A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
A INTEGRAÇÃO REGIONAL NA AMÉRICA LATINA COMO
POSSIBILIDADE - PARA SUPERAR “A ARMADILHA DO
SUBDESENVOLVIMENTO”
RICARDO LUIGI (Ricardo Abrate Luigi Junior)1
Resumo: A Integração regional na América Latina adquiriu uma nova conformação no século XXI.
Deixou de ser apenas reprodução dos modelos de integração dos países desenvolvidos,
principalmente a União Europeia, para abraçar a ideia de ser um mecanismo plausível para a
possibilidade de se superar o subdesenvolvimento. Portanto, fugindo do ideário propalado pelos
regimes internacionais, a integração no continente supera a mera expectativa econômica para se
transformar, de forma bem peculiar, em integração política.
Palavras-chave: Integração Regional, Globalização; Subdesenvolvimento.
Abstract: Regional Integration in Latin America has a new conformation in the XXI century. No
more just play integration models of developed countries, especially the European Union to embrace
the idea of being a plausible mechanism for the ability to overcome underdevelopment. So far away of
the common ideas spreaded by international regimes, the integration on the continent exceeds mere
economic expectations to become, in a special way, in political integration.
Key-words: Regional Integration; Globalization; Underdevelopment
1 – Introdução
O presente trabalho visa demonstrar de que forma a integração regional pode
contribuir para que as economias em “catch up” alcancem o desenvolvimento,
identificando e superando a lógica de dependência. O termo “armadilha do
subdesenvolvimento”, elaborado por Celso Furtado na década de 1950, alude a uma
série de imposições e condicionantes externos que visam diminuir a mobilidade dos
países no sistema internacional. Defende-se, pois, a ideia de que a integração
regional esteja sendo utilizada como uma forma de os países em desenvolvimento
adotarem
políticas
e
instituições
mais
adequadas
ao
seu
estágio
de
século
XXI
desenvolvimento.
Diversos
eventos
internacionais
ocorridos
no
início
do
concorreram para uma menor influência dos Estados Unidos na América Latina.
1
- Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual de Campinas Unicamp. E-mail de contato: [email protected]
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Nessa espécie de vazio de poder se organizaram diversas propostas de integração
regional que buscam uma nova forma de inserção internacional.
O Brasil tem seguido em sua política externa recente uma tentativa de
construção de uma multipolaridade benigna. Essa estratégia encontra convergência
com a atuação de outros países da América Latina, e parece alcançar seu ápice em
torno das organizações de integração regional, especialmente Unasul e Celac.
Mais do que promover o aumento do comércio entre os países membros, as
novas perspectivas da integração buscam superar a integração meramente pela
relação comercial, almejando uma “integração política”, uma relação mais complexa
e produtiva.
Notam-se, pois, alterações nas relações entre os países sul-americanos e
seus respectivos “blocos de poder”, o que nos enseja investigar o papel da Unasul e
da Celac nesse âmbito. Para isso, é preciso termos a compreensão do
posicionamento dessas organizações diante dos modelos de integração regional
propostos pelos teóricos; a diferenciação ante a outras iniciativas de integração que
ocorreram na América Latina; a avaliação dos objetivos brasileiros ao se integrar a
esses grupos, visando liderar um processo fundamental para seu próprio
desenvolvimento.
Visa-se então superar “a armadilha do subdesenvolvimento”, criando
possibilidades de alcançar o desenvolvimento a partir de novas instituições mais
adequadas ao grau de desenvolvimento desses países e alternativas aos regimes
internacionais estabelecidos. Para que a globalização se nos imponha não como
fábula ou perversidade, mas como disponibilidade e possibilidade de um outro
concerto internacional.
2 – Desenvolvimento
O tema da “integração regional”, muito estudado na Economia e nas Relações
Internacionais, pode ser ricamente explorado na Geografia, principalmente dado à
riqueza conceitual dessa área de conhecimento. A geografia pode servir para aclarar
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os conceitos regionalização, integração regional e regionalismo, usado muitas vezes
de forma nebulosa nesse debate (RICHARD, 2014).
A priori, julga-se necessário esclarecer que alude Haesbaert (2010), o
conceito de região foi muitas vezes dado como “morto” durante o século XX.
Também por isso discussão sobre a região, regionalização e integração regional
esteve bastante discreta na Geografia (RICHARD, 2014; HAESBAERT, 2010). Na
Geografia Política, por exemplo, ele acabou perdendo espaço para o conceito de
território.
Ciente da capacidade explicativa do conceito, busca-se resgatar sua
capacidade explicativa aproximando-se o nosso escopo das denominadas
“perspectivas associativas”, “integradoras – entre os conceitos de território e região”
(HAESBAERT, p. 173). Portanto, não haverá necessidade de se fazer essa distinção
entre os conceitos, nem necessariamente um está diluído no outro.
No que tange aos estudos de Integração Regional em Geografia, vislumbramse essas duas possibilidades de inserção: uma com base no conceito de território e
outra com base no conceito de região.
Embora haja uma tendência apontada por Haesbaert (2010, p. 42) de
“hegemonia do conceito de território – pelo menos nas geografias latinas”, isso não
significa dizer que devamos analisar o fenômeno da integração regional apenas por
esse prisma. Tampouco se pretende aprofundar na discussão que Haesbaert (2010)
faz sobre as possibilidades de foco conceitual da região.
Contudo, a região se fará mais notada dado seu foco “nos processos gerais
de articulação” do espaço (HAESBAERT, p. 178).
Nota-se um favorecimento dessa abordagem na Geografia Política e na
Geopolítica (especialmente em sua vertente denominada “Crítica”). Para Font; Rufí
(2006, p. 92), a A “Geopolítica Crítica” é “uma nova geopolítica, que tenta
desconstruir os discursos do poder, institucionalizados e, portanto, construir novas
visões políticas das relações sócio-espaciais”. Nessa nova tendência, diversos
aspectos estão envolvidos.
Uma grande “crítica” dessa corrente se direciona ao vínculo militar sem a qual
a Geopolítica Clássica parecia não existir. Portanto isso conectaria a corrente crítica
à produção acadêmico-científica, em contraposição à “Geopolítica Prática”,
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produzida pelos governos, e à “Geopolítica Popular”, produzida pela mídia e pelos
meios de comunicação.
A Geopolítica Crítica também revisou alguns aspectos que fundamentavam a
Geopolítica Tradicional: a visualização e o mapeamento do espaço global do alto;
sua estrutura binária, que via o mundo de acordo com a categoria nós/eles –
Leste/Oeste; a ideia de desenvolvimento eurocêntrica/ norte-americana, que agora
dá espaço a outros modelos de desenvolvimento; a naturalização da “armadilha
territorial”, que priorizava a ideia de soberania dentro de espaços fechados, como
Estados; o enfoque constante em temas ligados à conquista do poder e o interesse
nacional.
De alguma forma a globalização, além de pano de fundo histórico, contribuiu
para a revalorização da discussão regional. Para Dosenrode (2015, p. 5),
“globalization has played an important role in promoting regionalization”. De acordo
com
Haesbaert
homogeneizadora,
(2010,
o
que
p.
15),
vemos,
“a
apesar
da
propalada
concomitantemente,
é
uma
globalização
permanente
reconstrução da heterogeneidade e/ ou da fragmentação(...)”.
Nesse processo de constante reconstrução, a regionalização pode ser
entendida como uma “onda” da globalização. A integração regional passou por
algumas "ondas” distintas, e considera-se que no século XXI emerge uma nova onda
de regionalização na América Latina, especialmente na América do Sul.
Alguns eventos contribuíram para uma reorganização da geopolítica na
América Latina: Houve um relaxamento da coerção americana na região a partir dos
atentados de 11 de setembro de 2001, que alteraram o foco da política externa de
segurança e defesa estratégica dos EUA; a não conclusão da rodada Doha da OMC
causou obstáculos às exportações de produtos primários entre a América Latina e
os principais países desenvolvidos, principalmente os europeus; a maior demanda
internacional pelas commodities agrícolas, minerais e energéticas; a ascensão
chinesa, que suscitou novas parcerias comerciais com o país asiático; a crise
econômica mundial iniciada em 2008, com efeitos deletérios sobre o crescimento da
maior parte dos países; e, por fim, a eleição de uma série de presidentes de
esquerda na América Latina facilitou o andamento de uma série de propostas de
integração regional (VITTE; PIERI, 2013).
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Criam-se então novas perspectivas para a integração na América Latina como
as possibilidades de fortalecimento do Mercosul (Mercado Comum do Cone Sul)
com as tratativas de acordos com a União Europeia e com a entrada da Venezuela –
que se por um lado aumenta o mercado interno consumidor, por outro causa rachas
internos.
A União de Nações Sul-Americanas (UNASUL), criada em 2008, e que entrou
em vigor em 2011. Composta pelos doze países da América do Sul é uma
organização de propósito abrangente, com uma institucionalidade bem ampla, que
inclui, entre outras instituições, Banco do Sul, CDS, COSIPLAN etc.
A Comunidade dos Estados Latinoamericanos e Caribenhos (CELAC), criada
em 2010, e herdeira da CALC (2008), congrega 32 países da América Latina; A
ALBA (Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América), criada em 2004 e
constituída por Venezuela, Bolívia, Equador, Cuba e outros países da América
Central; a Aliança do Pacífico, estabelecida em 2012 e composta por Chile,
Colômbia, México e Peru; por detrás de todo esse cenário há como pano de fundo a
maior presença chinesa no continente – com a consequente reação americana) e o
avanço da cooperação SUL-SUL.
Pretende-se, portanto, demonstrar de que forma a integração regional pode
contribuir para que as economias em “catch up” alcancem o desenvolvimento,
identificando e superando a lógica de dependência. Defende-se a ideia da
integração regional como uma possibilidade mais adequada para os países em
desenvolvimento adotarem “políticas e instituições mais adequadas ao seu estágio
de desenvolvimento” (CHANG, 2004, p. 232). A análise sobre o papel da CELAC se
faz importante devido às novas possibilidades institucionais que esse grupo enseja.
Para Aravena (2012, p. 57) é preciso destacar “el sentido transcendente de esta
construcción institucional mayor de América Latina y el Caribe”. O mesmo autor
destaca as palavras da presidente brasileira Dilma Rousseff na reunião de cúpula
inaugural da organização, em 2012, afirmando que a CELAC seria uma expressão
da capacidade dos países e da importância estratégica e geopolítica da região
(ARAVENA, 2012).
É preciso encontrar uma organização para a integração regional na América
Latina que supere a desconfiança da pouca eficiência, já que há uma ideia geral de
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que o grande número de organizações voltadas para a integração da América Latina
atrapalhe o avanço das iniciativas.
Um diagnóstico bastante frequente entre especialistas do norte e
também do sul é o de frustração com relação à experiência dos
processos de integração latino-americano que alegadamente se
fragmentaram em inúmeras iniciativas que se sobrepuseram, mas
com fraca articulação entre elas e perda de eficiência e relevância
em vista de suas expectativas iniciais” (LIMA, 2013, p.176).
Ainda em Aravena (2012, p. 61) encontram-se questionamentos sobre três
desafios possíveis que a CELAC deve enfrentar nos próximos anos, e que, com a
superação deles, poderá contribuir bastante para o desenvolvimento do nosso
continente: contribuir para a promoção do desenvolvimento dos países da região,
estabelecer mecanismos para se criar uma comunidade integrada latino-americana,
e ser capaz, mais do que outras iniciativas de integração regional, de ter eficácia,
com instituições que sejam realmente funcionais. Dosenrode (2015, p. 106)
apresenta perspectiva semelhante ao tratar da Unasul, ao dizer que existe ainda um
longo caminho para a consolidação dessa iniciativa.
Essa perspectiva se aproxima daquilo que Aravena (2012) chama de
integração política, uma opção político-estratégica buscando uma alternativa para o
desenvolvimento dos países que a integram. Nesse cenário, projeta-se a
importância das integrações regionais na América Latina como caminho sólido para
a integração regional de todo o continente.
Pretende-se, portanto, demonstrar de que forma a integração regional pode
contribuir para que as economias em “catch up” alcancem o desenvolvimento,
identificando e superando a lógica de dependência. Defende-se a ideia da
integração regional como uma possibilidade mais adequada para os países em
desenvolvimento adotarem “políticas e instituições mais adequadas ao seu estágio
de desenvolvimento” (CHANG, 2004, p. 232).
Por mais que os diferentes graus de diferenciação da estrutura social dos
países condicionem de forma distinta o desenvolvimento econômico desses países,
é preciso que se analisem as possibilidades do desenvolvimento ou estagnação dos
países latino-americanos.
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Nesse “mundo tal como nos fazem crer: a globalização como fábula” expressa
por Santos (2000, p. 18), existe a disseminação de uma ideologia que nos leva a
crer que devemos imitar os modelos de desenvolvimentos dos países anteriormente
desenvolvidos, o que vai acabar por rebater também nos modelos de integração
regional. As iniciativas latino-americanas do século XXI apontam para uma outra
direção,
para
outra
globalização,
a
da
possibilidade
de
modelos
de
desenvolvimentos autônomos mesmo diante de um padrão homogeneizante. Como
nos lembra Santos (2000, p. 21), é possível “conhecer as possibilidades existentes e
escrever uma nova história”.
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