Matemática das Esferas Série Estimativas Objetivos 1. Introduzir o problema do empacotamento esférico e suas aplicações práticas. Matemática das Esferas Série Estimativas Conteúdos Estimativas, áreas e volumes, empacotamento esférico. Duração Aprox. 10 minutos. Objetivos 1. Introduzir o problema do empacotamento esférico e suas aplicações práticas. 2. Ensinar o aluno os princípios básicos para fazer uma boa estimativa. 3. Incentivar o aluno a descobrir outros métodos de estimativa. Sinopse O apresentador do programa e seus convidados querem saber quantas moedas caberiam numa quadra de vôlei e quantas laranjas numa sala de aula – e descobrem que os problemas estão conectados. Material relacionado Áudios: Outro áudios; Experimentos:Quantos peixes há no lago; Introdução A ideia da série é incentivar os alunos a fazerem estimativas numéricas sobre perguntas abertas: Quantas pizzas são consumidas por ano no Brasil? Quantas laranjas cabem na sala de aula? Quanto tempo um fusca levaria pra chegar até a lua? Quantos pneus são descartados por ano no Brasil? O que se espera do aluno é um raciocínio organizado, que o conduza a arriscar uma resposta razoável - não necessariamente exata. Para ajudá-lo, colocamos alternativas com ordem de grandezas diferentes, de modo que diferenças pequenas possam ser desprezadas. Perguntas como as acima, além de seu interesse intrínseco, são exercícios interessantes, pois os alunos formulam conjecturas, hipóteses e, a partir delas, chegam a uma conclusão. Este tipo de questão às vezes é chamado de Fermi question, em homenagem ao físico Enrico Fermi, que costumava propor questões abertas a seus alunos. Atualmente, várias empresas têm usado questões semelhantes em seus processos seletivos de contratação. Alguns exemplos do uso desse tipo de questões na contratação de pessoas para trabalhar na empresa Microsoft são descritos em Pundstone (2005). Além disso, alguns vestibulares já incluíram em suas provas questões exigindo raciocínio dedutivo e estimativas. Em Paulos (1994), discute-se a importância desse tipo de atividade como forma de incentivar os alunos a pensarem em questões do cotidiano e desenvolverem esse tipo de raciocínio lógico que é bastante útil no dia a dia. Na maioria dos áudios, é sugerido um caminho para abordar as questões, mas existe espaço para o professor propor soluções diferentes ou discutir as hipóteses levantadas no programa. Estimativas Matemática das Esferas 3/15 Sobre o programa De nome Chute Certo, o programa explora, descontraidamente, questões abertas cujas respostas são desconhecidas e em geral difíceis de determinar com exatidão. Elas exigem um raciocínio lógico que vai além da aplicação de fórmulas. Em dois blocos, o apresentador, seu assistente e o convidado discutem maneiras simples de se obter estimativas. No primeiro bloco, bloco o apresentador enuncia o problema que analisará, junto com os convidados, no programa. Resumidamente, a questão é: “Sem amontoar uma em cima da outra, quantas moedas de um real cabem em uma quadra de vôlei?”. vôlei?”. Assim como em todas as estimativas, vamos precisar montar um plano de resolução, chutar alguns valores necessários para a continuidade do cálculo e realizar algumas conversões de medidas para chegarmos numa resposta satisfatória. A maneira mais natural de abordar este problema é determinar quantas moedas cabem numa fileira que se estende pela quadra numa direção e depois multiplicar esse número de moedas pelo tamanho do lado perpendicular a essa direção. Errata: Num trecho do audio, o assistente do programa informa que quadra de vôlei possui 9 x 9 m², mas na verdade a quadra tem aproximadamente 18 x 9 m². Nos cálculo feitos no programa as dimensões corretas foram consideradas. Estimativas Matemática das Esferas 4/15 O diâmetro da moeda é de 27mm, assim, na direção do comprimento é possível colocar 18m/27mm ≈ 666 moedas enfileiradas. Já na direção da largura, conseguimos dispor 9m/27mm ≈ 333 moedas numa fila. A multiplicação das fileiras nos dá o número total de moedas que cabem nesse espaço, que é 333 x 666 ≈ 221778 moedas. Apesar de ser a abordagem mais simples e natural desse problema, a solução encontrada desta maneira não é a melhor possível. Essa disposição em fileira ocupa apenas cerca de 78% de todo o espaço livre (a demonstração desse valor está na sugestão de atividades mais abaixo). Figura 1: Ilustração de uma solução do problema: moedas colocadas em filas. Repare que a parte destacada em azul é o desperdício de espaço, neste caso, cerca de 22%. Estimativas Matemática das Esferas 5/15 Se essa maneira não é a mais eficiente, como devemos dispor as moedas para maximizar a área ocupada por elas? O professor convidado do programa nos diz que para a área ocupada seja a máxima possível, é preciso colocar as moedas num arranjo triangular, onde cada moeda situa-se nos vértices de um triângulo equilátero. Dessa maneira, é possível ocupar um pouco mais de 90% da área total. Figura 2: Ilustração da melhor solução para o problema de distribuir moedas na quadra de vôlei. Sabendo-se que o aproveitamento de espaço máximo de uma disposição de moedas numa região é de aproximadamente 90%, para sabermos quantas moedas cabem na quadra de vôlei basta tomar 90% da área da quadra e dividir pela área de uma moeda. Estimativas Matemática das Esferas 6/15 Assim, dado que a área total da quadra é de 9m x 18m = 162 m², tomando 90% desse valor obtemos a “área útil” Aútil = 145,8 m². A área da moeda é dada por A = πr². Se a moeda tem 27 mm de diâmetro, então seu raio é r = 27/2 = 13,5 mm = 0,0135 m. Então Amoeda = π(0,0135m)² ≈ 5,7 x 10-4 m². Finalmente, fazendo a divisão Aútil/Amoeda = 145,8/5,7x10-4 determinamos a quantidade máxima de moedas que podem ser dispostas na quadra, que é aproximadamente 255789 moedas. Se ao invés da quadra de vôlei quiséssemos saber quantas moedas cabem num campo de futebol, de 100 x 64 m², basta fazer o mesmo cálculo: Aútil= 0,9 x 6400 = 5760 m². Aútil/Amoeda = 5760/5,7x10-4 ≈ 10 milhões de moedas No segundo bloco a pergunta feita é: “Quantas laranjas cabem numa sala de aula?”. aula?”. Intuitivamente nota-se que o problema é parecido com o anterior, mas a diferença é que ao invés de círculos (moedas) e áreas, o trabalho é determinar quantas esferas (laranjas) ocupam um determinado volume do espaço. Nesse sentido, será preciso estimar as dimensões de uma sala de aula e do volume de uma laranja para prosseguir com os outros cálculos. A sugestão do assistente do programa é que uma sala de aula tem, em média, 6 metros de largura, 8 de comprimento e 3 de altura. Dessa forma, o volume da sala é 6m x 8m x 3m = 144 m³. Estimativas Matemática das Esferas 7/15 Em relação à laranja, o assistente disse que, apesar de poder variar, o tamanho aproximado do diâmetro de uma laranja é de 6 cm. Se prosseguirmos com o cálculo fazendo a abordagem por fileiras, como utilizamos no exemplo anterior das moedas na quadra de vôlei, vamos encontrar uma resposta satisfatória, mas que pode ser melhorada – isto é, não é a configuração que otimiza o aproveitamento do espaço. Sabe-se, contudo, que na melhor das configurações é possível ocupar cerca de 74% do volume total da sala. Assim, faremos essa estimativa de maneira análoga a anterior. Tomando 74% do volume da sala e dividindo essa grandeza pelo volume de uma laranja, determinamos quanto de laranjas a sala comporta. Sendo o volume da sala 144 m³, fazendo Vútil = 74% x 144 = 106,56 m³ obtemos o volume efetivo que será ocupado pelas laranjas. Para determinar o volume da laranja, utilizamos a fórmula conhecida do volume de uma esfera – dada por V = 4πr³/3, onde r é o raio da esfera. Foi estimado o diâmetro da laranja em D = 6 cm. Como resf = D/2, nosso raio é 3 cm e o volume fica Vlaranja = 4π(0,03)³/3 ≈ 11,0 x 10-5 m³ Repare que trabalhamos em metros, e não em centímetros, para manter a consistência dimensional das grandezas. Finalmente, a divisão Vútil/Vlaranja 106,56 m³ / 11,0 x 10-5 m³ ≈ 940 000 determinamos o resultado final, isto é, caberiam algo em torno de 950 mil laranjas numa sala de aula. Estimativas Matemática das Esferas 8/15 Sugestões de atividades Antes da execução Sugerimos que o professor utilize esse áudio no contexto das aulas de geometria espacial, dando ênfase na aplicação dos conceitos estudados. Há inúmeros exemplos de aplicações na qual é preciso calcular volumes e determinar relações entre objetos – o áudio só apresenta uma delas. Na bibliografia colocamos alguns livros que podem ajudar o professor a entender o panorama histórico e utilizá-lo como subsídio para a apresentação desse áudio. O professor pode optar por passar o áudio de uma só vez e discutir com os alunos novos métodos para resolver os problemas propostos no programa. Se este for o caso, pule o tópico seguinte. Se o professor preferir interromper a áudio, leia o próximo tópico. Durante a execução Caso o professor preferir, ele pode, no primeiro bloco, fazer uma pausa no áudio em 01:32, logo após o apresentador ter feito as perguntas, para deixar aos alunos o trabalho de resolver a questão. No segundo bloco, essa pausa pode ser feita em 01:01. Depois da execução Seguem abaixo informações gerais que podem ser discutidas em sala de aula. Os problemas estudados nessa edição do programa são denominados problemas de empacotamento esférico. Estes problemas têm inúmeras aplicações, incluindo a transmissão de sinais Estimativas Matemática das Esferas 9/15 de TV e telefone. Em geral, busca-se a melhor maneira de posicionar esferas num espaço de modo a preenche-lo o máximo possível. No caso plano (duas dimensões) consideramos círculos e suas áreas, no espaço (três dimensões) fazemos a análise com esferas e volumes. Podemos estender esta ideia para espaçõs de dimensões maiores, sem perder a ideia do empacotamento, como o nome sugere. A medida do quanto do espaço é ocupada pelas esferas em um empacotamento é chamada densidade de empacotamento. Nas estimativas feitas nesse áudio, utilizamos valores conhecidos da densidade máxima de empacotamento para os casos no plano e no espaço. Esses valores foram dados, embora possam ser demonstrados via argumentos da geometria. A seguir, daremos uma ideia de como fazer isso. O termo densidade, emprestado da física, sugere uma relação entre grandezas do tipo “quantas unidades de uma coisa cabem em outra coisa”. No nosso caso, estabeleceremos a relação entre quantidade de moedas que cabem numa determinada área fixa e depois faremos para o caso espacial (quantas esferas cabem num volume fixo). Vamos analisar as duas soluções propostas para o empacotamento de moedas na quadra de vôlei. Para analisarmos a primeira solução, devemos investigar a relação entre a área do círculo inscrito num quadrado e a área deste quadrado. Vamos denotar por d a fração da área do quadrado que é ocupada pela área do círculo, ou seja, d = Acírculo/Aquadrado = πr²/L². Figura 3: Circulo de raio r inscrito num quadrado de lado L Estimativas Matemática das Esferas 10/15 Como o quadrado tangencia o circulo diametralmente, L = 2r, de onde d = πr²/(2r)² = πr²/4r². Simplificando a expressão obtemos, d = π/4 ≈ 0,78 Repare que esse valor de densidade não muda caso o lado do quadrado seja multiplicado por uma constante k. Como o raio do circulo está vinculado ao comprimento do lado do quadrado, e viceversa, uma dilatação ou contração das dimensões não altera o valor de d. Além disso, o valor da densidade permanecerá igual caso façamos uma fileira desses quadrados com círculos inscritos, como na figura 4: Figura 4: Círculos empacotados em fileira. O valor de d também não mudará se agregarmos varias fileiras justapostas. O resultado geral mostra que a densidade de empacotamento de círculos (que não se sobrepõem e tangenciam as bordas de uma região), inscritos em retângulos enfileirados é sempre a mesma, d = π/4, por isso utilizamos esse valor nas estimativas do programa. Estimativas Matemática das Esferas 11/15 Figura 4: Empacotamento hexagonal de círculos no plano. A solução ótima: A segunda solução proposta no áudio para o problema é um pouco mais sofisticada e resulta na melhor forma de empacotar círculos num plano (conforme ilustração na figura 4). Neste caso, a densidade de empacotamento deriva da relação entre a área de um círculo inscrito num hexágono regular e a área deste hexágono. d = Acírculo/Ahexágono Figura 5: Circulo de raio r inscrito num hexágono regular de lado L Estimativas Matemática das Esferas 12/15 A área do circulo se mantém Acírculo=πr². Já para calcular a área do hexágono, vamos dividir o trabalho em duas partes: primeiro calculamos a área em função do lado L, depois encontramos uma relação entre r e L para expressar a área do hexágono em função de r, substituindo na primeira expressão encontrada. Sabe-se que um hexágono regular pode ser visto como uma junção de seis triângulos equiláteros de lado L. Assim, sua área corresponde a soma da área de seis triângulos equiláteros de lado L. A altura de um triângulo equilátero de lado L é facilmente deduzida pelo teorema de Pitágoras, e vale L x (√3)/2. A área desse triângulo é Atriângulo= base x altura / 2 = L x L x ((√3)/2) / 2 = L²(√3)/4. De modo que a área do hexágono é dada por: Ahexágono = 6 x Atriângulo = 6L²(√3)/4 = L²3(√3)/2 (I) Para determinar a relação entre o lado do hexágono e o círculo nele inscrito, olhemos para o triângulo construído na figura acima. Pelo teorema de Pitágoras, tem-se: r²+(L/2)² = L² r²+L²/4=L² 4r²/3=L² (II) Assim determinamos uma relação entre L e r. Substituindo (II) em (I), obtemos: Ahexágono = L²3(√3)/2 = (4r²/3) 3(√3)/2 = 2√3r² Que é a área do hexágono em função de r. Para determinar a densidade de empacotamento nesse caso, basta dividirmos a área do círculo pela área do hexágono: Estimativas Matemática das Esferas 13/15 d = Acírculo/Ahexágono = πr²/2√3r² = π/2√3 ≈ 0,9069 Repare que essa densidade é maior que a encontrada anteriormente utilizando um quadrado como base. O resultado geral segue a mesma ideia anterior: O fato das dimensões do círculo estarem vinculadas às do hexágono, uma contração ou dilatação no tamanho do raio não vai alterar o valor da densidade. Da mesma forma, se dispormos essa configuração em arranjos hexagonais maiores, como na figura 4, o valor da densidade permanecerá o mesmo. O caso tridimensional: No caso tridimensional, os argumentos são análogos aos utilizados no plano. Para determinar a densidade de empacotamento de esferas num arranjo onde as esferas são inscritas em cubos empilhados, basta estabelecer a densidade de uma única esfera inscrita num cubo. A esfera tangencia o centro de todas as faces do cubo, de modo que o lado do cubo está relacionado ao raio da esfera por L = 2r. Se Vcubo = L³ = (2r)³ = 8r³ e Vesfera = ⁴/Kπr³, a densidade é d = Vesfera/Vcubo = π/6 ≈ 0,52 Qualquer arranjo posterior que se basear em sobreposições de esferas “contidas” em cubos “imaginários” também apresentará esse mesmo valor de densidade. No entanto, este não é a melhor maneira de empacotar esferas num espaço tridimensional. A melhor configuração é deduzida a partir de uma pilha de esferas com base triangular. Neste caso, a densidade pode ser calculada pela relação entre o volume de uma esfera inscrita num dodecaedro rômbico e o volume deste poliedro. Não deduziremos essa relação mas nas sugestões de leitura o professor pode encontrar esta e outras informações sobre o assunto caso deseje um aprofundamento. Estimativas Matemática das Esferas 14/15 Sugestões de leitura CONWAY, J. H., & SLOANE, N. J. A. Sphere packings, lattices and groups, third ed., vol. 290. Springer-Verlag, New York, 1999. PAULOS, John Allen. Analfabetismo em matemática e suas consequências. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1994. POLYA, G. A arte de resolver problemas: um novo aspecto do método matemático. Rio de Janeiro: Interciência, 1995. PUNDSTONE W. Como mover o monte Fuji. Ed. Ediouro, 2005. Fundamentos da mat. Elementar – Combinatorial. TOREZZAN, C. Códigos esféricos e toros planares. Tese de doutorado. Unicamp, 2009. Ficha técnica Autores Alan Bondesan De Maria e Cristiano Torezzan Revisão Cristiano Torezzan Coordenação de Mídias Audiovisuais Coordenação Geral Prof. Dr. Eduardo Paiva Prof. Dr. Samuel Rocha de Oliveira Universidade Estadual de Campinas Reitor Fernando Ferreira Costa Vice-reitor Edgar Salvadori de Decca Pró-Reitor de Pós-Graduação Euclides de Mesquita Neto Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica Diretor Jayme Vaz Jr. Vice-diretor Edmundo Capelas de Oliveira Estimativas Matemática das Esferas 15/15