Universidade Federal da Integração Latino-Americana
Fundação Parque Tecnológico Itaipu
Curso de Especialização em Energias Renováveis
Ênfase em Biogás
DISCIPLINA: Fontes de Energia e suas Transformações
PROFESSORES: Carlos Alberto dos Santos, Janine Padilha Botton e Pedro
Henrique Konzen
MÓDULO 2: Fontes Primárias de Energia
2.1 Conceito de Fonte Primária de Energia
O desenvolvimento de um país está diretamente ligado à sua matriz energética, a
qual, por sua vez, depende da acessibilidade de fontes primárias de energia, sobretudo das
fontes renováveis. Um cenário favorável nesses termos determinará a facilidade de acesso
da população à energia elétrica e outros serviços de infraestrutura, saneamento básico,
transporte e telecomunicações.
São consideradas fontes primárias de energia aquelas existentes na natureza, antes
de sua conversão por meio de processos artificiais. Tais fontes podem ser renováveis ou
não renováveis. Exemplos de fontes primárias não renováveis: carvão, nuclear, petróleo,
gás natural e hidrato de gás. As fontes renováveis são: gravitacional, hídrica ou hidráulica,
solar, eólica, geotérmica, marés e biomassa.
Segundo dados da BP Global, no ano de 2007 o petróleo foi a maior fonte de
energia primária no mundo, correspondendo a 3.952 milhões de tep (tep = toneladas equivalentes de petróleo), sendo logo seguido pelo carvão com 3,177 milhões de tep. Além de
o petróleo ser uma fonte de energia primária não renovável, ele é o vilão da saúde pública,
pois a poluição causada por sua utilização origina várias doenças respiratórias na população. Quem aqui tem asma, bronquite, sinusite ou já teve uma doença respiratória?
Além dos fatores citados acima, o aumento populacional juntamente com a elevação no consumo de energia elétrica está obrigando a busca de novas fontes de energia que
não agridam o meio ambiente nem emitam poluentes atmosféricos. Uma saída para driblar
a crise energética é explorar de maneira crescente as fontes de energia renováveis.
2.2 Fotossíntese, Energia e Matéria na Terra
Expresso em termos gerais, a fotossíntese aparenta ser muito simples. Ao incidir
sobre a folha de uma planta, a luz solar produz uma reação fotoquímica (eq. 1.2), tendo
água e gás carbônico como reagentes e oxigênio e glicose como produtos da reação. É o
início da produção de biomassa. Mas bastam umas poucas perguntas sobre detalhes do
processo e logo se descobre sua complexidade. Não é por nada que mais de três séculos
depois de sua descoberta, a fotossíntese continua desafiando nossa inteligência para entender muitos de seus aspectos.
Um desses aspectos pouco compreendidos refere-se à eficiência do processo e sua
comparação com os sistemas fotovoltaicos. Efetuar cálculos comparativos é uma tarefa tão
difícil quanto necessária para o desenvolvimento tecnológico da energia solar. Uma parte
da dificuldade em calcular a eficiência energética da fotossíntese reside na falta de conhecimento detalhado do processo. Um alerta contundente para algumas lacunas nesse conhecimento foi dado recentemente por Marco Sacilotti e colaboradores do Departamento de
Física da Universidade Federal de Pernambuco (SACILOTTI, 2011).
Não resta mais dúvida de que o mecanismo da fotossíntese é controlado pela mecânica quântica. No entanto, a literatura atual não apresenta elementos quantitativos ou
mesmo qualitativos para justificar essa hipótese, afirmam os pesquisadores da UFPE ao
propor modelos para sanar essa dificuldade. Uma das principais deficiências dos modelos
atuais é a falta de uma boa compreensão das forças que determinam o movimento de cargas elétricas positivas e negativas no interior dos sistemas fotossintetizantes.
Se por um lado o tratamento quântico da fotossíntese tem muito a evoluir – o que
representa um vasto campo de trabalho para biólogos, físicos e químicos –, por outro, o
cenário geral do processo já está bem estabelecido. Não há mais questionamento na literatura sobre a natureza inicial do processo, que ocorre quando a luz solar atinge a clorofila e
outros pigmentos fotossensíveis presentes nas folhas de plantas e algas. A energia absorvida nessa interação é transferida para uma enzima estruturalmente complexa, conhecida
como fotossistema II (PSII, na sigla em inglês). O surgimento dessa enzima na Terra é
considerado o “big bang da evolução”. Ela é responsável pela quebra da molécula da água,
que resulta na produção de elétrons e prótons por meio de um processo termodinâmico,
com eficiência de aproximadamente 70% na conversão da energia associada à luz solar
incidente em energia armazenada nas ligações químicas dos produtos formados.
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Para se ter ideia do quão alta é essa eficiência, basta compará-la com os 18% da
mais eficiente célula solar disponível hoje comercialmente. Todavia, até chegar ao estágio
energético utilizável, os sistemas naturais dissipam energia sob diferentes formas e, ao final, a eficiência teórica não ultrapassa 4,5%, e os melhores resultados experimentais não
ultrapassam 3%.
Biólogos, físicos e químicos que trabalham na área acreditam que procedimentos
de engenharia genética possam contribuir para aumentar essa eficiência. Uma possibilidade
seria alargar artificialmente a faixa do espectro solar absorvido por pigmentos fotossensíveis. Os sistemas naturais captam apenas luz na faixa visível para realizar a fotossíntese.
Então, se for possível manipular esses materiais para incluir pigmentos absorvedores de
outras faixas, a eficiência poderá ser maior na medida em que mais energia será captada
para a mesma intensidade de radiação solar.
O processo inverso da fotossíntese é a fotorrespiração, produzida pela ação de
oxigênio sobre glicose, que libera energia sob a forma de água e gás carbônico. A fotorrespiração chega a consumir até 25% da energia inicialmente armazenada na fotossíntese. Para enfrentar essa limitação, a natureza desenvolveu em algumas plantas a fotossíntese C4,
na qual o gás carbônico é fixado em um ácido com quatro átomos de carbono. O resultado
disso é que, ao apresentar maior eficiência na fixação do gás carbônico e pequena perda de
água, as plantas C4 praticamente dispensam a fotorrespiração. Já existem pesquisas em andamento na tentativa de incorporar materiais fotossintetizantes do tipo C4 em plantas, nas
quais inexistem esses componentes.
Vejamos agora alguns desses aspectos um pouco mais detalhadamente, tendo como referência o processo de fotossíntese baseado na clorofila.
2.3 Energia Nuclear
2.3.1 Marie Curie e Rutherford, os Pais da Radioatividade
Experimentos realizados por Becquerel, em 1896, possibilitaram a descoberta da
radioatividade natural, mas, ao contrário do que ficou consagrado, Becquerel não descobriu o fenômeno da radioatividade. Essa descoberta deveu-se às investigações de Marie
Curie, Ernest Rutherford e seus respectivos colaboradores. Abordagens detalhadas sobre
essa questão são apresentadas por Martins (1990) e Quinn (1995). O que se segue é um
resumo dessa história.
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A divulgação da descoberta dos raios X, em dezembro de 1895, motivou inúmeros cientistas a reproduzirem os experimentos do físico alemão Wilhelm Conrad Roentgen.
Becquerel foi orientado por uma hipótese equivocadamente levantada por Jules Henri
Poincaré, em uma sessão da Academia Francesa de Ciências, em janeiro de 1896. Ao relatar os resultados obtidos por Roentgen, Poincaré concluiu que deveria haver uma relação
entre a emissão dos raios X e a fluorescência do vidro de que era feito o tubo de raios X.
Como se sabe, não existe essa relação (SANTOS, 1995). Mas, Becquerel, que era um dos
especialistas em fluorescência, perseguiu esse caminho errado até que Madame Curie e
Rutherford mostrassem que se tratava de um fenômeno de natureza completamente diferente. Foi a Madame Curie quem cunhou o termo radioatividade e descobriu que se tratava
de uma manifestação espontânea de determinados materiais aos quais ela denominou de
radioativos. Em 1898, ela descobriu os elementos químicos Rádio e Polônio. No ano seguinte, Ernest Rutherford inicia suas pesquisas nessa área e identifica três tipos de radiação, alfa, beta e gama; sendo a primeira, o núcleo de hélio (2 prótons e 2 nêutrons); a segunda, o elétron, que havia sido descoberto em 1897, por Joseph John Thomson; a terceira,
a radiação era uma radiação eletromagnética como os raios X (SANTOS, 2008).
Nas três primeiras décadas do século 20, a família Curie (Marie, sua filha Irene e
seu genro Frederic Joliot) daria novas e relevantes contribuições para a física nuclear, e
Ernest Rutherford, com seus experimentos de espalhamento de partículas alfa pela matéria,
propôs o modelo atômico (1911) ainda hoje utilizado em noções elementares de física nuclear, e que, ao ser desenvolvido por Niels Bohr (1913), desembocou no surgimento da teoria quântica. Em 1919, Rutherford produziu a primeira desintegração artificial, bombardeando átomos de nitrogênio com a sua ferramenta predileta – partículas alfa. Nesse experimento, ele descobriu o próton e levantou a hipótese da existência de outra partícula neutra, com massa semelhante à do próton: o nêutron, descoberto 13 anos mais tarde por seu
colaborador James Chadwick. Alguns desses temas serão abordados mais adiante.
2.3.2 Conceitos Básicos
Antes dessa revolução científica iniciada com a descoberta dos raios X e que teve
sua primeira fase culminando com o surgimento da teoria atômica em 1913, passando pela
descoberta da radioatividade, pela teoria quântica de Max Planck em 1900 e pelo miraculoso ano de 1905, com os trabalhos de Albert Einstein, a comunidade científica debatia vigorosamente a questão da natureza corpuscular da matéria. De um lado, os cineticistas, de-
4
fensores do atomismo, e de outro os energeticistas, que defendiam a equivalência quantitativa da energia sem tecer considerações sobre a sua natureza última. Como se sabe hoje,
esse debate travado na época em que se iniciava a revolução foi vencido pelos cineticistas,
de modo que hoje parece não haver dúvida de que todos os objetos naturais, vivos ou inertes, são compostos por átomos, por sua vez constituídos por três tipos de partículas: prótons, nêutrons e elétrons.
É interessante observar que o processo foi muito rápido. Em pouco mais de uma
década (1895-1913) os fundamentos básicos da constituição da matéria foram estabelecidos, embora os detalhes continuem sob investigação. Por exemplo, no início se pensava
que prótons e nêutrons eram partículas elementares. Hoje se sabe que elas são constituídas
de quarks, as verdadeiras partículas elementares. No entanto, a física de partículas elementares ainda é uma área que está longe de uma compreensão que seja, se não consensual,
pelo menos aceitável por grande parte da comunidade científica. Os conceitos fundamentais referentes ao núcleo, essenciais para nossa disciplina, podem ser assim sintetizados:
1. O átomo é constituído de um núcleo com carga elétrica positiva, em volta do
qual se distribui uma carga negativa.
2. As cargas positivas no núcleo são transportadas pelos prótons, enquanto as
negativas o são pelos elétrons. Ambos transportam o que se denomina carga
elementar, e=1,6x10-19 Coulombs. Portanto, a carga nuclear é igual +Ze.
3. Em condições de equilíbrio, o átomo é eletricamente neutro. Portanto, a carga
positiva do núcleo é igual à carga negativa em sua volta. O que significa dizer
que, em condições de equilíbrio, o número de prótons é igual ao de elétrons.
Em inúmeros processos e reações químicas e biológicas, os átomos perdem
momentaneamente alguns dos seus elétrons. Eles ficam ionizados.
4. Além do próton, os núcleos de todos os átomos, exceto do hidrogênio, contêm
uma partícula neutra, denominada nêutron.
5. A massa do átomo está praticamente concentrada no núcleo. Prótons e nêutrons, também conhecidos como núcleons, possuem massas similares e aproximadamente 1840 vezes superior a do elétron.
6. No modelo atômico de Bohr, os elétrons pertenciam a diferentes camadas, caracterizadas por determinados valores de energia. Embora esse modelo simples esteja ultrapassado, ainda é uma imagem útil para fins didáticos. De qual-
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quer modo, continua válida a ideia de estados eletrônicos, caracterizados
energeticamente.
7. Cada átomo é caracterizado pelo seu número atômico, Z, igual ao número de
prótons e de elétrons. Na tabela periódica eles são distribuídos em ordem crescente do valor de Z, do hidrogênio, Z=1, ao Ununóctio (nome provisório),
com Z=118.
8. Outro número associado a cada átomo é seu número de massa, A, igual à soma de prótons e nêutrons. Portanto, o número de nêutrons, N, é simplesmente
A-Z.
9. Alguns elementos químicos se apresentam na natureza com diferentes números de massa. Isto é, possuem o mesmo número atômico e diferentes quantidades de nêutrons. Esses átomos são denominados isótopos.
10. Foram as experiências de Rutherford que permitiram as primeiras estimativas
das dimensões atômicas. O diâmetro atômico é da ordem do angstron (1
Å=10-10 m), enquanto o nuclear é da ordem do fermi ou fentômetro (1 fm=1015
m). Ou seja, como a massa do átomo concentra-se no núcleo, não há exage-
ro em dizer que a matéria é um grande vazio.
11. A faixa de energia apropriada para o estudo de fenômenos atômicos e nucleares situa-se em torno do elétron-volt (1 eV = 1,6x10-19 Joules) e seus múltiplos: o quiloelétron-volt, keV=103 eV, o megaelétron-volt, MeV (lê-se
mév)=106 eV, o gigaelétron-volt, GeV=109 eV e o teraelétron-volt, TeV=1012
eV.
12. Massas atômicas e nucleares são mais convenientemente mensuradas em unidades de massa atômica, amu, na sigla em inglês. Ela foi definida como 1/12
da massa do isótopo carbono-12, ou, na notação científica,
1 amu = 1,66x10-27 kg.
, ou seja:
(2.1)
Convém detalharmos um pouco mais alguns conceitos apresentados acima. Até
este momento, tratamos de dois tipos de interação na matéria. A interação gravitacional,
que entre outras coisas está na origem da hidroeletricidade, e a interação eletromagnética,
responsável pelo funcionamento de todos os artefatos elétricos e eletrônicos. Agora, para
6
entender a existência e como se comporta o núcleo atômico é necessário considerar outro
tipo de interação.
Você viu acima que prótons (carga elétrica positiva) e nêutrons coexistem no interior do núcleo, imprensados num volume reduzidíssimo. Conclui-se que a repulsão elétrica
(repulsão Coulombiana) entre os prótons seja muito intensa, pois ela depende inversamente
do quadrado da distância entre as cargas. Quanto menor a distância, maior a interação. Então, o núcleo não poderia existir se contivesse apenas prótons. São os nêutrons que dão a
estabilidade nuclear. Por meio das interações nucleares, eles funcionam como uma cola.
Não vamos entrar nesse detalhe, nem discutir que existem dois tipos de interações nucleares, a fraca e a forte. É suficiente ter em mente que a matéria existe por causa das interações nucleares e que os nêutrons desempenham papel importante nessa história.
A existência de nêutrons no núcleo sempre se justifica pela satisfação de uma ou
outra condição de equilíbrio. Quando alguma dessas condições é violada, ocorrem fenômenos conhecidos como decaimento (ou desintegração) nuclear. Os diversos tipos de decaimento são reunidos no fenômeno mais amplo que é a radioatividade. É, entre outras coisas, por essa razão que todo elemento químico apresenta mais de um isótopo, embora alguns deles sejam tão instáveis que dificulta sua observação.
Na Figura 2.1 mostra-se que à medida que cresce a quantidade de prótons, cresce
mais a quantidade de nêutrons. O núcleo de hélio mais estável contém 2 prótons e 2 nêutrons, mas o de berílio contém 4 prótons e 5 nêutrons. Mas, é importante observar que,
embora tenha uma tendência linear, a distribuição de nêutrons não segue exatamente uma
reta. Por exemplo, o carbono tem 6 prótons e 6 nêutrons. Observa-se na figura que é a partir de Z=20 que a quantidade de nêutrons se afasta da reta N=Z.
Sem entrar nos detalhes físicos, químicos e matemáticos, podemos dizer que o
resultado das interações nucleares é a existência de uma energia de ligação entre os núcleons. Podemos apreciar a existência dessa energia simplesmente examinando as massas de
alguns núcleos, como aquelas expostas na Tabela 2.1.
Se o deutério contém 1 próton e 1 nêutron, por que sua massa é menor do que a
soma das massas, Mp+Mn? Para onde vai a massa restante? Essa massa transforma-se em
energia, a energia de ligação nuclear. Esse é um resultado geral: quando dois ou mais núcleons se combinam para formar um núcleo, a massa total do núcleo é sempre menor do
que a soma das massas dos núcleons. O que sobra se transforma em energia para manter o
núcleo. Muito antes dessa comprovação, Einstein já tinha determinado essa relação a partir
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de um contexto completamente diferente, ou seja, a partir da sua teoria da relatividade restrita. O caso é interessante, mas é outra história e não cabe discuti-la. Cabe simplesmente
apresentar a relação que ficou conhecida como equivalência massa-energia:
,
(2.2)
onde MA é a massa atômica do núcleo e c é a velocidade da luz no vácuo (3x108 m/s).
Tabela 2.1 – Massas atômicas de alguns núcleos e do nêutron.
Nome
Símbolo (
)
Massa (amu)
Próton
1,007825
Nêutron
1,008665
Deutério ou Dêuteron
2,014102
Trítio
3,016030
Hélio 3
3,016030
Partícula alfa
4,002604
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Figura 2.1 – Gráfico do número de nêutrons versus o número de prótons. As cores representam a meia-vida
dos isótopos, de acordo com a escala à direita. Extraída de
<http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Isotopes_and_half-life.PNG>.
A partir da relação acima é fácil mostrar que a energia de ligação do dêuteron é
aproximadamente 2,22 MeV. Para resolver esse tipo de problema convém transformar amu
em unidades de energia. A partir da equivalência massa-energia obtém-se:
1 amu = 931 MeV.
(2.3)
2.3.3 Radioatividade Natural
Existem vários tipos de transformações, entre as quais aquelas que resultam na
radioatividade natural e que ocorrem espontaneamente. Trata-se do fenômeno também conhecido como decaimento radioativo, resultado da instabilidade nuclear que aumenta na
mesma proporção do crescimento do número de núcleons. O decaimento é seguido pela
emissão dos três tipos de radiação mencionados acima: radiação ou partículas alfa (núcleos
de hélio-4,
; radiação ou partículas beta (elétrons) e raios gama (radiação eletromagné-
tica, tipo raios X).
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Sem entrar em detalhes, podemos dizer que o fenômeno, característico de cada
elemento radioativo, apresenta uma regularidade impressionante. Por exemplo, cada elemento tem uma meia-vida típica e decai exponencialmente conforme essa meia-vida. A
meia-vida é o tempo necessário para que a metade dos elementos apresente o decaimento.
Portanto, quanto maior a meia-vida, mais tempo será necessário para que todos os isótopos
desapareçam. Por exemplo, a meia-vida do urânio-238 é de 4,5 bilhões de anos.
2.3.4 Radioatividade Artificial
O primeiro passo para a realização da radioatividade artificial foi dado por Rutherford, em 1919, ao bombardear átomos de nitrogênio com a sua ferramenta predileta –
partículas alfa, resultando na seguinte reação:
.
(2.4)
Trata-se de uma reação de transmutação nuclear, pois o nitrogênio foi transformado em oxigênio e próton, que é ejetado com a energia excedente. Foi nesse experimento
que Rutherford descobriu o próton. Mais do que isso, previu a existência de outra partícula
no interior do núcleo que deveria ser eletricamente neutra, com massa similar à do próton.
Era o nêutron, que só foi descoberto em 1932 pelo seu colaborador James Chadwick. Como todos os elementos envolvidos nessa reação ocorrem na natureza, ela não representa o
fenômeno da radioatividade artificial, reconhecida como tal depois do experimento realizado pelo casal Frederic Joliot-Curie e Irene Curie, em 1934:
.
(2.5)
O fósforo-30 jamais foi observado na natureza, portanto é bastante provável que
se trate de um elemento artificial. O casal Curie ganhou o Prêmio Nobel de Química de
1935 por ter realizado a síntese de novos elementos radioativos.
Daqui em diante você vai trabalhar com reações similares a essas apresentadas
acima, de modo que é importante observar os princípios de conservação de massa e de carga elétrica expressos nas equações. Assim, a carga total dos reagentes, 13+2, é igual à car-
10
ga total dos produtos, 15+0. Da mesma forma, a massa total dos reagentes, 27+4, é igual à
massa total dos produtos, 15+0.
2.3.5 Fusão e Fissão
A principal fonte de energia à nossa disposição é a que vem do Sol e resulta de
processos de fusão de átomos leves formando átomos mais pesados. Como as massas desses últimos são menores do que a soma das massas dos menores, a massa restante é transformada em energia e liberada para o espaço, chegando à Terra sob diferentes formas. Embora a essência da reação de fusão nos aparenta simples, o processo inteiro é bastante
complicado, ainda sujeito a debates na literatura científica. Então, vamos examinar apenas
dois casos simples para ter ideia do processo de geração de energia. O primeiro caso é uma
reação muito lenta, que se acredita ocorrer no Sol, por meio do ciclo carbono-oxigênionitrogênio, cujo resultado final é:
.
(2.6)
Portanto, 4 átomos de hidrogênio se fundem para formar 1 átomo de hélio, 2 pósitrons (
), 2 neutrinos ( ) e dois raios gama ( ). Como a massa de 4 átomos de hidrogênio
é maior do que a soma das massas dos produtos, a reação libera 26,8 MeV, correspondente
ao excesso de massa. O pósitron é a antipartícula do elétron. Tem propriedades físicas
idênticas às do elétron, exceto a carga elétrica, que é positiva. O neutrino é uma partícula
elementar sem carga elétrica e massa quase nula.
Em laboratório, as reações mais promissoras para o uso da fusão nuclear fazem
uso do deutério. É possível ocorrer reações sequenciais, de modo que o resultado final seja
a produção de 2 átomos de hélio a partir de 4 deutérios, conforme a reação
.
(2.7)
É interessante observar nesta reação que o rendimento energético por unidade de
massa atômica é de aproximadamente 6 MeV, quase 10 vezes o rendimento obtido na fissão de U-235, que é de aproximadamente 0,85 MeV.
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Infelizmente, esse extraordinário rendimento energético ainda não pôde ser aproveitado para a geração de energia em aplicações fora dos laboratórios de pesquisa. Já a fissão nuclear desembocou na triste utilização da bomba poucos anos depois da sua descoberta. A possibilidade para a obtenção da fissão foi aberta com a descoberta do nêutron, em
1932. Sendo uma partícula pesada, sem carga elétrica e com energia na faixa do MeV, essas partículas não sofrem a repulsão eletrostática da carga nuclear, razão pela qual penetram facilmente na matéria.
Entre 1938 e 1939, Otto Hahn, Lise Meitner, Fritz Strassmann e Otto Frisch
(HAHN, 1946) mostraram que núcleos de urânio são divididos quase ao meio quando
bombardeados por nêutrons lentos, ou térmicos, como são conhecidos na literatura especializada. Depois dos experimentos pioneiros, outras reações foram descobertas, com nêutrons de diferentes energias e outros isótopos radioativos físseis (nem todos os isótopos
radioativos são fissionáveis), mas o exemplo clássico é a fissão do urânio-235 quando
bombardeado por nêutrons lentos (energia inferior a 1 MeV). O nêutron penetra no núcleo,
deixando-o em um estado excitado.
Vale a pena abrirmos um parêntese para um esclarecimento válido em outras situações. Estado excitado significa situação com excesso de energia. Isso é assim no caso
atômico, onde o estado excitado ocorre com reposicionamento de elétrons que gravitam em
torno do núcleo, e no caso nuclear, onde algo similar acontece com o reposicionamento
dos núcleons. Esses reposicionamentos representam situações fora do equilíbrio. Cedo ou
tarde, o sistema (atômico ou nuclear) voltará ao estado inicial ou produzirá novo estado de
equilíbrio, liberando a energia excedente, representada pela diferença entre a energia do
estado excitado e a energia da nova situação de equilíbrio. Em muitos casos atômicos, e em
alguns nucleares, a nova situação de equilíbrio é na verdade a situação inicial, anterior à
excitação.
Agora voltemos ao U-235, que ao absorver um nêutron lento passou a um estado
excitado. O importante aqui não é detalhar o estado excitado. O importante é ter em mente
que o estado excitado representa estado fora do equilíbrio e que há um excesso de energia.
A natureza não suporta estado de desequilíbrio. Ela sempre dá um jeito de sair dele, indo
para um novo estado de equilíbrio para o estado inicial. Se para isso ela tem que se livrar
de excessos de energia, ela se livra. Quando possível, ou quando o homem maneja a situação com inteligência, a liberação do excesso de energia é usada em nosso proveito tecnológico.
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De um modo bastante simples e sintético, os estados inicial e final de um processo
de fissão pode ser representado por esta equação:
.
(2.8)
No caso do U-235 excitado pelo nêutron, o retorno a um novo estado de equilíbrio
é muitas vezes representado na literatura pela reação:
.
(2.9)
Na verdade, os 200 MeV resultam de vários outros produtos da reação, bem como
das energias com as quais os fragmentos (criptônio e bário) são ejetados, conforme valores
expostos na Tabela (2.2).
Então, o rendimento energético só será aproveitado se for possível converter todas
essas energias em calor ou trabalho. Por exemplo, ainda não é possível aproveitar a energia
dos neutrinos. É por isso que o rendimento por unidade de massa na fissão do U-235 é estimado como sendo 190/235=0,85 MeV.
A alta quantidade de energia liberada pela fissão nuclear é um motivo para sua
utilização, apesar dos resíduos nucleares serem milhões de vezes mais concentrados do que
os resíduos de uma reação química normal, quando se compara volumes produzidos. Alguns desses resíduos são nocivos ao ser humano, mas seu volume é pequeno e uma solução
temporária é estocá-lo para uma posterior eliminação.
Tabela 2.2 – Balanço energético na fissão do U-235. Fonte: Murray [s.d.].
Fonte da energia
Energia cinética total dos fragmentos da fissão
MeV
166
Energia cinética dos nêutrons
5
Energia dos raios gama imediatos
7
Energia dos raios gama dos produtos da fissão
7
Energia cinética das partículas beta
5
Energia cinética dos neutrinos
TOTAL
10
200
13
Quando se compara os custos, as reações nucleares podem produzir quantidades
consideráveis de energia com custo altamente competitivo com outras fontes de energia.
Mas, apesar de seu custo competitivo, existe um grande medo em se utilizar essa fonte de
energia, em parte, originário do uso da bomba atômica em 1945.
2.3.6 Aplicações tecnológicas
O aproveitamento da energia da fissão nuclear é realizado por meio de um sistema
denominado reator nuclear, no qual é mantida a reação de fissão em cadeia sustentada por
nêutrons. Sua estrutura varia de acordo com a sua finalidade (feixes de nêutrons para aplicações científicas, tecnológicas ou médicas; calor para aquecimento industrial ou urbano;
energia mecânica para propulsão naval; ou eletricidade). Considerando apenas as centrais
nucleares que produzem eletricidade, sua vantagem é a capacidade de produzir grandes
quantidades de calor a baixo custo. Esse calor é usado para produzir vapor que aciona um
grupo de turbinas semelhantes àquelas usadas em usinas de energia que queimam combustíveis fósseis.
O primeiro reator nuclear foi construído por Enrico Fermi e sua equipe em 1942,
debaixo das bancadas de um estádio de Chicago, para produzir a bomba nuclear. Sua potência era muito baixa, menos que 0,5 W. O uso pacífico, como a produção de eletricidade,
se deu pela primeira vez em 1951, no local chamado Idaho Falls nos Estados Unidos, mas
foi somente em 1954 que o primeiro reator nuclear foi ligado à rede elétrica em Obninsk,
nas proximidades de Moscou. Na França, o primeiro reator, com potência de 40 MW, foi
encomendado em Marcoule em 1956. Em 2006, 441 reatores nucleares com potência elétrica total de cerca de 380 TW produziram mais de 2.600 TWh de eletricidade, que representa, em termos de equivalente de petróleo, quase 0,7 Gtep ou pouco mais de 16% da
produção elétrica total, e quase o equivalente do gerado pela hidrelétrica.
O princípio de funcionamento do reator nuclear é o seguinte: o metal radioativo é
colocado na forma de cilindros dentro do núcleo do reator, que também precisa conter cilindros ou placas de um material moderador, geralmente grafite, que absorve parte dos
nêutrons emitidos. É necessário o resfriamento do núcleo do reator, o que é realizado com
o auxílio de um fluido, que pode ser líquido ou gasoso, que circula no seu interior. O calor
retirado do sistema é transferido por permutação para outra tubulação, onde circula água,
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transformando-a em vapor superaquecido (320ºC), que vai movimentar as pás da turbina
acopladas a um gerador, produzindo eletricidade. Após movimentar as pás da turbina, este
vapor é liquefeito e a água é reconduzida para a tubulação, onde é novamente aquecida e
vaporizada. A figura 2.2 mostra o diagrama do reator de uma usina nuclear.
Figura 2.2 - Diagrama do reator de uma usina nuclear. Fonte: Goldemberg (2008).
Segundo dados da Eletrobrás Eletronuclear, o Brasil tem duas usinas nucleares
(Angra 1 – PWR, 637 MW e Angra 2 – PWR, 1350 MW) em operação, cuja produção de
eletricidade em 2009 foi de 12,97 TWh ou 2,93% da energia elétrica do país; e uma usina
em construção (Angra 3 – PWR, 1405 MW) com obras iniciadas em 2010, após ampla negociação com a prefeitura de Angra dos Reis com respeito à licença de uso do solo e às
compensações ambientais e sociais, cujo montante de investimentos chegam a 317 milhões
de reais.
Com relação a combustível no Brasil, as estimativas das reservas de Santa Quitéria (Ceará) chegam a 142,5 mil toneladas de urânio. O país tem ainda em produção a mina
de Caetité (Bahia) que está ampliando a produção.
O Brasil possui ainda quatro reatores de pesquisa, sendo que o maior deles é usado para produzir radioisótopos, que são usados na indústria e na medicina. Dentre as diversas aplicações médicas desses elementos, destacam-se os contrastes usados em exames diagnósticos e para tratamento de tumores. Porém, o Brasil não é autossuficiente em radiofármacos.
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2.4 Energia Solar
2.4.1 Origem e Quantidade da Energia Solar Disponível na Terra
A origem da energia solar é o processo de fusão discutido acima. O conjunto de
todos os processos de fusão no Sol resulta em um fluxo luminoso, na Terra, de aproximadamente 1.368 W.m-2. Esta é a quantidade total de energia recebida por unidade de superfície e tempo da região externa da atmosfera da Terra, mas a quantidade real de energia
que chega ao nível do solo é menor. A maior quantidade de energia conseguida é cerca de
1000 W.m-2 (isso quando o Sol está em seu auge). Na superfície da Terra, nem todos os
comprimentos de onda da radiação do Sol são recebidos com a mesma intensidade e, felizmente, a perigosa radiação ultravioleta é filtrada pela camada de ozônio.
A radiação na Terra é proporcional às condições da superfície, ou seja, é dependente do dia e da noite, da estação do ano, da latitude e até mesmo depende da presença de
nuvens no céu. Assim, a média de luz recebida é aproximadamente 20% do fluxo luminoso
da energia solar. Ela varia entre 6 kWh.m2.dia-1 em desertos como o Saara e menos que 1
kWh.m-2.dia-1 na região dos pólos. Na França, a radiação solar varia entre 3 e 5 kWh.m2
.dia-1. Já em países localizados nos trópicos existe maior proporção de energia recebida
por radiação solar direta.
A energia solar que chega à Terra é equivalente a 1,56 x 1018 kWh, ou aproximadamente 15.000 vezes a energia consumida no mundo. Toda essa energia é transformada
em diferentes modalidades conforme as proporções apresentadas na Tabela (2.3).
A energia solar pode ser utilizada tanto para produzir calor (energia térmica solar)
quanto eletricidade (energia fotovoltaica), conforme detalhes apresentados a seguir.
Tabela 2.3 – Repartição da radiação solar recebida pela Terra. Fonte: Ngô (2010)
Modalidade da energia
Proporção (%)
Radiação infravermelha absorvida como calor e posteriormente
devolvida ao espaço
Radiação refletida para o espaço
Ventos
Evaporação de água e gelo
Fotossíntese (produção de biomassa)
45
30
2
22
0,06
16
2.4.2 Energia Solar Térmica
A radiação solar pode ser aproveitada para produzir calor por meio de painéis solares, geralmente metálicos, com uma superfície escura para absorver melhor a radiação
solar. O aquecimento de fluidos pelo aproveitamento térmico é feito com o uso de coletores ou concentradores solares. Os concentradores solares são para aplicações como secagem de grãos e produção de vapor, pois alcança uma temperatura mais elevada.
Nos aquecedores solares domésticos, como aquele da ilustração exibida na figura
2.3, a água aquecida pode ser utilizada diretamente ou ser usada como um trocador de calor para aquecer um cilindro de água. É necessário o auxílio de uma caldeira de aquecimento quando não há radiação solar. Coletores solares produzem entre 200 e 800 kWh.m-2
por ano. Quanto ao investimento, um painel solar com área superficial entre 3 e 5 m2, que é
suficiente para aquecer água para uma família de quatro pessoas, custa entre 4.000 e
10.000 reais. Para quem deseja instalar esse sistema em sua casa ou local de trabalho, estima-se que sejam necessários aproximadamente 1 m2 de coletor solar para cada 10 m2 de
habitação. Sua utilização permite uma economia de 50 a 60% do custo com aquecimento.
A eficiência térmica de um coletor solar é aproximadamente 50%.
Figura 2.3 - Sistema solar de aquecimento de água. Adaptado de Green et al.(2000).
A energia térmica solar também pode ser usada para produzir eletricidade através
de um processo termodinâmico. Esse processo ocorre somente com elevada temperatura,
assim é necessário fazer a concentração dos raios solares com o auxílio de espelhos. A
temperatura alcançada é extremamente alta, chegando até 1.000ºC.
17
Usinas solares já estão em funcionamento e usam refletores parabólicos para a
concentração de raios solares, e podemos citar como exemplo a Usina Solar localizada na
Califórnia que possui uma capacidade instalada de 354 MW. Outros tipos de usinas solares
funcionam em fase experimental como, por exemplo, a Torre Térmica Solar do sudoeste da
França. Essas usinas têm uma eficiência de 10 a 15% e o custo do kWh de eletricidade é
em torno de 9 a 15 centavos de euro – relativamente caro comparado com os métodos convencionais de produção de eletricidade. Este valor em reais é equivalente a R$ 0,22 a R$
0,36. Se olharmos no endereço eletrônico da Copel (Cooperativa Paranaense de Energia
Elétrica), o custo de 1 kWh é R$ 0,46. Assim, será que a energia solar é mesmo cara? É
algo para ser pensado. Do meu ponto de vista, as usinas solares são mais apropriadas para
países onde a radiação solar é mais intensa.
2.4.3 Energia Solar Fotovoltaica
Costuma-se confundir o efeito fotovoltaico com o efeito fotoelétrico, discutido na
seção 2.2. Embora o primeiro tenha o segundo em parte do seu mecanismo – no efeito fotovoltaico ocorre o efeito fotoelétrico – os resultados finais são diferentes. O efeito fotovoltaico ocorre em junções de materiais semicondutores diferentes. Num deles, o elétron
é liberado pelo efeito fotoelétrico e migra para o outro.
Ambos os fenômenos só podem ser explicados com base na teoria quântica, mas
eles foram observados e empiricamente tratados muito antes da consolidação dessa teoria.
Tudo indica que o primeiro relato a respeito do efeito fotovoltaico foi apresentado por Edmond Becquerel (pai de Henri Becquerel), em 1839. Ele observou que ao incidir luz sobre
um eletrodo de platina coberto com prata, imerso em um eletrólito, surgia uma corrente
elétrica proporcional à intensidade luminosa. Depois da descoberta da fotocondutividade
do silício por Smith em 1873, o mesmo efeito foi observado sobre um material sólido por
Adams e Day em 1877. O primeiro dispositivo fotocondutivo, com eficiência de 1%, foi
elaborado em 1914 para a fabricação de fotômetros, e a primeira célula solar, com eficiência de 6%, foi fabricada nos Laboratórios Bell, o berço do transistor, no início dos anos
1950. Em 1958 esse sistema já apresentava eficiência de 14%.
São inúmeros os dispositivos fabricados com células fotovoltaicas e utilizados em
satélites, relógios, calculadoras, máquinas fotográficas e filmadoras, entre outros produtos
tecnológicos. Especialmente interessante é a utilização desses dispositivos para a geração
de eletricidade em residências, como ilustrado na Figura 2.4.
18
Figura 2.4 - Sistema de geração fotovoltaica de energia elétrica. Extraído de
<www.aneel.gov.br/aplicacoes/atlas/pdf/03-Energia_Solar(3).pdf>.
Acesso em 14.07.2011.
2.4.4 A Energia Solar no Brasil
O aproveitamento da energia solar no Brasil ainda é pequeno, considerando-se o
seu potencial. Excetuando a utilização em prédios comerciais e residenciais, para aquecimento de água, nada mais de relevante existe que não seja em fase de projeto.
Segundo dados de 2009 da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), existem
vários projetos em andamento referentes ao aproveitamento da energia solar no Brasil. Esses projetos empregam o sistema fotovoltaico para geração de eletricidade, principalmente
visando o atendimento de comunidades onde o acesso da energia elétrica por redes de
transmissão é dificultado e comunidades carentes. Parcerias com órgãos internacionais,
como a Agência Alemã de Cooperação Técnica e o Laboratório de Energia Renovável dos
Estados Unidos, têm auxiliado no desenvolvimento desses projetos.
2.5 Energia da Biomassa
Biomassa é a energia estocada em matéria viva como material de plantas e animais, incluindo resíduos e desperdícios. Esse material orgânico tem como base o carbono,
que reage com oxigênio por reação de combustão e de processos metabólicos naturais para
liberar calor. Esse calor pode ser superior a 400ºC, o qual pode gerar trabalho e energia
elétrica. O material orgânico inicial pode ser transformado quimicamente e biologicamente
para a produção de biomassa e biocombustíveis, sendo este último uma forma de combustível utilizado para os transportes como, por exemplo, gás metano, etanol líquido, ésteres
19
metílicos, óleos e carvão sólido. O conjunto de biomassa e biocombustíveis pode ser chamado de bioenergia.
O ser humano usa a madeira para gerar calor desde os tempos primórdios. A utilização de biomassa é uma forma indireta para o uso da energia solar, pois a energia inicial
do sistema de biomassa-oxigênio é capturada da radiação solar na fotossíntese. Quando
liberada em combustão, a energia do biocombustível é dissipada, porém, os elementos do
material devem estar disponíveis para reciclagem em processos ecológicos naturais ou
agrícolas. Assim, o uso de biocombustível industrial, quando ligado cuidadosamente ao
ciclo ecológico natural, pode ser não poluente e sustentável. Esses sistemas são chamados
de agroindústrias, das quais as mais conhecidas e utilizadas são as indústrias de cana-deaçúcar e produtos florestais. No entanto, cada vez mais tem se diversificado os exemplos
de matéria-prima utilizada para a produção de energia a partir de culturas agrícolas.
A massa de matéria seca de material biológico que possui ciclo de vida na biosfera é aproximadamente 250 x 109 t.ano-1, incorporando cerca de 100 x 109 t.ano-1 de carbono. A energia associada à fotossíntese é 2 x 1021 J.ano-1 (equivalente a 0,7 x 1014 W). Como 0,5% em peso da biomassa é oriunda do cultivo de plantas e grãos pelo homem, sua
produção varia com as condições locais.
A biomassa fornece aproximadamente 13% da energia necessária para o consumo
humano, incluindo o uso doméstico. Este percentual é comparável à energia proveniente de
gases fósseis. O uso doméstico de biocombustíveis como resíduos de esterco, madeira e
plantas tem elevada importância, pois aproximadamente 50% da população mundial utiliza
esse sistema. Entretanto, se comparada à utilização industrial da energia da biomassa, esta
é relativamente pequena na maioria dos países, exceto em países produtores de cana-deaçúcar onde o resíduo, bagaço, é queimado para gerar calor, podendo até gerar energia elétrica.
Se a biomassa é considerada uma fonte de energia renovável, seu crescimento deve pelo menos manter o ritmo do seu uso. Dentro desse pensamento, essa alternativa energética pode ser desastrosa para a ecologia local e controle do clima global devido ao elevado consumo de lenha, o que provoca progressivamente a devastação das florestas mundiais.
O carbono na biomassa é obtido a partir do CO2 na atmosfera via fotossíntese e
não a partir de fontes fósseis. Quando a biomassa é queimada ou digerida, o CO2 emitido é
reciclado na atmosfera, e ele não é adicionado à concentração de CO2 atmosférico, pois é
20
consumido durante o crescimento da biomassa. Assim, a energia oriunda de biomassa é
considerada “carbono neutro”. Esse é o diferencial quando comparada com o uso de combustíveis fósseis que liberam grande quantidade de CO2 quando queimados. Assim, o uso
de biocombustíveis renováveis, em grande escala, é um componente importante das políticas de médio e longo prazo que têm a finalidade de diminuir a emissão de gases causadores do efeito estufa.
O armazenamento da energia solar utilizando biomassa e biocombustíveis é de
fundamental importância. Assim como outras tecnologias, o uso de bioenergias tem como
finalidade produzir combustíveis convenientes a preços econômicos, incluindo combustível líquido para transporte.
Calculando a energia calorífica disponível na combustão, equivalente na prática à
entalpia ou à densidade de energia, esta varia de 8 MJ.kg-1 (madeira “verde” não desidratada) e 16 MJ.kg-1 (madeira seca), a 40 MJ.kg-1 (óleos e gorduras) e 56 MJ.kg-1 (metano).
O sucesso da biomassa é regulado por princípios que nem sempre são apreciados,
tais como:
a) Toda a atividade da biomassa produz uma vasta gama de produtos e serviços.
Por exemplo, quando o açúcar é feito da cana, muitos produtos comerciais podem ser obtidos a partir do melaço e das fibras de resíduo. Se a fibra é queimada, então qualquer calor produzido pode ser usado para gerar eletricidade.
A água de lavagem e as cinzas podem retornar ao solo e serem usadas como
adubos.
b) Alguns produtos combustíveis de alto valor podem necessitar mais do que
baixa quantidade de energia quando são manufaturados, por exemplo, o etanol
a partir do amido e do hidrogênio. Como a relação energética é maior que 1, a
deficiência de energia precisa ser compensada por um processo mais barato, e
este pode ser oriundo do consumo de outros materiais, como resíduos de florestas, colheitas e outras fibras.
c) O benefício econômico total das agroindústrias tende a ser generalizado, apesar de ainda ser difícil de avaliar. Porém, um dos benefícios possíveis é o aumento da economia e do emprego local.
d) A produção de biocombustível só é suscetível de ser econômica quando utiliza
materiais já concentrados, provavelmente de um subproduto disponível a baixo custo ou de renda extra passível de tratamento e remoção do meio ambien-
21
te. Assim, o mais aconselhável é a produção de energia perto do local onde é
gerado o resíduo que é o suprimento de biomassa. Como exemplos podemos
citar os resíduos de dejetos de animais, sobras e aparas de serrarias, esgotos
municipais, cascas e conchas de coco e palha de sereais. É de extrema importância a identificação e quantificação desses fluxos de biomassa na economia
local ou nacional para então ser especificada a biomassa mais provável. A cultura exclusiva para a biomassa deve ser fundamentada no custo-efetividade,
principalmente quando serão utilizados subsídios agrícolas.
e) O principal perigo da utilização do solo para produzir biomassa para combustível provém do desmatamento de áreas, erosão do solo e a troca de culturas
alimentares por culturas de combustível.
f) Os biocombustíveis são materiais orgânicos, por isso há sempre a alternativa
de utilizar esses materiais como matéria-prima de produtos químicos e materiais estruturais. Por exemplo, o óleo de palma é um importante componente de
sabonetes, muitos plásticos e produtos naturais, além de outros produtos que
são constituídos de fibras de plantas como compósitos.
g) Quando o processo de combustão de biomassa é mal controlado, pode produzir poluição indesejada, havendo a necessidade de se implantar um processo
de biomassa moderno com extremo cuidado.
h) O uso de biocombustíveis sustentáveis na substituição de combustível fóssil
diminui a emissão de CO2, reduzindo assim as mudanças climáticas.
2.5.1 Produção de Biomassa
Quando falamos da produção de biocombustíveis, o interesse maior é na possibilidade deles substituírem o petróleo. Eles podem ser misturados com combustíveis tradicionais na proporção de 5 a 10%, ou mais. Existe a possibilidade de se produzir etanol ou
outro derivado do éter, o ETBE (etil terc-butil éter). Ambos podem ser usados como combustível ou misturados com petróleo. O diesel também pode ser substituído pelo metil éster
produzido do óleo de colza. Os biocombustíveis utilizados atualmente são descritos como
biocombustíveis de primeira geração.
A produtividade do biocombustível depende da cultura obtida pela agricultura.
Um hectare de trigo produz 2.500 L de etanol, enquanto que um hectare de beterraba produz 6.500 L. Um hectare de colza produz 1.300 L de éster. O balanço energético, que é a
22
razão entre a energia que pode ser obtida e a necessária para obtenção do biocombustível,
depende da natureza do combustível e do tipo de cultura. Devido a esse fator, existem otimistas e pessimistas sobre a produção de biocombustíveis, principalmente pelo fato da cultura usada para sua fabricação concorrer com a produção de alimentos e assim elevar o
preço deste último.
Sabemos que o Brasil é um grande produtor de biocombustível etanol, principalmente oriundo do cultivo da cana-de-açúcar. Uma vantagem dessa matéria-prima é a possibilidade de queimar o bagaço e usar e energia da queima no processo de produção do biocombustível. Em relação à poluição, a vantagem consiste na emissão de menos dióxido de
enxofre, SO2, e CO2. Porém, existe um aumento na emissão de óxidos de nitrogênio devido
a esses combustíveis conterem mais oxigênio do que o petróleo e ocorrer a produção de
aldeído.
Os biocombustíveis de segunda geração utilizam a madeira-celulose de biomassa
(madeira, palha, resíduo de floresta, etc.) que tem a vantagem de ser cultivada sem fertilizantes. As plantas que crescem rapidamente, como árvores e arbustos de matagal, proporcionam um maior rendimento. O objetivo é usar todas as plantas. Depois da gaseificação
da biomassa, os combustíveis podem ser sintetizados pelo método Fischer-Tropsch. A
grande vantagem dos biocombustíveis de segunda geração é não utilizar cultura alimentar.
2.5.2 A geração de Energia Elétrica a Partir da Biomassa no Brasil
Segundo dados da Aneel, a produção de biomassa tem crescido no Brasil, principalmente em sistemas de cogeração. Em 2007, a biomassa correspondeu a 3,7% da oferta
total de energia elétrica, ficando em segundo lugar na matriz energética nacional. A biomassa só é superada pela hidreletricidade.
O Banco de Informações de Geração da Aneel publicou em 2008 que existem 302
termelétricas movidas à biomassa no Brasil, o que corresponde a 5,7 mil MW instalados.
Dessas, 13 são abastecidas por licor negro (resíduo da celulose), 27 por madeira, 3 por biogás, 4 por casca de arroz e 252 pelo bagaço de cana.
De acordo com estimativas da União da Indústria de Cana-de-Açúcar de São Paulo, a provisão é que em 2020 a eletricidade produzida a partir da biomassa poderá representar 15% da matriz brasileira. Esse valor pode ser alcançado com o auxílio da evolução
da regulamentação, da legislação e dos programas oficiais que estimulam os empreendimentos no setor de biomassa.
23
2.6 Energia Eólica
A energia eólica é a energia obtida dos ventos, mais especificamente do movimento de migração das massas de ar decorrentes das diferenças de temperaturas na superfície da Terra que geram uma energia cinética.
A utilização da energia eólica para gerar energia mecânica é conhecida há muito
tempo. Essa energia mecânica era essencial na navegação, principalmente a comercial, na
moagem de grãos e em sistemas de bombeamento de água.
Atualmente a geração de energia eólica se dá com o auxílio de aerogeradores (turbinas eólicas). Os aerogeradores são um tipo de imensos cata-ventos que possuem um rotor. As pás do cata-vento se movimentam em contato com o vento, gerando assim a energia
mecânica que aciona o rotor e gera a energia elétrica. A quantidade de energia elétrica produzida depende da densidade do ar, da área coberta pela rotação das pás e da velocidade do
vento.
Seguindo o mesmo caminho das outras fontes de energia, o sistema para a geração
de energia eólica também evoluiu ao longo dos anos, principalmente no desenvolvimento
de equipamentos capazes de aproveitar melhor a energia mecânica para convertê-la em elétrica. Como exemplo, pode-se citar o diâmetro da turbina que passou de 20 para 100 m e
assim a potência média alcançada passou de 50 kW para 5.000 kW. Juntamente com o aumento do diâmetro da turbina, sua altura foi aumentada em cinco vezes.
Como vamos conseguir energia solar em um local de pouca luminosidade? O
mesmo pode ser aplicado para a energia eólica. Posso instalar uma usina de energia eólica
em qualquer local? Quais os fatores que devem ser considerados para a instalação de um
parque eólico? Os fatores são a densidade do ar, a intensidade do vento, sua direção e velocidade que podem ser analisados a partir do relevo da região, a vegetação e as interações
térmicas entre a superfície da Terra e a atmosfera.
O levantamento do potencial eólico mundial não nos fornece valores concretos,
somente uma estimativa de que possam ser produzidos 500.000 TWh por ano, porém apenas 10% da energia eólica é aproveitada devido a restrições socioambientais.
Apesar de ser aproveitada uma pequena fração do potencial eólico, essa energia
está crescendo no mundo todo, principalmente em países europeus, na América do Norte e
Ásia. A Europa é que explora mais a energia eólica e, segundo dados, em 2006 essa ener-
24
gia cobria 2,8% do consumo de energia elétrica naquela região. Havia a perspectiva para
ter uma potência instalada de 75.000 MW em 2010 e 180.000 MW em 2020.
Esse crescimento é alavancado por vários fatores científicos e tecnológicos, tais
como:
a) A energia eólica é abundante, o vento é inesgotável. É, portanto, um recurso
verdadeiramente renovável.
b) A energia eólica é limpa e as turbinas eólicas não poluem. Elas não liberam
substâncias nocivas ao meio ambiente nem produzem resíduos. Assim, contribuem para a redução significativa na emissão de gases de efeito estufa.
c) A indústria eólica tem um grande potencial de geração de empregos tanto na
sua fabricação quanto instalação.
O ponto a ser questionado ainda sobre esse tipo de energia é o apoio por parte dos
governos no que tange aos investimentos e à política na sua regulamentação.
A energia eólica depende de uma fonte de energia intermitente e difícil de ser
programada. Sua inserção na rede elétrica causa problemas e restrições específicas que devem ser consideradas pelos operadores. Quando se “injeta” energia na rede de distribuição,
o desejo é a produção de energia e não a degradação na qualidade da tensão no sistema.
Considerando essa possibilidade, estão cada vez mais rigorosas as exigências técnicas com
relação às regras de conexão às redes.
2.6.1 Geradores Eólicos
As turbinas de vento são usadas para converter energia eólica em energia cinétrica. Essa conversão ocorre em duas etapas:
a) Ao nível da turbina, que remove uma parte da energia cinética do vento disponível para conversão em energia mecânica;
b) Ao nível do gerador, que recebe energia mecânica e converte em energia elétrica que é transmitida para a rede elétrica.
A conversão e a transmissão devem ser equilibradas, pois somente é possível armazenar inércia, ao preço de aceleração da turbina.
O funcionamento geral de um gerador eólico está mostrado na figura 2.5.
25
Figura 2.5 - Princípio de conversão de energia. Fonte: Sabonnadière (2009) (adaptado).
A turbina de vento é composta pelo mastro, ou torre, e pela turbina. A torre deve
ser alta, pois a velocidade do vento aumenta com a altura. Na parte da turbina existe um
esqueleto de metal que abriga o gerador, o sistema de refrigeração, a caixa de câmbio e várias peças do equipamento de controle eletrônico que permitem o controle dos mecanismos
da turbina. A velocidade da turbina pode variar entre 1.000 e 2.000 rpm, a qual é controlada pela caixa de velocidades. Essa caixa é equipada com um freio de disco mecânico, ao
qual o gerador é acoplado.
A turbina tem geralmente três lâminas usadas para capturar a energia eólica e
transferi-la para o eixo lento. Um sistema eletromecânico geralmente permite a orientação
das lâminas para controlar o torque da turbina e regular a velocidade de rotação. As lâminas também funcionam como um freio aerodinâmico por abertura ou apenas pela rotação
de suas extremidades. Um mecanismo usando servomotores elétricos ajuda a orientar o
nacele ao vento. Um anemômetro e cata-vento no topo do nacele fornecem os dados necessários para o sistema de controle guiar a turbina e acioná-lo ou pará-lo, conforme a velocidade do vento.
2.6.2 A Energia Eólica no Mundo e no Brasil
Como já falado anteriormente, com o avanço tecnológico da energia eólica, sua
capacidade instalada mundial cresceu 1.155% entre os anos de 1997 e 2007. E a tendência
de crescimento é ainda maior.
A grande vantagem da energia eólica consiste na sua capacidade de ser amplamente renovável, perene, ter grande disponibilidade e principalmente não depender de im-
26
portações, além de ter custo zero para a obtenção do vento. Apesar do que foi citado anteriormente, a grande desvantagem dessa tecnologia é o seu custo, quando comparado com
outras fontes de energia, embora tenha decrescido ao longo dos anos. Segundo estudo do
World Wind Energy Association (Associação Mundial de Energia Eólica – WWEA), em
2008 o custo da energia eólica era 2,3 vezes maior do que a energia hidrelétrica.
Em nível mundial, os países que possuem uma matriz energética concentrada em
combustíveis fósseis possuem projetos que auxiliarão na expansão de parques eólicos no
médio prazo.
No Brasil a energia eólica possui uma presença mais expressiva na matriz energética quando comparada ao perfil mundial. Analisando a “qualidade” dos ventos, existe uma
oscilação da velocidade em torno de 5% e isso facilita a previsão do volume a ser produzido. Além disso, é em época de estiagem que ocorre um maior aumento na velocidade dos
ventos, e assim as usinas eólicas poderiam complementar as hidrelétricas.
Segundo dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), em 2007 a oferta interna de energia eólica aumentou de 236 para 559 JW.h-1. Além dos parques eólicos existentes, existem mais de 22 projetos em andamento na área de energia eólica.
2.7 Energia Gravitacional e Hidroeletricidade
A força motriz da água foi uma das primeiras energias utilizadas pelo homem que
a aproveitou para a moagem de grãos, serrar a madeira, forjar e tear. O moinho de água era
conhecido na Síria antes da era cristã e também foi usado pelos romanos. A introdução da
engrenagem no século 11 possibilitou os moinhos d'água a serem utilizados como fonte de
energia mecânica até a chegada da máquina a vapor. Posteriormente com o progresso tecnológico e poucas rodas d’água ou engrenagens continuaram a ser utilizadas.
Um quarto da energia que vem do Sol é absorvida pelo ciclo da água. No processo, uma pequena parte da água dos oceanos é evaporada pela energia solar e retorna à Terra
na forma de precipitações de chuva ou neve. Parte cai sobre os continentes, que representam apenas 30% da superfície da Terra, posteriormente sendo evaporada ou junta-se ao
mar. Isso contribui para o crescimento das plantas e resulta na formação de córregos e rios.
Como todas energias renováveis, a energia hidráulica se espalha. Terrenos, riachos pequenos, cursos de água e rios, tudo isso ajuda a concentrar a chuva em lagos que
permitem a armazenagem de energia.
27
A exploração da energia hidrelétrica faz uso da diferença entre a energia potencial
da água de acordo com sua altura acima do nível do mar. Um corpo de massa m situado a
uma altura h, no campo gravitacional da Terra sofre uma aceleração que é g, e pode produzir energia potencial de mgh. Se a queda d’água cai de altura h1 a h2, onde h1 é maior que
h2, a sua pode ser calculada por mg (h1 - h2). Parte dessa energia pode ser recuperada quando a água é direcionada para uma turbina. A energia que pode ser extraída de uma cachoeira é proporcional à sua taxa de fluxo e altura. Grandes quantidades de água e uma mudança
substancial do nível (altura da queda) são necessárias para produzir grandes quantidades de
eletricidade, por exemplo: 1 kWh representa a energia de 3,6 toneladas de água caindo de
uma altura de 100 m. Uma geladeira de família consome, em média, 380 kWh.ano-1. Para
alimentar um refrigerador com eletricidade de uma hidrelétrica seria necessário obter a
energia de quase 1.400 toneladas de água caindo de uma altura de 100 m, equivalendo a
3,8 toneladas de água por dia em uma queda dessa altura.
A represa é usada para reter água em um lago natural ou artificial, ou por vezes
um curso de água. Existem dois tipos de reservatórios: acumulação e fio d’água. O primeiro tipo normalmente é localizado na cabeceira dos rios, onde a queda d’água é alta, permitindo maior acúmulo de água. Esse tipo de reservatório também auxilia na regulagem da
vazão d’água para outras hidrelétricas. As usinas de fio d’água utilizam o fluxo de água do
rio para gerar energia elétrica, ou seja, não acumulam água. Para produzir eletricidade, a
água é canalizada para uma turbina que gera energia mecânica. Esta é acoplada a um alternador, produzindo eletricidade. Os vários tipos de turbinas substituíram a roda d’água porque a eficiência é muito maior (de 70% a 200% em vez de 20%).
A exploração da energia hidrelétrica está diretamente ligada à taxa de fluxo do
curso de água. Esta varia de acordo com a região e época do ano. Por exemplo, nos países
tropicais chove apenas no verão, enquanto que em climas temperados há chuva em quase
todo o ano. Reservatórios ajudam a compensar esta intermitência e permitem que grandes
quantidades de energia sejam armazenadas.
Detalhes técnicos sobre o funcionamento de uma usina hidrelétrica, turbinas e
cálculos de geração de energia podem ser encontrados em Twidell e Weir (1986).
2.7.1 A Energia Hidráulica no Mundo e no Brasil
Teoricamente, o potencial hidrelétrico mundial é de 36.000 TWh, porém, apenas
16.000 TWh são exploráveis e, desses, 8.000 TWh são economicamente viáveis. Atual-
28
mente, menos de 20% desse potencial é utilizado. Como podemos ver na figura 2.6, entre
os anos de 1973 e 2006 ouve um decréscimo na utilização de energia hidráulica, sendo a
energia oriunda do petróleo, a não renovável, a mais utilizada.
Figura 2.6 - Matriz energética, de 1973 e 2006. Fonte: IEA (2008).
A figura 2.7 mostra que, quanto ao tipo de combustível utilizado, a posição da
energia elétrica na matriz energética recuou de 21% para 16%.
Figura 2.7 - Geração de energia elétrica no mundo por tipo de combustível nos anos de 1973 e 2006.
Fonte IEA (2008).
Segundo dados da Agência Internacional de Energia (IEA), nos últimos anos a
energia hidráulica cresceu somente na China e na América Latina, alavancado pelo Brasil.
O crescimento só não foi maior nesses países devido à pressão de caráter ambiental, pois as
usinas de grande porte, quando na sua construção, provocam grande impacto ambiental e
populacional. Com a formação de grandes lagos ou reservatórios, a flora, fauna e a população que anteriormente ocupavam esses locais devem ser realocados, porém, nem sempre
isso é possível, e assim ocorre um impacto maior sobre a flora e a fauna. Além do possível
aumento do nível dos rios ou alterações em seus cursos.
29
A China possui a maior hidrelétrica do mundo, a Três Gargantas, que, quando totalmente instalada, terá uma capacidade de 18.200 MW. No Brasil, a Usina Binacional
Itaipu possui uma capacidade de 14 mil MW.
No Brasil existem usinas de pequeno, médio e grande porte. Essa classificação
leva em conta a capacidade instalada de geração de energia elétrica dessa usina. Como
consequência, a rede de transmissão de energia elétrica dependerá do porte da usina a ela
ligada.
Conforme citado anteriormente, em nível mundial houve uma diminuição na utilização de energia hidrelétrica. No Brasil essa diminuição também ocorreu devido à necessidade de se utilizar outras fontes de energia, principalmente as renováveis e que não necessitem de rede de transmissão.
2.8 Energia Geotérmica
O núcleo interno da Terra atinge uma temperatura de aproximadamente 4.000ºC.
O calor passa através do material sólido subterrâneo e alcança a superfície terrestre principalmente por condução e, ocasionalmente, por convecção ativa de correntes de magma
derretido ou água aquecida. A energia geotérmica média que chega à superfície da Terra
com o fluxo de calor é de apenas 0,06 W.m-2, com um gradiente de temperatura menor que
30ºC.km-1. Esta corrente de calor contínua é trivial em comparação com outras fontes renováveis que existem acima da superfície da Terra e produzem uma energia média total de
500 W.m-2. No entanto, em alguns locais pode haver uma influência do gradiente de temperatura ocasionado pelo aumento significativo de recursos geotérmicos. Estes podem ser
aproveitados em áreas da ordem de quilômetros quadrados e profundidades de aproximadamente 5 km, com fluxos de 10-20 W.m-2 para produzir cerca de 100 MW (térmico) por
km2 no fornecimento comercial para, pelo menos, 20 anos de operação.
O calor geotérmico é geralmente de baixa qualidade e é melhor usado diretamente
para a construção ou processo que necessitem calor em cerca de 50-70ºC, ou para préaquecimento dos sistemas convencionais de fornecimento de energia de alta temperatura.
Ocasionalmente, o calor geotérmico está disponível em temperaturas acima de 150ºC, assim a produção de energia elétrica a partir de turbinas pode ser considerada. Vários projetos de utilização de energia geotérmica para a geração de energia elétrica estão em andamento, especialmente na Itália, Nova Zelândia e EUA.
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Apesar de a energia renovável ser definida como uma energia que ocorre naturalmente no meio ambiente, por definição, algumas fontes de energia geotérmica podem ser
classificadas como renováveis, porque essa energia também pode ser dissipada de outra
forma no meio ambiente, por exemplo, nascentes ou fontes quentes. A partir desta água
aquecida é produzido o vapor utilizado em usinas termelétricas, como mostrado na figura
2.8 a seguir. Existem poucas termelétricas no mundo. No Brasil não há nenhuma termelétrica em operação, nem experimental.
Nos últimos anos, somente os Estados Unidos e a Islândia registraram crescimento na utilização de energia geotérmica.
2.9 Energia das Ondas Marítimas
O nível de água nos grandes oceanos da Terra sobe e desce de acordo com padrões previsíveis. Os principais períodos τ destas marés são diariamente em períodos de 24
h e outras a cada 12 h 25 min. A mudança de altura entre as sucessivas marés alta e baixa é
o intervalo, R. Essa varia entre 0,5 m em geral, e cerca de 10 m em locais próximos às regiões de continente. O movimento da água produz correntes marítimas que podem atingir
velocidades de aproximadamente 5 m.s-1 em locais de costa ou entre as ilhas.
Figura 2.8 - Reservatório geotérmico de alta temperatura. Fonte: Aneel (2009).
A água do mar pode ser presa quando a maré está alta em uma bacia estuarina de
área A, atrás de uma represa ou barreira para produzir energia das marés. Se a água de densidade ρ passa através de turbinas quando a maré está baixa, a potência média produzida é:
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.
(2.10)
Por exemplo, se A = 10 km2, R = 4m, τ = 12 h 25 min, então P = 17 MW. Obviamente,
locais de grande variedade das marés podem dar um maior potencial energético, mas outros fatores vitais são a necessidade de potência, os custos e benefícios secundários da
construção. Os custos de engenharia civil podem ser reduzidos quando as construções são
utilizadas para outras finalidades também, por exemplo, a construção de estradas em barragens, controle de cheias, melhoria na irrigação, captação da água bombeada para armazenamento de energia e navegação. Dessa forma, o desenvolvimento da energia das marés
pode ter um local bem específico.
A potência obtida das correntes de marítimas pode ser aproveitada de forma semelhante à potência do vento, podendo também ser chamada de "poder das marés". Na
prática, a corrente de maré pode ser atraente para geração de energia apenas quando é reforçada com a velocidade do movimento da água entre uma ilha e o continente, ou entre
ilhas relativamente grandes. Porém, nem todos os locais têm a estrutura necessária. Podemos notar também que o fluxo de potência em um rio tem características semelhantes, mas
sem a variação temporal. Assim, a discussão fica em torno da utilização do rio ou do mar,
pois a vantagem do rio é que ele não sofre variação temporal.
Aproveitamento da energia da amplitude das marés (doravante chamado de "energia das marés", teve sua utilização direcionada para pequenos dispositivos mecânicos na
Inglaterra medieval e na China. O mais conhecido sistema de geração de eletricidade em
grande escala é o sistema 240 MWe 'La Rance' num estuário para o Golfo de St Malo, na
Bretanha, França, que tem operado confiável desde 1967, provando assim a viabilidade
técnica desta tecnologia em larga escala. No entanto, as restrições econômicas e ambientais
fizeram com que pouquíssimos sistemas similares fossem construídos desde então. Outros
locais com grande amplitude das marés, como o estuário do Severn na Inglaterra e na Baía
de Fundy, na fronteira leste entre o Canadá e os Estados Unidos, têm sido objeto de numerosos estudos de viabilidade ao longo dos últimos 100 anos.
A faixa de vazão e o comportamento periódico das marés na maioria das regiões
costeiras estão bem documentados e analisados em função das exigências da navegação e
oceanografia. O comportamento pode ser previsto com precisão, dentro de uma incerteza
de ± 4%, e assim apresenta uma maré muito confiável e garante uma forma de energia renovável. As desvantagens principais são:
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1) A incompatibilidade dos principais períodos lunares impulsionados de 12 h 25
min e 24 h 50 min com o período solar humano de 24 h, de modo que a melhor
geração de energia das marés não está em fase com a demanda.
2) O intervalo de mudança das marés e do fluxo ao longo de um período de duas
semanas produz alteração na produção de energia.
3) A exigência de grande fluxo de água em volume faz com que sejam necessárias
muitas turbinas especialmente construídas conjuntamente em paralelo.
4) Os custos de capital muito grande da maioria das instalações.
5) A localização de locais com grande variedade de marés pode ser distante da
demanda de energia.
6) Dano ecológico e interrupção dos grandes estuários ou regiões marinhas.
Para geração de energia elétrica ideal das marés, as turbinas devem ser operadas
de forma regular e repetível. O modo de operação depende da escala da usina, da demanda
e da disponibilidade de outras fontes. Por exemplo, se a eletricidade gerada pela maré for
para uso local, deve existir outra fonte de alimentação quando a energia das marés não está
disponível. A figura 2.9 ilustra a geração de energia em uma usina maremotriz.
Figura 2.9 - Geração de energia em usina maremotriz. Fonte: Aneel (2009).
Segundo dados de pesquisa realizados pela Coordenação dos Programas de PósGraduação de Engenharia (Coppe) da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o Brasil
possui um potencial de 40 GW de aproveitamento da energia das marés. Porém, atualmente existe somente um projeto piloto nessa área localizado no litoral do Ceará.
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