O ESPÍRITO SANTO NA CRIAÇÃO
Texto Básico: Gn 1.1-2
Contexto
O Espírito estava presente como executivo não apenas "no princípio" (Gn 1.1) e na
formação do homem (Gn 1.26,27). Todos os dias de criação foram executados por ele. Tenha
especial cuidado para não dar uma impressão impessoal do Espírito ao tratar do seu poder.
Introdução
"Quero falar com o gerente!" Muitas vezes essa frase ressoa em lojas, bancos e nos mais
variados estabelecimentos comerciais. Ela expressa o seguinte princípio: não adianta muito falar
com subalternos; o melhor é ir direto ao chefe. Quando associamos essa idéia a concepção do
crente quanto ao ser de Deus, a impressão que dá é que, às vezes, embora saiba que a Trindade
é constituída de Pessoas iguais em poder, glória e autoridade, enfatiza mais o Pai e o Filho em
detrimento do Espírito (tradicionais), ou o Espírito em detrimento do Pai e do Filho (Pentecostais e
neo-pentecostais). Parece haver uma tendência de tripartir a Trindade, elegendo uma Pessoa de
maior influência ou poder. De qualquer forma, é importantíssimo crermos na doutrina bíblica que
enfatiza a existência de um único Deus, constituído de três Pessoas, enxergando a importância
vital de cada uma delas para nossa existência e para nossa fé. Vejamos o papel desempenhado
pelo Espírito Santo na Criação, aparentemente, um tanto desconsiderado em nossos dias.
I - O Espírito Criador
A narrativa da Criação revela mais do que a origem do universo. Descortina-nos que Deus
criou a existência. Na verdade, originou e delimitou uma dimensão física e outra espiritual onde
seres haveriam de existir. Refletindo neste poderoso ato criador, os estudiosos formularam duas
expressões latinas que expressam verdades importantes. Fala-se do fiat divino, que indica a
ordem de Deus no ato na criação: "faça-se" (ARA "Haja"). Tudo foi criado tão-somente pelo poder
da palavra ordenada por Deus. Disso também se deriva o conceito teológico ex nihilo que quer
dizer literalmente "do nada". Dessa forma, firma-se a doutrina que declara que o Criador trouxe à
existência o universo não a partir de alguma matéria eterna ou pré-existente, como se fosse um
agente meramente transformador. Hoje em dia há pensadores que defendem a tese da eternidade
da matéria. Contudo, tal pensamento não encontra o menor respaldo nas Escrituras. Pois bem,
assumindo como verdade absoluta a criação do universo pelo Deus bíblico, qual o papel do
Espírito Santo nisso? É importante considerarmos inicialmente qual o conceito da Terceira Pessoa
da Trindade no Antigo Testamento. Em ambos os Testamentos, a palavra "espírito" (Hebr. ruah, e
Gr. pnêuma) tem também como significado "vento". Por isso, o Espírito Santo é por vezes figurado
assim (Jo 3.6-8; At 2.2). Especialmente no Antigo Testamento, o termo aplicado ao Espírito/vento
não tem o sentido simples de ar ou uma leve brisa. Na verdade, é um termo onomatopaico, que
ressoa o ruído original daquilo que significa. Por isso, ruah é o som estrondoso do vento
intempestivo e avassalador. Expressa a poderosa "fúria" de uma ventania que não pode ser
resistida. É um poderoso “furacão” de Deus, que não mostra apenas poder para destruir, mas
para criar! Ao falar do ruah de Deus pairando sobre as águas, as Escrituras afirmam a agência
poderosa do Espírito na Criação de todas as coisas. Ele é descrito "pairando", como mais uma
associação ao vento, contudo, expressando o poder dinâmico do Senhor na Criação. Certamente,
não estamos falando de uma simples demonstração de poder, como se o ruah fosse apenas uma
força de Deus, como querem as Testemunhas de Jeová. Fala-se aqui de uma Pessoa e não
meramente de uma força demonstrada. É fácil constatar a pessoalidade do ruah na própria
narrativa de Gênesis. Quando Deus vai criar o homem, ele diz: "Façamos o homem à nossa
imagem, conforme a nossa semelhança" (Gn 1.26). Sabemos que Cristo estava presente na
Criação e tomou parte em todo ato criativo (Jo 1.3). O texto já havia feito referência ao Espírito
(Gn 1.2). Temos, portanto, uma indicação da pessoalidade da Trindade. Não é um recurso de
linguagem para destacar a grandeza de Deus (plural majestático). Não é uma referência aos
anjos, pois faria deles também agentes de criação, um atributo exclusivo da divindade. O texto
enfatiza o papel do Espírito na Criação, citado “no princípio”, refletindo os decretos da Trindade.
II - O Espírito e o Homem Perfeito
A narrativa da Criação conta a origem de todas as coisas. Contudo, ela também marca o
início da experiência e do exercício do conhecimento humano. No seu estado de perfeição, o
homem desfrutava de habilidades que o impulsionavam rumo ao descobrimento das leis que
regem o universo, tarefa indispensável para cumprir a ordem de sujeita-lo dada pelo próprio Deus
(Gn 1.28). Entretanto, o conhecimento humano também haveria de se expandir quanto ao
relacionamento com o Criador. Embora fosse perfeito, o ser criado à imagem e semelhança de
Deus deveria crescer no entendimento de todas as coisas, o que implicaria incrementar também o
conhecimento humano do próprio Senhor. Sabemos que a Criação revela a Deus (Sl 19.1). O
apóstolo Paulo chega a dizer que “os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como
também a sua própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo
percebidos por meio das coisas que foram criadas” (Rm 1.20). Imagine o que era isso na
experiência do homem em sua perfeição! Na existência do homem perfeito, crescer no
conhecimento de tudo o que foi criado era se aprofundar no conhecimento do próprio Deus.
Mesmo esta ciência não era meramente especulativa, pois todo conhecimento real que o homem
pode ter de Deus é experimental, obtido dentro de um relacionamento com a divindade. É por isso
que o Senhor sempre se revelou ao homem através de alianças. Desde o paraíso, foram várias as
alianças: Aliança da Criação, com Adão antes da queda; Aliança do Começo com Adão depois da
queda; Aliança da preservação, com Noé; Aliança da Promessa, com Abraão; Aliança da Lei, com
Moisés; Aliança do Reino, com Davi; e aquela, que cumpre todas as anteriores, a chamada Nova
Aliança em Cristo Jesus. É importante lembrarmos que este relacionamento se dá interiormente.
É de cunho espiritual, pois Deus é de essência espiritual (Jo 4.24). Significa dizer que o homem foi
criado para ser o templo do Espírito Santo e que realmente essa foi a experiência de Adão, antes
da queda. O Espírito Santo habitava plenamente o coração do primeiro casal. Quando o Criador
soprou o fôlego de vida no homem (Gn 2.7) isso não significava apenas a vida física ou corpórea,
mas o envio da Terceira Pessoa da Trindade para habitar naquele ser, criado como servo aliado
inigualável em toda a Criação.
III - O Executivo da Trindade
Ao invés de um "poder" ou uma "força" impessoal, o Espírito Santo é apresentado nas
Escrituras como o Executivo Divino. A ele é atribuída toda a sabedoria necessária para a criação
de tudo o que existe, especialmente na constituição de toda matéria viva. Veja a declaração
bíblica: "Envias o teu Espírito, eles são criados, e, assim, renovas a face da terra" (Sl 104.30).
Esse texto está tratando da formação do homem. De forma semelhante, após ter feito referência
ao Espírito, Davi afirma: "Pois tu formaste o meu interior, tu me teceste no seio de minha mãe.
Graças te dou, visto que por modo assombrosamente maravilhoso me formaste" (Sl 139.13-14a,
cf. 7-12). Jó faz coro com Davi, dizendo: "O Espírito de Deus me fez, e o sopro do Todo-Poderoso
me dá vida" (Jó 33.4). Como executivo da divindade, o Espírito é a fonte imediata de toda vida,
concedendo-a a todos os seres viventes. As Escrituras também ligam a ordem criativa de Deus
com a sua execução por parte do Espírito: "Os céus por sua palavra se fizeram, e, pelo sopro de
sua boca, o exército deles" (Sl 33.6). O “sopro de sua boca” é uma clara referência à Terceira
Pessoa da Trindade. Além disso, podemos enxergar na figura do ruah "pairando" sobre as águas
no início do capítulo um de Gênesis a presença abrangente do Espírito na criação, participando e
cumprindo o projeto da mente divina. Também o Novo Testamento apresenta o Espírito Santo
como executivo da Trindade. Seu papel é fundamental na salvação, cabendo-lhe especialmente a
aplicação da redenção na vida do eleito, regenerando, chamando, selando, concedendo-lhe dons,
capacitando e fortalecendo a igreja. É ele quem aplica a obra de Jesus Cristo no crente e viabiliza
o funcionamento da própria igreja. Sempre que o assunto envolve vida ou criação, o Espírito
Santo é evocado, fato visível até mesmo na concepção sobrenatural de Jesus no ventre de Maria.
CONCLUSÃO
É certo que existe paridade funcional em todas as obras da Trindade. Em outras palavras,
tudo o que uma das Pessoas faz, todas participam ativamente. Por isso, vemos Pai, Filho e
Espírito Santo como o Deus Criador. Todavia, isso não elimina o fato de haver certa identidade de
cada Pessoa da Trindade com alguma obra específica: o Pai Criador, o Filho Salvador e o Espírito
Executivo. Contudo, abordamos especialmente a Criação sob o prisma do papel do Espírito
Santo, por ser um aspecto que, embora sabido pela cristandade, parece ser assimilado como
secundário. Na verdade, ele e sua obra são tão indispensáveis quanto o Pai e o Filho e tudo que
realizaram, e nada do que foi feito se faria sem ele. Como executivo da Trindade, cabe ao
poderoso ruah de Deus realizar e aplicar os projetos divinos, dos quais ele também é o autor. Este
é o Espírito que habita em cada um de nós.
Rev. Jair de Almeida Júnior.
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