AS ESTRATÉGIAS DE APRENDIZAGEM EM LÍNGUA ESPANHOLA NO
ÂMBITO DO CAA - CENTRO DE AUTO-ACESSO
Gabriela Rodrigues Botelho
Prof. Camila Maria Corrêa Rocha (Orientador)
RESUMO
Este artigo tem por objetivo abordar as estratégias de aprendizagem de
língua estrangeira mobilizadas por alunos da licenciatura em Língua
Espanhola, da Universidade Estadual de Londrina, em um evento
promovido pelo Centro de Auto-Acesso (CAA). O CAA é um programa de
formação complementar ao ensino de graduação. O evento, realizado no
mês de junho do ano de 2010, consistiu em cinco oficinas, com duração
de uma hora cada uma, nas quais os alunos desenvolveram atividades que
abarcassem as habilidades de compreensão e produção oral e escrita
tendo como tema a vida animal. Serão revisadas algumas classificações
de estratégias de aprendizagem, as quais serão aplicadas aos dados
obtidos pela observação da segunda oficina, na qual os exercícios
realizados priorizaram a habilidade de produção oral. O construto teórico
que norteia as atividades desenvolvidas no CAA e que servirá de base
para a análise é a tipologia de O‟Malley e Chamot (1990), considerada a
mais operacional tanto para a pesquisa quanto para a compreensão das
estratégias de aprendizagem em línguas estrangeiras.
Palavras-chave: Estratégias de aprendizagem. Produção oral. Língua
espanhola.
801
O CAA: Centro de Auto-Acesso
O CAA é um programa de formação complementar ao ensino de
graduação
do
Universidade
Departamento
Estadual
de
de
Letras
Londrina
Estrangeiras
criado
em
1995
Modernas
sob
o
da
título
„Compreensão e produção em linguagem oral em Espanhol, Francês e
Inglês: implementação de um centro de auto-acesso através de estudo
individual orientado‟, como explica Taillefer (2000, p. 19). Seu objetivo era
propor um sistema de estudo individual orientado para atender aos alunos
de graduação do curso de Letras com as habilitações duplas inglêsportuguês, espanhol-português e francês-português. No ano de 1998, o
projeto foi reformulado a partir da observação das necessidades dos
usuários e passou a ser intitulado Centro de Auto-Acesso- CAA. Seu foco
foi, a partir de então, o desenvolvimento das habilidades de compreensão
e produção oral em língua estrangeira de forma autônoma.
Como explica Taillefer (2000, p. 22), “entendemos por autonomia
de aprendizagem a situação do aprendiz quando se sente seguro para
decidir o que aprender, como aprender, quando aprender”. O princípio
norteador das atividades desenvolvidas no espaço do CAA é a tipologia de
estratégias de aprendizagem proposta por O´Malley e Chamot (1990).
Acreditamos que o uso de estratégias de aprendizagem decorre
de uma aprendizagem autônoma. As estratégias de aprendizagem são
aqui entendidas como “procedimentos utilizados pelos aprendizes para
melhorar
sua
aprendizagem”
assim
como
“ferramentas
para
uma
implicação ativa e autônoma” (O‟MALLEY; CHAMOT apud CYR, 1998).
O‟Malley
e
Chamot
(apud
CYR,
1998)
postulam
que
as
estratégias de aprendizagem de uma língua estrangeira podem ser
agrupadas em três grandes categorias: elas podem ser metacognitivas,
cognitivas e sócio-afetivas. As primeiras implicam o pensar sobre o
802
processo
de
aprendizagem,
a
preparação
para
ele
por
meio
do
planejamento, da atenção, geral ou seletiva, dada ao que se vai aprender.
Às estratégias cognitivas, por sua vez, relacionam-se as ações que
envolvem a interação física do aprendiz com o material, ao passo que a
terceira categoria remete à dimensão afetiva que o processo de
aprendizagem de uma LE de forma autônoma implica.
No quadro abaixo, são apresentadas as tarefas que podem ser
executadas pelo aprendiz em cada categoria proposta por O‟Malley e
Chamot (1990).
Classificação das Estratégias: Panorama Geral
As estratégias metacognitivas:
As estratégias metacognitivas implicam em uma reflexão sobre o processo de
aprendizagem, em uma preparação que visa a aprendizagem, o controle ou a
monitoração das atividades de aprendizagem assim como a auto-avaliação.
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
a
a
a
a
a
a
a
antecipação ou o planejamento
atenção geral
atenção seletiva
auto-gestão
auto-monitoração
identificação de um problema
auto-avaliação
As estratégias cognitivas:
As estratégias cognitivas implicam em uma interação com a matéria de estudo, uma
manipulação mental ou física desta matéria e uma aplicação de técnicas específicas na
execução de uma tarefa de aprendizagem.
1. a
2. a
3. a
4. a
5. a
6. a
7. a
8. o
9. a
10. a
11. a
repetição
utilização de referências (fontes)
classificação ou o agrupamento
tomada de notas
dedução ou a indução
substituição
elaboração
resumo
tradução
transferência de conhecimentos
inferência
As estratégias sócio-afetivas:
As estratégias sócio-afetivas implicam na interação com uma outra pessoa, com o
803
objetivo de favorecer a aprendizagem e o controle da dimensão afetiva que a
acompanha.
o
a
o
o
esclarecimento / verificação (perguntas para esclarecimentos)
cooperação
controle das emoções
auto-reforço (auto-reanimação)
Quadro 1- Classificação das Estratégias: panorama geral.
Fonte: O'Malley e Chamot (1990, p. 137-139).
As Estratégias de Aprendizagem
Quando se fala em estratégias de aprendizagem, discute-se a
relevância deste conceito para a Lingüística Aplicada (LA) bem como a
dificuldade que sua conceituação impõe, já que, segundo Schmitz (1994,
p. 211), não se observa consenso entre os estudiosos que dele trata. Em
geral, o termo estratégia é comumente confundido com tática, técnica,
hábitos de estudo, estilo cognitivo, estilo de aprendizagem, método de
ensino, entre vários outros que acabam sendo empregados como
sinônimos dele.
Visando a esclarecer esse impasse, o autor tenta diferenciar
estratégia de tática e diz que, para a LA, estratégias são processos de
longa duração que incluem testagem de hipótese, simplificação da
linguagem e supergeneralização, enquanto que as táticas são de pequena
duração e abrangem regras e técnicas (SCHMITZ, 1994). Andrade et al
(1999) define técnicas de estudos como recursos auxiliares que por meio
dos quais são mobilizadas as estratégias; em outras palavras, técnicas de
estudos consistem em procedimentos que o aprendiz precisa adotar para
pôr em prática as estratégias.
Outra questão proposta por Schmitz (1994) é a existência de
divergências entre os autores quanto à consciência ou inconsciência no
uso das estratégias de aprendizagem, ou seja, alguns defendem que
quando o aprendiz se utiliza de estratégias, ele o faz de forma consciente,
804
ao passo que, para outros, tal utilização é inconsciente. Para o referido
autor, as estratégias podem ser utilizadas das duas maneiras, de acordo
com conhecimento do aprendiz na língua estrangeira e com o domínio que
ele tem sobre elas.
Dominá-las significa saber fazer um bom uso delas, saber
reconhecer
qual
atende
melhor
à
necessidade
do
aprendiz.
Compartilhamos, neste estudo, da opinião de Domiciano (2003, p. 301),
para quem “a prática de uma aprendizagem de línguas por estratégias
parece levar o aprendiz a ser proficiente, e mais ainda, aprender por
estratégias pode ser uma aprendizagem possível de ser realizada fora da
sala de aula”.
As Estratégias de Aprendizagem Mobilizadas em Língua Espanhola
Nos dias 8, 10, 14, 16 e 17 de junho do presente ano, foi
realizado pelo CAA um evento intitulado “Práticas das Compreensões e
Expressões Orais em Língua Estrangeira”, que consistiu em cinco oficinas,
com duração de uma hora cada uma nos dias acima mencionados. Nestas
oficinas, os alunos do curso de graduação e Espanhol e respectivas
Literaturas das quatro séries desenvolveram atividades que abarcaram as
habilidades de compreensão e produção oral e escrita tendo como tema a
vida animal. Ao mesmo tempo, tais oficinas estavam sendo realizadas com
os graduandos em língua inglesa e francesa.
Para a análise dos dados obtidos pela observação da segunda
oficina, ocorrida no dia 10 de junho, estes serão confrontados com os
pressupostos teóricos da teoria que norteia o CAA, a tipologia de
estratégias de aprendizagem de O‟Malley e Chamot (1990). Os exercícios
realizados neste dia priorizaram a habilidade de produção oral.
No dia 10 de junho, a oficina começou com uma atividade cujo
805
objetivo era resgatar o nome de alguns animais vistos no encontro
anterior e promover a interação entre os participantes; em círculo, cada
um deveria trocar seu nome pelo de um animal e, além de dizê-lo em
espanhol, quando chegada a sua vez, deveria dizer outros dois nomes
esperando
que
as
pessoas
se
manifestassem,
segundo
o
animal
mencionado. Conforme essa dinâmica ia acontecendo, os participantes
iam se movimentado até que sobrasse aquele que não conseguiu lembrase de dois nomes para dizê-los.
Nesse primeiro momento, foi possível perceber o uso das
estratégias metacognitivas, já que os aprendizes tinham que, mediante as
regras impostas na dinâmica, refletir sobre o contexto de aprendizagem
no qual estavam inseridos e monitorar-se para seguir no jogo. “As
estratégias metacognitivas envolvem pensar ou refletir sobre o processo
de
aprendizagem,
planejar
para
aprender,
monitorar
a
tarefa
de
aprendizagem e avaliar quanto e como se aprendeu” (ANDRADE et al,
1999, P.140).
Posteriormente,
propôs-se
o
exercício
de
produção
oral
apresentado abaixo intitulado De boca en boca, que consistia na
proposição de três temas para serem discutidos oralmente em pares; cada
aprendiz tinha que escolher um, elaborar sobre ele três perguntas fazê-las
ao companheiro.
Exercício: DE BOCA EN BOCA
Elige uno de los tres temas propuestos y elabora tres preguntas
para hacerlas a tu compañero. Él debe contestarlas oralmente.
Tener un animal es tener un compañero.
La caza: ¿deporte o crueldad?
El zoo: ¿lugar para conocer animales o prisión?
Essa atividade, que era para ser a primeira do material elaborado
para este dia, estendeu-se até o final da oficina, porém, nela pôde ser
806
observado, em graus diferentes, o uso das três categorias de estratégias
agrupadas por O‟Malley e Chamot (1990) de forma autônoma, motivo pelo
qual a escolhemos como objeto de análise.
Quanto ao papel do professor nesta oficina e nas demais, cabialhe observar as atitudes dos aprendizes na execução das atividades
propostas e chamar a atenção deles para as estratégias de aprendizagem
que, consciente ou inconscientemente estavam mobilizando.
A análise da atividade acima proposta permitiu-nos constatar o
predomínio do uso das estratégias cognitivas e das sócio-afetivas em
detrimento das metacognitivas. As primeiras puderam ser observadas pela
aplicação de técnicas para a resolução de problemas relativos à produção
oral tais como solicitar a repetição do que foi dito pelo parceiro, elaborar
respostas em espanhol, tomar notas, no caso de palavras desconhecidas,
e deduzir. Esta última técnica merece atenção pelo fato de que, quando os
participantes não conheciam determinada palavra, mas queriam dizê-la,
eles geralmente tentavam fazer deduções a partir da semelhança
existente entre o português e o espanhol. Porém geralmente, essa atitude
acarretava construções equivocadas e, portanto, o uso do português para
se dizer o que se pretendia. Essa atitude foi observada principalmente nos
alunos da 1º e 2º séries, cujo domínio da língua espanhola está em
estágio inicial. Pode-se dizer, portanto, que a estratégia de dedução esteve
diretamente relacionada à tradução e à transferência de conhecimentos do
português para o espanhol.
Acreditamos que o uso de estratégias para uma aprendizagem
autônoma pode ser feito desde os estágios iniciais de aprendizagem de
línguas estrangeiras, porém, concordamos que tal autonomia se manifesta
em graus e estágios diferentes, ou seja, em cada nível de aprendizagem,
o grau de autonomia varia, como explica Domiciano (2003, p. 307):
“Entendemos que o aprendiz passa por fases, portanto a autonomia é um
807
conceito dinâmico e parcial, com proeminência de certas estratégias e uso
de determinadas técnicas de estudos”.
Foram
perceptíveis
também
a
anotação
de
palavras
desconhecidas o pedido de confirmação para a professora de como se
escreve, a repetição das palavras que eles ainda não sabiam pronunciar,
com o objetivo de se conseguir formular a produção oral, habilidade
priorizada na atividade em análise; tudo isso com o intuito de se chegar à
elaboração
que
a
produção
oral
exigia.
Sobre
as
estratégias
de
elaboração, Andrade et al (1999, p. 139) explica que:
Compreendem
operações
de
relacionar
informação nova com informação já adquirida;
relacionar elementos novos da informação
entre si; incluir associações significativas para
a informação apresentada. Essa inclusão
implica em fazer julgamentos sobre o material
apresentado;
usar
conhecimento
de
aprendizagem; operacionalizar conhecimento
através de perguntas; usar figuras mentais ou
visuais para representar a informação.
Outra técnica freqüente, no domínio das estratégias cognitivas,
utilizada pelos aprendizes foi a substituição, no caso da falta de
vocabulário para se dizer o que se pretendia. “As estratégias de
substituição implicam em selecionar abordagens alternativas, revisar
planos ou diferentes palavras ou frases para realizar uma atividade”
(ANDRADE et al., 1999, p. 137).
As estratégias sócio-afetivas, por sua vez, também foram
bastante utilizadas para a realização da atividade proposta; elas implicam
a interação professor-aluno, aluno-aluno para o controle da dimensão
afetiva inerente ao processo de ensino e aprendizagem de línguas
estrangeiras. Observou-se o uso da estratégia esclarecimento, no caso da
incompreensão de determinada palavra, o qual era feito entre os pares e
808
com o professor por meio de perguntas. Por estarem em duplas, os
aprendizes utilizaram também a cooperação, bem como o controle das
emoções diante das dúvidas e das dificuldades relativas à produção oral.
Estas últimas estratégias são comuns em contextos comunicativos pelas
dificuldades com a produção oral implica.
Quanto às estratégias metacognitivas, acreditamos que o fato
dos alunos estarem em pares direcionou suas atitudes para o uso das
estratégias sócio-afetivas e minimizou o uso das metacognitivas, as quais
não implicam interação com o outro, mas sim posturas mais individuais.
Considerações Finais
Quando se pensa na aprendizagem de línguas estrangeiras e nas
dificuldades que este processo supõe, alguns questionamentos propostos
por Goettenauer (2003) justificam a necessidade de que se busque uma
aprendizagem que supere a sala de aula e que seja, portanto autônoma.
Neste sentido, cabe ao aprendiz encontrar respostas para os seguintes
questionamentos: Como você aprende? Que critérios você utiliza para
determinar o que quer ou precisa aprender? Como você estuda para
desenvolver as habilidades orais em espanhol/LE? Você tem dificuldades
de compreensão e produção oral em espanhol/LE? Se tem, quais são?
Como você detectou essas dificuldades? O que faz para superá-las?
Responder a estas questões deve conscientizar-nos, portanto,
enquanto aprendizes de línguas estrangeiras, para a necessidade de que
nos posicionemos ativamente e de forma autônoma no processo de ensino
e aprendizagem de LE. Defendemos que é por meio do conhecimento e do
uso das estratégias de aprendizagem que o aprendiz se torna autônomo.
Compartilhamos a visão de Domiciano e Santos (2003, p. 60);
809
[...] aprendiz autônomo é aquele que reflete
criticamente sobre a própria aprendizagem,
traçando objetivos de acordo com suas
necessidades, e assumindo a tarefa de decidir
sobre o que, como e quando estudar para
alcançar os resultados desejados.
810
Referências
ANDRADE, O. et al. Estratégias e técnicas de estudos para o projeto de
ensino: a compreensão e produção em linguagem oral: espanhol, francês
e inglês-implementação de um centro de auto-acesso. Boletim do
Centro de Letras e Ciências Humanas, Londrina, v. 36, p. 137-154,
1999.
BRIONES,
CYR, P. Las classifications das stratégies d’apprentissage. Paris: Clé
International, 1998.
DOMICIANO, R. M. G. Possíveis autonomias vinculadas ao uso de
estratégias de aprendizagem de línguas estrangeiras. Signum: Estudos da
Linguagem, Londrina, n. 6/1, p. 301-318, 2003.
DOMICIANO, R. M. G.; SANTOS, C. B. Autonomia em aprendizagem de
línguas estrangeiras (inglês): uma análise dos deslocamentos do conceito
e das práticas pedagógicas. In: FÓRUM INTERNACIONAL DE ENSINO DE
LÍNGUAS ESTRANGEIRAS - FILE II, Pelotas. Anais... Pelotas: UFPEL,
UCPEL, 2003, p.50-69.
GOETTENAUER, E. Otimização das estratégias de aprendizagem de
habilidades orais em espanhol/LE. In: SEMINÁRIO CELLIP, 16., 2003,
Londrina. Anais… Londrina, 2003. CDROM.
O‟MALLEY, J. M.; CHAMOT, A. U. Learning strategies in second
language acquisition. Cambridge: CUP, 1990.
SCHMITZ, J. R. O termo estratégia: um conceito útil para a lingüística
aplicada? São Paulo: Alfa, 1994.
TAILLEFER, R. J. Q. F. Centro de auto-acesso (CAA): como preparar,
organizar e viabilizar um espaço para gerenciar a autonomia em
aprendizagem de línguas estrangeiras. Boletim do Centro de Letras e
Ciências Humanas, Londrina, v. 39, p. 19-26, 2000.
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