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ESTUDO FITOQUÍMICO E AVALIAÇÃO CITOTÓXICA DE Polygala sp.
Danielle Figuerêdo da Silva1; Hugo Neves Brandão2
1. Bolsista FAPESB/UEFS, Graduanda em Ciências Farmacêuticas, Universidade Estadual de Feira de Santana, e-mail:
[email protected]
2. Orientador, Departamento de Saúde, Universidade Estadual de Feira de Santana, e-mail: [email protected]
PALAVRAS-CHAVE: Citotoxicidade, P. boliviensis, Triagem fitoquímica.
INTRODUÇÃO
A família Polygalaceae possui 19 gêneros e cerca de 1.300 espécies descritas com
ampla distribuição no mundo (MARQUES; PEIXOTO, 2007). No Brasil, está representada
por oito gêneros e cerca de 250 espécies, dos quais o gênero Polygala é o mais representativo,
com cerca de 140 táxons (MARQUES; PASTORE, 2006).
Diversos estudos fitoquímicos realizados com a família Polygalaceae, detectaram
saponinas, xantonas, derivados de pironas, cumarinas, ácidos graxos, fenóis e alcalóides. As
espécies de Polygala caracterizam-se também pela presença de salicilato de metila,
encontrado principalmente em suas raízes (COELHO; AGRA; BARACHO, 2008).
Espécies vegetais do gênero Polygala L. (Polygalaceae) são utilizadas
tradicionalmente em muitas regiões do mundo, tendo atribuídas diferentes atividades
biológicas, como expectorante, sedativa, antipsicótica, antifúngicas e analgésicas (LAPA,
2006).
A busca de novos compostos bioativos através de produtos naturais é de grande
interesse para laboratórios de pesquisa e indústrias farmacêuticas. Contudo, é indispensável
que seja realizado testes de toxicidade a fim de avaliar os efeitos tóxicos e os possíveis riscos
que podem ser extrapolados ao ser humano (AMDUR et al, 1996 apud INEU, 2007;
MONTANHER; PIZZOLATTI; BRIGHENTE, 2002).
Para avaliar a toxicidade de novos produtos naturais, muitos bioensaios podem ser
utilizados. Dentre estes, encontra-se a toxicidade frente à Artemia salina (TAS), que se
caracteriza por ser de baixo custo, rápido e não exigir técnicas assépticas. Esse ensaio de
letalidade vem sendo amplamente utilizado em centros de pesquisa visando minimizar a
utilização de animais de laboratório para estabelecer a segurança de produtos naturais, assim
como na busca de compostos com atividade citotóxica (RUIZ et al, 2005).
METODOLOGIA
A coleta da espécie Polygala boliviensis foi realizada nos meses de junho e julho de
2011, pelo período da manhã, no Campus Universitário da Universidade Estadual de Feira de
Santana e sua exsicata depositada no Herbário da mesma universidade, sendo identificada
como 2687 J.F.B. Pastore.
O material vegetal foi seco em estufa a (45±3)°C, durante 15 dias, até peso constante.
Após a secagem, toda a planta, incluindo parte área e raízes, foi moída utilizando um
liquidificador industrial e colocada em erlenmeyer para extração. Realizou-se maceração com
metanol como solvente extrator, por quatro vezes consecutivas, com duração média de 5 dias
cada. Os filtrados obtidos em cada etapa foram reunidos e concentrados em rotaevaporador
sob pressão reduzida. Depois da obtenção do extrato metanólico seco, uma alíquota foi
retirada para a realização do teste de citotoxicidade e a massa restante foi submetida à partição
para obtenção das frações hexânica, clorofórmica e acetato de etila.
Posteriormente, realizou-se o teste de citotoxicidade frente à Artemia salina para
avaliar a toxicidade in vitro do extrato bruto, frações obtidas após processo de partição e a
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fração mais ativa após cromatografia em coluna (CC) da fração clorofórmica (UPBFC01). O
teste de atividade citotóxica foi baseado no método desenvolvido por Meyer (1982) e
adaptado por Serrano (1996). Neste teste, os nauplii recém-eclodidos foram colocados em
contato com o extrato, em concentrações diferentes, e incubados por 24 horas. Após esse
período foram contados os nauplii sobreviventes para a determinação da DL50. Os nauplii
foram considerados mortos caso não exibissem nenhum movimento durante dez segundos de
observação. Todo o teste foi realizado em triplicata.
A amostra UPBFC01 foi ainda submetida à triagem fitoquímica em CCD com
reveladores específicos para esteroides e terpenos, cumarinas e compostos fenólicos,
conforme metodologia descrita por Wagner e Bladt (1996). A CCD foi realizada em placas de
alumínio recheadas com sílica gel 60 F254 e a fase móvel utilizada foi 10 mL de
hexano:acetato (1:1) e 2 gotas de ácido acético. As amostras foram aplicadas nas três placas
cromatográficas com capilar, sendo estas colocadas em cubas cromatográficas de vidro com a
fase móvel descrita acima. Após eluição e secagem das placas, cada uma foi borrifada com
reagente específico.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A coleta P. boliviensis realizada no Campus da UEFS resultou em material fresco de
2575 g. Após secagem em estufa, foram obtidos 865 g de planta seca que depois da moagem
gerou 790 g de produto pulverizado. Esse material foi submetido à maceração, e depois da
secagem completa do macerado obteve-se uma massa de 182,3 g, o que equivale a rendimento
de 23,08 %, calculado em relação à massa da droga vegetal.
Após partição do extrato, foram obtidas as frações hexânica (13,36 g), clorofórmica
(14,39 g) e acetato de etila (4,74 g), representando rendimento de, respectivamente, 7,33 %,
7,89 %, 2,60 %, em relação ao extrato metanólico seco.
Segundo Cechinel Filho e Yune (1998), a partição de extrato metanólico bruto com
hexano favorece a extração de esteroides, terpenos e acetofenonas; com clorofórmio, a de
lignanas, flavonoides metoxilados, sesquiterpenos, lactonas, triterpenos e cumarinas;
enquanto que o acetato de etila possibilita a extração de flavonoides, taninos, xantonas, ácidos
triterpênicos, saponinas e compostos fenolicos em geral.
Dentre as frações obtidas após partição do extrato, as frações hexânica e clorofórmica
apresentaram rendimento semelhante, 7,33 %, 7,89 %, respectivamente, o que indica a
presença de maior quantidade de compostos que tenham afinidade por esses solventes.
Contudo, apesar da utilização de maior volume de acetato de etila no processo de partição, o
rendimento (2,60 %,) foi inferior às demais frações.
O teste de letalidade da Artemia salina é um primeiro indicativo da toxicidade do
extrato testado. De acordo com Parra e colaboradores (2001), este é um método simples na
pesquisa de produtos naturais que possui uma significativa correlação com testes de
toxicidade aguda in vivo. Na avaliação da toxicidade, Meyer et al (1982) estabeleceram uma
relação entre o grau de toxicidade e a concentração letal média, CL50, apresentada por extratos
vegetais sobre larvas de A. salina. Desde então, considera-se que quando são verificados
valores abaixo 1000 µg/mL, estes, são considerados tóxicos.
Em relação à citotoxicidade, Anderson et al (1991) entendem que a substância que
apresentar CL50< 100 µg/mL pode ser comparável com a camptecina e sulfato de vincristina,
duas substâncias consideradas muito ativas, e aquela que apresentar CL50 no intervalo de 100
a 900 µg/mL pode ser comparada ao ácido hipúrico e considerada medianamente ativa
(DAVID; SILVA; MOURA, 2001).
Assim, o bioensaio realizado com Artemia salina revelou que as frações hexânica e
acetato de etila e UPBFC01 de P. boliviensis apresentaram média toxicidade, visto que a CL50
encontradas estavam dentro do intervalo de 100 a 900 µg/mL, sendo 122,15 µg/mL para a
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fração hexânica, 368,65 µg/mL para fração acetato de etila e 103,35 µg/mL para UPBFC01.
A fração clorofórmica apresentou menor CL50, equivalente a 30,03 µg/mL, sendo, portanto,
considerada altamente tóxica. Resultados similares foram relatados anteriormente na literatura
com outra espécie de Polygala (MONTANHER, A. B. P.; PIZZOLATTI, M.G.;
BRIGHENTE, 2003). Quando comparamos a CL50 da sub-fração UPBFC01 com a fração
clorofórmica (30,03 µg/mL), nota-se uma redução da atividade citotóxica, o que indica
possível sinergismo das substâncias presentes na fração clorofórmica que aumentaram tal
atividade. Contudo, essa comparação não pode ser realizada quanto ao extrato bruto, pois os
resultados obtidos não possibilitaram a determinação da CL50, sendo necessário refazer os
testes.
Quanto à triagem fitoquímica, também realizada com a amostra UPBFC01 mostrou
resultados interessantes. Dentre eles o aparecimento de mancha esverdeada após borrifar a
placa com reagente de Liebermann-Burchard, que indica a presença de núcleo esteroidal; a
presença de manchas com fluorescência esverdeada após aspersão da placa com reagente de
hidróxido de sódio e observação com luz ultravioleta em 365 nm é indicativo da presença de
cumarinas; e notou-se também a presença de fraca mancha com fluorescência azul após
borrifação da placa com cloreto férrico 1%, porém como a fluorescência era pouca, podendose sugerir que esses componentes estão presentes em pequenas quantidades.
A presença de esteroides, compostos fenólicos e terpenos concorda com resultados
anteriores de triagem fitoquímica, por métodos colorimétricos, realizados com o extrato bruto
de P. boliviensis no LAEX, nos quais os resultados também deram positivos para essas três
classes de metabólicos secundários.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Uma vez que a literatura não menciona nenhum estudo fitoquímico e avaliação da
atividade citotóxica de Polygala boliviensis, com exceção dos testes realizados pelo próprio
grupo de pesquisa Estudos químicos e atividades biológicas em produtos naturais, esse
trabalho fornece contribuição inédita acerca desta espécie.
O teste de atividade citotóxica frente à Artemia salina mostrou resultado interessante,
considerando que a CL50 encontrada para as frações hexânica, acetato de etila e sub-fração
UPBFC01 permite classificá-los como medianamente ativo, enquanto a fração clorofórmica
pode ser classificada como altamente ativa. Desta forma, pôde-se sugerir toxicidade dessas
frações ou a presença de agentes citotóxicos nas mesmas. Vale ressaltar que o fracionamento
da fração clorofórmica implicou na redução da atividade, indicando que os componentes
dessa atuam de forma sinérgica favorecendo a atividade.
A triagem fitoquímica indicou a presença de diferentes classes de metabólitos
secundários, que podem estar envolvidos na expressão de atividades biológicas ou potencial
tóxico do extrato em estudo.
Apesar dos resultados obtidos, faz-se necessário repetir o teste de citotoxicidade com o
extrato bruto de Polygala boliviensis, assim como realizar métodos de separação eficientes, de
forma a chegar à sub-fração ou substância responsável pela atividade citotóxica.
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