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PARTE 1 – EIXO BIOLÓGICO
INTRODUÇAO: EVOLUÇÃO DOS CICLOS DE VIDA NOS
DIFERENTES ORGANISMOS
Ronan Xavier Corrêa
Doutor em Genética e Melhoramento. Professor Pleno do Departamento de Ciências
Biológicas da Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC, Ilhéus, BA.
Introdução e Objetivos
Os ciclos de vida consistem em uma sequência de estádios na história
reprodutiva dos organismos. Em geral, cada espécie ou grupo de espécies tem uma
sequência padrão desses estádios, resultando em diferentes tipos de ciclos.
Você conhece esses diferentes tipos de ciclos de vida?
Você sabe explicar por que os ciclos de vida variam entre os diferentes
organismos?
O que garante a manutenção da variabilidade dos ciclos de vida entre os
organismos?
Quais mecanismos relacionados com reprodução geram e mantém a
variabilidade dos organismos em relação aos ciclos de vida e às respectivas
características?
•
•
•
•
Estas são algumas perguntas que pretendemos responder no presente texto
sobre evolução dos ciclos de vida. Nos capítulos do eixo biológico que se seguem,
você irá encontrar textos mais aprofundados e específicos sobre os processos
reprodutivos nos diferentes organismos. Desta forma, os conhecimentos sobre
evolução dos ciclos de vida, apresentados nesta unidade, servirão de âncoras para
que você tire o maior proveito das unidades que se seguem.
Com base neste texto, você deverá compreender alguns porquês de tanta
variação entre os diferentes organismos, ao mesmo tempo em que tais variações são
conservadas como padrões típicos de cada grupo de espécies. Portanto, veremos
como mecanismos variação e manutenção de características moldaram os processos
reprodutivos ao longo da evolução das espécies. Como exemplos desses mecanismos
em nível celular :
•
Mutação e recombinação gênica, as quais geram e ampliam a variação das
características - a recombinação gênica é o processo de troca de porções
entre moléculas de DNA nas células, incluindo dois tipos básicos:
o recombinação homóloga, que é a troca de DNA, ocorre entre
moléculas homólogas por reparo mediado por enzimas (recombinase
e outras enzimas), iniciando-se em quebras no DNA fita dupla. Essas
quebras podem ser programadas (tal como ocorre na meiose), ou
ocorrem ao acaso no genoma (tal como se verifica
experimentalmente na presença de agentes danosos ao DNA);
o recombinação sítio específica, que possibilita a fusão de genomas
virais em genomas hospedeiros (por exemplo, a recombinação do
vírus bacteriófago no genoma da bactéria).
• A replicação e o reparo do DNA garantem a perpetuação fiel das
características ao longo das gerações.
•
Os tipos de reprodução e seus efeitos na manutenção da variabilidade
entre os indivíduos das populações.
Módulo V – Processos Reprodutivos
Genoma:
Genoma é o conjunto
de moléculas de
DNA do
complemento
cromossômico básico
de um organismo.
Desta forma, o
genoma de uma
bactéria é composto
do cromossomo
principal e do
plasmídio típico que
ela carrega. O
genoma de uma
planta é composto de
um conjunto
haplóide de seus
cromossomos
nucleares (mesmo
que ela seja diplóide
ou poliplóide), o
cromossomo
mitocondrial e o
cloroplastídico.
Seleção natural:
Processo que resulta
em sobrevivência e
fertilidade
diferenciadas entre
os diferentes
indivíduos de uma
população.
http://pt.wikipedia.
org/wiki/Sele%C3%
A7%C3%A3o_natura
l
Grupos
taxonômicos:
Conjuntos de
organismos
devidamente
identificados,
nomeados e
classificados. Por
exemplo, todas as
variedades plantadas
de milho pertencem
à espécie milho (Zea
mays). Outro
exemplo, nossas
conhecidas
leguminosas,
constituem um
grupo taxonômico
formado de muitas
espécies tais como
feijão, soja, paubrasil etc.
2
Por outro lado, a seleção natural possibilita que características específicas ou
blocos de características (por exemplo, a manutenção de diferentes estádios nos ciclos
de vida) se mantenham constantes nos diferentes grupos taxonômicos.
Os Tipos e Aspectos Evolutivos dos Ciclos de Vida
Tipos de ciclos de vida dos organismos de reprodução sexuada
Os ciclos de vida podem ser definidos no contexto dos organismos de
reprodução sexuada como uma série de estágios que ocorrem entre a formação do
zigoto em uma geração e a formação do zigoto na próxima geração. Alguns ciclos de
vida são considerados complexos quando se verificam dois ou mais estágios pósembrionários com morfologia distinta. Por exemplo, as borboletas passam por cinco
estágios: ovo, larva (a lagarta), pupa (crisálida) e adulto (o inseto). Em alguns casos,
os ciclos de vida complexos apresentam mais de uma geração de indivíduos, isto é,
são ciclos que incorporam uma sucessão de dois ou mais tipos morfologicamente
distintos de indivíduos, geralmente associados com flutuações das condições
ambientais. Por exemplo, muitos sapos passam a fase de ovo e girino na água contida
em folhas de determinadas plantas e a fase de adulto no solo ou nas superfícies de
folhas. Todos esses ciclos possuem em comum um evento de meiose e fertilização.
Contudo, estes ciclos diferem entre as espécies quanto ao nível de ploidia dos
indivíduos, dentre outras características que veremos a seguir. Veja abaixo alguns
exemplos ilustrativos de organismos de cada tipo de ciclo de vida (Figuras 1 a 4), bem
como principais características dos quatro principais ciclos de vida (Figura 5).
•
Haplóides:
as células que formam o corpo do indivíduo são haplóides (possuem apenas uma
cópia de cada cromossomo) e apenas aquelas células que dão origem aos gametas
passam pela etapa diplóide (duas cópias de cada cromossomo). Os produtos
meióticos dão origem a esporos haplóides, a partir dos quais os indivíduos se
desenvolvem. Este tipo ocorre em briófitas (musgos e hepáticas), muitas algas verdes
(especialmente as da ordem charales), alguns protozoários e fungos.
Figura 1. Desenho esquemático de uma alga verde, haplóide.
Módulo V – Processos Reprodutivos
Borboletas :
http://cienciaecultu
ra.bvs.br/pdf/cic/v
55n2/15512.pdf)
Sapos:
http://www.scielo.b
r/pdf/isz/n91/9023.
pdf
Ploidia:
É o número de
complementos
cromossômicos do
indivíduo, isto é, o
número de vezes que
cada cromossomo
está representado na
célula que constitui o
organismo. Observe
que se trata dos
cromossomos que se
localizam no núcleo
das células
eucariotas ou o
cromossomo
principal das células
procariotas.
Portanto, não inclui
o genoma
mitocondrial,
cloroplastídico e os
plasmídeos.
3
•
Diplóides:
nesses organismos, apenas as células que dão origem aos gametas passam pela
redução do número de cromossomos ao número básico haplóide, isto é, usa meiose
para produzir os gametas, mesmo que o indivíduo realize algumas mitoses para
diferenciar os gametas. As células somáticas são diplóides. Esse tipo de ciclo ocorre
nos animais (exceto alguns insetos), nas plantas superiores, alguns fungos e algumas
algas (especialmente as da ordem Fucales).
Figura 2. Desenho esquemático de cão e coelho, diplóides, como todos os
animais superiores.
•
Haplodiplontes (também denominado de alternância de gerações):
os indivíduos são haplóides em uma fase e diplóides em outra fase. Este tipo de ciclo
ocorre em samambaias, foraminíferos, quase todas as algas vermelhas e marrons
(exceto Fucales), muitas algas verdes (exemplo: Ulvaceae) e alguns fungos (exemplo:
leveduras).
Figura 3. Desenho esquemático de uma samambaia, mostrando a
fase diplóide denominada de esporófito; a fase
haplóide, corresponde ao gametófito, como é típico nas
plantas.
Módulo V – Processos Reprodutivos
4
•
Haplodiplóides:
os machos são haplóides e as fêmeas, diplóides, ambos crescendo em mesma
população e ao mesmo tempo. Esse é o caso de muitos Hymenoptera (abelhas, vespas
e formigas) e Acarina (ácaros). Na maioria dos Himenoptera, os machos haplóides
são gerados por partenogênese arrenótoca, isto é, desenvolvimento dos machos a
partir de óvulos não fertilizados.
Figura 4. Desenho esquemático de uma formiga, em que a fêmea é
diplóide e o macho é haplóide.
Além da variação no nível de ploidia descrito, deve-se ressaltar que os ciclos
também variam quanto ao número de fases entre os eventos de meiose e fertilização
(figura 5).
A)
Módulo V – Processos Reprodutivos
B)
5
C)
D)
Figura 5. Esquema geral de quatro tipos de ciclos de vida. A) haplóide; B ) diplóide;
C ) haplodiplontes; D ) haplodiplóides. De “A” até “C”, modificado de Richerd et al.
(1993). Item “D”, elaborado com base em Cruz-Landim e Beig (1981).
Dentre esses quatro tipos de ciclos, observe que somente os haplodiplontes
possuem duas fases distintas:
•
Os indivíduos haplóides ocorrem logo após a meiose.
•
Os indivíduos diplóides ocorrem logo após a formação do zigoto.
Nos demais ciclos, os gametas formam o zigoto que se desenvolve
diretamente em indivíduos diplóides, ou que gera os esporos meióticos, e estes
últimos se desenvolvem em indivíduos haplóides.
Nos organismos haplóides, o zigoto é a única célula diplóide. Acredita-se
que os primeiros organismos tenham sido haplóides e que, em eventos evolutivos
individuais, alguns zigotos se dividiram por mitose em vez de meiose, gerando
organismos multicelulares diplóides.
As divisões por meiose sucedem como etapa de formação de gametas, os
quais são as únicas células haplóides de diversos organismos (como os animais). A
meiose nestes organismos também culminou na produção de células haplóides que se
dividem por mitose (em vez de formar gametas, dão origem a plantas haplóides
multicelulares, ou por partenogênese, dão origem a machos haplóides em alguns
animais).
Nos organismos multicelulares, a expressão coordenada de genes no início
do desenvolvimento do embrião leva a ativação de alguns genes na linhagem de
células, que resulta no tecido germinativo, e outros genes se tornam ativos nos
tecidos somáticos. Cada linhagem de células sofre sucessivos eventos de “liga e
desliga” dos genes que regulam a expressão de outros genes, de modo a resultar no
desenvolvimento de organismos completos. Nos organismos unicelulares, cada
divisão celular que ocorre após a replicação do DNA gera duas novas células que são
os dois novos indivíduos. Em ambos os organismos (unicelulares e pluricelulares) há
Módulo V – Processos Reprodutivos
Gametas:
São células haplóides
que se fundem aos
pares para formar o
zigoto.
Zigoto:
É a célula diplóide
resultante da fusão
dos gametas
masculino e
feminino.
Esporos:
São unidades
reprodutivas
(geralmente
unicelulares) de
plantas e estruturas
de resistência
(repouso) de alguns
animais, as quais
aguardam o
momento adequado
para se
desenvolverem em
indivíduos adultos.
Mitose:
Etapa do ciclo
celular das células
que forma
organismos
superiores em que
ocorre a divisão dos
cromossomos
duplicados em dois
conjuntos
cromossômicos
6
uma multiplicidade de eventos de regulação da expressão de genes, alguns
dependentes de fatores do ambiente e outros do padrão de diferenciação das células
ao longo do desenvolvimento. Em cada fase ou etapa do ciclo celular, genes
específicos podem ser ativados por mecanismos bioquímicos conservados entre os
organismos e por fatores do ambiente.
Nota:
Em outros módulos, você conhecerá mecanismos detalhados
sobre a regulação da expressão gênica, quanto ao funcionamento
basal do organismo (crescimento, desenvolvimento e reprodução).
Neste módulo, estamos contextualizando apenas que diferentes
características dos ciclos de vida dos organismos também seguem
determinações da expressão coordenada de genes do ciclo.
Como a seleção natural atua nos ciclos de vida
Você verá a seguir que a seleção está atuando a todo o momento durante o
ciclo de vida dos organismos. A seleção contra determinados genótipos pode ocorrer
tanto nos estágios haplóides como nos diplóides em um ciclo de vida, em cada
geração, dependendo de qual estágio a expressão do genótipo influencia a
sobrevivência ou a fertilidade (figura 6).
Figura 6. Diagrama simplificado da ação de seleção nos ciclos de vida (modificado de
Strickberger (2000).
Percebe-se na figura 6 que a seleção natural é composta por uma série de
seleções:
•
Seleção sexual:
Origina-se de diferenças no sucesso reprodutivo e consiste na competição
entre membros de um mesmo sexo (geralmente machos) para ter acesso à
fêmea e a escolha de machos pela fêmea.
•
Seleção gamética:
Refere-se a que gametas com maior vigor ou com genes compatíveis possam
ter maior sucesso no evento de fecundação.
•
Seleção zigótica:
Consiste em maior sucesso aos zigotos com maior capacidade de
estabelecimento e geração do novo organismo.
Módulo V – Processos Reprodutivos
Gene:
Uma combinação de
sequencias de ácidos
nucléicos (regiões de
controle da
expressão do gene e
a região que é
copiada na forma de
uma molécula de
RNA) que codifica
um produto (RNA
ou proteína). Este
produto interage
com moléculas
presentes na célula e
participa dos
processos celulares
específicos. Essas
sequencias são
passadas de pai para
filho ao longo das
gerações, motivo
pelo qual o gene é
definido também
como unidade da
hereditariedade.
7
•
Seleção de frequência:
Consiste em favorecer os indivíduos com fenótipos mais frequentes
(causando eliminação de fenótipos raros e, consequentemente, da variação
genética que se encontra em menor frequência).
Pela explicação anterior, você percebeu que a seleção natural age sobre as
diferentes etapas do ciclo de vida.
Pense um pouco e responda: você acha que a seleção age sobre o genótipo ou
sobre o fenótipo?
ATIVIDADE – Redija um pequeno texto sobre suas idéias a respeito dessa
questão antes de dar continuidade à leitura do texto.
Se você pensou que a seleção atua sobre os fenótipos, você acertou! Sabe por
quê? Porque os processos evolutivos são contínuos, de modo que a aquisição de uma
adaptação por indivíduos gera variabilidade entre os indivíduos. Essa variabilidade
pode proporcionar uma posterior competição entre indivíduos pelos recursos
ambientais e assim sucessivamente, de modo que a seleção natural ocorre a todo o
momento e sempre sobre o fenótipo.
Embora a mutação seja a fonte primária da variação genética, a recombinação
é a fonte primária para gerar variações fenotípicas, uma vez que ela reorganiza
aleatoriamente estas variações a cada evento de geração e fusão de gametas. Portanto,
se você considerar que a seleção natural sempre age sobre o fenótipo, perceberá
também que a recombinação entre os genes é a fonte principal que amplia a
variabilidade genética (e por conseqüência, fenotípica) para que a seleção natural
possa atuar (Mayr, 1997).
Vantagens evolutivas dos diferentes ciclos de vida
O nível de ploidia está relacionado com o tamanho e a complexidade
estrutural dos organismos. Os organismos mais complexos (animais e plantas
superiores) são diplóides ou poliplóides (algumas plantas), enquanto que os
organismos mais simples (muitos unicelulares) são haplóides. Os fungos e as algas
apresentam grande variedade de ciclos de vida, os quais geralmente são complexos e
de difícil inferência evolutiva (Richerd et al., 1993).
A predominância dos organismos diplóides tem sido atribuída a vantagens
genéticas advindas da presença de dois genomas por indivíduo, dentre as quais
podemos destacam:
•
Proteção contra mutações - podem ter desvantagens em curto prazo,
porém representam a fonte primária de variação genética entre os
indivíduos.
•
Proteção contra mutações somáticas - aquelas mutações que ocorrem nas
células que formam o corpo do indivíduo. Dentre os dois alelos por loco,
um pode estar envolvido na mutação e o outro não, funcionando como
uma proteção para as células somáticas ao garantir pelo menos um alelo
funcional.
•
Aquisição de novos genes e melhor controle da diferenciação celular.
•
Efeitos de sobredominância - possibilita que um mesmo indivíduo
possua dois diferentes alelos por loco gênico, os quais conferem
fenótipos com vantagens adaptativas. A sobredominância é causa do
“vigor híbrido”.
Módulo V – Processos Reprodutivos
Mutação:
Processo de
mudança no DNA,
causada por luz,
produtos químicos
ou por erros no
metabolismo celular.
Estas mudanças
levam a alterações na
composição dos
nucleotídeos na
molécula de DNA,
que se forem
transmitidas pelos
gametas pode m
transmitir novas
formas do gene em
que houve a
alteração para a
próxima geração.
Quando a alteração é
muito drástica, os
gametas, o zigoto ou
o novo ser são
inviáveis. Observe
que somente
mutações suportadas
pelos indivíduos
poderão acumular-se
nas populações.
Loco gênico:
Consiste na posição
relativa ocupada
pelo gene no
cromossomo.
Haploidia:
situação em que a
célula apresenta
apenas um conjunto
básico de
cromossomos típico
8
A manutenção de organismos haplóides na natureza, a “haploidia” pode ser
explicada por vantagens ecológicas da taxa de divisão celular mais alta ou ao
requerimento mais baixo de nutrientes, por causa de sua menor quantidade de DNA.
Isto é aplicável a organismos unicelulares como algas, porém são escassas as
informações sobre haplóides multicelulares.
A evolução dos organismos haplodiplontes pode ser explicada por três
hipóteses principais:
•
Vantagens para adaptação às mudanças ambientais - por esta primeira
hipótese, a existência de duas fases no ciclo (ou duas gerações) oferece
vantagens para adaptação às situações de mudanças ambientais sazonais
contrastantes ou de disponibilidade de nichos alternativos e adequados para
serem ocupados distintamente pelos indivíduos de cada fase do ciclo. Estas
vantagens são igualmente atribuídas à manutenção de polimorfismos
populacionais, não sendo necessariamente causadas por diferenças em
ploidia.
Favorecimento das duas fases pela seleção natural - de acordo com essa
segunda hipótese, a seleção poderia favorecer as duas fases e, indiretamente,
resultar na manutenção do ciclo haplodiplôntico. Este modelo pressupõe
que:
i) existe pelo menos um gene determinando fitness (valor adaptativo) dos
indivíduos e outro modificador que age sobre o comprimento relativo das
duas fases
ii) cada fase do ciclo haplodiplôntico é relativamente menor do que os ciclos
monofásicos, representando uma vantagem para sobrevivência se a taxa de
mortalidade for proporcional ao comprimento da fase.
Com essas duas pressuposições, essa hipótese evidencia que se as condições
ambientais favorecem indivíduos com tempo de vida curto, então as duas fases
serão favoravelmente selecionadas em detrimento de um ciclo monofásico longo.
•
•
Menor custo biológico na reprodução em duas fases do que nos ciclos
monofásicos - A explicação de que o custo reprodutivo sexual em duas fases
é mais baixo que nos ciclos monofásicos tem as seguintes premissas:
i) os estudos evolutivos sobre ciclos de vida devem considerar a duração da
vida do indivíduo como uma constante, que corresponde ao período único
do desenvolvimento do indivíduo, desde esporo ou zigoto até a produção
pelo indivíduo de células reprodutivas (gametas ou esporos meióticos);
ii) a reprodução sexuada é considerada de elevado custo energético para os
organismos.
Agora, observe novamente a figura 5: em organismos de ciclo bifásico
(haplodiplontes), duas gerações de indivíduos ocorrem após uma meiose e uma fusão
de gametas; para os demais tipos de ciclos (monofásicos), as duas gerações de
indivíduos irão requerer dois ciclos, isto é, dois eventos de meiose e de fusão de
gametas. Portanto, o custo biológico para reprodução dos haplodiplônticos é duas
vezes menor do que para os organismos de ciclos monofásicos. Este menor custo
explica a manutenção desse ciclo em duas fases (alternância de gerações).
Os estudos sobre ciclos de vida das plantas têm revelado que, nos
organismos cuja reprodução tem os eventos de meiose e fertilização como centrais, a
alternância de gerações é considerada como um estágio intermediário de mudança de
haplóides para diplóides. As vantagens genéticas da diploidia são evidências para
esse direcionamento de mudanças.
Módulo V – Processos Reprodutivos
Relações
filogenéticas:
Relações evolutivas
entre grupos de
organismos,
deduzidas a partir
de estudos de
fósseis,
características
estruturais ou
sequencias de DNA.
Carófitas:
Algas verdes que
apresentam relações
filogenéticas muito
próximas às briófitas
e plantas vasculares.
Briófitas:
Pequenas plantas
folhosas que crescem
normalmente em
florestas úmidas ou
nas margens dos
rios, incluindo três
grupos: musgos,
hepáticas e
antóceros.
Plantas vasculares:
Plantas que possuem
o sistema de
condução de água e
seiva.
9
As relações filogenéticas encontram-se estabelecidas da seguinte forma
(McManos e Qiu, 2008 – figura 7):
•
Algas do grupo das Carófitas (mais basal).
•
Briofitas e alguns grupos de plantas vasculares (intermediária).
•
Plantas vasculares, especialmente gimnospermas e angiospermas (mais
derivadas).
Figura 7. Esquema simplificado das relações filogenéticas entre algas, briófitas e plantas
vasculares.
A tendência de tipos de ciclo de vida é a seguinte:
•
Os indivíduos haplóides predominam nos grupos mais basais.
•
As espécies que apresentam típica alternância de gerações (uma
geração de indivíduos haplóides seguida de uma de indivíduos
diplóides) constituem os grupos intermediários.
•
Grupos com a fase haplóide curtíssima, ou restrita aos gametas,
predominam entre as angiospermas e gimnospermas. Nesta
mesma ordem, há diversificação e aumento do número de genes
que regulam a meiose. Supõe-se que a predominância de um
estágio diplóide esteja diretamente relacionada com a expressão
desses genes.
Espera-se que os avanços dos estudos filogenéticos possam ancorar estudos
sobre evolução dos ciclos de vida nos diferentes organismos. Não se sabe se há entre
os diferentes grupos de organismos essa correspondência filogenética e do ciclo de
vida com predominância de diplóides, como demonstrado em plantas (McManos e
Qiu, 2008).
Geração e Ampliação da Variabilidade
Pense na seguinte assertiva:
“Os mecanismos moleculares e reprodutivos, de um lado, garantem a
fidelidade do DNA, e de outro geram a variabilidade entre os indivíduos.”
Ela parece contraditória, não? Mas se você imaginar que os mecanismos
moleculares ocorrem nas células dos indivíduos (por exemplo: replicação do DNA) e
os mecanismos reprodutivos incluem desde a produção dos gametas pelos
indivíduos até as interações entre os organismos e o ambiente, em busca da garantia
Módulo V – Processos Reprodutivos
10
de perpetuação das espécies, você verá que não é! Vamos entender os fundamentos
biológicos da assertiva que você acabou de ler?
Em uma população, a diversidade genética dos organismos de reprodução
sexuada origina-se de mutações e amplia-se por (figura 8):
•
Recombinação gênica.
•
Recombinação cromossômica.
•
Fertilização ao acaso.
Esses três mecanismos são típicos da reprodução sexuada e fazem com que a cada
geração surjam novas combinações gênicas. Desta forma, é possível haver ampliação
da variabilidade nas populações a cada geração, desde que existam condições
adequadas para preservação das populações.
Figura 8. Diagrama simplificado da ação de mecanismos moleculares e evolutivos
(mutação, recombinação e migração) nos ciclos de vida.
A cada geração, novos genótipos (indivíduos geneticamente diferentes)
podem surgir por mutações em diferentes regiões de cada gene, originando novos
alelos para diferentes genes. Ao mesmo tempo, os diferentes alelos podem
recombinar-se pelos mecanismos de crossing over entre cromossomos homólogos,
bem como pela distribuição aleatória dos cromossomos para os gametas. Os gametas,
por sua vez, irão encontrar-se aleatoriamente para formar o zigoto.
As plantas e animais dispõem de mecanismos que favorecem a fecundação
cruzada. Por exemplo, algumas espécies possuem as flores masculinas em uma
planta e as flores femininas em outra planta, de modo que o pólen necessita
movimentar-se para outra planta para promover a fecundação. Algumas plantas são
auto-incompatíveis, isto é, mesmo tendo flores andróginas o pólen somente irá emitir
tubo polínico viável ou produzir núcleo gamético que tenha sucesso em fusionar-se
com a oosfera se possuir combinações gênicas adequadas. Alguns animais possuem
sistema de determinação sexual em que os machos produzem gametas masculinos e
o hermafrodita produz tanto os gametas masculinos como femininos. Neste caso, se
as condições são adequadas, os gametas masculinos dos machos vão se fundir com os
gametas femininos dos indivíduos hermafroditos. Portanto, a fecundação cruzada é
um fator que favorece a fertilização ao acaso.
A diploidia possibilita que dois alelos distintos possam estar presentes em
mesmo indivíduo. Desta forma, os alelos recessivos são protegidos nos heterozigotos.
Como esses alelos não conferem vantagem adaptativa (visto que seus efeitos são
Módulo V – Processos Reprodutivos
Crossing over:
Troca recíproca de
DNA entre
cromossomos que
ocorre durante a
meiose e resulta na
recombinação
gênica.
Cromossomos
homólogos:
São cromossomos
que possuem os
mesmos locos
gênicos. Em uma
célula diplóide, cada
cromossomo
herdado do pai tem
o seu homólogo que
foi herdado da mãe.
Fluxo gênico:
Movimentação de
genes para uma
população por meio
de intercruzamentos,
ou por migração
seguida de
intercruzamentos.
Mais informações:
veja na unidade
sobre genética de
populações.
11
encobertos pelos efeitos do alelo de dominância), eles são mantidos ao acaso e suas
freqüências são constantes ao longo das gerações em populações em equilíbrio
genético. Além disso, há situações em que há vantagem do estado de heterozigoto,
em relação aos dois homozigotos correspondentes. Assim, a presença de diferentes
alelos por loco passa a ser mantida na população com mais intensidade. Em ambos
os casos, a diploidia é a condição que torna possível a manutenção dessa
variabilidade.
Populações diferentes de uma mesma espécie podem surgir por diferentes
mecanismos, tais como:
•
Adaptação climática de grupos de indivíduos (uma vez que
condições climáticas variam ao longo da variação geográfica).
•
Interrupção do fluxo gênico entre estes grupos de indivíduos e
início de uma população a partir de pequeno grupo de indivíduos
(efeito fundador).
Você terá um aprofundamento em estudos genéticos populacionais em uma
unidade inteiramente dedicada a este tema!
Replicação do DNA, reprodução e evolução dos ciclos de vida
Ao ler os próximos parágrafos, você deverá buscar conexões entre:
•
Os mecanismos de replicação do DNA.
•
Os tipos de reprodução dos organismos e evolução dos ciclos de
vida.
Vamos mostrar que esses fenômenos influenciam a evolução dos ciclos de
vida e de todas as características dos indivíduos.
Você já tentou explicar biologicamente a conhecidíssima expressão “filho de
peixe, peixinho é”? A principal explicação vem da constatação de que os filhos
adquirem seus genes a partir de seus pais pela herança dos cromossomos. Com a
descoberta de como o material genético se replica para produzir novas células, isto
fica mais claro. Os mecanismos de duplicação (isto é, replicação) da molécula de
DNA (ácido desoxidorribonucleico) são compatíveis com a fidelidade da reprodução
dos organismos (figura 9):
•
Duplicação por replicação da própria molécula de DNA.
•
Conservação da informação genética ao longo das gerações.
•
Preservação da variação genética (figura 9).
Módulo V – Processos Reprodutivos
12
Figura 9. Diagrama ilustrativo do papel da replicação do DNA como mecanismo central da
perpetuação das espécies. À esquerda, ciclo celular em organismos cujos indivíduos
são haplóides, em que a meiose ocorre após a formação do zigoto. À direita, ciclo
celular de diplóides, em que a meiose ocorre antes de formar os gametas. Ao centro,
molécula de DNA evidenciando a replicação semiconservativa. Observe que para
cada zigoto formado são requeridas duas meioses nos diplóides e uma meiose nos
haplóides.
As enzimas de revisão e reparação do DNA agem durante a replicação do
DNA, bem como depois de agressões químicas ou físicas ao DNA dentro da célula
para garantir a preservação da informação genética. Mas alguns erros ainda
permanecem sem ser corrigidos, passando para as células filhas (de células
somáticas e de células que produzem gametas).
Nos organismos de reprodução sexuada, os gametas que portam esses erros
(mutações) podem levá-los para as próximas gerações de indivíduos. Se esses erros
não comprometem os gametas por seleção negativa dentro do ciclo de vida, então
eles podem se acumular na população como variação genética.
Módulo V – Processos Reprodutivos
Células filhas:
Células originadas
após a meiose ou
mitose.
Células somáticas:
São as células que
constituem o corpo
do indivíduo.
13
Figura 10. Representação esquemática de duas espécies de peixes,
ilustrando a herança das características entre gerações.
Anteriormente discutimos a expressão popular - "Filho de peixe,
peixinho é! Será que ela contraria a expressão também muito comum
entre nós: "Juninho se parece mais com o avô do que com o pai!"?
Depois desta propaganda sobre a fidelidade da replicação do
material genético, como você explicaria essa aparentemente
contradição?
ATIVIDADE - Escreva algumas explicações que você daria para cada uma das
afirmações acima.
Como explicamos anteriormente, as recombinações (gênica e cromossômica;
alguns autores usam as expressões “recombinação gênica” e “distribuição
cromossômica”) e os encontros aleatórios dos gametas fazem com que esses
peixinhos não sejam assim tão iguais aos seus pais. De fato, a variação genética
acumulada na população, mesmo que grande parte dela não seja fenotipicamente
visível em alguns indivíduos, elas podem manifestar nos indivíduos das diferentes
gerações, dependendo de qual combinação gênica surja aleatoriamente. Portanto,
observe que tanto os mecanismos de fidelidade da transmissão da informação
genética como os mecanismos de recombinação da variação genética são
fundamentais para a preservação dessa variação genética, bem como da variabilidade
fenotípica nas populações.
Nós vimos que alguns mecanismos biológicos são responsáveis pela
ampliação das variações entre os organismos. O mais importante e mais estudado
deles é a meiose. Em outros momentos do curso, você estudou as características das
diferentes fases da meiose.
Você se lembra das características das diferentes etapas da meiose?
Observe os eventos meióticos indicados na Figura 11 e identifique quais das
características desses eventos são responsáveis pelos fenômenos da:
•
Recombinação entre genes localizados em uma determinada
região do cromossomo (genes ligados) ?
Módulo V – Processos Reprodutivos
14
•
Recombinação entre genes localizados em diferentes cromossomos
(genes independentes) ?
Figura 11. Representação dos eventos de crossing over e anáfase na meiose.
Uma das conclusões mais importantes é visualizar que o crossing over que
ocorre na prófase I é responsável pela recombinação de genes ligados, e que as
anáfases I e II são responsáveis pela recombinação entre os genes independentes (ou
Módulo V – Processos Reprodutivos
15
seja, aqueles que se encontram em cromossomos distintos, já que cada um deles vai,
independentemente dos outros, constituir cada gameta).
Diferentes tipos de reprodução têm implicações na variabilidade
Na reprodução assexuada, um indivíduo passa cópias de seus cromossomos
para as progênies. As células, ou os propágulos reprodutivos são gerados por mitose,
motivo pelo qual as células dos filhos são idênticas às dos pais.
Figura 12. Esquema geral da mitose.
Diferenças genéticas ocasionais são geradas por mutações e observadas na
progênie. Contudo, em geral, os indivíduos filhos são idênticos entre si e aos pais,
motivos pelos quais são denominados clones.
Na reprodução sexuada, cada um de dois indivíduos genitores passa metade
de seus cromossomos para formar o novo indivíduo. As células reprodutivas (os
gametas masculino e feminino) são geradas por meiose e se fundem no zigoto.
Figura 13. Esquema geral da reprodução humana.
Assim, essa metade cromossômica de cada genitor possui arranjo único de
genes, resultante do processo de recombinação gênica que ocorre na meiose, fazendo
com que as células do filho não sejam idênticas às dos respectivos genitores.
Nota:
Módulo V – Processos Reprodutivos
16
Na unidade sobre “sexo e evolução” você terá a oportunidade de
discutir sobre a importância evolutiva do sexo, seu surgimento e processos
seletivos que o envolvem. Nesta unidade introdutória nosso foco é
evidenciar importância e consequências dos tipos de reprodução. Você vai
perceber que recombinação gênica proporcionada pela reprodução sexuada
permite reorganizar a variabilidade genética que existe na forma de
diferentes formas para cada gene nos diferentes organismos.
Estamos bastante acostumados a admirar a ampla variabilidade de
organismos pluricelulares. Algo semelhante acontece aos microrganismos. Por
exemplo, há diferentes tipos de bactérias:
Figura 14. Diversidade de formas das células bacterianas.
Vocês já imaginaram como seria o ciclo de vidas desses microrganismos acima?
ATIVIDADE – Redija um texto, descrevendo como esses microrganismos se
reproduzem.
- Prossiga com a leitura do texto, somente após a realização da
atividade .
Os organismos unicelulares apresentam reprodução rápida e possuem
milhões de indivíduos por população. Isto propicia que as mutações representem
quantidades elevadas de indivíduos sendo desafiados no ambiente. Por exemplo, a
bactéria Escherichia coli se reproduz por divisão binária (processo assexuado) de
forma rápida, de modo que em um ser humano são repostas cerca de 2x1010 bactérias
a cada dia, das quais cerca de 2.000 são mutantes. Neste cálculo, foi considerado que
Módulo V – Processos Reprodutivos
17
apenas um dos seus genes sofreu mutação, a uma taxa de 1 x 10-7 mutações por
divisão celular. Imagine que este número de mutantes será muito maior, visto que
mais de um gene pode mutar por geração! Desta forma, as mutações constituem a
mais importante força evolutiva para os organismos unicelulares.
Também nas bactérias ocorrem mecanismos especiais de recombinação gênica. O
mais estudado deles é a transformação gênica, em que plasmídios contendo
diferentes genes podem se inserir em células bacterianas diferentes de uma mesma
espécie.
O ciclo de vida de um vírus do tipo bacteriófago consiste na introdução do
seu DNA em uma bactéria, seguida da multiplicação de muitas cópias deste DNA e
síntese das proteínas da capa (usando para isto todo o aparato bacteriano). Após o
empacotamento das partículas virais, a bactéria se rompe (lise), liberando os vírus
para o meio. Durante o ciclo, podem ocorrer mutações na molécula de DNA, gerando
variação genética entre as partículas virais. Quando múltiplas moléculas de DNA
viral são liberadas dentro da bactéria e há diferenças genéticas entre seus genes, pode
haver recombinação entre as moléculas de DNA viral, gerando partículas virais
recombinantes.
Plasmídeos:
São moléculas de
DNA dupla fita
circular que ocorrem
geralmente em
bactérias e são
duplicadas de forma
independente do
cromossomo
principal
Os organismos mais complexos geralmente possuem longo tempo de
geração, populações relativamente pequenas e genótipos adaptados a
microambientes específicos. Assim, dificilmente estes organismos poderiam valer-se
das mutações como a principal fonte de variabilidade genética para responder
rapidamente a mudanças ambientais significativas. Desta forma, embora as mutações
também sejam a fonte primária de variações nos genes dos organismos complexos,
estes necessitam de mecanismos para trocar as informações genéticas e gerar novas
combinações de genes a serem testadas no ambiente. Esse mecanismo de troca é a
reprodução sexuada. Para Mayr (1997), o efeito de troca entre indivíduos e de
ampliação da variabilidade é tão direto e grandioso que certamente o sexo tenha
surgido muito cedo na história dos seres vivos.
Nos organismos de reprodução sexuada, a recombinação gênica que ocorre
na meiose faz com que cada gameta produzido seja um arranjo único de mistura de
porções de moléculas de DNA que o indivíduo herdou de seus genitores. Lembre-se
que apesar de cada cromossomo possuir uma única molécula de DNA, esta molécula
duplica-se em preparação à divisão celular. As duas fitas de DNA de cada
cromossomo em prófase envolvem-se em recombinações com as duas fitas do
cromossomo homólogo durante a meiose. Assim, o cromossomo que o indivíduo
herdou de seu pai troca porções com cromossomo que ele herdou de sua mãe (esse
fenômeno é denominado de recombinação gênica ou crossing over). Da mesma forma,
a segregação dos cromossomos durante a meiose (quando ocorre redução do número
cromossômico nas células filhas) é aleatória, de modo que cada gameta produzido
por um indivíduo é a combinação de cromossomos que ele recebeu de seus genitores
(pai e mãe). Portanto, novas combinações de genes serão testadas pelo ambiente em
várias gerações que se sucedem.
A reprodução sexuada possibilita o que Darwin chamou de “seleção sexual,
isto é, refere-se à vantagem que certos indivíduos tem sobre outros do mesmo sexo e
espécie, apenas em relação à reprodução”. Geralmente, a seleção sexual é tratada
como um componente da seleção natural, visto que a seleção opera após a formação
dos gametas, em mecanismos de isolamento reprodutivo e diferenças de uso do
ambiente.
Contudo, há organismos complexos que se reproduzem por:
Módulo V – Processos Reprodutivos
Um tipo especial de
recombinação ocorre
nos genomas de
bacteriófagos:
se dois tipos de
bacteriófagos
infectam
simultaneamente
uma bactéria, após
um ciclo de
replicação viral são
encontrados os
recombinantes.
18
•
Auto fecundação: animais hermafroditas e plantas andróginas, em que a
fecundação ocorre entre gametas masculino e feminino produzidos pelo
mesmo indivíduo.
Figura 15. Esquema de um verme, ilustrativo de animal
hermafrodita.
•
Partenogênese mitótica: em que o ovo se forma a partir de células
diplóides por mitose.
Figura 16. Abelhas diplóides (fêmeas) e haplóides (machos).
•
Propagação vegetativa: em que brotos da raiz, ou do caule ou das folhas
originam outros indivíduos.
Figura 17. Uso de brotações laterais em cebola como propágulos reprodutivos.
Nesses, a troca de informações genéticas entre indivíduos não ocorre.
Segundo Futuyma (1992), as populações dos indivíduos que apresentam esses tipos
de reprodução que não favorecem a recombinação possuem uma taxa de extinção
mais elevada. Portanto, em termos evolutivos, a manutenção do sexo deve-se a que a
recombinação favorece a habilidade das populações para se adaptarem a ambientes
em alteração.
Módulo V – Processos Reprodutivos
19
Outra evidência é o surgimento de espécies de plantas de reprodução
assexuada a partir de ancestrais que possuem reprodução sexuada (exemplo: dentede-leão, Taraxacum officinale). Um dos modelos que explica a manutenção da
reprodução sexuada propõe que em um mosaico de micro ambientes diferentes, a
competição entre a descendência diversificada de um genótipo de indivíduos com
reprodução sexuada irá favorecer alguma variedade existente em sua população.
Para que este modelo seja válido, devemos imaginar que para uma população se
adaptar a cada micro ambiente são necessárias muitas combinações diferentes de
alelos em cada loco. Se você considerar ainda os milhares de locos gênicos que cada
espécie possui, poderá perceber a infinidade de combinações possíveis
Tanto as espécies que se reproduzem por auto fecundação como por
fecundação cruzada evoluem e se mantem. De fato, podem ser identificadas
vantagens para a auto fecundação: em ambientes hostis, com pequeno número de
indivíduos de determinada planta, na ausência do polinizador específico, o fluxo
gênico entre indivíduos ficará comprometido; os indivíduos que se auto fecundarem
terão garantia de mais descendentes nas próximas gerações. No entanto, em plantas
não adaptadas à auto fecundação pode ocorrer depressão endogâmica em situações
de auto fecundação. Apesar de muitos parasitas humanos serem hermafroditas, a
maioria prefere fecundação cruzada, desde que as condições de hospedeiro
permitam. Portanto, como observado em plantas e animais, a fecundação cruzada
será mais vantajosa em populações grandes, crescendo em condições ambientais
adequadas, ao passo que a auto fecundação será mais vantajosa em populações
pequenas e ambientes desfavoráveis.
Transferência genética interespecífica e fusão de genomas
Até agora enfatizamos as trocas de informações genéticas em mesma espécie.
Contudo, deve-se observar que há mecanismos de trocas genéticos entre diferentes
espécies, no caso daqueles organismos cuja reprodução é sexuada. Em alguns casos,
são envolvidas espécies afins, e em outros, podem-se identificar diferentes níveis
taxonômicos:
•
Hibridação interespecífica:
Geralmente ocorre entre espécies afins, como pode ser ilustrado pelo uso
de diferentes espécies de eucaliptos (Eucalyptus spp) na produção de
híbridos férteis, visando selecionar plantas no melhoramento desta cultura.
As implicações evolutivas desses fenômenos de fusões genômicas podem
ser também ilustradas com o melhoramento de plantas a partir de
hibridação inter específica. Em trigo, os melhoristas desenvolveram plantas
que são verdadeiras misturas de cromossomos provenientes de hibridações
entre diferentes espécies de trigo, de modo a obter cultivares adequados
para produção do pão (apreciado no mundo inteiro), tolerantes a metais no
solo e possuidores de outras características favoráveis. Na natureza,
também são encontrados híbridos entre espécies relacionadas, como
ilustrado pelo Cymbidium x ballianum (híbrido natural entre Cymbidium
eburneum e Cymbidium mastersii).
•
incorporação de endo-simbiose:
As mitocôndrias e os cloroplastos das células eucariotas possuem genes e
mecanismos bioquímicos similares aos de bactérias. Com base nestas
evidências, postula-se que bactérias endo-simbiontes de células eucariotas
Módulo V – Processos Reprodutivos
Depressão
endogâmica:
Fenômeno que
representa a
diminuição do valor
fenotípico médio de
uma população
devido aos
acasalamentos
consangüíneos.
Fecundação cruzada:
É a união de gametas
originários de dois
indivíduos
diferentes, sendo a
única forma de
fecundação nas
espécies com sexos
separados.
20
primitivas tenham-se transformado nessas organelas celulares ao longo do
processo evolutivo.
•
Transformação genética:
Agrobacterium tumefaciens insere alguns de seus genes no genoma de
plantas hospedeiras específicas, as quais modificam sua fisiologia no
tecido local, propiciando a sobrevivência dessa bactéria nas estruturas
vegetais modificadas, denominadas galhas. Foi graças a esta propriedade
natural que esta bactéria passou a ser usada por geneticistas para o
desenvolvimento de plantas transgênicas.
•
Fusão de genomas:
As ilhas de patogenicidade encontradas em bactérias que causam doenças
em plantas e animais possuem estruturas similares a vírus, indicando que
essas regiões genômicas bacterianas sejam resultado de fusão de genomas
virais com os de bactérias. O termo fusão de genomas é também utilizado
para se referir indistintamente a todos esses diferentes grupos de exemplos
de transferência de informação genética inter específica.
Processos de Conservação da Variabilidade e Adaptação
Como vimos anteriormente, nos organismos de reprodução sexuada a
segregação aleatória dos alelos na meiose e a fusão aleatória dos gametas na
fertilização são responsáveis por “reorganizar” os polimorfismos existentes entre os
indivíduos reprodutivos (os alelos existentes na população), gerando a maioria da
variabilidade genética nova que se pode observar a cada geração.
Você já parou para pensar por que os organismos que sobrevivem nos
ambientes parecem tão bem adaptados aos seus ambientes? Os fenômenos que
reorganizam os polimorfismos genéticos na população não explicam essa adaptação,
uma vez que se trata de fenômenos aleatórios com relação ao modo pelo qual os
organismos sobrevivem nos ambientes. Na verdade, as mudanças em uma espécie,
causadas por modificações no ambiente, podem ocorrer porque os genótipos
diferentes (produzidos por mutação e recombinação) têm habilidades diferentes para
sobreviver e se reproduzir.
Neste mesmo cenário de populações, em que as variações são geradas e
reorganizadas, há forças evolutivas que mantém a variabilidade:
•
Em nível celular e de organismo.
•
Em nível das populações.
Você já observou que em vários livros de biologia alguns organismos
aparecem como modelos de estudos? A seguir, vamos descrever algumas
características reprodutivas e dos ciclos de vida de alguns organismos muito
utilizados em estudos evolutivos:
Escherichia coli: é uma bactéria presente no intestino humano e outros
ambientes. Trata-se de um organismo unicelular e haplóide, possuindo um
cromossomo circular. Seu ciclo de vida completo leva 20 minutos em
condições ótimas de crescimento. Possui reprodução assexuada por fissão
Módulo V – Processos Reprodutivos
Em nível celular e
de organismo:
A replicação precisa
e o reparo de danos
do DNA são
exemplos de
mecanismos que
mantém a identidade
dos indivíduos ao
longo de suas vidas.
Em nível das
populações:
As proporções de
variabilidade de
formas gênicas
(alelos) e genotípicas
mantém-se ao longo
das gerações se
forem observadas
condições favoráveis
ao equilíbrio
populacional.
Contudo, a
adaptabilidade das
novas combinações e
mutações pode
induzir novos
processos de seleção.
Neste sentido,
geração, ampliação e
manutenção da
variabilidade atuam
de forma simultânea
e em todas as
características, ao
mesmo tempo em
que a seleção pode
fazer com que haja
mudanças das
características com o
tempo. E, as
características que se
referem aos ciclos de
vida também se
encontram sob essas
forças evolutivas.
21
celular e pode eventualmente realizar recombinação genética por conjugação
sexual.
Saccaraomyces cerevisae: é um fungo conhecido como levedura, utilizado como
fermento de pão e cerveja. Trata-se de um organismo unicelular e haplóide,
possuindo 16 cromossomos lineares no núcleo das células. Seu ciclo de vida
completo leva 90 minutos em condições ótimas de crescimento. Possui
reprodução assexuada por mitose e pode apresentar uma fase sexuada pela
fusão de dois tipos celulares haplóides, formando células diplóides que se
dividem por meiose, originando novamente células haplóides.
Eventualmente, após a formação das células diplóides elas podem dividir-se
por mitose, formando células diplóides.
Arabidopsis thaliana: é uma planta da mesma família da couve, que apresenta
pequeno porte, utilizada em pesquisa científica. Trata-se de um organismo
multicelular e com fase diplóide predominante (esporófito) e fase haplóide
muito curta (gametófito), possuindo 10 cromossomos lineares no núcleo das
células. Seu ciclo de vida completo leva seis semanas. Possui reprodução
sexuada.
Drosophila melanogaster: é a mosca-das-frutas, encontrada em frutos maduros
e cascas de frutos em putrefação. Trata-se de um organismo multicelular e
diplóide, possuindo oito cromossomos lineares no núcleo das células. Seu
ciclo de vida completo leva 12 dias do ovo ao adulto. Possui reprodução
sexuada.
Mus musculus: é o camundongo utilizado como modelo de estudos em
mamíferos. Trata-se de um organismo multicelular e diplóide, possuindo 40
cromossomos lineares no núcleo das células. Seu ciclo de vida completo leva
10 semanas do nascimento até ter filhotes. Possui reprodução sexuada.
ATIVIDADE - Busque informações sobre ciclo de vida na internet e
em livros didáticos de biologia sobre as espécies de seu
interesse e aquelas indicadas na figura 18.
- Utilize o nome da espécie como palavra-chave,
associado com as expressões “ciclo de vida” e
“reprodução”, para conhecer as características
reprodutivas e de ciclos de vida.
- Amplie seus conhecimentos sobre esse tema,
confrontando as características de diferentes ciclos de
vida com os quatro tipos descritos nesse capítulo e
com os exemplos citados acima.
Provavelmente as espécies que você escolheu possuem ciclos de vida mais
longos do que os exemplos acima (pelo menos as plantas e os animais), uma vez que
os modelos de estudos geralmente incluem organismos de curto ciclo de vida.
Módulo V – Processos Reprodutivos
22
Figura 18. Exemplos de organismos com diferentes tipos de ciclos de vida. A) Fungos
decompondo um troco de árvore; B) Cão (Nininha); C) Samambaia; D) Abelha
visitando.uma flor. Fotos do autor.
Atenção
Na unidade sobre genética de populações
contida nesse módulo você terá explicações
detalhadas sobre a maneira de calcular essas
proporções (quantidades) de genes e
genótipos. Também irá aprender por que
essas proporções de variação somente podem
ser mantidas na população se não acontecem
os fenômenos perturbadores, tais como
redução drástica do tamanho da população,
introdução de novos indivíduos na
população e acasalamentos não ao acaso.
Módulo V – Processos Reprodutivos
23
Resumo e Conclusão
•
Os ciclos de vida dos organismos variam quanto ao nível de ploidia
dos indivíduos, à duração e ao número de fases entre os eventos de
meiose e fertilização. Portanto, além dos três tipos clássicos de ciclos
de vida (indivíduos haplóides, diplóides e alternância de gerações),
outras variações podem existir como ilustrado nesse texto pelos
haplo-diplóides (em mesma geração machos e fêmeas tem diferentes
níveis de ploidia).
•
A seleção natural ocorre nas diferentes características dos ciclos de
vida, tanto nos estágios haplóides como nos diplóides, em cada
geração, a depender de qual estágio a expressão do genótipo
influencia a sobrevivência ou a fertilidade do indivíduo e das
estruturas reprodutivas. Pelo menos em plantas, aspectos ecológicos
e genéticos são demonstrados como vantagens para manutenção da
diploidia, mesmo em organismos que tem indivíduos adultos como
haplóides.
•
A fidelidade da replicação do material genético é assegurada pela
estrutura do DNA e pelos dinâmicos mecanismos enzimáticos que
catalisam sua replicação. Contudo, a mutabilidade do DNA
possibilita a geração de formas alternativas para os genes. Estas
formas alternativas são conhecidas como alelos e podem recombinarse ao longo das gerações. Se populações estão em condições ideais de
reprodução e crescimento, mecanismos moleculares da célula e
biológicos da reprodução fazem com que a variação genética e a
variabilidade fenotípica se mantenham na população.
•
Nos animais e plantas superiores, tanto as espécies que se
reproduzem por auto fecundação, como as que se reproduzem por
fecundação cruzada, se mantem na natureza. Portanto, há vantagens
adaptativas nestes dois sistemas. Contudo, a maior taxa de extinção
para espécies de auto fecundação parece indicar maiores vantagens
para a fecundação cruzada.
Módulo V – Processos Reprodutivos
24
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Módulo V – Processos Reprodutivos
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EVOLUÇÃO DOS CICLOS DE VIDA NOS DIFERENTES