UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE LETRAS
MESTRADO EM LITERATURA
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A ESCRITURA ARTÍSTICA E O CASO RAUL POMPEIA
DURVAL CARVALHAL
SALVADOR - BA
1992
DURVAL CARVALHAL
A ESCRITURA ARTÍSTICA E O CASO RAUL POMPEIA
Trabalho apresentado ao Instituto de Letras da
Universidade Federal da Bahia como requisito de
avaliação parcial da disciplina Literatura Brasileira
XX do curso de Mestrado em Literatura.
Orientador: Prof. Dr. Jorge Araújo
SALVADOR - BA
1992
A ESCRITURA ARTÍSTICA, diz Afrânio Coutinho, “ficou identificada
como
o
conjunto
de
qualidades
formais
da
tendência”.
Tendência
impressionista.
O Realismo-Naturalismo, através da estética dos Goncourt, transformase em Impressionismo. São, portanto, Edmond e Jules de Goncourt os
fundadores e representantes máximos do novo estilo.
Pissarro, Manet, Monet, Renoir, na pintura. Debussy e Ravel, na música,
são os novos tipificadores da atmosfera artística da gênese impressionista.
Inicialmente, fenômeno pictórico, o impressionismo logo penetra nas
outras artes. O artista impressionista “inventa” paisagens, que dão a impressão
de ser mais autênticas que as paisagens reais.
No futuro, o impressionismo viria fazer, da literatura, mormente na prosa,
uma arte extremamente fecunda. Brilham, então, as estrelas de Marcel Proust,
Henry James, Anton Tchekhov, Flaubert, Baudelaire, Rimbaud, Daudet e,
principalmente, os irmãos Goncourt.
No Brasil, o processo foi diferente. O impressionismo chegou e se
hospedou no hotel da literatura, e não no da pintura, como se poderia supor.
Seus cicerones, ou seus adeptos, ou seus seguidores foram soldados
realista-naturalistas. Assim que foram promovidos a oficiais impressionistas,
empunharam suas armas e foram à luta. Destacam-se, nesse batalhão, os
nomes de Machado de Assis, Raul Pompeia, Graça Aranha, Adelino
Magalhães e Euclides da Cunha. E Pompeia acaba sendo o representante
maior, o comandante da tropa impressionista.
Na guerra de O Ateneu, usando armas típicas, tais como a símile, a
metáfora, o humor, o sarcasmo, a cor, a paisagem, o lirismo, afigurou-se como
o grande herói, o grande vencedor. Uma espécie de Alexandre, o da
Macedônia.
Pompeia foi um homem de ideia e de vontade, um Schopenhauer
literário. Um pessimista que não acreditava no homem e nas suas invenções
institucionais. Tentou mudar o Homem e o mundo, mas foi vencido pelo mundo
do Homem. Um tiro no coração, numa véspera de Natal, foi a marca da
decepção e da falta de sintonia com um mundo apodrecido, pleno de vermes
humanas e que, portanto, não lhe pertencia.
Ainda bem que ele foi avisado pelo seu pai, na porta de O Ateneu: “vais
encontrar o mundo, coragem para a luta”. Pompeia encheu-se de coragem.
Lutou muito, mas foi derrotado pela torpeza e pela bestialidade terrígenas.
Sem os traços do gênio, Pompeia lança-se com dois romances-novelas:
Joias da Coroa, onde ataca a Monarquia e seus verdugos, e Tragédias no
Amazonas, onde o trágico campeia. Percebe-se, desde já, que esse agricultor
iria plantar, no pomar literário, plantas frutíferas de maior saborosidade.
Suas crônicas e seus contos rivalizam em qualidade com a produção
machadiana, onde a sátira, o humor, o sarcasmo, a riqueza imagística, o
colorido, a musicalidade e os ritmos das construções funcionam como uma
grande
interseção
entre
os dois grandes prosadores impressionistas
brasileiros.
Todavia, é em O Ateneu que Pompeia, no dizer de Ledo Ivo, “denuncia
as verdades da vida: são mentiras”. É a corrupção, a desorganização, a
perversão, as injustiças, tudo isso se constitui nos valores sociais supremos
dentro do melhor estilo de Júlio Ribeiro: “Na batalha da existência, o importante
é não ficar vencido, porque o vencedor tem sempre razão”.
Pompeia viveu seu tempo. Participou de todas as lutas, quer políticas,
quer sociais, quer antropológicas, quer literárias. Escreveu para o seu tempo e
para os tempos futuros. Malgrado seja conhecido mais como o autor de O
Ateneu, continua sendo um dos escritores mais formidáveis da literatura
nacional. Não o fosse, não seria estudado do ginásio ao mestrado, quiçá,
doutorado.
Graça Aranha -José Pereira de Graça Aranha- é outro nome significativo
da prosa impressionista brasileira. Sua obra maior, Canaã, surgido nos idos de
1901, fez muito sucesso, notadamente entre a juventude. Ler Canaã era uma
obrigação, quer para criticá-lo, quer para louvá-lo, porque era um livro
diferente, com grande característica revolucionária.
Graça era filho do naturalismo filosófico alemão e, devido às suas
influências recifenses e sua vivência europeia, marcha ou avança para o
socialismo.
Canaã é uma utopia, um sonho de quem sonha com a justiça e a
dignidade humana. Percebem-se, nele, várias características, cuja principal foi
a impressionista. Foi, por assim dizer, uma confluência de influências.
Naturalismo, simbolismo, impressionismo, tudo isso o toca e o adorna.
Canaã é uma obra sempre atual, onde a visualidade plástica e dinâmica
é muito forte. São muitas as anotações, sejam visual-auditivas-táteis; sejam
visual-tátil-olfativas; sejam apensas olfativas. Há aí uma saborosa mistura de
formas, cor, sons, odores, enriquecida de comparações e metáforas.
A obra de Aranha é toda cheia de graça e sensibilidade, malgrado o
escritor maranhense ter tido razões (influências europeia e erudição latina)
para não cultivar o gosto pela exaltação, pela palavra, pelo gesto. A festa
verbal em Graça é uma marca de idealista, de um entusiasta, de um
exagerado.
Adelino Magalhães viveu de 1887 a 1969. Formou-se em direito.
Ensinou História e Geografia, e estudou medicina dois anos. Estreiou com
Casos e Impressões. Fez mergulho no simbolismo e no naturalismo.
Hipersensível e desdenhoso, teria que banhar-se na praia impressionista.
A técnica impressionista é encontrável em toda a sua obra, que soma
dez volumes, feliz coincidência com o quantitativo pompeiano.
Há notações auditivas (barulho das panelas, carcarejar das galinhas).
Na estreia, há as marcas do impressionismo da segunda fase, impressionismo
psicológico, interior. Soube explorar o monólogo interior, que é a forma
inaudível e silenciosa, através da qual, a personagem exprime os seus
sentimentos mais íntimos, sem se preocupar com a ordem lógica.
É na primeira obra, surgida em1916, que Adelino jorra os aspectos
descritivos e psicológicos do impressionismo. Adelino é inspirado, espontâneo,
de primeiro jato. Apresenta linguagem em estado nascente, poética, de traços
bíblicos.
Cultivou
as
frases
breves,
parágrafos
curtos,
ordem
indireta,
exclamações, reticências. Também, engajado no seu tempo, olhou com
atenção de bom observador, os problemas sociais. Foi um cronista e grande
fotógrafo verbal do Rio de Janeiro. Não foi um especialista em contos ou
novelas. Foi abrangente prosador. Adorava escrever e escreveu muito.
Escreveu casos, impressões, perfis, crônicas, instantâneos, monólogos,
devaneios, visões, poemas em prosa, rapsódias. Foi um grande fragmentador
na prosa.
Alma fotográfica, Adelino não romanceou, apesar de ter tentado. O
conto, que é um romance de calças curtas, foi onde o impressionismo melhor
se encontrou. E foi aí que pode, melhor, transpor o real e o vivido.
BIBLIOGRAFIA
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Zenir
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Opostos
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