O BIBLIOTECÁRIO ESCOLAR E A GESTÃO DE MÚLTIPLOS ESPAÇOS: A
EXPERIÊNCIA DE BELO HORIZONTE
Lília Virgínia Martins Santos (PBH) - [email protected]
Palavras-chave: Biblioteca escolar, Bibliotecários escolares, Gestão de bibliotecas,
Educação
Introdução:
Os desafios na gestão da biblioteca escolar devem ser pensados levando em
consideração as características da instituição que a abriga.
A estrutura organizacional das escolas de ensino fundamental já está de
alguma forma consolidada. Na configuração atual, e que perdura há décadas, os
diálogos tendem a acontecer no trinômio direção-coordenação pedagógicaprofessores. As decisões sobre a organização da prática pedagógica e a elaboração
de projetos e planos de melhoria da aprendizagem costumam ser tomadas pelos
responsáveis pela organização da escola, sem muita interferência de outros
setores.
Quando o bibliotecário está ciente da sua função educativa e aproxima-se dos
agentes pedagógicos, precisa inicialmente esclarecer a natureza de sua contribuição
para a aprendizagem. O trabalho de defesa da biblioteca deve acontecer também
dentro da própria instituição.
A visão tradicional da biblioteca silenciosa e delivery de livros é um obstáculo
para o entendimento de uma nova configuração que contemple seu potencial
educativo.
A prática tem demonstrado o massivo uso da biblioteca por parte dos
professores como apoio para a elaboração de seus planos de aula em questões
pontuais, ou seja, quando é necessária alguma bibliografia para um tópico do
currículo que está sendo trabalhado no momento. Ou então, as solicitações de
momentos lúdicos e voltados para a narração e contação de histórias como as
únicas possibilidades de uso do espaço.
Romper esta realidade é um grande desafio. É mais do que oportuna uma
nova configuração dos equipamentos da escola e que eles sejam usados com o
propósito de oferecer aos estudantes possibilidades de melhorar seu desempenho.
O Projeto Mobilizador, elaborado pelo Conselho Federal de Biblioteconomia, aponta
a importância da biblioteca na vida escolar dos alunos:
“a existência da biblioteca na escola torna-se indispensável
para a formação do indivíduo. (...) Não é só necessário
disponibilizar acervos mas, acima de tudo, viabilizar o acesso
ao conjunto de saberes que este acervo possui para que, a
partir do contexto da escola, do seu projeto pedagógico e da
cultura geral que compõe tal conjunto de saberes que
fundamentam e dão sentido ao modo de vida e à existência de
cada membro da comunidade escolar, a biblioteca possa
contribuir para criar mecanismos capazes de promover a
superação das dificuldades de modo a alcançar os objetivos
desejados pela proposta pedagógica desenvolvida no âmbito
da escola”.
(SISTEMA CRB/CRB, 2008, p. 07)
Relato de experiência:
A gestão das bibliotecas escolares da Rede Municipal de Educação de Belo
Horizonte (RME/BH) é feita por bibliotecários desde 1997, quando foi implantado um
programa de revitalização. As bibliotecas foram avaliadas, os acervos passaram por
uma seleção com descarte de livros didáticos e obsoletos e reorganização do
espaço físico.
O quadro de pessoal é composto de bibliotecários (com formação em
biblioteconomia), auxiliares de biblioteca (concursados de nível médio), contando
também com a ajuda de professores em redaptação funcional.
O Programa de Bibliotecas é vinculado à Gerência de Política Pedagógica da
Secretaria de Educação e possui uma Coordenação Geral. Em cada escola há um
auxiliar de biblioteca por turno e os bibliotecários atuam como coordenadores. Eles
são lotados em bibliotecas-polo e têm a função de gerenciar, além deste espaço,
outras 4 ou 5 bibliotecas na sua região (as chamadas bibliotecas coordenadas). Este
acompanhamento é feito através de visitas periódicas agendadas algumas vezes por
mês para monitorar o andamento dos trabalhos.
Neste cenário, apresenta-se o grande desafio para o bibliotecário: como atuar
de maneira igualitária em todos estes espaços? Há um grande abismo entre o
desejado e o que é possível fazer. Algumas questões apresentam-se diariamente na
condução do Programa de Bibliotecas:
-Alternância no cargo de auxiliar de biblioteca. A equipe está sempre defasada
com a constante exoneração dos profissionais;
-Execução de tarefas que não estão diretamente ligadas com a questão
pedagógica (gestão de livros didáticos, mau uso do espaço, problemas de
infraestrutura e gestão de conflitos);
-Bibliotecário ocupando-se majoritariamente de questões administrativas
como compras e processamento técnico;
Outro grande obstáculo é a dificuldade de gerenciar de forma remota equipes
de 10 a 15 pessoas, com perfis diferentes, formações diversas e em locais distintos.
O bibliotecário escolar geralmente atua sozinho no dia a dia. Não há, por
exemplo, divisão de setores com responsabilidades distintas, como tratamento de
materiais e referência. Além dos múltiplos espaços, o bibliotecário também se
desdobra em inúmeras tarefas.
Na RME/BH há um ponto positivo, que é o trabalho colaborativo dos
bibliotecários das bibliotecas-pólo. Ao longo dos anos, muitos procedimentos foram
padronizados, inclusive com a edição de um volume que orienta o desenvolvimento
das coleções e de cadernos temáticos que pretendem orientar o trabalho nas
bibliotecas da Rede.
Contar com uma rede estruturada que direcione alguns pontos do trabalho
pode diminuir as dificuldades de gerenciar um número grande de bibliotecas.
Considerações finais:
É preciso destacar o caráter pioneiro do Programa de Bibliotecas da RME/BH.
Com bibliotecas abertas em todas as 190 escolas, é possível afirmar que a
presença do bibliotecário transformou a realidade precária das bibliotecas, onde até
então atuavam somente professores deslocados para a função. Somente após a
revitalização e a reestruturação encabeçados pelos bibliotecários, os espaços
ganharam fôlego e redefiniram seu lugar na estrutura das escolas.
A experiência de Belo Horizonte, com bibliotecas-pólo, coordenadas e gestão
regionalizada, pode ser uma alternativa para a grande demanda lançada há cinco
anos, com a aprovação da Lei 12.244. A presença mesmo que remota de
bibliotecários já modifica o diálogo com a comunidade escolar e altera a realidade.
No entanto, é preciso pensar na melhor forma de configurar este modelo, definindo
com base em estudos e metodologias a quantidade ideal de unidades que um
bibliotecário é capaz de coordenar para apresentar resultados significativos do
desempenho da biblioteca.
As atribuições de gerenciar e de se ocupar com questões administrativas
acaba por afastar o bibliotecário da articulação das práticas pedagógicas. As tarefas
de mediar a leitura e de conduzir os estudantes a um desenvolvimento de suas
competências em informação deveriam ser priorizadas, o que não acontece na
realidade das bibliotecas da RME/BH.
O conhecimento e a reflexão sobre programas já consolidados pode auxiliar
no surgimento de iniciativas de redes, tão necessárias para a expansão da biblioteca
escolar no Brasil.
Referências
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal de Educação.
Política de desenvolvimento de acervo das bibliotecas escolares da Rede
Municipal de Educação de Belo Horizonte. Belo Horizonte: Programa de
Bibliotecas, Grupo de Acervo, 2009.
CAMPELLO, Bernadete. Biblioteca escolar: conhecimentos que sustentam a
prática. Belo Horizonte: Autêntica, 2012.
GASQUE, Kelley Cristine Gonçalves Dias. Letramento Informacional: pesquisa,
reflexão e aprendizagem. Brasília: Faculdade de Ciência da Informação /
Universidade de Brasília, 2012.
PAULA, Carolina Teixeira de; BARROS, Leila Cristina (org.). Orientações para o
uso da biblioteca escolar. Belo Horizonte: Secretaria Municipal de Educação, 2014.
(Cadernos do Programa de Bibliotecas, 2).
PAULA, Carolina Teixeira de; BARROS, Leila Cristina (org.). O programa de
bibliotecas da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte. Belo Horizonte:
Secretaria Municipal de Educação, 2014. (Cadernos do Programa de Bibliotecas, 1).
SISTEMA CFB/CRB. Biblioteca Escolar Construção de uma rede de informação
para o ensino público. Brasília: CFB/CRB, 2008.
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