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ARS VETERINARIA, 15(3):202-205, 1999.
PRODUÇÃO LÁCTEA DE QUARTOS MAMÁRIOS DE VACAS
COM ELEVADA CONTAGEM DE CÉLULAS SOMÁTICAS
(MILK PRODUCTION FROM MAMMARY QUARTERS OF COWS
WITH HIGH SOMATIC CELL COUNTS)
L. F. ZAFALON1 , L.A. AMARAL2 , A. NADER FILHO2 , F.D. RESENDE 3,
J.V. OLIVEIRA3 , A.R. DIMENSTEIN4
RESUMO
Foi estudada a produção láctea de 50 quartos com mastite subclínica e de outros 50 quartos homólogos sadios em um
rebanho bovino produtor de leite tipo C. Verificou-se que os quartos com mastite subclínica apresentaram uma contagem
celular média 567,3% superior a dos quartos sadios e uma produção láctea média 22,5% inferior a dos quartos sadios.
PALAVRAS-CHAVE: Produção láctea, Células somáticas, Mastite subclínica.
SUMMARY
Milk production of 50 quarters with subclinical mastitis and 50 additional healthy contralateral quarters were studied in a
bovine herd producing low quality milk (type C). The infected quarters presented an average cell count 567.3% higher than
healthy quarters and an average milk production 22.5% lower than healthy quarters.
KEY-WORDS: Milk production, Somatic cells, Subclinical mastitis.
INTRODUÇÃO
A diminuição da produção láctea pela mastite,
para os produtores de leite, é representada essencialmente
pela forma clínica da enfermidade, talvez pela observação
dos sinais de inflamação da glândula mamária e
consequente maior atenção dada a estes animais. Contudo,
a mastite subclínica representa 82% das perdas com a
redução da produção láctea total, sendo que a forma clínica
é responsável por apenas 18% do prejuízo total, devido a
mortes e descartes prematuros (Du Preez & Giesecke,
1994, citados por COSTA, 1998).
LESCOURRET & COULON (1994)
compararam as curvas de produção láctea de vacas com e
sem mastite, encontrando perdas de até 911 Kg para os
animais doentes, sobre a média de toda a lactação. No
entanto, não citaram a média da produção dos rebanhos
estudados durante os meses investigados.
JONES (1984) verificou que quando o número
de células somáticas no leite é elevado, há uma queda na
produção, tanto diária como no período de 305 dias.
BARBANO et al. (1991) e ZECCONI (1996) relataram
que as contagens superiores a 100 000 células / ml de leite
estão associadas com a diminuição progressiva na
1 Pós-graduando do Depto. Medicina Veterinária Preventiva e Reprodução Animal-Unesp-Jaboticabal.
2 Depto. Medicina Veterinária Preventiva e Reprodução Animal/Unesp, Via de acesso Prof. Paulo D. Castellane, s/n –
14870-000 – Jaboticabal/SP
3 Estação Experimental do Instituto de Zootecnia de Colina, Av. Rui Barbosa S/N, Caixa Postal 35, Colina, SP 14770-000.
4 Zootecnista.
ARS VETERINARIA, 15(3):202-205, 1999.
produção láctea.
O presente trabalho teve por finalidade mostrar
a produção e a contagem de células somáticas do leite
oriundo de quartos mamários sadios e afetados pela mastite
subclínica, de modo a trazer subsídios que possam nortear
os técnicos envolvidos no controle da enfermidade. Para
tanto, objetivou-se, neste estudo, comparar a produção
láctea de quartos com mastite subclínica e elevada
contagem de células somáticas, com quartos mamários
sadios.
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Pesagem do leite
Durante dois dias consecutivos em duas
ordenhas diárias, os quartos com mastite subclínica e seus
homólogos sadios foram ordenhados separadamente,
colocando-se no teto estudado uma teteira até a ordenha
total do quarto mamário, vedando-se as demais teteiras
durante a colheita do leite. Foram utilizados neste processo
latões com capacidade para 50 litros, com o conteúdo sendo
despejado em recipiente plástico que foi submetido à
pesagem em balança de precisão com capacidade para dois
litros de leite.
MATERIAL E MÉTODOS
RESULTADOS
Características da propriedade rural e da
população bovina
Estudou-se uma propriedade rural produtora de
leite tipo C, pertencente à Estação Experimental do
Instituto de Zootecnia de Colina, estado de São Paulo. A
população bovina foi constituída por 80 vacas lactantes,
pertencentes em sua maioria à raça Tropical (ZAFALON,
1998) e mantidas em sistema de criação semi-intensivo.
Seleção dos quartos mamários e colheita de
amostras para os exames microbiológicos e celulares
Foram selecionados 50 quartos mamários de
vacas lactantes, cujas secreções foram reagentes ao
California Mastitis Test em um dos quartos e negativas no
quarto homólogo correspondente. Destes 50 pares de
quartos, 27 eram posteriores e 23 eram anteriores. Em tubos
de ensaio esterilizados foram colhidos cerca de 5ml de
leite dos quartos reagentes e não reagentes, em acordo com
as normas de assepsia propostas por VEISSEYRE (1972).
Após o acondicionamento em caixas de material isotérmico
(isopor), contendo cubos de gelo, as amostras foram
transportadas para os laboratórios do Depto. de Medicina
Veterinária Preventiva e Reprodução Animal, da Faculdade
de Ciências Agrárias e Veterinárias, Campus de
Jaboticabal.
Análises bacteriológicas e celulares
Foram semeados 10 microlitros por amostra de
leite, em duplicatas, sobre a superfície de ágar sangue
contido em placas de Petri. O isolamento e identificação
das bactérias do gênero Staphylococcus foram efetuados
como preconizado por HOLMBERG (1973) e CARTER
(1988), do gênero Corynebacterium segundo CARTER
(1978) e do gênero Streptococcus e do grupo coliforme
de acordo com o NATIONAL MASTITIS COUNCIL
(1990). A contagem de células somáticas foi realizada
conforme o SUBCOMMITTEE ON SCREENING TESTS
NATIONAL MASTITIS COUNCIL (1968).
A Tabela 01 mostra a produção láctea média
dos quartos posteriores e anteriores, sadios e doentes, com
respectivas contagens médias de células somáticas por ml
de leite. Verificou-se que os quartos posteriores doentes
apresentaram uma produção média de leite 20,8% inferior
à produção média dos quartos sadios e uma contagem
celular média 626,7% superior à contagem celular média
dos quartos sadios.
A produção média de leite dos quartos
anteriores doentes foi 25,5% inferior à produção média
dos quartos anteriores sadios, enquanto a contagem celular
média foi 500,9% superior à contagem celular média dos
quartos sadios.
Tabela 01 – Produção* láctea média dos quartos
posteriores e anteriores, sadios e doentes,
com respectivas contagens de células
somáticas (CCS) médias, por ml de leite Colina/SP, 1998.
Quartos analisados
CCS (x103)
Produção
Post.
Post.
%
Ant.
Ant.
%
Sadios
Doentes
Variação
Sadios
Doentes
Variação
101
734
+ 626,7
108
649
+ 500,9
4489,6
3558,0
- 20,8
3324,2
2476,5
- 25,5
* Em gramas
Na Tabela 02 tem-se os valores médios da
produção de leite e das contagens celulares médias de todos
os quartos com mastite subclínica e de seus homólogos
sadios. Verificou-se que os quartos mamários doentes
tiveram uma produção média 22,5% inferior à produção
média dos quartos sadios, com uma contagem celular média
567,3% superior à contagem celular média dos quartos
sadios.
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ARS VETERINARIA, 15(3):202-205, 1999.
Tabela 02 – Valores médios da produção* de leite dos
quartos mamários com mastite subclínica
(doentes) e seus homólogos sadios, com suas
contagens de células somáticas (CCS)
médias, por ml de leite - Colina/SP, 1998.
encontradas por LeVAN et al. (1985), TIMMS &
SCHULTZ (1987) e WILSON et al. (1997), que foram
4,0%, 8,7% e 4,7%, respectivamente. SMITH &
HAGSTAD (1986) observaram que a mastite subclínica
reduziu significativamente o potencial de produção de leite
dos animais acometidos e ZECCONI (1996) relata que
esta redução é amplamente subestimada, principalmente
pelos fazendeiros.
A queda da quantidade do leite secretado por
quartos mamários afetados pela mastite subclínica,
conjuntamente com a queda da qualidade do produto,
verificada pelo aumento da contagem de células somáticas,
faz com que haja a necessidade de serem buscadas medidas
que visem o aumento dessa qualidade e diminuição das
perdas acarretadas aos produtores pela redução da
produção de leite.
DISCUSSÃO E CONCLUSÕES
Agradecimentos: À Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo (FAPESP), pelo financiamento do
trabalho e a Fabiano Gazzi Tadei, pelo transporte das
amostras.
A análise dos valores constantes na Tabela 01
evidencia que os quartos doentes, posteriores e anteriores,
apresentaram contagens celulares médias superiores às de
seus homólogos sadios, pois durante a infecção e
inflamação as moléculas de adesão e os polimorfonucleares
margeiam ou aderem ao endotélio dos capilares
sanguíneos. Pode-se pressupor que mensageiros químicos
ou agentes quimioatraentes liberados de leucócitos
presentes no leite ou de tecidos danificados tenham atraído
grande número de polimorfonucleares para o leite, e
provocado o aumento da contagem de células somáticas
(HARMON, 1994).
A análise da Tabela 01 revela que a produção
média dos quartos mamários sadios foi superior a dos
quartos doentes, tanto entre os quartos anteriores quanto
posteriores. Apesar das duas variações serem próximas, a
observada nos quartos anteriores foi ligeiramente superior
a encontrada nos quartos posteriores.
Na Tabela 02 constata-se que as amostras
procedentes dos quartos mamários doentes apresentaram
produção láctea média inferior e contagem média de células
somáticas superior às obtidas nos quartos sadios. OLIVER
& SORDILLO (1988) referem que a migração de
polimorfonucleares pelo epitélio secretório resulta em dano
morfológico, com aumento da liberação de N-acetil-betaD-glucosaminidase (NAGase) pelo tecido mamário e
injúria do epitélio devido a função dos polimorfonucleares.
O aumento da atividade da NAGase no leite indica perda
de integridade e capacidade sintética das células
secretórias.
A redução verificada na produção foi inferior
às encontradas por RAUBERTAS & SHOOK (1982), que
variaram de 25,6% a 45,5% e à encontrada por NICOLAU
(1994), de 31,4%. Entretanto, foi superior àquelas
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(Milk production from mammary quarters of cows with high somatic