Universidade
Católica de
Brasília
Virtual
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO
LATO SENSU EM DIREITOS HUMANOS: PROTEÇÃO E ASSISTÊNCIA
A VÍTIMAS E A COLABORADORES DA JUSTIÇA
Especialização
LIMITES E POSSIBILIDADES DO RÉU COLABORADOR EM PROGRAMAS DE PROTEÇÃO
Autor: Carlos Eduardo Brito
Orientador: Prof. Esp. Erich Meier Junior
BRASÍLIA
2009
2
CARLOS EDUARDO BRITO
LIMITES E POSSIBILIDADES DO PAPEL DO RÉU COLABORADOR
EM PROGRAMAS DE PROTEÇÃO
Monografia apresentada ao Programa de Pós
graduação Lato Sensu em Direitos Humanos:
proteção e assistência a vítimas e a
colaboradores a justiça da Universidade
Católica de Brasília, como requisito parcial
para obtenção do certificado de Especialista
em Direitos Humanos.
Orientador: Prof. Esp. Erich Meier Junior
3
BRASÍLIA
2009
Brasília
2009
(DF)
Monografia de autoria de Carlos Eduardo Brito, intitulada “LIMITES E
POSSIBILIDADES DO REU COLABORADOR EM PROGRAMAS DE PROTEÇÃO”,
apresentada como requisito parcial para obtenção do certificado de Especialista em Direitos
Humanos da Universidade Católica de Brasília em
de outubro de 2009, aprovada pela
banca examinadora abaixo assinada:
_______________________________
Prof. Esp Erich Meier Junior
Orientador.
UCB
________________________________
Prof.
.
UCB
________________________________
Prof.
.
UCB
Brasília (DF)
4
2009
Esta obra é dedicada ao meu saudoso
pai Sebastião Berlink Brito.
5
Agradecemos especialmente a pessoa da Srª.
Nilda Turra, Coordenadora Geral dos Programas
de Proteção, que por meio da Secretaria Especial
de Direitos Humanos, possibilitou a realização
desta especialização. Agradecemos, também, ao
Professor e Coordenador do Curso Daniel Seidel,
pelos diálogos atentos e pelas reflexões mantidas
sobre os temas aqui tratados.
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RESUMO
O estudo pretende contribuir para o aprimoramento das políticas públicas de combate à
impunidade, pois o réu colaborador, como sujeito de direito, poderá ser melhor compreendido
e estudado. O individuo que se encontra na situação processual de réu colaborador, não pode
ser encarado apenas como um objeto, instrumento de produção de prova, mas sim como um
indivíduo que merece proteção específica em razão de sua condição peculiar de colaborador
da Justiça. As contribuições para o aperfeiçoamento dos Programas de Proteção parte da
análise das limitações de ordem jurídica e psicosocial enfrentadas pelo réu colaborador nos
Programas de Proteção. Ao final deste estudo, foram apontadas algumas possibilidades para
superação das limitações encontradas, com o propósito de auxiliar a construção e
consolidação dos Programas de Proteção no Brasil, como instrumentos de uma política
pública de combate à impunidade e de preservação da VIDA.
Palavras-Chave: Réu colaborador. Limites. Possibilidades.
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ABSTRACT
In this thesis, we put forward suggestions towards the improvement of public policies dealing
with impunity. We are particularly interested in studying collaborating defendant as a person
who has rights. We take the stance that, during a lawsuit, a collaborating defendant cannot be
treated as an object, whose sole purpose is to provide evidences, but instead he/ she should be
treated as an individual deserving protection given his/ her unique condition as a collaborator
to the judicial process. The suggestions we offer to the improvement of the Protection
Program, which can be found at the end of this study, come from an analysis of the judicial
and psycho-social short comes we found that are faced by collaboratin defendant participating
in this program. Our solutions aim towards supporting the construction and consolidation of
the Brazilian Protection Programs as a public policy instrument against impunity and for the
preservation of life.
Keywords: Collaborating defendant. Limits. Possibilities
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LISTA DE SIGLAS
CGPT – Coordenação Geral de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaças
CONDEL – Conselho Deliberativo
FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
INSS - Instituto Nacional Serviço Social
GAJOP – Gabinete de Assessoria Jurídica a Organizações Populares
PROVITA - Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas
SEDH – Secretaria Especial dos Direitos Humanos
SPDE - Serviço de Proteção ao Depoente Especial
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 10
2 RÉU COLABORADOR NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO ......................... 12
2.1 Programa de Proteção no Brasil ...................................................................................12
2.2 Conceito de Delação Premiada e Réu Colaborador.....................................................14
2.3 Estrutura dos Programas de Proteção ........................................................................ 17
2.4 Requisitos de ingresso no Programa de Proteção .......................................................18
2.5 O réu colaborador e o Programa de Proteção .......................................................... 20
3 RÉU COLABORADOR NO PROGRAMA DE PROTEÇÃO ................................... 21
3.1 Repercussões jurídicas do réu colaborador no Programa de Proteção.................... 21
3.2 Repercussões psicológicas do réu colaborador no Programa de Proteção................27
3.3 Repercussões sociais do réu colaborador no Programa de Proteção ........................29
3.4 A importância das Equipes Interdisciplinares nos Programas de Proteção ...........30
3.5 A importância da Sociedade Civil na construção da rede solidária de proteção .....31
4 CONSIDERAÇÃO FINAIS ............................................................................................. 34
5 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................. 35
1
0
1 INTRODUÇÃO
Pretendemos através do tema escolhido, aprofundar o estudo e a conseqüente
discussão em torno das limitações de ordem jurídica e psicosocial enfrentadas pelo réu
colaboradores nos Programas de Proteção, seja em razão de sua própria condição de réu no
processo criminal, seja em razão das limitações estruturais e legais para sua efetiva inserção
nos programas.
Assim, para maior compreensão do tema, a pesquisa monográfica se utilizou do
método dialético de abordagem, pois o conjunto de opiniões e explicitações teóricas que faz
parte da pesquisa direciona-se à idéia de que o réu colaborador deve ser visto não como um
instrumento de prova, mas sim como um sujeito de direitos, um individuo que necessita de
proteção em razão de sua condição peculiar de colaborador da justiça.
As limitações e possibilidades do réu colaborador devem ser analisadas não de forma
fixa, mas dialeticamente, uma vez que as limitações e possibilidades não são apenas dos réus
colaboradores em razão das restrições de segurança impostas, são também dos Programas de
Proteção. Desta contradição nasce a necessidade de encontrarmos caminhos, possibilidades
para superação destes obstáculos. É um trabalho conciso, realizado à luz da experiência
prática do cotidiano.
O estudo do réu colaborador no Programa de Proteção será iniciado analisando-se a
estrutura da Lei 9.807/99, que estabeleceu normas para a organização e a manutenção de
programas especiais de proteção a vítimas e a testemunhas ameaçadas, instituiu o Programa
Federal de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas e dispôs sobre a proteção de
acusados ou condenados que tenham voluntariamente prestado efetiva colaboração à
investigação policial e ao processo criminal.
A estrutura em questão será analisada primeiramente pelo estudo do RÉU
COLABORADOR NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO, englobando o surgimento dos
Programas de Proteção no Brasil e legislação pertinente, conceito de réu colaborador e
delação premiada, estrutura dos programas, requisitos de ingresso, o réu colaborador e os
Programas de Proteção. Em seguida será analisada a figura do RÉU COLABORADOR NO
PROGRAMA DE PROTEÇÃO, sendo inseridos fatores como repercussões jurídicas do
ingresso do réu colaborador no Programa de Proteção, as repercussões psicológicas e sociais e
a importância das Equipes Interdisciplinares nos Programas de Proteção.
Outro ponto a ser abordado dentro do tema será a questão da lei, quando em sua
formulação, não ter feito referência ao réu colaborador ao instituir os Programas de Proteção.
1
1
O próprio estudo da estrutura do programa levou a verificação de que a lei criou um programa
para proteger às vítimas e testemunhas, e outro, para proteger os réus colaboradores e os
excluídos ou não aceitos nos Programas de Proteção, conforme art. 10, I, do Dec. n°
3.518/2000, que Regulamenta o Programa Federal de Assistência a Vítimas e a Testemunhas
Ameaçadas, instituído pelo art. 12 da Lei no 9.807, que dispôs ainda sobre a atuação da
Polícia Federal nas hipóteses previstas nos artigos. 2o, § 2o, 4o, § 2o, 5o, § 3o, e 15 da referida
Lei.
Tal abordagem é importante uma vez que na prática, como exceção dos excluídos e
não aceitos por não preencherem os requisitos legais, o réu colaborador sempre foi atendido
pelos Programas de Proteção com aplicação das medidas protetivas de forma integral, e não
apenas de forma isolada.
Os limites e as possibilidades do réu colaborador nos Programas de Proteção foram
analisados sob o ponto de vista jurídico e psicosocial. O conjunto de opiniões e explicitações
teóricas que fazem parte desta pesquisa direciona-se à idéia de que o réu colaborador deve ser
visto como um sujeito de direitos e não como um instrumento de prova.
1
2
Capítulo I – RÉU COLABORADOR NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO
2.1 – O Programa de Proteção no Brasil
Muito embora várias leis tratem do instituto da delação premiada, os Programas de
Proteção só foram formalmente criados no Brasil após a entrada em vigor da Lei 9.807/99,
que conforme a sua ementa, estabelece normas para organização e manutenção de programas
especiais de proteção a vítimas e a testemunhas ameaçadas, institui o Programa Federal de
Assistência a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas e dispõe sobre a proteção de acusados ou
condenados que tenham voluntariamente prestado efetiva colaboração à investigação policial
e ao processo criminal.
Existe hoje uma série de textos legais prevendo o instituto delação premiada, como:

O Código Penal Brasileiro, em seu art. 159, que dispõe sobre crime de extorsão
mediante seqüestro;

A Lei nº 8.072/90, em seu art. 8º , parágrafo único, dispõe sobre os crimes
hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e
determina outras providência;

A Lei nº 8.137/90, em seu art. 16, parágrafo único, que define crimes contra a
ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras
providências ;

A Lei nº 9.034/95, em seu art.6°, onde dispõe sobre a utilização de meios
operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações
criminosas;

A Lei nº 9.613/98, em seu artigo 1º, parágrafo 5º, que dispõe sobre os crimes de
"lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do
sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta Lei; cria o Conselho de
Controle de Atividades Financeiras - COAF, e dá outras providências;

A Lei nº 9.807/99, em seu artigo 14, que estabelece normas para a organização e
a manutenção de programas especiais de proteção a vítimas e a testemunhas
ameaçadas, institui o Programa Federal de Assistência a Vítimas e a
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Testemunhas Ameaçadas e dispõe sobre a proteção de acusados ou condenados
que tenham voluntariamente prestado efetiva colaboração à investigação policial
e ao processo criminal;

A Lei nº 11.343/02, em seu artigo 32, parágrafo 2°, institui o Sistema Nacional
de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção
do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas;
estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de
drogas; define crimes e dá outras providências.
Por sua vez, o Programa Federal de Assistência a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas
encontra-se regulamentado pelo Decreto nº 3.518/2000, do Presidente da República, que
Regulamenta o Programa Federal de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas,
instituído pelo art. 12 da Lei no 9.807, de 13 de julho de 1999, e dispõe sobre a atuação da
Polícia Federal nas hipóteses previstas nos arts. 2o, § 2o, 4o, § 2o, 5o, § 3o, e 15 da referida Lei.
O artigo 12 da Lei nº 9.807/99, assim dispõe :
Art. 12. Fica instituído, no âmbito do órgão do Ministério da Justiça
com atribuições para a execução da política de direitos humanos, o
Programa Federal de Assistência a Vítimas e a Testemunhas
Ameaçadas, a ser regulamentado por decreto do Poder Executivo.
Embora a institucionalização dos Programas de Proteção tenha ocorrido com a
promulgação da Lei 9.807, em 13 de julho de 1999, a implementação de serviços de
atendimento a vítimas e testemunhas ameaçadas no Brasil teve início em 1996, quando foi
incluído no Programa Nacional de Direitos Humanos, especificamente no capítulo dedicado à
“Luta Contra a Imunidade”.
Ainda no ano 1996, o Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares GAJOP, entidade não governamental sediada na cidade de Recife no Estado de Pernambuco,
criava em âmbito estadual, a primeira experiência prática de proteção a vitimas e testemunhas
ameaçadas no Brasil.
O Programa de Proteção se insere entre as medidas destinadas a combater a
criminalidade em nosso País, causada, principalmente, pela exclusão social, o tráfico e o
consumo de drogas, o comércio e o porte de armas, a desestruturação da família, o baixo nível
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de educação e a impunidade. A impunidade está relacionada, em parte, com a dificuldade ou a
impossibilidade da produção da prova pela acusação, em especial a prova testemunhal, sendo
os Programas de Proteção de que trata a Lei nº 9.807/99, importante instrumento postos à
disposição dos órgãos de segurança e justiça.
Um programa ou sistema de proteção à vítima e testemunhas, por um lado, interessa
ao Estado-Juiz1 pois representa um meio eficaz para a efetivação do direito de punir, e, por
outro, constitui garantia do direito a incolumidade física do cidadão que, em razão de seu
testemunho, colabora com a Justiça.
O Programa de Proteção é denominado PROVITA, abreviatura de Programa de
Proteção a Vitimas e Testemunhas Ameaçadas e funciona em vários Estados brasileiros que
criaram as suas próprias estruturas, baseado na inserção social de vítimas, testemunhas e réus
colaboradores em novas comunidades, de forma sigilosa, contando com a participação da
sociedade civil na formação de uma rede solidária de proteção.
O Programa de Proteção é uma experiência concreta e exitosa na perspectiva de
afirmação dos direitos e garantias fundamentais do cidadão, no intuito de formação de uma
cultura de combate à violência, com o envolvimento dos mais variados setores da sociedade.
2.1 Conceito de Delação Premiada e Réu Colaborador
Antes de iniciar o estudo sobre o réu colaborador no Programa de Proteção, torna-se
imprescindível o conceito dos institutos da delação premiada ou eficaz e de réu colaborador
para a melhor compreensão do tema.
De acordo com Damásio de Jesus (2005, p.01): “[...] delação premiada configura
aquela iniciativa do legislador, que premia o delator, concedendo-lhe benefícios (redução da
pena, perdão judicial, aplicação de regime penitenciário brando etc.) [...]”.
Já réus colaboradores são aqueles acusados ou indiciados2 que tenham
voluntariamente colaborado com a investigação e o processo criminal, conforme o art. 13 e 14
da Lei nº 9.807/99.
Segundo Capez (2004, p. 116), réu colaborador é aquele que “[...] trai seu grupo,
delatando a prática de crimes cometidos pela organização e apontando seus respectivos
autores e partícipes [...]”.
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2
Equivalente a jurisdição; poder do Estado de aplicar o direito ao caso concreto
São aqueles que respondem a inquérito policial;
1
5
O instituto de delação premiada sempre foi alvo de críticas por parte da doutrina, pois,
sob o ponto de vista sócio-psicológico ela é considerada imoral, aética, pois estimula a
traição, comportamento não aceito para os patrões morais modernos, seja dos homens de bem,
seja para os mais vis criminosos.
Segundo Damásio de Jesus (1993, p. 0.1): “[...] a lei não é pedagógica, pois ensina que
trair traz benefícios [...]”.
Sob o ponto de vista jurídico, polêmicas também surgiram, uma vez que indiretamente
o instituto da delação premiada rompe com o princípio da proporcionalidade da pena, uma
vez que se punirá com penas diferentes pessoas envolvidas no mesmo fato e com idênticos
graus de culpabilidade.
Entretanto o aumento da criminalidade, cada vez mais sofisticada e organizada, fez
com que tal instituto fosse aos poucos se legitimando em nosso ordenamento jurídico, com a
edição de várias leis prevendo sua incidência, como forma de estímulo à elucidação e punição
de crimes praticados em concurso de agentes.
Realmente, a necessidade de leis que dêem guarida às vítimas, testemunhas e réus
colaboradores se torna cada vez mais necessária, uma vez que uma das principais dificuldades
em combater a criminalidade reside no temor que as pessoas têm em testemunhar os fatos
delituosos que presenciaram.
A expressão delatar, segundo Franca (1977) “[...] possui conotação pejorativa,
tomando o sentido de acusação feita a outrem, com traição da confiança recebida, em razão de
função ou amizade”.
Desde o seu surgimento, sempre houve uma dificuldade prática na sua aplicação, pois
não havia qualquer forma de garantia ou sistema de proteção para assegurar proteção à
testemunha, à vítima e ao réu colaborador e suas respectivas famílias, que ficavam a mercê da
própria sorte.
Reclamava-se pela instituição de um programa que pudesse garantir proteção às
vítimas, testemunhas e aos réus colaboradores, que bem pontua o autor Fernandes (1995, p.
51/52) no que diz respeito ao Código do Silencio: “[...] „código do silêncio revelou-se ser uma
das principais dificuldades no combate à criminalidade, diante do temor das pessoas em
testemunhar fatos delituosos presenciados ou dos quais tenham sido vítima ou deles
participado [...]”.
Com o advento da Lei 9.807/99, foram criadas normas para a organização e a
manutenção de programas especiais de proteção a vítimas e a testemunhas ameaçadas,
instituindo-se o Programa Federal de Assistência a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas, bem
1
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como sobre a proteção de acusados ou condenados [réus colaboradores] que tenham
voluntariamente prestado efetiva colaboração à investigação policial e ao processo criminal.
Como bem citado pelo autor Luiz Flávio Gomes (1997, p.167):
A lei está imbuída de nobre propósito, qual seja de
proteger vítimas e testemunhas ameaçadas por sua
colaboração na elucidação de fatos criminosos; de outro
lado, todavia, representa falência do Estado no
cumprimento de um de seus objetivos básicos (segurança
pública), mormente quando pressionado pela opinião
pública a dar respostas rápidas e eficazes no tratamento
desta questão, na busca substituir os meios normais de
investigação e suprindo o "déficit" estrutural investigatório
do Estado, estimula a delação que é forma não ética de
revelação da verdade, premiando-a em relação aos réus
colaboradores, como já fizeram outros textos penais.
(GOMES, 1997, p.167).
A Lei 9.807/99 é um forte instrumento normativo destinado a proteger vítimas,
testemunha e réu colaboradores, viabilizando desse modo, a persecução penal e minorando os
efeitos da impunidade.
No art. 13 da Lei 9.807/9, ao denominar „réu colaborador‟ aos “acusados ou indiciados
que tenham voluntariamente colaborado com a investigação e o processo criminal”, utiliza-se
de uma figura de linguagem para disfarçar de idéias pejorativas das expressões “delator” e
“traidor”. De acordo com o artigo 13 da a Lei 9.807/99, entende-se por réu colaborador :
“[...] todo acusado ou indiciado, não reincidente, que tenha
colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e
o processo criminal, desde que essa colaboração tenha
resultado em na identificação dos demais co-autores ou
partícipes da ação criminosa; na localização da vítima com
a sua integridade preservada; ou na recuperação total ou
parcial do produto do crime.”.
Para a real diferenciação processual do que seja vítima, testemunha e réu
colaborador, o conceito de vitima e testemunha torna imprescindível.
Segundo definição de De Plácido e Silva “[...] „vítima‟ na linguagem penal
designa o sujeito passivo de um delito ou contravenção. É assim, o ofendido, o ferido, o
assassinado, o prejudicado, o burlado”.
Já para Manoel Antônio Teixeira Filho: “[...] „testemunha‟ é a pessoal física, distinta
das partes do processo, admitida como tal pela lei, a ser inquirida pelo magistrado, por
iniciativa deste ou a requerimento da parte, a respeito dos fatos da causa, dos quais tem
conhecimento próprio”.
1
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2.3 Estrutura dos Programas de Proteção
Conforme prevê a Lei nº 9.807/99, os programas são estruturados da seguinte forma :
2.3.1 Conselhos Deliberativos
Cada programa tem como instância decisória superior um Conselho Deliberativo,
órgão colegiado composto por representantes do Judiciário, Ministério Público e de outro
órgão públicos e de entidades da sociedade civil com atuação na área de direitos humanos.
Ao Conselho Deliberativo cabe deliberar não apenas sobre o ingresso e saída de
usuários do programa, bem como demais providencias de caráter geral relacionadas ao bem
funcionamento dos Programas de Proteção.
Art. 4o Cada programa será dirigido por um conselho
deliberativo em cuja composição haverá representantes
do Ministério Público, do Poder Judiciário e de órgãos
públicos e privados relacionados com a segurança pública
e a defesa dos direitos humanos.
2.3.2 Órgão Executor
Promove a articulação da rede solidária de proteção e a contratação dos profissionais
da Equipe Técnica. A atribuição do órgão executor recai sobre uma das instituições
representadas no Conselho Deliberativo. l
Parágrafo primeiro - A execução das atividades
necessárias ao programa ficará a cargo de um dos órgãos
representados no conselho deliberativo, devendo os
agentes dela incumbidos ter formação e capacitação
profissional compatíveis com suas tarefas.
No modelo brasileiro, com exceção do Estado do Rio Grande do Sul, todos os
programas são executados por representantes da sociedade civil, com militância na defesa dos
direitos humanos.
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8
2.3.3 Equipe Técnica
Responsável pelo acompanhamento jurídico e psicosocial dos usuários e pela
apresentação de subsídios ao Conselho Deliberativo. É liderado por um coordenador e
composta de Advogados, Psicólogos e Assistentes Sociais, além de outros profissionais de
outras áreas, conforme a necessidade de cada Estado.
2.3.4 Rede Solidária de Proteção
Conjunto de entidades da sociedade civil e órgão do poder público que auxiliam e
promove a inserção social dos usuários dos programas na comunidade.
2.4 Requisitos de ingresso no Programa de Proteção
A referida Lei nº 9.807/99 atribui legitimidade para apresentar solicitação de ingresso
no Programa de Proteção ao próprio interessado, ao Ministério Público, ao Delegado de
Polícia, ao Juiz e aos demais órgãos públicos e privados com atribuições de defesa dos
direitos humanos. O pedido de inclusão é dirigido ao Conselho Deliberativo, após prévio
parecer elaborado pela Equipe Técnica.
A Lei 9.807/99 dispõe que as medidas de proteção nelas previstas deverão ser
consentidas e levar em conta a gravidade da coação ou da ameaça à integridade física e
psicológica, a dificuldade de preveni-las ou reprimi-las pelos meios convencionais e a sua
importância para a produção da prova, podendo ser estendidas ao cônjuge ou companheiro,
ascendentes, descendentes e dependentes que tenham convivência habitual com a vítima ou
testemunha.
A lei em comento, em seu do art. 2º e § 2º, exclui expressamente o indivíduo cuja
personalidade ou conduta seja incompatível com as restrições de comportamento exigidos
pelo programa, os condenados que estejam cumprindo pena e os indiciados ou acusados sob
prisão cautelar em qualquer de suas modalidades.
Especificamente no que diz respeito aos réus colaboradores, a lei em estudo prevê em
seu art. 13, que o juiz poderá, de ofício ou a requerimento das partes, conceder perdão judicial
com a conseqüente extinção da punibilidade, desde que, sendo primários, tenham efetiva e
voluntariamente colaborado com a investigação e o processo criminal, desde que dessa
1
9
colaboração tenha resultado na identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação
criminosa; localização da vítima com a sua integridade física preservada e recuperação total
ou parcial do produto do crime.
A lei veda expressamente a proteção de condenados e indiciados que estejam sofrendo
privação de liberdade por prisão cautelar, evitando aplicação das medidas protetivas às
pessoas que estejam privadas da liberdade, inclusive cautelarmente.
Assim, a princípio, mesmo os condenados que foram beneficiados com a substituição
da pena privativa de liberdade nos moldes previstos pela Lei nº 9.714/99, poderão ingressar
no Programa de proteção às testemunhas, bem como, àqueles cujo processo esteja suspenso
em face do art. 87, da lei 9.099/95 (Juizados Especiais).
É importante frisar que o ingresso no programa, as restrições de segurança e demais
medidas por ele adotadas terão sempre a ciência e concordância da pessoa a ser protegida,
conforme art. 2º, § 3º, que serão expressas em termos de compromisso assinado no momento
da inclusão. Para que ocorra o ingresso do solicitante no programa, é necessário refletirmos
sobre a inclusão, abordando três enfoques trazidos pela lei 9.807/99, sendo eles: visão penal;
visão humanística e visão técnico/administrativa.
A visão penal analisa a relevância do testemunho como prova. A colaboração deve ser
efetiva, aferindo-se a dimensão do ilícito a justificar a inclusão. Deve-se atentar para a
conveniência e utilidade do depoimento na investigação. Neste ponto, destacamos a
importância da atuação do Ministério Público, uma vez que titular privativo da ação penal
pública, regra geral no processo penal, da qual é exceção a ação penal privada por disposição
constitucional (art. 129, inciso I, da Constituição Federal), é órgão principal interessado na
obtenção de provas para o fim de aplicação de justa pena aos criminosos e quem pode melhor
pode avaliar a relevância ou não de um testemunho.
Já a visão humanística busca resguardar a integridade da pessoa desde que avaliado a
gravidade da coação e da ameaça física e psicológica.
Finalmente, verificada a gravidade da coação ou a ameaça a integridade física ou
psicológica deve imperar a dificuldade de afastá-la pelos meios convencionais, preveni-las ou
reprimi-las pela atividade da policia, caracterizando assim a visão técnico /administrativa.
Sobre os requisitos de ingresso Pereira (2001, p.12), assim comenta :
“ Esquematicamente, pode-se, assim, resumir os requisitos
de ingresso nos programas de proteção, conforme
determinação da Lei n° 9.807/99 :
a) Situação de risco. A pessoa deve estar “coagida ou
exposta a grava ameaça” (art. 1°, caput). Obviamente não é
2
0
necessário que a coação ao a ameaça já se tenha
consumado, sendo bastante a existência de elementos que
demonstrem a probabilidade de que tal possa a vir a
ocorrer, A situação de risco, entretanto, deve ser atual.
b) Colaboração. A situação de risco em que se encontra a
pessoa deve decorrer, numa relação de causualidade, da
colaboração por ela prestada a procedimento criminal em
que figura como vítima ou testemunha (art. 1°, caput).
Assim, pessoas sob ameaça ou coação motivadas por
quaisquer outros fatores não comportam ingresso nos
programas.
c) Personalidade e condutas compatíveis.As pessoas a
serem incluídas nos programas devem ter personalidade e
conduta compatíveis com as restrições de comportamento a
eles inerentes (art. 2°, § 2°), sob pena de por em risco as
demais pessoas protegidas, as equipes técnicas e a rede de
proteção como um todo. Daí por que a decisão de ingresso
só é tomada após a realização de uma entrevista conduzida
por uma equipe multidisciplinar e os protegidos podem ser
excluídos quando reiterarem conduta incompatível (art. 10,
II, “b”).
d) Inexistência de limitação à liberdade. É necessário
que a pessoa esteja em gozo de sua liberdade, razão pela
qual estão excluídos os “condenados que estejam
cumprindo pena e os indiciados e acusados sob prisão
cautelar em qualquer de suas modalidades (art.2°, § 2°).
e) Anuência do protegido. O ingresso nos programas, as
restrições de segurança e demais medidas por eles adotadas
terão sempre a ciência e concordância da pessoa a ser
protegida (art. 2°, §3°), que serão expressas em Termo de
Compromisso assinado no momento da inclusão”.
Importante salientar que nos casos dos excluídos e não aceitos nos programas, caberá
aos órgãos de segurança pública adotar medidas necessárias para a preservação da integridade
física da vítima, testemunha e réu colaborador ameaçado.
À luz da avaliação dos requisitos objetivos e subjetivos previstos na lei é que se
decidirá pela admissão ou não do postulante no Programam de Proteção, aplicando-se as
medidas de forma isolada ou cumulativamente.
2.5 O réu colaborador e o Programa de Proteção
Ao examinarmos o texto legal, verificamos que o mesmo estabeleceu um sistema
misto para proteção de vítimas, testemunhas e réus colaboradores.
Assim, de acordo com a lei, de um lado, no Capítulo I, tratou da Proteção Especial a
Vítimas e a Testemunhas, criando o Programa de Proteção destinado a vítimas e testemunhas
que satisfaçam aos requisitos legais.
2
1
Já no Capítulo II, intitulado Proteção aos réus Colaboradores, a lei tratou do réu
colaborador apenas criando os institutos de delação premiada (perdão judicial e a diminuição
da pena), além de garantir ao réu colaborador medidas especiais de segurança.
Desta forma e segundo a lei, os Programas Proteção a Vítimas e Testemunhas
Ameaçadas – PROVITAS, deveriam se destinar apenas à proteção das “vítimas e
testemunhas”, enquanto que aos “réus colaboradores” caberia o encaminhamento ao Serviço
de Proteção ao Depoente Especial – SPDE, regulamentado pelo Decreto n° 3.518/2000 em
seu artigo 10, ou a aplicação de algumas medidas de segurança de forma isolada para cada
caso.
Porém, o fato é que o Serviço de Proteção ao Depoente Especial – SPDE, jamais foi
criado nos Estados federados, sendo instituído pelo Dec. nº 3.518/2000 apenas em âmbito
federal e com sede em Brasília. Assim sendo, os PROVITAS estaduais passaram a absorver
os réus colaboradores de seus Estados, uma vez que o SPDE, em Brasília, só atende aos
Estados não providos de Programas de Proteção. Portanto, não é só às vítimas e as
testemunhas que são atendidas pelos PROVITAS, como também os réus colaboradores.
É importante frisar que, embora a lei mencione, em seu artigo 7º, que as medidas de
proteção poderão ser adotadas isoladas ou cumulativamente, em regra, as medidas de proteção
são aplicadas de forma conjunta, principalmente em razão da falta de controle e
monitoramento por partes das equipes técnicas com relação às questões e mecanismos de
segurança.
Este fato acontece porque a cada nova inserção no programa, são geradas obrigações
para os protegidos, para os protetores e para as equipes, e ao mesmo tempo mantido o
controle, em maior ou menor grau, sobre os protegidos. A aplicação de medidas isoladas
interfere na relação entre o programa e os protegidos, na supervisão do protegido e
responsabilidade de ambos, razão pela qual, na prática, dificilmente é aplicada medida
protetiva de firma isolada.
Quando se fala em programas diferenciados, cabe questionar sobre a necessidade
de tratamento diferenciado que justifique a criação de programas distintos, um para atender
réus colaboradores, e outro, para vítimas e testemunhas.
O modelo de proteção proposto pelo PROVITA se baseia em estratégias para garantir
a segurança da testemunha, sendo que a confiança estabelecida entre a equipe e usuário é uma
das chaves para o sucesso da proteção. Em razão do laço de confiança que deve existir, muito
se questiona se o réu colaborador, por ter tido envolvimento com a criminalidade, seria tão
confiável quanto à testemunha ou vítima que, a princípio, não têm envolvimento com o crime.
2
2
Neste ponto, quando se trata das repercussões psicológicas do réu colaborador no
programa, verifica-se que a avaliação do requisito subjetivo “personalidade compatível”,
citada no artigo 2º, na primeira parte da Lei 9.807/99, é essencial, pois auxiliará na obtenção
de dados reveladores da personalidade e do grau de confiabilidade do usuário pleiteante.
Entretanto, existe um consenso sobre a desnecessidade, sendo assim na prática, da
existência de programas distintos, um para vítimas e testemunhas e outro para réus
colaboradores, como almejou a lei. Isto se deve ao fato de que o tratamento diferenciado gerar
discriminação e preconceito, além de ser desnecessário quando no tratamento da proteção de
pessoas ameaçadas.
Além disso, existem mecanismos que podem testar a confiabilidade de um usuário
inserido no programa, seja ele vítima, testemunha ou réu colaborador, devendo a equipe
técnica estar em constante atenção a este requisito. Neste contexto, entende-se que o
criminoso é resultado de um cruzamento de diversos fatores, não sendo descartada a
possibilidade de mudança de comportamento e atitudes por parte dos protegidos.
Capítulo II – RÉU COLABORADOR NO PROGRAMA DE PROTEÇÃO
3.1 Repercussões jurídicas do réu colaborador no Programa de Proteção
Antes de tratar sobre as repercussões jurídicas do réu colaborador no programa de
proteção, é importante analisar as considerações da atuação e atribuições do advogado no
Programa de Proteção.
Cabe registrar que o operador do direito no Programa de Proteção atua de forma
diferenciada de seus pares, uma vez que não atua na defesa da testemunha no sentido estrito
da palavra. É advogado do programa e não da vítima ou testemunha, não postulando em juízo
em favor do usuário.
Por essa razão o advogado do Programa de Proteção coloca-se de forma isenta na
dinâmica da relação processual, possibilitando um olhar crítico sobre a realidade que se
desenvolve em torno do réu colaborador. A intervenção do Advogado revela-se, ainda, no
processo de afirmação dos Direitos Humanos, na vigilância da legalidade e na agilidade dos
procedimentos judiciais e policiais.
Para a atuação eficaz do advogado do programa de proteção é de suma importância
considerar como princípio norteador de sua atuação a defesa dos Direitos Humanos, na
2
3
tentativa de romper o ciclo vicioso da impunidade que se manifesta de forma cruel na
sociedade, ao fomentar mais violência, além de suscitar no indivíduo sentimentos de revolta,
vingança e medo.
A luta contra a impunidade constitui o ponto para qual devem convergir os esforços do
operador do Direito que atua no Programa de Proteção, uma vez que a sua atuação funcional
estará diretamente ligada à defesa dos Direitos Humanos.
Citando as atividades desenvolvidas pelos advogados, dentro dos programas de
proteção, a obra publicada pelo GAJOP (Revista Direitos Humanos, 2001 p. 23), descreve as
mesmas, como sendo elas:

participar da triagem, onde analisa o(s) fato(s) delituoso(s), toma a termo as
declarações da vítima ou testemunha e avalia os riscos, emitindo parecer técnico
do caso;

elaborar o Parecer Técnico Interdisciplinar onde irá examinar se estão presentes os
requisitos legais de ingresso;

acompanhar a vítima e/ou testemunha em todas as ocasiões em que for necessária
a sua presença, seja na fase inquisitorial ou judicial;

acompanhar de forma sistemática os procedimentos, viabilizando a agilização
processual, somando esforços com o aparato de segurança e justiça do Estado;

trabalhar em sintonia com o Ministério Público, uma vez que este incumbe a
função de mensurar a relevância jurídica do testemunho;

buscar a sensibilização do Judiciário na perspectiva de estimular práticas que
priorizem os processos envolvendo vítima e testemunha que se encontram sob a
tutela do Provita;

estimular a reflexão de uma nova cultura no interior das políticas públicas
envolvidas nas ações do programa;

informar ao beneficiário sobre a situação processual, capacitando-o para obter o
reconhecimento de seus direitos de cidadão;
Ultrapassada a questão da atuação do Advogado no programa de proteção, se iniciará a
abordagem das repercussões jurídicas do réu colaborador nos Programas de Proteção.
Como observado anteriormente, quando foi tratado sobre a atual formatação dos
Programas de Proteção no Brasil, os mesmos não foram legalmente criados para assumir a
2
4
proteção do réu colaborador, sendo a lei, por esta razão, omissa em alguns pontos relativos ao
seu ingresso e permanência nos programas.
A primeira questão apontada como sendo uma das dificuldades jurídicas enfrentada
pelo réu colaborador, é o fato de não constar na lei à necessidade de celebração de acordo de
delação premiada, firmado entre o Ministério Público e o acusado, como requisito de ingresso
do mesmo no programa.
Tal acordo fundamenta-se no artigo 129, inciso I, da Constituição Federal, nos artigos
13 e 14 da lei 9.807/99 ( Proteção a Testemunhas), art. 8º, parágrafo único, da Lei nº 8.072/90
(Crimes Hediondos), além do art. 6º, da Lei nº 9.034/95 (Crime Organizado), estes aplicados
analogicamente, à luz do artigo 3º do Código de Processo Penal.
Tais dispositivos conferem ao Ministério Público o poder discricionário de propor ao
acusado quando da denúncia, um acordo para redução de pena privativa de liberdade de 1/3 a
2/3 ou a concessão do perdão judicial, que correspondente à extinção da punibilidade, ou
seja, a extinção do direito do Estado de aplicar sanção penal àqueles que descumprem as leis
penais.
O interesse público é atendido com a celebração deste acordo, tendo em vista a
necessidade de conferir efetividade à persecução criminal de outros suspeitos e réus, bem
como de ampliar e aprofundar, em todo o País, as investigações em torno de crimes,
principalmente os relativos ao Tráfico de Drogas, contra a Administração Pública, contra o
Sistema Financeiro Nacional, e contra a Ordem Tributária.
O referido acordo não é garantia absoluta de que o réu será, ao final do processo,
beneficiado com os institutos da delação premiada (redução de pena e perdão judicial), uma
vez que tal decisão dependeria de decisão judicial. Entretanto, é uma garantia de que o
Ministério Público, titular da ação penal, estará no processo postulando pela aplicação de tais
institutos em seu favor. Por essa razão, como a decisão final é do judiciário, é importante que
o Promotor de Justiça formule seu pedido e solicite a sua homologação judicial, conferindo
assim maiores garantias ao referido documento.
Embora inicialmente possa parecer que o referido acordo seja mais um obstáculo ao
ingresso do réu colaborador no programa, pois seria mais um requisito a ser preenchido, do
contrário, tal acordo garante ao réu que o Ministério Público empenhe-se em fazer com que a
colaboração do réu seja efetiva, e que os benefícios da delação premiada (perdão judicial e
diminuição da pena) sejam ao final, concretizados.
Importante salientar que, não sendo raro acontecer, Promotores de Justiça que
convencerem um réu a testemunhar contra seus comparsas, em troca dos benefícios,
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principalmente em crimes envolvendo organizações criminosas, mas que posteriormente
acabam deixando o processo em razão de promoção na carreira, por exemplo, e não
garantindo assim, que sejam efetivados os benefícios da delação (perdão judicial e diminuição
da pena).
Havendo um acordo formal de delação firmado entre Ministério Público e réu, este
não ficará sujeito a incerteza de uma futura condenação ou na incerteza de que seu beneficio
será efetivamente pleiteado em juízo, e se será o promotor que solicitou o ingresso o mesmo
até o final do processo.
Ao analisar as repercussões psicológicas do réu colaborador nos Programas de
Proteção, é possível verificar o drama vivido por estas pessoas dentro dos programas em
razão desta insegurança criada.
Portanto, o acordo deva ser compreendido como um direito subjetivo do réu e não
como mero favor. Assim, preenchido os requisitos legais, os benefícios da delação premiada
devem ser concedidos ao réu colaborador. Segundo Fernando Capez (2004, p. 118) : “[...]
presentes os requisitos, a diminuição da pena não pode ser negada, tratando-se de direito
público subjetivo do acusado ou condenado (quando feita após o transito em julgado).”
A preocupação do usuário com relação aos processos em que figura como réu é
plenamente justificável. O usuário teme por sua vida, pois se eventualmente for condenado e
tiver que cumprir pena, fatalmente será morto, uma vez que dentro do sistema carcerário sua
condição de “delator” é considerada infração gravíssima, e a pena para estes casos é a morte.
Diante da compreensível preocupação dos usuários com seu futuro no processo, é
importante que ocorra mudanças legislativas que contemplem o réu colaborador com a
obrigatoriedade do acordo de delação premiada.
É necessário, também, que os Advogados dos Programas articulem com o Ministério
Público um acordo de Delação Premiada, com a respectiva homologação judicial, para no
caso de ocorrer uma eventual condenação o réu colaborador seja favorecido com um perdão
judicial.
Outra questão bem polemica diz respeito a preservação da identidade e o contrato
formal de trabalho para os usuários inseridos no programa. O artigo 7º, IV, da Lei 9.809/99,
prevê que: “[...] os programas compreendem, dentre outras, as seguintes medidas, aplicáveis
isolada ou cumulativamente em beneficio da pessoa protegida, segundo a gravidade e as
circunstâncias de cada caso: [...] IV – preservação da identidade, imagem e dados pessoais.”.
O mesmo direito que assegura a preservação da identidade e dados pessoais do
individuo inserido no programa, garantindo seu anonimato e evitando, desse modo,
2
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represálias por parte dos grupos criminosos organizados, termina por se converter em
verdadeiro óbice à inserção do usuário no mercado formal de trabalho, porquanto não se pode
indicar nome fictício para efeito de contrato de trabalho e registro de empregado no Instituto
Nacional Serviço Social - INSS, bem como no que se refere a Fundo de Garantia por Tempo
de Serviço- FGTS, a ser recolhido junto à Caixa Econômica Federal.
Dentro deste contexto, a situação faz com que empresas recusem sistematicamente a
contratação de trabalhadores inseridos em Programas de Proteção, em virtude de temerem as
conseqüências do não fichamento em carteira e o não recolhimento das contribuições
previdenciárias.
Em face das barreiras opostas pelos empregadores à contratação, e sendo certo que o
trabalho é fonte de realização não apenas material, mas, sobretudo moral e espiritual do
trabalhador, se torna necessária a busca de soluções para contornar esta dificuldade.
Algumas medidas, objetivando contornar este tipo de dificuldade, e que podem ser
sanadas com a intervenção dos Conselhos Deliberativos, onde solicitariam ao INSS admitir a
inscrição do trabalhador com um nome fictício indicados pelo programa durante o período de
sua execução, que é de dois anos, podendo, em circunstâncias excepcionais, ser prorrogada a
permanência do trabalhador, na eventualidade de perdurarem os motivos autorizativos à sua
incorporação ao modelo protetivo do programa.
A participação nos Conselhos Deliberativos de representantes do Ministério Público
do Trabalho, por exemplo, é de suma importância, pois, o promotor trabalhista, em dadas
situações, poderá adotar medidas judiciais ou administrativas tendentes a obstar a prática
discriminatória perpetrada contra trabalhadores inseridos no programa.
Nestas situações, a fim de preservar o sigilo, as informações relativas ao trabalhador
protegido devem ser passadas exclusivamente ao Ministério Público do Trabalho e não ao
sindicato profissional, que também possui legitimidade para ingressar em juízo em defesa dos
interesses individuais do trabalhador, pois neste último caso corre-se o risco de vir a ser
conhecida a verdadeira identidade do trabalhador.
O Ministério Público do Trabalho assumirá a iniciativa concernente a toda e qualquer
medida judicial proposta, consoante determina o artigo 127, caput, da Constituição Federal,
cuja tramitação se dará sob o mais rigoroso sigilo, conforme permitido pelo artigo 93, IX,
parte final, da Constituição Federal e artigo 155, I, do Código de Processo Civil, de irrefutável
aplicação subsidiária ao processo do trabalho, no seu artigo. 769, da Consolidação das Leis
Trabalhistas.
2
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Outra forma de se garantir o acesso ao trabalho formal do trabalhador inserido no
programa seria a alteração da legislação (Lei nº 9.807/99), para estabelecer a suspensão ou
interrupção parcial do contrato de trabalho dos empregados eventualmente inseridos no
programa de proteção.
Desta forma, após a inclusão do empregado no programa, ficaria obrigado o
empregador a lhe pagar salário, bem assim a computar o período de afastamento como de
serviço efetivo para efeito de aposentadoria, recolhendo Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço - FGTS, férias, além de benefícios que possam decorrer de ajuste em norma coletiva
(acordo ou convenção).
Entretanto, uma alteração legislativa que garanta estabilidade empregatícia não seria o
melhor caminho, pois, corre-se o risco de uma reação ainda maior dos empregadores no
sentido de não contratação de trabalhadores protegidos, com graves repercussões para a sua
integração ao mercado de trabalho. Em situações como esta, medidas político-administrativas
são suficientes para resolver situações sem que tenha que se aguardar mudanças legislativas.
Outro ponto que merece a devida atenção pelo legislador é o que se refere a agilidade
dos processos e inquéritos envolvendo pessoas protegidas pelos Programas de Proteção.
Tendo em vista que para se garantir o bom funcionamento do programa é necessário à
adoção de medidas que visem à tramitação prioritária dos processos envolvendo pessoas
protegidas, destacando-se aqui o réu colaborador, que tem sua condição processual diversa
das demais pessoas protegidas.
O programa em regra tem duração máxima de dois anos, podendo ser prorrogado pelo
tempo necessário para a efetivação da proteção apenas em circunstâncias excepcionais,
quando perdurarem os motivos que deram ensejo ao seu ingresso, conforme dispõe o artigo
11 da Lei 9.807/99.
É preciso frisar que a lei não desejou a prorrogação do prazo, ou seja, mesmo que
ainda existam os motivos, somente em casos excepcionais é que deverá ocorrer. Isso faz com
que o processo crime transite em julgado dentro desse período, justificando assim a
necessidade de preferência na tramitação.
Neste particular, torna-se imperioso que não se espere por uma mudança legislativa,
podendo os Tribunais de Justiça, por meio de atos internos, estabelecerem regras que
garantam a tramitação prioritária dos processos envolvendo pessoas protegidas, bem como
adoção de medidas protetivas que resguardem a identificação do beneficiário do programa
nestes processos.
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3.2 Repercussões psicológicas do ingresso do réu colaborador no Programa de Proteção
De acordo com o art. 2°, § 2ª da Lei 9.807/99, a pessoa para ser incluída no Programa
de Proteção, deve ter personalidade compatível com as restrições de comportamento a ele
inerente, sob pena de por em risco as demais pessoas protegidas, as Equipes Técnicas e a
Rede de Proteção como um todo.
Parágrafo segundo -
Estão excluídos da proteção os
indivíduos cuja personalidade ou conduta seja incompatível
com as restrições de comportamento exigidas pelo programa,
os condenados que estejam cumprindo pena e os indiciados ou
acusados sob prisão cautelar em qualquer de suas modalidades.
Tal exclusão não trará prejuízo a eventual prestação de
medidas de preservação da
integridade física desses
indivíduos por parte dos órgãos de segurança pública.
Embora a Lei 9.807/99 estabeleça que o usuário do programa deva ter personalidade
compatível com as regras restritivas do Programa, tal dispositivo deve ser bem compreendido
para não se cometa discriminações e injustiças.
Realmente, o fato de o réu colaborador ter praticado ou participado de um crime, por
si só não é argumento suficiente para se afirmar que o mesmo não possua personalidade
compatível para ingressa no Programa.
Nestes casos, competirá à Equipe Técnica realizar um trabalho mais aprofundado,
notadamente por parte dos profissionais da área da Assistência Social e Psicologia,
consistente na pesquisa dos precedentes pessoais e familiares do solicitante, sob os aspectos
físicos, psíquicos e morais.
Tais elementos auxiliarão na obtenção de dados reveladores da personalidade e do
grau de confiabilidade do usuário pleiteante, requisito imprescindível este que deverá ser
constantemente apreciado durante a sua permanência no Programa.
É sabido que a frustração ocasionada pelo não cumprimento das exigências por parte
dos usuários do Programas gera situações de conflito e desconfiança entre a equipe técnica e o
usuário que, além de colocarem em risco a integridade da testemunha, compromete todos os
integrantes do Programa.
O modelo de proteção proposto pelo Programa de Proteção se baseia em algumas
estratégias importantes para garantir a segurança da testemunha, sendo que a confiança
estabelecida entre a equipe e usuário é a chave para o sucesso da proteção.
Não é fácil para os usuários deixar para trás suas histórias de vida, relações familiares,
afetivas, de acomodações, projetos, rotinas e começar uma nova vida. É uma experiência
2
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forçada na tentativa de escapar da situação de violência da qual estava inserido. Essa nova
realidade deve ser muito bem assimilada pelo usuário, caso contrário dificilmente conseguirá
superar seus conflitos internos, bem como se inserir em um novo contexto social.
A resilência, que consiste na capacidade do indivíduo de se adaptar de maneira
positiva diante de situações adversas, mantendo seu desenvolvimento normal e recuperandose dos efeitos traumáticos vividos é de suma importância. Para o usuário réu colaborador, esta
capacidade de adaptação dependerá de diversos fatores, principalmente da habilidade da
Equipe Interdisciplinar em demonstrar para o usuário essa possibilidade de mudança diante
do novo contexto em que passa a viver.
Entretanto, a tentativa de demonstrar ao usuário essa nova realidade muitas vezes é
difícil, uma vez que a superação de sua antiga realizada está diretamente relacionada ao
processo judicial do qual o réu participou. Isto porque, é extremamente difícil ao usuário réu
colaborador se adaptar a uma nova realidade, enquanto seu pensamento estiver voltado para o
processo judicial que responde e que eventualmente poderá lhe imputar uma condenação.
Tal possibilidade suscita no indivíduo sentimentos de medo, arrependimento e
descrédito na justiça, o que muitas vezes, dificulta sobremaneira o trabalho da Equipe
Técnica, pois os profissionais dos Programas de Proteção sempre trabalham para que o
testemunho do usuário, seja ele réu colaborador ou testemunha/vítima propriamente dita,
contribua de forma efetiva para o processo e condenação de seus algozes, reforçando no
usuário sentimentos de justiça e de exercício de cidadania.
Assim, observamos que existe um verdadeiro antagonismo no psíquico do usuário,
uma vez que os mesmos sentimentos que o levaram de forma positiva a revelar seu
testemunho, muitas vezes são os mesmos que de forma negativa acarretam medo,
arrependimento e descrédito na justiça.
A incerteza de uma futura condenação atrasa sobremaneira a autonomia do usuário e
dificulta os trabalhos das Equipes Técnicas, uma vez que o usuário não se motiva a
restabelecer uma nova vida, pois, não tendo certeza de sua absolvição, acredita que todo o
esforço de mudança poderá ser em vão, exigindo do operador do direito um acompanhamento
sistemático dos procedimentos judiciais e um trabalho conjunto com Ministério Público e
Judiciário, a fim de viabilizar a formulação de acordos de delação premiada , além é claro, do
acompanhamento dos demais membros da Equipe nas questões psicossociais.
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0
3.3 Repercussões sociais do ingresso do réu colaborador no Programa de Proteção
Conforme dispõe a Lei n° 9.807/99, em seu artigo 2°, § 2ª , da mesma forma que se
exige do protegido personalidade compatível, a lei exige também que o usuário tenha um
conduta social compatível com as restrições de comportamento a ele inerente.
Tal como ocorre com a personalidade, o requisito da conduta social compatível deverá
ser muito bem analisado para que não ocorra discriminações, conforme podemos verificar
quando tratamos no tópico anterior.
São inúmeras e essenciais às contribuições da Assistência Social para os Programas de
Proteção, uma vez que é através dela que se pode compreender os contextos sociais.
No que diz respeito às repercussões dos enfoques da Assistência Social na rede de
serviços utilizada pelos programas, é importante registrar que toda política pública de
combate/diminuição da criminalidade só é eficaz se associada a implementação de políticas
sociais, principalmente as que asseguram o direito à proteção social, destacando-se aí a
Assistência Social como política pública geradora de direitos e provedora dos mínimos
sociais.
No campo da assistência social, o que vimos na prática, principalmente nos Programas
de Proteção à Testemunha, é a dificuldade de reinserção social do usuário por questões de
segurança, fato este que muita vezes impede o usuário de usufruir de autonomia e de exercer
direitos. Estas constatações se dão principalmente em relação à impossibilidade exercer
trabalho formal, e conseqüente contribuição para a previdência social.
Torna-se claro que, este cerceamento a direitos é fruto da falta de articulação política
entre os órgãos estatais, pois é possível criar estratégias junto ao Ministério do Trabalho e
Previdência Social, por exemplo, para que o usuário não seja identificado nos bancos de
dados destes órgãos.
Este tipo de dificuldade enfrentada pelos Programas impede a emancipação do usuário,
fazendo com que a Assistência Social seja vista, principalmente por aqueles que desconhecem
o Serviço Social, como ajuda aos carentes e necessitados vítimas de violência e não como um
direito social.
Um ponto que atrasa sobremaneira a reinserção social do usuário, e que foi objeto de
estudo quando se trata das repercussões jurídicas do réu colaborador no programa, é a
dificuldade que os órgãos públicos têm em criar mecanismos seguros para inserir usuários
protegidos em seus bancos de dados, de forma que os mesmos tenham seus direitos sociais
3
1
garantidos, especificamente os previdenciários e trabalhistas, como já mencionado
anteriormente.
Garantir que os usuários dos programas possam exercer de forma segura trabalho
formal e contribuir para a previdência social é um dos grandes desafios dos Programas de
Proteção.
Conforme já comentado, em muitos casos, medidas político-administrativas são
suficientes para resolver situações sem que tenha que se aguardar mudanças legislativas.
Exemplos concretos de medidas já podem ser relatados em alguns Tribunais de Justiça do
Estado, onde foram criados provimentos disciplinando Delegados de Policia, Promotores de
Justiça e Juízes de Direito, que relatam como os mesmos podem proceder na condução de
inquéritos e processos envolvendo vítimas/testemunhas/réu colaboradores protegidos, com a
finalidade específica de proteger suas identidades. Tais exemplos podem ser implementados
junto ao Ministério da Previdência Social e Ministério do Trabalho.
A luta contra a impunidade envolve uma série complexa de providências e ações de
cunho social. Uma delas é a participação de movimentos da sociedade civil engajados na
defesa e promoção de direitos humanos. A outra é a participação do Estado, como gestor
financeiro e facilitador da utilização do aparato estatal para a execução desta política pública.
3.4 A importância das Equipes Interdisciplinares nos Programas de Proteção
Diante da complexidade das relações jurídico-psico-sociais, torna-se imprescindível à
necessidade de interação\ integração das várias áreas do conhecimento humano nas
intervenções das Equipes dos programas.
A complementariedade das várias áreas das ciências humanas envolvidas possibilita
uma análise conjunta dos fatos, fornecendo elementos para uma reflexão mais próxima da
realidade social, afastando a atuação dos profissionais das Equipes dos dogmas inerente a
cada área do saber.
A interdisciplinariedade exige que cada especialista ultrapasse seus próprios limites,
abrindo-se a contribuições de outras disciplinas. Assim, ter objetivos e metodologias comuns
ajudam a superar as dificuldades encontradas pelo grupo. Desta forma, a elaboração de um
plano de ação para a intervenção da Equipe junto ao usuário é fundamental para a atuação das
Equipes dos Programas.
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2
O plano de ação deve integrar momentos de conhecimento e intervenção em um
processo, ou seja, plano de ação para a intervenção da Equipe junto ao usuário, é
imprescindível para a atuação das mesmas.
Realmente, antes de inserir o usuário no Programa, é necessário construir um projeto
de reinserção sob uma perspectiva interdisciplinar. Após diagnosticar o caso concreto, podese avançar para o planejamento das possíveis ações necessárias à superação das dificuldades
apresentadas no caso, executando ações que atendam as demandas sociais (saúde, educação,
trabalho etc), psicológicas (psicanálise, terapias etc) e jurídicas ( ajuizamento de ações etc)
demandadas pelo usuário do Programa.
Vários são as situações reais que justificam e confirmam a necessidade de aplicação
desta metodologia. Ex: a situação de risco; a saudade pela distância de familiares; a não
inserção no mercado de trabalho; as dificuldades em adaptação a nova localidade e
insatisfação mediante o relacionamento conjugal; ociosidade; origem cultural; resistência
frente as orientações da Equipe; entre outras inúmeras situações.
O objetivo desses procedimentos e da intervenção interdisciplinar é o de compreensão
do caso sob uma ótica diversificada, a fim de estabelecer um campo comunicativo entre as
disciplinas, visando sempre à escolha de um melhor encaminhamento do caso.
3.5 A importância da Sociedade Civil na construção da rede solidária de proteção
Com a entrada em vigor da Lei Federal n° 9.807/99 o grande desafio institucional foi o
de formular uma proposta de política pública que contribuísse para controle da criminalidade
num quadro social e político marcado pela impunidade e pela banalização da violência. Com
o objetivo de dar efetividade às diretrizes traçadas por esta lei, coube aos Programas de
Proteção mobilizar o Estado e a sociedade civil organizada na construção de um compromisso
social em defesa dos direitos de vítimas e testemunhas ameaçadas.
No contexto atual, é cada vez mais evidente à importância da participação de entidades
e pessoas que contribuam de alguma forma para as ações do Programa. A construção de uma
rede solidária de apoio às ações do Programa de Proteção é o segredo para o seu sucesso. A
participação da sociedade significa grande economia de recursos, além de acrescentar o
componente de cidadania que faz desta política publica uma das mais importantes.
Para tanto, a entidade gestora precisa ter capacidade de mobilização da sociedade para
alcançar os objetivos do Programa. Pannunzio (2001, p.172), assim se manifesta :
3
3
O cerne da proposta do PROVITA é a estrutura de
uma rede de proteção, composta por organizações e
indivíduos da sociedade civil, para o acolhimento
sigiloso de vítimas, testemunhas e seus familiares
que estejam sendo ameaçados em razão de colaborar
para o esclarecimento de crimes e a
responsabilização de seus autores. Mas ainda, o
PROVITA se propõe a facilitar a inserção social
dessas famílias em novas comunidades, a estimular
o exercício da cidadania e a promover uma
articulação com as instituições que compõe o
sistema de segurança e justiça a fim de romper o
ciclo da impunidade.
As virtudes desse modelo são bastantes
significativas. Em primeiro lugar, a participação da
sociedade civil confere credibilidade a um serviço
que dificilmente teria condições de estimular a
confiança de famílias em situação de risco se fosse
executado isoladamente pelo Estado, além de
impulsionar a participação da própria população no
programa, que conta com um destacado número de
voluntários. Do mesmo modo, o envolvimento de
diversas instituições confere a ele um maior suporte
político e operacional, além de funcionar como
garantia adicional nos momentos de transição
política.
A problemática enfrentada pelo Programa de Proteção não é só o de estabelecer
contatos e construir uma rede de apoio, mas também o de manter essa rede atuante e
verdadeiramente solidária.
Dentre as estratégias de construção de uma rede de voluntários, podemos citar:

mapeamento das zonas de violência no Estado para definição dos locais mais
indicados para delinear a Rede Solidária de Proteção;

mapear os Municípios, as instituições públicas e privadas e locais que possuem
características adequadas, previamente definidas pela Equipe;

estabelecer contatos com lideranças e pessoas responsáveis pelos locais
selecionados e firmar compromissos;

cadastrar os locais de proteção;

efetuar a capacitação;
3
4

efetuar o monitoramento da Rede;
Embora caiba a entidade executora e equipe multidisciplinar estabelecer contatos a fim
de construir uma rede de apoio que se proponha ajudar financeira ou estruturalmente o
Programa, a realidade diária revela que tal atividade exige atribuições específicas e dedicação
exclusiva, uma vez que se mostra complexa. A rede deve ser regularmente monitorada e
mapeada.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante da criminalidade cada vez mais ousada, que viola as normas de convivência em
sociedade, solapando a ordem moral e a integridade da justiça, não há mais espaço para a
impunidade.
Neste contexto, os Programas de Proteção surgem como instrumentos eficazes de
combate a criminalidade, necessitando apenas de um maior aprimoramento legal e
institucional, natural em um programa ainda em processo de aperfeiçoamento.
Os órgãos públicos e a sociedade civil devem se aproximar cada vez mais, numa
interação salutar, visando o aprimoramento dos programas. É imprescindível que a
cooperação entre as instituições persista, buscando a proteção dos usuários protegidos.
As possibilidades para superação das limitações apontadas ao longo do trabalho
passam não só o pelo aprimoramento legislativo, como também pelo:
- relacionamento institucional com os órgãos públicos e privados na construção de redes de
apoio as atividades dos Programas de Proteção;

articulação de políticas públicas complementares ;

garantia da medidas de segurança para réus colaboradores previstas na Lei 9.807;

aperfeiçoamento do sistema de monitoramento e supervisão dos programas;

desenvolvimento de mecanismos que promovam maior agilidade aos procedimentos
policiais e judiciais;

aprimoramento da experiência democrático-participativa e da gestão compartilhada
Estado-sociedade civil;

agilização dos processos e inovações adaptadas às peculiaridades do programa;

ampliação da percepção de combate à impunidade com resgate da cidadania.
A politica pública de combate a impunidade deve expressar a reafirmação dos
compromissos e das responsabilidades assumidas em prol do aperfeiçoamento dos Programas
de Proteção, a partir da adequação da legislação em vigor e dos instrumentos a disposição do
3
5
Estado às necessidades dos programas, visando otimizar a efetivação das medidas protetivas
relacionadas principalmente ao réu colaborador.
.
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