PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2014.0000062971
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº
0012310-25.2005.8.26.0079, da Comarca de Botucatu, em que são apelantes
JOÃO ALBERTO ROSSI, LUIZ SARTORI JÚNIOR, PAULO KAWAHARA,
DULCINÉIA PIACITELLI, NILO SÉRGIO MARTINS DANTAS, ELIANA
CRISTINA SARTORI e ROSEMEIRE APARECIDA CORREA MOÇO, é
apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO.
ACORDAM, em 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça
de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento em parte aos
recursos. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este
acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores TORRES DE
CARVALHO (Presidente sem voto), ANTONIO CARLOS VILLEN E
ANTONIO CELSO AGUILAR CORTEZ.
São Paulo, 10 de fevereiro de 2014.
Urbano Ruiz
RELATOR
Assinatura Eletrônica
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VOTO Nº: 18325
APEL. Nº: 0012310-25.2005.8.26.0079
COMARCA: BOTUCATU
APTE. : JOÃO ALBERTO ROSSI E OUTROS
APDO. : MINISTÉRIO PÚBLICO
JUIZ: ALFREDO GEHRING CARDOSO
FONSECA
FALCHI
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Botucatu
Licitação - Fraude Convites Empresas licitantes que
pertenciam ou eram representadas por parentes e
funcionários da vencedora do certame
Prefeito e
Presidente da Comissão Permanente de Licitação de
Botucatu que sempre convidavam as mesmas empresas
Direcionamento e fracionamento das licitações princípios da isonomia e da impessoalidade violados
Prática de sobrepreço - atos de improbidade configurados
Lesão ao erário Art. 10 e 11 da Lei de improbidade
Solidariedade na obrigação de indenizar (C.Civil, art.
942) - Sanções adequadas, exceto no tocante ao valor da
multa, agora reduzido Recursos providos parcialmente.
Trata-se de ação civil pública por atos de improbidade
administrativa direcionada contra o então prefeito, o presidente da
Comissão de Licitação da Municipalidade de Botucatu e empreiteiras
envolvidas em ilícitos consistentes no fracionamento de serviços e obras
para enquadrá-los à modalidade de licitação diversa da legalmente
adequada, com o propósito de favorecer empresa determinada, contrariando
a vedação do § 5º, do art. 23, da Lei 8666/93. Em 1999 a Construtora
Sartori Ltda venceu 16 licitações, sempre competindo com 4 empresas prédeterminadas, mediante cartas-convite (fls. 81). Houve direcionamento face
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à repetição dos convites às mesmas empresas (fls. 83). Como explicado a
fls. 87, houve superfaturamento na locação de equipamentos (pácarregadeira, moto niveladora, retro escavadeira, caminhões e etc), todos da
Sartori, tendo o Tribunal de Contas do Estado quantificado os valores pagos
a maior (fls. 92, 90, 96, 97 e seguintes). Os ilícitos foram enquadrados nos
arts. 10, VIII e XI, art. 11 e inciso I da Lei de Improbidade
8.429/92
(frustrar a licitude de processo licitatório e ainda liberar verba pública sem a
estrita observância das normas pertinentes e praticar ações ou omissões,
dolosas ou culposas, que ensejem perdas patrimoniais).
A r. sentença julgou parcialmente procedente ação para
condenar os réus Pedro Losi Neto, João Alberto Rossi, Luiz Sartori Júnior,
Marilza Francisco, Paulo Kawahara, Dulcinéia Piacitelli, Nilo Sérgio
Martins Dantas, Eliana Cristina Sartori e Rosemeire Aparecida Correa
Moço ao ressarcimento integral do dano, no valor de R$575.121,00;
suspensão dos direitos políticos por cinco anos; pagamento de multa civil de
duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o poder público ou
receber benefícios ou incentivos fiscais pelo prazo de cinco anos.
Condenou, por fim, os vencidos ao pagamento das custas judiciais.
Irresignados, os réus apelaram. Pedro Losi Neto reitera,
preliminarmente, os argumentos levantados no agravo retido, no qual
sustenta a prescrição da ação. É que seu mandato eletivo findou em
dezembro de 2000 e citação ocorreu apenas em 2008. Por outro lado, aduz
que, na condição de Prefeito não pode ser acionado em ações de
improbidade administrativa. Diz, ainda, que Botucatu é incompetente para
conhecer da lide e que sua responsabilidade pelos vícios nas licitações não
está configurada, o que implica em nulidade da sentença por cerceamento
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de defesa. No mérito aduz que laudo produzido na ação de cobrança, em
trâmite perante a 3ª Vara Cível, atesta a inexistência de superfaturamento ou
ilicitude nos certames. Acrescenta inexistir qualquer prejuízo a ser reparado,
bem assim, não ter participado dos procedimentos licitatórios. Disse, por
fim, que a condenação se mostrou excessiva.
João Alberto Rossi também reiterou o agravo retido,
sustentando a prescrição da ação e nulidade da sentença por cerceamento de
defesa. A prova pericial era necessária para a apuração, sob o crivo do
contraditório, do alegado sobrepreço. No mérito, afirma que as conclusões
proferidas pelos representantes do Tribunal de Contas foram produzidas
sem obediência ao princípio do contraditório. Inexiste prejuízo ao
Município tampouco ilicitude nos procedimentos licitatórios. Sua
responsabilidade também não está caracterizada e a condenação se mostrou
excessiva. A empreiteira Sartori não recebeu todo preço combinado e
promove ação de cobrança contra a Municipalidade. A perícia realizada
naquela ação não apurou qualquer superfaturamento, embora os serviços e
obras tenham sido realizados. A sentença, todavia, não se pronunciou sobre
esse fato. Não foi cobrado preço maior e também não houve prejuízo ao
município, sem que se possa, por consequência, impor a obrigação de
indenizar. Negou, ainda, a prática de qualquer ato doloso, indispensável à
condenação. Disse, por fim, que a r. sentença se houve com excesso na
dosimetria das penalidades.
Não tem condições de pagar os valores
indicados na sentença.
Rosemeire
Aparecida
Correa
Moço
sustenta,
preliminarmente, ilegitimidade ativa “ad causam” do Ministério Público,
bem assim, falta de interesse de agir por inadequação da via processual. A
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ação popular seria adequada. Alegou prescrição da ação e nulidade da
sentença por cerceamento de defesa. No mérito, aduz a não ocorrência do
alegado superfaturamento e que não houve prejuízo ao Município. Por fim,
ressalta o caráter excessivo da condenação.
Dulcinéia Piacitelli reitera, por sua vez, os mesmos
argumentos defendidos por Rosemeire Aparecida Correa Moço.
Luis Sartori Junior sustenta, preliminarmente, inépcia da
inicial; ilegitimidade ativa “ad causam”; falta de interesse de agir por
inadequação da via eleita; prescrição da ação e nulidade da sentença por
cerceamento de defesa. A perícia técnica era indispensável. A inépcia
decorreria do fato da inicial não se reportar a provas e não esclarecer se a
conduta do apelante teria sido dolosa ou culposa. No mérito, alega a não
ocorrência de superfaturamento e que o Município não pagou pelos serviços
contratados, de modo que não existe prejuízo a ser reparado. Por fim, aduz
que a condenação se mostra excessiva.
Eliana Cristina Sartori apelou sustentando os mesmos
argumentos defendidos por Luis Sartori Junior.
Paulo Kawahara também reiterou o agravo retido
interposto, sustentando a necessidade de produção de prova pericial. No
mérito, aduz a não ocorrência de atos de improbidade administrativa. O
simples fato de ter participado das licitações tidas como fraudulentas não é
suficiente à condenação. Não há elementos ou indícios de que tenha
favorecido a Construtora Sartori Ltda. Ademais, o Município não sofreu
qualquer prejuízo.
Nilo Sérgio Martins reitera o agravo retido interposto. Aduz
a ocorrência de prescrição. No mérito, afirma não ter participado de nenhum
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dos certames relacionados na inicial. As testemunhas da licitação afirmaram
desconhecê-lo, sendo assim, entende ser parte ilegítima para figurar no polo
passivo da demanda. Defende, ainda, a ilegitimidade ativa do Ministério
Público; a inépcia da inicial e nulidade da sentença. No mérito, aduz que
não pode ser responsabilizado pelos atos relatados, uma vez que deles não
participou. Entende, ainda, não ser possível a condenação solidária dos réus.
Por fim, Marilza Aparecida Giordani Francisco reiterou o
agravo retido interposto, aduzindo a nulidade da sentença e sua
ilegitimidade passiva. Relata não ser proprietária da empresa Embraterra
Terraplanagem Ltda. É funcionária e não possui poder de direção. Por outro
lado, defende que os preços ofertados pela Embraterra não estão
superfaturados ou acima do valor de mercado. Não há prova de prejuízos
aos cofres públicos tampouco de sua responsabilidade.
O representante do Ministério Público opinou pelo não
provimento dos recursos.
É o relatório.
A inicial não é inepta. O Ministério Público bem definiu a
causa de pedir e o pedido, indicando os respectivos fundamentos e
documentos necessários ao julgamento da ação. A conduta de cada um foi
individualizada, sem qualquer prejuízo ao contraditório, ao direito de
defesa. A petição inicial preenche os requisitos indicados no art. 282 do
CPC, sem que se possa falar em inépcia.
Não ocorreu o alegado cerceamento de defesa. O
julgamento antecipado da lide estava autorizado pelo art. 330, I, do CPC. O
magistrado é livre na formação da respectiva convicção, é o destinatário das
provas e pode indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias
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(CPC, arts. 130 e 131). Deve, ademais, velar pela rápida solução da lide,
não estando obrigado a admitir provas que entenda desnecessárias (art. 125,
II, do CPC). Podia, por consequência, nos termos do disposto no art. 427 do
CPC dispensar a prova pericial requerida, mesmo porque os réus trouxeram
aos autos cópia do laudo pericial produzido em outra ação
de cobrança
dos valores ajustados nos contratos firmados em cada uma das licitações.
Acrescente-se que o auditor do Tribunal de Contas, que apurou o
sobrepreço, foi ouvido em juízo e as partes tiveram oportunidade de inquirilo.
O art. 129, III, da CF e bem assim o art. 17 da Lei 8.429/92,
atribuem legitimidade ao Ministério Público para a promoção de ações
destinadas à proteção do patrimônio público e social e de outros interesses
difusos e coletivos. Desse teor a súmula 329 do STJ. Sendo assim, tem
legitimidade para propositura da presente demanda.
Não há se falar, ainda, em falta de interesse de agir.
Conforme entendimento do STJ: “1. Os arts. 21 da Lei da Ação Civil
Pública e 90 do CDC, como normas de envio, possibilitaram o surgimento
do denominado Microssistema ou Minissistema de proteção dos interesses
ou direitos coletivos amplo senso, no qual se comunicam outras normas,
como o Estatuto do Idoso e o da Criança e do Adolescente, a Lei da Ação
Popular, a Lei de Improbidade Administrativa e outras que visam tutelar
direitos dessa natureza, de forma que os instrumentos e institutos podem ser
utilizados para "propiciar sua adequada e efetiva tutela" (art. 83 do CDC)”
(REsp
1221254/RJ, Rel. Ministro ARNALDO
ESTEVES LIMA,
PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/06/2012, DJe 13/06/2012).
Afasta-se, ainda, a alegação de inaplicabilidade da Lei
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8.429/92 aos agentes políticos. A referida lei, em seu art. 2º, considera
agente público todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem
remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer
outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função
nas entidades mencionadas. Sendo assim, adequada a via eleita pelo
Ministério Público, para responsabilizar por improbidade administrativa. É
que, na lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, agentes políticos “são os
titulares dos cargos estruturais à organização política do país” e dentre eles
se incluem os Prefeitos e respectivos vices. “O vínculo que tais agentes
entretêm com o Estado não é de natureza profissional, mas de natureza
política” (in Curso de Dir. Administrativo, 9ª Ed. Malheiros, pág. 151/152).
Não há se falar, de outra parte, em prescrição. Dispõe o art.
219, § 1º do CPC que a “interrupção da prescrição retroagirá na data da
propositura da ação” e, nos termos do art. 263 do CPC, 'considera-se
proposta a ação, tanto que a petição inicial seja despachada pelo juiz, ou
simplesmente distribuída, onde houver mais de uma vara'. Enuncia a súmula
106 do STJ que, proposta a ação no prazo fixado para seu exercício, a
demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da justiça, não
justifica o acolhimento da arguição de prescrição ou decadência. O fim do
mandato do Prefeito, Pedro Losi Neto, ocorreu em dezembro de 2000 e,
como se sabe, o termo “a quo” da prescrição, para hipótese de falta de
ocupantes de cargos eleitos, em comissão ou em função de confiança, é o
término do exercício do mandato ou afastamento do cargo (REsp
457723/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, 2ª Turma, DJ 25.08.2003, p. 282). A
ação foi proposta em 30.09.2005, ou seja, dentro do prazo prescricional,
previsto no art. 23 da Lei nº 8.429/1992.
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As demais preliminares se confundem com o mérito e serão
com ele analisadas.
O Ministério Público ajuizou ação civil de responsabilidade
por atos de improbidade administrativa imputando aos réus a prática de
fraudes em dezesseis licitações, ocorridas em 1999, na modalidade convite.
A Construtora Sartori saiu vencedora de todos certames, cujos concorrentes
eram
sempre
os
mesmos:
Embraterra
Terraplanagem,
Seman
Terraplanagem; Esaga Projetos e Centropave Construtora Ltda. Segundo o
Ministério Público, existia conluio entre os participantes em virtude do
vínculo empregatício ou do parentesco entre os representantes das empresas
derrotadas com o proprietário da vencedora, a Construtora Sartori. O
Prefeito da cidade - Pedro Losi Neto e o Presidente da Comissão Municipal
de
Licitações
João
Alberto
Rossi
também
participaram
das
irregularidades, fracionando os serviços e obras, além de superfaturarem os
preços. Houve, como se vê, atuação em conjunto ou, conluio entre os
envolvidos tanto que, Antonio Ielo, prefeito que sucedeu Pedro Losi Neto,
disse ter ficado claro o direcionamento dos certames por ter havido quebra
da ordem cronológica de pagamentos, dando-se prioridade à citada empresa
nos três últimos meses do mandato (fls. 1204).
Segundo consta do relatório da Polícia Civil de fls.
536/539, Luiz Sartori Junior é sócio da Construtora Sartori e da Centropave
Construtora Ltda, que também tem como sócia Eliana Cristina Sartori, sua
filha. Nadir Barbosa Sartori, esposa de Luiz Sartori Júnior, também é sócia
da Construtora Sartori e substabeleceu à Dulcinéia Piacitelli, sua
funcionária (fls. 539), poderes para gerenciamento da Centropave
Construções Ltda, localizada no mesmo endereço que a vencedora das
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licitações.
Rosemeire, também funcionária da Sartori, representava a
empresa Esaga de propriedade de Nilo Sérgio Martins Dantas. Segundo
Nilo, Rosemeire tinha procuração da empresa para participar das licitações.
Conclui-se, pois, que Dulcinéia Piacitelli, procuradora da empresa
Centropave, e Rosemeire Aparecida Correa Moço, Procuradora da Esaga,
eram na realidade funcionárias da Construtora Sartori e exerciam, em
conluio com os representantes da vencedora, a atividade de procuradoras
das referidas empresas, para garantir que a Sartori saísse vencedora das
licitações.
As empresas Embraterra e Seman, conforme bem observou
o magistrado, realizavam as mesmas propostas em todas as licitações que
participavam. Curiosamente, o valor ofertado em todas elas era pouco
superior àqueles apresentados pela Sartori.
Importa observar que as licitações eram realizadas
mediante convite e que conforme interrogatório perante a Justiça Criminal
(fls. 548 e vº), o Prefeito, Pedro Losi, afirmou ser amigo do proprietário da
Construtora Sartori.
Conclui-se, pois, que as supramencionadas empresas,
mantinham
relação
com
a
vencedora
e
eram
convidadas
pela
Municipalidade, por meio do Prefeito e respectivo presidente da comissão
de licitações de Botucatu, para participarem, apenas formalmente, da
licitação, que findaria na adjudicação do objeto da licitação pela
Construtora Sartori.
Trata-se de evidente simulação e conluio entre as
partes para fraudar o procedimento licitatório.
A licitação, como se sabe, visa assegurar a contratação de
particulares para realização de obras e serviços, em obediência ao princípio
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constitucional da isonomia e a fim de selecionar a proposta mais vantajosa
ao interesse público. Deve ser processada em observância aos princípios
previstos nos arts. 37 da CF e 3º da Lei nº8.666/93. O sobrepreço foi
apurado pelo Tribunal de Contas do Estado, como se vê no relatório, a partir
de fls. 87. Esse relatório foi enviado à Câmara Municipal que notificou o
prefeito e assegurou direito de defesa, resultando, a final, a reprovação das
contas daquele exercício e a remessa das peças do Ministério Público (fls.
26 e seguintes). Embora a perícia não tenha sido repetida nestes autos,
mesmo porque suficiente a prova emprestada, um dos réus trouxe aos autos,
a partir de fls. 694, cópia do laudo elaborado por economista na ação de
cobrança promovida pela Construtora Sartori contra a Municipalidade,
perante a 4ª. Vara Cível da Comarca. Esse perito disse ter encontrado, em
pesquisa, valores maiores que os cobrados pela empreiteira. O Tribunal de
Contas, por sua vez, apurou que o preço contratado não era o menor dentre
os praticados no mercado, daí a conclusão no sentido de ter havido
sobrepreço. Importa que não interessava saber se a vencedora da licitação
havia efetivamente proposto o preço menor, embora no mercado fosse
praticado valor menor. A fraude consistiu na seleção de concorrentes que
praticassem determinado preço
superior ao de mercado, para permitir o
superfaturamento e, por consequência, a vantagem indevida. Em resumo, a
prova pretendida pelos apelantes não tinham utilidade ou, pelo contrário,
reafirmou o alegado pelo Ministério Público. O art. 3º da Lei 8666/93
esclarece que a licitação destina-se a selecionar a proposta mais vantajosa
para a Administração, fato não verificado.
Preceitua o art. 10 da Lei 8.429/92 que constitui ato de
improbidade administrativa que causa lesão ao erário, qualquer ação ou
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omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio,
apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das
entidades públicas;
VIII
frustar a licitude de processo licitatório ou
dispensá-lo indevidamente.
De outra parte, o art. 11 da mesma Lei prevê que constitui
ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da
administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de
honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições.
Nem se alegue ausência de prejuízo financeiro. É que,
como bem disse o magistrado, a Municipalidade sofreu prejuízo
patrimonial, decorrente de aditamentos e celebração de contratos em valores
superiores aos pesquisados pelo Tribunal de Contas do Estado. O prejuízo
não decorreu apenas das seguidas contratações, mas sobretudo dos
aditamentos que ampliaram sobremaneira os valores iniciais.
Ainda que assim não fosse, a lesividade do ato decorre da
própria ilegalidade e violação aos princípios da supremacia do interesse
público e da impessoalidade.
O elemento subjetivo está, do mesmo modo, bem
configurado. É notória a intenção fraudulenta dos réus em simular melhor
proposta, aquela oferecida pela empresa vencedora. Do mesmo modo, não é
crível que o Prefeito e o Presidente da Comissão de Licitações
desconhecessem o conluio entre as partes. Até mesmo porque, o Prefeito
afirmou ser amigo do sócio da empresa vencedora e foi responsável pela
homologação e adjudicação da licitação.
Assente-se, por fim, que nos termos do disposto no art. 942
do Código Civil, há solidariedade passiva na obrigação de indenizar o dano
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decorrente da prática de ato ilícito. A r. sentença considerou o sobrepreço
apurado pelo Tribunal de Contas do Estado. Esse o valor que os réus
deverão devolver aos cofres do Município e, essa cobrança poderá ser feita
a qualquer deles.
Acrescente-se, por fim, que há documentação nos autos
esclarecendo que a empreiteira cobra valores que deixaram de ser pagos
pela Municipalidade, naqueles contratos. É possível, por fim, compensar
valores, caso se apure, naquela ação, que a Municipalidade deve algum
valor à empreiteira.
A r. sentença merece reparo apenas no tocante à
mensuração do valor da multa. Consoante esclarece Marino Pazzaglini
Filho, “a multa civil não tem natureza indenizatória, mas simplesmente
punitiva”. Deverá levar em consideração a gravidade do fato e a capacidade
econômico-financeira do agente público (in Lei de Improbidade
Administrativa Comentada, Atlas, 5ª ed., págs. 145/6). Em sendo assim, o
valor da multa fica reduzido a vinte mil reais para cada um dos réus,
atualizados da sentença.
No mais, a condenação se mostrou adequada e obediente
aos critérios previstos no art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa.
Sendo assim e, ante todo o exposto, subsiste a r. sentença,
exceto no tocante ao valor da multa, reduzida a vinte mil reais para cada um
dos réus, atualizados da sentença. Para esses efeitos, pois, é dado parcial
provimento aos recursos.
URBANO RUIZ
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