de concelhos de produção forrageira
intensiva, estes seis concelhos apresentam uma contribuição desprezível para a
área regional de cultivo de milho silagem (0,6%), assim como para o efectivo
de vacas leiteiras (0,7%). As características extensivas revelam-se ainda pelo
facto da terra arável ser ocupação de apenas 20% da SAU e de a área total
de pastagens temporárias e culturas forrageiras ser inferior a 20% da SAU.
As estimativas de encabeçamentos médios para estes dois grupos de
concelhos são de 2,1 e 0,57 CN ha-1 de superfície forrageira total e 3,1 e 0,52
CN ha-1 de SAU no grupo de produção intensiva e no de produção extensiva,
respectivamente. Por outro lado, o efectivo médio de vacas leiteiras por exploração era de 22,6 vacas no primeiro grupo, enquanto que no grupo de concelhos
com tipo de produção mais extensivo os efectivos eram 2,5 de “outras vacas”,
9,2 ovinos e 16,4 caprinos por exploração, o que revela diferenças sensíveis na
estrutura das explorações entre os dois grupos de concelhos.
QUADRO 5 – Efectivos de ruminantes (n.º) e ocupação da superfície agrícola utilizada
(SAU) por forragens e pastagens (ha) em seis concelhos representativos de
formas de cultivo mais extensivas na região do EDM
Arcos de
Ponte da Cabeceiras Mondim
SubMonção
Cinfães
Valdevez
Barca
de Basto de Basto
-totais
Vacas leiteiras
466
186
99
29
16
20
816
Totais
EDM
114 399
Outras vacas
4 811
1 965
1 514
2 280
1 181
2 209
13 960
47 062
Ovinos
8 600
14 418
1 628
5 036
325
6 211
36 218
140 883
6 525
1 082
3 564
3 295
4 465
2 936
21 867
66 202
16 675
7 009
10 782
5 898
5 390
4 746
50 500
215 675
Caprinos
SAL
Terra arável limpa
Pastagens perm.
Milho silagem
Total sup. c/ past.
temp. e cult. forrag.
Fonte: INE, RGA 99
2 893
1 687
1 272
1 544
1 039
1 633
10 068
109 422
12 923
4 234
9 121
3 392
3 759
2 424
35 853
70 736
47
40
32
35
67
-
221
37 213
2 443
1 522
1 008
1 791
1 457
1 452
9 673
134 360
PASTAGENS E FORRAGENS 23
7
4 – PERSPECTIVAS FUTURAS
Não é tarefa fácil perspectivar a evolução futura, mas já na reunião
homóloga da SPPF realizada aqui nesta região, em Abril de 1993, avancei
com algumas perspectivas (3) que se confirmaram (outras não). Por outro
lado, a evolução de alguns indicadores do RGA 89 para o RGA 99 são
uma base de previsão.
Em primeiro lugar a tendência continuada para a redução do
número de explorações com produção pecuária de ruminantes, com o consequente aumento da dimensão média das que se mantêm em produção. Isto
pode significar ainda uma continuada tendência de especialização, já que
entre as que cessam actividade predominam as de mais reduzida dimensão
e com uma actividade policultural mais marcada, e é crescente o número
das que mantêm apenas produção forrageira para venda a explorações
vizinhas mais especializadas.
A produção leiteira intensiva deverá prosseguir a sua especialização,
para o que deverá contar com o desenvolvimento de empresas prestadoras
de serviços, como algumas cooperativas o fazem já nos últimos anos com
os equipamentos de sementeira directa sem mobilização e com os equipamentos de colheita automotrizes.
Esta especialização, com estábulos cuja produção média por vaca
deverá continuar a subir, deve manter como seu suporte forrageiro principal
o milho silagem, aproveitando o potencial ainda a explorar quanto ao seu
valor alimentar, ou seja, a selecção e divulgação de variedades com mais
elevados valores de digestibilidade e ingestibilidade (4, 5, 6), assim como
com níveis mais elevados de valor azotado (%PB) (7). Esta evolução, além
de ser adequada para animais de elevado potencial produtivo, poderá
permitir em termos relativos uma diminuição do consumo de alimentos
compostos e assim uma redução da importação de nutrientes, contribuindo
para uma melhor gestão dos nutrientes ao nível da exploração, aspecto de
importância crescente nas regiões de produção intensiva em que há que
procurar reduzir os impactes ambientais (8).
Para além da melhoria do valor alimentar, a cultura do milho
silagem deverá continuar a beneficiar de efeitos do progresso genético
a nível do aumento das produções, como reflexo de melhorias devidas
à exploração de resistências a stresses, ao carácter “stay-green”, a resistência à acama, a maior eficiência do sistema radical na utilização
da água e nutrientes, assim como à melhor resistência ao frio nas
8
PASTAGENS E FORRAGENS 23
fases iniciais, o que permitirá por seu lado reforçar a tendência para
sementeiras mais precoces (7).
A cultura de Inverno, importante para o revestimento e protecção
do solo, mas também para a utilização do azoto disponível após a cultura
do milho e para aplicação e valorização dos chorumes da exploração (9),
tende a ser crescentemente utilizada para conservar como silagem, devendo beneficiar da adopção de equipamentos que permitam uma rápida e
eficiente pré-secagem ou, em alternativa, de conservantes biológicos com
crescente eficácia (10). O ajustamento da cultura de Inverno por forma a
desempenhar da melhor maneira a eficaz função de protecção ambiental
e simultaneamente satisfazer as exigências da alimentação em estábulos
leiteiros, de elevado potencial, é um desafio para os próximos anos.
A tendência atrás apontada para sementeiras mais precoces do
milho silagem permitirá induzir sementeiras mais precoces da cultura
de Inverno, o que é desejável do ponto de vista ambiental (9), e deverá
favorecer a utilização do azevém, com mais de um corte, em relação à
cultura para corte único com base em cereais praganosos.
A melhoria do valor alimentar das forragens produzidas, a utilização da sementeira directa e dos equipamentos automotrizes de colheita
e uma fertilização mais racional, deverão contribuir para a redução dos
custos de produção e simultaneamente dos impactes ambientais deste
sistema de produção intensiva.
As zonas de produção mais extensiva do EDM, onde como atrás
se refere os efectivos por exploração são mais reduzidos, deverão registar
uma mais acentuada redução do número de explorações com actividade
pecuária, e deverá acentuar-se a tendência para a exploração de produtos
com tipicidade regional (DOP e IGP), a par do desenvolvimento potencial
da produção biológica de carne e de leite.
O desenvolvimento potencial do modo de produção biológica
tenderá a favorecer a introdução de leguminosas, quer como culturas
forrageiras quer nas pastagens (11) das explorações de tipo mais extensivo
desta região.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1 – DRAEDM – Entre Douro e Minho - Breve caracterização. “Formação Profissional
Agrária”, 1990, n.º 6
2 – INE (2001) – hppt://www.ine.pt/prodserv/Rga/index_rga.asp
PASTAGENS E FORRAGENS 23
9
3 – MOREIRA, N. – Situação e Perspectivas da Produção Forrageira Intensiva no Noroeste de Portugal “Pastagens e Forragens” vol. 14/15, 1994, p. 31-40
4 – BARRIÈRE, Y. – Le maïs ensilage de demain, un maïs spécifique pour nourrir les
ruminants. «Fourrages», vol. 150, 1997, p. 171-189.
5 – BARRIÈRE, Y.; EMILE, J. C. – Le maïs fourrage. III - Evaluation et perspectives
de progrès génétique sur les caractères de valeur alimentaire «Fourrages», vol. 163,
2000, p. 221-238.
6 – NOGUEIRA, A. – O Minho, a Terra e o Homem, 2002, “Boletim regional de variedades de milho forragem” n.º 46, (2001). Suplemento, 16 pp.
7 – BARRIÈRE, Y.; EMILE, J. C. – Le maïs fourrage. II - Evaluation et perspectives
de progrès génétique sur les caractères de valeur agronomique «Fourrages». vol. 163,
2000, p. 209-220.
8 – VAN DER MEER, H. G. – Grassland and the enviroment. In “Progress in Grassland
Science: Achievements and Opportunities”, 2001, S. C. Jarvis (ed.), BGS/IGER, Devon
(U.K.), p. 53-67.
9 – TRINDADE, H.; COUTINHO, J.; MOREIRA, N. – Fluxos de Azoto em Explorações
de Bovinicultura Leiteira Intensiva no Noroeste de Portugal. “Pastagens e Forragens”,
1998, vol. 19, p. 99-112.
10 – MERRY, R.; JONES, R.; THEODOROU, M. – The conservation of grass. Its In
“Grass. Its Production & Utilization”, 3rd ed., 2000, Alan Hopkins (ed.), BGS &
Blackwell, Oxford., p. 196-228
11 – YOUNIE, D. – The role and management of grassland in organic farming. In” Grass.
Its Production & Utilization, 3rd ed., 2000, Alan Hopkins (ed.), BGS & Blackwell
Science, Oxford, p. 365-393.
"Pastagens e Forragens", vol. 23, 2002, p. 11–25.
DA FORRAGEM À PASTAGEM SEMEADA*
(COM RETROCESSO À PASTAGEM NATURAL)
Teodósio A. Salgueiro
Rua Cidade do Lobito, 268-2.º Esq.º – 1800 – 088 LISBOA
RESUMO
Depois de se fazer a distinção entre forragem e pastagem ou prado, refere-se
que a cultura das forragens em Portugal é antiquíssima, pois tem mais de 2000 anos,
ao passo que a das pastagens é recente, tendo-se iniciado, de forma sistemática, apenas em 1965.
Descrevem-se os desenvolvimentos das culturas forrageiras que tiveram lugar
nas décadas de 1920 e 1930, bem como o que se fez nos anos 50 e 60. Neste último
período, as forragens começaram a ser encaradas como susceptíveis de ocupar o lugar
do pousio nas rotações cerealíferas, em especial no sul do País.
Até 1965 não se falava em pastagens semeadas, pois considerava-se que, no
sequeiro, a sua permanência era inviável.
Em 1965, porém, este juízo mudou e foram semeadas as primeiras pastagens permanentes em sequeiro, principalmente com trevo subterrâneo (Trifolium subterraneum L.).
Iniciou-se então uma “revolução verde”, com benefícios evidentes para a produção animal e a conservação do solo ou, dito de outro modo, para a sustentabilidade
da agricultura.
Esta revolução começou, todavia, a ser perturbada nos anos 80, pela apologia
das pastagens naturais. Tal apologia é errada e as pastagens semeadas devem constituir a regra no desenvolvimento da pecuária. As pastagens naturais, pelo contrário,
só terão justificação em regiões de montanha e nalguns lameiros.
PALAVRAS-CHAVES: Forragens; Pastagens semeadas; Revolução verde;
FROM FORAGE CROP TO SOWN PASTURE
(WITH A COMEBACK TO NATURAL PASTURE)
ABSTRACT
After explaining the distinction between forage crops and pastures, it is affirmed that cultivation of forages in Portugal is very old, dating back to more than 2000
years ago, while cultivation of pastures is recent, dating back to 1965.
* Conferência proferida na XXIII Reunião de Primavera da SPPF. Guimarães, Abril
de 2002.
11
Development of forage crops in the decades of 1920 and 1930 is described as
well in the years of 1950 and 1960. In the later period, forages began to be regarded
as crops that could take the place of the fallow in cereal rotations, specially in the
south of the country.
Sown pastures were not taken into account until 1965, because its persistence
in non irrigated land was judged impossible.
But in 1965 this judgment changed and the first permanent pastures were sown
in dryland, mainly with subclover (Triflium subterraneum L.)
It is possible to say that a green revolution had begun at that time, with clear
benefits for animal production and soil conservation or, in other words, for the sustainability of agriculture.
However, this revolution has commenced to be disturbed in the years of 1980,
due to some opinions in favour of natural pastures. Such opinions are very wrong
and the sown pastures should be the rule for development of animal production. On
the contrary, natural pastures are justified only in mountainous situations with good
botanical composition, called “lameiros”.
KEYWORDS: Forage crops; Sown pastures; Green revolution; Natural pastures.
1 – DEFINIÇÕES
Para boa compreensão do que se vai seguir, há que distinguir entre
forragem e pastagem.
Assim, forragem ou cultura forrageira, abrange um conjunto de
plantas, praticamente sempre ervas, destinadas ao corte, para dar ao gado
no seu estado natural, ou depois de conservadas como feno ou silagem.
Eventualmente, uma área com forragem pode ser pastoreada, mas a maioria
da sua produção vegetal é aproveitada mediante corte.
Quanto à pastagem, também chamada prado, pasto ou pascigo,
trata-se dum conjunto de plantas, em geral ervas, mas podendo ser sub
arbustos ou mesmo arbustos, que ocupam uma certa extensão de terreno
e se destinam a ser comidas pelo gado no local onde vegetam. Acessoriamente, podem ser cortadas em determinados períodos do ano, para
alimentar, no estado natural ou após conservação como feno ou silagem,
animais que estão noutro local, mas a sua principal utilização não deixa
de ser o pastoreio.
Verifica-se, deste modo, que a diferença entre forragem e pastagem
reside na forma como as plantas são utilizadas pelo gado. Por esse motivo, há espécies e cultivares mais próprias para forragens e outras para
pastagens, sem deixar de haver algumas, de que a luzerna é um exemplo
típico, que são igualmente boas para uso forrageiro e uso pascícola.
12
PASTAGENS E FORRAGENS 23
2 – FORRAGENS E PASTAGENS EM PORTUGAL CONTINENTAL
A cultura das forragens é antiquíssima – tem mais de 2000 anos. A cultura
das pastagens, pelo contrário, é moderníssima – ainda não tem 40 anos.
Segundo Castro Caldas (4), foram os Romanos que introduziram as
primeiras forragens – tremoço, fenacho (Trigonella Foenum-graecum) e
ervilhaca – com a particularidade de as associarem ao desenvolvimento
dos cereais, que, como se sabe, constituía para eles uma preocupação, a
fim de assegurarem o abastecimento de Roma.
É interessante salientar que, há dois milénios, já os Romanos, entre os
quais havia autores de verdadeiros tratados de Agricultura, como Varrão,
Columela e Vergílio, conheciam os benefícios da ligação de leguminosas
forrageiras com as culturas cerealíferas.
E interessante – ou desinteressante – é também notar que, entre nós,
tais benefícios são, ainda, menosprezados por muitos.
Quanto à cultura das pastagens, isto é, a sementeira de espécies
(predominantemente leguminosas) para pastoreio, teve início de forma
sistemática, apenas em 1965.
É de toda a justiça referir desde já que tal se deveu a um investigador
australiano – Frank Hely –, a um Professor do Instituto Superior de Agronomia – Artur Garcia – e a dois engenheiros agrónomos – David Crespo e
Mário Barreiro da Ponte. Este, todavia, saiu do Organismo onde trabalhava
por decisão própria, cerca de dois anos depois, passando a sua acção a
ser continuada, a partir de 1968, pelo signatário desta comunicação.
3 – FORRAGENS
3.1 – Décadas de 1920 e 1930
Até aos anos de 1920, os progressos em matéria de diversificação
forrageira foram escassos, tendo ocorrido muito mais no Norte e Centro,
sobretudo no litoral, do que no Sul.
Forragens com alguma expansão nessa época eram o azevém anual
(Lolium multiflorum) alternando com o milho para ocupar a terra no
período outono-invernal, o trevo encarnado (Trifolium incarnatum), ligado
igualmente ao milho, mas utilizado também onde este não era semeado, a
serradela (Ornithopus sativus) e a garroba (Vicia monanthos)
PASTAGENS E FORRAGENS 23
13
Nas décadas de 20 e 30 do século passado, os Serviços Oficiais
fizeram notáveis esforços para o alargamento da área de cultivo, não só
destas espécies mas também doutras, sobre as quais tinha havido experimentação e que se afiguravam de grande interesse para o desenvolvimento
da pecuária.
Assim, em 1936, o Ministério da Agricultura editou dois folhetos, o
primeiro com 80 páginas e o segundo com 127, nos quais era explanado, por
engenheiros agrónomos das “Brigadas Técnicas” de diversas regiões, o tema
“Forragens – Subsídios para o estudo das possibilidades nacionais”.
No Entre Douro e Minho, onde, segundo Ruella (10), as leguminosas
forrageiras resumiam-se ao trevo encarnado e à serradela, tinham dado
bons resultados em regadio e estavam a ser muito solicitados pela lavoura
regional o trevo branco Ladino, o trevo violeta Spadoni e o trevo violeta
(sem indicação de variedade) que era, há muito, semeado no distrito de
Aveiro.
Para o sequeiro, as recomendações incidiam na Vicia villosa e na
Vicia macrocarpa, que “davam satisfatórias produções mesmo em terrenos
considerados, na região, como muito pobres” (sic).
Os trevos Ladino e Spadoni são também apontados por Teles de
Vasconcelos (15), como novas culturas forraginosas a introduzir, em regadio,
na Beira Transmontana (distrito da Guarda, “grosso modo”).
A anafa (Melilotus segetalis) e o bersim (Trifolium alexandrinum), que
se tornaram muito vulgares na região de Lisboa, especialmente para vacas
leiteiras, deram os primeiros passos nos anos de 1920 e 1930, por indicação
dos agrónomos Luís de Seabra (13) e Tavares de Almeida (2).
O primeiro dava relevo à aptidão da anafa para os solos salgados e,
além disso, salientava que devia entrar na rotação com o trigo.
Quanto ao bersim, o mesmo autor referia que na década de 1920 já
se cultivava com esplêndidos resultados (sic) no Algarve, nos concelhos de
Mértola e Vidigueira, do distrito de Beja, no Vale do Sado, no Ribatejo,
na Beira, etc.
É igualmente Seabra (13) que, em 1931, advoga a Vicia villosa, a que
chamava “ervilhaca peluda ou das areias”, para grande parte do Alentejo
onde, dizia, “poderá operar uma verdadeira revolução na prática da agricultura extensiva, tradicional”.
A própria serradela, embora já cultivada em várias zonas do País,
designadamente nos solos arenosos do Miocénico e do Pliocénico, ainda
14
PASTAGENS E FORRAGENS 23
não ocupava, nas décadas a que nos estamos a referir, área suficientemente
satisfatória.
Com efeito, Viana (16) escreve, em 1935, que nos arneiros e charneca
a sul do Tejo se deve divulgar e propagar a sementeira de serradela, para
ensilar ou fenar.
De maneira análoga se pronuncia Seabra (13), quer em relação a essa
charneca, quer no que respeita ao Alentejo.
A garroba, por sua vez, encontra-se numa situação idêntica, já que,
apesar de bastante cultivada, é susceptível de abranger uma área muito
mais vasta.
Assim, Trigo de Abreu et al. (1), reconhecendo que é a leguminosa
que mais se semeia no Nordeste Transmontano, dizem que “a sua cultura
está ainda muito longe de atingir a importância que podia e devia ter”.
Para a Beira Transmontana, ela é também preconizada por Teles de
Vasconcelos (15), por se ter mostrado, nas experiências efectuadas, como
muito rústica e pouco exigente, devendo anteceder o centeio ou o trigo.
A este respeito é muito interessante a revelação de que, adubando a
garroba com superfosfato, sulfato de potássio e gesso, pode fazer-se-lhe
seguir um cereal, pouco ou nada adubado, e obter dele uma produção
bastante superior à conseguida, mesmo com fortes adubações, quando não
é precedido desta leguminosa.
Na apologia desta Vicia também participa Seabra (13), referindo-selhe como “devendo ser escolhida, num futuro próximo1, para valorizar
muitos terrenos das Beiras e Alentejo, concorrendo, poderosamente, para
o aperfeiçoamento da sua agricultura”.
Este mesmo autor, que no seu
descreve diversas espécies, aponta o
velmente, a leguminosa forrageira de
conhecido, em muitas zonas, como
onde é muito cultivado.
livrinho “Ervagens de Leguminosas”
trevo encarnado como sendo, provamaior difusão em Portugal, sendo até
“trevo das Beiras”, por ser a região
Acrescenta, porém, que se deve expandir muito mais, com grandes
benefícios, invadindo (sic) o Centro e Sul do País e adianta saber que se
adapta no concelho de Montemor-o-Novo, em Cabrela, valorizando terrenos
xistosos.
1
Note-se que isto é escrito em 1931.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
15
A terminar este capítulo, é interessante destacar a luzerna (Medicago sativa).
Em 1924, esta espécie era completamente desconhecida em toda a
região minhota – palavras de Motta Prego (9) que, no entanto, dá preciosas indicações sobre a sua cultura, baseado num luzernal de cerca de um
hectare que, certamente sob a sua orientação, foi estabelecido na Escola
Agrícola “Conde de S. Bento”, em Santo Tirso.
Curiosa é a sua afirmação, a propósito da falta de “cal” (sic) nas
terras do Minho, de que basta uma calagem de 200 gramas por metro
quadrado, ou 2000 quilogramas por hectare, para se ter um bom luzernal
nessa região, a produzir anualmente 70 000 quilogramas de forragem verde
por hectare, em sete cortes e em regadio.
O autor compara a receita obtida pela sucessão tradicional de “milhogrão e erva no inverno (a dar dois cortes)” com a da luzerna, concluindo
que esta dá mais 19 773$00/ha e que provoca um enriquecimento da terra
em azoto de 60 kg/ha-1.
Anos depois, em 1935, havendo luzernais já estabelecidos no Sudeste
Transmontano e a darem cinco ou seis “abundantes cortes” (sic), Trigo de
Abreu e outros (1) aconselham a sua introdução nos lameiros mais fundos
e susceptíveis de rega do Noroeste Transmontano.
Na mesma data e relativamente à Beira Transmontana, Teles de Vasconcelos (15) expressa opinião idêntica e, pelo facto da luzerna entrar em
concorrência com a consociação de milho e feijão frade, faz a análise económica comparativa concluindo que os lucros são sensivelmente iguais.
À guisa de conclusões, é importante realçar a visão de agrónomos
que, trabalhando nas regiões (e estavam lá sem haver Direcções Regionais
de Agricultura), se lançavam na experimentação forrageira, visando a
diversificação agrária.
Para eles, a agricultura não devia cingir-se aos cereais – trigo, centeio,
milho – e a pecuária não devia ter, como substracto principal, as ervas
que a natureza dá.
Há que salientar a ênfase posta nas leguminosas, o empenho na divulgação dalgumas que já eram relativamente conhecidas mas restringidas
a certas zonas (trevo encarnado, serradela, garroba) e o interesse no estudo
de espécies que, nesse tempo, eram novidade (trevo branco, trevo violeta,
Vicia villosa e V. macrocarpa, anafa, bersim e luzerna).
É também de destacar o pragmatismo posto na expansão da luzerna,
ao compará-la com a cultura sua concorrente – o milho.
16
PASTAGENS E FORRAGENS 23
Esta questão não merece hoje atenção nenhuma porque, erradamente,
se privilegia o cereal. Mas devia ser objecto de ponderação e, até, de
investigação científica, a conciliação destas duas culturas, pois afigura-se
agronomicamente válido e economicamente vantajoso pôr o milho a beneficiar do azoto acumulado no solo em três a cinco anos de vida dum
luzernal que o preceda.
Que falta nos faz o Eng. Agrónomo Motta Prego que estudou e
escreveu sobre isto em 1924!
3.2 – Décadas de 1950 e 1960
Nos anos 50, ou ainda no final da década de 40, a produção de
forragens começou a suscitar o interesse de bastantes agrónomos, embora
visando essencialmente a região a sul do Tejo.
Assim, são de assinalar as criações, por Marques de Almeida, da
variedade Maral do trevo da Pérsia (Trifolium resupinatum ssp. suaveolens)
e, por Barbas Guerra, da variedade Grão da Gramicha do chícharo miúdo
(Lathyrus cicera).
Por outro lado, registam-se os esforços de Joaquim Sampaio na pesquisa duma rotação em que o pousio fosse substituído por forragens.
Num período de oito anos (1950-57) e no Posto de Évora da Direcção
Geral dos Serviços Agrícolas, este agrónomo estudou uma rotação, de seis
anos, a que chamou intensiva, e que consistiu em: alqueive-trigo-sideraçãotrigo sobre sideração-ferrejo estrumado-pastagem melhorada2 (8).
Como pastagem melhorada, o autor ensaiou várias espécies, entre as
quais trevo da Pérsia, serradela e centeio, vindo a concluir que a consociação aconselhável era a de aveia com grão da Gramicha.
Em trabalho publicado em co-autoria com Mariano Feio, sendo este
o primeiro autor (8), são comparados os resultados da rotação ensaiada
com os de explorações fidedignas da região, nas quais a rotação é de
cinco anos: alqueive-trigo-aveia-pousio-pousio. Nestas explorações o encabeçamento era de um ovino/ha.
A conclusão a que se chegou revelou que, na dita rotação intensiva,
a produtividade do trigo foi 3,2 vezes maior e o encabeçamento 3,5 vezes
superior. Todavia, na análise económica a que se procedeu, verificou-se que
2
O termo é incorrecto pois o que o autor designa são, na realidade, forragens.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
17
nas explorações tradicionais, com os pousios, os ovinos davam algum lucro,
ao passo que na rotação intensiva, com 3,5 cabeças/ha, davam prejuízo.
Apesar disso, Sampaio manteve a sua preferência pela forragem em
vez do pousio, advogando, numa palestra que fez em 1964, que a rotação a praticar devia ser: alqueive-trigo-tremocilha para enterrar-pastagem
melhorada. Especificou também que a pastagem podia ser uma mistura
de diversas forragens: aveia, centeio, vicias, serradela, trevo da Pérsia,
etc. (12).
São também de assinalar os trabalhos do Prof. Pais de Azevedo e dos
seus colaboradores Engenheiros José Chicau e André Dordio na expansão
da cultura forrageira em diversas zonas do Sul. Tratava-se, igualmente, de
introduzir as forragens, para ocuparem as folhas do pousio nas rotações
cerealíferas.
3.3 – Solos, Cereais e Forragens
A Carta de Solos de Portugal, que se vinha fazendo desde o final
dos anos 40, e a Carta de Capacidade de Uso do Solo, iniciada cerca de
10 anos depois, bem como as preocupações com a defesa contra a erosão,
que entraram em voga na época, contribuíram grandemente para que se
generalizasse entre os agrónomos a consciência de que importava reflectir
sobre a cultura dos cereais e a correspondente aptidão dos solos.
Esta consciencialização fez-se sentir nos diplomas legislativos que os
Governos emitiam com a designação de “Regime Cerealífero”.
Assim, no Regime Cerealífero de 1959-60, vem expressa, pela primeira
vez, a necessidade dum novo ordenamento cultural, sem, contudo, explicar
em que devia consistir. Mas no de 1962-63 já se estipula que se devem
entregar ao trigo apenas as terras que forem aptas, porém em rotação
com forragens (3).
Este decreto-lei tece considerações sobre o fomento forrageiro e pecuário e diz: Está mesmo [o Governo] na disposição de tornar dependente da
existência de culturas forrageiras e dos correspondentes efectivos pecuários
a concessão de qualquer facilidade futura para a cultura do trigo (3).
Em 1963 é instituído um Plano de Fomento Pecuário que inclui o regime
de produção e comercialização de sementes certificadas de forragens (5).
O Decreto-Lei n.º 46 595, de 15 de Outubro de 1965, promulga o
Regime Cerealífero de 1966-1970, o qual afirma que produção cerealífera,
18
PASTAGENS E FORRAGENS 23
produção pecuária e, consequentemente, produção forrageira são elementos inseparáveis. Em consonância com isto aborda também a questão da
produção de sementes de forragens.
Há que mencionar agora, por serem desvalorizadoras das forragens,
afirmações escritas por Mariano Feio – personalidade importante na
agricultura alentejana.
Assim, em 1963, numa exposição (sic) que tinha por título “Situação Económica e Perspectivas da Cultura do Trigo” (6), faz declarações
incorrectas e tendenciosas.
Com efeito, passando em revista as possibilidades de diversificação
da agricultura no Alentejo diz, a propósito do conjunto gado-forragem,
o seguinte:
1) O aproveitamento de forragens cultivadas não é aceitável em pastoreio e não é opção válida para fenação nem para ensilagem;
2) A criação de bovinos para carne tem de ser actividade económica
secundária, baseada nas pastagens espontâneas e com ajudas muito
limitadas de forragens cultivadas.
Analisando igualmente as possibilidades do regadio e da florestação,
para as quais aponta limitações quanto à área susceptível de ser beneficiada, o autor conclui que “não existe, assim, de momento, qualquer cultura
capaz de substituir os cereais em boas condições de rendimentos”.
Todavia, um ano depois (1964), numa grande reunião de técnicos dos
Serviços Oficiais que constituíam os Conselhos Regionais de Agricultura
da Quarta Zona (Alentejo e Algarve), M. Feio afirma, baseado nalguns
dados climáticos, que “estamos fora da zona ecológica do trigo, cujo
limite meridional passa na Europa, aproximadamente, pelo paralelo 43º,
correspondente à costa norte da Península Ibérica” (7).
Mais adiante, é a vez de declarar que “as condições no Sul do País
não são mais favoráveis para o gado do que para os cereais”.
Desta comunicação e do diálogo que houve foram escritas algumas
conclusões, das quais citamos duas:
1) Nos solos delgados há que manter a cultura dos cereais até onde a
mecanização possa ir3, para impedir a infestação de mato e obter
pastagem para o gado;
3
Na publicação onde isto vem referido (7) é explicitado mais adiante que o limite corresponde a declives até 20%.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
19
2) Nos solos esqueléticos e nos declivosos onde a máquina não consegue trabalhar, a cultura do trigo está irremediavelmente condenada...
A ocupação pelo mato será o seu destino natural.
É de assinalar a contradição entre afirmar-se que se está fora da zona
ecológica do trigo e, simultaneamente, preconizar se os cereais (com o trigo
no lugar principal) para os solos mais impróprios, que são os delgados
de xisto. Acrescente-se ainda que o limite topográfico que se aponta é
ditado, não pelos riscos de erosão advindos duma cultura agrícola, mas
pela possibilidade da mecanização, a qual se admite ser viável em declives
até 20%. Ora, isto é um atentado à boa conservação do solo.
Em abono do autor, diga-se que nesse ano de 1964 o trevo subterrâneo, embora espontâneo em quase todo o País, não era ainda conhecido
como cultura.
4 – PASTAGENS SEMEADAS
4. 1 – Espécies
Em 1965 deu-se um acontecimento simples, que está na origem do
que, quanto a mim, se pode classificar de pequena revolução verde na
agricultura nacional.
Nesse ano, um investigador científi co, de nome Frank Hely, da
Commonwealth Scientific and Industrial Research Organization (CSIRO),
da Austrália, veio a Portugal, graças a diligências do Prof. Artur Garcia,
(Instituto Superior de Agronomia) e de um organismo, já extinto, chamado
Fundo de Fomento Florestal (FFF).
Cá andou, durante cerca de um mês, acompanhado pelos Eng.
Agrónomos Mário Barreira da Ponte (FFF) e David Crespo (Estação de
Melhoramento de Plantas), mas teve também bastantes encontros com
outros técnicos e agricultores.
Hely descreveu os sistemas agro-pecuários que se praticavam na parte
da Austrália de clima mediterrâneo (Austrália do Sul e Austrália Ocidental), ecologicamente análoga ao Sul do nosso País. Referiu ainda quão
importantes eram as leguminosas, muito em especial o trevo subterrâneo
(Trifolium subterraneum), na constituição de pastagens permanentes.
Para que isto passasse a ser aplicado em Portugal, empenhou-se a
fundo em que esses dois técnicos pudessem deslocar-se à Austrália e lá se
inteirassem desses sistemas e os extrapolassem para cá.
20
PASTAGENS E FORRAGENS 23
Assim aconteceu e, regressados a Portugal, logo nesse ano de 1965
promoveram e orientaram as primeiras sementeiras de trevo subterrâneo
nalgumas centenas de hectares, todos ou quase todos no Sul, e as pastagens
semeadas à base de leguminosas não mais deixaram de se realizar. Apesar
disso, ainda hoje estão, infelizmente, muito aquém daquilo que deveriam
estar na agricultura nacional.
Até essa data, considerava-se impossível haver pastagens semeadas
plurianuais em sequeiro e, mesmo em regadio, a exploração das espécies
vivazes que se semeavam era feita quase sempre, ou sempre, por cortes, ou
seja, como forragem. A excelência da luzerna, por exemplo, era expressa
pelo número de cortes anuais que propiciava – tal como o fazia Motta
Prego em 1924 (9).
A possibilidade, que o estudo e as observações de campo avolumavam,
de haver pastagens à base de leguminosas, que persistiam ano após ano
em solos de baixa fertilidade, constituiu a solução técnica para o grande
problema da reconversão da agricultura cerealífera de sequeiro.
Nos solos delgados de xisto, declivosos, para os quais, em 1964, se
preconizava a manutenção da cultura dos cereais até onde a mecanização
pudesse ir, e nos solos esqueléticos, para os quais se dizia que o mato
era o seu destino natural, era possível agora semear uma planta – trevo
subterrâneo – que cumpria o desígnio divino: crescia e multiplicava-se.
Este papel fulcral das pastagens no reordenamento da produção agrária foi alvo, logo em 1966, dum trabalho meu, que constituiu o relatório
final do curso de engenheiro silvicultor, e que intitulei “As Pastagens de
Leguminosas na Reconversão Cultural da Região a Sul do Rio Tejo. Sua
Acção nos Solos de Capacidade de Uso Não Agrícola”.
De então para cá, várias têm sido as vozes que, vezes sem conta, têm
proclamado, em público e em publicações, que as pastagens semeadas constituem uma das soluções, económicas e amigas do ambiente, para substituir
os cereais em muitos solos inadequados e para as viabilizar noutros, onde
devem entrar nas rotações como fonte de azoto para o solo.
Nos primeiros anos, foi o trevo subterrâneo a principal componente
do que se semeava, porque a área contemplada situava-se, na esmagadora
maioria dos casos, no Alentejo, com pluviosidade inferior a 700 mm e
com muitos solos de baixa fertilidade e de pequena espessura efectiva.
Para estas condições não havia, nem há ainda, leguminosas vivazes que
suportem a secura estival dos terrenos.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
21
Apesar dos muitos exemplos de êxito, este trevo foi, não raras vezes,
acusado de não se adaptar ao nosso clima e aos nossos solos. Acusação de má
fé ou de ignorância, pois na Austrália ele é uma planta exótica e, no entanto,
ocupa lá milhões de hectares, ao passo que em Portugal é espontâneo.
Pereira Coutinho assinala-o, em 1939, na sua Flora de Portugal, como
existindo em quase todo o País, e o mesmo escreveu João de Carvalho e
Vasconcellos em 1962 (14).
Acontece até que as primeiras introduções de trevo subterrâneo na
Austrália terão sido, muito provavelmente, originárias do nosso País.
Com efeito, a colonização desse território foi decidida, pelo governo
inglês, em 1788 e, como o canal Suez só foi aberto à navegação em
1869, os navios vindos de Inglaterra não passavam pelo Mediterrâneo,
e era na Galiza, Portugal, Madeira e Canárias que procediam ao seu
abastecimento.
Nas primeiras sementeiras, juntava-se ao trevo subterrâneo uma pequena quantidade de azevém bastardo (Lolium rigidum), mas verificou-se
depois que, por um lado, este era muito pouco produtivo e, por outro
lado, a cultivar Currie da gramínea vivaz pé-de-galo (Dactylis glomerata)
adaptava-se perfeitamente às mesmas condições do trevo.
A partir de 1971, começou a haver uma certa expansão das pastagens semeadas no Oeste, onde a pluviosidade e os solos possibilitaram a
introdução duma leguminosa vivaz – o trevo-morango (Trifolium fragiferum
cv. Palestine) – consociada com cultivares dotadas de dormência estival
de azevém perene (Lolium perenne) e, por vezes, de festuca alta (Festuca
arundinacea), sem deixar de se incluir também o trevo subterrâneo (geralmente, a sua cultivar Clare).
Mais tarde, quando apareceu a cultivar Haifa do trevo branco, este
passou igualmente a ser utilizado em sequeiro, mas, em geral, só onde a
pluviosidade era superior a 850 mm.
Nos últimos anos, por iniciativa do Eng.º David Crespo, têm também
sido semeados, em consociação com o trevo subterrâneo, o trevo balansa
(Trifolium balansae), o trevo púrpura (T. purpureum), o trevo vesiculoso
e o trevo da Pérsia.
Em relação aos solos calcários, usou-se, inicialmente, a luzerna espinhosa
(Medicago truncatula) e, posteriormente, a luzerna rugosa (Medicago rugosa).
Nalguns casos, também se recorreu à luzerna de disco (Medicago tornata). Todas
estas luzernas anuais são, aliás, espontâneas em diversas regiões do País.
22
PASTAGENS E FORRAGENS 23
O que vimos na Austrália, quando lá estagiámos em 1970, e a bibliografia desse país, que consultámos, levaram-nos a proceder à cultura de
luzerna (Medicago sativa) e a introduzir uma gramínea desconhecida entre
nós – a erva da estepe (Ehrharta calycina) – ambas em sequeiro.
Com a luzerna, recorremos a uma variedade muito tolerante a verões
secos e quentes – Hunter River. Para além de solos de diversos tipos, ela
foi ensaiada com êxito em solos arenosos, de baixa fertilidade e muito ou
medianamente espessos como são os Solos Podzolizados do Plio-Plistocénico
e do Miocénico a sul do Tejo. Alguns destes tinham a característica de
serem repelentes da água.
Precisamente nestes solos foi igualmente introduzida a citada erva
da estepe.
4.2 – Inoculação com Rhizobium e Revestimento das Sementes de
Leguminosas
O começo das pastagens à base de leguminosas gerou o começo duma
prática que, embora velha nos livros e noutros países como a Austrália,
não tinha ainda sido aplicada em Portugal, mesmo no período do fomento
forrageiro das décadas de 50 e 60. Refiro-me à inoculação com bactérias
do género Rhizobium e ao revestimento das sementes com calcário muito
fino, que se faz para proteger esses microorganismos, quer em armazém,
quer no solo, até que se dê a germinação.
Este procedimento continua a seguir-se em relação às leguminosas
pascícolas e forrageiras, mas supomos que só nestas. Julgo, com efeito,
que não se aplica nas hortícolas, nem nas arvenses para grão.
5 – PASTAGENS NATURAIS
No início dos anos 80, alguns técnicos, nada amigos de estudar, começaram a preconizar que, em vez de se semearem pastos, se utilizassem as pastagens
naturais, melhoradas pela adubação, alegando que se gastava menos.
Com excepção dalguns casos, cingidos em geral, às pastagens de
altitude e a diversos lameiros, esta opção representa um grave erro.
Por um lado, a generalidade dos incultos e dos pousios têm uma
composição florística de fraco valor alimentar e pouco produtiva, mesmo
com adubação.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
23
Por outro lado, a produção animal em pastos naturais e adubados
tem um preço de custo por animal mais elevado do que quando feita em
pastagens semeadas.
Com efeito, se pensarmos que o encabeçamento nestas últimas é, pelo
menos, triplo do que é possível nos pascigos naturais, verificamos que,
para um mesmo efectivo animal, precisamos, neste segundo caso, duma
área que é tripla da do primeiro caso. Isto, por sua vez, acarreta uma
despesa muito maior em cercas e bebedouros.
Note-se, por fim, que a adubação dos pastos naturais é até, muitas
vezes, mais dispendiosa, pois inclui o nutriente azoto, que é muito caro e
que se dispensa nas pastagens semeadas de leguminosas.
Sucede, porém, que a exploração de pastagens naturais não exige
nenhuns conhecimentos científicos e os seus utentes – os animais – não
protestam nem fazem greves.
Com as pastagens semeadas sucede o contrário. É preciso ter conhecimentos científicos, que se adquirem pelo estudo, porque ninguém nasce
ensinado, dos diversos ramos do saber, sendo de destacar os que se referem
às espécies e variedades a semear, à fertilização mineral e à condução dos
pastoreios. E como as ciências agrárias evoluem constantemente, o estudo
constante é também um imperativo.
6 – CULTIVARES PORTUGUESAS
DO CATÁLOGO NACIONAL DE VARIEDADES
A investigação agrária tem-se interessado pela criação de cultivares,
em geral mais adequadas a forragens do que a pastagens.
Este trabalho tem sido feito, quase todo, pela Estação Nacional de
Melhoramento de Plantas e Estação Agronómica Nacional.
Da autoria destas Estações há, no Catálogo Nacional, cultivares de
aveia forrageira, bersim, chícharo (Lathyrus cicera), ervilhacas (Vicia villosa,
V. benghalensis e V. sativa), trevo da Pérsia e trevo subterrâneo.
A Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro criou um triticale
forrageiro (cv. Douro) e à Direcção Regional de Agricultura de Entre
Douro e Minho deve-se o azevém anual Bragelim.
24
PASTAGENS E FORRAGENS 23
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1 – ABREU, A. T. et al. – Forragens. Subsídios para o estudo das possibilidades nacionais.
II. Trás-os-Montes. “Estudos Técnicos da Campanha da Produção Agrícola.” Folheto
n.º 21, 1936, Ministério da Agricultura. Lisboa.
2 – ALMEIDA. F. T. – Forragens. Subsídios para o Estudo das Possibilidades Nacionais.
I. Região Saloia. “Estudos Técnicos da Campanha da Produção Agrícola”. Folheto
n.º 18, 1936, Ministério da Agricultura. Lisboa.
3 – CABRAL, A. – Produção, Transformação e Comercialização dos Cereais em Portugal.
Lisboa, 1991, EPAC.
4 – CALDAS, E. C. – A Agricultura Portuguesa Através dos Tempos. Lisboa, 1991,
INIC.
5 – Decreto-Lei nº 46 595 de 15 de Outubro de 1965. Regime Cerealífero 1966-1970.
6 – FEIO, M. – A Situação Económica e Perspectivas da Cultura do Trigo. Federação dos
Grémios da Lavoura do Baixo Alentejo. Beja, 1963, Publicação n.º 10.
7 – FEIO, M. – A Cerealicultura do Sul Perante a Reconversão Agrária. Os Problemas
Fundamentais da Reconversão Agrária da IV Zona Agrícola. Beja. Federação dos
Grémios da Lavoura do Baixo Alentejo. Publicações, 1965, n.º 16.
8 – FEIO, M; SAMPAIO, J. A. – Possibilidades da Agricultura de Sequeiro no Alentejo. A
Rotação Experimental do Posto de Évora. Beja. Federação dos Grémios da Lavoura
do Baixo Alentejo. Publicações, n.º 2, 1961, 2ª Edição Actualizada.
9 – PREGO, M. – Cultura da Luzerna (De Provença) no Minho, 1926, Porto.
10 – RUELLA, A. – Forragens. Subsídios para o Estudo das Possibilidades Nacionais.
I. Entre Douro e Minho. Estudos Técnicos da Campanha da Produção Agrícola.
Folheto nº 18. Ministério da Agricultura, 1936, Lisboa.
11 – SALGUEIRO, T. A. – Breve Historial das Pastagens Semeadas à Base de Leguminosas.
In “Valorização da Caprinicultura na Serra do Caldeirão” 2000, Direcção Regional
de Agricultura do Algarve, Faro.
12 – SAMPAIO, J. A. – Problemas de Matéria Orgânica na Agricultura Alentejana. Federação dos Grémios da Lavoura do Baixo Alentejo, Publicações, n.º 15, 1965, Beja.
13 – SEABRA, A. L. – Ervagens de Leguminosas. Lisboa. Empresa Nacional de Publicidade. 1931.
14 – VASCONCELLOS, J. C. – Ervas Forrageiras. Lisboa. Direcção Geral dos Serviços
Agrícolas. 1962.
15 – VASCONCELOS, M. T. – Forragens. Subsídios para o Estudo das Possibilidades Nacionais. II. Beira Transmontana. Estudos Técnicos da Campanha da Produção Agrícola.
Folheto nº 21. Ministério da Agricultura, 1936, Lisboa.
16 – VIANA, C. I. – Forragens. Subsídios para o Estudo das Possibilidades Nacionais. I.
Vale do Tejo e Sorraia. Estudos Técnicos da Campanha da Produção Agrícola. Folheto
n.º 18. Ministério da Agricultura, 1936, Lisboa.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
25
"Pastagens e Forragens", vol. 23, 2002, p. 27–40.
EFEITO DA APLICAÇÃO AO SOLO DE COMPOSTADO
DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS SOBRE
A CONCENTRAÇÃO EM METAIS PESADOS DA CEVADA E DO MILHO*
Manuel Souteiro Gonçalves, António Videira da Costa, Cristina M. Sempiterno
Laboratório Químico Agrícola Rebelo da Silva,
Apartado 3228 – 1306 LISBOA – Codex
RESUMO
Registam-se na literatura trabalhos divulgando acréscimos e outros apontando decréscimos na concentração em metais pesados de plantas cultivadas em solos previamente
submetidos a correcção orgânica com compostados de resíduos sólidos urbanos (RSU).
Procurando contribuir para a investigação sobre esta temática, visou-se, através
de ensaios em vasos, e no âmbito de um estudo mais abrangente destinado a avaliar
a qualidade agronómica de um compostado de RSU, estudar o efeito da aplicação de
doses crescentes deste fertilizante a dois tipos de solo sobre a concentração em metais
pesados (Cd, Cu, Cr, Ni, Pb e Zn) no material vegetal relativo a um sistema de culturas sucessivas: alface, cevada e milho. Os solos utilizados foram um Podzol câmbico
(PZb), da região de Pegões, e um Vertissolo cálcico (VRk), da região de Queluz. O
estudo apoiou-se num delineamento experimental constituído por seis tratamentos:
o controlo zero e cinco níveis de aplicação de compostado por vaso correspondendo,
grosso modo, a 7,5; 15; 30; 45 e 60 t ha-1.
A análise de variância revelou que: i) no caso do solo PZb, as aplicações de
compostado originaram, na cevada e no milho, uma drástica redução dos teores de
cádmio, cobre, níquel e zinco no material vegetal (parte aérea), logo a partir do nível
mais reduzido, não se registando diferenças significativas nos teores de chumbo e
crómio; ii) no caso do solo VRk, não se verificou resposta significativa das concentrações de todos os metais pesados nas plantas de milho às aplicações do fertilizante.
A análise de correlação permitiu verificar que as concentrações de cádmio, cobre,
níquel e zinco no milho do ensaio conduzido no solo PZb não se encontravam, de
um modo geral, directamente correlacionadas com os teores extraíveis (pelo método
de Lakanen e Ervio) dos vários elementos no solo, tendo-se obtido os mais elevados
coeficientes de correlação (negativos) entre tais concentrações e o pH do solo. Os
teores de cádmio, crómio e níquel apresentaram, em ambos os solos e culturas e em
todos os tratamentos, valores abaixo dos considerados normais nas plantas e os de
cobre, chumbo e zinco muito abaixo dos limites considerados toleráveis.
PALAVRAS-CHAVES: Cevada; Compostado de RSU; Metais pesados; Milho; pH;
* Comunicação apresentada na XXIII Reunião de Primavera da SPPF. Guimarães, Abril
de 2002.
27
EFFECT OF MUNICIPAL SOLID WASTE COMPOST APPLICATION
ON HEAVY METALS CONTENTS IN BARLEY AND CORN
ABSTRACT
Reports were made pointing out either an increase or a decrease of heavy metal
content in plants grown in soils where municipal solid waste (MSW) compost was
applied. In order to contribute for the research on this subject, the effect a MSW
compost on the heavy metal content (Cd, Cu, Cr, Ni, Pb and Zn) of a plant rotation
(lettuce, barley, corn) carried out in two soil types, a Cambic Podzol and a Calcic
Vertisol, was studied. With this aim, a pot trail was installed with six experimental
treatments: the zero control and five compost levels, corresponding, grosso modo, to
7.5; 15; 30; 45 and 60 t h-1.
The statistical analysis has shown the following: i) from the compost application
to the Cambic Podzol has resulted a dramatic reduction in the concentration of Cd, Cu,
Ni and Zn of barley and corn, as from the first compost level, but there was not significant differences in Pb and Cr contents; ii) a significant response of corn to the heavy
metal content of compost applied to the Calcic Vertisol was not found; iii) the concentration of Cd, Cu, Ni and Zn of corn grown in the Cambic Podzol was not, in general,
directly correlated with its extractable (by Lakanen and Ervio´s method) concentrations
in soil, being the higher correlation coefficients (negatives) attained with soil pH.
For every soil, crop and treatment, the levels of Cd, Cr and Ni were below the
limits considered “normal” and the levels of Cu, Pb and Zn below the tolerable limits
for feed crops.
KEYWORDS: Barley; Corn compost; Heavy metals; MSW; pH; Soil
1 – INTRODUÇÃO
Alguns autores registaram acréscimos no teor de alguns metais pesados
em plantas cultivadas em solos submetidos a correcções orgânicas com
o compostado de RSU, nomeadamente em doses elevadas (10, 13, 3, 4,
11), enquanto outros apontam decréscimos (9, 14). Esta discrepância de
resultados poder-se-á dever à intervenção de vários factores, tais como o
pH, capacidade de troca catiónica e teor de matéria orgânica do solo, o
pH, grau de maturação e carga em metais pesados do composto e, ainda,
os factores de transferência dos diversos metais pesados (2, 8).
O presente estudo, com o qual se procurou avaliar o efeito da aplicação
de um compostado de RSU sobre a concentração em metais pesados no
material vegetal relativo a um determinado sistema de culturas sucessivas
implantadas em dois solos de características distintas, inseriu-se numa investigação mais abrangente que visava, ainda, os seguintes objectivos: i) estimar
a eficiência de N, P e K veiculados para esses solos pelo compostado de
28
PASTAGENS E FORRAGENS 23
RSU, comparativamente com uma adubação mineral, veiculando as mesmas
doses de N, P e K; ii) avaliar o efeito da aplicação de doses crescentes de
compostado sobre a evolução dos principais parâmetros químicos indicadores do estado de fertilidade do solo e dos metais pesados não nutrientes.
Embora reconhecendo não ser muito correcto extrapolar para o campo
os resultados obtidos nos ensaios em vasos (1), tomou-se a liberdade de
estabelecer uma correspondência entre as quantidades expressas em gramas
por vaso e t ha-1 de compostado aplicado (considerando o volume da camada
arável do solo de 20 cm) para ilustrar alguns aspectos do presente estudo.
Esta transposição deverá, assim, ser considerada com as devidas reservas.
2 – MATERIAL E MÉTODOS
2.1 – Instalações
O ensaio foi conduzido no Horto de Química Agrícola Boaventura de
Azevedo, Tapada da Ajuda, numa estrutura constituída por uma estufa de
vidro, um abrigo de rede e uma unidade de apoio destinada à preparação
de macro-amostras de terra.
2.2 – Material de estudo
2.2.1 – Compostado
Utilizou-se um compostado de RSU com as características indicadas
no quadro 1.
QUADRO 1 – Características do compostado utilizado nos ensaios em vasos*
Parâmetros determinados
Humidade
Unidade
Resultados
%
22,7
pH (H2O)
Condutividade eléctrica
8,2
mS
cm-1
a 25 ºC
5,0
Matéria orgânica
%
41,7
C orgânico
%
18,7
N total
N orgânico insolúvel em água
%
2,1
% (N)
1,8
Fósforo total
% (P2O5)
1,3
Potássio total
% (K2O)
1,6
Cálcio total
% (CaO)
10,4
Continua
PASTAGENS E FORRAGENS 23
29
Continuação
Parâmetros determinados
Unidade
Resultados
Magnésio total
% (MgO)
1,0
Cloretos
% (NaCl)
1,4
Enxofre total
% (SO3)
0,7
Composto húmicos
%
Ácidos húmicos
%
8,0
Ácidos fúlvicos
%
2,2
10
Relação ac. húmicos/ac. fúlvicos
Taxa de humificação
3,4
%
30,3
Relação C/N
11
Cobre total
mg
kg-1
344
Zinco total
mg kg-1
727
Níquel total
mg
kg-1
70
Crómio total
mg kg-1
49
Cádmio total
mg
kg-1
3
Chumbo total
mg kg-1
753
* Resultados reportados à matéria seca a 100-105 ºC.
2.2.2 – Solos
Para os ensaios em vasos utilizaram-se dois solos de características
distintas e de grande representatividade, a nível regional e nacional:
– Um Vertissolo cálcico (VRk), de acordo com a classificação da FAO/
UNESCO, proveniente da região de Queluz, de textura franco-argilosa,
capacidade de troca catiónica elevada e pH na gama do neutro;
– Um Podzol câmbico (PZb), proveniente da região de Pegões, de
textura arenosa, capacidade de troca catiónica muito baixa e de
reacção ácida.
No quadro 2 apresentam-se algumas características das terras utilizadas nos ensaios em vasos, provenientes da camada arável (0 - 20 cm)
de ambos os solos.
2.2.3 – Culturas utilizadas
Nos ensaios foi utilizada a rotação alface (Lactuca sativa L., variedade
“Maravilha de Inverno”) × cevada (Hordeum vulgare L., variedade “Jaidor”)
× milho (Zea mays L., variedade “Px-74”, classe FAO 600).
30
PASTAGENS E FORRAGENS 23
QUADRO 2 – Características dos solos utilizados nos ensaios em vasos
Parâmetros
Textura
Fósforo (P2O5)
Potássio (K2O)
pH (H2O)
Matéria orgânica
N total (orgânico + amoniacal)
Cálcio extraível
Magnésio extraível
Bases de troca: Ca
Mg
K
Na
H titulável
Soma Bases Troca (SBT)
Capacidade Troca Catiónica (CTC)
Grau Saturação Bases (GSB)
Ferro extraível
Manganês extraível
Zinco extraível
Cobre extraível
Chumbo extraível
Níquel extraível
Crómio extraível
Cádmio extraível
Boro extraível
Molibdénio extraível
Zinco total
Cobre total
Chumbo total
Níquel total
Crómio total
Cádmio total
mg kg-1
mg kg-1
%
%
mg kg-1
mg kg-1
cmol(+) kg-1
cmol(+) kg-1
cmol(+) kg-1
cmol(+) kg-1
cmol(+) kg-1
cmol(+) kg-1
cmol(+) kg-1
%
mg kg-1
mg kg-1
mg kg-1
mg kg-1
mg kg-1
mg kg-1
mg kg-1
mg kg-1
mg kg-1
mg kg-1
mg kg-1
mg kg-1
mg kg-1
mg kg-1
mg kg-1
mg kg-1
Solo
VRk
Franco-argilosa
169
101
7,10
1,45
0,067
2508
1240
16,78
13,33
0,15
0,59
6,70
30,85
37,55
82,16
162
53
4,5
2,4
<3,0
7,0
<0,2
<0,2
0,84
0,049
91,5
53,8
24,5
24,0
192
<0,1
PZb
Arenosa
<11
14
4,70
0,40
0,036
77
10
0,38
0,07
0,03
0,03
0,42
0,51
0,93
54,84
40,6
8,8
3,0
1,2
<3,0
<0,2
<0,1
<0,1
0,40
0,002
5,0
5,5
3,5
4,0
1,0
<0,1
2.3 – Métodos
2.3.1. – Preparação das amostras e métodos de caracterização laboratorial
As amostras de compostado foram previamente secas em estufa a
60 ºC, sendo posteriormente moídas num moinho de facas em aço inoxidável a que se seguiu nova moenda num almofariz de ágata, para que o
material passasse por um crivo de 0,5 mm. Para a sua análise, utilizou-se
a metodologia descrita no quadro 3.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
31
QUADRO 3 – Métodos utilizados na análise físico-química do compostado
Parâmetro
Humidade
Unidades
%
Método
Mét. gravimétrico: perda por secagem a ≈105º C
PH
Esc. Sörensen Método electroquímico (potenciométrico)
Condutividade (susp.1:5 v/v)
mScm-1 (25 ºC) Método electroquímico
Matéria orgânica total
Carbono orgânico
rapidamente biodegradável
%
Método gravimétrico: perda por calcinação a ≈ 540º C
%
Oxidação com dicromato de potássio e ácido sulfúrico.
Doseamento por colorimetria
N total
%N
Método de Kjeldahl. Doseamento por volumetria
N amoniacal
%N
Destilação. Doseamento por volumetria
N nítrico
%N
Redução a N amoniacal pela liga de Devarda
Doseamento por volumetria
N orgânico insolúvel em água
%N
Ácidos húmicos
%
Ácidos fúlvicos
%
Fósforo total
% P 2O 5
Potássio total
% K 2O
Cálcio total
% CaO
Magnésio total
% MgO
Extracção com etanol, mineralização pelo método
de Kjeldahl. Doseamento por volumetria
Extracção com hidróxido de sódio e pirofosfato de sódio
. Precipitação (pH ≈ 2). Doseamento por colorimetria
Extracção com hidróxido de sódio e pirofosfato de
sódio. Doseamento por colorimetria
Solubilização com uma solução de ácido clorídrico após
calcinação da amostra. Doseamento por colorimetria
Solubilização com uma solução de ácido clorídrico após
calcinação da amostra. Doseamento por fotometria de
chama
Solubilização com uma solução de ácido clorídrico após
calcinação da amostra. Doseamento por EAA
Solubilização com uma solução de ácido clorídrico após
calcinação da amostra. Doseamento por EAA
Sódio solúvel em água
% Na
Extracção com água. Doseamento por fotometria de
chama
Sulfato solúvel em água
% SO3
Extracção com água levemente acidulada. Doseamento
por gravimetria
Cloreto solúvel em água
% Na Cl
Extracção com água. Doseamento por volumetria
Zn, Cu, Cd, Cr, Ni, Pb totais
mg kg-1
Solubilização com uma solução de ácido clorídrico após
calcinação da amostra. Doseamento por EAA
As amostras de terra, provenientes da camada arável de 0 – 20 cm,
foram secas a uma temperatura inferior a 40 ºC e submetidas a peneiração
com um crivo de aço inoxidável de 2 mm. As análises de terra foram
efectuadas no material passado por este crivo, no início e no termo dos
ensaios, tendo-se utilizado a metodologia adoptada pelo Laboratório Rebelo
da Silva (6, 7).
As amostras de material vegetal foram secas a 100 – 105 oC e moídas
num moinho apropriado, em aço inoxidável.
32
PASTAGENS E FORRAGENS 23
2.3.2. – Modalidades experimentais, esquema estatístico e fertilização.
Como atrás se referiu, a investigação realizada visava múltiplos objectivos, sendo o principal a avaliação da eficiência relativa do N, P e K
veiculados pelo compostado, pelo que se estabeleceu um complexo delineamento experimental integrando 29 tratamentos (T1 a T29), distribuídos
segundo um esquema de blocos completos casualizados, com 3 repetições,
num sistema de três culturas sucessivas: alface, cevada e milho. Para a
realização do presente trabalho, consideraram-se os tratamentos relativos
à “curva do azoto”, ou seja, o T1 (controlo zero) e cinco níveis de aplicação de compostado por vaso (T2 a T6), correspondendo, grosso modo,
a 7,5; 15; 30; 45 e 60 t ha-1. No quadro 4 descriminam-se os tratamentos
experimentais considerados, bem como se indicam as doses de compostado e de macronutrientes principais recebidas por cada vaso. O P foi
veiculado pelo Ca(H2PO4).H2O e o K pelo K2SO4. Todos os tratamentos,
incluindo os que levaram compostado, receberam 300 mg de Mg sob a
forma de MgSO4.7H2O. O efeito dos tratamentos sobre as concentrações
dos nutrientes no material vegetal foi avaliado através da análise de variância, tendo-se procedido à comparação das médias recorrendo ao teste
da diferença mínima significativa (p = 0,05).
QUADRO 4 – Tratamentos experimentais estabelecidos e doses de
compostado, N, P e K aplicadas
Tratamentos
T1 T2 T3 T4 T5 T6 -
N0PKC0
N0PKC1
N0PKC2
N0PKC3
N0PKC5
N0PKC4
Compostado
Fertilização mineral (mg por vaso)
(g por vaso)
N
P
K
0
26,25
52,50
105,00
157,50
210,00
0
0
0
0
0
0
1000
1000
1000
1000
1000
1000
1200
1200
1200
1200
1200
1200
2.3.3 – Descrição e condução dos ensaios
Utilizaram-se vasos do tipo Kick-Brauckmann de polietileno branco
quimicamente inerte e de parede dupla, com cerca de 7 dm3 de capacidade.
Para cada vaso pesaram-se, tendo em conta a densidade aparente, 8,5 kg de
terra no caso do solo VRk e 11,47 kg de terra no caso do solo PZb.
Após a preparação da terra, que foi passada por um crivo de malha de 1 cm, procedeu-se à incorporação do compostado e dos adubos
minerais nas quantidades previstas para cada tratamento. Os vasos foram
PASTAGENS E FORRAGENS 23
33
depois dispostos por blocos e tratamentos, de forma casualizada, nos
carros porta-vasos. Sempre que as condições atmosféricas o permitiram,
foram transferidos para o abrigo de rede. Após o humedecimento da terra, procedeu-se à plantação da alface (4 plantas por vaso). Uma semana
depois efectuou-se o desbaste, deixando duas alfaces por vaso, aplicandose de seguida a solução azotada de cobertura. A plantação foi realizada
primeiramente no solo VRk e, alguns dias depois, no solo PZb. Seguiu-se
o mesmo procedimento na instalação das restantes culturas ensaiadas
(cevada e milho). Assim, o trabalho iniciou-se sempre com o solo VRk,
sendo as diversas tarefas realizadas de forma escalonada. Durante o ensaio,
a terra foi mantida a 70% da capacidade máxima de retenção de água,
aproximadamente.
Após a colheita da alface, procedeu-se à preparação da terra para a
sementeira da cevada. A terra foi revolvida até à profundidade de 10-15 cm,
tendo-se efectuado o arranque da raiz principal. No caso da cultura do
milho, a sementeira foi também precedida de mobilização até aos 10-15 cm
de profundidade, deixando enterradas as raízes de cevada.
Para a segunda cultura (cevada), semearam-se 40 sementes por vaso.
Após a emergência, realizou-se o desbaste para 25 plantas por vaso. Para
o milho, utilizaram-se 8 sementes por vaso, tendo-se realizado o desbaste
na fase de duas folhas, mantendo em cada vaso apenas 4 plantas.
Os ensaios deram-se por concluídos cerca de 8 semanas após a
plantação, no caso da alface, e cerca de 5 semanas após a sementeira,
nos casos da cevada e milho. A colheita das plantas efectuou-se rés-terra, procedendo-se de seguida à sua pesagem e posterior secagem a 65 ºC
em estufa de ventilação forçada durante 48 horas, a que se seguiu nova
pesagem. O material vegetal foi moído para posterior análise química.
No sentido de minorar o erro experimental, uma vez que as aplicações
do compostado poderiam condicionar a acção dos fitofármacos, não foi
efectuado qualquer tratamento fitossanitário. Consequentemente verificou-se,
no ensaio com o solo PZb, um forte ataque de Botrytis cinerea à alface
(primeira cultura de rotação), do qual resultou a morte ou aparecimento
de necroses em 58% das plantas, pelo que esta cultura não foi considerada
no presente estudo.
Importará, também, referir que a determinação do teor de metais
pesados no material vegetal foi, numa primeira fase, efectuada através
da utilização de um espectrofotómetro de absorção atómica de chama
(PERKIN-ELMER 3100), tendo-se observado que os valores relativos ao
34
PASTAGENS E FORRAGENS 23
chumbo, no material proveniente de todas as culturas ensaiadas, e os relativos ao cádmio, chumbo, crómio e níquel, no caso da cevada e do milho, se
encontravam abaixo dos limites de detecção do aparelho. Decidiu-se, assim,
conservar as amostras de material vegetal (secas a 105 ºC e acondicionadas
em sacos de plástico, em local apropriado), tendo em vista a posterior determinação dos metais pesados utilizando, desta vez, um espectrofotómetro
de absorção atómica com forno de grafite (PERKIN-ELMER 4110 ZL).
Dadas as reduzidas quantidades de material remanescente de grande parte
das amostras correspondentes aos tratamentos considerados no estudo que
se pretendia realizar (T1 a T6), só foi possível efectuar as análises com 3
repetições das amostras relativas ao milho instalado em ambos os solos e
à cevada instalada no solo PZh. Assim, só os resultados provenientes da
análise química destas amostras foram passíveis de análise estatística.
3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 – Cevada
Os resultados relativos às concentrações de metais pesados nas plantas
de cevada (parte aérea) obtidas no ensaio com o solo PZb apresentam-se
no quadro 5.
QUADRO 5 – Concentrações (valores médios) de metais pesados nas plantas de cevada
(parte aérea) instaladas no solo PZb (mg kg-1)
Tratamento
Cádmio
Chumbo
Cobre
Crómio
Níquel
Zinco
T1
0,190 a
0,299 a
23,0 a
0,292 a
0,834 a 254,0 a
T2
0,087 b
0,355 a
17,1 a
0,272 a
0,249 b
75,5 b
T3
0,063 b
0,309 a
18,0 a
0,219 a
0,359 b
57,3 b
T4
0,076 b
0,283 a
16,3 a
0,196 a
0,209 b
70,3 b
T5
0,091 b
0,433 a
11,7 b
0,154 a
0,194 b
71,6 b
T6
0,098 b
0,342 a
10,7 b
0,096 a
0,132 b
65,0 b
Nota: médias seguidas da mesma letra, dentro da mesma coluna, não diferem entre si de forma significativa
(p = 0,05)
A análise de variância permitiu verificar que a resposta das concentrações de cádmio e zinco aos tratamentos experimentais resultou altamente
significativa (p < 0,001), a relativa ao cobre muito significativa (p < 0,01) e
a relativa ao níquel significativa (p < 0,05). Para o crómio e chumbo não se
observaram diferenças significativas. Mais se verificou que as concentrações
de cádmio, níquel e zinco se reduziram significativamente (p<0,05), logo a
partir do nível mais baixo de compostado (correspondendo a 7,5 t ha-1),
não diferindo significativamente entre este nível e os restantes.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
35
A inexistência de diferenças significativas entre tratamentos nos casos
do crómio e do chumbo justificar-se-á pelos relativamente reduzidos factores
de transferência destes elementos (8, 2). A redução das concentrações dos
restantes metais pesados na parte aérea da cevada dever-se-á não só à
elevação do pH do solo mas também ao aumento dos teores de matéria
orgânica e da capacidade de troca catiónica do solo, resultantes das aplicações de compostado (9). Relativamente ao pH, os resultados da análise
estatística sugerem que a elevação deste parâmetro para valores próximos
de 6,0 (obtidos, no caso vertente, com a aplicação dos níveis mais baixos
de compostado) será suficiente para reduzir drasticamente a fracção biodisponível de cádmio, cobre, níquel e zinco.
Importará referir que as concentrações de cádmio, crómio e níquel
apresentaram, em todos os tratamentos, valores abaixo dos considerados
normais para as plantas e os de chumbo, cobre e zinco, valores muito
aquém dos considerados toleráveis (12).
3.2 – Milho
Os valores das concentrações de metais pesados nas plantas de milho
(parte aérea) instaladas nos solos PZb e VRk constam nos quadros 6 e 7,
respectivamente.
Relativamente ao solo PZb, registaram-se, na média dos tratamentos,
concentrações mais elevadas de crómio e chumbo nas plantas de milho
do que nas de cevada, verificando-se o oposto no tocante aos teores de
cádmio, cobre e zinco, sendo os de níquel da mesma ordem de grandeza
em ambas as culturas. Tal como se verificou com a cevada, os teores de
cádmio, crómio e níquel situaram-se, em todos os tratamentos, abaixo dos
níveis considerados normais para a planta, e os de chumbo, cobre e zinco
muito aquém dos considerados toleráveis.
A análise de variância revelou que, neste solo, o padrão de resposta
das concentrações dos diversos metais no milho aos tratamentos experimentais foi, como seria previsível, muito semelhante ao relativo à cevada,
pelo que a apreciação dos resultados efectuada em 3.1 é também válida
para o caso vertente.
No caso do solo VRk, a resposta do milho foi distinta da registada
com o solo PZh, uma vez que não se verificaram diferenças significativas
entre tratamentos para nenhum dos metais pesados considerados. Estes
resultados eram expectáveis, já que o solo apresentava, à partida, valores
36
PASTAGENS E FORRAGENS 23
de pH da ordem de 7,0 elevada capacidade de troca catiónica e teores de
matéria orgânica bastante superiores aos do solo PZb.
QUADRO 6 – Concentrações (valores médios) de metais pesados nas plantas de
milho (parte aérea) instaladas no solo PZb (mg kg-1)
Tratamento
T1
T2
T3
T4
T5
T6
Cádmio
Chumbo
Cobre
Crómio
Níquel
0,108 a
0,056 b
0,042 b
0,049 b
0,051 b
0,059 b
0,975 a
1,007 a
1,097 a
1,285 a
1,202 a
1,254 a
9,1 a
5,8 b
6,3 b
6,2 b
6,1 b
5,9 b
0,387 a
0,548 a
0,419 a
0,368 a
0,385 a
0,351 a
0,338 a
0,261 b
0,221 c
0,204 c
0,195 c
0,176 c
Zinco
113,3 a
26,3 b
25,0 b
29,0 b
31,0 b
35,7 b
Nota: médias seguidas da mesma letra, dentro da mesma coluna, não diferem entre si de forma significativa
(p = 0,05).
QUADRO 7 – Concentrações (valores médios) de metais pesados nas plantas de milho (parte
aérea) instaladas no solo VRk (mg kg-1).
Tratamento
T1
T2
T3
T4
T5
T6
Cádmio
Chumbo
Cobre
0,016 a
0,021 a
0,024 a
0,016 a
0,023 a
0,032 a
0,536 a
0,474 a
0,541 a
0,451 a
0,530 a
0,537 a
4,5 a
4,6 a
4,0 a
3,4 a
3,8 a
5,0 a
Crómio
0,684 a
0,657 a
0,705 a
0,684 a
0,651 a
0,382 a
Níquel
0,927 a
0,954 a
0,949 a
0,920 a
0,901 a
0,871 a
Zinco
23,7 a
21,0 a
23,0 a
24,0 a
26,3 a
26,3 a
Nota: médias seguidas da mesma letra, dentro da mesma coluna, não diferem entre si de forma significativa
(p = 0,05).
3.3 – Correlações entre a concentração em metais pesados no milho
e o teor ou valor de alguns parâmetros do solo
No sentido de avaliar o eventual grau de associação entre a concentração em metais pesados no material vegetal e os parâmetros do solo que, de
forma mais efectiva, condicionam a absorção daqueles elementos pela planta,
determinaram-se os coeficientes de correlação (r) entre o teor de metais
pesados no milho (parte aérea), e: os seus teores no solo, extraíveis pelo
método de Lakanen e Ervio (5); os valores de pH; a capacidade de troca
catiónica; os teores de matéria orgânica. Estes parâmetros foram determinados
nas amostras do solo PZb após o termo dos ensaios (quadro 8).
Como é óbvio, não se teve em conta o solo VRk uma vez que, neste
solo, não se registaram diferenças significativas entre tratamentos e, pela
mesma razão, também não se consideraram os resultados relativos ao
crómio e ao chumbo no solo PZb.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
37
QUADRO 8 – Resultados relativos a alguns parâmetros do solo no PZb
Metais pesados (mg kg-1)
Cu
Cr
Ni
MO
(%)
pH
CTC
(cmol(+) kg-1)
Cd
Pb
T1
0,53
5,0
1,10
0,003
0,96
2,3
0,016
0,023
4,0
T2
0,53
5,9
1,24
0,004
1,25
2,4
0,007
0,038
2,0
T3
0,60
6,3
1,76
0,006
1,92
3,3
0,011
0,047
3,1
T4
0,62
7,1
2,48
0,010
3,72
4,7
0,020
0,066
5,4
T5
0,67
7,4
3,10
0,012
4,58
5,5
0,027
0,094
6,5
T6
0,81
7,7
3,55
0,015
6,27
6,8
0,034
0,121
9,3
Tratamento
Zn
Os valores negativos dos coeficientes de correlação (quadro 9) indicam
que as concentrações em metais pesados no milho variaram na razão inversa
com os parâmetros do solo considerados. Se no caso do pH, capacidade
de troca catiónica e teor de matéria orgânica, os valores obtidos são
plenamente justificáveis, dado que aqueles parâmetros do solo promovem
a fixação dos metais pesados, o mesmo não acontece no que diz respeito
aos teores extraíveis dos elementos metálicos considerados pelo método de
Lakanen e Ervio (5), pelo que seria conveniente avaliar a capacidade do
método para reflectir a biodisponibilidade daqueles elementos.
QUADRO 9 – Coeficientes de correlação entre as concentrações em metais pesados no
milho (parte aérea) e os valores de alguns parâmetros do solo
Parâmetros do solo
Teores extraíveis no solo (mg
kg-1)
Cd
Concentrações na planta (mg kg-1)
Cu
Ni
Zn
-0,449
-0,504
-0,851
-0,090
PH (H2O)
-0,674
-0,736
-0,964
-0,680
CTC [(cmol(+)kg-1]
-0,448
-0,533
-0,854
-0,451
Mat. org. (%)
-0,342
-0,462
-0,789
-0,358
Da análise do quadro retira-se, também, que o pH foi o parâmetro
que condicionou de forma mais determinante a biodisponibilidade dos
metais pesados em apreço. Com efeito, os valores de r obtidos entre este
parâmetro e as concentrações dos metais pesados no material vegetal
resultaram muito significativos (p<0,01) no caso do cádmio, cobre e zinco
e altamente significativos (p<0,001), no caso do níquel.
38
PASTAGENS E FORRAGENS 23
4 – CONCLUSÕES
Não se registou resposta significativa das concentrações de cádmio,
cobre, crómio, chumbo, níquel e zinco nas plantas (parte aérea) de cevada e
milho às aplicações de doses crescentes de compostado no solo VRk, fruto,
provavelmente, do valor de pH (cerca de 7,0) e da elevada capacidade de
troca catiónica que este solo apresentava à partida. No caso do solo PZb,
as aplicações de compostado proporcionaram, em ambas as culturas, uma
drástica redução dos teores de cádmio, cobre, níquel e zinco no material
vegetal (parte aérea) logo a partir do nível mais baixo (cerca de 7,5 t ha-1)
– que também proporcionou a elevação dos valores de pH do solo de 5,0
para 5,9 – não se registando diferenças significativas nos casos do chumbo
e do crómio. As concentrações de cádmio, crómio e níquel apresentaram,
em ambos os solos e culturas e em todos os tratamentos, valores abaixo
dos considerados normais nas plantas, e as de cobre, chumbo e zinco
muito abaixo dos limites considerados toleráveis.
As concentrações de cádmio, crómio, níquel e zinco no milho (parte
aérea) conduzido no solo PZb não se encontravam directamente correlacionadas aos teores extraíveis (pelo método de Lakanen e Ervio) dos
vários elementos no solo, tendo-se obtido os mais elevados coeficientes
de correlação (negativos) entre tais concentrações e o pH. Daqui se infere
ser necessário levar a efeito estudos de correlação entre as concentrações
dos metais pesados nas plantas e os seus teores extraíveis do solo por
outros extractantes e que, nas equações de regressão, se deverão incluir,
para além dos teores extraíveis dos elementos, outros parâmetros do solo
tanto ou mais determinantes na biodisponiblidade dos metais pesados, de
entre os quais emerge o pH.
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vegetable crops 1,2 and 9 years after application of composted municipal solid wastes
and sewage sludge. In. “Soils and Fertilisers”, 1997, vol. 60, abstract 11 558.
40
PASTAGENS E FORRAGENS 23
"Pastagens e Forragens", vol. 23, 2002, p. 41–51.
TEORES DE COBRE E ZINCO NUMA PASTAGEM
INSTALADA NUM SOLO TRATADO COM LAMA RESIDUAL
URBANA COM ELEVADO TEOR DE COBRE*
Hermínia Domingues, Odete Monteiro, Filipe Pedra, Maria da Graça Serrão
Departamento de Ciência do Solo, Estação Agronómica Nacional
Quinta do Marquês, Av. da República, 2784-05 – OEIRAS
RESUMO
Apreciam-se as concentrações foliares de Cu e Zn na biomassa vegetal, bem
como os teores destes nutrientes no solo, nos primeiros ciclos culturais (1997/1998
e 1998/1999) de dois ensaios de fertilização em pastagem melhorada e semeada, na
região de Mértola.
Os ensaios tiveram sete modalidades idênticas, em que se incluem a testemunha
(sem fertilização), a adubação corrigida anualmente, três níveis de lama residual urbana (LRU) de Évora (4,8 e 12 t ha-1) e dois níveis da mesma LRU (4 e 8 t ha-1) complementados com adubação. Antes da aplicação dos fertilizantes, os teores de Cu e de Zn
do solo (0 - 20 cm) e o de Zn, na LRU, extraídos por água régia (AR), eram inferiores
aos valores-limite da Portaria 176/96, ao contrário do teor de Cu no resíduo.
Os teores foliares de Cu e de Zn aumentaram no final do 2.º ciclo cultural, em
relação aos do 1.º ciclo, mas os valores mais elevados não ocorreram na modalidade
com 12 t ha-1 de LRU, para a qual os teores de Cu e Zn (AR) no solo também foram
muito inferiores aos da legislação.
Embora a disponibilidade do Cu e Zn (EDTA, pH 4,65) para as plantas não
fosse elevada na camada superficial do solo em 1998, em 1999 os teores de Cu e Zn
“disponíveis” foram altos nas modalidades com 8 e 12 t ha-1 de LRU, no termo do
2.º ciclo cultural. Estes acréscimos revelam transferência dos elementos na LRU para
formas mais disponíveis no solo o que, aliado a produções reduzidas de pastagem em
1999, contribuiu para a concentração de Cu e Zn na biomassa vegetal. Assim, considera-se essencial prosseguir o estudo de efeitos residuais nestes ensaios.
PALAVRAS-CHAVES: Cobre e zinco; Lama residual urbana; Pastagem; Solo.
* Comunicação apresentada na XXIII Reunião de Primavera da SPPF. Guimarães, Abril
de 2002.
Este trabalho foi financiado pelos Projectos N.º 4073 do PAMAF e N.º 141/01 do
PIDDAC.
41
COPPER AND ZINC CONCENTRATIONS IN PASTURE
ESTABLISHED ON A SOIL TO WHICH RICH COPPER SEWAGE
SLUDGE WAS APPLIED
ABSTRACT
Copper and zinc concentrations in plant biomass and in soil were evaluated,
for the first cropping cycles (1997/1998 e 1998/1999) of two fertiliser experiments with
improved and sown pasture, in the Mértola region. The experiments included seven similar treatments, the witness (no fertilization), a yearly-corrected mineral fertilization,
three urban sewage sludge rates (4, 8 and 12 t ha-1) from Évora town and two levels
of the same sludge (4 and 8 t ha-1) with mineral fertilization. Before the fertilizers
application, soil aqua regia (AR) extractable Cu and Zn concentrations (0 – 20 cm)
and sludge Zn concentration were lower than the Portaria 176/96 limit-values. On the
contrary, the residue Cu concentration exceeded the legal value.
At the end of the 2nd cropping cycle, foliar Cu and Zn concentrations increased
when they were compared to those of the 1st cropping cycle, but the highest values
did not occur at the 12 t ha-1 sludge treatment. In this treatment, soil Cu and Zn (AR)
were much lower than those of the legislation.
Although in 1988 Cu and Zn availability to the plants (EDTA, pH 4,65) was
not high in the topsoil for the different treatments, in 1999 soil “available” Cu and
Zn were high at the 8 and 12 t ha-1 sludge treatments. These increments indicate
transfer of the elements from the sewage sludge to more available forms in the soil.
As the pasture yields also decreased in 1999, Cu and Zn concentrated in the vegetal
biomass. Then, it is essential to proceed the study of the residual effects in these
experiments.
KEYWORDS: Copper and Zinc; Pasture; Soil; Urban Sewage Sludge
1 – INTRODUÇÃO
A necessidade ambiental de eliminar as lamas residuais urbanas (LRU),
que mostram um aumento de produção anual considerável, contempla a
sua reciclagem na aplicação em solos agrícolas, desde que sejam respeitados
os requisitos da legislação Portuguesa (2, 7, 8). No País, estes resíduos
orgânicos possuem, usualmente, quantidades apreciáveis de cobre (Cu) e
de zinco (Zn), que podem ser factores limitantes nos níveis de aplicação
das LRU na agricultura e na selecção das culturas.
O cobre e o zinco nas pastagens utilizadas por ovinos devem situar-se
em concentrações adequadas para o metabolismo animal, o que depende
da disponibilidade no solo destes elementos.
De acordo com a US NRC de 1980 (11), os níveis de Cu considerados como máximos toleráveis na dieta do gado equino, bovino e ovino
são de 800, 100 e 25 mg kg-1, respectivamente (expressos em matéria
42
PASTAGENS E FORRAGENS 23
seca, MS). Para os níveis de Zn, indicam-se como máximos toleráveis
na dieta do gado equino, bovino e ovino 500, 500 e 300 mg kg-1 (MS),
respectivamente.
A toxicidade de Cu no gado ovino revela-se numa acumulação deste
metal no fígado e rins (12). A ingestão de elevadas quantidades de Cu pelo
ser humano, manifesta-se através de vómitos, diarreias, cólicas estomacais
e náuseas e pode causar danos no fígado, rins e, mesmo a morte (1).
Neste trabalho, avaliam-se os teores foliares de Cu e Zn na pastagem
obtida em dois ciclos culturais consecutivos de dois ensaios de fertilização
em pastagem melhorada e semeada, instalados num Luvissolo Háplico da
região de Mértola, bem como os teores daqueles nutrientes no solo. O estudo justifica-se por ter sido utilizada uma LRU com elevada concentração
em cobre na maior parte das modalidades ensaiadas.
2 – MATERIAL E MÉTODOS
Num Luvissolo Háplico (4) derivado de grauvaques, foram instalados
dois ensaios de pastagem melhorada (ensaio A) e de pastagem semeada
(ensaio B), com um delineamento experimental de blocos casualizados, com
sete modalidades e quatro repetições. As modalidades de fertilização foram
as seguintes: sem fertilização, adubação corrigida anualmente, três níveis
de LRU de Évora (4,8 e 12 t ha-1) e dois níveis da mesma LRU (4 e 8 t
ha-1) complementados com adubação, no início de cada ciclo cultural. A
LRU foi aplicada apenas no 1.º ano dos ensaios. Os talhões tinham uma
área de 16 m2. A descrição pormenorizada das operações culturais nestes
ensaios foi efectuada por Serrão et al. (9).
Os valores de pH e os teores de Cu e de Zn extraídos pela água
régia (3) nas amostras compósitas de terra, colhidas antes da instalação
dos ensaios, e na LRU são apresentados no quadro 1. Salienta-se que
os teores de Cu e de Zn nas amostras de terra e os teores de Zn na
LRU extraídos pela água régia (AR) são baixos. O teor de Cu (AR)
na LRU (2260 mg kg-1) é muito superior ao valor da Portaria 176/96
(1000 mg kg -1) (7).
Realizaram-se três cortes na pastagem (dois em 1998 e um em 1999).
Analisaram-se os teores de cobre e zinco foliares por digestão nitroperclórica (10), seguida de determinação por espectrofotometria de absorção
atómica.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
43
QUADRO 1 – Valores de pH, teores de cobre e de zinco extraídos pela água régia nas
amostras de terra iniciais e na LRU e valores da Portaria 176/96
Profundidade (cm)
pH (H2O)
Solo
LRU
0 - 10
10 - 20
6,00
6,10
6,55
Portaria 176/96
Solos
LRU
5,5-7,0
–
kg-1)
11,5
11,0
2260
100
1 000
Zn (mg kg-1)
40,5
44,0
1400
300
2 500
Cu (mg
No fim dos ciclos culturais de 1997/1998 e 1998/1999 foram colhidas
dos ensaios amostras de terra (0 – 10 e 10 – 20 cm).
Com o objectivo de detectar uma possível poluição dos solos, nas
modalidades sem adubação e com aplicação de 12 t ha-1 de LRU, foram
determinados os teores de Cu e Zn nas amostras de terra, por digestão
com água régia (3). Para avaliar o estado de fertilidade do solo, em todas as modalidades, determinaram-se os teores de Cu e Zn considerados
disponíveis para as plantas, por extracção com 0,5 M NH4CH3COO + 0,5
M CH3COOH + 0,02 M EDTA (pH = 4,65) (6).
3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os teores de Cu e Zn foliares nos cortes realizados na pastagem
dos ensaios A e B, em 1998 e 1999, são apresentados nos quadros 2 e 3,
respectivamente.
Nos cortes efectuados em 1998, os teores foliares de Cu situaram-se
entre 4,2 e 11,3 mg kg-1, correspondentes, respectivamente, às aplicações
de 8 t ha-1 de LRU (no 2.º corte do ensaio B) e de 4 t ha-1 de LRU
complementada com adubação (no 2.º corte do ensaio A). Os teores foliares
de Zn variaram entre 21,0 e 40,6 mg kg-1 respectivamente, na modalidade
sem adubação e na de aplicação de 8 t ha-1 de LRU complementada com
adubação, no 1.º corte do ensaio B.
Em 1999, os teores de Cu foliar cresceram para valores entre 14,1 e
22,8 mg kg-1 (8 t ha-1 de LRU com adubação e 4 t ha-1 de LRU, ensaio
B) e os de Zn foliar para teores entre 51,2 e 94,5 mg kg-1 (4 t ha-1 de
LRU com adubação, ensaio A e 8 t ha-1 de LRU com adubação, ensaio
B). Constatou-se, ainda, que os teores mais elevados não ocorreram na
modalidade com aplicação de 12 t ha-1 LRU.
44
PASTAGENS E FORRAGENS 23
QUADRO 2 – Teores de cobre e zinco foliares (mg kg-1) nos dois cortes
realizados nos ensaios de pastagem melhorada (A) e de
pastagem semeada (B), em 1998
Ensaio
Modalidades
Corte
Cobre foliar
Zinco foliar
A
Sem fertilização
1.º
5,56
25,9
A
LRU 4 t ha-1
1.º
6,75
23,4
A
LRU 8 t ha-1
1.º
7,44
28,8
A
LRU 12 t ha-1
1.º
8,95
28,5
A
C/A
1.º
8,63
33,3
ha-1
A
LRU 4 t
C/A
1.º
8,00
32,4
A
LRU 8 t ha-1 C/A
1.º
7,88
36,0
A
Sem fertilização
2.º
5,56
23,6
A
LRU 4 t ha-1
2.º
5,81
21,9
A
LRU 8 t ha-1
2.º
9,89
25,6
A
LRU 12 t ha-1
2.º
8,94
27,6
A
C/A
2.º
A
LRU 4 t ha-1 C/A
2.º
11,3
28,8
A
LRU 8 t ha-1 C/A
2.º
10,9
28,7
B
Sem fertilização
1.º
5,81
25,9
LRU 4 t
ha-1
1.º
6,31
24,8
ha-1
1.º
7,06
29,7
1.º
6,50
30,3
B
5,75
24,9
B
LRU 8 t
B
LRU 12 t ha-1
B
C/A
1.º
7,56
40,4
B
LRU 4 t ha-1 C/A
1.º
7,94
31,8
B
LRU 8 t ha-1 C/A
1.º
7,38
40,6
B
Sem fertilização
2.º
6,00
21,0
B
LRU 4 t
ha-1
2.º
5,94
23,6
B
LRU 8 t ha-1
2.º
4,19
25,0
B
LRU 12 t ha-1
2.º
7,56
28,0
B
C/A
2.º
6,06
35,2
ha-1
B
LRU 4 t
C/A
2.º
5,63
27,8
B
LRU 8 t ha-1 C/A
2.º
6,00
28,4
C/A - com adubação.
Tendo como referência 25 mg kg-1 de Cu como nível máximo tolerável na dieta do gado ovino (11), considera-se preocupante o teor de
Cu foliar de 22,8 mg kg-1, na modalidade com aplicação de 4 t ha-1 de
LRU no ensaio B (quadro 3). No entanto, a absorção do Cu pelo gado
ovino diminui com a presença de teores elevados de cálcio, ferro, zinco,
molibdénio e enxofre (12).
PASTAGENS E FORRAGENS 23
45
QUADRO 3 – Teores de cobre e zinco foliares (mg
kg-1) no corte realizado nos ensaios de
pastagem melhorada (A) e de pastagem
semeada (B), em 1999
A
A
A
A
A
A
A
Ensaio
Modalidades
Sem fertilização
LRU 4 t ha-1
LRU 8 t ha-1
LRU 12 t ha-1
C/A
LRU 4 t ha-1 C/A
LRU 8 t ha-1 C/A
Cobre foliar
15,4
15,9
19,7
17,5
21,6
18,8
21,7
Zinco foliar
84,3
60,2
60,2
53,5
76,7
51,2
54,5
B
B
B
B
B
B
B
Sem fertilização
LRU 4 t ha-1
LRU 8 t ha-1
LRU 12 t ha-1
C/A
LRU 4 t ha-1 C/A
LRU 8 t ha-1 C/A
22,4
22,8
15,9
15,0
16,3
14,9
14,1
76,7
90,3
91,2
89,6
91,8
81,0
94,5
C/A - com adubação.
Serrão et al. (9) referiram que as maiores produções médias de matéria seca foram verificadas com as aplicações de 12 t ha-1 de LRU, com
acréscimos significativos relativamente à modalidade sem adubação, em 1998
(1294 kg ha-1) e em 1999 (481 kg ha-1), bem como em relação às outras
modalidades, em ambos os ensaios. No entanto, em 1999, observou-se uma
redução nas produções de cerca de 4 vezes, atribuída à instabilidade na
frequência da queda pluviométrica no decurso do 2.º ciclo cultural.
Os quantitativos de Cu e Zn introduzidos no solo pela aplicação de
12 t ha-1 de LRU, obtidos por cálculo, não ultrapassaram as quantidades
anuais permitidas pela Portaria 176/96 (quadro 4), prevendo não haver
posterior incorporação de LRU nestes ensaios de pastagens.
QUADRO 4 – Quantitativos de cobre e zinco introduzidos no
solo, numa única vez, em 1998, obtidos por cálculo
pela aplicação de 12 t ha-1 de LRU e as quantidades
anuais permitidas pela Portaria 176/96 (kg ha-1)
12 t ha-1 LRU
Portaria 176/96
Cobre
27,1
12
Zinco
16,8
30
Elemento
46
PASTAGENS E FORRAGENS 23
Os teores de Cu e Zn (AR) nas amostras de terra colhidas nas modalidades sem fertilização e com aplicação de 12 t ha-1 de LRU dos dois
ensaios, no termo dos ciclos culturais, em duas profundidades (quadro 5),
foram muito inferiores aos valores-limite da Portaria 176/96.
QUADRO 5 – Teores de cobre e zinco (mg kg-1) extraídos pela água régia, nas amostras
de terra colhidas em 1998 e 1999, nos dois ensaios
Ano
Ensaio
Profundidade (cm)
Cobre
Zinco
1998
A
Sem fertilização
Modalidades
0-10
13,0
40,2
1998
A
Sem fertilização
10-20
12,5
41,1
1998
A
LRU 12 t ha-1
0-10
18,0
44,0
1998
A
LRU 12 t
ha-1
10-20
12,5
38,0
1998
B
Sem fertilização
0-20
12,0
39,5
ha-1
1998
B
LRU 12 t
0-20
17,0
44,0
1999
A
Sem fertilização
0-10
13,0
43,0
1999
A
Sem fertilização
10-20
12,0
42,0
1999
A
LRU 12 t ha-1
0-10
23,0
50,0
1999
A
LRU 12 t
ha-1
10-20
16,0
46,0
1999
B
Sem fertilização
0-10
15,0
42,0
1999
B
Sem fertilização
10-20
16,0
42,0
ha-1
0-10
25,0
51,0
10-20
19,0
46,0
1999
B
LRU 12 t
1999
B
LRU 12 t ha-1
No fim do 1.º ciclo cultural (1998), nas diferentes modalidades dos
dois ensaios (quadro 6), o teor de Cu “disponível” no solo (EDTA, pH
4,65), situou-se entre reduzido (0,68 – 0,78 mg kg-1, modalidades sem
fertilização, 0 – 20 cm) e suficiente (0,88 – 3,33 mg kg-1 modalidades
com fertilização e com 12 t ha-1 LRU) para as plantas (5). O teor de
Zn “disponível” (1,85 mg kg-1) apenas foi suficiente no tratamento com
adubação (ensaio A, 0 – 10 cm), sendo reduzido ou muito reduzido (5)
nas outras modalidades.
Em 1999, na camada superficial do solo (0 – 10 cm), registaram-se
teores altos de Cu “disponível” (quadro 7) com a aplicação de 8 (7,11
mg kg-1, ensaio A) e 12 t ha-1de LRU (9,50 – 10,3 mg kg-1, ensaios A
e B). Também o teor de Zn “disponível” na mesma camada de solo foi
considerado elevado na modalidade com 12 t ha-1 de LRU do ensaio B
(4,31 mg kg-1). Nas outras modalidades, situou-se entre muito reduzido,
reduzido e suficiente (5).
PASTAGENS E FORRAGENS 23
47
QUADRO 6 – Teores de cobre e zinco extraídos pelo EDTA (mg kg-1) nas
amostras de terra colhidas nos dois ensaios, no fi m do 1.º
ano cultural
Ensaio
Modalidades
Profundidade (cm)
Cobre
Zinco
A
Sem fertilização
0-10
0,78
0,38
A
LRU 4 t ha-1
0-10
1,40
0,38
A
LRU 8 t
ha-1
0-10
3,20
1,15
A
LRU 12 t ha-1
0-10
3,28
1,43
A
C/A
0-10
1,70
1,85
A
LRU 4 t ha-1 C/A
0-10
2,08
0,85
A
LRU 8 t ha-1 C/A
0-10
3,15
1,30
A
Sem fertilização
10-20
0,73
0,15
A
LRU 4 t ha-1
10-20
1,10
0,35
A
LRU 8 t
ha-1
10-20
1,58
0,60
A
LRU 12 t ha-1
10-20
0,95
0,28
A
C/A
10-20
0,88
0,33
ha-1
A
LRU 4 t
C/A
10-20
1,93
0,75
A
LRU 8 t ha-1 C/A
10-20
1,05
0,30
B
Sem fertilização
0 - 20
0,68
0,28
B
LRU 4 t ha-1
0 - 20
0,88
0,23
B
LRU 8 t ha-1
0 - 20
1,45
0,45
B
LRU 12 t ha-1
0 - 20
3,33
1,35
B
C/A
0 - 20
0,90
0,58
ha-1
B
LRU 4 t
C/A
0 - 20
1,60
0,50
B
LRU 8 t ha-1 C/A
0 - 20
2,38
0,95
C/A – com adubação.
Estes acréscimos nos teores de Cu e Zn “disponíveis” no solo, no fim
do 2.º ano cultural, indicam transferência do Cu e Zn existentes na LRU
para formas mais disponíveis no solo, o que aliando-se a uma produção
de pastagem muito inferior no mesmo ano (cerca de 4 vezes), verificada
em algumas modalidades, contribuiu para os incrementos observados nos
níveis foliares de Cu e Zn (2,6 vezes), por efeito de concentração na
biomassa vegetal.
48
PASTAGENS E FORRAGENS 23
QUADRO 7 – Teores de cobre e zinco extraídos pelo EDTA (mg kg-1) nas
amostras de terra, colhidas nos dois ensaios, no fi m do
2.º ano cultural
Ensaio
Modalidades
Profundidade (cm)
Cobre
Zinco
A
Sem fertilização
0-10
1,68
0,83
A
LRU 4 t ha-1
0-10
5,34
2,34
A
LRU 8 t ha-1
0-10
7,11
2,98
0-10
9,50
3,50
ha-1
A
LRU 12 t
A
C/A
0-10
2,41
2,10
A
LRU 4 t ha-1
0-10
3,87
1,58
A
LRU 8 t ha-1 C/A
0-10
4,37
2,10
A
Sem fertilização
10-20
1,71
0,61
LRU 4 t
ha-1
10-20
2,98
1,15
A
LRU 8 t
ha-1
10-20
2,83
1,22
A
LRU 12 t ha-1
10-20
3,41
1,39
A
C/A
10-20
2,36
1,44
A
LRU 4 t ha-1 C/A
10-20
2,93
0,93
A
LRU 8 t
ha-1 C/A
10-20
3,43
1,31
B
Sem fertilização
0-10
1,24
0,92
B
LRU 4 t ha-1
0-10
3,35
1,26
B
LRU 8 t ha-1
0-10
4,42
1,69
0-10
10,3
4,31
A
ha-1
B
LRU 12 t
B
C/A
0-10
2,19
2,12
B
LRU 4 t ha-1 C/A
0-10
2,70
0,90
B
LRU 8 t ha-1 C/A
0-10
4,60
1,30
B
Sem fertilização
10-20
1,03
0,61
B
LRU 4 t
ha-1
10-20
1,47
0,69
B
LRU 8 t ha-1
10-20
1,58
0,73
B
LRU 12 t ha-1
10-20
2,11
0,87
B
C/A
10-20
0,90
0,30
B
LRU 4 t ha-1 C/A
10-20
1,70
0,50
B
ha-1 C/A
10-20
1,90
0,50
LRU 8 t
C/A - com adubação.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
49
4 – CONCLUSÕES
A aplicação de LRU com um teor de cobre muito superior ao valor
da Portaria 176/96 (1000 mg kg -1) foi limitada a um nível máximo de
12 t ha -1, em ensaios de fertilização em pastagem melhorada e semeada,
instalados num solo com baixo nível de fertilidade, na região de Mértola.
No entanto, admitindo que a LRU seria apenas aplicada no início dos
ensaios, as quantidades de cobre (27,1 kg ha -1) introduzidas no solo pela
aplicação daquele nível de LRU, obtidas por cálculo, eram inferiores às
quantidades anuais permitidas na referida Portaria (12 kg ha -1).
No fim dos 1.º e 2.º anos culturais, as maiores produções de matéria
seca, manifestaram-se na modalidade com o nível mais elevado da LRU,
embora com uma quebra de produção cerca de 4 vezes em 1999. Neste
ano, também se verificaram acréscimos dos teores foliares de cobre e zinco
de cerca de 2,6 vezes e registaram-se teores elevados de Cu e Zn “disponível” (0-10 cm) com a aplicação de 8 ou 12 t ha-1 de LRU. No entanto,
os teores foliares mais elevados não foram registados na modalidade com
aplicação de 12 t ha-1 LRU.
Tendo como referência 25 mg kg-1 de Cu como nível máximo tolerável
na dieta do gado ovino, considera-se preocupante o teor de Cu foliar de
22,8 mg kg-1, registado, em 1999, na modalidade com aplicação de 4 t
ha-1 de LRU do ensaio B.
Destes resultados, infere-se que há necessidade em prosseguir a
monitorização destes ensaios, através do estudo dos efeitos residuais.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem às Técnicas Profissionais Maria de Lurdes Cravo de Oliveira e
Rosa Rocha e à Auxiliar Técnica de Laboratório Ana Carvalho a preparação das amostras
e a realização de algumas análises.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1 – ATSDR – Agency for Toxic and Disease Registry, Public Health Statement: Copper.
Division of Toxicology, Atlanta, Georgia, 1990.
2 – DECRETO - LEI 446/91 – Regime de Utilização na Agricultura de Certas Lamas
Provenientes de Estações de Tratamento de Águas Residuais. Diário da República n.º
269, I - A Série, 22 de Novembro de 1991, p. 6076-6078.
50
PASTAGENS E FORRAGENS 23
3 – DIN 38 414 – Deutch Norm, part 7, Sludge and Sediments (Group S) Digestion
Using Aqua Regia for Subsequent Determination of Acid - soluble Portion of Metals
S7, 1983, p. 1-4.
4 – FAO-UNESCO – Soil Map of the World. Revised legend. World Soil Resources Report,
60, Rome, Italy, 1989.
5 – INIA – “Manual de Fertilização das Culturas”. 2000. Laboratório Químico Agrícola
Rebelo da Silva.
6 – LAKANEN, E.; ERVIO, R. – A Comparison of Eight Extractants for the Determination of Plant Available Micronutrients in Soils. Acta Agralia Fennica 123, 1971, p.
223-232.
7 – PORTARIA 176/96 – Valores-Limite da Concentração dos Metais Pesados nas Lamas
Destinadas à Agricultura e nos Solos Receptores e Valores-Limite das Quantidades de
Metais Pesados que Podem Ser Introduzidos nos Solos Receptores. Diário da República
n.º 230, II Série, 3 de Outubro 1996, p.13 789-13 790.
8 – PORTARIA 177/96 – Regras sobre a análise das lamas destinadas à agricultura e dos solos receptores. Diário da República n.º 230, II Série, 3 de Outubro 1996, p. 13 790.
9 – SERRÃO, M. G. et al. – Utilização de uma Lama de ETAR para Aumento de Produção
de Pastagens em Solos Marginais do Baixo Alentejo. In: ”Conselleria de Agricultura,
Gandería e Política Agroalimentaria, Xunta de Galicia (ed.) - III Reunião Ibérica
de Pastagens e Forragens”, Mabegondo, Centro de Investigacións Agrarias, 2000, p.
269-274.
10 – ULRICH, A. et al. – Plant Analysis, a Guide. Washington, 1980.
11 – US NRC – United States, National Research Council. Mineral Tolerance of Domestic
Animals. National Academic Press, Culturas, 2000.
12 – US NRC – United States, National Research Council. Nutrient Requirements of Sheep.
National Academic Press, Washington, 1985.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
51
"Pastagens e Forragens", vol. 23, 2002, p. 53–67.
GLEDITSIA TRIACANTHOS – LEGUMINOSA ARBÓREA COM
INTERESSE FORRAGEIRO.
CARACTERIZAÇÃO QUÍMICA E NUTRICIONAL.*
Arminda Martins Bruno-Soares♥, Benilde Martins Pereira♣, José Manuel Abreu♥
♥Instituto
Superior de Agronomia, DPAA – Tapada da Ajuda, 1349-017 Lisboa
♣ Serviço
de Desenvolvimento Agrário do Pico – Av. Machado Serpa
9950-32 – Madalena do Pico
RESUMO
A Gleditsia triacanthos é uma leguminosa arbórea com potencial de produção
de material forrageiro nas áreas de influência mediterrânica. As suas folhas e vagens
são consumidas pelos animais e a sua composição química indicia um valor nutritivo
que permite considerar a sua utilização em alimentação animal.
À semelhança do que acontece com os frutos de azinheira (Quercus rotundifolia), sobreiro (Quercus suber) ou alfarrobeira (Ceratonia siliqua), as vagens do Espinheiro da Virgínia (G. triacanthos) podem ser interessantes nos sistemas de produção
de ruminantes em regime extensivo. O elevado teor de açúcares totais das vagens
(>29%), na fase de deiscência (Outubro-Novembro), poderá ter efeitos sinérgicos e
complementares dos restantes alimentos que nessa altura integram os regimes dos
ruminantes em pastoreio.
A informação disponível refere que as folhas jovens da G. triacanthos apresentam um valor forrageiro próximo do da luzerna com valores da ordem de 17,7% de
proteina bruta (PB), 26,7% de fibra bruta (FB) e cerca de 70% de digestibilidade da
matéria seca (DMS).
Comparativamente com as folhas de alfarrobeira as do espinheiro da Virgínia
apresentam um teor de PB e DMS mais elevado, (8,2% e 41,4%), respectivamente.
As vagens da G. triacanthos apresentam teores de PB de 9,3% a 14,3%, de fibra
(NDF) da ordem de 31% e de açúcares totais (AT) até 46%. Apresentam teores de
lenhina ácido detergente (ADL) que variam de 9% a 11% e teores de fenois totais de
4% a 14%.
As vagens de G. triacanthos comparativamente à bolota (azinheira) apresentam
menor teor de gordura bruta (1% vs 9 %) e maior teor de PB (9,3% vs 4,5%).
PALAVRAS-CHAVES: Composição química; Digestibilidade; Fenóis; Gleditsia triacanthos; Leguminosa arbórea
* Comunicação apresentada na XXIII Reunião de Primavera da SPPF. Guimarães, Abril
de 2002.
53
GLEDITSIA TRIACANTHOS – LEGUMINOUS TREE FORAGER
PROFIT. CHEMICAL AND NUTRIVE VALUATION
ABSTRACT
Gleditsia triacanthos (Honey locust) is a leguminous tree, which has potential
for forage production on Mediterranean areas. Its leaves and pods are eaten up by
several animal species and their chemical composition indicates a nutritive value good
enough to consider its utilisation in animal feeding.
Similarly to the acorns of holm-oak (Quercus rotundifolia), cork-oak (Quercus
suber) and the fruits of carob tree (Ceratonia siliqua), honey locust pods may be interesting in extensive ruminant production systems. The high content in total sugars
of ripe pods (>29% on falling in October/November) may have complementary and
synergetic effects with other components of the grazing animals regime at that time
of the year.
Young leaves of Gleditsia are refered to have a forage value near to the leaves of
Lucerne, and present a content of about 17.7% crude protein (CP) and 26.7% crude
fibre (CF) and about 70% dry matter digestibility (DMD).
Honey locust leaves have higher value of CP and DMD, relatively to the ones
of carob tree (with only 8.2% and 41.4%) respectively.
Gleditsia triacanthos pods present values of CP between 9.3% and 14.3%,
neutral detergent fibre (NDF) of about 31% and total sugars till 46%. Their content
in acid detergent lignin (ADL) and total phenols varied between 9% and 11% and 4%
to 14%, respectively.
Relatively to acorns of holm oak, pods of Gleditsia are lower in crude fat (1%
vs 9%) and higher in PB (9.3% vs 4.5%).
KEYWORDS: Chemical composition; Digestibility; Gleditsia triacanthos; Leguminous tree; Phenols
1 – INTRODUÇÃO
À semelhança do que acontece com os frutos de azinheira (Quercus
rotundifolia), sobreiro (Q. suber) ou alfarrobeira (Ceratonia siliqua), os do
Espinheiro da Virginia (Gleditsia triacanthos) podem também ser interessantes nos sistemas de produção de ruminantes em regime de sequeiro
extensivo. Estes frutos, além de constituirem em si mesmos um acréscimo nas disponibilidades forrageiras, completam a maturação de forma
gradativa, disponibilizando-se, tal como a bolota ao longo do Outono
e Inverno, épocas em que habitualmente existem limitações na oferta de
forragens. Além disso, pela sua composição, terão provavelmente efeitos
sinérgicos e complementares dos restantes alimentos que nessa altura
integram os regimes dos ruminantes na região Sul do país (erva jovem,
palha de cereais).
54
PASTAGENS E FORRAGENS 23
Com o presente trabalho procurou-se caracterizar o valor nutritivo
para ruminantes das vagens de G. triacanthos e averiguar a presença de
substâncias anti-nutricionais que possam limitar a sua utilização pelos
animais.
2 – IMPORTÂNCIA DAS FORRAGEIRAS ARBÓREAS
De acordo com Huxley (16) a nível mundial mais de 90 espécies
florestais são usadas como forrageiras, embora haja referências a algumas
centenas potencialmente interessantes para esse fim (25). De acordo com
Leme et al. (20) cerca de 75% de árvores e arbustos africanos podem ser
consumidos por herbívoros. Nas zonas áridas e semi-áridas, e segundo
o ICRAF (International Council for Research in Agroforestry), 90% das
espécies lenhosas descritas têm alguma utilização forrageira. Nas zonas
tropicais húmidas e sub-húmidas, a utilização de material forrageiro provindo de árvores, é pelo menos tão frequente como nas regiões anteriores,
embora utilizando um número mais restrito de espécies.
A grande diversidade de espécies lenhosas forrageiras proporciona
um banco de germoplasma alargado, contudo apenas algumas dezenas de
espécies têm sido estudadas, em regime de cortes frequentes, com predomínio dos géneros Leucaena, Gliricidia, Erythrina e Acacia (21). O leque de
opções é elevado permitindo uma selecção criteriosa e uma boa adequação
às situações concretas, sendo as características mais frequentemente determinantes da escolha entre outras: o rápido crescimento, a eficiência no
aproveitamento da luz e nutrientes, a versatilidade que lhes garante ampla
área de distribuição na região de desenvolvimento pretendido; a capacidade
de competição com espécies invasoras; a compatibilidade com as espécies
que se pretendam associar-lhes; a resistência a pragas e doenças e ainda
como condicionantes maiores as características de boa palatabilidade e
valor nutritivo, sendo o seu estudo condição indispensável à difusão de
qualquer espécie. (20, 23, 38, 39).
No Sul do Brasil, Leme et al. (20), num estudo com 94 espécies
silvícolas potencialmente forrageiras concluiram que as folhas e raminhos
(diâmetro <0,5 cm) se caracterizam por serem: i) ricas em proteína
bruta (82% das espécies dosearam em média 14,7 variando entre 5 e
35% de PB); ii) frequentemente pouco degradáveis (56% apresentaram
degradabilidade <60%); iii) ricas em taninos totais (28% das espécies
registaram teores superiores a 10%). Os mesmos autores indicaram que
PASTAGENS E FORRAGENS 23
55
apenas cerca de 33% das 94 espécies estudadas apresentam potencial
forrageiro se se limitar a aceitação das folhas a um conteúdo mínimo de
proteína bruta de 10%, degradabilidade superior a 60% e taninos totais
a um máximo de 10%.
Usadas, em exclusivo ou como suplemento, principalmente pelos
ruminantes (26), as árvores e os arbustos produzem quantidades importantes de alimento nas zonas áridas e semi-áridas. Contudo, o seu maneio
e integração nos regimes alimentares dos animais requerem informações,
frequentemente não conhecidas com suficiente detalhe, sobre a sua palatabilidade e valor nutritivo (33, 34).
É também escassa a informação sobre as suas produções e produtividade potencial, até pela dificuldade de aplicação de métodos objectivos
para a sua estimativa (40).
Algumas leguminosas arbóreas, como a Gleditsia triacanthos, a Prosopis tamarugo, a Prosopis chilensis e a Ceratonia siliqua, para além das
folhas, produzem vagens em quantidade significativa, sendo particularmente
interessantes como espécies frutícolas. Estas vagens caiem nos períodos de
Outono/Inverno, podendo constituir suplementos ricos em energia e/ou
proteína e compensar, quantitativa e qualitativamente, os restantes recursos
forrageiros locais (8).
3 – A GLEDITSIA TRIACANTHOS COMO ESPÉCIE FORRAGEIRA
Entre as espécies arbóreas exóticas utilizadas na alimentação animal,
a G. triacanthos é uma das leguminosas com potencial de produção de
material forrageiro nas áreas de influência mediterrânica. As suas vagens
são consumidas pelos ruminantes e a sua composição indicia um valor
nutritivo que permite considerar a utilidade desta espécie para complementar
o papel das arbóreas autóctones, como por exemplo a azinheira (Quercus
rotundifolia) e a alfarrobeira (Ceratonia siliqua).
Pelo facto de associar à capacidade de produção de frutos as características de crescimento rápido, a G. triacanthos tem grande versatilidade
de maneio nos sistemas em que se integra. Pode ser encarada como
frutícola forrageira ou como arbórea conduzida em regime arbustivo
de cortes frequentes, ou mesmo, em situações de emergência, de forma
alternativa, dada a boa capacidade de regeneração das árvores após o
corte.
56
PASTAGENS E FORRAGENS 23
3.1 – A Gleditsia triacanthos nas regiões de influência mediterrânica
Na Bacia Mediterrânica, tal como nas áreas tradicionais de montado
do Centro e Sul de Portugal, a vegetação está adaptada, desde há muito,
ao seu meio e à pressão antrópica. Esta longa adaptação confere aos
ecossistemas características de elevada diversidade biológica e resistência
à instalação de novas espécies, sendo capazes de suportar, sem muitos
prejuízos, impactos fortes e violentos (29).
Papanastasis (28) indica como espécies favoráveis para apoio aos
sistemas pastoris mediterrânicos a Medicago arborea, a Robinia pseudoacacia, a Gleditsia triacanthos e a Morus alba, sugerindo que estas quatro
espécies e ainda a Amorfa fruticosa deveriam ser prioritariamente incluídas
nos programas sobre recursos genéticos de forrageiras lenhosas, a desenvolver em diversos países do Sul da Europa.
Destes programas, destaca-se um dos mais recentes, com início na
década de noventa sob o patrocínio da CE, (participação de França, Grécia, Itália e Espanha) que incluiu 17 espécies de árvores e arbustos, com
ênfase dada às consideradas de maior potencial como: Gleditsia triacanthos,
Chamaecytisus proliferus, Morus alba e Robinia pseudoacacia (28).
Autores como Correal et al. (9) pré-seleccionaram 150 espécies lenhosas com potencial para serem exploradas nas zonas em que a precipitação
média anual não ultrapassa os 500 mm. A G. triacanthos faz parte do
conjunto, devendo ser utilizada para zonas com precipitação média anual
superior a 450 mm. Talamucci e Pardini (36), assim como Correal et al.(9)
incluem o Espinheiro da Virgínia no grupo das 6 espécies leguminosas
forrageiras arbóreas ou arbustivas mais promissoras nas zonas semi-áridas
e húmidas da bacia mediterrânica.
Em ensaios conduzidos em zonas degradadas do SE de Espanha, com
características mediterrânicas semi-áridas semelhantes às do Centro e Sul
interior de Portugal, Tilstone et al. (37) observaram que o Espinheiro da
Virgínia se incluíu no grupo das espécies nativas e exóticas que se situaram
nas 5 mais promissoras, nos ensaios de produção. Nestes últimos, a G.
triacanthos registou a terceira mais elevada capacidade de sobrevivência
(até aos 2,5 anos) e uma das maiores capacidades de adaptação em três
das comunidades vegetais mais representativas daquela região.
No Centro e Sul de Portugal o Espinheiro da Virgínia pode encontrar-se ao longo de ruas e estradas e também na compartimentação de
propriedades e culturas, aludindo Goes (14) a sua boa adaptação às nossas
PASTAGENS E FORRAGENS 23
57
condições referindo a existência de vários exemplares com cerca de 30 m
de altura e 3,4 m de perímetro à altura do peito. Este mesmo autor incluiu
a G. triacanthos entre as várias espécies indicadas como mais interessantes
para o fomento florestal em Portugal, partilhando Correia e Oliveira (10)
da mesma opinião.
A espécie regista, no entanto, grande variabilidade relativamente à
quantidade, aspecto e composição das vagens produzidas (19). Os caracteres morfológicos das vagens constataram-se igualmente muito variáveis,
em termos de comprimento (22 a 45 cm), largura (3 a 4 cm), número de
sementes por vagem e relação peso das sementes/peso das vagens (17 a
43%) (28). Também Bruno-Soares e Abreu (6) observaram idêntica variação nos caracteres morfológicos das vagens estudadas em relação ao: i)
comprimento (25 a 56 cm); ii) largura (3,8 – 5,3 cm; iii) peso dos grãos
por vagem (1,2 a 4,7 g) e iv) peso do tegumento por vagem (15,9-45,0 g).
Acresce ainda que o elevado peso da fracção tegumento (cerca de 89% do
total da matéria seca das vagens) é determinante na composição química
da vagem.
3.2 – Valor nutritivo das produções de Gleditsia triacanthos
Folhas
As folhas da G. triacanthos apresentam um valor forrageiro próximo
do da luzerna, segundo Baertsche (3), destacando-se o elevado teor de
PB (17,7%).
Em regime de alto fuste, é no Outono que esta caducifólia proporciona
aos animais em pastoreio uma importante suplementação diária de folhas
(15). Por se tratar de uma arbórea, da família das leguminosas e com
folhas constituídas por numerosos folíolos, pequenos e finos, admite-se um
razoável grau de manutenção da sua qualidade até à senescência.
No quadro 1 e como termo de comparação, apresenta-se a composição
química das folhas de arbóreas nativas como a azinheira, o sobreiro e a
alfarrobeira.
Da comparação da composição das folhas destas espécies, destaca-se
o teor mais elevado de proteína bruta das da Gleditsia relativamente às
das espécies autóctones, bastante mais escoriáceas e cutinizadas.
58
PASTAGENS E FORRAGENS 23
No que respeita às folhas das quercíneas (azinheira e sobreiro), embora se saiba que a sua composição é variável ao longo do ano, são de
notar os teores relativamente elevados em matéria seca e fibra bruta (FB),
referindo ainda Cañellas et al. (7), para as resultantes das podas no mês
de Novembro, teores de gordura bruta (GB) da ordem de – 3,8 e 5,2%,
e razoável concentração proteica – 10,6 e 11,6% PB, respectivamente para
a azinheira e o sobreiro.
QUADRO 1 – Alguns parâmetros da composição química e digestibilidade da matéria
seca das folhas de Espinheiro da Virgínia (G. triacanthos), Azinheira
(Quercus rotundifolia), Sobreiro (Quercus suber) e Alfarrobeira (Cerotonia
siliqua) (% na MS)
Matéria seca (MS)
E.Virgínia *
Azinheira **
Sobreiro **
Alfarrobeira ***
40,0
58,0
54,3
60,4
Proteina bruta (PB)
17,7
10,6
11,6
8,2
Fibra bruta (FB)
26,7
27,3
27,8
21,2
0,12
0,19
Cálcio (Ca)
2,2
Fósforo (P)
0,12
Digestibilidade da MS (DMS)
69,8
41,4
*Adaptado de Duke (13); ** Adaptado Cañellas (7); *** Adaptado de Salem et al. (34).
Por sua vez, as folhas de alfarrobeira são pouco digestíveis (41,4%
DMS) e apresentam baixo teor de PB (8,2%), mas são das mais apetecíveis (por ovinos), de acordo com um estudo sobre a composição química
e digestibilidade de 12 das espécies arbóreas e arbustivas forrageiras de
regiões áridas e semi-áridas (34).
A população microbiana ruminal necessita dum teor mínimo de amónia, cerca de 70 mg de azoto por litro (cerca de 8% PB na dieta), para
desenvolver actividade fermentativa (26). Assim, e de acordo com Norton
(26) pode-se referir que as folhas de Gleditsia têm elevado teor proteico e
que as três arbóreas autóctones com maior aproveitamento forrageiro no
Centro e Sul do país são medianamente providas de PB.
Vagens
Segundo Goes (14), as vagens de G. triacanthos apresentam um elevado
valor nutritivo sendo bastante apetecíveis pelos animais. Contudo o mesmo
autor refere que o seu consumo em exagero pode trazer inconvenientes
PASTAGENS E FORRAGENS 23
59
para a saúde dos animais. Refere ainda que o seu valor energético é
semelhante ao das vagens de alfarroba, do grão de cevada e da polpa de
lande e superior ao da bolota.
Papanastasis (28) observou também que as vagens e especialmente as
sementes do Espinheiro da Virginia eram muito nutritivas e apetecíveis,
sobretudo por ovinos, doseando 26% e 12% de PB e 62% e 70% de digestibilidade da MS, respectivamente para as sementes e vagens (quadro 2).
QUADRO 2 – Teores de cinza, proteina bruta (PB), fibra bruta (FB), fibra neutro e ácido
detergente (NDF, ADF), lenhina ácido detergente (ADL), gordura bruta
(GB) e digestibilidade da matéria seca (DMS) de sementes e vagens de
Gleditsia triacanthos (% na MS).
Cinza
5,4
PB
20,3
FB
NDF
ADF
ADL
12,7
GB
DMS
Ref
62
(28)
70
(28)
4,6
26,0
(13)
Semente
3,9
10,6
21,1
0,8
12,0
Vagem*
9,3
16,1
4,7
14,3
18,4
3,9
7,0
–
3,9-4,8 10,3-13,4
–
(13)
(35)
1,9
31,0
23,1
11,2
34,5-44,6 22,2-29,6 8,8-11,4
–
1,1-1,6
(27)
67,5
(6)
(30)
*com semente
Bruno-Soares e Abreu (6) em vagens colhidas em Novembro observaram valores com cerca de 7% de PB e DMS da ordem de 68%. Por sua
vez Pereira (30) observou valores de PB da ordem de 13,4% a 10,3% em
vagens colhidas respectivamente em Julho e Novembro (quadro 2).
De referir que o açúcar é a forma preferencial de armazenamento
desta espécie (quadro 3). Contudo é de salientar a grande faixa de variação
deste parâmetro (1,9 – 50%) que pode ter resultado de entre outros factores: i) dos métodos analíticos utilizados na sua avaliação; ii) das espécies
utilizadas; iii) das condições edafo-climáticas e dos sistemas de exploração
da árvore e ainda, vi) das fases de maturação das vagens estudadas.
Muitas espécies forrageiras e subprodutos vegetais incluem substâncias
tóxicas ou anti-nutricionais que podem depreciar o seu valor alimentar
(12). Assim, a avaliação do teor de tais substâncias potenciará a informa-
60
PASTAGENS E FORRAGENS 23
ção disponível para um mais completo e rigoroso conhecimento do valor
nutritivo desses produtos.
A informação disponível sobre a presença de substâncias tóxicas e/ou
antinutricionais nas folhas e vagens da G. triacanthos é ainda escassa.
Contudo foi possível observar que as vagens podem dosear teores elevados
de substâncias antinutricionais, nomeadamente de compostos fenólicos
(taninos condensados) e saponinas (quadro 3).
QUADRO 3 – Teor de açúcares totais (AT), fenois totais (FT),
taninos condensados (TC) e saponina bruta (SB)
de vagens de G. triacanthos (% na MS).
AT
FT
TC
SB
Referência
24,6
(32)
10 – 38
(19)
50
(24)
46
(17)
1,9-23,0
3,9-14,4
1,6-9,5
-
(30)
29,2
3,5
5,4
5,2
(6)
Níveis da ordem de 5% de taninos condensados e saponina bruta
foram observados por Bruno-Soares e Abreu (6) em vagens de G. triacanthos colhidas em fase de maturação (Outubro/Novembro). Os mesmos
autores observaram que o teor de taninos condensados (5%) presentes nas
vagens de G. triacanthos quando estas integraram uma dieta, de feno (44%
na MS), bagaço de soja (15% na MS) e vagens (40% na MS), fornecida
a ovinos não provocou depressão na sua digestibilidade. De acordo com
Kumar (31) mais de 9% de taninos condensados nas dietas podem ser
letais, sendo correntemente aceite que teores de taninos superiores a 5%
na MS têm acção anti-nutritiva nos alimentos fornecidos a ruminantes,
entre outros efeitos por reduzir a ingestão (influência da palatibilidade) e
a digestibilidade (deprime a degradação da fibra) (4).
Pereira (30) observou que o teor de compostos fenólicos nas vagens
de G. triacanthos, nomeadamente de taninos condensados, diminuiu com
o desenvolvimento fenológico dos frutos (14,4% para 3,9% e 9,5% para
1,6%, respectivamente para os compostos fenólicos e taninos condensados).
A observância da menor concentração de compostos fenólicos na fase de
maturação das vagens indicia que será nesta fase a época por excelência
para serem utilizadas pelos animais.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
61
No que respeita ao teor de saponina bruta (5,2%) este é relativamente
elevado, na fase de maturação, quando comparado com o teor observado
na maioria das forragens, nomeadamente na luzerna (2,5%). Contudo a
quantidade e/ou a qualidade de saponinas observadas por Bruno-Soares
e Abreu (6) pareceu não afectar a saúde, nem as condições corporais,
dos ovinos quando estes ingeriram cerca 1800 g de vagens (1046 g MS
vagens/dia/animal) integradas numa dieta diária de 1479 g de MS.
É de notar que o efeito laxante referido por Goes (14) quando da
ingestão de vagens de G. triacanthos por ovinos não foi observado por
Bruno-Soares e Abreu (6) na mesma espécie animal quando da ingestão
de vagens até 71% da MS total da dieta (17% de feno + 12% de bagaço
de soja) durante um periodo de 15 dias.
3.3 – Valor nutritivo dos frutos de G. triacanthos vs Quercus suber,
Q. rotundifolia e Ceratonia silíqua
Os frutos das espécies autóctones, sobretudo a bolota, têm sido frequentemente objecto de estudo. Segundo Goes (14) em estudos realizados
em Espanha, a bolota de azinheira é constituída por 79,0 a 83,3% de polpa
e 16,7 a 21,0% de casca. Estes frutos apresentaram valores de MS que
variaram entre 48,5 e 58,5%, teores de PB da ordem dos 6,8% e teores de
GB que oscilam entre 8,5 e 15,5%. Mais refere, o referido autor, que a
amplitude de variação dos parâmetros da composição química mencionada
resultaram da longa época de deiscência dos frutos e da evolução dos
respectivos teores com a maturação.
Cañellas et al. (7) determinaram o valor nutritivo da bolota de várias
quercíneas, concluindo que o da azinheira era o de melhor qualidade. Como
refere Ayanaz (2) a bolota tem baixo teor em PB (cerca de 4,5%) quando
comparado com o das vagens maduras do espinheiro da Virginia (cerca de
10,3%) (6). O seu valor energético assemelha-se ao dos frutos em apreço,
em energia bruta (19,6 vs 19,1 MJ. kg-1 MS), respectivamente na bolota
de azinheira (1) e nas vagens do Espinheiro da Virgínia (6).
As vagens da alfarrobeira são também bastante deficientes em proteína (3,6 a 6,5% PB), doseando menos fibra bruta (7,0 a 10% FB) do
que os frutos da azinheira e do sobreiro (quadro 4). Por outro lado, e à
semelhança das vagens da G. triacanthos, as da alfarrobeira constituiem
as suas reservas sob a forma de açúcares e não como amido e gordura,
como acontece com as quercíneas.
62
PASTAGENS E FORRAGENS 23
O teor de açúcares nas vagens de alfarrobeira é superior ao do Espinheiro da Virgínia, contudo com menor amplitude de variação do que
nestas últimas - 45,7 a 61,2% na alfarroba vs 10 a 50% no Espinheiro da
Virgínia (quadros 3 e 4).
QUADRO 4 – Teores de cinza, proteina bruta (PB), fibra bruta (FB), fibra neutro e
ácido detergente (NDF e ADF), lenhina ácido detergente (ADL), gordura
bruta (GB), amido (A), açúcar total (AT) de bolota de azinheira (Quercus
rotundifolia), sobreiro (Quercus suber) e vagens de alfarrobeira (Ceratonia
siliqua), (% na MS).
Frutos
Integral
Azinheira
Polpa
(Quercus rotundifolia) “
Casca
Cinza
PB
FB
NDF
ADF
ADL
GB
A
1,7
4,5
13,6
31,2
23,9
10,2
9,1
34,0
_
9,9-23,8
3,2-4,5
0,9-2,1
4,0
_
_
_
1,9-2,0 5,2-6,1
2,5
6,0
1,2-1,7 3,2-4,8
_
4,8-11,3 24,1-43,6
9,2
_
66,7-85,6 43,9-65,7 14,6-28,6 1,0-1,3 0,0 – 0,0
AT Ref.
_
(1)
_
(5)
_
(5)
_
(5)
“
2,1
5,5
42,7
_
_
_
1,4
_
_
(5)
Sobreiro
Polpa
2,1
8,1
2,1
_
_
_
9,0
_
_
(7)
(Quercus suber)
Casca
2,2
6,3
31,4
_
_
1,7
_
_
(7)
Alfarroba
Integral 2,1-3,5 3,6-6,5 7,0-10
_
_
_
_
0,6
_
45-61 (11)
(Ceratonia siliqua)
Ambas as leguminosas doseiam teores significativos de taninos nos
seus frutos. Contudo, a utilização de métodos diferentes na sua avaliação
não permite estabelecer relações de grandeza entre os seus teores. Assim
as vagens da alfarrobeira apresentaram 4,5 a 13,4% de taninos de acordo
com Tous e Battle (1990) cit. por Custódio (11) avaliados pelo método
de Folin-Denis usando a D-catequina como padrão; as vagens maduras
do Espinheiro da Virgínia com 0,9 a 3,7% de taninos de acordo com
Bruno-Soares e Abreu (6) doseados pelo método de Julkumen-Titto (18)
e a bolota 4,1 g de ácido gálico. 100 mg-1 de MS de acordo com BrunoSoares et al.(5) e doseados de acordo com Marigo (22).
4 – CONCLUSÕES
O interesse forrageiro do Espinheiro da Virgínia (G. triacanthos) pode
incidir: i) como fornecedora de folhas (15% a 18% PB e 65% a 70% de
DMS) em regime arbustivo de cortes frequentes e/ou ii) como fornecedora
de vagens em regime de alto fuste.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
63
As vagens de Gleditsia triacanthos são relativamente ricas em proteína
(10-2%), doseando mesmo maduras um teor de PB (cerca 10%) superior ao
dos frutos das quercíneas autóctones (4,5%-8,1%) e da alfarrobeira (4,9%).
A fracção fibra tem nas vagens da G. triacanthos (cerca de 35%NDF) uma maior participação do que nos frutos das quercíneas (cerca
de 31%-NDF).
Os teores máximos de açúcares são da ordem de 31%, notoriamente
inferiores aos observados nas vagens da alfarrobeira (>50%).
Os compostos fenólicos apresentam nas vagens de G. triacanthos teores
que variam de 1,6 a 9,5% para os taninos condensados.
A diminuição dos teores de paredes celulares e de compostos fenólicos com o aumento do teor de açúcares na maturação indicia que será
nesta fase (Out/Nov) que as vagens deverão ser utilizadas pelos animais
(pastoreio). Por as vagens da G. triacanthos apresentarem um elevado teor
de açúcares rapidamente fermentescíveis, elas poderão ser um complemento
para as ervas jovens, ricas em azoto rapidamente degradável.
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PASTAGENS E FORRAGENS 23
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"Pastagens e Forragens", vol. 23, 2002, p. 69–78.
COMPOSIÇÃO BOTÂNICA DA DIETA ALIMENTAR DE BOVINOS
EM PASTOREIO – MÉTODO DA ANÁLISE MICRO-HISTOLÓGICA
DE FEZES*
Jerónimo Côrte-Real Santos, Ana Catarina Ferreira
Divisão de Produção Animal (DRAEDM) – Direcção Regional de Agricultura
de Entre Douro e Minho – Quinta do Pinhó – 4800-875 – S. TORCATO.
RESUMO
O conhecimento da dieta alimentar de bovinos em regime de pastoreio livre é
essencial para uma eficiente gestão do sistema alimentar destes animais, principalmente em ecossistemas de grande diversidade florística, como é o caso da Serra da
Peneda (Noroeste de Portugal), local onde se desenvolveu este trabalho.
O método da análise micro-histológica das fezes por nós utilizado, é composto
por duas fases distintas. Na primeira fase construímos uma colecção fotográfica de
referência da flora existente na Serra da Peneda de acordo com o método proposto
por Metcalfe e Chalk descrito por Guerra (3) e do método proposto por (12 e 5) que
se baseia no facto de cada espécie vegetal apresentar características anatómicas e
químicas das suas células epidérmicas, distintas e específicas para cada uma delas. As
maiorias destas epidermes vegetais não são digeridas pelos processos digestivos de
um ruminante, mantendo a estrutura microanatómica depois de excretada, podendo
ser identificadas microscopicamente à posteriori. Recolhemos 18 amostras de fezes,
em que cada amostra representa um grupo de animais, que foram conservadas por
processo de congelação doméstica.
Numa segunda fase, através da comparação das epidermes encontradas nas
amostras fecais com a colecção de referência previamente elaborada, procede-se então
à discussão das dietas alimentares. Como resultados apresentamos a colecção de referência da flora identificada na Serra da Peneda cujas fotografias foram confrontadas
com as da bibliografia sendo discutidas as eventuais causas para as diferenças ou
semelhanças encontradas.
Apresentamos a composição botânica da dieta alimentar dos animais estudados em função da época do ano e do local de pastoreio do animal sendo estes
resultados discutidos com os obtidos pelo método da observação directa. De forma a
pudermos utilizar estes resultados para a Serra da Peneda, testámos estatisticamente
o efeito local e época do ano.
PALAVRAS-CHAVES: Bovinos; Dieta alimentar; Micro histologia das fezes.
* Comunicação apresentada na XIII Reunião de Primavera da SPPF. Guimarães, Abril de
2002
69
BOTANICAL DIET COMPOSITION OF FREE GRAZING BOVINES
MICRO HISTOLOGICAL FAECES ANALYSIS
ABSTRACT
The knowledge of diet composition of free grazing bovines is very important in order to have an efficient management of the feeding system mainly in
ecosystems of great floristic diversity as it is the one of Peneda’s mountain (Northwest of Portugal) where this work took place.
The method of micro histological faeces analysis that we have used has two
different stages. In the first one we built a reference photographic collection of the
flora from the Peneda’s mountain adapted from Metcalfe and Chalk described
by Guerra (3) and also from the method proposed by Sparks and Malechek (12)
and Holechek (5), that is based on the fact that each plant presents anatomic and
chemical caratheristics of its cells from the epidermis that are different and specific for each one of it. Most of the epidermis are not digested by ruminants and
they can keep its micro anatomical structure after being excreted. Afterwards, they
can be identified by means of a microscope. We have picked up 18 faeces samples
where each one represents a group of animals (five) which were conserved in a
domestic freezer.
In the second step we have compared the epidermis that we found in the
faeces samples with the photos from the reference photographic collection and
afterwards we have discussed the feeding diets.
As results, we present the reference photographic collection from the identified flora from Peneda’s mountain. We compared our photos with other authors
Maia et al. (6) and Fernandes (1) and we have not find any differences. We also
present the botanical diet composition per month and per place being these data
compared with the ones from the direct observation (11) and statistical tested as
effects.
KEYWORDS: Bovines; Feeding diet; Micro histological faeces analysis
1 – INTRODUÇÃO
O desenvolvimento agrícola sustentável, baseado numa correcta utilização dos recursos naturais, deve ser uma meta de um desenvolvimento
económico equilibrado, o qual exige a aplicação dos conhecimentos científicos às metodologias de intervenção em zonas de montanha.
Tendo por objectivo a determinação da dieta alimentar de espécies
herbívoras em ambiente natural, sendo, no nosso caso, os bovinos de raças
70
PASTAGENS E FORRAGENS 23
autóctones, optámos pelo método da análise micro-histológica de fezes,
de modo a obter resultados fidedignos e significativos sem alteração do
comportamento e hábitos alimentares dos animais. Este método baseia-se na
identificação dos fragmentos de epiderme não digeridos, que ficam retidos
no material fecal dos bovinos. A identificação é baseada numa colecção de
referência, que permite uma comparação com as epidermes encontradas.
2 – MATERIAL E MÉTODOS
A área de estudo localiza-se na Serra da Peneda, Noroeste
de Portugal, no concelho de Arcos de Valdevez, e compreende a área
geográfica das freguesias de Sistelo, Cabreiro e Gavieira num total 90
km2, representando 28% da superfície total do concelho (10). A zona,
predominantemente montanhosa, caracteriza-se por um relevo fortemente
acidentado (cotas que variam entre 200 e 1416 m), com pronunciados
declives e inúmeros afloramentos rochosos. O clima mediterrâneo marítimo,
proporciona à região uma temperatura média anual de 13 ºC, devido à
influência oceânica que penetra até ao interior montanhoso através dos
vales dos rios Minho e Lima. O crescimento vegetativo é influenciado no
Verão pela falta de água (precipitação ou rega) e no Inverno é limitado
pelas baixas temperaturas (inferiores a 8 ºC) (8). A oferta alimentar para
as freguesias de Cabreiro, Rouças e Gavieira, provém de uma superfície
composta por cerca de 2910 ha de pastagens naturais de baldio e 351 ha
de pastagens permanentes privadas (8).
As amostras de fezes foram obtidas entre 1999 e 2000 enquanto ainda
se encontravam frescas, num total de 18 amostras (6, de Janeiro; 2, de
Fevereiro; 7 de Maio; 1 de Junho; 2 de Julho), sendo cada uma composta
por 5 g de fezes das defecações individuais de 5 animais encontrados
num mesmo local. As amostras de fezes foram conservadas num congelador doméstico, devidamente identificadas. Os animais dos quais foram
recolhidas as amostras de fezes eram fêmeas adultas, representativas do
universo (sexo e origem genética) de animais que pastoreiam livremente
na Serra da Peneda.
Para a realização da colecção de referência, procedeu-se inicialmente
à recolha de material herbáceo e arbustivo de todas as espécies que nos
foi possível identificar na área de estudo, entre Abril e Junho de 2001.
Através de conhecimentos adquiridos em estudos anteriores, foi-nos possível
garantir a recolha das principais espécies que esperamos encontrar na dieta
PASTAGENS E FORRAGENS 23
71
dos bovinos em estudo. Devido à abundância de espécies herbáceas e à
sua maior importância relativa não foram recolhidas espécies arbóreas. De
cada espécie vegetal extraiu-se uma amostra de várias estruturas (folhas,
caule, flores) e colocadas em sacos no frigorífico. Posteriormente, de cada
estrutura vegetal foi retirado um pequeno fragmento que foi colocado
numa placa de Petri com algumas gotas de hipoclorito de sódio, sendo o
tecido imobilizado com uma lâmina de vidro e raspado com a ajuda de
uma lâmina de barbear, após o que foi lavado com água. O hipoclorito
de sódio foi utilizado de modo a que a epiderme perdesse os pigmentos e
assim facilitasse a observação e identificação das características epidérmicas
de cada espécie. Por vezes, foi também utilizada, para o mesmo efeito, a
solução de Hertwig’s, principalmente em espécies bastante lenhificadas como
certos caules de arbustivas. Após a adição da referida solução a lâmina
foi aquecida numa placa de aquecimento. Depois, a epiderme foi montada
entre lâmina e lamela, utilizando-se o meio de Hoyer como líquido de
montagem, sendo a amostra posteriormente aquecida e colocada numa
superfície fria, absorvendo o excesso de meio com papel absorvente e evitando deixar bolhas de ar na montagem. Por fim, a montagem foi selada
com um isolante (verniz para unhas) de modo a evitar o contacto com o
ar. Tiraram-se fotografias a todas as epidermes, com diferentes ampliações
(200× e 400×). Para o efeito, foi utilizado um microscópio Nikon Labophoto 2 ligado a uma câmara, que permitiu a visualização das estruturas
num ecran, ao qual foram tiradas as fotografias.
Foram classificadas 32 espécies, pertencendo 24 ao estrato herbáceo
e 8 ao estrato arbustivo, que constituem a colecção de referência.
Como complemento à colecção de referência por nós realizada, utilizámos também a colecção de fichas individuais do trabalho de Fernandes
(1) para as espécies arbóreas: (Pinus pinaster, Quercus lusitanica Lam.,
Quercus súber L.,) e arbustivas: (Cistus crispus L., Cistus ladanifer L.,
Cistus populifolius L. e Halimium alyssoides Lam C. Koch), para posterior
identificação dos fragmentos ao microscópio.
A análise micro histológica de fezes foi feita de acordo com Sparks
e Malechek (12, 15) e Holechek (4). Uma vez retiradas as amostras do
congelador, pesaram-se 5 g de fezes, que foram colocadas num copo misturador, tipo doméstico, com capacidade de 1 litro. Depois de adicionada
água, trituravam-se durante cerca de 3 minutos, de modo a obter uma
mistura com epidermes homogéneas. Em seguida, fez-se passar a solução
por um crivo de 53 μ. O material retido foi colocado numa placa de Petri
72
PASTAGENS E FORRAGENS 23
e foi-lhe adicionado hipoclorito de sódio, de forma a sofrer o mesmo
tratamento das epidermes da colecção de referência, permanecendo assim
durante aproximadamente 24 horas. Quando o preparado das fezes não
pode ser observado imediatamente, deve ser mantido numa solução de
álcool etílico a 70%.
Sobre uma folha de papel quadriculado, onde se escolheram aleatoriamente 5 pontos diferentes de amostragem, foi colocada a placa de Petri
com o material decantado, já despigmentado, proveniente de cada amostra.
De cada ponto retirou-se com uma pipeta uma gota, que se colocou entre
lâmina e lamela (6).
Esta preparação foi observada ao microscópio, com uma ampliação
de 200×, suficiente para garantir um maior rigor na classificação das
epidermes, e por vezes de 400× para confirmar algum pormenor. Os fragmentos foram identificados, por comparação com as imagens da colecção
de referência e contabilizados sistematicamente em trajectos paralelos, num
varrimento total ao longo da preparação, de modo a evitar a duplicação
na contagem (6).
Chama-se a atenção para o facto de nem sempre ter sido possível a
identificação das epidermes, observadas ao microscópio, até ao nível da
espécie, pelo que optámos pela sua divisão nas seguintes categorias: graminae, outras herbáceas, cistaceae, leguminosae, ericaceae, fagaceae, arbustivas
e/ou arbóreas não identificadas (arb/arv) e fragmentos não identificados
(NI). Testámos os efeitos, mês do ano e local, na composição botânica da
dieta dos bovinos da Serra da Peneda, através do programa JMP versão
3.2.2 (SAS Institut Inc. 1997) para a análise de variância pelo método de
Tuckey-Kramer HSD.
3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO
Para a colecção de referência foi feito um estudo sobre as características microscópicas de cada espécie, as quais ficaram registadas em
fotografia. Para além desta colecção fotográfica, elaborámos fichas individuais para cada espécie classificada, onde estão discriminadas a data e
o local da colheita e alguns apontamentos sob a forma de desenho, para
além das características histológicas das células da epiderme, estomas e
pêlos. Esta colecção de referência, devido às suas particularidades, será
publicada de uma forma autónoma.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
73
QUADRO 1 – Lista das espécies que constituem a colecção de referência
FAMÍLIA
CYPERACEAE
COMPOSITAE
ERICACEAE
GRAMINEAE
ESPÉCIE
FAMÍLIA
Carex acuta
Leontodon taraxacoides
Calluna vulgaris *
Erica arbórea *
Erica australis *
Erica umbellata *
Erica tetralix *
Agrostis spp.
Agrostis curtisii
Dactylis glomerata
Danthonia decumbens
Festuca spp.
Nardus stricta
Molinea coerulea
Poa annua
Poa trivialis
Pseudarrhenatherum
longifolium
ESPÉCIE
IRIDACEAE
JUNCACEAE
Crocus carpetanus
Juncus efusus
Juncus squarrosos
Chamaespartium tridentatum *
Genista florida *
Trifolium repens
Ulex minor (Roth?) *
Asphodelus lusitanicus
Simethis planifólia
Rumex acetosella
Pteridium aquilinum
Ranunculus repens
Carum verticillatum
Peucedanum lancifolium
Veronica officinalis
LEGUMINOSEAE
LILIACEAE
POLYGONACEAE
PTERIDACEAE
RANUNCULACEAE
UMBELIFEREAE
Legenda: *estrato arbustivo
Como resultado da observação microscópica dos fragmentos obtidos
das amostras de fezes, apresentamos na figura 1, a importância relativa
das componentes da composição botânica da dieta dos bovinos em função
do mês a que se refere a observação.
1%
1%
28%
19%
25%
3%
8%
1% 1%
1%
26%
1%
38%
8%
1%
4%
9%
9%
1%
2%
7%
19%
6%
3%
4%
5%
5%
55%
60%
58%
42%
Janeiro
Graminae
Fevereiro
Outras herbáceas
Maio
Cistaceae
Leguminosae
Junho
Ericaceae
47%
Julho
Fagaceae
Arb/Arv
FIGURA 1 – Variação da composição botânica em função do mês.
74
PASTAGENS E FORRAGENS 23
Relativamente às pinaceae, ainda que não apareçam na figura 1, foram
identificadas a um nível residual (0,1% nos meses de Janeiro, Fevereiro, Maio
e Junho, e sem observações no mês de Julho). Os fragmentos não identificados
(NI) têm um peso relativo bastante grande em relação ao total de observações (Janeiro=46%, Fevereiro=39%, Maio=41%, Junho=57%, Julho=43%).
Contudo, estão dentro de níveis admissíveis, quando comparados com os
trabalhos de Fernandes (1) (Inverno=41%. Primavera=44%) ou de Guerra (3)
(30%). O elevado número de fragmentos não identificados deve-se ao facto
do tamanho do fragmento ser de reduzidas dimensões. Por outro lado, por
vezes, as epidermes apresentaram-se opacas devido à elevada proporção de
componentes lenhosos o que pode sugerir uma sub estimação do grupo das
arbustivas e/ou das arbóreas. Também a presença de fragmentos onde apenas
se notavam tecidos vasculares que poderiam pertencer a arbustos contribuiu
para valores tão elevados de fragmentos não identificados.
Como seria de esperar, as gramíneas são a principal opção alimentar dos bovinos da Serra da Peneda, conclusão que também tirou
Mandaluniz et al. (7) nos seus trabalhos sobre bovinos em pastoreio no
País Basco, tendo utilizado esta mesma metodologia da análise microhistológica de fezes. As ericaceae são as principais arbustivas (9, 8)
consumidas pelos bovinos, assumindo particular importância no tempo
quente, resultados que estão de acordo com os trabalhos de Santos e
Pinheiro (11), tendo estes autores utilizado o método da observação
directa do animal em pastoreio na Serra da Peneda.
Para validar a aparente diversificação da composição botânica da
dieta alimentar em função do mês, procedemos à análise de variância,
cujos resultados apresentamos no quadro 2, apenas para os estatisticamente
significativos.
Para todas as famílias, excepto para as pinaceae, é significativa a variação da sua ocorrência em função do mês. As gramineae são consumidas
pelos bovinos em maior quantidade no mês de Maio assim como as outras
herbáceas (OH) e as cistaceae. As leguminosas são mais consumidas no
mês de Junho enquanto que as ericaceae, as fagaceae e as arbustivas/arbóreas são mais consumidas no mês de Julho. Assim, o aumento relativo
da preferência dos bovinos pelas arbustivas no início do tempo quente
poderá ter a ver com a diminuição da disponibilidade das herbáceas (7)
mas também é nossa opinião, que está associado às diferentes evoluções
do estado fisiológico, já que as gramíneas sofrerão mais com a falta de
água e aumento da temperatura de Junho e Julho do que as arbustivas.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
75
QUADRO 2 – Análise de variância (média ± erro padrão) das componentes da dieta
alimentar em função dos meses do ano.
Gra ***
OH *
Cis **
Leg ***
Eri ***
Fag *
Arb/Arv ***
JAN
73,1±5,65
b,c
8,2±1,31
a,c
2,0±1,17
b
10,1±1,62
c,d
36,3±4,16
c,d
1,1±0,22
a,b,c
6,7±2,11
d
FEV
97,4±9,78
a,b,c
12,8±2,27
a,c
1,3±2,03
a,b
4,6±2,81
d
40,2±7,21
b,c,d
1,0±0,38
a,b,c
24,3±3,65
a,b,c
MAI
105,9±5,23
a
12,3±1,22
b,c
7,5±1,08
a
15,2±1,50
a,b,c
34,0±3,86
d
0,6±0,20
b,c
15,3±1,95
c
JUN
58,8±13,83
c
5,6±3,22
a,c
7,2±2,87
a,b
26,4±3,97
a
36,6±10,20
a,b,c,d
0,0±0,54
c
17,6±5,16
b,c,d
JUL
87,7±9,78
a,b,c
5,6±2,27
a
5,6±2,03
a,b
11,0±2,81
b,c,d
70,3±7,21
a
1,9±0,38
a
35,5±3,65
a
Legenda: Gra-gramineae. OH-outras herbáceas. Cis-cistaceae. Leg-leguminosae. Eri-ericaceae. Fag-fagaceae. Arb/Arv-arbustivas e arbóreas não identificadas.
As médias dentro da mesma coluna, com a mesma letra não são significativamente diferentes # (p>0,05) *(p<0.05);** (p<0.01); ***(p<0.001)
Um outro possível factor de variação na composição da dieta é o
local de pastoreio onde o bovino se encontrava, no momento da colheita
da amostra de fezes. Assim, apresentamos no quadro 3 o resultado da
análise de variância para o efeito local apenas para os estatisticamente
significativos.
QUADRO 3 – Análise de variância (média ± erro padrão) das componentes da dieta
alimentar por local.
Gramineae
Outras
herbáceas
Cistaceae
Leguminosae
Ericaceae
Arb/Arv
ABADE
103,3±9,55
a,b
15,4±1,57
a,b,c
0,9±1,33
f,g,h
6,0±1,97
e,f,g
53,9±5,09
a,b,c,d,h
15,3±3,07
d,e,f
ALHAL
79,2±7,80
a,b,c
2,4±1,29
g
0,5±1,09
h
3,5±1,61
g
57,9±4,16
a,b,c,h
1,5±2,51
g
AREEIRO
87,7±9,55
a,b,c
5,6±1,57
e,f,g
5,6±1,33
c,d,e,f,g,h,i
11,0±1,97
d,e,f,g
70,3±5,09
a
35,5±3,07
a
AZEVEDO
97,4±9,55
a,b,c
12,8±1,57
a,b,c,d,e
1,3±1,33
f,g,h,i
4,6±1,97
f,g
40,2±5,09
b,c,d,e,f
24,3±3,07
a,b,c,d
B. ALHAL
92,2±13,50
a,b,c
8,4±2,23
b,c,d,e,f,g
3,2±1,89
e,f,g,h,i
18,6±2,78
a,b,c,d
25,4±7,20
d,e,f,g
2,8±4,34
f,g
Continua
76
PASTAGENS E FORRAGENS 23
Continuação
Gramineae
Outras
herbáceas
Cistaceae
Leguminosae
Ericaceae
Arb/Arv
CANDO
99,0±13,50
a,b,c
7,8±2,23
c,d,e,f,g
16,6±1,89
a
29,0±2,78
a
15,6±7,20
f,g
20,6±4,34
a,b,c,d,e,f
CEIDA
58,8±13,50
b,c
5,6±2,23
d,e,f,g
7,2±1,89
b,c,d,e,f,g,h,i
26,4±2,78
a,b
36,6±7,20
c,d,e,f,g
17,6±4,34
b,c,d,e,f,g
LAMELA
119,0±9,55
a
18,9±1,57
a
0,9±1,33
g,h
11,5±1,97
c,d,e,f,g
39,4±5,09
b,c,d,e,f,h
3,6±3,07
e,f,g
LIMARINHO
98,7±9,55
a,b
5,0±1,57
f,g
16,0±1,33
a
21,1±1,97
a,b
17,8±5,09
e,f,g
24,4±3,07
a,b,c,d
PORTELA
54,5±9,55
c
16,8±1,57
a,b
3,5±1,33
d,e,f,g,h,i
15,6±1,97
b,c,d
9,3±5,09
g
16,5±3,07
c,d,e,f
Legenda: Arb/Arv- arbustivas e arbóreas não identificadas. As médias dentro da mesma
coluna, com a mesma letra, não são significativamente diferentes (p<0.001).
A preferência alimentar dos bovinos varia de acordo com a oferta
alimentar disponível que, por sua vez, varia em função do local. Para
quem conhece a Serra da Peneda, é facilmente visível, na Branda do
Areeiro, que a área de arbustivas é relativamente maior em relação à das
herbáceas, enquanto que na branda da Lamela (Lamela) e na Chã do
Abade (Abade) a área ocupada por herbáceas é nitidamente superior à
das arbustivas. Os resultados obtidos neste trabalho, quando tratados em
função do local (quadro 3), vêm confirmar isto mesmo.
4 – CONCLUSÕES
A principal conclusão deste trabalho é que a metodologia da análise
micro-histológica de fezes (AMHF) confirma os resultados obtidos por
Santos e Pinheiro (11), com o método da observação directa do animal,
para identificação da composição botânica da dieta alimentar dos bovinos
em pastoreio na Serra da Peneda. De referir que os trabalhos de Santos
e Pinheiro foram realizados na mesma altura em que foram recolhidas as
amostras de fezes. Vários outros autores (2, 5) chegaram à conclusão de
que a AMHF é um bom método para confirmação de resultados obtidos
por observação directa. Por outro lado, este método da AMHF permite
poupar recursos e esforços quando comparado com o método da observação
directa do animal por períodos de 24 horas.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
77
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1 – FERNANDES, C. A. – Estudo da Dieta (Inverno/Primavera) da População de Veados
(Cervos elaphus L.) da serra de Silves: Análise micro-histológica das fezes. “Relatório
de fim de curso - Licenciatura em Engenharia Florestal”, Universidade Técnica de
Lisboa, I.S.A. 1997, 90 pp.
2 – GORDON, I. J. – Animal – based techniques for grazing ecology research. “Small
Ruminant Research”, 1995, vol. 26, p. 203-214.
3 – GUERRA, A. P. – Utilização da Vegetação Natural por Herbívoros: Determinação de
Dietas Alimentares. “Relatório final de estágio, Licenciatura em Engenharia Zootécnica, U.T.A.D.,” 1990, Vila Real, 53 pp.
4 – HOLECHEK, J. L. – Sample preparation techniques for microhistological analysis.
“Range Manag”., 1982, vol. 35, p. 267-268.
5 – HOLECHEK, J. L., VAVRA, M., PIEPER, R. D. – Botanical composition determination of range herbivores diets: a review. “Range Manag.” 35 (3), p. 309-314.
6 – MAIA, M. J., REGO, F. C., FONSECA, M. M. e BUGALHO, J. F. – Dieta de uma
População de Veados (Cervus elaphus L.) Durante o Período de Reprodução: análise
micro-histológica das fezes "Revista Florestal", 1996. vol. 9(1), p. 277-286.
7 – MANDALUNIZ, N., ALDEZABAL, A.; OREGUI, L. – Mountain grazing system
of beef cattle in a natural park of the Basque Country, preliminary data. Livestock
farmig systems. Integrating animal science advances into the search for sustainability.
“EAAP, 7” Posieux (Fribourg), Switzerland, Publication, 2000, vol. 9, p. 179-182.
8 – MELO, M.; XAVIER, D. – As Pastagens na Serra da Peneda; Caracterização, Importância e Evolução. “Cadernos da Montanha, Peneda” 2000, vol. 1, p. 70-87.
9 – PACHECO, L. F. E; XAVIER, D. – Práticas de Pastoreio – Imaginar, Observar e
Aprender. Direcção Regional de Agricultura de Entre-Douro e Minho. Divisão de Produção
Animal, 1999, 79 pp.
10 – REY, J. – Território e Povoamento. “Cadernos da Montanha, Peneda 1”, p. 22-39.
11 – SANTOS, J. C-R., PINHEIRO, R. A. G., – Bovinos em Pastoreio na Serra da Peneda
– estudo da estratégia alimentar, “Pastagens e Forragens”, 2000, vol. 22, p. 55-69
12 – SPARKS, D. R.; MALECHEK, J. C. – Estimating percentage dry weight in diets using
a microscopic technique. “Range Manag.”, 1968, vol. 21, p. 264-265.
78
PASTAGENS E FORRAGENS 23
"Pastagens e Forragens", vol. 23, 2002, p. 79–89.
FITOESTROGÉNIOS DA LUZERNA E SUAS IMPLICAÇÕES
NA ALIMENTAÇÃO DE VACAS LEITEIRAS*
♥Luísa
M. Chambel Leitão, ♣M. Conceição Castilho, ♦José M. Abreu
♥Escola
Superior Agrária Coimbra, Bencanta – 3040-316 COIMBRA
♣ Faculdade
Farmácia Universidade COIMBRA
– Rua do Norte – 3000 - 316 COIMBRA
♦Instituto
Superior Agronomia, Tapada Ajuda – 1349-017 LISBOA Codex
RESUMO
Após algumas notas históricas e económicas sobre a luzerna, referem-se a
sua grande produtividade e o seu bom valor nutritivo, tanto para ruminantes como
para monogástricos. Mencionam-se os fitoestrogénios que esta leguminosa possui
(formononetina, daidzeína, biochanina A, genisteína e cumestrol), os factores que
mais afectam a sua presença e teor, e os efeitos que têm nos animais, sobretudo nas
vacas leiteiras. Discutem-se igualmente os efeitos que estes estrogénios possam ter no
homem, via consumo de leite, sobretudo em grupos de risco. Finalmente, considera-se
o potencial impacto ambiental dos fitoestrogénios dos dejectos, admitindo que possa
ser significativo em zonas de grande concentração de animais.
PALAVRAS-CHAVES: Ambiente; Fitoestrogénios; Leite; Luzerna; Segurança alimentar.
LUCERNE PHYTOESTROGENS, ITS EFFECTS ON DAIRY COWS
ABSTRACT
After a few historical and economical notes, mention is made of the high productivity and good nutritive value of alfalfa, both for ruminants and monogastric.
Alfalfa phytoestrogens (formononetina, daidzein, biochanina A, genistein, coumestrol), as well as the factores that influence their occurrence and levels, and their effects
in dairy cows, human milk consumers and environment are discussed.
KEYWORDS: Alfalfa; Environment; Food safety; Milk; Phytoestrogens.
* Comunicação apresentada na XXIII Reunião de Primavera da SPPF. Guimarães, Abril
de 2002
Este trabalho foi apoiado pelo PRODEP III, Medida 5 / Acção 5.3. Concurso 4/5.3
de 2000.
79
1 – INTRODUÇÃO
O interesse forrageiro das plantas do género Medicago (seguidamente
referidas por medicagos) é reconhecido desde tempos imemoriais. Entre
elas destaca-se tanto histórica como economicamente, a luzerna Medicago
sativa. As primeiras referências conhecidas à luzerna datam pelo menos
do séc. VII a.C. (20). As estatísticas da FAO dão-nos conta da sua importância actual, ao atribuírem nos últimos dez anos uma área global da
ordem dos 16×106×ha. Nos últimos anos, a cultura está à escala mundial
relativamente estabilizada, seguindo a tendência dos Estados Unidos da
América (EUA).
Os EUA detêm mais de 60% da produção mundial e a União Europeia (UE) cerca de 13%. Na UE, a Itália, a França e a Espanha são os
maiores produtores, com mais de 80% da quantidade produzida. Portugal
apresenta valores insignificantes de produção no contexto europeu (6).
As estatísticas da FAO mostram ser Portugal um país deficitário em
luzerna desidratada ao contrário do que sucede com Espanha, França
ou Itália, que conseguem atingir grandes produções para auto-consumo
sendo ainda grandes exportadores mundiais. Em Portugal, a importação
média anual ronda as 50 mil toneladas de luzerna vindo mais de 80% de
Espanha (9).
A participação de luzerna desidratada na produção nacional de
alimentos compostos para animais não vai além dos 1,5%. Isto é menos
do que a quantidade de melaço ou carbonato de cálcio utilizada ou aproximadamente 10% da utilização do bagaço de soja (9).
A luzerna, em condições favoráveis dá origem a plantas muito produtivas, que regeneram bem após o corte. Possuem um valor nutritivo elevado
e são bem consumidas pelos animais. Para além destas vantagens, têm uma
apreciável flexibilidade de utilização quer por poderem ser consumidas
de várias formas – em verde, feno, silagem ou erva desidratada – quer
por poderem ser vantajosamente incluídas nas dietas da maior parte dos
animais domésticos, incluindo ruminantes e monogástricos.
Em contrapartida, a luzerna, contém algumas substâncias com efeitos
potencialmente negativos sobre os animais, nomeadamente substâncias
causadoras de timpanismo, como as saponinas e substâncias com efeitos
estrogénicos, como as isoflavonas e o cumestrol. Note-se no entanto que
estas últimas podem também influenciar, positivamente, o crescimento dos
animais, pelo seu provável efeito anabolizante (2).
80
PASTAGENS E FORRAGENS 23
Neste artigo iremos abordar as características dos fitoestrogénios,
pertencentes aos grupos das isoflavonas e dos cumestanos (cumestrol), as
suas vias de metabolização e excreção pelos animais e as potenciais consequências da presença de resíduos destes fitoestrogénios para o homem,
como consumidor de produtos de origem animal, nomeadamente no leite
e para o meio ambiente. Um melhor conhecimento destes temas ajudará
a utilizar de forma mais eficiente e segura a luzerna, em particular na
alimentação das vacas leiteiras.
2 – FITOESTROGÉNIOS NA LUZERNA
Os fitoestrogénios são metabolitos secundários que ocorrem em especial
abundância em leguminosas, tais como a soja, o trevo ou a luzerna. Estes
são muitas vezes, associados a mecanismos de defesa, para assegurar a
sobrevivência destas espécies no ecossistema. Entre os fitoestrogénios da
luzerna encontram-se, habitualmente, as isoflavonas (biochanina A, a daidzeína, a formononetina e a genisteína) que são flavonoides e o cumestrol
que é um cumestano (7).
Os fitoestrogénios a que nos referimos, isoflavonas e cumestrol,
podem interferir no metabolismo animal devido à semelhança química
das suas estruturas moleculares com as dos estrogénios dos animais,
podendo competir com estes para os mesmos receptores. No entanto,
os fitoestrogénios são fenóis e não esteróis como as hormonas animais.
Na figura 1 pode ver-se a semelhança que existe entre as estruturas
moleculares do 17β-estradiol, o estrogénio mais activo em mamíferos e
as de alguns fitoestrogénios pertencentes aos grupos das isoflavonas e
do cumestano.
Uma forragem tanto pode conter compostos fitoestrogénicos endógenos, como estar contaminada com fungos (por exemplo do género
Fusarium) produtores de outros compostos com actividade estrogénica,
como a zearalenona, toxina que por hidrogenação dá origem ao conhecido anabolizante zeranol. Este composto é um promotor de crescimento
em animais explorados para a produção de carne, tendo sido banido
da União Europeia, como todos os anabolizantes, em 1988. Vestígios
de zeranol poderão ser encontrados nalguns tecidos animais mas a sua
origem pode estar na ingestão de zearalenona, presente em alimentos mal
conservados (18).
PASTAGENS E FORRAGENS 23
81
BHVWUDGLRO
+2
2+
&+ +2
2
+2
'DLG]HLQD
*HQLVWHLQD
)RUPRQRQHWLQD
2
2+
2+
2
2
2+
+2
2
&XPHVWURO
2
2&+ 2
+2
2
+2
2
%LRFDQLQD$ 2+
2
2&+ 2
2+
FIGURA 1 – Semelhança molecular entre alguns fitoestrogénios e o estradiol.
Refira-se que o zeranol é um composto com características estrogénicas
tão potentes como o 17β-estradiol ou o dietilstilboestrol (DES), por isso
a sua presença na cadeia alimentar representa um risco muito superior ao
dos fitoestrogénios (21).
Já referimos que, compostos com actividade estrogénica podem ser
encontrados naturalmente em plantas ou em microrganismos, mas existem
ainda, sintetizados pelo homem, em pesticidas, plásticos, produtos farmacêuticos, entre outros. Todos eles possuem alguma capacidade para se ligar ao
receptor de estrogénio das células animais e interferir na resposta metabólica
normal. No caso dos fitoestrogénios, é a presença do anel fenólico que
torna possível a ligação do composto ao receptor de estrogénio presente
na célula animal. Esta interferência dá origem a respostas metabólicas
diversas, que dependem de factores tais como o fitoestrogénio em causa,
a concentração do fitoestrogénio, ou de outros compostos estrogénicos, o
órgão ou a célula envolvido e a situação do receptor (38).
O conhecimento sobre as influências da variedade e das condições
de cultura nos níveis dos diferentes fitoestrogénios presentes na luzerna é
reduzido embora seja uma questão muito interessante tanto do ponto de
82
PASTAGENS E FORRAGENS 23
vista teórico como do ponto de vista prático. Sabe-se, no entanto que os
estrogénios endógenos tendem a aumentar após a floração, e surgem em
concentrações superiores nas folhas mais velhas das zonas inferiores dos
caules (14). Sendo assim, tanto a fase como a altura de corte, poderão
influenciar o nível de estrogénios na forragem. É também sabido que o
stress tende a aumentar a síntese de alguns metabolitos secundários nas
plantas (33).
Vários autores reconhecem que podem existir isoflavonas na luzerna,
mas raramente se têm publicado valores concretos de concentração destes fitoestrogénios. O cumestrol é habitualmente identificado como sendo
aquele que mais contribui para os efeitos estrogénicos nos consumidores
e podem ser considerados teores de 25 a 65 ppm (parte por milho) de
matéria seca (37).
De seguida iremos debruçar-nos sobre as consequências da ingestão de
fitoestrogénios nos animais, suas repercussões no homem como consumidor
de leite e carne e no meio ambiente.
3 – EFEITOS SOBRE OS ANIMAIS
Os efeitos dos fitoestrogénios, sobre os ruminantes, essencialmente consumidores de trevos têm sido estudados, em particular na Nova
Zelândia com vacas leiteiras, e na Austrália com ovinos. No caso dos
ovinos, é sabido que a ingestão de doses elevadas de alguns trevos reduz
a fertilidade, quando ocorre antes da cobrição, podendo em contrapartida
não ter efeitos visíveis durante a gestação (2). Também estão identificadas
situações de ovelhas em pastoreio prolongado destes trevos que desenvolveram esterilidade definitiva (28).
Animais, ingerindo fitoestrogénios, vão em situação normal ser capazes de os excretar sob a forma conjugada e a percentagem de eliminação
destes conjugados normalmente não ultrapassa os 50% (39). Assim, parte
dos fitoestrogénios permanece em circulação ou sob a forma conjugada
ou ligada a proteínas do plasma e uma pequena percentagem, inferior a
5% (38) encontra-se livre e por isso disponível para interferir no processo
hormonal dos estrogénios endógenos.
Se em animais reprodutores os efeitos dos fitoestrogénios são geralmente nefastos, em animais produtores de carne poderão exercer efeitos
anabolizantes ou outros benéficos do ponto de vista zootécnico tais como
antioxidantes, antisépticos ou promotores da ossificação. Resta saber qual
PASTAGENS E FORRAGENS 23
83
o nível ideal, em que os fitoestrogénios devem estar presentes nas dietas,
de forma a existir uma participação favorável no desempenho animal. Por
exemplo a genisteína, uma das isoflavonas com actividade estrogénica,
presente na luzerna, tem revelado poder comportar-se como agonista a
baixas concentrações e como antagonista a altas concentrações (26).
Por outro lado podem surgir efeitos sinérgicos (3) e antagónicos (35)
entre os vários compostos com actividade estrogénica que podem afectar
tanto a produção animal como a saúde humana. Actualmente admite-se
que a investigação com células in vitro não permite a identificação correcta
da acção dos compostos estrogénicos in vivo, devido à complexidade dos
seus efeitos nos organismos.
Reconhece-se desde já que as reacções serão diferentes em função
da espécie e dentro da mesma espécie variarão com vários factores com
destaque para a idade, a dieta, a presença de estrogénios sintéticos, o
período de habituação e o indivíduo (39).
4 – EFEITOS SOBRE O HOMEM
Os eventuais efeitos sobre a saúde humana dos fitoestrogénios bem
como outras substâncias sintéticas com actividade estrogénica são hoje
motivo de literatura abundante. Os riscos destes compostos hormonais
para o homem e para os ecossistemas são grandes e foram pretexto de
tomada de posição por países como os Estados Unidos da América e o
Reino Unido.
Em humanos é corrente admitir-se que uma dieta rica em carne e
lacticínios implica a ingestão de compostos com actividade estrogénica uma
vez que na ração dos animais quase sempre existe soja, trevo, luzerna, (16)
ou seus derivados com teor elevado destes compostos. O leite é um dos
produtos da alimentação humana que se sabe ter resíduos de compostos
com actividade estrogénica, com origem na dieta das vacas. Tendo já sido
considerado que 60 a 70% dos estrogénios consumidos pelo homem têm
origem nos lacticínios da sua dieta (8).
Devemos realçar também que a exclusão do leite (de origem animal) da dieta infantil pode ter más consequências uma vez que é difícil
seleccionar um bom substituto. Foram identificadas perturbações graves
no sistema hormonal de crianças que ingeriram quantidades elevadas de
leite de soja, ou que tinham dietas à base de soja (40). Verificou-se que
a concentração de isoflavonas encontrada no plasma destas crianças era
84
PASTAGENS E FORRAGENS 23
13 000 a 22 000 vezes superior à concentração de estradiol nos primeiros
meses de vida. Quando comparadas com crianças alimentadas à base de
leite de vaca tinham dez vezes mais isoflavonas no plasma e vinte vezes
mais do que as alimentadas com leite materno (39).
Admite-se ainda que durante a gestação o feto possa ser gravemente
afectado por compostos de natureza estrogénica (36) e assim talvez seja
de recomendar a diminuição de fitoestrogénios na dieta de grávidas e
recém-nascidos. O efeito da exposição prematura a fitoestrogénios não é
claro. A hipótese de ser adverso, baseia-se no conhecimento de distúrbios
reprodutivos e neuroendócrinos verificados em várias espécies animais, mas
também se admite poder ocorrer um efeito positivo relacionado com o
aumento de resistência a algumas formas de cancro (40).
5 – EFEITOS SOBRE O MEIO
As excreções de fitoestrogénios conjugados que se têm quantificado,
normalmente não ultrapassam os 50% como já se mencionou. Tem sido
difícil, fazer uma correcta avaliação, do total excretado uma vez que
existe uma grande variedade de compostos resultantes do catabolismo
dos fitoestrogénios ingeridos, e por motivos diversos nem todos têm sido
quantificados (40).
Não serão muitas as referências precisas sobre o impacto dos fitoestrogénios sobre o meio ambiente. A sua concentração num terreno pode
tornar-se considerável quando nele estejam concentrados grandes efectivos
de vacas leiteiras, quer porque ingiram quantidades apreciáveis de fitoestrogénios, quer por as vacas poderem estar sujeitas a tratamentos hormonais
com estrogénios de síntese, que também serão parcialmente excretados.
Os fitoestrogénios e os seus metabolitos são considerados (26) como
tendo reduzida bio-acumulação, quando comparados com compostos com
actividade estrogénica sintetizados pelo homem, DDT ou DES (diclodifeniltricloroetano ou dietilstilbestrol) que permanecem intactos no meio
ambiente e nos organismos vivos por largos períodos (43).
O ciclo dos fitoestrogénios não tem sido estudado. Em teoria, após
excreção, estes poderão ser mais uma das fontes de contaminação para o
meio ambiente, mais grave em sistemas de produção mais intensivos como
são os de bovinos de leite.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
85
Admitimos que o meio poderá ser afectado pela aplicação ao solo de
estrumes e chorumes provenientes de explorações onde os animais ingiram
grandes quantidades de fitoestrogénios. Estes, depois de excretados poderão
interferir com os processos naturais de simbiose estabelecidos entre raízes
de leguminosas e alguns microorganismos do solo, uma vez que estes
processos são modulados por flavonóides excretados pelas raízes, entre
eles isoflavonas e cumestanos.
Estão descritas semelhanças funcionais entre o receptor de estrogénio
das células animais e certas proteínas presentes no Rhizobium, que se ligam
a um flavonol excretado pela planta (29). É a ligação dum composto com
características estrogénicas, à proteina receptora da bactéria que permite
o desencadear da nodulação nas leguminosas.
Existe uma enorme variedade de espécies de Rhizobium, verificando-se haver uma certa especificidade entre estas e as leguminosas a que
se ligam; essa especificidade poderá ser controlada pela composição dos
flavonóides excretados pela raiz e pela estrutura da proteína receptora
da bactéria (4). Por exemplo, a daidzeína, a genisteína e o cumestrol
podem ser promotores de nodulação na soja (34) e o cumestrol pode
inibi-la na luzerna (29). Assim, se as concentrações destes compostos
estiverem desequilibradas no solo, a nodulação pode não se concretizar,
com consequente perda da capacidade de fixação azotada da planta.
Interacções entre as micorrizas e fungos estabelecem-se também
na rizosfera, e do mesmo modo, neste caso entram em jogo compostos
flavonóides que promovem o crescimento dos microorganismos. Mais
uma vez, será de admitir que o uso de chorumes e estrumes com
elevado teor de fitoestrogénios possa interferir significativamente nos
mecanismos de cooperação existentes no solo entre microrganismos e
plantas.
6 – CONCLUSÕES
Produtividades altas em vacas leiteiras só se atingem com dietas
muito equilibradas, baseadas em forragens de elevada qualidade. Neste
sentido, a luzerna apresenta-se como um alimento de eleição. No entanto,
a sua ingestão pode implicar a de substâncias estrogénicas, susceptíveis
de interferirem no metabolismo reprodutivo e produtivo dos animais e
de desencadear efeitos ainda pouco estudados na cadeia alimentar, com
possíveis repercussões no homem como consumidor de leite e carne.
86
PASTAGENS E FORRAGENS 23
São escassos os estudos que referem os níveis de fitoestrogénios
presentes na luzerna e seria útil avaliar como variam em função de factores tais como a variedade, a época de corte, o processamento após o
corte, entre outros. Conhecer os efeitos dos fitoestrogénios nos animais
produtores de leite ou carne será também importante, especialmente numa
perspectiva de cadeia alimentar, considerando a posterior transferência
destes compostos com actividade estrogénica para a alimentação humana
e para o meio ambiente.
A presença nos alimentos e no meio ambiente de compostos com
características hormonais poderá por outro lado ser benéfica para o ecossistema, desde que promovam a sobrevivência e o equilíbrio das espécies.
Os mecanismos ecológicos de defesa da luzerna expressam-se através da
limitação da sobrevivência dos que directa, ou indirectamente, a consomem.
Cabe ao produtor aprender a tirar partido do melhor desta forragem,
evitando os possíveis efeitos adversos que lhe estejam associados.
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PASTAGENS E FORRAGENS 23
89
"Pastagens e Forragens", vol. 23, 2002, p. 91–101.
PRODUÇÃO E VALOR NUTRITIVO DA CONSOCIAÇÃO
DE CEREAIS FORRAGEIROS COM ERVILHACA
(VICIA BENGHALENSIS L.) *
Valdemar Carnide♣, Miguel A. M. Rodrigues♦, Luis M. M. Ferreira♦,
Henrique Guedes-Pinto♣
♣Centro
♥Centro
de Genética e Biotecnologia
de Ciência Animal e Veterinária.
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, 5000-911 – VILA REAL
RESUMO
A produção e o valor nutritivo de diversas consociações de três triticales, um
centeio, uma aveia e uma ervilhaca vermelha, foram avaliadas durante dois anos em
Vila Real. Efectuou-se um único corte à floração da ervilhaca vermelha.
Os resultados obtidos para a produção de matéria seca evidenciam diferenças
significativas (P<0,001) entre consociações, não significativas (P>0,05) entre anos e
para a interacção anos × consociações.
As duas consociações mais produtivas eram constituídas por dois cereais forrageiros (triticale e aveia ou triticale e centeio) e ervilhaca vermelha. A digestibilidade
in vitro da matéria orgânica mais baixa verificou-se nas consociações em que um dos
cereais forrageiros era o centeio e a mais elevada em consociações de triticale com
ervilhaca vermelha. O teor em proteína bruta parece não ser influenciado pela espécie
de cereal e o número de espécies de cereal na consociação. A utilização de duas espécies de cereal forrageiro, sendo um destes o triticale, na constituição de consociações
com ervilhaca vermelha, parece ser mais indicado do que a utilização de uma única
espécie de cereal forrageiro.
PALAVRAS-CHAVES: Cereais forrageiros Consociações; Ervilhaca vermelha; Produção; Valor
nutritivo.
YIELD AND NUTRITIVE VALUE OF CEREALS × VETCH
(VICIA BENGHALENSIS L.) MIXTURES
ABSTRACT
The production and nutritive value of several mixtures of three triticales, a rye,
an oat and a red vetch, were evaluated for two years at Vila Real. Only one cut was
made at flowering stage of the red vetch.
* Comunicação apresentada na XXIII Reunião de Primavera da SPPF. Guimarães, Abril
de 2002.
91
The results obtained for the production of dry matter show significant differences (P <0.001) among mixtures, not significant (P>0.05) among years and for the
interaction years × mixtures.
The two most productive mixtures were composed by two cereals (triticale and
oat or triticale and rye) and red vetch. The lowest in vitro organic matter digestibility
was observed in the mixtures in that one of the cereals was rye and the highest in
triticale × red vetch mixture. The concentration in crude protein does not seem to be
influenced by the cereal species and the number of cereal species in the mixtures. The
utilization of two cereal species, being one of these the triticale, in the mixtures with
red vetch, seems to be more suitable than the use of singular cereal species.
KEYWORDS: Mixtures; Cereals; Nutritive value; Red vetch; Yield.
1 – INTRODUÇÃO
As consociações de Outono, de cereal com leguminosa, são uma
forma de obtenção de forragem para o início da Primavera ou para ensilar. As mais frequentes em Portugal são de um cereal, normalmente a
aveia e, mais recentemente, o triticale com uma leguminosa, em especial a
ervilhaca. No entanto, em alguns países como no Canadá e nos Estados
Unidos da América utilizam-se também consociações constituídas por dois
cereais ou por dois cereais e uma leguminosa. A inclusão da leguminosa
na consociação tem como principal finalidade aumentar o valor nutritivo,
em particular o teor em proteína e em elementos minerais, compensando
assim a diminuição do valor nutritivo que se verifica nos cereais com o
avanço do seu estado de desenvolvimento (4, 11).
Com este trabalho pretendeu-se estudar a importância do cereal e de
diferentes espécies de cereal forrageiro na produção e no valor nutritivo
de diferentes tipos de consociações. Para o efeito elegeram-se três espécies
de cereal forrageiro (aveia, triticale e centeio) que foram consociadas, quer
individualmente quer na combinação de duas a duas, com uma mesma
cultivar de ervilhaca vermelha (Vicia benghalensis L.).
2 - MATERIAL E MÉTODOS
Estudou-se o comportamento de três espécies de cereal forrageiro
– aveia (cv. Boa-Fé), triticale (cv. Douro, cv. Ugo e linha EP3/94) e centeio (Pop. Montalegre) - quando consociadas com a cultivar de ervilhaca
vermelha Fontainhas. Os triticales Douro e EP 3/94 são provenientes do
programa de melhoramento do Departamento de Genética e Biotecnologia
da UTAD e o triticale Ugo é uma cultivar polaca.
92
PASTAGENS E FORRAGENS 23
As consociações estudadas eram formadas por um cereal forrageiro
ou por dois cereais forrageiros pertencentes a espécies diferentes e pela
ervilhaca vermelha. Os ensaios foram instalados em Vila Real e decorreram
durante 2 anos agrícolas (1998/99 e 1999/2000). A sementeira, em blocos
completos casualizados com quatro repetições, efectuou-se na primeira
quinzena de Outubro, em linhas afastadas de 25 cm, sendo a densidade
de sementeira de 250 plantas/m2 para o cereal e de 90 plantas/m2 para
a ervilhaca vermelha. A adubação consistiu na aplicação de 28 kg de
azoto, 56 kg de P2O5 e de K2O de fundo e de 60 kg de azoto em cobertura. O corte das consociações ocorreu quando a leguminosa atingiu
a floração. De cada um dos talhões retiraram-se duas amostras. Uma das
amostras colocou-se numa estufa de circulação forçada de ar a 65 °C por
um período superior a 36 h para secagem, para posterior determinação
da produção de matéria seca e para as análises de qualidade. Na outra
amostra separaram-se os componentes cereal; nas consociações com mais
do que um cereal forrageiro separaram-se os dois cereais e a leguminosa,
avaliando-se em seguida a contribuição de cada um dos constituintes para
a produção total. O valor nutritivo da forragem foi avaliado pela digestibilidade in vitro da matéria orgânica, através do método de Tilley e Terry
(14) modificado por Marten e Barnes (10) e pelo teor em proteína bruta
(N × 6,25), tendo-se determinado o teor em azoto num sistema semimicro
Kjeldhal. A concentração em matéria orgânica digestível (expressa em %
da MS) foi estimada de acordo com Beever e Mould (2).
3 – RESULTADOS
Para a produção de matéria seca registaram-se diferenças significativas (P<0,001) entre consociações e não significativas (P>0,05) entre
anos e para a interacção anos × consociações. Na média dos dois anos
as maiores produções de matéria seca obtiveram-se nas consociações
triticale EP3/94 × aveia Boa-Fé × ervilhaca vermelha Fontainhas e triticale Douro × centeio Montalegre × ervilhaca vermelha Fontainhas com
8714 kg/ha-1 e 8706 kg/ha-1, respectivamente. Estas consociações foram
significativamente diferentes (P<0,05) de todas as consociações em cuja
constituição entrou apenas uma espécie de cereal forrageirro. A menor
produção obteve-se na consociação triticale Ugo × ervilhaca vermelha Fontainhas (5149 kg/ha-1) e foi significativamente inferior (P<0,05) à registada
em todas as outras consociações (quadro 1).
PASTAGENS E FORRAGENS 23
93
QUADRO 1 – Produção de matéria seca, digestibilidade in vitro da matéria orgânica,
teor em proteína bruta, fibra do detergente neutro e fibra do detergente
ácido em diferentes consociações (média de 2 anos).
PROD. MS
(kg/ha-1)
DIVMO
(%)
PB
(%)
NDF
(%)
ADF
(%)
Douro × Montalegre × Fontainhas
8706
59,43
10,85
62,92
40,50
Douro × Boa-Fé × Fontainhas
8349
65,41
10,35
57,08
36,12
EP3/94 × Montalegre × Fontainhas
8286
60,65
10,79
64,45
40,37
EP3/94 ×Boa-Fé × Fontainhas
8714
64,11
10,94
58,58
38,25
Ugo × Montalegre × Fontainhas
7682
64,54
12,51
62,25
39,98
Ugo × Boa-Fé × Fontainhas
6959
66,99
11,49
56,16
36,40
Douro × Fontainhas
7100
66,97
12,15
57,23
35,20
EP3/94 × Fontainhas
8314
67,61
12,81
59,45
38,06
Ugo × Fontainhas
5149
71,86
12,29
53,24
34,87
Boa-Fé × Fontainhas
7435
65,77
11,11
54,17
34,46
Montalegre × Fontainhas
8622
60,71
11,99
64,60
42,79
DMS (P=0,05)
1094
2,35
1,03
2,02
2,10
Legenda: Prod. MS – Produção de Matéria Seca; DIVMO – Digestibilidade In Vitro da Matéria Orgânica;
PB – Proteína Bruta; NDF – Fibra do Detergente Neutro; ADF – Fibra do Detergente Ácido
A digestibilidade in vitro da matéria orgânica foi significativamente
diferente (P<0,01) entre anos e entre consociações e para a interacção
anos × consociações (P<0,05). A consociação triticale Ugo × ervilhaca
vermelha Fontainhas teve a digestibilidade média mais elevada (71,86%) e
foi significativamente diferente (P<0,05) de todas as outras consociações,
seguida da consociação triticale EP 3/94 × ervilhaca vermelha Fontainhas
(67,61%). O valor mais baixo (59,43%) registou-se na consociação triticale
Douro × centeio Montalegre × ervilhaca vermelha Fontainhas não tendo
sido significativamente diferente (P>0,05) das consociações triticale EP 3/94
× centeio Montalegre × ervilhaca vermelha Fontainhas (60,65%) e centeio
Montalegre × ervilhaca vermelha Fontainhas (60,71%) (quadro 1). De notar
que estas três consociações têm em comum a espécie centeio.
94
PASTAGENS E FORRAGENS 23
No que se refere ao teor em proteína bruta registaram-se diferenças
significativas ao nível de 0,1% entre anos, ao nível de 1% para a interacção anos × consociações e ao nível de 5% entre consociações. O teor
médio mais elevado de proteína bruta obteve-se na consociação triticale
EP 3/94 × ervilhaca vermelha Fontainhas (12,81%) seguida da consociação triticale Ugo × centeio Montalegre × ervilhaca vermelha Fontainhas
com 12,51%. A consociação triticale Douro × aveia Boa-Fé × ervilhaca
vermelha Fontainhas apresentou o teor médio mais baixo com 10,35%, o
qual não foi significativamente diferente (P>0,05) das consociações em que
os cereais triticale EP 3/94 e centeio Montalegre, triticale Douro e centeio
Montalegre, triticale EP 3/94 e aveia Boa-Fé estiveram consociados com a
ervilhaca vermelha (quadro 1).
Quanto ao teor em NDF registaram-se diferenças significativas
(P<0,001) entre anos, entre consociações e para a interacção anos × consociações. Para os teores em ADF as diferenças foram significativas (P<0,01)
para o efeito consociações e não significativas (P>0,05) para os efeitos
anos e interacção anos × consociações. O teor médio mais baixo em NDF
registou-se na consociação triticale Ugo × ervilhaca vermelha Fontainhas
(53,24%) e o de ADF na consociação aveia Boa-Fé × ervilhaca vermelha
Fontainhas (34,46%). O teor mais alto de NDF obteve-se na consociação
centeio Montalegre × ervilhaca vermelha Fontainhas com 64,60, o qual
não foi significativamente diferente (P>0,05) do registado nas consociações
triticale EP 3/94 × centeio Montalegre × ervilhaca vermelha Fontainhas
e triticale Douro × centeio Montalegre × ervilhaca vermelha Fontainhas.
Quanto ao teor em ADF o valor mais elevado (42,79%) obteve-se na
consociação centeio Montalegre × ervilhaca vermelha Fontainhas e foi
significativamente diferente (P<0,05) do encontrado em todas as outras
consociações (quadro 1).
A contribuição média da ervilhaca nas consociações em que havia
dois cereais forrageiros variou entre 17,5% na consociação triticale Douro × centeio Montalegre × ervilhaca vermelha Fontainhas e 24,1% na
consociação triticale Ugo × centeio Montalegre × ervilhaca vermelha
Fontainhas. Nas consociações com uma única espécie de cereal forrageiro
a contribuição média da ervilhaca oscilou entre 26,1% na consociação
centeio × ervilhaca vermelha e 37,6% na consociação triticale Ugo ×
ervilhaca vermelha (quadro 2). Em todas as consociações a percentagem
média das infestantes foi inferior a 5% pelo que se considerou desprezível
a sua contribuição para a produção total.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
95
QUADRO 2 – Contribuição (%) de cada um dos componentes das diferentes consociações.
CEREAL 1* CEREAL 2*
(%)
(%)
CONSOCIAÇÕES
ERVILHACA
VERMELHA
(%)
Douro × Montalegre × Fontainhas
41
41,6
17,5
Douro × Boa-Fé × Fontainhas
41,5
38
20,6
EP 3/94 × Montalegre × Fontainhas
45,2
35,5
19,3
EP 3/94 × Boa-Fé × Fontainhas
43
41,5
20,7
Ugo × Montalegre × Fontainhas
29,7
46,3
24,1
Ugo × Boa-Fé × Fontainhas
36,6
41,7
22,7
Douro × Fontainhas
66,4
-
33,6
EP 3/94 × Fontainhas
70,4
-
29,1
Ugo × Fontainhas
62,4
-
37,6
Boa-Fé × Fontainhas
71,5
-
28,6
Montalegre × Fontainhas
73,9
-
26,1
* O cereal 1 refere-se ao primeiro cereal forrageiro indicado na consociação e o cereal 2 ao segundo cereal
forrageiro da consociação, nas consociações com 2 cereais forrageiros
4 – DISCUSSÃO
Nas consociações em que existia apenas um cereal forrageiro a produção média de matéria seca mais elevada registou-se naquela em que o
cereal foi o centeio, o qual teve também a maior contribuição (73,9%)
para a produção de matéria seca. Esta consociação (centeio × ervilhaca
vermelha) teve dos menores valores para a digestibilidade in vitro da
matéria orgânica e as consociações em que o centeio foi um dos constituintes apresentaram ainda o NDF e o ADF mais elevados. A consociação
triticale Ugo × ervilhaca vermelha Fontainhas teve a produção de matéria
seca mais baixa mas a digestibilidade in vitro da matéria orgânica mais
elevada e um dos teores em proteína bruta mais alto. Atendendo a que,
na generalidade das gramíneas, quando aproveitadas em corte único, a
produção de matéria seca aumenta ao longo do ciclo vegetativo e o valor
nutritivo da forragem decresce (1, 3, 5) o diferente comportamento destas
consociações pode ser explicado pelo facto do centeio já se encontrar
no início da floração enquanto a cultivar de triticale Ugo se encontrava
apenas no início do espigamento. Por outro lado, na consociação centeio
Montalegre × ervilhaca vermelha Fontainhas a contribuição da leguminosa
96
PASTAGENS E FORRAGENS 23
foi 11,5 unidades inferior à registada na consociação triticale Ugo × ervilhaca vermelha Fontainhas o que também contribuiu para a justificação
do melhor valor nutritivo da forragem desta consociação.
Ao contrário dos resultados obtidos em trabalhos anteriores (6, 7,
8, 9) a consociação aveia × ervilhaca vermelha apresentou uma produção
média de matéria seca significativamente superior (P<0,05) à obtida quando
a ervilhaca vermelha foi consociada com as variedades de triticale Ugo mas
significativamente inferior (P<0,05) à registada na consociação triticale EP
3/94 × ervilhaca vermelha. A digestibilidade in vitro da matéria orgânica
nas consociações em que se utilizou apenas uma espécie de cereal foi
mais alta quando o cereal foi o triticale. Estes resultados são diferentes
dos obtidos em trabalhos anteriores (7, 8) em que a consociação aveia ×
ervilhaca apresentou valores mais elevados.
No que se refere ao teor em proteína bruta, as três consociações
triticale × ervilhaca vermelha apresentaram valores médios superiores aos
registados nas consociações centeio × ervilhaca vermelha e aveia × ervilhaca
vermelha sendo para esta última consociação as diferenças estatisticamente
diferentes (P<0,05). O maior teor em proteína bruta obtido nas consociações em que o cereal foi o triticale ou o centeio, comparativamente com
o registado na consociação em que o cereal foi a aveia, vem confirmar os
resultados de Osman et al. (12) Contudo, Carnide et al. (8, 7) e Rihawi et
al. (13) obtiveram teores mais elevados em consociações aveia × ervilhaca
do que em consociações triticale × ervilhaca. A diferença de resultados
obtida entre estudos pode ser devida aos genótipos avaliados serem diferentes, ao estado de desenvolvimento das plantas quando do corte e a
factores edafoclimáticos.
A melhor produção média de matéria orgânica digestível obteve-se na
consociação triticale EP3/94 × ervilhaca vermelha Fontainhas com 5621 kg/ha-1,
tendo-se registado na consociação triticale Ugo × ervilhaca vermelha o valor
médio mais baixo (3700 kg/ha-1). Em termos gerais, as menores produções
médias de matéria orgânica digestível obtiveram-se nas consociações em que
um dos constituintes foi a cultivar de triticale Ugo (figura 1).
Quanto à produção média de proteína bruta os valores apresentaram
uma amplitude entre 1065 kg/ha-1 na consociação triticale EP3/94 × ervilhaca
vermelha Fontainhas e 638 kg/ha-1 na consociação triticale Ugo × ervilhaca
vermelha Fontainhas (figura 2).
Nas consociações em que se utilizaram dois cereais forrageiros
verifica-se que os valores mais elevados, quer para a digestibilidade in
PASTAGENS E FORRAGENS 23
97
vitro da matéria orgânica quer para a proteína bruta, se conseguiram em
consociações em que um dos cereais forrageiros foi a cultivar de triticale
Ugo. Estes dados vêm confirmar a influência da espécie e, porventura de
igual ou maior importância, o efeito da variedade.
Quando se analisa a produção de matéria orgânica digestível é possível verificar que a inclusão de dois cereais forrageiros nas consociações
permitiu obter, na generalidade, valores mais elevados comparativamente às
consociações em que se utilizou apenas uma espécie de cereal (figura 1).
5750
PROD. MAT. ORG. DIG. (kg/ha)
5500
5250
5000
4750
4500
4250
4000
3750
3500
3250
BOA FE X FONT
MONT X FONT
UGO X FONT
EP3/94 X FONT
DOURO X FONT
UGO X BOA FE X
FONT
UGO X MONT X
FONT
EP3/94 X BOA FE
X FONT
EP3/94 X MONT X
FONT
DOURO X BOA FE
X FONT
DOURO X MONT
X FONT
3000
CONSOCIAÇÕES
FIGURA 1 – Produção de matéria orgânica digestível (kg/ha-1) em diferentes consociações.
Em duas das três consociações triticale × aveia × ervilhaca vermelha
a produção média de proteína bruta foi superior à registada na consociação
aveia × ervilhaca vermelha o que reflecte a importância da introdução do
triticale neste tipo de consociações (figura 2). A única consociação em que
não se verificou esta situação foi aquela em que o cereal foi a cultivar de
triticale Ugo que, como se disse anteriormente, tem um ciclo mais tardio
do que as restantes cultivares de cereal ensaiadas.
98
PASTAGENS E FORRAGENS 23
1000
PROD. PROT. BRUTA (kg/ha)
950
900
850
800
750
700
650
600
550
BOA FE X FONT
MONT X FONT
UGO X FONT
EP3/94 X FONT
DOURO X FONT
UGO X BOA FE
X FONT
UGO X MONT X
FONT
EP3/94 X BOA FE
X FONT
EP3/94 X MONT
X FONT
DOURO X BOA
FE X FONT
DOURO X
MONT X FONT
500
CONSOCIAÇÕES
FIGURA 2 – Produção de proteína bruta em diferentes consociações
A produção média de proteína bruta apresentou uma variação muito
maior quando se consociou apenas uma espécie de cereal forrageiro com a
ervilhaca, entre 638 kg/ha-1 na consociação triticale Ugo × ervilhaca vermelha Fontainhas e 1065 kg/ha-1 na consociação triticale EP3/94 × ervilhaca
vermelha Fontainhas, do que quando se utilizaram duas espécies de cereal
forrageiro consociadas com a ervilhaca vermelha, entre 864 kg/ha-1 na consociação triticale Douro × aveia Boa-Fé × ervilhaca vermelha Fontainhas e
961 kg/ha-1 na consociação triticale Ugo × centeio Montalegre × ervilhaca
vermelha Fontainhas.
Deste estudo podemos concluir que a consociação de duas espécies
diferentes de cereal forrageiro, sendo uma delas o triticale, com a cultivar
de ervilhaca vermelha Fontainhas, é uma boa alternativa à consociação
de uma única espécie de cereal forrageiro com esta cultivar de ervilhaca
vermelha. Constata-se ainda que é importante, dentro de uma espécie de
cereal e em particular para o triticale, a escolha do ciclo da cultivar a
consociar.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
99
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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5 – CARNIDE, V.; FERREIRA, A. M.; PINTO, H. G. – Study of a triticale variety for
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7 – CARNIDE, V.; GUEDES-PINTO, H.; MIGUEL-RODRIGUES, M.; SEQUEIRA,
C.; MASCARENHAS-FERREIRA, M. – Forage yield and quality of triticale-vetch
mixtures. Proc. 4th Int. Triticale Symposium, Canadá, 1998, p. 252-255.
8 – CARNIDE, V.; GUEDES-PINTO, H.; SEQUEIRA, C.; MASCARENHAS-FERREIRA, M. – Estudo de consociações triticale x ervilhaca. “Pastagens e Forragens”,vol.
13, 1992, p. 105-114.
9 – CARNIDE, V.; MASCARENHAS-FERREIRA, A.; SEQUEIRA, C.; GUEDESPINTO, H. – Dois anos de ensaio de consociações triticale × ervilhaca. Produção e
valor nutritivo. “Melhoramento”, vol.32, 1990, p. 471-484.
10 – MARTEN, C. G.; BARNES, R. F. – Prediction of energy digestibility of forage with “in
vitro” rumen fermentation and fungal enzymes systems. In: PIGDEN, W. C.; BALCH,
C. C.; GRAHAM,M. (eds.) – Standardization of analytical methodology for feeds.
Ottawa, IDRC, 1980, p. 61-71.
11 – MUSLERA PARDO, E.; RATERA GARCIA, C. – Praderas e forrages. Producción
y aprovechamiento. Madrid, Mundi-Prensa, 1984, p. 495-506.
12 – OSMAN, A. E.; NERSOYAN, N.; SOMAROO, B. H. – Effects of phosphate, seed rate,
seed ratio and harvesting stage on yield and quality of forage legume-cereal mixtures.
“Forage Research”, 9 (2), 1983, p. 127-135.
100
PASTAGENS E FORRAGENS 23
13 – RIHAWI, S.; CAPPER, B. S.; OSMAN, A. E.; THOMSON, E. F. – Effects of crop
maturity, weather conditions and cutting height on yield, harvesting losses and nutritive
value of cereal-legume mixtures grown for hay production. “Expl. Agric.”, 23, 1987,
p. 451-459.
14 – TILLEY, J. M. A.; TERRY, P. A. – A two stage technique “in vitro” digestion of forage
crops. “J. Br. Grassl. Soc.”, vol. 18, 1963, p. 104-111.
PASTAGENS E FORRAGENS 23
101
"Pastagens e Forragens", vol. 23, 2002, p. 103–104.
CONCLUSÕES DA XXIII REUNIÃO DE PRIMAVERA DA SPPF
S. TORCATO – GUIMARÃES (16 A 19 DE ABRIL DE 2002)
Constituiu objectivo central da XXIII Reunião de Primavera da Sociedade Portuguesa de Pastagens e Forragens discutir a problemática da
produção de forragens e pastagens a nível nacional, tendo subjacente a
necessidade de produzir forragens e pasto mantendo os sistemas agrícolas
rentáveis e respeitadores do ambiente. O evento promoveu a participação
de investigadores, técnicos e demais interessados, com a apresentação de
trabalhos que contribuíram para uma reflexão mais profunda sobre a forma
de produzir forragens e pastagens num contexto de qualidade e ambiente,
enfatizando-se estas questões, também a um nível regional.
Participaram na reunião 100 congressistas dos quais 55 sócios, 32 não
sócios e 13 estudantes.
Foram apresentadas trinta e uma comunicações, dezanove das quais
foram apresentações orais distribuídas por quatro sessões, a que se somou
uma de posters. As comunicações abrangeram as vertentes ambiente, produção e qualidade alimentar em sistemas intensivos e extensivos.
Para a resolução de problemas ambientais na produção intensiva foram
apontadas algumas soluções que passam sobretudo pela melhor gestão do
azoto mineral e orgânico, pela redução do efectivo de substituição e pelo
melhoramento animal.
Para a melhoria da qualidade da dieta animal no sistema leiteiro, foi
apontada a necessidade de melhorar a tecnologia de produção de silagens,
como meio de diminuir os factores anti-nutricionais da forragem verde.
103
Um novo perfil de produtores de forragem constitue um desafio para
a comunidade técnica e científica.
Em relação ao sistema extensivo, a actual relação da produção de
pastagens e forragens com o ambiente deixa uma margem para a intervenção técnica no sentido de melhorar a produtividade e a qualidade sem
que isso interfira na qualidade dos produtos. Aponta-se como estratégia
de desenvolvimento a produção de alimentos com interesse para os produtores e consumidores, preservando ao mesmo tempo a paisagem. Deu-se
particular relevo a novas tecnologias para a produção pecuária, sempre
associada às infra-estruturas e às medidas de política ajustadas que sirvam
de instrumento para o efectivo desenvolvimento rural.
Entendeu-se que há necessidade de conferir um carácter local às
actividades de experimentação no âmbito da produção de forragens e
pastagens, nomeadamente no que se refere ao impacto destas actividades
no ambiente e na qualidade.
É conveniente potenciar parcerias, nomeadamente envolvendo as
autarquias locais, dirigindo-se as suas acções ao estudo e à resolução de
“pequenos” problemas concretos de pessoas concretas, induzindo a formatação de medidas de política mais adequadas.
104
PASTAGENS E FORRAGENS 22
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