CRISE EUROPEIA
Hollande, o desejado
"Roosevelt da Europa"
toma hoje posse
O novo Presidente francês é olhado com interesse e esperança
por boa parte dos europeus, ansiosos por uma mudança na
política de austeridade a qualquer preço. Na Grécia, sobretudo
Clara Barata
de manhã, François
Hollande toma posse como
Presidente
de França,
com toda a pompa que o
momento exige. À tarde,
já legítimo representante
do seu país, e também portador das
esperanças de uma Grécia que se vê
à beira da exclusão da moeda única,
tem uma tarefa de Hércules: vai à
Alemanha jantar com a senhora cujo
nome muitos europeus pronunciam
franzindo o cenho: Angela Merkel.
A missão do Presidente "normal"
da França é convencer a chanceler
alemã a reabrir negociações sobre
o tratado de disciplina orçamental,
para aliviar a austeridade e incluir
Hoje
medidas de incentivo ao crescimento. Essa foi uma das promessas primordiais da sua campanha, e foi
aquela que fez com que a esquerda europeia olhasse para Hollande
como uma lufada de ar fresco que
poderia inverter o discurso e a prática da austeridade como resposta
à crise da dívida na Europa.
Durante a campanha, Merkel recusou-se a receber Hollande. Quando
ele foi eleito Presidente, disse que o
receberia "de braços abertos", para
renovar a relação franco-alemã, o eixo em que assenta a União Europeia.
Mas foi deixando vários rotundos
neins quanto a mudanças de rumo.
Mesmo após a pesada derrota da sua
CDU, no domingo, no estado-federado da Renânia do Norte-Vestfália:
"Não afecta o trabalho que temos a
fazer na Europa", garantiu Merkel.
Sobre o encontro de hoje, Hollan-
gar a um bom compromisso".
A Grécia, onde os partidos continuavam a discutir as (im)possíveis
geometrias de coligações para formar um governo que aceite continuar a pôr em prática as dolorosas
medidas da troika e evitar novas
eleições em Junho, enlouqueceu
ontem os mercados, com políticos,
financeiros e académicos a falarem,
de forma cada vez mais descarada,
da possibilidade de a Grécia sair do
curo. Richard Parker, um economista de Harvard e conselheiro do exsocialista grego
primeiro-ministro
George Papandreou, declarou mesmo que a Grécia já tinha considerado seriamente sair do curo.
Mas os gregos têm as esperanças
concentradas em Hollande. O diário
Ta Nea repescou para título uma frase do economista Thomas Piketty,
François Hollande, o "Roosevelt da
Europa", para sublinhar a necessidade de um NewDeal para a UE, para
relançar o crescimento.
Alteração de forças
"Depois das eleições, François
Hollande representa a grande esperança de uma alteração na relação
de forças e uma revisão na política
europeia", disse à AFP o politólogo Georges Séfertzis. Prova disso é
que Alexis Tsipras, o líder da coli-
gação de esquerda radical Syriza,
o segundo partido mais votado nas
legislativas de 6 de Maio, tentou encontrar-se com Hollande na semana
passada. A Syriza quer permanecer
no curo e na UE, mas recusa as condições da troika. Se houver eleições
pode bem ser o vencedor.
O Presidente cuja palavra de ordem foi "a mudança é agora" terá
um início de mandato que é uma
sucessão de provas de fogo. O encontro com Merkel servirá de preparação para uma cimeira informal
em Bruxelas no dia 23 e permitirá à chanceler conhecer o seu novo
parceiro francês, e perceber até que
ponto está empenhado em aliviar as
cordas da austeridade para incluir o
crescimento na agenda europeia.
Se a UE discute uma espécie de
Plano Marshall neutro em termos de
dívida pública
o que permitiria aos
estados injectar dinheiro na economia, financiando grandes projectos,
sem incorrer nas penalizações por
agravar a dívida -, o mesmo economista que falou em Hollande como o "Roosevelt europeu" sublinha
que esta estratégia não tem futuro
a longo prazo. A mutualização das
dívidas públicas é o passo a dar, escreveu, no Liberation.
Sexta-feira, Hollande estará nos
EUA, onde se encontra com Barack Obama, e no fim-de-semana tem
uma cimeira do
em Camp David
cimeira da NAe uma importante
TO onde irá dizer que quer tirar
a França do Afeganistão um ano
mais cedo.
-
-
G
-
8
de falava cautelosamente ontem à
tarde: "Seremos francos, diremos o
que pensamos, não um sobre o outro, mas sobre o futuro da Europa...
Não concordamos em tudo. Vamos
falar sobre isso para podermos che-
De regresso a França reunir-secom o conselho de ministros.
Hollande tem mantido um silêncio
sepulcral sobre as suas escolhas,
mas o nome do primeiro-ministro
será conhecido hoje, e o resto do
governo na quarta-feira.
Fala-se insistentemente de JeanMarc Ayrault, o chefe do grupo parlamentar e presidente da Câmara
de Nantes, como o mais forte candidato a primeiro-ministro,
pela sua
proximidade com Hollande, e por
ser conhecedor da língua e cultura
á
'François Hollande
representa a
esperança de uma
uma revisão na
política europeia",
diz o politõlogo
grego Séfertzis
alemãs. A sua posição enfraquece
por ter sido condenado, há 15 anos,
pela elaboração do boletim municipal sem concurso público. A líder
do PS, Martine Aubry, também está na corrida, mas as suas relações
com Hollande são más, e é mais à
seria
esquerda que o Presidente
como ter um governo de coabitação,
dizem os analistas. Hollande poderá
escolher alguém menos óbvio. Falase, entre outros, de Manuel Valls,
da sua
o estratega de comunicação
-
campanha.
A última oportunidade
Comentário
Jorge Almeida Fernandes
que François
Hollande e Angela Merkel
se vão encontrar hoje
em situações inversas.
Hollande, crítico da
austeridade, beneficia
da sua fresca eleição e de algum
capital de simpatia em vários
países europeus. E terá pela
frente uma Merkel enfraquecida
pela derrota eleitoral do fim-desemana, sob cerrada crítica da
e em
oposição social-democrata
risco de isolamento na Europa.
Berlim teria começado a ceder
terreno. O ministro das Finanças,
Dir-se-á
Wolfgang Schãuble, reassegura
que crescimento e saneamento
orçamental não são contraditórios.
Acontece que, no encontro de
hoje, as vantagens tácticas serão
pouco relevantes. A situação é de
emergência. A Grécia somou à crise
económica uma quase insanável
de Angela Merkel
crise política, ameaçando de novo
toda a zona curo e augurando
um dramático regresso à dracma.
Mudou o clima, crescendo na
opinião pública o descrédito de
uma abordagem da crise apenas
assente na austeridade. A ascensão
eleitoral da extrema-direita, em
na
França, e da extrema-esquerda,
Grécia, fizeram soar os alarmes.
E se Berlim corre o risco de
isolamento, a situação económica
francesa não é brilhante e está sob
vigilância das praças financeiras.
"Merkel e Hollande estão sob alta
pressão para se entenderem",
resume, em declarações à AFP, o
alemão Martin Koopmann, director
da Fundação Genshagen.
O diário Suddeutsche Zeitung,
de Munique, acrescenta outra
perspectiva: Hollande será "a nova
oportunidade de Merkel". Porquê?
Sarkozy e a chanceler pertenciam
à mesma família política. Com
Hollande é diferente. O anterior
eixo liberal-conservador
cede o
lugar ao binómio esquerda-direita.
"Se encontrarem compromissos
em política económica e financeira,
dificilmente serão atacados em
matéria de política europeia. E
ambos se reforçarão internamente
Alemanha: "austeridade
Maria João Guimarães
chanceler alemã, Angela
Merkel, reconheceu ontem
a derrota que o seu partido
sofreu domingo nas eleida
ções no estado-federado
Renânia do Norte-Vestfália,
o mais populoso da Alemanha: foi
"uma derrota dolorosa e amarga".
A
A eleição deu pistas sobre o que poderá acontecer nos próximos tempos
e também nas próximas legislativas,
previstas para o Outono de 2013.
Para já, os sociais-democratas
reencontraram alguma força. O
SPD vinha a fazer uma travessia no
deserto com dificuldade em obter
A vitória da popular
Hannelore Kraft no domingo parece
inverter esta tendência. De tal modo que a candidata reconheceu ter
bons resultados.
perante as respectivas oposições."
Não se trata de trocar o
"Merkozy" por um "Merkollande"
Evaporou-se a ilusão do
"condomínio".
A carta aberta
de David Cameron, Mário Monti
e Mariano Rajoy, assinada por
mais nove chefes de Governo
da UE, apelando a uma política
de crescimento, assinalou em
Fevereiro o fim desse modelo de
gestão da crise.
Hegemonia alemã?
entendimento franco-alemão
continuará a ser um instrumento
indispensável para gerir as crises
europeias. O que se tornou
patente é que o eixo ParisBerlim só funciona se obtiver
o consenso de outras capitais.
Roma e Madrid, mas também
Londres e Varsóvia, são parceiros
É sintomática
"incontornáveis".
a posição italiana. Esquerda e
direita aplaudiram discretamente
a eleição de Hollande: se atribuem
a Merkel o pecado da "teimosia",
não perdoam a Sarkozy o da
"arrogância" no exercício do
imaginário "condomínio".
O saneamento do clima
político europeu passa por um
O
esclarecimento de fundo. Que quer
a Alemanha? Berlim foi empurrada
para a liderança da crise do curo
forte,
porque é economicamente
a França está economicamente
debilitada e a Grã-Bretanha não faz
parte do clube. O "condomínio"
serviu para disfarçar esta realidade
e acabou, paradoxalmente,
por
criar a ideia de uma "hegemonia
alemã", o que ajuda a isolar Berlim
e agrava as divisões políticas na
Europa. A Alemanha foi incapaz de
liderar a procura de "saídas para
a crise": limitou-se a defender os
seus interesses e o seu modelo.
A Alemanha tem poderio para
liderar economicamente,
mas
não tem meios políticos para
uma hegemonia que continua
a repugnar aos alemães. "A
Alemanha tornou-se mais poderosa
do que nunca dentro da UE, mas
está longe de ser hegemónica - e
não sopeia sua "relutância" em
comandar, mas porque não é capaz
mi não quer fazer os sacrifícios que
tal hegemonia implica", resume o
analista alemão Hans Kundnani.
Enquanto se aguardam as ideias
de Hollande, há uma pergunta em
suspenso: que está Berlim disposta
a fazer para salvaguardar o curo?
sim, mas não no meu quintal"
para ser candidata a
chanceler em 2013, mas recusou:
"O meu trabalho é aqui", concluiu
da Renânia do
a ministra-presidente
sido cortejada
Norte-Vestfália.
O candidato derrotado da CDU
era o ministro do Ambiente Norbert Rõttgen, protegido de Merkel
e visto como um potencial sucessor
da chanceler. Esta derrota parece
ter posto um grande travão a esta
ambição. Rõttgen ficou numa posição frágil ao admitir que não seria
líder da oposição no estado em caso
de derrota, e irritou todos no partido ao sugerir que a eleição era um
referendo à política de austeridade
de Merkel na Europa. E esta política
tem, segundo uma sondagem de há
duas semanas, o apoio de 61% dos
alemães. Um responsável de uma
empresa de sondagens citado pelo
Guardian explicava a aparente contradição entre apoio e rejeição dessa
receita política: "austeridade sim,
mas não no meu quintal".
A curto prazo, o resultado do SPD
pode deixar o partido com mais vontade de desafiar a chanceler na crise
do curo. Os sociais-democratas
têm
insistido na necessidade de incluir
mais medidas de promoção do crescimento no pacto orçamental
que
Merkel ainda tem de fazer aprovar
no Parlamento, precisando de uma
maioria de dois terços e, assim, do
apoio do SPD.
Mas o partido ainda não explicou ainda exactamente o que quer.
"Não é claro como é que o SPD se
vai posicionar em relação à crise
do curo", diz a revista Der Spiegel.
Rejeitar o tratado orçamental não
-
é uma opção: seriam vistos como
irresponsáveis com o dinheiro dos
contribuintes alemães. O mistério
deverá ser de pouca dura: hoje, os
líderes sociais-democratas
Sigmar
Gabriel, Peer Steinbrúck e FrankWalter Steinmeier
vão esclarecer
as suas exigências, numa conferência
de imprensa horas antes da chegada
-
-
Hollande a Berlim.
Finalmente, o bom resultado dos
de François
liberais do FDP, que nas duas últimas
eleições estaduais inverteram a onda
de derrotas é, ironicamente, uma má
notícia para a coligação no Governo
de Berlim. Os liberais parecem ganhar mais votos quando se opõem
a Merkel, o que faz prever uma con-
tinuação dos conflitos internos na
coligação. Há analistas que defendem, no entanto, que isto poderia
até ser bom para Merkel: um conflito
poderia levar ao fim da coligação e
a eleições antecipadas. A CDU sairia
vencedora e governaria em "grande
coligação" com o SPD.
Zona curo afirma vontade
"inabalável" de manter
a Grécia na moeda única
Ministros das Finanças dos Dezassete recordam que
cumprimento dos acordos é condição para a permanência
no curo e para a continuação da assistência financeira
Isabel Arriagae Cunha,
Bruxelas
ministros das finanças da
zona curo exprimiram ontem uma "vontade inabalável" de que a Grécia permaneça no curo, embora
avisando que, em contrapartida, Atenas terá de prosseguir as
reformas acordadas em troca de uma
ajuda de 240 mil milhões de euros.
"Temos uma vontade inabalável
de manter a Grécia na zona curo e
faremos todos os possíveis para isso", afirmou Jean-Claude Juncker, ministro das finanças do Luxemburgo
e presidente do eurogrupo, no final
de uma longa reunião dos seus pares
da zona curo.
O cenário de uma saída da Grécia
do curo não foi discutido e "absolutamente ninguém defendeu essa
posição", garantiu. "Sou completamente contra", acrescentou. Falar
dessa eventualidade, "é um disparate, é propaganda", afirmou ainda,
insurgindo-se contra os que querem
dar "conselhos" aos gregos a propósito das eleições 1 de 6 de Maio que
resultaram num impasse para a formação de um novo governo.
"A Grécia votou e temos de ter em
conta os resultados. Esperamos que
um governo seja formado nos próximos dias ou semana e depois lidaremos com esse governo", sublinhou
Juncker, insistindo: "não temos de
dar lições à Grécia".
Os
Olli Rehn, comissário europeu responsável pelos assuntos económicos
e monetários, frisou no entanto que
a continuação da assistência financeira europeia está dependente do
cumprimento do programa de ajus-
tamento
económico
e
financeiro
acordado por Atenas, que pressupõe
reduções drásticas das despesas públicas e duras reformas estruturais.
"Sem o compromisso grego, a solidariedade [europeia] não funcionará",
afirmou, frisando que "o futuro da
Grécia depende do cumprimento por
parte dos políticos gregos da sua parte do pacto de solidariedade".
A Grécia, que há dois anos espoletou a crise da dívida, volta a pôr
a zona curo perante uma escolha
draconiana, entre manter a ajuda
flexibilizando os termos do acordo,
ou estancá-la, provocando a falência do país e a sua saída inevitável
do curo.
Esta perspectiva, que está a assustar os investidores, ameaça contagiar a Espanha devido às dificuldades
gigantescas do sector bancário e de
redução do défice orçamental.
No caso da Grécia, a preocupação
dos Dezassete tem sido de assumir
uma postura capaz de reforçar a posição dos dois partidos tradicionais
(socialistas e conservadores) favoráveis ao cumprimento do programa
de ajuda, que não conseguiram obter
uma maioria parlamentar.
Juncker foi o único a admitir, durante o fim-de-semana a possibilidade de uma flexibilização do programa com a concessão de um ano
suplementar para os gregos cumprirem as metas fixadas ao abrigo da
necessidade de encontrar "soluções
inteligentes".
Ontem o presidente do eurogrupo
limitou-se a deixar implícito que será
preciso esperar pela formação de um
governo para que essa eventualidade possa ser discutida. Rehn afirmou
por seu lado que as metas orçamentais não foram abordadas.
Grande parte dos outros países re-
cusou admitir qualquer tipo de flexibilidade, porventura por temerem
reforçar os argumentos dos partidos
contrários ao acordo.
"Não vejo o que é que poderíamos
fazer mais em termos de negociações" com a Grécia, afirmou o ministro alemão, Wolfgand Scháuble
à chegada a Bruxelas. "É inevitável
que o povo grego tenha de sofrer as
consequências de décadas de negligência. Não há uma saída fácil para
a Grécia qualquer que seja o resultado". Jan Kees de Jager, o ministro
holandês, disse igualmente que "não
há margem para flexibilizar o acordo".
Mesmo se recusam oficialmente
que a Grécia saia do curo, vários
responsáveis invocam essa eventualidade com cada vez maior tranquilidade, convictos de que as consequências sobre os restantes países
são "geríveis".
"Trabalhámos muito no último
meio ano para reduzir os riscos de
uma possível problema nos outros
países" resultante da saída da Grécia,
afirmou o ministro holandês.
Durante o fim-de-semana, Durão
Barroso, presidente da Comissão
Europeia, já tinha afirmado, comparando a zona curo a "um clube",
que "toda a gente tem de respeitar
os acordos".
Jean-Claude
Juncker presidente
do eurogrupo, foi o
único a admitir uma
flexibilização do
programa de ajuda a
Atenas
Tensões no mercado financeiro
Rosa Soares
mercados financeiros europeus voltaram ontem a
viver um dia negativo: as
bolsas encerraram com
perdas elevadas, o curo
caiu face ao dólar e subiram os juros das dívidas soberanas
dos países da zona curo com maiores dificuldades financeiras. Depois
de um curto período de tréguas, a
Espanha e a Itália voltaram a pagar
juros mais elevados nas emissões de
dívida que realizaram ontem.
Este resumo, igual a tantos outros
no passado recente, não traduz as
elevadas tensões que se vivem nos
mercados financeiros, em especial
nos europeus. Para o banco espanhol BBVA, estas tensões são superiores às da queda do banco norteamericano Lehman Brothers, no
pico da crise financeira de 2008.
Citado pelo Expansion.com, o BB-
Os
VA refere num relatório
que "a conexão entre as preocupações da dívida soberana na União Europeia e a
preocupação pela saúde do sistema
financeiro europeu se intensificou,
e as tensões financeiras na Europa
alcançaram níveis, em muitos aspectos, superiores aos presentes depois
de queda do Lehman Brothers, em
Outubro de 2008".
No Relatório, enviado à SEC (a entidade supervisora da bolsa norteamericana), no âmbito das contas
anuais, e escrito antes do agudizar
da crise política na Grécia e do novo plano para recapitalizar a banca
Situação em
Espanha voltou
a dar sinais
preocupantes
para o governo
deMariano
Rajoy
eíuuropeu
i
espanhola, o BBVA destacava que
"as tensões financeiras na Europa
incrementaram
o custo de financiamento dos governos e das instituições financeiras que, em alguns
casos, perderam o acesso ao crédito
internacional".
do
o relatório
Curiosamente,
BBVA foi notícia no dia em que o
prémio de risco de Espanha, face
alemãs, que servem
para o mercado, atingiu novo máximo histórico desde
a entrada no curo, nos 491 pontos.
Os juros implícitos das obrigações
a 10 anos voltaram a quebrar a barreira dos 6%, chegando a atingir os
às obrigações
de referência
6,33%
A comprovar as tensões nos mercados está o facto do tesouro espanhol ter sido obrigado a pagar juros
mais elevados, apesar de ter optado
estrategicamente
por emissões de
curto prazo. No leilão de ontem, a
Espanha emitiu 2192 milhões em títulos de dívida a 12 meses, pagando
um juro de 3,09%, acima dos 2,74%
da operação anterior (a 17 de Abril)
e 711 milhões
em títulos a 18 meses,
com juros que subiram de 3,20%
para 3,40%.
Também a Itália viu os juros a
subir, na emissão que realizou no
mercado primário, mas também
no secundários (onde se revendem
títulos de dívida). Os títulos de dívida de Portugal foram igualmente
penalizados, com os juros implícitos
das obrigações a 10 anos a quebrar
a barreira dos 10%.
superiores
a Outubro de 2008
Para além da situação dos bancos
que renova as dúvidas
quanto à segurança dos testes de
stress, o andamento dos mercados
foi muito prejudicada pela instabi-
espanhóis,
lidade política na Grécia, que pode
acelerar uma eventual saída do curo. E é sobre as consequências dessa
saída para os restantes países da zona curo que se colocaram inúmeras
dúvidas,
A agência de notação financeira
Fitch entende que uma eventual saída da Grécia da zona curo teria um
impacto especialmente concentrado
em Portugal, Espanha e Itália, podendo contagiar outros países caso
a saída viesse a acontecer de forma
desordenada. Ainda de acordo com
a agência, uma eventual saída da
moeda única poderá trazer problemas a muitas empresas por toda a
Europa, dependendo a dimensão do
impacto da saída ser feita de forma
ordenada ou desordenada.
Os mercados bolsistas revelaram
forte preocupação com a situação
política da Grécia, onde continua a
não haver consenso quanto à constituição de um Governo de coligação.
Quedas elevadas na bolsa espanho-
la, que perdeu 2,74%, para mínimo
do ano e com forte queda do sector
bancário, e na praça de de Paris, que
perdeu 2,29%. O principal índice da
bolsa de Lisboa encerrou a perder
1,94%, o mesmo que perdeu o DAX
alemão e o FTSE IOO de Londres. Na
bolsa portuguesa, os bancos fecharam com quedas entre 2% e 4,5%.
Governo de personalidades na
Grécia? Ainda não é claro se
sim e com o apoio de quem
Maria João Guimarães
media gregos fervilhavam de especulação sobre
que Governo poderia sair
de mais um dia de converpelo
sações patrocinadas
Presidente para tentar chegar a um acordo político para um
Governo no país. Segundo esta especulação, tratar-se-ia de um Governo
de "personalidades".
Mas estava
longe de ser certo o apoio político
necessário a este executivo.
Na reunião de hoje com o Presidente, Karolos Papoulias, estarão
presentes todos os partidos com assento parlamentar excepto o neonazi
Aurora Dourada; uma alteração relevante em relação ao dia de ontem, em
que as negociações decorreram sem a
presença do Syriza (Coligação de Esquerda Radical). No entanto, o Syriza
já veio dizer que não apoiará qualquer executivo que ponha em prática
o memorando, mesmo que se trate
de um governo de tecnocratas.
Também presente nas conversações de hoje vai estar o líder do
partido Gregos Independentes, um
partido-protesto saído de uma cisão
do Nova Democracia. Esta presença
era tida como um sinal tímido de possível apoio, ainda que muito improvável, deste partido. Até agora o líder
dos Gregos Independentes, Panos
Kammenos, tem negado qualquer
"colaboração com os traidores", como chama aos políticos que assina-
Os
ram o acordo com a troika.
Ilustrando a situação dramática
do país, com eleições inconclusivas
no topo de uma crise económica, o
diário Ta Nea pôs na primeira página
a imagem de um homem dando um
tiro na cabeça
o desenho feito pelos estilhaços de sangue era o mapa
da Grécia.
Muitos gregos temem que a crise
política acabe por ditar o fim do país
na moeda única. A defesa de uma
saída da Grécia do Euro fazia, aliás, a
capa da revista alemã DerSpiegel.
As eleições de 6 de Maio na Grécia
terminaram com um impasse entre
dois campos, um que defende que o
memorando com a troika (Comissão
Europeia, FMI e Banco Mundial) seja
respeitado (ainda que renegociado),
e outro que defende que o acordo
seja revisto ou mesmo renegado.
No centro do impasse está Alexis
Tsipras, o líder do Syriza, que defende uma rejeição do memorando sem
que isso implique a saída da Grécia
do Euro. Líder europeu após líder
europeu têm expressado, nos últimos dias, variações da mesma ideia:
o desrespeito dos compromissos do
acordo significa o final do empréstimo à Grécia. As verbas nos cofres do
país durarão até ao final de Junho
sendo que até uma parte da última
tranche entregue ficou suspensa, a
aguardar uma definição política.
Se não houver um entendimento
para um governo até esta 5. a feira,
-
-
haverá novas eleições. Caso essa votação fosse hoje, segundo as sondagens, o vencedor seria o Syriza.
Os líderes dos partidos puseram a
tónica numa palavra: "responsabilidade". "Participarei no encontro
com um sentido de responsabilidade", disse o líder do Esquerda Democrática, Fotis Kouvelis. "Todos
têm de assumir a responsabilidade",
afirmou o líder do Nova Democracia,
Antonis Samaras. O Syriza, pelo seu
e a dilado, exigiu "transparência"
vulgação dos conteúdos das reuniões
políticas de ontem.
Com um entendimento a parecer
improvável,
capítulos
as cenas dos próximos
prosseguem
hoje.
"Adoraria ser mãe.
Mas não posso sequer
pensar nisso"
Dos 5,64 milhões de desempregados espanhóis, muitos são
jovens. A geração mais bem preparada de sempre tem medo
do futuro. Alguns estiveram sábado nas Portas do Sol
Reportagem
Sofia
Drena
Villaumbrales, basca de
26 anos a viver em Madrid, foi
despedida em Janeiro e está
no último mês do subsídio de
Leire
desemprego.
"Édesesperante.
Muitas vezes pondero voltar
ao País Basco e viver outra vez em
casa dos meus pais".
Quando terminou o curso de
Psicologia, em 2008, Leire não
imaginava que a sua entrada no
mercado de trabalho se faria com
tantos trambolhões. Em 2009,
encontrou o primeiro emprego,
no ano seguinte terminou a pósgraduação em Psicoterapia. Tem
dois anos e meio de experiência:
"Não chega para competir por
um lugar como psicóloga e
impede-me de pedir uma bolsa
numa empresa; para concorrer é
obrigatório ser recém-licenciada, e
isso também já não sou".
A recessão voltou a bater à
porta de Espanha, pela segunda
vez em três anos, e o desemprego
disparou nos primeiros meses de
2012. Leire foi apenas uma das
365.900 pessoas que ficaram sem
trabalho entre Janeiro e Março.
No fim desse mês, os espanhóis
desempregados eram já 5,64
milhões. A taxa de desemprego era
então de 24,44%, um recorde nos
países industrializados.
Se ainda tivesse 25 anos, Leire
estaria também no grupo mais
afectado: pela primeira vez,
são mais os jovens que querem
trabalhar e estão no desemprego
(921 mil) do que aqueles que têm
emprego (850 mil). A taxa de
desemprego entre os menores de
25 chegou aos 52%.
Se olharmos para um gráfico
do desemprego em Espanha, a
curva de 2008, ano em que Leire
se licenciou, é sempre a pique seguem-se dois anos e meio de
altos (mais) e baixos (menos),
período em que os desempregados
passaram de 4 para 5 milhões.
As quebras acabam no último
trimestre de 2011 e, desde então,
a curva voltou a apontar ao céu
como se não houvesse limites.
Nas imagens da Irlanda ou da
Grécia que nos chegam desde o
início da crise há muitas vezes
centros de emprego a transbordar,
com filas que se estendem pela
rua. Em Espanha, essas imagens
não se repetem desde 2008.
Nesse ano, o aumento brutal no
desemprego paralisou os serviços
e obrigou a uma mudança. Os
desempregados continuam a ter
de assinar uma declaração de três
em três meses enquanto durar o
subsídio, mas agora podem fazê-lo
através da Internet.
As mães
É isso que explica que o centro de
desemprego da rua Evaristo San
Miguel, no bairro madrileno de
Mondoa, esteja quase vazio em
visitas sucessivas. Aliás, só entre
as 9h e as 10h30 é que os serviços
recebem novos desempregados.
É o caso de Belén, 31 anos e dois
filhos, despedida da empresa
de auditoria financeira em que
trabalhava quando regressou da
licença de maternidade.
"As mães já se sabe, muitas
vezes são as primeiras a ir...", diz.
"Por agora espero conseguir o
subsídio e depois, quem sabe, um
trabalhito qualquer."
Em princípio, Belén vai receber
70% do seu último salário, que era
de 1300 euros (quase tanto como
o subsídio máximo em Espanha,
1356 euros). Isto nos primeiros 180
dias; a partir daí, a prestação baixa
não
para 60%. Se o "trabalhito"
aparecer, terá direito a subsídio
durante dois anos (o período
máximo) porque teve a sorte de
pagar segurança social mais de
2160 dias ao longo dos últimos seis
anos. A prestação só é calculada
com base no ordenado anterior
para quem descontou pelo menos
durante 360 dias nos seis anos
anteriores a ficar sem emprego.
Um ano a descontar vale 4 meses
de subsídio.
Aos espanhóis que não tenham
descontado tempo suficiente resta
tentar o subsídio de 400 euros
inscritos
pago aos desempregados
há mais de um mês no centro de
emprego da sua zona sem terem
recusado nenhuma oferta de
trabalho considerada adequada.
Belén diz fazer parte "dos
sortudos". "Pelo menos descontei
e o meu marido tem contrato
fixo" (há 1,7 milhões de lares em
que todos os membros estão
Pelo menos, a
desempregados).
empresa onde trabalhava pagou
a sua segurança social. A Eva, de
32 anos, já aconteceu descobrir
que não ia ter direito a subsídio.
"Quando isso me aconteceu
denunciei a empresa. Não foi fácil,
mas ganhei", conta, enquanto vai
deitando um olho ao mostrador e
à senha que tem na mão, para não
deixar passar a sua vez.
A ajuda dos pais
Eva já passou quase tanto tempo
no desemprego como a trabalhar.
"Este emprego espero que dure",
afirma. "Faço o que queria fazer,
só me falta a estabilidade, isso
nunca consegui." Trabalha há um
ano como administrativa
numa
empresa que oferece assessoria a
outras empresas e é por isso que
ali está, a tratar de contratos de
outros. Apesar do seu ordenado,
próximo da média de 1318 euros
que ganham os espanhóis dos 18
aos 34 anos (quase 10,5 milhões de
pessoas), Eva só consegue manterse "com a ajuda dos pais".
Leire também precisa da ajuda
dos pais, que vivem no País Basco,
e só pôde continuar até aqui em
Madrid porque divide casa com
outras três jovens. "O que eu
queria era exercer Psicologia, dar
consultas. Mas como só o sector
social contratava sem experiência
comecei num centro de
acolhimento de menores", conta.
"Em Janeiro, despediram toda a
equipa porque a associação para
a qual trabalhávamos encerrou
algumas
Apesar
Leire diz
de nada.
das casas que geria".
de tudo, aos 26 anos,
que ainda não desistiu
"De momento estou à
procura de qualquer coisa para
poder viver e tenho medo de não
encontrar, mas os meus sonhos
mantêm-se iguais. Gostava de abrir
um centro de Psicoterapia", diz.
Também aqui Leire está
bem acompanhada: os jovens
espanhóis são empreendedores,
pelo menos nas intenções, e 54%
gostariam de criar a sua própria
empresa, segundos dados do
Eurostat. "A situação actual em
Espanha é realmente revoltante,
mas tento manter a confiança.
Quero ficar e empreender o meu
próprio projecto", repete Leire.
Tal como a basca põe a
possibilidade de voltar à sua região
e a casa dos pais, Eva admite
sair de Madrid em busca de um
trabalho estável. "Para fora não,
a língua é um obstáculo. Mas por
um bom emprego noutra região
espanhola não hesitaria",
explica.
Os filhos
Rafa Aníbal, 28 anos, jornalista
no desemprego desde Novembro,
já não acredita que valha a pena
ficar. E também já recusou
trabalhos: 300 euros por um
part-time e 500 por um trabalho a
tempo inteiro. Para isso, prefere irse embora. Planeia mudar-se para
o Chile, onde sabe que poderá
ganhar o ordenado máximo que
teve em Espanha, 1250 euros.
Enquanto arranja coragem
e tenta amealhar o dinheiro
para o bilhete, Rafa vai
alimentando o bloque que
começou em Dezembro como
escape para "a indignação".
Chama-se pepasypepes e recolhe
testemunhos de jovens que já
apanharam o avião.
A entrevista que fez a Tâmara
Guirao, jovem da Corunha a viver
em França, foi uma das últimas
que publicou. Licenciada em
Tâmara
Relações Internacionais,
lembra "os dez anos" que o
Estado espanhol investiu na sua
formação, entre a universidade
de
e as bolsas, um investimento
que agora "outro país beneficia".
Decidiu partir "quando terminava
a enésima bolsa" e estava há dois
meses no desemprego. "Surgiu a
oferta e a minha mãe disse-me:
'Estudaste para isto, se tens de ir,
vai. Aqui não tens nada'."
Alfredo, 56 anos, está na fila do
centro de emprego à conversa com
Belén, mas veio fazer exactamente
o contrário: contratar. "Tenho
uma empresa na área do meio
ambiente, tratamos de questões
florestais e trabalhamos para
empresas e para administrações
públicas", diz, antes de se queixar
dos clientes ("cada vez são mais os
que deixam de pagar").
A empresa que tem há 22 anos
não vai bem, mas o que mais
preocupa Alfredo são as filhas, de
26 e 23 anos: "Elas não têm nada
facilitado. A mais velha foi para
a Inglaterra e lá está bem, numa
multinacional de cosméticos. A
mais nova está empregada, mas
ganha mal e só se aguenta a viver
connosco".
O fracasso de um pais
Fernando Vallespín, analista
político, lamenta a fuga da
"geração mais bem preparada da
história de Espanha". "Muitos vão
para a Alemanha, para França,
para o Reino Unido. É certo que
a maioria ainda se move dentro
do espaço europeu e isso já não é
tão dramático como antes, muitas
vezes ficam a duas horas de voo da
família. Mas não deixa de ser um
facto de muita transcendência, o
fracasso de um país."
De acordo com a Comissão
Europeia, 68% dos jovens
espanhóis estão dispostos a sair
de Espanha. Destes, 32% iriam por
muito tempo.
Villespín fala da "quebra do
lembrando
pacto intergeracional",
que serão "os jovens a pagar as
dívidas dos mais velhos" sem
terem usufruído dos mesmos
benefícios. "Às vezes tenho muito
medo. É que nós, os jovens, ainda
vamos viver muito tempo, sem
perspectivas de que a situação
melhore", diz Eva.
Soraya, de 31 anos, nunca
pensou sair de Espanha.
Educadora de infância, esteve sete
anos a trabalhar a tempo inteiro
para uma associação privada.
"Sempre me dediquei a trabalhar
com crianças, era o que queria",
conta num café de Vallecas, no
extremo sul de Madrid. Mas desde
o ano passado trabalha "muito
poucas horas", numa escola, um
trabalho que "acaba a 31 de Maio,
depois não sei."
O desemprego chegou à vida
de Soraya ao mesmo tempo
que o movimento
Real (15M) nascia
Madrid, em Maio
"Estive acampada
Democracia
no centro de
do ano passado.
o tempo que
pude, percebi que era uma nova
forma de intervenção social e
quis participar. Depois, as coisas
viraram-se para os bairros. Metime na associação de Puente
Vallecas e dinamizei o grupo de
trabalho sobre habitação, que
era o que fazia falta. Como tenho
tempo livre, mais participo."
"Nesta zona há muitos
problemas. Muito desemprego,
muita gente em risco de perder
a casa", diz, à porta de uma
delegação do Banesto onde foi
entregar um abaixo-assinado a
pedir ao banco que não despeje
um casal de equatorianos seus
vizinhos, pais de uma menina
de três anos, que deixaram de
conseguir
pagar a hipoteca.
Redes de apoio
Sábado, Soraya voltou às Portas d
Sol para o 12M, um dia de protesti
global mobilizado pelo 15M e pele
Em
Occupy norte-americanos.
Madrid foram 35 mil espanhóis a
manifestar-se, incluindo muitos
"Devíamos ser
desempregados.
muitos mais. Deviam estar aqui
os 5 milhões de desempregados",
diz Sara, de 26 anos, estudante
e trabalhadora precária que
foi à manifestação com duas
amigas. "Eu vim", dispara Irene,
outra educadora de infância, no
desemprego desde Dezembro,
sentada no chão como Sara, e
encostada à parede de uma das
saídas de metro da praça.
"Há um ano estivemos aqui a
pedir uma reforma da lei eleitoral
mais representatividade.
Em
vez disso, ofereceram-nos uma
reforma laborai e cortes em todas
as áreas importantes, da saúde à
educação", defende Sara.
"Indignada" e "inconformada".
Soraya diz que todo o seu bairro é
assim. "Temos muita tradição de
luta em Vallecas, mas o 15M ajude
a revitalizar essa tradição, que nã
era tão presente nos mais novos.
Agora criámos redes, ninguém
passa pelos problemas sozinhos,
estamos aqui uns para os outros.'
Soraya ainda consegue pagar
a renda da casa onde vive, pelo
menos até ao fim do mês. Depois,
se não arranjar nada, vai recorrer
ao subsídio de desemprego. O
resto é que vai sendo adiado:
"Adoraria ser mãe. Mas não posse
seauer rjensar nisso."
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