1
UNIVERSIDADE
CATÓLICA DE
BRASÍLIA
PRO- REITORIA DE GRADUAÇÃO
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
Direito
RESPONSABILIDADE CIVIL POR ABANDONO AFETIVO NA
RELAÇÃO PATERNO-FILIAL
Autora: Lucely de Souza Menezes
Orientador: Dr. José Eduardo Sabo Paes
BRASÍLIA
2007
2
LUCELY DE SOUZA MENEZES
RESPONSABILIDADE CIVIL POR ABANDONO AFETIVO
NA RELAÇÃO PATERNO-FILIAL
Brasília
2007
3
Dados Internacionais de catalogação na Publicação (CIP)
Universidade Católica de Brasília - UCB
M545r
MENEZES, Lucely de Souza.
Responsabilidade civil por abandono afetivo na
relação paterno-filial / por Lucely de Souza Menezes.
Brasília: UCB, 2007.
121 f.
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) –
Curso de Direito, 2007.
“Orientador: Dr. José Eduardo Sabo Paes”.
I. Título. 1. Responsabilidade civil. 2. Perdas e danos 3.
Direitos e deveres
CDU : 347.51:347.439.1
4
LUCELY DE SOUZA MENEZES
RESPONSABILIDADE CIVIL POR ABANDONO AFETIVO NA
RELAÇÃO PATERNO-FILIAL
Trabalho apresentado ao curso de
graduação de Direito da Universidade
Católica de Brasília como requisito
para obtenção do Título de Bacharel
em Direito.
Orientador: Dr. José Eduardo Sabo
Paes
Brasília
2007
5
ERRATA
Folha
Linha
Onde se lê
Leia-se
6
Trabalho
de
autoria
de
Lucely
de
Souza
Menezes
intitulado
“Responsabilidade civil por abandono afetivo na relação paterno-filial”,
requisito parcial para a obtenção do grau de bacharel em direito, defendida e
aprovada em _______________________ pela banca examinadora composta por:
________________________________________________
José Eduardo Sabo Paes
Orientador
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
Brasília
2007
7
Aos meus pais, que me transmitiram o
amor pela justiça e me incentivaram a
lutar pelo Direito.
8
Agradeço a Deus, força maior, pelo dom
da vida.
Ao Professor Dr. José Eduardo Sabo
Paes, pela valiosa orientação, apoio e
incentivo, os quais foram indispensáveis
para a realização deste trabalho.
A
bibliotecária
Lucimara
de
Souza
Menezes (minha irmã), pela valorosa
contribuição nesta pesquisa.
A minha família e aos meus amigos, pela
rica convivência.
9
Ainda que eu falasse as línguas dos
homens e dos anjos, e não tivesse amor,
seria como o metal que soa ou como o
sino que tine.
E ainda que tivesse o dom de profecia,
e conhecesse todos os mistérios e toda a
ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de
maneira tal que transportasse os montes,
e não tivesse amor, nada seria.
E ainda que distribuísse toda a minha
fortuna para sustento dos pobres, e ainda
que entregasse o meu corpo para ser
queimado, e não tivesse amor, nada disso
me aproveitaria.
O amor é sofredor, é benigno; o amor
não é invejoso; o amor não trata com
leviandade, não se ensoberbece.
Não se porta com indecência, não
busca os seus interesses, não se irrita,
não suspeita mal; não folga com a
injustiça, mas folga com a verdade;
Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo
suporta;
I Corintios 13: 1-7
10
RESUMO
MENEZES, Lucely de Souza. Responsabilidade civil por abandono afetivo na
relação paterno-filial. 2007. 121 f. Trabalho de conclusão de curso (graduação) –
Faculdade de Direito, Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2007.
A Constituição Federal de 1988 instituiu a entidade familiar como base do Estado e
constitucionalizou os direitos da personalidade, dentre eles, a dignidade da pessoa
humana. Aos pais compete o dever de sustento, guarda e educação dos filhos. A
ausência, descaso e até mesmo a rejeição dos genitores em relação aos filhos viola
o seu direito a honra e a imagem, caracterizando, ainda, o abandono moral e afetivo.
Do abandono afetivo, na relação paterno-filial, resultam graves danos que estão
sujeitos a reparação, pois o Código Civil de 2002 prevê a responsabilização civil do
autor que causar prejuízo a outrem. A destituição do poder familiar, por si só, não
produz efeito apto a desestimular a prática do abandono. É necessária a
composição de medidas eficazes que busquem ressarcir o dano e inibir o
desamparo, resgatando assim, os valore sociais na família.
Palavras-chave: afeto, família, dignidade da pessoa humana, responsabilidade civil,
dano moral, abandono, paternidade.
11
ABSTRACT
MENEZES, Lucely de Souza. Civil responsibility for affective abandonment in
the parent-child relation. 2007. 121 p. Course conclusion paper (Graduation) – Law
School, Catholic University of Brasilia, Taguatinga, 2007.
The 1988 Federal Constitution instituted the family entity as the base of the State and
constitutionalized the personality rights, among them, the human being dignity. To
the parents compete the sustenance, guard and kids’ education duty. The lack,
disinterest and even the rejection from the parents regarding the kids violates their
right to honor and to the image, characterizing, the moral and affective abandonment.
From the affective abandonment, in the parent-child relation, many serious damages,
that are subjected to repairing, are resulted, because the 2002 Civil Code foresees
the civil responsabilization of the author who causes damage to someone. The
destitution of the family power, by itself, does not produce an effect enough to
discourage the abandon practice. The composition of effective measures that seek
the compensation of the damage and the inhibition of the support lack is necessary,
rescuing the family social values.
Key words: Affection. Family. Human being dignity. Civil responsibility. Moral
damage. Abandonment. Fatherhood
12
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABREVIATURAS
art. por artigo
arts. por artigos
etc por et cetera
E.g. por Exempli gratia
id por idem
ibid por ibidem
obs. por observação
op cit por op citatun
p. por página
t. por tomo
v. por volume
v.g por verbi gratia
c/c combinado com
SIGLAS
DNA - Desoxirribonucléicos
ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente
CF/88 - Constituição Federal de 1988
CC/02 - Código Civil de 2002
CPC - Código de Processo Civil
CPP - Código de Processo Penal
CP - Código Penal
TJSP - Tribunal de Justiça de São Paulo
TJRS - Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul
13
LISTA DE SÍMBOLOS
> maior
+ mais (sinal de adição)
= igual (sinal de igualdade)
§ parágrafo
14
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO _____________________________________________________16
CAPÍTULO 01 - Da Relação Familiar na Perspectiva Civil-Constitucional ____20
1.1 Da familia ___________________________________________________20
1.2 Do direito à filiação ___________________________________________21
1.2.1 Dos filhos havidos no casamento ______________________ ________25
1.2.2 Dos filhos havidos fora do casamento ___________________________26
1.3 Do poder familiar _____________________________________________27
1.3.1 Titularidades do poder familiar _________________________________28
1.3.2 Causas de suspensão, destituição e extinção do poder familiar _______30
1.4 Da paternidade _______________________________________________31
1.5 Dos alimentos _______________________________________________33
CAPÍTULO 02 - O Abandono na Relação Paterno-Filial ___________________37
2.1 Do abandono material _________________________________________40
2.2 Do abandono intelectual _______________________________________42
2.3 Do abandono moral e afetivo____________________________________43
2.3.1 Conseqüências do abandono afetivo ____________________________45
CAPÍTULO 0 3 - Teoria Geral da Responsabilidade Civil __________________48
3.1 Evolução histórica ____________________________________________51
3.2 Espécies de responsabilidade civil_______________________________54
3.2.1 Responsabilidade subjetiva e objetiva ___________________________54
3.2.2 Responsabilidade contratual e extracontratual_____________________56
3.2.3 Responsabilidade indireta e direta ______________________________58
3.3 Pressupostos da responsabilidade civil___________________________58
3.3.1 Da conduta humana _________________________________________59
3.3.2 Da culpa __________________________________________________60
3.3.3 Do dano __________________________________________________62
3.3.4 Do nexo de causalidade______________________________________63
3.4 Finalidades __________________________________________________64
3.4.1 Compensatória _____________________________________________66
3.4.2 Punitiva __________________________________________________65
3.4.3 Diss uasiva ______________________________________________67
3.5 Excludentes de responsabilidade ________________________________68
3.5.1 Da culpa exclusiva da vitima e culpa concorrente __________________68
3.5.2 Da imputabilidade __________________________________________69
3.5.3 Do estado de necessidade, legitima defesa e exercício regular de direito ____70
3.5.4 Do caso fortuito e força maior _________________________________72
CAPÍTULO 04 - Do Dano __________________________________________________ 73
4.1 Noções______________________________________________________73
15
4.2 Espécies de danos ____________________________________________74
4.2.1 Do dano material ___________________________________________75
4.2.2 Do dano moral _____________________________________________77
CAPÍTULO 05 - Da Responsabilidade Civil por Abandono Afeitvo_________________ 81
5.1 Dos direitos personalíssimos ___________________________________81
5.2 Do princípio da dignidade da pessoa humana e da afetividade _____85
5.3 Do dano por abandono afetivo __________________________________88
5.4 Da finalidade da reparação civil _________________________________94
5.5 Do perigo da monetarização do afeto _____________________________97
CONCLUSÃO _____________________________________________________99
REFERÊNCIAS ___________________________________________________101
GLOSSÁRIO _____________________________________________________106
ANEXO - Recurso Especial Nº 757.411 - MG (2005/0085464-3) ____________109
16
INTRODUÇÃO
A família como baldrame social sofreu diversas transformações ao longo dos
anos, que resultaram em modificações significativas em sua estrutura.
Com o advento da Constituição Federal de 1988, grandes avanços foram
alcançados em decorrência dessas mudanças. O Estado passou a reconhecer a
família como instituição fundamental da sociedade, amparando-a e protegendo suas
relações de afeto.
A família deixou de ser necessariamente um núcleo econômico e de
reprodução,
passando
a
ser
um lugar
propicio
ao
desenvolvimento
do
companheirismo, do amor e, acima de tudo, o centro formador do individuo e
elemento fundante do próprio sujeito.
As relações de afeto no âmago familiar, sempre foram questões contestáveis
diante da sociedade. O convívio familiar é um direito assegurado a toda criança ou
adolescente. Aos pais cabe a incumbência do dever de sustento, guarda e educação
dos filhos. A educação abrange não somente a escolaridade, mas também a própria
convivência, o afeto, o amor, o estabelecimento de paradigmas, a criação de
condições para que a presença do pai ajude no desenvolvimento da criança. O
cerceamento desse direito acarretará o abandono afetivo que, na maioria das vezes,
ocasiona conseqüências irreversíveis.
O abandono afetivo é um assunto que alcançou espaço considerável no
mundo e no ordenamento jurídico brasileiro, sendo causa de amplas discussões a
respeito de sua aceitação. A Constituição Federal de 1988 dispõe no art. 227, caput,
que é dever, em primeiro lugar, da família, assegurar dentre outros o direito da
17
criança e do adolescente à convivência familiar, além de colocá-los a salvo de toda
forma de negligencia.
A Lei de nº. 8069/90, Estatuto da Criança e do Adolescente, na maioria das
vezes, apenas é utilizado no que diz respeito ao menor delinqüente, sendo poucas
vezes aludido a afirmar a proteção ao direito do menor.
O Estatuto da Criança e do Adolescente reafirma o direito da criança e do
adolescente a ser criado e educado no seio da sua família, e adjudicando aos pais o
dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, segundo art. 19 e 22.
Para alguns doutrinadores, o Direito não tem poder para criar afetividade,
nem sentimentos decorrem de legislações. Sendo assim, o Estado não pode prestar
a devida tutela jurisdicional. Para a corrente divergente, é admissível indenização
pelo não cumprimento de obrigações garantidas pela Constituição Federal de 1988,
sendo está indenização de caráter punitivo e dissuasório, servindo como estimulo
aos demais a não cometer tal prática e cumprirem os deveres éticos impostos pelas
relações familiares, sendo ainda compensatória pelos danos causados a criança.
Para alguns doutrinadores, o fato da concessão de indenizações, indica uma
extensão descomunal da definição de danos
indenizáveis e incentiva a
monetarização do afeto. Além disso, não surti efeitos, pois não haverá uma
reaproximação do filho por imposição de lei ou decisão judicial.
A escolha do tema da presente investigação justifica-se, pois, pelas
significativas alterações já referenciadas, provenientes, em primeiro lugar, da
mudança provocada pela Constituição Federal de 1988. No novo texto
constitucional, alterou-se a própria essência da filiação e da família tal como se
conhecia, com severas distinções entre os filhos, dependendo de sua origem,
18
bem como com importantes limitações ao direito de reivindicar e, como
conseqüência, de se conhecer a paternidade. A posteriori, a escolha decorre
também das transformações legislativas que surgiram após 1988, inspiradas
pela nova roupagem que ganhou o instituto jurídico da filiação, em respeito ao
princípio e direito maior da personalidade e da dignidade da pessoa humana.
O presente trabalho tem como objetivo evidenciar a existência do dano
moral causado pelo abandono afetivo na relação paterno filial e apontar a
possibilidade real deste dano ser reparado, além de avaliar seus efeitos dentro do
atual entendimento do direito. Busca-se ainda, tratar sobre a responsabilidade civil,
identificando as nuances norteadoras dos preceitos que abalizam o tema,
procurando compreender o teor das emanações apresentadas, encontrando, se
possível, uma solução ao problema suscitado.
O tema será desenvolvido de maneira a reforçar os princípios alusivos à
afetividade e da dignidade da pessoa humana, nas normas positivadas e em
princípios constitucionais. Mantém-se a necessidade de elucidar o papel do Poder
Judiciário como lócus ideal a pensar e interpretar o direito voltado à compreensão
dos relacionamentos entre pessoas que vêm propiciando e experimentando
progresso, porém, sempre em busca da felicidade. Esse direito há de ser
democratizado para aproximá-Io do cidadão. As normas legais existem em função
da pessoa, e não vice-versa, não podendo servir o positivismo de motivo para a
negação de direitos. Cabe ressaltar, que há disponíveis sistemas hermenêuticos
aptos e eficientes a amparar cientificamente posições e decisões que não mais se
contentem com a reprodução de antigos paradigmas que já não condizem com a
realidade social.
19
Procurar-se-á demonstrar a melhor forma de tratar as relações familiares,
por vezes, tão íntimas e prazerosas e, por outras, portadoras de tantas frustrações
e sentimentos de rejeição, na certeza de que, como já dito, apenas o afeto
justifica sua permanência e constância.
A presente pesquisa se caracterizará por um estudo descritivo, onde utilizarse-á o método dedutivo, pois iniciará de premissas pré-ordenadas acerca da relação
familiar e da responsabilidade civil para se demonstrar o dano ocasionado pelo
abandono moral e afetivo. A hermenêutica será utilizada como mecanismo de
interpretação
teleológica,
buscando
o
entendimento
das
disposições
em
conformidade com os objetivos almejados. A técnica a ser adotada será da pesquisa
bibliográfica de fontes primarias e secundarias como também a pesquisa
documental (decisões jurisprudenciais).
Será adotado o estudo bibliográfico de acordo com a especialidade da
estrutura do trabalho desenvolvido. Serão analisados além de doutrinas e decisões
jurisprudenciais, artigos de jornais e revistas especializadas, disponíveis em
periódicos e internet, como publicações avulsas.
20
CAPÍTULO 01
DA RELAÇÃO FAMILIAR NA PERSPECTIVA CIVIL-CONSTITUCIONAL
1.1 Da família
A acepção do termo família tem sido variada ao longo dos anos. No direito
romano seu significado estava diretamente ligado ao sangue ou a um grupo de
pessoas submetidas a uma mesma autoridade. A família era, simultaneamente, uma
unicidade econômica, política, religiosa e jurisdicional1. Suas instituições básicas,
tais como, casamento, parentesco, poder familiar e tutela, apresentavam princípios
fundamentalmente distintos dos hodiernos.
Atualmente, inúmeros são os significados do vocábulo família, devido ao
fenômeno da plurivalência semântica do vocabulário jurídico.
Segundo Maria Helena Diniz2, no sentido amplo o termo abrange o conjunto
de pessoas ligadas pelo vínculo da consangüinidade ou da afinidade, incluindo
estranhos, como no caso do art. 1.412, §2º, do Código Civil. Na acepção lata,
abrange ainda, os parentes da linha reta ou colateral, bem como os afins, além dos
cônjuges e de seus filhos.
No stricto sensu, a família é o conjunto de pessoas ligadas pelos laços do
matrimonio e da filiação, sendo os cônjuges e a prole, como também a comunidade
1
WALD, Arnoldo. Curso de direito civil brasileiro: o novo direito de família. 14. ed. São Paulo: Saraiva,
2002. p. 4.
2
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. 20. ed. São Paulo: Saraiva,
2005. p. 10-11 (Coleção Curso de Direito Civil Brasileiro; v. 5).
21
formada por qualquer dos pais e descendentes, como prescreve o art. 226, §§ 3º e
4º da Constituição de 1988, independente do vinculo conjugal” 3.
Destaca-se ainda, a respeitável compreensão do jurista Arnoldo Wald4, “ao
lado da família em sentido amplo – conjunto de pessoas ligadas pelo vínculo da
consangüinidade, ou seja, os descendentes de um tronco comum –, também a
família em sentido estrito, que diz respeito ao casal e a seus filhos legítimos,
legitimados ou adotivos”.
A Constituição Federal de 1988, além de tratar e tutelar as relações
familiares, em capítulo destacado, provocou profundamente uma modificação no
Código Civil de 2002, considerando a família como base da sociedade, recebendo
especial proteção do Estado, conforme o art. 226, caput.
Uma das inovações mais significativas da Constituição de 1988 foi o
pluralismo das entidades familiares. Para que seja considerada entidade familiar é
necessário que tenha afetividade e estabilidade. Dentre essas entidades, destacamse as famílias monoparentais, anaparentais, matrimoniais e as não matrimoniais
(união estável).
1.2 Do direito à filiação
Filiação é o liame existente entre pais e filhos. Nem sempre esse vínculo é
determinado de uma união sexual, podendo ser provida de uma inseminação
artificial homóloga, de uma fertilização in vitro ou na proveta ou da adoção.
3
DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 09-10.
WALD, Arnoldo. op. cit., p. 4.
4
22
Pontes de Miranda5 sustenta que a filiação é "a relação que o fato da
procriação estabelece entre duas pessoas, uma das quais nascidas da outra,
chama-se paternidade ou maternidade, quando considerada com respeito ao pai ou
à mãe e filiação quando do filho para qualquer dos genitores”.
O estado de filiação é a designação jurídica de uma relação de parentesco,
conferida a alguém, compreendendo um complexo de direitos e deveres
reciprocamente preponderados por força da convivência familiar, consolidada na
afetividade. É uma relação de parentesco que se constitui entre duas pessoas, onde
o filho é titular do estado de filiação, da mesma forma que o pai e a mãe são titulares
dos estados de paternidade e de maternidade, em relação a ele.
Juridicamente, não há de se falar em distinções entre filhos legítimos,
ilegítimos, biológicos ou não-biológicos, ante a norma de eficácia imediata,
estabelecida na Magna Carta e nas Leis 8.069/90 e 8.560/92.
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 227, §6º, equiparou os filhos
nascidos ou não na constância do casamento, ou por adoção, além de proibir
quaisquer designações discriminatórias. O Código Civil de 2002 reproduziu, em seu
art. 1.596, concernente à igualdade entre filhos de qualquer natureza, superando o
paradigma discriminatório da legitimidade, constituído na consangüinidade e na
matrimonialidade.
“Art. 1.596 Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por
adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer
designações discriminatórias relativas à filiação”.
5
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. Campinas: Bookseller,
2000. Vol. 9, p.45.
23
Porém, em outra época, segundo Fustel de Culanges6, em sua obra A
Cidade Antiga, as relações familiares eram menos condescendentes. Em Roma e na
Grécia, a família era constituída apenas pelo casal, após cerimônia religiosa, e pelos
filhos derivados dessa relação. Caso nascesse fora do matrimônio, estaria o filho
fadado ao preconceito e ao abandono, sem qualquer direito. Os vínculos biológicos
produziam reflexos insuficientes para o direito de família, segundo evidencia o autor,
visto que poderia o filho “bastardo” ver-se abandonado ou não reconhecido com a
finalidade de proteger a entidade familiar.
Atualmente, a família reencontrou-se no fundamento da comunhão e do
afeto. A afetividade, abordada pelos educadores, psicólogos e pedagogos, adentrou
nas ponderações dos juristas, que buscam explicar as relações familiares hodiernas.
O afeto não é fruto da biologia. Os laços de afeto e de solidariedade derivam da
convivência familiar e não do sangue.
Com efeito, se todos os filhos são dotados de direitos e deveres idênticos,
não importando a sua origem, cessou qualquer sentido de legitimidade nas relações
de família e conseqüentemente, relativizou-se a performance instituidora da origem
biológica.
De acordo com Paulo Luiz Netto Lobo 7, a Constituição Federal de 1988 traz
diversos fundamentos do estado de filiação geral, que não se sintetiza apenas à
filiação biológica:
6
COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2002. (Coleção a Obra Prima
de Cada Autor. Série Ouro; v. 2).
7
LÔBO, Paulo Luiz Netto. Princípio jurídico da afetividade na filiação. Jus Navigandi, Teresina, ano 4,
n. 41, maio 2000. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=527>. Acesso em: 22
out. 2007.
24
a) Todos os filhos são iguais, independentemente de sua origem (art. 227, §
6º);
b) A adoção, como escolha afetiva, alçou-se integralmente ao plano da
igualdade de direitos (art. 227, §§ 5º e 6º);
c) A comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes,
incluindo-se os adotivos, tem a mesma dignidade de família constitucionalmente
protegida (art. 226, § 4º); não sendo relevante a origem ou existência de outro pai
(genitor);
d) O direito à convivência familiar, e não a origem genética constitui
prioridade absoluta da criança e o do adolescente (art. 227, caput);
e) Impõe-se a todos os membros da família o dever de solidariedade, uns
com os outros, dos pais para os filhos, dos filhos para os pais, e todos com relação
aos idosos (arts. 229 e 230);
O reconhecimento da filiação, direito personalíssimo indisponível e
imprescindível, pode ser feito de forma voluntária, administrativa ou jurisdicional,
sendo demonstrado através do registro civil ou da sentença judicial em ação de
investigação ou negatória de paternidade.
O reconhecimento voluntário é aquele que se caracteriza por ato exclusivo e
espontâneo dos pais, no registro de nascimento, em escritura pública, em
testamento, documento escrito ou por manifestação expressa e direta perante o juiz.
Já o reconhecimento administrativo é aquele feito por declaração da mãe ao oficial
do registro civil, no ato de registro do filho indicando o nome e a qualificação do
genitor que se negou a reconhecer de forma natural. O oficial encaminhará a
25
certidão integral ao juiz que ouvirá a mãe e o hipotético pai, que confirmando a
paternidade, lavrar-se-á o termo de reconhecimento e sua averbação.
Nos casos em que é frustrado o reconhecimento administrativo, incidirá no
reconhecimento judicial mediante ação de investigação de paternidade, que segue
rito ordinário, sendo admitidos todos os meios de prova, notadamente a pericial, em
específico o exame de DNA.
1.2.1 Dos filhos havidos no casamento
A filiação no casamento pressupõe “a maternidade por parte da esposa e a
paternidade por parte do marido” 8. Ainda que o casamento seja considerado nulo,
anulado ou não de boa-fé pelos consortes.
Considera-se concebido na constância do casamento aquele filho nascido
cento e oitenta dias após o estabelecimento da convivência conjugal. Dissolvida a
sociedade conjugal pela morte, pela separação judicial ou pela anulação ou
declaração de nulidade do casamento, presume-se a paternidade do filho nascido
nos trezentos dias seguintes ao ato que dissolveu a sociedade, somente se
admitindo a contestação da paternidade nos casos expressos.
A presunção de paternidade é juris tantum, ou seja, relativa, pois a prova
contraria é limitada. Porém a presunção é absoluta, em relação a terceiros, mediante
o fato de que não podem contestar a paternidade de alguém, visto ser tal
contestação privativa do pai.
8
WALD, Arnoldo, op. cit., p. 197.
26
Há a presunção legal de paternidade também nos casos do art. 1.597,
incisos III, IV e V, do Código Civil de 2002, em que os filhos são havidos:
a) Por fecundação artificial homológa, mesmo que tenha falecido o marido;
b) Por fecundação artificial homológa, a qualquer tempo, sendo os embriões
excedentes;
c) Por inseminação artificial heterológa, desde com a anuência prévia do
marido de sua mãe;
A ação negatória da paternidade e maternidade pode ser proposta pelo
marido contra o filho, e se este vier a falecer na pendência da lide, seus herdeiros
poderão prossegui-la, tendo por fim contestar paternidade fundando-se nos casos
dos arts. 1.597, inciso V, 1.599, 1.600 e 1.602, do Código Civil de 2002.
1.2.2 Dos filhos havidos fora do casamento
Consideravam-se filhos legítimos aqueles biológicos, havidos na relação do
casamento. Já os filhos procriados por pessoas não casadas entre si eram
denominados de ilegítimos.
A filiação ilegítima podia ser natural, quando inexistia algum impedimento
entre os pais para casar, e espúria, quando tal casamento não podia acontecer, em
virtude de um já estar casado ou de existir entre ambos uma relação de parentesco.
Atualmente, mesmo na vigência do casamento, qualquer dos cônjuges pode
reconhecer o filho havido fora do matrimônio. Trata-se de ato declaratório, pois
27
apenas declara um fato do qual o direito atribui conseqüências, sem criar a
paternidade.
Mediante a filiação é atribuído o direito de estabelecer o liame de parentesco
entre o filho e pais, à assistência e alimentos, equiparação para fins sucessórios e
sujeição do filho reconhecido ao poder familiar.
1.3 Do poder familiar
Poder familiar é o cuidado que os pais devem ter em relação aos seus filhos
menores, devendo criá-los, alimentá-los e educá-los. Tem como finalidade
resguardar o ser humano que, desde a infância, necessita de alguém que o eduque,
ampare e cuide de seus interesses.
Para Maria Helena Diniz9, o poder familiar é “um conjunto de direitos e
obrigações, quanto à pessoa e bens do filho menor não emancipado, exercido pelos
pais, para que possam desempenhar os encargos que a norma jurídica lhes impõe,
tendo em vista o interesse e a proteção do filho”.
No Código Civil de 1916, a autoridade sobre os filhos era exercida apenas
pelo pai, não se cogitando a hipótese deste poder ser exercido conjuntamente com a
mãe. O pai era responsável pelas contas e pelo mantimento, entretanto a educação
e criação eram exercidas exclusivamente pela mulher. Porém com o advento do
Código de 2002, o pátrio poder foi substituído pelo poder familiar e esta condição foi
9
DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 447.
28
alterada, acompanhando a evolução das relações familiares. Atualmente a
incumbência de cuidar dos filhos é de ambos.
Sendo assim, o poder-dever transformou-se em um múnus público, um
encargo jurídico atribuído a alguém, em face de tais circunstâncias como a
parentalidade.
O poder familiar é irrenunciável, inalienável, e imprescritível. Não pode ser
abdicado e nem mesmo transferido a outrem a título gratuito e oneroso. Porém,
poderá ocorrer a perda desse poder em casos previstos em lei.
1.3.1 Titularidades do poder familiar
Compete aos pais, simultânea e privativamente, a titularidade do poder
familiar sobre os filhos. Tendo ambos, as mesmas responsabilidades sem qualquer
distinção. Enquanto menores, os filhos estão sob o poder dos pais, não podendo
praticar atos da vida civil sem a autorização deles.
Em casos de divergência dos progenitores acerca do exercício do poder
familiar, é assegurado a qualquer um dos pais o direito de recorrer ao judiciário
buscando solucionar o conflito.
Não é permitido outra pessoa ser titular do poder familiar, de acordo com a
própria natureza do instituto, fundado pelo vínculo da paternidade e maternidade.
Não há no ordenamento jurídico brasileiro qualquer dispositivo de lei que admita tal
possibilidade. A propósito, a Carta Magna afirma serem os pais detentores do dever
de assistir, criar e educar os filhos menores, disposto no art. 229. Ainda, o caput do
29
art. 1.634, do Código Civil de 2002, assegura que o exercício do poder familiar
compete "aos pais".
Na constância do casamento ou da união estável, será exercido o poder
familiar pelos pais, entretanto, se um deles vier a falecer ou ficar impedido de
exercê-lo, o outro restante é quem exercerá.
A separação judicial ou divórcio não altera a condição dos pais de titulares
do poder familiar. Será designada a guarda da criança a um dos progenitores, o
direito às visitas e o valor da pensão alimentícia a ser paga, mas ambos continuam
detentores de tal poder.
Se o filho for registrado apenas pela mãe, somente ela exercerá o poder
familiar. No caso de perda do poder ou com o falecimento da genitora, passar a
existir à necessidade de nomeação de um tutor.
Importante ressaltar que constitui crime o induzimento ao menor para evadirse do ambiente em que se exercite o poder familiar, sujeito a pena de detenção de
um mês a um ano. Ainda é tipificado crime subtrair o menor à autoridade de quem
detém o poder familiar, sujeito à pena de detenção de dois meses a dois anos,
previstos no artigo 248 do Código Penal Brasileiro. O crime é agravado, com pena
de reclusão de dois a seis anos, se a subtração do menor, de quem detém o poder
familiar, se der com intuito de colocá-lo forçosamente em lar substituto10.
10
LOBO, Paulo Luiz Netto (Coord.). Entidades familiares constitucionalizadas: família e cidadania – o
novo CCB e a vaccatio legis. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 72.
30
1.3.2 Causas de suspensão, destituição e extinção do poder
familiar
A suspensão do poder familiar é uma sanção que objetiva a preservação dos
interesses do filho, privando temporariamente o genitor, do exercício do poder
familiar, por prejudicar o filho.
Incidi a suspensão por abuso de poder devidamente comprovado,
condenação por sentença irrecorrível, falta aos deveres paternos, dilapidação dos
bens dos filhos, maus exemplos, crueldade, exploração ou perversidade do genitor,
comprometendo a saúde, segurança e moralidade do filho.
Cabe ressaltar que nos casos de violência contra a mulher, acarretando
assim, prejuízos aos filhos, poderá o juiz, a pedido da ofendida ou a requerimento do
Ministério Público, adotar medidas protetivas, tais como a suspensão do poder
familiar do pai e agressor, a fim de amparar e tutelar a família. A Lei 11.340/06
conhecida como “Lei Maria da Penha” além do seu caráter punitivo, traz medidas de
proteção à mulher, oferecendo solução para o seu conflito, resguardando a
normalidade da convivência familiar.
A determinação da suspensão é de livre arbítrio e convencimento do juiz,
que poderá deixar de aplicar, se for oferecida garantia idônea de que o filho
receberá dos pais o tratamento adequado.
A legislação não impõe limite de tempo para suspensão. Será sempre
respeitado o interesse do menor. Retorna ao exercício desse poder, uma vez
desaparecida a causa que originou tal suspensão.
A destituição ou perda do poder familiar é a mais grave sanção imposta por
decisão judicial aos pais que praticam qualquer um dos atos que a justificam.
31
Em regra, a destituição tem caráter permanente, podendo ser restabelecido
o poder familiar dentro de cinco anos, a contar do momento da aplicação da
penalidade.
Castigar imoderadamente, deixar ao abandono material ou moral, praticar
atos contrários à moral ou bons costumes, incidir reiteradamente nas faltas
mencionadas no art. 1.637 do Código Civil de 2002, constituem causas para a perda
do poder familiar.
A Lei 8.069/90, em seus artigos 148, parágrafo único, alínea “b”, 201, inciso
III, 155 a 163, trata do procedimento da destituição e da suspensão do poder
familiar.
O poder familiar se extingue com “a maioridade ou com a emancipação dos
filhos, com a morte dos pais ou do próprio filho e com a adoção” 11.
O vínculo com os pais biológicos deixam de existir quando a criança é
adotada por outro casal, destarte, o poder familiar é suprimido para estes, passando
a ser titulares por direito os pais adotivos, justificando-se pela existência do vínculo
afetivo.
1.4 Da paternidade
A paternidade é uma qualidade ou condição de pai12. Em Roma, o pai era
instituído pelo poder da lei e dotado de autoridade plena. Nesse sistema patriarcal,
11
WALD, Arnoldo, op. cit., p. 201.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da língua
portuguesa. 3. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 1.513.
12
32
as
crianças
eram desamparadas
afetivamente
pelo
pai
e eram criadas
exclusivamente pela mãe.
Atualmente, com a evolução do patriarcado e a revolução feminista, os
homens tendem a ter uma participação ativa na criação dos filhos.
A Constituição Federal de 1988 equiparou homens e mulheres perante a lei,
trazendo o reconhecimento de outras formas de entidade familiar. Modificou ainda o
instituto da filiação, igualizando filhos havidos na constância do casamento e fora
dele, proibindo quaisquer designações discriminatórias.
A Lei 8.560/92 veio estabelecer o compromisso do Estado em promover a
investigação de paternidade dos filhos que não apresentam o nome do pai em seus
registros de nascimento. O direito ao pai é “condição básica para que alguém
possa existir como sujeito. Portanto, é mais que um direito fundamental, é o
direito fundante do ser humano como sujeito. Desta forma, podemos dizer que
sem paternidade não é possível existir o sujeito, ou seja, não há sujeito sem que
alguém lenha exercido sobre ele uma função paterna”
Conforme
aponta
Yussef
Sahid
Cahali14,
13
.
manifesta-se,
hoje,
uma
preocupação ostensiva e decisiva com a verdade da paternidade, procurando
afirmar a filiação para seu reconhecimento conforme a verdade real, biológica, com
vistas a mais eficiente proteção da pessoa do filho.
Com a evolução do conhecimento científico, a averiguação da paternidade
pode ser feita por meio de exames genéticos, pelo método do DNA. Entretanto
constata-se que a paternidade é um fato cultural, social e não simplesmente um fato
13
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito De Família: uma abordagem psicanalítica. Belo Horizonte:
Del Rey, 1999. p. 5-8.
14
CAHALI, Yussef Sahid. Dos Alimentos. São Paulo: RT, 2003. p. 201
33
natural e biológico. A função preponderante da figura paterna não é essencialmente
a reprodutiva. O pai é o transmissor de um nome e de um patrimônio, é aquele que
educa e sustenta, mesmo não sendo necessariamente o biológico.
O reconhecimento da paternidade objetiva não apenas a descoberta da
identidade genética, mas o restabelecimento da dignidade do filho. A finalidade
desse reconhecimento é constituir um relacionamento afetuoso entre pai e filho. A
função paterna é de grande importância para os filhos dentro da convivência familiar.
1.5 Dos alimentos
Para Orlando Gomes15, alimentos são prestações que objetivam satisfazer
as necessidades vitais de quem não pode prover a própria subsistência. A finalidade
da prestação dos alimentos é suprir às necessidades de quem não pode provê-las
por si, seja por motivos de doença ou de deficiência física ou mental, ou trabalho
não auto-sustentável. Fornecer aquilo que lhe é indispensável à manutenção,
assegurando-lhe meios de sustento.
De acordo com César Fiúza16, “considera-se alimento tudo o que for
necessário para a manutenção de uma pessoa, aí incluídos os alimentos naturais,
habitação, educação, vestuário e lazer. A chamada pensão alimentícia, soma em
dinheiro para prover os alimentos deve, em tese, ser suficiente para cobrir todos
esses itens ou parte deles, dependendo se a obrigação do alimentante for integral
ou parcial”.
15
GOMES, Orlando. Direito de família. 3. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1978, p. 15.
FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 2. ed. rev. atual. ampl. Belo Horizonte: Horizonte, 1999.
p. 35.
16
34
Diante do princípio da solidariedade familiar são devidos alimentos aos
parentes, cônjuges, companheiros ou pessoas integrantes de entidades familiares
lastreadas em relações.
Os alimentos dividem-se em naturais ou necessários e civis ou côngruos em
relação a sua natureza jurídica. Os alimentos naturais ou necessários referem-se ao
que é absolutamente indispensável à vida de uma pessoa, tais como, comida,
bebida, casa e etc. Logo os alimentos civis ou côngruos, são aqueles que
compreendem necessidades não essenciais a vida, tais como as intelectuais e
morais, que tendem a nivelar a vida do alimentando a do alimentante.
O direito a alimentos é personalíssimo, irrenunciável, destarte, mesmo que o
credor não exerça lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo
crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora. É também considerado
imprescritível, visto que poderá ser exigido a qualquer tempo pelo alimentado.
A intransmissibilidade é outra característica marcante dos alimentos. A
obrigação alimentar não pode ser estendida da pessoa do devedor a seus herdeiros.
Decorre do poder familiar a obrigação de sustento dos pais em relação aos
filhos menores, enquanto não atingirem a maioridade civil ou por outra causa
determinada pela legislação, art. 22 da Lei n o. 8.069/90.
“Art. 22 Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos
filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de
cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais”.
Quanto à finalidade, os alimentos classificam-se em definitivos, provisionais
e provisórios. Os alimentos definitivos são aqueles cujos valores e formas de
pagamentos são estipulados judicialmente com decisão transitada em julgado.
Os alimentos provisórios são aqueles determinados no decorrer da ação de
alimentos, objetivando suprir as dificuldades do alimentando até serem decretados
35
os alimentos definitivos. Já os provisionais são aqueles decretados em ação
cautelar, comprovando o fumus boni iure e o periculum in mora, cuja finalidade é
igualmente atender de imediato as necessidades do alimentando.
Atingida a maioridade, a obrigação alimentar poderá continuar em
decorrência da relação de parentesco, se comprovada à continuidade da
necessidade do alimentando.
É dever dos pais sustentar e oferecer uma condição digna para filho, uma
vez que este não possui meios de se manter sem a ajuda dos seus genitores.
A propósito do tema, observa-se o seguinte julgado do Tribunal de Justiça
de São Paulo17:
“EMENTA: "ALIMENTOS - Exoneração pretendida - Filha que completa 21
anos, que não tem rendimentos próprios e cursa estabelecimento de ensino
superior - Prestação devida pelo pai - Confirmação da sentença" (Ap. Cív.
125.784-1 TJSP)”.
O inadimplemento da obrigação alimentar pode resultar no constrangimento
à prisão civil, nos termos do art. 5º, inciso LXVII, da Constituição Federal e incidir em
ilícito penal.
A execução dos alimentos dar-se, a priori, por meio de descontos em folha
de pagamento da pessoa obrigada. Nos casos de execução de sentença ou de
decisão, que fixa os alimentos, o juiz mandará, a pedido do credor, citar o devedor
para em três dias, efetuar o pagamento dos alimentos, provar que o fez ou justificar
a impossibilidade de efetuá-lo. No caso da inércia do devedor, o juiz decretar-lhe-á a
prisão pelo prazo de um a três meses, independentemente de prévia manifestação
do representante do Ministério Público. Sendo pagas as prestações alimentícias, o
juiz suspenderá o cumprimento da ordem de prisão.
17
Ap. Cív. 125.784-1, decisão da 1ª Câm. Cív. do TJSP, proferida em 18-9-1990, RT 666/85;
36
A prisão deve ser decretada sempre que estiverem presentes os requisitos
legais ajustados com os ditames do princípio da razoabilidade e com fundamentação
pertinente. Sendo, geralmente, fixado em um mês, e somente quando o devedor for
reincidente no inadimplente poderá o juiz, analisado o caso concreto, fixar prazo
superior ao mínimo legal.
A extinção da obrigação de prestar alimentos ocorre com a morte do
alimentando ou com o desaparecimento de um dos pressupostos do art. 1.695 do
Código Civil.
“Art. 1.695 São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem
bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e
aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do
necessário ao seu sustento”.
37
CAPÍTULO 02
O ABANDONO NA RELAÇÃO PATERNO-FILIAL
Entende-se por abandono, na relação paterno-filial, à falta de amparo e de
assistência aos filhos, à ausência no convívio familiar e o descumprimento do dever
legal de cuidar, previsto na Constituição Federal de 1988.
Segundo o Novo Dicionário Aurélio18, o termo abandono é definido como
“ato ou efeito de abandonar”. Logo, abandonar tem por significado expressões como
“deixar, largar, desamparar, desprezar e não ter interesse”.
A família se transformou no decorrer do tempo, a forma como a infância é
vista e o modo de tratamento dispensado a criança foram modificados com o
surgimento da família hodierna.
Até meados do século XVII, a criança era imperceptível, não tinha qualquer
valor e importância para a própria família. Esse período é marcado pelo abandono
de crianças à própria sorte, um sentimento de infância semelhante ao
contemporâneo entre as famílias, as crianças eram rejeitadas ou abandonadas 19.
A criança significava um imenso sacrifício para as famílias e, “existia e ainda
existe uma gama de soluções para esse problema, que vai do abandono físico ao
abandono moral da criança. Entre os dois extremos, possibilidades diversas e
bastardas, cujos critérios de adoção são essencialmente econômicos” 20.
18
Ferreira, Aurélio Buarque de Holanda. op. cit., p. 5.
ARIÉS, P. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: Zahar, 1981. p 10.
20
BADINTER, E. Um amor conquistado: o mito do amor materno. Rio de Janeiro; Nova fronteira,
1985. p. 64.
19
38
E. Badinter
21
aponta que até o século XVII a prática do abandono não é
respaldada exclusivamente nos problemas de ordem econômica, mas muitas vezes
no próprio egoísmo dos pais. Crianças eram abandonadas com bilhetes em suas
vestes, dizendo particularidades de sua existência, talvez com a intenção de os pais
voltarem a tê-las.
De acordo com M. Poster22,
“A estrutura emocional do lar aristocrático só foi analisada por um punhado
de historiadores. As crianças estavam nas mãos de fâmulos e criados
desde o momento em que chegavam ao mundo. Pais e mães raramente se
preocupavam com os filhos, especialmente durante os primeiros anos
formativos. Os cuidados com os filhos eram considerados abaixo da
dignidade de uma dama aristocrática. As crianças eram consideradas
pequenos animais, não objetos de amor e afeição”.
No período do Brasil colonial, e mesmo durante o Império, havia a roda dos
enjeitados, que eram instaladas em orfanatos ou instituições religiosas, como um
modo de abandonar crianças ainda pequenas sem se saber a identidade de quem
as abandonava23.
Na Europa medieval, onde esse sistema surgiu, funcionava por meio de um
cilindro de madeira, denominado roda dos expostos, onde se depositavam as
crianças enjeitadas, que mais tarde eram recolhidas por alguém do orfanato.
Destarte, em vez de abandonar o bebê indesejado pelas praças ou em latas
de lixo, nas portas de igrejas ou casas de famílias, colocavam-no, na roda dos
enjeitados onde ficava protegido de morrer de frio e fome e de forma anônima.
Em muitos os casos o pai é o responsável pelo abandono. Deixam de
assumir ou reconhecer para si o direito-dever de participar da formação, convivência
21
BADINTER, E. op. cit., p. 69.
POSTER, M. Teoria critica da família. Rio de Janeiro: Zahar, 1979. p. 198.
23
MESGRAVIS, L. A assistência à infância desamparada e a Santa Casa de São Paulo: a roda dos
expostos no século XIX. Revista de História, III, 1976. p. 401-423.
22
39
afetiva e desenvolvimento de seus filhos. A falta da figura paterna, em decorrência
de um abandono material, moral ou afetivo, tem provocado graves seqüelas na
estruturação psíquica dos filhos e que repercute, obviamente, nas relações sociais.
O final do século XIX trouxe muitas mudanças, cujo contexto histórico e
social aponta para uma dimensão em favor da causa do menor, instituindo novas
políticas assistenciais envolvendo intervenções médicas e jurídicas.
A ausência do pai, desinteressado em suprir as necessidades físicas e
emocionais do filho, comumente, é resultado de uma separação ou divórcio
conflituoso dos pais, da formação de uma nova família e/ou da carência de um
planejamento familiar.
No Código Penal, os arts. 244, 246 e 247, tipificam como crime o abandono
material, intelectual e moral. A lei civil prevê pena de penhora e/ou prisão para os
devedores de pensão alimentícia. Porém, o grande prejuízo é ocasionado pelo
abandono moral e afetivo, a omissão do pai no cumprimento de suas funções
paternas: proporcionar segurança, proteção e carinho.
Além disso, outra sanção oriunda do abandono é a destituição do poder
familiar, conforme art. 1.638, inciso II, do Código Civil de 2002. A perda do poder
familiar trata-se de uma medida repressiva, aplicada aos pais mediante decisão
judicial. Neste sentido, aponta a jurisprudência colacionada24:
“Ementa: “DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. ABANDONO DA
CRIANÇA”.
“Se o histórico dos fatos e avaliações técnicas evidenciam a incapacidade
psicológica e comportamental da genitora em criar seu filho, bem como o
abandono intelectual e material, imperiosa a destituição do poder familiar, a
fim de que o menor possa ser inserido em família substituta e desfrutar de
uma vida saudável e equilibrada”. (Ap. cív. 70011343308. Sétima câm. cív.
TJRS)”.
24
Ap. Cív. 70011343308, decisão da 7ª Câm. Cív. do TJRS, proferida em 12-08-1996.
40
2.1 Do abandono material
É considerado crime contra a assistência familiar, tipificado como abandono
material no art. 244 do Código Penal Brasileiro, com redação atualizada pela Lei n.
5.478, de 25 de julho de 1968, deixar de prover, sem justa causa, a subsistência do
cônjuge, ou de filho menor de dezoito anos ou inapto para o trabalho, ou de
ascendente invalido ou maior de sessenta anos, não lhes proporcionando os
recursos necessários ou inadimplindo o pagamento de pensão alimentícia
judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar de socorrer descendente ou
ascendente gravemente enfermo.
É previsto para o crime de abandono material uma pena de um a quatro
anos, e multa de até dez salários mínimos.
A objetividade legal neste delito é a preservação adequada da família,
quanto ao dever de amparo material atribuído aos ascendentes, descentendes e
cônjuges25.
O artigo 244 do Código Penal Brasileiro faz menção a três condutas
delituosas que caracterizam o abandono material. A conduta inicial é a de deixar de
proporcionar ao sujeito passivo o necessário para subsistir. Outra conduta é deixar
de assistir ou socorrer o sujeito passivo gravemente enfermo e, finalmente, praticar o
abandono pecuniário, modalidade que implica na existência de uma sentença
judicial, atribuindo ao sujeito ativo à obrigação de pagar pensão alimentícia. É
necessário que caracterize a falta de motivos contundentes para tal conduta omissa.
25
HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código penal. Vol. 8. Revista forense, 1954. p. 3941.
41
A jurisprudência entende que, se os pais proporcionam os meios de
sustento, condizentes com a realidade, mesmo que insuficientes, não há de falar em
abandono. Neste contexto, exemplifica o acórdão26:
“EMENTA: “ABANDONO MATERIAL - ABANDONO INTELECTUA” –
“Indispensável demonstração do dolo do agente, sendo insuficiente a
demonstração do resultado para que o delito se caracterize. Se a mãe
oportuniza os meios que estão ao seu alcance, com os quais o filho não fica
satisfeito, não há crime”. (Apelação Crime Nº. 298005950, Sexta Câmara
Criminal, Tribunal de Alçada do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado
em 03/09/1998)”.
O parágrafo único, do art. 246 do Código Penal, observa que as mesmas
penas incidem sobre o devedor de alimentos que procura frustrar o pagamento da
pensão alimentícia com a hipótese de fraude, em alguns casos, chega-se a
abandonar injustificadamente o emprego com a finalidade de não possuir meios de
cumprir com a obrigação.
Podem ser considerados sujeitos ativos de tal conduta: os ascendentes
(pais, avós), os descendentes (filhos, netos) e o cônjuge. É admitido neste delito o
concurso de agentes, quando mais de uma pessoa concorre para a concretização
de uma infração penal.
Este crime procede-se mediante ação penal pública incondicionada. Sendo
admissível o arrependimento posterior e a aplicação da suspensão condicional do
processo.
26
Ap. cív. 298005950, decisão da 6º câm. cív. do Tribunal de Alçada do RS, proferida em 03/09/1998.
42
2.2 Do abandono intelectual
O ordenamento jurídico brasileiro assegura que a educação é um direito de
todos e é dever do Estado proporcionar mecanismos para a difusão do
conhecimento através do ensino. A Constituição Federal, em seu art. 205, aponta a
referida afirmativa:
“Art. 205 A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e
sua qualificação para o trabalho”.
Deixar de prover a instrução primária de filho em idade escolar, sem motivos
aparentes e não acompanhar o desenvolvimento dos estudos dos filhos constitui
crime de abandono intelectual. Segundo o Promotor de justiça Francisco Maia
Guedes27, o Ministério Público do Estado do Acre, tem entendido que, o fato de
deixar de levar e buscar os filhos na escola caracteriza o delito, previsto no art. 246
do Código Penal.
O crime de abandono intelectual é tipificado no artigo 246 do Código Penal
Brasileiro. A pena prevista é de quinze dias a um mês de detenção, ou multa.
A priori, os pais que cometem essa conduta são penalizados com o
pagamento de uma multa e/ou prestação de serviços comunitários. Em casos de
reincidência, aplica-se a pena de detenção, acrescida de multa.
27
GUEDES, Francisco Maia. Ministério Público do Estado do Acre. Abandono intelectual.
http://www2.uol.com.br/pagina20/05022005/c_0305022005.htm acesso em 20/08/2007.
43
2.3 Do abandono moral e afetivo
Consentir que menor de dezoito anos, sob sua responsabilidade, guarda ou
vigilância seja assíduo, em casas de jogos, espetáculos impróprios, e ainda, resida
ou trabalhe em casa de prostituição, conviva com pessoas viciadas, viva em
mendicância ou sirva a mendigo para comover as pessoas é crime de abandono
moral. A pena para esse crime é de um a três meses de detenção ou multa,
segundo art. 247 do Código Penal Brasileiro.
O abandono moral versa sobre o crime contra a assistência familiar,
resultante da falta de cuidado ou negligência daquele que tem o dever de guarda e
vigilância do menor de dezoito anos.
Já o abandono afetivo consiste no afastamento de quem detém a obrigação
de amparar, transmitir segurança, proteger e instruir.
Giselda Mª F. Novaes Hironaka28 defini o abandono afetivo, como “omissão
dos pais ou de um deles, pelo menos relativamente ao dever de educação,
entendido este na sua concepção mais ampla, permeada de afeto, carinho, atenção
desvelo”.
Afirma ainda que “[...] os pais devem, assim, desempenhar as funções de
educadores e de autoridades familiares para que a criança possa se formar
enquanto pessoa humana29”.
A Constituição Federal de 1988 dispõe no art. 227, caput, in verbis:
28
HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Pressupostos, elementos e limites ao dever de
indenizar por abandono afetivo. In: PEREIRA, Tânia da Silva; PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A ética
da convivência familiar e sua efetividade no cotidiano dos tribunais. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
p. 136.
29
___ op. cit., p. 136.
44
“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança
e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão”.
O Código Civil de 2002, em seus artigos 1.632 e 1.634, inciso II, versam
sobre a relação entre pais e filhos após a separação dos pais, disciplinando que:
“Art. 1.632. A separação judicial, o divórcio e a dissolução da união estável
não alteram as relações entre pais e filhos senão quando ao direito, que aos
primeiros cabe, de terem em sua companhia os segundos”.
“Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:
II - tê-los em sua companhia e guarda”;
Nesse contexto, o Estatuto da Criança e do Adolescente em determinados
artigos reafirma o assunto, ou seja, o abandono afetivo, o dever e o direito de
relacionamento entre pais e filhos após a separação do casal.
De acordo com Luiz Netto Lobo30 “a afetividade é construção cultural que se
dá na convivência, sem interesse materiais, que apenas secundariamente emergem
quando aquela se extingue”.
O direito da criança em conviver com seus pais está devidamente
regulamentado, no entanto, é notória a ausência de sanção para o descumprimento
deste dever legal, todavia se faz necessário buscar na lei formas de reduzir a prática
do abandono afetivo.
A jurisprudência tem entendido que não se pode obrigar um pai a amar um
filho, não obstante, a Constituição Federal, em seu art. 227, demonstra que é um
dever a convivência familiar, destarte, uma obrigação e se não cumprida, ocasiona
um dano que deve ser reparado.
30
LOBO, Paulo Luiz Netto. op.cit., p. 90.
45
O abandono afetivo, tanto materno quanto paterno acarreta um grande
prejuízo a um filho, causando significativo sofrimento. Neste caso, a perda do poder
familiar, por si só, não é capaz de reparar o dano decorrente do abandono,
implicando ainda em maiores conseqüências.
2.3.1 Conseqüências do abandono afetivo
Atualmente no Brasil, garotos de rua e jovens marginalizados são
conseqüências da pobreza e miserabilidade em que vivem as famílias, da ausência
dos pais, da violência dentro e fora do lar e da inversão de valores morais.
A importância do afeto nas relações familiares expandiu a capacidade de
reflexão dos direitos da personalidade. A afetividade basilar da personalidade e da
dignidade da pessoa humana transformou-se em valor jurídico.
A mulher tem ocupando o lugar de chefe de família, como demonstra a
Pesquisa Mensal de Emprego do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de
04/10/200631, sendo responsáveis pelas contas da casa, pela criação e sustento dos
filhos. Porém, é importante ressaltar que a mãe pode até exercer a figura paterna
dentro do convívio familiar, entretanto, não significa que o pai não seja
imprescindível na vida do filho.
Entre as mulheres que recebem as menores remunerações, destaca-se a
necessidade de sobrevivência e a escassez de alternativas, enunciadas pelo perfil
31
Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios, 2006. Pesquisa
Mensal de Emprego. 04/10/2006.
46
etário mais elevado, pelas grandes responsabilidades familiares enfrentadas pelas
chefes de famílias 32.
O exercício da paternidade é assegurado por lei. O Estatuto da Criança e do
Adolescente institui o direito à filiação e assegura o direito de requerer junto a justiça
o reconhecimento da paternidade, por entender que é determinante para a criança
conhecer sua origem.
Todavia, com o reconhecimento da paternidade imposto por lei, surge à
questão da relação de parentesco repentino entre pai e filho, ocasionando rejeições
e desapontamentos, em virtude da forma em que se iniciou o vínculo de parentesco.
Segundo Donald W. Winnicoot33, “a criança que foi rejeitada experimenta um
resultado altamente frustrante e carregará isso como um enorme e pesado fardo
pelo resto da vida”.
Afirma, ainda que “(...) os filhos abandonados total ou parcialmente pelo pai
têm dificuldade de lidar com sentimentos gerados por esta rejeição, o que acarreta
conseqüências imprevisíveis. Estas crianças apresentam um núcleo depressivo que
pode levá-las a sentimentos de baixa auto-estima, de não serem merecedoras de
amor. Além de gerar sentimentos de ódio e de inveja de difícil manejo” 34.
Uma pesquisa feita com crianças e adolescentes do Programa de Atenção à
Infância e à Adolescência do Centro de Psicologia da Faculdade de Psicologia da
Universidade Federal de Uberlândia (CENPS – UFU)35 verificou que grande parte
das
32
crianças
com
desvios
de comportamento,
agressividade,
indisciplina,
Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – DIEESE. Estudos e
pesquisas: as mulheres e o salário mínimo nos mercados de trabalho metropolitanos. Ano 3, nº. 32.
(março de 2007).
33
WINNICOTT, Donald W. A criança e seu mundo. 6º ed. 1982. p. 131.
34
___ op. cit., p. 135.
35
MELO, Sandra Augusta de. Estudos de Psicologia: características da população infantil atendidas
em triagem no período de 2000 a 2002 numa clinica-escola. Campinas: julho-setembro. 2006.
47
irritabilidade e baixo rendimento escolar foram privadas do convívio paternal.
Contudo, não se trata de uma regra geral.
Todos os filhos independentes da origem são iguais e têm garantido a
convivência familiar, além de que a Constituição Federal afastou qualquer interesse
ou valor que não seja o da afetividade como alicerce da relação entre pai e filho.
Cabe ao judiciário suprir, com dispositivo de lei, a ausência do cumprimento ao
preceito constitucional.
48
CAPÍTULO 03
TEORIA GERAL DA RESPONSABILIDADE CIVIL
A responsabilidade civil é um instituto jurídico afeto ao senso de justiça. A
convivência em sociedade produz uma interação de condutas e interesses, que por
inúmeras vezes, resulta em conflitos, implicando na decorrência de danos que
devem ser reparados.
Não se trata de uma matéria nova disciplinada no direito brasileiro,
entretanto é bastante relevante na atualidade jurídica e expande-se gradativamente
no direito moderno, com proeminentes reflexos nas atividades humanas.
Para Maria Helena Diniz36, “grande é a importância da responsabilidade civil,
nos tempos atuais, por se dirigir à restauração de um equilíbrio moral e patrimonial
desfeito e à redistribuição da riqueza em conformidade com os ditames da justiça,
tutelando a pertinência de um bem, com todas as suas utilidades, presentes e
futuras, a um sujeito determinado”.
Primeiramente, De Plácido e Silva37 traz a pertinente acepção de
responsabilidade:
“Dever jurídico, em que se coloca a pessoa, seja em virtude de contrato,
seja em face de fato ou omissão, que lhe seja imputado, para satisfazer a
prestação convencionada ou para suportar as sanções legais, que lhe são
impostas”.
“Onde quer, portanto, que haja obrigação de fazer, dar ou não fazer alguma
coisa, de ressarcir danos, de suportar sanções legais ou penalidades, há a
responsabilidade, em virtude da qual se exige a satisfação ou o
cumprimento da obrigação ou da sanção”.
36
DINIZ, Maria Helena. op. cit. p. 36
SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. Atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. Rio
de Janeiro: ABDR, 2007. p. 1222.
37
49
Quanto à natureza da responsabilidade poderá ser moral, onde o homem se
sente responsável diante de sua consciência e julga-se culpado pelos próprios atos
cometidos decorrentes de violação da norma moral, e jurídica, que tem a função de
fazer prevalecer à ordem e garantir a liberdade individual e consenso nas relações
entre os homens.
Da responsabilidade jurídica deriva a responsabilidade civil e penal. A
responsabilidade civil consiste na obrigação de reparar o prejuízo feito por violação
de lei ou contratual a terceiros, particular ou ao Estado, logo a penal, é aquela
resultante de um fato criminoso praticado na forma comissiva ou omissiva, trazendo
como conseqüência uma sanção prevista em lei.
Tanto na seara civil quanto na penal, a finalidade é punir o transgressor da
norma legal. Fazer com que o mesmo sinta o peso da responsabilidade de suas
atitudes. Desestimulá-lo a cometer novamente o ato danoso.
Segundo Cavalieri Filho38, etimologicamente versando, a responsabilidade
“exprime a idéia de obrigação, de encargo, contraprestação”. Logo, no sentido
jurídico, “designa o dever que alguém tem de reparar o prejuízo decorrente da
violação de outro dever jurídico”. Enfim, “responsabilidade civil é um dever jurídico
sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever
jurídico originário”.
Ainda, neste contexto, Carlos Roberto Gonçalves39 define, in verbis:
“[...] a palavra ‘responsabilidade’ origina-se do latim respondere, que
encerra a idéia de segurança ou garantia da restituição ou compensação do
bem sacrificado. Teria, assim, o significado de recomposição, de obrigação
de restituir ou ressarcir”.
38
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros
Editores, 2004. p. 24.
39
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 15.
50
De acordo com o referido autor40, vale acrescentar que “a teoria da
responsabilidade civil integra o direito obrigacional, pois a principal conseqüência da
prática de um ato ilícito é a obrigação que acarreta, para o seu autor, de reparar o
dano, obrigação esta de natureza pessoal, que se resolve em perdas e danos”.
Cabe ressaltar, que ato ilícito é aquele que viola uma lei ou um contrato,
tratando-se de um ato material, assim sendo, um delito civil ou criminal. O Código
Civil de 2002, traz a previsão dos atos considerados ilícitos em seu Titulo III do Livro
III, e define-os como sendo “uma ação ou omissão voluntária, negligência, ou
imprudência que viola direito ou causa prejuízo a outrem”, diante do ato antijurídico
procede à responsabilidade.
Nos arts. 927 e 943, o Código Civil dispõe acerca da obrigação de indenizar
e apresenta as possíveis situações que ensejarão a responsabilidade civil. Pois,
além do ato ilícito, existem outros fatores que ensejam a responsabilidade civil.
A responsabilidade civil origina-se da violação das normas jurídicas ou
morais, de atos ou fatos pelos quais o agente contrai a obrigação de fazer retornar o
“status quo ante”. Pressupõe uma relação jurídica entre a pessoa que sofreu o
prejuízo e a que deve repará-lo.
A finalidade do instituto da responsabilidade civil é garantir o direito do
lesado à segurança e servir como sanção civil, através da reparação do dano
causado a vitima. Apresenta como função o ressarcimento, o restabelecimento do
equilíbrio original e a prevenção contra transgressores.
40
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das Obrigações: Parte especial - Responsabilidade civil. 2.
ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 1. (Coleção sinopses jurídicas; v. 6, t. 2).
51
Significante é o entendimento de P. Barcellona, citado apud Luiz Gastão
Paes de Barros Leães41, para qual o instituto da responsabilidade civil “foi concebido
para regular as relações sociais sob o prisma da redistribuição do risco e da
reparação dos danos sofridos”.
Tratando-se do direito de família, é possível afirmar que a responsabilidade
toma adjacências bem mais complexas, sobretudo nas relações de parentesco.
Todo ser humano tem direito ao amparo da família, da sociedade ou mesmo do
Estado, garantido pela Constituição Federal, bem como o Código Civil, dentre outras
normas, almejando proteger tal premissa, trazem insculpidas a proteção de cada
indivíduo, cabendo à família a principal parte desta obrigação, sendo que seu
desrespeito deverá originar as sanções legais ao transgressor.
3.1 Evolução histórica
O prejuízo causado por um indivíduo ao outro, existe desde os primórdios da
civilização. A responsabilidade abrangia ao agrupamento humano. A coletividade
agia como um todo, não se tendo inserido os ideais da individualidade humana,
construindo assim, uma responsabilidade pela reparação do dano também
pertencente ao agrupamento.
Não estando o ser humano individualizado, a responsabilidade por seus atos
recaia sobre toda a coletividade. Era denominada de vingança coletiva, pois se
41
P. BARCELLONA. Diritto privato e processo econômico. Napoli, 1973, p. 325-327. Apud LEÃES,
Luiz Gastão Paes de Barros. Responsabilidade do fabricante pelo fato de produto. São Paulo:
Saraiva, 1978, p.19.
52
caracterizava pela reação conjunta do grupo contra o agressor pela ofensa a um de
seus componentes.
Porém, foi no Direito Romano que o instituto da responsabilidade civil
evoluiu e aprofundou-se no universo jurídico, atribuindo a reparação do dano
causado como uma punição aquele que violasse direito alheio.
A partir dessa evolução, surgiu a reação individual, onde os homens faziam
justiça com as próprias mãos, sob a égide da Lei de Talião, conhecida como
vingança privada.
O regime da Lei de Talião (450 a.C.) tinha como princípio basilar à
reparação do mal pelo mal, ou seja, “olho por olho, dente por dente”, “quem com
ferro fere, com ferro será ferido”. Com intuito de minimizar abusos, o poder público
apenas se manifestava para declarar quando e como a vitima poderia ter direito de
retaliação, acarretando ao lesante dano igual ao que sofreu o lesado. A
responsabilidade era objetiva, não estava sujeito a culpa, revelando-se apenas como
uma reação do lesado contra a causa aparente do dano.
A Lei de Talião encontra registro até mesmo na Bíblia. Assim está escrito em
Êxodo 21: 23-24: “Se houver morte, então pagarás vida por vida, olho por olho,
dente por dente, mão por mão, pé por pé, queimadura por queimadura, ferida por
ferida, golpe por golpe”.
Entre os Hebreus, o Pentateuco, discorre notadamente no Livro de Êxodo,
diversas maneiras de reparação do dano causado, seja material ou moral, onde teria
53
o responsável o dever de reparar pelos resultados advindos, além de prever a
constrição física e a pena capital em casos específicos42.
Por volta do final do século III, a.C., um tribuno da plebe de nome Aquilius,
dirigiu uma proposta de lei ao Conselho da plebe, com vistas a regulamentar a
responsabilidade por atos intrinsecamente ilícitos. Foi votada e aprovada, tornandose conhecida como Lex Aquilia de damno, que veio a estabelecer as bases da
responsabilidade, criando uma forma pecuniária de indenização dos prejuízos, com
base no estabelecimento de seu valor.
A Lex Aquilia tratava-se de uma lei de circunstâncias, provocadas pelos
plebeus que buscavam se proteger contra prejuízos que lhes causavam os patrícios,
nos limites de suas terras.
Por volta do século XVIII, com a estrutura da idéia de dolo e culpa distinguiuse a responsabilidade civil da penal. Mas a teoria da responsabilidade civil somente
se firmou por obra da doutrina.
Isso porque, ao lado da culpa, constituiu-se ante a sua insuficiência para
cobrir todos os prejuízos, como fundamento da responsabilidade civil o risco,
visando à proteção jurídica a pessoa humana, em particular dos trabalhadores e das
vitimas de acidentes, contra a insegurança material.
Contudo, o instituto da responsabilidade civil também evoluiu em face ao seu
fundamento, baseando-se o dever de reparação não só a culpa (subjetivo), como
ainda ao risco (objetivo), estendendo-se a indenização de danos sem existência de
culpa.
42
VILAS-BÖAS, Renata Malta. Direitos na Antigüidade: direito hebraico. Revista Prática Jurídica, ano
6, n. 58, p. 10-14, jan. 2007. p. 11.
54
Cabe ressaltar, o entendimento de Maria Helena Diniz43, à respeito da
evolução, no tocante a extensão da responsabilidade civil:
“o aumento não apenas do indicador de pessoas responsáveis pelos
danos, admitindo-se, ao lado da responsabilidade direta ou por fato próprio
do imputado, a indireta por fatos de animais e coisas sob sua guarda,
fundada em alguns casos na idéia de culpa presumida e em outros, na do
risco, mas também no número de beneficiários da indenização,
substituindo-se ao parente o dependente econômico, e no número de fatos
que ensejam a responsabilidade civil”.
3.2 Espécies de responsabilidade civil
A responsabilidade civil pode ser classificada em distintas espécies, de
acordo com o aspecto em que se analisa.
Quanto ao seu fato gerador, a responsabilidade civil pode ser classificada
em contratual ou extracontratual, também conhecida como aquiliana.
Sob a
perspectiva de seu fundamento, pode ser a responsabilidade subjetiva ou objetiva. E
ainda, relativamente ao agente pode ser considerada direta ou indireta.
3.2.1 Responsabilidade subjetiva e objetiva
Responsabilidade civil, na doutrina subjetiva, é o princípio segundo o qual
cada um responde pela sua própria culpa. Por se caracterizar um fato constitutivo do
direito à pretensão reparatória, caberá ao postulante, sempre, o ônus da prova de
suposta culpa do réu 44.
43
DINIZ, Maria Helena. op. cit. p. 25.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo.
responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 3, p. 15.
44
Novo Curso de Direito Civil:
55
A descrição caracterizadora da responsabilidade subjetiva é a culpa, pois
sem ela não há obrigação de reparação. Os elementos da responsabilidade civil
subjetiva são: o dano, o nexo de causalidade e a culpa.
A teoria subjetiva vem fundada na culpa ou dolo por ação ou omissão, lesiva
a pessoa especifica. Desse modo, a prova da culpa do agente é necessária para
que exista o dever de reparar.
Assim, Rodrigo Mendes Delgado45, afirma em sua obra:
“Na teoria subjetiva o elemento culpa assume o epicentro da controvérsia.
Culpa aqui entendida em seu aspecto amplo, abrangendo tanto o dolo, a
intenção de provocar o resultado, quanto à culpa strictu senso, ou seja, a
negligência, a imprudência e a imperícia (...)”.
Prontamente, a responsabilidade civil objetiva fundamenta-se no risco que
uma determinada atividade oferece a coletividade e nos danos que dessa atividade
possam provir. Sua justificativa plausível está voltada ao social privilegiando o bem
comum.
As culpas in eligiendo e in vigiando obrigavam o sujeito a responder além de
seus próprios atos. Gradativamente formou-se a presunção da culpa, onde o direito
passa a se preocupar com um dever de conduta mais concreto.
A presunção
absoluta de culpa, nada mais é que a renegação da culpa, como também a
abstração da própria culpa para se estabelecer o dever de reparação.
A teoria objetiva não considera o elemento intencional do agente causador
do dano. Não se investiga se o agente teve o intuito ou não de causar um dano a
outra pessoa, ou mesmo se agiu, culposamente.
45
DELGADO, Rodrigo Mendes. O valor do dano moral. 2° ed. Leme: Ed. JH Mizuno, 2005. p. 63
56
Os elementos da responsabilidade objetiva são o dano e o nexo de
causalidade, considerando que a teoria objetiva prescinde a culpa. É irrelevante a
conduta culposa ou dolosa do causador do dano bastando apenas a existência do
nexo causal entre o prejuízo ocasionado e a ação do agente para que passe a existir
o dever de indenizar.
Consta no art. 927 do Código Civil a demonstração implícita da
responsabilidade objetiva, eis que dispõe a obrigatoriedade da reparação, mesmo
que não se comprove a culpa, nos casos onde houver o risco por natureza própria,
previsto em norma.
3.2.2 Responsabilidade contratual e extracontratual
A responsabilidade contratual se oriunda de inexecução de negocio jurídico
bilateral ou unilateral. Procede da existência de relação jurídica voluntária, de
instrumento contratual tácito ou expresso.
Segundo Silvio Rodrigues46 “[...] antes de a obrigação de indenizar emergir,
existe, entre o inadimplente e seu co-contratante, um vínculo jurídico derivado da
convenção [...]”.
A responsabilidade contratual é a que decorre da celebração ou da
execução de um contrato, podendo ser por ato licito ou ilícito. Tal responsabilidade
vem prevista no art. 389 e seguintes do Código Civil e com suas conseqüências
jurídicas expressas no art. 186 do mesmo diploma.
46
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: responsabilidade civil. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 9.
(Coleção Direito Civil; v. 2).
57
A responsabilidade extracontratual, também denominada de aquiliana,
decorre de atos unilaterais de vontade, podendo ser por atos ou fatos lícitos e
ilícitos.
Por sua vez, não vem prevista em contrato, vem estabelecida na própria
letra da norma. Portanto, tem poder erga omnes, existindo a situação que se aplique
à previsão legal.
A responsabilidade extracontratual se configura com o descumprimento, seja
por ato omissivo ou comissivo do agente, de premissa legal ou jurídico, como nos
casos de decisão judicial, não se vinculando a existência de relação contratual,
como nos casos do dever de alimentar.
A responsabilidade por ilícito contratual difere da extracontratual na
composição da natureza da situação ou da relação jurídica que lhes origina. A
primeira implica em um ilícito contratual, que é o ato antijurídico que trata da
promoção ou da execução de um contrato. A seguinte pressupõe um ato
intrinsecamente ilícito, desassociando-se de qualquer contrato ou ato unilateral licito,
ou exercício de direito.
Conforme epílogo de César Fiúza47, “ambas se baseiam no principio que
coíbe a pratica da antijuridicidade, por atentar contra os objetivos maiores do Direito,
quais sejam, a paz, a tranqüilidade, a harmonia, a ordem na vida em sociedade”.
47
FIUZA, César. op. cit., p. 142.
58
3.2.3 Responsabilidade indireta e direta
A responsabilidade civil indireta ou complexa é aquela que se procede de
ato de terceiro, de fato de animal e de coisas inanimadas sob sua guarda, com o
qual o agente está vinculado de forma legal de responsabilidade.
Se a ação praticada for proveniente da própria pessoa imputada, considerase a responsabilidade civil como sendo direita.
3.3 Pressupostos da responsabilidade civil
Para a configuração da responsabilidade civil, alguns pressupostos ou
elementos formadores devem compor o ato. Portanto, conforme o art. 186 do Código
Civil, são os pressupostos: a ação ou omissão, a culpa ou dolo do agente
apresentadas como conduta humana, o dano efetivamente experimentado pela
vítima e a relação de causalidade existente. O dano restará justificado se ausentes
quaisquer destes pressupostos, afastando-se a obrigação de indenizar48.
Cada
um
desses
elementos
possui
grande
importância
para
a
caracterização do instituto da responsabilidade civil e para que a reparação do dano
se faça necessária.
48
SANTOS, Antonio Jeová. Dano moral indenizável. 2. ed. São Paulo: Lejus, 1999. p. 79.
59
3.3.1 Da conduta humana
Toda manifestação de vontade, exteriorizada de forma voluntária, unilateral
ou por acordo de vontades, resulta em ato jurídico. Para considerar a produção de
ato jurídico, o agente deve assumir a atitude de desenvolver determinada conduta,
ou contrariamente, abster-se de praticá-la.
Dentro do âmbito da responsabilidade civil, a ação é a atitude comissiva ou
omissiva do agente que ocasionou um dano. Podemos aplicar analogicamente a
esse pressuposto da responsabilidade civil à terceira Lei de Newton, onde “a toda
ação, corresponde uma reação de mesma intensidade e em sentido contrário”.
Essa conduta humana causadora do dano pode ser negativa ou positiva. Se
for positiva, houve uma ação, uma manifestação de força de um agente que se
canaliza na produção de um evento. Porém, pode o agente causador do dano agir
negativamente ou omissivamente, quando deixa de fazer algo que deveria fazer.
Toda conduta comissiva se consubstancia numa ação que se materializa no
plano concreto, por sua vez, a omissão revela-se numa conduta negativa, surgindo
porque alguém não praticou determinada ação.
Apenas a conduta humana, comissiva ou omissiva, dará causa ao dano.
Porém, o art. 936 do Código Civil de 2002 versa sobre a responsabilidade do
proprietário de animais em cuidar para que este não provoque prejuízos a outrem,
sendo assim, caso venha a configurar algum dano, deverá ser reparado.
Consta ainda que, mesmo independente da conduta do autor, estarão
sujeitas a reparação, aquela conduta derivada por fato da coisa, por ato de terceiros,
dentre outras formas, de acordo com os arts. 932, 937 e 938 do Código Civil.
60
“Art. 932 São também responsáveis pela reparação civil:
I – os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em
sua companhia;
II – o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas
mesmas condições;
III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e
prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;
IV – os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se
albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hospedes,
moradores e educandos;
V – os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até
a concorrente quantia.
Art. 937 O dono de edifício ou construção responde pelos danos que
resultarem de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja
necessidade fosse manifesta.
Art. 938 Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano
proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar
indevido.”
Finalizando, Maria Helena Diniz49 declara que “a ação, elemento constitutivo
da responsabilidade, vem a ser o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito,
voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiros, ou o fato de
animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer
os direitos do lesado”.
3.3.2 Da culpa
A culpa é o elemento fundamental e caracterizador da responsabilidade
subjetiva. A culpa refere-se à violação de um direito subjetivo e enseja a
indenização.
A culpa lato sensu, ou seja, compreendida em seu aspecto mais amplo,
abrange a culpa stricto sensu e o dolo. O dolo ocorre quando uma pessoa age
intencionalmente. Sendo assim, age de tal forma que o resultado que se verifica era
49
DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 39.
61
o esperado e o desejado. Entretanto, a culpa em sentido estrito, não há intenção de
lesar ou uma consciência da lesividade da conduta, porém o dano surge de um ato
imprudente ou negligente do sujeito.
No âmbito do Direito Penal deparamos com características que sustentam a
casuística da culpa: a imprudência, a imperícia e a negligência.
Temos como imprudente aquele que através de uma conduta, afasta-se do
domínio que a apropriada diligencia exige. Logo a imperícia configura-se a partir do
despreparo do agente em exercer determinada função onde conhecimentos técnicos
são inescusáveis para o sucesso da atividade. Enfim, negligente demonstra-se o
agente que na prática revela e caracteriza a omissão, em prejuízo de uma atitude
que deveria ser originalmente positiva.
Em relação à graduação da culpa, Maria Helena Diniz50 classifica em: grave,
leve e levíssima. A culpa grave é aquela que o homem comum com um mínimo de
atenção facilmente evitaria. A culpa leve é aquela que poderia ser evitada com uma
atenção mais acentuada. E ainda, levíssima aquela que apenas seria evitada com
um grau de diligência extraordinário.
Cabe ressaltar, que a autora supracitada, correlaciona paralelo a culpa in
faciendo e in omittendo, a culpa in eligendo, decorrente da má escolha de preposto
ou mandatário, e a culpa in vigilando, decorrente da falta de observância e controle
de ato que incumbe a terceiros sob sua responsabilidade, conforme disciplinadas
nos arts. 1.521, incisos I, II, e III, do Código Civil.
A responsabilidade sem culpa transita em torno da noção de risco. O risco é
inerente a cada atividade humana, podendo ser definido como a possibilidade de
50
DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 41.
62
ocorrerem conseqüências negativas de uma atividade, por meio da qual se procura
obter algum beneficio, inserindo-se no exercício de um ato lícito.
3.3.3 Do dano
O prejuízo, a perda, a diminuição patrimonial que o lesado sofre em seu
patrimônio
denomina-se
dano.
É
inadmissível
qualquer
cogitação
de
responsabilidade subjetiva ou objetiva, sem a ocorrência de um dano. De Plácido e
Silva51, traz uma definição mais ampla, para o termo:
“Deriva do latim damnum, genericamente, significa todo mal ou ofensa que
tenha uma pessoa causado a outrem, da qual possa resultar uma
deteriorização ou destruição à coisa dele ou um prejuízo a seu patrimônio.
Possui, assim, o sentido econômico de diminuição ocorrida ao patrimônio de
alguém, por ato ou fato estranho a sua vontade. Equivale, em sentido, a
perda ou prejuízo”.
O dano é elemento essencial para a formação da obrigação de indenizar.
Em sentido lato, trata-se uma lesão que atinge um bem jurídico, e em sentindo
estrito, o dano é a lesão direta ao patrimônio.
De acordo com Rodrigo Mendes Delgado52, atualmente, há três tipos
fundamentais de danos: o patrimonial, o extrapatrimonial e o moral. Sendo dano
patrimonial, aquele possível de verificação visual, mensurável e de fácil constatação.
Ainda, dano extrapatrimonial, aquele utilizado para designar os danos que se
verificam no meio ambiente, ou no patrimônio da humanidade e demais objetos do
gênero. E finalmente, dano moral, aquele que não se exterioriza no mundo material,
tal qual o patrimônio. Somente o lesado pode aferir a sua extensão.
51
SILVA, De plácido e. op. cit., p. 408.
DELGADO, Rodrigo Mendes. op. cit., p. 55.
52
63
Para a doutrina majoritária, os danos podem ser patrimoniais ou morais.
José de Aguiar Dias53 esclarece que, os danos se distinguem não pela sua essência,
mas pelos efeitos que produzem. O dano patrimonial é sempre aquele que
pressupõe uma ofensa ou diminuição de certos valores econômicos. Entretanto, no
dano moral há uma ofensa a um direito, mas sem prejuízo material. Este atinge
valores imensuráveis, tais como a honra, a imagem, causando dor e sofrimento de
forma injusta à pessoa.
Os danos reflexos ou em ricochetes são aqueles em que um terceiro é
atingido de forma mediata, quando o dano em si atinge imediatamente a outrem.
Estes são reparáveis, desde que, atendam aos requisitos exigidos pelo
ressarcimento dos danos em geral.
3.3.4 Do nexo de causalidade
A palavra nexo demonstra a acepção de ligação, vínculo e/ou união.
Causalidade diz respeito à causa. Nos ditames da responsabilidade civil, causa é o
acontecimento que antecede o resultado lesivo ou mais singelamente, o dano. Desta
forma, dano é o resultado de uma causa.
Nexo de causalidade é o vinculo que serve de ponte entre a causa, ação ou
omissão do agente e o resultado, o efeito desta causa, o dano. Segundo, Rodrigo
Mendes Delgado54, “nexo de causalidade é o laço que une duas pontas dos
acontecimentos. Entrelaça a causa ao efeito, a ação ou omissão ao resultado lesivo,
o dano”.
53
AGUIAR DIAS, José. Da responsabilidade civil. 5º ed. Rio de Janeiro: Forense, 1973. p. 63.
DELGADO, Rodrigo Medes. op. cit., p. 57.
54
64
Não subsiste para o autor55 o dever de indenizar determinada lesão, sem
que entre esta e a conduta desenvolvida demonstre-se a ocorrência de um nexo de
causalidade. A responsabilidade civil não pode existir sem a relação de causalidade
entre o dano e a ação que o provocou.
Silvio Rodrigues56, em sua obra magistral, define nexo de causalidade como
um elo entre o dano e a ação ou omissão que o originou, revelando a causa do
dano, identificando o fato que o produziu.
Gagliano e Pamplona Filho57, apud Serpa Lopes apontam que:
“Uma das condições essenciais à responsabilidade civil é a presença de um
nexo causal entre o fato ilícito e o dano por ele produzido. É uma noção
aparentemente fácil e limpa de dificuldade. Mas se trata de mera aparência,
porquanto a noção de causa é uma noção que se reveste de um aspecto
profundamente filosófico, além das dificuldades de ordem prática quando os
elementos causais, os fatores de produção de um prejuízo, se multiplicam
no tempo e no espaço”.
A não configuração do nexo de causalidade, ou mesmo, o seu rompimento
impedem a formação da responsabilidade civil e por conseguintes a obrigação e
indenizar.
3.4 Finalidades
Encontra-se na responsabilidade civil não apenas o dever de reparar o
prejuízo causado, mas, sobretudo, a finalidade da pacificação social. Destarte, além
da obrigação de reparar, há ainda a necessidade de punir o agente e de
55
DELGADO, Rodrigo Medes. op. cit., p. 59.
RODRIGUES, Silvio. op. cit., p. 33
57
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil:
responsabilidade civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 3, p. 95.
56
65
desestimular este e outros, ao cometimento de atos contrários a norma e a boa
vivência social.
3.4.1 Compensatória
A reparação pecuniária do dano é um combinado de pena e de satisfação
compensatória. Uma indenização desempenha a função compensatória quando o
dano ocasionado pode ser avaliado de maneira aproximadamente exata.
A intenção precípua da responsabilidade civil é a de restituir o ofendido ao
seu estado anterior, a fim de restabelecer o equilíbrio violado. Para Maria Helena
Diniz58, a responsabilidade civil constitui uma relação obrigacional que tem por
objeto a prestação de ressarcimento.
Segundo a aludida autora59, a compensação do dano busca a restauração
de um equilíbrio moral e patrimonial desfeito e à redistribuição da riqueza em
conformidade com os ditames da justiça.
3.4.2 Punitiva
Obrigações originadas de atos ilícitos são aquelas que se constituem por
meio de ações ou omissões culposas ou dolosas do agente, praticadas com infração
a um dever de conduta e das quais resulta dano o outrem. A obrigação que, em
conseqüência, surge é a de indenizar ou ressarcir o prejuízo causado.
58
DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 87.
___ op. cit., p. 89.
59
66
Seja civil ou penalmente, o agente causador do dano não pode ficar impune.
Contudo, este caráter punitivo ou expiatório é ao mesmo tempo contestado, uma vez
que a reparação não tem finalidade de acarretar perda patrimonial ao ofensor, mas
de oferecer uma satisfação ao ofendido.
Os defensores do caráter punitivo da indenização por danos invocam a
chamada “teoria do valor do desestímulo”, segundo a qual, na fixação da
indenização pelos danos sofridos, deve o magistrado estabelecer um valor capaz de
impedir, dissuadir práticas semelhantes, assumindo forma de verdadeira punição
criminal no âmbito civil.
A teoria do valor do desestímulo é um instituto que através da condenação a
um valor considerável, pretende obter, a um só tempo, a punição do ofensor,
desestimulando-o a reincidir no erro e proporcionar um exemplo a sociedade como
meio preventivo.
Carlos Alberto Bittar60 faz menção à teoria, nestes termos:
“Coaduna-se essa postura, ademais, com a própria índole da teoria em
debate, possibilitando que se realize com maior ênfase a sua função
inibidora, ou indutora de comportamentos. Com efeito, o peso do ônus
financeiro é, em um mundo em que cintilam interesses econômicos, a
resposta pecuniária mais adequada a lesionamentos de ordem moral”.
Entretanto, essa teoria de origem norte americana, no ordenamento jurídico
brasileiro não é aceita, por ser considerada incompatível com a realidade brasileira.
Segundo Rodrigo Mendes Delgado61, a teoria do valor do desestímulo macula a
Constituição Federal, ferindo a sistemática do instituto da responsabilidade civil e de
seus princípios norteadores.
60
BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1994. p. 41.
61
DELGADO, Rodrigo Mendes. op. cit., p. 63-64
67
Yussef Said Cahali62 defende a persistência do caráter punitivo em casos de
reparação civil, distinguindo a figura da indenização do prejuízo material da
reparação do dano moral.
3.4.3 Dissuasiva
No ordenamento jurídico brasileiro não se admite a prisão civil, salvo no s
casos previstos em lei. Contudo, encontra-se na responsabilidade a efetiva garantia
de compensação pela lesão ao direito.
A responsabilidade civil não tem a função exclusiva de reparar o dano, ou
seja, de restituir o status quo ante do prejudicado em seu direito, mas, também, de
promover a educação, visando desestimular o agente ao cometimento de atos
danosos. Desempenha, ainda, função de prevenir o dano e de dissuadir o agente a
pratica de novos atos tendentes ao prejuízo de terceiro.
Neste contexto, Maria Helena Diniz63 versa, in verbis:
“[...] se houver prejuízo a um individuo, à coletividade, ou a ambos, turbando
a ordem social, a sociedade reagirá contra esses fatos, obrigando o lesante
a recompor o status quo ante, a pagar uma indenização ou a cumprir pena,
com o intuito de impedir que ele volte a acarretar o desequilibro e de evitar
que outras pessoas o imitem”.
62
CAHALI, Yussef Said. op. cit., p. 233.
DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 94.
63
68
3.5 Excludentes de responsabilidade
Desobriga-se o autor da responsabilidade, impedindo a consolidação do
nexo causal e nos casos de excludentes de ilicitude.
Cabe lembrar que, entende-se por licitude tudo aquilo que o ordenamento
jurídico permite. Assim, De Plácido e Silva64 define:
“Derivado do latim licitus (legítimo, permitido, legal), de licere (ser permitido,
ser possível), em sentido rigorosamente jurídico, quer exprimir tudo aquilo
que se pode fazer, porque não é vedado por lei”.
3.5.1 Da culpa exclusiva da vitima e da culpa concorrente
Julio Fabbrini Mirabete65 aponta a culpabilidade como a reprovabilidade da
conduta típica e antijurídica.
Não se confunde culpa com a culpabilidade. Culpa refere-se “à
inobservância de um dever que o agente devia conhecer e observar66”, e
culpabilidade decorre de um juízo de reprovação do agente diante de uma conduta.
Existindo a culpa exclusiva da vítima, isento estará o agente da
responsabilidade pelo dano causado, não tendo direito a qualquer indenização.
Nestes casos, a vítima arcará com todos os prejuízos, pois o agente causador do
dano é meramente um instrumento do acidente, não podendo cogitar a hipótese de
nexo de causalidade entre a ação e a lesão.
64
SILVA, De Plácido e. op. cit., p.846.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p.
196. (Coleção Curso de Direito Penal, v. 1).
66
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 23.
(Coleção Direito Civil; v. 4).
65
69
A culpa concorrente é aquela que tanto a vítima quanto o autor, concorre
para que o evento lesivo se verifique, cada um com a sua parcela de culpa.
O art. 945 do Código Civil prevê a situação da culpa concorrente,
incumbindo ao autor arcar, civil e criminalmente, com a parcela de sua culpabilidade
no ato danoso. Maria Helena Diniz67 ressalta que a culpa concorrente não faz excluir
o liame de causalidade, somente abranda os efeitos da responsabilidade, posto que
ensejará ao autor e à vítima a indenização pelos danos ocasionados dentro de suas
devidas proporções.
3.5.2 Da imputabilidade
Imputabilidade pressupõe entendimento, capacidade que a pessoa tem de
poder suportar as conseqüências de seus atos. Corroborando com esse
entendimento, De Plácido e Silva versa:
“Imputabilidade. Deriva de imputor, do latim imputare (levar em conta,
atribuir, aplicar), exprime a qualidade do que é imputável. Nestas condições,
seja nos domínios do Direito Civil, Comercial ou Penal, a imputabilidade
revela a indicação da pessoa ou do agente, a quem se deve atribuir ou
impor a responsabilidade, ou a autoria de alguma coisa, em virtude de fato
verdadeiro que lhe seja atribuído, ou de cujas conseqüências seja
responsável.
Desse modo, a imputabilidade mostra a pessoa para que se lhe imponha a
responsabilidade. A imputabilidade, portanto, antecede a responsabilidade.
Por ela, então, é que se chega a conclusão da responsabilidade, para
aplicação da pena ou imposição da obrigação”.
Para que exista responsabilidade por parte do agente causador do dano,
deve haver imputabilidade, ou seja, a capacidade de entendimento da realidade que
o cerca.
67
DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 102
70
Se não há imputabilidade, não poderá haver responsabilidade, no sentido de
se obrigar uma pessoa a reparar o dano causado.
A imputabilidade, muitas vezes, confunde-se com o nexo de causalidade.
Porém, a imputabilidade trata de elementos subjetivos e o nexo causal, de
elementos objetivos, consistentes na ação ou omissão do sujeito.
3.5.3 Do estado de necessidade, legitima defesa e exercício regular
de direito
O Código Penal, em seu art. 24, traz a definição legal de estado de
necessidade:
“Art. 24. Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para
salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem poderia de
outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas
circunstâncias, não era razoável exigir”.
O estado de necessidade apresenta como fundamento, o perigo de um bem
jurídico, que apenas pode ser resguardado com o sacrifício de outro. Surgindo uma
colisão entre dois bens jurídicos, o Estado admite que um deles seja sacrificado,
ante a impossibilidade de preservação de ambos.
Desta forma, existindo uma situação de risco ou de lesão iminente, admitese a proteção de um bem, em detrimento do bem de outrem.
A doutrina apresenta posicionamentos distintos a cerca da natureza do
estado de necessidade. Para Damásio68 o estado de necessidade é um direito
68
JESUS, Damásio de. Código penal brasileiro anotado. 21° ed. rev. E atual. Rio de Janeiro: Saraiva,
2004. p. 98.
71
subjetivo de liberdade, onde o Estado tem a obrigação de reconhecer os efeitos da
causa excludente da antijuridicidade.
Discordando do posicionamento supracitado, Nelson Hungria69 assegura
tratar-se de uma faculdade, pois o estado declara a inexistência de crime na conduta
do sujeito, ressaltando que nenhum dos titulares dos bens em conflito tem a
obrigação de sofrer a lesão de seu interesse.
Quanto à legítima defesa e exercício regular de direito, o Código Civil traz o
art. 188, inciso I, o seguinte texto:
“Art. 188. Não constituem atos ilícitos: I – os praticados em legítima defesa
ou no exercício regular de um direito reconhecido”.
O art. 25 do Código Penal preconiza que “entende-se em legítima defesa
quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão,
atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.
Para a caracterização da legítima defesa, é necessário se fazer presente na
conduta, os seguintes requisitos: agressão atual ou iminente e injusta, direito próprio
ou alheio a ser preservado, repulsa com os meios necessários e uso moderado dos
meios necessários a defesa.
Assim, a legítima defesa é uma defesa legitimada e legalizada pelo
ordenamento jurídico, produzindo efeitos semelhantes tanto na esfera civil, quanto
na penal.
Do mesmo modo à legítima defesa, o exercício regular do direito vem
disposto, no Código Civil, em seu art. 188, inciso I. Praticados sob esta hipótese,
69
HUNGRIA, Nelson. op. cit., p. 201.
72
não deixam os atos de se constituir típicos e antijurídicos. O que se exclui é a
necessidade de ressarcir do dano causado.
3.5.4 Do caso fortuito e força maior
Caso fortuito é aquele evento casual, acidental, que não pode ser previsto.
Força maior é aquela que se produz com uma violência e com uma abruptabilidade,
sendo assim, impossível ao homem, dentro de suas limitadas forças, vencê-las.
O caso fortuito e força maior eliminam a culpabilidade, ante o fato de ser
inevitável.
Segundo Maria Helena Diniz70, ambos possuem dois requisitos: o
objetivo, que se configura na inevitabilidade do evento e o subjetivo, que é a
ausência de culpa na produção do fato.
Tanto no caso fortuito, quanto na força maior, há sempre um acidente que
produz um prejuízo.
Logo se, em decorrência do caso fortuito ou da força maior, houver a
produção de um dano, o lesado ficará irressarcidos, pois, a ninguém poderá ser
imputada a responsabilidade por tais eventos. São eximentes da reparação no
âmbito civil.
Dentre as excludentes de responsabilidade citadas, acrescentam-se como
causas de irresponsabilidade os ofendículos, a violência esportiva, intervenção
médica e cirúrgica e o consentimento do ofendido.
70
DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 109
73
CAPÍTULO 04
DO DANO
4.1 Noções gerais
O dano é um pressuposto fundamental da responsabilidade civil, cuja
definição deve ser compreendida para esclarecer e aprofundar
questões
relacionadas com o tema objeto desta pesquisa.
Aparecida Amarante71 traz a seguinte definição contemporânea e sintetizada
de dano:
“Dano significa todo prejuízo acarretado a um bem jurídico, seja por
diminuição do patrimônio ou do bem-estar”.
Enfim, o dano é o fato objetivo de uma pessoa ou coisa deixar de ser o que
era anteriormente, ou seja, sofrer uma modificação resultante de um prejuízo
ressarcível72.
O dano, na acepção jurídica, pode ser avaliado como o estrago ou a
completa inutilização de um bem patrimonial material de uma determinada pessoa,
uma lesão real e concreta causada à integridade física de outrem, levando em conta
o simples ferimento até a morte, ou ainda, ofensa a integridade moral de uma
pessoa.
Nesse sentido, o ilustre jurista Álvaro Vilaça Azevedo73 apresenta o seguinte
entendimento:
71
AMARANTE, Aparecida. Responsabilidade civil por dano à honra. 4.ed., rev. e atual. Belo
Horizonte: Del Rey, 1998. p. 235.
72
DINIZ, Maria Helena. op cit., p. 58.
74
“[...] a palavra dano tem extensão ilimitada de sentido, representando o
resultado de qualquer espécie de lesão (moral, religiosa, econômica,
política, etc.); entretanto no prisma jurídico, o dano circunscreve-se a
detrimento econômico ou moral”.
É a conseqüência decorrente de ato comissivo ou omissivo do agente,
ocasionando a outra pessoa um sofrimento ou ofensa a si ou a seu patrimônio,
resultando em um desequilíbrio social.
Para Orlando Soares74, o dano em sentido lato, denota todo mal ou ultraje
que tenha uma pessoa causado a outrem, quer em razão da existência de um
vínculo contratual ou extracontratual. Nesse contexto, entende-se que o dano pode
ser tanto aquiliano, que resulta do ato ilícito, como contratual, baseado na ofensa a
obrigação.
4.2 Espécies de danos
Segundo a doutrina, no âmbito dos danos, é plausível apontar, a categoria
dos danos patrimônios e extrapatrimoniais, sendo respectivo o prejuízo econômico,
o sofrimento psíquico e moral, infligidos ao ofendido. Ambos decorrem do ato ilícito,
com perda parcial ou total de seus bens.
Os danos podem ser classificados em positivos e negativos. São danos
positivos aqueles que consistem na diminuição considerável do patrimônio do
credor, também conhecidos como dano emergente. E os negativos, também
73
AZEVEDO, Álvaro Vilaça. Curso de Direito Civil: Teoria geral das obrigações. 7. ed. rev. e atual.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998. p. 238.
74
GOMES, Orlando. Obrigações. 12. ed. São Paulo: Forense, 1998, p 37.
75
chamados de lucro cessante, versam sobre a privação de um ganho que o credor
tinha direito de esperar75.
Outras espécies de danos são mencionadas por Orlando Gomes 76, em sua
magistral obra. Tais como: o dano concreto ou real, que ocorre na alteração efetiva
do bem jurídico afetado, não se verificando nenhuma perda patrimonial. O dano
matemático, que implica em perda de um valor patrimonial, em dinheiro, sendo sua
reparação em prestações suscetíveis de avaliação pecuniária, ainda que por mera
estimativa. E ainda, o dano direto, que produz no bem um prejuízo imediato,
enquanto no dano indireto, esse prejuízo somente é verificado como efeito posterior.
Afirma, com exatidão, José de Aguiar Dias77, que os danos são distinguidos
pelos efeitos que produzem e não pela sua essência. Com base nesse
entendimento, os danos podem ser classificados em duas espécies: morais ou
extrapatrimoniais e materiais ou patrimoniais, que serão abordados em seguida.
4.2.1 Do dano material
O dano material, também cognominado pela doutrina como patrimonial, é
todo detrimento real que atinge os interesses relativos ao patrimônio de outrem.
Consiste na deteriorização ou perda de bens materiais, sendo suscetível de
indenização78.
75
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito civil. São Paulo; Saraiva, 1999. p. 9.
GOMES, Orlando. op. cit., p. 39
77
AGUIAR DIAS, José. op. cit., p. 52.
78
DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 63.
76
76
Afere-se o dano material pela diferença entre o valor do patrimônio do
lesado, atualizado após o prejuízo, e aquele que teria se não houvesse sofrido a
lesão.
O dano material ou patrimonial compreende o dano emergente e o lucro
cessante, expressos no artigo 402 do Código Civil:
“Art. 402 Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e
danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o
que razoavelmente deixou de lucrar”.
Entende-se por dano emergente, aquele dano cuja lesão provoca a
diminuição do patrimônio de forma efetiva e notória.
De acordo com o art. 404 do Código Civil de 2002, as obrigações em
dinheiro, as perdas e danos consistem nos juros de mora e custas. A atualização
monetária logo está pacificada no ordenamento jurídico brasileiro, pois sem a
mesma não haverá indenização adequada ao tempo fixado para o cumprimento da
obrigação.
É oportuno trazer a inteligência do artigo 404 do Código Civil de 2002, que
versa o dano material:
“Art. 404 As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro,
serão pagas com atualização monetária segundo índice oficiais
regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de
advogados, sem prejuízo da pena convencional”.
Entende-se por lucro cessante, o rendimento que o credor deixou de obter,
ou seja, o aumento que o patrimônio teria caso não houvesse o evento danoso, mas
que em virtude da lesão não pode lucrar. Deve-se observar com cautela o princípio
77
da razoabilidade para a fixação da indenização nesses casos, uma vez que esta não
pode ensejar em enriquecimento do credor79.
Considera-se, ainda, lucro cessante, a redução do patrimônio do credor em
face do lucro que deixou de perceber em razão dos atos ilícitos praticados.
Tanto no dano emergente quanto no lucro cessante, há uma redução do
patrimônio da vitima, seja pela deteriorização do bem, ou mesmo, pelos reflexos
causados pelo infrator.
4.2.2 Do dano moral
O prejuízo causado a um bem imaterial, insuscetível de apreciação
econômica é denominado de dano moral ou extrapatrimonial. Para que este dano
seja reparado, é necessário que haja agressão aos direitos da personalidade, com
ou sem reflexos de perda patrimonial.
Dano moral é toda lesão de interesses não patrimoniais, provocado por atos
ilícitos. Esses interesses não patrimoniais podem ser tanto de pessoa física, quanto
de pessoa jurídica80. A propósito do tema, Carlos Alberto Bittar81, afirma que:
“Qualificam-se como morais os danos em razão da esfera da subjetividade,
ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato
violador, havendo-se, portanto, como tais aqueles que atingem os aspectos
mais íntimos da personalidade humana (o da intimidade e da consideração
pessoal), ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua
(o da reputação ou da consideração social)”.
Ainda, Augusto Ferraz de Arruda82 traz a seguinte definição de dano moral:
79
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: Teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. São
Paulo: Atlas, 2001. (Coleção direito civil; v. 2) p. 148.
80
DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 84.
81
BITTAR, Carlos Alberto. op. cit.. p. 72.
78
“Todo fato resultante de um ato contrario ao Direito, que afete de alguma
forma a integridade psíquica do individuo, provocando-lhe a infelicidade,
transitória ou não no tempo, no plano jurídico, é um dano moral.”.
Cabe ressaltar que, desde os primórdios, o dano moral era tratado pela
sociedade. Fazia-se presente na Babilônia, especificamente no Código de
Hamurabi, há 2000 anos a. C., onde era reparado mediante pagamento de um
determinado valor. Ainda, no Código de Manu, havia previsão de reparação para
certos danos extrapatrimoniais.
Em Roma, a reparação por danos morais apenas era admitida nos casos
previstos em lei. Com a descoberta dos direitos personalíssimos, a reparação por
danos morais, passou a ser muito requisitada, surgindo assim, a necessidade de leis
que amparassem tais direitos.
A ressarcibilidade por danos morais continuamente esteve presente, ainda
que indiretamente, sendo positivada no direito brasileiro tardiamente.
Ressalta-se que, no Brasil, mesmo antes da Constituição Federal de 1988, o
Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117/62), a Lei de Imprensa (Lei
5.250/67) e a Lei dos Direitos Autorais (Lei 9.610/98), já consagravam a
reparabilidade por danos morais.
Com o advento da Constituição Federal de 1988, findou-se resistência dos
tribunais, em não admitir a reparabilidade do dano moral, pacificando assim, a
possibilidade real da reparação, até então defendida pela doutrina.
O art. 5º, inciso V, da Constituição Federal de 1988, estatui a reparabilidade
do dano moral, afirmando que:
82
ARRUDA, Augusto F. M. Ferraz de. Dano moral puro ou psíquico.São Paulo: Juarez de Oliveira,
1999. p. 29.
79
“V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além de
indenização por dano moral, material ou à imagem”.
O dano moral está ligado diretamente à dor, que não pode ser mensurada e
tampouco, objeto de valoração. Para alguns doutrinadores, a reparação do dano
moral ensejaria um enriquecimento ilícito e vexatório. Entretanto, a doutrina moderna
e majoritária, entende que o padecimento íntimo, oriundo de uma humilhação e
ofensa, deve ser indenizado, a fim de abrandar o sofrimento e de propiciar meios
propícios para a recuperação do lesado.
O ordenamento jurídico brasileiro admite a reparação do dano moral, tanto
na lesão originaria de obrigação contratual, quanto na decorrente de culpa aquiliana.
O dano moral denota um constrangimento sofrido por alguém, em conseqüência de
uma lesão em direito personalíssimo, causado por outra pessoa de forma ilícita83.
Considera-se bens jurídicos, elementos do direito personalíssimo, o direito a
vida, a liberdade, a honra, a saúde, e ainda, o direito ao nome e a imagem, dentre
outros.
A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso X, assegura que:
“X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação”.
O dano moral é indenizável, tanto quanto o dano patrimonial, podendo ser
acumuláveis. O Superior Tribunal de Justiça, com amparo constitucional, consolidou
a Súmula 37, conforme a qual “são acumuláveis as indenizações por dano material e
moral, oriundos do mesmo fato”.
Atualmente, há dois polêmicos questionamentos em relação ao instituto do
dano moral: o da caracterização do dano moral; e o quantum indenizatório. Na
reparação do dano moral, o juiz deve aferir o grau de seqüela deixada pela lesão,
83
GOMES, Orlando. op. cit., p. 47.
80
atentando para a repercussão do dano na vida da vítima. Ives Gandra Martins84,
descreve alguns aspectos devem ser ponderados pelos julgadores, tais como: a
extensão do dano; a situação patrimonial da imagem do lesado; a situação
patrimonial do ofensor e a sua real intenção.
Ainda, a respeito da reparação do dano moral, Pontes de Miranda85, assim
manifesta:
“Os padecimentos morais devem participar da estimação do prejuízo. O
desgaste dos nervos, a moléstia da tristeza, projetam-se no físico, são
danos de fundo moral e conseqüências econômicas”.
O Código Civil de 2002, ainda, confirma a possibilidade das pessoas físicas
e jurídicas pleitearem indenização por danos patrimoniais e morais, tratando a
questão, em seus artigos 186 e 187, a saber:
“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou
social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.
Assim sendo, inúmeras legislações vêm sendo editadas, expandindo a
possibilidade do ingresso de ações, tais como o Código de Defesa do Consumidor
(Lei 8078/90, art. 6º, incisos VI e VII), o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei
8069/90, art. 17, c/c art. 201, incisos V, VIII e XI), dentre outras86.
84
MANUAL DE INICIAÇÃO AO DIREITO. Ives Gandra Martins e Fernando Passos (coordenadores),
vários autores, p. 159.
85
PONTES DE MIRANDA, Francisco. op. cit., p. 239
86
CAHALI, Yussef Said. op. cit. p. 42.
81
CAPÍTULO 05
DA RESPONSABILIDADE CIVIL POR ABANDONO AFETIVO
5.1 Dos direitos personalíssimos
Os direitos personalíssimos, também cognominados por alguns juristas,
como direitos da personalidade, são aqueles que incorporam a personalidade
humana, desde o seu nascimento com vida, ressalvados as exceções referentes ao
nascituro.
A personalidade é definida por Silvio de Salvo Venosa87, “como um conjunto
de poderes conferidos ao homem, à pessoa, para figurar nas relações jurídicas,
sendo a capacidade a medida da personalidade”.
Entende-se que toda pessoa é capaz de direitos e deveres na esfera civil,
porém a lei impõe limites a essa capacidade. O Código Civil, em seus arts. 3º e 4º,
aborda a respeito da incapacidade absoluta e relativa.
Incapacidade absoluta é aquela que impede a pessoa de participar de
qualquer negócio jurídico, sendo suprida pela representação legal. De acordo com o
art. 3º do Código Civil, são considerados incapazes absolutos: os menores de
dezesseis anos, os que por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o
discernimento necessário para a prática desses atos, e os que mesmo por causa
transitória não puderem exprimir sua vontade.
87
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: parte geral. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003. v. 1, p. 148.
82
De Plácido e Silva88 define a incapacidade relativa como, incapacidade
parcial, ou seja, a que não impede a pessoa de praticar certos atos jurídicos ou da
vida civil, quando permitido por lei ou autorizado por quem, legalmente, compete
assisti-la. São esses os relativamente incapazes: os pródigos, os excepcionais sem
desenvolvimento mental completo, os maiores de dezesseis anos e menores de
dezoito, os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, os que por deficiência mental
tenham o discernimento reduzido, ainda, os falidos, declarados por sentença, quanto
aos interesses, direitos e obrigações da massa.
A proteção dos Direitos da personalidade foi constitucionalizado com o
advento da Lei Maior de 1988, positivando diversos direitos inerentes a proteção da
pessoa humana.
Dentro da perspectiva hodierna, o Código Civil de 2002, traz a previsão
legal de proteção a bens jurídicos integrantes da personalidade humana, mediante
capítulo próprio.
De acordo com José Eduardo Sabo Paes89, podem-se enumerar, segundo o
Código Civil de 2002, os direitos da personalidade da seguinte maneira:
“1 direito à integridade física e moral;
2 direito ao nome;
3 direito à voz;
4 direito à imagem;
5 direito à honra, à boa fama e à respeitabilidade;
6 direito à vida privada ou intimidade”.
Segundo Ives Gandra da Silva Martins90, os direitos da personalidade
correspondem às pessoas humanas em cada sistema básico de sua situação e
atividade social. Cada direito da personalidade corresponde a um valor fundamental,
88
SILVA, De Plácido e. op. cit. p. 722.
PAES, José Eduardo Sabo. Fundações, Associações e Entidades de interesse social. 6º ed. rev.
ampl. e atual. Brasília: Brasília Jurídica, 2006. p. 174-187.
90
MANUAL DE INICIAÇÃO AO DIREITO. Ives Gandra Martins e Fernando Passos (coordenadores),
vários autores, p. 171.
89
83
“a começar pelo valor do próprio corpo, que é condição essencial do que somos, do
que sentimos, percebemos, pensamos e agimos”.
A respeito dos direitos da personalidade, Miguel Reale91 aponta:
“Os direitos da personalidade são aqueles inerentes a pessoa humana, no
qual possui a razão de ser de sua própria existência”.
Como particularidade da condição humana, o direito personalíssimo busca
tutelar a preservação de interesses pessoais, em diferentes aspectos, sendo eles:
físicos, psíquicos e morais92.
Logo em seguida à proteção ao corpo, existe a proteção ao nome, nele está
subentendido o prenome e o sobrenome, não podendo ser exposto ao desprezo
público, por meio de publicações e representações, ainda que não haja intenção
difamatória93. Sendo terminantemente proibido o uso de nome alheio em
propaganda comercial.
Complementando, são protegidos também contra terceiros a divulgação de
escritos de uma pessoa, a transmissão de sua palavra, bem como, ainda, a
publicação e exposição de sua imagem.
Prontamente, o art. 1º da Constituição Federal de 1988, trata dos
fundamentos do Estado Democrático de Direito, enumerando os seguintes direitos
da personalidade: a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do
trabalho e a livre iniciativa.
“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela União indissolúvel
dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
91
REALE, Miguel. Os direitos da personalidade:
artigos. 2004.
Disponível
em:
<http://www.miguelreale.com.br/artigos/dirpers.htm>. Acesso em: 29/mai/2006.
92
MANUAL DE INICIAÇÃO AO DIREITO. Ives Gandra Martins e Fernando Passos (coordenadores),
vários autores, p. 175.
93
REALE, Miguel. op. cit.
84
IV- os valores sociais do trabalho e a livre iniciativa;
V - o pluralismo político.”
Ainda de acordo com o art. 5°, caput e 6º, caput, da Constituição Federal,
são considerados direitos personalíssimos da pessoa: a inviolabilidade da vida
privada, o direito à vida, a liberdade, a igualdade e a segurança.
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: [...]
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o
lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à
infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.”
A finalidade da proteção da vida privada, exteriorizada por regras de direito
objetivo, é proteger os cidadãos de aborrecimentos particulares, mantendo sob sigilo
informações referentes ao seu universo individual e familiar.
Os direitos personalíssimos possuem características próprias que são
invioláveis. São considerados absolutos, devendo ser respeitados por todos e ainda,
irrenunciáveis, salvo nos casos de restrições temporárias, de forma que não haja
violação da dignidade da pessoa humana, tendo como exemplo um artista que cede
a sua imagem para determinados fins.
Outra característica fundamental é a indisponibilidade relativa, onde o titular
do direito pode dispor de um de seus direitos, desde que não seja de forma
permanente.
Os direitos da personalidade são extrapatrimoniais, não tem valor
econômico, porém a sua violação gera um dano moral que está sujeito a
indenização. Ainda, são imprescritíveis, ou seja, não se extinguem em decorrência
85
da omissão do exercício pelo titular do direito, e intransmissíveis, pois não são
objetos de cessão e de sucessão.
Nesse sentido, Carlos Roberto Gonçalves94 expõe:
“Os direitos da personalidade, por não terem conteúdo econômico imediato
e não se destacarem da pessoa de seu titular, distinguem-se dos direitos de
ordem patrimonial. São inerentes à pessoa humana, estando a ela ligados
de maneira perpétua. A sua existência tem sido proclamada pelo direito
natural. Destacam-se, dentre outros, o direito à vida, à liberdade, ao nome,
ao próprio corpo, à imagem e à honra”.
Importante ressaltar que o abandono afetivo, está profundamente vinculado
à personalidade e ao dever de acompanhamento. Nesse sentido Giselda Maria F.
Novaes Hironaka95 assevera que “[...] os pais devem, assim, desempenhar as
funções de educadores e de autoridades familiares para que a criança possa se
formar enquanto pessoa humana”.
5.2 Do princípio da dignidade da pessoa humana e da afetividade
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 1º, inciso III, prevê que o Estado
Democrático de Direito tem como fundamento a dignidade da pessoa humana.
Diante desse princípio inafastável de proteção da pessoa humana,
atualmente fala-se em personalização, repersonalização e despatrimonialização do
94
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil : parte geral. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 58.
(coleção sinopses jurídicas; n.1).
95
HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Pressupostos, elementos e limites ao dever de
indenizar por abandono afetivo. In: PEREIRA, Tânia da Silva; PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A ética
da convivência familiar e sua efetividade no cotidiano dos tribunais. Rio de Janeiro, Forense, 2006.
p. 136.
86
Direito Privado. Ao mesmo tempo em que o patrimônio perde importância, a pessoa
é supervalorizada96.
Ingo Wolfgang Sarlet97 considera o princípio da dignidade humana, em
questão, como “o reduto intangível de cada indivíduo e, neste sentido, a última
fronteira contra quaisquer ingerências externas. Tal afirmação não significa, contudo,
a impossibilidade de que se estabeleçam restrições aos direitos e garantias
fundamentais, mas que as restrições efetivadas não ultrapassem o limite intangível
imposto pela dignidade da pessoa humana”.
O princípio de proteção da dignidade da pessoa humana é o ponto
fundamental de atual discussão no Direito de Família, surgindo como objetivo central
solucionar diversas questões práticas voltadas ao bem-estar da família.
O macroprincípio da dignidade da pessoa humana preside todas as relações
jurídicas. O artigo 5º da Constituição Federal reafirma que todos, sem distinção, são
pessoas humanas que possuem direitos civis, políticos, sociais, econômicos e
culturais, assegurando que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações.
Ainda, o art. 227 da Constituição Federal expõe a essência de uma
prioridade que até então não havia sido objeto de apreciação por texto de lei,
referente ao direito da criança, transcrito a seguir:
“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança
e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-la a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão.”
96
CF. FACHIN, Luiz Edson. Estatuto jurídico do patrimônio mínimo. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.
SARLET, I. W. . Mínimo Existencial e Direito Privado: apontamentos sobre algumas dimensões da
possível eficácia dos direitos fundamentais sociais no âmbito das relações jurídico-privadas.
Revista Trimestral de Direito Civil, v. 29, p. 53-94, 2007.
97
87
Nesse contexto, o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece, ainda,
em seu art. 3º:
“A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais
inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata
esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as
oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico,
mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de
dignidade”.
Em relação ao princípio da afetividade, o afeto é apontado como o principal
fundamento das relações familiares. A Constituição Federal em momento algum faz
menção ao termo afeto como um direito fundamental, porém subentende-se que a
afetividade decorre da valorização constante da dignidade humana.98
Na jurisprudência, o princípio da afetividade vem sendo aplicado de forma
estável, com o reconhecimento da parentalidade socioafetiva, predominante sobre o
vínculo biológico.99 O princípio da afetividade é de grande importância, pois rompe
paradigmas, trazendo a concepção da família de acordo com o meio social.
Segundo Paulo Luiz Netto Lobo100, o princípio da efetividade tem
embasamento jurídico constitucional, não sendo mera petição de princípio, nem fato
exclusivamente sociológico ou psicológico.
O restabelecimento da primazia da pessoa humana, nas relações civis, é o
ponto de partida para a adequação do direito à realidade e aos fundamentos
constitucionais. O princípio da afetividade e a relação paterno-filial observam, dentre
outros aspectos, o princípio da dignidade da pessoa humana.
98
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 4º ed. rev.e atual. Rio Grande do Sul: Revista
dos Tribunais, 2006. p. 66.
99
TJ do Paraná, Apelação Cível 0108417-9, de Curitiba, 2ª Vara de Família. DJ 04/02/2002, Relator
Accácio Cambi.
100
LOBO, Paulo Luiz Netto. op. cit.
88
Ultimamente, tem sido cada vez mais freqüente, a Justiça reconhecer que “a
ausência, o descaso e a rejeição do pai em relação ao filho, violam a sua honra e a
sua imagem”, segundo entendimento do MM. Juiz Mário Romano Maggioni, da
Comarca de Capão da Canoa (RS)101.
A prestação de obrigação alimentar não extingue a obrigação em relação
aos outros deveres implícitos no poder familiar. A guarda e educação dos filhos não
compreendem, apenas, a escolaridade, entretanto, estende-se à convivência
familiar, o amor, o respeito, a dignidade e a presença constante de ambos os
genitores no desenvolvimento da criança.
A relevância do principio da afetividade nas relações familiares ampliou a
capacidade de reflexão dos direitos da personalidade e das relações sociais. Visto
que, a dignidade humana ”repousa na idéia de respeito irrestrito ao ser humano” 102,
a Constituição Federal de 1988 idealizou o homem, nesse sentido como “centro de
referência da ordem jurídica, que se humaniza e legitima imantada pelo valor que se
irradia a partir do princípio da dignidade da pessoa humana” 103.
5.3 Do dano por abandono afetivo
O dano moral por abandono afetivo na relação paterno-filial é um evento
novo no ordenamento jurídico brasileiro. Tal é a complexidade do assunto, que
inúmeras controvérsias surgem no meio jurídico e nos tribunais a respeito do
101
Revista Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre: Síntese, v. 25, p. 148-150. disponível em:
<http:// www.espaçovital.com.br/colunaespaçovital18062004a.htm> acesso em 11.01.2005.
102
___, Porto Alegre: Síntese, v. 25, p. 151- 160.
103
___, Porto Alegre: Síntese, v. 24, p. 110-113.
89
cabimento dos danos morais por negativa de afetividade paterno-materna. Deve-se
ter a devida cautela ao analisar cada caso concreto.
Primeiramente, cabe lembrar a definição de abandono afetivo, segundo o
entendimento de Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka104:
“O abandono afetivo configura-se pela omissão dos pais ou de um deles,
pelo menos relativamente ao dever de educação, entendido este na sua
concepção mais ampla, permeada de afeto, carinho, atenção desvelo”.
Nesse sentido, Álvaro Villaça Azevedo105 entende que, "o descaso entre pais
e filhos é algo que merece punição, é abandono moral grave, que precisa merecer
severa atuação do Poder Judiciário, para que se preserve não o amor ou a
obrigação de amar, o que seria impossível, mas a responsabilidade ante o
descumprimento do dever de cuidar, que causa o trauma moral da rejeição e da
indiferença”.
Ainda, apontando o entendimento de Giselda Maria Fernandes Novaes
Hironaka106, sobre o tema:
“[...] o dano causado pelo abandono afetivo é, antes de tudo, um dano à
personalidade do indivíduo”.
Através de uma análise à luz da Constituição de 1988 podemos afirmar que
dano moral é a “violação do direito à dignidade”. Dessa forma “pode haver ofensa à
dignidade da pessoa humana sem dor, vexame, sofrimento, assim como pode haver
dor, vexame e sofrimento sem violação a dignidade” 107.
104
HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Pressupostos, elementos e limites ao dever de
indenizar por abandono afetivo. In: PEREIRA, Tânia da Silva; PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A ética
da convivência familiar e sua efetividade no cotidiano dos tribunais. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
p. 136.
105
AZEVEDO, Álvaro Villaça. Jornal do Advogado – OAB, São Paulo, n° 289, dez, 2004, p. 14.
106
HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. op. cit., p. 141.
107
___, op. cit., p. 143.
90
Para a mesma autora, três elementos necessitam estar presentes para que
se configure o dever de indenizar, quais sejam, a conduta deliberada ou culposa do
agente, a existência do dano e o nexo conseqüente entre eles, elementos estes
discorridos anteriormente108.
A primeira decisão á respeito do tema em questão, é oriunda do Estado do
Rio Grande do Sul, proferida na Comarca de Capão de Canoas, pelo juiz Mario
Romano Maggioni109, onde um pai foi condenado a pagar uma indenização por
danos morais, correspondente a duzentos salários mínimos, em virtude do
abandono moral e afetivo de sua filha, sentença transitada em julgado e em fase de
execução.
A decisão do magistrado veio fundamentada no art. 22 da Lei 8.069/90.
Considerou ainda, que “a educação abrange não somente a escolaridade, mas
também a convivência familiar, o afeto, amor, carinho, ir ao parque, jogar futebol,
brincar, passear, visitar, estabelecer paradigmas, criar condições para que a
presença do pai ajude no desenvolvimento da criança"110.
Outra decisão é do juiz da 31a Vara Cível de São Paulo, Dr. Luis Fernando
Cirillo111, que também condenou por danos morais um pai, reconhecendo que a
"paternidade não gera apenas deveres de assistência material, e que além da
guarda, portanto independentemente dela, existe um dever, a cargo do pai, de ter o
filho em sua companhia".
Mesmo considerando inviável que um filho ajuíze indenização por danos
morais em face do pai, o ilustre magistrado sentenciante, avaliou que "não se pode
108
___, op. cit., p. 143.
Revista Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre: Síntese, v. 25, p. 148-150. Disponível em:
<http:// www.espaçovital.com.br/colunaespaçovital18062004a.htm> acesso em 11.01.2005.
110
___, op. cit., p. 148-150.
111
31º Vara Civil Central de São Paulo. Processo nº. 000.01.036747-0 – DJ 07.06.2004, in Revista
Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre: Síntese, v. 25, p. 151-160.
109
91
rejeitar a possibilidade de pagamento de indenização do dano decorrente da falta de
afeto simplesmente pela consideração de que o verdadeiro afeto não tem preço,
porque também não tem sentido sustentar que a vida de um ente querido, a honra e
a imagem e a dignidade de um ser humano tenham preço, e nem por isso se nega o
direito à obtenção de um benefício econômico em contraposição à ofensa praticada
contra esses bens”.112
Não obstante, a 4ª Turma, do Superior Tribunal de Justiça, concluiu que não
cabe indenização por dano moral decorrente de abandono afetivo, por quatro votos
a um, dando provimento a recurso especial de um pai de Belo Horizonte para
modificar a decisão do Tribunal de Alçada de Minas Gerais que havia reconhecido a
responsabilidade civil no caso e condenado o pai a ressarcir financeiramente o filho
num valor de 200 salários mínimos.
Na primeira instância, a ação foi julgada improcedente, devido à falta de
comprovação dos danos supostamente causados ao filho.
A 7ª Câmara Cível do Tribunal de Alçada de Minas Gerais, ao apreciar a
apelação, reconheceu o direito à indenização por dano moral e psíquico causado
pelo abandono do pai. Segue o entendimento do aresto colacionado, in verbis:
“INDENIZAÇÃO DANOS MORAIS – RELAÇÃO PATERNO-FILIAL –
PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – PRINCÍPIO DA
AFETIVIDADE. A dor sofrida pelo filho, em virtude do abandono paterno,
que o privou do direito à convivência, ao amparo afetivo, moral e psíquico,
deve ser indenizável, com fulcro no princípio da dignidade da pessoa
humana” (Tribunal de Alçada de Minas Gerais, 7ª Câmara de Direito
Privado, Apelação Cível 408.555-5. Decisão de 01/04/2004. Relator Unias
Silva, v.u.).
A 4ª Turma considerou que a lei apenas prevê como punição, a perda do
poder familiar. Ressaltou o Ministro Fernando Gonçalves113, ao votar que "a
determinação da perda do poder familiar, a mais grave pena civil a ser imputada a
112
TAMG, AC 0408550-5 BH, 7º C.Cív., Rel. Juiz Unias Silva, DJ 01.04.2004.
STJ Resp. 757.411 – MG Rel. Min. Fernando Gonçalves. DJ 27.03.2006.
113
92
um pai, já se encarrega da função punitiva e, principalmente, dissuasória, mostrando
eficientemente aos indivíduos que o Direito e a sociedade não se compadecem com
a conduta do abandono, com o que cai por terra a justificativa mais pungente dos
que defendem a indenização por dano moral"
O Ministro Barros Monteiro114, votou pelo não-conhecimento do recurso do
pai e considerou que a destituição do pátrio poder não interfere na indenização.
Acrescentou ainda, que "ao lado de assistência econômica, o genitor tem o dever de
assistir moral e afetivamente o filho", afirmou. Segundo aludido Ministro, o pai estaria
desobrigado da indenização, apenas se comprovasse a ocorrência de motivo maior
para o abandono.
A Constituição Federal estabelece em seu art. 229 que “os pais têm o dever
de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de
ajudar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.
A norma vincula a
reciprocidade de assistência entre familiares, não apenas em relação à assistência
patrimonial, como também, à afetiva.
A proteção, mencionada no artigo citado, refere-se em seu amplo sentido, ao
amparo e afeto, não sendo apenas segurança material.
Alcionir Urcino Aires Ferreira115, em seu entendimento, aponta que:
“Se não pode o filho ser amado pelo pai enquanto menor, dificilmente terá o
pai o carinho do filho quando deste vier a necessitar em sua velhice. Obrigase a justiça a primar para que as relações familiares tenham valores e
reflexos recíprocos entre os membros para que eles próprios sejam os
principais protetores da entidade familiar”.
114
___, op. cit.
FERREIRA, Alcionir Urcino Aires. O princípio da afetividade e a reparação civil por abandono
paterno-filial. Taguatinga: UCB, 2007.
115
93
O Código Penal Brasileiro estabelece a aplicação de sanções referentes a
prática do abandono de incapaz, segundo o disposto no art. 133.
“Art. 133. Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância
ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos
resultantes do abandono:
Pena – detenção, de seis meses a três anos”.
Ainda, em seu art. 244, cuja redação foi dada pela Lei no 10.741, de 1o de
outubro de 2003, estabelece um pena prevista ao abandono material, versando que:
“Art. 244. Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou
de filho menor de dezoito anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente
inválido ou maior de sessenta anos, não lhes proporcionando os recursos
necessários ou faltando ao pagamento da pensão alimentícia judicialmente
acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer
descente ou ascendente, gravemente enfermo:
Pena – detenção, de um a quatro anos, e multa de uma a dez vezes o maior
salário mínimo vigente no país.”
A afirmação da possível existência do dano no abandono afetivo é unânime
no meio jurídico, mesmo não sendo alguns autores a favor da responsabilização do
agente causador do abandono.
Assim sendo, com embasamento jurídico, no disposto do art. 5 o, inciso V, da
Constituição Federal, é admitida a ação de reparação pela referente lesão.
Os tribunais, embora com certa resistência, começam a perceber a
importância das relações afetivas na família, reconhecendo nas Justiças Estaduais,
o direito e a obrigação da responsabilidade pelo dano afetivo entre parentes. E toda
essa percepção tem colaborado para o reconhecimento da possibilidade do dano
afetivo, porém, ainda não foi o suficiente para coibir tal prática.
94
Os estudiosos do Direito de família têm reverificado esses desvios sociais
almejando alcançar uma solução. O entendimento de Rodrigo da Cunha Pereira116
ratifica, versando que:
“A ausência das funções paternas já se apresenta hoje, inclusive, como um
fenômeno social alarmante, e provavelmente é o que tem gerado péssimas
conseqüências conhecidas por todos nós, como o aumento da delinqüência
juvenil, menores de rua e na rua, etc.”
Ainda, de acordo com Caroline Said Dias117, o acompanhamento do pai em
relação ao desenvolvimento do filho não significa precisamente que este não vá
delinqüir ou que não terá algum outro desvio comportamental, entretanto esta
probabilidade estará diminuída se houver o total desempenho pelo pai em seu dever
de assistência.
5.4 Da finalidade da reparação civil
Na reparação civil não se cogita a hipótese de compra de afeto, nem
tampouco de carinho do pai. Não há quantia em dinheiro capaz de ressarcir o
sofrimento de um filho, em virtude do desprezo e abandono paterno.
Entretanto, a reparação civil tem grande relevância na redução do índice de
filhos desamparados pelo pai. Esse caráter preventivo da responsabilização, faz
com que se evite que outros venham a omitir-se de seus deveres, por meio do
constrangimento pecuniária.
116
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Pai, por que me abandonaste? In: FARIAS, Cristiano Chaves de
(Coord.). Temas atuais e processo de família. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004. p. 389.
117
DIAS, Caroline Said. Os instrumentos jurídicos do direito civil disponíveis para fiscalização do
cumprimento dos deveres parentais. Jus navigandi, Teresina, v.. 9, n. 583, 10 fev. 2005. Disponível
em: <http://jus2.uol.com.br/doutrinatexto.asp?id=6301>. Acesso em: 05 mar. 2007.
95
A reparação pecuniária teria, no dano moral resultante do abandono afetivo,
uma função satisfatória ou compensatória. Todos os prejuízos em face do sofrimento
oriundo do abandono afetivo devem ser ressarcidos, de acordo com a intensidade
e peculiaridades de cada caso concreto.
Os que se opõem a reparação civil por abandono afetivo se posicionam de
acordo com a idéia de que não se pode pagar por tudo mediante o risco de estar
esquecendo-se as questões éticas na aplicação do direito. Trazem, ainda, como
argumento o fato de que a concessão de indenização em casos de abandono afetivo
representaria excessivo alargamento do conceito de danos indenizáveis.
Nesse contexto, Ademir Buitoni118 é determinante ao afirmar que:
“Tudo está se transformando em dano moral. Tudo parece que produz dor
nas pessoas, mas, dentro dessa dor, os interessados parecem que estão
enxergando apenas o dinheiro como meio de reparação”.
Muitos são os casos de abandono afetivo que vêm sendo julgados nos
tribunais do país, pois o pagamento de alimentos e a perda do poder familiar não
desobrigam o dever de afeto do pai em relação ao filho.
Em contraposição, ressalta-se o posicionamento de Luiz Felipe Brasil
Santos119, determina que:
“O desempenho dos pais deve ir muito além de prover o sustento material
do filho, deve abranger a subsistência emocional e a função
psicopedagógica, de educação e assistência. Na medida em que não se
cumpre esse papel, por injustificável ausência paterna, surge o dano que há
de ser reparado”.
Atualmente, alguns consideram a guarda compartilhada, como uma medida
conveniente para a solução do abandono moral e afetivo, buscando assim, uma
118
BUITONI, Ademir. A dor e o dinheiro no dano moral. Ordem dos Advogados do Brasil – Seção de
São Paulo, São Paulo, 2006. Disponível em:
<http://www.oabsp.org.br/asp/esa/comunicacao/esa1.2.3.1.asp?_noticias=67>. Acesso em: 20 jun.
de 2006.
119
SANTOS, Luiz Felipe Brasil. Indenização por abandono afetivo. COAD: Seleções jurídicas, 2005.
96
melhor convivência dos filhos com os seus genitores, principalmente em face de
separação do casal.
Conforme assinala a psicanalista Eliana Riberti Nazareth apud Nehemias
Domingos de Melo, "o afastamento dos pais tenderia a ocorrer em muito menor grau
se a guarda dos filhos fosse compartilhada e se, em lugar do direito de visita, fosse
instituído o direito à convivência".
A destituição do poder familiar não interfere na reparação civil. Ao lado da
assistência econômica, o genitor tem o dever de assistir moral e afetivamente o filho.
A perda do poder familiar, mesmo sendo a mais grave pena civil a ser
imputada a um pai, não se encarrega da função punitiva, sendo o contrário, estimula
a prática do abandono e ainda presenteia ao genitor com a desobrigação de
assistência ao filho.
A perda do poder familiar do pai nestas circunstâncias mostra-se insuficiente
ou de pouco alento para inibir a propagação do abandono por parte dele e de outros
indivíduos como impulso à impunidade. Para aquele que já se afastou do convívio
da prole, a perda do poder familiar se torna mera consagração do que já se havia
configurado, ou seja, o efetivo afastamento, o abandono120.
Contudo o Superior Tribunal de Justiça121 se posicionou em seu artigo
eletrônico, da seguinte forma:
“Embora não sejam muitos os precedentes jurisdicionais consagrando a
tese da indenização no Direito de Família, tradicionalmente fundamentado
no afeto e nos laços parentais, sem dar valor econômico às relações de
família, muda-se neste início de século o paradigma. Nesse mundo
globalizado e mensurável pelo econômico, passa o patrimônio moral a ter
valor materializado em espécie em dinheiro e, como tal, tem a
jurisprudência de, seguindo os passos da doutrina, forçar o legislador a
positivar na legislação o conteúdo desse direito”.
120
FERREIRA, Alcionir Urcino Aires. op. cit.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Responsabilidade civil no direito de família.
Disponível em: <http//:www.stj.gov.br>. Acesso em: 22 jun. 2006.
121
2005.
97
No ordenamento jurídico brasileiro, inúmeros são os dispositivos que
evidenciam a existência do direito dever paterno de cuidar e proteger o filho, não
apenas em seu aspecto físico, como também psíquico.
5.5 Do perigo da monetarização do afeto
O dano moral é de difícil aferição, uma vez que, diz respeito ao íntimo da
pessoa lesionada. Diversos são os aspectos que deverão ser considerados para se
obter um valor que seja razoável e justo, para que possa suprir o dano causado pela
ação ou omissão de terceiros.
Para alguns doutrinadores, a atitude de um pai que não quer ver seu filho é
moralmente reprovável. Todavia, ser a favor de danos morais por negativa deste
amor, seria monetarizar o amor, o afeto.
Teresa Ancona Lopez122 acrescenta que, “é preciso cuidado para não
transformar as relações familiares em relações argentarias, de tal sorte que
dependendo de cada caso concreto, o juiz deverá ser sábio na aplicação do direito
em face de postulações a esse título”. Complementa, ainda, que "é preciso avaliar
como a pessoa elaborou a indiferença paterna. Acredito que só quando ficar
constatado em perícia judicial que o projeto de vida daquele filho foi truncado pelo
abandono, configurando o dano psicológico, é que cabe indenização".
122
LOPEZ, Teresa Ancona. Jornal do Advogado – OAB, São Paulo, n° 289, dez, 2004, p. 13.
98
Ainda, de acordo com a aludida autora123, deve-se distinguir o dano oriundo
do abandono afetivo, com o sentimento de ódio nutrido por uma mãe inconformada,
pois “é muito comum as mães jogarem os filhos contra os pais, quando o certo seria
tentar preservar a imagem paterna".
Ao quantificar o afeto, outras situações podem ensejar a reparação civil.
Decorrente dessa realidade é necessário avaliar com precisão a dimensão do dano,
para que a reparação civil não tenha a sua verdadeira finalidade desvirtuada.
Por isso, os serviços de outros profissionais são utilizados, quando
necessário, ao lado dos juízes para garantir a boa aplicação da norma ao caso
concreto. Nos casos de abandono paterno-filial, psicólogos, pedagogos, médicos,
assistentes sociais, dentre outros, deverão prestar o devido suporte técnico
imprescindível.
Finalizando, destaca-se o entendimento de Nehemias Domingos de Melo 124,
in verbis:
“Em face da jurisprudência que começa e ser formada a respeito do tema,
há que se fazer uma dupla advertência: ao profissional do direito, que tenha
cautela na propositura de ações a esse título e, ao Judiciário, que paute
suas decisões pela prudência e severidade, de tal sorte que não se venha a
dar guarida a sentimento de vingança, onde a criança, apenas e tão
somente, seja usada como instrumento na obtenção de indenizações que,
ao invés de remediar a situação, venha tão somente a atender sentimentos
menores com os quais, com a devida vênia, a Justiça não pode
compactuar”.
123
___, op. cit.
MELO, Nehemias Domingos. Abandono moral: fundamentos da responsabilidade civil. Direitonet,
2005. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/x/19/11/1911/>. Acesso em: 10 jul. 2006
124
99
CONCLUSÃO
São vários os dispositivos legais que corroboram com a existência do direitodever de proteger e cuidar dos filhos no aspecto moral. O dever de um pai não é
limitado apenas à obrigação alimentar, estende-se também à subsistência
emocional.
A afetividade é elemento essencial e indispensável para a formação e
aprimoramento do princípio da dignidade da pessoa humana. Porém, nem sempre
os filhos abandonados pelos pais estão pré-determinados a desenvolver um
comportamento violento ou transtornos de personalidade, entretanto, o desamparo
pode provocar situações que influenciam no seu comportamento.
O Código Civil de 2002 aponta como deveres conjugais o sustento, a guarda
e a educação dos filhos, resguardando sempre o interesse do menor. A ausência de
afetividade e apoio moral constitui ato ilícito em conseqüência do prejuízo ao
desenvolvimento da criança, além de violar norma constitucional.
Não é previsto no ordenamento jurídico brasileiro uma coação direta a
prática do abandono afetivo, apenas a destituição do poder familiar, sanção oriunda
do Direito de família que nada impede a concessão de indenização.
Evidenciado o dano de caráter irreparável, a indenização se torna passível
no âmbito da responsabilidade civil, cuja finalidade ultrapassa a idéia de
compensação, uma vez que busca penalizar o pai que abandonou o filho, além de
coibir a ausência intencional, amenizando assim a falta de afeto.
100
Sem ultrapassar os parâmetros do bom senso, fazendo-se a necessária
justiça, os magistrados, em atenção as suas finalidades para fixar o quantum
indenizatório, devem arbitrá-lo dentro do princípio da razoabilidade, respeitando
elementos como: a posição profissional e social do ofendido, a gravidade do dano,
extensão do dano, a reincidência do ofensor, a condição financeira do ofensor e a
condição financeira do ofendido.
É evidente que a solução legal da reparação pecuniária não é satisfatória
por si só. A responsabilidade em admitir a importância do afeto deve ser direcionada
para o restabelecimento da ação comunicativa, onde os antigos vínculos possam
reconhecer o verdadeiro sentido de criar relacionamentos solidários presentes e
futuros.
O abandono e a deficiência de convívio devem ser tratados não somente por
perícias
judiciais,
contudo
devem adequar-se
no
âmbito
da
metodologia
interdisciplinar com acompanhamento profissional pertinente, capaz de identificar o
dano moral, objetivando a sua mensuração.
Mesmo não havendo previsão legal que coíba o abandono afetivo nas
relações familiares, a justiça não poderá ficar inerte. Devem-se criar mecanismos
que visem resgatar valores sociais e subsídios para que tais práticas possam ser
evitadas.
Cabe ao judiciário acolher e legitimar a questão do abandono moral e
afetivo, suprimindo assim com a disposição legal, a falta da obediência ao preceito
constitucional do sujeito, que necessite da convivência e do afeto para o seu
desenvolvimento.
101
REFERÊNCIAS
AGUIAR DIAS, José. Da responsabilidade civil. 5º ed. Rio de Janeiro: Forense,
1973.
AMARANTE, Aparecida. Responsabilidade civil por dano à honra. 4ª ed. Belo
Horizonte: Del Rey, 1998.
ARIÉS, P. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: Zahar, 1981.
ARRUDA, Augusto F. M. Ferraz de. Dano moral puro ou psíquico. São Paulo: Juarez
de Oliveira, 1999.
AZEVEDO, Álvaro Vilaça. Curso de direito civil: teoria geral das obrigações. 7. ed.
rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.
BADINTER, E. Um amor conquistado: o mito do amor materno. Rio de Janeiro; Nova
fronteira, 1985.
BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. 2. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1994.
______. Direito de família. 2. ed. rev. atual. e ampliada. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2006.
BRASIL. Código Civil. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. In: Vade Mecum
Acadêmico de Direito. 3. ed. São Paulo: Rideel, 2006.
BRASIL. Código de Processo Civil. Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. In: Vade
Mecum Acadêmico de Direito. 3. ed. São Paulo: Rideel, 2006.
BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei n. 2.848, de 07 de dezembro de 1940. In: Vade
Mecum Acadêmico de Direito. 3. ed. São Paulo: Rideel, 2006.
BRASIL. Constituição da República Federativa de 1988. In: Vade Mecum Acadêmico
de Direito. 3. ed. São Paulo: Rideel, 2006.
BRASIL. Lei n. 5.478, de 25 de julho de 1968. In: Vade Mecum Acadêmico de
Direito. 3. ed. São Paulo: Rideel, 2006.
BRASIL. Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e
do Adolescente – ECA e dá outras providências. In: Vade Mecum Acadêmico de
Direito. 3. ed. São Paulo: Rideel, 2006.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 757411/MG, 29 de
novembro de 2005. Relator: Ministro Fernando Gonçalves, Quarta Turma do
Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: <http://www.stj.gov.br>. Acesso em: 22
fev. 2006.
102
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Responsabilidade civil no direito de família.
2005. Disponível em: <http//:www.stj.gov.br>. Acesso em: 22 jun. 2006.
BUITONI, Ademir. A dor e o dinheiro no dano moral. Ordem dos Advogados do
Brasil – Seção de
São Paulo, São Paulo, 2006. Disponível em:
<http://www.oabsp.org.br/asp/esa/comunicacao/esa1.2.3.1.asp?_noticias=67>.
Acesso em: 20 jun. de 2006.
CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
______. Dano Moral. 2. ed. rev. atual. e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2000.
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 5. ed. São Paulo:
Malheiros Editores, 2004.
COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. São Paulo: Martin Claret, 2002. (Coleção
a Obra Prima de Cada Autor. Série Ouro; v. 2).
DASSI, Alice Soares. Indenização ao filho por descumprimento do dever de
convivência familiar. Revista Grupo Integrado, Campos Mourão, 2006.
DELGADO, Rodrigo Mendes. O valor do dano moral. 2° ed. Leme: Ed. JH Mizuno,
2005.
Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – DIEESE.
Estudos e pesquisas: as mulheres e o salário mínimo nos mercados de trabalho
metropolitanos. Ano 3, nº. 32. (março de 2007).
DIAS, Caroline Said. Os instrumentos jurídicos do direito civil disponíveis para
fiscalização do cumprimento dos deveres parentais. Jus navigandi, Teresina, ano 9,
n.
583,
10
fev.
2005.
Disponível
em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrinatexto.asp?id=6301>. Acesso em: 05 mar. 2007.
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 4º ed. rev.e atual. Rio Grande
do Sul: Revista dos Tribunais, 2006.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 17. ed.
São Paulo: Saraiva, 2003. (Coleção Curso de direito civil brasileiro; v. 7).
______. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 18. ed. São Paulo:
Saraiva, 2003. (Coleção Curso de Direito Civil Brasileiro; v. 7).
______. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. 20. ed. São Paulo:
Saraiva, 2005. (Coleção Curso De Direito Civil Brasileiro; v. 5).
FACHIN, Luiz Edson. Da paternidade: relação biológica e afetiva. Belo Horizonte:
Del Rey, 1996.
FERREIRA, Alcionir Urcino Aires. O princípio da afetividade e a reparação civil por
abandono paterno-filial. Taguatinga: UCB, 2007.
103
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da
língua portuguesa. 3. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
FIDOMANZO, Marie Claire Libran. Privar a criança de conviver com o genitor enseja
dano moral. Apase. Disponível em: <http://www.apase.org.br/11241-dano
moral.htm>. Acesso em: 09 mai. 2006.
FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 2 ed. rev. atual. ampl. Belo Horizonte:
Horizonte, 1999.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil:
responsabilidade civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 3.
GOMES, Luiz Roldão de Freitas. Elementos de responsabilidade civil. In: LIRA,
Ricardo Pereira (Coord.). Curso de direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.
GOMES, Orlando. Direito de família. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978.
______. Obrigações. 12. ed. São Paulo: Forense, 1998.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 6. ed. São Paulo: Saraiva,
1995.
______. Direito das Obrigações: Parte especial - Responsabilidade civil. 2. ed. São
Paulo: Saraiva, 2002. (Coleção sinopses jurídicas; v. 6, t. 2).
HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Pressupostos, elementos e limites ao
dever de indenizar por abandono afetivo. In: PEREIRA, Tânia da Silva; PEREIRA,
Rodrigo da Cunha. A ética da convivência familiar e sua efetividade no cotidiano dos
tribunais. Rio de Janeiro, Forense, 2006.
HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código penal. Vol. 8. Revista forense, 1954.
IBGE, Diretoria de Pesquisas, Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios, 2006.
Pesquisa Mensal de Emprego. 04/10/2006.
JESUS, Damásio de. Código penal brasileiro anotado. 21° ed. rev. E atual. Rio de
Janeiro: Saraiva, 2004.
LEITE, Eduardo de Oliveira. Famílias monoparentais: A situação jurídica de pais e
mães separados e dos filhos na ruptura da vida conjugal. 2. ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2003.
LOBO, Paulo Luiz Netto (Coord.). Entidades familiares constitucionalizadas: Família
e cidadania – o novo CCB e a vaccatio legis. Belo Horizonte, 2002.
______. Princípio jurídico da afetividade na filiação. Jus Navigandi, Teresina, ano 4,
n. 41, maio 2000. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=527>.
Acesso em: 22 out. 2007.
104
MADALENO, Rolf. A multa afetiva. In Revista jurídica Del Rey: Especial Afeto, a
ética no Direito de Família e para o Novo Código Civil, p. 33. Belo Horizonte: Del
Rey, 2004.
MANUAL DE INICIAÇÃO AO DIREITO. Ives Gandra Martins e Fernando Passos
(coordenadores), vários autores.
MELO, Nehemias Domingos. Abandono moral – fundamentos da responsabilidade
civil.
Direitonet,
2005.
Disponível
em:
<http://www.direitonet.com.br/artigos/x/19/11/1911/>. Acesso em: 10 jul. 2006.
MELO, Sandra Augusta de. Estudos de psicologia: características da população
infantil atendidas em triagem no período de 2000 a 2002 numa clinica-escola.
Campinas: julho-setembro. 2006.
MESGRAVIS, L. A assistência à infância desamparada e a Santa Casa de São
Paulo: a roda dos expostos no século XIX. Revista de História, III, 1976.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral. 18. ed. São Paulo:
Atlas, 2002. (Coleção Curso de Direito Penal, v. 1).
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. São Paulo; Saraiva, 1999.
NICOLAU JUNIOR, Mauro. Paternidade e coisa julgada: limites e possibilidades à
luz dos direitos fundamentais e dos princípios constitucionais. Curitiba: Juruá, 2006.
NÓBREGA, Airton Rocha. Dos alimentos e sua regulamentação normativa –
comentários ao art. 1964 do Código Civil. Revista Prática Jurídica, ano 5, n. 54, p.
48-49, set. 2006.
OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de
Direito de Família. 2ª ed., 2ª tir. Curitiba: Juruá, 1998.
P. BARCELLONA. Diritto privato e processo econômico. Napoli, 1973, p. 325-327.
Apud LEÃES, Luiz Gastão Paes de Barros. Responsabilidade do fabricante pelo fato
de produto. São Paulo: Saraiva, 1978.
PAES, José Eduardo Sabo. Fundações, associações e entidades de interesse
social. 6º ed. rev. ampl. e atual. Brasília: Brasília Jurídica, 2006
PARIZATTO, João Roberto. Manual prático da responsabilidade civil. São Paulo:
Edipa, 2006.
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de família: uma abordagem psicanalítica. Belo
Horizonte: Del Rey, 1999.
PEREIRA, Tânia da Silva. Direito da criança e do adolescente: uma proposta
interdisciplinar. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 1996.
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. Campinas:
Bookseller, 2000. Vol. 9.
105
PORLICARPO, Douglas. A incompatibilidade da dignidade afetiva e o direito à
sucessão: Uma abordagem do reconhecimento da paternidade extemporânea. Jus
navigandi. Teresina, ano 11, n. 1256, 9 dez. 2006. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9257>. Acesso em: 05 mar. 2007.
POSTER, M. Teoria critica da família. Rio de Janeiro: Zahar, 1979.
REALE, Miguel. Os direitos da personalidade: artigos. 2004. Disponível em:
<http://www.miguelreale.com.br/artigos/dirpers.htm>. Acesso em: 29/mai/2006.
Revista Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre: Síntese, v. 25, p. 148-150.
disponível em: <http:// www.espaçovital.com.br/colunaespaçovital18062004a.htm>
acesso em 11.01.2005
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
(Coleção Direito Civil; v. 6).
______. Direito Civil: responsabilidade civil. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
(Coleção Direito Civil; v. 2).
SANTOS, Antonio Jeová. Dano moral indenizável. 2. ed. São Paulo: Lejus, 1999.
SANTOS, Luiz Felipe Brasil. Indenização por abandono afetivo. COAD: Seleções
jurídicas, 2005.
SARLET, I. W. . Mínimo Existencial e direito privado: apontamentos sobre algumas
dimensões da possível eficácia dos direitos fundamentais sociais no âmbito das
relações jurídico-privadas. Revista Trimestral de Direito Civil, v. 29, 2007.
SCHUH, Lizete Peixoto Xavier. Responsabilidade civil por abandono afetivo: a
valoração do ele perdido ou não consentido. In Revista Brasileira de Direito de
família, v. 8, nº. 35, p. 53-77, abr./maio de 2006.
SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 24. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro.
Editora: Forense, 2004.
THEODORO JUNIOR, Humberto. Dano moral. 4ª ed. São Paulo: Juariz de Oliveira,
2001.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. 3. ed. São Paulo: Atlas,
2003. (Coleção Direito Civil; v. 4).
______. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. São
Paulo: Atlas, 2001. (Coleção direito civil; v. 2).
VILAS-BÖAS, Renata Malta. Direitos na antigüidade: direito hebraico. Revista
Prática Jurídica, ano 6, n. 58, p. 10-14, jan. 2007.
WALD, Arnoldo. Curso de direito civil brasileiro: o novo direito de família. 14. ed. São
Paulo: Saraiva, 2002.
WINNICOTT, Donald W. A criança e seu mundo. 6º ed. 1982.
106
GLOSSÁRIO
Apud: (Loc. lat.) Consoante, conforme, segundo (referência a livro, obra ou autor).
Código de Hamurabi: Codificação das leis sumero-babilônicas, empreendida pelo
rei Hamurabi (1728 – 1688 a.C.), que vigorou por mais de mil anos junto a inúmeros
povos da Antigüidade Oriental. Contendo 282 disposições sobre os diversos ramos
do Direito, acha-se esculpida numa pedra de diorito negro com 2,22 metros,
encontrando-se, presentemente, no Museu do Louvre. Pensava-se que tal código
era a mais antiga legislação codificada da História, mas hoje se sabe que houve
codificações ainda mais remotas, como as dos reis Ur-Nammu (2050-2030 a.C.) e
Lipit-Ishtar (1875-1865 a.C.)
Código de Manu: Codificação das leis da Índia antiga (cerca de 1300 a.C.),
excelente para o estudo da civilização brâmane. Dele constam 18 títulos redigidos
em sânscrito.
Culpa in comittendo: culpa em cometer (conduta comissiva). Sinônimo: culpa in
faciendo
Culpa in eligendo: é a culpa na escolha, pela qual se responsabiliza aquele que
escolheu o terceiro. Ex: patrão que escolheu o empregado.
Culpa in omittendo: culpa em omitir (ou pela omissão) (conduta omissiva).
Culpa in vigilando: é a quebra do dever legal de vigilância. Ex: pai que não vigia
adequadamente seus filhos.
Erga omnes: (Loc. lat.) Dir. Para com todos. Diz-se de ato, lei ou dispositivo que
obriga a todos.
107
Família: Sociedade matrimonial, formada pelo marido, a mulher e os filhos, ou o
conjunto de pessoas ligadas por consangüinidade ou mero parentesco. O atual CC
acaba com qualquer discriminação entre cônjuges e estabelece a igualdade entre os
filhos. A família passa a ser formada pelo casamento religioso, pela união estável ou
comunidade formada por qualquer dos pais com seus descendentes. As mães
solteiras passam a formar família com seus filhos.
Fumus boni iure: (Loc. lat.) Presunção de legalidade, possibilidade da existência de
um direito.
Ilegítimo: a que faltam qualidades ou condições ou requisitos legais para sua
validade, admissão ou reconhecimento.
In vitro: (Loc. lat.) No vidro. Expressão que indica as reações fisiológicas feitas fora
do organismo, em tubos de ensaio.
Juris tantum: (Loc. lat.) Dir. De direito somente. O que resulta do próprio direito e
somente a ele pertence.
Lato sensu: (Loc lat.) No sentido lato, geral.
Legitimo: Derivado do latim legitimus, de lex, exprime o vocábulo, de modo geral,
tudo o que está conforme às leis ou que se apresenta cumprindo as determinações
legais. Nessa razão, possui a mesma significação de legal. E, decorrente, de válido,
puro, perfeito, regular.
Lex de Aquilia de damno: lei de circunstâncias, do século III a.C., provocadas
pelos plebeus que buscavam se proteger contra prejuízos que lhes causavam os
patrícios, nos limites de suas terras. Lei cujo nome foi inspirado em um tribuno da
plebe conhecido como Aquilius.
Múnus: Encargo, emprego ou função.
108
Pentateuco: Do grego, "os cinco rolos", o Pentateuco é composto pelos cinco
primeiros livros da bíblia cristã. Também chamado de Torá, uma palavra da língua
hebraica com significado associado ao ensinamento, instrução, ou especialmente
Lei, uma referência à primeira secção do Tanakh, i.e., os primeiros cinco livros da
Bíblia Hebraica, da autoria de Moisés. Os judeus também usam a palavra Torá num
sentido mais amplo, para referir o ensinamento judeu através da história como um
todo.
Periculum in mora: (Loc. Lat.) Situação de fato que se caracteriza pela iminência
de um dano decorrente de demora de providência que o impeça. Muito utilizada à
expressão em casos de medidas cautelares.
Quantum: Quantidade; Quantificar, mensurar determinado valor.
Status quo ante: (Loc. lat.) Estado anterior à questão de que se trata.
Stricto sensu: (Loc. lat.) No sentido restrito.
109
ANEXO – Recurso Especial Nº. 757.411 – MG (2005/0085464-3)
RELATOR : MINISTRO FERNANDO GONÇALVES
RECORRENTE : V DE P F DE O F
ADVOGADO : JOÃO BOSCO KUMAIRA E OUTROS
RECORRIDO : A B F (MENOR)
ASSIST POR : V B F
ADVOGADO : RODRIGO DA CUNHA PEREIRA E OUTROS
EMENTA
RESPONSABILIDADE CIVIL. ABANDONO MORAL. REPARAÇÃO. DANOS
MORAIS. IMPOSSIBILIDADE.
1. A indenização por dano moral pressupõe a prática de ato ilícito, não
rendendo
ensejo à aplicabilidade da norma do art. 159 do Código Civil de 1916 o
abandono afetivo, incapaz
de reparação pecuniária.
2. Recurso especial conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas a seguir, por maioria, conhecer do recurso e lhe dar provimento. Votou
vencido o Ministro Barros Monteiro, que dele não conhecia. Os Ministros Aldir
Passarinho Junior, Jorge Scartezzini e Cesar Asfor Rocha votaram com o Ministro
Relator.
Brasília, 29 de novembro de 2005 (data de julgamento).
MINISTRO FERNANDO GONÇALVES, Relator
110
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES:
Por ALEXANDRE BATISTA FORTES foi proposta ação ordinária contra
VICENTE DE PAULO FERRO DE OLIVEIRA, seu pai, pleiteando indenização por
danos morais decorrentes do abandono afetivo por ele perpetrado.
Sustenta o autor, nascido em março de 1981, que desde o divórcio de seus
pais em 1987, época do nascimento da filha do recorrente com sua segunda esposa,
por ele foi descurado o dever de lhe prestar assistência psíquica e moral, evitandolhe o contato, apesar de cumprir a obrigação alimentar. Aduz não ter tido
oportunidade de conhecer e conviver com a meia-irmã, além de ignoradas todas as
tentativas de aproximação do pai, quer por seu não comparecimento em ocasiões
importantes, quer por sua atitude displicente, situação causadora de extremo
sofrimento e humilhação, restando caracterizada a conduta omissa culposa a
ensejar reparação.
O genitor, a seu turno, esclarece ser a demanda resultado do inconformismo
da mãe do recorrente com a propositura de ação revisional de alimentos, na qual
pretende a redução da verba alimentar. Aduz ter até maio de 1989 visitado
regularmente o filho, trazendo-o em sua companhia nos finais de semana, momento
em que as atitudes de sua mãe, com telefonemas insultuosos e instruções ao filho
para agredir a meio-irmã, tornaram a situação doméstica durante o convívio
quinzenal insuportável. Relata, além disso, ter empreendido diversas viagens, tanto
pelo Brasil, quanto para o exterior, permanecendo atualmente na África do Sul,
comprometendo ainda mais a regularidade dos encontros. Salienta que, conquanto
não tenha participado da formatura do filho ou de sua aprovação no vestibular,
sempre demonstrou incentivo e júbilo por telefone. Afirma, nesse passo, não ter
ocorrido qualquer ato ilícito.
Em primeira instância (fls. 81/83), o Juiz de Direito da 19ª Vara Cível da
Comarca de Belo Horizonte - MG julga improcedente o pedido inicial, salientando:
"... não haver estabelecido o laudo psicológico exata correlação entre o
afastamento paterno e o desenvolvimento de sintomas psicopatológicos
pelo autor, não tendo detectado o expert sinais de comprometimento
psicológico ou qualquer sintomatologia associada a eventual malogro do
laço paterno filial (fls. 71).
A par de tais conclusões periciais resta inequívoco que, não obstante a
relutância paterna em empreender visitações ao filho afete-lhe
negativamente o estado anímico, tal circunstância não se afigura
111
suficientemente penosa, a ponto de comprometer-lhe o desempenho de
atividades curriculares e profissionais, estando o autor plenamente
adaptado à companhia da mãe e de sua bisavó.
De sua vez, indica o estudo social o sentimento de indignação do autor ante
o tentame paterno de redução do pensionamento alimentício, estando a
refletir, tal quadro circunstancial, propósito pecuniário incompatível às
motivações psíquicas noticiadas na Inicial (fls. 74).
Por outro lado, não se colhe do conjunto probatório descaso intencional do
réu para com a criação, educação e a formação da personalidade do filho,
de molde a caracterizar o estado de abandono a que se refere o art. 395, II,
do Cód. Civil, a determinar, inclusive, a perda do pátrio-poder.
(...)
Tais elementos fático-jurídicos conduzem à ilação pela qual o tormento
experimentado pelo autor tem por nascedouro e vertedouro o traumático
processo de separação judicial vivenciado por seus pais, inscrevendo-se o
sentimento de angústia dentre os consectários de tal embate emocional,
donde inviável inculpar-se exclusivamente o réu por todas as idiossincrasias
pessoais supervenientes ao crepúsculo da paixão."
Interposta apelação, a Sétima Câmara Cível do Tribunal de Alçada do
Estado de Minas Gerais dá provimento ao recurso para condenar o recorrente ao
pagamento de indenização por danos morais no valor de R$44.000,00 (quarenta e
quatro mil reais), entendendo configurado nos autos o dano sofrido pelo autor em
sua dignidade, bem como a conduta ilícita do genitor, ao deixar de cumprir seu dever
familiar de convívio com o filho e com ele formar laços de paternidade. A ementa
está assim redigida:
"INDENIZAÇÃO DANOS MORAIS - RELAÇÃO PATERNO-FILIAL PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA - PRINCÍPIO DA
AFETIVIDADE.
A dor sofrida pelo filho, em virtude do abandono paterno, que o privou do
direito à convivência, ao amparo afetivo, moral e psíquico, deve ser
indenizável, com fulcro no princípio da dignidade da pessoa humana." (fls.
125)
Perante esta Corte VICENTE DE PAULO FERRO DE OLIVEIRA interpõe
recurso especial com fundamento nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional,
sustentando violação ao art. 159 do Código Civil de 1916 e dissídio jurisprudencial.
Aduz não estarem presentes na hipótese os elementos constitutivos do ato ilícito de
modo a embasar uma condenação. Afirma que as dificuldades oriundas de uma
separação e da atividade profissional do pai são fatos normais da vida, não havendo
que se falar em dolo ou culpa.
Foram apresentadas contra-razões (fls. 149/163). Salienta o recorrido não
prescindir o exame do especial do reexame do material fático-probatório, além de
não restar caracterizado o dissídio jurisprudencial, dada a ausência de casos
semelhantes na jurisprudência nacional a ensejar o confronto analítico. Afirma ser
irretocável a decisão objeto do recurso.
112
Ascenderam os autos a este Superior Tribunal de Justiça, por força de
provimento a agravo regimental.
Parecer da Subprocuradoria-Geral da República pelo não conhecimento do
recurso e, acaso conhecido, pelo não provimento (fls. 176/179). São os termos da
ementa:
"RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANO MORAL.
ABANDONO AFETIVO. DESCUMPRIMENTO DE DEVERES PATERNOS.
PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. PRINCÍPIO DA
AFETIVIDADE. ÓBICE DA SÚMULA 07 DO STJ. COMPROVAÇÃO DO
DANO EMOCIONAL E PSÍQUICO SOFRIDO PELO FILHO. Pelo não
conhecimento, e se conhecido, pelo não provimento."
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº. 757.411 - MG (2005/0085464-3)
VOTOS
O EXMO. SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES (RELATOR):
A questão da indenização por abandono moral é nova no Direito Brasileiro.
Há notícia de três ações envolvendo o tema, uma do Rio Grande do Sul, outra de
São Paulo e a presente, oriunda de Minas Gerais, a primeira a chegar ao
conhecimento desta Corte.
A demanda processada na Comarca de Capão da Canoa-RS foi julgada
procedente, tendo sido o pai condenado, por abandono moral e afetivo da filha de
nove anos, ao pagamento de indenização no valor correspondente a duzentos
salários mínimos. A sentença, proferida em agosto de 2003, teve trânsito em
julgado, vez que não houve recurso do réu, revel na ação. Cumpre ressaltar que a
representante do Ministério Público que teve atuação no caso entendeu que "não
cabe ao Judiciário condenar alguém ao pagamento de indenização por desamor" ,
salientando não poder ser a questão resolvida com base na reparação financeira.
O Juízo da 31ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo-SP, a seu turno,
condenou um pai a indenizar sua filha, reconhecendo que, conquanto fuja à
razoabilidade que um filho ingresse com ação contra seu pai, por não ter dele
recebido afeto, "a paternidade não gera apenas deveres de assistência material, e
113
que além da guarda, portanto independentemente dela, existe um dever, a cargo do
pai, de ter o filho em sua companhia".
A matéria é polêmica e alcançar-se uma solução não prescinde do
enfrentamento de um dos problemas mais instigantes da responsabilidade civil, qual
seja, determinar quais danos extrapatrimoniais, dentre aqueles que ocorrem
ordinariamente, são passíveis de reparação pecuniária. Isso porque a noção do que
seja dano se altera com a dinâmica social, sendo ampliado a cada dia o conjunto
dos eventos cuja repercussão é tirada daquilo que se considera inerente à existência
humana e transferida ao autor do fato. Assim situações anteriormente tidas como
"fatos da vida", hoje são tratadas como danos que merecem a atenção do Poder
Judiciário, a exemplo do dano à imagem e à intimidade da pessoa.
Os que defendem a inclusão do abandono moral como dano indenizável
reconhecem ser impossível compelir alguém a amar, mas afirmam que "a
indenização conferida nesse contexto não tem a finalidade de compelir o pai ao
cumprimento de seus deveres, mas atende duas relevantes funções, além da
compensatória: a punitiva e a dissuasória. (Indenização por Abandono Afetivo, Luiz
Felipe Brasil Santos, in ADV - Seleções Jurídicas, fevereiro de 2005).
Nesse sentido, também as palavras da advogada Cláudia Maria da Silva:
"Não se trata, pois, de "dar preço ao amor" – como defendem os que resistem ao
tema em foco - , tampouco de "compensar a dor" propriamente dita. Talvez o
aspecto mais relevante seja alcançar a função punitiva e dissuasória da reparação
dos danos, conscientizando o pai do gravame causado ao filho e sinalizando para
ele, e outros que sua conduta deve ser cessada e evitada, por reprovável e grave.” (
Descumprimento do Dever de Convivência Familiar e Indenização por Danos á
Personalidade do Filho, in Revista Brasileira de Direito de Família, Ano VI, n° 25 –
Ago-Set 2004) .
No caso de abandono ou do descumprimento injustificado do dever de
sustento, guarda e educação dos filhos, porém, a legislação prevê como punição a
perda do poder familiar, antigo pátrio-poder, tanto no Estatuto da Criança e do
Adolescente, art. 24, quanto no Código Civil, art. 1638, inciso II. Assim, o
ordenamento jurídico, com a determinação da perda do poder familiar, a mais grave
pena civil a ser imputada a um pai, já se encarrega da função punitiva e,
principalmente, dissuasória, mostrando eficientemente aos indivíduos que o Direito e
a sociedade não se compadecem com a conduta do abandono, com o que cai por
114
terra a justificativa mais pungente dos que defendem a indenização pelo abandono
moral.
Por outro lado, é preciso levar em conta que, muitas vezes, aquele que fica
com a guarda isolada da criança transfere a ela os sentimentos de ódio e vingança
nutridos contra o ex-companheiro, sem olvidar ainda a questão de que a indenização
pode não atender exatamente o sofrimento do menor, mas também a ambição
financeira daquele que foi preterido no relacionamento amoroso.
No caso em análise, o magistrado de primeira instância alerta, verbis :
"De sua vez, indica o estudo social o sentimento de indignação do autor
ante o tentame paterno de redução do pensionamento alimentício, estando
a refletir, tal quadro circunstancial, propósito pecuniário incompatível às
motivações psíquicas noticiadas na Inicial (fls. 74).
(...)
Tais elementos fático-probatórios conduzem à ilação pela qual o tormento
experimentado pelo autor tem por nascedouro e vertedouro o traumático
processo de separação judicial vivenciado por seus pais, inscrevendo-se o
sentimento de angústia dentre os consectários de tal embate emocional,
donde inviável inculpar-se exclusivamente o réu por todas as idiossincrasias
pessoais supervenientes ao crepúsculo da paixão." (fls. 83)
Ainda outro questionamento deve ser enfrentado. O pai, após condenado a
indenizar o filho por não lhe ter atendido às necessidades de afeto, encontrará
ambiente para reconstruir o relacionamento ou, ao contrário, se verá definitivamente
afastado daquele pela barreira erguida durante o processo litigioso?
Quem sabe admitindo a indenização por abandono moral não estaremos
enterrando em definitivo a possibilidade de um pai, seja no presente, seja perto da
velhice, buscar o amparo do amor dos filhos, valendo transcrever trecho do conto
"Para o aniversário de um pai muito ausente", a título de reflexão (Colocando o "I" no
pingo... E Outras Idéias Jurídicas e Sociais, Jayme Vita Roso, RG Editores, 2005):
"O Corriere della Sera, famoso matutino italiano, na coluna de Paolo Mieli,
que estampa cartas selecionadas dos leitores, de tempos em tempos
alguma respondida por ele, no dia 15 de junho de 2002, publicou uma,
escrita por uma senhora da cidade de Bari, com o título "Votos da filha, pelo
aniversário do pai".
Narra Glória Smaldini, como se apresentou a remetente, e escreve: "Caro
Mieli, hoje meu pai faz 67 anos. Separou-nos a vida e, no meu coração, vivo
uma relação conflitual, porque me considero sua filha ´não aproveitada´.
Aos três anos fui levada a um colégio interno, onde permaneci até a
maioridade. Meu pai deixara minha mãe para tornar a se casar com uma
senhora.
Não conheço seus dois outros filhos, porque, no dizer dele, a segunda
mulher ´não quer misturar as famílias´. Faz 30 anos que nos relacionamos à
distância, vemo-nos esporadicamente e presumo que isso ocorra sem que
saiba a segunda mulher. Esperava que a velhice lhe trouxesse sabedoria e
bom senso, dissipando antigos rancores. Hoje, aos 39 anos, encontro-me
ainda a esperar. Como meu pai é leitor do
Corriere, peço-lhe abrigar em suas páginas meus cumprimentos para meu
pai que não aproveitei."
115
Por certo um litígio entre as partes reduziria drasticamente a esperança do
filho de se ver acolhido, ainda que tardiamente, pelo amor paterno. O deferimento do
pedido, não atenderia, ainda, o objetivo de reparação financeira, porquanto o
amparo nesse sentido já é providenciado com a pensão alimentícia, nem mesmo
alcançaria efeito punitivo e dissuasório, porquanto já obtidos com outros meios
previstos na legislação civil, conforme acima esclarecido.
Desta feita, como escapa ao arbítrio do Judiciário obrigar alguém a amar, ou
a manter um relacionamento afetivo, nenhuma finalidade positiva seria alcançada
com a indenização pleiteada.
Nesse contexto, inexistindo a possibilidade de reparação a que alude o art.
159 do Código Civil de 1916, não há como reconhecer o abandono afetivo como
dano passível de indenização. Diante do exposto, conheço do recurso e lhe dou
provimento para afastar a possibilidade de indenização nos casos de abandono
moral.
EXMO. SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR:.
Sr. Presidente, estou inteiramente de acordo com o voto de V. Exa. Entendo
que essa questão - embora dolorosa nas relações entre pais e filhos, marido e
mulher, nas relações de família em geral - resolve-se no campo do Direito de
Família, exclusivamente. No caso, existe previsão no art. 384, inciso I, quanto à
obrigação dos pais de dirigir a criação e a educação dos filhos e tê-los em sua
guarda e companhia. Mas os arts. 394 e 395 prevêem exatamente a situação em
que, não cumprindo os pais essa obrigação, poderá ocorrer a perda do pátrio poder
a pedido do Ministério Público ou de algum parente. Diz o art. 395:
" Perderá, por ato judicial, o pátrio poder o pai ou mãe que deixar o filho ao
abandono."
Não me parece que isso tenha sido requerido nem pelo Ministério Público
nem por algum parente, notadamente a mãe, em nome de quem ele estava sob a
guarda direta, porque, aparentemente, o pai se ausentou.
Na hipótese de perda do pátrio poder, a tutela é dada em substituição, nos
termos do art. 406, I, também do Código Civil anterior. Parece-me, pois, que não é
116
hipótese de ato ilícito. Não é dessa forma que se enfrentaria tal situação. A
legislação de família prevê institutos específicos, inclusive em relação às
necessidades do filho na lei de alimentos. Aqui, ressalto, foram prestados os
alimentos.
Com essas considerações apenas adicionais, acompanho o voto de V. Exa.
no sentido de conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento para julgar
improcedente a ação.
VOTO-VENCIDO
O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO:
Sr. Presidente, rogo vênia para dissentir do entendimento manifestado por V.
Exa. e pelos eminentes Ministros Aldir Passarinho Junior e Jorge Scartezzini.
O Tribunal de Alçada de Minas Gerais condenou o réu a pagar 44 mil reais
por entender configurado nos autos o dano sofrido pelo autor em sua dignidade,
bem como por reconhecer a conduta ilícita do genitor ao deixar de cumprir seu dever
familiar de convívio e afeto com o filho, deixando assim de preservar os laços da
paternidade. Esses fatos são incontroversos. Penso que daí decorre uma conduta
ilícita da parte do genitor que, ao lado do dever de assistência material, tem o dever
de dar assistência moral ao filho, de conviver com ele, de acompanhá-lo e de dar-lhe
o necessário afeto.
Como se sabe, na norma do art. 159 do Código Civil de 1916, está
subentendido o prejuízo de cunho moral, que agora está explícito no Código novo.
Leio o art. 186:
"Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,
violar direito ou causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral,
comete ato ilícito."
Creio que é essa a hipótese dos autos. Haveria, sim, uma excludente de
responsabilidade se o réu, no caso o progenitor, demonstrasse a ocorrência de força
maior, o que me parece não ter sequer sido cogitado no acórdão recorrido. De
maneira que, no caso, ocorreram a conduta ilícita, o dano e o nexo de causalidade.
O dano resta evidenciado com o sofrimento, com a dor, com o abalo psíquico sofrido
pelo autor durante todo esse tempo.
117
Considero, pois, ser devida a indenização por dano moral no caso, sem
cogitar de, eventualmente, ajustar ou não o quantum devido, porque me parece que
esse aspecto não é objeto do recurso.
Penso também, que a destituição do poder familiar, que é uma sanção do
Direito de Família, não interfere na indenização por dano moral, ou seja, a
indenização é devida além dessa outra sanção prevista não só no Estatuto da
Criança e do Adolescente, como também no Código Civil anterior e no atual.
Por essas razões, rogando vênia mais uma vez, não conheço do recurso
especial.
O SR. MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA:
Sr. Presidente, é certo que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais pontificou
que o recorrido teria sofrido em virtude do abandono paterno; são fatos que não
podem ser desconstituídos. E é justamente com base nesses fatos que aprecio o
que está ora posto. Penso que o Direito de Família tem princípios próprios que não
podem receber influências de outros princípios que são atinentes exclusivamente ou
– no mínimo – mais fortemente - a outras ramificações do Direito. Esses princípios
do Direito de Família não permitem que as relações familiares, sobretudo aquelas
atinentes a pai e filho, mesmo aquelas referentes a patrimônio, a bens e
responsabilidades materiais, a ressarcimento, a tudo quanto disser respeito a
pecúnia, sejam disciplinadas pelos princípios próprios do Direito das Obrigações.
Destarte, tudo quanto disser respeito às relações patrimoniais e aos efeitos
patrimoniais das relações existentes entre parentes e entre os cônjuges só podem
ser analisadas e apreciadas à luz do que está posto no próprio Direito de Família.
Essa compreensão decorre da importância que tem a família, que é alçada à
elevada proteção constitucional como nenhuma outra entidade vem a receber, dada
a importância que tem a família na formação do próprio Estado. Os seus valores são
e devem receber proteção muito além da que o Direito oferece a qualquer bem
material. Por isso é que, por mais sofrida que tenha sido a dor suportada pelo filho,
por mais reprovável que possa ser o abandono praticado pelo pai – o que, diga-se
de passagem, o caso não configura - a repercussão que o pai possa vir a sofrer, na
área do Direito Civil, no campo material, há de ser unicamente referente a alimentos;
118
e, no campo extrapatrimonial, a destituição do pátrio poder, no máximo isso. Com a
devida vênia, não posso, até repudio essa tentativa, querer quantificar o preço do
amor. Ao ser permitido isso, com o devido respeito, iremos estabelecer gradações
para cada gesto que pudesse importar em desamor: se abandono por uma semana,
o valor da indenização seria "x"; se abandono por um mês, o valor da indenização
seria "y", e assim por diante. Com esses fundamentos, e acostando-me ao que foi
posto pelo eminente Ministro Fernando Gonçalves, Relator deste feito, e pelos Srs.
Ministros Aldir Passarinho
Junior e Jorge Scartezzinni, peço vênia ao eminente Sr. Ministro Barros
Monteiro para conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento.
119
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número Registro: 2005/0085464-3 REsp 757411 / MG
Números Origem: 20000624650 200401427225 4085505 633801
PAUTA: 22/11/2005 JULGADO: 29/11/2005
Relator
Exmo. Sr. Ministro FERNANDO GONÇALVES
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro FERNANDO GONÇALVES
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. DURVAL TADEU GUIMARÃES
Secretária
Bela. CLAUDIA AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECK
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : V DE P F DE O F
ADVOGADO : JOÃO BOSCO KUMAIRA E OUTROS
RECORRIDO : A B F (MENOR)
ASSIST POR : V B F
ADVOGADO : RODRIGO DA CUNHA PEREIRA E OUTROS
ASSUNTO: Civil - Responsabilidade Civil - Indenização - Ato Ilícito - Dano Moral
SUSTENTAÇÃO ORAL
DR. JOÃO BOSCO KUMAIRA, pelo Recorrente.
DR. RODRIGO DA CUNHA PEREIRA, pelo recorrido.
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe
na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por maioria, conheceu do recurso e deu-lhe provimento, nos termos
do voto do Sr. Ministro Relator. Votou vencido o Sr. Ministro Barros Monteiro, que
dele não conhecia.
Os Srs. Ministros Aldir Passarinho Junior, Jorge Scartezzini e Cesar Asfor
Rocha votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 29 de novembro de 2005
CLAUDIA AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECK
Secretária
Documento: 595269 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 27/03/2006
120
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE BRASÍLIA
LUCELY DE SOUZA MENEZES
RESPONSABILIDADE CIVIL POR ABANDONO AFETIVO
NA RELAÇÃO PATERNO FILIAL
Brasília
2007
121
LUCELY DE SOUZA MENEZES
RESPONSABILIDADE CIVIL POR ABANDONO AFETIVO
NA RELAÇÃO PATERNO FILIAL
Brasília
2007
Download

Lucely de Souza Menezes