ULTRAPASSAR
A FRAGILIDADE
DE ÁFRICA
ELABORAR UMA NOVA ABORDAGEM EUROPEIA
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MOBILIZAÇÃO DA INVESTIGAÇÃO
EUROPEIA NO DOMÍNIO DAS
POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO
SOBRE
O
DESENVOLVIMENTO
ULTRAPASSAR
A FRAGILIDADE
DE ÁFRICA
ELABORAR UMA NOVA ABORDAGEM EUROPEIA
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
MOBILIZAÇÃO DA INVESTIGAÇÃO
EUROPEIA NO DOMÍNIO DAS
POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO
SOBRE
O
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre Desenvolvimento de 2009, Ultrapassar a Fragilidade de África, Centro de
Estudos Avançados Robert Schuman do Instituto Universitário Europeu, San Domenico di Fiesole.
© União Europeia, 2009
Reprodução autorizada mediante indicação da fonte
Declaração de exoneração de responsabilidade:
As opiniões expressas no presente relatório são da exclusiva responsabilidade dos autores e não
reflectem necessariamente a posição oficial da Comissão Europeia ou dos Estados-Membros da
União Europeia.
Caso exista alguma ambiguidade, o texto em inglês terá precedência sobre todas as outras versões
linguísticas.
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Preâmbulo
PREÂMBULO
A elaboração de políticas exige conhecimentos exactos, profundos e atempados de qualquer
situação. E o desenvolvimento não é excepção. Na Europa, existe uma grande diversidade de
universidades e institutos de investigação que estudam as questões do desenvolvimento e produzem
trabalho analítico informado. No entanto, o pleno aproveitamento do seu potencial ainda não se
concretizou por várias razões, incluindo a fragmentação de esforços, uma escassez de recursos e
uma desconexão relativa no domínio da elaboração política.
A iniciativa “Mobilização da investigação europeia no domínio das políticas de desenvolvimento”
destina-se a corrigir esta situação. Apoiada actualmente pela Comissão Europeia e por seis EstadosMembros (Alemanha, Espanha, Finlândia, Luxemburgo, Reino Unido e Suécia), esta iniciativa
conjunta procura promover a perspectiva europeia, a sua visão, sobre algumas das questões de
desenvolvimento candentes da nossa época, com base na excelência do conhecimento, na inovação
e na criação de uma base comum entre a comunidade de investigação europeia e os decisores
políticos.
O presente Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento (RED), que deverá ser publicado anualmente,
é o principal resultado desta iniciativa. Trata-se de uma análise independente, baseada no
conhecimento e orientada para o futuro, das questões de desenvolvimento que reflectem uma
visão europeia. O presente Relatório ajudará a União Europeia a aperfeiçoar a sua visão em matéria
de desenvolvimento, enriquecer as suas políticas e influenciar o debate internacional para que possa
marcar a diferença. Também complementa outros relatórios importantes sobre desenvolvimento,
numa tentativa de reflectir a diversidade de opiniões que podem coexistir em relação a várias
questões e, se aplicável, as abordagens europeias específicas, baseadas nos valores políticos e
sociais da Europa e na sua própria história e experiência. De facto, estamos convencidos de que
não deverá existir qualquer monopólio do pensamento numa área tão complexa e rica como é a
política de desenvolvimento.
Esta primeira edição anual, elaborada sob a direcção do Instituto Universitário Europeu (IUE), com
sede em Florença, aborda a complexa e multidimensional questão da “fragilidade”, com especial
incidência na África subsariana, onde a maior parte dos países frágeis estão localizados. Esta questão
foi descrita como “o desafio mais difícil da nossa era em matéria de desenvolvimento”. Fazer face
às situações de fragilidade é, certamente, um problema crescente quer para a Europa quer para
toda a comunidade internacional, e uma prioridade cada vez mais importante nas políticas de
desenvolvimento europeias. É também um desafio fundamental para a estratégia de segurança
europeia.
Ultrapassar a fragilidade é, antes de mais, uma necessidade moral imperiosa. Um terço do
mundo pobre vive nos países considerados frágeis. O progresso na consecução dos Objectivos
de Desenvolvimento do Milénio (ODM) está atrasado nesses países e o custo de uma governação
fraca, especialmente quando esta conduz a conflitos e guerras, é enorme em termos económicos,
humanos e sociais. Este aspecto reveste-se de grande importância, atendendo à estreita relação entre
os choques alimentar, de combustíveis e, actualmente, económico e financeiro que ameaçam reverter
os recentes progressos de desenvolvimento. Os custos humanos das crises são especialmente
preocupantes para os países frágeis da África subsariana, onde a capacidade de resposta aos choques
é limitada.
As situações de fragilidade são também a principal fonte de preocupação numa perspectiva de
segurança. Num mundo cada vez mais interdependente, enfrentar a fragilidade é também do
nosso interesse a fim de assegurar a estabilidade e a prosperidade a nível global. O ressurgimento
da pirataria no Golfo de Aden, o qual está associado à situação de agitação na Somália, bem como
os fluxos económicos, políticos e de refugiados de guerra, que, compreensivelmente e muitas vezes
com relutância, fogem da fragilidade nos seus países de origem para construir vidas melhores e
mais estáveis na Europa e outras regiões abastadas do mundo, são apenas alguns exemplos desta
crescente interdependência.
Por último, estas situações, que incluem um conjunto extremamente diverso de sociedades com
circunstâncias e composições socioeconómicas, culturais e políticas muito diferentes, exigem
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SOBRE
O
III
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Preâmbulo
abordagens específicas e adaptadas a cada caso quando se trata de apoio externo. Os instrumentos
clássicos da política de desenvolvimento, nomeadamente, a agenda da eficácia da ajuda (Declaração
de Paris e Agenda de Accra em matéria de Acção (AAA)), o Consenso Europeu sobre o desenvolvimento
e a abordagem para apoiar as reformas em matéria de governação, enfrentam desafios específicos
na sua aplicação em contextos frágeis. Tal como referido no estudo da UE “A meio caminho dos
Objectivos de Desenvolvimento do Milénio”, de 2008, orientado pelo Professor Bourguignon e
elaborado no âmbito desta iniciativa1, “é, portanto, essencial enfrentar essa “fragilidade”, a fim de
alcançar um progresso dos ODM. Isto exigirá um envolvimento sustentado e uma utilização nova
e imaginativa de recursos políticos, técnicos, financeiros e, por vezes, militares, implicando os
governos, mas também a sociedade civil e agentes não estatais”. A este respeito, os países parceiros
e doadores estão actualmente empenhados num “diálogo internacional sobre a construção do
Estado e a consolidação da paz” com o objectivo de chegar a um possível consenso em matéria de
objectivos e princípios de intervenção nestas circunstâncias mais difíceis.
Foi organizado um intenso processo participativo, que reuniu estudiosos, decisores políticos e
representantes da sociedade civil, da Europa e de África, para realizar esta ambiciosa iniciativa de
investigação política. Através da criação de bases analíticas comuns sobre a melhor forma de resolver
estas situações difíceis, a primeira edição do RED ajudará a Europa a aperfeiçoar a sua abordagem
estratégica à situação de fragilidade e a definir políticas mais coerentes no futuro. Trata-se de um
grande progresso para a iniciativa de investigação europeia, que procura clarificar a forma de
conciliar os objectivos de desenvolvimento com os novos desafios globais.
Stefano Manservisi
Yves Mény
Director-Geral da Comissão Europeia para o Desenvolvimento
e Relações com os Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico
Presidente do Instituto
Universitário Europeu
1
Ver “Millennium Development Goals at Midpoint: Where do we stand and where do we need to go?”
Documento de apoio da UE da autoria de François Bourguignon et al., 2008,
http://ec.europa.eu/development/icenter/repository/mdg_paper_final_20080916_en.pdf
IV
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Agradecimentos
AGRADECIMENTOS
Este Relatório foi elaborado por uma equipa de investigadores do Centro de Estudos Avançados
Robert Schuman do Instituto Universitário Europeu (IUE), liderada por Giorgia Giovannetti e
composta por Franklin Allen, Simone Bertoli, Shailaja Fennell, Wendy Harcourt, Marta ReynalQuerol, Marco Sanfilippo, Elisa Ticci, Pascal Vennesson e Thierry Verdier. O gestor do projecto foi
Ingo Linsenmann.
A equipa deseja agradecer especialmente a François Bourguignon pelo seu aconselhamento científico
e a Luca Alinovi, Nicolas Gérard, Seth Kaplan, Stephan Klasen, Ramon Marimon, Françoise Moreau,
Yaw Nyarko, Dorothée Starck, bem como a todos os membros do Comité de Direcção RED pelo seu
aconselhamento e apoio constantes. Desejamos igualmente agradecer a Stefania Innocenti o seu
apoio à investigação.
William A. Amponsah, Mina Baliamoune-Lutz, Stefano Bartolini, Victor Davies, Jörn Grävingholt,
Sven Grimm, Francesco N. Moro, Donato Romano, Alexander Sarris, Andrew Sherriff e Gianni Vaggi
colaboraram activamente no processo de consulta. Lubomira Bencova, Piera Calcinaghi, Monique
Cavallari, Angela Conte, Mei Lan Goei, Laetitia Jespers, Alexei Jones, Laura Jurisevic, Christine Lyon,
Serena Scarselli, Elisabetta Spagnoli e Valerio Pappalardo participaram em várias fases do relatório.
Bruce Ross Larson foi o editor principal. Chris Engert foi responsável pela revisão linguística dos
documentos de apoio. A todos, os nossos agradecimentos.
Devemos muito aos autores das notas e documentos de apoio: Ernest Aryeetey, Niagale BagayokoPenone, Michael Barnett, Nicolas Berman, Elva Bova, Deborah Bryceson, Christian Büger, Maurizio
Carbone, Paul Collier, Lorenzo Cotula, Nasredin Elamin, Fernanda Faria, Patrick Guillaumont, Sylvaine
Guillaumont Jeanneney, Kenneth Harttgen, Damien Helly, Lelio Iapadre, Zohra Kahn, José Maria Larrú,
Francesca Luchetti, Alan Matthews, Philippe Martin, Jesse McConnell, Mark McGillivray, Andrew
Mold, Wim Naudé, Janvier Nkurunziza, Abena D. Oduro, Alina Rocha-Menocal, Sara Pantuliano,
Jean-Philippe Platteau, Béatrice Pouligny, Prabirjit Sarkar, Ajit Singh, Aysen Tanyeri-Abur, Necla
Tschirgi, Margherita Velucchi e Tony Venables.
Um agradecimento especial a todos os participantes da iniciativa New Faces for African Development,
que contribuíram entusiasticamente com novas opiniões para o relatório, apresentaram o seu
trabalho e redigiram notas e documentos: Eme Akpan, Japhet Biegon, Muslilhah Badmus, Christian
B. Kamga Kam, Dorine Kanmi Feunou, Nicholas Kilimani, Albert Makochekanwa Douzounet Mallaye,
Ndubuisi Nwokolo Magidu Nyende, Isaac Oluwatayo, Thomas Poirier, Afees Salisu e Sigismond
Wilson.
É impossível agradecer a todas as pessoas, por exemplo, todos os que contribuíram para o processo
que conduziu à publicação do presente relatório, participando em sessões preparatórias em Bruxelas
(6 de Fevereiro) Cambridge (17-18 de Março), Florença (16-17 de Abril), Barcelona (7-8 de Maio),
Accra (21-23 de Maio), Florença (22-23 de Junho) e Bruxelas (4 de Setembro). A lista completa
de participantes nestes eventos está incluída no Volume 1B, mas gostaríamos de salientar aqui,
com gratidão, os contributos de todos para o processo de consulta e para os debates sobre os
temas controversos. Agradecemos igualmente às Instituições de acolhimento, nomeadamente o
Jesus College, em Cambridge, Universitat Pompeu Fabra e CREMed (Centro de Investigação das
Economias do Mediterrâneo) em Barcelona, e o ISSER (Instituto de Investigação Estatística, Financeira
e Económica) em Accra.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
V
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Índice
ÍNDICE
PERSPECTIVA GERAL
1. Melhores respostas da UE a situações de fragilidade
2. Definição de prioridades
1
4
7
SECÇÃO UM
10
CAPÍTULO 1
FRAGILIDADE DO ESTADO NA ÁFRICA SUBSARIANA: DESAFIOS E CUSTOS
1. Políticas europeias de desenvolvimento num contexto global em evolução
2. A que se refere o conceito de fragilidade de Estado?
3. Os custos da fragilidade do Estado na África subsariana
11
11
16
18
CAPÍTULO 2
CARACTERÍSTICAS DOS ESTADOS FRÁGEIS
1. Os Estados frágeis partilham algumas características comuns
2. Os países frágeis apresentam muitos elementos de heterogeneidade
2. Em resumo
32
32
37
50
CAPÍTULO 3
AS ORIGENS HISTÓRICAS DA FRAGILIDADE DOS ESTADOS
1. Principais factores específicos e factores subjacentes comuns
2. Será a fragilidade um legado colonial?
3. Estados coloniais da África subsariana
4. Descolonização
5. Contexto internacional e continuidade
6. A dependência da trajectória das instituições – afastamento e extroversão
7. Conclusões
51
51
52
52
53
55
57
59
CAPÍTULO 4
OS FACTORES ECONÓMICOS PODEM AUMENTAR A FRAGILIDADE
1. Os factores económicos influenciam a fragilidade dos Estados e a fragilidade influencia a economia
2. A abertura comercial pode aumentar ou reduzir a fragilidade dos Estados
3. Ligações bidireccionais entre o investimento directo estrangeiro e a fragilidade
4. A afectação dos recursos naturais pode piorar a governação
5. A governação afecta a relação entre a terra e a fragilidade
6. Populações famintas e instituições frágeis
7. Conclusão
60
60
61
62
63
65
72
73
VI
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Índice
SECÇÃO DOI
76
CAPÍTULO 5
FRAGILIDADE VERSUS RESILIÊNCIA
1. Melhorar a resiliência
2. O que implica uma abordagem baseada na resiliência?
3. A fragilidade do Estado afecta negativamente a resiliência socioeconómica
77
78
78
79
CAPÍTULO 6
ESTADOS FRÁGEIS AFRICANOS DURAMENTE ATINGIDOS PELA CRISE FINANCEIRA MUNDIAL
1. As consequências importantes da crise: travar anos de progresso continuado
2. Produtos alimentares, combustíveis, finanças e fragilidade (3F+1 – food, fuel, finance, fragility)
3. Os quatro canais de transmissão para os países frágeis
4. Podem os Estados frágeis fazer face à crise?
82
82
83
83
92
CAPÍTULO 7
CONSTRUÇÃO DO ESTADO E COESÃO SOCIAL
1. Devolver ao Estado um papel importante
2. Coesão social e dimensões imateriais da construção do Estado
3. A necessidade de uma compreensão mais profunda do contexto local
4. Complementaridade entre ajuda humanitária e intervenções em matéria de construção do Estado
em cenários de pós-conflito
97
97
98
102
105
SECÇÃO TRÊS
112
CAPÍTULO 8
POLÍTICAS DA UE PARA ENFRENTAR A FRAGILIDADE NA ÁFRICA SUBSARIANA
1. A preocupação histórica da UE com os países frágeis
2. Potencial da UE em situações de fragilidade
3. Melhor resposta da UE a situações de fragilidade
113
114
121
122
CAPÍTULO 9
CONCLUSÕES  PRIORIDADES E MEDIDAS
1. As políticas da UE podem ter impacto
2. Prioridades e medidas
133
133
135
REFERÊNCIAS
143
ANNEX
158
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
VII
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Quadros e figuras
QUADROS E FIGURAS
Quadro da caixa 0.1:
Figura da caixa 0.1:
Figura da caixa 0.2:
Figura 0.1:
Figura 0.2:
Figura da caixa 1.1:
Quadro da caixa 1.1:
Quadro 1.1:
Figura 1.1:
Figura 1.2:
Quadro 1.2:
Quadro 1.3:
Figura 1.3:
Quadro 2.1:
Países da África subsariana em situação de fragilidade
Pirâmide populacional dos países frágeis da África subsariana
Pirâmide populacional dos países da União Europeia
Resiliência nos países frágeis da África subsariana: de baixa a elevada
Vulnerabilidade nos países frágeis da África subsariana: de baixa a elevada
Impactos incrementais da ajuda no crescimento
Ajuda aos países frágeis, 2004
Desenvolvimento humano nos Estados frágeis da África subsariana
Variações absolutas dos principais indicadores OMD (2000-2006)
Variações relativas dos principais indicadores OMD (2000-2006)
Refugiados e pessoas deslocadas internamente, 2008
Índices de segurança alimentar dos países frágeis
Tendências dos indicadores de governação, países frágeis da África subsariana
Fiscalidade, receitas públicas e condições de facilidade para os negócios nos países frágeis
da África subsariana
Figura 2.1:
Fluxos externos (média simples entre 2003 e 2007)
Figura da caixa 2.1: Exportações da Zâmbia e preços do cobre (2002-2009)
Figura da caixa 2.2: Os preços do cobre e o kwacha zambiano (2002-2009)
Figura da caixa 2.3: Receitas das minas na Zâmbia (2001-2007)
Figura 2.2:
Percentagens da agricultura, indústria e serviços no PIB, 2006
Quadro 2.2:
Lista de países da África subsariana importadores e exportadores de produtos alimentares
Quadro 2.3:
Concentração das exportações nos países frágeis
Quadro 2.4:
Destinos, percentagem e média das exportações dos países frágeis, 2004-2006
Quadro 2.5:
Despesa pública em percentagem do PIB
Quadro 2.6:
População
Quadro 2.7:
Infra-estrutura e características geográficas
Figura 2.3:
Crescimento do PIB real dos países frágeis, países frágeis ricos em recursos e países frágeis
com poucos recursos, 2000-2008
Quadro 2.8:
Características macroeconómicas
Quadro 2.9:
Classificação de Vulnerabilidade Global
Quadro 4.1:
Assegurar os efeitos de redução da pobreza dos novos investimentos em terrenos de cultivo
Quadro da caixa 4.1: Afectação de terrenos agrícolas no período 2000-2008 (autorizações acima de 1000 hectares)
Figura 5.1:
Interacções entre a fragilidade do Estado e a resiliência socioeconómica
Figura 6.1:
Aumento das exportações em termos de percentagem do PIB
Figura da caixa 6.1: A África do Sul responde ao colapso do Lehman Brothers – o Quénia e a Nigéria não
Figura 6.2:
Descida acentuada das exportações da África subsariana
Figura 6.3:
Exportações de produtos primários e da indústria transformadora da África subsariana
depois da crise financeira no país parceiro
Figura 6.4:
Redução estimada dos fluxos de ajuda para África em 2009
Figura da caixa 6.2: Cooperação económica da China com os países frágeis africanos e ajuda CAD, 1998-2007
Figura 6.5:
Muitos migrantes residem no interior de África
Quadro 6.1:
Classificação de resiliência: de baixa a elevada
Figura 6.6:
O impacto da crise no bem-estar social
Quadro 8.1:
Instituições e agências da União Europeia relevantes para os Estados frágeis
VIII
1
3
3
6
7
13
14
19
21
22
24
26
29
33
34
35
36
37
37
38
40
41
42
44
45
47
48
49
69
71
80
83
84
86
87
89
90
91
92
93
120
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Caixas
Caixas
Caixa 0.1:
Caixa 0.2:
Caixa 0.3:
Caixa 1.1:
Caixa 1.2:
Caixa 2.1:
Caixa 4.1:
Caixa 4.2:
Caixa 4.3:
Caixa 5.1:
Caixa 5.2:
Caixa 6.1:
Caixa 6.2:
Caixa 6.3:
Caixa 7.1:
Caixa 7.2:
Caixa 7.3:
Caixa 7.4:
Caixa 7.5:
Caixa 7.6:
Caixa 7.7:
Caixa 8.1:
Caixa 8.2:
Caixa 8.3:
Caixa 8.4:
Caixa 8.5:
Caixa 8.6:
Caixa 8.7:
Caixa 8.8:
Caixa 8.9:
Caixa 9.1:
Caixa 9.2:
Caixa 9.3:
Caixa 9.4:
Caixa 9.5:
Quais os países da África subsariana que são considerados frágeis?
Características comuns dos países frágeis – e diferenças significativas
De que modo a crise de 2008-2009 afectou os Estados frágeis da África subsariana
Eficácia da ajuda e dotações de ajuda a países frágeis
A integração da fragilidade no discurso de desenvolvimento
Expansão e quebra do cobre na Zâmbia
Códigos de conduta e a Carta dos Recursos Naturais
Aquisições de terra em larga escala em África – análise das transacções de terrenos
(Large-scale land acquisitions in Africa – unpacking the land deals)
Investimentos internacionais no Sudão: o “celeiro” da região árabe
(International investments in Sudan: the “breadbasket” of the Arab region)
Definição de resiliência e de vulnerabilidade
Crescimento económico, desenvolvimento e bem-estar nos países frágeis
(Economic growth, development and well-being in fragile countries)
Mercados financeiros africanos: repercussões dos choques
Estará a China a preencher a lacuna?
Choques adversos e protecção social: qual o papel das instituições financeiras formais e informais?
(Adverse shocks and social protection – what role for formal and informal financial institutions?)
Porque é que a resiliência local pode melhorar a segurança (Why local resilience can improve security)
Somália e Somalilândia (Somalia and Somaliland)
Um modelo africano de governação (An African governance model)
Intervenção internacional nos Estados frágeis: a lição do Sul do Sudão
(International engagement in fragile states: learning from Southern Sudan)
Aprender com as comunidades locais: programas de apoio a mulheres ex-combatentes
Transição pós-conflito: uma oportunidade para a emancipação das mulheres?
Orçamento na perspectiva do género (Gender responsive budgeting)
“Atitude perante a fragilidade dos Estados” – Extractos do Consenso Europeu sobre o
Desenvolvimento, 2005
Disposições específicas sobre fragilidade da Declaração de Paris sobre a Eficácia da Ajuda
Princípios para uma Intervenção Internacional Eficaz em Estados Frágeis e em Situações
de Fragilidade da OCDE-CAD
Resolução 1325 do Conselho de Segurança das Nações Unidas
A Flex Vulnerabilidade
A Política Agrícola Comum da UE e a segurança alimentar nos Estados frágeis africanos
(The EU’s Common Agricultural Policy and food security in fragile African states)
Ajuda ao Comércio
Acordos de Parceria Económica
Desafios de segurança e desenvolvimento em situações de fragilidade: ensinamentos
adquiridos com as operações PESD (Security and development challenges in fragile situations:
lessons from ESDP operations)
Uma proposta para a estabilização das receitas
Políticas da UE e desenvolvimento de capital humano em África
(EU policies and African human capital development)
Um nível adequado de integração regional
O dilema da liderança e da hegemonia no reforço da governação local
Reavaliar a governação da ajuda (Reassessing aid governance)
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SOBRE
O
IX
DESENVOLVIMENTO
1
3
5
13
16
35
64
67
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89
95
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105
108
109
111
114
116
117
118
119
123
125
126
129
136
136
138
139
140
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Lista de acrónimos
LISTA DE ACRÓNIMOS
ACP
Países de África, das Caraíbas e do Pacífico
APD
Ajuda Pública ao Desenvolvimento
CAD
Comité de Ajuda ao Desenvolvimento da OCDE
CEE/NU (UNECA)
CIFP
CNUCED (UNCTAD)
CODEV
Comissão Económica para África das Nações Unidas
Carleton University Country Indicators for Foreign Policy
Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento
Grupo da Cooperação para o Desenvolvimento – Conselho da União Europeia
CPIA
Avaliação Institucional e Políticas de Países
DFID
Departamento de Desenvolvimento Internacional (do Reino Unido)
DG Desenvolvimento
FDI
GDC (UNODC)
Direcção-Geral do Desenvolvimento - Relações com os Estados de África,
das Caraíbas e do Pacífico – Comissão Europeia
Investimento Directo Estrangeiro
Gabinete das Nações Unidas para a Droga e a Criminalidade
GTZ
Gesellschaft für Technische Zusammenarbeit (agência alemã para a cooperação técnica)
IDH
Índice de Desenvolvimento Humano
IFPRI
Instituto Internacional de Investigação de Política Alimentar
IIED
Instituto Internacional para o Ambiente e o Desenvolvimento
OCDE-CAD
ODM
OIT
Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico
Objectivos de Desenvolvimento do Milénio
Organização Internacional do Trabalho
OMC
Organização Mundial de Comércio
OMS
Organização Mundial de Saúde
OTAN
Organização do Tratado do Atlântico Norte
SIPRI
Instituto Internacional de Investigação para a Paz de Estocolmo
PAC
Política Agrícola Comum
PAM
Programa Alimentar Mundial
PDNU (UNDP)
PESD
PIB
RNB
UE
UNIFEM
UNMIS
UNRISD
WPF
ZCCM
Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas
Política Europeia de Segurança e Defesa
Produto Interno Bruto
Rendimento Nacional Bruto
União Europeia
Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para as Mulheres
Missão das Nações Unidas no Sudão
Instituto de Investigação das Nações Unidas para o Desenvolvimento Social
World Population Foundation (organização dos Países Baixos)
Zambia Consolidated Copper Mines (principal operador zambiano de minas de cobre)
X
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Perspectiva geral
PERSPECTIVA GERAL
A crise de 2008-2009 conduziu à pior contracção da economia mundial desde 1929. A crise económica e financeira afectou os
orçamentos dos países da União Europeia e de outros países desenvolvidos, criando elevadas dívidas públicas, desemprego e
problemas sociais. E a crise tem sido especialmente devastadora para países frágeis, na sua maioria situados na África subsariana,
região que se considerava inicialmente protegida devido à sua reduzida integração financeira com o resto do mundo. Embora
a terrível situação socioeconómica da África subsariana exija um compromisso renovado, as preocupações da UE com os seus
problemas sociais internos podem desviar a atenção e os fundos das políticas comunitárias de ajuda ao desenvolvimento. Mas
a UE deve manter, e se possível reforçar, o seu compromisso com a África subsariana, evitando as políticas de ajuda ineficientes.
É necessária uma reavaliação da política de desenvolvimento da UE em relação aos países frágeis da África subsariana. Este é o
objectivo do Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento de 2009 (RED 2009).
O Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento de 2009 analisa os custos e as características da fragilidade (Secção 1), a capacidade
de resposta dos países frágeis aos choques negativos como a crise financeira de 2008-2009 (Secção 2) e o compromisso actual da
UE para com os países frágeis, bem como o potencial da política comunitária de desenvolvimento em ajudar as partes interessadas
nacionais a aumentar a resiliência (Secção 3). O relatório centra-se na África subsariana dado que a região parece estar particularmente
atrasada em matéria de consolidação do Estado; um facto estilizado que se sobrepõe a todas as disputas teóricas sobre a definição
e medição de fragilidade: os países da África subsariana contam-se sempre entre o grupo dos Estados frágeis (caixa 0.1)1.
Caixa 0.1: Quais os países da África subsariana que são considerados frágeis?
Existem várias classificações para determinar a fragilidade dos Estados: o Quadro da Caixa 1 mostra a lista operacional de
países da África subsariana em situação de fragilidade usados neste relatório:
Quadro da caixa 0.1: Países da África subsariana em situação de fragilidade
Angola
Burundi
Camarões
Centro-Africana (República)
Chade
Comores
Congo (República Democrática do)
Congo
Costa do Marfim
Jibuti
Guiné Equatorial
Eritreia
Etiópia
Gâmbia
Guiné
Guiné-Bissau
Quénia
República doLibéria
Mauritânia
Níger
Nigéria
Ruanda
São Tomé e Príncipe
Serra Leoa
Somália
Sudão
Togo
Uganda
Zimbabué
A lista foi elaborada pela OCDE (2009), mas não foi oficialmente aprovada por esta organização. Resulta de uma compilação
dos dois quintos inferiores da World Bank’s Country Policy and Institutional Assessment for 2007 (Avaliação institucional
e de políticas de países para 2007 do Banco Mundial), do Brookings Index of State Weakness in the Developing World
for 2008 (Índice de 2008 do Instituto Brookings relativo à situação de fragilidade nos países em desenvolvimento) e
dos Carleton University Country Indicators of Foreign Policy for 2007 (Indicadores de política externa dos países para
2007, Universidade de Carleton). O RED 2009 utiliza esta lista para efeitos operacionais, mas não a aprova dado que
defendemos que a própria definição é dinâmica (ver Capítulo I).
Os custos humanos e económicos da fragilidade exigem modelos orientadores de desenvolvimento, estratégias e acções para
reforçar a resiliência das sociedades, ou seja, para aumentar a capacidade de um sistema socioeconómico em se adaptar e responder
aos choques e à alteração das condições sem comprometer as capacidades das pessoas. Num mundo em que os choques globais
são cada vez mais graves e atingem mais pessoas, a resiliência de um sistema socioeconómico é fundamental para o percurso
de desenvolvimento de um país. Este facto deve constituir um objectivo central das estratégias nacionais de desenvolvimento e,
deste modo, da ajuda ao desenvolvimento.
Os países frágeis da África subsariana partilham muitas características – todos têm graves problemas estruturais e instituições
disfuncionais –, mas também diferem em muitos aspectos (caixa 0.2). Para estes países, as situações de emergência são a regra,
não a excepção. Numa tentativa de contrabalançar os choques, carecem muitas vezes de um horizonte a longo prazo para as suas
1
Por exemplo, 29 de 49 países identificados como frágeis pela OCDE (2009) estão situados na África subsariana.
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SOBRE
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DESENVOLVIMENTO
Perspectiva geral
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
opções e as necessidades imediatas alteram os objectivos a longo prazo. A UE pode ajudá-los a lutar contra a fragilidade, rumo
à resiliência e ao crescimento sustentável. Para esse efeito, a UE necessita de uma abordagem flexível a longo prazo para os seus
compromissos e de novas formas de ajuda à governação para aumentar a sua eficiência. Estas medidas tornarão credíveis as políticas
a longo prazo e os compromissos orçamentais, os quais não interferem com o princípio da soberania nacional. Estes compromissos
permitirão às economias frágeis aumentar os horizontes temporais das suas políticas.
A mudança de prioridades para medidas específicas e orientações para intervenção exige um profundo conhecimento da situação
local a fim de ter em conta a notável heterogeneidade dos países frágeis da África subsariana na história, cultura, situação económica
e política. Apenas podem ser formuladas medidas políticas pormenorizadas através de uma correspondência entre as experiências
políticas e o conhecimento do contexto local2.
VANTAGENS COMPARATIVAS DA UE: DESENVOLVER O CAPITAL HUMANO E SOCIAL
E APOIAR O DESENVOLVIMENTO INSTITUCIONAL
A ajuda ao desenvolvimento por parte da UE e dos Estados-Membros tem um grande potencial: para a maior parte dos países frágeis
da África subsariana, a Europa é o principal doador, parceiro comercial e fonte de investimentos externos e importante destino
migratório. E a UE é um importante bloco político, diplomático e económico. Todavia, a Europa não pode esquecer que a fragilidade
tem frequentemente raízes nos processos de colonização e descolonização, por vezes ampliada pelas práticas irresponsáveis de
empresas estrangeiras e o tráfico ilícito e criminoso de e para a Europa.
A UE deve continuar empenhada em ajudar os países frágeis, respeitar a apropriação nacional, ir mais além do simples reforço
institucional, explorar integralmente as suas vantagens comparativas e concentrar os seus esforços no desenvolvimento de capital
humano e social e no apoio ao desenvolvimento institucional a nível local e regional.
Ao contrário das acções da maior parte das agências de ajuda3, o conjunto das potenciais políticas comunitárias abrange mais do
que a assistência financeira, de modo a incluir o comércio, a agricultura, as pescas, a segurança, a migração, as alterações climáticas,
o ambiente, a dimensão social da globalização, o emprego, a investigação e desenvolvimento, a sociedade da informação, a energia
e a governação4. Além disso, a própria história da UE está centrada no desenvolvimento institucional das diversas sociedades,
caracterizadas por instituições com diferentes origens, tradições e história. Por este motivo, a União Europeia, durante a sua própria
história de alargamento, teve de enfrentar problemas de transição de ditaduras militares para a democracia (por exemplo, Grécia,
Portugal e Espanha na década de 1970), bem como a integração de países que apenas recentemente adoptaram uma abordagem
de mercado. Estas experiências proporcionaram conhecimentos úteis para responder a situações de fragilidade.
O potencial para a acção da UE não deveria, contudo, ser sobrevalorizado. A ordem mundial tornou-se mais multipolar, com centros
políticos e económicos emergentes a juntarem-se aos anteriores agentes. A configuração EUA-China-UE tornou-se central no sistema
internacional. Além das principais organizações internacionais, outros países estão empenhados em ajudar os Estados frágeis, desde
os Estados Unidos até aos países do Este Asiático e os Estados Árabes do Golfo. A China, em especial, construiu infra-estruturas,
investiu em terrenos e aumentou o “soft power” (“poder suave”) na maior parte dos países frágeis.
Além disso, as iniciativas comunitárias para fazer face à fragilidade dos Estados, tais como a ajuda à consolidação da paz e à
construção do Estado, podem ser entendidas como intrusivas e não como politicamente neutras pelos países parceiros. Estas
podem, possivelmente sem intenção, afectar processos e dinâmicas que são intrinsecamente internos. Além disso, a resistência e
os constrangimentos internos na UE podem diminuir o compromisso nas políticas de desenvolvimento. Também o envelhecimento
da população, o elevado défice acumulado com a crise e o alargamento da UE podem reduzir os incentivos para afectar recursos
públicos à cooperação internacional para o desenvolvimento.
2
3
4
O relatório da agência alemã para a cooperação técnica, GTZ (2008), analisa seis estudos de países e sublinha as diversidades geográficas e as diferentes fases
de governo e de orientações em matéria de desenvolvimento: “the “do no harm” approach, sensitivity to context and thorough knowledge of the country
remain indispensable to any strategy development” (“a abordagem “não prejudicial”, sensibilidade ao contexto e conhecimento profundo do país continuam
indispensáveis a qualquer estratégia de desenvolvimento (pág. 12).
As acções das agências de ajuda e das instituições internacionais têm um âmbito muito mais reduzido, sendo frequentemente limitadas a medidas correctivas
de curto prazo e, devido às obrigações institucionais destes organismos, centradas numa única questão específica. Ver o documento de referência de Paul
Collier (2009a) incluído no Volume 1B sobre esta questão.
Ver o Relatório da UE sobre a coerência das políticas numa perspectiva de desenvolvimento – 2009, que identifica 12 importantes domínios políticos.
2
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Perspectiva geral
Caixa 0.2: Características comuns dos países frágeis – e diferenças significativas
Os países frágeis não são capazes de mobilizar os recursos nacionais e obter receitas fiscais significativas.
As receitas dos governos dos países frágeis da África subsariana, com excepção das subvenções, raramente representam
mais de 20% do PIB. Os impostos variam entre 6 e 13% do PIB, pelo que não existe grande margem para o fornecimento
de bens e serviços públicos.
Baixo desenvolvimento humano. O baixo investimento público no desenvolvimento humano reflecte-se no
funcionamento ineficiente dos sistemas educativos e de cuidados de saúde. De facto, embora muitos Estados frágeis tenham
reduzido a sua despesa militar, esta redução não se traduziu num aumento nos domínios da saúde e da educação.
Baixa densidade populacional. A maioria dos países frágeis são caracterizados, em média, por uma baixa densidade
populacional: 15 dos 29 países têm menos de 40 habitantes por quilómetro quadrado, enquanto a densidade populacional
dos países não considerados frágeis é de cerca de 84. A população é jovem e está em crescimento (em nítido contraste com
a pirâmide populacional da UE). No entanto, nesses países a maioria da população vive nas zonas rurais.
Figura 0.1: Pirâmide populacional dos países frágeis da África subsariana
100+
95-99
90-94
85-89
80-84
75-79
70-74
65-69
60-64
55-59
50-54
45-49
40-44
35-39
30-34
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20-24
15-19
10-14
5-9
0-4
50
40
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20
10
0
Feminina
Masculina
0
10
20
30
40
50
População, em milhões
Figura 0.2: Pirâmide populacional dos países da União Europeia
100+
95-99
90-94
85-89
80-84
75-79
70-74
65-69
60-64
55-59
50-54
45-49
40-44
35-39
30-34
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0
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População, em milhões
Fonte: U.S. Census Bureau International Data Base
Infra-estruturas ineficientes, lentas e difíceis. Os países frágeis têm apenas 8 metros de estradas pavimentadas por
quilómetro quadrado, enquantos os países não considerados frágeis têm 18 metros. Os custos dos transportes nos países
frágeis (em especial para o comércio intra-africano) são duas vezes mais caros do que nos países do Sudeste Asiático. São
necessários cerca de 116 dias para deslocar um contentor de uma fábrica na República Centro-Africana para o porto mais
próximo. A mesma transacção demora cinco dias desde Copenhaga. O voo mais directo entre o Chade e a Nigéria efectuase via França – mais de 4000 quilómetros; existe apenas um voo semanal de Bangui, na República Centro-Africana, para a
Europa; o número de linhas móveis por 1000 habitantes, apesar do enorme aumento verificado recentemente, é metade
do que existe nos países não considerados frágeis.
Exportações concentradas. O índice de diversificação das exportações é inferior a metade do índice dos países
não considerados frágeis, o que revela um grau de concentração muito elevado. Salvo raras excepções, os países frágeis
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DESENVOLVIMENTO
Perspectiva geral
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
exportam principalmente produtos primários: em 2006, em média, os produtos primários representaram mais de 80% das
exportações, 30% dos quais foram combustíveis, com alguns países como Angola, Chade, República do Congo e Guiné
Equatorial acima dos 90%.
Uma elevada exposição ao risco de falência e conflitos armados. Cerca de 73% dos mil milhões de pessoas carenciadas
dos países incluídos no livro Bottom Billion, um indicador para uma lista de países frágeis, viveram recentemente ou estão
a viver uma guerra civil. Além disso, o risco de que esses países entrem em guerra civil num período de cinco anos é muito
elevado – um em seis 5.
Mas…
Crescimento divergente. Os países frágeis cresceram cerca de 4% por ano entre 2000 e 2008. Mas os países frágeis
ricos em recursos cresceram 6,3%, atingindo um máximo de 10% em 2002 e 8,5% em 2004. Os países frágeis sem recursos
naturais cresceram 2,3%.
Rendimentos. O rendimento per capita real, que foi, em média, 600 dólares em 2008 nos países frágeis da África
subsariana, varia entre 100 dólares na República Democrática do Congo e 4500 dólares na Guiné Equatorial.
Esperança de vida. Em São Tomé e Príncipe, as pessoas têm uma esperança de vida à nascença superior a 65 anos,
em conformidade com a média para os países desenvolvidos – mas os cidadãos da Serra Leoa e do Zimbabué têm uma
esperança de vida de pouco mais de 40 anos.
Os fluxos de Investimento Directo Estrangeiro são canalizados exclusivamente para os países ricos em
recursos. Mais de 70% de todo o investimento directo estrangeiro (IDE) destinado a países frágeis da África subsariana
para o período de 2000 a 2007 foi canalizado apenas para cinco países: Angola, Chade, Guiné Equatorial, Nigéria e Sudão,
todos dotados com recursos naturais.
Reservas cambiais – insuficientes ou adequadas. Alguns países frágeis têm uma quantidade muito baixa de reservas
cambiais (inferior a 90 dias de cobertura das importações). Em Abril de 2009, a Etiópia, a Guiné e o Zimbabué tinham reservas
para pouco mais de um mês de importações, enquanto os países exportadores de petróleo tinham para seis meses.
Dívida externa. Os países exportadores de petróleo conseguiram conter a dívida externa, e os indicadores de
endividamento externo estão controlados. Por exemplo, o rácio da dívida do rendimento nacional bruto e a dívida total
para exportações de bens e serviços melhoraram substancialmente em Angola e no Sudão desde 2000. Os países frágeis
com poucos recursos, tais como a Guiné-Bissau e a Libéria, continuam a ter um elevado endividamento, o que prejudica
o seu desenvolvimento futuro.
1. MELHORES RESPOSTAS DA UE A SITUAÇÕES DE FRAGILIDADE
Uma revisão da actual abordagem comunitária às condições de fragilidade (capítulo 8) revela que é
necessário progredir em várias áreas.
A primeira, e a mais geral, é colmatar o défice de execução, que gera uma clivagem entre o quadro teórico-político e a concepção de
intervenções específicas no terreno. Isto representa um desafio essencial, na medida em que o efeito de uma política é observado
na sua execução. Além disso, esta execução deve ser adequadamente adaptada à situação, dado que uma política única para todos
os casos não responde às necessidades dos Estados frágeis.
Em seguida, e mais especificamente, são necessários progressos nas seguintes áreas:
• adquirir um sólido conhecimento do contexto local a fim de conceber intervenções eficazes com base nesse conhecimento;6
• estudar a forma como o princípio de apropriação deve ser adoptado na abordagem dos países que possuem instituições do
Estado sem capacidade ou legitimidade (o que pode tornar o apoio orçamental uma opção especialmente problemática), uma
situação que está presente na maior parte dos países frágeis. Mesmo naqueles com instituições democráticas, a legitimidade
dos governos é frequentemente breve, o que torna difícil implementar políticas a longo prazo através do apoio orçamental, a
menos que seja possível um acompanhamento atento;
5
6
Collier 2007.
Por exemplo, em situações de pós-conflito, “the context is subject to very fast changes and numerous challenges must be addressed simultaneously. Here
a flexible mix is necessary” (“o contexto está sujeito a alterações muito rápidas e deve ser dada resposta a vários desafios em simultâneo. É necessária uma
combinação mais flexível”) (GTZ, 2008, pág. 22).
4
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Perspectiva geral
• evitar que a amplitude das políticas comunitárias seja repercutida negativamente e as diferentes políticas produzam efeitos
negativos indirectos nos Estados frágeis. A dimensão horizontal da coerência política necessita de ser correspondida por uma
procura mais eficaz da coerência vertical, assegurando uma melhor coordenação no seio da CE e entre a CE e os Estados-Membros
da UE, muitas vezes relutantes em abdicar do seu papel de protagonistas. Esta coordenação permitirá à UE agir a uma só voz,
tornando a política de desenvolvimento comunitária mais responsável e facilmente compreendida pelos destinatários;
• tornar as políticas comerciais da UE mais ajustáveis às necessidades específicas dos Estados frágeis da África subsariana e assegurar
que os acordos bilaterais não prejudicam a integração regional ou multilateral. Embora exista nas regras da Organização Mundial
do Comércio uma certa margem para excepções no que respeita aos países em desenvolvimento e, em especial, aos países menos
desenvolvidos, não existem disposições específicas para Estados frágeis ou situações de fragilidade. Esta é uma área onde se
deveriam fazer progressos significativos;
• mudar de intervenções ajustáveis para preventivas, de modo a que os países com situações de fragilidade não entrem numa
espiral que progressivamente provoque a erosão da capacidade e da legitimidade das suas instituições de Estado. Esta mudança
pode exigir a adopção de uma abordagem regional à fragilidade, dado que os efeitos da má vizinhança podem prejudicar a
construção do Estado e a coesão social7;
• melhorar a compreensão da forma como a relação entre a segurança e o desenvolvimento pode ser devidamente encarada. A
paz e a segurança estão entre as principais questões da parceria estratégica entre a União Europeia e a União Africana. Embora
as experiências positivas tenham sido várias, em alguns casos, as acções de segurança interferiram com a aplicação das políticas
de desenvolvimento.
Colmatar o défice exige a reavaliação das prioridades, a concentração dos esforços em objectivos limitados, bem definidos e
acordados, a simplificação dos procedimentos e, nas situações em que as instituições do Estado estão especialmente sem capacidade
para, ou reticentes em, desempenhar as suas funções, a procura da organização ou parceiro adequados para executar as políticas8.
Trata-se não só de uma questão de execução de políticas mas também de criar confiança entre os doadores e os destinatários e
aprender com as experiências políticas.
Embora os progressos sejam visíveis e os documentos políticos comunitários ofereçam actualmente orientações políticas mais
abrangentes, ainda há um longo caminho a percorrer para transformar os compromissos assumidos em resultados práticos. Os
instrumentos e os procedimentos financeiros podem ser agora mais simples e flexíveis, mas continuam demasiado complexos,
pesados, demorados e hostis para com os destinatários.
Caixa 0.3: De que modo a crise de 2008-2009 afectou os Estados frágeis da África subsariana
Os países frágeis, com uma reduzida integração na economia mundial, foram inicialmente poupados aos efeitos directos
da crise financeira; contudo, foram afectados pela recessão mundial e pelo colapso do comércio decorrentes.
A crise económica e financeira juntou-se a um período de preços elevados e voláteis dos alimentos e combustíveis. A subida
dos preços, em meados de 2008, colocou os países frágeis importadores de alimentos e de petróleo da África subsariana
sob fortes pressões, provocando a queda das reservas cambiais e tornando mais difícil pagar as importações e apoiar o
crescimento. As fases de expansão e quebra (boom and bust) contribuíram para a volatilidade da produção, desencorajando
os investimentos na capacidade produtiva a longo prazo.
A maior parte dos países frágeis da África subsariana sofreram quase em simultâneo choques petrolíferos, alimentares e
financeiros. Estimativas recentes colocam o crescimento do PIB para 2009 em cerca de 1,5%, abaixo dos 5,5% previstos
em Outubro de 2008. Estes números permitem considerar 2009 como o primeiro ano numa década em que a maior parte
dos países frágeis da África subsariana registou um crescimento negativo no PIB real per capita, ameaçando o progresso
rumo aos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) e prejudicando a estabilidade política. Um crescimento mais
lento nem sempre ameaça inverter o desenvolvimento humano, mas provoca recuos, especialmente através de cortes nas
despesas com a educação e a saúde, o que tem graves consequências a longo prazo.
Os países frágeis da África subsariana possuem sistemas bancários nacionais de pequenas dimensões e mercados accionistas
reduzidos ou inexistentes. Dado o baixo desenvolvimento financeiro da região e as ligações limitadas dos países frágeis
ao sistema financeiro mundial, os principais canais de transmissão da crise são os sectores reais da economia. Estes estão
7
8
Muitas experiências históricas na forma de lidar com a fragilidade mostraram a necessidade de uma abordagem regional, sendo os Balcãs um exemplo.
Ver Collier (2009b), caixa 9.5 no capítulo 9 e GTZ (2008) para os conhecimentos adquiridos no terreno.
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DESENVOLVIMENTO
Perspectiva geral
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
expostos à crise, principalmente através do comércio: a redução nas receitas de exportação é acompanhada por efeitos
prejudiciais no comércio, reforçados pela excessiva dependência das exportações de produtos dos países frágeis e pela
polarização das suas exportações. O comércio entrou em crise em 2009 e os países da África subsariana foram mais afectados
do que outros por esses desenvolvimentos devido aos cortes no financiamento do comércio (os menos fiáveis são mais
susceptíveis de sofrerem cortes) e à composição das suas exportações. Os países frágeis estão igualmente expostos a fluxos
de FDI mais baixos devido a uma atitude de expectativa por parte dos investidores em situações de incerteza, fluxos de ajuda
externa (possivelmente) mais baixos e remessas de migrantes mais baixas. As remessas intra-africanas são especialmente
importantes, dado que os migrantes de países frágeis não podem suportar os elevados custos de migração para países com
rendimentos elevados e deslocam-se para países vizinhos. Todavia, os principais mercados de destino dos migrantes de
países frágeis, a Nigéria e a África do Sul, foram os únicos países da África subsariana directamente afectados pela crise.
Os países frágeis foram duramente atingidos, mas o impacto da crise é muito homogéneo em todos os países; em
consequência, não existe uma vulnerabilidade elevada para os países em situação de fragilidade. Pelo contrário, a sua
capacidade de recuperação dos choques é que é muito inferior.
Figura 0.1: Resiliência dos países frágeis da África subsariana: de baixa a elevada
■ Não frágeis
■ Frágeis sem dados
■ Resiliência elevada
■ Resiliência média
■ Resiliência baixa
6
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Perspectiva geral
Figura 0.2: Vulnerabilidade dos países frágeis da África subsariana: de baixa a elevada
■ Não frágeis
■ Frágeis sem dados
■ Vulnerabilidade baixa
■ Vulnerabilidade média
■ Vulnerabilidade elevada
2. DEFINIÇÃO DE PRIORIDADES
A UE teve que definir as suas próprias áreas de intervenção prioritárias, baseando-se na experiência do
passado, na aprendizagem com os erros e na adaptação rápida aos contextos em evolução, não deixando
contudo de respeitar a soberania nacional. O RED 2009 sugere cinco prioridades que devem integrar os
compromissos comunitários a longo prazo nos Estados frágeis da África subsariana com o objectivo de
aumentar a resiliência:
1. Apoio à construção do Estado e à coesão social. O objectivo fundamental do compromisso externo nos países
frágeis consiste em contribuir para o processo endógeno de construção do Estado9. A UE aprovou esta prioridade essencial na
sua declaração Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento10, pelo que os compromissos nos países frágeis da África subsariana
devem centrar-se neste objectivo a longo prazo. A complexidade deste compromisso deve-se ao facto de não ser possível obter uma
perspectiva externa (europeia) destes processos. O processo de construção do Estado para os países frágeis africanos subsarianos
não se assemelha ao processo de construção do Estado na Europa durante o século XIX. Do mesmo modo, a coesão social não
será igual entre etnias e religiões cujas diferenças remontam a centenas de anos. O conhecimento do contexto local é essencial
para o compromisso externo nos países frágeis, o que é necessário para identificar os agentes que podem ser os impulsionadores
da mudança e ajudar estes países a saírem das situações de fragilidade, possivelmente através de caminhos diferentes. Embora os
“agentes de mudança” devam ser reforçados, em especial, incentivando a participação das mulheres na construção do Estado, é
também importante, para o êxito da estratégia de promoção da democracia, enfraquecer a posição dos sectores mais refractários
e apoiar os líderes nos seus esforços para reconstruir um novo pacto social e a confiança entre o Estado e os cidadãos e entre as
diferentes facções e etnias que correm o risco de se envolverem em conflito. Se determinados grupos são discriminados e excluídos
da representação política, o risco de conflito é elevado e a saída da situação de fragilidade mais difícil.
2. Anular a distância entre as necessidades a curto prazo e a resiliência a longo prazo. Para centrar a atenção dos
países frágeis num horizonte a longo prazo em vez da resposta às necessidades urgentes de curto prazo, a UE pode implementar
um mecanismo de seguro para salvaguardar os países frágeis das receitas de exportações voláteis. Com (mais) receitas estáveis, os
países frágeis poderiam apoiar as suas políticas nacionais e reforçar as suas potenciais vantagens comparativas a longo prazo.
9
10
Ver OCDE/CAD 2007.
Ver Parlamento Europeu, Conselho, Comissão, 2006.
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DESENVOLVIMENTO
Perspectiva geral
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
3. Reforço do capital humano e social. O investimento na educação dos cidadãos dos países frágeis, tentando superar as
disparidades entre homens e mulheres e reforçando o capital social, são os melhores caminhos para se conseguir um crescimento
e desenvolvimento sustentáveis e aumentar a resiliência. Os países frágeis afectados por conflitos sofrem perturbações no ensino
público, o que reduz as taxas de inscrição e aumenta as taxas de iliteracia entre os adultos. Deve ser concedido financiamento
adequado, não apenas ao ensino básico mas também ao ensino terciário, resolvendo as desigualdades de género e estimulando
o conhecimento local e a adopção de tecnologia e inovação. Centrar as intervenções junto dos jovens pode também ser essencial,
especialmente nos países frágeis em situação de pós-conflito, para reduzir a atracção de actividades ilegais como o tráfico e o
contrabando.
4. Apoiar melhor governação regional, incluindo os processos de integração regional. Os acordos comerciais
regionais permitem aos países africanos obterem economias de escala significativas com mercados regionais mais amplos,
melhorarem a competitividade interna, aumentarem os retornos de investimentos e, subsequentemente, atraírem IDE, o que conduz,
por sua vez, à transferência de tecnologia e ao crescimento. Poderiam também ajudar essas economias a partilharem recursos
para a preparação conjunta de projectos de infra-estruturas, através da exploração das economias de escala e da internalização
dos efeitos regionais desses investimentos entre os países. E poderiam permitir que os pequenos países africanos encetassem
negociações mais eficazes nas questões de política económica com outros blocos comerciais ou grandes parceiros privados. Numa
perspectiva institucional, os acordos regionais podem igualmente prever mecanismos de compromisso sobre políticas e reformas.
Podem ajudar a criar instrumentos de compromisso especialmente relevantes para os Estados com uma fraca capacidade de
compromisso nacional. A este respeito, os acordos de integração regional podem ser utilizados como ferramentas para o reforço
das instituições. Aderir a um bloco comercial com “regras de clube” muito fortes pode ajudar a lançar reformas democráticas e
construir credibilidade para os países membros.
5. Promover a segurança e o desenvolvimento da região. As acções em matéria de segurança e desenvolvimento exigem
uma estratégia multifacetada. É necessário um esforço a longo prazo para transformar as culturas políticas europeias neutras e
introspectivas numa cultura de envolvimento na governação global. Estabelecer uma relação entre as responsabilidades globais da
UE e o bem-estar nacional dos seus cidadãos na Europa é, por conseguinte, essencial. Os decisores políticos das UE compreenderam
que cada acção comunitária em cada domínio, desde a agricultura e pescas ao comércio ou investigação e desenvolvimento, pode
ter implicações a nível de segurança e que, em contrapartida, as iniciativas em matéria de segurança podem ter implicações para
o desenvolvimento e o comércio.
A UE deve mudar a sua abordagem linear de engenharia social centrada nos instrumentos disponíveis para uma abordagem
estratégica mais flexível centrada no próprio problema e que reconheça o carácter contestado e político de muitas políticas e
objectivos dos doadores. O crescente recurso a instrumentos de gestão de crise civis e militares constitui uma oportunidade não
só para encorajar o planeamento conjunto (militar, civil e de desenvolvimento) como também para pensar de uma forma mais
estratégica. É igualmente uma oportunidade para recompensar a assunção de riscos por parte das equipas, muitas vezes essencial
em situações de fragilidade. Ignorar estes problemas prementes de segurança é contraproducente: em vez de aplicar uma matriz
europeia (blueprint) pré-existente, podem ser obtidos resultados significativos se as necessidades de segurança da população
forem analisadas com seriedade, o que constitui um primeiro passo rumo a uma apropriação local genuína, incluindo meios para
superar a violência com base no género.
Em resumo, a inacção poderá ter custos muito elevados quer para os doadores quer para os destinatários. Para os países frágeis, os
custos são reflectidos no fraco desenvolvimento humano e na ausência de segurança relacionada com as lacunas de desenvolvimento
persistentes: o custo de não adquirir resiliência. Para a Europa – geograficamente próxima de África e dos seus problemas de
demografia explosiva, tráfico ilícito, contrabando, pirataria, violência com base no género e ameaças ambientais – os efeitos
negativos podem ser consideráveis. Por esse motivo, a acção da UE deve ser reavaliada. A UE não pode permitir-se o desperdício
de fundos ou ser ineficiente. Para ter uma política de desenvolvimento eficiente com impacto, é essencial a UE:
• agir a uma só voz e definir políticas em conjunto. Os debates entre os Estados-Membros da UE e com a Comunidade Europeia
podem ser abertos e animados, mas uma vez adoptada uma política definida em conjunto, a UE deve manter-se firme nas suas
posições;
• empenhar-se em políticas de longo prazo e evitar mudanças dos objectivos políticos em áreas essenciais, uma vez que os
problemas específicos dos países em situações de fragilidade são essencialmente estruturais e persistentes e um aspecto
dominante da fragilidade é a incapacidade em seguir objectivos a longo prazo;
• estabelecer a “delegação adequada” para executar as políticas. Delegar é essencial, uma vez que os doadores e os destinatários
frequentemente não estão na melhor posição para executar ou controlar os programas, dada a necessidade de resolver
complexidades locais. Nessas situações, seria conveniente separar as diferentes funções de governo: elaboração de políticas
para afectação de recursos e acompanhamento, com o último a ser executado por agências independentes;
8
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Perspectiva geral
• compreender que a construção do Estado e a coesão social nos países da África subsariana são processos evolutivos longos,
que adoptam formas novas, diversas e imprevisíveis aos níveis nacionais e regionais. Esses processos exigem uma atenção
permanente e o apoio institucional adequado no terreno.
Considerar todos estes elementos pode também mostrar a necessidade de aprofundar o nosso conhecimento em muitas áreas. Uma
dessas áreas é o papel das desigualdades persistentes em situações de fragilidade e outra é a necessidade de redes de segurança
sociais e organizações sociais para o reforço da resiliência.
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DESENVOLVIMENTO
SECÇÃO UM
COMPREENDER A FRAGILIDA
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
CAPÍTULO 1
FRAGILIDADE DO ESTADO NA ÁFRICA SUBSARIANA:
DESAFIOS E CUSTOS
1. POLÍTICAS EUROPEIAS DE DESENVOLVIMENTO NUM CONTEXTO GLOBAL
EM EVOLUÇÃO
Nunca, como agora, a erradicação
errad cação daa pobr
pobreza
za e o desenvolvimento
dese
sustentável assumiram tamanha importância. O contexto
context em que é prosseguido o objectivo da erradicação
dicaçã da po
pobreza
breza é o de um mundo cada vez mais
globalizado e interdependente. Ora, esta situação gerou novas oportunidades, mas também
t mbém novos
novo desafios.
(O Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento,
nto 2005)
20 5)
O compromisso da União Europeia em promover um desenvolvimento mais equitativo e sustentável a nível global necessita de
fazer face aos desafios da globalização do século XXI. Os países, as sociedades e as economias estão mais interligados e menos
isolados e, assim, mais susceptíveis de serem influenciados pela alteração das condições e da variação de forças externas que
interagem com dinâmicas internas. Uma maior integração deve ser acompanhada por uma mudança da actividade económica para
leste. O maior peso da China e da Índia no PIB mundial e nas exportações torna estes países peças essenciais no cenário internacional,
em especial a China na África subsariana. As políticas de desenvolvimento não podem ignorar o novo equilíbrio sociopolítico.
Os padrões populacionais são outra característica da globalização do século XXI. Enquanto a UE assiste ao envelhecimento da
população, a África subsariana é caracterizada por uma população jovem. Em 2010, a África terá 40% da população na faixa etária
dos 0 aos 14 anos e 20% entre os 15 e os 24 para um total de 60% com idade inferior a 25 anos contra 28% na UE. Estas tendências
– em conjunto com os desafios colocados pelo aquecimento global, pelas organizações criminosas internacionais e pelo recente
choque internacional nos preços dos alimentos – são importantes exemplos dos desafios que as sociedades enfrentam.
Neste contexto, a crise económica e financeira de 2008-2009 conduziu à pior contracção da economia mundial desde 1929 e afectou
os orçamentos dos países da União Europeia e de outros países desenvolvidos. E a crise tem sido especialmente devastadora para
os países mais pobres, na sua maioria situados na África subsariana. As previsões indicam que, devido à crise, cerca de 90 milhões
de pessoas podem ficar em situação de pobreza1 e que o excesso de mortalidade infantil associada à crise será de 400 000 óbitos2.
Mas é muito difícil traduzir em números os custos humanos da crise.
Os custos humanos e económicos exigem modelos orientadores de desenvolvimento, estratégias e acções para reforçar a resiliência
das sociedades, ou seja, estratégias para aumentar a capacidade de um sistema socioeconómico em se adaptar e responder às
perturbações e à alteração das condições sem comprometer as capacidades das pessoas. Num mundo em que os choques globais
são cada vez mais graves e atingem mais pessoas, incluindo muitas das pessoas que vivem em situação de pobreza e eram pouco
afectadas anteriormente, a resiliência de um sistema socioeconómico é fundamental para o percurso de desenvolvimento de um
país. Este facto deve constituir um objectivo central das estratégias nacionais de desenvolvimento e, deste modo, da ajuda ao
desenvolvimento.
1
2
DDI 2009 e Banco Mundial 2009a.
Banco Mundial 2009b.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 1
1.1 O PARADOXO DA AJUDA AO DESENVOLVIMENTO NOS ESTADOS FRÁGEIS
Nos últimos anos, os países frágeis emergiram como uma prioridade essencial para a comunidade do desenvolvimento devido aos
seus baixos resultados de desenvolvimento e às graves violações dos direitos do homem3. Este grupo, caracterizado por carências
profundas nas suas instituições de Estado, coloca grandes desafios de desenvolvimento global à comunidade internacional. A
fragilidade impõe custos humanos significativos, generalizados e persistentes. Viver em países frágeis significa sofrer graves
privações dos serviços públicos essenciais e de garantias de segurança e direitos humanos. Produz igualmente efeitos negativos
a nível regional e mundial.
A ajuda ao desenvolvimento destinada aos países frágeis enfrenta desafios maiores do que noutros cenários. Estes países têm
tendência a serem parceiros difíceis. Os fluxos de ajuda podem provocar efeitos negativos. E a eficácia da ajuda é dificultada pela
fraca capacidade dos governos nacionais: colaborar com instituições de Estado frágeis pode significar interagir com governos
ilegítimos, não representativos ou fracos ou com vários agentes em competição. Nestes cenários, a ajuda tem menos possibilidades
de chegar às populações a que se destina ou de apoiar uma perspectiva a longo prazo.
Os países doadores podem mesmo dificultar a transição de uma situação de fragilidade para uma situação mais estável. Na verdade,
os fluxos de ajuda, com excepção da assistência técnica, podem reduzir a probabilidade destes países saírem do grupo dos países
frágeis4. Esta conclusão, secundada por Dambisa Moyo no seu best-seller Dead Aid, aponta para aspectos que devem ser melhorados
nos compromissos internacionais com os países frágeis5. Nestes contextos, a construção do Estado torna-se o objectivo central
do compromisso internacional nos países frágeis, tal como resulta dos Princípios para uma Intervenção Internacional Eficaz em
Estados Frágeis e em Situações de Fragilidade6.
As dotações de ajuda baseadas no desempenho, definidas vagamente como “recompensar os bons desempenhos com fluxos de
ajuda crescentes”, deixaram os países frágeis como “órfãos de ajuda” (caixa 1.1). Os países frágeis da África subsariana correm um
risco ainda maior de serem abandonados. Num total de 48 países frágeis, 29 países da África subsariana absorveram 49% dos fluxos
de ajuda pública ao desenvolvimento (APD) para o período de 2000-20077.
Na África Ocidental, vários países nunca estiveram próximos de uma situação de consolidação e a região é a mais pobre e a menos
estável a nível mundial. Entre 1998 e 2005, pelo menos 35 grupos armados estiverem activos na Costa do Marfim, Gâmbia, Guiné,
Guiné-Bissau, Libéria, Mali, Níger, Nigéria, Senegal e Serra Leoa8. O Sudão e a região dos Grandes Lagos sofreram os genocídios
mais recentes. E o Corno de África acolhe um Estado falhado emblemático, a Somália.
A África subsariana predomina, assim, entre os países frágeis. A situação de fragilidade tem uma origem histórica comum bem
definida (capítulo 3). E uma concentração de esforços na região poderia ajudar a compreender melhor os desafios de desenvolvimento
colocados pela fragilidade.
A comunidade internacional deve superar o paradoxo de atribuir menos ajudas aos países que mais dela necessitam e adaptar as
práticas de ajuda ao desenvolvimento às condições, características e dinâmicas específicas dos países frágeis. Os países frágeis
representam um balão de ensaio do compromisso da UE, reafirmado pelo Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento, a fim de
fornecer mais e melhor ajuda. O processo não será fácil. Na actual crise económica e financeira, os países da UE são obrigados a
financiarem os seus próprios défices públicos cada vez mais agravados. E o recente alargamento da UE torna mais difícil obter um
consenso sobre a afectação de recursos.
3
4
5
6
7
8
Existem diversas classificações de fragilidade do Estado. Salvo especificação diferente, o presente relatório adopta a lista (não oficial) de países frágeis e em
situação de pós-conflito utilizada no Relatório Anual de 2008 da OCDE intitulado Resource Flows to Fragile and Conflict-Affected States (OCDE 2009). Trata-se
de uma compilação de três listas: os dois últimos quintos da avaliação CPA (Country Policy and Institutional Assessment) de 2007, o Índice de debilidade do
Estado nos países em desenvolvimento de 2008, elaborado por Brookings, e o índice CFIP (Carleton University Country Indicators for Foreign Policy) de 2007.
Esta lista de Estados frágeis inclui o Afeganistão, Angola, Burundi, Camarões, Camboja, Chade, Comores, Coreia do Norte, Costa do Marfim, Eritreia, Etiópia,
Gâmbia, Guiné, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Haiti, Ilhas Salomão, Iraque, Jibuti, Kiribati, Laos, Libéria, Mauritânia, Myanmar, Nepal, Níger, Nigéria, PapuásiaNova Guiné, Paquistão, Quénia, República Centro-Africana, República Democrática do Congo, República do Iémen, Ruanda, São Tomé e Príncipe, Serra Leoa,
Somália, Sudão, Tajiquistão, Territórios Palestinianos sob administração, Timor-Leste, Togo, Tonga, Uganda, Uzbequistão, Vanuatu e Zimbabué. Conforme é
discutido na secção seguinte, a compilação de uma lista de Estados frágeis é política e analiticamente controversa. O RED 2009 não aprova oficialmente esta
classificação, a qual é utilizada apenas para fins operacionais.
Chauvet e Collier 2008.
Moyo 2009.
OCDE-CAD 2007.
OCDE, DAC Statistics Online Database, para os anos 2000–2007.
GDC (UNODC) 2009.
12
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Fragilidade do Estado na África subsariana: desafios e custos
Caixa 1.1: Eficácia da ajuda e dotações de ajuda a países frágeis
(Aid effectiveness and allocations to fragile states)
por Mark McGillivray, Economista-chefe da agência australiana para o desenvolvimento internacional
(AusAID)
Seria o crescimento económico nos países frágeis mais baixo, mais elevado ou igual sem ajudas? Segundo uma perspectiva
de crescimento, os Estados frágeis recebem, individual ou colectivamente, demasiada ajuda, pouca ajuda ou uma ajuda
adequada?
A literatura sobre o impacto da ajuda no crescimento económico melhorou significativamente nos últimos 10 anos, devido
a melhores dados, teorias subjacentes mais incisivas e a aplicação de métodos empíricos mais rigorosos9. Este facto não
significa que a literatura não tem limitações, dado que ainda existem muitas. Possivelmente, a principal falha é a de não
ser capaz de esclarecer quais os canais de ajuda que afectam o crescimento.
Resultou de toda esta literatura uma conclusão sólida, retirada de praticamente todos os estudos recentes: a relação
incremental entre ajuda e crescimento segue um padrão em U invertido, com níveis de ajuda mais elevados associados a
taxas de crescimento mais elevadas apenas até um determinado limiar de ajuda, além do qual uma ajuda maior é associada
a menor crescimento. Este limiar foi designado como nível de ajuda “growth-efficient” (nível de ajuda que maximiza o seu
impacto no crescimento económico, ou seja “o nível de ajuda eficiente no crescimento”). A este nível, o impacto incremental
da ajuda no crescimento do rendimento per capita é maximizado nos países destinatários.
A constatação de uma relação em forma de U invertido entre ajuda e crescimento adquire um significado particular nos
Estados frágeis. Uma das interpretações do declínio do impacto incremental da ajuda, para além do nível growth-efficient,
é a existência de restrições na capacidade de absorção dos países destinatários. Considera-se que as restrições surgem
por várias razões, sendo a principal a baixa qualidade do desempenho das instituições e das políticas, uma característica
fundamental dos Estados frágeis.
Neste contexto, os investigadores têm colocado a hipótese, defendida por alguns decisores políticos, que a relação entre
ajuda e crescimento nos Estados frágeis e outros Estados (não frágeis) é a descrita na figura 1.1 infra. No que respeita aos
Estados frágeis, a relação entre ajuda e crescimento é a mesma prevista para os países não frágeis, mas com um menor
nível de ajuda growth-efficient, além do qual o impacto incremental da ajuda ao crescimento é negativo e o impacto
incremental global da ajuda ao crescimento é inferior em todos os níveis de ajuda.
Figura da caixa 1.1: Impactos incrementais da ajuda no crescimento
gi
0
aif*
aif**
ainf*
ainf**
Estados frágeis
ai
Estados não frágeis
Note: ai refers to some measure of aid to recipient country i, gi refers to i’s real per capita GDP growth, ainf* is the growth efficient level of aid
for nonfragile states, and ainf** is a level of aid beyond which the incremental contribution of aid to growth in these states is negative.
McGillivray e Feeny (2008) analisaram os dados relativos à ajuda e ao crescimento entre 1977 e 2001 para determinar se
existe um suporte empírico para as relações da figura da caixa 1.1. Consideram um Estado como frágil se pertencer aos dois
últimos quintos da avaliação CPIA do Banco Mundial. No que respeita aos países classificados no último quinto, os “Estados
9
É possível encontrar estudos sobre esta literatura em Morrissey (2001), Clemens et al. (2004) e McGillivray et al. (2006).
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 1
muito frágeis”, tal como McGillivray e Feeny (2006) os designam, a ajuda pública ao desenvolvimento contribuiu em cerca
de 1,37 pontos percentuais para o crescimento real do PIB per capita durante o período. Esse valor é comparado com os
2,47 pontos percentuais nos outros Estados frágeis, os situados no segundo quinto da avaliação CPIA.
O estudo de McGillivray e Feeny (2008) é o único sobre a relação ajuda-crescimento que incidiu especificamente nos
Estados frágeis, embora existam muitos estudos que analisaram esta relação nos países da África subsariana10 . Gomanee
et al. (2005) analisaram a ajuda a 25 países da África subsariana durante o período de 1970 a 1997 e constataram que cada
ponto percentual de aumento na ajuda como um rácio do PIB representa em média um contributo de um quarto de ponto
percentual para as taxas de crescimento desses países. Clemens et al. (2004) estudaram o impacto de curto prazo da ajuda,
concluindo que este aumentou o crescimento médio do rendimento anual per capita na África subsariana em pelo menos
meio ponto percentual ou mais entre 1973 e 2001. Lensink e Morrissey (2000) concluíram que, embora a ajuda tenha tido
um impacto menor no crescimento da África subsariana do que noutras regiões, este impacto foi positivo e significativo.
Estes estudos apoiam aparentemente os resultados mencionados no estudo de McGillivray e Feeny (2008).
McGillivray e Feeny (2008) e Feeny e McGillivray (2009) fornecem igualmente estimativas de aif* e ainf* para os Estados muito
frágeis (13,88% do PIB) e outros Estados frágeis (38,38% do PIB). A comparação destes valores com os resultados efectivos
da ajuda pública ao desenvolvimento (APD) das agências bilaterais e multilaterais, em 2004, sugere que os Estados frágeis
recebem menos ajuda numa perspectiva de crescimento-eficiência (quadro da caixa 1.1). Os países que recebem menos
ajuda, em relação ao PIB, no grupo de países muito frágeis, são a Costa do Marfim e a Nigéria. A afectação de níveis de ajuda
growth-efficient, em comparação com as dotações efectivas em 2004, teria conduzido a um crescimento médio de 1,92
pontos percentuais para todos os Estados frágeis em questão. No entanto, nem todos os Estados frágeis parecem receber
menos ajuda. Dez Estados frágeis receberam mais ajuda do que o montante growth-efficient em 2004. De todos os Estados
frágeis em questão, os mais ajudados numa perspectiva de crescimento foram o Burundi e as Ilhas Salomão.
Quadro da caixa 1.1: Ajuda aos países frágeis, 2004
Estados muito frágeis
Outros Estados frágeis
Todos os Estados frágeis
APD (milhões de dólares
americanos)
6 629
2 719
9 348
APD “growth-efficient ”
(em milhões de dólares
americanos)
14 512
10 506
25 018
Crescimento e APD real
(%, média)
-0,46
3,43
1,25
Ganho de crescimento
resultante da ajuda
“growth-efficient” (%, média)
1,43
2,47
1,92
Países que recebem mais do
que ajuda “growth-efficient”
8
2
10
Países que recebem menos do
que ajuda “growth-efficient ”
9
13
22
Notas: os Estados muito frágeis estão no último quinto da avaliação CPIA; os outros Estados frágeis estão no penúltimo quinto
da avaliação CPIA.
Os estudos McGillivray e Feeny (2008) e Feeny e McGillivray (2009) acentuam o facto de os níveis de ajuda growth-efficient
constituírem uma referência pouco rigorosa para os montantes de ajuda que os doadores devem fornecer aos países
frágeis. Acentuam igualmente o facto de que os doadores têm muitos outros objectivos válidos de desenvolvimento que
justificam desvios dos montantes growth-efficient: os seus resultados sugerem, contudo, que os doadores necessitam de
avaliar cuidadosamente as dotações aos países que diferem substancialmente desses montantes, interrogando-se se os
desvios podem ser justificados por critérios de desenvolvimento.
10
De notar que, dependendo da definição utilizada, cerca de metade dos Estados frágeis localiza-se na África subsariana.
14
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Fragilidade do Estado na África subsariana: desafios e custos
1.2 A POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO DA UE NOS PAÍSES FRÁGEIS
A ajuda ao desenvolvimento por parte da UE e dos Estados-Membros tem um grande potencial: para a maior parte dos países em
desenvolvimento, a Europa é o principal doador, parceiro comercial, investidor e destino de migração e a UE é um importante bloco
político, diplomático e económico. Os países europeus têm grandes responsabilidades perante os países frágeis, com a origem da
fragilidade a remontar ao processos de colonização e descolonização, por vezes ampliada pelas práticas irresponsáveis de empresas
estrangeiras e o tráfico ilícito e criminoso de e para a Europa.
O potencial para a acção da UE não deveria, contudo, ser sobrevalorizado. A ordem mundial tornou-se mais multipolar, com centros
políticos e económicos emergentes a juntarem-se aos anteriores agentes. A configuração EUA-China-UE tornou-se central no sistema
internacional. Além das principais organizações internacionais, outros países estão empenhados em ajudar os Estados frágeis,
desde os Estados Unidos até aos países do Este Asiático e os Estados Árabes do Golfo. Além disso, as iniciativas comunitárias para
fazer face à fragilidade dos Estados, tais como a ajuda à consolidação da paz e à construção do Estado, podem ser entendidas como
intrusivas e não como politicamente neutras pelos países parceiros. Podem afectar processos e dinâmicas que são intrinsecamente
internos. Por fim, a resistência e os constrangimentos internos na UE podem diminuir o compromisso europeu nas políticas de
desenvolvimento. O envelhecimento da população, o elevado défice acumulado com a crise e o alargamento da UE podem reforçar
os incentivos para desviar os recursos públicos destinados à cooperação internacional em matéria de desenvolvimento para as
necessidades internas da UE.
Com esta situação como cenário, o Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento de 2009 aborda a fragilidade dos Estados da África
subsariana e as políticas de desenvolvimento comunitárias em matéria de fragilidade. O relatório analisa os aspectos que devem
ser melhorados nos compromissos actuais da UE com os países frágeis e o potencial das políticas comunitárias de desenvolvimento
para ajudar as partes interessadas nacionais a ultrapassar a situação de fragilidade. O relatório centra-se na África subsariana, dado
que a região parece estar particularmente atrasada em matéria de consolidação do Estado e acolhe a maior parte dos países com
instituições de Estado frágeis.
Este esforço é coerente com uma abordagem baseada na resiliência para a definição de políticas e prioridades em matéria de
desenvolvimento. As instituições de Estado e a sua capacidade de mobilização dos recursos internos são um elemento essencial
da resiliência de um sistema socioeconómico. As instituições devem manter a ordem interna, garantir a segurança dos cidadãos,
controlar o território, prestar serviços sociais, executar regulamentos e proteger contra riscos individuais e colectivos, bem
como adaptar-se a esses riscos. As instituições de Estado influenciam, assim, o bem-estar dos cidadãos e as suas variações face a
perturbações e mudanças.
1.3 ESTRUTURA DO RELATÓRIO
O RED 2009 contribui para o objectivo de elaborar uma nova abordagem europeia com vista a ultrapassar a situação de fragilidade
na África subsariana através de três etapas principais. A primeira etapa consiste na análise do significado de fragilidade dos Estados,
bem como o seu âmbito e custos inerentes na África subsariana. O relatório descreve as características económicas dos países frágeis,
debate os factores económicos que podem afectar o funcionamento das instituições, a governação e a estabilidade sociopolítica
dos Estados e analisa as interpretações propostas pela literatura sobre as origens históricas e políticas da situação de fragilidade
em África. Na segunda parte do relatório, a relação entre resiliência socioeconómica e situação de fragilidade é estudada numa
perspectiva teórica e avaliada em relação ao impacto da crise económica mundial de 2008-2009 nos países frágeis. Na parte final,
são debatidas as políticas: o Capítulo 8 oferece uma perspectiva do compromisso da UE nos países frágeis e uma análise das
políticas de segurança. São debatidos os desafios e as potencialidades da ajuda dos agentes externos no apoio à construção do
Estado nos países parceiros e tenta-se identificar as boas práticas com base nas experiências internacionais nesta área. O último
capítulo propõe os critérios e as prioridades para a intervenção da UE nas situações de fragilidade.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
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15
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 1
2. A QUE SE REFERE O CONCEITO DE FRAGILIDADE DE ESTADO?
A literatura existente está repleta de definições de “fragilidade” (caixa 1.2) e a utilização da expressão
“fragilidade do Estado” é muito controversa. Paul Collier, por exemplo, não divulgou inicialmente a lista
de países que integram o famoso Bottom Billion – frequentemente equiparado ao grupo dos Estados
frágeis11 – porque conclui que “não se trata de uma empresa na qual os países têm interesse em deter uma
participação e a estigmatização de um país tende a criar uma profecia evidente12”.
Apesar das diferenças em matéria de definições, existe consenso sobre alguns aspectos essenciais na literatura política e académica.
Stewart e Brown (2009) concluem que as definições existentes se baseiam em três graus principais de fragilidade: os fracassos em
matéria de autoridade, serviço e legitimidade que ocorrem, respectivamente, quando o Estado não consegue proteger os seus
cidadãos da violência, prestar serviços básicos a todos os cidadãos e ver a sua legitimidade reconhecida pelos cidadãos.
Esta visão de fragilidade do Estado está consagrada indirectamente na definição da OCDE dos “Princípios para uma Intervenção
Internacional Eficaz em Estados Frágeis e em Situações de Fragilidade”: “Um Estado é frágil quando as estruturas estatais apresentam
um défice de vontade política e/ou de capacidade de assegurar aos seus cidadãos as funções básicas necessárias à redução da
pobreza, ao desenvolvimento e à salvaguarda da segurança e dos direitos humanos das suas populações13.” A OCDE propôs que a
atenção incidisse no papel central da legitimidade e das expectativas dos cidadãos, através do ajustamento da definição de Estados
frágeis como aqueles “incapazes de responder às expectativas das populações ou de promover uma mudança nas expectativas e
na capacidade através do processo político14”.
Caixa 1.2: A integração da fragilidade no discurso de desenvolvimento
As décadas de 1990 e 2000 foram marcadas por uma progressiva mudança do apoio baseado em projectos para o apoio orçamental,
bem como por um crescente reconhecimento da forma como as políticas dos países destinatários medeiam o impacto dos
programas de ajuda.15 Essas duas mudanças significativas tiveram como resultado um aumento na selectividade das ajudas. A
ênfase crescente na selectividade das ajudas, reflectida no Consenso de Monterrey, conduziu a uma mudança significativa nas
dotações de ajudas bilaterais.16 Os doadores estavam perante um dilema: a selectividade das ajudas implicava reduzir as ajudas
onde eram mais necessárias, não obstante serem provavelmente menos eficientes. Desse modo, alguns países ficaram órfãos
de ajuda, uma vez que os países caracterizados por uma fraca governação registaram um declínio acentuado e volátil nos fluxos
de ajudas.17
Nestas condições, a crescente preocupação com a fragilidade “surgia como uma resposta política a um problema operacional”
(Guillaumont e Guillaumont Jeanneney 2009). As agências doadoras debateram-se com problemas de interacção com “países
onde existe falta de empenhamento político e capacidade insuficiente para desenvolver e implementar políticas a favor dos
pobres.”18 Esta definição do Comité de Ajuda ao Desenvolvimento da OCDE demonstra que a noção de país frágil é intrinsecamente
relacional, uma vez que se refere a uma divergência entre a vontade política, ou capacidade, de um país e as prioridades universais
da comunidade de doadores.
As diferenças nas definições devem-se em parte à extrema sensibilidade política de um conceito que, implícita ou explicitamente,
suscita dúvidas sobre as prioridades políticas de um país ou sobre a sua capacidade para as executar. Os países frágeis eram
encarados, mesmo antes do ataque de 11 de Setembro nos Estados Unidos, como um possível paraíso para grupos de terroristas,
dado o limitado controlo que tinham sobre os seus territórios. A segurança e o desenvolvimento estão estreitamente interligados
nos países frágeis; alguns autores solicitam um conjunto de meios mais abrangente, incluindo intervenções militares, para lidar
com o desafio de desenvolvimento que esses países enfrentam.19
Foi por esse motivo que o Comité de Ajuda ao Desenvolvimento da OCDE começou a mencionar também situações de fragilidade,
centrando as atenções não apenas no Estado.20 Os seus Princípios para uma intervenção internacional eficaz defendem que a
perspectiva a longo prazo da intervenção internacional nesses países “assenta no apoio às reformas nacionais, de forma a constituir
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
Zoellick 2008.
Collier 2007, pág. 7.
OCDE-CAD 2007, pág. 2.
OCDE 2008.
Chhotray e Hulme 2009.
Dollar e Levin 2006.
Levin e Dollar 2005, Fielding e Mavrotas 2008.
OCDE-CAD 2006.
Bourguignon et al. 2008, Collier 2009..
OCDE-CAD 2007.
16
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Fragilidade do Estado na África subsariana: desafios e custos
instituições eficazes, legítimas e resistentes, capazes de se empenharem de maneira produtiva com as suas populações com vista à
promoção de um desenvolvimento sustentável.”21 A referência a reformas nacionais ajuda a transmitir a ideia de que a construção
do Estado é um processo interno que apenas pode ser influenciado marginalmente por agentes externos.
Uma alteração associada da definição é a mudança de uma definição de fragilidade que, embora implicitamente, se centra nas
relações entre um país e a comunidade de doadores, para definições que tentam identificar os traços essenciais de um país frágil.
O Conselho da União Europeia reconheceu que:
“o conceito de fragilidade refere-se a estruturas débeis ou em desagregação e a situações em que o contrato social é
rompido devido à incapacidade ou à falta de vontade do Estado de assumir as suas funções de base, cumprir as suas
obrigações e responsabilidades no que diz respeito ao Estado de Direito, protecção dos direitos humanos e liberdades
fundamentais, segurança da população, redução da pobreza, prestação de serviços, transparência e gestão de recursos
e acesso equitativo ao poder.” 22
A referência ao contrato social, o resultado das intermináveis negociações entre a sociedade e o Estado, amplia substancialmente
a relevância dos efeitos persistentes da fragilidade. Um conceito de fragilidade do Estado baseado nas expectativas da população
não toma uma posição sobre o conteúdo do contrato social e introduz um aspecto dinâmico interessante na definição, uma vez
que a fragilidade pode ser entendida como a incapacidade de gerir as perturbações que podem afectar o conteúdo do contrato
social. Este conceito está de acordo com o argumento de Baliamoune-Lutz e McGillivray, que argumentam que a expressão
“fragilidade do Estado” deve ser utilizada apenas para “descrever Estados apenas em termos de risco de ruptura ou vulnerabilidade
a choques com efeitos negativos,” 23 que é precisamente a argumentação do CAD-OCDE. A ruptura do contrato social devido à
incapacidade do Estado em corresponder às expectativas da população cria um elemento de instabilidade latente, o qual pode
conduzir a um conflito que, por sua vez, representa a manifestação definitiva de instabilidade.
Kaplan reforça este argumento ao estabelecer uma definição de países frágeis com base nas características da concepção do
Estado e fazendo-a depender de uma “divergência” significativa entre as instituições formais e informais. Segundo Kaplan, as
fronteiras que forçam grupos com identidades diferentes e sem referências históricas comuns a trabalharem em conjunto e os
sistemas políticos e jurídicos que não reflectem valores, crenças e formas de organizar a sociedade, podem facilmente separar o
Estado da população que é suposto servir e é pouco provável que essas condições sociopolíticas produzam um governo capaz
de satisfazer as expectativas dos cidadãos.24
Uma outra definição é apresentada por Engberg-Pedersen e outros, que contornam a centragem exclusiva sobre o Estado que
caracteriza as definições que analisámos até agora e definem uma situação de fragilidade como “instabilidade institucional
que prejudica a previsibilidade, a transparência e a responsabilidade dos processos de decisão pública e a prestação de
serviços sociais e de segurança à população.” 25
De acordo com este argumento, Ikpe associa a fragilidade “à capacidade do Estado em adaptar-se a circunstâncias diferentes,
proteger os cidadãos, absorver impactos e gerir conflitos sem recurso à violência26”. A súbita interrupção ou a erosão gradual da
capacidade do Estado para responder às expectativas dos cidadãos, adoptar um processo político ajustável para gerir a mudança
nas relações entre o Estado e a sociedade ou manter o controlo do seu território são, assim, factores determinantes da fragilidade
do Estado. Vale a pena sublinhar que os fracassos em matéria de legitimidade, autoridade e serviços, embora conceptualmente
distintos, estão interligados e reforçam-se mutuamente. Por exemplo, mesmo que as expectativas dos cidadãos sejam específicas
a nível cultural e do país, a capacidade de assegurar as necessidades básicas e os direitos humanos da população não pode ser
considerada como uma condição para a legitimidade das instituições do Estado.
A fragilidade apresenta padrões muito diversificados em termos qualitativos e quantitativos de país para país. Pode ser despoletada
por diversos factores, desde um conflito violento à erosão gradual da capacidade e legitimidade do Estado, e apresentar graus de
intensidade variáveis. O risco de colapso das funções do Estado é maior em períodos de transição política e económica, extrema
instabilidade política, reconstrução política e do Estado em países afectados por conflitos, fases iniciais de formação de Estados,
períodos prolongados de exposição a choques e perturbações externas graves e frequentes. Uma gestão incorrecta destas fases
delicadas pode despoletar forças poderosas que estarão na origem de manifestações extremas da fragilidade do Estado: conflitos
e regimes autoritários com repressão massiva e sistemática e violações dos direitos humanos de grupos populacionais.
21
22
23
24
25
26
OCCD-CAD 2007, pág. 1; sublinhado nosso.
Conselho da União Europeia, 2007.
Baliamoune-Lutz e McGillivray 2008.
Kaplan 2008. Para um debate crítico dos argumentos de Kaplan, consultar o capítulo 3.
Engberg-Pedersen et al. 2008, pág. 6.
Ikpe 2007, pág. 86.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
17
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 1
A heterogeneidade é, assim, uma característica determinante das manifestações de fragilidade e dos Estados considerados “frágeis”.
Alguns autores observam igualmente que este conceito é “lato” no sentido de que agrupa países cuja comparação é difícil27.
Como defende Brinkerhoff, “os Estados frágeis são dinâmicos e percorrem trajectórias desde a estabilidade até ao conflito, crise
e/ou fracasso, e emergem da crise rumo à recuperação e à estabilidade28”. Isto implica que cada país pode enfrentar dificuldades
específicas em matéria de capacidade e vontade política. Alguns autores vão mais além, defendendo que não é sequer possível
desenhar uma linha convincente que separe os países frágeis dos não frágeis e suscitam dúvidas quanto aos benefícios da inclusão
de alguns países no grupo definido de modo muito lato como o grupo de países frágeis29. Brisco observa que “a fragilidade de
Estado caracteriza-se essencialmente pelos seus sintomas: pobreza, insegurança, propensão para o conflito, corrupção30.”
Na verdade, o debate sobre a fragilidade voltou a centrar a atenção na função das instituições do Estado no âmbito do processo
de desenvolvimento e sublinhou a necessidade de adaptar as prioridades e as intervenções externas com base no conhecimento
profundo do contexto político e económico local. A heterogeneidade dos graus e manifestações de fragilidade significa que esse
conhecimento do contexto local é decisivo para assegurar o sucesso dos compromissos externos nos países frágeis.
Mesmo nas suas formas mais graves de fracasso do Estado, a fragilidade não implica necessariamente um vazio político, uma vez que
as instituições informais podem, pelo menos parcialmente, executar algumas funções do Estado. Engberg-Pedersen, entre outros,
defende que “em situações frágeis em que o Estado está ausente ou muito enfraquecido, as autoridades não estatais desempenham
frequentemente funções para-estatais em matéria de prestação de serviços sociais e de segurança31”, uma observação que está
de acordo com os argumentos teóricos de Dixit32. Por exemplo, o cumprimento da lei e da ordem na Somália é assegurado por
“tribunais islâmicos e os tribunais que aplicam a sharia desempenham uma função instrumental na “criação” da ordem jurídica [...]
em anarquia, a resolução de litígios é livre e rápida à luz dos padrões internacionais”, observa Leeson33. Embora a situação actual
esteja longe de ser a ideal, melhorou significativamente em relação a 1991, uma melhoria que não se limita ao sistema judicial. O
Relatório sobre o Desenvolvimento Humano de 2001 para a Somália observa que existem actualmente mais escolas no país do
que final da década de 1980 e que o sector privado tem fornecido água e electricidade34.
Estas observações demonstram que os agentes externos não devem ignorar essas instituições quando se envolvem num país
em situação de fragilidade. Na verdade, a concentração das atenções apenas no Estado não permitirá uma compreensão bem
fundamentada da fragilidade e da melhor forma de a mitigar.
3. OS CUSTOS DA FRAGILIDADE DO ESTADO NA ÁFRICA SUBSARIANA
O papel fundamental do Estado na formação da resiliência socioeconómica, capacidades humanas e bemestar é espelhado pelos débeis resultados de desenvolvimento obtidos pelos países considerados “frágeis”
devido ao fracasso das suas instituições estatais. Os mecanismos que estão na origem de resultados de
desenvolvimento fracos e de relações problemáticas entre os doadores e os governos destinatários são
diferenciados. A fragilidade do Estado pode evoluir segundo trajectórias diferentes, dado que a formação
do Estado, o funcionamento do Estado e a estabilidade são o resultado de um processo complexo que
vai do sentimento comum de cidadania ao controlo do território. Apesar desta diferenciação, os custos
da fragilidade em termos económicos, de segurança e de desenvolvimento tendem a ser significativos,
abrangentes e persistentes em diversos sectores.
3.1 UM CUSTO PESADO PARA O DESENVOLVIMENTO HUMANO
O estudo do desenvolvimento humano nos países frágeis pode proporcionar um balanço sintético, mas revelador, dos custos
directos da fragilidade. O grupo dos países com um fraco registo em termos de desenvolvimento humano é, na sua maioria,
constituído pelos países frágeis da África subsariana. No que respeita ao IDH, as suas posições vão desde a 128.ª, no caso de São
Tomé e Príncipe, até à 179.ª, para a Serra Leoa, a última na lista de países para as quais o índice está disponível. O IDH médio para
os países frágeis situa-se em 0,459 em 2006 (0,329 para a Serra Leoa e 0,643 para São Tomé e Príncipe).
27
28
29
30
31
32
33
34
Faria e Magalhães-Ferreira 2007.
Brinkerhoff 2007, pág. 3.
Easterly 2009.
Briscoe 2008, pág. 1.
Engberg-Pedersen et al. 2008, pág.23.
Dixit 2004.
Leeson 2007, pág. 705.
PDNU 2001.
18
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Fragilidade do Estado na África subsariana: desafios e custos
Quadro 1.1: Desenvolvimento humano nos Estados frágeis da África subsariana
cada 1000)(3)
67,4
202,7
1 400
48,9
59,3
164,4
1 100
0,514
50,0
67,9
142,6
1 000
178
0,352
44,0
48,6
178,5
980
Índice de
Índice de
Desenvolvimento
Humano(1)
Desenvolvimento
Humano(1)
Angola
157
0,484
42,1
Burundi
172
0,382
Camarões
150
República Centro-Africana
Nome do País
Taxa de
mortalidade
de crianças
menores de
5 anos (por
Taxa de
mortalidade
materna (por
cada 100 000
nascimentos
vivos)(4)
Posição no
Esperança de Taxa de literacia
vida à nascença(1) nos adultos(2)
Chade
170
0,389
50,4
25,7
209,7
1 500
Comores
137
0,572
64,5
74,2
61,3
400
Congo (República Democrática do)
177
0,361
46,1
67,2
121,9
1 100
Congo (República do)
130
0,619
54,5
86,0
128,6
740
Costa do Marfim
166
0,431
47,7
48,7
196,4
810
Jibuti
151
0,513
54,2
…
123,7
…
Guiné Equatorial
115
0,717
50,8
87,0
166,9
680
Eritreia
164
0,442
57,2
…
73,6
450
Etiópia
169
0,389
52,2
35,9
129,3
720
Gâmbia
160
0,471
59,0
…
115,3
690
Guiné
167
0,423
55,3
29,5
145,2
910
Guiné-Bissau
171
0,383
46,0
62,8
194,5
1 100
Quénia
144
0,532
52,7
73,6
102,4
560
Libéria
176
0,364
45,1
54,4
138,2
1 200
Mauritânia
140
0,557
63,6
55,2
119,4
820
Nigéria
174
0,370
56,2
29,8
170,2
1 800
Nigéria
154
0,499
46,6
71,0
185,9
1 100
Ruanda
165
0,435
45,8
64,9
153,4
1 300
São Tomé e Príncipe
128
0,643
65,2
87,5
94,0
…
Serra Leoa
179
0,329
42,1
37,1
145,8
2 100
Somália
n.c.
n.c.
47,5
…
177,9
…
Sudão
146
0,526
57,8
60,9
109,6
…
Togo
159
0,479
58,0
53,2
96,7
510
Uganda
156
0,493
50,5
72,6
120,9
550
Zimbabué
n.c.
n.c.
41,7
90,7
92,3
880
Países frágeis da África subsariana
0,469
51,2
59,2
138,3
976
Países não frágeis da África subsariana
0,545
53,2
66,4
97,5
614
África subsariana
0,500
52,2
62,9
123,2
824
Notas: ... indica dados não disponíveis; n.c. indica não classificado; (1) dados relativos a 2006; (2) dados relativos a pessoas com idade igual
ou superior a 15 anos no ano de 2006;(3) dados relativos a 2008; (4) dados relativos a 2000, ajustados com base em revisões da UNICEF,
WHO e UNFPA para ter em conta problemas de registos e classificações incorrectos.
Fonte: Elaboração do RED com base no Relatório sobre o Desenvolvimento Humano 2008 do PDNU (2008), Perspectivas Económicas
Africanas 2009 da OCDE e da AfDB (2009).
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
19
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 1
Os custos humanos, sociais e económicos da fragilidade não se limitam ao fraco registo dos países frágeis nas três componentes do
IDH. Os países frágeis possuem indicadores significativamente mais baixos para a maior parte dos ODM em relação a outros países
em desenvolvimento35. Na verdade, existe uma forte correlação negativa entre a fragilidade e o desempenho ODM: os Estados
frágeis da África subsariana estão muito distantes de realizar os ODM até 2015.
Harttgen e Klasen, que adoptaram uma classificação de Estados frágeis com base na lista CPIA de 2006, concluíram que a fragilidade
está claramente associada a resultados de desenvolvimento muito mais fracos em termos de pobreza, subnutrição, escolarização e
mortalidade de crianças menores de cinco anos36. O número de pessoas abaixo do limiar da pobreza da lista CPIA de países frágeis,
em 2006, é mais de três vezes superior ao dos países não frágeis. As taxas de conclusão do ensino primário, o número de crianças
com insuficiência ponderal, a mortalidade de crianças menores de cinco anos e o rácio emprego/população revelam que os Estados
frágeis têm normalmente um registo de desenvolvimento humano muito inferior ao dos Estados não frágeis. Os países frágeis
da África subsariana encabeçam a lista de mortalidade de crianças menores de cinco anos e do rácio desemprego/população. O
desempenho atingido entre 2000 e 2006 confirma estas conclusões.
Ao mesmo tempo, alguns indicadores de desenvolvimento, como as taxas de pobreza, de esperança de vida e de mortalidade de
crianças menores de cinco anos, apresentam uma certa diferenciação no grupo de países frágeis. Embora a diferença agregada entre
países frágeis e não frágeis seja significativa, esconde uma heterogeneidade considerável. A recente taxa elevada de crescimento
parece ter sido transmitida aos objectivos de desenvolvimento apenas em alguns países – por certo não na Guiné, que possui ainda
uma taxa de alfabetização de adultos de 29%, ou em Angola, onde a taxa de mortalidade de crianças menores de cinco anos, em
2008, era superior a 20%, ou seja 203 por 1000 (ver quadro 1.1).
Duas edições recentes do Relatório Mundial de Acompanhamento mostraram que os países frágeis não estão a apresentar
progressos na consecução dos ODM ou estão mesmo em retrocesso.37 Em comparação com os países de rendimento médio e os
de rendimento baixo, os países frágeis, de acordo com os critérios CPIA, apresentaram progressos consideravelmente inferiores
na consecução dos ODM entre 1990 e 2006.
Harttgen e Klasen, que comparam o desempenho dos países frágeis na consecução dos ODM adoptando critérios diferentes de
classificação38, apresentam uma perspectiva ligeiramente diferente. Concluíram que o desempenho dos países frágeis é idêntico ao
de outros países em vias de desenvolvimento no que respeita aos progressos para a consecução dos ODM, embora ainda estejam
consideravelmente atrasados39. As variações nos indicadores ODM entre 2000 e 2006 demonstram uma grande heterogeneidade
entre os países frágeis e entre os indicadores dos países frágeis, enquanto os padrões de países frágeis e não frágeis não apresentam
diferenças sistemáticas. Se, pelo contrário, a análise se centrar nos países frágeis da África subsariana, o padrão varia e a fragilidade
do Estado parece ter mais peso no progresso dos ODM. As figuras 1.1 e 1.2 mostram que os países frágeis da África subsariana estão
atrasados em relação ao continente no que respeita tanto a variações relativas como absolutas rumo aos ODM. Os desempenhos
mais insuficientes registam-se nos países onde a fragilidade do Estado é particularmente grave. Os países com um baixo valor CPIA,
em 2007, em todos os níveis – gestão económica, políticas estruturais, igualdade/inclusão social, gestão do sector público – são
maioritariamente países da África subsariana.
35
36
37
38
39
Ver o documento de apoio de Harttgen e Klasen para obter uma visão completa da forma como definições diferentes afectam os resultados.
Harttgen e Klasen 2009.
Banco Mundial 2007, 2009a.
Harttgen e Klasen 2009.
Harttgen e Klasen 2009. De notar que a conclusão de Harttgen e Klasen (2009) pode ser distorcida pela falta de dados, uma vez que não existem informações
pertinentes para avaliar o progresso rumo aos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio em relação a um elevado número de países frágeis. Se considerarmos
que os países que não dispõem de informações são caracterizados por um registo inferior à média, então mesmo o progresso absoluto rumo ao conjunto
de objectivos pode ser inferior para os países frágeis.
20
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Fragilidade do Estado na África subsariana: desafios e custos
Figura 1.1 Variações absolutas dos principais indicadores OMD (2000-2006)
ENSINO PRIMÁRIO
NÚMERO DE PESSOAS ABAIXO DO LIMIAR DE POBREZA
14
6
12
4
10
2
8
0
CPIA-SSA
SSA
CPIA-ALL
6
-2
4
-4
2
-6
0
CPIA-SSA
SSA
CPIA-ALL
MORTALIDADE EM CRIANÇAS MENORES
DE CINCO ANOS
INSUFICIÊNCIA PONDERAL
0
1,5
CPIA-SSA
1
-2
0,5
-4
SSA
CPIA-ALL
-6
0
CPIA-SSA
SSA
CPIA-ALL
-0,5
-8
-1
-10
-12
Notas: CPIA-SSA: países da África subsariana incluídos na lista CPIA de 2007 (com um valor CPIA inferior a 3,2); CPI-All: países que apresentam
um valor CPIA inferior a 3,2 em qualquer uma das sublistas CPIA (gestão económica, políticas estruturais, igualdade/inclusão social, gestão
do sector público) em 2007; SSA: todos os países da África subsariana; para efeitos de cálculo da média de cada indicador por situação
de fragilidade, as variações referentes ao número de pessoas abaixo do limiar da pobreza, à conclusão do ensino primário, à insuficiência
ponderal e à taxa emprego/população são medidas em percentagens; as variações referentes à mortalidade em crianças menores de
cinco anos são medidas em valor absoluto, em mortes por cada 1000 crianças.
Fonte: Harttgen e Klasen 2009.
Número de pessoas abaixo do limiar de pobreza 2000-06
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
21
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 1
Figura 1.2 Variações relativas dos principais indicadores OMD (2000-2006)
NÚMERO DE PESSOAS ABAIXO DO LIMIAR DE POBREZA
ENSINO PRIMÁRIO
0,45
0,15
0,40
0,10
0,35
0,05
0,30
0,00
CPIA-SSA
SSA
0,25
CPIA-ALL
-0,05
0,20
-0,10
0,15
-0,15
0,10
CPIA-SSA
SSA
CPIA-ALL
MORTALIDADE EM CRIANÇAS MENORES
DE CINCO ANOS
INSUFICIÊNCIA PONDERAL
0,08
0
CPIA-SSA
-0,01
0,06
-0,02
0,04
-0,03
-0,04
0,02
-0,05
0
CPIA-SSA
SSA
CPIA-ALL
-0,06
-0,02
-0,07
-0,08
-0,04
Nota: Ver nota da figura 1.1.
Fonte: Harttgen e Klasen 2009.
22
SSA
CPIA-ALL
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Fragilidade do Estado na África subsariana: desafios e custos
3.2 OS CUSTOS SÃO ELEVADOS E MULTIFACETADOS
A fragilidade também é caracterizada pela sua gravidade, incluindo as piores formas de privação humana e as violações dos
direitos humanos fundamentais à vida e à segurança. Reflecte com frequência a incapacidade dos governos em cumprir uma das
suas principais tarefas, como a gestão da segurança alimentar, ou pode resultar em conflitos violentos e guerras civis, com custos
elevadíssimos em termos humanos, sociais e económicos.
Conflito. Cerca de 73% dos mil milhões de pessoas carenciadas dos países incluídos no livro Bottom Billion, um indicador para
uma lista de países frágeis, viveram recentemente ou estão a viver uma guerra civil. Além disso, o risco de que esses países entrem
em guerra civil num período de cinco anos é muito elevado: um em seis40.
A relação entre fragilidade e conflito é dinâmica e complexa. Os conflitos podem, a um tempo, ser uma consequência da fragilidade
e uma das suas causas. Os países frágeis são frequentemente caracterizados pela exclusão social de grupos específicos (étnicos,
religiosos, proprietários de recursos naturais) que pode estar na origem de conflitos. Mas os conflitos também afectam a capacidade
dos Estados para prestarem serviços públicos, enfraquecendo as instituições e provocando o abrandamento do desempenho
económico e da redução da pobreza. A combinação destes factores potencia as forças destabilizadoras.
Os custos dos conflitos são inúmeros e abrangentes41. Alguns são “directos” e podem ser quantificados de um modo geral: mortes,
feridos, doenças, pessoas deslocadas internamente, migrações em massa. Outros são “indirectos”, como a interrupção da actividade
económica, o aumento das despesas públicas, desde a saúde e a educação às forças armadas, e a remodelação da receita pública (por
exemplo, impostos sobre as exportações petrolíferas, no caso da crise no delta do Níger). Os conflitos podem também provocar o
aumento do desemprego, sobretudo nos jovens do sexo masculino, aumentando o risco de criminalidade e o apelo ao extremismo.
Após um conflito, normalmente devido a um menor controlo no terreno, regiões inteiras podem ser convertidas em áreas de
cultivo de drogas e o tráfico de droga é fácil (e lucrativo), levando a que as pessoas se envolvam em actividades ilegais em vez de
regressarem aos seus antigos empregos (muitas vezes destruídos). Alguns custos não podem ser quantificados: os cidadãos sofrem
frequentemente traumas prolongados após o termo de conflitos, mas os custos psicológicos não são facilmente mensuráveis.
No caso vertente, quantificamos, tanto quanto possível e tendo em conta as incertezas, os principais custos para a África
subsariana42.
As perdas de vidas em combate podem ser quantificadas de um modo geral43, mas o mesmo não acontece com a maior parte das
perdas de vidas civis, ligadas à violência e à propagação das doenças; deste modo, mesmo a estimativa do número total de mortes
ligadas a conflitos violentos é um exercício difícil. O Relatório sobre o Desenvolvimento em África de 2009 indica o número de
mortes em combate e o total de mortos de guerra em países africanos específicos: em Angola (1975-2002), foram contabilizados
cerca de 160 000 mortos em combate e 1,5 milhões de mortos no total, no Burundi (1990-2002), cerca de 7000 mortos em combate
e 200 000 mortos no total e na República Democrática do Congo (1998-2008), 5,4 milhões de mortos no total, tornando esta guerra
na mais mortal desde o final da Segunda Guerra Mundial44.
Os dados relativos a pessoas deslocadas internamente, concentrados na Somália, Sudão, República do Congo e Costa do Marfim,
são mais fáceis de obter e mais comparáveis (quadro 1.2). O deslocamento de pessoas, por si próprio um custo, também implica
propagação de doenças, subnutrição e violência (em particular para as mulheres, sujeitas a violência extrema e frequentemente
violadas)45.
40
41
42
43
44
45
Collier 2007.
Collier, Hoeffler e Söderbom (2004) defendem que as guerras civis têm uma duração média de sete anos mas são necessários cerca de 21 anos para regressar
ao volume de receitas anterior à guerra. O custo total de uma guerra civil está calculado em quase 3 mil milhões de dólares anuais.
Ver Reynal-Querol 2009 e AfDB 2009 para uma análise de causas e conflitos.
As mortes resultantes de batalhas representam, no mínimo, 30% do total de eventos relacionados com conflitos.
AfDB 2009, pág. 12.
AfDB 2009.
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SOBRE
O
23
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 1
Quadro 1.2: Refugiados e pessoas deslocadas internamente, 2008
País de origem
Total de refugiados
PDI protegidas
ou auxiliadas
pelo ACNUR
Total da população
envolvida
Angola
171 393
0
185 186
Burundi
281 592
100 000
483 626
Camarões
13 870
0
16 803
República Centro-Africana
125 106
197 000
323 357
Chade
55 105
166 718
267 222
Comores
378
0
418
Congo (República Democrática do)
19 925
0
25 069
Congo (República do)
367 995
1 460 102
1 918 424
Costa do Marfim
22 227
683 956
737 792
Jibuti
650
0
716
Guiné Equatorial
384
0
431
Eritreia
186 398
0
201 094
Etiópia
63 878
0
95 552
Gâmbia
1352
0
2489
Guiné
9495
0
11 517
Guiné-Bissau
1065
0
1342
Quénia
9688
404 000
762 617
Libéria
75 213
0
88 413
Mauritânia
45 601
0
53 421
Níger
796
0
1067
Nigéria
14 169
0
24 645
Ruanda
72 530
0
90 428
São Tomé e Príncipe
35
0
35
Serra Leoa
32 536
0
35 480
Somália
561 154
1 277 200
1 860 373
Sudão
419 248
1 201 040
1 749 536
Togo
16 750
0
22 679
Uganda
7548
853 000
1 466 792
Zimbabué
16 841
0
51 639
África subsariana
2 628 765
6 343 016
10 530 951
Países frágeis da África subsariana
2 592 920
6 343 016
10 478 161
Países não frágeis da África subsariana
35 844
0
52 789
Fonte: Elaboração do ERD com base na versão online da Base de Dados do ACNUR sobre Populações.
Os conflitos não só estão na origem de uma contracção da produção, como também destroem infra-estruturas através de
bombardeamentos e outras acções e da redução das despesas com trabalhos de manutenção e renovação. O capital humano e
financeiro tende a abandonar os países, mas quantificar o fenómeno sem dados contrafactuais é uma tarefa difícil. Durante e após
os conflitos, registam-se alterações significativas na composição sectorial do PIB (Collier 2007). Na verdade, alguns sectores são mais
vulneráveis aos conflitos: o aumento das despesas militares significa normalmente menos despesas com a educação, o que tem
um custo elevado a longo prazo e pode ter um impacto permanente no crescimento de um país. Outro custo, importante devido
ao seu impacto sobre a política interna, é a redução dos horizontes temporais dos decisores políticos e dos investidores privados.
Lidar com conflitos persistentes cria uma situação contínua de emergência e os governos reagem com medidas de curto prazo46.
46
Um problema associado é a “dimensão ideal” do sector militar nos países afectados por conflitos (ver Acemoglu et al. 2009).
24
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Fragilidade do Estado na África subsariana: desafios e custos
Insegurança alimentar. O papel do Estado na definição do quadro jurídico e institucional em matéria de produção e distribuição
de bens alimentares e as reformas e intervenções governamentais podem afectar a disponibilidade dos bens alimentares e os
direitos a estes dos diferentes grupos populacionais. A fragilidade do Estado pode tornar-se uma causa subjacente de insegurança
alimentar através de diferentes canais47:
• Fracasso da capacidade: quando a capacidade de distribuição de um Estado falha, ou corre o risco de falhar, a probabilidade de
ocorrência de uma crise alimentar aumenta. O fornecimento inadequado de serviços básicos pode dar origem a este resultado.
As instituições dos Estados frágeis podem ter menos capacidade para activar mecanismos que podem apoiar o acesso dos pobres
aos bens alimentares ou proteger os cidadãos (consumidores e produtores) contra as flutuações dos preços dos bens alimentares
a nível mundial ou contra outras variações na origem e dimensão dos direitos a bens alimentares, como a insegurança alimentar
cíclica associada ao comportamento sazonal de algumas actividades económicas.
• Fracasso da autoridade: quando a autoridade de um Estado falha, os entraves nos sistemas de distribuição alimentar e a
incapacidade para proteger os activos produtivos destinados à produção e distribuição agrícola podem provocar crises
alimentares e emergências humanitárias.
• Fracasso da legitimidade: a implementação de sistemas de protecção social é uma questão não só de capacidade como também
de boa vontade e responsabilidade do Estado. Algumas características comuns das instituições estatais ilegítimas (falta de
formas de democracia eficazes, perseguição de opositores ou grupos populacionais, papel preponderante das forças militares
no governo, controlo dos meios de comunicação) podem ameaçar a segurança alimentar de grandes grupos populacionais. De
acordo com o prémio Nobel Amartya Sen, por exemplo, é essencial a existência de uma imprensa livre para divulgar informações
sobre as crises alimentares e responsabilizar os governos pela protecção e garantia dos direitos a bens alimentares48.
A fragilidade do Estado e a insegurança alimentar estão, assim, estreitamente ligadas (quadro 1.3). Nos países frágeis subsarianos, a
alimentação média era de 2093 Kcal por pessoa, comparada com 2303 Kcal noutros países subsarianos, e a prevalência de subnutrição
era 8 pontos percentuais superior (35% contra 23%). Os indicadores de malnutrição não só são em média mais baixos nos países
frágeis, como também atingem valores dramáticos: na maior parte dos países frágeis subsarianos, os níveis de subnutrição são
superiores a 40%, atingindo 68% na Eritreia e 76% na República Democrática do Congo49. O Índice Global da Fome de 2008, um
índice agregado criado pelo Instituto Internacional de Investigação sobre Políticas Alimentares para medir a fome e a má nutrição50,
chama a atenção para uma situação que varia entre alarmante e extremamente alarmante em matéria de segurança alimentar e
nutricional em 25 países da África subsariana, dos quais 16 constam na nossa lista operacional de Estados frágeis. A nível global,
os 10 países cuja insegurança alimentar piorou desde o início da década de 1990 incluem seis países frágeis da África subsariana51
(Burundi, Comores, República Democrática do Congo, Guiné-Bissau, Libéria e Zimbabué). Os dados disponíveis sugerem que a
fragilidade do Estado tende a afectar negativamente a situação de segurança alimentar e nutricional.
47
48
49
50
51
Stewart e Brown 2009.
Drèze e Sen 1989.
FAO 2008.
O IGF combina três indicadores com ponderação idêntica: a proporção de pessoas subalimentadas expressa em percentagem da população, a prevalência
de crianças menores de cinco anos com insuficiência ponderal e a taxa de mortalidade de crianças menores de cinco anos. Os dados do IGF 2008 são relativos
ao período 2001 a 2006 enquanto os dados do IGF 1990 são referentes ao período 1988-1999 (IFPRI 2008).
IFPRI 2008.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 1
Quadro 1.3: Índices de segurança alimentar dos países frágeis
Prevalência
de subnutrição,
percentagem(1)
Disponibilidade dos
bens alimentares
Kcal/pessoa/dia)(2)
Índice de Produção
de Bens Alimentares(3)
Angola
46
1 880
116
Burundi
63
1 630
98
Camarões
23
2 230
101
República Centro-Africana
43
1 900
103
País
Chade
39
1 980
101
Comores
…
1 800
95
Congo (República Democrática do)
76
1 500
90
Congo (República do)
22
2 330
99
Costa do Marfim
14
2 520
96
Jibuti
…
2 170
118
Guiné Equatorial
…
…
…
Eritreia
68
1 530
73
Etiópia
46
1 810
103
Gâmbia
30
2 140
77
Guiné
17
2 540
106
Guiné-Bissau
…
2 050
94
Quénia
32
2 040
102
Libéria
40
2 010
85
Mauritânia
8
2 790
98
Níger
29
2 140
97
Nigéria
9
2 600
96
Ruanda
40
1 940
108
São Tomé e Príncipe
…
2 600
99
Serra Leoa
47
1 910
101
Somália
…
…
…
Sudão
21
2 290
100
Togo
37
2 020
97
Uganda
15
2 380
98
Zimbabué
40
2 040
84
África subsariana
30
2 212
98
Países frágeis da África subsariana
35
2 097
98
Países não frágeis da África subsariana
23
2 367
98
Notas: … indica dados não disponíveis; (1) dados relativos ao período de 2003-2005; (2) dados em kcal por pessoa por dia e relativos ao
período de 2003-2005; (3) dados relativos ao período de 2002-2004 (média de 1999-2001 igual a 100).
Fonte: Elaboração do RDE com base nas Perspectivas Económicas Africanas da OCDE e da AfDB (2009) e no FAOSTAT.
26
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Fragilidade do Estado na África subsariana: desafios e custos
Violações dos direitos humanos: especial ênfase na violência contra as mulheres. A fragilidade do Estado acarreta pesados
custos, em especial para os sectores mais vulneráveis da sociedade que mais necessitam de protecção social, como as mulheres,
as crianças e os idosos.
Os efeitos sobre o bem-estar das mulheres são uma das manifestações mais emblemáticas dos elevados custos da fragilidade
do Estado. Os Estados frágeis estão mais expostos a conflitos violentos e as consequências não são independentes do género,
embora os números oficiais disponíveis sejam apenas pontuais. Em contextos de fragilidade, o fraco crescimento económico
pressiona as mulheres no sentido de trabalharem longas horas para obterem um rendimento, normalmente no sector informal
e em actividades relacionadas com a agricultura. As indústrias de guerra desenvolvidas com vista ao financiamento de conflitos
podem constituir uma nova fonte de receitas, à semelhança do petróleo, diamantes e outros metais preciosos em Angola,
Congo (Brazzaville), República Democrática do Congo, Libéria, Serra Leoa e Sudão. Mas os progressos económicos para as
mulheres podem ser contrabalançados pelo encerramento de outras indústrias e pelo colapso das estruturas governamentais
e as correspondentes perdas de emprego. Em Angola, Eritreia, Moçambique e Zimbabué, as mulheres perderam os seus antigos
empregos no sector para os homens que regressaram de conflitos. E, durante os conflitos, a ausência dos homens deixa muitas
mulheres com a responsabilidade exclusiva de assegurar o sustento familiar. Por outro lado, muitas delas não podem herdar ou reclamar
a propriedade dos seus falecidos maridos.
No Sudão, onde a guerra tem sido uma constante desde a independência, em 1956, as mulheres e as crianças têm pago um
pesado tributo. A maior parte das pessoas deslocadas e das que vivem em campos para pessoas deslocadas internamente (PDI)
são mulheres e crianças. A maior parte das mulheres sudanesas, em particular no Sul, vive numa situação de extrema pobreza,
com elevadas taxas de iliteracia e acesso limitado a água e a cuidados de saúde. A mortalidade materna está entre as maiores do
mundo, com 1700 em cada 100 000 nascimentos no sul do Sudão e 509 no norte do país. A taxa de iliteracia entre as mulheres do
sul do Sudão é de 90%.
As mulheres têm igualmente sido as vítimas de violência com base no género, como a gravidez forçada devido a violação. No final
de 2005, quando 2,2 milhões de pessoas deslocadas internamente viviam em campos, a situação tornou-se muito insegura para
as mulheres que arriscavam serem violadas sempre que saíam do acampamento em busca de lenha52.
Na República Democrática do Congo, uma das características da guerra tem sido o uso indiscriminado da violação como arma de
guerra. Entre 1998 e 2003, foram denunciados 51 000 casos de violação nas províncias do Sul do Kivu e Kalemie. A organização
humanitária Médicos sem Fronteiras refere que 75% dos casos de violação que trataram a nível mundial ocorreram no leste do
Congo.53 O estigma ligado à violência sexual é muito elevado. As mulheres temem perder qualquer perspectiva de casamento
ou que os maridos as abandonem, caso se dirijam à polícia, e ainda que os seus perpetradores as castiguem por denunciarem os
abusos. A violência sexual generalizada tem graves consequências para a sociedade, a começar pela dignidade e integridade física
e moral das vítimas. A dimensão e a natureza do abuso sexual criaram já um grave problema de saúde pública, com o aumento
do VIH e de outras doenças transmissíveis por via sexual. A falta de infra-estruturas médicas, em especial nas regiões remotas,
agravou o problema.
No Norte do Uganda, de acordo com o relatório Doubly Traumatised da Amnistia Internacional, de 2007, as mulheres e as raparigas
são alvo de violência sexual e com base no género e enfrentam sérias dificuldades para tentar levar os seus perpetradores à justiça54.
O estudo de 2007, efectuado em cinco distritos, revela a discriminação que as mulheres enfrentam quando tentam apresentar queixa
sobre casos de violação, desonra, violência doméstica, ofensas corporais e outras formas de violência55. A Amnistia Internacional
considera que o sistema de justiça actual do Norte do Uganda é muito insuficiente, principalmente para assegurar a protecção das
mulheres e raparigas contra a violência sexual e com base no género.
Como estes exemplos demonstram, os conflitos violentos que marcam os Estados frágeis afectam as mulheres de formas
profundamente diferentes. A violência e as perdas que enfrentam face à comunidade impede-as muitas vezes de exercerem
plenamente a sua cidadania, incapazes de participarem no processo de reconstrução das instituições e de reforma do Estado.
As mulheres podem ser expostas a várias formas de violação dos direitos humanos não só em cenários de conflito como também
quando o sistema de justiça é incapaz de controlar as actividades criminosas e ilícitas. Um estudo recente do GDC das Nações
Unidas revela que um dos custos mais elevados para as mulheres na África Ocidental consiste no tráfico para exploração sexual,
frequentemente associado a pagamento de dívidas56. Em 2006, foram detectadas 570 mulheres da África Ocidental vítimas de
52
53
54
55
56
WILPF 2006.
The Guardian 2007.
Amnistia Internacional 2007.
Amnistia Internacional 2007.
GDC (UNODC) 2009.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 1
exploração sexual em 11 países europeus, por isso “se apenas é detectada uma em cada 30 vítimas, o que é admissível, estaremos
perante um cenário de 17 000 vítimas por ano57”. As tendências de prostituição parecem ter estabilizado com o tempo, embora
com variações em função dos países. O valor do mercado sexual está estimado em cerca de 850 milhões de dólares por ano58.
3.3 A FRAGILIDADE DO ESTADO E OS SEUS CUSTOS PERSISTEM
Os progressos limitados na consecução dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, bem como o aumento das despesas
durante e após um conflito, desde a educação às forças armadas, transmitem uma ideia de custos humanos, sociais e económicos
prolongados. A persistência da fragilidade está relacionada com as características políticas e institucionais profundamente enraizadas
num país. Trinta e cinco países considerados frágeis pelo Banco Mundial em 1979 ainda se encontram em situação de fragilidade,
30 anos mais tarde,59 enquanto que a probabilidade de crescimento sustentado do grupo de países era de apenas 1,85% por ano
entre 1977 e 200460.
Esta tendência é coerente com o que a história nos diz sobre a formação dos Estados; na Europa, foram necessários séculos de
batalhas e profundas alterações a nível económico, social, político e tecnológico. O apoio à construção de um Estado por parte de
agentes externos pode ajudar à sua consolidação, mas o processo continua a ser interno. Nos países onde a formação do Estado
ainda não foi concluída, superar a fragilidade deverá ser uma missão mais morosa e difícil.A persistência da fragilidade do Estado é
também reflectida pela qualidade da governação e pelos progressos decepcionantes na aplicação das normas jurídicas. Uma fraca
governação é um sintoma e um parâmetro de fragilidade do Estado. Os países frágeis possuem um mau desempenho em termos
de indicadores de governação (figura 1.3). Muitos desses países são afectados por uma elevada instabilidade política, corrupção
persistente e confiança reduzida no Estado de Direito. Além disso, os fracos níveis de governação tendem a persistir e a depender
demasiado do percurso seguido: uma eficiência de governação ou um Estado de Direito fracos no ano de 2000 aumentam a
probabilidade de resultados insuficientes em 2008 e muitos países frágeis tinham menor desempenho governativo e um Estado
de direito mais fraco em 2008 do que em 200061.
57
58
59
60
61
GDC (UNODC) 2009, pág. 7.
GDC (UNODC) 2009.
OCDE 2009.
Chauvet e Collier 2008.
Kaufmann et al. 2008.
28
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Fragilidade do Estado na África subsariana: desafios e custos
Figura 1.3: Tendências dos indicadores de governação, países frágeis da África subsariana
ESTABILIDADE POLÍTICA
EFICÁCIA DA GOVERNAÇÃO
0,50
0,50
0,00
-3,00 -2,50 -2,00 -1,50 -1,00 -0,50
0,00
0,00
0,50 1,00 1,50
2,00
-3,50
-3,00 -2,50
-0,50
-1,00
-1,00
0,50
1,00
1,50
2,00
0,50 1,00 1,50
2,00
-1,50
-2,00
-2,00
-2,50
-2,50
-3,00
-3,00
-3,50
-3,50
2000
2000
2000
2000
ESTADO DE DIREITO
CORRUPÇÃO
0,50
0,50
0,00
0,00
-3,00 -2,50 -2,00 -1,50 -1,00 -0,50
0,00 0,50 1,00 1,50
2,00
-3,50
-3,00 -2,50 -2,00 -1,50 -1,00 -0,50
0,00
-0,50
-0,50
-1,00
-1,00
2008
2008
2008
2008
0,00
-0,50
-1,50
-3,50
-2,00 -1,50 -1,00 -0,50
2008
2008
2008
2008
-3,50
-1,50
-2,00
-1,50
-2,00
-2,50
-2,50
-3,00
-3,00
-3,50
-3,50
2000
2000
2000
2000
Nota: Os indicadores de governação são medidos em unidades que variam aproximadamente entre -2,5 e 2,5 com os valores mais elevados a
corresponderem a melhores resultados de governação. Estabilidade política mede as percepções da probabilidade de o governo ser destabilizado
ou destituído por meios violentos ou inconstitucionais; eficácia da governação mede a qualidade dos serviços públicos, a qualidade do serviço
civil e o seu grau de independência face a pressões políticas, a qualidade das políticas formuladas e implementadas e a credibilidade do empenho
do governo nessas políticas; Estado de Direito mede o grau de confiança e observância das regras de sociedade pelos agentes, em particular
a qualidade da execução de contratos, a polícia e os tribunais, bem como a probabilidade de crime e violência; corrupção mede a extensão do
exercício do poder público para a obtenção de ganhos privados, incluindo formas de corrupção insignificantes e substanciais, bem como a
“captura” do Estado pelas elites e pelos interesses privados.
Fonte: Kaufmann, Kraay e Mastruzzi, 2008.
As consequências da fragilidade do Estado para a governação podem ser a criação de forças que se oponham à saída da situação
de fragilidade. A degradação dos controlos e equilíbrios pode dar origem a novos interesses contrários ao bem-estar social. Esses
interesses tentam defender e reproduzir as possibilidades de corrupção, interferência política e as actividades destinadas a maximizar
o lucro, enfraquecendo ainda mais a responsabilização do Estado. E, nos regimes autoritários, o Estado pode transformar-se num
veículo para o enriquecimento pessoal. Embora estes cenários possam ser intrinsecamente instáveis, uma vez que as tentativas de
distribuição de cargos públicos para aliados (“spoils”) podem resultar em mudanças violentas de governo, as dinâmicas predatórias
subjacentes serão provavelmente as mesmas62.
62
GDC (UNODC) 2009, pág. 67.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 1
3.4 OS PAÍSES FRÁGEIS SÃO “MAUS VIZINHOS”
Os custos da fragilidade parecem igualmente não respeitar as fronteiras nacionais. Cerca de 80% dos custos da fragilidade, em
termos de renúncia ao crescimento económico, são suportados pelos países vizinhos, os quais sofrem um efeito significativo de
má vizinhança, com uma perda de crescimento de cerca de 0,6% anual por cada país vizinho. Assim, com 3,5 vizinhos por país em
média, as perdas decorrentes do efeito de má vizinhança podem totalizar cerca de 237 milhões de dólares anuais63.
Os países frágeis exercem uma influência adversa nos seus vizinhos através de outros canais. A fragilidade não parece ser contagiosa,
mas origina efeitos transfronteiriços adversos, como a propagação de instabilidade política64. Não existem indicações de que a
fragilidade conduza a um aumento sistemático da probabilidade de os países vizinhos se envolverem num conflito civil ou numa
guerra entre países65. Mas existem casos conhecidos onde ocorreu um efeito semelhante, por exemplo, o governo liberiano de
Charles Taylor, que forneceu mercenários, dinheiro, armas e infra-estruturas a grupos de rebeldes da Serra Leoa, na esperança de
obter o controlo das redes económicas e das minas de diamantes da região.
A difusão do risco de instabilidade e conflito violento através das fronteiras é instigada por extensos mercados regionais de
armamento em África66. A porosidade das fronteiras nacionais africanas facilita o movimento de armas e munições entre os países,
pelo que a oferta pode facilmente responder à distribuição geográfica da procura67.
Outros efeitos da má vizinhança resultam de movimentos transfronteiriços de refugiados, na sua maioria para países vizinhos,
impondo custos significativos aos países de destino68. Os movimentos de refugiados contribuem para a propagação da malária
nos países da África subsariana69. E os refugiados que se deslocam do Ruanda e do Burundi para a região de Kagera, no noroeste
da Tanzânia representam uma factura pesada em matéria de saúde e escolaridade70.
Os movimentos de refugiados em massa também podem destabilizar os países vizinhos71. E como foi possível constatar com a
recente onda de violência na região dos Grandes Lagos, os campos de refugiados podem ser um local de organização de grupos
violentos. As pessoas deslocadas internamente e os refugiados da África subsariana são quase exclusivamente originários dos
países da região (ver quadro 1.2).
Outros fluxos ilícitos, atraídos por países com controlo limitado do território e um Estado de Direito fraco, podem igualmente
ameaçar a estabilidade de países vizinhos, nomeadamente aqueles com capacidade insuficiente para aplicar a lei. A Guiné-Bissau
é o centro de trânsito de cocaína proveniente da América do Sul com destino à Europa, o que tem implicações humanitárias e de
segurança consideráveis72. Na Décima Primeira Reunião de Alto de Nível de Chefes das Missões de Paz das Nações Unidas, que
teve lugar em 4 de Novembro de 2007 em Dakar, na África Ocidental, os Chefes das Missões Paz na África Ocidental em 2007
expressaram “preocupação acerca do aumento alarmante de tráfico de drogas e da ameaça que representa para a estabilidade
do país e da sub-região em geral.”
3.5 OS PAÍSES FRÁGEIS SÃO FONTES DE AMEAÇAS GLOBAIS
Os efeitos adversos da fragilidade podem atingir proporções globais. Com efeito, o conceito de fragilidade do Estado emergiu no
cenário do desenvolvimento numa altura de preocupação acrescida com as ameaças de seguranças globais devido à inexistência
ou fragilidade das estruturas de Estado.
Todavia, a existência de uma relação causal entre fragilidade do Estado e ameaças transnacionais, como o terrorismo, tem sido
frequentemente contestada73. A relação entre fragilidade e terrorismo na África subsariana permanece controversa. Nem todos os
países frágeis subsarianos são afligidos pelo terrorismo, pelo menos por um terrorismo com objectivos e alcance transnacional. Os
grupos de terroristas também emergiram de, e operam em, países com Estados fortes e estáveis e vários sistemas de governação.
Além disso, os países frágeis podem ter uma importância menor para os terroristas transnacionais, tendo em conta que estes estão
espalhados por redes mais globais com células autónomas em dezenas de países, pobres e ricos74.
63
64
65
66
67
68
69
70
71
72
73
74
Chauvet et al. 2007.
Iqbal e Starr 2008.
Iqbal e Starr 2008.
Lambach 2004; Studdard 2004.
Killicoat 2007b.
ACNUR 2009.
Montalvo e Reynal-Querol 2007.
Baez 2008.
Mandel 1997.
GDC (UNODC) 2007.
Chandler (2006) argumenta que “a ideia de Estados frágeis como ameaça de segurança é [...] exagerada,” e Hehir (2007), Patrick (2007), Newman (2007) e
Stewart (2007) utilizam padrões de argumentação idênticos.
Ver, por exemplo, Korteweg 2008; Takeyh e Gvosdev 2002.
30
Fragilidade do Estado na África subsariana: desafios e custos
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
O ressurgimento da pirataria no Golfo de Aden é descrito como exemplo típico das ameaças transnacionais da fragilidade75. A
Resolução do Parlamento Europeu de 23 de Outubro de 2008 sobre a pirataria no mar salienta o carácter urgente desta ameaça
e a resposta militar da UE no Corno de África, através da missão Atalanta, reforça essa importância. A ligação entre fragilidade
e pirataria é intuitiva, já que as condições de fragilidade que favorecem a pirataria e o assalto à mão armada continuam pouco
investigadas76. A Pirataria no Golfo de Aden revela também as limitações da representação dessas ameaças como resultantes
exclusivamente da fragilidade. Existiram factores externos cruciais para o ressurgimento inicial da pirataria77, dado que “traineiras
de pesca estrangeiras se deslocaram agressivamente para as águas ricas e sem patrulhamento da Somália, à custa das aldeias
piscatórias costeiras”, após a queda de Siad Biarre, em 199178. A revolta dos pescadores somalis contra as traineiras estrangeiras,
bem como contra a alegada descarga de resíduos tóxicos nas suas águas79, é insuficiente para explicar o aumento súbito da
pirataria80. Sugere, no entanto, que alguns dos custos mais abrangentes da fragilidade podem ter origem em oportunidades de
lucro aproveitadas por agentes externos.
Apesar dos contrastes da relação causal, a distribuição da ajuda dos doadores CAD sugere que a segurança é um dos principais
critérios de atribuição. Os quatro países frágeis que receberam mais fluxos de ajuda em 2007 constituíam uma preocupação premente
em matéria de segurança – Afeganistão e Iraque – ou tinham uma grande importância em regiões muito instáveis – Paquistão e
Etiópia. Estes quatro países absorveram metade da ajuda canalizada para países frágeis81.
3.6 OS PAÍSES FRÁGEIS SÃO TERRENO FÉRTIL PARA O CRIME ORGANIZADO E O TRÁFICO ILÍCITO
Como já foi mencionado, o crime organizado floresce nos países frágeis, tendendo a emergir quando as instituições do Estado são
fracas. Algumas actividades têm um elevado valor acrescentado, por exemplo, o roubo de petróleo ou o tráfico de drogas. Outras
actividades comuns são o contrabando de tabaco, a contrafacção (em especial, comprimidos conta a malária), a fraude financeira,
o crime de alta tecnologia, o comércio de armamento, a exploração sexual organizada e o branqueamento de capitais. O elevado
valor monetário dessas actividades atenua a ameaça. No caso da cocaína, a maior parte das mais-valias são realizadas fora do
país (ou da região) onde esta é cultivada e comercializada. São traficadas anualmente cerca de 250 toneladas de cocaína da África
Ocidental para a Europa, com um valor de cerca de 11 mil milhões de dólares, se tiverem chegado ao mercado grossista82. No que
respeita ao petróleo roubado e ao tabaco de contrafacção, uma grande parte do dinheiro permanece no país (ou região). Deste
modo, embora o negócio da cocaína imponha custos globais, o impacto do petróleo e do tabaco será mais concentrado a nível
local. O impacto ambiental do petróleo roubado coloca riscos para a saúde e degrada a qualidade de vida nos países em torno
do Delta do Níger. O tráfico ilegal de medicamentos de contrafacção é considerável e envolve em especial os países onde muitas
pessoas são afectadas pela malária e pela SIDA, bem como os países vizinhos. A inexistência de punição para esses crimes constitui
um sintoma de debilidade das instituições do Estado que torna possível a especulação com a saúde das pessoas.
O risco de proliferação de tecnologias de ponta em matéria de armamento, como as armas nucleares, químicas e biológicas ou
veículos lançadores de satélites, é reduzido83. Mas a proliferação de armas ligeiras e outras armas tácticas pode afectar a segurança
regional. As ligações são claras: os grupos que visam desafiar o Estado são os principais clientes de armas ligeiras. Entre 1998
e 2004, foram apreendidas ou recolhidas mais de 200 000 armas ligeiras na região (África Ocidental), das quais pelo menos
70 000 foram posteriormente destruídas. Embora impressionantes, estes números são escassos em comparação com o número
estimado de armas ligeiras na África Ocidental (entre 7 e 10 milhões)84.
75
76
77
78
79
80
81
82
83
84
A incapacidade do Governo Federal Transitório da Somália para patrulhar as águas pertencentes à sua Zona Económica Exclusiva levou o Conselho de
Segurança das Nações Unidas a adoptar a Resolução 1816, que autoriza navios estrangeiros a combater os piratas em águas somalis (Guilfoyle 2008).
Nincic 2008.
Menkhaus 2009, pág. 22.
O relatório da FAO (2009) sugere que “700 navios estrangeiros dedicam-se exclusivamente à pesca ilegal em águas somalis”.
Hansen 2008.
Menkhaus (2009) defende que “a pirataria somali é um caso típico de transformação dos motivos de um grupo armado de revolta em ganância.
OCDE 2009.
GDC (UNODC) 2009.
Stewart 2007.
GDC (UNODC) 2009, pág. 54.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 2
CAPÍTULO 2
CARACTERÍSTICAS DOS ESTADOS FRÁGEIS
Existe um consenso alargado quanto à relação da fragilidade do Estado com o fraco desempenho das
instituições do Estado na prestação de serviços básicos, devido à falta de capacidade para cumprir as
funções básicas do Estado ou para atribuir as prioridades devidas.
Os países da África subsariana cujas instituições do Estado são frágeis apresentam conjuntos de características sociais, estruturais
e económicas marcadamente diferentes. Essa heterogeneidade não surpreende, uma vez que cada país teve a sua própria
experiência de percurso socioeconómico e histórico. Embora algumas causas profundas subjacentes possam ser comuns, como
o processo de formação de Estados coloniais (ver capítulo 3), as causas da fragilidade são específicas de cada país.
Não existe consenso quanto a uma lista de países frágeis. A seguir, conforme mencionado no capítulo 1, utilizamos para fins
operacionais a lista de países numa situação de fragilidade adoptada pela OCDE (2009), limitando a análise aos países da África
subsariana. A lista é o resultado de “uma compilação de três listas: os dois últimos quintos da avaliação CPIA de 2007; o índice
de debilidade do Estado nos países em desenvolvimento, elaborado por Brookings e o índice (CFIP) 2007 [...] da Universidade de
Carleton [...]. [Esta lista] representa uma alteração aos Relatórios de 2005, 2006 e 2007. [...] Os outros dois índices que reflectem
a definição CAD de fragilidade e conflito (consideração da capacidade e da legitimidade do Estado e inclusão da dimensão da
segurança) visam tornar a lista mais sólida.1”
A lista contém mais cinco países da África subsariana, Etiópia, Guiné Equatorial, Quénia, Ruanda e Uganda, não considerados frágeis
anteriormente. A turbulência política que se seguiu às eleições presidenciais de 2007, por exemplo, fez com que o Quénia integrasse
este grupo. Outros países são classificados há muito tempo como frágeis segundo a definição do Banco Mundial, criada inicialmente
na década de 1970, enquanto outros, como a Costa do Marfim e o Zimbabué, viram a sua situação alterar-se gradualmente de casos
de sucesso para situações de fragilidade.
1. OS ESTADOS FRÁGEIS PARTILHAM ALGUMAS CARACTERÍSTICAS COMUNS
1.1 A INCAPACIDADE PARA MOBILIZAR RECURSOS INTERNOS E A DEPENDÊNCIA DE RECURSOS
EXTERNOS
Os países frágeis não conseguem mobilizar recursos internos e obter receitas fiscais substanciais através de impostos. As receitas
públicas dos países frágeis da África subsariana deduzidas de subvenções raramente representam mais de 20% do produto interno
bruto desses países (ver quadro 2.1). Apenas 4 países de um total de 29, Angola, República do Congo, São Tomé e Príncipe e Guiné
Equatorial, possuem um rácio elevado de receitas públicas face ao PIB, mas isso deve-se não à sua capacidade de cobrança de
impostos mas sim à sua disponibilidade de recursos naturais, como indica o Quadro 2.7.
1
OCDE 2009, pág. 21. Ver também capítulo 1, nota de rodapé 2.
32
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Características dos Estados frágeis
Quadro 2.1: Fiscalidade, receitas públicas e condições de facilidade para os negócios nos países
frágeis da África subsariana
País
Angola
Burundi
Camarões
República Centro-Africana
Chade
Comores
Congo (República Democrática do)
Congo (República do)
Costa do Marfim
Jibuti
Guiné Equatorial
Eritreia
Etiópia
Gâmbia
Guiné
Guiné-Bissau
Quénia
Libéria
Mauritânia
Níger
Nigéria
Ruanda
São Tomé e Príncipe
Serra Leoa
Somália
Sudão
Togo
Uganda
Zimbabué
Países frágeis da África subsariana
Países não frágeis da África subsariana
África subsariana
Receitas publicas(1)
46,7
18,6
18,8
10,3
20,6
12,7
14,8
42,7
19,2
…
38,3
22,8
12,8
21,4
14,3
14,6
22,2
23,6
…
15,2
16
13,6
40,1
10,8
…
…
17
12,6
6,0
20,2
25,4
24,5
Receitas fiscais(2)
…
…
…
6,0
…
…
6,3
8,5
14,9
…
…
…
10,7
…
…
…
18,3
…
…
…
…
…
…
11,0
…
…
13,9
13,0
…
11,4
22,4
17,7
Classificação das
condições de facilidade
para os negócios (3)
168
177
164
180
175
155
181
178
161
153
167
173
116
130
171
179
82
157
160
172
118
139
176
156
n.c.
147
163
111
158
Notas: ... indica não disponível; n.c. indica não classificado; (1) os dados excluem subvenções, são relativos a 2007 e estão expressos em
percentagem do PIB; (2) receitas fiscais, em percentagem do PIB, refere-se às transferências obrigatórias para o governo central para fins
públicos e os dados são relativos ao último ano disponível; (3) dados relativos a 2009.
Fontes: Perspectivas Económicas Regionais da África Subsariana do FMI (2009a); Indicadores de Desenvolvimento Mundial do Banco
Mundial (2008ª); Classificação das condições de facilidade para os negócios do Banco Mundial (Ease of doing business) (2009).
Gupta e Tareq (2008) argumentam que, embora tenha havido um aumento do rácio das receitas públicas médias face ao PIB nos
países da África subsariana nos últimos 25 anos, esse aumento está, em grande parte, ligado a direitos de exploração ou impostos
sobre os rendimentos das empresas petrolíferas e mineiras, enquanto as receitas provenientes de recursos não naturais têm
crescido cerca de 1% desde 19802. Em alguns países frágeis, a percentagem dos impostos comerciais na totalidade dos impostos
é muito elevada, com valores máximos superiores a 20% em Angola e na Nigéria3. Apenas estão disponíveis dados de receitas
2
3
De acordo com Stümer 2008, a República Democrática do Congo cobrou impostos sobre receitas de 16,4 milhões de dólares no sector extractivo em 2006,
enquanto em 2004 o valor dos minerais foi de cerca de mil milhões de dólares. O Instituto Federal Alemão para as Ciências Geológicas e os Recursos Naturais
considera que foram desviados clandestinamente do país cerca de 1000 milhões de dólares em produtos de base mineiros.
Os dados relativos à percentagem da tributação comercial em relação ao total de impostos apenas estão disponíveis para alguns Estados frágeis: Angola
(22,2%), Quénia (8,0%), Nigéria (22,2%) e Uganda (9,0%). Ver Volkerink 2009.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
33
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 2
fiscais de alguns países: o rácio médio dos impostos face ao PIB dos nove países para os quais existem dados disponíveis cifra-se
em cerca de 11%, com um mínimo de 6% para a RCA e a RDC: com uma base fiscal tão limitada, o mínimo que se pode dizer é que
a disponibilização adequada de bens públicos dificilmente será uma opção.
A insuficiente mobilização dos recursos internos reduz a pressão para uma boa governação, uma despesa pública eficiente e um país
responsável. Além disso, o Estado não é induzido a adoptar políticas orientadas para o desenvolvimento que poderiam consolidar
o sistema económico e aumentar as receitas fiscais4. Um possível motivo para esta situação poderia ser a pequena dimensão das
elites dominantes: quanto menor for a sua dimensão, menores serão os incentivos para disponibilizar bens públicos nacionais e
desenvolver políticas a longo prazo que possam aumentar as perspectivas de crescimento económico5.
As fracas receitas dos países frágeis da África subsariana podem ser identificadas até à sua extroversão ou às suas relações políticas
e económicas no exterior do país (ver capítulo 3). Estes países têm sido historicamente dependentes de fontes externas de receitas,
em especial durante a época colonial, mas também anteriormente. Na maior parte dos países frágeis, o peso combinado das ajudas,
do investimento directo estrangeiro e das remessas constitui uma percentagem importante do PIB, bem acima da média da África
subsariana, mas a composição difere substancialmente entre os países (figura 2.1). A ajuda pública ao desenvolvimento (APD) é o
fluxo principal para a maioria dos países. Burundi, República do Congo, Eritreia, Guiné-Bissau, Libéria e Serra Leoa são países que
têm percentagens de ajuda face ao PIB6 próximas ou superiores às das receitas públicas. As remessas desempenham um papel
fundamental, sobretudo na Libéria e no Togo7. Para outros países, como a Guiné Equatorial, Gâmbia, Chade, Mauritânia, São Tomé
e Príncipe e Sudão, as receitas externas são geradas pelas exportações de alguns recursos naturais, como petróleo e minérios, e
pelo investimento directo estrangeiro destinado à obtenção de recursos.
Estas fontes externas reduzem os incentivos aos governos para mobilizar os recursos localmente, através de um sistema de
tributação geral. Para as elites políticas, a tributação poderia dar origem ao efeito (indesejado) de despoletar uma dinâmica
através da qual os cidadãos responsabilizariam o governo pela despesa. A extroversão atenua esta dinâmica.
Figura 2.1: Fluxos externos (média simples entre 2003 e 2007)
Burundi
Burundi
Guiné-Bissau
Guinea-Bissau
SãoTomé
Toméand
e Príncipe
São
Príncipe
República
do Congo
Congo,
Rep. of
Gâmbia
Gambia,
The
SerraLeone
Leoa
Sierra
Mauritânia
Mauritania
Guiné
Equatorial
Equatorial
Guinea
Jibuti
Djibouti
Uganda
Uganda
Ruanda
Rwanda
Eritreia
Eritrea
Etiópia
Ethiopia
Chade
Chad
Níger
Niger
Sudão
Sudan
Togo
Togo
Congo
(Rep.
Dem.
Congo,
Dem.
Rep.do)
of
Guiné
Guinea
Nigéria
Nigeria
Comores
Comoros
Quénia
Kenya
Rep. Centro-Africana
Central
African Republic
Camarões
Cameroon
Angola
Angola
Zimbabué
Zimbabwe
CostaCôte
do Marfim
d’Ivoire
Influxos APD líquidos, todos os doad
Influxos de IDE
Remessas de migrantes
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
Notas: Os dados relativos à Somália não estão disponíveis; os dados relativos às remessas do Zimbabué, Angola, RCA, Chade, Eritreia, Jibuti
e RDC não estão disponíveis; os dados relativos à Libéria não foram incluídos na figura, uma vez que são anómalos.
Fonte: Elaboração do RED com base nas Perspectivas Económicas Africanas 2009 da OCDE e da AfDB (2009)
4
5
6
7
Tilly, 1990.
Adam e O’Connell, 1999.
Em 2007, a ajuda estrangeira representou, em média, 15% do PIB dos países frágeis. No entanto, em vários países, a ajuda representa mais de 20%, reflectindo
uma dependência muito elevada. Os fluxos de ajuda tendem a ser mais voláteis do que as remessas e as receitas internas, o que dificulta o planeamento a
médio prazo e a afectação eficiente das despesas públicas, de acordo com Gupta e Tareq 2008.
De notar que a Libéria não aparece na figura mas as remessas representam mais de 100% do PIB (107% de acordo com um relatório da OCDE e AfDB 2009). De
notar igualmente que é provável que as remessas estejam subestimadas, uma vez que os dados consideram apenas as remessas oficiais. Algumas estimativas
recentes indicam que o valor das remessas informais é muito superior (Banco Mundial 2008b); o relatório African Development Indicators 2007 (Banco Mundial
2008b) conclui que, no Sudão, devem representar 85% das remessas totais.
34
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Características dos Estados frágeis
A principal implicação deste mecanismo de financiamento tem a ver com o facto de os países frágeis dependerem maioritariamente
do sector primário, o que, por seu turno, significa que possuem um cabaz de exportações menos diversificado e são caracterizados
pela escassez de investimentos em infra-estruturas e desenvolvimento humano.
Caixa 2.1: Expansão e quebra do cobre na Zâmbia (Copper boom and bust in Zambia)
Por Elva Bova, Candidata a doutoramento na Escola de Estudos Orientais e Africanos,
Universidade de Londres
Com a China e a Índia a provocarem a explosão da procura de cobre, os preços subiram de 1800 dólares por tonelada métrica
em 2002 para 8000 dólares em 2008. A expansão teve enormes repercussões na economia da Zâmbia, cujas exportações
de cobre constituem mais de 60% das exportações totais. As exportações aumentaram de 61 milhões de dólares em 2002
para 600 milhões de dólares em 2008 e o PIB manteve-se estável numa média de 5,6%, graças também aos fluxos IDE, à
baixa inflação e a fundamentais macroeconómicos sólidos. O preço do cobre caiu em Julho de 2008, atingindo 3000 dólares
por tonelada métrica em Outubro; as exportações caíram para 270 milhões de dólares em Abril de 2009, prevendo-se
um crescimento do PIB inferior a 4% em 20098. O declínio substancial das exportações de cobre provocou uma série de
encerramentos de minas, incluindo duas unidades da mina de Luanshya, a maior mina do país. No total, perderam-se
8000 empregos no sector do cobre em Dezembro de 2008.9
Milhões de dólares americanos
10 000
800
8 000
600
6 000
400
4 000
200
2 000
0
2009m01
2008m09
2008m05
2008m01
2007m05
2007m05
2007m01
2006m09
2006m05
2006m01
2005m09
2005m05
2005m01
2004m09
2004m05
2004m01
2003m09
2003m05
2003m01
2002m09
2002m05
2002m01
0
Dólares americanos por tonelada métrica
Figura da caixa 2.1: Exportações da Zâmbia e preços do cobre (2002-2009)
Fonte: FMI – Estatísticas Financeiras Internacionais e Direction of Trade Statistics
IMPACTO MONETÁRIO
O fenómeno de expansão e quebra ampliou a volatilidade da moeda zambiana, que é essencialmente ditada pelo mercado
e apresenta uma estreita relação com o preço do cobre.
Durante a ascensão, o aumento das receitas das exportações da indústria mineira provocou a valorização da moeda,
exacerbada pelo aumento simultâneo das ajudas, fluxos IDE e portfólio. Entre Julho e Novembro de 2005, o kwacha zambiano
valorizou 30% em termos nominais e este aumento provocou uma quebra de algumas das principais exportações não
tradicionais do país. As exportações mais afectadas foram as de algodão, tabaco e café, que sofreram quebras de lucros
superiores a 30% em apenas um ano de colheitas.10 Com a queda do cobre, a moeda desvalorizou 40% em três meses,
entre Outubro e Dezembro de 2008. A desvalorização deveu-se igualmente a um fluxo de saída substancial do portfólio,
demonstrado pela queda mensal de 5% do índice da bolsa de valores de Lusaca.11 Embora favorecesse a competitividade
das exportações não tradicionais, a desvalorização da moeda provocou o aumento dos preços a nível interno. Dada a
desvalorização da moeda e o aumento global dos preços dos bens alimentares, a inflação no país aumentou de 8,5% em
Janeiro de 2008 para 16% em Dezembro do mesmo ano, graças ao aumento geral sofrido pelos preços dos bens alimentares,
que representam 20% das importações totais do país. O Banco da Zâmbia tentou atenuar a desvalorização através da venda
de divisas. No entanto, a manobra provocou uma redução de 23% nas reservas de divisas e o risco de esgotamento das
reservas tem aumentado.12
8
9
10
11
12
FMI 2009.
Ndulo et al. 2009.
Weeks et al. 2007; Weeks 2008; Fynn e Haggblade 2007; Export Board of Zambia 2007.
Ndulo et al. 2009.
Ndulo et al. 2009.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
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O
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 2
6000
8 000
5000
4000
6 000
3000
4 000
2000
2 000
1000
0
Kwacha zambiano
2009m01
2008m09
2008m05
2008m01
2007m05
2007m05
2007m01
2006m09
2006m05
2006m01
2005m09
2005m05
2005m01
2004m09
2004m05
2004m01
2003m09
2003m05
2003m01
2002m09
2002m05
0
Kwacha zambiano por dólar americano
10 000
2002m01
Dólares americanos por tonelada métrica
Figura da caixa 2.2: Os preços do cobre e o kwacha zambiano (2002-2009)
Preço do cobre
Fonte: MF- Estatísticas Financeiras Internacionais.
IMPACTO FISCAL
As exportações de cobre contribuem pouco para o orçamento de Estado da Zâmbia. Em meados da década de 1990, a empresa
pública Zambia Consolidated Copper Mines (ZCCM) foi privatizada, devido às perdas avultadas que a empresa registava num
período de preços baixos dos produtos de base. Com a reforma da privatização, a indústria foi dividida em seis unidades diferentes
sob controlo e gestão de empresas multinacionais. O governo da Zâmbia manteve entre 15% e 20% em cada unidade, controlados
directamente pela empresa pública ZCCM-International Holding. No entanto, a ZCCM-IH não obteve quaisquer receitas com a
subida do cobre, uma vez que ainda tinha de pagar as dívidas acumuladas desde o início da década de 1990.
Os impostos pagos pelas empresas mineiras eram praticamente insignificantes até 2007. As empresas conseguiam negociar
secretamente acordos muito favoráveis com o governo zambiano (Acordos de Desenvolvimento), que estabeleciam direitos de
exploração reduzidos (0,6% em vez de 3%), impostos mais baixos sobre as exportações (15% em vez de 25%) e um conjunto de
concessões e deduções, como a transição de perdas durante um período de 20 anos (Fraser e Lungu, 2007). Quando os acordos
foram divulgados em 2007, organizações internacionais e ONG locais forçaram o governo a rever o regime fiscal e uma nova
legislação entrou em vigor no final de 2007. No entanto, o aumento esperado de 9% para o orçamento decorrente dos novos
impostos não se concretizou e as receitas fiscais aumentaram apenas 3% em 2008 (Green 2008).
A queda dos preços do cobre em Julho de 2008 reabriu o debate em matéria de impostos sobre a indústria mineira e foram
atribuídas novas concessões às empresas em Janeiro de 2009. Essas concessões eliminam o imposto sobre lucros extraordinários
que devia ter sido pago quando os preços do cobre estavam acima de um nível específico e também permitem às empresas
efectuarem a remissão de 100% de qualquer investimento a título de amortização fiscal no ano em que ocorrem as despesas
(Green 2008).
A quebra do preço do cobre e o consequente encerramento de minas levantaram a questão sobre o aumento da participação
do governo nas minas como forma de ampliar o âmbito da gestão económica em períodos de expansão e quebra. No entanto,
a proposta enfrenta a oposição intransigente das empresas mineiras e do Banco Mundial. Como referiu Obiagel Ezekwesli,
Vice-presidente do Banco Mundial para a África, “a reacção populista seria dizer “vamos ficar com uma participação”,
mas porquê arriscar capital num sector onde o sector privado pode correr riscos? (…) esta é uma indústria que deve ser
administrada pelo sector privado”.13
13
Reuters, 2009
36
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Características dos Estados frágeis
Figura da caixa 2.3: Receitas das minas na Zâmbia (2001-2007)
Mil milhões de kwacha zambianos
10 000
Receitas
8 000
Impostos
6 000
Impostos sobre receitas
do sector mineiro
4 000
2 000
0
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
Fonte: Indicadores de Desenvolvimento Mundial do Banco Mundial e Administração dos Impostos da Zâmbia.
1.2 DEPENDÊNCIA DE PRODUTOS PRIMÁRIOS
A maior parte dos países frágeis é caracterizada, em média, por uma densidade populacional muito baixa: 15 de 29 países têm
menos de 40 habitantes por quilómetro quadrado, enquanto a densidade populacional nos países não frágeis se situa em cerca
de 84. Além disso, a maioria da população desses países vive em zonas rurais – no Burundi, cerca de 90% (ver quadro 2.6). Esta
proporção implica uma elevada taxa de emprego no sector agrícola.
A percentagem da agricultura no PIB é significativa, nomeadamente nos países frágeis não dotados de recursos naturais (ver
figura 2.2)14. Além disso, a contribuição dos produtos agrícolas para as exportações é significativa e a agricultura ainda é a principal
fonte de receitas de exportação para países como o Burundi, a Etiópia, a Gâmbia e a Serra Leoa.
Figura 2.2: Percentagens da agricultura, indústria e serviços no PIB, 2006
Angola
Zimbabué
Burundi
Uganda
Camarões
Togo
República Centro-Africana
Sudão
Chade
Serra
Leoa
São Tomé eComoros
Príncipe
Ruanda
Congo (Rep. Dem.
do)
Nigeria
Congo (Rep.
do)
Níger
Costa do Marfi
m
Mauritânia
Jjibouti
Libéria
Guiné Equatorial
Quénia
Eritreia
Guiné-Bissau
Etiópia
Guiné
Gâmbia
Gâmbia
Guiné
Etiópia
Guiné-Bissau
Eritreia
Kenya
Guiné Equatorial
Libéria
Jibouti
Mauritânia
Costa do Marfim
Niger
Congo, Nigéria
Rep. do
Congo, Rep. Dem.
do
Ruanda
Comores
São Tomé e Príncipe
SerraChade
Leoa
República Centro Africana
Sudan
Camarões
Togo
Burundi
Uganda
Angola
Zimbabué
0%
10 %
20 %
30 %
40 %
50 %
60 %
70 %
Agricultura
80 %
90 %
Indústria
100 %
Serviços
Fonte: Indicadores de Desenvolvimento Mundial 2008 do Banco Mundial (2008a).
14
De notar que os rendimentos agrícolas são difíceis de tributar. Ver Volkerink 2009.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
37
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 2
A agricultura dos países da África subsariana é afectada pela baixa produtividade, tecnologia rudimentar, pequena exploração
e dificuldade em penetrar nos mercados. Além disso, a falta de informação, o amplo poder de mercado de alguns agentes e os
mercados incompletos expõem os países frágeis às falhas do mercado15.
De acordo com Ng e Aksoy (2008), a maior parte dos países da África subsariana não importa produtos alimentares (quadro 2.2).
Apenas cinco países frágeis (Camarões, Costa do Marfim, Quénia, Somália e Sudão) pertencem a este grupo e padecem de uma
elevada prevalência de subnutrição16. Além disso, muitos deles são importadores líquidos de petróleo.
Quadro 2.2: Lista de países da África subsariana importadores e exportadores
de produtos alimentares
Importadores de bens alimentares(1)
Angola
Libéria
Benim
Malávi
Burundi
Mali
Cabo Verde
Mauritânia
República Centro-Africana
Maurícias
Chade
Moçambique
Comores
Níger
Congo (República
Nigéria
Democrática do)
Congo (República do)
Ruanda
Guiné Equatorial
São Tomé e Príncipe
Eritreia
Senegal
Etiópia
Seicheles
Gabão
Serra Leoa
Gâmbia
Tanzânia
Gana
Togo
Guiné
Uganda
Guiné-Bissau
Zimbabué
Lesoto
Exportadores de bens alimentares
Botswana
Burkina Faso
Camarões
Costa do Marfim
Quénia
Madagáscar
Namíbia
Somália
África do Sul
Sudão
Suazilândia
Zâmbia
Notas: os países pertencentes à definição operacional de países
frágeis estão em negrito; (1) Bens alimentares são definidos como
matérias-primas na SITC Rev. 2, com excepção de todas as culturas de
rendimento, bens alimentares transformados e produtos do mar; um
país é considerado importador se a diferença entre as exportações e as
importações for negativa face à média de 2004/2005.
Fonte: Elaboração do ERD com base em Ng e Aksoy (2008).
A dependência da importação de produtos alimentares, não correspondida por exportações de produtos não agrícolas menos
voláteis (como produtos manufacturados), é um factor estrutural que pode aumentar a vulnerabilidade dos países da África
subsariana17. Esta constatação é particularmente verdadeira quando os preços dos produtos alimentares estão mais altos, como
aconteceu durante o mês de Junho de 2008. De facto, embora não existam previsões sistemáticas do impacto do aumento dos
15
16
17
PAM 2009.
A subnutrição nos Estados frágeis da África subsariana aflige 35% da população e, nos Estados não frágeis, 23%. Ver quadro 1.3 do Capítulo 1.
Sarris e Rapsomanikis 2009.
38
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Características dos Estados frágeis
preços dos produtos alimentares nos países frágeis18, as primeiras indicações sugerem que se encontram entre os mais afectados.
A maior parte dos países identificados no último State of World Food Security (situação da segurança alimentar) como países com
risco de deterioração da segurança alimentar devido aos preços elevados dos produtos alimentares são países frágeis da África
subsariana (19 dos 26 países da África subsariana)19. Em Julho de 2009, 18 dos 30 países que atravessavam uma crise alimentar e
necessitavam de ajuda externa da FAO eram países frágeis da África subsariana20.
No que respeita a alguns produtos alimentares, como lacticínios, cerais e hidrocarbonetos, os preços dispararam21 e mesmo
quando começaram a descer mantiveram-se substancialmente acima de valores históricos. Esta tendência implicou facturas de
importação mais pesadas, agravou consideravelmente o défice das contas correntes e afectou inclusivamente factores como a taxa
de câmbio, as reservas do banco nacional e o nível de endividamento externo22. O pico dos preços dos produtos primários de base
que, em conjunto com a descida do preço unitário dos produtos manufacturados, conduziu a um melhoramento das condições
de comercialização dos produtos alimentares após uma longa tendência de descida comum à maior parte dos produtos de base,
foi, contudo, acompanhado de maior incerteza e de uma elevada volatilidade da taxa de câmbio, o que limitou as oportunidades
dos produtores acederem aos mercados de crédito e ao investimento em tecnologias.
O desenvolvimento dos preços dos produtos alimentares afectou de forma diferente as famílias pobres das zonas urbanas e rurais,
dependendo do acesso aos mercados e da disponibilidade de tecnologia e de capital. As famílias sem terra e as lideradas por
mulheres são mais afectadas pelo aumento dos preços dos produtos alimentares. Um aumento de 50% no preço do milho no Malávi,
na Zâmbia e no Uganda aumenta o número de famílias com insegurança alimentar, em média, em cerca de 5%23. Se os preços dos
produtos alimentares aumentarem 50%, a percentagem da população que vive abaixo do limiar de pobreza aumenta 3,5%24.
Além disso, as condições prévias dos países frágeis colocam-nos em situação de desvantagem. Entre as suas limitações para
enfrentar o aumento dos preços dos produtos alimentares contam-se, por exemplo, a elevada pobreza, uma reduzida capacidade
de consumo uniforme a nível familiar devido aos elevados gastos com a distribuição de alimentos, a pré-existência de níveis
extremos de insegurança alimentar, uma elevada dependência da importação de produtos alimentares e algumas limitações
macroeconómicas na adopção de medidas para estabilizar os preços (baixa disponibilidade de armazéns temporários de produtos
alimentares, escassez de reservas de divisas e pressões adversas sobre as taxas de câmbio).
1.3 EXPORTAÇÕES CONCENTRADAS
O índice de diversificação de exportações dos países frágeis da África subsariana é inferior a metade do índice dos países não frágeis
(ver quadro 2.3), o que revela um elevado grau de concentração das suas exportações.
Com raras excepções, os países frágeis da África subsariana exportam principalmente produtos primários: os produtos primários,
combustíveis e não combustíveis, representavam em média mais de 80% das suas exportações em 2006. Os combustíveis
representavam 26,2% das receitas de exportação, existindo alguns países como Angola, Chade, República do Congo, Guiné
Equatorial e Nigéria onde as receitas dos combustíveis se situaram acima de 90%. Os produtos alimentares básicos, incluídos no
cabaz de produtos de base primários, geram uma percentagem considerável das receitas totais de exportação, cujo valor médio é
de 27%, com picos acima dos 80% para a Gâmbia, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe. Para outros países, como a RDC, a Guiné e a
Serra Leoa, os produtos minerais representam os produtos de base primários exportados. A Eritreia, a Libéria e o Togo constituem
excepções a este cenário, uma vez que as exportações de produtos manufacturados geraram, em 2006, mais de metade das suas
receitas de exportação.
A concentração dos mercados de destino é igualmente elevada: 15 países da África subsariana obtêm mais de metade das suas
receitas de exportação com exportações para uma única área geográfica. Em particular, nove países obtêm mais de 50% das suas
receitas com exportações para a Europa. Para três países, Jibuti, Togo e Zimbabué, predomina o comércio intra-africano, que
representa mais de 50% das exportações totais (ver quadro 2.4).
18
19
20
21
22
23
24
O conjunto da investigação engloba estudos de caso do país e análise global ou regional de choques associados à crise alimentar e ao preço dos alimentos
(Wodon e Zaman 2008; Aksoy e Isik-Dikmelik 2008; Ivanic e Martin 2008; Dessus 2008).
FAO 2008a.
FAO 2009.
De notar que as alterações dos preços a nível mundial nem sempre se repercutem de forma total ou simétrica nos mercados internos, devido a restrições às
exportações, impostos, elevados custos de transporte e margens de comercialização elevadas. Para uma avaliação do efeito sobre os preços a nível interno,
a altura em que essas alterações se repercutem é igualmente relevante. Em alguns casos existe apenas uma divergência mínima entre os preços internos e
os preços a nível mundial, mas, na maior parte dos casos, a oportunidade de lucro persiste durante um período de tempo longo, com consequências muito
mais negativas.
FAO 2008b.
Sarris e Rapsomanikis, 2009.
Wodon e Zaman, 2008.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
39
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 2
Quadro 2.3: Concentração das exportações nos países frágeis
Índice
de diversificação das
exportações(1)
Exportações (% do
PIB)(2)
Produtos
de base
primários,
excepto
combustíveis(3)
Angola
1,1
72,7
2,0
Burundi
2,6
9,6
País
Bens alimentares,
essenciais(5)
Metais(6)
Produtos
manufacturados(7)
97,5
0,1
1,8
0,4
97,0
0,0
42,0
50,8
2,9
Combustíveis(4)
Camarões
3,3
24,7
33,2
61,6
11,6
4,9
3,0
República Centro-Africana
5,5
13,6
95,5
0,2
1,1
60,7
1,7
Chade
1,1
12,8
4,5
94,6
0,0
0,0
0,6
Comores
4,9
15,2
…
…
…
…
…
Congo (República Democrática
do)
7,6
80,7
83,4
12,6
1,4
73,0
2,7
Congo (República do)
1,4
34,3
7,6
90,3
0,2
4,2
0,6
Costa do Marfim
7,7
49,0
43,5
36,9
34,6
0,5
19,4
Jibuti
5,9
…
16,9
0,7
11,6
2,7
15,1
Guiné Equatorial
1,3
88,6
1,4
94,5
0,0
0,0
3,7
Eritreia
2,1
6,4
43,6
0,0
27,5
6,2
52,0
Etiópia
4,7
14,2
93,9
0,0
70,5
6,8
6,0
Gâmbia
6,6
44,2
85,9
0,0
80,7
0,9
14,1
Guiné
3,2
30,1
89,4
5,5
8,8
78,0
3,1
Guiné-Bissau
1,2
27,9
82,3
0,5
80,0
0,6
17,0
Quénia
21,9
25,9
57,3
7,3
38,8
2,8
35,4
Libéria
3,5
34,2
15,8
14,6
0,4
0,7
69,1
Mauritânia
3,9
…
93,1
…
28,3
64,7
0,0
Níger
1,4
17,4
87,4
1,5
22,6
60,1
9,8
Nigéria
1,3
43,4
3,6
95,0
1,5
0,3
0,8
Ruanda
4,1
9,6
92,3
0,7
54,7
34,0
6,5
São Tomé e Príncipe
3,9
13,3
95,1
0,0
91,7
0,0
4,9
Serra Leoa
7,3
23,2
90,4
0,1
9,1
80,4
7,3
Somália
6,6
…
86,4
0,2
55,0
10,3
9,1
Sudão
1,2
…
10,8
87,5
5,4
3,1
1,2
Togo
9,3
41,9
45,5
0,8
20,1
11,2
51,1
Uganda
10,4
14,1
77,1
4,4
50,3
15,0
18,5
Zimbabué
10,8
31,1
69,8
1,1
8,4
29,5
29,1
África subsariana
7,4
36,1
58,5
22,6
23,8
24,1
18,9
Países frágeis da África subsariana
5,0
31,1
57,3
26,2
27,0
21,5
13,8
Países não frágeis da África
subsariana
11,1
40,3
60,2
13,3
19,0
26,6
26,4
Notas: (1) dados relativos ao ano de 2007 e classificados de 0 a 100; (2) as exportações obtidas são a média aritmética dos fluxos de exportação
entre 2003 e 2007; (3) dados expressos em percentagem das exportações totais de mercadorias e relativos a 2006, produtos de base primários
inclui as classificações SITC 0, 1, 2, 4, 68, 667, 971; (4) dados expressos em percentagem das exportações totais de mercadorias e relativos
a 2006, combustíveis corresponde à classificação SITC 3; (5) dados expressos em percentagem das exportações totais de mercadorias e
relativos a 2006, bens alimentares essenciais inclui as classificações SITC 0, 22, 4; (6) dados expressos em percentagem das exportações
totais de mercadorias e relativos a 2006, metais, pedras preciosas e ouro não monetário incluem as classificações SITC 27, 28, 68, 667,
971; (7) dados expressos em percentagem das exportações totais de mercadorias e relativos a 2006, produtos manufacturados inclui as
classificações SITC 5 a 8, excepto 667 e 68.
Fonte: Elaboração do ERD com base nos Indicadores de Desenvolvimento Mundial 2008 do Banco Mundial (2008a); Perspectivas Económicas
Africanas 2009 da OCDE e AfDB (2009), UNCTAD, Manual de Estatística, base de dados online.
40
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Características dos Estados frágeis
Os produtos exportados pelos países frágeis para fora de África, principalmente combustíveis25, diferem dos que são exportados
no interior da região, os quais incluem também produtos manufacturados. Por esse motivo, as suas exportações em África são
mais diversificadas do que as exportações para o resto do mundo. Assim, a expansão do comércio intra-africano poderia reduzir
o impacto da volatilidade dos preços dos produtos de base e, consequentemente, a vulnerabilidade dos países frágeis a choques
relacionados com o comércio.
A relação entre a fragilidade do Estado e a concentração das exportações pode ser explicada pela disponibilidade de recursos: a sua
abundância pode redefinir os interesses e comportamentos de um governo em exercício, induzindo uma excessiva dependência
dos recursos naturais, limitando a expansão do sector produtivo e degradando a governação26. Chauvet e Collier (2008) consideram
que as cedências dos recursos reduzem significativamente as possibilidades de obtenção de uma recuperação sustentada de uma
situação de fragilidade de Estado. A duplicação das cedências dos recursos em termos de percentagem do PIB não compensa o
tempo dispendido. Além disso, devido à pouca diversificação das exportações, os Estados frágeis podem ser propensos à “Doença
Holandesa” (Dutch disease), que ocorre quando a taxa de câmbio valoriza como consequência de fluxos de capitais, tornando as
exportações menos competitivas.
Quadro 2.4: Destinos, percentagem e média das exportações dos países frágeis, 2004-2006
País
Angola
Burundi
Camarões
República Centro-Africana
Chade
Comores
Congo (Rep. do)
Congo (Rep. Dem. do)
Costa do Marfim
Jibuti
Guiné Equatorial
Etiópia
Gâmbia
Guiné
Guiné-Bissau
Quénia
Libéria
Mauritânia
Níger
Nigéria
Ruanda
São Tomé e Príncipe
Serra Leoa
Somália
Sudão
Togo
Uganda
Zimbabué
África
1,7
15,2
9,5
7,1
0,6
1,6
2,5
6,8
28,9
87,4
0,2
9,7
9,9
1,9
17,5
42,7
5,4
16,8
27,4
9,0
2,8
4,2
2,7
5,0
3,3
64,1
20,8
56,9
Ásia Oriental,
Sul da Ásia e
Sudeste asiático
41,0
10,2
14,1
14,1
19,3
16,4
61,7
14,1
5,0
2,0
36,2
11,8
47,3
8,6
70,6
10,6
10,9
11,5
0,7
5,0
35,5
7,5
3,4
10,4
61,1
13,8
7,9
9,1
Ásia
Ocidental
0,0
1,2
1,1
5,8
0,0
6,1
0,4
0,0
0,8
7,0
0,2
11,9
0,3
0,0
...
2,3
1,2
0,6
0,1
0,7
0,3
3,0
0,3
83,3
7,1
0,3
4,4
1,5
Economias em
desenvolvimento
- América
Economias
em desenvolvimento - Europa
39,6
0,8
6,5
4,9
75,5
18,3
23,9
10,9
11,9
0,6
30,9
6,9
1,7
6,3
7,9
6,9
9,6
1,5
16,2
49,9
3,2
1,7
10,8
0,2
1,1
0,8
4,4
6,6
11,0
49,1
64,0
66,0
4,5
50,1
8,4
58,9
45,0
2,9
27,4
40,7
38,2
45,4
3,7
29,3
71,9
53,1
45,9
22,1
19,2
79,3
78,1
0,7
3,1
15,5
51,3
23,3
Fonte: UNCTAD, Manual de Estatística, base de dados online.
25
26
Uma vez que a maior parte do petróleo é exportada para fora da região, o comércio intra-africano dos países frágeis exportadores de petróleo é, em média,
inferior à dos exportadores de produtos não petrolíferos.
Para uma análise mais aprofundada destes mecanismos, ver o capítulo 4 e Collier 2009.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
41
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 2
1.4 BAIXO DESENVOLVIMENTO HUMANO
O baixo investimento público no desenvolvimento humano reflecte-se no funcionamento deficiente dos sistemas educativo e de
cuidados de saúde. De facto, embora muitos Estados frágeis tenham reduzido as despesas militares, esta redução não correspondeu
a um aumento da despesa nas áreas da saúde e da educação (ver quadro 2.5).
Quadro 2.5: Despesa pública em percentagem do PIB
Despesas com a saúde(1)
País
1995
2006
Despesas
com a educação(2)
1991
2006
Despesas militares(3)
1990
2006
Angola
3,3
2,3
…
2,6
1,3
3,7
Burundi
1,1
0,7
3,5
5,1
3,4
4,7
Camarões
0,9
1,5
3,2
3,3
1,5
1,4
República Centro-Africana
1,4
1,4
2,2
1,4
1,6
1,1
Chade
2,0
1,3
1,6
1,9
…
0,9
Comores
2,8
1,8
…
3,8
…
…
Congo (República Democrática do)
0,2
1,6
…
…
…
1,9
Congo (República do)
1,8
0,9
7,4
1,8
…
1,2
Costa do Marfim
1,2
0,9
..
4,6
1,3
1,5
Jibuti
4,3
5,1
3,5
8,3
5,9
4,2
Guiné Equatorial
3,3
1,2
…
0,6
…
…
Eritreia
2,6
1,7
…
2,4
…
24,1
Etiópia
2,7
3,0
2,4
5,5
8,5
2,1
Gâmbia
1,7
2,5
3,8
2,0
1,1
0,6
Guiné
0,7
0,7
2,0
1,7
2,4
2,0
Guiné-Bissau
1,6
1,5
…
5,2
…
3,9
Quénia
2,0
2,2
6,7
7,1
2,9
1,6
Libéria
1,4
3,6
…
…
7,2
0,8
Mauritânia
2,0
1,5
4,6
2,9
3,8
3,0
Níger
1,8
2,1
3,3
3,4
..
1,0
Nigéria
1,1
1,2
0,9
…
0,9
0,6
Ruanda
1,6
6,6
…
4,9
3,7
1,9
São Tomé e Príncipe
9,1
9,0
…
…
…
…
Serra Leoa
1,1
1,7
…
3,8
1,4
2,1
Somália
1,2
1,2
…
…
…
…
Sudão
0,5
1,4
6,0
…
3,5
4,4
Togo
1,5
1,5
…
3,6
3,1
1,6
Uganda
1,6
1,9
1,5
5,2
3,0
2,0
Zimbabué
4,5
4,4
7,7
4,6
4,4
1,9
África subsariana
2,0
2,6
4,0
4,4
2,8
2,3
Países frágeis da África subsariana
1,7
2,0
3,8
3,6
3,1
2,9
Países não frágeis da África
subsariana
2,5
3,5
4,3
5,5
2,5
1,5
Fontes: (1) OMS (2008); (2) Instituto de Estatística da UNESCO (2008); (3) SIPRI (2008).
42
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Características dos Estados frágeis
Em consequência, observámos no capítulo 1 que os países frágeis da África subsariana estão atrasados em relação ao resto do
continente, no que respeita à taxa de alfabetização de adultos, que se situa em 59,2% em comparação com 66,4% no resto da
África subsariana (ver quadro 1.1). O fraco registo em matéria de desenvolvimento humano é igualmente confirmado pela taxa
de mortalidade de crianças menores de cinco anos, que se situa em 138 por cada 1000 nascimentos nos países frágeis, um valor
muito superior aos 98 que se registam em média nos restantes países da África subsariana.
O escasso investimento público em cuidados de saúde e na educação não só contribui para o fraco registo em matéria de
desenvolvimento humano como também produz um impacto irregular nos homens e nas mulheres. As desigualdades entre
homens e mulheres nos países frágeis são superiores às existentes nos restantes países da África subsariana, uma vez que a
fragilidade das instituições do Estado pode influenciar negativamente a situação das mulheres. A diferença entre o IDH e o IDG, um
indicador para as desigualdades entre homens e mulheres, é, em média, quase o dobro nos países frágeis da África subsariana em
comparação com os países não frágeis27. A diferença seria provavelmente ainda maior, uma vez que não existem dados para dois
países, Somália e Sudão, que presumivelmente são caracterizados por um fraco registo em matéria de igualdade entre homens
e mulheres. A escassez ou inexistência de financiamento público ao sector da saúde conduz à mortalidade materna, que é muito
superior à dos países não frágeis (ver quadro 1.1). A incapacidade de financiar adequadamente a prestação de serviços sociais atinge
toda a população, agravando simultaneamente as desigualdades entre homens e mulheres.
As taxas de fertilidade nos países frágeis são superiores e diminuem mais lentamente do que nos países não frágeis (ver
quadro 2.6). A taxa de fertilidade é importante porque as famílias com muitos filhos têm provavelmente menos possibilidades de
suportar as despesas de escolaridade. As famílias com menos filhos, por outro lado, estarão em melhor situação para lhes oferecer
uma educação melhor.
27
Elaboração do RED com base no PDNU (2008).
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
43
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 2
Quadro 2.6: População
Densidade
populaPaís cional (1)
Percentagem
Percende potagem
pulação
de podos 0 aos pulação
(2)
14
rural(2)
Distribuição de jovens mulheres
que deram à luz(4)
Taxa de Taxa de
fertilida- fertilidade total, de total,
média
média
ensino
19752000- sem edu- ensino secundá- ensino
(3)
(3)
80
05
cação
primário
rio
superior
Angola
13
46,5
46,0
7,2
6,7
…
…
…
…
Burundi
318
45,0
89,7
6,8
6,8
…
…
…
…
Camarões
39
41,2
44,5
6,4
5,0
24,5
43,0
32,2
0,3
República Centro-Africana
7
43,0
61,8
5,8
4,9
71,8
21,4
6,6
0,2
Chade
8
47,3
74,2
6,7
6,4
…
…
…
…
Comores
330
42,0
62,3
7,2
4,0
…
…
…
…
Congo (Rep. Dem. do)
27
47,3
67,3
6,6
6,7
…
…
…
…
Congo (República do)
11
47,1
39,4
6,3
5,6
…
…
…
…
Costa do Marfim
59
41,9
54,6
7,4
5,0
…
…
…
…
Jibuti
35
…
…
…
…
…
…
…
…
Guiné Equatorial
18
44,4
60,9
5,7
5,9
…
…
…
…
Eritreia
46
44,8
80,2
6,5
5,5
…
…
…
…
Etiópia
77
44,5
83,7
6,3
5,5
73,6
20,4
5,6
0,3
Gâmbia
166
40,1
45,3
6,5
4,7
…
…
…
…
Guiné
37
43,7
66,5
6,9
5,7
79,4
12,3
8,0
0,2
Guiné-Bissau
59
47,5
70,3
7,1
7,1
…
…
…
…
Quénia
64
42,8
79,0
7,5
5,0
10,3
70,2
18,3
1,2
Libéria
37
47,1
41,2
6,9
6,8
…
…
…
…
Mauritânia
3
43,0
59,4
6,4
5,8
…
…
…
…
Níger
11
49,0
83,0
8,2
7,9
86,9
10,1
3,0
0,0
Nigéria
159
44,3
51,0
6,9
5,7
53,7
21,0
24,0
1,3
Ruanda
384
43,5
79,8
8,5
5,9
24,4
69,9
5,4
0,3
São Tomé e Príncipe
162
39,5
41,2
6,4
4,0
…
…
…
…
Serra Leoa
80
42,8
58,6
6,5
6,5
…
…
…
…
Somália
13
44,1
64,3
7,2
6,4
…
…
…
…
Sudão
16
39,2
58,3
6,5
4,4
…
…
…
…
Togo
118
43,5
59,2
7,0
5,3
…
…
…
…
Uganda
152
50,5
87,3
7,1
7,1
12,1
68,0
18,0
1,9
Zimbabué
34
40,0
63,6
7,1
3,6
…
…
…
…
África subsariana
87
43,0
62,1
6,6
5,2
Países frágeis da África
subsariana
86
44,1
63,3
6,8
5,7
Países não frágeis da África
subsariana
84
41,1
60,2
6,3
4,5
Notas: … indica dados não disponíveis; (1) indivíduos por quilómetro quadrado, dados relativos a 2006; (2) dados relativos a 2006; (4) ultimo
ano disponível.
Fontes: (1),(2) e (3) Indicadores de Desenvolvimento Mundial 2008 do Banco Mundial (2008a); (4) Inquérito Demográfico e de Saúde do Banco
Mundial, vários anos e países.
44
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Características dos Estados frágeis
1.5 INFRAESTRUTURAS MATERIAIS E IMATERIAIS FRACAS
A existência de infra-estruturas físicas pouco desenvolvidas é outra característica comum dos países frágeis da África subsariana.
Os países frágeis possuem apenas 8 metros de estradas pavimentadas por quilómetro quadrado e os países não frágeis 18
(quadro 2.7).
Quadro 2.7: Infra-estruturas e características geográficas
Densidade
de estradas
pavimentaPaís
das(1)
Linhas de
telefone
móvel(2)
Rico em
recursos(3)
Percentagem
da população
sem acesso
a recursos
hídricos melhorados(4)
Sem
litoral(5)
Número de
fronteiras
terrestres
Angola
4,3
29,1
sim
49
não
3
Burundi
46,2
2,9
não
29
sim
3
Camarões
10,5
24,5
sim
30
não
6
República Centro-Africana
0,0
3,0
não
34
sim
5
Chade
0,2
8,5
sim
52
sim
5
Comores
361,7
4,8
não
15
não
0
Congo (República Democrática do)
1,2
34,2
não
29
sim
9
Congo (República do)
2,5
10,5
sim
54
não
4
Costa do Marfim
20,1
36,6
sim
19
não
5
Jibuti
…
5,3
não
8
não
3
Guiné Equatorial
0,0
43,4
sim
57
não
2
Eritreia
7,4
1,7
não
40
não
3
Etiópia
4,5
1,5
não
58
sim
5
Gâmbia
64,0
46,8
não
14
não
1
Guiné
17,7
21,3
sim
30
não
6
Guiné-Bissau
26,7
17,5
não
43
não
2
Quénia
15,4
30,2
não
43
não
5
Libéria
5,9
15,0
não
36
não
3
Mauritânia
0,8
41,6
não
40
não
4
Níger
3,0
6,3
não
58
sim
7
Nigéria
31,4
27,3
sim
53
não
3
Ruanda
101,0
6,5
não
35
sim
4
São Tomé e Príncipe
227,0
19,1
sim
14
não
0
Serra Leoa
12,6
13,2
sim
47
não
2
Somália
4,1
6,9
não
71
não
3
Sudão
1,7
21,3
sim
30
não
8
Togo
41,8
18,1
não
41
não
3
Uganda
67,5
13,6
não
36
sim
5
Zimbabué
47,3
9,2
não
19
sim
4
África subsariana
11,4
25,7
Países frágeis da África subsariana
7,8
17,9
Países não frágeis da África
subsariana
18,5
36,9
Notas: … indica dados não disponíveis; (1) Metros de estradas pavimentadas por quilómetro quadrado, dados relativos ao ultimo ano
disponível; (2) número de linhas telefónicas por 1 000 habitantes, dados relativos a 2007; (3) um país é considerado rico em recursos se os
rendimentos dos produtos de base primários (petrolíferos e não petrolíferos) forem superiores a 10% do PIB; (4) dados relativos a 2007;
(5)
classificação do FMI.
Fontes: (1) Indicadores de Desenvolvimento Mundial 2008 do Banco Mundial (2008a); (2),(3) e (5) Perspectivas Económicas Regionais da África
Subsariana 2009 do FMI (2009a); (4) Índices de Desenvolvimento Humano – Uma Actualização Estatística 2008.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
45
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 2
Uma infra-estrutura viária falível28 dificulta as comunicações e os transportes entre o centro e a periferia, acentuando a incidência
urbana na despesa pública, e pode desincentivar a integração regional.
Nos últimos anos, a China tem investido fortemente em infra-estruturas em África, nomeadamente nos países frágeis, com vista a
melhorar a qualidade e o acesso aos recursos naturais. Interligados com os seus programas de ajuda, os projectos de investimento
chineses estão rapidamente a reconstruir portos, barragens e estradas em países saídos de situações de conflito, como Angola e
a RDC29.
Mas, sem investimentos em infra-estruturas imateriais (em políticas e regulamentos, bem como em procedimentos fronteiriços e
administração aduaneira), os custos dos transportes continuarão a constituir um problema para os países frágeis.
Os países frágeis da África subsariana estão também atrasados em matéria de telecomunicações. O número de linhas telefónicas
da rede fixa estagnou nos últimos 10 anos enquanto o número de subscritores de telemóveis registou uma taxa de crescimento
muito elevada. Assim, esses países lideram a mudança das redes fixas para as redes móveis30, uma vez que as linhas da rede móvel
exigem um investimento inicial menor, normalmente suportado por empresas estrangeiras. Apesar destas mudanças, o número
de linhas da rede móvel por 1000 habitantes é metade do dos países não frágeis (ver quadro 2.7) e menos de 3% da população
utiliza a Internet, contra 4,2% no continente africano e 23% em todo o mundo31.
Estas características comuns, tais como incapacidade de mobilizar recursos internos, dependência de recursos externos, baixo
desenvolvimento de capital humano, infra-estruturas débeis e dependência de produtos primários e exportações concentradas,
tornam possível identificar um grupo de países em situação de fragilidade. No entanto, no que respeita a outroas aspectos, as
diferenças entre os países frágeis mantêm-se.
28
29
30
31
Os custos de transporte em África são 136% superiores aos de outras regiões, com uma grande disparidade entre países e produtos. É provável que esta
disparidade seja maior no Uganda, onde “no início da década de 2000 a taxa de tributação efectiva das exportações devido aos custos de transporte era de
40%, […] muito superior à média de 15% dos países APC” (CNUCED 2009, pág. 38).
Ver caixa 6.2 “Estará a China a preencher a lacuna?” no capítulo 6. De acordo com Stümer 2008, “a China irá criar, na RDC, infra-estruturas que incluem 3840
quilómetros de estradas, 3200 quilómetros de vias-férreas, 32 hospitais, 145 centros de saúde e duas universidades no valor total de 6 mil milhões de dólares,
como compensação das importações de cobre e cobalto”, pág. 2.
Ver União Internacional das Telecomunicações, 2009. De notar que a Nigéria liderou o aumento no sector das comunicações móveis, com 11 milhões de
linhas, mas o Quénia e a Costa do Marfim tiveram igualmente uma contribuição significativa.
Ver União Internacional das Telecomunicações, 2009.
46
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Características dos Estados frágeis
2. OS PAÍSES FRÁGEIS APRESENTAM MUITOS ELEMENTOS DE HETEROGENEIDADE
Durante o recente período de crescimento sustentável na África subsariana, Angola registou uma taxa
de crescimento de dois dígitos e o Zimbabué contraiu. Mas o Zimbabué possui níveis de escolaridade
mais elevados e uma taxa de mortalidade infantil baixa, ao contrário de Angola, com menores níveis de
escolaridade e uma taxa de mortalidade infantil elevada (ver quadro 1.1).
Vários indicadores apontam as diferenças entre os países frágeis. As taxas de crescimento económico, por exemplo, cresceram em
todo o continente a partir de meados da década de 1990. Os países frágeis, no seu conjunto, seguiram esta tendência, registando
um crescimento anual de cerca de 4% entre 2000 e 2008. Mas os diferentes subgrupos cresceram a ritmos muito diferentes: os países
frágeis ricos em recursos cresceram a uma média de 6,3%, com valores máximos de 10% em 2002 e 8,5% em 2004 (ver figura 2.3).
Os países frágeis com poucos recursos cresceram a uma média de 2,3%. As taxas de cada país também diferem substancialmente
por ano e em média32.
Figura 2.3: Crescimento do PIB real dos países frágeis, países frágeis ricos
em recursos e países frágeis com poucos recursos, 2000-2008
12
Non-resource-intensive fragile countries
Percentagem
10
Países frágeis com poucos recursos
8
Países frágeis
6
4
2
0
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
-2
Fonte: Elaboração do RED com base nas Perspectivas Económicas Mundiais – Crise e Recuperação, Abril de 2009, do FMI (2009b).
O crescimento real do rendimento por habitante, um valor médio de 600 dólares nos países frágeis da África subsariana, varia entre
100 dólares na República Democrática do Congo e 4500 dólares na Guiné Equatorial. O rácio entre os dois extremos no grupo de
países frágeis da África subsariana não está muito distante do rácio entre a média deste grupo de países e os países membros da
OCDE e constitui um exemplo elucidativo do grau de heterogeneidade existente no grupo de países frágeis.
Mas o PIB e o PIB per capita não são as únicas variáveis a considerar. É importante ter em conta outros aspectos a fim de obter uma
melhor perspectiva da situação e da sustentabilidade económica e social e, nesse sentido, implementar as medidas políticas adequadas33.
Por exemplo, as componentes do índice de desenvolvimento humano retêm aspectos de heterogeneidade importantes.
A esperança de vida à nascença varia substancialmente na região subsariana: em São Tomé e Príncipe, as pessoas esperam viver
mais de 60 anos, em linha com a média dos países em desenvolvimento – mas os cidadãos da Mauritânia e do Zimbabué têm uma
esperança de vida de cerca de 40 anos. A esperança de vida média no conjunto dos países frágeis, no entanto, não difere muito
da dos países não frágeis34.
32
33
34
Ver FMI 2009a.
Fitoussi et al. 2009.
Ver quadro 1.1 do Capítulo 1.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
47
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 2
Quadro 2.8: Características macroeconómicas
País
Angola
Burundi
Camarões
República Centro-Africana
Chade
Comores
Congo (República Democrática do)
Congo (República do)
Costa do Marfim
Jibuti
Guiné Equatorial
Eritreia
Etiópia
Gâmbia
Guiné
Guiné-Bissau
Quénia
Libéria
Mauritânia
Níger
Nigéria
Ruanda
São Tomé e Príncipe
Serra Leoa
Somália
Sudão
Togo
Uganda
Zimbabué
África subsariana
Países frágeis da África subsariana
Países não frágeis da África
subsariana
Dívida
externa,
% do
PIB(1)
Composição sectorial do PIB(3)
Reservas,
meses de
importações(2)
Agricultura
Indústria
Produtos
manufacturados
Serviços
PIB real
per
capita(4)
9,9
150,5
4,9
55,6
12,0
61,2
52,3
122,6
53,7
…
1,1
66,2
11,3
46,0
77,6
257,0
18,8
571,8
…
16,0
2,4
16,8
105,8
17,7
…
…
85,1
12,3
20,1
50,2
73,9
5,1
4,5
5,4
2,5
8,3
7,3
0,9
4,0
3,6
…
12,1
-2,2
1,8
5,1
1,1
8,0
4,1
-6,0
…
5,6
12,1
7,0
4,9
5,5
…
…
5,3
9,2
0,9
5,0
4,6
8,9
54,0
19,9
55,8
20,5
45,2
45,7
4,2
22,7
4,0
2,7
17,5
47,3
29,0
12,9
61,8
27,1
54,0
13,1
41,0
33,0
41,0
17,0
46,4
…
32,3
44,0
32,3
19,0
26,0
30,4
69,7
19,0
33,2
15,5
54,8
11,8
27,7
73,5
26,3
17,0
94,3
23,0
13,5
15,0
37,5
11,5
18,8
19,0
47,8
17,0
39,0
21,2
21,0
25,0
…
28,5
24,0
18,4
24,0
30,1
30,3
4,3
…
18,1
7,5
5,3
4,2
6,5
4,9
18,3
…
8,6
8,7
5,3
…
3,7
7,2
11,5
…
…
…
…
8,5
…
…
…
6,2
…
9,1
…
10,6
8,1
21,4
27,0
46,9
28,7
24,7
…
26,6
22,3
51,0
79,0
3,0
59,5
39,2
56,0
49,6
26,8
54,1
27,0
39,1
43,0
28,0
37,8
63,0
28,6
…
39,2
32,0
49,2
57,0
43,8
39,2
1 456
113
687
223
410
366
101
1 188
528
…
4 621
162
180
383
515
141
485
134
…
190
626
315
783
247
…
…
222
352
…
1 128
601
18,9
5,4
19,7
29,4
12,9
50,1
1 811
Notas: … indica dados não disponíveis; (1) e (2) dados relativos a 2007; (3) dados relativos a 2006, excepto para o Níger (2003) e Burundi,
Togo e Zimbabué (2005); (4) dados relativos a 2008.
Fontes: (1) Perspectivas Económicas Africanas da OCDE e da AfDB (2009); (2) e (4) Perspectivas Económicas Regionais da África Subsariana
2009 do FMI (2009a); (3) Indicadores de Desenvolvimento Mundial 2008 do Banco Mundial (2008a).
Mais de 70% do total de investimento directo estrangeiro nos países frágeis da África subsariana entre 2000 e 2007 foi canalizado
para apenas cinco países: Angola, Chade, Guiné Equatorial, Nigéria e Sudão, todos bem dotados de recursos naturais35.
Não existe um padrão claro nas principais variáveis macroeconómicas. Alguns países frágeis possuem reservas de divisas
extremamente baixas (menos de 90 dias de cobertura de importações)36. Em Abril de 2009, a Etiópia, a Guiné e o Zimbabué
tinham reservas para um mês de importações, enquanto os exportadores de petróleo tinham para meio ano. As reservas baixas
tornam esses países mais vulneráveis a choques externos. E, a longo prazo, não dispõem de recursos para expandir a produção e
diversificar as suas economias.
35
36
OCDE 2008.
O grupo de países da África subsariana dispõe, em média, de 5,2 meses de reservas, e os países não frágeis 5,0 meses. Assim, não existe uma diferença
significativa entre os dois grupos, embora existam diferenças no interior do grupo.
48
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Características dos Estados frágeis
Também não existe um padrão comum para a dívida externa37. Graças às receitas volumosas, os exportadores de petróleo contiveram
a dívida externa e os indicadores de endividamento externo estão amplamente controlados. Por exemplo, a dívida em percentagem
do rendimento nacional bruto e a dívida total referente à exportação de mercadorias e serviços melhoraram substancialmente
em Angola e no Sudão desde 200038. Os países frágeis dotados de poucos recursos, como a Libéria e a Guiné-Bissau, ainda têm um
forte endividamento que compromete o seu desenvolvimento futuro.
Os indicadores macroeconómicos de nível e de desenvolvimento podem ser utilizados para calcular o índice de vulnerabilidade
económica de um país39.
Quadro 2.9: Classificação de Vulnerabilidade Global
Classificações
Naudé (2009)
Elevada
Elevada
Média
Baixa
Média
Baixa
Elevada
Baixa
Elevada
n.c.
Baixa
Baixa
Baixa
Baixa
Média
Média
Média
Elevada
n.c.
Baixa
Elevada
Baixa
Média
Baixa
AfDB
Elevada
Muito elevada
Baixa
Elevada
Moderada
n.c.
Elevada
n.c.
Elevada
n.c.
Baixa
Muito elevada
Moderada
Elevada
n.c.
Moderada
Elevada
Elevada
n.c.
Muito elevada
Elevada
Elevada
Elevada
Elevada
DG Desenvolvimento
da Comissão Europeia
Baixa
Média
Baixa
Elevada
Baixa
Média
Elevada
Baixa
Média
Elevada
Baixa
Média
Média
Elevada
Média
Média
Média
Elevada
Elevada
Média
Baixa
Média
Elevada
Média
n.c.
n.c.
n.c.
Togo
Média
Muito elevada
Média
Uganda
Baixa
Baixa
Média
n.c.
n.c.
Elevada
País
Angola
Burundi
Camarões
República Centro-Africana
Chade
Comores
Congo (Rep. Dem. do)
Congo (República do)
Costa do Marfim
Jibuti
Guiné Equatorial
Eritreia
Etiópia
Gâmbia
Guiné
Guiné-Bissau
Quénia
Libéria
Mauritânia
Níger
Nigéria
Ruanda
São Tomé e Príncipe
Serra Leoa
Somália
Zimbabué
Notas: n.c. indica não classificado; os índices de vulnerabilidade combinam-se numa medida sintética da posição externa e financeira
de um país e os graus de diversificação da sua carteira de exportações.
Fonte: Naudé (2009) DG Desenvolvimento da Comissão Europeia, comunicação pessoal.
37
38
39
Em média, a dívida oficial dos países frágeis da África subsariana é de 73,9% do PIB, enquanto a dos países não frágeis é de 18,9%, novamente sem diferenças
entre os dois grupos.
Reisen 2007.
A vulnerabilidade económica é apenas um dos aspectos da vulnerabilidade de um país, uma vez que os factores económicos são apenas um aspecto
entre muitos. Mas os factores económicos têm a vantagem de serem mais facilmente mensuráveis do que os aspectos sociais. A vulnerabilidade estrutural,
que inclui elementos como a instabilidade política, conflitos e instituições disfuncionais, é debatida no capítulo 5. Nos países frágeis, estes elementos são
predominantes, mas graves problemas de medição dificultam a sua avaliação. O Quadro 2.9 apresenta medições da vulnerabilidade económica apenas para
países em situação de fragilidade; o Volume 1b do documento de apoio de Allen e Giovannetti, 2009, apresenta a lista completa, que inclui todos os países
subsarianos para os quais existem dados disponíveis suficientes. A classificação não está disponível para países como a Somália, para a qual existia apenas
uma das componentes do índice económico.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
49
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 2
Os países são vulneráveis economicamente quando são particularmente sensíveis a choques externos. Assim, a seguir, avaliamos
a exposição a choques e a capacidade de reacção. Pretendemos verificar se os países frágeis, de acordo com as expectativas,
são mais vulneráveis a choques do que os outros países subsarianos. Tal como Naudé (2009), consideramos a diversificação, o
endividamento externo, a abertura da economia, as responsabilidades externas, o capital para activos ponderados em função do
risco e a taxa de crescimento do crédito ao sector privado40. Mais precisamente, para cada país frágil para o qual existem dados
disponíveis (excluindo, assim, a Mauritânia, a Somália, o Sudão e o Zimbabué), analisamos:
• Abertura, medida como o peso das exportações no PIB.
• Concentração de exportações, medida de acordo com o Índice Herfindal-Hirschman: quanto mais diversificado o cabaz de
exportações, menos vulnerável o país.
• Endividamento externo, medido como o peso da dívida externa no PIB.
• Quadro regulamentar em matéria de capital para activos ponderados em função do risco.
• Responsabilidades externas.
• Crescimento do crédito ao sector privado.
A classificação dos países foi calculada como uma média simples para evitar distorções. Classificámos todos os países subsarianos,
frágeis e não frágeis, de acordo com um critério pelo qual uma classificação baixa significa vulnerabilidade baixa e uma classificação
elevada significa vulnerabilidade elevada. Em seguida, dividimos os países em grupos sensivelmente idênticos, da classificação baixa
para a elevada (quadro 2.9). Os países em situações de fragilidade, de acordo com a nossa definição operacional, estão divididos
equitativamente pelos três grupos41.
3. EM RESUMO
O papel decisivo das funções do Estado em matéria de desenvolvimento económico e humano é reflectido
por algumas características comuns aos países frágeis analisados no presente capítulo. A incapacidade
de mobilizar recursos internos, de promover a diversificação económica e desenvolver cadeias de valor, a
elevada dependência de recursos financeiros externos, o baixo nível de capital humano e a persistência
de infra-estruturas subdesenvolvidas e não interligadas a nível interno são todos “sintomas” de fragilidade
do Estado. Para além destas características comuns, no entanto, existe também um elevado grau de
heterogeneidade devido ao percurso histórico, diferentes recursos, geografia, coesão étnica e religiosa,
entre outras; além disso, o grupo de países frágeis inclui situações muito diferentes em termos de
resultados e grau de vulnerabilidade.
As diferentes características de fragilidade (semelhanças e heterogeneidades) combinam-se de formas diferentes e, além disso,
mudam com o tempo. Por esse motivo, tentar categorizar os países frágeis, mesmo em subgrupos, é uma tarefa difícil, uma vez
que envolve avaliações muito subjectivas.
40
41
Guillamont e Guillaumont Jeanneney (2009) referem a vulnerabilidade estrutural utilizando um índice de vulnerabilidade económica que combina a
exposição a choques – dimensão populacional, distância do mercado mundial, concentração das exportações de mercadorias e percentagem relativa de valor
acrescentado nos sectores agrícola, florestal e das pescas – e a “dimensão” do próprio choque. A AfDB (2009) utiliza factores estruturais macroeconómicos
como diminuição das reservas, elevada concentração de propriedade estrangeira no sistema bancário, perspectivas de inflação, e redução do crescimento
do PIB, as condições comerciais e as contas correntes. A DG Desenvolvimento da Comissão Europeia utiliza três conjuntos de variáveis: dependência das
receitas de exportação; dependência de fluxos financeiros externos e capacidade de reacção.
As classificações do Banco Africano de Desenvolvimento e da DG Desenvolvimento da Comissão Europeia produziram resultados idênticos. Os países frágeis
estão distribuídos por diferentes grupos, embora as variáveis tidas em consideração para classificar os países em função das suas vulnerabilidades sejam
diferentes.
50
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
CAPÍTULO 3
AS ORIGENS HISTÓRICAS DA FRAGILIDADE DOS ESTADOS
Este capítulo tenta determinar se a fragilidade do Estado na África subsariana partilha uma origem
histórica comum, uma vez que sobressai um facto estilizado de todos os debates teóricos sobre a
definição e medição de fragilidade:1 os países da África subsariana constituem sempre a maior parte do
grupo dos Estados frágeis. A grande diversidade dos desenvolvimentos institucionais na região sugere que
uma origem histórica comum da fragilidade do Estado não tem uma acção isolada, mas está estreitamente
ligada às dinâmicas específicas de cada país. O presente capítulo não apresenta uma descrição
pormenorizada dos factores que tornam os países da África subsariana frágeis e não pretende substituir
ou resumir uma análise exaustiva do contexto local. No entanto, oferece perspectivas importantes com
vista a compromissos externos eficazes em situações de fragilidade.
A “Partilha de África” (Scramble for Africa), organizada pelos países europeus nos finais do século XIX, é uma candidata natural
para a origem histórica da fragilidade que atormenta muitos dos países da África subsariana. Esta experiência histórica une a maior
parte da região e o período colonial mostrou ter tido consequências duradouras sobre o padrão do desenvolvimento institucional
durante a colonização2. Embora as instituições de Estado possam ser frágeis em países que não foram afectados pela Partilha de
África, como a Etiópia e a Libéria, o colonialismo europeu pode, contudo, ter impedido a criação de estruturas de Estado sólidas
na região.
Se bem que a experiência colonial tenha sido um ponto de viragem na história da região, abrangeu apenas um curto período.
Assim, o presente capítulo analisa a possibilidade, em conjunto com as linhas traçadas por Herbst (2000), de a fragilidade estar
relacionada com as profundas características regionais que dificultaram e continuam a dificultar a adopção de uma política de
desenvolvimento institucional conducente a Estados legítimos e eficazes.
Esta perspectiva não diminui o argumento que defende a importância da experiência colonial no desenvolvimento institucional
dos Estados pós-coloniais. No entanto, enquadra-a numa perspectiva mais global3. A Partilha de África não ocorreu num vazio
institucional. A formação dos Estados coloniais interagiu com as características institucionais pré-estabelecidas dos países
colonizados, as quais, em vez de serem estáticas e imutáveis, foram significativamente influenciadas pelo período colonial.
1. PRINCIPAIS FACTORES ESPECÍFICOS E FACTORES SUBJACENTES COMUNS
Os países da África subsariana partilham alguns sintomas distintivos mas “a fragilidade de Estado
caracteriza-se essencialmente pelos seus sintomas: pobreza, insegurança, propensão para o conflito,
corrupção4.” Embora a dimensão regional da fragilidade não possa ser ignorada, é mais provável que
a fragilidade do Estado seja determinada pelos principais factores específicos de cada país, os quais
conferem ao grupo de países frágeis a heterogeneidade descrita no capítulo 2. Uma compreensão
profunda dos factores que conduzem um país a uma espiral de declínio, que progressivamente provoca
a erosão da capacidade e legitimidade das suas instituições de Estado, dificilmente poderá ser obtida
através das análises que visam conclusões alargadas.
No entanto, a concentração geográfica dos Estados frágeis deixa antever determinados factores regionais comuns, que possivelmente
interagem com os factores específicos de cada país na determinação da fragilidade das instituições de Estado. Se podemos
estabelecer, com uma certa credibilidade, factores comuns que contribuem para a ocorrência (e para a persistência) da fragilidade,
este aspecto deve constituir a base de um quadro analítico mais abrangente, o qual poderá assim contribuir para a organização e
compreensão do papel essencial dos factores específicos de cada país.
A maioria dos debates sobre a fragilidade dos Estados, pelas comunidades académica e de desenvolvimento, não inclui as origens
históricas da fragilidade. Mas realçar a dimensão histórica da fragilidade pode melhorar a solidez e a credibilidade dos compromissos
europeus para apoiar a construção do Estado. A Europa dificilmente poderá esperar que o seu compromisso seja entendido como
neutro ou meramente técnico, uma vez que a ideia de que a Europa é responsável pela fragilidade das instituições de Estado se
1
2
3
4
Bertoli e Ticci 2009.
Por exemplo, Acemoglu et al. 2001; Lange 2004; Angeles e Neanidis 2009.
Como observa Robinson (2002), a avaliação das influências relativas dos diferentes factores históricos é ainda uma questão empírica por resolver.
Briscoe 2008, pág. 7.
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SOBRE
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 3
generalizou a toda a África subsariana. Alguns autores, na verdade, argumentaram que este compromisso é uma nuance da antiga
mission civilisatrice que supostamente serviu de base à colonização europeia na época da Partilha de África5. Uma análise profunda
do papel dos países europeus é, assim, uma pré-condição para o apoio europeu eficaz à construção do Estado.
2. SERÁ A FRAGILIDADE UM LEGADO COLONIAL?
Os países europeus, que durante séculos mantiveram praças-fortes ao longo de toda a costa africana,
conquistaram o controlo político de quase toda a África subsariana durante algumas décadas, entre o
final do século XIX e o início do século XX. A experiência colonial marcou a história africana, embora tenha
decorrido menos de um século entre a Conferência de Berlim e a independência das colónias portuguesas
em meados da década de 1970.
São necessários, pelo menos, três elementos para apoiar o argumento de que a fragilidade dos Estados é um dos legados da
experiência colonial em África. É necessário identificar as características mais marcantes dos Estados (e os seus processos de
formação) que se assemelham a traços distintivos das instituições dos Estados frágeis. Uma vez estabelecida a semelhança, é
necessário compreender os motivos pelos quais a independência política em relação às antigas potências coloniais não eliminou
ou pelo menos não alterou significativamente estas características institucionais. Por fim, é necessário descrever os factores que
contribuíram para a sua permanência nos Estados pós-coloniais, uma vez que passou mais de meio século desde que a Costa
Dourada (actual Gana) conquistou a independência em relação à Grã-Bretanha em 1957, abrindo o caminho para a descolonização
na África subsariana.
3. ESTADOS COLONIAIS DA ÁFRICA SUBSARIANA
A fragilidade dos Estados pode estar relacionada com quatro aspectos da formação das instituições de
Estado na África subsariana.
• O primeiro é o seu carácter artificial: a criação de Estados coloniais introduziu um elemento não relacionado com as características
sociais, institucionais e culturais dos territórios colonizados.
• O segundo é a natureza extractiva: a estrutura das instituições foi concebida para transferir recursos para as potências coloniais,
não para promover o desenvolvimento local.
• O terceiro é a sua inerente extroversão: os Estados estabeleceram laços económicos sólidos com as potências coloniais, numa
relação de dependência política.
• O quarto tem a ver com o governo indirecto: um sistema de administração colonial iniciado no Império Britânico 6, mas que
também foi aplicado pela França e pela Bélgica nas suas colónias7.
As potências coloniais europeias transplantaram estruturas institucionais estranhas ao contexto local8. O desenvolvimento das
instituições do Estado na época colonial evoluiu diferentemente da orientação seguida na Europa9. Os Estados coloniais não
emergiram de um processo demorado que consolidasse instituições formais e mediasse interesses de conflito na sociedade. Pelo
contrário, foram impostos externamente pelo poderio militar dos países europeus. “O Estado [é] na maior parte do continente
africano essencialmente um Estado artificial, ‘a pairar sobre’ uma sociedade que nunca o produziria e que o não pediu10.”
O carácter artificial das instituições de Estado contribuiu para o seu afastamento da sociedade11. A existência do sistema de
governo indirecto reforça este argumento, uma vez que apenas os níveis mais baixos da administração colonial podiam ser
atribuídos a elementos da população local. Embora muitos deles fossem chefes tradicionais ou consuetudinários, o seu papel (e
mais especificamente as suas relações com as comunidades locais) era reformulado pela potência colonial12. O argumento de Kaplan
(2009) vai de encontro a uma linha de pensamento que foi avançada na literatura sobre economia do desenvolvimento: Myrdal
(1972) atribuiu a debilidade das estruturas de Estado no período pós-colonial precisamente à introdução exógena das instituições
de Estado, as quais inculcaram nos cidadãos um sentimento de oposição contra si e uma relutância em aceitar as suas regras.
5
6
7
8
9
10
11
12
Paris 2002.
Lugard 1922.
Lange 2004.
Kaplan 2009.
Herbst 2000.
Luling 1997, págs. 288–289.
Kaplan 2009.
Ranger 1983, págs. 211–262; UNECA 2007.
52
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
As origens históricas da fragilidade dos Estados
As estruturas de Estado coloniais artificiais não se destinavam a apoiar o desenvolvimento económico dos territórios colonizados
mas a satisfazer os interesses económicos das potências coloniais. A prossecução destes interesses não assume a forma de um
mecanismo vent for surplus (“saída para excedentes”). Pelo contrário, as potências coloniais extraíram recursos naturais e receitas
fiscais das suas colónias, as quais suportavam níveis muito elevados de impostos, o que promoveu o desenvolvimento das infraestruturas locais apenas em termos muito limitados.
O carácter extractivo do Estado colonial está ligado à sua extroversão orientada para as potências coloniais13. Um símbolo poderoso
desta orientação é a localização das cidades capital ao longo da costa. “De uma forma muito sistemática, os europeus criaram
capitais que transferiram o poder para o oceano e o afastaram dos centros de poder que os africanos lentamente tinham criado
no interior do território14.” Por exemplo, Accra tornou-se a capital da Costa Dourada em vez da cidade interior de Kumasi, que tinha
sido o centro do Império Ashanti (ou Asante), enquanto Bamako substituiu Timbuktu como centro político do Mali. A limitada
orientação para o interior dos Estados coloniais reflecte-se igualmente no fraco desenvolvimento de estradas que caracterizou
o período colonial. As infra-estruturas foram negligenciadas sempre que não conduziam a um retorno financeiro directo. As vias
ferroviárias, por exemplo, foram construídas para transportar matérias-primas do interior para os portos, mas raramente para
servir de ligação a territórios no interior.
As elevadas taxas de mortalidade que os europeus enfrentavam na África subsariana também moldaram o domínio colonial,
limitando as oportunidades para uma extensiva colonização directa15. As potências coloniais, nomeadamente a Grã-Bretanha,
mas também, embora em menor grau, a França e a Bélgica, estabeleceram-se nas colónias de forma muito restrita e recorriam ao
governo indirecto para a sua administração. Os níveis superiores da administração colonial eram dominados pelos colonizadores,
embora as potências coloniais se baseassem em instituições tradicionais e consuetudinárias para manter a ordem fora da capital16,
dado que a administração colonial tinha um alcance muito limitado nas zonas rurais.
O sistema de governo indirecto alimentou o despotismo descentralizado17, uma vez que as potências coloniais reformularam a
relação entre os chefes consuetudinários e as comunidades. Na época pré-colonial, as comunidades podiam expulsar os chefes do
poder, mas na administração colonial apenas esta podia conferir ou retirar esse poder18. Este sistema diminuiu significativamente a
responsabilidade dos chefes tradicionais e consuetudinários para com as suas comunidades e estes podiam exercer a sua autoridade
tendo em vista a acumulação de riqueza pessoal, o que contribuiu para a subsequente privatização do Estado19.
Estes quatro aspectos dos países coloniais da África subsariana, estreitamente ligados, assemelham-se a algumas características
distintivas da fragilidade dos Estados. O carácter artificial da sua formação afasta as instituições de Estado da sociedade, dificultando
o processo político que pode equilibrar as expectativas dos cidadãos e a capacidade do Estado. A limitada orientação em matéria
de desenvolvimento dos Estados frágeis tem eco no carácter extractivo dos Estados coloniais, enquanto a sua incapacidade
para mobilizar os recursos internos pode estar relacionada com a extroversão das instituições de Estado estabelecidas na época
colonial. E uma estrutura de Estado bifurcada reforçada pelo governo indirecto colonial pode ter estabelecido a base para a posição
neopatrimonial de alguns Estados frágeis da África subsariana20.
4. DESCOLONIZAÇÃO
Com excepção das colónias portuguesas, que sofreram uma longa e violenta luta pela independência, e
das colónias da África do Sul, os outros países da África subsariana obtiveram a independência política em
relação às suas potências coloniais poucos anos depois de 1957, ano em que a Costa Dourada britânica
se tornou no independente Gana. A transição pacífica do domínio colonial para a autonomia política foi
uma clara oportunidade para eliminar as características institucionais prejudiciais dos Estados coloniais.
Mas as elites políticas desses novos países raramente foram além da mera africanização da burocracia,
não acompanhada de uma alteração significativa das instituições. Por que motivo o desenvolvimento
institucional dos países da África subsariana não conheceu uma alteração significativa na altura da
independência?
13
14
15
16
17
18
19
20
Clapham 1996.
Herbst 2000, pág. 16.
Acemoglu et al. 2001.
Lange 2004.
Lange 2004.
Lugard 1922.
Bayart 1999.
Mamdani 1996.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 3
A redução do carácter artificial teria exigido a indigenização das instituições de Estado, o que poderia ter reduzido a separação
entre as instituições formais e informais. Mas vários factores prejudicaram esse desenvolvimento. Em primeiro lugar, as estruturas
administrativas (e o alcance do poder de Estado) de vários países coloniais eram muito fracas. Esta situação fez com que os líderes
políticos nacionais fossem cautelosos quanto à introdução de grandes alterações na estrutura institucional que pretendiam
consolidar. “Necessitavam de controlar o aparelho administrativo em boas condições de funcionamento em vez de procurar criar
um novo de raiz com a inimaginável confusão produzida pela conquista da independência e a reorganização de toda a estrutura
política em simultâneo21.”
No entanto, os sistemas jurídico, de governação e de ensino excessivamente ocidentalizados impediram as comunidades locais de
aproveitarem os seus próprios recursos, capacidades e redes sociais e criaram conflitos desnecessários entre as instituições formais
e informais. As estruturas de governo altamente centralizadas dos países onde os organismos estatais continuam ineficazes e as
fontes de rendimento alternativas permanecem escassas forçam os grupos a competir pelos recursos escassos, acentuando a
fragmentação política no processo.
Além disso, os líderes de vários dos novos Estados foram educados em países ocidentais: Julius Nyerere no Reino Unido, Léopold
Sédar Senghor em França e Kwame Nkrumah nos Estados Unidos. E os líderes formados em países africanos, tais como Milton
Obote ou Félix Houphouët-Boigny, fizeram os seus estudos em instituições académicas que apoiam activamente as instituições e
os valores políticos ocidentais. Estes líderes encaravam a indigenização das instituições de Estado como um retorno às instituições
políticas pré-coloniais, prejudiciais ao desenvolvimento22. As instituições tradicionais contribuíram para o funcionamento dos
Estados coloniais, o que prejudicou a confiança nestas para reduzir o afastamento entre as estruturas estatais e os valores políticos
e culturais23.
O carácter extractivo das instituições de Estado no período colonial foi claramente prejudicial ao desenvolvimento dos países da
África subsariana, mas podia continuar a servir os interesses dos líderes políticos. Acemoglu et al. (2001) defenderam que “em
muitos dos casos em que as potências europeias estabeleceram instituições autoritárias, delegaram a administração diária do
Estado numa pequena elite interna. Este círculo restrito controlou frequentemente o Estado depois da independência e favoreceu
as instituições extractivas24”.
A extroversão dos Estados não podia ser eliminada instantaneamente na altura da independência, uma vez que a dependência de
fontes externas de receitas reflectia as características profundamente enraizadas dos países da África subsariana. Por exemplo, a rede
viária foi criada para ligar países estrangeiros, não para promover o desenvolvimento económico local. Além disso, a extroversão
podia ser do interesse da elite política. Collier (2009a) sugere que Mobutu Sese Soko, que construiu a sua riqueza pessoal com
receitas provenientes da exportação de recursos naturais do Zaire, não tinha interesse em reduzir a dependência de fontes externas
de receitas25, a qual teria de ser acompanhada por uma introversão na geração de recursos do Estado. Uma maior dependência
da tributação teria provocado um círculo, virtuoso para a sociedade mas vicioso para Mobutu Sese Soko, de maior exigência de
responsabilidade financeira perante os cidadãos e um reforço progressivo das instituições de Estado.
A falta de vontade política para aumentar a mobilização dos recursos internos correspondia a uma grave limitação da capacidade.
O aumento dos impostos constitui um desafio para uma estrutura de Estado pouco desenvolvida e com dificuldade em alargar
o seu âmbito para fora das zonas urbanas enquanto a maior parte da população vivia em zonas rurais de fraca densidade
populacional.
Deste modo, a independência política alcançada pelos países subsarianos não introduziu uma alteração significativa no
desenvolvimento das instituições de Estado. Por este motivo, o segundo elemento da cadeia necessário para relacionar a actual
fragilidade do Estado com a experiência colonial é sólido. Existem bases sólidas que podem ser invocadas para justificar o motivo
pelo qual a independência política alcançada pelos países da África subsariana não produziu uma mudança significativa no
desenvolvimento das suas instituições de Estado.
21
22
23
24
25
Clapham 1996, pág. 35.
Clapham 1996.
De notar que a percepção do atraso das instituições informais foi acompanhada, logo após a independência, pela dependência das elites políticas em relação
às chefias tradicionais em matéria de apoio político. Esta atitude, ao mesmo tempo que não atenuou as diferenças entre as instituições formais e informais,
contribuiu para a persistência ao longo do tempo dos efeitos colaterais prejudiciais do sistema colonial de governo indirecto.
Acemoglu et al. 2001. Um argumento idêntico é exposto em Mamdani 1996.
Collier 2009a.
54
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
As origens históricas da fragilidade dos Estados
5. CONTEXTO INTERNACIONAL E CONTINUIDADE
A independência política não foi acompanhada por um desenvolvimento institucional. Todavia, já
passaram mais de três décadas desde o fim da descolonização, pelo que é necessário complementar os
argumentos sobre a ausência de uma mudança significativa nas instituições com factores que expliquem a
persistência de algumas das principais características institucionais. Embora a África subsariana apresente
exemplos notáveis de desenvolvimento institucional bem sucedido como, por exemplo, o Botswana, estes
são a excepção e não a regra. Porquê?
Os Estados independentes da África subsariana foram formados pelo “traço de uma caneta internacional”, uma vez que obtiveram
o reconhecimento imediato do Conselho de Segurança das Nações Unidas26. Foi desta forma que “nasceram os Estados dos
mil milhões de pessoas carenciadas (bottom billion)”, com pouca atenção à sua viabilidade económica ou política. Sobre a sua
viabilidade económica, Collier (2009a) observa que vários novos Estados eram liliputianos, uma vez que o curto período de tempo
da experiência colonial impediu os cidadãos dos territórios coloniais de convergirem numa identidade nacional comum.
A independência da Ásia do Sul em relação ao domínio colonial britânico produziu apenas dois países independentes em 1949, a
Índia e o Paquistão, a partir de uma multiplicidade de diferentes entidades políticas pré-coloniais. Mas a África Ocidental francesa
dividiu-se em vários pequenos países, cujas fronteiras foram arbitrariamente desenhadas. Estes países eram demasiado pequenos
para constituírem um Estado, ou seja, a sua reduzida dimensão impedia-os de proporcionarem segurança e responsabilidade
financeira27. A arbitrariedade das fronteiras coloniais formou “populações compostas por grupos de identidade diferentes e muitas
vezes incompatíveis”, comprometendo a viabilidade política dos Estados pós-coloniais28.
Embora as diferentes identidades tribais e étnicas tenham precedido claramente o período colonial, as administrações coloniais
determinaram a “imobilização de populações, o reforço da etnicidade e uma maior rigidez de definição social”, uma realidade que
não existia na África subsariana pré-colonial, que não era caracterizada por uma “única identidade ‘tribal’, uma vez que a maioria
dos africanos se movimentou entre várias identidades29.” Ranger refere explicitamente a “invenção da tradição na África colonial”,
mostrando que algumas características distintivas das sociedades africanas pós-coloniais como, por exemplo, a importância das
afiliações étnicas ou tribais, não são um legado do período pré-colonial, antes surgiram ou foram significativamente reforçadas
na época do domínio colonial.
Com o intuito de apresentar um bom exemplo desta dinâmica, Newbury (1998) relembra que “a administração belga no Ruanda
[...] procurou estruturar a ordem social, racionalizar e normalizar as relações sociais heterogéneas [...]. Na década de 1930, foram
emitidos bilhetes de identidade que indicavam a categoria étnica das pessoas. [...] essas medidas não criaram etnicidade; em vez
disso, serviram para formar a sua importância social. Assim, no Ruanda colonial, os Hutus foram classificados como cidadãos de
segunda classe. Esta situação foi completamente ilustrada na afectação de novos recursos coloniais económicos e sociais30.” Este
exemplo sugere que grupos divididos, quanto a identidades étnicas e tribais, eram frequentemente produto do domínio colonial,
tal como a estrutura de Estado.
Os novos países da África subsariana foram, assim, atormentados por dois problemas estruturais, a fragmentação da identidade
política e instituições nacionais fracas, que, em conjunto, impediam a formação de qualquer sistema de governo nacional sólido,
prejudicando com gravidade a legitimidade do Estado e produzindo ordens políticas altamente instáveis e difíceis de reformar. A
fragmentação política e os órgãos de governação fracos influenciam-se mutuamente, prejudicando as tentativas de construir um
Estado legítimo e eficaz. As divisões étnicas e, aliás, as divisões religiosas e tribais, bem como as formas geográficas e socioeconómicas
da fragmentação política, impediram a formação de “um dos mais importantes requisitos para o bom funcionamento dos Estados
[...] a criação de estruturas burocráticas apolíticas (serviços públicos, justiça, polícia, exército) assentes numa ideologia que legitima
o papel da autoridade neutra do Estado na manutenção da ordem social através de procedimentos prescritos e do Estado de
direito31.”
Enquanto vários grupos coesos com longas histórias comuns desenvolveram sistemas políticos, económicos e sociais sofisticados
que mantêm a estabilidade e promovem o progresso económico, as populações divididas não têm esses mecanismos. As sociedades
fragmentadas, quando combinadas com estruturas governamentais fracas, tendem a gravitar rumo a “um miasma sufocante de
círculos viciosos” onde, como observa Putnam, “o abandono, a desconfiança, a desresponsabilização, a exploração, o isolamento,
a desordem e a estagnação se intensificam mutuamente32.” Quando predominam tais padrões de comportamento disfuncionais
26
27
28
29
30
31
32
Collier 2009a.
Collier 2009a.
Kaplan 2009, pág. 2.
Ranger 1983, pág. 248.
Newbury 1998, pág. 11.
Easterly 2000, pág.12.
Putnam 1993, 177.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 3
e estéreis numa sociedade, estes persistirão porque, tal como explica North, o elevado grau de dependência da trajectória de
um determinado quadro institucional “desincentiva a actividade produtiva [ao criar] organizações e grupos com um interesse
nas limitações existentes”, as quais são “um importante factor para a explicação das taxas de crescimento baixas persistentes nos
países em desenvolvimento33.”
Nunn (2007) apresenta um modelo com equilíbrios múltiplos que demonstra que uma estrutura institucional introduzida
externamente com direitos de propriedade desprotegidos e um baixo nível de produção, em que o Estado extrai recursos do
sistema económico, pode persistir mesmo depois de a fonte externa de extracção ter sido eliminada. “A sociedade continua presa
neste equilíbrio não ideal mesmo depois de o período de extracção externa ter terminado,” pelo que a independência política não
resulta na eliminação de uma estrutura institucional socialmente indesejável34.
Embora a maior parte dos Estados pós-coloniais da África subsariana tivesse inicialmente uma limitada viabilidade política e
económica, o mapa político da região não foi alterado desde o fim da descolonização. “Desde 1945 não desapareceu qualquer
Estado como resultado da acção militar de um vizinho35.” Estes países não foram sujeitos a uma ameaça militar externa, um factor
que foi essencial no reforço dos Estados europeus36.
Citando Collier (2009b) em pormenor, a “descolonização ocorreu depois da mais terrível guerra mundial da história e num contexto
de rivalidade nuclear. Não é de surpreender que existisse a ideia de que [a ameaça militar externa] já não era uma parte aceitável
do comportamento dos governos: os custos eram demasiado elevados e as guerras entre vizinhos poderiam transformar-se em
guerras globais. Como resultado da pressão internacional, incluindo a mediação internacional através das Nações Unidas e de
grupos regionais como a Organização de Unidade Africana, a incidência de guerra internacional foi radicalmente reduzida. […]
O processo darwiniano pelo qual os Estados fortes absorveram Estados fracos, um processo que ajudou a Alemanha a reduzir o
número de estados de 300 para um, deixou de existir completamente37.”
As ameaças militares externas criaram a necessidade da introversão dos Estados, que foram obrigados a cobrar impostos para
financiar o aparelho militar necessário para fazer face a essas ameaças. A necessidade dos Estados mobilizarem os recursos internos
obrigou os cidadãos a exigirem a sua responsabilização pela utilização dos recursos fiscais, impondo assim restrições nas suas acções.
Além disso, a necessidade de aumentar os recursos levou os Estados a criarem instituições orientadas para o desenvolvimento,
por exemplo, no âmbito da protecção dos direitos de propriedade, uma vez que a mobilização dos recursos internos estava
decisivamente relacionada com o reforço do sistema económico. As ameaças externas consolidaram igualmente uma identidade
nacional comum e reforçaram o processo político, conciliando interesses do Estado e da sociedade.
Embora os Estados subsarianos não estivessem sujeitos a ameaças externas, eram altamente inseguros, uma vez que as ameaças
provinham de rebeliões internas, não de Estados vizinhos38. A viabilidade da rebelião estava relacionada com a pequena dimensão
dos novos Estados, factor que aumentava as possibilidades dos rebeldes derrotarem o exército e apoderarem-se do poder, enquanto
os Estados de maior dimensão “estavam seguros”39. A protecção contra ameaças externas, um “bem público”, leva os interesses
da elite política e da sociedade a coincidirem. Mas a protecção contra ameaças internas não surte o mesmo efeito. A repressão de
uma ameaça interna é um “bem privado” que partes da sociedade podem não apoiar. Tão pouco contribui para o reforço de uma
identidade nacional comum.
As ameaças internas não colocam uma grave ameaça à estabilidade de um governo, uma vez que as estimativas indicam que
apenas uma em cada cinco tentativas de rebelião interna é bem sucedida no derrube do governo. Todavia, a ameaça mais grave
para as elites dominantes da África subsariana vinha do exército, uma vez que os golpes de Estado tinham mais possibilidades
reais de sucesso do que as rebeliões40. Este facto prejudicou igualmente a aplicação do principal mecanismo de consolidação
das instituições do Estado utilizado na Europa: o reforço do exército. Mobutu Sese Soko enfraqueceu e dividiu deliberadamente
o exército zairense ao longo de várias gerações com o objectivo de reduzir o risco de golpe de Estado. Esta política conduziu ao
resultado paradoxal do Ruanda, um país bem mais pequeno, invadir o vizinho Zaire na década de 199041.
33
34
35
36
37
38
39
40
41
North 1990, 99.
Nunn 2007, pág. 173.
Collier 2009b, pág. 4.
Tilly 1990.
Collier 2009b, pág. 4.
Collier 2009b.
Collier 2009b.
Collier 2009b.
Collier 2009a.
56
As origens históricas da fragilidade dos Estados
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Assim, a fragilidade do Estado nos países da África subsariana serviu interesses bem definidos da elite política local. A contínua
debilidade das instituições de Estado no período pós-colonial estava igualmente em consonância com os interesses das antigas
potências coloniais42. Depois de abandonarem o controlo político, pretenderam manter o controlo económico, de modo a continuar
a extrair recursos valiosos das antigas colónias.
A ajuda dos países doadores pode ter também consolidado a extroversão dos Estados pós-coloniais, reduzindo os incentivos para
uma mobilização mais eficaz dos recursos internos. Os critérios de selectividade da ajuda estabelecidos no Consenso de Monterrey
destinavam-se a recompensar os países destinatários com uma conjuntura propícia à mobilização dos recursos internos e que
utilizassem efectivamente o investimento e a ajuda internacionais43. Mas existe a preocupação generalizada de que a ajuda pode
ter um efeito adverso nesta fase essencial do reforço das instituições de Estado.
6. A DEPENDÊNCIA DA TRAJECTÓRIA DAS INSTITUIÇÕES  AFASTAMENTO
E EXTROVERSÃO
O padrão da colonização produziu uma forte e duradoura influência sobre as normas de qualidade
institucional actuais44. O argumento teórico que apoia a análise empírica – que não se limita à África
subsariana – defende que as taxas de mortalidade que os colonizadores europeus enfrentaram tiveram
uma forte influência no seu padrão de colonização. As colónias onde os europeus se instalaram numa
extensão muito limitada, devido às elevadas taxas de mortalidade, eram menos propensas a adoptarem
o quadro jurídico e institucional das potências coloniais. Esse quadro era transferido para as colónias
onde os colonos europeus o exigiam, porque tinham um interesse directo na replicação do quadro
institucional orientado para o desenvolvimento que caracterizava os países europeus. Mas nos locais
onde a colonização era limitada, tal como na maior parte dos territórios da África subsariana, com as raras
excepções das colónias portuguesas, era mais provável que o quadro institucional dos Estados coloniais
tivesse um carácter extractivo45.
Não se trata apenas da dimensão da colonização directa nas colónias, mas também do sistema de governo colonial46. Um estudo
relativo a 30 antigas colónias britânicas, metade das quais situadas na África subsariana, testa a hipótese de que o governo indirecto
colonial foi prejudicial para o desenvolvimento institucional pós-independência. O âmbito do governo indirecto, definido como “o
número de processos consuetudinários reconhecidos colonialmente no número total de processos em 1955” tem uma significativa
influência em várias normas de qualidade institucional, tais como a eficácia burocrática, a carga regulamentar do Estado, o Estado
de direito e a ausência de corrupção governamental47. Esta evidência, embora limitada às antigas colónias britânicas, está em
consonância com os argumentos propostos para o legado negativo do sistema de governo indirecto na África subsariana.
Até ao momento, temos defendido a ideia de que o período colonial contribuiu para a fragilidade das instituições de Estado na África
subsariana. Assim sendo, é mesmo possível afirmar que os argumentos aqui apresentados reforçam uma interpretação específica da
fragilidade do Estado em África: os Estados da região fracassaram antes de serem formados48. De facto, são “irrefutáveis as provas de
que a maior parte dos Estados de África que entraram em colapso, em nenhum momento da época pós-colonial, se assemelharam
remotamente ao modelo ideal da moderna política ocidental49.” É por este motivo que a expressão Estado fracassado, que substitui
muitas vezes a expressão Estado frágil sem uma alteração clara do sentido subjacente, pode ser extremamente enganadora50. A
fragilidade do Estado atingiu recentemente países que foram considerados durante muito tempo casos de sucesso em matéria de
desenvolvimento económico e institucional na região, tais como a Costa do Marfim e o Zimbabué. No entanto, é inegável que a
fragilidade do Estado, altamente persistente ao longo do tempo, se manifestou principalmente em países que nunca beneficiaram
de instituições de Estado eficazes.
42
43
44
45
46
47
48
49
50
Wallerstein 1975.
Dollar e Levin 2006.
Acemoglu et al. 2001.
Os efeitos duradouros do padrão da colonização foram confirmados recentemente por Angeles e Neanidis (2009), que demonstraram a sua influência sobre
a orientação em matéria de desenvolvimento da elite governativa e, através deste canal, a eficácia da ajuda externa.
Lange 2004; Acemoglu et al. 2001.
Lange 2004.
Anderson 2004 citado em Englebert e Tull 2008.
Englebert e Tull 2008, p. 111.
Cammack et al. 2006.
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57
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 3
Todavia, é justo afirmar que esta observação reforça o puzzle que caracterizou o curto período de tempo de governo colonial
europeu. Embora seja necessário não minimizar o legado colonial em matéria de desenvolvimento institucional dos Estados
pós-coloniais, é importante analisar se, e eventualmente como, o governo colonial interagiu com alguns factores pré-existentes
e profundamente enraizados.
Herbst (2000) defendeu de forma convincente que o alcance do poder colonial na África subsariana se manteve meramente
fictício durante décadas. A Conferência de Berlim “permitiu aos europeus a conquista de África, fazendo o mínimo possível para
a controlar51.” “Em 1939, os comissários distritais britânicos eram responsáveis, em média, por uma área aproximadamente do
tamanho do País de Gales, que administravam conjuntamente com o seu pessoal africano. Um total de 1223 administradores e
938 polícias governavam cerca de 43 milhões de pessoas na África tropical britânica em 1939. De modo idêntico, existiam
3660 oficiais para governar 15 milhões de africanos na África Ocidental francesa, 887 para governar 3,2 milhões na África Equatorial
francesa e 2384 para governar 9,4 milhões no Congo belga, em 193852.”
Estes números são um bom exemplo da capacidade limitada dos Estados coloniais em alargar a sua autoridade administrativa
até aos imensos territórios que deviam controlar, a qual, além do pequeno número de pessoal administrativo, era dificultada pelo
fraco desenvolvimento de estradas durante o período colonial.
Por que motivo as potências coloniais não optaram por consolidar o seu controlo sobre a África subsariana? A resposta mais
convincente tem a ver com a capacidade e não com a vontade. O desafio colocado pela África subsariana aos países europeus não
era diferente do desafio enfrentado pelos “governantes pré-coloniais em África [que tinham] lutado durante séculos para alargar
o seu poder53.” O autor defende que “o problema essencial que se colocava aos construtores do Estado em África, fossem eles os
reis pré-coloniais, os governadores coloniais ou os presidentes da época da independência, era o de projectar a autoridade em
territórios inóspitos com baixa densidade populacional54.”
Este argumento sugere que dificilmente seria expectável que os países europeus pudessem ser bem sucedidos na consolidação
das instituições de Estado apenas em algumas décadas, quando os governantes pré-coloniais fracassaram redondamente ou nem
sequer o tentaram fazer. Algumas características dos Estados coloniais podem estar relacionadas não apenas com os Estados pósindependência como também com as características de entidades políticas do período pré-colonial, sugerindo uma ainda mais
forte dependência da trajectória e persistência do desenvolvimento institucional na região. O afastamento entre os governantes
e a sociedade reflectiu-se no que Herbst (2000) designa como “a primazia do êxodo”, uma vez que os interesses dos governantes
e de alguns grupos sociais não podiam ser conciliados. O êxodo assumiu a forma de mobilidade, uma vez que a “migração para
fugir dos problemas sociais ou políticos era [...] comum entre as tribos Ioruba, Edo, Fon e muitas outras55.” A mobilidade resultou
no enfraquecimento dos governantes, tal como observa Barfield (1993), no caso das tribos do Sul do Sudão, “os poderes do chefe
Dinka eram fracos [...] porque em vez de se submeterem à sua autoridade, os grupos dissidentes podiam deslocar-se para um novo
território se não estivessem satisfeitos56”.
A perspectiva de êxodo através da migração reduziu consideravelmente as oportunidades para os governantes aumentarem os
recursos a partir da comunidade governada, dado que “uma população dispersa e móvel tem menos possibilidades de gerar quer
os recursos de que dependem as instituições governamentais permanentes quer as estruturas e valores sociais necessários para
as manter57.” Esta dificuldade inerente determinou a extroversão, até em instituições pré-coloniais, a qual obteve recursos do
exterior, através de um comércio de longa distância. A extroversão pré-colonial teve no comércio esclavagista a sua forma mais
distintiva. Os escravos para venda provinham quer do seio da comunidade, onde as pessoas podiam ser condenadas com base
em acusações produzidas arbitrariamente pelas instituições judiciárias58, quer através de ataques contra as comunidades vizinhas,
minando a confiança e o capital social.
A forma trágica da extroversão pré-colonial teve consequências institucionais duradouras para os países da África subsariana, as
quais podem, mais uma vez, estar relacionadas com a actual fragilidade das suas instituições de Estado. Nunn (2008) demonstra
que o comércio esclavagista prejudicou o desenvolvimento económico dos países da África subsariana, com efeitos negativos nas
instituições de Estado. O comércio esclavagista favoreceu a desconfiança nas instituições de Estado e a consolidação das identidades
étnicas com forte dimensão local, o que impede o bom funcionamento da relação entre o Estado e a sociedade quando o primeiro
é fraco à partida.59
51
52
53
54
55
56
57
58
59
Herbst 2000, pág. 72.
Herbst 2000, pág. 78.
Herbst 2000, pág. 35.
Herbst 2000, pág. 11.
Herbst 2000, pág. 39.
Barfield 1993, pág. 38.
Clapham 1996, pág. 28.
Nunn 2008.
Collier 2009b; Kaplan 2009.
58
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
As origens históricas da fragilidade dos Estados
Uma recente contribuição de Nunn e Wantchekon (2009) demonstra igualmente que o comércio esclavagista exerceu um impacto
negativo duradouro no capital social, uma vez que a “confiança das pessoas nos seus familiares, vizinhos e governo local é pouca
se os seus antepassados tiverem sido profundamente ameaçados pelo comércio esclavagista60”, o que pode ampliar os efeitos
adversos da fragilidade do Estado. Nunn e Puga (2009) demonstram que o comércio esclavagista fez com que as dificuldades do
terreno se transformassem numa bênção disfarçada para os países da África subsariana: embora tenha um efeito directo negativo
para o desenvolvimento económico, o seu efeito indirecto, e o mais importante, consistia em proteger as populações dos ataques
dos comerciantes de escravos.
7. CONCLUSÕES
A concentração geográfica dos Estados frágeis da África subsariana sugere a existência de causas
profundas que são comuns à situação de fragilidade e que interagem com os factores específicos de
cada país. Os argumentos analisados no presente capítulo corroboram a existência de factores históricos
que estabeleceram a base para a fragilidade das instituições de Estado. A formação de Estados coloniais
na época da Partilha de África introduziu algumas características institucionais que ainda persistem nas
estruturas de Estado actuais. Nem a conquista da independência política nem as décadas decorridas
desde essa altura alteraram significativamente a evolução altamente dependente da trajectória dos
Estados da África subsariana.
Embora tenha tido, provavelmente, um papel essencial, o período colonial não esgota os factores históricos que afectaram a
fragilidade das instituições de Estado na África subsariana, uma vez que a época pré-colonial teve igualmente influência no posterior
desenvolvimento institucional da região. Os períodos pré-colonial e colonial produziram efeitos duradouros não apenas na estrutura
formal das instituições de Estado mas também noutros factores sociais que determinam a fragilidade ou a solidez de uma política.
Mais precisamente, a definição de etnicidade foi profundamente moldada pelo comércio esclavagista na era pré-colonial e pela
sua importância social crescente e reforçada nas administrações coloniais.
Se bem que a história seja importante para explicar a fragilidade dos países subsarianos, a análise do presente capítulo não
permite um percurso determinístico entre a história da África subsariana e a difusa fragilidade de Estado actual. A diversidade
do desenvolvimento específico das instituições de Estado em cada país sugere que podem nascer Estados eficazes mesmo num
contexto onde as probabilidades podem ser reduzidas por factores históricos ou geográficos, conclusão essa que não deveria
colocar expectativas demasiado optimistas no reforço das capacidades dos Estados da África subsariana.
60
Nunn e Wantchekon 2009, pág. 43.
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Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 4
CAPÍTULO 4
OS FACTORES ECONÓMICOS PODEM AUMENTAR A FRAGILIDADE
A evolução da fragilidade dos Estados não é uma simples sucessão de causas e efeitos ou o resultado de
um factor isolado, antes é afectada pela interacção e pelos resultados combinados de todo um conjunto
de riscos e pressões, mecanismos virtuosos e janelas de oportunidade acumulados que influenciam o
funcionamento e a legitimidade do aparelho de Estado. As instituições públicas actuais resultam das
origens históricas da formação dos Estados e das suas interacções com outros elementos, como as
características geográficas e os grupos populacionais étnicos e religiosos.
A sua evolução ao longo dos tempos, por seu turno, está associada a factores económicos exógenos e endógenos que, pela sua
inserção no contexto institucional, podem acentuar a fragilidade dos Estados. Esta combinação pode conduzir as instituições públicas
para uma espiral descendente onde as suas capacidades são progressivamente colocadas em risco. Mas também pode reforçar o
Estado ao promover a estabilidade, a legitimidade e a responsabilidade políticas. Reformas, políticas de desenvolvimento, forças
e choques económicos externos, dependendo do legado histórico e dos compromissos dos governos nacionais e das instituições
internacionais, podem ser factores de fragilidade, mas também uma plataforma para sair da fragilidade1.
1. OS FACTORES ECONÓMICOS INFLUENCIAM A FRAGILIDADE DOS ESTADOS
E A FRAGILIDADE INFLUENCIA A ECONOMIA
O rumo e o nível de desenvolvimento económico podem afectar a situação de fragilidade de um país,
mas também podem resultar dessa situação2. As relações económicas diferenciam os interesses e os
incentivos à cooperação ou à concorrência, articulando a sociedade em grupos sociais distintos. Além
disso, a acumulação de recursos para a construção do Estado e para a partilha social interna é afectada
pelo padrão de desenvolvimento económico. Por exemplo, muitos Estados pós-coloniais, numa tentativa
de se libertarem dos antigos colonizadores que adquiriam os seus produtos (garantindo mercados de
exportação), implementaram políticas introspectivas de substituição das importações, o que se traduziu
frequentemente no aumento do papel do Estado de uma forma pouco optimizada.
O presente capítulo analisa os processos económicos que caracterizam os Estados frágeis e que estão associados a sintomas de
fragilidade dos Estados, desde governação fraca e corrupção até comportamentos predatórios e conflitos. Também analisa a forma
como estes factores podem interagir e tornar os Estados mais frágeis ou criar círculos virtuosos de instituições mais sólidas e com
um crescimento mais rápido. O objectivo consiste em salientar a escolha do momento e a consistência temporal na abordagem
dos diferentes aspectos da fragilidade. Mais precisamente:
• A abertura comercial interage com a fragilidade através dos potenciais ganhos do comércio que podem ajudar os países a saírem
de uma situação de fragilidade para uma situação de resiliência, mas também através do valor dos recursos em causa, dos custos
de oportunidade de contestação e das oportunidades de concertação entre os agentes privados e os funcionários públicos.
• O Investimento directo estrangeiro (IDE) pode forçar a competitividade na economia local através do reforço da eficiência na
afectação dos recursos internos e da redução dos rendimentos e dos efeitos colaterais negativos para a governação pública.
Neste caso, o IDE tem um impacto positivo no crescimento, dependendo da extensão do sector e do emprego a nível nacional
mobilizado. Sem regulação e incentivos adequados, no entanto, os investidores estrangeiros podem contribuir para a má
governação e a corrupção ou participar directa ou indirectamente na “economia de guerra” e no financiamento dos senhores
da guerra e dos conflitos civis.
• A riqueza dos recursos naturais pode ajudar as instituições públicas a desempenharem as suas funções, com os impostos da
extracção de recursos a contribuírem significativamente para as receitas públicas dos Estados frágeis (capítulo 2). Mas os Estados
frágeis também podem cair em círculos viciosos associando a gestão dos recursos às capacidades deficitárias do Estado: a
1
2
Fosu 2009.
Robinson (2009) argumenta que o Botswana constitui um exemplo interessante das interacções virtuais entre desenvolvimento económico e consolidação do
Estado. Na sequência da independência, em 1996, o Botswana dispôs de condições iniciais idênticas às de outros países subsarianos que prosseguiram uma
trajectória económica e uma formação de Estado menos bem sucedida e menos pacífica. Partilhava com esses países uma pobreza extrema, iliteracia global,
infra-estruturas débeis, uma herança colonial e diversos grupos étnicos. O país estava bem dotado de gado, como o Sudão e a Somália, e de diamantes, como
Angola e a Serra Leoa. De acordo com Robinson, a formação do Estado moderno, alicerçado num “longo processo de formação do Estado e de instituições
herdados dos estados Tswana”, pode explicar o sucesso do Botswana e demonstra o papel decisivo das instituições do Estado no desenvolvimento económico
e na eficácia das políticas económicas e paradigmas.
60
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Os factores económicos podem aumentar a fragilidade
“maldição dos recursos naturais”. A abundância de recursos tem um efeito positivo no crescimento nos países com instituições
sólidas e um efeito negativo naqueles que possuem instituições fracas3. Assim, uma vez que os Estados frágeis são caracterizados
por instituições fracas, é mais provável que os recursos naturais sejam uma maldição para esses Estados e não para outros
países africanos, onde os recursos naturais podem contribuir para o crescimento baseado nas exportações. Os compromissos
intertemporais são extremamente relevantes nesta situação. Os recursos naturais proporcionam rendimento imediato, muitas
vezes à custa de um menor rendimento no futuro. A gestão eficiente dos recursos necessita, assim, de um horizonte a longo
prazo, o que não é fácil para governos que podem ser ilegítimos ou estar em risco de destituição.
• As mudanças drásticas no acesso aos recursos dos solos e hídricos têm implicações para a sustentabilidade ambiental, a
segurança alimentar e a correlação de poderes. Estreitamente ligados ao comércio e ao IDE, estes factores podem moldar a
estabilidade social, a fragilidade do Estado e o crescimento económico.
• A gestão da segurança alimentar é uma função essencial do governo, pelo que a fragilidade tem consequências para a segurança
alimentar. As percepções da incapacidade ou falta de vontade do Estado para resolver o problema crónico da insegurança
alimentar ou para proteger os cidadãos contra choques alimentares podem afectar a confiança nas instituições públicas e,
consequentemente, a legitimidade do governo.
2. A ABERTURA COMERCIAL PODE AUMENTAR OU REDUZIR A FRAGILIDADE
DOS ESTADOS
Embora a fragilidade dos Estados possa influenciar a eficiência da abertura comercial sobre os
resultados económicos, o comércio internacional pode ter um impacto sobre a fragilidade. O primeiro
efeito da abertura comercial é a alteração da estrutura dos preços relativos dos serviços e mercadorias
comercializados com o resto do mundo.
INum contexto de governação e execução da lei deficientes, a abertura comercial interage com a fragilidade para originar
consequências ao nível da distribuição, dinamiza o crescimento económico e afecta o valor dos recursos em causa, as oportunidades
de corrupção, os custos de oportunidade dos conflitos, as opções entre actividades produtivas e predatórias e as margens de
maximização do rendimento.
Num contexto institucional bem definido, onde o Estado garante a segurança, os direitos de propriedade e a execução dos contratos,
a abertura comercial proporciona normalmente ganhos globais. Mas em contextos institucionais fracos, a situação é diferente. E
mesmo quando existem potenciais ganhos agregados provenientes do comércio, a sua distribuição pode estar na origem de conflitos
e desestabilização, nomeadamente quando as instituições nacionais de gestão de conflitos não existem ou foram desmanteladas.
Além disso, a estrutura da vantagem comparativa do país pode afectar esta dimensão. Na verdade, a exclusão de alguns grupos
ameaçadores da partilha de recursos do Estado é mais provável quando o país depende de recursos naturais de “fontes pontuais”
(combustíveis, minerais e cultivo de plantações como açúcar e algodão) do que da produção e difusão de exportações agrícolas
(animais e produtos agrícolas provenientes de pequenas quintas familiares, como arroz e trigo)4. Abundam exemplos como a guerra
do Biafra na Nigéria no final da década de 1960 e as guerras civis em Angola e na República Democrática do Congo. Pelo contrário,
quando a produção e os benefícios são amplamente distribuídos pelas zonas geográficas, grupos étnicos ou centros urbanos, as
hipóteses de violência civil parecem ser muito reduzidas.
A abertura pode igualmente reforçar as relações verticais entre o Estado e a sociedade. A abertura comercial, por exemplo, pode
interagir com a natureza das instituições públicas e o tipo de políticas de redistribuição escolhidas pelas elites. No entanto, também
pode enfraquecer as ligações económicas nacionais entre os grupos de elites e outros grupos sociais. Este facto, por seu turno,
pode influenciar negativamente as elites no sentido de não investirem em bens públicos locais ou favorecer políticas ineficazes
em termos de maximização de rendimentos5.
3
4
5
Mehlum et al. 2006.
Isham et al. 2005.
Segura-Cayuela (2006) apresenta um exemplo. Quando as elites políticas não demonstram vontade de contribuir para o fornecimento de bens públicos e não
possuem capacidade de Estado para aumentar os impostos, procuram normalmente captar recursos através da distorção dos preços. Mas o âmbito destas
políticas de apropriação está limitado pelo facto de as receitas das próprias empresas das elites poderem, de algum modo, ser complementares da produção
dos grupos sociais não pertencentes às elites. Nesse contexto, a abertura comercial reduz os custos de oportunidade de políticas de preços apropriativas.
Na realidade, com a integração comercial, os produtos dos preços tendem a ser estabelecidos fora da economia nacional, eliminando, de certo modo, os
benefícios retirados pelas elites das distorções que impõem à economia local. Este aspecto, por sua vez, leva-os a manipular os preços internos relativos
de forma intensiva a fim de extraírem receitas dos sectores da sociedade não pertencentes a elites. Esta argumentação sugere que a integração comercial
pode ter consequências negativas em países caracterizados por uma fraca participação política e uma certa insensibilidade das elites para com o resto da
sociedade.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 4
Diversas análises investigaram a evidência empírica das ligações entre a integração comercial e a emergência de conflitos internos
e guerras civis. Chauvet et al. (2007) consideram o comércio como uma motivação para guerras civis ou um meio de financiar a
rebelião. Na verdade, existem forças que empurram em direcções opostas: algumas reduzem o risco de guerras, devido ao elevado
custo de oportunidade dos conflitos, mas outras aumentam esse risco, uma vez que o comércio proporciona fontes alternativas
de consumo e rendimento à produção interna, a qual pode ser destruída pela guerra.
Estudos transfronteiriços quantitativos recentes indicam que os países abertos são mais estáveis do que os países auto-suficientes,
bem como menos propensos a guerras civis, embora sejam detectados compromissos importantes. Martin et al. (2008) consideram
que a integração comercial pode ter um efeito dissuasor sobre as guerras caso os ganhos provenientes do comércio sejam colocados
em risco durante uma guerra civil. Mas a abertura também pode funcionar como um mecanismo de segurança e reduzir os custos
de oportunidade das guerras. Mais precisamente, a abertura comercial tem efeitos opostos sobre a probabilidade de ocorrência
de guerra civil: pode ter um efeito dissuasor sobre as mais intensas (as que destroem o maior volume de comércio) mas pode
aumentar o risco de conflitos em pequena escala.
Centrando a atenção na África subsariana e analisando os efeitos da abertura comercial e da liberalização sobre o surto de guerras
internas em 37 países entre 1980 e 2000, Bussman et al. (2005) consideram que a abertura comercial tem um efeito positivo na paz
e na estabilidade, uma vez concluída a reestruturação da economia. No curto prazo, contudo, a liberalização do comércio pode
aumentar o risco de guerra civil e conflito durante a implementação das reformas.
O debate que se segue sugere compromissos políticos entre os riscos a curto prazo da reforma comercial e os ganhos a longo
prazo da abertura comercial, bem como a prevenção de conflitos graves e os riscos persistentes de tensões em menor escala. Uma
solução possível para esses compromissos poderá ser a compensação dos perdedores imediatos a fim de reduzir os riscos a curto
prazo da instabilidade política e permitir tempo suficiente para que a economia atinja a situação a longo prazo em que um número
suficiente de pessoas beneficie da reforma.
3. LIGAÇÕES BIDIRECCIONAIS ENTRE O INVESTIMENTO DIRECTO ESTRANGEIRO
E A FRAGILIDADE
Embora a literatura reconheça o impacto negativo de uma má governação interna e da corrupção nos
fluxos de investimento directo estrangeiro, estudos recentes fornecem algumas indicações empíricas do
efeito inverso do IDE sobre as estruturas de governo do país de acolhimento e as manifestações extremas
de fragilidade do Estado: conflitos e guerras civis. As pesquisas recentes não forneceram evidências
empíricas conclusivas quanto à relação entre o investimento directo estrangeiro e os conflitos. Polachek
et al. (2005)6 concluíram que o IDE reduz a probabilidade de conflitos internacionais e que este tipo de
investimento e o comércio se complementam na redução de conflitos, enquanto Gissinger e Gleditsch
(1999)7 sugerem que nos países mais pobres o IDE tem efeitos positivos no bem-estar económico, mas
tem efeitos negativos na distribuição e na estabilidade política. Barbieri e Reuveny (2005)8, por seu turno,
consideram que, nos países menos desenvolvidos, o IDE reduz a duração das guerras civis, mas não a
probabilidade do seu início.
A literatura empírica não fornece uma base definitiva para a hipótese de uma ligação positiva entre o IDE e outra dimensão da
fragilidade dos Estados, por exemplo, a corrupção. Uma recente análise transnacional realizada por Larrain e Tavares (2008) sugere
que o IDE reduz significativamente a corrupção no país de acolhimento e os seus resultados reforçam a inclusão de diversos
determinantes de abertura como complemento à intensidade do comércio e à taxa média dos direitos aduaneiros, incluindo a
dependência dos recursos naturais, o fraccionamento étnico e a dimensão da economia e da despesa pública9. No entanto, a relação
entre o IDE e a corrupção pode depender do nível de desenvolvimento e de democracia do país de acolhimento. Zhu (2007)10, por
exemplo, fornece uma base empírica para a perspectiva de que os fluxos de IDE podem reduzir a corrupção nas democracias mais
desenvolvidas e aumentar a corrupção nos países não democráticos menos desenvolvidos.
Embora não sejam definitivos, estes resultados salientam os desafios das políticas de IDE. Em primeiro lugar, poderá ser necessário
ultrapassar a fragilidade do Estado e criar instituições democráticas sólidas para obter os benefícios económicos do IDE. Em segundo
lugar, embora a abertura ao IDE em contextos de fragilidade possa reduzir os riscos de conflitos internacionais, também é necessário
6
7
8
9
10
Polachek et al. 2005.
Gissinger e Gleditsch 1999.
Barbieri e Reuveny 2005.
Ver Larrain e Tavares 2007.
Zhu 2007.
62
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Os factores económicos podem aumentar a fragilidade
algum tipo de regulamentação para promover a qualidade do investimento em detrimento da quantidade. Um aspecto claramente
importante para o contributo do IDE para a economia local é a existência de um quadro jurídico e contabilístico que promova a
transparência e a responsabilidade junto dos países de origem dos investidores.
O conhecimento da relação entre o IDE e a fragilidade dos Estados pode advir de uma observação mais atenta dos principais
destinatários dos fluxos de IDE na África subsariana. Em apenas 13 dos 29 países frágeis da África subsariana, o peso dos fluxos
de IDE no PIB é superior à média da África subsariana (já de si baixo, situado nos 3,2%, em comparação com os 4,8% do Sudeste
Asiático). Muitos desses países são ricos em petróleo e recursos naturais (Angola, Chade, República do Congo, Guiné Equatorial,
Nigéria, São Tomé e Príncipe, Serra Leoa e Sudão)11. Assim, para uma percepção do impacto do IDE na fragilidade dos Estados, é
necessário compreender primeiro a questão da afectação dos recursos naturais.
Enquanto o IDE pode potencialmente ter um impacto positivo no crescimento e na redução da pobreza, os impactos externos
negativos prevalecem quando a qualidade das instituições é fraca, aumentando a probabilidade de conflito e má gestão. O círculo
vicioso resultante amplia o impacto do IDE sobre a fragilidade. Para transformar este círculo vicioso num círculo virtuoso, os governos
(se forem legítimos) devem comprometer-se a uma distribuição justa dos rendimentos através da imposição de restrições à sua
actuação. Mas a fraca credibilidade dos governos dos países frágeis torna improvável a criação de um círculo virtuoso, a menos
que os agentes externos (por exemplo, organizações internacionais) promovam e garantam os compromissos.
4. A AFECTAÇÃO DOS RECURSOS NATURAIS PODE PIORAR A GOVERNAÇÃO
A abundância de recursos naturais constitui uma excelente oportunidade para o desenvolvimento
económico e a consolidação do Estado. Um Estado rico em recursos possui os fundos necessários para
construir capacidade de execução das suas funções, nomeadamente para financiar a despesa pública com
vista ao desenvolvimento económico e à redução da pobreza. Mas alguns mecanismos perversos podem
colocar em risco este processo: a dependência dos recursos pode criar instabilidade económica, a qual,
por seu turno, pode gerar instabilidade política. A abundância de recursos naturais pode efectivamente
obstar à qualidade da governação, uma componente essencial do funcionamento do Estado, e dessa
forma aumentar o risco de fragilidade do Estado. Mas para que a abundância de recursos seja traduzida
num bom desempenho económico global e padrões de vida mais elevados, a importância de uma boa
governação é talvez ainda maior do que em economias com poucos recursos. Esta interacção entre
afectação dos recursos e fraca governação pode levar a fragilidade do Estado num percurso perverso.
Os recursos naturais podem, assim, ser uma bênção ou uma maldição para os países ricos em recursos12. Estudos empíricos confirmam
que os recursos pontuais e os rendimentos dos recursos aumentam a corrupção e retardam o desenvolvimento económico e
institucional. Uma vez que diversos países frágeis possuem grandes afectações de recursos naturais e baixos níveis de governação,
é necessário determinar a forma como a abundância de recursos naturais pode ampliar a fragilidade dos Estados (ou o que pode
ser feito para seleccionar as oportunidades proporcionadas pelas afectações de recursos e transformar a economia numa economia
dinamizada pelas exportações).
O desenvolvimento de um depósito de recursos naturais, desde a prospecção até à extracção e à gestão dos rendimentos, está
ligado à responsabilização do governo. A abundância de recursos aumenta as oportunidades de retirar os recursos aos governos
em exercício (ver capítulo 2). A maximização dos rendimentos pode assumir diferentes formas: desde a corrupção ao roubo e ao
conflito. Os rendimentos dos recursos podem efectivamente levar à destituição do governo através da insurreição a nível regional
ou nacional. Uma vez que as alterações dos preços dos produtos de base afectam a incidência e a duração das guerras civis, o
debate mais recente centrou-se nos canais de produtos de base para afectar o risco de conflito13.
• Em primeiro lugar, as exportações de produtos de base podem financiar a escalada e a sustentabilidade de rebeliões.
• Em segundo lugar, as rebeliões podem ser motivadas pelo desejo de captar rendimentos, mais fácil num contexto marginal
como o gerado por um conflito.
• Em terceiro lugar, os recursos naturais aumentam a probabilidade de guerras separatistas.
11
A percentagem de IDE no PIB destes países varia entre 5% em Angola e 27% na Guiné Equatorial.
Ver os documentos de apoio de Collier (2009) e Collier e Venables (2009) para uma análise exaustiva desta questão.
Nom,E-mail,Remarques,Section
- Description,Section
1 - E-mail,Section 1 - IM,Section 1 - Téléphone,Section 1 - Portable,Section
13
Ver o documento de apoio de1Reynal-Querol
(2009).
12
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 4
A abundância de recursos também pode modificar os interesses e comportamentos do governo em exercício. A governação
pode deteriorar-se de várias formas:
• Os rendimentos dos recursos podem reduzir a responsabilidade eleitoral num sistema democrático se o governo utilizar alguns
desses fundos para manter o poder através de mecenato. A compra de votos é uma forma mais directa de conseguir o divórcio
entre eleições e responsabilização. Deste modo, os rendimentos dos recursos podem enfraquecer o papel das eleições e tornar
a manutenção do poder mais apetecível para os governos.
• Num regime autocrático, os rendimentos dos recursos podem comprometer a eficácia da responsabilização, o que limita os
escrutínios e reduz assim a pressão sobre o governo para satisfazer as necessidades dos cidadãos.
• Os rendimentos dos recursos podem alterar as probabilidades da democracia face à autocracia.
• Também podem protelar as mudanças fundamentais de políticas gravemente disfuncionais.
O facto de a abundância de recursos tender a garantir rendimentos, nomeadamente nos países frágeis onde o Estado de Direito
não se encontra plenamente implementado, pode dar origem a um ambiente no qual é difícil conseguir um progresso económico
estável, um ambiente mais vulnerável à instabilidade política e social. A literatura actual demonstra amplamente que a dependência
dos recursos cria instabilidade económica e uma incapacidade para desenvolver estratégias ocupacionais não estritamente
relacionadas com os recursos naturais14.
Se o Estado for incapaz de estabelecer o quadro jurídico relativo às licenças de produção e exploração destinadas à extracção e
exploração dos recursos, é provável a ocorrência de erros de distribuição, maximização dos rendimentos e ineficiência. Os erros de
distribuição acontecem devido à distribuição espacial dos recursos naturais; a maximização dos rendimentos porque a propriedade é
conferida através de controlo físico do território; a ineficiência devido à incerteza quanto à manutenção do controlo. Se o controlo for
entendido como temporário, a iniciativa privada delapidará rapidamente os activos, mesmo que seja socialmente mais oneroso.
Uma outra consequência é que a inexistência de direitos de propriedade, muito comum nos países frágeis, interage com a falta de
informação. À semelhança da inovação, os incentivos à investigação são escassos, a menos que as descobertas sejam protegidas15.
É mais eficaz esperar que outros descubram os activos naturais e então assumir o seu controlo, mesmo que seja necessário recorrer
à violência. Assim, muitos recursos permanecem por descobrir.
Caixa 4.1: Códigos de conduta e a Carta dos Recursos Naturais
As autorizações internacionais através de códigos de práticas ou obrigações no âmbito de tratados podem ser importantes. São
exemplos a Iniciativa para a Transparência nas Indústrias Extractivas (EITI), o processo de Kimberly (que exige que os diamantes
comercializados sejam certificados como não provenientes de zonas de conflito) e a mais recente Carta dos Recursos Naturais.
A carta é um conjunto de princípios para os governos e sociedades sobre a utilização efectiva das oportunidades criadas pelos
recursos naturais. Tem por objectivo ajudar os governos e as sociedades dos países ricos em recursos não renováveis a gerir
esses recursos de uma forma que produza crescimento económico, promova o bem-estar da população e seja ambientalmente
sustentável. Visa igualmente assegurar que as oportunidades proporcionadas por novas descobertas e subidas dos produtos de
base não são desperdiçadas.
O que torna a Carta dos Recursos Naturais única é o facto de ser elaborada através de um processo participativo orientado pela
investigação académica.
“A Carta inclui doze preceitos [...] que sintetizam as opções e as estratégias propostas que os governos podem adoptar
com vista a reforçar as perspectivas de desenvolvimento económico sustentável a partir da exploração dos recursos
naturais16:
• O desenvolvimento dos recursos naturais deve ser concebido para assegurar o máximo benefício para os cidadãos do
país de acolhimento.
• Os recursos extractivos são activos públicos e as decisões quanto à sua exploração devem ser transparentes e sujeitas
a supervisão pública informada.
• A concorrência é essencial para proteger o valor e assegurar a integridade.
14
15
16
A maior parte da literatura centra-se no conceito de dependência de recursos e não apenas na disponibilidade, o que cria uma diferença entre países que
possuem uma economia mais diversificada e têm menor dependência dos recursos naturais.
O problema é análogo ao analisado em Dixit (1989) no que respeita ao IDE. Um exemplo recente são as bem sucedidas explorações de petróleo no Gana,
que se seguiram ao melhoramento dos direitos de propriedade.
Retirado de: http://www.naturalresourcecharter.org/index.php/en/the-precepts, acedido em 5 de Outubro de 2009.
64
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Os factores económicos podem aumentar a fragilidade
• Os termos fiscais devem ser sólidos perante as alterações das circunstâncias e devem assegurar que o país obtém o
máximo proveito dos seus recursos.
• As empresas do sector dos recursos naturais devem ser competitivas e não devem exercer funções de regulação ou
outras actividades.
• Os projectos de exploração de recursos podem ter importantes efeitos sociais e ambientais que devem ser tidos em
conta e mitigados em todas as fases do ciclo do projecto.
• As receitas dos recursos devem ser utilizadas essencialmente para promover um crescimento solidário sustentado
através do apoio e manutenção de elevados níveis de investimento interno.
• A utilização eficiente das receitas dos recursos exige a redução gradual das despesas públicas e o atenuar dos fluxos
de receitas voláteis.
• Os governos devem utilizar a riqueza dos recursos para reforçar a eficiência e a eficácia das despesas públicas.
• Os governos devem investir numa forma que permita ao sector privado responder às mudanças estruturais da
economia.
• Os governos nacionais das empresas de extracção e os centros internacionais do capital devem exigir e aplicar as
melhores práticas.
• As empresas de extracção devem adoptar as melhores práticas internacionais em matéria de contratos, operações e
pagamentos.”
Vários estados frágeis da África subsariana adoptaram a EITI com o objectivo de melhorar a governação através da inspecção
e publicação integral dos pagamentos das empresas e das receitas governamentais decorrentes da indústria mineira, gás e
do petróleo. As empresas do sector mineiro, gás e petróleo acordaram apoiar a iniciativa. A adesão à EITI é um sinal sólido do
empenhamento do governo na transparência.
A nível interno, é possível criar mecanismos de compromisso através da formalização de contratos a longo prazo e da
criação de reputação. Também é possível estabelecer regras fiscais ao abrigo das quais uma parte das receitas é reservada
para utilização a longo prazo.
Na verdade, o Níger e a Libéria solicitaram aos seus parceiros da ajuda apoio técnico-jurídico em matéria de adjudicação de
contratos. Em Moçambique, o trabalho de análise está a promover o diálogo em matéria de gestão das despesas públicas
e responsabilidade financeira no contexto do aumento das receitas da extracção mineira.Alguns países solicitam apoio em
matéria de atribuição de licenças e negociação de contratos com grandes investidores, gestão de rendimentos de produtos
de base voláteis e optimização da composição e qualidade de investimentos públicos.
5. A GOVERNAÇÃO AFECTA A RELAÇÃO ENTRE A TERRA E A FRAGILIDADE
As alterações profundas no acesso à terra são normalmente influenciadas pela acção governamental.
Existe um vasto âmbito para reformas do regime de propriedade fundiária e políticas fundiárias
(tributação da propriedade fundiária, titulação e registo e regulação de mercados e contratos fundiários)
com vista a reduzir a pobreza, aumentar a produtividade agrícola e promover um ambiente sustentável.
Mas as políticas fundiárias não são imparciais e podem provocar tensões sociais. Os conflitos africanos
demonstram que as reformas mal concebidas do regime de propriedade tributária constituíram factores
subjacentes ou agravantes. A limitação do acesso às terras a vastos sectores da sociedade pode dar origem
a revoltas, frustração, insegurança alimentar e desequilíbrios no poder político17.
No Zimbabué, a reforma agrária teve início na década de 1980 e, posteriormente, o “rápido restabelecimento” teve impactos
profundos na agricultura, tendo como consequência perdas maciças de postos de trabalho, insegurança alimentar e reacções
violentas18. A terra constitui igualmente um problema noutros países que atravessam crises prolongadas, como a República
Democrática do Congo, a Somália e o Sudão19. Nas Montanhas Nuba, no Sudão, a promulgação da Unregistered Land Act (Lei relativa
17
18
19
Vlassenroot et al. 2006.
Sachikonye 2003; Pons-Vignon e Solignac Lecomte 2004.
Alinovi e Russo 2009.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 4
à propriedade fundiária não registada), em 1970, que aboliu os direitos consuetudinários de utilização das terras e forneceu uma
base jurídica para a aquisição de terras através de projectos de agricultura mecanizada em grande escala, resultou numa privação
extensiva dos direitos civis de pequenos agricultores e pastores nómadas: estima-se que metade da área total das planícies (os
melhores solos da região) foi obtida através dessa forma20.
Mais recentemente, emergiu na África subsariana um novo fenómeno com potenciais efeitos importantes no acesso e uso das terras.
Na sequência das crises alimentar e do petróleo, e apesar da crise económica e financeira, uma onda de aquisições de terrenos
de cultivo por investidores nacionais e estrangeiros deu origem a um debate intenso. Os governos e empresas privadas da China,
Emirados Árabes Unidos, Índia, Coreia do Sul e países da UE parecem ser os principais investidores nas terras de África. Mas a
imprensa internacional também mencionou negócios de terras em larga escala com outros países investidores, como os Estados
Unidos, a Líbia e o Egipto. Os dados preliminares21 sugerem que o IDE em terrenos africanos incide principalmente num pequeno
grupo de países (Sudão, Moçambique, Madagáscar e Etiópia). Mas a tendência é o alargamento a outras regiões do continente.
Registaram-se recentemente grandes investimentos em terrenos de cultivo em Angola, República Democrática do Congo, Gana,
Libéria, Nigéria e Tanzânia.
As consequências para a agricultura e a população africanas podem ser profundas, persistentes e não facilmente reversíveis. A
dimensão é ainda amplamente desconhecida porque as informações são limitadas qualitativa e quantitativamente e não são
fiáveis nem transparentes; no entanto, os dados disponíveis sugerem que este fenómeno não é marginal. Em apenas cinco países
africanos (Etiópia, Madagáscar, Mali, Moçambique e Sudão), foram aprovados 2,5 milhões de hectares em grandes22 negócios de
terras desde 2004 e os contratos pendentes farão subir estes números23. Ainda incipiente, esta onda de construção pode colocar
em risco o desenvolvimento de um país frágil. Nesse sentido, é importante controlar e evitar os possíveis efeitos negativos na
estabilidade social e na fragilidade dos Estados desta forma “especial” de IDE na agricultura.
A percepção da enorme disponibilidade e acessibilidade de terrenos de cultivo e de águas inexploradas em África despertou
interesses, mas as recentes tendências dos preços do petróleo e dos produtos alimentares e as reacções proteccionistas de alguns
dos principais exportadores de produtos alimentares foram o agente catalisador. A maior procura de produtos alimentares que
exigem técnicas de produção que requerem grandes parcelas de terrenos (tais como carnes e lacticínios), a procura crescente de
energias alternativas aos combustíveis fósseis, o agravamento da escassez de água para utilização produtiva e o crescimento lento
da produtividade agrícola, bem como reduções na produção agrícola em algumas zonas, são factores de pressão para a expansão
agrícola. Os importadores de produtos alimentares poderão ter alguma relutância em confiar a segurança dos seus produtos aos
mercados internacionais e o recurso à produção alimentar externa tornou-se uma estratégia nacional mais exequível.
A ligação entre o IDE, por um lado, e as políticas externas e os interesses nacionais, por outro, tem sido reforçada pelo crescente
envolvimento de empresas públicas e fundos soberanos nos mercados internacionais. Embora a maior parte dos negócios de
terrenos sejam realizados por investidores estrangeiros e privados e, em alguns países, a aquisição de terrenos tenha despertado
um interesse crescente junto dos investidores nacionais, os investimentos têm frequentemente apoio governamental e os dois
governos, local e de origem, promovem e apoiam grandes investimentos em terrenos24.
Muitos países africanos estão actualmente a tentar tirar partido do valor crescente dos solos e da água. É por este motivo que o
compromisso dos investidores em matéria de investimentos, infra-estruturas ou emprego é um requisito comum nos negócios de
terrenos. A ideia subjacente consiste em promover o desenvolvimento económico e reduzir a pobreza de um país através de uma
permuta de recursos abundantes com outros que escasseiam: terrenos por capital, infra-estruturas, tecnologias e competências.
Em muitos países africanos, nomeadamente nos países frágeis, a maior parte das pessoas vive em zonas rurais. O desenvolvimento
da agricultura pode permitir a redução da pobreza e o crescimento económico, enquanto os investimentos em infra-estruturas,
experiência e tecnologia podem ter repercussões positivas importantes.
20
21
22
23
24
Pantuliano 2008.
Estas indicações são baseadas em Cotula et al. 2009; von Braun e Meinzen-Dick 2009; GRAIN 2008.
Acima de 1000 hectares.
Cotula et al. 2009.
Cotula et al. 2009.
66
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Os factores económicos podem aumentar a fragilidade
Caixa 4.2: Aquisições de terra em larga escala em África – análise das transacções
de terrenos (Large-scale land acquisitions in Africa – unpacking the land deals)
Por Lorenzo Cotula, Investigador principal – Direito e desenvolvimento sustentável,
Instituto Internacional para o Ambiente e o Desenvolvimento
As transacções de terrenos são incorporadas num ou vários contratos, os quais devem ser examinados em conjunto com outros
documentos jurídicos que definem o seu contexto jurídico mais amplo, incluindo a legislação nacional e internacional. Os contratos
são complexos e diferem significativamente consoante os países e mesmo consoante os projectos. A identificação de tendências
nas práticas contratuais e a comparação de opções contratuais exigem um trabalho mais intenso. Mas a análise de um pequeno
número de contratos de África sublinha algumas questões importantes.
PARTES E ESTRUTURA GLOBAL
Na sua forma mais simples, os contratos de transacções de terrenos envolvem, pelo menos, duas partes. Uma das partes é o
comprador, normalmente uma empresa privada ou pública. Também pode tratar-se de um governo estrangeiro que adquire
terrenos directamente, por exemplo, ao abrigo de um “Acordo Especial de Investimento Agrícola” assinado entre a Síria e o Sudão,
em 2002. A outra parte é o fornecedor de terrenos, um governo ou, mais raramente, um proprietário privado.
Esta aparente simplicidade oculta alguma complexidade. Cada “transacção” pode envolver vários contratos e instrumentos
jurídicos, desde um contrato-quadro que estabelece os principais aspectos da transacção global e em que o governo do país de
acolhimento se compromete a disponibilizar os terrenos ao investidor, até instrumentos mais específicos (de natureza contratual
ou outra) que transferem efectivamente os terrenos, na totalidade ou em parte. A dimensão da forma como as transacções de
terrenos são negociadas ou normalizadas varia consoante os países e as diferentes fases de negociação, com tendência para
uma maior normalização dos instrumentos de atribuição de terrenos (como é o caso dos contratos de arrendamento do Office
du Níger no Mali).
Cada transacção envolve normalmente um vasto número de partes ao longo das diversas fases de preparação, negociação,
contratação e execução do projecto. Primeiro, são envolvidas várias agências do governo de acolhimento. Mesmo nos países onde
existe um ponto de contacto centralizado (balcão único) para potenciais investidores, normalmente uma agência de promoção
de investimentos, esta não tratará de todos os aspectos relacionados com as transacções de terrenos.
Os investidores privados dispõem da vantagem de poderem actuar como uma única entidade jurídica com um conjunto coerente
de valores. Mas mesmo neste caso o cenário pode ser mais diversificado. Entre os possíveis cenários, a execução de acordos
comerciais celebrados entre dois governos pode ser gerida por operadores privados, quer desde o início ou como parte de esforços
posteriores para ganhar maior dinamismo. Por exemplo, o acordo entre a Síria e o Sudão permite à Síria delegar a execução no
sector privado, desde que aprovado pelo governo do Sudão.
DIREITOS SOBRE OS TERRENOS TRANSFERIDOS, SALVAGUARDA DOS INTERESSES LOCAIS
Em África, os arrendamentos de terrenos predominam sobre as aquisições, com durações que variam desde prazos curtos
até 99 anos. Os governos de acolhimento tendem a desempenhar um papel fundamental na atribuição de arrendamentos,
designadamente porque possuem formalmente grande parte ou a totalidade dos terrenos. Neste sentido, é fundamental a forma
como os governos têm em conta os interesses locais na terra, na água e nos recursos naturais.
Mas os governos de acolhimento podem comprometer-se contratualmente a fornecer os terrenos antes de consultarem os seus
utilizadores locais. Além disso, a falta de transparência, controlo e equilíbrio nas negociações de contratos fomenta a corrupção e
a recolha dos benefícios pelas elites. Em Moçambique e noutros países a legislação nacional exige que os investidores consultem
a população local antes da afectação dos terrenos. No Gana, as transacções com líderes locais são frequentes. Mas, mesmo nesses
casos, as deficiências na aplicação dos requisitos legais e na responsabilização dos líderes locais são um problema recorrente.
A protecção dos direitos das populações locais sobre os terrenos é também fundamental. As legislações nacionais variam, mas
alguns aspectos recorrentes prejudicam a posição das populações locais. Esses aspectos incluem os direitos de utilização de
terrenos públicos, procedimentos de registo inacessíveis, a compensação apenas pela perda de melhoramentos como as colheitas
em vez dos terrenos e taxas de compensação desactualizadas. Por conseguinte, as populações locais têm perdas e mesmo os
investidores que pretendem seguir as boas práticas são prejudicados pela falta de orientações e procedimentos claros por parte
dos governos.
O EQUILÍBRIO ECONÓMICO DOS ACORDOS SOBRE TERRENOS
As despesas com as transacções de terrenos e outras transferências monetárias são normalmente pequenas ou inexistentes,
devido ao desejo de atrair investimento, evidentes baixos custos de oportunidade e falta de mercados de terrenos sólidos.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 4
Este facto, por si só, não significa que o acordo é desequilibrado: as vantagens para os países de acolhimento podem incluir
compromissos dos investidores em matéria de níveis de investimento e de desenvolvimento de infra-estruturas, por exemplo,
sistemas de irrigação.
Dada a importância dos compromissos de investimento no equilíbrio económico das transacções de terrenos, a sua execução
reveste-se de particular importância. A afectação de terrenos públicos está normalmente dependente do acordo dos
investidores com os planos de investimento para os primeiros anos do projecto, após o que a afectação é confirmada. Mas
os governos africanos utilizaram raramente este instrumento para responsabilizar os investidores, com uma redacção de
contratos não suficientemente específica para ser aplicável. E as avaliações únicas numa fase inicial de execução não permitem
o acompanhamento e a aprovação contínuos do desempenho do investimento durante a vigência do projecto.
Embora a estrutura das transacções de terrenos seja extremamente diversificada, uma pequena amostragem de contratos
sugere que ainda muito pode ser feito para reforçar áreas-chave que afectam o equilíbrio da economia, em especial
quando esses contratos são comparados com as práticas contratuais de outros sectores como o petróleo e o gás. Com
variações consideráveis de caso para caso, os contratos primam pela ausência de mecanismos sólidos que permitam
controlar ou aplicar a conformidade com os compromissos dos investidores, garantir benefícios para as populações locais,
promover a participação dos pequenos proprietários nas actividades de produção (por exemplo, através de contratos de
produção agrícola, cooperação voluntária com proprietários locais ou outras formas de produção colaborativa), maximizar
as receitas públicas e amenizar as preocupações em matéria de segurança alimentar tanto nos países de origem como nos
de acolhimento.
A modernização da agricultura pode ajudar os países africanos a ascenderem na cadeia de valor. O melhoramento da agricultura pode
promover a diversificação dos meios de subsistência, gerar emprego e dinamizar a produtividade agrícola (através de variedades
de sementes melhoradas, experiência e tecnologias). Os investidores em terrenos e as empresas agrícolas podem estimular ou
investir directamente em infra-estruturas, tecnologias e intervenções que permitam melhorar o acesso aos mercados e os impostos
e concessões agrícolas podem proporcionar receitas fiscais.
Os riscos, contudo, são preocupantes. As alterações registadas no acesso aos recursos dos solos e hídricos, na gestão dos recursos e
nas técnicas de produção podem afectar a sustentabilidade ambiental, a segurança alimentar, as estruturas do poder e a estabilidade
social, particularmente quando as transacções são dominadas por negociações desequilibradas. Existe o risco de perder o controlo
dos terrenos para vários sectores da sociedade, com repercussões negativas na segurança alimentar, na estabilidade social e nas
oportunidades de receitas e de trabalho local. A gestão dos terrenos por investidores estrangeiros pode dar origem a incentivos
perversos à utilização de técnicas de produção não sustentáveis; por outro lado, as negociações e transacções de terrenos podem
criar oportunidade de corrupção e de apropriação de ganhos privados em prejuízo dos interesses nacionais a longo prazo.
Em alguns países da África subsariana, é provável que as transacções de terrenos provoquem atritos entre as partes envolvidas (caixa
4.3)25. As aquisições tendem a realizar-se em zonas mais lucrativas com irrigação, acesso a água e infra-estruturas e próximas dos
mercados. As fontes de água e os solos mais produtivos destinados ao investimento não são os recursos “não utilizados”. Mesmo
quando estão classificados como “inactivos”, provavelmente já foram reclamados pelos anteriores utilizadores. Este fenómeno foi
documentado na Etiópia, na Tanzânia e em Moçambique26 e é consistente com o facto de que, em África, a utilização dos recursos é
subestimada porque a grande maioria dos utilizadores locais dos recursos não possui títulos de utilização formais, nomeadamente
nas zonas rurais. As técnicas de produção que não exigem a utilização contínua dos terrenos estão amplamente divulgadas (animais
de pastoreio, sistemas de cultivo de pousio longo). Por conseguinte, muitas pessoas dependem de recursos comuns com acesso
gratuito para assegurarem a sua subsistência.
As agências internacionais de desenvolvimento e a comunidade de investigação estão a trabalhar no sentido de prestar
aconselhamento e assistência às partes interessadas (investidores, governos, populações locais e sociedade civil) para concretizar
os benefícios potenciais do interesse renovado no investimento na agricultura. Mas esses esforços podem ter custos consideráveis
e os resultados são incertos.
Assegurar os efeitos sobre a redução da pobreza do investimento nacional e estrangeiro em terrenos de cultivo de África constitui
um enorme desafio, mais ainda nos países frágeis (quadro 4.1). Esses países têm uma fraca capacidade de negociação e pouca
capacidade para conciliar conflitos sobre recursos.
25
26
Esta caixa não reflecte as opiniões das organizações dos autores e estes são exclusivamente responsáveis pelo conteúdo.
Sulle 2009; Nhantumbo e Salomao 2009.
68
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Os factores económicos podem aumentar a fragilidade
Quadro 4.1: Assegurar os efeitos de redução da pobreza dos novos investimentos em terrenos
de cultivo
Condições para efeitos
sustentáveis de
redução da pobreza dos
grandes investimentos
em terrenos
Acções que podem ajudar a
satisfazer as condições
Definição clara e
reconhecimento dos
direitos pré-existentes de
utilização dos recursos
Registo fundiário dos recursos:
identificação dos recursos da
comunidade e utilização informal
dos recursos; envolvimento das
populações locais nos processos de
decisão.
Elaboração de contratos
que assegurem o
equilíbrio entre as
prioridades, perspectivas
e incentivos dos
investidores, dos
governos e das
populações locais.
Implementação de processos de
decisão transparentes e participativos.
Assistência técnica para a construção
de capacidade para a elaboração,
controlo e gestão de contratos.
Credibilidade e
aplicabilidade dos
compromissos pelos
investidores e pelos
governos de acolhimento.
Identificação e
compensação dos direitos
das pessoas afectadas
negativamente.
Criação de mais e
melhores oportunidades
de trabalho.
Observações
A maior parte da população africana não detém a
utilização formal ou o direito de propriedade dos
recursos naturais a que tem acesso. O registo fundiário
exige tempo e processos morosos que consomem
muitos recursos. A experiência internacional demonstra
que a má concepção da reforma do regime de
propriedade fundiária e dos programas de registo
podem excluir os grupos mais vulneráveis e criar
forças desestabilizadoras. A colaboração transparente
e informada das partes interessadas locais é
particularmente difícil em países com níveis de educação
baixos e contratos sociais frágeis entre os cidadãos e as
instituições públicas.
Ver observações supra.
Um dos principais obstáculos a esta condição é o
desequilíbrio de poder negocial e capacidade de
negociação entre os investidores, os governos e os
agricultores e as comunidades locais.
As populações locais não dispõem normalmente de
recursos humanos e financeiros para cumprir estas
condições.
Avaliações de base das condições
ambientais, sociais e económicas.
Acompanhamento do contrato pelas
instituições públicas ou por partes
interessadas internacionais.
Acções para assegurar a transparência
e a divulgação das informações.
Os governos destinatários podem não ter a capacidade,
os recursos fiscais ou a boa vontade necessários para
manter estruturas eficazes e impor ameaças credíveis de
punição em caso de não conformidade. Problemas de
informações assimétricas podem dificultar a definição,
avaliação e controlo da conformidade.
A sustentabilidade económica e financeira dos projectos
pode incentivar os novos investidores a anularem,
implícita ou explicitamente, os seus compromissos para
a implementação de normas de trabalho e técnicas de
trabalho intensivo. A sindicalização dos trabalhadores
pode ser contrária aos interesses da elite nacional.
Ver acções supra sobre elaboração
e execução de contratos. Reforçar
o envolvimento dos sindicatos e
representantes laborais.
Ver observações supra.
Os projectos agrícolas
devem aumentar a
produtividade e ser
ambientalmente
sustentáveis.
Ver acções supra. Criação e reforço
de instituições (legislação, agências
e estruturas) para a regulação e
supervisão do ambiente. Assistência
técnica aos novos investidores
e mecanismos para adoptar os
conhecimentos locais em matéria de
técnicas agrícolas.
Em muitas regiões de África, a terra tem baixa resiliência
à intensificação agrícola. Os investidores externos
poderão não ter um conhecimento adequado dos
ecossistemas e das práticas de produção sustentáveis a
nível local.
Contractos de produção agrícola, parcerias e sistemas de
contratos crescentes (contract growing) podem melhorar
a absorção dos conhecimentos locais e beneficiar a
partilha entre os investidores e as populações locais.
Porém, estes resultados podem ser colocados em risco
pelas assimetrias económicas e posições de poder das
partes envolvidas.
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69
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 4
A Europa pode apoiar iniciativas internacionais com vista a um Código de Conduta, mas também pode ajudar as populações e os
agricultores de África a usufruírem directamente do crescente valor dos terrenos de cultivo do continente africano no mercado
global actual, através do reforço da sua participação em programas a longo prazo que visam o desenvolvimento agrícola e a ajuda
aos pequenos agricultores. A Europa pode reforçar o seu papel como agente político e económico em negociações internacionais,
relações diplomáticas e nos mercados globais de produtos alimentares. Pode tentar incluir mecanismos que estimulem a procura de
terrenos, como controlos às exportações dos principais exportadores de produtos alimentares e políticas de energia que promovam
a utilização de biocombustíveis em detrimento da eficiência energética.
Caixa 4.3: Investimentos internacionais no Sudão: o “celeiro” da região árabe
(International investments in Sudan: the “breadbasket” of the Arab region)27
Por Aysen Tanyeri-Abura e Nasredin Elaminb a Northeastern University, Boston; b Organização para
a Alimentação e Agricultura (FAO), Direcção Regional para o Próximo Oriente e Norte de África.
O Sudão é considerado desde há muito o “celeiro” da região árabe e um destino para o investimento agrícola, nomeadamente
de países árabes. Com uma superfície de 2,5 milhões de quilómetros quadrados, é o maior país de África e um dos poucos da
região que ainda possui potencial de solos e aquífero inexplorado. Localizado estrategicamente, faz fronteira com nove países
africanos e fornece acesso ao mar para vários desses países. A população é jovem, resultado do rápido crescimento populacional
nos últimos 30 anos. Mas a riqueza de recursos do Sudão é ensombrada pela disseminação da insegurança alimentar e da pobreza
(21% dos sudaneses sofriam de subnutrição em 2003-2005; FAO, 2008).
Algumas tendências recentes dos países árabes em matéria de investimento agrícola estão a influenciar o ritmo e a
natureza dos fluxos de capital para o Sudão.
• A agricultura e a água estão a emergir como novas classes de activos para fins de investimento devido a mudanças
políticas radicais na Arábia Saudita e às preocupações dos países do Golfo após as subidas dos preços dos produtos
alimentares e dos embargos às exportações em 2007, acompanhadas pela queda dos preços do petróleo.
• A maior parte dos investimentos resulta de iniciativas do sector privado, embora o Estado tenha uma forte presença
em termos de apoio e fomento.
• O Sudão, com um dos mais elevados níveis de insegurança alimentar na região árabe, é também o destino da maior parte
desses investimentos. Mais de 50% dos acordos de investimento em terrenos na região são realizados no Sudão.
• Os investimentos e as fusões recentes contribuíram para o aumento do investimento na região, bem como para o aumento
do comércio intra-regional entre os países árabes. Além disso, os novos blocos comerciais nos sectores da alimentação e
do petróleo, como o Conselho de Cooperação do Golfo (CCG) e a Associação das Nações do Sudoeste Asiático (ANASE)28,
podem criar outros acordos comerciais para facilitar investimentos futuros na agricultura e produtos alimentares.
Estes desenvolvimentos têm implicações políticas. Deve ser prestada especial atenção às opções de investimento sustentável
e a uma perspectiva de longo prazo. Numa região com escassez de água e confrontada com a impossibilidade de se tornar
auto-suficiente, a aprendizagem com as decisões políticas do passado deve constituir uma prioridade.
O Sudão pode ser relativamente rico em recursos dos solos e hídricos, mas as previsões indicam que a bacia do rio Nilo será
uma região com escassez de água em 2025 (Revenga et al., 2000). A Arábia Saudita tem tido experiências negativas com as
suas próprias políticas em matéria de auto-suficiência alimentar, com um grave esgotamento dos recursos (Elhadj, 2008).
Embora o aumento do investimento na agricultura e na produção alimentar seja essencial para resolver os problemas de
segurança alimentar no Sudão, os investimentos insustentáveis terão impactos negativos para ambos os países, investidor
e destinatário, bem como para todas as partes interessadas envolvidas.
A escassez de informações pormenorizadas e actualizadas impossibilita uma análise exaustiva da estrutura e desempenho
do investimento directo estrangeiro (IDE) na agricultura sudanesa.
27
28
Esta caixa não reflecte as opiniões das organizações dos autores e estes são exclusivamente responsáveis pelo conteúdo.
A CCG e a ANASE anunciaram, em 30 de Junho de 2009, que pretendem formar um novo bloco comercial de produtos alimentares e petróleo, nomeadamente
arroz dos países da ANASE e energia e produtos petroquímicos dos países do Golfo (Reuters, 2009)..
70
Os factores económicos podem aumentar a fragilidade
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Vale a pena atentar em algumas observações sobre os fluxos de IDE na agricultura do Sudão:
• O IDE na agricultura tem sido escasso até recentemente, com uma média inferior a 1% do seu valor total.
• A maior parte desse investimento em agricultura no Sudão destina-se à pesquisa de recursos (quadro da caixa 4.1)
Os investimentos no Sudão podem ser resumidos do seguinte modo:
Quadro da caixa 4.1: Afectação de terrenos agrícolas no período 2000-2008
(autorizações acima de 1000 hectares)29
Investidores
estrangeiros
Arábia Saudita
Emirados Árabes Unidos
Coreia do Sul
Egipto
Outros
Local
Investimento total
Investimento total
(hectares)
Envolvimento em parceria
(hectares)
713 010
706 640
365 190
71 820
84 000
5 500
186 500
2 363 000
3 782 650
48 300
32 340
500 000
126 000
Fonte: Estimativas do autor baseadas em comunicações com o Ministério do Investimento do Sudão
• Embora a parte no total do IDE seja pequena, o IDE na agricultura continuou a aumentar ao longo da última década. O IDE
na agricultura do Sudão cresceu a uma média de 23% entre 2000 e 2008, embora corresponda a uma pequena parte,
cerca de 2%, do IDE total (Nur, 2009). O IDE atingiu 17% do investimento total em 2009 e espera se que aumente para
50% em 2010 (Reuters, 2008)
• O IDE intra-árabe constitui a grande fatia de IDE no Sudão, cerca de 93% de todos os investimentos, dos quais 38% da
Arábia Saudita.
• O IDE árabe na agricultura do Sudão remonta à década de 1970 com a implementação de grandes projectos, através da
Autoridade Árabe para o Investimento e Desenvolvimento e outras iniciativas dos sectores público e privado. A Kenana
Sugar Company é um exemplo30. Os impactos destes investimentos foram positivos e negativos.
• No Sudão, a quase totalidade do IDE concentrou-se nas três regiões mais desenvolvidas, Cartum, rio Nilo e Gezira, com
86% de todos os projectos de investimento, e sobretudo na agricultura primária (Nur, 2009). As políticas devem dar uma
resposta às disparidades regionais no investimento.
• A intensidade de capital do IDE no Sudão é particularmente elevada para investimentos árabes. Os resultados demonstram
igualmente que, embora 37% do total de projectos IDE e 41% do capital IDE total se encontrem na agricultura mista,
apenas 25% do número total de postos de trabalho IDE são criados por este subsector devido às técnicas elevadas de
produção capital-intensiva (Nur, 2009).
O quadro político e institucional é fundamental para a continuação dos fluxos de investimento, para fornecer os incentivos
correctos à afectação de investimentos, bem como para responder às preocupações nacionais em matéria de segurança
alimentar. A fim de colmatar a lacuna de recursos na agricultura, o Sudão empenhou-se na captação de investimento
estrangeiro, prestando menor atenção à maximização dos impactos positivos e às ligações nacionais desses investimentos
em termos de reforço da segurança alimentar.
29
30
Não estão realizados mais do que 10% dos negócios de terras (investidores estrangeiros). Foram encetadas negociações para cancelar cerca de 10% a 15%
dos negócios com investidores estrangeiros.
A Kenana Sugar Company foi criada no Sudão através de um financiamento público-privado de países árabes na década de 1970. Esta iniciativa aumentou
significativamente a capacidade de produção no país e expandiu a produção de açúcar, tornando o Sudão auto-suficiente em matéria de açúcar e mesmo
exportador deste produto. Mas outros impactos sociais e económicos na região decorreram igualmente de iniciativas públicas-privadas.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
71
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 4
O súbito influxo do investimento na agricultura motivou a aplicação de novas políticas. No caso específico dos investimentos
destinados à obtenção de recursos, como as novas aquisições de terrenos, entraram em vigor taxas de arrendamento e
outras políticas que regulamentam a utilização dos terrenos. A maior parte dos terrenos no Sudão é alugada a taxas anuais
que variam entre $2,7 e $35 por hectare, sendo mais frequentes as taxas mais baixas. Os acordos de arrendamento variam
casuisticamente. O governo sudanês estabeleceu diversas garantias para assegurar que a utilização dos terrenos está em
conformidade com as questões sociais e económicas. Por exemplo, os arrendamentos são estabelecidos inicialmente por um
período de três anos e depois prolongados de sete em sete anos até aos 99 anos. Existem igualmente requisitos específicos
para os investidores, que os obriga a construir estradas de acesso, fornecer electricidade e destinar 10-20% dos terrenos
investidos para utilização pelas comunidades locais (a negociar com as comunidades). 31
O Sudão continua a ser encarado como o celeiro da região árabe, com a maior parte do investimento recente em terrenos
a ser canalizado para este país. No entanto, a questão mantém-se: quais os produtos alimentares de base que podem ser
produzidos de forma rentável no Sudão, nomeadamente a longo prazo? Para responder às suas necessidades alimentares, a
prioridade dos investidores árabes é investir na produção de produtos alimentares de base, nomeadamente trigo. Dadas as
condições climáticas do país, continuam por investigar a capacidade de produção de trigo e a produtividade no Sudão. Além
disso, o Sudão tem terrenos aráveis de grandes dimensões, mas os recursos hídricos disponíveis poderão não ser suficientes
para responder às necessidades futuras de expansão tendo em conta o elevado número de recentes arrendamentos de
terrenos a investidores estrangeiros, sem que se tenha em consideração os impactos secundários desses investimentos
nas populações rurais e nas zonas urbanas densamente povoadas.
A avaliação da contribuição dos investimentos directos estrangeiros para a segurança alimentar não é uma tarefa fácil. Não só é
difícil prever o desenvolvimento futuro de qualquer investimento, como também se afigura uma tarefa dantesca responder às
preocupações das diversas partes interessadas (sector privado e governos dos países investidores e de acolhimento). A tudo isto
deve ainda acrescentar-se as diferentes preocupações em matéria de segurança alimentar e as diferenças entre os países em termos
de recursos e rendimentos. A fim de salvaguardar as preocupações das diversas partes, poderá ser útil desenvolver um quadro de
acção que saliente os aspectos específicos dos investimentos que devem ser avaliados para que os impactos negativos possam ser
minimizados no futuro e tornados mais sustentáveis. É igualmente importante ter em conta os investimentos anteriores da mesma
natureza e identificar as aprendizagens deles decorrentes.
6. POPULAÇÕES FAMINTAS E INSTITUIÇÕES FRÁGEIS
A insegurança alimentar, estreitamente associada à fragilidade do Estado, é claramente uma das principais
ameaças para os países africanos32. Aqui, a questão central reside na forma como a fragilidade institucional
amplia o risco de insegurança alimentar aguda e o que pode ser feito para concretizar o primeiro
Objectivo de Desenvolvimento do Milénio (reduzir para metade, até 2015, a proporção da população
afectada pela fome).
A recente crise alimentar revelou a extrema vulnerabilidade da segurança alimentar dos países frágeis da África subsariana a
choques externos, nomeadamente devido à baixa (e estagnada) produtividade da agricultura africana nas duas últimas décadas.
Esta estagnação da produtividade acompanhou o aumento da procura, por um lado, devido a factores internacionais (aumento
da procura na China e na Índia) e, por outro, ao aumento das populações, o que fragilizou ainda mais os importadores líquidos
de produtos alimentares dos países africanos e aumentou substancialmente a vulnerabilidade e a probabilidade de ocorrência
de uma crise alimentar33. A predisposição contra a agricultura originou um movimento de deslocamento para as zonas urbanas
e aumentou as desigualdades entre os meios rurais e urbanos. Este processo estimulou um aumento da violência e insegurança
política nas zonas urbanas, o que, por sua vez, aumentou os recursos para a resolução de problemas de segurança nas cidades
à custa do financiamento rural – um círculo vicioso. Além disso, a elevada migração para as cidades, associada ao investimento
limitado nas zonas rurais, implicou menor produção agrícola e consequente aumento das importações de produtos alimentares,
o que afectou ainda mais a capacidade de produção da agricultura.
Uma crise alimentar pode aumentar a fragilidade do Estado em termos de legitimidade, como aconteceu com os motins por
questões alimentares provocados pela recente escalada dos preços internacionais dos produtos alimentares. Mas esta situação
31
32
33
Comunicação pessoal, Ministro do Investimento do Sudão
A CNUCED (2009) estima que 300 milhões de africanos enfrentam fome crónica.
Os países africanos importam ainda produtos de primeira necessidade, como trigo e arroz (CNUCED 2009).
72
Os factores económicos podem aumentar a fragilidade
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
pode ser alterada caso os compradores líquidos de produtos alimentares se transformem em vendedores (como aconteceu na Ásia
Meridional e na Ásia Oriental durante a designada “revolução verde”). Os vendedores de produtos alimentares poderiam aumentar
as receitas e reduzir os custos desses produtos, contribuindo para a saída do estado de pobreza das populações dos Estados frágeis
e de outros países graças ao aumento da procura34. Mas para que o processo de multiplicação se inicie, os mercados devem começar
a funcionar adequadamente. Nos países frágeis, contudo, existem muitos obstáculos aos mecanismos de mercado, uma vez que os
agricultores enfrentam um acesso limitado ao crédito e custos elevados na obtenção de informações e na execução de contratos.
Com acesso deficiente a financiamento formal, os comerciantes negoceiam volumes pequenos, em áreas geograficamente fechadas,
e aumentam a probabilidade de preços voláteis.
Entre os países frágeis, os que se encontram em situação de conflito são os que apresentam maior risco de insegurança alimentar.
Estabelecer uma relação causal não é um processo linear, mas a instabilidade política surge frequentemente em países com
insegurança alimentar. Os conflitos e os colapsos económicos são considerados a causa de mais de um terço das emergências
alimentares entre 1995 e 2003, enquanto os confrontos civis e os refugiados ou pessoas deslocadas internamente têm sido citados
como o principal motivo de mais de metade das emergências alimentares em África35. Os conflitos reduzem normalmente a produção
agrícola e as receitas provenientes das culturas de rendimento e da criação de gado. De acordo com a FAO, os conflitos em África
provocaram a perda de mais de 120 mil milhões de dólares de receitas da produção agrícola no último terço do século XX.
A produção alimentar caiu em 13 dos 18 países observados assolados por conflitos36.
As consequências a longo prazo para as actividades agrícolas podem também ser graves e os efeitos indirectos e os impactos
externos negativos podem ameaçar a segurança alimentar dos países vizinhos. Existe uma relação interactiva, e possivelmente
múltipla, entre o impacto de conflitos e de situações de guerra e o desenvolvimento agrícola. Moçambique perdeu 40% dos seus
activos em agricultura, infra-estruturas e comunicações durante os 20 anos de guerra civil37.
Os problemas de produção alimentar nos países afectados por conflitos ou perturbações sociais podem aumentar a necessidade
de importação de produtos alimentares e provocar o aumento dos preços desses produtos nos países vizinhos. No Uganda, o
recente aumento da procura de produtos alimentares pelos parceiros de comércio da região, como o Quénia e a região sul do
Sudão, pressionou em alta os preços dos produtos alimentares38. Por outro lado, a deficiente gestão pós-conflito pode dificultar o
desenvolvimento económico e agrícola de um país. O regresso das comunidades agrícolas às suas explorações agrícolas de origem,
por exemplo, nem sempre produz o resultado pretendido. Na Serra Leoa, as medidas para permitir que os residentes regressassem
aos seus terrenos agrícolas e modos de vida potenciaram a tomada de controlo pelas elites39.
Em contrapartida, a insegurança alimentar pode promover a fragilidade. O subinvestimento na agricultura potencia a possibilidade
de conflito, à semelhança da luta pela alimentação ou da falta do direito de acesso aos produtos alimentares40. As rebeliões, os
conflitos e os colapsos governamentais na Etiópia, no Ruanda e no Sudão têm as suas origens em crises alimentares provocadas
por factores naturais (por exemplo, secas) e pela gestão deficitária do auxílio agrícola e da ajuda ao desenvolvimento 41.
A segurança alimentar está também estreitamente relacionada com o acesso aos recursos hídricos. Nos países frágeis, a escassez de
água afecta o consumo humano e dos animais e a irrigação pode tornar-se um problema. A utilização de fertilizantes, maioritariamente
importados e caros, é igualmente baixa.
7. CONCLUSÃO
Um país pode chegar a uma situação de conflito ou de paz – ou enfrentar ou não uma crise alimentar, ser
ou não um exportador de produtos alimentares ou de minério – dependendo da evolução histórica das
variáveis pertinentes e da interacção específica dos diferentes factores que afectam a fragilidade nesse
país. “A história é importante,” e essa persistência torna a fragilidade um desafio ainda maior.
A interacção dos diferentes factores económicos que afectam a fragilidade pode originar efeitos não lineares. O comércio e o
investimento directo estrangeiros, os conflitos associados à insegurança alimentar e os conflitos associados aos recursos naturais
podem originar um círculo virtuoso de atracção de mais IDE e estimular o crescimento, mas também podem dar início a um círculo
vicioso de instituições fracas e corrupção.
34
35
36
37
38
39
40
41
Esta tendência ocorreu na China em anos recentes, até Novembro de 2008, quando a crise económica e financeira ameaçou devolver os “novos” trabalhadores
urbanos à China rural.
Flores 2004.
Stewart et al. 2001.
Collier et al. 2003.
Benson 2008.
Maconachie 2008.
DFID 2001.
Messer e Cohen 2006; Messer et al. 1998.
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SOBRE
O
73
DESENVOLVIMENTO
Capítulo 4
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
A persistência não é o único problema. O tempo também é importante: o horizonte curto das decisões dos governos pode levar a
um aumento excessivo das despesas correntes e a comportamentos oportunistas. Os países frágeis, sempre a reagir a situações de
emergência, dispõem de um horizonte temporal muito mais limitado do que outros países. O horizonte curto é exacerbado pela
incapacidade para o empenhamento, pelo que mesmo um governo com perspectivas a longo prazo pode ver as suas decisões
influenciadas pela incapacidade de empenhamento.
Estas considerações reforçam a importância do tempo e da persistência, uma vez que a probabilidade de um choque temporário
ter um efeito permanente na fragilidade de um país é muito elevada. Reforçam igualmente a importância de ter em conta as
interacções entre os diferentes factores económicos e de algumas questões de coerência de tempo particularmente relevantes
para os países frágeis42.
42
Por exemplo, se os governos tiverem de atrair empresas do sector mineiro para investir em prospecção ou no desenvolvimento de uma mina ou de um
campo petrolífero, as empresas enfrentam um revés. Uma vez efectuado o investimento e independentemente das promessas, os investidores perderam o
poder negocial: os governos têm um incentivo para se apropriarem das receitas dos recursos. O problema do compromisso existe em todos os investimentos,
mas é mais agudo na exploração de recursos naturais e mais ainda nos países frágeis. O investimento de capital necessário para a extracção de recursos é
normalmente muito superior ao de outras actividades, pelo que o risco é maior e o investimento é habitualmente inseguro e não pode ser movimentado.
Uma vez que o investimento tem lugar em países frágeis, os governos são menos responsabilizados.
74
SECÇÃO DOIS
DA FRAGILIDADE À RESILIÊNCIA
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
CAPÍTULO 5
FRAGILIDADE VERSUS RESILIÊNCIA
A resiliência de um sistema socioeconómico depende da capacidade dos seus diferentes sectores, familiar,
comunitário e nacional, para se ajustarem aos choques internos e externos. Trata-se de uma dimensão de
desenvolvimento que já não pode ser ignorada. O reforço e manutenção da resiliência promovem o bemestar humano. Num mundo estático, o grau em que os membros de um grupo ou sistema social (famílias,
comunidades, Estados) conseguem controlar o seu destino depende dos direitos, da identidade, do poder
de decisão e dos mecanismos de resolução de problemas que lhes estão inerentes. A capacidade dos
membros individuais de buscarem os seus objectivos e aspirações depende da forma como o grupo:
• gera solidariedade entre os seus membros e garante um conjunto mínimo de recursos, serviços e direitos;
• permite que os seus membros actuem num sistema normativo;
• dispõe dos mecanismos institucionais para resolver os problemas desses membros;
• oferece aos membros um grau de influência na governação do grupo1.
Num mundo em evolução, os sistemas socioeconómicos sofrem mudanças e os choques podem afectar estes elementos. Assim,
a capacidade para manter ou reorganizar estas condições permite que os membros utilizem as suas capacidades ao longo do
tempo. Por outras palavras, se a capacidade de um sistema social promove o bem-estar dos seus membros, a sua resiliência torna
esta funcionalidade duradoura.
De que forma as diferentes sociedades criam resiliência e em que componentes e mecanismos se baseia esta? É possível avançar
dois argumentos:
1. O funcionamento adequado do Estado promove a resiliência de um sistema socioeconómico, uma vez que potencia as capacidades
humanas quer em situações estáveis quer, num sentido mais lato, em situações difíceis.
2. Num sistema socioeconómico, a gestão dos processos de adaptação em reacção a mudanças não está restrita às instituições do
Estado. Em cada sociedade, os agentes não estatais elaboram os seus próprios sistemas e capacidades para a sua organização,
adaptação e aprendizagem. As fontes de resiliência que têm origem na sociedade civil incluem a coesão e redes sociais, memória
social2, laços de confiança mútua e de penalização de irregularidades, instituições privadas e informais que regulamentam as
actividades económicas, direitos de utilização dos recursos e resolução de litígios.
As instituições dos Estados frágeis podem coexistir com sociedades resilientes, mas é improvável que o resultado seja estável e
benéfico do ponto de vista social. Na verdade, a fragilidade do Estado tende a desgastar a resiliência dos sistemas da sociedade civil
e da generalidade do sistema socioeconómico. Em contrapartida, as famílias, comunidades e sociedades civis resilientes podem
ajudar a proteger a população dos custos da fragilidade do Estado.
As sociedades civis da África subsariana adaptaram-se de uma forma criativa aos episódios repetidos da crise e desenvolveram
mecanismos de sobrevivência, reacção e adaptação sofisticados e complexos, que vão desde sistemas de segurança intrafamiliares
e comunitários até à gestão tradicional das terras de pastoreio.
Apesar destes mecanismos de resiliência e as tentativas dos agentes não estatais para substituir ou complementar parcialmente
os serviços e funções do Estado, as sociedades civis não foram capazes de amortecer totalmente os custos humanos e de
desenvolvimento decorrentes dos choques políticos, económicos ou climáticos ou da fragilidade do Estado.
1
2
Stinchcombe 1975.
Folke 2006.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 5
1. MELHORAR A RESILIÊNCIA
A resiliência, desenvolvida inicialmente no ramo das ciências naturais, diz respeito à capacidade de um
sistema de se adaptar a uma perturbação e de manter as suas funções essenciais inalteradas3. A resiliência
de um sistema deve, assim, ser avaliada no contexto das suas funções. Quando aplicada a um sistema
económico, a resiliência refere-se à capacidade do mercado e das respectivas instituições de apoio em
“afectar recursos de forma eficiente ou prestar serviços essenciais” (Perrings 2006, p. 418). Quando aplicada
a um sistema socioeconómico, a resiliência refere-se à capacidade de o sistema criar as condições para que
os membros da sociedade possam atingir o seu bem-estar e satisfazerem as necessidades e desejos que
não conseguem concretizar quando estão isolados.
A resiliência de um sistema, um conceito inerentemente dinâmico, pode ser medida através da sua capacidade de reagir a mudanças
ou choques através da activação dos mecanismos de adaptação adequados (caixa 5.1).
Caixa 5.1: Definição de resiliência e de vulnerabilidade
Resiliência e vulnerabilidade são conceitos adoptados em disciplinas diferentes, desde a economia à psicologia e da ecologia à
segurança. À semelhança de outros atributos de um sistema, estes termos são propensos a imprecisões, confusões e interpretações
diferentes na sua utilização. O presente relatório utiliza as seguintes definições:
Resiliência é a “capacidade de um sistema de absorver uma perturbação, sofrer uma mudança e manter essencialmente a
mesma função, estrutura, identidade e retroacções.” Esta definição foi elaborada no âmbito da Resilience Alliance, uma rede de
investigação pluridisciplinar que estuda o tema desde 1999.
Vulnerabilidade é a susceptibilidade de uma pessoa, grupo ou sistema aos efeitos dos choques. A vulnerabilidade é o resultado
da dimensão e da frequência dos choques e pressões, da exposição aos choques e da capacidade de reacção aos choques, ou
seja, a resiliência.
A vulnerabilidade estrutural é a vulnerabilidade a factores que são duráveis e independentes da capacidade de um sistema
de reagir a mudanças e choques. Assim, a vulnerabilidade depende da dimensão e da frequência dos choques e pressões e da
exposição aos choques.
A resiliência é também uma componente importante da sustentabilidade. A manutenção do bem-estar humano ao longo do tempo
exige a imposição de um limite ao grau de pressão a que os sistemas ecológicos e socioeconómicos são sujeitos. A resiliência diz
respeito à adaptabilidade a alterações e novas pressões. A resiliência é essencial à sustentabilidade, na medida em que os choques,
as perturbações e as alterações das condições são inevitáveis e normalmente imprevisíveis, embora a necessidade de redução
da pressão de forças sobre os sistemas socioeconómicos seja essencial para a sustentabilidade uma vez que essas forças podem
afectar negativamente a resiliência.
2. O QUE IMPLICA UMA ABORDAGEM BASEADA NA RESILIÊNCIA?
Uma abordagem baseada na resiliência tem implicações multifacetadas, e possivelmente a longo prazo,
no discurso de desenvolvimento. Influencia as prioridades da agenda de desenvolvimento, a concepção
das políticas de ajuda e o quadro analítico adequado. A perspectiva da resiliência implica a aceitação da
limitação das políticas baseadas no conceito de Estado estático.4 Além disso, esta abordagem pode dar
origem a novos objectivos e compromissos.
2.1 COMPROMISSOS E COMPLEMENTARIDADES ENTRE AS PERSPECTIVAS A LONGO PRAZO
E A CURTO PRAZO
A necessidade de reacções mais rápidas a situações de emergência pode provocar eventuais tensões com as práticas correntes, o
que poderá prejudicar o desenvolvimento a longo prazo. Por exemplo, as acções humanitárias em matéria de alimentação e de
prestação de serviços por organizações internacionais e não governamentais protegem as pessoas em situações de risco extremo,
mas o desenvolvimento agrícola será provavelmente lento nos sistemas socioeconómicos que dependam de ajuda alimentar5.
3
4
5
Holling (1973) define a noção de resiliência como o nível de perturbação que um sistema pode absorver sem mudar para um regime alternativo.
Folke 2006.
Alinovi e Russo 2009.
78
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Fragilidade versus resiliência
Por outro lado, as estruturas separadas geridas por agentes externos correm o risco de se sobreporem às instituições do Estado e
impedirem a sua consolidação6. Este compromisso não deve, contudo, ser sobrevalorizado. As intervenções urgentes não excluem
automaticamente as estratégias a longo prazo. E uma vez que a exposição a choques sucessivos pode desgastar a resiliência, as
respostas a curto prazo podem estar de acordo com uma abordagem baseada na resiliência7. Essas respostas podem evitar o
surgimento de situações de fragilidade através da aprendizagem com as boas práticas decorrentes de muitos anos de intervenções
em crises humanitárias complexas.
2.2 COMPROMISSOS ENTRE RESILIÊNCIA E EFICIÊNCIA
A eficiência económica e o crescimento económico são condições necessárias, mas não suficientes, para a redução da pobreza.
Uma abordagem baseada na resiliência iria questionar as políticas de desenvolvimento que apenas consideram a eficiência e o
crescimento económico como essenciais para aumentar o bem-estar humano. Em contrapartida, as políticas que optimizam o
crescimento poderiam, em casos específicos, afectar negativamente a resiliência de um sistema, colocando a sua sustentabilidade em
perigo. Por exemplo, as políticas orientadas para a exportação que privilegiam a eficiência e melhoram o potencial de crescimento
de um país podem também reduzir a sua resiliência. De que forma? Criando pressões para a especialização em sectores primários
expostos a amplas flutuações de preços nos mercados internacionais. Como observa Perrings (2006), a concentração de activos
em áreas de actividade que produzem o retorno mais elevado a curto prazo irá certamente reduzir a resiliência do sistema na sua
globalidade8.
2.3 NOVOS ELEMENTOS DE ANÁLISE NA FORMULAÇÃO DE ESTRATÉGIAS DE DESENVOLVIMENTO
As abordagens baseadas em resiliência tendem a ampliar os objectivos e os requisitos das políticas de desenvolvimento eficazes. A
elaboração das políticas deve basear-se não só em análises estáticas e na observação de resultados como também em “avaliações
de resiliência”. A análise das fontes de resiliência num sistema socioeconómico requer uma melhor compreensão dos mecanismos
de adaptabilidade, capacidade de aprendizagem, organização própria, processos de decisão e acção colectiva. Estes elementos
de análise podem complementar o estudo do capital social e da coesão social, dos activos das famílias, da exposição a riscos e
choques e das opções dos cidadãos e das famílias para enfrentar os choques.
3. A FRAGILIDADE DO ESTADO AFECTA NEGATIVAMENTE A RESILIÊNCIA
SOCIOECONÓMICA
Os processos utilizados pelas pessoas para melhorarem o seu bem-estar dependem das interacções entre
os diferentes sectores das estruturas sociais, como uma família, comunidade local, estatal ou global, e
os diferentes tipos de instituições, desde os mercados até aos sistemas políticos, culturais e jurídicos, ao
capital social e aos sistemas formais e informais, à regulação dos direitos de utilização dos recursos e à
resolução de litígios e conflitos.
Caixa 5.2: Crescimento económico, desenvolvimento e bem-estar nos países frágeis
(Economic growth, development and well-being in fragile countries)
Por J. Allister McGregor, Instituto de Estudos de Desenvolvimento, Universidade de Sussex.
Há algum tempo, W. Arthur Lewis constatou que o crescimento económico não era o objectivo do desenvolvimento, mas uma
forma de aumentar as opções de que as pessoas dispunham. Hoje amplamente reconhecida, esta importante mensagem tem
sido elaborada por vários eminentes pensadores do desenvolvimento. Mas nem sempre é aplicada de forma consistente nas
políticas e na prática.
As várias crises recentes da economia, da governação e do ambiente a nível mundial salientaram a necessidade de reajustar a
forma como percebemos o desenvolvimento e como organizamos as práticas e as políticas de desenvolvimento internacional.
Existe um amplo consenso quanto à necessidade de uma abordagem mais humana do pensamento do desenvolvimento (ver
“Relatório da Comissão Sarkozy” 2009), alicerçada no reconhecimento de que a política de desenvolvimento visa proporcionar
as condições sociais para as pessoas atingirem o bem-estar e combaterem as condições que geram sofrimento humano.
6
7
8
Manor 2007.
Guillaumont e Guillaumont Jeanneney 2009.
Perrings 2006.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 5
Nos países frágeis em desenvolvimento, os desafios da reconstrução das condições sociais para o bem-estar humano são enormes.
Em muitos desses países, as pessoas e as comunidades criam as suas próprias condições sociais para sobreviver e lutar. As pessoas
associam-se através de acordos locais. Pagam a milícias privadas para terem segurança física. Podem depender dos proprietários
das empresas locais para terem oportunidades de mercado. E podem recorrer aos sistemas de justiça tradicionais para aplicarem
a lei e ordem básicas. Embora esses acordos possam criar as condições mínimas para “levar a vida por diante”, também envolvem
geralmente compromissos que não podem ser considerados positivos para o desenvolvimento e o bem-estar das pessoas.
Algumas necessidades essenciais poderão ser satisfeitas, mas também serão sacrificadas liberdades, além de que elevados níveis
de instabilidade e insegurança reduzem a qualidade de vida em geral.
De acordo com esta perspectiva, os esforços de desenvolvimento nestes contextos de fragilidade devem resultar de uma
análise dos elementos que já estão a criar condições de bem-estar e depois, de uma forma pragmática, trabalhar com e a partir
desses elementos. Este processo envolve, muito provavelmente, um compromisso com outros agentes além do Estado, tais
como associações de entreajuda, organizações locais da sociedade civil, milícias e redes de empresas locais. O objectivo de
desenvolvimento deste compromisso consiste em reforçar as dimensões positivas das condições sociais para o bem-estar e
afastar essas organizações e instituições dos seus procedimentos e práticas mais prejudiciais.
Utilizando este enquadramento do bem-estar, a prioridade imediata nos Estados frágeis e falhados consiste em determinar quais
são os mais vulneráveis e quais os que possuem as deficiências mais graves em termos de bem-estar como resultado do colapso
do Estado. Esta agenda de compromisso centrado no bem-estar pode apoiar os primeiros passos da reconstrução de um pacto
social de base e estabelecer as bases para uma governação eficaz.
A resiliência de um sistema socioeconómico, entendido como um órgão complexo de agentes estatais e não estatais funcionalmente
interdependentes, é moldada pela resiliência de todos os seus componentes no desempenho das suas funções, pela sua influência
recíproca e pela sua capacidade de interagir construtivamente com o objectivo de gerir todo o sistema e a sua trajectória. O
conceito de resiliência pode ser aplicado de forma rentável a todos os sectores de um sistema socioeconómico, desde as famílias
às comunidades locais e às instituições do Estado9.
As instituições do Estado são uma parte essencial deste sistema complexo. A resiliência de um sistema socioeconómico pode ser
assegurada ou reforçada pelas estratégias de adaptação implementadas nos seus diferentes sectores10. Ao mesmo tempo, o Estado
molda a resiliência de outras estruturas sociais, uma vez que define os mecanismos de governação em sociedade, fornece bens
públicos, presta serviços básicos e protege a segurança e a estabilidade dos cidadãos, que são elementos essenciais à criação de
capacidades humanas (figura 5.1).
Figura 5.1: Interacções entre a fragilidade do Estado e a resiliência socioeconómica
Choques externos
Impacto no Estado (dotações de
bens públicos, orçamento público,
equilíbrio orçamental)
Impactos em agentes e instituições
não estatais: famílias, sociedade
civil, instituições económicas
Resiliência
Resiliencedos
of
socioeconomic
systems
sistemas
socioeconómicos
Fragilidade
do Estado
Estratégias
de adaptação
Reacções políticas
Bem-estar humano e social
9
10
Para uma aplicação de análise de resiliência a nível familiar, ver Alinovi et al. (2009).
Engberg-Pedersen et al. 2008.
80
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Fragilidade versus resiliência
Inversamente, a fragilidade do Estado pode afectar negativamente a resiliência de um sistema socioeconómico. O desenvolvimento
humano e económico, a resiliência e o reforço das instituições do Estado estão estreitamente interligados. Se o desenvolvimento
económico pode reforçar a capacidade do Estado e criar procura para o “Estado”, os elementos e os processos de constituição das
entidades legítimas e funcionais do Estado ajudam as pessoas a exercerem as suas actividades económicas e a conseguirem o seu
bem-estar mesmo em períodos de mudança.
A capacidade e a evolução das instituições do Estado não podem ser analisadas separadamente. Se, por exemplo, as famílias ou as
comunidades estão em melhores condições para adoptarem estratégias de adaptação eficazes quando têm de lidar com choques
externos, este factor reduz a dimensão e a pressão das exigências políticas que expressam. A fragilidade do Estado pode ser
influenciada e mediada pela resiliência social11. A construção do Estado pode, assim, ser efectuada de forma eficaz, concentrando
a atenção em todos os sectores do sistema socioeconómico e não apenas nas instituições do Estado.
As lutas e as alianças entre o Estado e outras organizações sociais (famílias, tribos, partidos políticos, empresas nacionais e
multinacionais) definem a forma como a sociedade e o Estado estabelecem e mantêm disposições que regem as acções, o poder
e a distribuição dos benefícios e dos custos em termos colectivos12. A interacção entre o que Migdal (1988)13 designa Estados
fortes e sociedades fortes pode dar origem a um processo de reforço mútuo: “uma sociedade civil forte proporciona uma base de
legitimidade e uma capacidade de acção na qual o Estado se pode basear, mas a sociedade civil também depende do Estado para
a prestação de determinados serviços14.”
O capítulo seguinte esclarece a relação entre a fragilidade do Estado e resiliência socioeconómica, debatendo os impactos e os
canais de transmissão da recessão global nos países frágeis da África subsariana, bem como a capacidade potencial dos seus
sistemas macroeconómicos para enfrentar a crise. O reconhecimento de que a resiliência macroeconómica é apenas uma parte
da resiliência socioeconómica pode ajudar a compreender a importância da fragilidade do Estado para a capacidade dos países
da África subsariana de enfrentarem e se adaptarem a grandes choques.
11
12
13
14
Engberg-Pedersen et al. 2008.
Migdal 1988.
Migdal 1988.
Spalding 1996, pág. 66.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
81
DESENVOLVIMENTO
Capítulo 6
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
CAPÍTULO 6
ESTADOS FRÁGEIS AFRICANOS DURAMENTE ATINGIDOS
PELA CRISE FINANCEIRA MUNDIAL
Quando rebentou a crise económica mundial no Verão de 2007, existia uma percepção consensual
de que a África subsariana iria ser afectada de um modo limitado, sem excepção para os países frágeis1.
A fraca integração dos pequenos sistemas financeiros com os mercados capitais americanos e europeus
parecia, à primeira vista, resguardá-los dos efeitos mais negativos. Mas à medida que a situação evoluiu,
esta percepção revelou-se incorrecta. Mesmo que os efeitos da crise sobre os rendimentos sejam menos
pronunciados do que para outros países em desenvolvimento, a África subsariana, nomeadamente os
seus países frágeis, revelaram-se particularmente vulneráveis às ligações comerciais e às perturbações do
sistema financeiro2.
A dependência dos países da África subsariana do comércio internacional e, por consequência, a sua exposição aos choques
provenientes do exterior, aumentaram nos últimos 10 anos. As economias africanas tornaram-se mais sensíveis à redução da procura
internacional, nomeadamente numa sincronização sem precedentes dos ciclos económicos, que limita os benefícios de diversas
parcerias comerciais. Além disso, uma vez que os fundos destinados à ajuda oficial ao desenvolvimento tendem a seguir os ciclos
económicos dos países doadores, apesar dos compromissos de manutenção e mesmo de aumento das ajudas, os países da África
subsariana poderão enfrentar uma redução das ajudas, pelo menos a curto e médio prazo. Apesar dos repetidos pedidos efectuados
em reuniões internacionais para que os compromissos de ajuda sejam respeitados e que os doadores respeitem as suas promessas e
mantenham inalterada a percentagem de ajuda do PIB, a ajuda poderia cair substancialmente devido ao abrandamento nos países
doadores e possivelmente também devido a movimentos desfavoráveis das taxas de câmbio (como a recente desvalorização da
libra face ao dólar). Espera-se também uma redução das remessas após um longo período de crescimento sustentado.
1. AS CONSEQUÊNCIAS IMPORTANTES DA CRISE: TRAVAR ANOS DE PROGRESSO
CONTINUADO
A crise de 2008-2009 pôs termo a um período prolongado de crescimento económico e globalização a
nível mundial, durante o qual o comércio mundial cresceu ao dobro do ritmo do PIB mundial.
O crescimento do PIB começou a decair em 2008 e a contracção estendeu-se a todas as regiões. Na
verdade, o padrão de declínio, o pior em décadas, assemelha-se ao colapso de 1929-1930. A crise actual
afectou negativamente os factores da recente fase de globalização: mercados abertos, cadeias de
produção globalmente integradas e muitas empresas internacionais mais flexíveis.
O abrandamento do comércio mundial foi mais violento do que o do PIB, mesmo do que o registado durante a Grande Depressão3.
Este efeito pode ter tido origem na sincronização geral dos ciclos entre os países. Pode também ser indicado pelo maior peso dos
bens intermédios no comércio, o qual, por sua vez, se deve à fragmentação da produção, o que, depois de estimular um rápido
crescimento nos últimos 10 anos, acelerou o declínio.
A crise económica e financeira surgiu no auge de um período de extrema volatilidade dos preços dos produtos de base e das
taxas de câmbio, o que aumentou a incerteza e fortaleceu o círculo vicioso de queda de investimentos e fluxos comerciais. A crise
ocorreu numa altura em que a África subsariana tinha dado um forte impulso ao crescimento4. Antes de Julho de 2008, a África
subsariana registava um crescimento sólido e os países frágeis, independentemente da definição, não eram excepção. A crise
actual ameaça interromper esta tendência positiva, apesar de a região estar mais preparada para se adaptar do que em períodos
de recessão anteriores5.
Durante o recente período de crescimento, a África subsariana tornou-se mais integrada no resto do mundo, o que se reflectiu no
aumento (ainda lento) da sua quota nas exportações mundiais e no PIB (figura 6.1)6. Os países frágeis, com uma média de integração
inferior à de dos outros países da África subsariana, seguiram a mesma tendência. O aumento da integração internacional expôs
1
2
3
4
5
6
Ver IDS 2008 e FMI 2008.
Berman e Martin 2009.
Eichengreen e O’Rourke 2009. A elasticidade estimada do comércio mundial em relação ao PIB mundial é de cerca de 2, o que serviu de suporte à globalização
e é provável que agora tenha uma repercussão negativa.
Arbache e Page 2008.
Fosu e Naudé 2009.
Para alguns países, o rácio de exportações em relação ao PIB, em especial no que respeita aos exportadores de petróleo na África Central, está provavelmente
inflacionado pelos preços elevados das matérias-primas.
82
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Estados frágeis africanos duramente atingidos pela crise financeira mundial
muito mais os países da África subsariana a perturbações no comércio e a outros choques. Teve igualmente um efeito marcado
nas receitas fiscais (e em alguns países na política fiscal) com menos receitas dos impostos comerciais. Os desafios da globalização
em matéria de mobilização de recursos são exacerbados pela crise recente, que fez baixar a base fiscal.
Figura 6.1: Aumento das exportações em termos de percentagem do PIB
50
45
40
Percentagem
35
30
Paíse não frágeis da África subsariana
25
20
Países frágeis da África subsariana
15
10
2006
2004
2002
2000
1998
1996
1994
1992
1990
1988
1986
1984
1982
0
1980
5
Fonte: Indicadores de Desenvolvimento Mundial 2009 do Banco Mundial (2009c).
2. PRODUTOS ALIMENTARES, COMBUSTÍVEIS, FINANÇAS E FRAGILIDADE
3F+1  FOOD, FUEL, FINANCE, FRAGILITY
As subidas dos preços dos produtos alimentares e do petróleo em meados de 2008 colocaram uma
enorme pressão sobre as importações desses produtos pelos países frágeis da África subsariana,
reduzindo as suas reservas de divisas e dificultando o pagamento das importações e o crescimento
sustentado. Inversamente, os países exportadores de petróleo viram as suas receitas aumentadas e alguns
puderam reforçar as suas reservas de divisas. No entanto, a expansão e quebra contribuiu para aumentar
a volatilidade e desincentivar o investimento em capacidade produtiva a longo prazo.
Como salientou o FMI (2009ª), a maior parte dos países da África subsariana sofreram quase consecutivamente os choques do
petróleo, dos produtos alimentares e financeiro. As mais recentes estimativas apontam para um crescimento real do PIB da África
subsariana de cerca de 1,5% em 2009, uma descida face aos 5,5% previstos em Outubro de 2008. Estes números fazem do ano de
2009 o primeiro numa década em que muitos países frágeis da África subsariana registaram um crescimento negativo no PIB real per
capita, ameaçando o progresso rumo aos ODM e afectando negativamente a estabilidade política7. O abrandamento do crescimento
não constitui necessariamente uma ameaça de reversão do desenvolvimento humano, mas gera contratempos, nomeadamente
através de cortes nas despesas com a educação e a saúde, o que tem graves consequências a longo prazo.
3. OS QUATRO CANAIS DE TRANSMISSÃO PARA OS PAÍSES FRÁGEIS
Dado o reduzido desenvolvimento financeiro na região e as ligações limitadas dos países frágeis ao
sistema financeiro mundial, os principais canais de transmissão da crise encontram-se nos sectores da
economia real. A maior parte dos países da África subsariana dispõe de pequenos sistemas bancários
nacionais e mercados de capitais inexistentes ou quase inexistentes. Além disso, os investidores
estrangeiros e os fundos soberanos investem apenas em alguns países exportadores de petróleo.
Os países da África subsariana estão expostos à crise essencialmente através do comércio: a redução das receitas das exportações é
acompanhada por um efeito adverso nas condições comerciais reforçado pela excessiva dependência das exportações de produtos
de base dos países frágeis da África subsariana e pela polarização das suas exportações8. Estes países estão também expostos
através da diminuição das remessas de emigrantes, menores fluxos de investimentos directos do estrangeiro e eventuais menores
fluxos de ajuda externa.
7
8
A África subsariana tem, em média, uma taxa de crescimento negativa do PIB real per capita (- 0,6%). Os países frágeis da África subsariana registam uma
taxa de crescimento negativa do PIB de 0,2%, mas este número oculta um elevado grau de heterogeneidade (capítulo 2).
A maior parte dos países frágeis depende das exportações de um único produto. Em média, os três maiores exportadores representam cerca de 90% das
exportações totais, conforme salientado no capítulo 2.
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O
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DESENVOLVIMENTO
Capítulo 6
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Os canais de transmissão de financiamento directo têm funcionado apenas em países como o Quénia e a Nigéria (e em dois países
não frágeis importantes, África do Sul e Gana), que dispõem de mercados financeiros mais profundos e integrados (caixa 6.1). A
Nigéria, por exemplo, sofreu quedas na bolsa de valores idênticas ou mesmo superiores às dos países em desenvolvimento9. O
seu índice NSE-20 caiu 55% entre Julho de 2008 e Fevereiro de 2009, após uma queda de 45% no ano anterior10. Este declínio e a
correspondente falta de confiança tornaram ainda mais difíceis os empréstimos dos mercados de capitais. As repercussões da crise
em alguns dos mais importantes mercados de destino para os migrantes intra-regionais, como a Nigéria, a África do Sul, o Uganda
e a Zâmbia, tiveram um forte impacto nos países frágeis vizinhos (nomeadamente através de uma queda de oportunidades de
emprego para os migrantes e de uma diminuição das remessas).
Caixa 6.1: Mercados financeiros africanos: repercussões dos choques
Desde o início da década de 1990 que vários países em desenvolvimento criaram bolsas de valores, por um lado, para dar resposta
à sua procura de novos capitais e, por outro, para incorporar elementos do capitalismo de mercado nas suas economias. A África
subsariana também participou nesta tendência, com a África do Sul a cotar-se como um dos principais destinos dos mercados
emergentes e com diversos fundos regionais destinados especificamente para o continente. Por iniciativa dos governos nacionais
e com apoio dos países doadores, a África aumentou o número de bolsas de valores nacionais de 6, em finais da década de 1980,
para mais de 20 na actualidade, embora nem todas tenham sido criadas de forma idêntica. Entre os países frágeis, a Nigéria e
o Quénia possuíam as bolsas de valores mais desenvolvidas.
De que forma foram os mercados africanos (África do Sul, Nigéria e Quénia) afectados pelos acontecimentos nos maiores
mercados financeiros (a China, os Estados Unidos e o Reino Unido) entre 2004 e 2009? Analisando a volatilidade de diversos
mercados financeiros através de um modelo econométrico, Giovannetti e Velucchi (2009) concluiram que, em média, os choques
positivos na África do Sul e os choques negativos na China e no Reino Unido afectaram todos os mercados em questão. Os
mercados africanos são todos influenciados pelos choques negativos dos mercados norte-americanos, com excepção do Quénia,
influenciado apenas pelos choques positivos nos Estados Unidos. A África do Sul afecta os Estados Unidos e é afectada apenas
pelo mercado nigeriano. Não existem indicações de uma relação significativa entre a Nigéria e o Quénia. A China possui fortes
ligações com os mercados africanos. Outros resultados mostram que a África do Sul tem uma influência importante em todos
os mercados africanos e que a influência do Reino Unido e dos Estados Unidos é menor. A China é independente do Reino
Unido e dos Estados Unidos.
A figura da caixa 1 representa graficamente (funções de impulso-resposta) a propragação do choque de volatilidade; no eixo
horizontal regista-se o tempo (dias) e no eixo vertical a resposta de volatilidade. Quando um choque atinge o mercado i, o gráfico
apresenta as respostas em todos os mercados; em média, a resposta do mercado i no tempo 0 será superior à resposta de outros
mercados. A figura mostra como o colapso do Lehman Brothers se propagou a todos os mercados. No dia 15 de Setembro de
2008, o Lehman Brothers entrou em falência e os mercados financeiros internacionais sofreram pesadas perdas. A China e o Reino
Unido reagem fortemente ao choque dos Estados Unidos, ao contrário da Nigéria e do Quénia. A África do Sul é muito sensível
aos Estados Unidos, mas o efeito é cumulativo e os choques atingem o efeito máximo decorridos 20 dias.
Resposta
Figura da caixa 6.1: A África do Sul responde ao colapso do Lehman Brothers – o Quénia e a
Nigéria não
3,0
Estados Unidos
2,5
Reino Unido
2,0
África do Sul
1,5
China
Quénia
1,0
Nigéria
0,5
0,0
1
7
13
19
25
31
37
43
49
55
61
67
73
79
85
91
97
Dias de
Nota: Esta caixa utiliza uma abordagem Multiplicative Error Model (modelo multiplicativo de erro) para descrever e prever as
interacções e as repercussões entre estes países (Engle, Gallo e Velucchi, 2008). O modelo explora a dinâmica da volatilidade
esperada de um mercado, incluindo as interacções com os quadrados dos retornos anteriores dos outros mercados; a função
impulso-resposta é utilizada para sugerir uma acumulação nas repercussões.
Fonte: Giovannetti e Velucchi (2009).
9
10
AfDB 2009a e ODI 2009a.
Kasekende et al. 2009 e ODI 2009a.
84
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Estados frágeis africanos duramente atingidos pela crise financeira mundial
Os exportadores de minérios e de produtos agrícolas registaram reduções nas receitas, o que, por sua vez, afectou as receitas
públicas. Na Nigéria, por exemplo, a volatilidade do preço do petróleo, que constitui cerca de 90% das exportações do país (ver
quadro 2.3) e 90% das receitas públicas11, criou um elevado grau de incerteza, tal como a queda dos preços dos metais na República
Democrática do Congo. Neste contexto, a crise poderia ter um impacto positivo, ao estimular o redireccionamento do interesse e
fazer reviver o potencial de sectores diferentes do petróleo e dos combustíveis (ou, de uma forma geral, matérias-primas), reforçando
assim as economias para eventuais choques futuros.
3.1 MENOS RECURSOS PARA INVESTIMENTO DIRECTO ESTRANGEIRO
O IDE tem sido uma importante fonte de recursos para alguns (poucos) países frágeis da África subsariana e um poderoso motor
de crescimento, dependendo dos sectores a que foi destinado. Os investimentos na indústria petrolífera geram pouco emprego a
nível nacional, dado o reduzido número de trabalhadores e as elevadas competências necessárias; por outro lado, os investimentos
no turismo ou em alguns sectores da indústria transformadora tradicional estimulam o emprego, o consumo e o crescimento a
nível interno12.
Em termos de percentagem do PIB, o FDI tem sido menor na África subsariana do que noutros países em desenvolvimento,
distribuído de forma não uniforme pelos países e frequentemente relacionado com a afectação dos recursos naturais. O IDE
aumentou em valor absoluto em termos de percentagem do PIB desde 2000, mas a crise económica reduziu o montante total
dos fundos ou adiou alguns projectos. A crise restringiu o crédito e reduziu os lucros das empresas nas economias emergentes
e em desenvolvimento, levando-as a rever em baixa os seus planos de investimento e assumir uma atitude de expectativa13. A
elevada e crescente incerteza associada às crises simultâneas do petróleo, dos produtos alimentares e financeira explica o declínio
geral do IDE, particularmente negativo devido aos seus efeitos persistentes14, porventura superiores aos efeitos justificados pelos
fundamentais macroeconómicos de um país.
No primeiro semestre de 2008, Angola, Nigéria, República Democrática do Congo e Guiné receberam, cada um, mais de mil
milhões de dólares em fluxos de IDE15. Mas no segundo semestre de 2008 e no primeiro semestre de 2009 vários investimentos no
domínio dos recursos naturais e da indústria transformadora foram suspensos ou cancelados. A República Democrática do Congo
e a Zâmbia viram alguns projectos mineiros cancelados, o Sudão teve uma refinaria adiada e o Botswana e a Tanzânia tiveram
projectos mineiros adiados.
Mas houve um sector em que o IDE continuou a aumentar: terrenos (capítulo 4). Os países estrangeiros, em busca de segurança
alimentar ou pretendendo aumentar a sua produção de biocombustíveis sem comprometer os seus recursos hídricos, estão a
adquirir terrenos na África subsariana. Os negócios podem ser desfavoráveis para os países da África subsariana, nomeadamente
naqueles cujas instituições públicas estão envolvidas, uma vez que são caracterizadas por uma aplicação pouco rigorosa da lei,
facto que pode ser explorado pelos países estrangeiros envolvidos nos negócios. Os efeitos destes fluxos nos países destinatários
são extremamente controversos16. Os fundos de curto prazo destinados a amortecer os piores efeitos da crise podem tornar-se
uma prática predatória de recursos importantes. No entanto, se forem bem geridos, podem aumentar a produtividade agrícola e
terem inclusivamente efeitos positivos no crescimento.
3.2 DECLÍNIO COMERCIAL
Muitos países da África subsariana, incluindo os países frágeis exportadores de matérias-primas, dependem essencialmente dos
mercados de exportação para crescerem. A crise foi-lhes transmitida principalmente através da redução da procura de exportações
e da redução dos preços destas.
É necessário tempo para avaliar os efeitos da crise nos fluxos comerciais, mas os primeiros sinais não são tranquilizadores: a procura
de produtos dos países frágeis da África subsariana pela Europa, Estados Unidos e China caiu abruptamente, mais ainda do que a
procura de produtos de outras regiões (figura 6.2). Esta redução deve-se essencialmente ao facto de as suas exportações assentarem
essencialmente em matérias-primas. Mesmo os produtores, concentrados em produtos com pouca tecnologia, são mais afectados
11
12
13
14
15
16
ODI 2009a.
Ver Bonassi et al. 2006.
Os modelos teóricos de investimento em condições de incerteza (Dixit 1989) utilizaram no passado a teoria da opção para explicar esta atitude dos investidores
quando se considera que o ambiente constitui um risco. O comportamento das empresas é diferente para os mesmos valores dos fundamentais, dependendo
do histórico das empresas: se uma empresa já investe no país, mantém-se mas os novos investimentos são adiados. O comportamento das empresas pode
explicar a situação actual: aquilo que constitui uma descontinuidade num comportamento individual (as empresas podem decidir investir ou não investir
na mesma situação, dependendo do seu histórico e dos vários equilíbrios possíveis) torna a função do investimento global uma função extremamente não
linear.
É necessário tempo para que os investimentos se concretizem e a ocorrência de uma redução num ano produz um impacto a longo prazo nos anos
subsequentes
Ver CNUCED 2009, pág. 42.
Para um debate sobre esta questão, ver o capítulo 4.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 6
do que outras regiões em desenvolvimento17. Além disso, muitos países frágeis da África subsariana foram afectados pela crescente
volatilidade das taxas cambiais, o que trouxe custos acrescidos e um elevado grau de incerteza ao comércio internacional. Muitos
países da zona CFA têm a sua taxa de câmbio indexada ao Euro e sofreram uma considerável desvalorização da taxa de câmbio. Até
certo ponto, este facto reduziu os preços das importações destes países mas, uma vez que os países frágeis têm pouca capacidade
para aumentar as exportações, não puderam explorar esta oportunidade18.
Figura 6.2: Descida acentuada das exportações da África subsariana
IMPORTAÇÕES CHINESAS
120
América Latina
110
Médio Oriente e Norte de África
Indice (Setembro 2008=100)
100
90
Países frágeis da África subsariana
80
África subsariana
70
60
Mundo
50
40
30
20
IMPORTAÇÕES DOS EUA
110
América Latina
Indice (Setembro 2008=100)
100
África subsariana
90
Países frágeis da África subsariana
80
Sub-Saharan Africa
70
Mundo
60
50
40
IMPORTAÇÕES DA UE
Indice (Setembro 2008=100)
150
América Latina
130
Médio Oriente e Norte de África
110
Países frágeis da África subsariana
África subsariana
90
Mundo
70
50
30
Fonte: Global Trade Atlas (Atlas do comércio mundial).
17
18
Ver CNUCED 2009; esta queda acentuada das exportações é igualmente verdadeira para o conjunto da África subsariana.
AfDB 2009b.
86
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Estados frágeis africanos duramente atingidos pela crise financeira mundial
A crise financeira também reduziu a capacidade de financiar o comércio mundial. As empresas da África subsariana, nomeadamente
nos países frágeis, dependem mais do que outras do financiamento do comércio. As transacções de grande parte das empresas
da África subsariana baseiam-se em cartas de crédito dos países destinatários, sobretudo devido a um sistema financeiro nacional
subdesenvolvido e à escassez de financiamento próprio. Estes fornecedores, perante uma situação de elevada incerteza e falta
de confiança, reduziram a sua exposição ao risco e ao crédito. As empresas e os países que sofrem mais são os considerados mais
em risco. Assim, o racionamento do crédito, que aumenta os custos das transacções, refreou as exportações dos países da África
subsariana.
Análises19 baseadas em 117 crises sistémicas20 e dados de transacções bilaterais sugerem que as exportações dos países da África
subsariana podem ser duramente atingidas pela crise actual. Primeiro, o impacto das crises financeiras e recessões anteriores nas
exportações da África subsariana foi mais forte e persistente quando o parceiro da transacção era um país industrial. Segundo,
os países da África subsariana foram atingidos com maior dureza e durante mais tempo do que outras regiões pelas crises que
afectaram os seus mercados de destino. Não se trata apenas de um efeito de composição devido à predominância de produtos
primários no seu cabaz de exportações, mas também de uma consequência da menor competitividade das exportações das
indústrias transformadoras da África subsariana, mais concentradas em produtos de menor valor acrescentado. Na verdade, as
exportações de matérias-primas e de produtos industriais da África subsariana foram ambas duramente atingidas (figura 6.3). De
igual modo, as deficiências das infra-estruturas, que aumentam os custos (direitos alfandegários, burocracia, fronteiras), contribuem
para a sua vulnerabilidade. Pelo contrário, para explorar as oportunidades oferecidas por uma crise económica, as empresas devem
procurar nichos, criar produtos de maior qualidade ou subir na cadeia de valor. Mas tudo isto exige o capital humano adequado,
escasso nos países frágeis.
Rácio de excedente comercial
Figura 6.3: Exportações de produtos primários e da indústria transformadora da África subsariana
depois da crise financeira no país parceiro
0,5
Produtos transformados
0,3
Matérias-primas
0,1
-2
-1 -0,1
1
2
3
4
5
6
7
8
-0,3
-0,5
-0,7
Anos desde a crise
Nota: o gráfico mostra o desvio das exportações africanas depois da crise financeira que ocorre no ano t = 0, no que respeita ao efeito
médio de perturbação. O rácio do excedente comercial no eixo dos y representa o desvio das exportações bilaterais da África subsariana
gerado por uma crise financeira no país parceiro, em relação ao desvio médio: um rácio positivo (negativo) de excedente comercial
significa que o efeito de uma crise financeira no país parceiro para as exportações africanas é mais positivo (negativo) do que o efeito
médio sobre as exportações.
Fonte: Berman e Martin 2009.
3.3 FLUXOS DE AJUDA DECRESCENTES: UM CENÁRIO A EVITAR
A cimeira do G8 em Gleneagles, em 2005, prometeu reforçar a ajuda aos países africanos, tendo esta promessa sido repetidamente
reformulada e confirmada em reuniões internacionais. No entanto, a recessão global provocada pela crise mundial de 2008-2009
levanta dúvidas sobre a verdadeira evolução dos esforços de ajuda por parte dos países doadores OCDE-CAD. Os orçamentos
consagrados à ajuda podem ser reduzidos em relação ao máximo histórico de 2008, para financiar os pacotes de estímulos fiscais
destinados a sustentar a procura interna nos países doadores. Os primeiros sinais de alguns países membros OCDE-CAD não são
tranquilizadores. O governo irlandês anunciou uma redução de 22% do seu orçamento consagrado à ajuda em relação ao que
estava planeado inicialmente para o ano em curso. E a Itália pode reduzir a metade o seu orçamento consagrado à ajuda em 2009,
19
20
Berman e Martin (2009) utilizam um “modelo de gravidade” para o cálculo de impulsos-respostas; neste caso, a análise incide sobre o conjunto da África
subsariana devido à escassez de séries cronológicas fiáveis para o grupo dos países frágeis. Para mais detalhes, ver o respectivo documento de apoio no
Volume 1B.
Crise sistémica definida como eventos, provavelmente com vários anos de duração, nos quais grande parte ou a totalidade do capital dos bancos estava
esgotada. O conjunto de dados relativo ao comércio bilateral e à crise financeira diz respeito ao período 1972-2002.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 6
atingindo um mínimo histórico21. A curto e médio prazo, vários orçamentos de países em desenvolvimento consagrados à ajuda
serão afectados devido aos recentes défices orçamentais. Por esse motivo, devem ocorrer cortes de despesas ou subidas das taxas
de juro num futuro próximo.
As crises anteriores, que não foram tão globais, demonstram que os países doadores tendem a reduzir significativamente os
orçamentos consagrados à ajuda quando enfrentam uma grande recessão. Por exemplo, a crise bancária nos países nórdicos, em
1991, foi seguida por uma redução substancial dos desembolsos de ajuda por parte da Noruega, Suécia e Finlândia.
A própria manutenção de compromissos anteriores não protege os países destinatários de uma redução considerável dos fluxos de
ajuda, uma vez que os compromissos são expressos em termos de percentagem do rendimento nacional bruto e também devido
às oscilações das taxas de câmbio bilaterais face ao dólar.
Orçamentos consagrados à ajuda para 2009 A fim de obter uma melhor compreensão dos possíveis efeitos da crise no orçamento
consagrado à ajuda, utilizámos a análise econométrica de Bertoli et al. (2007), que cria um modelo dos determinantes económicos,
institucionais e políticos do esforço de ajuda, definido como rácio da ajuda sobre o PIB, dos 22 membros da OCDE-CAD durante
o período 1970-2004. No caso presente, estendemos a análise até 2008 e utilizámos uma especificação modificada do modelo
que permite uma relação não linear entre as recessões e o esforço de ajuda. Essa especificação reflecte a ideia de que as grandes
recessões podem ter um impacto grave, e mais do que proporcional, sobre o esforço de ajuda dos países doadores22.
As nossas estimativas sugerem que os países com maior défice orçamental não reduzem necessariamente os seus desembolsos de
ajuda, uma vez que o défice orçamental primário não proporciona uma avaliação correcta da política orçamental de um país. Esta
conclusão, em consonância com Round e Odedokun (2004), não é tranquilizadora. A análise demonstra que as ajudas diminuem
com uma dívida pública elevada e a diminuição é superior ao valor proporcional como resposta a um maior hiato do produto, o
qual mede a gravidade da recessão. As estimativas são depois utilizadas para as previsões dos orçamentos consagrados à ajuda
em 2009 para cada país doador, com base nas previsões macroeconómicas das Perspectivas Económicas da OCDE.
De acordo com as nossas previsões, os fluxos de ajuda dos países da OCDE-CAD podem diminuir 22 mil milhões de dólares em
2009 em relação ao montante de 119 mil milhões de dólares em 2008, caso os países doadores mantenham o comportamento que
tiveram em recessões anteriores23. A variação acumulada dos fluxos totais de ajuda é radicalmente diferente da perspectiva que
resulta das projecções efectuadas com base nas comunicações públicas dos países membros da OCDE-CAD (OCDE, 2009a), que estão
em consonância com compromissos anteriores. As nossas previsões representam a forma como os orçamentos consagrados
à ajuda poderão evoluir em resposta às possíveis flutuações dos ciclos económicos – trata-se, obviamente, apenas de um
cenário – podendo ser evitada desde que a maior parte dos países doadores atribua a devida prioridade à ajuda.
Para reforçar a ideia de que se trata de um cenário a evitar, tentamos avaliar a dimensão do impacto sobre os países destinatários
da África subsariana, no pressuposto de que os países doadores mantêm inalteradas as suas dotações entre 2003 e 200724. Este
exercício aproximado mostra que a maior parte dos países da África subsariana estão expostos a uma redução de 15% a 20% nos
fluxos de ajuda (figura 6.4). Este corte pode afectar particularmente os países com uma maior percentagem de ajuda na sua balança
de pagamentos25. As flutuações da ajuda são particularmente devastadoras para os países frágeis26.
21
22
23
24
25
26
Ver One 2009.
Ver Bertoli et al. (2007) para uma descrição do modelo econométrico subjacente e o documento de apoio de Allen e Giovannetti (2009) disponível no Volume
1B no que respeita aos resultados do modelo econométrico ampliado.
Ver Allen e Giovannetti (2009) para projecções específicas por país.
Os dados de 2008 relativos à ajuda bilateral ainda não estão disponíveis.
O capítulo 2 fornece dados sobre a dependência dos países frágeis em relação à APD, comparada com as remessas e o IDE. De acordo com a OCDE (2009b), num
contexto diferente e com estimativas diferentes, o Chade, a Eritreia e a Guiné devem enfrentar uma redução da ajuda em mais de 20 milhões de dólares.
A OCDE (2009b) mantém que o Burundi, a Eritreia, a Guiné-Bissau, a Libéria, a RDC e a Serra Leoa tiveram flutuações na ajuda superiores a 5% do PIB entre
1990 e 2005.
88
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Estados frágeis africanos duramente atingidos pela crise financeira mundial
Figura 6.4: Redução estimada dos fluxos de ajuda para África em 2009
■ inferior a 15 por cento
■ entre 15 e 16 por cento
■ entre 16 e 18 por cento
■ entre 18 e 20 por cento
■ superior a 20 por cento
Fonte: Elaborado pelo autor.
Obviamente, os doadores europeus devem evitar cortes nas ajudas aos países da África subsariana, em geral, e aos países frágeis, em
particular, uma vez que o canal de ajuda iria contribuir para os efeitos adversos transmitidos pelos três canais descritos anteriormente.
Na verdade, o receio de que os países doadores que efectuaram cortes significativos a nível interno para fazerem face à crise possam
reduzir os seus fluxos não pode ser facilmente dissipado, dada a experiência histórica e alguns sinais iniciais preocupantes. O FMI
(2009c) argumenta que “independentemente dos compromissos internacionais em reforçar a ajuda, as projecções não apontam
para a existência desse reforço em 2009”27 e sugere que os países de baixos rendimentos podem sofrer uma redução de 25% em
relação ao ano transacto.
A China, que possui um excedente orçamental (e também na balança de pagamentos), pode preencher a lacuna deixada pelos
países da OCDE (caixa 6.2).
Caixa 6.2: Estará a China a preencher a lacuna?
O Fórum de Cooperação China-África, lançado em 2000 pela China e pelos seus parceiros africanos (com excepção dos três
países que ainda reconhecem Taiwan como uma província autónoma) é a plataforma utilizada pela China para divulgar
os seus planos em matéria de ajuda ao desenvolvimento internacional para o continente africano28. A China presta ajuda
internacional aos países africanos através da cooperação económica, (principalmente projectos), associada frequentemente
a IDE e comércio. No final de 2006, a China tinha lançado cerca de 800 projectos de ajuda em África: 137 na agricultura,
133 em infra-estruturas, 19 em escolas, 38 em hospitais. A China enviou também 16 000 elementos de pessoal médico para
43 países africanos, formou 15 000 pessoas e perdoou dívidas africanas de cerca de 1,2 mil milhões de dólares29.
A China tinha desembolsado 5,6 mil milhões de dólares em ajuda para África até ao final de 2006. O China Exim Bank (banco
de fomento à exportação e importação da China), um dos principais agentes do país em matéria de cooperação para o
desenvolvimento, anunciou que tinha desembolsado 12,3 mil milhões de dólares em empréstimos e créditos de exportação
para África entre 1995 e 2006. O Centro de Estudos Chineses30 acrescenta que o Exim Bank tinha 259 projectos em 39 países
africanos em Setembro de 2006, dos quais 80% em infra-estruturas (barragens, vias férreas, instalações petrolíferas e minas).
Jacoby (2007) acrescenta subvenções e outros créditos aos números anteriores e estima um montante de 19 mil milhões
de dólares em auxílio financeiro da China a África até 2006.
A ajuda aos países africanos é prestada sob a forma de subvenções (principalmente em espécie), empréstimos sem juros e
empréstimos em condições preferenciais. Recentemente, a China começou a proporcionar aos países africanos uma maior
redução da dívida. Os responsáveis chineses preferem prestar ajuda sob a forma de subvenções em espécie, uma vez que
reduz consideravelmente os custos de transacção associados à prestação da ajuda e aumenta a sua eficácia31.
27
28
29
30
31
FMI 2009c, pág. 30.
Burkina Faso, Gâmbia e São Tomé e Príncipe.
Ver MOFCOM 2007.
Ver CCS 2008.
Ver Lancaster 2007.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 6
A OCDE (2008b) refere que vários países frágeis africanos (como Angola, Camarões, República do Congo, República
Democrática do Congo, Costa do Marfim, Eritreia, Libéria, Nigéria, Sudão e Togo) já receberam empréstimos em condições
preferenciais do China Exim Bank. Pehnelt (2007) considera que a maioria dos parceiros mais importantes da China no
continente têm um fraco desempenho em matéria de liberdade política e qualidade de governação, e Alves e Draper
(2007) destacam a baixa classificação no Índice dos Estados falhados em matéria de política externa (Foreign Policy’s Failed
States Index). Woods (2008) e Brautigam (2008) salientam o crescente apoio chinês a Estados que não respeitam o direito
internacional, como o Sudão e o Zimbabué, embora este apoio não se limite à prestação de ajuda, e Shinn (2008) destaca
os fortes laços militares com estes dois países.
A figura da caixa 1 compara a ajuda CAD com a cooperação económica chinesa32 para um grupo de países frágeis africanos33.
A ajuda pública ao desenvolvimento dos países CAD tem sido cíclica desde 2000, com uma tendência descendente ao
longo dos últimos anos. Pelo contrário, os fluxos da cooperação económica chinesa para os países frágeis têm aumentado
de forma uniforme e, em 2006, eram praticamente idênticos aos fluxos de ajuda dos países CAD.
A tendência é ainda maior para alguns países africanos específicos, em especial aqueles cujo apoio financeiro prestado por
países doadores ocidentais tem decrescido desde meados da década de 1990 (Angola, Guiné Equatorial, Eritreia, Sudão),
quando um número extenso de episódios de violência e instabilidade geral assolou o continente34, e recebem actualmente
a maior parte da ajuda financeira da China.
Figura da caixa 6.2: Cooperação económica da China com os países frágeis africanos e ajuda
CAD, 1998-2007
20 000
China
milhões de dólares
18 000
CAD
16 000
14 000
12 000
10 000
8 000
6 000
4 000
2007
2006
2005
2004
2003
2002
2001
2000
1999
0
1998
2 000
Fonte: Elaboração do RED baseada na base de dados da OCDE-CAD e Instituto Nacional de Estatística da China (várias edições),
Anuário Estatístico da China
De acordo com alguns observadores, a China irá beneficiar de uma possível retirada de África dos países ocidentais35,
embora essa situação apenas se torne clara depois da quarta cimeira do FOCAC, em Novembro de 2009. No início de 2009,
os líderes chineses reafirmaram o seu compromisso com África, anunciando montantes avultadíssimos para novos projectos
e outras formas de ajuda, incluindo uma redução adicional da dívida36. Antes do périplo do Presidente Hu Jintao por um
grupo de países da África Oriental, em Fevereiro de 2009, os responsáveis chineses anunciaram que a China manteria a
sua ajuda a África, “independentemente da crise financeira” e que estava planeado um aumento de 200% na sua ajuda
externa a África em relação a 200637.
32
33
34
35
36
37
De acordo com a definição fornecida pelo Instituto Nacional de Estatística da China, os dados relativos à cooperação económica com regiões ou países
estrangeiros abrangem os projectos financiados pelos programas de ajuda da China e os projectos contratados assinados por adjudicatários chineses. Assim,
é importante utilizar alguma prudência no que respeita à comparação entre os fluxos de saída (exfluxos) da cooperação económica chinesa que, de acordo
com a OCDE (2008a), inclui a APD chinesa (embora provavelmente sobrestimada) e a APD dos países em desenvolvimento, que constitui uma categoria mais
centrada e auto-explicável.
Os países frágeis foram seleccionados de acordo com a definição operacional proposta pela OCDE (2009b) e adoptada no capítulo 2 do presente relatório.
Ver Tull 2008.
Ver Cook e Lam 2009.
Ver Brown e Chun 2009.
“China to maintain aid, investment in Africa regardless of financial crisis”, China View, 2 de Junho de 2009.
90
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Estados frágeis africanos duramente atingidos pela crise financeira mundial
3.4 ABRANDAMENTO DAS REMESSAS
As remessas de migrantes para a África subsariana atingem países onde outros fluxos privados, como os investimentos directos
estrangeiros, são limitados ou inexistentes, chegando mesmo a exceder a ajuda pública ao desenvolvimento38. E muitos migrantes
subsarianos dos países frágeis (bem como refugiados) vivem nas redondezas, uma vez que não podem suportar os elevados custos
da migração para países com rendimentos elevados (figura 6.5)39.
Figura 6.5: Muitos migrantes residem no interior de África
■ menos de 20 por cento
■ 20-40 por cento
■ 40-60 por cento
■ 60-80 por cento
■ mais de 80 por cento
Fonte: Elaboração do autor com base em dados da Universidade de Sussex e do Banco Mundial mencionados em Ratha e Shaw (2007).
As remessas são importantes para os países destinatários não só pela sua dimensão como também porque tendem a ser estáveis e
mesmo a estarem em contraciclo com os ciclos económicos dos países destinatários, reduzindo assim a probabilidade de uma crise
na balança de pagamentos40. Então, de que modo responderam as remessas para os países frágeis africanos à actual recessão?
Existem diversas hipóteses. Ratha e Mohapatra (2009), após o optimismo inicial, prevêem que as remessas para a África subsariana
cairão 7% em 2009 para 18 a 19 mil milhões de dólares, em relação ao montante de 20 mil milhões de dólares registado oficialmente
em 2008 (não inclui os canais informais, utilizados normalmente por migrantes intra-regionais). O FMI (2009b) afirma que a redução
de um ponto percentual na taxa de crescimento económico nos países de origem dos migrantes reduz o volume das remessas
enviadas em cerca de 4%. Calí e Dell’Erba (2009) defendem que, em comparação com a América Latina e as Caraíbas ou a Ásia
Oriental e o Pacífico, a África subsariana sofrerá uma queda moderada de cerca de 6% a 9% nos fluxos oficiais em 2009, dado que
a sua percentagem de remessas oriundas de países com rendimentos elevados foi relativamente baixa em 200841.
As remessas enviadas através dos canais oficiais e dos países tradicionais de destino dos migrantes são, no entanto, apenas uma
parte da história, com a migração intra-regional a constituir um importante canal de transmissão dos países emergentes africanos
para os países frágeis subsarianos. Uma avaliação detalhada por país exigiria previsões razoáveis sobre os fluxos de remessas e
a evolução das taxas de câmbio bilaterais dos países de destino dos migrantes face ao dólar, uma vez que este é o factor mais
relevante na determinação do valor do dólar no que respeita às remessas recebidas dos migrantes. Porém, sem essas previsões,
não é possível efectuar uma avaliação.
A diminuição das remessas pode afectar a composição das despesas, caso as remessas sejam consideradas como um rendimento
de fontes nacionais a ser investido na educação e na habitação42.
Assim, os países frágeis da África subsariana sofrerão uma queda acentuada nas receitas do comércio, devido a uma queda na
procura internacional e à deterioração das condições do intercâmbio. Além disso, estão também expostos a uma diminuição das
remessas provenientes dos países em desenvolvimento e emergentes da África subsariana, os quais são os principais destinos de
38
39
40
41
42
OCDE 2008.
Sander e Maimbo 2005.
Ver Ratha (2006) para informações sobre movimentos contracíclicos de remessas e Bugamelli e Paternó (2006) para um debate sobre o papel das remessas
em crises da Balança de Pagamentos.
A ODI (2009b) refere que as remessas no Quénia, maioritariamente provenientes dos Estados Unidos, caíram 12% na primeira metade de 2009 em comparação
com o período homólogo de 2008.
Maimbo e Ratha 2005.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 6
migrantes dos países frágeis, e a uma redução dos fluxos de IDE. Estes efeitos adversos podem também ser acompanhados por
uma diminuição dos fluxos de ajuda dos países CAD, caso estes não respeitem os seus compromissos com África e reajam, tal como
as experiências do passado sugerem, à recessão através de cortes nos orçamentos consagrados à ajuda.
4. PODEM OS ESTADOS FRÁGEIS FAZER FACE À CRISE?
Os países frágeis sofrerão os efeitos da queda acentuada no comércio internacional. Mas também
sofrerão com a deterioração das condições do intercâmbio e da redução das remessas, devido ao elevado
desemprego nos países em desenvolvimento e nos países emergentes da África subsariana, bem como
com a redução dos IDE, os desinvestimentos e possivelmente a redução dos fluxos de ajuda, pelo menos
a curto e médio prazo. Para compreender a forma como podem fazer face à recessão ou a outros choques
negativos, propomos e aplicamos um índice de resiliência global.
A resiliência é uma característica multifacetada de um sistema socioeconómico, que apenas está parcialmente compreendida
e cuja medição é controversa. Seguindo Naudé (2009), centramo-nos aqui apenas na sua dimensão macroeconómica, que está
relacionada com a capacidade do Estado para implementar políticas adequadas em reacção a um choque como, por exemplo, a
crise de 2008-2009. Assim, não são tidas em conta outras dimensões da resiliência, a nível familiar ou comunitário, cuja relevância
não deve ser minimizada, mas as instituições do Estado ainda representam um pilar de resiliência. Tendo em conta esta condição,
criámos um índice da resiliência de cada país da África subsariana, analisando quatro dimensões separadas43:
• gestão macroeconómica, reflectida na balança de pagamentos, nos equilíbrios orçamentais e nos níveis das reservas
cambiais;
• boa governação;
• eficiência de mercado, medida pelos indicadores Doing Business em 2009;
• coesão social, medida através da utilização do índice de fragmentação linguística e do índice de estabilidade política.
Em seguida, agrupámos estas quatro componentes do índice de resiliência e classificámos os países da África subsariana, de acordo
com a sua capacidade de enfrentar choques externos, em três categorias principais: resiliência baixa, média e elevada. A maior
parte do subgrupo dos países frágeis possui a classificação de resiliência baixa (quadro 6.1).
Quadro 6.1: Classificação de resiliência: de baixa a elevada
Baixa
Média
Elevada
Congo (República
Democrática do)
1
Etiópia
16
Burkina Faso
31
Chade
3
Serra Leoa
17
Togo
32
Burundi
4
Zâmbia
18
Madagáscar
33
República CentroAfricana
5
Malávi
19
Benim
34
Eritreia
6
São Tomé e Príncipe
20
Tanzânia
35
Congo (República do)
7
Camarões
21
Moçambique
36
Guiné-Bissau
8
Mali
22
Lesoto
37
Costa do Marfim
9
Uganda
23
Suazilândia
38
Guiné
10
Nigéria
24
Seicheles
39
Níger
11
Gana
25
Gabão
40
Quénia
12
Senegal
26
Namíbia
41
Libéria
13
Cabo Verde
27
África do Sul
42
Angola
14
Ruanda
28
Maurícias
43
Comores
15
Guiné Equatorial
29
Botswana
44
Gâmbia
30
Fonte: Naudé 2009.
43
Ver o documento de apoio de Naudé (2009) no Volume 1B com informações adicionais sobre o índice.
92
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Estados frágeis africanos duramente atingidos pela crise financeira mundial
Constatámos que a maior parte dos países frágeis se encontram no grupo de países de resiliência baixa. É provável que, em cada país,
as pessoas mais afectadas sejam as mais pobres, aquelas com uma resiliência inferior à média (a nível comunitário e familiar).
A capacidade dos países frágeis para reagirem à crise foi dificultada não só pela própria fragilidade como também pelas anteriores
crises alimentar e petrolífera: os países frágeis importadores de produtos alimentares e de petróleo foram afectados pela transmissão
dos efeitos reais da crise de 2008-2009 quando muitos deles se encontravam já numa situação de extrema pressão, o que agravou
a sua capacidade limitada de enfrentar a crise devido à fragilidade das suas instituições públicas.
4.1 GRAVE IMPACTO SOCIAL DA CRISE
O impacto da crise de 2008-2009 na África subsariana varia entre os países e no interior destes, embora a sua extensão seja difícil
de avaliar devido ao desfasamento e à escassez de dados. A figura 6.6 apresenta uma breve descrição do impacto da crise e da
forma como foi agravada pela fragilidade das instituições públicas. A crise de 2008-2009 influencia directamente as instituições
públicas e os agentes não estatais. O efeito combinado das estratégias de adaptação das instituições públicas e dos agentes não
estatais determina o impacto da crise no bem-estar social.
Figura 6.6: O impacto da crise no bem-estar social
Crise financeira
Fragilidade do Estado
Canais de transmissão: remessas, ajuda, comércio,
fluxos de capital
Os impactos em agentes não estatais como, por
exemplo, famílias, sociedade civil e instituições
económicas, dependem dos efeitos da crise
dos produtos alimentares e dos combustíveis,
das poupanças, da diversificação dos rendimentos,
da disponibilidade de activos
Os impactos nas instituições de Estado
dependem da fragilidade do Estado,
do impacto da crise dos produtos
alimentares e dos combustíveis, da
vulnerabilidade estrutural
Reacções políticas: redução
nos serviços sociais, despesa,
inflação, inexistência de redes
de segurança sociais
Estratégias de adaptação:
retirar as crianças da escola,
vender bens, trabalhar no sector
informal
Impacto no bem-estar social: (Pobreza, estado
dos sistemas educativo e da saúde, conflitos)
De acordo com Chen e Ravaillon (2009), a conjugação da crise financeira com os preços máximos dos produtos alimentares e dos
combustíveis irá aumentar o número de pessoas pobres entre 53 e 64 milhões em 2009, com base em estimativas de pessoas que
vivem com menos de 2 dólares e 1,25 dólares por dia, respectivamente. Os países da África subsariana devem perder, pelo menos,
50 mil milhões de dólares de receitas em 2009. As taxas de mortalidade neo-natal e infantil também devem aumentar. Friedman
e Schady (2009) estimam que a crise possa aumentar entre 30 000 e 50 000 o número de mortes de crianças na África subsariana.
O IFPRI prevê que a prevalência de subnutrição entre as crianças da África subsariana aumentará de um quinto em 2005 para um
quarto em 2020.
As mulheres chefes de família pobres, os agricultores, os trabalhadores fabris, os prestadores de serviços informais e os PDI e
refugiados apanhados em situações de guerra são os mais vulneráveis a choques. Uma pesquisa da UNRISD44 salienta que as mulheres
chefes de família têm uma carga de trabalho maior e menos tempo para descansar e cuidar da saúde dos seus familiares.
44
UNRISD 2006.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 6
Obiageli Ezekwesili, vice-presidente do Banco Mundial para a Região de África, afirmou em Maio de 2009 que “a crise económica
global reduzirá drasticamente os rendimentos individuais das mulheres africanas, bem como os orçamentos familiares que gerem,
com consequências particularmente desastrosas para as raparigas [...] A pobreza tem uma face feminina e a recessão económica
terá um impacto significativo sobre as mulheres, uma vez que cada vez mais perdem o emprego e são forçadas a gerir rendimentos
familiares que diminuem45.” Uma pesquisa do Banco Mundial mostra já uma redução dos rendimentos familiares no Uganda e uma
quebra nos rendimentos agrícolas em Madagáscar, onde as raparigas são as primeiras a serem retiradas das escolas. Ezekwesili
observa também que “a crise em África está a deixar as mulheres com cada vez menos possibilidades de emprego. Em muitas
indústrias voltadas para a exportação [...] são as mulheres, não os homens, que estão a perder empregos em toda a África devido
à crise. A redução das remessas e a limitação do microfinanciamento estão a restringir os fundos disponíveis para as mulheres
gerirem os seus orçamentos familiares.”
A capacidade dos governos dos países frágeis para reagirem à crise foi dificultada não só pela fragilidade como também pelas
anteriores crises alimentar e petrolífera: os países frágeis importadores de produtos alimentares e petrolíferos foram atingidos
pelos efeitos reais da crise quando já se encontravam numa situação de extrema pressão, o que limitou as suas receitas e
investimentos.
O colapso global da procura provocou a perda de postos de trabalho em muitas indústrias. A AfDB (2009c) refere que existirão, na
África subsariana, 27 milhões de novos pobres, mais 28 milhões de empregos vulneráveis, nomeadamente na indústria mineira e
na indústria transformadora, e mais 3 milhões de desempregados a seguir à crise. Avaliações recentes referem maiores reduções
das horas de trabalho, o que força os trabalhadores a optarem por actividades com menor produtividade ou pelo sector informal,
com a inerente taxa de desemprego elevada e insegurança de rendimentos46.
Adoptar estratégias a nível familiar: o impacto directo nas famílias depende também da disponibilidade de activos, da diversificação
dos rendimentos, das poupanças e das redes locais de segurança, como as associações fúnebres. As alterações dos preços afectam
tanto produtores como consumidores. A menor procura global de produtos de base pressiona os preços em baixa, reduzindo as
receitas dos produtores. As quedas de preços são boas para os consumidores líquidos mas, infelizmente, a transmissão da redução
nunca é total e demora muito tempo a chegar aos consumidores finais47. A inflação dos preços dos produtos alimentares é muito
elevada e, com o tempo, irá colocar em causa a segurança alimentar e reduzir o orçamento dos pobres no que respeita a aspectos
não alimentares, como a educação e a saúde.
A combinação de activos e de mecanismos de segurança define estratégias de adaptação das famílias nos países frágeis. Para
enfrentarem a crise, as famílias poderão ter de vender bens, retirar as crianças da escola, reduzir o recurso a cuidados de saúde e
cortar nas despesas com a alimentação, optando por produtos de qualidade inferior com menos calorias. Esta situação cria um
círculo vicioso que condiciona as possibilidades das gerações mais novas saírem da situação de pobreza. Na verdade, existem
grandes probabilidades de as crianças não regressarem à escola depois de terminada a crise ou de não colmatarem as lacunas de
aprendizagem decorrentes da falta de assiduidade. Por outro lado, a quebra do consumo alimentar entre as crianças pode conduzir
a efeitos irreversíveis (caixa 6.3)48.
45
46
47
48
Banco Mundial 2009d.
Banco Mundial 2009a.
ODI 2009b.
Banco Mundial 2009b.
94
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Estados frágeis africanos duramente atingidos pela crise financeira mundial
Caixa 6.3: Choques adversos e protecção social: qual o papel das instituições financeiras
formais e informais? (Adverse shocks and social protection – what role for formal and
informal financial institutions?)
Por Abena D. Oduro, Departamento de Economia, Universidade do Gana
Os indicadores objectivos do risco em África incluem a variabilidade da precipitação, a sazonalidade dos preços dos
produtos vegetais e a proporção de famílias com acesso a água potável e saneamento básico. A incidência de choques
comunicados pelos próprios é outro indicador da extensão e da natureza dos riscos e choques que as famílias africanas
enfrentam. Na Tanzânia, por exemplo, cerca de dois terços das famílias rurais inquiridas nas regiões do Quilimanjaro e do
Ruvuma comunicaram choques que afectaram os seus meios de subsistência durante cinco anos (Sango et al., 2007).
As famílias tendem a ser atingidas por mais do que um choque. Em Terna, um distrito maioritariamente urbano do Gana, a
maior parte das famílias comunicou um ou dois choques durante um período de dois anos. Este resultado contrasta com
o de Builsa, um distrito maioritariamente rural, onde mais de metade das famílias comunicaram mais de quatro choques
nos dois anos. A crise mundial actual e o seu impacto nas economias africanas aumentam o risco e a incerteza para as
comunidades e as famílias já propensas ao risco.
Os choques adversos têm impactos a curto e longo prazo. Por exemplo, as inscrições escolares de rapazes e raparigas na
Costa do Marfim caíram após um choque climatérico. Houve um aumento de subnutrição infantil nas áreas que sofreram
o choque (Jensen, 2000).
A redução dos investimentos na educação e na saúde das crianças na sequência de um choque pode ter impactos negativos
duradouros. A queda do consumo significa que algumas pessoas ou famílias poderiam tornar-se pobres ou, caso já o fossem,
continuarem pobres. Em alguns países, o número de pobres temporários, que entram ou saem da situação de pobreza,
pode ser significativo.
Em resposta a um choque adverso, as famílias equilibram a redução do consumo e a alienação dos bens. As famílias utilizam
uma grande variedade de medidas para gerir o risco e responder a choques adversos. Estes mecanismos de adaptação
dependem substancialmente das redes familiares (núcleo e restantes elementos), de outras redes e da segurança própria
(por exemplo, a venda de bens). O recurso à protecção social pública e a instrumentos formais de crédito e de seguro é
limitado.
A prevalência de acordos informais de financiamento pode ser explicada pela oferta e pela procura. A cobertura geográfica dos
bancos e de outras instituições financeiras formais é limitada. As comunidades rurais e remotas são servidas deficientemente
por estas instituições. Os programas de microfinanciamento possuem uma cobertura muito mais ampla. Não é provável
que as instituições financeiras formais expandam a cobertura na economia rural até que possam resolver adequadamente
os problemas de selecção adversa e risco moral. A procura de crédito e seguro informais persiste porque os custos de
transacção para empréstimos informais podem ser inferiores aos dos empréstimos formais. Os custos do incumprimento
de um empréstimo informal podem ser inferiores aos de um empréstimo formal. Num ambiente de elevado risco, este facto
pode desviar a procura de crédito e seguro para o sector informal. Alguns exemplos de instituições financeiras informais
são as associações fúnebres e as associações de poupança e crédito renovável, que não estão vocacionadas para fornecer
protecção contra choques adversos.
As evidências empíricas sugerem que as famílias não podem proteger-se totalmente contra os riscos. Os acordos de partilha
de riscos têm mais probabilidade de fornecer protecção contra choques idiossincráticos do que contra choques covariáveis (ou
concomitantes). Por exemplo, as associações fúnebres fornecem normalmente protecção contra choques covariáveis. Mas,
normalmente, as pessoas pobres não conseguem este tipo de acordos.49
O elevado risco das economias africanas e o facto de as famílias não conseguirem proteger o consumo quando são atingidas
por choques adversos sugerem que deve existir uma grande procura de protecção. Um estudo sobre famílias rurais na
Tanzânia concluiu que existe procura de protecção contra as flutuações dos preços e quedas de precipitação. A vontade
de pagar a protecção depende da disponibilidade de dinheiro para o efeito (Sarris et al., 2007).
49
Ver Harrower e Hoddinnot, 2005, Hoogeveen, 2003 e de Weerdt, 2009; os acordos de partilha de risco podem proporcionar uma segurança parcial mas não
total. As contribuições podem não ser suficientes para cobrir o custo total do choque. É menos provável que as famílias contratem seguros que cubram
totalmente os diversos riscos (Harrower e Hoddinnot, 2005; Hoogeveen 2003). As entradas e saídas das famílias de uma situação de pobreza ao longo do
tempo sugerem a inexistência ou a falibilidade de mecanismos de gestão de risco que possam proteger adequadamente as famílias do risco de pobreza
quando ocorrem choques.
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95
DESENVOLVIMENTO
Capítulo 6
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
4.2 O RISCO DA INSTABILIDADE POLÍTICA E DO RESSURGIMENTO DE CONFLITOS
A fragilidade das instituições de Estado atenua os processos políticos necessários para atingir o equilíbrio entre a capacidade do
Estado e as expectativas dos cidadãos. A crise económica e financeira mundial reduz as possibilidades de manter esse equilíbrio
nos países frágeis da África subsariana. O conflito armado é uma consequência possível da divergência entre a capacidade do
Estado e as expectativas dos cidadãos. Esta preocupação foi formulada por Dominique Strauss-Khaus, director-geral do FMI,
que defendeu que, no que respeita aos países com rendimentos baixos, “não nos preocupamos apenas com o crescimento em
si, também queremos preservar a paz e evitar a guerra. Na verdade, quando os países com rendimentos baixos tiveram um bom
desempenho durante a última década, os incidentes de guerra diminuíram significativamente. O maior receio é que esta tendência
possa ser invertida50.”
Miguel et al. (2004) analisaram as características de uma guerra civil em 41 países africanos, demonstrando que uma redução de
5% da taxa de crescimento económico aumenta em 50% o risco de um conflito. Brückner e Ciccone (2007) sustentam que a quebra
do preço de um produto base de exportação aumenta a probabilidade de um conflito armado. E Ciccone (2008) mostra que uma
quebra das receitas provocada por uma seca produz um efeito idêntico.
Esse resultado trágico da crise nos países frágeis da África subsariana aumenta os custos sociais humanos da crise económica e
financeira mundial. Embora os países da África subsariana não sejam necessariamente mais afectados por um grande choque
macroeconómico do que outros países da região, as consequências podem ser muito mais graves, devido à sua capacidade limitada
para implementar respostas políticas adequadas aos choques. É por isso que a protecção dos países frágeis contra o impacto da
crise deve constituir uma das principais prioridades dos doadores.
50
Strauss-Kahn 2009.
96
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
CAPÍTULO 7
CONSTRUÇÃO DO ESTADO E COESÃO SOCIAL
A construção do Estado tornou-se uma prioridade fundamental para a comunidade internacional de
desenvolvimento. Actualmente, quase todos os grandes doadores identificam a construção do Estado
como um dos principais objectivos de desenvolvimento, em especial nos Estados frágeis1. O consenso
cada vez maior sobre a necessidade de compromissos duradouros com os países frágeis coincidiu com o
reconhecimento, numa era pós Consenso de Washington, do papel essencial das instituições de Estado
no processo de desenvolvimento. Tal como a Comissão para África salientou no seu relatório de 2005, as
instituições são essenciais para promover o desenvolvimento e os Estados têm um papel fundamental
nas mudanças necessárias para concretizar e manter os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio.
A comunidade internacional também assume compromissos nos países frágeis com base em objectivos
de curto prazo, os quais são prosseguidos tendo em conta o contexto institucional existente. Mas como
é afirmado nos Princípios OCDE, “a perspectiva de longo prazo da intervenção internacional nos Estados
frágeis assenta no apoio às reformas nacionais, de forma a constituir instituições eficazes, legítimas e
resistentes2.”
A comunidade internacional deve, contudo, ter expectativas realistas sobre a possibilidade destes processos internos poderem
ser influenciados. Apoiar o reforço das instituições de Estado não constitui um simples esforço técnico. A construção do Estado
é um processo que exige a criação de um sentimento de cidadania e envolve valores, expectativas e percepções comuns ligados
ao Estado pelas pessoas, sociedade civil e comunidades. Além disso, a formação de instituições de Estado ajustáveis, capazes e
responsáveis exige a promoção da capacidade de cobrança de impostos e mecanismos para consulta das populações.
Na Europa, a formação de Estados eficazes e sólidos foi um processo que durou séculos e baseou-se profundamente em guerras
internacionais (capítulo 3). Existem poucos fundamentos para apoiar a ideia de que podem ser introduzidas mudanças nos Estados
frágeis, num curto período de tempo, no sentido de se assemelharem ao ideal de Weber. Na verdade, em muitos países africanos,
os Estados frágeis são o resultado de regras coloniais que tentaram moldar os países de acordo com o modelo ocidental, impondo
regras de territorialidade e controlo. Um desafio importante da construção do Estado no continente africano é a institucionalização
de um sentimento de identidade comum e o desenvolvimento de estruturas formais estáveis, sem referir o modelo estilizado
de construção do Estado europeu, o qual não pode prestar a orientação necessária às populações africanas e aos esforços dos
governantes para desenvolver Estados eficazes e legítimos.
1. DEVOLVER AO ESTADO UM PAPEL IMPORTANTE
Remodelar as bases formais e informais do Estado para construir Estados mais legítimos e representativos,
que sirvam os interesses dos seus cidadãos em vez dos interesses de um círculo restrito no poder, é
o que está em causa neste caso. Trata-se indubitavelmente de um esforço a longo prazo. Redefinir
a compreensão e os acordos subjacentes à política e unir o Estado e a sociedade exige uma análise
profunda das estruturas de poder incorporadas e fundamentalmente a sua alteração. Mas esta tarefa
poderá ser extremamente difícil e sensível, sobretudo porque, num sentido muito real, o esforço inerente
à construção do Estado, especialmente em situações de pós-conflito, assenta inevitavelmente mais na
negociação e no compromisso do que em mudanças fundamentais.
A construção do Estado constitui um processo endógeno, que a comunidade internacional pode apoiar, mas não dirigir. Na sua
formulação mais simples, a construção do Estado refere-se aos esforços dos agentes nacionais (por vezes com a ajuda de agentes
internacionais) com vista ao estabelecimento, reforma e reforço das instituições de Estado, quando estas estão gravemente
desgastadas ou não existem3. Por outras palavras, a construção do Estado tem a ver com a construção da legitimidade e o reforço
da capacidade das instituições de Estado com o objectivo de prestarem serviços básicos aos cidadãos: segurança, justiça e Estado
de Direito, bem como escolas, saúde, higiene pública, água, todos a corresponderem às expectativas dos cidadãos.
As experiências das intervenções em matéria de construção do Estado demonstram que os dois extremos das intervenções
internacionais têm possibilidades de sucesso limitadas: nem uma abordagem mínima apenas centrada na manutenção da paz nem
1
2
3
Fritz e Rocha Menocal 2007.
OCDE-CAD 2007.
Caplan 2005.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 7
uma tentativa geral de engenharia institucional podem ser eficazes. Uma abordagem progressiva baseada em expectativas realistas
sobre o que as intervenções internacionais podem conseguir tende a ser mais adequada. Os critérios gerais para as intervenções em
matéria de construção do Estado devem estimular todas as oportunidades no terreno, evitando planos ambiciosos de refundação
das instituições de Estado e do pacto social. E porque a construção do Estado constitui um processo político profundo, o bom
conhecimento do contexto local e uma abordagem ascendente compatível com os incentivos são essenciais para aumentar as
possibilidades de sucesso das intervenções internacionais.
2. COESÃO SOCIAL E DIMENSÕES IMATERIAIS DA CONSTRUÇÃO DO ESTADO
O conceito de construção do Estado evoluiu consideravelmente nos últimos anos. Na década de 1990,
a tónica era colocada na construção e no reforço das instituições formais e da capacidade do Estado.
Mas, recentemente, esta posição alterou-se e existe actualmente o reconhecimento de que o Estado
não pode ser encarado de forma isolada e que as relações Estado-sociedade são centrais nos processos
de construção do Estado. O elemento central da construção do Estado, em especial a construção de
um Estado “ajustável”4, passou a ser entendido como um processo político eficaz para os cidadãos e os
Estados negociarem as exigências, obrigações e expectativas mútuas5. Uma situação frágil caracteriza-se
pela não existência desse processo eficaz. A debilidade das instituições de Estado, por exemplo, tem a
ver igualmente com os mecanismos de selecção de poder, algumas vezes distorcidos por laços étnicos ou
religiosos, pouco ou nenhum controlo sobre o executivo do Estado e ausência de participação pública nas
decisões políticas. Esta mudança colocou o conceito de legitimidade, considerado como um instrumento
para o reforço da capacidade de Estado e um objectivo em si, no centro da agenda da construção do Estado.
Assim, a ênfase transitou de uma abordagem “descendente” do reforço institucional (centrada nos agentes estatais e nas elites
nacionais) para uma abordagem “ascendente”, que relaciona Estado e sociedade (trabalhada através da sociedade civil)6. Todavia,
demasiadas vezes, a ênfase é colocada nas elites e nas instituições centrais e formais (ver caixa 7.6), fracassando na criação de um
processo político mais inclusivo e utilizando uma abordagem apenas nacional e não local7. Além disso, a comunidade internacional
tende a centrar-se nos aspectos técnicos da construção do Estado (tais como programas de formação para os funcionários públicos),
dado que estes aspectos são considerados não intrusivos e apolíticos.
Se a construção do Estado não se refere apenas à capacidade de desenvolvimento das instituições do Estado, mas, num contexto
mais amplo, ao processo de negociação entre cidadãos, grupos sociais e Estado, uma perspectiva demasiado centrada nos aspectos
técnicos da construção do Estado corre o risco de negligenciar as dinâmicas do processo político com vista à conciliação da
capacidade do Estado e as expectativas sociais. A fragilidade do Estado constitui, de facto, um fenómeno político profundo,
caracterizado pela inexistência de processos políticos eficazes que possam conciliar as capacidades do Estado e as expectativas
sociais. Uma perspectiva centrada exclusivamente nos aspectos formais não conseguirá recuperar a eficácia do processo político
que está na base do pacto social. As intervenções em matéria de reforço da capacidade das instituições de Estado devem ser
acompanhadas e complementadas por medidas que tenham em conta o papel das percepções e expectativas, das consultas às
populações e a forma como as populações se sentem representadas pelas instituições públicas.
2.1 TER EM CONTA A IMPORTÂNCIA DAS “DIMENSÕES IMATERIAIS” DO ESTADO.
As intervenções internacionais relativas à construção do Estado não podem ignorar os elementos sociais e culturais que apoiam
as instituições do Estado. A compreensão das estruturas de governação de um país pode ser consideravelmente melhorada pela
análise da forma como o contexto histórico e cultural molda as percepções públicas de quem são as “autoridades” e quais são as
instituições informais existentes com maior influência. Estas dimensões imateriais podem, por exemplo, influenciar as reformas
políticas e judiciais. As divisões da sociedade em dimensões étnicas, religiosas, raciais e espaciais podem influenciar o funcionamento
dos processos eleitorais. Durante o processo de revisão ou de elaboração de uma constituição, as campanhas de educação cívica e
os mecanismos de deliberação que incluem a perspectiva das populações podem assegurar um consenso e criar um sentimento de
confiança e ligação em relação à constituição. Os valores comuns, as crenças, as percepções e os valores culturais são igualmente
elementos importantes das reformas de segurança (caixa 7.1).
4
5
6
7
Whaites 2008.
OCDE-CAD 2008.
Pouligny 2009.
Ver Kaplan (2009) no volume 1B para um exame detalhado da vantagem do envolvimento dos agentes locais.
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Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Construção do Estado e coesão social
Caixa 7.1: Porque é que a resiliência local pode melhorar a segurança
(Why local resilience can improve security)
por Béatrice Pouligny, Universidade de Georgetown
Os elementos sociais e culturais subjacentes às instituições de Estado e que asseguram o seu funcionamento são especialmente
importantes em situações frágeis. As perspectivas convencionais necessitam de ser ampliadas a fim de abrangerem a multiplicidade
e diversidade das instituições políticas (formais e informais) e as culturas que podem apoiar a resiliência do Estado e os processos
de construção do Estado.
Encarar com seriedade as percepções e as atitudes locais em relação às questões de segurança em contextos
de fragilidade
Uma perspectiva centrada nos aspectos técnicos das reformas institucionais dirige a ajuda para os sintomas do problema em
vez das causas. Os peritos tendem a reproduzir soluções técnicas e baseiam-se em estratégias “modelo” que não são capazes
de integrar uma compreensão profunda das situações locais e baseiam-se ainda menos nas normas e práticas locais. Todavia, a
prática no terreno mostrou que as reformas e as políticas no sector da segurança estão condenadas ao fracasso se não integrarem
dimensões “imateriais” que definem a forma como as questões de segurança são apreendidas e podem ser resolvidas num
determinado contexto.
Por exemplo, uma das questões mais urgentes da agenda de muitos Estados “frágeis” tem a ver com a redução das armas ligeiras
e de pequeno calibre. A maior parte dos estudos mostra a importância de ter em conta nesta questão não apenas a perspectiva
da oferta, mas também a da procura, analisando os motivos pelos quais cidadãos ou grupos querem ou desejam este tipo de
armas. São essenciais questões como: “Porque é que as pessoas possuem e compram armas ligeiras? Quais as funções políticas,
económicas e sociais das armas e que ideias (sobre violência, segurança, justiça, autoridade, interesse próprio, género) estão
subjacentes a estas?” Esta análise de motivações para a aquisição de armas ligeiras exige a participação de antropologistas,
criminologistas, psicologistas, sociologistas e economistas comportamentais. Estas abordagens sublinham o facto de que, da
perspectiva da sociedade, o desarmamento é uma questão muito mais vasta do que deixar simplesmente de utilizar as armas e
facilitar a sua recolha. É também uma questão de mudança de atitudes.
O mesmo acontece com o sentimento de segurança, um processo subjectivo. As avaliações dos problemas e das necessidades de
segurança tendem a ser altamente subjectivas. Quando são realizadas exclusivamente através do filtro dos conceitos de segurança
humana dos países doadores, as especificidades das percepções de segurança locais correm o risco de ser minimizadas ou
ignoradas. Num dado país, os diferentes agentes podem também entender e definir os seus problemas de segurança de diferentes
formas. Podem ser influenciados por uma diversidade de eventos e perdas emocional, social e culturalmente traumáticos e pela
destruição de normas sociais e códigos de conduta. Estes são os problemas que a maior parte dos cidadãos e das comunidades
enfrentam em situações frágeis, frequentemente caracterizadas pela violência e imprevisibilidade da vida quotidiana. Em contextos
de fragilidade diferentes, por exemplo, o Congo Oriental (na República Democrática do Congo), uma microanálise das percepções
de insegurança locais também pode ajudar a evitar a violência contra civis e a proteger as populações locais, uma preocupação
crescente para a comunidade internacional.
A fragilidade não é sinónimo de vazio institucional: mecanismos comunitários para gerir ameaças de segurança,
fazer justiça e facilitar a reintegração
Em muitas situações, as instituições estão destruídas ou são disfuncionais ou ilegítimas, ou existe até a conjugação destes três
aspectos. A infra-estrutura está destruída. Existe uma capacidade humana muito reduzida com pouco, ou nenhum, pessoal
qualificado. E a população sente uma profunda desconfiança e falta de fé no Estado. Nestas circunstâncias, fica a impressão
de que é necessário reconstruir o aparelho de Estado e construir novas instituições de raiz, em condições que são muitas vezes
descritas como “anarquia virtual”, o que explica a referência frequente a noções como “vazio de segurança” ou “vazio do Estado
de Direito”.
Todavia, a prática mostrou repetidamente que não existe esse vazio, mesmo quando as estruturas de Estado entraram
completamente em colapso. De facto, as questões relacionadas com a justiça e a segurança em situações de pós-conflito e nos
países frágeis são administradas não pelas autoridades judiciárias ou policiais mas por organizações não estatais de justiça e de
segurança. Prestar atenção aos mecanismos existentes permite uma melhor compreensão das necessidades das populações, bem
como dos obstáculos, das possibilidades e dos recursos, com vista a (re)construir uma relação Estado/sociedade funcional e de
apoio. Mesmo em situações descritas como anarquia, tais como a Somália ou o Congo Oriental (RDC), vários agentes cumpriram
em parte as funções que deveriam ser exercidas pelo Estado, mesmo que esse cumprimento tenha sido realizado de forma
disfuncional.
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Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 7
Os esforços comunitários para reduzir as ameaças de segurança criadas pela proliferação de armas ligeiras ou para reintegrar excombatentes e recuperar a confiança entre estes e as comunidades locais sublinham os valores locais e os elementos imateriais das
culturas locais com vista à construção de instituições sustentáveis. Em Moçambique e no norte do Uganda, os rituais tradicionais
facilitaram a reintegração das ex-crianças-soldados. Estas medidas demonstraram o sucesso de estratégias profundamente
enraizadas no contexto social e cultural e que consideram as dimensões subjectivas e psiquiátricas da reintegração.
• Os rituais ajudam a transformar as visões do mundo e permitem que as pessoas tenham uma perspectiva mais ampla do conflito.
Quando as visões do mundo estão em desagregação, os rituais podem criar novas formas de pensamento e alterar drasticamente
a forma como as pessoas encaram o mundo. Podem também tornar os conflitos menos destrutivos reenquadrando as questões
em jogo e permitindo que as pessoas abordem os problemas de novas formas.
• Estes sistemas (frequentemente qualificados como “tradicionais” e “informais”) são igualmente formas mais abrangentes
de governação que vão mais além da resolução de litígios. Os seus líderes e operadores podem também envolver-se no
funcionamento quotidiano das suas aldeias ou comunidades. Embora estes sistemas possam ter sido seriamente afectados e
alterados pela violência, é provável que se mantenham mais intactos do que os sistemas formais.
• Uma contribuição única destes sistemas promove a confiança social e a reintegração na comunidade, em especial depois de
situações de violência. Geralmente, baseiam-se em noções de ordem e comunidade, sendo a principal questão o bem-estar
da comunidade e não apenas o da vítima.
Mas estes sistemas também podem ter inconvenientes e comportar perigos, especialmente em matéria de direitos humanos,
igualdade do género e direitos dos jovens. Assim, os mecanismos tradicionais e informais devem ser sujeitos a uma avaliação
pormenorizada e contextualizada em relação às limitações com que se deparam em vários contextos: a erosão e a potencial
distorção das autoridades e normas tradicionais; o risco de abuso de poder e padrões de domínio; o risco de manipulação política;
a questão da legitimidade e eficácia do sistema; a limitada aplicabilidade nas regiões e junto de grupos étnicos. Estas limitações
são geralmente consideradas como tendo melhor resposta por parte dos agentes locais da sociedade civil, que podem promover
e apoiar a adaptação de sistemas que têm sido constantemente alterados ao longo dos tempos.
Resumindo, para os países doadores e agências internacionais, e em especial para a UE, deve ser uma prioridade absoluta
compreender melhor a forma como as populações reagem aos problemas de segurança quotidianos nos locais onde o sistema
de Estado é fraco ou onde os próprios Estados são a causa dos problemas.
2.2 TER EM CONTA A SOCIEDADE CIVIL
Os esforços para a construção do Estado estão destinados a fracassar se, no reforço das capacidades institucionais, a legitimidade
do Estado não for restaurada. A legitimidade tem diferentes origens e sofreu alterações ao longo dos tempos, por processos que
tornam difícil a sua total compreensão para os agentes externos. Algumas vezes, quando o Estado não é legítimo, as instituições
não estatais mantêm a legitimidade, sendo o seu papel social reconhecido pelas populações locais. Uma perspectiva demasiado
centrada no Estado corre o risco de ignorar agentes importantes que actuam fora dos limites das instituições de Estado.
Uma forma de criar confiança e aumentar a legitimidade do Estado é ultrapassar a ideia de um Estado isolado e pensar na construção
do Estado como uma forma de intervir na interface das relações entre o Estado e os agentes não estatais. Embora o reforço da
capacidade das instituições centrais do Estado seja importante, é igualmente essencial apoiar a capacidade da sociedade civil
para assegurar um mecanismo de controlos e equilíbrios sobre o Estado, de modo a acompanhar as suas acções e imputar-lhe a
responsabilidade pelas suas políticas.
O desafio consiste, todavia, em não prejudicar a posição do Estado, evitar a concorrência entre os agentes estatais e os agentes
não estatais e estar ciente de que a construção do Estado pode enfraquecer outras fontes de autoridade, prejudicando assim o
processo.
2.3 PROMOVER UM SENTIMENTO DE CIDADANIA COLECTIVA E APOIAR MECANISMOS
DE RESPONSABILIZAÇÃO
A promoção da coesão social e a utilização de instituições formais que incentivam a inclusão são importantes dimensões imateriais
da construção do Estado. Devem ser consideradas medidas que simultaneamente unem populações diferentes nos países frágeis
a nível nacional e aproveitam as vantagens de bolsas de coesão a nível dos órgãos infra-estaduais. Os Estados africanos com mais
sucesso impulsionaram uma política geográfica coerente e apelaram à história comum dos seus povos para criar um sentimento
de identidade e objectivo comuns.
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Construção do Estado e coesão social
No Botswana, por exemplo, a coesão social pode ter sido o factor que levou a elite a administrar cuidadosamente os recursos
diamantíferos mais valiosos do país em benefício de toda a população, evitando a maldição dos recursos que assolou praticamente
todos os outros países africanos ricos em recursos8. Estes Estados africanos não têm as vantagens geográficas e históricas do
Botswana e a perpetuação das políticas predatórias dominadas pelas elites prejudicam também os processos de construção do
Estado.
Quando a fragilidade do Estado está relacionada com a manipulação da fragmentação de factores como etnicidade, geografia ou
recursos naturais, uma forma eficaz e duradoura de criar unidade consiste em colocar a ênfase na cooperação institucional entre
grupos e reduzir as desigualdades horizontais. O governo consociativo do Burundi, por exemplo, oferece várias oportunidades para
criar coligações e reduzir tensões, atenuando ou eliminando desequilíbrios reais ou perceptíveis na representatividade de grupos
em ministérios, função pública, legislatura e forças armadas. De modo idêntico, as reformas que apoiam a partilha dos lucros dos
recursos naturais de forma justa e transparente e promovem a distribuição equitativa da despesa social afastariam uma possível
fricção entre as políticas divididas. Os agentes internacionais podem igualmente dar um contributo importante para ajudar os
sistemas financeiros a acompanhar a afectação e gestão das receitas e despesas públicas.
A celebração do carácter distintivo de cada grupo aquando da tentativa de construir uma “nação de nações” é capaz de ser bem
mais sucedida do que a construção de um Estado com base na “negação das identidades sociais”, ou seja, uma “nação contra
as identidades”9. Promover um sentimento de unidade com a ajuda de vários programas educacionais, desportivos e culturais
pode criar identidades culturais complementares que reforcem os laços nacionais, reduzindo as fricções entre os grupos durante
o processo. A África do Sul, por exemplo, utilizou os desportos de forma criativa desde o fim do apartheid para unir a “nação do
arco-íris”. Os programas para reconciliar feridas há muito abertas entre grupos, tais como a Comissão de Verdade e Reconciliação
da África do Sul e os programas de reconciliação do Burundi, revelaram-se valiosos em muitos países.
Noutros casos, a fragilidade do Estado está menos associada a divisões entre as populações ou à sua manipulação enquanto os
principais obstáculos à estabilidade social e à prestação de serviços públicos decorrem principalmente de uma configuração do
Estado que oculta a concorrência entre as tribos ou serve os interesses da “classe do Estado”10, uma elite poderosa que domina os
principais cargos na burocracia estatal, partidos políticos e posições económicas. A homogeneidade étnica e cultural da Somália, por
exemplo, não evitou os conflitos entre as tribos11. E na República Democrática do Congo, apesar da composição étnica heterogénea,
a classe política é composta por 150 a 200 famílias que estão presentes em todos os grupos políticos12. Mesmo em países onde os
conflitos são geralmente interpretados como o resultado de uma manipulação de identidades socioétnicas como, por exemplo,
no Burundi, estas divisões sociais superam as divisões tribais, regionais e de classes13.
Quando a construção do Estado é prejudicada pela classe política que dirige o país em proveito próprio e pela escassa vontade em
cooperar, o apoio internacional a dimensões imateriais da construção do Estado pode incluir a criação de espaços de participação
para dar voz aos grupos da sociedade civil e aos grupos representativos que podem fazer circular as informações e impulsionar a
mudança sociopolítica. Mas, de acordo com a ideia veiculada nos Princípios para uma Intervenção Internacional Eficaz em Estados
Frágeis e em Situações de Fragilidade da OCDE-CAD de que as intervenções internacionais devem “evitar danos”, os agentes externos
devem minimizar o risco de pôr em perigo os parceiros. Esta abordagem deve ser complementada pela procura de pontos de
contacto no interior das instituições do Estado.
As reformas devem ser graduais e incrementais, de uma forma que não ameace os frágeis laços sociais. O objectivo será criar um
processo iteractivo e auto-sustentado de mudança que passe através de um sistema, afectando a sociedade e o Estado a vários níveis
e transformando as suas relações ao longo do tempo. Tal abordagem implantaria um Estado mais firme na sociedade e obrigaria
as elites a serem mais responsáveis perante as suas populações. É muito mais provável que a democracia se mantenha nos países
em que foi introduzida de forma satisfatória e com progressos em várias frentes; os esforços precipitados para organizar eleições
com calendários apertados, mesmo quando generosamente financiadas pela comunidade internacional (como na República
Democrática do Congo, em 2008), terão mais probabilidades de dilacerar uma sociedade frágil, o que inviabilizaria uma melhoria
significativa da governação, em especial no curto prazo.
8
9
10
11
12
13
Kaplan 2008.
Cahen 2005.
Keller 1991.
Mengisteab e Daddieh 1999.
GTZ 2008.
Brachet e Wolpe 2005.
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Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 7
3. A NECESSIDADE DE UMA COMPREENSÃO MAIS PROFUNDA DO CONTEXTO LOCAL
Os Estados necessitam de fazer uma avaliação interna dos seus recursos e modelos institucionais e adoptar
estruturas e processos políticos e económicos que reflictam a história, a complexidade e a especificidade
das suas populações e meio ambiente. Demasiados regimes pós-coloniais adoptaram uma perspectiva
externa para os seus recursos e modelos de governação, tornando-se, nesse processo, dependentes da
ajuda externa e garantindo efectivamente que as suas origens internas serão sempre demasiado fracas
para os apoiar.
Este facto não significa que os modelos políticos ocidentais convencionais não tenham importância para as sociedades não
ocidentais; significa, isso sim, que esses modelos precisam de ser adaptados para acolher as tradições e as condições políticas,
económicas e sociais. O objectivo não deveria ser o de conseguir Estados centralizados com leis “ocidentalizadas” e uma democracia
definida exclusivamente por eleições periódicas. Em alternativa, deveria consistir na promoção de governos capazes, inclusivos,
participativos, ajustáveis e responsáveis. O Botswana, por exemplo, baseia os seus sistemas políticos num paradigma tradicional
que tira proveito de normas de governação amplamente aceites.
É muito importante colocar a ênfase na procura local de soluções adequadas para os problemas de governação, gestão de terras e
de recursos e transferência de conhecimentos, se o objectivo for efectivamente o de implementar Estados legítimos e responsáveis.
Por certo, nenhuma sociedade que se tenha desenvolvido com sucesso dependeu tanto de recursos externos, modelos políticos
externos, línguas estrangeiras e leis estrangeiras como acontece com os Estados frágeis actualmente14.
Os países doadores devem investir mais na compreensão das sociedades locais e na avaliação dos desafios políticos que estas
enfrentam. Os padrões da globalização alteraram muito provavelmente as estruturas tradicionais dos países frágeis, as quais
não podem ser consideradas idênticas às do passado. A evolução das instituições estatais e não estatais é constante e não linear,
colocando desafios suplementares às pessoas que pretendam relacionar-se com estas instituições. O reforço da capacidade local
para investigar a “geografia humana” dos Estados e analisar os contextos socioculturais é essencial, o que já foi reconhecido por
alguns países doadores. (O Ministério da cooperação para o desenvolvimento dos Países Baixos está a ajudar organizações locais
a realizarem investigação relevante em 9 países do mundo em desenvolvimento; a fundação Hewlett disponibiliza apoio a longo
prazo a 24 grupos de reflexão (think tanks) em 11 países africanos.)
As agências de ajuda devem dedicar maiores esforços e recursos a uma melhor compreensão e diagnóstico dos problemas
sociopolíticos e institucionais que afligem os Estados frágeis (caixa 7.2). Apoiar uma investigação mais extensiva sobre política e
ciência social seria pouco dispendioso e traria dividendos consideráveis às políticas de desenvolvimento locais e internacionais
cuidadosamente adaptadas a cada caso para resolver os inevitáveis problemas complexos dos Estados frágeis. Analisar os cenários
políticos e sociais é, na verdade, necessário para compreender as exigências e identificar os pontos de entrada e os espaços para
interacção com as instituições de Estado. Um valioso contributo para a capacidade da UE em definir as modalidades de intervenção
em matéria de desenvolvimento pode surgir de um processo de gestão e avaliação analítica do pessoal comunitário envolvido
nos Estados frágeis, baseado em avaliações periódicas, mecanismos que promovam o diálogo entre especialistas de diferentes
domínios (ajuda humanitária, cooperação para o desenvolvimento, política externa e diplomacia) e especialização em regiões,
países ou sectores específicos.
Caixa 7.2: Somália e Somalilândia (Somalia and Somaliland)
Por Seth Kaplan, sócio-gerente, Alpha International Consulting, Ltd.
A Somália e o seu território separatista da Somalilândia proporcionam um dos melhores contrastes entre a construção do
Estado que utiliza pilares institucionais importados e a construção do Estado que utiliza pilares institucionais nacionais.
A comunidade internacional tentou, pelo menos 15 vezes, desde a dissolução do Estado da Somália em 1991, reconstruí-lo do
topo para a base, e nunca teve sucesso. Isoladas das realidades políticas do país, as agências de ajuda, embaixadas e organizações
multilaterais fizeram repetidamente uma leitura incorrecta da dinâmica política do país e forçaram “respostas políticas orientadas
por modelos, não imaginativas, não estratégicas, com pouca relevância no contexto da Somália e tendo pouco em conta a opinião
da população somali.” Em consequência, “os somalis que procuram libertar o país desta crise mortal e prolongada têm de o fazer
apesar do envolvimento da comunidade internacional e não devido a esse envolvimento.15”
14
15
Kaplan 2009.
Menkhaus 2008, pág. 9.
102
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Construção do Estado e coesão social
Pelo contrário, a Somalilândia, uma região do noroeste da Somália que declarou a independência em 1991, construiu as suas
instituições de Estado adoptando uma abordagem da base para o topo que tira partido de estruturas tribais há muito existentes
e com uma grande base de aceitação. Actualmente, é o Estado mais democrático da região e criou estabilidade e prosperidade
suficientes para atrair migrantes da região do Corno de África. A Somalilândia deve o seu sucesso, em parte, ao facto de ter tido
pouca ajuda externa, forçando o país a depender dos seus próprios recursos, capacidades e instituições, (Na verdade, alguns
defensores da independência da Somalilândia receiam que uma maior ajuda externa teria tido um impacto negativo.) Outras
regiões da Somália, como Puntland, criaram igualmente as suas próprias administrações locais baseadas em estruturas tribais.
Todavia, a comunidade internacional recusa-se a reconhecer a Somalilândia e persiste nos seus esforços sisifianos para forjar um
Estado somali centralizado.
O que o cientista político Ken Menkhaus afirmou sobre a Somália aplica-se a muitos outros Estados frágeis e falhados: “Estes
mecanismos [informais] extensivos e intensivos [de autogovernação] […] são virtualmente invisíveis para os observadores
externos, cuja exclusiva preocupação se centra, frequentemente, na única estrutura que proporciona de facto a dimensão
mínima de Estado de Direito na Somália – o Estado central. [...] Para os agentes externos, a convicção geral é que um Estado
ajustável e eficaz constitui um pré-requisito essencial para o desenvolvimento, uma situação prevista em quase todas as
estratégias do Banco Mundial e das Nações Unidas em matéria de desenvolvimento. Para muitos somalis, o Estado é um
instrumento de acumulação e domínio, que enriquece e concede poderes àqueles que o controlam e explora e persegue
o resto da população. Estas diferentes percepções do Estado resultam frequentemente em debates sobre o passado entre
agentes externos e internos” 16.
Uma possível forma de impulsionar as capacidades e instituições locais e melhorar a governação consiste em colocar a ênfase na
construção de governos locais e vinculá-los tanto quanto possível às suas comunidades. Os governos locais não são perfeitos, mas
a devolução das funções governativas às aldeias, vilas e bairros de cada cidade pode tirar proveito do poder da interacção face-aface e incentivar formas de governo mais transparentes e responsáveis. Os governos centrais podem assegurar uma moeda estável,
promover um mercado extensivo para as mercadorias, construir ligações de transporte intercidades e estabelecer normas básicas
em matéria de serviços bancários, jurídicos, de saúde e de educação. Mas incumbe aos governos locais ou distritais a prestação
dos serviços que mais afectam as famílias e as pequenas empresas no quotidiano. Os governos locais disponibilizam, por exemplo,
mais serviços de educação, saúde e construção de estradas.
Isto não significa que apoiar a descentralização corresponde sempre a governos mais eficazes e ajustáveis. De facto, as administrações
locais podem ser expostas a tentativas de ataque ao poder e apropriação de recursos pelas elites locais e “usurpadores” de cargos
públicos. A descentralização é consistente com uma construção do Estado inclusiva apenas se assegurar um mecanismo de controlos
e equilíbrios, aumentar a participação dos cidadãos e associar as responsabilidades dos governos locais a uma atribuição adequada
da autonomia de decisão e recursos humanos e financeiros suficientes.
Assim, os doadores devem apoiar os processos de descentralização baseados numa estrutura participativa, deveres sociais alinhados
e incorporados e recursos de instituições locais do Estado. Estes factores podem reduzir o risco de apropriação do poder pelas elites,
aumentar a responsabilidade e manter o papel dos organismos e instituições informais semelhantes como alternativo e paralelo
às funções do Estado. O Ruanda constitui um exemplo bem sucedido de uma abordagem governativa descentralizada em matéria
de prestação de serviços, capaz de implantar os conceitos e as instituições tradicionais no funcionamento do Estado (caixa 7.3). A
necessidade de encontrar mecanismos de governação incorporados na sociedade implica também que o papel do governo local
versus nacional depende também da “história” do país. Não pode ser aplicada uma solução única a países muito diferentes.
Caixa 7.3: Um modelo africano de governação (An African governance model)
Por Jesse McConnell, consultor em desenvolvimento de reformas
Dois desafios comuns que se colocam à boa governação em África são a grande diversidade dos cidadãos que os seus
líderes devem governar e as limitações de capacidade dos funcionários públicos para constituir uma liderança local. O
Ruanda constitui um exemplo de um modelo africano exclusivo de governação orientado para a prestação de serviços,
baseado na responsabilização e capaz de ultrapassar muitos desafios. O Imihigo, um conceito que existe há vários séculos
na cultura ruandesa, tem muitas parecenças com um contrato de objectivos. O conceito desenvolveu-se como uma ideia
16
Menkhaus, 2007, pág. 87.
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Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 7
de um compromisso público dos mais destacados líderes militares para com o seu rei, com vista a atingir um objectivo
específico, como seja o de conquistar um inimigo ou região. Atingir o objectivo definido significaria aceder a uma recompensa
e aclamação de prestígio pelo feito alcançado.
Esta ideia foi modernizada e institucionalizada no sistema político. Os presidentes dos municípios estabelecem compromissos
anuais públicos com o presidente com vista à consecução de objectivos específicos estabelecidos na agenda nacional de
desenvolvimento e localizados nos planos distritais de desenvolvimento. O Imihigo moderno é, assim, uma função da prioridade
de responsabilização por parte do governo através da prestação de serviços centrados nas pessoas com vista a obter um rápido
desenvolvimento no terreno. Os objectivos são decididos através de consulta a nível local pelos presidentes dos municípios
junto dos membros da comunidade e difundidos por todo o país, transmitindo transparência e responsabilização ao processo.
O fórum nacional anual é depois acompanhado por reuniões Imihigo trimestrais a nível distrital, nas quais os presidentes dos
municípios apresentam aos membros da comunidade e aos representantes do governo nacional os progressos realizados e os
desafios enfrentados na perseguição dos objectivos.
Uma razão fundamental para o sucesso da iniciativa foi o facto de conseguir um melhor desempenho dos funcionários civis. Este
sucesso foi conseguido através de:
• uma elevada presença de público na abertura anual e na apresentação trimestral dos Imihigos.
• uma clarificação dos objectivos introduzidos pelos processos.
• um maior envolvimento das comunidades como beneficiárias e, por conseguinte, como entidades planeadoras no
processo de identificação das necessidades e de selecção dos projectos pertinentes.
• o facto de o Imihigo ser baseado na tradição e no conhecimento existente.
Desde a sua criação, o Imihigo afectou todos os quadrantes da sociedade, com compromissos através dos departamentos
governamentais, escolas e mesmo famílias.
Alguns Estados frágeis são fragmentados por factores de identidade, culturais e linguísticos e as suas diferentes regiões estão ligadas
de forma ténue devido a infra-estruturas deficientes, geografias políticas desvantajosas e sistemas administrativos débeis. Assim,
os modelos de desenvolvimento geridos localmente podem ser bem sucedidos onde os modelos baseados no Estado fracassam,
em especial se os seus ganhos forem alargados ao longo do tempo a outras localidades, horizontalmente, e a órgãos superiores do
governo, verticalmente (em especial nos países de grandes dimensões, tais como a República Democrática do Congo). Garantem
igualmente que as comunidades locais não fiquem reféns das disfunções de um governo nacional. Centrar a ajuda nestas “bolsas
de oportunidade” seria mais eficaz a curto prazo e incentivaria outras áreas a melhorar através da concorrência para os fundos a
médio prazo.
Dado que poderia ser muito difícil ou impossível ou até, em determinados casos, não desejável mudar a estrutura e as instituições
sociais locais, é importante conhecer melhor as condições em que as instituições formais e informais podem ter uma melhor
ligação17. O reconhecimento da necessidade da diversidade institucional, ou mesmo multiplicidade (processo pelo qual o Estado
reconhece, e integra sempre que possível, diferentes tradições históricas), bem como da necessidade de os países serem práticos
e flexíveis na construção dos governos baseados na capacidade e instituições já existentes no terreno, transformaria a forma como
os doadores abordam a construção do Estado.
As instituições formais locais podem ter um papel essencial na construção do Estado, mas é necessário evitar expectativas
injustificadas e “visões românticas” desse papel18. Nem todas as instituições informais locais são bem geridas ou “melhores” que
as instituições estatais. Por exemplo, as instituições informais locais podem ser discriminatórias, especialmente em relação às
mulheres e aos jovens de uma comunidade19.
Os casos de países em diferentes situações de fragilidade do Estado20 (Zimbabué, Serra Leoa e República Democrática do Congo)
sugerem que o apoio a formas de governação alternativas e tradicionais deve ser avaliado de acordo com os contextos específicos
de cada país com base na sua integração potencial com os órgãos do Estado e na sua capacidade para manter ou prejudicar a
legitimidade do Estado. Os ensinamentos a extrair destes estudos de caso mostram igualmente que uma atitude pragmática e
flexível pode ser a melhor forma de colocar em prática estes critérios gerais para apoio de reformas institucionais. As intervenções
17
18
19
20
Jütting 2003.
Pouligny 2009.
UNECA 2007.
GTZ 2008.
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Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Construção do Estado e coesão social
internacionais podem abrir janelas de oportunidade para reformas, através da identificação e criação de relações estáveis com
agentes orientados para as reformas entre as elites, funcionários públicos, organizações da sociedade civil, associações profissionais
e instituições de microfinanciamento de um país.
A forma de proceder consiste, assim, numa abordagem gradual à construção do Estado, firmemente enraizada no contexto local. Os
Princípios OCDE recomendam tomar o contexto como ponto de partida para evitar a imposição de matrizes europeias (blueprints)
externas. Para a comunidade internacional, isto pode constituir uma parceria mais arriscada do que o compromisso técnico, mas
com possibilidades de sucesso mais credíveis.
4. COMPLEMENTARIDADE ENTRE AJUDA HUMANITÁRIA E INTERVENÇÕES EM
MATÉRIA DE CONSTRUÇÃO DO ESTADO EM CENÁRIOS DE PÓSCONFLITO
Um dos desafios das intervenções internacionais em situações de transição pós-conflito é o de assegurar
que o apoio aos agentes da sociedade civil promove a construção do Estado e as necessidades básicas das
populações sem criar estruturas paralelas.
Os agentes privados da sociedade civil prestam serviços sociais em muitos contextos pós-conflito. Uma transição demasiado rápida
da ajuda humanitária para o apoio orçamental ao Estado pode deixar muitos destes agentes sem recursos para continuarem a
assegurar esses serviços sociais enquanto o Estado ainda não estiver preparado para desempenhar essas funções. Uma mudança
prematura para uma política de construção do Estado pode implicar que as necessidades humanitárias não sejam satisfeitas. No Sul
do Sudão (caixa 7.4), as necessidades humanitárias foram maiores durante os cinco anos de transição do que durante o conflito. Se
o Estado ainda não tiver a capacidade de prestar serviços sociais, retirar o apoio aos prestadores locais deixa um vazio humanitário.
Proteger o espaço humanitário exige, assim, que o apoio à construção do Estado seja complementado por um processo paralelo
igualmente importante de apoio à sociedade civil. Por outras palavras, a construção do Estado não pode ser prosseguida à custa
dos princípios humanitários.
Esta abordagem é também coerente com a necessidade de melhorar a legitimidade do Estado. Em primeiro lugar, a incapacidade do
Estado em responder às necessidades humanitárias pode prejudicar a sua legitimidade. Em segundo lugar, o apoio às organizações
da sociedade civil pode ajudar a desenvolver Estados ajustáveis e inclusivos. Em situações de transição pós-conflito, muitos acordos
políticos são negociados pelas elites e a sociedade civil é mantida afastada da discussão. Deste modo, a participação e o apoio às
instituições da sociedade civil ajudaria a reforçar a legitimidade e a construir um pacto social mais duradouro.
A ajuda dos países doadores em contextos afectados por conflitos deve também ultrapassar a justaposição incorrecta dos diferentes
instrumentos das intervenções. A acção da UE pode ser prejudicada pela assunção errada de que existe uma progressão linear de
uma situação de emergência, em que a ajuda humanitária é o principal instrumento de intervenção, para situações em que existe
mais estabilidade e em que a cooperação para o desenvolvimento pode utilizar o apoio orçamental como principal instrumento
(caixa 7.4). De facto, a intervenção internacional deve assegurar um espaço em que a ajuda humanitária e a cooperação para o
desenvolvimento sejam utilizadas em simultâneo com igual importância. Ambos os instrumentos podem ser extremamente valiosos
e devem ser utilizados de acordo com uma visão global, embora possam necessitar de aperfeiçoamento. A ajuda humanitária
associada a desembolsos anuais é inadequada para atenuar os factores de crises prolongadas e de níveis baixos de conflito.
Caixa 7.4: Intervenção internacional nos Estados frágeis: a lição do Sul do Sudão
(International engagement in fragile states: learning from Southern Sudan)
Por Sara Pantuliano, Overseas Development Institute
Após a assinatura do Acordo Abrangente de Paz, em Janeiro de 2005, o Sudão foi incluído nos nove países da experiênciapiloto OCDE-CAD para a aplicação dos Princípios para uma Intervenção Internacional Eficaz em Estados Frágeis e em Situações
de Fragilidade. Baseados na Declaração de Paris sobre a Eficácia da Ajuda, de 2005, e nos Princípios e Boas Práticas da Ajuda
Humanitária, os novos Princípios visam responder à complexidade e à necessidade de uma acção internacional coordenada
em situações que envolvam questões de segurança, humanitárias e de desenvolvimento21. A experiência-piloto no Sudão,
limitada à intervenção internacional no Sul do país, centrou-se em três questões essenciais: mecanismos de coordenação de
doadores, apoio internacional à construção do Estado e apoio internacional à consolidação da paz, com especial incidência
na implementação do Acordo Abrangente de Paz.
21
Haslie e Borchgrevink 2007
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Capítulo 7
Foi ensaiado um conjunto de mecanismos de coordenação de ajuda no Sudão, durante e após as negociações de paz, os quais
incluíam a Missão de Avaliação Conjunta, os Multi-Donor Trust Funds (Fundos Fiduciários de Múltiplos Doadores) e o Joint
Donor Team (Grupo Conjunto de Doadores) em Juba. A Missão de Avaliação Conjunta consistia numa avaliação abrangente das
necessidades de reabilitação e recuperação transitória em oito agregados temáticos, a ser realizada nos dois primeiros anos do
Período Transitório do APC (2005-2011). A avaliação, que teve a duração de 15 meses e foi co-liderada pelo PDNU/GNUD e pelo
Banco Mundial, observou o envolvimento muito activo dos principais responsáveis das duas principais partes em conflito,
o Partido do Congresso Nacional (PCN) e o Exército/Movimento de Libertação do Povo do Sudão (SPLM/A) e de um grande
número de países doadores. A MAC devia proporcionar o enquadramento necessário para apoiar a estabilidade e oferecer
os dividendos da paz para reconhecimento do acordo de paz.
A avaliação, um exercício muito ambicioso e dispendioso, criou expectativas de que constituiria o documento de orientação
e propôs mecanismos para a sua implementação22. Desempenhou um papel fundamental na reunião das partes em conflito
em torno de um programa comum de recuperação e constituiu um primeiro esforço sério para enquadrar a resposta no
novo contexto. Todavia, não funcionou como um quadro de acção eficaz. Foram colocadas algumas reservas quanto à
inexistência de uma sequência e prioridades claras no seu plano operacional e quanto à validade dos métodos utilizados
na determinação dos custos e na extrapolação dos níveis de necessidade23, bem como a incidência inadequada em termos
de segurança e consolidação da paz24. As maiores limitações, todavia, foram a fraca apropriação da avaliação pelos agentes
nacionais e a sua crescente irrelevância face a um contexto em rápida mutação, à medida que surgiam novas estruturas
de governo e de segurança. A Missão de Avaliação Conjunta errou ao tentar proporcionar uma matriz europeia (blueprint)
para a intervenção internacional em vez de um quadro dinâmico e ajustável face às mudanças de contexto.
Os principais mecanismos para a implementação das conclusões da avaliação foram dois fundos fiduciários de múltiplos
doadores, um para o Governo de Unidade Nacional e um para o Governo do Sul do Sudão (GOSS). Estes fundos
administrados pelo Banco Mundial destinavam-se a facilitar o financiamento coordenado dos doadores externos com
vista a apoiar a recuperação imediata, consolidar a paz, criar capacidade e acelerar o progresso na consecução dos
Objectivos de Desenvolvimento do Milénio até 2011. Na prática, o desempenho e o impacto foram profundamente
decepcionantes.
Os fundos foram amplamente criticados por não conseguirem obter um impacto rápido e visível 25. A taxa de desembolso
foi extraordinariamente lenta, com a maior parte dos projectos a não conseguir proporcionar ‘bens materiais’ ao público
mesmo durante o segundo ano de operação. 26 Os procedimentos burocráticos do Banco Mundial, os problemas de pessoal
e as negociações prolongadas entre as equipas das Nações Unidas e do Banco Mundial sobre os acordos de execução
prejudicaram a execução inicial 27. A incapacidade do governo em dar resposta às exigências burocráticas dos fundos
provocou graves atrasos e ineficiências.
As deficiências dos fundos levaram muitos doadores a ignorá-los, canalizando mais recursos bilateralmente ou através
de fundos conjuntos. As regras e os procedimentos aplicados aos fundos pareciam mais adequados a um contexto de
reconstrução e desenvolvimento a médio prazo do que para um contexto de recuperação pós-conflito. Não é a primeira
vez que o instrumento falha a consecução dos seus objectivos num contexto pós-conflito, o que levanta a interrogação
sobre o motivo de não estarem a ser retiradas lições importantes.28
Outro mecanismo destinado a melhorar a harmonização dos doadores no Sul do Sudão foi a criação do Grupo Conjunto
de Doadores (JDT, Joint Donor Team) em Juba. Uma avaliação intercalar concluiu que a equipa teve um bom desempenho
ao contribuir para promover a apropriação no Sul do Sudão e reforçar o alinhamento dos doadores com as políticas do
governo. Mas a harmonização da JDT e a adesão aos princípios dos Estados frágeis da OCDE-CAD teve um sucesso bem
menor29. Especificamente, os parceiros da equipa não conseguiram trabalhar num quadro político comum, com abordagens
e objectivos diplomáticos e de desenvolvimento comuns. Em consequência, não puderam conter o aumento de programas
bilaterais.
22
23
24
25
26
27
28
29
Murphy 2007.
Murphy 2007.
GNUD/Banco Mundial 2006.
Scanteam 2007b.
Fenton 2008.
Pantuliano et al. 2007.
Pantuliano et al. 2008.
Bennet et al. 2009.
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Construção do Estado e coesão social
A proliferação de projectos continuou a dificultar a coordenação das ajudas no Sul do Sudão e limitou a capacidade da equipa
para contribuir de forma coerente e sustentável para a construção do Estado. 30 Os pareceres técnicos sobre política agrária e a
resolução de litígios em torno de terrenos foram particularmente descoordenados e frequentemente contraditórios. 31 O Grupo
Conjunto de Doadores, à semelhança de muitas organizações internacionais no Sul do Sudão, teve igualmente dificuldades para
atrair e manter pessoal com as competências e experiência adequadas, o que afectou o desempenho. 32
A construção do Estado no Sul do Sudão, um ponto fulcral da intervenção internacional, constitui um enorme desafio, uma
vez que as estruturas formais do governo têm de ser criadas de raiz. Embora tenha existido uma concertação de esforços
para criar o aparelho administrativo do Governo do Sul do Sudão, esta abordagem foi claramente “descendente”. Foi dada
mais atenção à criação da capacidade administrativa do governo central e das instituições em Juba, em detrimento da
resolução de problemas em matéria de legitimidade e responsabilização.33 Foram conseguidos alguns progressos na criação
de estruturas regionais e de Estado, mas a prestação de serviços básicos é ainda muito limitada e a corrupção impera em
muitas zonas. 34
A criação do Governo do Sul do Sudão foi interpretada tanto pelos agentes nacionais como internacionais como uma
oportunidade dada ao Sul do Sudão para “evoluir” de um contexto de aceitação passiva de ajuda humanitária externa
para a preparação, financiamento e execução de programas nacionais de recuperação e desenvolvimento. Os doadores
aumentaram consequentemente as contribuições para fundos de recuperação e desenvolvimento a longo prazo e reduziram
o financiamento humanitário. Isto apesar do aumento das necessidades humanitárias, da contínua incapacidade do Governo
do Sul do Sudão para lhes dar resposta e do fraco registo de eficiência dos mecanismos de financiamento a longo prazo.
A arquitectura de ajuda convencional demonstrou uma vez mais que está mal preparada para dar resposta às situações que
ocorrem em toda a divisão binária entre ajuda ao desenvolvimento e ajuda humanitária. Tal como em muito contextos “pósconflito”, é necessário continuar a orientar a prestação de serviços no Sul do Sudão e, ao mesmo tempo, criar capacidade
de governação, pelo menos para evitar situações de emergência mais graves como surtos epidémicos de cólera ou crises
alimentares.
A promoção da estabilidade é igualmente um objectivo central da transição para a paz. Os programas e estratégias para
atingir este objectivo devem ser concebidos de uma forma que contribua para a criação do Estado, mantendo o equilíbrio
entre a criação das instituições de segurança nacional e a função de agentes externos como, por exemplo, missões de
manutenção da paz. A missão de manutenção da paz UNMIS no Sul Sudão, mandatada para supervisionar a implementação
do APC, foi um importante elemento da intervenção internacional.
A UNMIS tem uma forte presença militar em todo o Sul do Sudão e nas Zonas Transitórias. Mas o seu mandato rígido
(frequentemente interpretado de forma demasiado rígida) e as orientações de segurança interna tornaram-na ineficiente
e receosa dos riscos a um nível inaceitável. Em muitas áreas, a sua supervisão de conflitos reais e potenciais tem sido
irregular e os programas de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração (DDR) sofreram atrasos ou enfrentaram
resistências.35 E outras questões de segurança, como a transformação do Exército de Libertação do Povo do Sudão num
exército profissional, a formação de uma força policial e o combate contra a violência intercomunitária, receberam um
apoio limitado ou tardio. Muitos soldados da UNMIS não têm os necessários conhecimentos linguísticos para interagirem
entre si e muito menos com as populações locais. Em consequência, o envolvimento entre os observadores militares e as
comunidades é, no mínimo, fragmentado e irregular. A UNMIS é considerada pouco interventiva face aos seus imensos
recursos. Na verdade, as despesas internacionais da UNMIS apresentam um forte contraste com o reduzido nível de prestação
de ajuda constatado no Sul do Sudão. 36
A incapacidade da comunidade internacional em proporcionar dividendos de paz imediatos e materiais no Sul do Sudão e nas
“três áreas” referidas teve um impacto negativo na consolidação da paz. 37 Os atrasos e as lacunas na prestação de serviços
e o aumento da insegurança em algumas zonas de regresso fizeram com que os retornados se concentrassem em cidades
e colónias já com excesso de população ou adiassem o regresso. A confiança das comunidades locais e dos retornados na
capacidade do Governo do Sul do Sudão para prestar serviços e outros dividendos de paz foi assim afectada.
30
31
32
33
34
35
36
37
Bennet et al. 2009.
Pantuliano et al. 2008.
Bennet et al. 2009.
Haslie e Borchgrevink 2007.
Bennet et al. 2009.
Vaux et al. 2008.
Vaux et al. 2008.
Haslie e Borchgrevink 2007.
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Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 7
A complexidade da situação no Sul do Sudão coloca à intervenção internacional desafios que não são fáceis de vencer.
Os princípios da OCDE-CAD constituem um ponto de partida útil, mas podem ser contraditórios. Podem ser necessários
compromissos importantes entre, por exemplo, os objectivos de construção do Estado e de coordenação dos doadores e
o rápido desenvolvimento dos serviços básicos como dividendos de paz. 38 No entanto, a aplicação da análise a um Estado
frágil apenas é útil se as causas da fragilidade forem bem analisadas, compreendidas e separadas por área ou círculo eleitoral.
Por exemplo, no Sul do Sudão, as causas e as respostas à fragilidade nas “três áreas” podem diferir significativamente das
respostas para algumas zonas do Nilo Superior.
A intervenção internacional assume erradamente com demasiada frequência que a transição da guerra para a paz é linear. Na
verdade, a assinatura de um acordo de paz, muitas das vezes, pouco muda na prática. A transição da guerra para a paz não é
um exercício técnico, mas sim um processo extremamente político no qual diferentes princípios, prioridades e abordagens
devem coexistir e ser realizados em conjunto.39 Isto implica uma análise sofisticada e matizada das relações de poder, das
causas de vulnerabilidade, dos factores de conflito e dos indicadores de resiliência. Em especial em cenários pós-conflito
dinâmicos, a economia política da transição deve ser analisada e revista continuamente para ser verdadeiramente específica
no contexto. Devem igualmente ser envidados maiores esforços para identificar os “campeões nacionais” das reformas e
mudanças, bem como formas de os apoiar. O papel dos agentes nacionais é fundamental porque a mudança apenas pode
acontecer através de um processo endógeno: a intervenção internacional pode ajudar a estimular a estabilidade, mas não
pode controlá-la.
4.1 OPORTUNIDADES NA RECONSTRUÇÃO PÓSCONFLITO
Os cenários pós-conflito não só colocam desafios significativos aos governantes nacionais e à ajuda internacional como também
podem proporcionar óptimas oportunidades para resolver as causas antigas de exclusão, revoltas e desigualdades. A perspectiva
do género das situações de transição pós-conflito, por exemplo, pode marcar importantes progressos na luta pela emancipação
das mulheres contra a discriminação de género. E uma integração coerente entre o critério de apropriação local e uma abordagem
sensível à discriminação das mulheres na reconstrução pós-conflito pode ser mais frutífera do que programas para ambos os sexos
e “descendentes” (aplicados do topo para a base) (caixa 7.5).
Caixa 7.5: Aprender com as comunidades locais: programas de apoio a mulheres
ex-combatentes
As acções necessárias para reforçar a resiliência de uma sociedade exigem o envolvimento das comunidades locais nos
processos de reforma e nos mecanismos públicos de decisão. Os residentes locais possuem estratégias de sobrevivência
essenciais que podem ser apoiadas com vista à criação de novas instituições mais resilientes. Algumas políticas de ajuda
inadequadas devem-se à incompreensão das línguas e condições locais pelos agentes da ajuda que trabalham no terreno
e da decorrente incapacidade para lidarem com leis consuetudinárias, sistemas tradicionais e conhecimentos locais. Estas
barreiras linguísticas, de comunicação e de conhecimentos constituem um obstáculo à participação dos grupos pobres ou
marginalizados nas decisões políticas, perdendo-se assim oportunidades para que as pessoas participem na reconstrução
económica e política das suas instituições.
Estes problemas foram salientados na profunda preocupação quanto às políticas de ajuda inadequadas manifestada pelo
amplo movimento social mundial, o Fórum Social Mundial, que inclui o activo Fórum Social Africano e congrega milhares
de movimentos da sociedade civil.
A contribuição da apropriação local na criação e execução de programas de desenvolvimento em situações de fragilidade
é claramente evidente no contraste entre os programas internacionais mal sucedidos e bem sucedidos para a reintegração
de mulheres ex-combatentes na Libéria durante o período de transição pós-conflito.
Na Libéria, cerca de 22 000 mulheres e 2 740 raparigas de um total de 103 000 ex-combatentes foram desarmadas e
desmobilizadas em 2004 (Campbell-Nelson 2008). Embora a política consistisse em integrar as questões de género nas
políticas e procedimentos do processo de desarmamento, tal não aconteceu. As organizações femininas observaram
que as mulheres foram enviadas para casa sem uma avaliação adequada da sua saúde reprodutiva ou das condições
psicológicas e sexuais. A reintegração nas respectivas famílias e comunidades foi muito difícil pois sofreram com o duplo
estigma de terem sido alvo de abuso sexual e terem estado integradas nas forças armadas.
38
39
Haslie e Borchgrevink 2007.
Elhawary, comunicação pessoal.
108
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Construção do Estado e coesão social
Foi encontrada uma solução inovadora durante o trabalho conjunto com organizações femininas locais e parceiros
internacionais: mulheres ex-combatentes foram integradas nas forças policiais. O primeiro grupo da Polícia Nacional
da Libéria (PNL) concluiu a formação em 2005 e, em 2009, 12,6% das forças da PNL eram constituídas por mulheres. A
PNL criou uma Unidade de Protecção de Mulheres e Crianças (WAPCU, Women and Child Protection Unit), a qual colabora
com organismos governamentais e não governamentais e é apoiada pelo Gender-Based Violence Inter-Agency Task Force
(Grupo de Missão Inter-Agências sobre a violência com base no género) que coordena o trabalho das Nações Unidas e de
outros doadores. O projecto Women Peace Huts, criado pela Rede Women in Peace Building (WIPNET), apoia igualmente
as mulheres da comunidade que permanecem nas Peace Huts (“cabanas de paz”) como refúgio e procuram assistência
sobre questões como violação, propriedade de terras, diferenças religiosas e tribalismo (UNIFEM 2007).
Em contextos frágeis, a relação das mulheres com o Estado é fundamentalmente diferente da relação dos homens. Frequentemente,
é mediada através da família, comunidade ou instituições religiosas ou consuetudinárias. As mulheres enfrentam uma grande
disparidade entre a sua cidadania formal e a substantiva, bem como importantes obstáculos económicos, sociais e culturais
no exercício dos seus direitos e participação nos processos de decisão. Além disso, em vários contextos de Estados frágeis, as
questões pessoais e domésticas que mais preocupam as mulheres (tais como o direito de família, as heranças, o acesso à terra e a
segurança) são delegadas em instituições consuetudinárias ou agentes não estatais, tornando as mulheres incapazes de obrigar
o Estado a ser responsável pelos seus direitos nesses domínios. Todos estes factores significam que as mulheres se deparam com
obstáculos específicos na reivindicação dos seus direitos, participação na governação e responsabilização do Estado (na prática,
na sua actuação como cidadãs de pleno direito) e que as medidas para reconstruir ou reformar o Estado afectarão as mulheres de
forma diferente.
Os papéis desempenhados por homens e mulheres e as relações entre ambos podem determinar as oportunidades e os obstáculos
à construção do Estado. Estes papéis e relações mudam frequentemente durante os conflitos armados e a reforma pós-conflito das
instituições políticas oferece uma oportunidade para aumentar a participação e a influência políticas das mulheres, em especial
na nova arquitectura eficaz da ajuda.
Os processos intensivos de construção do Estado aplicados em cenários pós-conflito e de Estados frágeis permitem alterações nas
relações de poder, nas estruturas e instituições do Estado e nas relações entre o Estado e os cidadãos (caixa 7.6). No processo para
sair de situações de fragilidade existem importantes oportunidades para a comunidade internacional apoiar os agentes nacionais
na construção de um Estado mais responsável. Existe assim a oportunidade de promover a cidadania das mulheres nos processos
de construção do Estado em cenários de países frágeis, produzindo Estados capazes, responsáveis e ajustáveis de forma a garantir
que não sejam restabelecidos padrões antigos de opressão.
Caixa 7.6: Transição pós-conflito: uma oportunidade para a emancipação das mulheres?
O impressionante número de 56% de mulheres na câmara baixa do parlamento do Ruanda em 2009 pode ser encarado
no amplo contexto de duas tendências: a utilização de quotas e as oportunidades para combater a desigualdade entre
homens e mulheres numa situação pós-conflito. O aumento do número de mulheres no parlamento foi mais célere na
África subsariana nos últimos 40 anos do que em qualquer outra região, principalmente através de quotas. De acordo com a
União Interparlamentar (UIP), os países em situação pós-conflito “destacam-se entre os 30 melhores países da classificação
mundial da UIP em termos de mulheres em parlamentos nacionais,” e esses países têm utilizado as quotas com eficiência e
reservado lugares “para assegurar a presença e a participação de mulheres nas [suas] recém-criadas instituições40”.
O Ruanda mostra como a construção do Estado em situações de pós-conflito pode combater as desigualdades entre
homens e mulheres. Powley (2003) refere que este facto se deve a um movimento activo e empenhado das mulheres na
sociedade civil, à capacidade das mulheres de trabalharem com diferentes grupos étnicos e partidários com vista a alterar
a constituição e ao apoio técnico da comunidade internacional para incentivar as mulheres a entrarem no parlamento
através do sistema de quotas. Powley salienta a importância da campanha sustentável levada a cabo pela organização
de cúpula, Pró-Femmes, que elabora pareceres para o governo sobre a participação política das mulheres e promove a
reconciliação ao reunir as mulheres locais, as ONG e os funcionários governamentais. No parlamento, o Fórum de Mulheres
40
Powley 2003, pág. 5.
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O
109
DESENVOLVIMENTO
Capítulo 7
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Deputadas (Forum of Women Parliamentarians) trabalhou igualmente em políticas sobre a igualdade entre homens e
mulheres com vários grupos partidários. A chave para o sucesso residiu no incentivo e ajuda técnica e financeira dos
parceiros internacionais como a AAID, DFID, UIP, PDNU, AWEPA e International Alert. Constituíram actos legislativos históricos
a revogação, em 1999, da legislação que proibia as mulheres de herdarem terras e a aprovação, em 2003, de uma nova
constituição sensível às questões do género. Seguiram-se as eleições parlamentares, com as mulheres a conquistarem 49%
dos assentos na Câmara de Deputados.
Deve ser dada uma atenção precoce à igualdade de género e à promoção da perspectiva e participação das mulheres no
desenvolvimento político, social e económico dos países frágeis e em cenários de pós-conflito. A reconstrução do Estado pode
moldar novas dinâmicas sociais, económicas e políticas que podem acabar com os estereótipos de género. A reconstrução de
Estados frágeis oferece possibilidades para que os compromissos em matéria de direitos das mulheres e a promoção da igualdade
de género sejam confirmados nos novos acordos de governação. O desafio nas situações de pós-conflito consiste em reforçar os
governos nacionais de forma a assegurar a coerência entre política macroeconómica e objectivos de igualdade de género. Os
processos intensivos de construção do Estado aplicados em cenários de pós-conflito e Estados frágeis permitem alterações nas
relações de poder, nas estruturas e instituições de Estado e nas relações entre Estado e cidadãos e entre os próprios cidadãos.
Existe potencial nestes contextos para alterar questões como a discriminação na educação e na segurança económica, nas práticas
e leis socioculturais discriminatórias, no assédio e violência sexual e na exclusão de mulheres e jovens dos processos de decisão
no sector da segurança.
Castillejo (2008)41 argumenta que a redefinição dos limites da autoridade entre o Estado formal e os sistemas de governação
consuetudinários pode proporcionar às mulheres novas oportunidades de cidadania. Não centrar a perspectiva nas questões de
género pode consolidar os sistemas que discriminam as mulheres.
O desafio colocado a um nível operacional reside na não atribuição de uma prioridade elevada às questões de género na construção
do Estado em cenários pós-conflito. Em muitos países da África subsariana, as mulheres têm um contacto limitado com o Estado
formal e as suas vidas são regidas pelos sistemas de governação consuetudinários que restringem seriamente os seus direitos e
oportunidades para a participação política.42 Este facto é ainda mais notório nos Estados frágeis, onde o Estado formal é débil e
inacessível.
Têm existido, contudo, mudanças nos direitos, participação e mobilização das mulheres em países como a Serra Leoa e a Libéria,
exemplos de como os países doadores podem apoiar o reforço da participação das mulheres na construção do Estado em países
frágeis africanos.
Um dos problemas da promoção e defesa dos direitos das mulheres nos Estados frágeis consiste no pluralismo jurídico. Muitos
países africanos têm diferentes sistemas jurídicos baseados em leis de Estado, religiosas e consuetudinárias. Cada sistema jurídico
tem diferentes noções sobre o que implicam os direitos das mulheres, o que complica a agenda da reforma.
Os sistemas sobrepõem-se frequentemente, o que apresenta problemas quanto ao local onde os direitos devem ser reivindicados.
Por exemplo, se uma pessoa for casada de acordo com a lei consuetudinária e os direitos forem violados, qual o código jurídico que
deve ser utilizado para a julgar? Muitas vezes não é claro qual a lei que prevalece, uma vez que estes sistemas não são legislados ou
reconhecidos. E num sistema de instituições débeis e comprometidas, este facto pode provocar ainda mais a erosão dos direitos.
Ao determinar formas de melhorar os sistemas jurídicos e as instituições de governação, é importante compreender que é neste
aspecto que assumem importância as relações sociais patriarcais, a literacia das mulheres e a sensibilização e o acesso aos seus
direitos. Para responder a estas complexidades e criar novas estruturas de governação são necessários mais recursos que tenham
em conta as desigualdades de género e adoptem acções afirmativas.
Como sugere Castillejo (2008), é importante uma estreita conjugação entre os processos de construção do Estado e as estruturas
de governação consuetudinárias, centrais para a vida de muitas mulheres, em vez da construção de um Estado formal assente em
estruturas de governação consuetudinárias não reformadas que continuam a determinar a vida quotidiana das pessoas43.
O género e a fragilidade constituem uma área totalmente nova da política de desenvolvimento. Apesar de as estruturas de ajuda
ao desenvolvimento exigirem políticas sensíveis ao género, em geral, as respostas políticas à fragilidade ainda não têm totalmente
em conta as questões de género, mesmo apesar de muitas das características da fragilidade possuírem importantes dimensões
de género.
41
42
43
Castillejo 2008.
Castillejo 2008.
Castillejo 2008.
110
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Construção do Estado e Coesão Social
Caixa 7.7: Orçamento na perspectiva do género (Gender responsive budgeting)
O orçamento na perspectiva do género (GRB – Gender responsive budgeting) emergiu como uma importante resposta
estratégica para combater as desigualdades entre homens e mulheres através das novas modalidades de ajuda (apoio
sectorial e orçamental), as quais colocam desafios específicos em matéria de acompanhamento dos resultados em termos
de igualdade de género. O orçamento na perspectiva do género é uma forma de atingir este objectivo, uma vez que força os
governos a utilizarem a análise de género no processo orçamental a nível nacional e local. Os orçamentos de género visam
promover a responsabilização entre os cidadãos mais pobres e os seus governos e proporcionar direitos e democracia às
mulheres44. Foram efectuadas análises extremamente úteis de orçamentos de género em vários países da África subsariana,
incluindo Moçambique, África do Sul, Tanzânia e Uganda45.
A análise de orçamentos de géneros ajuda a medir o impacto diferencial do aumento da receita e da despesa pública sobre
os homens e as mulheres e a preconizar alterações ou mudanças na despesa pública de forma a corresponder aos objectivos
políticos46. Não se trata de um orçamento separado para as mulheres, mas de uma ferramenta analítica para combater a
discriminação baseada no género que pode desempenhar um papel importante ao permitir que as mulheres e os cidadãos
pobres possam exercer os seus direitos a serviços básicos, oportunidades económicas e participação política, bem como
uma maior responsabilização do governo no que respeita à prestação de serviço público.
O GRB tem como objectivos:
• melhorar a afectação de recursos às mulheres;
• integrar o género nas políticas de macroeconomia e de desenvolvimento;
• reforçar a participação da sociedade civil na elaboração da política económica;
• reforçar as ligações entre os resultados da política económica e da política social;
• controlar a despesa pública imputável aos compromissos políticos em matéria de desenvolvimento e de género;
• contribuir para a consecução dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio47;
• permitir que os governos cumpram obrigações internacionais como a Declaração e a Plataforma de Acção de Pequim
e a Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW, Convention on the
Elimination of All Forms of Discrimination Against Women).
O GRB tem um enorme potencial para promover a afectação equitativa de recursos para ambos os géneros nos Estados
frágeis. A fim de tornar a ajuda eficaz no combate à pobreza e à desigualdade, é essencial que os países doadores e os
governos nacionais tenham uma profunda compreensão dos desafios específicos que as mulheres enfrentam. O GRB é
particularmente importante no contexto da reconstrução e do reforço das instituições de Estado, uma vez que proporciona
um importante ponto de partida para a perspectiva do género.
O Ruanda mostra como a construção do Estado em situações de pós-conflito pode combater as desigualdades entre
homens e mulheres. Powley (2003) refere que este facto se deve a um movimento activo e empenhado das mulheres na
sociedade civil, à capacidade das mulheres de trabalharem com diferentes grupos étnicos e partidários com vista a alterar a
constituição e ao apoio técnico da comunidade internacional para incentivar as mulheres a entrarem no parlamento através
do sistema de quotas. Powley salienta a importância da campanha sustentável levada a cabo pela organização de cúpula,
Pró-Femmes, que elabora pareceres para o governo sobre a participação política das mulheres e promove a reconciliação
ao reunir as mulheres locais, as ONG e os funcionários governamentais. No parlamento, o Fórum de Mulheres Deputadas
(Fórum of Women Parliamentarians) trabalhou igualmente em políticas sobre a igualdade entre homens e mulheres com
vários grupos partidários. A chave para o sucesso residiu no incentivo e ajuda técnica e financeira dos parceiros internacionais
como a AAID, DFID, UIP, PDNU, AWEPA e International Alert. Constituíram actos legislativos históricos a revogação, em 1999,
da legislação que proibia as mulheres de herdarem terras e a aprovação, em 2003, de uma nova constituição sensível às
questões do género. Seguiram-se as eleições parlamentares, com as mulheres a conquistarem 49% dos assentos na Câmara
de Deputados.Allow governments to comply with international obligations such as the Beijing Declaration and Platform
for Action and the Convention on the Elimination of All Forms of Discrimination Against Women.
44
45
46
47
Sharp 2003.
Claasen 2008.
Budlender e Hewitt 2002
Budlender e Hewitt 2002.
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DESENVOLVIMENTO
SECÇÃO TRÊS
ULTRAPASSAR A FRAGILIDADE:
PAPEL DA UE
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
CAPÍTULO 8
POLÍTICAS DA UE PARA ENFRENTAR A FRAGILIDADE NA ÁFRICA
SUBSARIANA
A atitude perante a fragilidade dos Estados tem constituído desde há muito uma prioridade política da
União Europeia. Para as relações com países em situações de fragilidade, a UE elaborou um conjunto
abrangente de políticas, incluindo um quadro geral, que estabelece as orientações e objectivos da
política externa e de desenvolvimento da União Europeia, bem como políticas específicas em matéria de
fragilidade. A elevada prioridade atribuída à fragilidade dos Estados está também reflectida no Consenso
Europeu sobre o Desenvolvimento, adoptado em 2005.
Saber se este conjunto abrangente de documentos políticos se traduz em instrumentos adequados que abordem adequadamente
os desafios colocados pela fragilidade das instituições de Estado na África subsariana é um tema ainda em discussão. O presente
relatório não pretende avaliar pormenorizadamente as políticas existentes, mas sim realçar o potencial e as limitações da União
Europeia na luta contra a fragilidade.
Uma análise da abordagem comunitária à fragilidade do Estado revela que é necessário progredir em várias áreas. Primeiro, e de
um modo mais geral, colmatar o défice de execução entre o quadro teórico-prático e a concepção e execução de intervenções
específicas no terreno. Este desafio é essencial, na medida em que o efeito de uma política é observado na sua execução. Além
disso, esta execução deve ser adequadamente adaptada à situação, dado que uma política única para todos os casos não responde
às necessidades dos Estados frágeis.
Em seguida, e mais especificamente, são necessários progressos nas seguintes áreas:
• adquirir um sólido conhecimento do contexto local a fim de conceber intervenções eficazes com base nesse conhecimento;
• compreender a forma como o princípio de apropriação deve ser adaptado na abordagem dos países que possuem instituições
de Estado sem capacidade ou legitimidade, o que pode tornar o apoio orçamental ineficaz;
• evitar que a amplitude das políticas comunitárias seja repercutida negativamente, o que pode acontecer se a Coerência das
Políticas de Desenvolvimento não for atingida, e as diferentes políticas produzam efeitos negativos indirectos nos Estados
frágeis. A dimensão horizontal da coerência política necessita de ser correspondida por uma procura mais eficaz da coerência
vertical1, assegurando uma melhor coordenação entre a UE e os seus Estados-Membros;
• tornar as políticas comerciais da UE mais ajustáveis às necessidades específicas dos Estados frágeis da África subsariana e
assegurar que os acordos bilaterais não prejudicam o processo de integração multilateral;
• mudar de intervenções ajustáveis para preventivas, de modo a que os países com situações de fragilidade não entrem numa
espiral que progressivamente provoque a erosão da capacidade e da legitimidade das suas instituições de Estado. Esta mudança
pode exigir a adopção de uma abordagem regional à fragilidade, dado que os efeitos de má vizinhança descritos nos capítulos
anteriores podem prejudicar as possibilidades de combater a fragilidade país a país;
• melhorar a compreensão da forma como a relação entre a segurança e o desenvolvimento pode ser devidamente encarada.
Colmatar o défice exige a reavaliação das prioridades, a concentração dos esforços, a simplificação dos procedimentos e, em
especial, a procura da organização ou parceiros adequados para executar as políticas. Trata-se não só de uma questão de execução
de políticas mas também de criar confiança entre os doadores e os destinatários e aprender com as experiências políticas. Além
disso, a UE deveria adoptar uma abordagem mais construtiva no pressuposto de que combater a fragilidade consiste, de facto,
em criar resiliência.
Face a este contexto, o presente capítulo avalia as “melhores” políticas comunitárias para com os países frágeis, indicando as
opções de mudança2.
1
2
Ver Carbone 2009.
Ver Bakrania e Lucas (2009) para uma descrição geral das actividades dos doadores nos países frágeis do Corno de África, nomeadamente o Banco Africano
de Desenvolvimento, a CE, o PDNU, os EUA, o Banco Mundial e países individuais seleccionados. O estudo salienta que as actividades dos doadores reflectem
não só a sua própria experiência como também interesses em matéria de política externa.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 8
1. A PREOCUPAÇÃO HISTÓRICA DA UE COM OS PAÍSES FRÁGEIS
Já em 2001, a presidência belga da União Europeia tornou os Estados frágeis uma prioridade e o tema
tem sido desde há muito uma preocupação de diversos institutos independentes de investigação política
da UE3. A Estratégia de Segurança Europeia, de 2003, no período após os atentados de 11 de Setembro,
redefine a questão dos Estados frágeis como um problema de segurança4. O Consenso Europeu sobre o
Desenvolvimento de 2005, adoptado pelo Conselho Europeu, Parlamento Europeu e Comissão Europeia,
concordou pela primeira vez com uma visão partilhada da UE em matéria de desenvolvimento e definiu a
fragilidade dos Estados como um dos cinco principais desafios da política de desenvolvimento da União
Europeia5.
Caixa 8.1: “Atitude perante a fragilidade dos Estados” – Extractos do Consenso Europeu
sobre o Desenvolvimento, 2005 6
• A UE irá melhorar a sua resposta às parcerias difíceis e aos Estados frágeis, onde vive um terço dos mais pobres do mundo.
Intensificará os seus esforços no trabalho de prevenção de conflitos e apoiará a prevenção da fragilidade dos Estados
mediante reformas governativas, o desenvolvimento do Estado de direito, medidas anticorrupção e a implantação de
instituições estatais viáveis, a fim de os ajudar a desempenhar um certo número de funções básicas e a satisfazer as
necessidades dos seus cidadãos. A UE actuará através dos sistemas e estratégias estatais, sempre que possível, a fim de
reforçar as capacidades dos Estados frágeis. A UE defende a manutenção do seu empenhamento, mesmo nas situações
mais difíceis, de modo a evitar a emergência de Estados frágeis.
• Nas situações de transição, a UE promoverá elos de ligação entre a ajuda de emergência, a reabilitação e o desenvolvimento
a longo prazo. O processo de desenvolvimento nas situações de pós-crise será norteada por estratégias integradas de
transição destinadas a reconstruir as capacidades institucionais e as infra-estruturas e serviços sociais essenciais, a reforçar
a segurança alimentar e a facultar soluções duradouras para os refugiados e pessoas deslocadas e para a segurança dos
cidadãos de um modo geral. A acção da UE será conduzida no contexto dos esforços multilaterais, designadamente
da Comissão da ONU para a Consolidação da Paz, e terá por objectivo restabelecer os princípios da apropriação e da
parceria.
• Alguns países em desenvolvimento são particularmente vulneráveis às catástrofes naturais, às alterações climáticas, à
degradação ambiental e aos choques económicos exógenos. Os Estados-Membros e a Comunidade facultarão apoio à
prevenção e preparação para as catástrofes nesses países, a fim de os tornar mais resistentes a tais desafios.
O Consenso estabelece uma abordagem da UE baseada em reformas governativas, desenvolvimento do Estado de Direito, medidas
anticorrupção e a criação de instituições de Estado viáveis, bem como o reforço das capacidades dos Estados frágeis7. Salienta
também a necessidade constatada no interior da UE de melhorar a eficácia e a coerência da sua ajuda aos países em desenvolvimento.
E defende a manutenção do seu empenhamento, mesmo nas situações mais difíceis, de modo a evitar a emergência de Estados
frágeis.
O trabalho realizado por outras instituições, como o Banco Mundial e a OCDE, tem sido essencial para centrar o pensamento político
e o debate sobre o modo de actuação nos Estados frágeis8. Estas instituições e os Estados-Membros da UE individualmente, mais
do que a CE e a UE em conjunto, lideraram frequentemente o debate político. Embora alguns Estados-Membros da UE tivessem
as suas próprias políticas bilaterais em relação aos Estados frágeis, outros sentiram a urgência de as desenvolver e forçaram um
maior número de debates políticos a nível europeu9.
No âmbito da Presidência Portuguesa, em 2007, e na sequência de uma ampla consulta aos Estados-Membros, agentes da sociedade
civil e outras instituições europeias, a UE definiu a fundamentação analítica e conceptual para abordar de uma forma mais sistemática
3
4
5
6
7
8
9
Ver Visman 1998.
Solana 2003.
Este capítulo baseia-se no documento de apoio de Faria e Sherriff, de 2009, disponível no Volume 1B.
Extraído do documento do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão, 2006.
Ver número 20 do documento do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão, 2006.
Ver International Initiative on Conflict and Fragility da OCDE – (http:www.oecd.org/dac/incaf)
e Banco Mundial (http://www.worldbank.org/ieg/licus/index.html).
Por exemplo, o DFID implementou uma abordagem específica da fragilidade, que inclui a criação do Estado como objectivo central, a utilização de formas
diferentes de prestação de ajuda, uma colaboração mais estreita com os parceiros internacionais e a manutenção de um compromisso a longo prazo com
vista à obtenção de resultados. Ver DFID, 2009, White Paper, capítulo 4.
114
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Políticas da UE para enfrentar a fragilidade na África subsariana
e estratégica a sua cooperação com países e regiões em situações de fragilidade. Esta definição levou à adopção, em Outubro
de 2007, de uma Comunicação da Comissão “Resposta da UE a situações de fragilidade – intervir em contextos difíceis, em prol
do desenvolvimento sustentável, da estabilidade e da paz”, a qual foi seguida de Conclusões do Conselho e de uma resolução do
Parlamento Europeu sobre o mesmo assunto, em Novembro de 200710. Paralelamente, o Conselho adoptou, em Novembro de 2007,
as suas Conclusões sobre “Segurança e Desenvolvimento”11, onde declarou que “a relação entre segurança e desenvolvimento
deve integrar as estratégias e políticas da UE a fim de contribuir para a coerência da acção externa da UE”.
Com base nestes compromissos políticos, a Comissão e o Secretariado-Geral do Conselho proporão, antes do final de 2009, um
Plano de Acção da UE12 para situações de fragilidade e conflito, apontando medidas concretas para melhorar a resposta da UE a
situações de fragilidade em quatro domínios essenciais: abordagem de “toda a União Europeia”, construção do Estado, tornar a
ajuda da UE mais ajustável e eficaz e parcerias estratégicas internacionais.
1.1 OS QUADROS DE ACÇÃO DA UE PARA COMBATER A FRAGILIDADE NA ÁFRICA SUBSARIANA
As políticas da UE relativas aos Estados frágeis da África subsariana definem-se de acordo com três linhas gerais:
• quadros de acção gerais que fornecem as orientações gerais e os objectivos da UE em matéria de política externa e de
desenvolvimento e compromisso internacional em domínios que, embora não específicos dos Estados frágeis ou de África, são
normalmente essenciais em situações de fragilidade, como o desenvolvimento, a segurança e a ajuda humanitária;
• quadros de acção conjuntos para África que, embora não específicos para os Estados frágeis, moldem a acção e as relações da
UE com os Estados da África subsariana (tais como o Acordo de Parceria de Cotonu13 e a Estratégia Conjunta África-UE);
• políticas e orientações políticas no âmbito da CE ou de toda a UE (não necessariamente específicas para África) centradas nas
situações de fragilidade ou abrangendo aspectos da acção comunitária ou da CE particularmente relevantes (como missões de
gestão de crises, reforma do sector da segurança, desarmamento, desmobilização e reintegração, armas ligeiras e de pequeno
calibre, governação, prevenção de conflitos, crianças e conflitos armados, políticas e prioridades de desenvolvimento e segurança
e a dimensão desenvolvimento da crise económica e financeira)14.
Além destas medidas específicas, outras políticas da UE relativas ao comércio, migração, investigação e inovação, pescas e agricultura
têm impacto, pelo menos, sobre alguns aspectos da fragilidade e interagem com as medidas pontuais. Assim, é essencial não limitar
a análise ao cenário tradicional da política externa e de desenvolvimento para comprovar a coerência das políticas da UE com o
combate à fragilidade e o reforço de resiliência.
Através da sua liderança em matéria de Coerência das Políticas de Desenvolvimento, a UE conseguiu recentemente alguns progressos,
mas é necessário um maior esforço no que respeita à compreensão do impacto efectivo da incoerência política da UE nos Estados
frágeis em domínios não associados à política externa e de desenvolvimento e, como a UE reconheceu, em conciliar os interesses
divergentes entre os Estados-Membros e elaborar políticas de toda a União mais coerentes15.
A nova abordagem estratégica à Coerência das Políticas de Desenvolvimento, que salienta a promoção da paz e da segurança e
contribui para a criação de um quadro de acção para uma abordagem de toda a União Europeia em matéria de desenvolvimento,
segue a direcção certa.
Além disso, os Estados-Membros da UE e a Comissão Europeia ratificaram a Declaração de Paris de 2005 relativa à eficácia da ajuda
e o Programa de Acção de Accra (AAA) de 2008, cujos princípios são igualmente aplicáveis a situações de fragilidade embora devam
ser adaptados a ambientes com pouca capacidade e/ou apropriação (ver caixa 8.2)16. A UE traduziu este programa sobre a eficácia
da ajuda em várias iniciativas, por exemplo, um quadro comum para programação plurianual conjunta, mecanismos comuns de
10
11
12
13
14
15
16
Comissão das Comunidades Europeias 2007, Parlamento Europeu 2007 e Conselho da União Europeia, 2007.
Conselho da União Europeia, 2007.
O Plano será baseado em actividades de acompanhamento dos dois conjuntos de Conclusões do Conselho, separadas ao longo deste processo. O trabalho
sobre as situações de fragilidade é baseado em: 1) Planos de Acção, estudos e relatórios de 6 países-piloto, liderados por um Estado-Membro em conjunto
com uma delegação da CE em 4 casos: Serra Leoa (co-liderança da Alemanha), Burundi (co-liderança dos Países Baixos), Guiné-Bissau (co-liderança de
Portugal), Haiti (co-liderança da França), Timor-Leste e Iémen; 2) um estudo de apoio com o mapeamento dos agentes, instrumentos e ferramentas de
avaliação em situações de fragilidade; 3) trabalho conjunto com a COM, o BM, a AfDB e o FMI com vista a uma abordagem conjunta para orçamentar o
apoio em situações de fragilidade e 4) a adopção de procedimentos flexíveis em situações de crise e emergência. Para o acompanhamento da relação entre
segurança e desenvolvimento, ver em especial RELEX/Estudos/IE (Instrumento de Estabilidade)/Segurança e Desenvolvimento. Relatório Final Livro 1 e 2
(Projecto n.º 2008/157766). O estudo examinou a relação entre a segurança e o desenvolvimento em Aceh/Indonésia, Afeganistão, África do Sul, Chade,
Colômbia e República Centro Africana e foi distribuído aos Estados-Membros da UE em Fevereiro de 2009.
O Acordo de Parceria de Cotonu (APC) entre a União Europeia os Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico (ACP) inclui todos os Estados da África subsariana
com exclusão da África do Sul.
É possível encontrar uma lista completa dos documentos da política da UE/CE em matéria de fragilidade no Volume 1B.
Comissão das Comunidades Europeias 2009b.
Programa de Acção de Acra, 2008, terceiro Fórum de Alto Nível, 2 a 4 de Setembro.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 8
execução (cofinanciamento, missões comuns de doadores) e um “Código de Conduta sobre a complementaridade e a divisão das
tarefas na política de desenvolvimento”17, até agora aplicado “muito parcialmente18.” Actualmente, está a ser elaborado um quadro
operacional para promover a eficácia da ajuda e as abordagens conjuntas a nível comunitário nos domínios da divisão das tarefas,
utilização dos sistemas do país e cooperação técnica para desenvolvimento de capacidades, incluindo em contextos frágeis, com
vista ao quarto Fórum de Alto Nível para a Eficácia da Ajuda (HLF IV) que terá lugar em Seul, Coreia, em 2011.
Caixa 8.2: Disposições específicas sobre fragilidade da Declaração de Paris
sobre a Eficácia da Ajuda e do Programa de Acção de Acra
DECLARAÇÃO DE PARIS SOBRE A EFICÁCIA DA AJUDA
Adaptação e aplicação às diferentes situações dos países
• Melhorar a eficácia da ajuda em situações de emergência e de complexidade, tais como o desastre do maremoto que
atingiu os países costeiros do Oceano Índico, em 26 de Dezembro de 2004. Nessas situações, a assistência humanitária e a
ajuda ao desenvolvimento têm de ser harmonizadas no âmbito dos objectivos de reforço do crescimento e da redução da
pobreza dos países parceiros. Nos Estados frágeis, ao apoiarmos o reforço das instituições e o fornecimento dos serviços
essenciais, velaremos para que os princípios de harmonização, alinhamento e gestão centrada nos resultados sejam
adaptados a ambientes caracterizados pela deficiência das estruturas governativas e de falta de capacidade. De um modo
geral, daremos mais atenção a estas situações complexas nos nossos esforços para aumentar a eficácia da ajuda.
Reforçar a eficácia da ajuda nos Estados frágeis
• A visão a longo prazo do envolvimento internacional em Estados frágeis é estabelecer instituições nacionais ou outras
que sejam legítimas, eficazes e sólidas. Embora os princípios orientadores da ajuda eficaz se apliquem igualmente a
Estados frágeis, tais princípios precisam de ser adaptadas a ambientes onde a apropriação e as capacidades sejam
débeis, bem como a necessidades urgentes de fornecimento de serviços essenciais.
Os países parceiros comprometem-se a:
• Realizar progressos na criação de instituições e estruturas de governação eficazes, que proporcionem à sua população
segurança e protecção pública, bem como aceso equitativo aos serviços sociais básicos.
• Estabelecer diálogo com os doadores sobre a elaboração de ferramentas simples de planificação, tais como a matriz de
resultados para a transição, quando não tenham ainda sido adoptadas estratégias nacionais de desenvolvimento.
• Fomentar uma ampla participação de actores nacionais muito diversos, para a definição das prioridades em matéria
de desenvolvimento.
Os doadores comprometem-se a:
• Harmonizar as suas actividades. A harmonização é muito mais crucial quando não exista uma forte liderança
governamental. Ela deve focalizar-se em análises a montante, avaliações conjuntas, estratégias comuns, coordenação
do compromisso político, bem como em iniciativas práticas, tais como a criação de escritórios comuns para vários
doadores.
• Alinhar-se na maior extensão possível com estratégias conduzidas pela administração central do país parceiro ou,
quando este princípio não seja aplicável, utilizar ao máximo os sistemas nacionais, regionais, sectoriais ou outros não
governamentais.
• Evitar actividades que prejudiquem a criação das instituições nacionais, tais como as que têm por efeito passar por cima
dos processos orçamentais nacionais ou pagar salários muito elevados ao pessoal local.
• Utilizar uma gama apropriada de instrumentos de ajuda, incluindo o apoio a financiamentos recorrentes, especialmente
nos países que se encontrem numa fase de transição prometedora, mas de alto risco.
PROGRAMA DE ACÇÃO DE ACRA
Adaptaremos as políticas de ajuda aos países em situações de fragilidade
Na Declaração de Paris, acordámos que os princípios de eficácia da ajuda se aplicam igualmente à cooperação para o
desenvolvimento em situações de fragilidade, nomeadamente em países emergentes de conflitos, mas que esses princípios têm
que ser adaptados a ambientes em que a apropriação e as capacidades são fracas. Desde então, foram adoptados os Princípios
para uma Intervenção Internacional Eficaz em Estados Frágeis e em Situações de Fragilidade. Para aumentar a eficácia de ajuda
nestes ambientes, adoptaremos as seguintes medidas:
17
18
Conselho da UE, 2007.
Parlamento Europeu 2009.
116
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Políticas da UE para enfrentar a fragilidade na África subsariana
• Os doadores realizarão avaliações conjuntas de da governação e das capacidades e examinarão as causas de conflito,
fragilidades e insegurança, envolvendo autoridades dos países em desenvolvimento e outras partes interessadas
relevantes, até ao limite possível.
• A nível nacional, os doadores e os países em desenvolvimento estabelecerão e acordarão um conjunto de objectivos realistas
em matéria de construção do Estado e consolidação da paz, que enfrentem as causas profundas de conflito e fragilidade e
ajudem a garantir a protecção e participação das mulheres. Este processo deverá basear-se num diálogo internacional entre
parceiros e doadores sobre estes objectivos, como pré-requisitos do desenvolvimento.
• Os doadores proporcionarão apoio ao desenvolvimento das capacidades, regulado pela procura, talhado à medida e coordenado
para a execução de funções essenciais do Estado e para uma pronta e rápida recuperação. Trabalharão em conjunto com
os países em desenvolvimento para delinearem medidas provisórias, sequenciadas e que conduzam a instituições locais
sustentáveis.
• Os doadores trabalharão em modalidades flexíveis, rápidas e financiadas a longo prazo, numa base partilhada quando
apropriado, para i) fazer a ponte para fases humanitárias, de recuperação e de desenvolvimento a longo prazo e ii) apoiar a
estabilização, incluindo a consolidação da paz e a construção de Estados capazes, responsáveis e com capacidade de resposta
reactiva. Em colaboração com os países em desenvolvimento, os doadores promoverão parcerias com o Sistema das Nações
Unidas, instituições financeiras internacionais e outros doadores.
• A nível nacional e numa base voluntária, os doadores e os países em desenvolvimento acompanharão a implementação
dos Princípios para uma Intervenção Internacional Eficaz em Estados Frágeis e em Situações de Fragilidade, partilhando os
resultados como parte dos relatórios de progresso da implementação da Declaração de Paris.
A abordagem política da UE às situações de fragilidade reflecte amplamente muito do que está estabelecido como melhores
práticas internacionais aplicáveis aos Estados frágeis, tais como a adopção de abordagens “ao nível de todas as administrações”
(“whole-of-government”) e a aplicação do Compromisso Político e dos Princípios para uma Intervenção Internacional Eficaz em
Estados Frágeis e em Situações de Fragilidade da OCDE, de Abril de 2007 (caixa 8.3).
Caixa 8.3: Princípios para uma Intervenção Internacional Eficaz em Estados Frágeis
e em Situações de Fragilidade da OCDE-CAD19
1.
Tomar o contexto como ponto de partida.
2.
Evitar danos (em todas as actividades).
3.
Focalizar a construção do Estado como objectivo central.
4.
Priorizar a prevenção.
5.
Reconhecer as ligações entre os objectivos políticos, de segurança e de desenvolvimento.
6.
Promover a não-discriminação enquanto base das sociedades que gozam de estabilidade e inclusão social.
7.
Alinhar-se segundo as prioridades locais em diferentes formas e segundo contextos distintos.
8.
Alcançar consenso sobre mecanismos práticos de coordenação entre os actores internacionais.
9.
Agir com rapidez...mas manter-se envolvido durante o tempo suficiente para garantir a sustentabilidade.
10.
Evitar criar bolsas de exclusão (“órfãos de ajuda”).
Uma vez que já existem na UE e a nível internacional um extenso quadro de acção e várias iniciativas políticas relevantes para a
fragilidade dos Estados, a questão não reside em criar um novo quadro. Trata-se antes de vencer os desafios políticos, financeiros
e institucionais para executar essas políticas na prática. As questões que necessitam de orientações operacionais nos Estados
frágeis incluem o apoio orçamental, a relação entre consolidação da paz e construção do Estado, comércio, alterações climáticas,
descentralização, integração regional, prestação de serviços e coesão social e de género. Algumas destas áreas já foram abordadas,
enquanto para outras a política comunitária actual fornece apenas orientações práticas limitadas. Além disso, é importante que
os quadros de acção actuais da UE sejam suficientemente “testados no terreno” em termos de viabilidade, relevância e impacto
em diferentes contextos de fragilidade.
19
Extraído de OCDE-CAD 2007.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 8
1.2 INSTRUMENTOS COMUNITÁRIOS PARA A EXECUÇÃO DO QUADRO DE ACÇÃO
Tal como foi reconhecido na Estratégia Europeia de Segurança, de 2003, e em vários outros documentos políticos pertinentes, o
desafio para a UE consiste em congregar os seus diferentes instrumentos e capacidades num esforço concentrado e coerente, não
só entre instrumentos comunitários mas também incluindo as actividades externas dos Estados-Membros. Alguns dos instrumentos
necessários são:
Orientações, planos de acção e estratégias específicas. Conforme mencionado anteriormente, está a ser elaborado um
Plano de Acção que define uma abordagem comunitária às situações de fragilidade e conflito. A UE desenvolveu também estratégias
e planos de acção específicos20 sobre outras questões como, por exemplo, a execução das Resoluções 1325 e 1820 do Conselho
de Segurança das Nações Unidas. A Resolução 1325 das Nações Unidas sobre as mulheres, a paz e a segurança, foi o primeiro
documento oficial do Conselho de Segurança das Nações Unidas a reconhecer o impacto dos conflitos armados nas mulheres,
a destacar a importância da sua participação plena e equitativa nos processos de paz e segurança e a exigir que todas as partes
envolvidas num conflito respeitassem os direitos das mulheres (caixa 8.4). A “parceria 1325” da UE foi criada pelo grupo European
Peacebuilding Liaison Office – Gender, Peace and Security (Gabinete europeu de ligação para a consolidação da paz – género,
paz e segurança) para criar um fórum destinado a decisores políticos e melhorar o debate e o conhecimento das perspectivas de
género e a aplicação da resolução 1325 das Nações Unidas na União Europeia.
Caixa 8.4: Resolução 1325 do Conselho de Segurança das Nações Unidas
A Resolução 1325 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, adoptada em 31 de Outubro de 2000, ajudará a combater
a desigualdade de género em situações de pós-conflito e a criar uma paz mais equitativa para ambos os sexos. A Resolução
1325 exige que as partes em conflito respeitem os direitos das mulheres e apoiem a sua participação em negociações de paz
e em processos de reconstrução pós-conflito21. A Resolução do Conselho de Segurança aborda especificamente o impacto
único e desproporcionado da guerra nas mulheres e as contribuições especiais subavaliadas e subutilizadas das mulheres
para a resolução de conflitos e a paz sustentável. Exorta à participação plena e equitativa das mulheres como agentes activos
da paz e da segurança. A construção da paz é um processo contínuo nos Estados que estão a sair de situações de fragilidade
e a igualdade entre os géneros é essencial para incentivar a boa governação, a transparência e a responsabilidade.
O Centro Africano para a Resolução Construtiva de Disputas (ACCORD) forma homens e mulheres para adquirirem
competências em matéria de resolução, negociação e mediação de conflitos para os ajudar a apresentar as suas questões,
necessidades e interesses nas negociações de paz na África do Sul, Burundi, Guiné, Libéria, Quénia, República Democrática
do Congo, Ruanda, Serra Leoa, Somália, Sudão e Uganda.
As Redes Mano River Women Peace na Serra Leoa, Libéria e Guiné (MARWOPNET), signatárias do Acordo de Paz de Lomé, foram
galardoadas com o United Nations Human Rights Prize (Prémio Direitos Humanos das Nações Unidas) pelo seu desempenho
no processo de paz na África Ocidental, em 2003. O seu trabalho aponta para os desafios que as mulheres enfrentam para
assumirem posições de liderança nos domínios social, político e económico nos processos de reconstrução e consolidação
da paz e para a importância que as Convenções Internacionais e as Resoluções das Nações Unidas 22 atribuem às mulheres
na manutenção da paz e da segurança nas suas sociedades 23.
20
21
22
23
Por exemplo, os planos de acção da UE em matéria de alterações climáticas e desenvolvimento.
A Comissão Europeia, a UNIFEM e o Centro de Formação Internacional da OIT criaram igualmente esta parceria para apoiar uma actuação mais forte em
matéria de igualdade de género e emancipação das mulheres nos processos nacionais de desenvolvimento e nos programas de cooperação financiados
pela CE. A parceria inclui o esforço na implementação eficaz da Resolução 1325 do Conselho de Segurança das Nações Unidas e incide sobre 12 países, na
sua maioria a emergirem de situações de conflito.
Convenções Globais, Resoluções da ONU e Protocolo Africano para o Género, a Paz e a Segurança: Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de
Discriminação contra a Mulher (CEDAW) 1979; Plataforma de Acção de Pequim, 1995; Resolução 1265 da ONU sobre a “Protecção dos Civis em Conflitos
Armados” adoptada em 17 de Setembro de 1999; Resolução 1261 da ONU sobre “as Crianças e os Conflitos Armados” adoptada em 25 de Agosto de 1999;
Resolução 1296 da ONU sobre a “Protecção dos Civis em Conflitos Armados” adoptada em 19 de Abril de 2000; Resolução 1314 da ONU sobre “as Crianças e
os Conflitos Armados” adoptada em 11 de Agosto de 2000; Resolução 1325 da ONU sobre “as Mulheres, a Paz e a Segurança” adoptada em 31 de Outubro de
2000: Gender Equality, Development and Peace for the Twenty-first Century ” Nova Iorque, 5 a 9 de Junho de 2000 e Protocolo sobre os Direitos das Mulheres
em África, Maputo, 11 de Julho de 2003.
Os Estados-Membros da UE fornecem exemplos de boas práticas, que podem ser replicadas em contextos de fragilidade. Os Planos Nacionais para a
Implementação da Resolução 1325 da ONU (“NAP”) estão a ser executados em nove países europeus (Áustria, Dinamarca, Espanha, Islândia, Noruega, Países
Baixos, Reino Unido, Suécia e Suíça). Os NAP são considerados como tentativas inovadoras e estratégias abrangentes para promover o acompanhamento de
compromissos internacionais. Para uma análise mais detalhada dos NAP, ver Sherriff e Barnes (2008).
118
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Políticas da UE para enfrentar a fragilidade na África subsariana
A fim de poder desempenhar um papel mais importante na protecção e emancipação das mulheres em cenários pós-conflito,
a UE deve implementar mecanismos de responsabilização, controlo e informação mais eficazes e aumentar os recursos
financeiros e humanos afectados a este domínio de acção 24. O papel dos prestadores consuetudinários de segurança e
justiça deve igualmente ser considerado nos processos de reforma do sector da segurança uma vez que, em muitos Estados
frágeis, os serviços de segurança abrangem apenas o centro da capital e as pessoas que vivem nas zonas rurais ou nos
subúrbios degradados dependem, sobretudo, de uma rede informal de fornecedores de segurança.
Instrumentos financeiros e procedimentos. Face às actuais perspectivas financeiras para o período 2007-2013, a CE lançou
um processo de reforma dos seus instrumentos financeiros em matéria de acção externa que inclui, designadamente, o Instrumento
para a Estabilidade, o Instrumento de Financiamento da Cooperação para o Desenvolvimento (incluindo rubricas orçamentais
temáticas como “Intervenientes Não Estatais e Autoridades Locais no Processo de Desenvolvimento”) e o Instrumento Europeu
para a Democracia e os Direitos do Homem, além do Fundo Europeu de Desenvolvimento como instrumento para a cooperação
com os países ACP fora do âmbito do orçamento da UE. O Instrumento para a Estabilidade dispõe de 2,1 mil milhões de euros para
o período 2007-201325. O 10.º Fundo Europeu de Desenvolvimento para os países ACP dispõe de 22,7 mil milhões de euros para o
período 2008-2013 e fornece um quadro integrado para financiar actividades em matéria de desenvolvimento e segurança26.
Caixa 8.5: A Flex Vulnerabilidade
A fim de ajudar os países em desenvolvimento a enfrentar os efeitos da crise económica de 2008/2009, a UE adoptou
diversas medidas em 2009, incluindo a criação de um mecanismo Flex ad-hoc Vulnerabilidade (V-Flex) 27. Trata-se de um
instrumento de curto prazo e orientado para a procura, que apoia os países ACP mais vulneráveis e com fraca capacidade
de resiliência a fim de permitir que estes mantenham as despesas prioritárias, nomeadamente nos sectores sociais, em 2009
e 2010. O mecanismo V-FLEX pode conceder subvenções nos países ACP onde os empréstimos das Instituições Financeiras
Internacionais são insuficientes ou as potenciais IFI não estão a operar. O apoio pode também ser prestado sob a forma de
apoio orçamental (mecanismo privilegiado) ou programas/projectos existentes (solução de recurso).
O mecanismo V-Flex dispõe de um montante de 500 milhões de euros para o período 2009-2010. A elegibilidade dos países
para o mecanismo Flex Vulnerabilidade deve ser decidida casuisticamente de acordo com os critérios estabelecidos pela
Comissão.
O mecanismo de Apoio à Paz em África, criado em 2003 em resposta a um pedido da União Africana, utiliza o Fundo Europeu de
Desenvolvimento para apoiar as operações de manutenção da paz em África. Mais recentemente, a Comissão Europeia desenvolveu
um trabalho estratégico em matéria de apoio orçamental em situações de fragilidade, em conjunto com vários Estados-Membros,
o Banco Mundial, o Banco Africano de Desenvolvimento e o Fundo Monetário Internacional, com o objectivo de desenvolver
orientações e melhorar a coordenação a nível comunitário e internacional. Conforme referido anteriormente, deverá ser adoptado
um “documento com uma abordagem conjunta” (CAP, Common Approach Paper) até ao final de 2009. A Comissão procedeu
igualmente a uma revisão dos seus procedimentos a fim de os tornar mais flexíveis em situações de fragilidade.
Recursos humanos. Embora a existência de recursos humanos adequados para executar estas políticas continue a ser um
problema nas capitais dos Estados-Membros europeus, em Bruxelas e na África Subsariana, as delegações da CE adquiriram maior
sensibilidade e sensibilização política. As delegações da CE continuam a centrar prioritariamente a sua atenção na gestão de
programas/projectos de ajuda, mas a dimensão política é agora mais importante, com melhores esforços para utilizar o diálogo
político com maior eficácia. Algumas delegações da CE dispõem de consultores políticos e existe uma maior atenção nas questões
governativas, uma lacuna antiga nas políticas comunitárias. No entanto, muitas delegações da CE não possuem capacidade
para detectar os factores sociais que podem desencadear a instabilidade e não possuem a implantação local para adquirir um
conhecimento completo das questões pertinentes. Não possuem também, com frequência, uma estratégia e mandato políticos
claros apoiados por todos os agentes comunitários no terreno, nem a capacidade para os executar. Caso seja adoptado, o Tratado
24
25
26
27
Sherriff e Barnes 2008.
Para um debate mais aprofundado deste instrumento específico, ver Gänzle 2009.
Desde que não se destinem a custos de acções militares de carácter ofensivo, uma vez que as actividades do FED não podem abranger este tipo de acções,
em conformidade com a definição de Ajuda Pública ao Desenvolvimento acordada internacionalmente.
Comissão das Comunidades Europeias 2009.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 8
de Lisboa pode proporcionar uma oportunidade para reforçar e apoiar esta dimensão política através de uma nova arquitectura
institucional. Mas a CE necessita igualmente de solucionar os condicionalismos processuais que frequentemente comprometem
a sua capacidade de traduzir compromissos políticos em actividades28.
Capacidades de gestão de crises. A UE tem igualmente desenvolvido as suas capacidades em matéria de gestão de crises civis
e militares. Em Junho de 2003, no âmbito da PESD, a UE destacou a sua primeira força militar fora da Europa sem a colaboração
da OTAN, na província de Ituri, na República Democrática do Congo. O objectivo desta missão consistia em estabilizar a situação
de segurança e melhorar as condições humanitárias dentro da cidade de Bunia e nas zonas periféricas. Entre 2004 e 2006, ainda
no âmbito da PESD, a UE destacou agentes da polícia europeia para a República Democrática do Congo (EUPOL-Kinshasa), uma
missão consultiva para a reforma do sector da segurança, bem como a missão EUFOR DRC, um destacamento militar, em Kinshasa
e nas zonas periféricas e ainda no vizinho Gabão, com a missão de ajudar a MONUC a estabilizar a situação durante as eleições
e proteger a população civil. Desde Janeiro de 2008 até Março de 2009, a UE destacou uma força militar no leste do Chade e na
região nordeste da República Centro Africana para proteger a população civil em perigo, facilitar a prestação de ajuda humanitária
e proteger os funcionários e as instalações das Nações Unidas.
No entanto, a estrutura por pilares abrangente e a divisão de competências limitam a articulação entre os diferentes intervenientes,
instrumentos e políticas da UE29. No domínio da relação entre segurança e desenvolvimento, quando as operações de gestão de
crises militares e civis convergem com o reforço das instituições, a prevenção de conflitos e o desenvolvimento económico, surgem
questões pertinentes quanto à demarcação de poderes entre os referidos pilares30. No âmbito das instituições europeias não existe
consenso universal quanto à possibilidade de uma delegação integrada do Conselho e da Comissão ser a melhor opção31. Está
em curso uma tentativa de articular as capacidades civis e militares da UE no âmbito da reestruturação de responsabilidades no
secretariado do Conselho, o que pode afectar igualmente o trabalho conjunto com a CE.
Quadro 8.1: Instituições e agências da União Europeia relevantes para os Estados frágeis32
Comissão Europeia 32
Conselho da UE
Etados-Membros da UE
• CAGRE
• DG Relações Externas
• DG do Comércio
• Alto Representante
• COPS
• GPM
• DG Desenvolvimento e
• Grupos de Trabalho do • Ministérios estrangeiros
Acção diplomática
Relações com os Estados
Conselho (COHOM, CODEV, • Embaixadas/missões
de África, das Caraíbas e do
CIVCOM e grupos regionais
Pacífico
de trabalho)
• Delegações CE
• REUE
• Secretariado do Conselho
• DG Desenvolvimento e
Relações com os Estados
de África, das Caraíbas e do
Pacífico
• Ministérios/agências
para a cooperação e
desenvolvimento
Programação • DG Relações Externas
multilateral e bilateral
• DG ECHO (ajuda
humanitária)
• Agências para o
desenvolvimento operacional
• Embaixadas/missões
• DG EuropeAid
• Delegações CE
Gestão de crises • DG Relações Externas
28
29
30
31
32
• Missões PESD
• Contribuições para as missões
PESD
Por exemplo, os procedimentos da CE dificultam a tarefa das delegações comunitárias de contratar investigadores locais para colaborarem em algumas
destas análises de contexto. Koeb 2008 sugere, por exemplo, a insistência no recrutamento de pessoal especializado.
Solana 2009.
Hoffmeister 2008.
Vogel 2009.
As instituições têm papéis diferentes no âmbito de cada uma destas áreas e a Comissão Europeia não pode encetar uma iniciativa diplomática de âmbito
comunitário.
120
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Políticas da UE para enfrentar a fragilidade na África subsariana
2. POTENCIAL DA UE EM SITUAÇÕES DE FRAGILIDADE
A UE é um interveniente essencial a nível político, económico e diplomático. A UE é o maior
bloco comercial do mundo e, colectivamente, o maior doador internacional. À semelhança de outros
grandes intervenientes no cenário internacional, é uma grande potência económica. Pode utilizar a sua
energia diplomática através da Política Externa e de Segurança Comum com os 27 Estados-Membros
a agirem conjuntamente em países e fóruns internacionais como as Nações Unidas. E tem algumas
vantagens sobre as Organizações Internacionais no combate à fragilidade: a grande diversidade das
suas acções potenciais, os recursos que pode mobilizar e o seu estatuto enquanto interveniente político.
Além disso, a própria história da UE, no que respeita à transição de regimes ditatoriais para regimes
democráticos, em alguns países, e de sistemas regulados para sistemas de mercado, representa uma
inestimável experiência a explorar.
A UE colabora com agentes estatais e não estatais. A UE tem a capacidade de colaborar com diversos agentes não
governamentais, incluindo autoridades locais, agentes não estatais e organizações regionais, que trazem novas perspectivas à
UE no que respeita ao conhecimento do contexto local, integram o diálogo político com os governos e reforçam o alcance das
suas políticas. Mas, muitas vezes, essa capacidade não é explorada devido à complexidade dos procedimentos comunitários e à
capacidade limitada de alguns dos outros agentes33.
A UE tem uma presença duradoura. Através dos Estados-Membros ou das delegações CE, a União Europeia tem uma presença
duradoura nos países frágeis. Mesmo em situações de conflito aberto violento, quando permanecem poucos agentes internacionais,
a UE mantém muitas vezes algum tipo de presença e apoio através dos serviços ou de peritos locais do Serviço de Ajuda Humanitária
da CE. Na verdade, o facto de a CE (através do programa ECHO) ter sido o único doador permanente presente na parte leste da
República Democrática do Congo ao longo dos primeiros anos desta década deu-lhe uma vantagem significativa sobre os outros
doadores. E proporcionou a primeira missão de gestão de crise em África (sem recurso a activos da OTAN) em apoio da operação
Artemis das Nações Unidas em Bunia, no nordeste da República Democrática do Congo, em 2003.
A UE pode desenvolver parcerias globais. A UE não é a única potência económica, política ou militar envolvida ou interessada
em África34. A capacidade da UE de criar um diálogo trilateral genuíno com China e África enfrentou dificuldades uma vez que
poucos agentes africanos encaram este diálogo trilateral no seu melhor interesse. Em alguns casos, as capacidades da UE são
igualadas ou ultrapassadas por terceiros, mas a sua natureza não hegemónica, desde que entendida dessa forma, pode trazer
um valor acrescido à presença e acção da UE. Além disso, a UE pode agir colectivamente com um peso político significativamente
menor do que cada um dos seus Estados-Membros, nomeadamente aqueles com um passado colonial na África subsariana. Desde
que os países parceiros não considerem que os Estados-Membros da UE, isoladamente, perseguem os seus próprios interesses
económicos ou de segurança específicos através da União Europeia, poderão ter maior abertura para um compromisso com a UE
e aceitá-la como uma força nas Nações Unidas. No entanto, é importante ser realista e não sobrevalorizar a influência da UE em
África. O seu papel efectivo pode não corresponder ao previsto, em parte porque, frequentemente, a UE não é encarada como
uma entidade colectiva nos países parceiros. Em termos de função ou acção, o seu desempenho é também normalmente menor
do que a soma das suas partes.
Mas a UE deve falar e agir a uma só voz e um só pensamento. O valor acrescentado da UE continuará a ser subutilizado até
que a CE e os Estados-Membros da UE actuem e falem a uma só voz (partilhando um conhecimento e uma estratégia comuns sobre
a forma de agir nestes contextos) e tenham uma divisão efectiva do trabalho não limitada à agenda de eficácia da ajuda. Conforme
indicado anteriormente, estão em curso diversas iniciativas, como o futuro plano de acção em matéria de situações de fragilidade
e conflito. A questão reside na forma como o grande leque de políticas e instrumentos, bem como os diferentes agentes da UE, se
inter-relacionam com vista a desenvolver e executar uma estratégia informada, coerente e baseada nas necessidades, que possa
ajudar melhor esses Estados e sociedades a enfrentar as causas e os efeitos da fragilidade e melhorar a sua resiliência.
Se a coordenação e a coerência da UE são frequentemente difíceis a nível nacional, no âmbito das administrações dos EstadosMembros, são ainda mais complexas a nível comunitário: com 27 Estados-Membros, as instituições da UE, os processos de decisão
morosos e pesados e procedimentos internos e financeiros complexos. Mas a UE pode obter resultados como interveniente único,
quando existe uma liderança competente e uma forte vontade política. A política comunitária aplicada na República Democrática
do Congo, em meados da década de 1990, é considerada frequentemente um exemplo de unidade de objectivos e compromissos
no âmbito das instituições da UE (incluindo os Estados-Membros) para apoiar a estabilização de um Estado. Mas para que este
resultado unificado seja mais permanente, são necessários acordos institucionais mais estáveis. Uma política unificada a longo
prazo não pode ser executada através de uma coordenação pontual.
33
34
Ver Particip 2008.
Ver Tadesse 2009.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 8
3. MELHOR RESPOSTA DA UE A SITUAÇÕES DE FRAGILIDADE
Embora os progressos sejam visíveis e os documentos políticos ofereçam orientações políticas mais
abrangentes, há um longo caminho a percorrer para transformar os compromissos assumidos em
resultados práticos. Os instrumentos e os procedimentos financeiros tornaram-se mais simples e flexíveis,
mas continuam complexos, pesados, demorados e “hostis para com os agentes não estatais”. Este facto
é verdadeiro mesmo em relação à ajuda humanitária, que tem indubitavelmente os procedimentos
comunitários mais ligeiros. A CE e o Conselho ainda competem em matérias de competência. A criação de
um serviço comum para a acção externa, caso o Tratado de Lisboa seja ratificado, pode fornecer algumas
respostas, mas o trabalho essencial é mais profundo35.
As políticas de desenvolvimento devem articular-se com as missões (gestão de crises civis e militares) da Política Externa e de
Segurança Comum (PESC) e da Política Europeia de Segurança e Defesa (PESD), e vice-versa. Esta articulação deve processar-se
especialmente nos casos em que as questões transversais (direitos humanos, Estado de Direito) e as actividades (reforma do
sector da segurança (RSS) e desarmamento, desmobilização e reintegração (DDR)) serão provavelmente tão importantes como os
domínios tradicionais dos compromissos da UE em matéria de política externa (ou talvez ainda mais). Os agentes envolvidos em
acções humanitárias e militares podem também encontrar-se mais facilmente no terreno, o que coloca outros desafios relacionados
com as percepções das suas diferentes funções, a clareza dos seus mandatos e a adequabilidade dos seus meios. Também as
articulações entre desenvolvimento, segurança e ambiente não foram ainda clarificadas, embora sejam agora alvo de maior atenção,
nomeadamente na África Central, incluindo a região dos Grandes Lagos.
Os factores de mudança são essencialmente locais. Os países doadores e as suas políticas podem ajudar, prejudicar ou não fazer
qualquer diferença. Mas cabe aos agentes locais determinar quando e como ocorre a mudança. Assim, é importante que os papéis
e as actividades da UE se enquadrem em cada contexto específico (de acordo com os Princípios da OCDE-CAD). Isso pressupõe o
conhecimento e a compreensão da dinâmica local e regional, do ponto de vista antropológico, histórico, socioeconómico e político.
Deste modo, é necessário um compromisso político mais sustentável do que tecnocrático.
3.1 REDUZIR A DISTÂNCIA ENTRE A COMPREENSÃO DO CONTEXTO E UMA RESPOSTA POLÍTICA
ADEQUADA
As recentes acções políticas da UE caracterizaram-se por um renovado esforço para conhecer a dinâmica local, identificar as
causas de (potenciais) conflitos e integrar análises políticas, sociais, económicas e regionais fundamentadas e de várias fontes nas
estratégias nacionais, nomeadamente em situações de fragilidade36. As análises de contexto são frequentemente partilhadas pela
CE e pelos Estados-Membros da UE. E as estratégias da CE para os países baseiam-se geralmente em necessidades e prioridades
identificadas em documentos de estratégia nacionais, aumentando o potencial de apropriação. Mas a forma como essas análises
são afectadas pelas diversas fontes locais não é sempre clara. Também não existe um profundo conhecimento dos agentes locais
(perturbadores, impulsionadores de mudança), das suas motivações e da dinâmica social evolutiva. Este facto pode ser explicado
parcialmente pela necessidade de os Estados-Membros da UE manterem alguma margem de manobra política. Além disso, um
conhecimento partilhado do contexto não significa que diferentes agentes (no terreno, nas capitais europeias, parceiros locais)
partilhem uma estratégia operacional e política comum.
A UE tem tido alguma dificuldade em conseguir uma melhor articulação entre a análise de economia política e a estratégia e
programação. Alguns consideram que tal se deve ao facto de as indicações serem frequentemente contraditórias ou de serem
necessárias opções políticas que a UE, ou o seu parceiro, não pretende ou não pode efectuar. Por exemplo, no Quénia, muitos
países doadores não reagiram nem adaptaram as suas estratégias até à eclosão da violência política em 2007, apesar dos sinais de
aviso que surgiram durante anos.
3.2 NECESSIDADE DE UM PRINCÍPIO DE APROPRIAÇÃO LEGÍTIMA
Em muitos Estados frágeis, a legitimidade tem uma duração curta, mesmo quando o governo é eleito através de um processo
eleitoral livre e justo, já de si uma proeza neste contexto. As capacidades do governo são geralmente ultrapassadas pelo nível de
necessidades. O controlo do governo está muitas vezes limitado a partes do país, não abrangendo os perpetradores de violência
(por vezes mesmo dentro das estruturas do Estado). As políticas nacionais nem sempre existem ou são bem definidas. No entanto,
35
36
Ver Koeb, 2008, no que respeita às implicações do Tratado de Lisboa nas relações da UE com os países em desenvolvimento. Em oposição à fundamentação
da aprovação do Tratado, Gaves e Maxwell, 2009, propõem modelos organizacionais diferentes para reestruturar a política de desenvolvimento da UE.
Sobre esta questão, ver o número 2 (páginas 3 a 5) do “Room Document” – Síntese da política em matéria de fragilidade actualmente em curso a nível da
UE, Bruxelas, Comissão das Comunidades Europeias 2009a.
122
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Políticas da UE para enfrentar a fragilidade na África subsariana
as políticas de desenvolvimento da UE parecem frequentemente assumir um governo em funções como um parceiro e interlocutor
legítimo. Assim, são necessárias abordagens mais criativas a fim de envolver os agentes locais e regionais como parceiros em
iniciativas comunitárias conjuntas, uma tarefa difícil de executar.
As recentes intervenções na Somália ilustram a capacidade e vontade da UE para encontrar abordagens alternativas às quase
exclusivas relações e diálogo “entre Estados” e abandonar essa visão limitada de apropriação “governo/Estado”. Mesmo que a sua
estratégia não seja a solução a longo prazo para a construção do Estado, a UE tem continuado a canalizar ajuda, a apoiar a prestação
de serviços essenciais através de agentes da sociedade civil e a promover parcerias entre os governos locais e a sociedade civil.
A UE poderá basear-se neste exemplo para rever e legitimar o princípio de apropriação e a sua relação com a sociedade civil nos
Estados frágeis.
3.3 COERÊNCIA E COORDENAÇÃO POLÍTICAS
Os esforços para uma maior coerência devem visar a construção de uma visão e estratégia política comuns, entre as instituições
da UE e os principais intervenientes no terreno, sobre a forma de enfrentar os principais desafios, definir as prioridades, com
quem colaborar, como e porquê, para a eventualidade de enfrentar governos relutantes e desafios de governação. A liderança e o
compromisso não são tão rigorosos como noutros contextos. A coordenação no terreno é ainda entendida principalmente como
não demasiado interferente nos domínios de outros e como um factor de criação de sinergias entre as actividades dos doadores.
Mas parece existir uma menor apetência entre a comunidade de doadores para uma divisão efectiva do trabalho em áreas mais
políticas da cooperação para o desenvolvimento (da mesma forma como o progresso na educação parece ser mais simples do
que o apoio à governação).
Acima de tudo, as questões políticas mais complexas tendem a ser colocadas de parte em qualquer esforço de coordenação no
terreno, nomeadamente no caso de governos fortes mas relutantes e com fraca acção governativa, o que resulta numa falta de
estratégias políticas claras para enfrentar cada situação de fragilidade. Este facto é, por um lado, o resultado de agendas e culturas
políticas diferentes da CE e dos Estados-Membros da UE e, por outro, o resultado de a interacção entre o terreno e os serviços
centrais (Bruxelas e/ou capitais) ser afectada pela falta de clarificação quanto ao papel no terreno, a nível de elaboração de políticas
e enquanto agente político. A nomeação de um novo e mais poderoso Alto Representante para os negócios estrangeiros e a política
de segurança, também Vice-Presidente da Comissão Europeia, e um novo serviço diplomático conjunto, o Serviço Europeu para a
Acção Externa, de acordo com a proposta do Tratado de Lisboa, pode trazer mudanças positivas para algumas deficiências da UE
em matéria de coerência e coordenação. No entanto, o seu possível papel transformador não deve ser sobrestimado.
Caixa 8.6: A Política Agrícola Comum da UE e a segurança alimentar nos Estados frágeis
africanos (The EU’s Common Agricultural Policy and food security in fragile African states)
por Alan Matthews, Institute for International Integration Studies, Trinity College Dublin, Ireland
A Política Agrícola Comum (PAC) da União Europeia tem sido fortemente criticada pelos seus efeitos prejudiciais na segurança
alimentar dos países africanos. As críticas são dirigidas directamente à forma como os produtos agrícolas financiados pela UE
prejudicam os mercados locais para os produtores nacionais e competem com as exportações africanas nos mercados de outros
países e a forma como as barreiras comerciais dificultam as exportações dos produtores africanos para os mercados europeus. As
ONG elaboraram estudos de caso dos danos provocados à produção local pelas exportações comunitárias subsidiadas de leite em
pó, açúcar, tomate em conserva e tomate concentrado, carne de vaca, algodão e a venda de frangos congelados 37. Teme-se que as
obrigações de liberalização impostas pelos Acordos de Parceria Económica (APE) possam expor os sectores agrícolas vulneráveis
a um aumento da concorrência exercida pela importação a partir de empresas europeias da agro-indústria 38.
Os impactos da PAC na segurança alimentar devem ser avaliados à luz de reformas significativas para os regimes de mercado da
PAC nos últimos anos. As condições de acesso aos mercados também mudaram radicalmente com os novos acordos comerciais
com países africanos em matéria de produtos agrícolas. A diversidade das economias africanas vulneráveis, muitas vezes com
elevada especialização num reduzido número de exportações agrícolas e dependentes da importação de produtos alimentares
para satisfazer as necessidades alimentares, deve igualmente ser reconhecida. Nestes países, a produção de alimentos da UE
afectará os produtores e os consumidores alimentares de forma diferente.
O comércio agrícola da UE com a África subsariana é extremamente diferenciado. A UE importa principalmente cacau e produtos
à base de cacau, bananas, café, açúcar de cana, tabaco, algodão e alguns frutos e vegetais da região, e exporta essencialmente
trigo, farinha, preparações alimentícias, açúcar branco, leite em pó, malte e frango congelado. A reforma da PAC reduziu o apoio
37
38
Paasch, 2008; Oxfam, 2002.
Bertow e Schulteis, 2008.
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SOBRE
O
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 8
dos preços de mercado para a maioria dos produtos de base elementares produzidos na UE, continuando a apoiar as receitas
agrícolas através de pagamentos directos amplamente dissociados. Assim, os preços de intervenção para os cereais, carne de
vaca, produtos lácteos, açúcar e arroz foram significativamente reduzidos. Os pagamentos directos associados relativos ao
tabaco, produtos hortícolas transformados e, em parte, à produção de algodão, foram eliminados. A dependência dos subsídios
à exportação foi muito reduzida, embora estes subsídios tenham sido reintroduzidos para a carne de porco e a carne de aves de
capoeira, em 2008, e para os produtos lácteos, em 2009. Mas a UE comprometeu-se a eliminar os subsídios à exportação depois
de 2013 e não introduziu taxas de exportação sobre os cereais durante a crise alimentar de 2007-2008, como tinha feito durante
o anterior pico dos preços em 1995-1996.
Os progressos na redução da protecção fronteiriça para a produção agrícola da UE foram menores. As taxas aduaneiras de
importação variáveis foram convertidas em tarifas fixas à importação e reduzidas em média 36% no “Uruguay Round”. Mas as
tarifas agrícolas permanecem elevadas, cerca de 20% em média, com tarifas muito mais elevadas sobre produtos de base como
carne de vaca, açúcar, bananas e produtos lácteos. Existem também indicações de progressão dos direitos aduaneiros na estrutura
tarifária da UE, com as tarifas a aumentarem com o grau de processamento.
No entanto, os países africanos beneficiam de acesso preferencial ao mercado agrícola comunitário. Todos os países menos
desenvolvidos de África têm acesso ao mercado com isenção de direitos/não sujeição a contingentes (Duty Free Quota Free - DFQF),
além de acordos transitórios relativos ao açúcar, que serão progressivamente integrados até 2015. O acesso DFQF foi alargado aos
países que não figuram entre os países menos desenvolvidos (não-PMD) que tenham rubricado APE provisórios com a UE, o que
permite melhores oportunidades de acesso ao mercado, nomeadamente para bananas e, após um período de transição, açúcar.
As regras de origem ao abrigo de APE permitem alguma flexibilização e simplificação no que respeita aos produtos agrícolas e aos
produtos agrícolas transformados, permitindo que os produtores e agricultores africanos exportem com maior facilidade para os
mercados da UE. O acesso DFQF evita também a discriminação contra a produção de valor acrescentado devido à progressão dos
direitos aduaneiros. Os países africanos que não figuram entre os menos desenvolvidos e que não assinaram APE podem utilizar
o Sistema de Preferências Generalizadas (SPG) da UE, embora as preferências pautais relativas a produtos da PAC ao abrigo deste
acordo sejam muito limitadas.
Paradoxalmente, a reforma da PAC reduz o valor deste acesso preferencial ao mercado e diminui os rendimentos que os
exportadores africanos podem obter. O acesso alargado para o açúcar foi acompanhado pela renúncia ao Protocolo do Açúcar,
o qual garantia que as exportações africanas de açúcar para a UE dentro de quotas pré-atribuídas receberiam o preço garantido
pela UE. Os preços de intervenção mais baixos e as reduções pautais diminuíram a rentabilidade do mercado comunitário para
os exportadores africanos de arroz, bananas, carne de vaca e frutos e vegetais39. Assim, no âmbito das negociações comerciais
da Agenda de Doha da OMC, os países africanos solicitaram o alargamento dos calendários das reduções pautais propostas para
produtos cujas preferências são importantes.
A UE, em reconhecimento de que a reforma da PAC pode causar dificuldades de adaptação aos países africanos devido à redução
do acesso preferencial, disponibilizou ajuda financeira para ajudar a melhorar a competitividade e contribuir para a diversificação.
As medidas de acompanhamento a favor dos países signatários do Protocolo do Açúcar, com um orçamento indicativo de 1,28
mil milhões de euros para o período 2006-2013, apoiam os processos de adaptação em 18 países ACP produtores de açúcar. No
período de 1994 a 2008, foram disponibilizados mais de 450 milhões de euros ao abrigo do Enquadramento Especial de Assistência
destinado aos países ACP exportadores de banana para promover a adaptação. A UE e os seus Estados-Membros têm também
apoiado a parceria UE-África para o desenvolvimento do algodão desde 2004 e afectaram uma verba superior a 300 milhões de
euros para programas e projectos relacionados com o algodão.
Assim, têm sido conseguidos progressos consideráveis no sentido de tornar a política agrícola da UE mais coerente com os
objectivos de desenvolvimento e os objectivos de segurança alimentar das economias africanas vulneráveis40. Mas os países
continuam a expressar receios quanto aos potenciais efeitos adversos das exportações comunitárias de produtos alimentares
no contexto da liberalização recíproca instituída ao abrigo de APE. Um dos principais objectivos da reforma da PAC consiste
em tornar as exportações comunitárias de produtos agrícolas mais competitivas. Mas a UE garantiu a esses países que a
assimetria da liberalização integrada nesses acordos pode ser utilizada tanto para excluir da liberalização diversos direitos
aduaneiros sobre os produtos agrícolas europeus como para os submeter a longos períodos de transição (até 25 anos).
A reforma da PAC irá prosseguir, tendo em conta o aceso debate sobre a natureza e justificação de pagamentos dissociados
na UE, nomeadamente depois de 2013, e o compromisso para um acordo para uma maior liberalização do comércio agrícola
assumido na Agenda de Doha. Isto permitirá incentivar uma maior importação de produtos de base elementares para a
UE e reforçar a competitividade do sector comunitário de produtos alimentares transformados. As economias africanas
frágeis encontrarão ameaças e oportunidades neste processo, mas estas terão de ser mantidas em perspectiva. Apesar do
perfil elevado dos debates sobre o impacto da PAC nos países africanos, nomeadamente na Europa, a segurança alimentar
africana continua a depender essencialmente do investimento e das políticas agrícolas nacionais em África.
39
40
Low et al., 2009.
Matthews, 2008.
124
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Políticas da UE para enfrentar a fragilidade na África subsariana
3.4 POLÍTICAS COMERCIAIS DA UE PARA OS ESTADOS FRÁGEIS
Em conformidade com o Acordo de Parceria de Cotonu, o quadro político comercial com a África subsariana baseia-se nos Acordos
de Parceria Económica (APE) negociados entre a UE e seis regiões ACP para dinamizar o comércio e o desenvolvimento e inverter a
marginalização dos Estados ACP. Em Cotonu, foi igualmente acordado que os APE serão compatíveis com as regras da OMC. Embora
exista nas regras da OMC uma certa margem para excepções no que respeita aos países em desenvolvimento e, em especial,
aos países menos desenvolvidos (PMD), não existem disposições específicas para Estados frágeis ou situações de fragilidade. A
capacidade e o espaço político para a UE adaptar ou adoptar medidas específicas destinadas aos Estados frágeis no domínio do
comércio estão assim limitados pelos compromissos internacionais assumidos (mas, contudo, possíveis).
Alguns analistas argumentaram que “embora as APE não constituam uma solução imediata para a crise, podem aumentar as
dificuldades encontradas por alguns países africanos, a menos que o processo de negociações APE seja dotado de alguma flexibilidade
e sejam adoptadas e aplicadas de imediato medidas adequadas de apoio ao desenvolvimento41”. As medidas comunitárias de Ajuda
ao Comércio podem permitir alguma flexibilidade de adaptação às especificidades dos Estados frágeis ou, pelo menos, assegurar
que as suas capacidades de comércio e resiliência são melhoradas e não fragilizadas pelos compromissos assumidos nesses acordos
comerciais.
Caixa 8.7: Ajuda ao Comércio
A UE é um dos principais fornecedores da Ajuda ao Comércio, uma ampla iniciativa destinada a promover o comércio, a
desenvolver políticas comerciais e a criar infra-estruturas comerciais. Deste modo, mesmo não sendo específica para países
frágeis, é relevante para estes países, dadas as suas características estruturais.
A Declaração Ministerial da OMC de Hong Kong, em 2005, apelou para uma maior e melhor ajuda ao comércio. A
declaração iniciou um processo para ajudar os países com rendimentos baixos a ultrapassar as limitações estruturais e as
débeis capacidades que prejudicam as suas possibilidades de competirem e optimizarem os benefícios decorrentes das
oportunidades de comércio e investimento. Em 2007, o Conselho da UE adoptou uma Estratégia comunitária de Ajuda ao
Comércio, uma iniciativa conjunta da Comunidade e dos Estados-Membros da União Europeia. Esta estratégia visa “permitir
que os países em desenvolvimento, nomeadamente os países menos desenvolvidos (PMD) utilizem o comércio de forma mais
eficaz para promover o crescimento, o emprego, o desenvolvimento e a redução da pobreza, bem como para alcançar os
seus objectivos de desenvolvimento 42.” Esta estratégia inclui o reforço do financiamento específico destinado à Assistência
Relacionada com o Comércio (ARC) para 2 mil milhões de euros por ano até 2010. Visa beneficiar mais os pobres, aumentar
a capacidade dos Estados-Membros de acordo com os princípios de eficácia da ajuda, apoiar o processo ACP de integração
regional e acompanhar os compromissos.
No que respeita ao compromisso da UE em afectar 2 mil milhões de euros anuais à Assistência Relacionada com o Comércio
até 2010, os novos valores indicam que o compromisso colectivo da UE estava quase cumprido em 2007. Nesse ano,
os compromissos dos Estados-Membros da UE e da Comunidade em matéria de ARC somaram 960 milhões de euros e
1,02 mil milhões de euros, respectivamente. O montante total do apoio da UE em 2007 atingiu assim 1,97 mil milhões
de euros com um aumento de 8% face a 2006, que totalizou 1,83 mil milhões. No que respeita ao programa alargado de
ajuda ao comércio, o apoio total da UE atingiu 7,17 mil milhões de euros em 2007 e a África está a receber a maior fatia das
dotações comunitárias em matéria de ajuda ao comércio: 2,7 mil milhões de euros em 2007 e 44% da ajuda comunitária
ao comércio entre 2005 e 2007 43.
O princípio subjacente à Ajuda ao Comércio, ou seja, ajudar os países em desenvolvimento a ligarem-se ao mercado global,
é importante, uma vez que a resolução das questões não pautais e dos condicionalismos das infra-estruturas são objectivos
a longo prazo essenciais para a redução da pobreza. E a Ajuda ao Comércio pode ter um efeito de estímulo imediato na
recessão de 2009.
O que não existe em muitos Estados frágeis não é tanto o comércio de mercadorias, que é essencialmente informal e desvia parte das
muito necessárias receitas do Estado, mas sim as instituições que asseguram a execução dos acordos e políticas comerciais. Os países
frágeis da África subsariana enfrentam muitos obstáculos internos (falta de conhecimento, burocracia em excesso, financiamento
inadequado, infra-estruturas fracas), o que lhes dificulta as operações comerciais e a possibilidade de beneficiar totalmente da
ajuda ao comércio. Este facto particularmente notório nos países da África Central que, devido à sua posição geográfica, correm o
risco de se tornarem “órfãos da ajuda ao comércio” e serem mais marginalizados pelo processo de globalização.
41
42
43
Bilal et al. 2009, pág.1.
Comissão das Comunidades Europeias 2007, pág. 3
Comissão das Comunidades Europeias 2009, pág. 3.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 8
Embora fosse possível adoptar outras medidas criativas no âmbito comercial, a UE parece ter, a nível global, pouca flexibilidade
para adaptar a sua política comercial e torná-la mais sensível a situações de fragilidade. Alguns argumentam, face ao impacto da
actual crise financeira, que os “elementos dos APE necessitam claramente de uma revisão urgente44.”
`
Caixa 8.8: Acordos de Parceria Económica
Os APE são acordos assimétricos que abrangem não apenas o comércio de mercadorias e serviços mas também questões não
pautais, como competitividade, contratos públicos, propriedade intelectual e facilitação de comércio, promovendo a integração
regional em combinação com a ajuda. Nos termos do Acordo de Cotonu, o objectivo consiste em reforçar a cooperação em
todas as áreas relevantes para o comércio e promover o desenvolvimento sustentável nos Estados ACP. Os APE devem visar o
desenvolvimento, aprofundar a integração regional, melhorar o acesso dos produtos ACP ao mercado da UE e reforçar a cooperação
em matérias de questões relacionadas com o comércio e os serviços. Ao melhorar a competitividade, os APE devem contribuir
para a integração dos países ACP na economia global e promover o seu crescimento económico.
Os APE envolveram inicialmente seis grupos ACP regionais, depois sete com a CAO (Comunidade da África Oriental), dos
quais cinco são na África subsariana45. Num APE entre a UE e um grupo regional, este negoceia como um bloco único,
embora o acordo seja assinado bilateralmente. Os países ACP não-PMD que pretendam participar num APE podem aceder
à UE através do Sistema de Preferências Generalizadas46 que, contudo, é menos favorável. Os resultados provisórios do
processo APE47 foram objecto de aceso debate na literatura económica e política48.
Muitos estudos sublinham a incerteza dos seus resultados49. Para alguns países, os APE provisórios não devem conduzir
a significativos ganhos com o comércio, uma vez que os países ACP podem cumprir uma percentagem significativa dos
esforços de liberalização exigidos nos APE sem prejudicar consideravelmente o seu sistema de protecção actual50.
Do ponto de vista da fragilidade e do reforço institucional, o potencial impacto dos APE sobre as receitas dos direitos
aduaneiros dos países da África subsariana constitui uma questão importante. Tendo em conta a importância dos impostos
comerciais para a receita pública dos países africanos, a redução das receitas dos direitos aduaneiros associados à liberalização
comercial recíproca pode reduzir a capacidade para satisfazer as funções essenciais do Estado. As estimativas inerentes
à liberalização total e imediata sugerem que as perdas podem ser significativas51. Por exemplo, a África Ocidental será
provavelmente a região mais afectada, com as estimativas das perdas para a CEDEAO a variarem entre 30% e 89,5% das
receitas dos direitos aduaneiros52. Uma liberalização mais gradual do comércio poderá reduzir as perdas das receitas de
direitos aduaneiros, mas com o custo de menores ganhos resultantes da abertura comercial.
Assim, sem uma reforma adequada dos sistemas fiscais e das medidas compensatórias, os APE podem ter consequências
negativas significativas para a capacidade de alguns Estados da África subsariana em aumentar os recursos públicos. Este
facto é ainda mais importante porque é sobejamente sabido que os países pobres têm dificuldade em substituir os impostos
sobre o valor acrescentado por impostos comerciais 53. Um elemento fundamental para as taxas de recuperação fiscal
consiste claramente em melhorar a cobrança (e possivelmente incluir a economia informal). As perdas de receitas podem
ser flexíveis se a liberalização do comércio for gradual e acompanhada por reformas das finanças públicas. No entanto, no
44
45
46
47
48
49
50
51
52
53
Jones 2009, pág. 7.
Stevens e Kennan 2005.
O primeiro SPG (Sistema de Preferências Generalizadas) da União Europeia foi criado em 1971. Em Fevereiro de 2001, o Conselho adoptou o Regulamento (CE)
416/2001, o denominado “Regulamento EBA” (“Regulamento tudo menos armas”). O Regulamento EBA, um acordo comercial não recíproco, proporciona aos
50 países, 34 dos quais da África subsariana (incluindo 22 países frágeis), classificados oficialmente como Países Menos Desenvolvidos (PMD) pelas Nações
Unidas, acesso livre de direitos aduaneiros a todos os produtos da UE, com excepção de armas e munições e 41 posições pautais relativas a arroz e açúcar,
para as quais estão estabelecidas quotas de isenção de direitos aduaneiros até à liberalização total em Setembro de 2009 (arroz) e Outubro de 2009 (açúcar).
Fonte: http://ec.europa.eu/trade/issues/global/gsp/eba/index_en.htm.
As negociações APE tiveram início em Setembro de 2002, com a meta inicial de 31 de Dezembro de 2007 para atingir a conformidade com as regras da OMC.
As negociações prolongaram-se para além do prazo inicial, uma vez que estavam a avançar lentamente. Em consequência, a Comissão Europeia emitiu uma
comunicação em 23 de Outubro de 2007, proporcionando um acesso preferencial provisório ao mercado para os países não PMD a partir de 1 de Janeiro de
2008, a fim de prolongar as negociações com vista a APE completas. Deste modo, foram celebrados diversos acordos provisórios (também denominados “APE
provisórios”) durante o final de 2007 entre a UE e sub-regiões APC e países individuais, os quais continham compromissos de liberalização em matéria
de comércio de mercadorias a fim de cumprir os requisitos de compatibilidade da OMC. Fonte: http://www.acp-eu-trade.org/index.php?loc=epa/
background.php.
No final de 2007, 46 países africanos eram membros de um APE provisório. Ao mesmo tempo, apenas 18 desses países tinham inicialmente um APE provisório;
desses países, oito são países frágeis: Burundi, Camarões, Comores, Costa do Marfim, Quénia, Ruanda, Uganda e Zimbabué (Bilal e Stevens, 2009).
Ver Sindzingre 2008 e Delpeuch e Harb 2007.
Stevens e Kennan 2005 e Delpeuch 2007.
Delpeuch e Harb 2007.
Busse et al. 2004.
Baunsgaard e Keen 2005.
126
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Políticas da UE para enfrentar a fragilidade na África subsariana
que respeita aos Estados frágeis com pouca capacidade ou vontade política limitada, essas reformas poderão ser difíceis
de aplicar a curto e médio prazo. Por conseguinte, é importante dispor de recursos externos afectados explicitamente à
ajuda e facilitação do processo de adaptação desses países.
Mais importante, os APE podem representar oportunidades para os países africanos racionalizarem a sua rede de acordos
regionais de integração e podem ser utilizados como mecanismos externos de compromisso para que os Estados africanos
com um fraco nível de institucionalização procedam às reformas internas necessárias, apoiando-se no contexto institucional
mais sólido da UE. No entanto, têm sido levantadas dúvidas quanto à capacidade dos APE para promover a integração
regional em África e, em particular, se os APE representam alicerces ou obstáculos. Uma das principais dificuldades diz
respeito à grande heterogeneidade dos países da África subsariana no seio dos diferentes grupos de APE. Os países diferem
em termos de estruturas de exportação, classificação (países PMD versus não-PMD), graus de compromisso de liberalização
regional e lista de produtos sensíveis 54. Embora a heterogeneidade dos países não constitua necessariamente um obstáculo
à integração regional e possa, de facto, aumentar os seus benefícios económicos, também gera custos em matéria de
coordenação de políticas e negociação política. Por exemplo, a dificuldade em harmonizar regras entre e nos grupos
regionais pode levar os controlos fronteiriços e as regras de origem relativas à circulação de produtos da UE entre as
regiões a assegurar que a exclusão de um produto num país não é afectada por preferências para o mesmo produto num
país parceiro 55. Assim, é importante ter a mesma oferta de acesso ao mercado e os mesmos produtos excluídos para toda
a região a fim de promover as possibilidades do mercado único.
3.5 POLÍTICAS E MEDIDAS PREVENTIVAS
Os esforços recentes da UE centraram-se na necessidade de enfrentar e responder melhor a situações de crise e pós-crise. Mas a
inexistência de um trabalho eficaz e atempado continua a ser o principal problema. Embora se considere que o diálogo político
no Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento tem uma importante dimensão preventiva, existem indícios que sugerem que
muitas vezes não é utilizado para esse fim56.
Além da vontade política, a UE enfrenta várias restrições de natureza institucional e operacional, incluindo as limitações de
instrumentos comunitários, os processos de organização interna e de decisão e a capacidade para uma resposta cabal aos requisitos
de políticas preventivas a montante. A estrutura institucional, que define as funções e as competências de cada órgão da UE, resulta
em diferentes perspectivas e prioridades para os diversos serviços da Comissão e na inexistência de ligação institucional entre a
CE e o Conselho. O Serviço Europeu para a Acção Externa (SEAE) pode oferecer maior margem de manobra para melhorar esta
situação e para uma melhor ligação das políticas comunitárias a curto e médio prazo.
3.6 QUADROS POLÍTICOS CONJUNTOS COM ORGANIZAÇÕES REGIONAIS AFRICANAS
A UE tem investido tempo e recursos significativos no desenvolvimento de parcerias com organizações regionais na África subsariana
e com a União Africana. A forma como essas parcerias e quadros políticos conjuntos moldam as políticas comunitárias para fazer
face à fragilidade é menos evidente. O Acordo de Parceria de Cotonu, o principal instrumento comercial, de ajuda e de diálogo
político para as relações da UE com Estados subsarianos, não possui um artigo específico sobre Estados frágeis ou fragilidade.
Mas abrange medidas relevantes, desde o diálogo político à governação democrática e desde os direitos humanos e comércio à
prevenção de conflitos e à consolidação da paz através de medidas punitivas. Do mesmo modo, a Estratégia Conjunta África-UE,
ratificada pelos Chefes de Estado durante a cimeira de Lisboa em 2007, não continha qualquer referência explícita à fragilidade dos
Estados, uma expressão amplamente rejeitada pelos participantes africanos no período que antecedeu as negociações. No entanto,
a União Africana e os seus Estados-Membros parecem aceitar a importância do combate à fragilidade dos Estados e de ultrapassar
a questão formal, o que pode abrir novas oportunidades de abordagens concertadas para combater a fragilidade.
A UE melhorou o diálogo e a parceria com a União Africana (UA) em matéria de paz e segurança e é um dos principais apoiantes
da Arquitectura Africana de Paz e Segurança, a qual inclui sistemas de mediação e de alerta rápido e missões de manutenção
da paz, fazendo igualmente a ligação entre a UA e os “mecanismos regionais”. A Estratégia Conjunta África-UE e o seu plano de
acção proporcionam oportunidades para abordar problemas de governação relacionados com a fragilidade, direitos humanos,
54
55
56
Stevens et al. 2008.
Brenton et al. 2008.
O diálogo político é igualmente um elemento importante do Acordo de Parceria de Cotonu.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 8
comércio, integração regional e infra-estruturas (caixa 8.9). Na prática, no entanto, teve até agora um impacto limitado a nível
nacional e a sua aplicação foi prejudicada pela forma como deveria ser financiada e por uma discussão sobre o seu verdadeiro
valor acrescentado.
No que respeita às questões potencialmente mais controversas, como a governação democrática e os direitos humanos, foi difícil
encontrar o diálogo genuíno e o respeito pelo ritmo dos processos africanos. A maior parte das organizações regionais não têm
interesse em serem “instrumentalizadas” pela agenda política da UE e consideram o apoio das suas próprias prioridades como
mais importante. No entanto, a qualidade do diálogo em algumas áreas, no âmbito do acordo de Cotonu, melhorou, bem como
o alinhamento da UE com as prioridades de África (como a paz e a segurança). A Estratégia Conjunta África-UE tem ajudado a UE
a alinhar-se com a UA nos “Grupos Internacionais de Contacto” (“International Contact Groups”) sobre as situações de crise que se
vivem na Guiné, Guiné-Bissau, Madagáscar, Mauritânia e Somália. E o esforço da UE para falar a uma só voz com a UA e as suas
Comunidades Económicas Regionais (CER) tem sido um avanço significativo.
Uma perspectiva de “melhoramento da resiliência” reforça as “ligações regionais” e a possibilidade de “agregados regionais
de fragilidade”. Por outro lado, uma visão mais global destas questões destaca os factores externos a nível nacional e regional.
Consistente com esta perspectiva, a Estratégia Conjunta África-UE poderia promover uma nova abordagem abrangente a nível
regional para África. Actualmente, esta estratégia define um amplo quadro de acção para a integração regional em África, em
conjunto com orientações políticas, económicas e sociais. O primeiro Plano de Acção (2008-2010) tem oito Parcerias África-UE
em áreas como paz e segurança, governação democrática, direitos humanos, comércio e integração regional. A maior parte dos
esforços desenvolvidos até ao momento tem sido organizacional, a fim de estabelecer o diálogo, a confiança e a coordenação. Mas
as expectativas quanto a mais compromissos de financiamento e mais eficácia são elevadas.
3.7 A UE ENQUANTO INTERVENIENTE EM MATÉRIA DE SEGURANÇA E DESENVOLVIMENTO
A erradicação da pobreza e o reforço da segurança são questões que coexistem. Esta coexistência não é nova: desde a doutrina
de Truman e o Plano Marshall, a questão da segurança esteve sempre presente nas políticas de desenvolvimento de diferentes
modos e em diferentes graus.
A interacção entre segurança e desenvolvimento é amplamente reconhecida e integra os principais objectivos das políticas
internacionais da UE: contribuir para a paz e a estabilidade e promover a democracia, os direitos humanos, o Estado de Direito e
o multilaterismo efectivo. As vias para objectivos coerentes, planos operacionais e programas comunitários, e em última análise,
medidas significativas, permanecem um desafio. Tal como descrito anteriormente, a UE tem elaborado um grande leque de políticas,
instrumentos e iniciativas para fazer face às questões de segurança e desenvolvimento, nomeadamente na África subsariana.
Os objectivos, os valores e os calendários dos doadores e dos destinatários são em grande número e frequentemente contraditórios.
Reunir diferentes intervenientes e recursos, agentes da ajuda que trabalham no terreno e soldados, diplomatas e empresários,
embora urgentemente necessário, é um processo difícil e demorado. E a própria UE é um interveniente complexo e, por vezes,
descoordenado.
Confrontada com a fragilidade e a insegurança, sente-se tentada a procurar um “pré-requisito” como, por exemplo, uma nova
medida económica ou uma instituição política diferente57. Sugerimos, pelo contrário, que as sociedades que enfrentam situações
de fragilidade podem começar a mudar no domínio da segurança e desenvolvimento “tal como são e apesar do que são”58.
Com base na grande experiência da capacidade e iniciativas locais e na experiência da UE em conciliar segurança e desenvolvimento
nos países africanos que enfrentam situações de fragilidade, nomeadamente a reforma do sector da segurança e as missões de
gestão de crise59, defendemos que é possível ultrapassar os bem conhecidos e profundamente enraizados obstáculos à mudança
da relação segurança-desenvolvimento60. Destacamos seis processos em situação de fragilidade:
1. SEGURANÇA E DESENVOLVIMENTO: MUDANÇA ANTAGONISTA OU NÃO-ANTAGONISTA?
Os defensores de mudanças políticas que afectam simultaneamente a segurança e o desenvolvimento consideram muitas vezes
as suas propostas de reformas como não-antagonistas: sair de uma situação de fragilidade, tornando a população mais segura e,
ao fazê-lo, libertar energias para o desenvolvimento, só pode ser vantajoso para todos os intervenientes e, em última análise, para
o país. Esta assunção é contudo questionável61. Em primeiro lugar, nas situações de fragilidade, a insegurança e o que resta das
instituições públicas disfuncionais podem ser úteis quer aos governos quer aos rebeldes. Alguns intervenientes chegam mesmo a
57
58
59
60
61
Hirschman 1963, pág. 6; Hirschman 1967, pág. 5.
Hirschman 1963, pág. 6
Brzoska 2006.
Hirschman 1963, pág. 6; Hirschman 1985, págs. 3-34 e 56-76.
Englebert e Tull 2008.
128
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Políticas da UE para enfrentar a fragilidade na África subsariana
criar, manter e explorar a insegurança de forma a assegurar a sua sobrevivência política62. Na Serra Leoa, os governantes destruíram
intencionalmente a capacidade do Estado de modo a apropriarem-se da distribuição de bens públicos63. Em segundo lugar, nas
situações de fragilidade, coexiste frequentemente uma debilidade relativa e um poder relativo. As instituições de Estado na República
Democrática do Congo, por exemplo, foram debilitadas mas não desapareceram todas64. Face às exigências dos países doadores,
as autoridades públicas, que têm pleno conhecimento da situação de fragilidade do seu país e que precisamente devido a este
contexto de fragilidade e à sua posição (relativamente) precária, foram capazes de manter e até reforçar a sua posição negocial e
desenvolver uma estratégia de evasão e resistência. Mesmo quando a soberania parece estar no seu ponto mais baixo, o Estado
que resta é capaz de salvaguardar dos países doadores o que considera ser o essencial da sua autonomia65.
Assim, a insegurança associada à fragilidade não é necessariamente negativa para os agentes locais e não implica fraqueza para
todos os intervenientes. Os agentes locais reagem e tentam contornar as pressões dos países doadores e explorar as suas fraquezas.
É por este motivo que as abordagens técnicas simplificadas têm poucas possibilidades de êxito. A UE deve mudar a sua abordagem
de engenharia social linear para uma abordagem estratégica mais flexível.
2. A INSEGURANÇA COMO UMA OPORTUNIDADE PARA POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO
Os críticos da relação segurança-desenvolvimento apresentam geralmente três preocupações. Em primeiro lugar, a emergência
da segurança numa agenda política já preenchida e com decisores políticos com energias, capacidades e recursos limitados está
destinada a distrair quer os países doadores quer os países em desenvolvimento e a atrasar as medidas relativas ao principal
objectivo, ou seja, a redução da pobreza. Em segundo lugar, a segurança é apenas a ponta do icebergue, um sintoma de disfunções
estruturais mais profundas. Em terceiro lugar, um esforço genuíno para enfrentar os desafios de segurança provavelmente superaria
a capacidade do país doador e do país parceiro. Em contrapartida, sugerimos que a relação entre segurança e desenvolvimento
pode gerar oportunidades para reformas (caixa 8.9).
Primeiro, as populações locais expressam frequentemente uma preocupação maior e imediata com a segurança e a paz. Por exemplo,
os representantes da sociedade civil da região dos Kivus, na República Democrática do Congo, defenderam acertadamente que as
eleições deveriam esperar até a paz ser estabelecida, mas não foram escutados66. Ignorar estes problemas urgentes de segurança
é contraproducente. Segundo, a emergência dos problemas de segurança constitui uma oportunidade para os reformadores
encontrarem novos aliados e para facilitar análises e elaboração de estratégias conjuntas. Terceiro, a insegurança pode chamar a
atenção para problemas sociais, que, se negligenciados, poderiam tornar-se de difícil resolução, bem como ajudar na sua detecção
precoce67. Por último, iniciativas políticas tímidas ou superficiais podem ter o efeito não intencional de mobilizar as pessoas que
beneficiarão da solução proposta, quer nos países doadores quer nos países parceiros.
Caixa 8.9: Desafios de segurança e desenvolvimento em situações de fragilidade:
ensinamentos adquiridos com as operações PESD (Security and development challenges
in fragile situations: lessons from ESDP operations)
por Dr Damien Helly, Research Fellow, Instituto Europeu de Estudos de Segurança
A Política Europeia de Segurança e Defesa (PESD) foi criada há 10 anos nos Balcãs. Desde essa data, a União Europeia utilizou esta
política como instrumento único para a gestão de crises militares ou civis em várias situações de fragilidade. Das 23 operações
PESD, 8 foram destacadas para África e algumas ainda estão em curso. Todas as operações PESD no continente africano devem fazer
face a alguma forma de fragilidade. Um livro recente editado por investigadores do Instituto de Estudos de Segurança da União
Europeia fornece dados abrangentes e uma avaliação crítica da PESD 10 anos depois68. Algumas das suas conclusões, baseadas
essencialmente em entrevistas no terreno, podem ser utilizadas nos debates sobre segurança e desenvolvimento, situações de
fragilidade e a necessidade de uma maior coerência entre os instrumentos e as políticas da UE.
• Ao longo de 10 anos a UE melhorou a coordenação da PESD com as políticas da Comissão Europeia em contextos de fragilidade.
Desde 1999, as interligações entre os desafios de segurança e de desenvolvimento tornaram-se o fio condutor de todos os
62
63
64
65
66
67
68
Clapham 1996, págs. 208–243; Chabal e Daloz 1999, págs. 3–16.
Reno 2003.
Englebert 2003; Trefon 2004, 2007.
Por exemplo, na República Democrática do Congo, dois importantes serviços de segurança – serviços de guarda fronteiriça e de informações militares e
civis – foram mantidos afastados da reforma do sector da segurança (Melmot 2008; Davis 2009).
Autesserre 2009, pág. 271.
Hirschman 1981, págs. 119, 149.
Grevi et al. forthcoming.
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
O
129
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 8
• discursos políticos. Questões como a segurança básica necessária para a redução da pobreza, a criação de emprego e o
desenvolvimento das empresas foram bem documentadas em importantes documentos políticos europeus, reforçando os
conhecimentos em matéria de planeamento político. Por exemplo, os serviços centrais de Bruxelas planearam acções conjuntas
no Chade em 2008 que visavam um reforço mútuo. O Programme d’Accompagnement à la Stabilisation, financiado pela
Comissão Europeia, destinava-se a complementar a dissuasão militar, embora a sua coordenação se tenha revelado difícil e
lenta na prática.
• Apesar dos progressos a nível estratégico, os peritos em segurança, os promotores de desenvolvimento, os economistas e os
responsáveis pela ajuda humanitária ainda precisam de intensificar o diálogo sobre as situações de fragilidade. A concorrência
em matéria de recursos para financiar a segurança e o desenvolvimento pode ser elevada. Os gestores dos programas de
ajuda à cooperação e os peritos em segurança dificilmente partilham informações sobre o potencial impacto, em termos de
segurança, de um projecto de infra-estruturas de transporte. E embora alguns peritos trabalhem em conjunto, por exemplo,
militares e responsáveis pela ajuda humanitária, a experiência adquirida durante as operações de gestão de crise necessita
de ser mais eficazmente divulgada. Por exemplo, a missão EUFOR Chade/RCA disponibilizou conhecimentos às comunidades
militar e humanitária, mas não ficou claro como comunicarão com outros intervenientes.
• Em situações de fragilidade, as avaliações qualitativas são tão relevantes quanto os dados quantitativos. Enquanto os economistas
trabalham principalmente com dados materiais, os cientistas políticos e os analistas de informações utilizam igualmente
abordagens qualitativas. No caso das forças policiais ou militares na República Democrática do Congo, é fundamental um
conhecimento sólido dos políticos locais e dos jogos de poder para criar mecanismos de recolha de dados como, por exemplo,
as bases de dados de censos. A EUSEC, uma missão responsável por ajudar as autoridades congolesas na reforma do exército,
passou os seus primeiros anos a criar confiança mútua com as partes interessadas nacionais através de laços fortes pessoais,
informações com origens em pessoas e conhecimentos militares. Inversamente, na Guiné-Bissau, onde o pequeno número de
soldados (menos de 6000) sugere que a reforma do exército poderia ser fácil, a governação e os factores de poder, tais como
o poder simbólico dos veteranos, a intimidação e o tráfico ilícito revelaram-se graves obstáculos. As realidades humanas, por
vezes, contrariam os dados.
• As iniciativas europeias em matéria de segurança e defesa dependem amplamente da agenda e da vontade política das
autoridades locais. Quando as autoridades locais estão relutantes em acolher as operações PESD ou os estrangeiros que
supostamente deveriam ajudar a reformar o seu aparelho militar, frequentemente por motivos políticos ou devido a interesses
estabelecidos, torna-se extremamente difícil para os europeus maximizar o seu impacto. Esta realidade tornou-se óbvia na
República Democrática do Congo quando, depois das eleições de 2006, o governo mostrou menos interesse na reforma do
sector da segurança. Também se assistiu a este fenómeno na Guiné-Bissau, onde a missão da UE responsável pela reforma do
sector da segurança considerou muito difícil encetar o diálogo com o último Chefe do Estado-Maior do Exército, Tagmé Na
Wai. E o mesmo se passou no Sudão, quando os líderes não quiseram acolher uma operação de manutenção da paz da UA/
ONU e atrasaram os processos de vistos do pessoal da UE em missão de apoio ao planeamento e da cadeia de comando da
força de manutenção da paz da União Africana no Darfur.
• Depois de 10 anos, o pessoal da PESD aprendeu sobre as dificuldades de aplicação da apropriação local, especialmente em
países frágeis onde as capacidades do Estado estão próximas do zero e onde os responsáveis locais não têm capacidade para
absorver ou responder às ajudas e intervenções da UE. Os mandatos breves e a elevada rotação das operações PESD raramente
corresponderam às necessidades dos seus parceiros em matéria de reforço da capacidade a longo prazo.
• A UE sofre de um défice de execução na aplicação das suas políticas em contextos de fragilidade. Apesar da impressionante
panóplia de estratégias, comunicações e documentos de programação para fazer face à fragilidade, evitar conflitos e apoiar
a consolidação da paz, a UE ainda tem um longo caminho a percorrer para colocar em prática essas orientações políticas. O
pessoal da UE ignora frequentemente os principais documentos políticos que orientam o seu trabalho quotidiano e decisões
em situações de fragilidade. Embora dotada de instrumentos adequados, como a LRRD (Interligação entre ajuda de emergência,
reabilitação e desenvolvimento), a UE não os utiliza de forma sistemática nos países. A formação para o pessoal que trabalha
em contextos de fragilidade deveria ser transversal e aplicada de forma sistemática.
• Na abordagem de situações de fragilidade, a UE tem de identificar as prioridades da sua política externa. Embora o fracasso
dos Estados seja designado como uma ameaça na Estratégia Europeia de Segurança de 2003, os interesses estratégicos da
África subsariana continuam pouco claros. Alguns Estados europeus, a maior parte antigas potências coloniais, revelam
preocupações em relação aos países frágeis de África porque estes representam ameaças importantes como terrorismo e
droga, armas e tráfico de seres humanos. Mas estas preocupações podem não ser partilhadas de forma igual por todos os
Estados-Membros da UE, o que conduz a uma ausência de prioridades políticas externas claras em África, além das que foram
definidas por parcerias continente a continente ou pelo Acordo de Parceria de Cotonu. É necessária mais investigação neste
aspecto, a qual será realizada pelo Instituto de Estudos de Segurança da União Europeia (IESUE) em 2010.
130
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Políticas da UE para enfrentar a fragilidade na África subsariana
• Os responsáveis dos países frágeis culpam muitas vezes a UE pelas suas políticas contraditórias. O proteccionismo
comercial, em especial, é citado regularmente como prejudicial ao desenvolvimento. Apesar dos novos mecanismos
de compensação, como, por exemplo, o Programa de Ajuda para o Comércio, o diálogo político ainda é marcado pela
desconfiança. Responder a situações de fragilidade implica esforços para um diálogo genuíno, bem como vontade de
superar preconceitos antigos e o reconhecimento das responsabilidades mútuas.
3. A FRAGILIDADE CONDUZ A UM AUMENTO DAS INSTITUIÇÕES DE SEGURANÇA LOCAIS PARALELAS.
A deterioração da capacidade do Estado em situações de fragilidade não implica uma ausência de governação. De facto, as situações
de fragilidade podem ter dado origem a “iniciativas institucionais locais que facilitaram a sobrevivência e a organização da vida
social durante os anos de conflito e que podem vir a ser úteis no futuro69”. Os chefes tradicionais, grupos da sociedade civil, igrejas
e agências de ajuda intervêm para se responsabilizarem pela segurança70. As situações de fragilidade podem acentuar o acesso
desigual à segurança e à justiça e aumentar a intolerância para com estrangeiros, a violência, a ilegalidade e a falta de mecanismos
de responsabilização. Mas, em alguns casos, uma soberania e um policiamento de Estado débeis revigoraram o autopoliciamento71.
O “multichoice policing” (“policiamento múltipla escolha”) resultante fornece uma rede de segurança e aprofunda a democracia
local. O êxito deste policiamento alternativo pode contribuir para respostas favoráveis do Estado e apoio da UE.
4. SEQUÊNCIAS E DESEQUILÍBRIOS PODEM CONTRIBUIR PARA A REFORMA EM MATÉRIA DE SEGURANÇADESENVOLVIMENTO
Para abordar a relação segurança-desenvolvimento nas situações de fragilidade, as estratégias “articuladas” que combinem
simultaneamente todas as ferramentas políticas num pacote coerente que inclua instrumentos políticos, de segurança, humanitários
e de desenvolvimento são frequentemente consideradas bem adaptadas à descontinuidade do contexto72. Mas, embora alguma
coordenação seja valiosa, especialmente na UE, pode não ser necessário despender esforços consideráveis na integração precoce
e numa abordagem simultânea ou equilibrada à relação segurança-desenvolvimento. Oscilações nos progressos e ajustamentos
das políticas de segurança e desenvolvimento são inevitáveis em contextos de fragilidade. Esses ajustamentos e oscilações são
desejáveis, uma vez que os decisores-políticos tomaram consciência das imperfeições e dos desequilíbrios das suas medidas através
de fracassos, irritações e desconfortos73. Por exemplo, na Serra Leoa não existiam ligações conceptuais ou substanciais entre os
elementos da reforma do sector da segurança, que prosseguiram de forma independente74, mas a Serra Leoa é frequentemente
apresentada como um exemplo de boas práticas, mesmo pela OCDE-CAD.
A resolução de problemas sequenciais corre o risco de ficar bloqueada numa determinada fase ou em determinado domínio.
Todavia, dada a convicção geral sobre a necessidade de coordenação, é útil lembrar que a duplicação, a confusão e a ausência
de comunicação entre as pessoas que trabalham de acordo com linhas de acção paralelas nem sempre são más e podem mesmo
conduzir a reformas mais rápidas e menos onerosas75.
5. SEGURANÇA E DESENVOLVIMENTO NÃO PROGRIDEM NECESSARIAMENTE EM CONJUNTO
É importante saber se assegurar a segurança pode conduzir a um desenvolvimento humano sustentável. A esse respeito, uma
avaliação conduzida pela ONU relativa a 17 operações de construção do Estado cinco anos após o seu início revelou que, embora
exista uma ligação potencial entre segurança (definida como ausência de guerra e o restabelecimento de um domínio total sobre
os meios de violência) e outras dimensões da construção do Estado, tais como o desenvolvimento económico, a democracia e a
criação de capacidade institucional, a segurança não conduz automaticamente a efeitos positivos para o Estado de Direito ou para
a eficácia da governação, o desenvolvimento económico e a democracia76.
69
70
71
72
73
74
75
76
Englebert e Tull 2008, págs. 125, 127.
Vlassenroot 2008, pág. 2.
Baker2008.
Faria e Magalhães Ferreira 2007.
Hirschman 1985, págs. 74-75.
Horn et al. 2006, págs. 110, 118.
Hirschman 1981, pág. 66.
As missões de construção de Estados atingiram objectivos de segurança importantes: 13 das 17 missões acabaram com guerras (1000 mortes anuais resultantes
de batalhas por ano ou durante a guerra). Embora fosse mais difícil acabar com a guerra nos países mais pobres em situação de pós-guerra, as operações
de construção de Estados conseguiram atingir os seus objectivos também neste contexto (7 em 11 casos). As missões de construção de Estados tiveram
menos sucesso no restabelecimento de um monopólio total sobre os meios de violência (9 em 17 casos). Mas este sucesso no domínio da segurança tem
implicações limitadas para outras dimensões da construção de Estado (Zürcher 2006).
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 8
A relação entre a segurança e os progressos de desenvolvimento pode assumir formas diferentes e o padrão não é sempre uma
inter-relação entre dois domínios políticos. Proclamar que os dois domínios são completamente independentes seria uma reacção
exagerada. Embora segurança e desenvolvimento nem sempre possam estar ligados de uma forma funcional, é possível alternar
entre interdependência e autonomia em alturas diferentes e contextos diferentes77.
6. MENOS PODE SER MAIS
A UE orgulha-se do seu envolvimento contínuo e da relativa estabilidade das suas intervenções em matéria de construção dos
Estados e, de uma forma mais geral, do desenvolvimento. No entanto, adquirir flexibilidade nesta questão e permitir períodos de
desintervenção selectiva poderia alargar o âmbito das iniciativas. A assunção de que “mais construção do Estado é melhor construção
do Estado” está generalizada entre os decisores políticos ocidentais78, que afectam mais recursos a países frágeis considerados
importantes, tais como o Afeganistão, Bósnia, Iraque e Kosovo, do que a países considerados periféricos. De uma perspectiva de
segurança, isto implica que missões militares da UE e das Nações Unidas mais fortes, dotadas de mais meios militares e mandatos
mais sólidos, poderiam ser mais bem sucedidas.
A experiência das políticas de desenvolvimento, em especial no domínio da segurança e desenvolvimento, mostra que alguma
separação e desintervenção podem ter efeitos positivos79. Uma intervenção menor ou mais limitada e selectiva pode contribuir para
a experimentação social e favorecer o crescimento de iniciativas locais. A definição da República Democrática do Congo como um
caso-piloto para a manutenção da paz pela ONU, implicando, por exemplo, o envolvimento de uma intervenção intensa, muitas
vezes retratada como “protectorado”, conduziu a escolhas políticas problemáticas durante a transição de uma situação de guerra
para uma situação de paz e democracia em 2003-200680.
77
78
79
80
Hirschman 1981, págs. 142-166; Hirschman 1995, págs. 221-230.
Englebert e Tull 2008, págs. 135-139.
Hirschman 1995, págs. 190-192.
Autesserre 2009, pág. 258.
132
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
CAPÍTULO 9
CONCLUSÕES  PRIORIDADES E MEDIDAS
A União Europeia dispõe de um grande leque de instrumentos políticos para fazer face aos desafios
colocados pelos Estados frágeis e tem procedido regularmente à sua revisão e aperfeiçoamento ao longo
da última década. No entanto, o compromisso da UE para com os Estados frágeis ainda sofre de um “défice
de execução”, que gera uma clivagem entre os compromissos oficiais e a operacionalização das suas
políticas1.
1. AS POLÍTICAS DA UE PODEM TER IMPACTO
A UE tem o potencial de influenciar as perspectivas de desenvolvimento dos Estados frágeis da África
subsariana e, em especial, ajudá-los a aumentar a sua resiliência aos choques. Para o efeito, contudo,
necessita de criar um clima de confiança e aprender com as experiências adquiridas, bem como basearse nessas experiências. A UE não está sozinha nesta difícil tarefa, a qual exige uma acção cooperativa de
todos os agentes que intervêm nos países frágeis.
A UE pode melhorar a eficácia das suas intervenções, agindo decisivamente e definindo políticas a uma só voz. Os debates entre
os Estados-Membros da UE e no seio da CE devem ser abertos e abrangentes, mais ainda quando o seu compromisso em relação
à fragilidade é uma questão de grande sensibilidade política. Mas uma vez definida e acordada uma política conjunta, a UE deve
comprometer-se com políticas a longo prazo e não mudar os seus objectivos ou principais áreas de intervenção. Os problemas
dos Estados frágeis são principalmente estruturais e persistentes e abordá-los exige um compromisso estável e a longo prazo
dos agentes externos. Concentrar os esforços num número reduzido e bem definido de prioridades, facilitaria a simplificação
dos procedimentos e reduziria a burocracia. E a UE deve tornar o seu compromisso para com os Estados frágeis credível, as suas
políticas facilmente compreendidas e o seu impacto significativo. Deve igualmente adaptar políticas gerais para abordar questões
específicas e ajustá-las ao contexto individual.
Quando os países são considerados não elegíveis para apoio orçamental2 ou quando o conhecimento do contexto local é
especialmente importante, os doadores e os destinatários podem não estar em posição de aplicar ou acompanhar as políticas
de ajuda. Estas tarefas podem ser delegadas noutros parceiros oficiais, organizações da sociedade civil, agências de serviços
independentes (ver caixa 9.5). A delegação de tarefas pode ajudar a abordar os complexos problemas locais e assegurar um
compromisso adequado. Nas situações em que a ajuda não é utilizada de forma eficaz ou os doadores canalizam a maior parte
da sua ajuda para instituições informais ou ONG, pode valer a pena separar as diferentes funções dos governos: elaboração de
políticas de afectação ou acompanhamento de fundos. Separar a tarefa de definir os objectivos da política de desenvolvimento
a longo prazo da aplicação de medidas políticas, torná-la-á independente de pressões políticas imediatas, evitará problemas
de compromisso e desenvolverá capacidades técnicas adequadas. A base para esta divisão já existe, embora sejam necessárias
mudanças na governação para aplicar de forma eficaz políticas de longo prazo3.
1.1 VANTAGENS COMPARATIVAS DA UE
A UE tem uma vantagem comparativa na elaboração de estratégias para ajudar os países frágeis a aumentar a sua resiliência. A fim
de a explorar, deve concentrar os seus esforços no desenvolvimento de capital humano e social e no apoio ao desenvolvimento
institucional a nível local e regional. A vantagem comparativa assenta na própria história comunitária do alargamento, bem como
no amplo conjunto de políticas de que a UE dispõe para moldar a sua acção. Tal como explicado no capítulo 8, ao contrário das
acções da maior parte das agências de ajuda4, as políticas da UE podem conjugar qualquer um dos seguintes domínios: comércio,
agricultura, pescas, migração, alterações climáticas, ambiente, dimensão social da globalização, investigação e desenvolvimento,
sociedade da informação, energia, segurança e governação. O impacto destas políticas, positivo ou negativo, na fragilidade dos
Estados, é mais abrangente do que as disposições de ajuda financeira.
A história da UE, além disso, é uma história de desenvolvimento institucional em sociedades diversas e complexas, com as suas
próprias instituições internas. E a UE adquiriu uma grande experiência na abordagem dos problemas de Estados com instituições
disfuncionais ou em transição durante a sua própria história de alargamento. Alguns Estados-Membros actuais da UE (Grécia,
1
2
3
4
O capítulo 8 aborda em pormenor as áreas em que é mais necessário intervir com vista a tornar o compromisso da UE mais eficaz.
Ver OCDE (2009) para uma discussão das condições sob as quais o apoio orçamental representa uma modalidade de ajuda adequada nos Estados frágeis.
Collier 2009b.
Ver o documento de referência de Collier (2009a) incluído no Volume 1B sobre esta questão.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 9
Portugal e Espanha) foram capazes de transitar pacificamente de ditaduras militares para democracias durante a década de 1970.
Ao longo da década de 1990, a UE ajudou igualmente os países do Leste Europeu durante a sua transição económica, o que exigiu
importantes reformas institucionais, mudanças de sistemas de governação e mecanismos estatais de execução. Estas experiências
constituem uma vantagem comparativa, uma vez que a UE pode utilizar a experiência adquirida como uma “ferramenta” em
situações de fragilidade.
As agências de ajuda e as instituições internacionais centram frequentemente a sua acção em medidas correctivas de curto prazo
ou, devido às suas obrigações institucionais, num problema específico5. Os Estados Unidos dispõem de uma grande variedade
de políticas idênticas às da UE mas têm uma história diferente e, apesar de um interesse renovado pela África subsariana, estão
geograficamente distantes6. A China (e os Estados Árabes) tende a concentrar a sua intervenção na construção de infra-estruturas e
no investimento directo estrangeiro em terrenos, o que pode constituir uma bênção ou uma maldição para os países destinatários.
Embora a UE possa também estar envolvida na construção de infra-estruturas, deve concentrar os seus esforços no desenvolvimento
do capital humano e social e das instituições, que constituem áreas onde a UE tem uma vantagem comparativa.
1.2 A NECESSIDADE DA INTERVENÇÃO DA UE EM CONTEXTOS GLOBAIS DESFAVORÁVEIS
Mobilizar recursos internos e reforçar as instituições do Estado e a coesão social são as medidas essenciais para aumentar a resiliência.
Ambas as medidas, quase por definição, são difíceis para os Estados frágeis isoladamente. Assim, embora a intervenção da UE seja
necessária, enfrentar a fragilidade da África subsariana constitui um desafio importante e arriscado.
A inacção tem também elevados custos para doadores e destinatários. Para os países frágeis, os custos são reflectidos no fraco
desenvolvimento humano e na ausência de segurança relacionada com as lacunas de desenvolvimento persistentes. Para a Europa,
geograficamente próxima de África e dos seus problemas de demografia explosiva, refugiados, tráfico ilícito, contrabando, violência
com base no género e pirataria, os efeitos negativos podem ser consideráveis
O desafio é enorme, uma vez que a UE necessita de intervir nos países frágeis e respeitar a sua soberania nacional. Os Estados
frágeis raramente são responsáveis perante os seus cidadãos, mas devem ter a oportunidade de assumir a apropriação das suas
políticas. Enquanto a baixa capacidade de aplicação da legislação condiciona a tributação, a incapacidade para gerir efectivamente
os recursos internos prejudica a independência e a capacidade de governação.
A crise económica e financeira de 2009 tornou as intervenções nos países frágeis ainda mais difíceis. Os Estados frágeis têm sido
fortemente atingidos por uma crise que não provocaram e este facto provavelmente força mais países para situações de fragilidade,
tornando ainda mais difícil a consecução dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio até 2015. A crise tem tido um forte impacto
negativo no rendimento per capita e seguiu-se a uma ou duas crises devastadoras para os países frágeis: alimentos e combustíveis.
A quase simultaneidade das três crises teve um efeito multiplicador negativo, tornando as situações de emergência a regra e não a
excepção. Os países em situações de fragilidade, que tentam responder ao que acreditam serem choques de curto prazo, perderam
a perspectiva de longo prazo necessária para ultrapassar a fragilidade.
O contexto económico também é afectado pela histórica dívida pública e por graves problemas sociais internos que afectam
os países da UE. A crise torna o compromisso em matéria de políticas a longo prazo ainda mais importante, em conjunto com
uma utilização mais eficaz da ajuda ao desenvolvimento. Políticas ad hoc de curto prazo, execução e controlo deficientes e
fragmentação e duplicação de ajuda têm sido as causas da ineficiência. Necessitam de ser substituídas pelas regras simples
mencionadas anteriormente: a União Europeia deve assumir uma posição coerente, centrar-se em políticas de longo prazo e
delegar em parceiros, se possível.
1.3 UM PAPEL PARA OS AGENTES NÃO ESTATAIS EM PAÍSES FRÁGEIS
Os Estados têm sido o principal ponto de entrada para os países doadores, que encaram as intervenções através das instituições
de Estado como um meio para aumentar a responsabilização, resolver as desigualdades de género, criar confiança, estabelecer
um quadro jurídico comum e garantir o Estado de Direito.
Mas as instituições de Estado actuais são influenciadas pelas origens históricas da formação dos Estados e das suas interacções
com as características geográficas e grupos étnicos ou religiosos. Além disso, os governos da África subsariana tendem a declarar
que não são responsáveis pela sua situação de fragilidade, atribuindo a culpa a causas “externas”.
Assim, a construção do Estado e a coesão social exigem a mobilização de agentes não estatais, por vezes fora das estruturas dos
Estados frágeis, com conhecimentos do contexto local e recursos humanos valiosos.
5
6
Por exemplo, ver World Food Price (Preços Mundiais dos Alimentos) sobre a questão das emergências alimentares.
Gartner 2009.
134
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Conclusões – prioridades e medidas
2. PRIORIDADES E MEDIDAS
A UE deve ter em conta as características comuns e as características específicas dos Estados frágeis da
África subsariana (ver capítulo 2) e as suas próprias vantagens comparativas face a outros países doadores
e instituições internacionais (ver debate supra e capítulo 8) ao definir as suas próprias prioridades.
Embora os países frágeis da África subsariana difiram entre si de muitas formas, partilham algumas fraquezas comuns que prejudicam
a criação de um Estado forte capaz de desempenhar as suas funções essenciais. Esses factores prejudiciais são caracterizados do
seguinte modo:
• incapacidade de mobilização de recursos internos e a consequente forte dependência de fontes externas de financiamento;
• sistema económico baseado num pequeno número (em muitos países, apenas um) de produtos primários, o que determina
um padrão de crescimento instável e uma forte concentração das receitas das exportações;
• estado debilitado das suas infra-estruturas flexíveis e pesadas, o que exclui os países dos benefícios da globalização, prejudicando
o seu acesso aos principais mercados de destino;
• baixo desenvolvimento humano, o que afecta a capacidade de aproveitar as oportunidades que surgem;
• elevada exposição ao risco de eclosão de conflitos armados.
Estas características condicionam a consecução do objectivo fundamental do compromisso externo em países frágeis, contribuindo
nomeadamente para o processo endógeno de construção do Estado7. A UE aprovou esta prioridade essencial na sua declaração
Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento8, pelo que os compromissos com os países frágeis da África subsariana devem centrarse neste objectivo a longo prazo. Essas cinco características comuns sugerem cinco prioridades principais para os compromissos
da UE com países frágeis:
Prioridade 1: Identificar e apoiar as forças e os intervenientes que promovem a construção do Estado e a coesão
social. A complexidade da ajuda europeia para a construção do Estado deve-se ao facto de não poder ser inspirada por uma
perspectiva externa deste processo. O processo de construção do Estado nos países frágeis africanos não se assemelha ao processo
de construção dos Estados na Europa durante o século XIX9. Do mesmo modo, a coesão social não será igual entre etnias e religiões
cujas diferenças recuam centenas de anos no tempo. O conhecimento do contexto local é, assim, essencial para o compromisso
externo nos países frágeis. É necessário identificar os agentes que podem ser os impulsionadores da mudança e ajudar estes países
a saírem das situações de fragilidade, possivelmente através de percursos diferentes. Embora os “agentes de mudança” devam ser
reforçados, nomeadamente com incentivos à participação das mulheres na construção do Estado, é também importante, para o
êxito da estratégia de promoção da democracia, enfraquecer a posição dos sectores mais refractários10 e apoiar os líderes nos seus
esforços para reconstruir uma nova confiança social entre o Estado e os cidadãos e entre as diferentes facções e etnias que correm
o risco de se envolverem em conflito. Se determinados grupos são discriminados e excluídos da representação política, o risco de
conflito é elevado e a saída da situação de fragilidade mais difícil.
Embora exista alguma capacidade organizacional nos Estados frágeis11, esta deve ser redireccionada para outros objectivos
comuns, como a mobilização dos recursos internos e a melhor governação das receitas desses recursos. Os grupos de elite podem
desempenhar um papel importante, mas, em alguns Estados frágeis, as facções religiosas ou étnicas podem ter pouco incentivo
para o reforço da capacidade eficaz do Estado ou mesmo ter interesse em a comprometer. Por este motivo, não estão motivados
para chegarem a um consenso. A falta de coesão social enfraquece a exigência de uma boa governação a nível local.
Prioridade 2: Encurtar a distância entre necessidades a curto prazo e políticas e resiliência a longo prazo. Para
mudar a atenção dos Estados frágeis da resposta às necessidades urgentes de curto prazo para o planeamento do futuro, a UE
pode criar mecanismos de segurança para reduzir o risco de volatilidade nas receitas das exportações. Com uma base de receitas
mais estável (caixa 9.1), os Estados frágeis podem elaborar políticas nacionais a longo prazo. Na verdade, tendo em conta a baixa
resiliência dos países frágeis a choques externos e, em especial, a flutuações dos preços dos produtos de base e das condições
comerciais, deve ser tido em conta o potencial de desenvolvimento da ajuda dos países doadores para reforçar os mecanismos de
segurança e de prevenção de riscos, bem como a possibilidade de utilizar os fluxos de ajuda para ‘atenuar os choques internacionais’,
como observaram recentemente Bourguignon et al. (2008).
7
8
9
10
11
Ver OCDE-CAD 2007.
Parlamento Europeu, Conselho, Comissão 2006.
As eleições são normalmente consideradas essenciais para a construção do Estado. Mas as eleições podem ser manipuladas, a menos que as pessoas partilhem
a crença de que expressam a vontade colectiva do país.
Ver Magen e Morlino 2008, págs. 256-257.
Por exemplo, alguns países são capazes de organizar o exército e outros conseguem colocar o sistema educativo a funcionar adequadamente; outros possuem
sistemas de transferência de dinheiro eficazes.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 9
Caixa 9.1: Uma proposta para a estabilização das receitas
A fim de ajudar os Estados frágeis a alargar o horizonte temporal das suas políticas, frequentemente condicionados por situações
de emergência, a UE pode comprometer-se antecipadamente a redireccionar os fluxos de ajuda para países cujos preços das
exportações se situem abaixo do preço limiar de desencadeamento. Os Estados frágeis poderão então adoptar prioridades a
longo prazo, sabendo que as suas receitas nunca serão inferiores a um determinado nível.
A execução pode ser preocupante. O compromisso credível é o primeiro passo. O cabaz de produtos e o preço de intervenção
devem ser decididos antecipadamente a fim de evitar interferências com as opções em matéria de exportação e produção nacional.
E o mecanismo de estabilização deve ser claramente temporário. Os países podem ser recompensados pela afectação de fundos
a políticas de longo prazo, por exemplo, na educação e na saúde.
A CE pode ter uma vantagem comparativa em relação aos restantes doadores no apoio a esse mecanismo. Não é provável que os
países isolados afectem uma percentagem considerável dos seus desembolsos de ajuda a um mecanismo automático, embora a
CE, que medeia os interesses dos Estados-Membros, possa assumir esse compromisso de forma mais credível. O acompanhamento
dos fundos pode ser atribuído às organizações locais da sociedade civil (novamente com antecedência para evitar problemas
de credibilidade).
Prioridade 3: Reforço do capital humano e social. O investimento na educação nos Estados frágeis, tentando superar as
disparidades entre homens e mulheres, e o reforço do capital social são essenciais para conseguir um crescimento e desenvolvimento
sustentáveis. Os países frágeis sofrem perturbações no ensino público que reduzem as taxas de inscrição e aumentam as taxas de
iliteracia entre os adultos. É necessário um financiamento adequado não apenas do ensino básico, mas também do ensino superior.
Em 1970, cerca de 30% da população adulta da África subsariana sabia ler e escrever. Em 1990, essa percentagem era de 51% e, em
2006, 63% (mas apenas 59% nos Estados frágeis). O défice de literacia deve ser eliminado o mais rapidamente possível. Com taxas de
literacia mais elevadas, os países frágeis podem melhorar substancialmente o seu índice de desenvolvimento humano e promover
o crescimento económico. A educação das mulheres é particularmente importante, uma vez que afecta as taxas de fertilidade, a
saúde e o bem-estar dos membros das famílias, em especial as crianças12. Centrar as intervenções nas crianças e jovens do sexo
masculino pode também ser essencial, especialmente nos países frágeis em situação de pós-conflito, para reduzir a atracção de
actividades ilegais como o tráfico e o contrabando. Perante este cenário, a educação poderá não ser a única solução para os jovens
do sexo masculino, pelo que devem também ser adoptadas (a custo zero) medidas com vista a reduzir a regulamentação excessiva
e assegurar um ambiente empresarial adequado com poucas barreiras económicas ou burocráticas. Esta política seria essencial
para a criação de emprego e, consequentemente, trazer esperança e um futuro para as gerações mais jovens, convencendo-as de
que ser rebelde não é a única forma de ter um rumo.
Os Estados-Membros da UE poderiam abrir as suas fronteiras a estudantes oriundos de países frágeis, sabendo que a educação no
estrangeiro contribui para o desenvolvimento institucional nos países de origem (caixa 9.2)13. A UE poderia igualmente ajudar através
da criação de universidades e centros de investigação locais e de incentivos de estímulo à inovação em áreas como a utilização
eficiente da água em condições climáticas desfavoráveis e o tratamento de problemas de saúde como a SIDA e a malária.
Caixa 9.2: Políticas da UE e desenvolvimento de capital humano em África
(EU policies and African human capital development)
Por Yaw Nyarko, Universidade de Nova Iorque
O capital humano é uma componente importante do desenvolvimento económico. Na África subsariana, os níveis de capital
humano permanecem baixos, apesar do forte investimento dos governos na educação. Promover o desenvolvimento do capital
humano na África subsariana, uma das melhores formas de melhorar os padrões de vida e o desenvolvimento económico, é uma
área onde a União Europeia pode desempenhar um papel eficaz e distintivo.
12
13
De acordo com diversos testemunhos (ver Gartner 2009), as crianças cujas mães frequentaram cinco anos de ensino primário têm mais 40% de probabilidades
de atingirem os cinco anos de idade. Deste modo, dada a elevada taxa de mortalidade em crianças menores de cinco anos nos países frágeis, salientada nos
capítulos 1 e 2, o impacto desse investimento pode ser significativo.
Ver, por exemplo, Spilimbergo 2009.
136
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Conclusões – prioridades e medidas
Diversos estudos demonstraram as ligações entre capital humano e desenvolvimento económico (ver Spiegel e Benhabib, 2005, e
as referências citadas neste documento). São necessários trabalhadores qualificados para facilitar a adopção das novas tecnologias,
introduzir actividades empreendedoras, administrar os sistemas de cuidados de saúde e planear as economias nacionais. Apesar
das elevadas percentagens dos orçamentos de Estado gastas na educação, os índices de sucesso escolar permanecem baixos
em muitos países africanos. Em 2000, o último ano em que existem dados internacionais relativamente completos, o número de
ganeses com educação superior, num país com mais de 20 milhões de pessoas 14, era de cerca de 81 000. Para contextualizar este
número, a Universidade de Nova Iorque (onde eu ensino e é uma entre muitas no estado de Nova Iorque) tem cerca de metade
daquele número em inscrições. Muitos outros países africanos têm números igualmente baixos de cidadãos com educação
superior: o Quénia tem 124 000, o Uganda tem 63 000. E em muitos países africanos a percentagem da faixa etária relevante
com educação superior situa-se entre 3% e 5%, muito abaixo dos padrões internacionais (cerca de 70% na República da Coreia,
Singapura e outros países).
Os números relativos aos médicos são igualmente decepcionantes. Em 2004, no Gana, os dados registam 1860 médicos, número
praticamente igual ao das inscrições na faculdade de medicina da Universidade de Nova Iorque. Este número implica um rácio
doente-médico de 11 200 para 1. O Malávi registou 124 médicos em 2004, para um alarmante rácio doente-médico de 88 000
para 1. Os rácios doente-médico no Ocidente são de cerca de 227 para 1 em Itália e 476 para 1 no Reino Unido.
Os países da África subsariana realizaram progressos significativos em matéria de capital humano desde a independência, no início
da década de 1960, mas ainda há muito a fazer. Assim que o tema da acumulação de competências em África é mencionado, o
debate desvia-se invariavelmente para a fuga de cérebros, utilizada como argumento para restringir a ajuda externa ao ensino
superior em África, e para o fluxo de saída de pessoal qualificado para o Ocidente. Esta posição é errada. Existem subtilezas na
medição da fuga de cérebros e no regresso dessas pessoas qualificadas. Esta é uma área em que a União Europeia poderia assumir
um papel de liderança de uma forma que poderia beneficiar significativamente a África subsariana, mas também os países da
União Europeia.
As percentagens de africanos com educação superior que vivem no estrangeiro são elevadas: 52% para a Serra Leoa, 46% para
o Gana, 44% para o Quénia e 35% para o Uganda. No entanto, o número de fuga de cérebros contabilizado contém diversas
subtilezas que devem ser reconhecidas. Em primeiro lugar, a fuga de cérebros é um reflexo das qualificações em diferentes áreas
geográficas num dado momento. Muitos dos actuais dirigentes de hospitais, ministérios e outras instituições em África são pessoas
que estudaram no estrangeiro e regressaram com melhores qualificações. Essas pessoas foram, a dada altura, contabilizadas
nas estatísticas de fuga de cérebros. As qualificações das pessoas que regressaram depois de receberem formação têm uma
importância essencial para o desenvolvimento do país de origem. Os dados mostram taxas de regresso relativamente elevadas
após a conclusão dos estudos, pelo que existe mais uma circulação de cérebros do que uma fuga.
Investigações recentes salientam também a importância das remessas dos trabalhadores migrantes para as economias dos países
de origem. Easterly e Nyarko (2009) tentaram quantificar os aspectos positivos e negativos da fuga de cérebros, enquadrando as
remessas de migrantes e o regresso de pessoas qualificadas nos primeiros. Essa investigação indica a importância da circulação
de cérebros para os países de origem.
Outras investigações demonstraram um efeito considerável de incentivo à fuga de cérebros. A possibilidade de abandonar as
economias locais para prosseguir os estudos no estrangeiro ou auferir salários superiores aumenta o desejo de adquirir uma
educação superior, o que pode conduzir a níveis de educação mais elevados na economia local mesmo depois de alguns terem
saído para o estrangeiro. E mesmo que todos os médicos do Gana e do Malávi que vivem no estrangeiro regressassem a casa, os
rácios doente-médico continuariam a ser muito inferiores aos padrões internacionais. O que é necessário é um aumento maciço
dos níveis de especialização, um aumento de dez vezes ou mais das taxas de inscrição no ensino superior.
Decorrem várias recomendações da análise aqui apresentada:
• criar um “cartão azul” da UE, em consonância com o “cartão verde” dos Estados Unidos. Várias propostas de “cartão azul” da UE
facilitariam a imigração para a Europa para aquisição de competências, aumentando o bem-estar dos indivíduos que emigram
e as remessas para os familiares. Muitos acabarão por regressar aos países de origem com melhores qualificações. O regresso
de profissionais e trabalhadores qualificados aos países de origem deve ser incentivado (com períodos “sabáticos” flexíveis
para os titulares do cartão). No que respeita à concorrência global por pessoas qualificadas, a instituição de um sistema de
“cartão azul” da UE permitiria à Europa concorrer de forma muito mais eficaz com os Estados Unidos e o seu cartão verde na
captação de pessoas altamente qualificadas. Se o sistema fosse concebido adequadamente, tanto os países da África subsariana
como os da União Europeia teriam a ganhar.
14
Docquier e Marfouk, 2005.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 9
• Os contratos bilaterais de migração, que permitem a emigração de um número fixo de trabalhadores de África para a Europa,
devem ser alargados. Esses contratos devem ser concebidos para permitir e encorajar o regresso das pessoas qualificadas
aos seus países de origem.
• Os programas de empréstimos a estudantes e os investimentos no ensino profissional devem ser reforçados a fim de
responder à necessidade de aumentos maciços de profissionais especializados em África. Este processo pode entrar num
sistema de autofinanciamento, com tabelas de pagamento superiores para os alunos que emigram e descontos para aqueles
que permanecem no país de origem e com todos os alunos a iniciarem o pagamento dos empréstimos quando estiverem
empregados. O financiamento da UE pode ajudar a criar estes sistemas.
A migração e a circulação de pessoas, qualificadas e não qualificadas, sempre fez parte da história da humanidade. A origem
de todas as migrações é, provavelmente, a grande migração humana do vale do Rift da África Oriental, que eventualmente
esteve na base da primeira povoação humana na Europa actual. Existiram igualmente movimentos maciços de europeus
para colonizar o novo mundo a partir do início do século XVI. No início do século XVIII, os africanos começaram a receber
formação nas universidades europeias. O Fourah Bay College, na Serra Leoa, uma das primeiras universidades de estilo
europeu da África subsariana, era inicialmente um centro para escravos regressados e tornou-se posteriormente uma
incubadora de movimentos africanos a favor da independência.
Seria um erro terrível se a crise financeira actual e uma avaliação incorrecta da fuga de cérebros entravassem o importante
processo de desenvolvimento de competências e a circulação de cérebros. Em vez disso, o incentivo à migração e os
benefícios da migração podem ser utilizados de forma criativa para reforçar os níveis de capital humano na África subsariana
e, simultaneamente, beneficiar a Europa.
Prioridade 4: Apoiar melhor governação a nível regional, incluindo os processos de integração regional. As respostas
políticas a nível regional podem tirar partido dos mecanismos de integração regional que ajudam a assimilar as repercussões entre
os países vizinhos ou substituir as “fraquezas” de algumas instituições locais (caixa 9.3).
Caixa 9.3: Um nível adequado de integração regional
No âmbito da Estratégia Conjunta UE-África (JEAS), a UE pode promover mais diálogo político sub-regional e contribuir para a
aplicação eficaz do princípio de subsidiariedade baseado na confiança. A liderança local é importante se os acordos regionais
contribuírem para a construção do Estado. São necessários incentivos adequados para os líderes regionais, como a Nigéria
e a África do Sul, se envolverem plenamente em acordos regionais de parceria económica e assumirem a liderança15.
Devido à grande heterogeneidade económica existente nos grupos regionais africanos, é provável que a integração
com a CE (e o mercado global) tenha impactos significativamente diferentes nos diversos países. Podem emergir ou ser
reforçadas configurações do denominado modelo hub-and-spokes (“centro e eixo irradiantes”) a nível sub-regional, criando
tensões e maiores desigualdades dentro do subgrupo. Podem ser necessários mecanismos de transferência para atenuar
essas situações e reduzir as desigualdades regionais. Os projectos de investimento sub-regionais devem ser concebidos e
subsidiados de forma a favorecer a convergência local. No âmbito da JEAS, os diálogos políticos com os líderes sub-regionais
devem ser orientados no sentido de estimular a sua contribuição para esses mecanismos sub-regionais de compensação.
A este respeito, a UE pode utilizar a sua própria experiência na promoção de fundos estruturais sub-regionais.
Os acordos regionais de comércio podem ajudar os países africanos a realizar economias de escala, melhorar a competitividade
interna, aumentar os retornos dos investimentos e atrair IDE, o que conduz a transferência de tecnologia e crescimento económico.
Os acordos regionais podem igualmente ajudar as economias a partilharem recursos para a preparação conjunta de projectos de
infra-estruturas e, desse modo, internalizar os efeitos regionais desses investimentos entre os países16. Podem, também, dotar os
países africanos de uma voz mais forte na negociação de acordos com outros blocos comerciais ou parceiros privados.
15
16
Estes países não assinaram nenhum acordo provisório e os seus negócios com a UE são realizados ao abrigo de outros regimes
Ver Collier 2006. O documento CNUCED (2009), por exemplo, reafirma que a cooperação regional deve centrar-se no desenvolvimento de infra-estruturas
e salienta os benefícios de infra-estruturas conjuntas; na África Oriental, “o caminho-de-ferro foi um modo de transporte relativamente barato e gerido a
nível regional, que ligou o Uganda ao oceano através do Quénia. Esta situação alterou-se em 1977, quando a East African Railways foi dividida em segmentos
nacionais geridos a nível nacional. A divisão reduziu a eficiência da via-férrea, uma vez que introduziu custos adicionais em matéria de gestão, manutenção,
controlo fronteiriço e outros custos de coordenação”, pág. 41.
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Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Conclusões – prioridades e medidas
Através da análise do desempenho das economias de escala em matéria de prestação de serviços de segurança e outros bens públicos
e a produção de bens privados não transaccionáveis, é possível argumentar que o Estado africano típico é demasiado pequeno17.
A teoria comum em matéria de internalização sugere que o fornecimento de bens públicos regionais (tais como o transporte
internacional e as infra-estruturas de rede) e a regulamentação dos “males” públicos regionais (tais como a corrida ao armamento
nos países vizinhos, a disseminação de doenças e as fronteiras inseguras) se realizam melhor através de acordos intra-africanos.
Os acordos regionais de integração podem também servir como instrumentos para o reforço das instituições. Podem ajudar a
integrar os instrumentos de compromisso destinados ao reforço de reformas políticas, especialmente relevantes para Estados com
uma fraca capacidade de compromisso nacional. Aderir a um bloco comercial com “regras de clube” muito fortes pode ajudar a
lançar reformas democráticas e centrar a credibilidade nos países membros.
A abordagem de integração regional tem tido um sucesso limitado na África subsariana até ao momento. A aplicação das regras pode
constituir um problema juntamente com a ambiguidade associada à liderança regional. Devido à fraca governação, às estruturas das
instituições nacionais fracas e à ausência de vontade política, as políticas regionais são frequentemente mal executadas. Os efeitos
económicos dos acordos comerciais têm sido decepcionantes e a integração regional do poder político tem sido especialmente
limitada, com escassa devolução de poder às organizações regionais18. A insegurança e a fragilidade apresentam desafios ao
sucesso da integração regional19. E a lógica inicial do regionalismo político em África assentava numa forte ligação à soberania do
Estado e no princípio de não ingerência20.
A criação da Nova Parceria para o Desenvolvimento de África (NPDA) reflecte as tentativas mais recentes de “partilhar a soberania”
para melhorar a governação através do Mecanismo Africano de Avaliação pelos Pares. Estes recentes desenvolvimentos são
consistentes com uma perspectiva que reconhece a importância de interdependências regionais, que conduzem a agregados de
fragilidade21, e o fracasso de uma pura abordagem “centrada no Estado” ao reforço das capacidades (abordagem “europeia”)22.
Estes processos locais de reforço de governação devem ser promovidos de forma mais extensiva para apoiar a construção do
Estado nos países frágeis (caixa 9.4).
Caixa 9.4: O dilema da liderança e da hegemonia no reforço da governação local
As considerações conceptuais sugerem que o reforço da governação local poderá ser mais eficaz se os acordos incluírem
grandes parceiros com mais credibilidade para aplicar as regras a grupos e, assim, proporcionar melhores bases para o reforço
das instituições políticas. Ao mesmo tempo, a aplicação das regras deve estar regulamentada. Os grandes parceiros não
devem utilizar a sua posição superior (e credível) de responsáveis pela aplicação das regras numa perspectiva oportunista
e hegemónica. Esta questão introduz um importante dilema político pelo facto de as características que tornam um grande
parceiro uma entidade credível responsável pela aplicação de regras a grupos pode também levar a que esse parceiro se torne
hegemónico. Esta ambiguidade pode gerar desconfiança nos grupos e limitar a eficiência do sistema baseado em regras.
Em África, esta situação é ilustrada pelos dois acordos regionais com parceiros dominantes: a Comunidade Económica
dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), com a Nigéria, e a Comunidade de Desenvolvimento da África Central (SADC),
com a África do Sul. A existência de um grande interveniente nesta região estimulou alguma liderança que permitiu a
realização de missões de segurança africana no continente (na Libéria e no Lesoto). Mas, em ambos os casos, existia a
presunção de que a utilização dos mecanismos regionais racionalizava ex-post motivos oportunistas. A posição da África
do Sul enquanto entidade credível de aplicação de “boas regras de governação” na SADC foi também prejudicada pela
herança do apartheid e a desconfiança inerente que ainda existe nos seus parceiros regionais. Conforme sublinhou um
observador, “a reclamação do estatuto de “gestor de segurança” na África Austral por parte da África do Sul, embora não
constatada oficialmente, é contestada especialmente por países como o Zimbabué, que usufruiu anteriormente de um
estatuto de hegemonia regional antes da reintegração da África do Sul na SADC”23. As grandes disparidades económicas
entre a África do Sul e os seus parceiros regionais também continuaram a alimentar sentimentos de inveja e receios de
hegemonia regional que reduziram a sua legitimidade como líder regional. Estimularam igualmente outros países da SADC
a celebrar acordos regionais alternativos para contrabalançar o domínio da África do Sul24.
17
18
19
20
21
22
23
24
Collier 2006.
Yang e Gupta 2005.
UNECA 2006 e Fanta 2008.
Gandois 2005.
UNECA 2004.
Kaplan 2006.
Qobo 2007, p. 17.
Por exemplo, alguns países membros da SADC – Malávi, Maurícias, Zimbabué e Zâmbia (entre os países frágeis) – são simultaneamente participantes na
COMESA.
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DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Capítulo 9
Prioridade 5: Reforçar a segurança na área. É necessário um esforço a longo prazo para manter e aumentar a vontade dos
cidadãos europeus em continuarem empenhados e envolvidos na governação global. Na elaboração de políticas de segurança,
os decisores políticos da UE devem ter em conta o facto de as medidas em diversos domínios, desde a agricultura e as pescas ao
comércio, poderem ter implicações ao nível da segurança e que as iniciativas em matéria de segurança podem ter implicações
para o desenvolvimento e o comércio. A UE deve mudar a sua abordagem linear de engenharia social centrada nos instrumentos
disponíveis para uma abordagem estratégica mais flexível centrada no próprio problema e que reconheça o carácter contestado
e político de muitas políticas e objectivos dos doadores. O crescente recurso a instrumentos de gestão de crise civis e militares
constitui uma oportunidade não só para encorajar o planeamento conjunto (militar, civil e de ajuda/desenvolvimento) como também
para pensar de uma forma mais estratégica. É igualmente uma oportunidade para recompensar a adaptação e a assunção de riscos
por parte dos responsáveis locais, muitas vezes essenciais em situações de fragilidade. Ignorar as necessidades de segurança da
população é contraproducente: em vez de aplicar uma matriz europeia (blueprint) pré-existente, podem ser obtidos resultados
significativos se as necessidades de segurança da população forem analisadas com seriedade, o que constitui um primeiro passo
rumo a uma apropriação local genuína.
2.1 A NECESSIDADE DE UMA ABORDAGEM FLEXÍVEL A LONGO PRAZO
Para fazer face à heterogeneidade dos Estados frágeis da África subsariana em termos de desempenho e características, a UE
necessita de uma abordagem flexível e de novas formas de governação da ajuda e de ajuda ao desenvolvimento para melhorar a
sua eficiência (caixa 9.5).
Caixa 9.5: Reavaliar a governação da ajuda (Reassessing aid governance)
Por Ramon Marimon, Instituto Universitário Europeu
A eficácia de qualquer política de financiamento depende da sua execução. Este aspecto é especialmente importante no caso da
ajuda aos Estados frágeis. O problema já é reconhecido há muito tempo e concentrou a atenção da Declaração de Paris sobre a
Eficácia da Ajuda, de 2005, e do subsequente Programa de Acção de Acra, de 2008.
A elaboração de políticas eficazes de governação da ajuda exige, em primeiro lugar, a identificação dos intervenientes (doadores,
governos doadores, destinatários, governos dos países destinatários) e das suas relações, incluindo a especificação de responsáveis
pela definição dos objectivos gerais e específicos e dos programas correspondentes, bem como pela sua aplicação. A definição
do papel das agências de ajuda e da sua autonomia em relação a outros intervenientes reveste-se de especial importância.
A concepção mais simples para a governação da ajuda é o apoio orçamental numa situação em que não existem problemas de
elegibilidade ou necessidades especiais de acompanhamento25. Numa situação ideal como esta, a presença de agências de ajuda
é praticamente desnecessária, uma vez que os governos destinatários (aqui o mesmo que destinatários) executam directamente as
políticas adequadas. Os doadores podem definir objectivos gerais, mas os governos destinatários definem objectivos específicos,
embora por vezes também definam objectivos gerais. No entanto, essa forma idealizada de apoio orçamental pressupõe que os
países destinatários possuem instituições governamentais representativas dos interesses dos destinatários, muito desenvolvidas e
empenhadas em boas políticas. Este não é o caso dos Estados frágeis. De facto, o problema do compromisso acontece mesmo nos
países em desenvolvimento com uma governação razoavelmente boa: as revisões orçamentais anuais traduzem-se muitas vezes
em cortes discricionários para as políticas de desenvolvimento quando outras necessidades mais urgentes adquirem precedência.
A recente crise financeira apresentou diversos exemplos desse problema de compromisso, um problema que pode ser evitado
através de delegação das políticas de ajuda e da afectação de orçamentos plurianuais às agências de ajuda.
No entanto, os problemas de compromisso não estão limitados a problemas de finanças discricionárias: emergem também
quando a confiança é desgastada por mudanças discricionárias das políticas ou quando as políticas de ajuda são vulneráveis a
manipulações por parte de grupos poderosos. Assim, a atenuação dos problemas de compromisso é a principal razão para recorrer
a agências de ajuda autónomas que são capazes de perseguir objectivos a longo prazo sem mudanças discricionárias e distorções
locais. Uma segunda razão reside no facto de, quando o apoio orçamental a governos ou a organizações não governamentais
exige um acompanhamento rigoroso ou quando não é um mecanismo de ajuda eficaz e é necessário implementar programas de
ajuda, a política de ajuda tornar-se uma tarefa extremamente complexa que exige capacidade, especialização, profissionalização
e conhecimentos locais adequados.
25
No que respeita às condições de elegibilidade e às questões de controlo associadas, ver EuropeAid - Serviço de Cooperação (2009).
140
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Conclusões – prioridades e medidas
As agências doadoras e as agências dos governos destinatários não estão imunes a problemas de compromisso nem possuem a
capacidade adequada. Dependendo dos respectivos governos, não conseguem isolar-se da política e das mudanças orçamentais.
As agências doadoras, distantes dos países destinatários, carecem dos incentivos, confiança e conhecimentos locais adequados
para controlar ou implementar de forma efectiva e consistente as políticas de ajuda. As agências dos governos destinatários,
demasiado perto dos destinatários, podem ser influenciadas por grupos locais poderosos para desviar a ajuda da sua utilização
mais eficaz, ou não dispor dos incentivos adequados para controlar a atribuição da ajuda, quer sob a forma de apoio orçamental
quer sob a forma de programas de ajuda; podem possuir conhecimento local, mas não dispõem da capacidade para aprender
com terceiros ou para criar a reputação e a confiança necessárias para atrair fundos externos.
No âmbito dos princípios de “apropriação” e “alinhamento” da Declaração de Paris e do Programa de Acção de Acra26 , é também
necessária uma reavaliação da governação da ajuda. Os doadores (e os governos dos países em desenvolvimento) devem definir
os objectivos gerais e comprometerem-se com políticas de desenvolvimento a longo prazo. A melhor forma de manter esses
compromissos consiste em delegar a aplicação dos programas em agências de serviços de ajuda e transferir os fundos para estes
organismos. Uma preocupação imediata reside no facto de essa abordagem aberta e mais concorrencial poder exacerbar o
problema da fragmentação27. Ter vários doadores e destinatários pode ser uma virtude. O problema da fragmentação advém do
facto de existirem demasiadas agências, cada uma com um círculo restrito de relações diferente e/ou capacidades extremamente
limitadas para acompanhar ou gerir programas de ajuda complexos, etc. Tal como noutros sectores de serviços concorrenciais,
existem economias de escala na prestação de serviços de ajuda e as agências que prestam serviços de ajuda profissionais devem
encontrar a sua própria dimensão e especialização, evitando uma fragmentação ineficiente28.
Em resumo, existem vários princípios de governação e confiança em matéria de política de ajuda que devem ser
seguidos:
• Os doadores e os governos dos países em desenvolvimento devem definir objectivos gerais a longo prazo (“empenhandose num diálogo aberto e inclusivo sobre políticas de desenvolvimento”).
• Os programas de ajuda, ou os programas de apoio orçamental, que necessitam de acompanhamento devem ser
delegados em agências de serviços de ajuda, as quais devem aplicar os conhecimentos locais e especializados na
definição de programas e objectivos específicos e na avaliação e acompanhamento de programas de ajuda ou de apoio
orçamental.
• As agências de serviços devem ser independentes dos doadores, dos governos dos países em desenvolvimento e dos
destinatários finais.
• As agências de ajuda devem ser profissionais, estáveis, responsáveis e financiadas de forma adequada.
• Os doadores devem ser capazes de afectar fundos a um conjunto de agências e estas devem ser capazes de canalizar
ajudas em função de resultados de desenvolvimento e não apenas em função de relações já estabelecidas.
O Programa de Acção de Acra afirma que “alcançar resultados de desenvolvimento – e prestar abertamente conta desses
resultados – tem que estar presente em tudo o que fazemos”. Os cinco princípios expressos neste documento constituem
uma reafirmação, e uma definição mais específica, deste objectivo, em que os resultados não podem ser obtidos através da
simples transferência de fundos, como um mecanismo ‘ideal de apoio orçamental’. A aplicação destes princípios à política
da UE de ajuda ao desenvolvimento dos Estados frágeis em África exige uma completa reavaliação e reestruturação da
governação da ajuda. A governação da ajuda da UE é dominada pelas agências dos Estados-Membros e, tal como reconhece
a Declaração de Paris, é afectada pela fragmentação e pela falta de coordenação, custos de transacção elevados para os
governos com capacidade administrativa limitada e acompanhamento, avaliação e aprendizagem inadequados. No entanto,
é possível criar melhores estruturas de governação da ajuda com base nos conhecimentos das agências actuais e seguindo
os cinco princípios acima mencionados.
26
27
28
A Declaração de Paris e a Agenda de Acra salientam a importância da “apropriação” (os países em desenvolvimento devem definir as suas próprias estratégias
para reduzir a pobreza, reforçar as suas instituições e combater a corrupção) e do “alinhamento” (os países doadores devem alinhar-se com estes objectivos
e utilizar os sistemas locais).
De acordo com o estudo de W. Easterly e T. Pfutze (2008) sobre 31 agências bilaterais e 17 agências multilaterais, “a probabilidade de dois dólares seleccionados
aleatoriamente no esforço de ajuda internacional terem origem no mesmo doador e se destinarem ao mesmo país e para o mesmo sector é de 1 em
2658”.
P. Collier salientou igualmente a necessidade de uma estrutura de “agências de serviços” mais competitiva (Collier designa-as por “Autoridades Independentes
de Serviços”; ver Bold, Collier e Zeitlin (2009). Collier baseia a sua argumentação na complexidade da afectação e controlo dos fundos das ajudas: “O meu
argumento baseia-se igualmente na necessidade de mitigar os problemas de compromisso. Ele entende-os como autoridades de serviços nacionais ou locais,
eu vejo-os essencialmente – mas não exclusivamente – como agências multilaterais de serviços de ajuda a operar em diversos países”.
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SOBRE
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141
DESENVOLVIMENTO
Capítulo 9
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Alguns países frágeis da África subsariana necessitam principalmente de melhorar os indicadores de desenvolvimento humano,
enquanto outros necessitam de criar instituições estatais credíveis. Do mesmo modo, muitos desses países devem apoiar-se mais
na sociedade civil. Alguns estão em situação de conflito ou pós-conflito e precisam de ajuda militar. E, por fim, alguns necessitam
primeiro de combater a SIDA/VIH ou a malária. Todos eles têm necessidade de melhorar o seu capital humano e emancipação,
com particular atenção à educação das mulheres (o que se reflecte no aumento do bem-estar das famílias) e dos jovens do sexo
masculino, a fim de reduzir o risco de instabilidade social e actividades ilegais.
Uma vez definidas as prioridades, a UE deve estabelecer compromissos orçamentais e políticos credíveis a longo prazo, sem
interferir com a soberania do Estado. Esses compromissos permitirão aos Estados frágeis aumentar os horizontes temporais para
a reformulação e execução das políticas. Os mecanismos de acompanhamento e avaliação pelos pares são igualmente essenciais
para atingir os objectivos de desenvolvimento e melhorar a resiliência.
A mudança de prioridades para medidas específicas e orientações para intervenção exige um profundo conhecimento das situações
locais, uma vez que os países frágeis da África subsariana são notavelmente heterogéneos. Para que tenham impacto, as medidas
políticas pormenorizadas devem ser acompanhadas de um conhecimento do contexto local. Além disso, a UE deve falar a uma só
voz e interiorizar o facto de a construção do Estado e a coesão social em África serem processos a longo prazo que podem assumir
diferentes formas em qualquer momento e exigirem uma atenção constante e apoio adequado no terreno. A sociedade é abrangida
pelo Estado, mas o Estado penetra e reestrutura as relações sociais.
142
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
REFERÊNCIAS
Banco Mundial. 2007. Global Monitoring Report 2007 –
Confronting the Challenges of Gender Equality and Fragile
States. Washington, DC: Banco Mundial.
REFERÊNCIAS RELATIVAS À “PERSPECTIVA GERAL”
Collier, P. 2007. The Bottom Billion. Oxford: Oxford University
Press.
Banco Mundial. 2009a. Global Monitoring Report 2009 –
A Development Emergency. Washington, DC: Banco Mundial.
Collier, P. 2009a. The Political Economy of Fragile States and
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R E L ATÓ R I O E U R O P E U
SOBRE
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157
DESENVOLVIMENTO
Relatório Europeu sobre o Desenvolvimento 2009
Anexo
ANEXO
1.
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Verdier, T., Regional Integration, Fragility and the Institution Building: An Analytical Framework Applied to the African Context.
Bertoli, S., e Ticci, E., The Fragile Consensus on Fragility.
2.
Carbone, M., Desperately Seeking Policy Coherence: Aid and
Security in the Development Policy of the European Union.
O PROCESSO DE CONSULTA DO RELATÓRIO
EUROPEU DE DESENVOLVIMENTO DE 2009
O processo de consulta do relatório Europeu sobre o
Desenvolvimento de 2009 incluiu os seguintes sete eventos:
Collier, P., The Political Economy of Fragile States and Implications
for European Development Policy.
Workshop sobre “Development in a context of fragility – Focus
on Africa” (Desenvolvimento num contexto de fragilidade – Foco
em África), Bruxelas, Bélgica, 6 de Fevereiro de 2009.
Collier, P., e Venables, T., Natural Resources and State Fragility.
Faria, F., e Sherriff, A., EU Policies to Address Fragility in SubSaharan Africa.
Workshop sobre “Food crisis and the development potential of
the agricultural sector in fragile countries” (A crise alimentar e o
desenvolvimento potencial do sector agrícola nos países frágeis),
Cambridge, Reino Unido, 17-18 de Março de 2009.
Fennell, S., State Fragility and African Agriculture.
Giovannetti, G., e Velucchi, M., African Financial Markets:
A Spillover Analysis of Shocks.
Workshop sobre “Transforming Political Structures: Security,
Institutions, and Regional Integration Mechanisms” (Transformar
as estruturas políticas: segurança, instituições e mecanismos de
integração regional), Florença, Itália, 16-17 de Abril de 2009.
Guillaumont P., e Guillaumont Jeanneney, S., State Fragility and
Economic Vulnerability: What is Measured and Why?
Harcourt, W., Gender and Fragility: Policy Responses.
Conferência sobre “The challenges of fragility to development
policy” (Os desafios da fragilidade para a política de
desenvolvimento), Barcelona, Espanha, 7- 8 de Maio de 2009.
Harttgen, K. e Klasen, S., Fragility and MDG Progress: How Useful
is the Fragility Concept?
Iapadre, L., e Luchetti, F. Trade Regionalisation and Openness
in Africa.
Conferência sobre “Financial markets, adverse shocks and policy
responses in fragile countries” (Mercados financeiros, choques
adversos e respostas políticas nos países frágeis), Acra, Gana,
21-23 de Maio de 2009.
Kaplan, S., Enhancing Resilience in Fragile States.
Khan, Z., Gender Responsive Budgeting.
Conferência sobre “Moving Towards the European Report
on Development 2009” (Rumo ao Relatório Europeu sobre o
Desenvolvimento de 2009), Florença, Itália, 21-23 de Junho de
2009.
Mold, A. e Prizzon, A., Fragile States, Commodity Booms and Export
Performance: An Analysis of the Sub-Saharan African Case.
Naudé, W., Africa and the Global Economic Crisis: A Risk
Assessment and Action Guide.
Conferência sobre “Overcoming fragility in Africa: ERD Policy
recommendations” (Ultrapassar a fragilidade em África:
recomendações políticas do RED), Bruxelas, Bélgica, 4 de
Setembro de 2009.
New Faces for African Development, vários autores, Contribuições
da “poster session” na Conferência RED de Acra, 21-23 de Maio
de 2009.
O Volume 1B documenta o processo de consulta, apresentando
os programas finais, a lista de participantes e, no caso dos eventos
1 a 5, igualmente os relatórios da conferência. As apresentações
da conferência dos eventos 2 a 5 e os podcasts dos eventos
3, 4, e 7 podem ser transferidos do sítio Web do projecto, http://
erd.eui.eu.
Nkurunziza, J., Why is Burundi’s Financial Sector Not
Development-Oriented?
Nyarko, Y., EU Policies and African Human Capital Development.
Oduro, A.D., Adverse Shocks and Social Protection in Africa: What
Role for Formal and Informal Financial Institutions?
158
ULTRAPASSAR
A FRAGILIDADE
DE ÁFRICA
ELABORAR UMA NOVA ABORDAGEM EUROPEIA
http://erd.eui.eu/
R E L ATÓ R I O E U R O P E U
MOBILIZAÇÃO DA INVESTIGAÇÃO
EUROPEIA NO DOMÍNIO DAS
POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO
SOBRE
O
DESENVOLVIMENTO
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ultrapassar a fragilidade de áfrica - Social protection for inclusive