GÊNERO, HISTÓRIA E EDUCAÇÃO NA PARAÍBA: MEMÓRIAS DE
PROFESSORAS E ESCRITORAS DO INÍCIO DO SÉCULO XX
Ana Maria Coutinho Bernardo
Universidade Federal da Paraíba
“Era necessário deixar um pouco de lado os
alfinetes e os bordados que impregnavam a vida
feminina e tentar tecer outros rendados históricos em
busca de certos ideais.”
(Elizabeth Siqueira)
Este texto é resultado parcial da pesquisa de doutorado em Teoria da Literatura,
em desenvolvimento na Universidade Federal de Pernambuco. Dois motivos centrais me
impulsionaram a iniciá-la: a inexistência de estudos sobre o que fizeram as paraibanas em favor
da Educação no início do século XX, despertou o desejo de dar a minha contribuição à História
da Educação da Paraíba, e uma antiga paixão pela questão de Gênero.
Parafraseando Michelle Perrot, da história oficial da Paraíba, a mulher foi
excluída. Quando aparece é, geralmente, cristalizada nos papéis de esposa e mãe, desempenhando
uma série de atividades tradicionalmente femininas: o cuidado das crianças, da casa, da fiação e
da tecelagem. Entretanto, dentre os diversos tipos de bordados produzidos pelas mulheres da
Paraíba no início do século XX, além das rendas tradicionais, destaca-se como podemos ver na
epígrafe de Elizabeth Siqueira, “outros rendados históricos”, entre eles: o magistério e a
literatura.
Esta pesquisa tem por objetivo trazer ao público contemporâneo algumas
biografias de professoras e escritoras que foram esquecidas na historiografia literária paraibana,
mestras nas linhas de escrever e de bordar textos, vidas e histórias. Essas mulheres ao tecerem e
bordarem palavras, recriaram a si mesmas, reinventando novas trajetórias, criando novos sentidos
e deixando suas marcas na História. Num olhar interdisciplinar, esse estudo se propõe a fazer
uma articulação entre Literatura e História da Educação da Paraíba, destacando nessa fronteira a
participação feminina na vida social e política. A fronteira, aqui, não isola, ao contrário, destaca o
ponto de convergência onde podemos observar que, provavelmente, não é por acaso que as
primeiras professoras são também as primeiras escritoras. Desse modo, consideramos importante
dar historicidade a estas memórias femininas, como lembra Michelle Perrot no artigo Práticas da
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Memória Feminina: “no teatro da memória, as mulheres são sombras tênues”, explicando que,
a narrativa histórica tradicional reserva-lhes pequeno espaço, privilegiando a dimensão pública: a
política, a guerra, onde elas pouco entram em cena. Essa historiadora adverte que, existem
aspectos mais graves:
“Essa ausência no nível da narrativa se amplia pela carência de pistas no
domínio das “fontes” com as quais se nutre o historiador, devido à deficiência dos registros
primários. No século XIX, por exemplo, os escrituários da história – administradores, policiais,
juízes ou padres, contadores da ordem pública- deixam bem poucos registros que digam respeito
às mulheres, categoria indistinta, destinada ao silêncio” (Perrot, 1989, p. 10).
Este silêncio pode ser constatado na lacuna existente sobre a presença e participação
da mulher na literatura e na educação da Paraíba. Nossas escritoras e professoras foram excluídas
da história oficial, sinalizando uma desvalorização de seus discursos, de modo geral, pela sua
posição na hierarquia de gênero. Excluídas do processo de criação cultural, as mulheres estavam
sujeitas à autoridade/autoria masculina. Para poder tornar-se criadora, a mulher teve de enfrentar
muita censura e preconceitos, como destaca Balila Palmeira, no artigo que resgata a presença da
mulher no Instituto Histórico e geográfico Paraibano (IHGP):
“Primeiro quero lembrar que, na Fundação, a ausência da Mulher é notada (...) É
bom lembrar que, segundo o escritor Horácio de Almeida “Na própria capital da Paraíba,a
primeira escola do sexo feminino foi criada em 1828 (...) Isso, sabemos, apenas aprendiam a ler
e escrever e contar. O forte da educação das moças era o trabalho manual, ”prendas
domésticas”. Tudo era uma preparação para o casamento. Nunca se olhava o que a Mulher
poderia oferecer à sociedade como participante ativa de núcleos literários, artísticos e outras
atividades congêneres. Tomando-se a data da primeira escola aberta à mulher, vemos que
somente em 1922 é que adentrava neste Instituto a primeira mulher: Eudésia Vieira, professora,
escritora, médica, historiadora com uma inteligência privilegiada, porém, igual a ela houve
várias mas, o preconceito abafou o seu dinamismo (Palmeira, 1995, p. 293).
Nessa direção, as recentes preocupações da historiografia com a descoberta de
“outras histórias” vêm favorecendo a inclusão das mulheres na história, como esclarece Michelle
Perrot:
“As mulheres não são passivas nem submissas. A miséria, a opressão, a
dominação,por reais que sejam,não bastam para contar a sua história. Elas estão presentes aqui
e além. Elas se afirmam por outras palavras, outros gestos. Na cidade, na própria fábrica ,elas
têm outras práticas cotidianas, formas concretas de resistência – à hierarquia, à disciplina – que
derrotam a racionalidade do poder, enxertadas sobre uso próprio do tempo e do espaço. Elas
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traçam um caminho que é preciso reencontrar. Uma história outra. Uma outra história”
( Michelle Perrot, 1988, p. 48).
Na citação acima Michelle Perrot, aponta que já não há mais dúvidas de que as
mulheres sabem inovar na reorganização dos espaços físicos, sociais, culturais e, pode-se
complementar, nos intelectuais e científicos. E o que parece mais importante, sabem inovar
criativamente, abrindo o campo das possibilidades interpretativas, propondo múltiplos temas de
investigação, formulando novas problematizações, produzindo uma outra história, construindo
novas formas de pensar e viver, como afirma Ecléa Bosi:
“Somos tentados, na esteira de Bérgson, a pensar na etimologia do verbo. “
Lembrar-se”, em francês se souvenir, significaria um movimento de “vir” “ de baixo”: sousvenir, vir à tona o que estava submerso. Esse afloramento do passado combina-se com o
processo corporal e presente da percepção. (...) Pela memória, o passado não só vem à tona das
águas presentes, misturando-se com as percepções imediatas, como também empurra, “desloca”
estas últimas, ocupando o espaço todo da consciência. A memória aparece como força subjetiva
ao mesmo tempo profunda e ativa, latente e penetrante, oculta e invasora” (Bosi, 1987. p. 9).
Na perspectiva de Ecléa Bosi, o que a memória realiza é a reinvenção de um
passado em comum, o qual possibilita novos olhares, permitindo que homens e mulheres
entendam melhor o presente. Revisar o passado é abrir novas possibilidades não apenas para o
presente, mas também para o futuro. A reconstituição da memória coletiva é um elemento
fundamental para a vida social (Halbwachs, 1968), no sentido tanto da sua continuidade, quanto
da sua transformação. De acordo com os estudos realizados por Elizabeth Xavier Ferreira (1996),
no quadro geral do papel da memória coletiva, há aspectos diferenciados relevantes,
especialmente a influência na construção de identidades, como também sua força subversiva, que
desafia a história oficial pelo resgate de memórias concorrentes. Para tanto, a citada autora
estabelece a relação entre memória e poder, afirmando:
“O controle sobre o passado não garante apenas o controle sobre o futuro. Ele
significa sobretudo o controle sobre o presente e, por extensão, um determinado poder sobre
quem somos. O desconhecimento das várias histórias que compõem a ampla história de um dado
grupo subtrai-lhe a possibilidade de melhor compreender os processos sociais em que está
envolvido no presente, cerceando sua capacidade de escolha e de autodeterminação (Ferreira,
1996, p. 71).
No campo específico da atuação da mulher na Literatura Brasileira, Zahidé L. Muzart
(1999) afirma que a questão da memória é central. Como as mulheres constituem um grupo
oprimido cuja história foi silenciada, restituir-lhes a memória e a voz é dar-lhes o passado e a
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história. Muito se escreveu sobre a dificuldade de se construir a história das mulheres,
mascadas que eram pela fala dos homens e excluídas que foram do cenário histórico.
Decorre daí a importância do resgate de nossas primeiras escritoras e professoras,
contribuindo para preencher as lacunas da nossa historiografia oficial, nesse sentido, Izilda
Matos (1994) afirma que é indiscutível a contribuição da abordagem historiográfica sobre os
estudos feministas na ampliação das visões do passado, mas ainda há muito silêncio para
romper, já que grande parte dos segredos a serem conhecidos ainda está encoberta por
evidências inexploradas da atuação das mulheres na História da Educação da Paraíba.
Rompendo o silêncio dos arquivos: biografias de professoras e escritoras da Paraíba
A descoberta de documentos relativos a essa atuação feminina nos encorajou a
empreender a tarefa de coletar dados, que nos permitisse sistematizar, brevemente, a presença
e participação da mulher como sujeito histórico no cenário social da Paraíba no início do
século XX. Já construímos um corpus mais amplo. Entretanto, nesse trabalho apresentamos as
biografias de:
Anayde Beiriz
Anayde Beiriz, nasceu na manhã de 18 de fevereiro de 1905, em João Pessoa. Filha de José da
Costa Beiriz e Maria Augusta de Azevedo. Estudou na Escola Normal Oficial do Estado,
conquistando um destacado espaço. Tinha muita facilidade para expressar seus pensamentos.
Era muito solicitada nas festas da escola para recitar poemas e participar de peças teatrais.
Concluiu seu curso de professora em 1922. Lecionou em uma colônia de pescadores, em
Cabedelo, durante o dia ensinava as crianças e no turno da noite desenvolvia trabalhos
educativos com jovens e adultos. Foi uma professora muito respeitada e querida por seus
alunos. Nas suas aulas valorizava a participação de todos, demonstrando grande interesse pela
aprendizagem da turma. Às vezes terminava o horário da aula, mas Anayde permanecia na
sala, tirando dúvidas dos alunos e, escutando cada um. Costumava dizer que, estava no lugar
certo: “Realmente, nasci para o magistério”. Sempre buscando progredir mais e mais, no ano
de 1927, ela foi uma das primeiras mulheres que concluiu o curso de datilografia, na Escola
Rimington, na primeira turma mista da conceituada Escola. Poetisa, escreveu várias poesias,
que foram publicadas na Revista ERA NOVA. Anayde suicidou-se em Recife, dias após o
assassinato do seu noivo João Dantas. Foi enterrada como mendiga no Cemitério Santo
Amaro, Certidão de Óbito Nº 2585. Faleceu no dia 22 de outubro de 1930.
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Analice de Caldas Barros
Analice Caldas, nasceu em Horta, um dos pequenos engenhos de Alagoa Nova no dia 30 de
outubro de 1891. Filha de proprietários rurais da região - Manoel Paulino Correia de Barros e
Ana Salvina de Caldas Barros. Os primeiros anos de infância viveu Analice, ao lado dos
irmãos Lauro, Anatólio e Cléa, no ambiente bucólico do próprio “Horta”, vendo e aprendendo
o fabrico da rapadura e a destilação da aguardente. Costumava fazer muitas perguntas sobre
todo o processo do engenho. Criativa e muito ousada, logo cedo trocou a segurança e o
carinho dos pais, transferindo-se para a Capital. Matriculou-se na escola Normal Oficial do
Estado. Seu grande sonho era tornar-se professora. Recebeu muito incentivo e apoio do tio
Caldas que carinhosamente a hospedara. O velho magistrado Caldas Brandão que lhe
acompanhava os passos, orgulhava-se do enorme potencial criativo da sobrinha. Em fins de
44, foi aprovada em concurso de âmbito nacional, promovido pelo DASP para a cadeira de
Português, em nível médio, no então Liceu Industrial, antiga Escola Técnica Federal, e hoje,
Centro federal de Educação Tecnológica da Paraíba, onde já ensinava há algum tempo.
Integrando a turma de 1911, dos diplomados pela Escola Normal Oficial, Analice dedicou-se,
de imediato, ao magistério. Sua paixão maior fora mesmo o ensino profissional, cuja
importância e utilidade sempre sublinhou, como podemos constatar no depoimento que ela dá,
no jornal Aprendiz, publicação comemorativa dos 25 anos de fundação da escola de
aprendizes Artífices da Paraíba (atual CEFET): “ Como professora que sou há mais de dez
anos e conseqüentemente em convivência diária com a população proletária e humilde de
minha cidade, testemunho quanto de providencial, indispensável e oportuno é este
aprendizado na Paraíba. É com eles, me sinto hoje regozijada, vitoriosa, em celebrar esta
etapa de labor, de dureza e de compensações”. Na Academia de Comércio “Epitácio Pessoa”,
além de outras disciplinas, lecionou taquigrafia, tendo por algum tempo exercido a função de
taquigrafa, sendo a primeira mulher a ocupar este cargo na Assembléia Legislativa.
Colaborava regularmente na imprensa local. As páginas de Era Nova excelente revista, que na
década de 20, fez época em nossa capital. Freqüentemente convidada, proferia palestras em
associações culturais e clubes de serviço, como Rotary Club da Paraíba. Foi uma das
precusoras do Instituto de genealogia da Paraíba. Alagoa Nova já lhe prestou o público
reconhecimento criando a Biblioteca Analice Caldas. Na capital seu nome se inscreve como
símbolo, na placa de uma rua e no nome de um uma escola pública do município. Ela faleceu
em 15 de fevereiro de 1945, num acidente de avião em Lagoa Santa.
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Adamantina Neves
Adamantina Neves, nasceu em João Pessoa, no dia 26 de setembro de 1905, filha de Arthur
Jader de Carvalho Neves e Marieta Gomes de Carvalho Neves, é a primeira filha de uma prole
de 10 irmãos. Iniciou desde os 06 anos de idade sua convivência com as letras, sentia o maior
prazer em ouvir as poesias e as histórias que, sua tia Fininha contava. Tal prazer facilitou seu
processo de aprender a ler e escrever, iniciando as suas primeiras quadrinhas. Estudou na
Escola Normal Oficial do Estado, onde recebeu o diploma de professora. Foi professora de
várias gerações: da Escola Santa Rosário ao Grupo Escolar Epitácio Pessoa no Jardim de
Infância sua maior paixão. Entre seus alunos podemos citar pessoas como Dr. Odilon Ribeiro
Coutinho, a deputada Lúcia Braga, o deputado José Clerot, o prefeito Jáder Pimentel, o
jornalista e escritor Luiz Augusto Crispim. Dr. Everaldo Soares Júnior, o jornalista e escritor
Otávio Sintônio Pinto e muitos outros alunos. Adamantina Neves, juntamente com outras
professoras promoveram com grande êxito a Feira da Mocidade, em 1947, festa bastante
badalada pela sociedade pessoense. Antes de falecer em 05 de janeiro de2000, Adamantina
em 1997, teve a alegria grande de ver publicados seus dois livros: Porats Abertas e Folhas de
Portas, contando para isso, com o esforço do sobrinho Jânder Neves e com o apoio da Em Dia
Editoral. Na subdivisão do livro Folhas de Portas, ela dedicou uma parte às Cidades
Mulheres. Vejamos alguns fragmentos do poema Roma:
“Volto ao passado.../ Coliseu../perseguição aos cristãos/ minh´alma se confrange
pelo horror(...).
Basílica de São Pedro/ La Pietá famosa escultura/ de Miguel Ângelo/ Sarcófagos
Gosto das tuas antiguidades/ dos pisos das igrejas/ das cúpulas famosas/
tudo simplesmente belo/imponente(...)
Mas, tive saudade/ do alpendre de minha casa/ quando comi
melancias adocicadas(..)
Lembrei as mulheres das verduras/ o alpendre colorido
as frutas espalhadas pelo chão(...)”
Podemos constatar nesses fragmentos como Adamantina utilizando a linguagem
poética para articular dados da História com a memória individual, comprovando as palavras
de Ecléa Bosi que, a memória individual sempre está vinculada com a história social. Essa
visão ampla do sujeito permite-nos entender a dimensão social da memória, para o que nos
remete Marilena Chauí, quando explica que “o modo de lembrar é individual tanto social: o
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grupo transmite, retém e reforça as lembranças, mas o recordador, ao trabalhá-las, vai
paulatinamente individualizando a memória comunitária e, no que lembra e como lembra, faz
com que fique o que signifique” Nesse aspecto, vale destacar nas palavras de Adamantina o
fio da história, entrando em cena as mulheres esquecidas na história oficial: as mulheres das
verduras. Como também o cotidiano: o alpendre colorido. Essas lembranças ultrapassam as
experiências de mera repetição, como esclarece Angélica Soares:
“Refazemos o passado no presente, que se abre ao futuro de nossas possibilidades,
ao vir-a-ser, numa tridimensionalidade, que habita cada fato, cada pensamento, cada
sentimento vivenciado. A memória põe-nos em contato, consciente ou inconscientemente, com
o sentido unitário do tempo, que governa o nosso ser no mundo” (Angélica Soares, 1999, p.
98).
Daura Santiago Rangel
Daura Santiago, nasceu no município de Monteiro, no dia 31 de outubro de 1908. Filha do
Senhor Eduardo Dias Santiago, natural de Vila Nova de Goiás, vilarejo pertencente à cidade
do Porto, em Portugal; e da Senhora D. Sinfrônia. Aos 08 anos incompletos, matriculou-se no
Colégio Nossa Senhora das Neves, onde permaneceu durante 10 anos, concluiu os estudos em
1927, formando-se oradora da turma. Foi a primeira dentre as formadas a ser nomeada
professora estadual, em fevereiro de 1928, aos 20 anos de idade, lecionou em quase todos os
Grupos Escolares de João Pessoa daquela época. D. Pedro II, Antônio Pessoa, Isabel Maria
das Neves, Duarte da Silveira, Epitácio pessoa e Tomás Mindelo. Em 1938, foi nomeada para
lecionar a cadeira de Matemática da Escola Normal da Paraíba. Em 1939 foi nomeada para
assumir a cadeira de Matemática do Liceu Paraibano.
Eudésia Vieira
Eudésia de Carvalho Vieira, nasceu no dia 08 de abril de 1894, na povoação de Livramento,
no município de Santa Rita, sendo seus pais Pedro Celestino Vieira e Rita Filomena de
Carvalho Vieira. Recebeu o diploma de professora pública pela Escola Normal Oficial, em 15
de junho de 1911, sendo a oradora da turma. Casou-se em 1917, com José Taciano da Fonseca
Jardim, nascendo desse casamento 14 filhos. Foi professora pública em várias escolas
primárias do Estado. Já casada decidiu ser médica, contrariando a vontade do marido e
enfrentando todos os obstáculos e preconceitos da época, preparou-se e submeteu-se às provas
da Faculdade. Eudésia foi à única mulher numa turma de homens a receber o grau de doutora
e a primeira paraibana a conquistar o título, pela Faculdade de Medicina de Recife, ali recebeu
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o diploma de doutora em ciências médicas e cirúrgicas, por ter sido a única que defendeu Tese
(Síndrome de Schickelé), dentre os 52 diplomados naquele ano. Aqui em João Pessoa,
instalou um consultório em sua residência, à rua Duque de Caxias, passou a atender e dedicarse à sua clientela, fazendo da medicina o seu apostolado. Foi Assistente Social da
Penitenciária Modelo, sendo muito amada pelos presidiários. Professora, médica, jornalista e
poetisa. Ingressou no Instituto Histórico e Geográfico Paraibano em 3 de junho de 1922.
Como professora se preocupou muito com a qualidade do livro didático adotado nas Escolas
Primárias e, com muito sacrifício, conseguiu elaborar e editar dois livros e adotá-los nas
Escolas Oficias do Estado. Como médica, dedicou-se com extremado desvelo às clientes,
orientando-as, principalmente na questão do pré-natal, numa época que este exame era
totalmente desconhecido pela maioria das mulheres. Como escritora, jornalista e poetisa, foi
muito atuante. Colaborou na Revista ERA NOVA, nos jornais, O NORTE, A UNIÃO, A
IMPRENSA, A GAZETA DO RECIFE e em NOVELAR, jornal da Festa das Neves. Seu
primeiro poema foi publicado quando tinha 14 anos. Realizou muitas Conferencias. Em 1974
recebeu o título de cidadã Benemérita da Paraíba e, quando faleceu, foi homenageada com seu
nome dado a uma rua do Bairro dos Estados. Deixou publicados os seguintes trabalhos:
“Pontos de História do Brasil” (didático); “Cirus e Nimbos”; (versos); “A Minha Conversão e
Dom Ulrico Sonntag”; “Síndrome de Schickelé”; (Tese de doutorado); Terra dos Tabajaras
(didático) - 1955; Mistério de Fátima - 1952; Conferência - 1948; Dois Episódios de uma
Vida; Poema do Sentenciado; O Torpedeamento do Afonso Pena - 1951; Inéditos: “Mortos
que Falam”; “A Mãe Cristã e a Educação Eucarística que Ha de Dar aos Filhos”, Eudésia
faleceu em João Pessoa, no dia 16 de julho de 1981.
Lylia Guedes
Lylia Guedes, nasceu no dia 14 de novembro de 1900, em Nova Cruz, Estado do Rio Grande
do Norte, mas desde dos três meses, residiu nesta Capital. Foram seus pais Terencio Guedes e
Maria Amélia Guedes, com os quais estudou as primeiras letras. Iniciou os estudos
secundários no curso de Francisca Moura, nesta Capital, tendo prestado os exames no Liceu
Paraibano nos anos de 1916 e 1917. Em março de 1918, matriculou-se na Faculdade de
Direito do Recife, onde colou grau de bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, no dia 16 de
dezembro de 1922. Ainda acadêmica, foi designada para auxiliar na cadeira de Português da
extinta Escola Normal, cargo que desempenho nos anos letivos de 1919 e 1920. No mesmo
ano estabelecimento, ensinou também nas cadeiras de Geografia e História da Civilização.
Ocupou, seis vezes, a tribuna do júri desta Capital, obtendo quatro absolvições. É inscrita na
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Ordem dos Advogados. Foi sócia fundadora da Associação Paraibana Pelo Progresso
Feminino. Exerceu o cargo de professora auxiliar da cadeira de Geografia do Liceu Paraibano.
No dia 09 de julho de 1939, entrou para o quadro social do Instituto Histórico Geográfico
Paraibano IHGP. Tendo feito um discurso sobre Maciel Pinheiro, Democrata e Republicano.
No período de 1956/59, assumiu o cargo de Bibliotecária e entre o período de 1959/62
assumiu a Comissão de Admissão de Sócios, bem como o período de 1965/75, participou da
Comissão de Conta desta Instituição. Tem livros de versos publicados. Preparou um método
de Taquigrafia, inteiramente original, um livro de ficção e um outro sobre assunto de
atualidades. Além de contribuir com a Coluna titulada PÁGINA FEMININA dos Jornais
“AUNIÃO” e a “IMPRENSA”. Os jornais fazem menção constante com Advogada no Fórum
da capital, sendo a primeira mulher na Paraíba a fazer parte da Ordem dos Advogados do
Brasil – OAB, como secretária. Proferiu palestra sobre o Bicentenário de D. João VI, entre
1965/75. Faleceu entre o período 1965/75.
Maria Ignez Mariz
Maria Ignez Mariz é uma das primeiras mulheres escritoras da Paraíba. Além de escritora e
jornalista, realizava trabalhos educativos com pessoas das classes populares da cidade de
Sousa - alto sertão paraibano. Estava comprometida em transformar mentalidades, combater a
ignorância e defender os direitos da mulher. Ela nasceu em Souza, no dia 26 de dezembro de
1905. Filha do Dr. Antônio Marques da Silva Mariz e de D. Maria Emília Marques Mariz.
Estudou os primeiros anos escolares na cidade natal e fez curso de Pedagogia no Colégio
Nossa Senhora da Neves, em João Pessoa. Desde cedo demonstrou que seguiria um caminho
diferente das demais mulheres da sua época. Ainda muito nova começou a ajudar o seu pai, o
Dr. Silva Mariz, como era conhecido o seu pai (chefe político, médico e rábula), na difícil
missão de liderar um povo sofrido. Aos dezoito anos começou a colaborar em Jornais e
Revistas do sertão. Na década de 30 iniciou a “Campanha pró-bibliotecas Municipais”,
sentindo-se realizada com essa iniciativa. Em 1937, Ignez publicou, pela José Olímpico, “A
Barragem”, que a projetou nacionalmente e foi muito bem aceito pela crítica sulista. Nesse
romance, ela narra a história da família de operários Mariquinha e Zé Mariano, integrantes,
como tantos sertanejos da época, dos duros trabalhos da obra de açudagem. A narrativa se
abre para o complexo social e coletivo, não raro se transmutando num discurso sociológico,
articulando categorias tão eficazes quanto distintas de análise das relações sociais, como
gênero, classe, etnia, cultura. Ignez faz parte do Instituto Histórico Geográfico Paraibano
IHGP.
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Olivina Carneiro da Cunha
Olivina Carneiro nasceu no dia 26 de maio de 1892 em João Pessoa. Filha do Sr. Silvino
Carneiro da Cunha, Barão do Abiahy. Estudou na Capital paraibana, onde se diplomou pela
Escola Normal. Desde cedo mostrou seu interesse pelo magistério dedicando-lhe grande parte
de sua vida e mais tarde também as letras. A poetisa colaborou em vários jornais e revista da
Paraíba. Na década de 30, juntamente com outras adeptas a emancipação feminina fundam a
Associação Paraibana Pelo Progresso Feminino, onde sua meta era licenciar as mulheres
em busca dos seus direitos com ser pensante e atuante na sociedade. No dia 06 de abril de
1938 entra para o quadro de sócios do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano e do
Instituto Paraibano de Genealogia e Heraldica. Em 1940, lançou a público uma biografia do
seu pai Sr. Silvino Elvídio Carneiro da Cunha, “Barão do Abiahy”. Das suas colaborações
podemos destacar os Jornais “A UNIÃO” e “A IMPRENSA”, na coluna titulada PÁGINA
FEMININA, além da Revistas “ERA NOVA” “MANAÍRA”, entre outros. No ano de 1904
diplomou-se pela Escola Normal Oficial da Paraíba, em junho. No ano de 1905 foi nomeada
para a 9ª Cadeira da Escola Normal. 1907 - Foi nomeada para 1ª Cadeira do Grupo Escolar
Modelo, anexo a Escola Normal. 1917 - Designada para lecionar a Cadeira de Desenho e
trabalhos Manual do Grupo Escolar Modelo, a pedido do Diretor da Escola Normal, deu aulas
de Matemática e Geografia do 1º ano. Proferiu diversas palestras no IHGP sobre a condição
da mulher. Publicou um livro de poesias: Migalhas de inspiração. Olivina faleceu no dia 12
março 1977 em João Pessoa.
Atualmente, estamos em fase de conclusão do corpus literário da nossa pesquisa,
incluindo os nomes e as produções literárias de: Apolônia Amorim, Ambrosina Magalhães,
Albertina Correia Lima, Alice Azevedo Monteiro, Catarina Moura, Francisca
Rodrigues Chaves Moura, Francisca de Ascenção Cunha, Isabel Iracema Feijó da
Silveira, Iracema Marinho e Juanita Machado.
Os dados coletados até aqui, confirmam as palavras de Luzilá Gonçalves Ferreira: “A
certeza de que estamos, de algum modo, contribuindo para que uma parte de nossa história
se torne conhecida” (Ferreira, 1999, p. 16). Nesse sentido, com Ignez Mariz se permite ler
uma Paraíba na ótica da mulher, do cotidiano e dos operários, através de seu romance
histórico e regionalista, conquistando através da palavra escrita um espaço relevante na luta
de resistência social à exclusão. Além dos elementos históricos, esse romance traz à tona
muitas pistas sobre o debate da época em torno das questões de gênero, classe e exclusão,
dialogando no início do século XX, com a produção escrita por homens, ou seja, este é um
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romance regionalista de tanto valor como outros escritos por homens, a exemplo de: A
bagaceira de José Américo de Almeida e Pedra Bonita de José Lins do Rego, entretanto, A
Barragem ainda continua desconhecido, reforçando a necessidade de estudos que retirem do
esquecimento a literatura produzida por mulheres na Paraíba.
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