O CIDADÃO SURDO: IDENTIDADE, CULTURA E LÍNGUA DE SINAIS
Lucilaine Aparecida Jonsson – UNICENTRO/I
[email protected]
Anízia Costa Zych – UNICENTRO/I
[email protected]
RESUMO: O artigo tem como foco identificar aspectos da educação dos surdos, bem
como seu idioma e cultura. O surdo encontra grande dificuldade ao ser incluído numa
escola do ensino regular, pois elas não estão preparadas para recebê-lo. A partir do exposto
há necessidade de se analisar tal contexto. Assim sendo, emerge a pesquisa de como o
surdo vem sendo atendido na escola. Para tanto, o trabalho está dividido em três etapas. No
primeiro momento, através de pesquisa bibliográfica, realizaram-se estudos sobre a
educação dos surdos nos primórdios da história para fundamentar sua evolução. No
segundo momento, priorizamos a Língua Brasileira de Sinais, a qual é utilizada pela
maioria das pessoas surdas, favorecendo sua comunicação também com os ouvintes que a
dominam. No terceiro momento, procuramos apreender concepções sobre identidade,
cultura e surdez como subsídio sociocultural do grupo. Espera-se que o estudo contribua
significativamente para a educação das pessoas surdas.
Palavras-chave: surdo, identidade e cultura, libras, educação.
INTRODUÇÃO
O presente artigo é parte integrante do trabalho de conclusão de curso e tem como
objetivo estudar questões com respeito à educação dos surdos, bem como seu idioma e
cultura. Partindo deste pressuposto, surgiu então o interesse de investigar como o aluno
surdo é atendido no contexto escolar. Para tanto, este artigo está subdividido em três
grandes momentos.
No primeiro momento, para que possamos ter um entendimento mais aprofundado e
amplo a respeito da educação dos surdos, buscamos adquirir informações referentes ao
modo como eram atendidos nos tempos primórdios, para chegarmos a um consenso de
como ocorreu à evolução educacional do mesmo. Para tanto será pesquisado as concepções
históricas. No segundo momento, priorizamos a Língua Brasileira de Sinais, mais
conhecida como LIBRAS. Trata-se de um sistema estruturado da mesma maneira que as
diferentes línguas naturais. Todos os surdos têm condições de comunicar-se nesta língua,
considerada sua língua natural, possibilitando sua comunicação com as demais pessoas. No
terceiro momento, procuramos aprofundar estudos a respeito das concepções sobre
identidade e cultura.
CONCEPÇÕES HISTÓRICAS
Para que se possa ter um entendimento com mais clareza a respeito ao aluno surdo
no contexto escolar, constata-se necessário fazer um resgate do histórico da Educação dos
Surdos. Até a Idade Média, a igreja católica acreditava que a alma do surdo não era
imortal, devido ao fato de não conseguirem falar os sacramentos. Nos dias de hoje os
impedimentos religiosos não existem mais com tanta intensidade, porém, o impedimento
legal ainda está presente. Sabe-se que defender a cidadania e o direito do aluno com
deficiência é algo que passou a ser considerado muito recentemente na sociedade.
De acordo com Moura (2000), para os gregos ouvintes, os surdos não eram seres
humanos competentes, pois eles acreditavam que o pensamento não podia se desenvolver
sem a linguagem sendo, portanto, impossível desenvolver-se sem a fala. Partiam de um
pressuposto de que a pessoa que nascia surda não pensava, era impossibilitado de aprender
e considerado como um não humano, sem nenhuma possibilidade de desenvolver as
faculdades intelectuais.
Segundo Moura (2000) os romanos privavam os surdos de seus direitos. Assim
desconsiderados eram tidos como incapazes de gerenciar os seus próprios atos, perdiam a
sua condição de ser humano e eram confundidos com os retardados. Prejudicado com isso,
até hoje o surdo é visto de maneira errônea, não é entendido num sentido mais amplo.
Considerando mais a história da educação das pessoas com deficiência, observa-se
que até o século XVIII, o pouco que era conhecido sobre deficiência era ligado ao
misticismo e ocultismo, cujo conteúdo não tinha base cientifica, ou seja, as informações
partiam de noções e/ou ideias. A religião que colocava o homem como imagem e
semelhança de Deus, exaltava o ser humano perfeito física e mentalmente, em que ser
portador de alguma deficiência era entendido como imperfeição e era deixado de lado.
Aprofundando o conhecimento sobre o tema, pode-se constatar que a primeira obra
sobre educação de deficientes teve como autor e criador Jean-Paul Bonet. Intitulada
“Redação das Letras e Arte de Ensinar os Mudos a falar”, foi editada na França em 1620.
A primeira instituição especializada na educação de surdos-mudos foi fundada pelo abade
Charles Michel de L’Eppée em Paris, 1770. Ele foi responsável pela criação dos sinais, que
tinha como objetivo completar o alfabeto manual.
Os educadores Thomas Braidwood e Samuel Heincke fundaram um instituto
educacional destinado aos surdos-mudos, ambos em seus países. Mais especificamente,
Heinecke inventou o método oral para facilitar o aprendizado dos surdos-mudos,
atualmente esse método é conhecido como leitura labial. Tal método acabou vindo de
encontro ao método até então utilizado que era o de sinais, ocasionando, portanto várias
discussões quanto a sua validade.
Ernesto Hüet chegou ao Brasil no ano de 1855, logo de início foi apresentado ao
Marquês de Abrantes que foi seu ponto de ligação com o Imperador D. Pedro II. Este se
interessou muito pelos planos de Hüet, relacionados à fundação de uma escola para surdos
no Brasil. A partir daí começou a lecionar para dois alunos e logo, o Imperial Instituto de
Surdo-mudo foi então criado por Dom Pedro II em outubro de 1856. Cem anos depois seu
nome mudou devido a lei nº 3.198, de 6 de julho, passou então a chamar-se Instituto
Nacional de Educação de Surdos-(INES). Contudo, tal escola se focalizava na educação
literária e ensino profissionalizante de meninos surdos-mudos, entre 7 e 14 anos.
Segundo Mazzotta (2001) o Instituto Santa Terezinha teve como fundador o bispo
Dom Francisco de Campos Barreto em 15 de abril de 1929 em Campinas (SP). Mas isso só
foi possível pelo fato de duas freiras brasileiras irem para o Instituto de Bourg-la-Reine,
em Paris, com o objetivo de se especializarem a fim de que pudessem lecionar para alunos
surdos. Depois de quatro anos de preparação, retornaram ao Brasil juntamente com mais
duas freiras francesas, sendo então criado o Instituto Santa Terezinha. No mesmo momento
em que começou a funcionar como externato para meninas e meninos, iniciou-se também
um trabalho para integrar os surdos no ensino regular.
O Instituto Santa Terezinha era considerado como uma instituição especializada e
conceituada, o qual oferecia aos alunos surdos não somente o ensino de 1º grau, mas
também atendimento médico, psicológico, entre outros. Cabe salientar que o Instituto era
mantido pela Congregação Irmãs de Nossa Senhora do Calvário, sendo reconhecido como
Utilidade pública Federal, Estadual e Municipal.
Moura (2000) salienta que foi com o monge Ponce de León que surgiu a educação
dos surdos, seu trabalho serviu de incentivo para o trabalho de vários outros educadores,
sendo também o primeiro professor a trabalhar com os surdos. Ele passou parte de sua vida
em um monastério Beneditino em San Salvador, na Espanha. Por um grande período
passou orientando os surdos filhos dos nobres, ensinava-lhes a falar, ler, escrever, rezar e
conhecer doutrinas do Cristianismo.
Johann Conrad Amman, era médico residente da Suíça, foi um dos principais
expoentes do oralismo alemão, tendência que acreditava que a humanidade residia na
possibilidade da fala do indivíduo e que o sopro da vida só é possível na voz, sendo esse
legado dado ao homem, por Deus. Para ele os surdos pouco se diferenciavam dos animais,
era contra os sinais porque acreditava que o uso dos mesmos atrofiava a mente. Ainda
considerava a Língua de Sinais como sendo uma mímica sem linguagem.
Jean-Marc Itard era médico cirurgião e iniciou o seu trabalho com surdos por acaso,
atendendo um surdo no Instituto Nacional de Surdo-Mudo e se tornando posteriormente
médico residente. Seu trabalho mais conhecido foi o de tentar socializar o Menino
Selvagem de Aveyron, que ele tentou recuperar, tendo fracassado em suas tentativas.
Voltou-se então aos surdos com os quais se dedicou a realizar experiências médicas no
referido Instituto. Ele tentava descobrir as causas visíveis para a surdez e constatou, que a
causa da surdez não podia ser detectada visualmente. Itard nunca aprendeu a Língua de
sinais durante todo este trabalho que realizou com os surdos. Contudo Moura (2000, p. 27),
nos mostra o apontamento que Itard fez com respeito ao surdo quando diz:
Desde que sua proposta era a transformação do Surdo em ouvinte, a ausência da
fala fluente não serviu ao seu propósito e ele então culpou a Língua de Sinais
usada na escola pela falha de desenvolvimento da capacidade da fala dos Surdos.
Se o Surdo não tivesse acesso aos Sinais, ele se veria forçado a falar,
desenvolveria a fala (como ele já havia demonstrado que poderia ocorrer nos
seus treinamentos) e a usaria fluentemente, pois não teria outra forma para se
comunicar.
Moura (2000), ainda salienta que Thomas Gallaudet adquiriu interesse pela causa
da surdez quando se deparou com uma surda, então juntamente com outros colegas criou
uma escola pública para surdos nos Estados Unidos. Thomas não sabia nada sobre sinais,
por isso foi para a Europa aprender o método que era utilizado por Braidwood, mas ele não
quis revelar seu método a Thomas, o que fez com que fosse para a França em 1816, no
Instituto Nacional para Surdos-Mudos, em que pode realizar estágios, observações e
aprender os sinais, ao mesmo tempo em que aprendeu o método de L’Epée, o qual teve
como seu instrutor Laurent Clerc.
A princípio era utilizada a Língua de Sinais Francesa, mas gradativamente os
alunos foram modificando, passando a se formar a Língua de Sinais Americana. A partir
do momento em que esta foi fortalecida e também com o surgimento de comunidades de
Surdos, foram surgindo mais escolas para surdos nos Estados Unidos.
De acordo com Moura (2000), foi em 1864, que o Congresso americano passou a
autorizar a implantação e funcionamento da primeira faculdade para surdos que se localiza
em Washington. Atualmente denominada Gallaudet University, pois foi fundada por
Edward Gallaudet, filho de Thomas Gallaudet. Eram encaminhados para esta faculdade,
alunos que tinham bom aproveitamento e que se beneficiariam dos ensinamentos
oferecidos.
No ano de 1878, foi realizado em Paris um Congresso sobre os Surdos, o qual tinha
por objetivo discutir a educação do surdo, decidindo sobre a forma de língua que seria mais
favorável ao desenvolvimento da educação dos surdos. Neste congresso a língua oral foi
indicada como a principal forma de comunicação e o sinal seria utilizado apenas como
língua auxiliar.
O Congresso de Milão que foi realizado no ano de 1880 contou com a participação
de italianos e franceses, unidos por razões políticas, justamente por tal interesse, a
Alemanha havia sido convidada a participar também. O interesse do Congresso foi fazer
uma discussão sobre a necessidade de substituir a Língua de Sinais pela língua oral
nacional.
No início do século XX, a maioria das escolas de surdos abandonou o uso da língua
de sinais, em conseqüência do Congresso de Milão de 1880, considerou-se que a melhor
forma de educação do surdo, seria aquela que utilizasse somente o oralismo. O surdo para
viver em sociedade deveria falar para poder ter o direito de conseguir viver e ser aceito
pelo seu grupo social. A filosofia oralista dominou em todo o mundo até a década de 60.
De acordo com Moura (2000, p. 48), a resolução do congresso foi que:
Dada a superioridade incontestável da fala sobre os Sinais para reintegrar os
Surdos-Mudos na vida social para dar-lhes maior facilidade de linguagem,...
(Este congresso) declara que o método de articulação deve ter preferência sobre
o de sinais na instrução e educação dos surdos e mudos.
Este Congresso notoriamente teve suas conseqüências, como por exemplo, a
demissão de alguns professores que eram surdos e a eliminação dos educadores, ou seja,
buscou-se impedir que fosse possível acontecer qualquer tipo de manifestação ou proposta
que fosse contra ao oralismo.
LÍNGUA DE SINAIS: UMA MODALIDADE VISUAL ESPACIAL
A língua de sinais é a principal forma de comunicação para os surdos, considerada
sua língua natural. É indiscutível o valor da língua de sinais para a comunicação da
comunidade surda. Segundo Coll, Marchesi e Palácios (2004) trata-se de um sistema
lingüístico estruturado, com uma coerência interna e um sistema de regras capaz de
produzir todo tipo de expressões e significados.
Compreende-se que a língua de sinais é natural porque ela surgiu de uma
necessidade por parte da comunidade surda. Ela é de certa maneira, diferente da língua
oral, pois se baseia principalmente de um meio de comunicação visual-espacial, no qual se
apropria do espaço e do que a visão se apercebe. Além de ser uma língua gestual-visual,
pois se apropria para a comunicação dos gestos, bem como as expressões faciais. O que a
caracteriza como língua é sua estrutura a partir de níveis lingüísticos, como o fonológico,
morfológico, sintático, semântico e pragmático. A língua de sinais de cada país apresenta
características próprias, portanto, cada comunidade surda apresenta variação no uso dos
sinais. Percebe-se, portanto, a necessidade de uma língua que possibilite a fácil
comunicação do surdo na interação com a sociedade.
Britto (1997, p. 22), reafirma tal necessidade quando enfatiza:
Os surdos são pessoas e, como tais, dotados de linguagem assim como todos nós.
Precisam apenas de uma modalidade de língua que possam perceber e articular
facilmente para ativar seu potencial lingüístico e, conseqüentemente, os outros
potenciais e para que possam atuar na sociedade como cidadãos normais.
Com base nisso, podemos entender que o surdo é um ser humano com potencial,
basta apenas que seja lhe proporcionado as oportunidades, como a utilização da língua de
sinais como meio de comunicação e o espaço para que o mesmo possa demonstrar tal
atitude. É para este fim que a LIBRAS está disponível, justamente para tornar possível esse
processo.
Advém ressaltar que a língua oral e a língua de sinais são de certa forma parecidas e
sua gramática é a mesma, pois as duas possuem dupla articulação e são estruturadas com
base em morfemas e tipos lingüísticos já existentes. Para tanto, a LIBRAS como qualquer
outra língua possuí sua gramática e é organizada, contendo sua própria estrutura. Ela
apresenta como principais aspectos: a configuração da mão, que é o posicionamento da
mão ao sinalizar, neste também inclui o local de articulação, que se limita entre a cabeça e
o cotovelo, no exato momento da sinalização; o movimento, a orientação que vem a ser se
o sinal possuiu algum movimento e uma direção, bem como a expressão facial e corporal,
pois existem sinais que somente serão diferenciados com base neste aspecto. Britto (1997)
ressalta que falar com as mãos é, portanto, combinar esses elementos que formam as
palavras.
Advém ressaltar, que o léxico em LIBRAS se considera infinito, no sentido de que
sempre lhe são agregadas novas palavras ou sinais. Contudo, o que é usado na estrutura das
palavras é semelhante ao português, porém, o que diferencia é que em português sua
modalidade é oral-auditiva e na LIBRAS é visual-espacial. Tais modalidades que fazem
parte da língua de sinais visual-espacial seria a configuração da mão, o ponto de
articulação, o movimento, a expressão facial, além de classificadores que servem como
marcadores de concordância, bem como indicar a forma ou tamanho de algum objeto.
CONCEPÇÕES SOBRE IDENTIDADE, CULTURA E DIFERENÇA SURDA
A principio compreendemos a necessidade de fazer uma breve explanação com
respeito ao surdo ser considerado diferente ou deficiente. Contudo percebemos que ser
normal ou anormal diz respeito a questões sociais, ou seja, ser considerado anormal é
possuir características diferentes que não se encaixam com os ditos “normais”, que são
delineados socialmente. Supomos com isso que perante a sociedade ser diferente não
agrada, e por muitas vezes é considerado um estranho, por sua vez, anormal. Com base
nisso Santana (2007, p. 23) salienta:
Nesse caso, o sujeito não pode ter características particulares, já que sua
individualidade “compromete” a norma. Em outras palavras, a individualidade é
vista como um desvio e, portanto, deve ser corrigida para adequar a pessoa ao
que é considerado normal, evitando-se a discriminação. Discriminação esta de
que são alvos os gagos, os afásicos, os surdos, os disfluentes, enfim, todos
aqueles que fogem à norma vigente.
Portanto, não somente os surdos são discriminados, mas qualquer pessoa que
possua uma característica diferente não se encaixa no grupo de pessoas ditas “normais”, e
que por sua vez é deixada fora do âmbito social.
O fato de o surdo ter uma modalidade diferenciada de comunicação faz com que
algumas pessoas acabem se afastando, do convívio. Muitas vezes são tidos como
coitadinhos dignos de pena ou desprovidos de capacidade, porém, a característica do surdo
é que são dotados de outra língua, que seria a língua de sinais. Sabe-se que são diferentes
as formas como uma família ouvinte aceita o fato de ter um filho surdo, algumas têm um
impacto de início, mas se adapta ou não. Outras fazem esforço para aprender a língua de
sinais para uma melhor comunicação com seu filho, porém, existem aquelas que não se
propõem a aprender a língua de sinais, por acreditar que é a língua restrita ao filho.
Percebe-se então a necessidade de uma mudança, em que a surdez passe a ser vista
não mais como incapacidade, mas sim como condição de fenômeno social. Dentro desse
aspecto, entendemos que o surdo não é mais considerado como deficiente, mas sim pessoas
que fazem parte de uma comunidade que o identifica. Com isso, a luta pela mudança
começa acontecer, visto que a língua passa a ser identificada como parte integrante de uma
cultura específica.
Santana (2007) explicita que a língua de sinais legitima o surdo como sujeito de
linguagem e é capaz de transformar a “anormalidade” em diferença. Os defensores da
língua de sinais afirmam que é somente por meio da língua de sinais que o surdo constrói
uma identidade surda, sendo assim é o que o define.
Para tanto entendemos necessário ter conhecimento das três concepções de
identidade citadas por Hall (2006), no qual as divide em Sujeito do iluminismo, Sujeito
sociológico e Sujeito pós-moderno.
O Sujeito do iluminismo se baseia na pessoa como indivíduo centrado e unificado,
sendo que este possui capacidades de razão, de consciência e ação. Este ser centrado
emerge no nascimento do sujeito e com ele se desenvolve, contudo permanece idêntico ao
decorrer de sua existência. O Sujeito sociológico entende identidade como sendo formada
na interação entre a sociedade e o eu, ou seja, estabiliza os mundos culturais que os
habitam tornando-os unificados. O Sujeito pós-moderno não se constitui de uma identidade
permanente, ou seja, se transformam continuamente, pois se assumem diferentes
identidades em determinados momentos.
Portanto, que a identidade não é por inteira completa, acabada, é o que explica isso
em Hall (2006, p.38):
Assim, a identidade é realmente algo formado, ao longo do tempo, através de
processos inconscientes, e não algo inato, existente na consciência no momento
do nascimento. Existe sempre algo “imaginário” ou fantasiado sobre sua
unidade. Ela permanece sempre incompleta, está sempre “em processo”, sempre
“sendo formada”.
Assim a identidade evolui da dinâmica relacional que está em andamento, em
constante processo. Santana (2007, p. 43) discorda sobre alguns defensores da língua de
sinais, quando afirmam que os surdos só adquirirem uma identidade se fizerem uso da
língua de sinais, baseado nesse apontamento lemos que:
Afinal de contas, não há relação direta entre língua especifica e identidade
especifica. A identidade não pode ser vista como inerente às pessoas, mas como
resultado de práticas discursivas e sociais em circunstancias sócio-históricas
particulares. O modo como a surdez é concebida socialmente também influencia
na concepção da identidade.
Dentro desse aspecto, entendemos que o surdo não deve ser encarado como se
estivesse vagueando socialmente. De acordo com Santana (2007), entendemos o conceito
de identidade como uma construção permanente que busca determinar especificidades que
estabeleçam uma ponte com o outro, sendo assim adquirindo o reconhecimento de sua
pertinência pelos integrantes do grupo a qual pertencem. Com isso, identificamos que a
identidade não está relacionada a uma língua determinada e sim a práticas discursivas.
Muszkat (1986) propõe que a identidade passe a ser entendida como um complexo
funcional, pois se trata de um agrupamento de conteúdos psíquicos que se configuram e se
modificam continuamente. Ressalta-se com isso, que essa função define-se como uma
experimentação e transformação do mundo e de suas necessidades básicas, com o intuito
de integração e discriminação do próprio complexo.
Ao se ouvir falar em cultura, o que vem à cabeça de momento são práticas
simbólicas de um grupo, porém, não é um complexo de padrões, comportamentos ou até
mesmo costumes. O termo cultura refere-se à língua que os surdos fazem uso, sendo que à
existência dessa cultura impele a segregação entre surdos e ouvintes. Conforme Santana,
(2007), a defesa da cultura surda atualiza os mecanismos de reprodução da própria
desigualdade, fazendo com que o termo cultura torne-se instrumento de legitimação dessa
REFERÊNCIAS
BRASIL, Secretaria de Educação Especial. Língua Brasileira de Sinais/ organizado por
Lucinda F. Brito ET. al – Brasília: SEESP, 1997. V. III. – (Série Atualidades Pedagógicas,
n.4).
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade / Stuart hall; tradução Tomaz
Tadeu da silva, Guaracira Lopes Louro – 11. ed. – Rio de Janeiro: DP&A, 2006.
MAZZOTA, Marcos José Silveira. Educação especial no Brasil: História e políticas
publicas/ Marcos José Silveira Mazzotta – 3. Ed. – São Paulo: Cortez, 2001.
MOURA, Maria Cecília. O surdo: Caminhos para uma nova identidade. Rio de Janeiro:
Revinter Ltda, 2000.
MUSZKAT, Malvina. Consciência e Identidade. São Paulo: Ática S. P, 1986.
SANTANA, Ana Paula. Surdez e linguagem: aspectos e implicações neurolinguísticas /
Ana Paula Santana – São Paulo: Plexus, 2007.
COLL, Cezar, MARCHESI, Álvaro, PALACIOS, Jesús. Desenvolvimento psicológico e
educação; trad. Fátima Musad – 2ª . ed. Porto Alegre: Artemed, 2004. 3 V.
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O CIDADÃO SURDO: IDENTIDADE, CULTURA E LÍNGUA