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N.º 221
Dezembro 2010
Mensal
2,00 €
TempoLivre
www.inatel.pt
Viagens Inatel
Marraquexe
Entrevista
Tonicha
nas “Vozes
de Trabalho”
Destacável
12 páginas
Hotelaria
Inatel 2011
Belém
Natal na Palestina
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Sumário
Na capa
Foto: Humberto Lopes
30
RITUAIS
Natal em Belém
A margem ocidental do
Jordão alberga uma
infinidade de lugares
ligados a narrativas do
Velho e do Novo
Testamento. Belém é o mais
visitado, sobretudo pela sua
condição de local de
nascimento de Jesus de
Nazaré. Espaço
multicultural e
multirreligioso, a cidade
acolhe todos os anos as
mais famosas celebrações
de Natal.
5
EDITORIAL
6
CARTAS E COLUNA
DO PROVEDOR
8
16
36
42
76
78
DESTACÁVEL DE 12 PÁGINAS
CONCURSO
DE FOTOGRAFIA
46
48
75
Hotelaria Inatel 2011
NOTÍCIAS
51
70
PAIXÕES
A inspiração duriense
de Mestre Fandino
18
ENTREVISTA
MEMÓRIA
Metro Goldwyn
Pictures: mais estrelas
que no céu
OLHO VIVO
A CASA NA ÁRVORE
O TEMPO E AS PALAVRAS
Tonicha e as “Vozes de Trabalho”
Não perdeu o ar franzino nem o
brilho no olhar. E fala com
entusiasmo deste desafio novo: a
representação. No Teatro da Trindade,
integra o espectáculo Vozes de
Trabalho, onde dá corpo a Ti Ana,
mulher sem idade, a quem os
trabalhos do campo levaram a maior
parte das memórias, mas as cantigas
guardou-as todas.
Maria Alice Vila Fabião
24
OS CONTOS
VIAGENS
DO ZAMBUJAL
Marraqueche: à sombra do Atlas
É uma das quatro cidades imperiais
de Marrocos, a mais meridional. O
deserto fica ainda mais para sul, do
outro lado do Atlas, mas Marraquexe
já acolheu caravanas que vinham do
Níger e do Mali. A segunda maior
cidade marroquina tem uma face
moderna, mas também uma herança
que a mantém ligada às montanhas
vizinhas.
CRÓNICA
Baptista-Bastos
BOA VIDA
CLUBE TEMPO LIVRE
Passatempos, Novos
livros e Cartaz
Revista Mensal e-mail: [email protected] | Propriedade da Fundação INATEL Presidente do Conselho de Administração: Vítor Ramalho Vice-Presidente: Carlos
Mamede Vogais: Cristina Baptista, José Moreira Marques e Rogério Fernandes Sede da Fundação: Calçada de Sant’Ana, 180, 1169-062 LISBOA, Tel. 210027000
Nº Pessoa Colectiva: 500122237 Director: Vítor Ramalho Editor: Eugénio Alves Grafismo: José Souto Fotografia: José Frade Coordenação: Glória Lambelho
Colaboradores: António Costa Santos, António Sérgio Azenha, Carlos Barbosa de Oliveira, Carlos Blanco, Gil Montalverne, Humberto Lopes, Joaquim
Diabinho, Joaquim Magalhães de Castro, José Jorge Letria, José Luís Jorge, Lurdes Féria, Manuela Garcia, Maria Augusta Drago, Maria João Duarte, Maria
Mesquita, Pedro Barrocas, Rodrigues Vaz, Sérgio Alves, Suzana Neves, Vítor Ribeiro. Cronistas: Alice Vieira, Álvaro Belo Marques, Artur Queirós, Baptista
Bastos, Fernando Dacosta, Joaquim Letria, Maria Alice Vila Fabião, Mário Zambujal. Redacção: Calçada de Sant’Ana, 180 – 1169-062 LISBOA, Telef.
210027000 Fax: 210027061 Publicidade: Direcção de Marketing (DMRI) Telef. 210027189; Impressão: Lisgráfica - Impressão e Artes Gráficas, SA Rua Consiglieri Pedroso, n.º 90, Casal de Sta. Leopoldina, 2730-053 Barcarena, Tel. 214345400 Dep. Legal: 41725/90. Registo de propriedade na
D.G.C.S. nº 114484. Registo de Empresas Jornalísticas na D.G.C.S. nº 214483. Preço: 2,00 euros Tiragem deste número: 150.825 exemplares
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Editorial
V í t o r Ra m a l h o
Um programa para o futuro
À
data da nossa posse propusemo-nos
actuar na modernização administrativo-financeira da Fundação, no
reforço das relações de proximidade
com os beneficiários, na requalificação dos equipamentos que se justificassem, na racionalização
dos recursos humanos, no aprofundamento dos
programas existentes e na inovação, numa lógica
de auto-sustentabilidade económica e financeira.
A reformulação da Tempo Livre, a uniformização da nossa imagem, a modernização do
nosso sitio, a requalificação do Teatro da
Trindade, do Parque de Jogos 1º de Maio, das
unidades da Foz do Arelho e de Albufeira e as
que estão em curso ou em projecto e que vão
desde Cerveira até Manteigas, passando por
Oeiras tal como a reorganização da hotelaria, do
turismo, da cultura e do desporto e das ex-delegações falam por si como exemplos do esforço
desenvolvido.
Estes objectivos têm corrido paredes meias
com a criação de novos programas como o do
Turismo Educativo Júnior, que será reforçado no
próximo ano, sem que descurássemos os programas governamentais com maiores preocupações
sociais como o "Abrir Portas à Diferença", o
"Turismo Solidário", ou noutro plano o "Turismo
para Todos", com elevadas exigências de qualidade. Tem havido ainda a preocupação em concedermos novos benefícios aos associados com
parcerias que permitem a aquisição de medicamentos mais baratos, o mesmo sucedendo com
combustíveis para automóveis e em equipamentos telefónicos, entre outros, muitos que vão para
além dos serviços directamente prestados.
É nesta lógica que este número da "Tempo
Livre" faz referência a um novo programa que
projectamos apresentar já em 2011 e que se
denominará "SEMPRE EM FÉRIAS".
A ideia é a de possibilitarmos uma alternativa
muito apelativa ao impulso de muitos seniores,
no pleno gozo de todas as faculdades físicas e
psíquicas, à eventual opção, a partir de certa
altura da vida, em desejarem voluntariamente
fixarem residência definitiva num lar.
O "SEMPRE EM FÉRIAS" - que só se concretizará se o número de candidatos e os requisitos
exigíveis estiverem preenchidos - facultará aos
que preferirem a Fundação Inatel a um lar o
direito a permanecerem por ano em três ou quatro das nossas unidades hoteleiras com a
assistência, o lazer e a convivencialidade que
têm marcado a oferta da Inatel.
C
onscientes da crise, das dificuldades
existentes, da escassez de recursos,
queremos conceder respostas inovadoras que, indo ao encontro das
exigências dos nossos beneficiários e do mundo
de hoje, contribuam para reforçar os alicerces do
futuro da nossa Fundação numa perspectiva
crescentemente humanista.
Sabemos que nem tudo o que fizemos e iremos fazer é perfeito ou está isento de críticas.
Por essa razão estamos a proceder a um
balanço aprofundado do trabalho desenvolvido
para também corrigirmos o que deve ser corrigido, o que, como se vê, não prejudica que em
simultâneo trabalhemos em novas iniciativas
como o SEMPRE EM FÉRIAS. n
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TempoLivre 5
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Cartas
A correspondência
para estas secções
deve ser enviada
para a Redacção de
“Tempo Livre”,
Calçada de Sant’Ana,
nº. 180, 1169-062
Lisboa, ou por e-mail:
[email protected]
E o Porto aqui tão perto…
Turismo Sénior
Ao ler a “Tempo Livre” de Novembro verifico
que vai estrear no Teatro da Trindade mais um
magnífico espectáculo, assim como concertos de
Ravel e Cesar Franck. Constato que há sempre
em cena uma peça de teatro, sessões de cinema
e outras actividades. Lamento que no Porto não
haja nada, mesmo na própria agência, apesar de
haver boas instalações. Pergunto-me se não seria
possível haver parcerias com alguma das várias
casas de espectáculos desta cidade que também
beneficiariam com um pouco de vida, assim
como os sócios desta região pouco fértil em
eventos culturais acessíveis à generalidade da
população. Até o Parque de Jogos de Ramalde
poderia servir para muita coisa se fosse revitalizado.
Espero que este meu desabafo/sugestão possa
servir para despertar algum entusiasmo em
quem de direito.
Arminda R.Carvalho Coutinho,Porto
Sou o sócio 100180, com quotas em dia, frequento com a esposa o Turismo Sénior e
Termalismo desde o início. Sempre fiz a melhor
divulgação e outros amigos aderiram. O meu dia
de inscrição era hoje (28-10-2010). Com outros
amigos, dirigi-me a Agência Best Travel, de
Sines, onde me informaram que as marcações
para 2011 só seriam aceites no dia 8-11-2010,
sem considerarem o sorteio de nomes. Todos
pretendíamos Abril de 2011. Verifiquei que no
livro que editaram, e nem no telefonema que me
fizeram, constava tal condição. Resultado: de
Alvalade a Sines e volta andei, em vão, 120 Km.
Considero uma falta de respeito para aqueles
que são a razão da existência da Fundação.
José Raposo Nobre, Alvalade
N.R. -Tratou-se de um erro cometido pela agência de viagens que, pronta e voluntariamente,
tratou de o corrigir através do contacto com o
Sr. José Raposo Nobre. Após os devidos esclarecimentos, o nosso beneficiário pôde reservar as
suas férias na viagem pretendida. Todavia, e porque as normas que regem o processo de inscrições assim o determinam, a mesma agência
de viagens será notificada sobre esta questão e
devidamente penalizada.
Coluna do Provedor
Kalidás
Barreto
[email protected]
6
TempoLivre
| DEZ 2010
AS INSCRIÇÕES, sobretudo para o Turismo
Sénior, são sempre motivo de reclamação.
A despeito do Regulamento ser publicitado,
largamente, de todas as formas que permitam
chegar, atempadamente, aos destinatários, a verdade é que há, sempre descontentamentos sobre
os sorteios.
Porém, ao longo dos tempos, têm os serviços
da Inatel, estudado várias formas de ir ao encontro das sugestões e de se evitarem algumas aglomerações nas datas de inscrição.
Ultimamente optou-se pelas letras do primeiro nome do concorrente após sorteio previamente incluído no Regulamento, opção muito
mais clara e que tem tido êxito, evitando-se
algumas situações desagradáveis.
Claro que subsistem incompreensões até porque no hábito português, uma boa parte dos
interessados não lê o Regulamento e deixa
andar. Porém, os Regulamentos devem ser cumpridos.
Meus caros leitores, é bom estar-se atento
para se usar o direito à reclamação, mas é
necessário que se conheçam as regras do jogo,
isto é, os Regulamentos que existem e ninguém ganha com o desconhecimento dos mesmos.
Depois, valha a verdade, quem apanha por
tabela são o serviços de atendimento quando na
esmagadora maioria dos casos é o utente que
não se informa devidamente, isto é, “paga o
justo pelo pecador”! n
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Notícias
Albergaria do Sameiro na rede hoteleira da Inatel
l Na sequência de um protocolo
com o Centro Apostólico do
Sameiro, a Fundação Inatel vai
proporcionar aos seus beneficiários
a oferta de serviços de alojamento e
restauração na Albergaria do
Sameiro, uma unidade hoteleira de
99 quartos, com capacidade para
alojar cerca de 150 pessoas (e
facilidades para casais com filhos),
situada num dos locais mais
atractivos da região minhota
Para o cónego José Paulo Abreu,
presidente da Confraria de Nossa
Senhora do Sameiro, o acordo agora
firmado visa dinamizar a Albergaria/
Centro Apostólico do Sameiro, um
«espaço aprazível» com «óptimas
instalações» e condições logísticas
«excelentes», mas com problemas de
rentabilidade na época baixa e que
será benéfico para as duas partes,
pois a Inatel aumenta a sua oferta na
zona e o Centro Apostólico e terá um
maior rendimento da sua unidade
que apenas tem maior ocupação no
Verão.
A Inatel, representada no acto pelo
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presidente e vice-presidente,
respectivamente, Vítor Ramalho e
Carlos Mamede, disporá, por seu
turno, de um espaço de qualidade
para os seus beneficiários numa das
mais belas zonas do país. “Temos
aqui muitas coisas à volta que podem
e merecem ser visitadas, e este
espaço pode ser um ancoradouro
para as pessoas procurarem estas
belezas que este “mar verde” tem para
oferecer», salientou na sua
intervenção o cónego José Paulo
Abreu.
Vítor Ramalho acentuou, por sua
vez, a relevância do acordo dado
tratar-se de “uma estalagem
exemplar”, situada numa zona “muito
aprazível” e que aumenta e diversifica
a oferta hoteleira da Inatel, uma
instituição com cerca de 200 mil
associados e que mobiliza, nos
programas governamentais de turismo
social, cerca de 50 mil pessoas.
Os benficiários Inatel deverão
reservar as respectivas estadias
através das agências da Fundação. O
custo da diária para duas pessoas
varia entre os 50€ (preço para
associados) e os 55€, preço para o
público em geral.
amizade e da solidariedade para
reforço dos laços entre os
trabalhadores que ao longo dos anos
contribuíram para dignificar esta
instituição. “ O nosso maior legado –
frisou - são os trabalhadores e não
encontro palavras para traduzir o
contributo de todos os que ajudaram
a construir esta casa”.
Votos de esperança no futuro e
um apelo à inovação e
competitividade dos serviços tendo
em conta a importância e missão da
Inatel estiveram, ainda, presentes na
intervenção do presidente da
Fundação ao acentuar a importância
do bom relacionamento com os
associados - “são a razão da nossa
existência”, disse –, através do
reforço do contacto directo e da
recolha de elementos que espelhem a
realidade e o seu perfil, criando, ao
mesmo tempo, uma oferta de
serviços mais diversificada e
atractiva que vá ao encontro dos seus
desejos e expectativas.
Convívio Inatel
Cerca de duas centenas de
trabalhadores estiveram presente no
almoço de Confraternização da
Fundação Inatel, que decorreu na
Unidade Hoteleira da Costa de
Caparica, no passado dia 6 de
Novembro. Um encontro marcado
pelo convívio, amizade e boa
disposição entre trabalhadores de
vários recantos dos país e que
assinala os 75 aniversário da Inatel.
Vítor Ramalho, presidente do CA
da Inatel, realçou a importância da
l
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Notícias
Concurso INATEL/Teatro
Novos Textos
O Grande Prémio do concurso
Inatel/Teatro Novos Textos foi atribuído
ao original “A Manhã, A Tarde e a
Noite”, de Luis Miguel Silva Lopes,
cabendo a César Lomba Magalhães o
Prémio Miguel Rovisco pela autoria
do original “A Pítia”. O concurso
INATEL/Teatro Novos Textos tem como
intuito estimular novos autores para a
Agência de Lisboa
escrita de textos originais em língua
portuguesa, promovendo e divulgando
novos valores literários na área do
Teatro. Em 2002, foi criado um prémio
especial dedicado aos jovens com
idade até aos 25 anos, que tem como
patrono o malogrado dramaturgo
Miguel Rovisco.
l No sentido de reforçar o contacto
directo entre os associados, a
Agência Inatel passou a funcionar,
desde Novembro último, no Parque
de Jogos 1º de Maio, em Alvalade
(Lisboa). Nestas instalações poderá
encontrar resposta para todas as
questões relacionadas com as áreas
desportiva e cultural, inscrição de
associados e outras informações de
âmbito geral, com excepção das
actividades na área de Turismo
(reserva de viagens e outras) que
estão a cargo da dependência Inatel,
sita na rua das Portas de Santo
Antão (Rossio) em Lisboa.
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Nova época
desportiva
2010-2011
“Presépios deste Mundo”
O Auditório da Agência
Inatel do Porto foi palco, em
Outubro último da cerimónia
de entrega de Prémios da
Época 2009/2010 e da
abertura da nova época
desportiva 2010-2011. O acto,
a que assistiram dezenas de
participantes, contou com as
presenças do Administrador
Moreira Marques, do
Delegado Regional, Armindo
Oliveira, do Director da
Agência do Porto, Emanuel
Mota, e de dois convidados
especiais: Rosa Mota (ex-atleta
olímpica) e Carlos Resende
(ex-atleta internacional).
O programa incluiu a
actuação da banda Os
Eruditos, uma exibição de um
grupo de atletas da Federação
Portuguesa de Karaté e um
Porto de Honra.
Foram ainda
homenageados os atletas
António Valente, Domingos
Moreira e Armando Silva
pelas suas carreiras
desportivas no atletismo
O acto finalizou com a
apresentação pública das
equipas de Futebol da Taça
Fundação Inatel.
l
Muitas das tradições transmitidas
pelos colonizadores aos povos
meridionais foram sincreticamente
adaptadas ao seu quotidiano. A
imagem do menino Jesus que nasceu,
cresceu e viveu entre os pobres,
assume a sua verdadeira dimensão
nas mãos de diversos artesãos
pertencentes a esses comunidades
que se organizam com o objectivo de
enfrentar as adversidades impostas
por crescentes situações de injustiça e
desigualdade.
l
Alguns desses trabalhos,
verdadeiros hinos à criatividade
destes povos, construídos e
comercializados segundo os
princípios do Comércio Justo, podem
ser apreciados ou adquiridos na
exposição “Presépios deste Mundo”,
patente ao público até ao dia 24 de
Dezembro, no espaço solidário da Mó
de Vida Coop, na Calçadinha da
Horta, nº 19, Pragal, de 2ª a 6ª feira
das 14 às 20 horas e sábados até às
19 horas.
Teatro da Trindade
l
Conterrânea de Lídia Jorge, autora de “O Dia dos Prodígios”, romance que deu
origem à peça homónima, levada à cena no Teatro da Trindade, Maria Cavaco Silva
foi uma espectadora atenta de uma das numerosas e aplaudidas representações no
passado mês de Novembro.
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Notícias
AG da CSIT
Nos dias 8 e 9 de
Outubro realizou-se em
Agrigento (Itália) a
Assembleia-Geral da
CSIT (Conféderation
Sportive Internationale
du Travail). A Inatel
esteve representada pelo
seu administrador, Eng.º
Moreira Marques, que
participou nas
principais deliberações,
designadamente sobre o calendário
executivo para 2011 e os próximos
calendários desportivos. A
assembleia, presidida pelo austríaco
Harald Bauer, debateu, ainda,
questões relacionadas com o doping,
Dia Mundial
do Coração
l
a adesão de novos membros, casos da
China, Turquia, Sérvia e Rússia e a
realização do próximo congresso da
CSIT em 2011, no Rio de Janeiro,
cidade que deverá albergar os Jogos
Mundiais da CSIT, em 2013.
l A Fundação Inatel associouse, através da Direcção
Desportiva, ao Dia Mundial do
Coração, uma iniciativa que
pretende sensibilizar a
população portuguesa para a
actividade física e desportiva.
Presente na mesa da
conferência de imprensa do
Dia Mundial do Coração, o
Administrador Moreira
Marques deu conta do papel e
iniciativas da Fundação na
promoção e divulgação do
desporto amador,
contribuindo para um estilo
de vida mais activo e de
prática desportiva no
quotidiano dos portugueses.
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“Mutualismo com Jornalistas dentro”
“Bicicletas em Setembro”
l A União das Mutualidades
Portuguesas (UMP) editou,
recentemente, “Mutualismo com
Jornalistas dentro”, da autoria de
Mário Branco. O trabalho do antigo
dirigente da Casa da Imprensa (CI),
cujos direitos autorais foram
oferecidos à UMP, é um compêndio
que, objectivando num fio condutor
os principais factos, circunstâncias,
contextos políticos e protagonistas, relativos aos 200 anos de
mutualismo em Portugal, “aspira a ser útil ao progresso do
Movimento e, portanto, à defesa e promoção do Homem e
dos seus direitos fundamentais”. O livro foi oferecido aos
participantes na cerimónia que assinalou, nas Caldas da
Rainha, o Dia Nacional do Mutualismo. Na ocasião, a
presidente da Assembleia Geral da UMP, Maria de Belém
Roseira, homenageou Mário Branco, pela “ampla divulgação”
da causa do mutualismo ao longo de uma vida inteira.
l Esgotada a primeira edição, o mais recente romance
de Baptista-Bastos, “Bicicletas em Setembro”, regressa
às livrarias com a chancela da
Oficina do Livro. Obra maior
de um grande romancista
português, “Bicicletas em
Setembro” fala de trajectórias
amorosas e de que todos os
destinos sentimentais
ocultam histórias
subterrâneas. Fala, também,
da beleza perversa das
relações humanas, e de que
as pessoas suportam tudo,
menos a solidão, a separação e a
perda. É uma parábola sobre perdedores – todos nós.
Porque cada um de nós perdeu alguma coisa.
“A Crise Financeira
e Económica e as Outras”
XXIV Salão de Outuno
homenageia Nadir Afonso
l A Galeria de Arte do
Casino Estoril, a
exemplo do que já fez
em relação a outros
grandes pintores
ligados a esta galeria,
em que participaram
muitos outros artistas,
propõe-se homenagear, também, Nadir Afonso, com uma
ampla e qualificada exposição colectiva.
Esta mostra, que será o XXIV Salão de Outono, inaugurada
a 4 de Dezembro, dia do 90º aniversário de Nadir Afonso,
apresentará - a par de dez trabalhos do homenageado –
trabalhos de pintura, escultura e desenho de dezenas de
artistas convidados.
Nadir Afonso é, indubitavelmente, um dos mais
importantes pintores portugueses contemporâneos. É o pintor
das grandes urbes do mundo, com uma linguagem plástica
exclusivamente sua, fruto de uma rigorosa investigação, que
tem feito acompanhar com a publicação de numerosos livros,
onde fundamenta o seu pensamento sobre a Arte e que serão
também expostos. A exposição manter-se-á patente ao
público, até 15 de Janeiro.
l A Fundação Mário Soares foi palco, em Novembro,
do lançamento de “A Crise Financeira e Económica e
as Outras”, de José Maria Rodrigues da Silva, antigo
juíz conselheiro do Supremo Tribunal Administrativo.
Autor de uma extensa obra ensaística e de ficção, o
também ex-presidente da Associação Sindical dos
Juízes Portugueses salienta no seu mais recente
travalho que enfrentamos, fundamentalmente, uma
profunda crise “identitária, civilizacional e cultural”,
agravada pela “emergência da crise economicofinanceira”.
A par dos défices identitários e culturais, o autor
aborda os problemas de natureza política, a situação da
justiça, o super-individualismo
das sociedades modernas, a
complexa influência dos media
e as polémicas em torno do
actual primeiro-ministro, para
concluir que “a solução” dos
problemas financeiro e
económico “está dependente
da resolução das outras crises,
com relevo para as da ética, da
cultura, da justiça e da
informação”.
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TempoLivre 13
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Notícias
Prémios Gazeta 2009
Teresa Gonçalves
em Viena
l
No Instituto de Cultura
Francesa de Viena esteve
patente, em Outubro e
Novembro, a exposição
“Desenhos”, da artista
madeirense Teresa Gonçalves
Lobo. A mostra, de 30
desenhos, teve o patrocínio da
Embaixada de Portugal e do
Com a presença do Chefe de
Estado, teve lugar no passado dia 15
de Novembro, a cerimónia de entrega
dos Prémios Gazeta 2009, iniciativa
do Clube de Jornalistas, com o
patrocínio da CGD. Foram
distinguidos Miguel Carvalho,
l
jornalista da Revista Visão, com o
Grande Prémio Gazeta 2009, pela
reportagem “Os segredos do Barro
Branco”; o quinzenário “Repórter do
Marão” recebeu o Prémio Gazeta
Regional e a João Paulo Guerra foi
atribuído o Prémio Gazeta de Mérito.
Centro de Língua
Portuguesa/Instituto Camões
na capital austríaca e foi
apresentada por Arnold
Mettnizer, figura de referência
do mundo cultural vienense.
Portugal no Coração
Os vinte emigrantes portugueses, radicados nos continentes
africano e americano, que integraram a 2.ª fase do programa
“Portugal no Coração”, de 18 a 29 de Outubro último,
visitaram vários pontos do país, designadamente Lisboa,
Albufeira, Óbidos, Fátima e Coimbra, com estadias nas
unidades hoteleiras da Inatel. Promovido pela Direcção-Geral
dos Assuntos Consulares e Comunidades Portuguesas, com
apoio da TAP e da Fundação INATEL, o programa, iniciado em
1996, traz, todos os anos em Maio e Outubro, dezenas de
emigrantes seniores ausentes do país por longos períodos de
tempo e sem recursos financeiros.
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Fotografia
XV Concurso “Tempo Livre”
Fotos premiadas
[1]
[3]
[2]
16
TempoLivre
| DEZ 2010
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Regulamento
1. Concurso Nacional de Fotografia da
revista Tempo Livre. Periodicidade
mensal. Podem participar todos os
associados da Fundação Inatel,
excluindo os seus funcionários e
colaboradores da revista Tempo Livre.
2. Enviar as fotos para: Revista Tempo
Livre - Concurso de Fotografia, Calçada
de Sant’Ana, 180 - 1169-062 Lisboa.
3. A data limite para a recepção dos
trabalhos é o dia 10 de cada mês.
4. O tema é livre e cada concorrente
pode enviar, mensalmente, um
máximo de 3 fotografias de formato
mínimo de 10x15 cm e máximo de
18x24 cm., em papel, cor ou preto e
branco.
5. Não são aceites diapositivos e as
fotos concorrentes não serão
devolvidas.
6. O concurso é limitado aos
associados da Inatel. Todas as fotos
devem ser assinaladas no verso com o
nome do autor, morada, telefone e
número de associado da Inatel.
Menções honrosas
[ a ] Sérgio Guerra, S. João do Estoril
Sócio n.º 204212
[ b ] Joaquim Faria, Matosinhos
Sócio n.º 65387
[ c ] Fernando Ledo, Viana de Castelo
Sócio n.º 349141
[a]
[b]
7. A «TL» publicará, em cada mês, as
seis melhores fotos (três premiadas e
três menções honrosas),
seleccionadas entre as enviadas no
prazo previsto.
8. Não serão seleccionadas, no
mesmo ano, as fotos de um
concorrente premiado nesse ano
9. Prémios: cada uma das três fotos
seleccionadas terá como prémio duas
noites para duas pessoas numa das
unidades hoteleiras da Inatel, durante
a época baixa, em regime APA
(alojamento e pequeno almoço). O
prémio tem a validade de um ano. O
premiado(a) deve contactar a redacção
da «TL».
[ 1 ] Manuel Cardoso,
Vila Nova de Gaia
Sócio n.º 345542
[ 2 ] Ana Fialho,
Azueira
Sócio n.º 122630
[ 3 ] Manuel Andrade,
Vila Nova de Gaia
Sócio n.º 421159
[c]
10. Grande Prémio Anual: uma
viagem a escolher na Brochura Inatel
Turismo Social até ao montante de
1750 Euros.
A este prémio, a publicar na «TL» de
Setembro de 2011, concorrem todas
as fotos premiadas e publicadas nos
meses em que decorre o concurso.
11. O júri será composto por dois
responsáveis da revista T. Livre e por
um fotógrafo de reconhecido prestígio.
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Entrevista
Tonicha
encanta no Trindade
ão perdeu o ar franzino nem o brilho no olhar. E fala com
entusiasmo deste desafio novo: a representação. No Teatro
da Trindade, integra o espectáculo Vozes de Trabalho,
onde dá corpo a Ti Ana, mulher sem idade, a quem os trabalhos
do campo levaram a maior parte das memórias, mas as cantigas
guardou-as todas. Depois de ter passado uma vida agarrada à
nora, a tirar a água das entranhas da terra – como refere o bem
urdido texto de Tiago Torres da Silva, que acumula a encenação a personagem abre espaço para Tonicha dar o melhor de si e
arranca com Massadeira. Mais à frente há-de embalar com
Moreninha mas onde realmente mostra todo o seu à-vontade e
alegria a interpretar o reportório do Cancioneiro Popular é em
Vareira, uma música originária da Beira Litoral.
E é embalada pelo som da orquestra de instrumentos etnográficos
que ocupam uma parte do palco da sala principal do Trindade
que Tonicha nos fala deste regresso.
N
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Entrevista
Como está a viver este desafio de voltar aos
espectáculos mas agora também como actriz em
Vozes de Trabalho?
O que se está a passar comigo agora é algo diferente de tudo o que já fiz. Nunca fiz representação,
nunca estive no teatro. E é muito
interessante, faz-me trabalhar com
a cabeça, com o físico. E veio
Vozes de
numa hora muito boa. Tive probleTrabalho tem a ver
mas de saúde e isto serve-me de
com trabalho, com o
terapia. Quando tinha os meus 16
campo, o mar, a gente
anos, apanharam-me uma vez na
que está em várias
RTP e perguntaram-me se queria
actividades. O tipo de
fazer um pequeno papel numa
música que temos ali
peça que ia ser emitida em directo.
está de facto
Achei graça e aceitei. Fiz de filha
dentro…
de uma grande actriz, a Mariana
Vilar. Foi a única experiência que
tive antes em termos de representação. Agora estou a tentar fazer bem.
Esta peça vai também de encontro à sua faceta
de intérprete da canção popular tradicional… é
um voltar às suas raízes…
É verdade. Eu diria que Vozes de Trabalho tem a
“
”
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ver com trabalho, com o campo, o mar, a gente
que está em várias actividades. O tipo de música
que temos ali está de facto dentro do que conheço,
da música tradicional portuguesa que sempre
cantei, e aí eu estou perfeitamente à vontade.
E representa o papel de uma senhora sem
idade…
A Ti Ana aqui é uma espécie de lenda. Passa a
vida numa nora, é o seu trabalho, é o que conhece bem. O trabalho e as cantigas. No fundo a
única coisa que lhe dá uma certa vida, alguma
vontade de continuar a viver é a música.
Mas devo dizer aqui que o Tiago Torres da
Silva ao escrever esta peça convidou as pessoas
que achou por bem convidar e distribuiu os
papéis por igual: ou seja, todos temos o nosso
tempo em cima de palco. Todos representamos,
todos cantamos, à excepção de duas grandes
actrizes que lá estão, que não são cantoras Cecília Guimarães e Lourdes Norberto. Nós
representamos mas também pedimos desculpa
por isso (risos).
E das plateias, do público, tem saudades…
Tenho. Há que dizer: eu parei há ano e meio mas
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naturalmente a minha vida foi sempre essa.
Quarenta e muitos anos de cantigas é muito
tempo. É uma vida. Andei por todo o mundo.
Gravei em francês, inglês, italiano e castelhano.
Queríamos que o nosso trabalho fosse mais além
e achámos que isso seria mais interessante.
Está feliz com a carreira que escolheu?
Sim, repare, comecei a viajar aos 16 anos à boleia
da música. O primeiro país que eu visitei foi
França, fui a Paris – que me deslumbrou, como
pode imaginar. A partir daí fui para todo o lado.
Para toda a Europa, incluindo alguns países de
Leste; a América do Norte fi-la não sei quantas
vezes em tournées; estive na Ásia, andei por todo
o lado, desde Macau, Austrália…
Que reportório levava?
Cantava mais música tradicional portuguesa.
Cantei para a emigração mas também para públicos locais. Fiz por exemplo um espectáculo na
City Hall em Toronto e cantei para tudo quanto
era gente. E isto para lhe dizer que a música deume tudo de bom. Desde a oportunidade de viajar
muito, muito, muito até conhecer pessoas fantásticas. Porque eu fui sempre bem recebida, tanto
lá fora como cá, e não me posso queixar.
Para quem veio de Beja com 16 anos para o
Barreiro já imaginava toda esta vida?
Tenho uma prima que cantava no Centro de
Preparação de Artistas de Rádio e uma vez por
mês dava o programa em directo do estúdio e eu
ouvia-a cantar. Como já gostava de cantar, aquilo
entusiasmava-me muito. Por outro lado, na família da parte do meu pai, todos eles eram ligados à
música e isso passou a ser um sonho meu desde
muito criança.
Quais são as primeiras memórias ligadas à
música?
Tínhamos um amigo da família que gostava
muito de brincar comigo. Eu era muito pequenina, devia ter uns 4-5 anos e ele fazia-me uma
maldade: sabia que eu gostava imenso de cantar
e dizia-me que me dava uma moeda se eu cantasse debaixo da mesa, era um sádico. Eu respondia-lhe que só ia se me desse uma moeda
branca, porque as pretas não valiam nada. E lá ia
para debaixo da mesa cantar e ele muito sádico a
gozar o pratinho.
Portanto isto vem mesmo desde miúda. Eu
estive no Barreiro 15 dias. Tinha um tio-avô que
era chefe dos caminhos - de - ferro do Barreiro. E
foi uma boa oportunidade ir ali a casa do meu tio
porque era muito fácil vir a Lisboa bater às portas.
Como se entrava no mundo artístico?
Nessa altura os cantores tinham professores de
canto e eu comecei por aí. Perguntei onde podia
encontrar uma professora de canto. E indicaramme Corina Freire, também uma grande actriz. E
eu fui. Curiosamente era onde ia a maioria dos
cantores da época. Ali fiz conhecimentos e consegui saber imensas coisas: podia concorrer aqui
e ali. Por exemplo fui a um concurso para a exEmissora Nacional, com mais 40 cantores e fiquei
eu; fui a concurso à RTP, teria os meus 16-17 anos
e também fiquei… portanto isto é uma coisa que
vem das entranhas.
Não havia como calar esta vontade…
Não, nem alguma vez pensei em
O que se está a
ser outra coisa. Eu tal como a perpassar comigo agora
sonagem Tiana só queria cantigas,
é algo diferente de
queria cantar. Se um dia ia ou não
tudo o que já fiz (…)
ser popular, não pensava nisso.
nunca estive no
E o início da minha carreira foi
teatro. E é muito
muito interessante, porque cointeressante, faz-me
nheci muita gente que queria
trabalhar com a
seguir o mesmo caminho, dávacabeça, com o físico.
mo-nos todos muito bem, era
E veio numa hora
tudo muito descontraído, ninmuito boa….
guém naquela altura pensava em
concorrência.
Respeitávamos
muito quem já cá estava e que já
tinha grandes carreiras. E para nós era o deixa
andar, calmamente, foi muito descontraído.
O que a terá ajudado a ter um percurso feliz…
Sim e há coisas que me fazem fugir: o drama, as
pessoas negativas. Sou uma pessoa que tem tido
problemas, como toda a gente, mas sou muito
positiva, tenho muita força. Há coisas que nos
puxam para baixo e eu puxo muito para cima.
Começou pela música ligeira depois enveredou
pelo lado etnográfico…
Por influência do meu marido. Ele fazia recolhas,
foi um etnógrafo muitíssimo bom que já estava a
trabalhar muito antes de me conhecer, já estava
ligado a um grupo de Almeirim, viajava e era um
estudioso dessas matérias, quer aqui, quer lá fora.
Um dia disse-me se eu não queria cantar uma
cantiga do Cancioneiro e eu respondi-lhe que
não; acho que não sou capaz. Mas ele insistiu. E
“
”
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Entrevista
“
…A música
deu-me tudo de bom.
Desde a oportunidade
de viajar muito,
muito, até conhecer
pessoas
fantásticas.
”
tanto insistiu que experimentei e achei que tinha
jeito. E foi a partir daí. Sempre, sempre com o
apoio e o aconselhamento dele. Aliás, nessa área
e noutros estilos de música. Nos estúdios, na própria RTP, era ele que dirigia todo o meu trabalho.
Lembra-se das primeiras músicas tradicionais
que cantou?
Vira dos Malmequeres, Resineiro… foram todas
mais ou menos gravadas nos anos 70. Comecei e
vendia milhares de discos. As pessoas gostaram
muito de me ouvir cantar esse estilo, tive imensa
sorte. Às tantas, fazia o trabalho de estrada que
todos os artistas fazem e cantava metade, metade:
o estilo que sempre gostei de cantar, a canção
com poesia, mais elaborada e depois cantava
músicas do Cancioneiro Popular.
Eram dois públicos diferentes?
Creio que sim. A música do Cancioneiro era
muito mais abrangente. Naturalmente que eu ia a
um espectáculo popular e aquilo era uma festa!
As pessoas cantavam todas as músicas. Milhares
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TempoLivre
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de pessoas a cantar é uma coisa absolutamente
fantástica. É a melhor prenda para o artista, é de
tudo quanto há de melhor: o público e o espectáculo em directo.
E agora vai tê-lo, no Trindade e na digressão…
Vai ser muito interessante. Vai ter músicas do
Cancioneiro. Canto uma Vareira da Beira Litoral, é
uma música que eu divulguei. Achámos que seria
bom colocar ali uma peça daquela zona porque
tem a ver com umas personagens que ali estão. E é
muito alegre. É uma peça pura, autêntica.
E a partir de agora ganha a música ou o teatro?
Não sei porque nunca fui para cima de um palco
representar… Agora há a responsabilidade de
fazer o que nunca fiz, que é representar; e a de
cantar, porque há um ano e tal que não canto. Isto
tem sido um ir trabalhando, não é uma coisa que
se faça de um dia para o outro. Isto abana, pica.
E aí está outra vez a Tonicha nos palcos…
Aí estou eu outra vez. n
Manuela Garcia (texto) José Frade (fotos)
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Viagens
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Marraquexe
À sombra do Atlas
É uma das quatro cidades imperiais de Marrocos, a mais meridional. O
deserto fica ainda mais para sul, do outro lado do Atlas, mas Marraquexe já
acolheu caravanas que vinham do Níger e do Mali. A segunda maior cidade
marroquina tem uma face moderna, mas também uma herança que a
mantém ligada às montanhas vizinhas.
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Viagens
lmorávidas, Almóadas, Merínidas,
Saadianos e Alauítas sucederem-se
no domínio da maior cidade
marroquina do sul. Marraquexe foi
fundada por um guerreiro da primeira dessas dinastias, Youssef Ben Tachfine,
que alargou a sua soberania até terras andaluzas,
mantendo Fez como sede do poder. Foi Ali Ben
Youssef, o sucessor, que transformou Marraquexe
em capital imperial privilegiada. O primeiro
grande circuito de muralhas, a edificação de
palácios e mesquitas, a par de um extraordinário
desenvolvimento das artes decorativas, marcaram esse período. A dinastia seguinte, pela mão
do seu terceiro sultão, Yacoub el Mansour, inaugurou a que seria a época de ouro de Marraquexe,
o tempo que foi o da edificação da Koutoubia, a
A
torre gémea da Giralda de Sevilha e um dos símbolos da actual Marraquexe.
Depois dos Merínidas, que reinaram um século, vieram os Saadianos e Marraquexe fez-se sede
de um vasto império que se estendia desde a
costa atlântica até Tombuctu. Ahmed el Mansour,
um dos monarcas responsáveis pela derrota lusitana em Alcácer-Quibir, foi o obreiro principal da
empresa que deu a Marraquexe o controlo das
rotas das caravanas africanas até ao Mali e ao
Império do Songai, com os seus comércios de
ouro, marfim e escravos. Os quase mil anos de
Marraquexe sedimentaram todas essas heranças.
Uma praça feérica
Como em qualquer outra cidade marroquina, os
souks e a medina são pontos irresistíveis para os
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passos do viajante. Os mercados estão, como
sempre, mergulhados em muitos quefazeres e a
organização da Medina espelha lógicas medievas
de compartimentação profissional, transformando as deambulações pelo labirinto da Medina
numa sucessão de surpresas. Mercadorias e trabalho repartem-se por cantões especializados:
ora se revelam os odores dos souks das especiarias, ora somos surpreendidos pelo ribombar dos
martelos dos ferreiros, no souk Haddadin, ora
pela cantilena das serras dos carpinteiros. No
souk Cherratin, o odor dos couros faz-nos hesitar
em seguir em frente... Os preços, esses, são regateados sempre com um razoável grau de incerteza. Escrevia Canetti em “As vozes de Marraquexe”: “... o preço dito de início é a ponta de um
enigma. Ninguém o sabe de antemão, incluindo
o próprio comerciante, pois que para cada caso
há um preço diferente”…
Há, claro, o mais ou menos convencional
roteiro monumental: o Palácio da Bahia, os
Túmulos Saadianos, o Palácio Dar Si Said, que
acolhe o Museu das Artes Marroquinas (e uma
admirável colecção de tapetes e jóias do Alto
Atlas), a Madraça Ben Youssef (uma escola corânica quinhentista), as ruínas do Palácio El-Badi
(famoso pelos mármores de Itália e materiais preciosos da Índia e construído com as indemnizações de guerra de Alcácer-Quibir), os jardins
Majorelle e de Menara, a cintura de muralhas de
pedra rosada que a luz do crepúsculo faz parecer
acabadinha de sair de um desenho infantil.
Dos quarteirões modernos, “ocidentalizados”,
de Guéliz ou Hivernage, pouco ou nada se dirá:
provam o convívio de Marraquexe com temporalidades diversas. É na Praça Djemaa-el-Fna que
pulsa uma certa herança de Marraquexe, quiçá a
mais singular e aquela que liga a cidade ao Atlas
– e, sobretudo, aos tempos pré-modernos.
A animação da mais famosa ágora marroquina
ganha fôlego com o cair da noite, quando começa
a fumarada dos grelhados dos restaurantes ao ar
livre. Um ambiente feérico, para abreviar adjectivos. A malta acomoda-se, noite dentro, em
pequenos ajuntamentos à volta das atracções:
contadores de histórias com ar de profetas, músicos berberes com os seus tambores e cornetas,
dentistas e curandeiros mais as suas mezinhas e
ervas e antídotos, encantadores de serpentes e as
suas flautas e ofídeos, videntes e astrólogos, acro-
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Viagens
batas e comediantes, aguadeiros e uns quantos
ratoneiros simpáticos.
Herança berbere: teoria e prática
Mais do que árabe, o coração de Marraquexe é
berbere. A cidade foi, largamente, um lugar de
encontro e de cruzamento privilegiado de gente
do Atlas, de nómadas do Sara, de antigos escravos que fizeram a travessia do grande deserto.
Como muitas outras cidades, Marraquexe tem o
seu quinhão de mestiçagem, ou de mestiçagens -
Viagens INATEL
A Direcção de turismo da Fundação INATEL
tem dois programas de viagem para
Marraquexe, na passagem de ano, de 30 de
Dezembro a 3 de Janeiro (partidas de Lisboa,
Porto e Faro), e no Carnaval, entre 5 e 8/3 de
2011, com partidas de Lisboa. Mais
informações nas agências Inatel e em
www.inatel.pt
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culturais, arquitectónicas, etc. O período colonial
francês deixou traços no urbanismo, em certas
rotinas sociais, em muitos aspectos da cultura
urbana e na arquitectura, que se mesclaram com
referências árabes. Mas a herança berbere, diz-se
e escreve-se, permanece transversal a várias
dimensões da identidade de Marraquexe.
À sombra do Atlas, portanto. A cadeia montanhosa que começa lá no norte, no Riff, perto do
Mediterrâneo, e corre quase até ao deserto completa o cenário, mas é, obviamente, apenas um
fragmento do cenário. A cidade é bem mais do
que essa imagem de postal que pinta os picos
nevados como tela de fundo de palmeiras e de
muralhas rosadas. Mas o Atlas é, ainda a fonte de
onde brotam os contadores de histórias, os acrobatas, os músicos da praça Djemaa-el-Fna. Sem a
montanha Marraquexe não seria o que é: a cidade que vive à sombra do Atlas. Não disse Paul
Bowles, um dia, que sem a praça Djemaa-el-Fna
Marraquexe seria apenas mais uma cidade
marroquina, sem nada de especial que a evidenciasse entre as demais? n
Humberto Lopes (texto e fotos)
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Belém
Natal na
Palestina
A margem ocidental do
Jordão acolhe uma
infinidade de lugares
ligados a narrativas do
Velho e do Novo
Testamento. Belém é o
mais visitado, sobretudo
pela sua condição de
local de nascimento de
Jesus de Nazaré. Espaço
multicultural e
multirreligioso, a cidade
acolhe todos os anos as
mais famosas
celebrações de Natal.
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Rituais
Rua de Belém,
Igreja da Gruta do
Leite, Mesquita
de Omar e Igreja
da Natividade
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S
e Jericó, situada a umas dezenas de
quilómetros na direcção da fronteira
da Jordânia, é considerada a cidade
mais antiga do mundo, Belém é uma
das comunidades cristãs mais vetustas do planeta. A cidade onde se supõe ter nascido Jesus de Nazaré conserva, ainda, muitos
outros pergaminhos, já que aí coexistem espaços
simbólicos para as três grandes religiões monoteístas que nasceram no Médio Oriente. O túmulo de Raquel, um local sagrado para o Judaísmo,
encontra-se perto de uma das entradas da cidade,
que foi também lugar de nascimento do rei
David. Pela cidade terá passado, ainda, o profeta
Maomé, que ali se deteve em oração.
Os indícios mais antigos de um assentamento
urbano datam de 3000 a.C., tendo sido o local
habitado e disputado por Cananeus e Filisteus.
Com a chegada do Islão, através do califado de
Omar, a antiga Efrata, designação com que Belém
surge mencionada nos textos bíblicos, não deixou de ser cristã, pelo menos parcialmente,
embora na actualidade a maioria da população
seja muçulmana. A comunidade cristã, que
reúne hoje cerca de vinte mil habitantes, manteve sempre os seus templos e cultos ao longo dos
vários períodos da sua história, com períodos de
maior ou menor tolerância, à excepção do tempo
em que esteve sob o domínio dos Mamelucos.
Pouco depois do ano 1000, os Cruzados conquistaram a cidade, mas foram expulsos logo a seguir
pelo sultão Saladino. A cidade, localizada no
deserto da Judeia, é administrada actualmente
pela Autoridade Palestiniana, na sequência dos
acordos de Oslo de 1995, mas o controlo das suas
entradas e dos territórios circundantes continua a
ser feito pelo exército israelita desde a Guerra dos
Seis Dias, em 1967.
Um graffiti pintado no muro construído por
Israel para isolar os colonatos judeus na
Palestina, perto do checkpoint da estrada para
Jerusalém, é exemplar na representação da
situação actual da Cisjordânia e, particularmente,
de Belém. É uma árvore de Natal cercada por um
muro alto – o muro que deixou do outro lado o
túmulo de Raquel e que é bem mais do que a
expressão de uma violência simbólica, nessa
separação que faz de territórios e lugares sagrados de diferentes comunidades religiosas. Mas,
como sustenta Elias, um árabe cristão que tem
uma loja nas imediações e que é descendente dos
refugiados palestinianos que acudiram a Belém
em 1948 (quando do conflito que eclodiu com a
criação do Estado de Israel, na sequência do fim
do mandato britânico), “o problema não é a religião”. As questões políticas que atravancam o
processo de paz têm muitos outros e mais fortes
componentes, numa terra onde os templos
cristãos sobreviveram a sucessivas e diferentes
soberanias. A igreja da Natividade é vizinha da
mesquita de Omar, ambas na Praça da
Manjedoura, lembra Elias.
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O comerciante aponta para um calendário
com uma imagem da Virgem com o Menino.
“Vocês, Portugal, França, Itália, Espanha... todos
latinos. Como a minha família, aqui na Palestina.
Podes ir a Hebron, onde quiseres, ninguém te faz
mal. Aqui entre nós os muros não têm a altura
daquele ali em baixo”. Será que Elias se lembra
de quando a igreja da Natividade foi salva da destruição graças à população muçulmana local, que
se insurgiu, em 1009, contra um édito do califa
Hakim?
A igreja e a gruta da Natividade
Belém ou Nazaré? A investigação histórica sobre
o local de nascimento de Cristo enfrenta algumas
contradições que os textos sagrados – e as suas
interpretações – tentaram ultrapassar. Como
sublinha Ambrogio Donini na sua “História do
Cristianismo”, obra de referência na literatura
não confessional sobre o assunto, “Nazoreu” (ou
“Nazareno”) não teria relação com Nazaré e referir-se-ia, muito provavelmente, à qualidade de
“santo”, ou “puro”, uma vez que “a tradição cristã
dos primeiros séculos tem conhecimento de um
grupo de nazoreus, que se conservou por muitos
séculos, fazendo referências a Jesus, ‘que honram
como um homem justo’”. A indicação de Nazaré
como lugar de origem de Cristo opõe-se, como
assinala também Donini, a uma outra tradição
que atribuía ao Messias uma descendência da
linhagem de David e o nascimento em Belém,
versão “que depois prevaleceu, enriquecida com
toda uma série de pormenores lendários”. A
especificação do lugar de nascimento (dada pelos
evangelhos de S. Lucas e de S. Mateus) surge
após o consulado de Constantino, quando as
autoridades eclesiásticas procuraram sistematizar a topografia da Palestina. Segundo S.
Jerónimo, que viveu em Belém e que Donini cita
como fonte desta
informação, por volta do ano 400 foi
descoberta a “gruta
da natividade”, justamente “no local
em que, havia séculos, tinha sido edificado um pequeno
templo a Adónis (ou
Tammuz), o ‘salvador’ dos cultos de
mistério orientais. Dioniso, Hermes, Horo, Zeus
e, sobretudo, Mitra, tinham nascido também
numa gruta”.
A primitiva igreja da Natividade, localizada
num dos extremos da Praça da Manjedoura, foi
construída no séc. IV, sobre a gruta, por ordem do
imperador Constantino, e substituída por outro
templo maior, já no séc. VI, que é, hoje, o mais
importante foco de peregrinação cristã em Belém.
De feição bizantina, a basílica ortodoxa mantém
intacta a nave central, com algumas intervenções
Um árabe
cristão
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Rituais
Centro da Paz e
Museu Arqueológico
e, ao lado, pormenor
de um mercado
posteriores (séc. XV e XIX) nos tectos. Muitas das
colunas têm gravadas inscrições dos Cruzados e
a maior parte fazia parte da igreja primitiva do
tempo de Constantino. A igreja conserva,
também, mosaicos do início do séc. XII.
O acesso à gruta faz-se por uma escada numa
zona lateral do altar. Lá dentro estão assinalados
o lugar exacto onde Cristo terá nascido e,
também, o sítio onde foi depositada a manjedoura. Sobre a estrela que assinala o sítio do nascimento pendem quinze lamparinas, seis gregas,
cinco arménias e quatro católicas. A gruta da
Natividade é um dos espaços principais das celebrações natalícias cristãs.
Uma noite branca
As celebrações de Natal constituem, naturalmente, o momento mais importante das celebrações
religiosas cristãs em Belém, motivando, portanto,
um maior afluxo de peregrinos, estrangeiros e,
sobretudo, da comunidade cristã da Cisjordânia.
Nos últimos anos, a Autoridade Palestiniana tem
apostado na criação de condições para incrementar o turismo religioso na cidade, uma das principais fontes de rendimento da autarquia.
Informações úteis
Centro de Informação Cristã de Jerusalém: (Christian Information
Centre), Praça Omar Ibn el Khattab, Jaffa Gate, POB 14308, Jerusalem
91142 e-mail: [email protected]; Telef: 02 627-2692; Fax: 02 628-6417.
Posto de Turismo de Belém: Praça da Manjedoura, telef. 972 2 274
1322/3/4; Fax: 972 2 274 1327; e-mail: [email protected].
Na internet: http://www.bethlehem-city.org/
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As comemorações assumem diferentes colorações, de acordo com as várias igrejas em que se
expressa o cristianismo: católica, protestante, ortodoxa, etc., com múltiplas procissões e liturgias. As
principais celebrações protestantes realizam-se no
Campo dos Pastores, mas a grande maioria das
procissões ocupa a Praça da Manjedoura. Os serviços religiosos católicos realizam-se na igreja de
Santa Catarina, um templo fransciscano edificado
no século XV que incorporou elementos de uma
capela do tempo das Cruzadas.
Com poucas variações, as celebrações católicas iniciam-se normalmente no dia 24 de
Dezembro com uma recepção do Patriarca Latino
de Jerusalém no túmulo de Raquel e na igreja de
Santa Catarina. Durante a tarde há uma procissão
entre Santa Catarina e a Gruta da Natividade. A
igreja de Santa Catarina abre as portas aos peregrinos por volta das 22h00 (é necessário obter
previamente senhas de entrada).
À meia noite realiza-se a Missa do Galo, que
tem contado com a presença de altos dirigentes
da Autoridade Palestiniana, como Mahmoud
Abbas ou Yasser Arafat, e na Gruta da Natividade inicia-se um ciclo de missas que se prolonga madrugada dentro, até quase ao amanhecer.
Por volta das duas da manhã há outra procissão
de Santa Catarina para a Gruta. No manhã do dia
segue-se uma missa solene na igreja de Santa
Catarina e durante a tarde tem lugar uma peregrinação até ao Campo dos Pastores. Elias, o
comerciante árabe da rua que desce para o muro,
vai estar lá, como sempre acontece todos os
anos. n
Humberto Lopes (texto e fotos)
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Artesanato
A inspiração duriense
de Mestre Fandino
Alexandre Fandino, um artista que se inspira nas terras durienses para criar
peças criativas e originais com o barro vermelho, tem este mês algumas das
suas obras expostas no Hotel Lamego com trabalho ao vivo. A arte deste
mestre de olaria figurativa seduz quem aprecia a beleza e a cultura do
Douro.
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“
minha natureza é muito caprichosa, e superficial: para ter
cores, estilo, ideias, preciso de
um meio que me sacuda, que me
excite, que me espiritualize.”
Esta frase pertence a Guerra Junqueiro, um dos
grandes escritores portugueses inspirados pelo
Douro. O rio, as paisagens, as serras fazem parte
da identidade das terras durienses que muitos
outros autores, tais como Aquilino Ribeiro, Eça
de Queiroz, Miguel Torga imortalizaram nas suas
obras.
A beleza da geografia convida a criar arte. Seja
por palavras, pinturas ou figuras. Alexandre
Fandino, mestre em olaria figurativa, em Lamego,
molda com as suas mãos obras que nos dão um
sentido de pertença. Nas suas peças está representada a nossa cultura vitivinícola nas situações
mais inusitadas. Imagine a Sagrada Família a
A
Casal Presidencial aprecia as peças de Mestre Fandino
navegar numa embarcação do Douro ou um presépio, encimado por S. Francisco de Assis, onde o
Deus Menino, ao invés de estar em palhas deitado,
tem a leveza macia das parras da videira.
Muita parra e pouca uva é um ditado que não
se aplica à obra suculenta do mestre Fandino. O
oleiro garante que com o barro tenta fazer tudo
“até onde possa desafiar a imaginação”. A arte
sacra tem um lugar de excelência na sua obra.
Explica que esta opção se relaciona com a fé que
as pessoas, em geral, buscam: “A arte religiosa
tem uma presença ímpar na região onde vivo e
trabalho.” Em cada peça integra os elementos do
Douro, que são já a sua imagem de marca: “Quero
que todas as minhas obras tenham uma
‘impressão digital’ comum e sejam reconhecidas,
e, por isso mesmo, nada melhor que integrar os
símbolos da minha região”, afirma com orgulho.
Talvez por isso a peça que mais gostou de criar foi
a fuga do Egipto para o Douro, porque “o Douro é
acolhedor para com os forasteiros”.
Nas terras durienses há lugares e paisagens
que ajudam a estimular a criatividade. “O Douro,
majestoso e imponente, está sempre nas minhas
criações”, acentua o artista. Para Alexandre
Fandino, o barro vermelho é um prolongamento
de si próprio que o ajuda a pensar e a criar as suas
obras inspiradas numa das zonas mais belas de
Portugal. “O barro faz parte de mim… e com ele
pretendo actuar continuadamente, numa perspectiva cultural, criativa e inovadora”.
Das suas mãos já saíram centenas de obras,
que pertencem a várias entidades públicas e privadas, quer no nosso país quer no estrangeiro.
Maria Cavaco Silva, o prémio Nobel da Paz, D.
Ximenes Belo, o maestro Vitorino de Almeida e
Mariza são algumas das muitas figuras públicas
que adquiriram as suas peças.
Este Natal, mestre Fandino vai continuar a trabalhar nos presépios e promete novidades:
“Variedades incontornáveis do Menino do Douro,
enfeites de Natal para as decorações de árvores,
entre outras.” Para coleccionadores está a preparar algumas novidades como a Rainha Santa
Isabel do Douro, Nossa Senhora do Ó do Douro,
Santa Teresinha do Douro, Pietà do Douro, São
Francisco de Assis do Douro, “sem esquecer uma
grande variedade de Cristos, as cruzes alusivas
ao Douro e os Caretos de Lazarim”.
É curioso observar na sua obra os rostos indeDEZ 2010 |
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Artesanato
finidos. Quem adquire uma das suas peças tem
de fazer o trabalho de imaginar as expressões pertencentes a cada uma das figuras: “Deixo ao critério de cada pessoa apreciar a obra e a idealização
de cada rosto”, explica.
Não raras vezes, Alexandre Fandino trabalha
ao vivo. O reboliço à sua volta, quando está numa
rua movimentada enquanto os transeuntes
olham curiosos, enche o mestre de regozijo por
ter a oportunidade de mostrar a sua arte.
“Quando trabalho na rua, o que acontece quando
participo em feiras de artesanato, as pessoas
observam como nasce uma peça de barro do
nada. Gosto de ver a satisfação das pessoas ao
presenciarem o meu trabalho”, confessa. Mas a
maioria das peças é produzida na intimidade do
seu pequeno, mas acolhedor ateliê. É ali que
acontece o milagre de quem cria e vê a sua obra
nascer depois de um trabalho minucioso que
«aspira a seduzir quem a vê».
Depois, tal como acontece com os filhos, as
suas obras ganham asas e partem para outros
lugares para ver mundo e deixam de lhe pertencer.
Razão tinha o artista norte-americano John
Baldessari quando dizia que “a arte é a melhor
forma de perceber o mundo”. n
Sílvia Júlio (texto) Nany Cabral (fotos)
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De Angola a Lamego…
Alexandre Rodriges M. Lopes Fandino nasceu
em Angola, em 1959, mas é lamacense de
alma e coração. O gosto pelo barro nasceu
muito cedo na escola. Em 1998, obteve o
primeiro lugar ex-aequo no XIII Concurso de
Presépios realizado pela Associação de
Artesãos de Lisboa. Dez anos depois recebeu
o Prémio Anim’Arte 2008 Produção Artística
Escultura.
A arte sacra tem primazia na sua obra, mas
também faz figuras típicas regionais, como
Caretos. Dele se diz que é ícone da olaria
figurativa e mestre da escultura. É
habitualmente convidado para ir a escolas
transmitir os seus conhecimentos aos mais
novos e despertar neles a mesma paixão pela
arte do barro.
Este mês, os trabalhos estão expostos no
Hotel Lamego com trabalho ao vivo. A partir
do dia 13, as suas obras poderão ser vistas
no Posto de Turismo de Braga.
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Memória
METRO
Mais Estrelas que no Céu
Mais estrelas que no céu, eis o slogan adoptado pelos estúdios da Metro, a tal que tinha
como mascote um leão a rugir no écran. Já lá vai o tempo em que um filme valia ou era
sucesso pelo nome das estrelas que o protagonizavam. E o grande culpado daquilo a que se
chamou de «Star System» foi um homem chamado Louis B. Mayer, o patrão da Metro
Goldwyn Pictures, nascida em 1924.
A
fábrica de sonhos criada por este americano
confundia-se com o pequeno bairro chamado Hollywood (madeira de azevinho) que
muitos transformaram em meca do cinema.
Fábrica de sonhos de onde sairiam nomes
famosos como Mickey Rooney, Deborah Kerr, Elizabeth
Taylor, Spencer Tracy, Clark Gable ou Gene Kelly. E, claro, a
maior de todas, Greta Gustafson, rapidamente transformada
em Greta Garbo. Dos estúdios da Metro saíram, durante
anos, os melhores musicais e filmes tipicamente americanos, género «o rapaz bonzinho que se apaixona pela rapariga mais bonita do lugar». Talvez por isso e pelo sucesso das
suas fitas, os críticos de serviço não gostavam da Metro. Mas
a razão estava do lado de Mayer e de, por exemplo, o realizador Vincente Minnelli que disse um dia: «o objectivo do
cinema é acrescentar um pouco de magia às nossas vidas».
Ir ao cinema ver as estrelas
Quando hoje vemos o êxito de revistas cor de rosa que alimentam os leitores com segredos e mentiras, tricas e inventonas das vedetas do nosso triste a apagado mundo artístico, não nos espanta que os estúdios de cinema como a
Metro inventassem paixões assolapadas, traições e amores
para sempre, bodas e divórcios, enfim, uma vida de mentira, superficial mas sempre fascinante, de molde a manter o
público cinéfilo atento ao que se passava naquele reino de
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fantasia chamado Hollywood- Era preciso alimentar a
curiosidade dos cinéfilos. Ontem e hoje tudo no melhor dos
mundos.
Na Metro nada era deixado ao acaso. O «dono» dos estúdios era, ao mesmo tempo, «dono» das vedetas. Era ele que
dizia que as divas, as estrelas não nascem estrelas.
Constroem-se, fabricam-se como foi, por exemplo, o caso de
Greta Garbo. Louis B. Mayer conheceu Greta na Europa e
ficou logo apaixonado por aquele rosto fascinante.
Aconselhou-a a perder peso e em pouco tempo aquela
sueca angulosa transformou-se na diva mais famosa de
Hollywood.
Mulheres e homens que tentavam entrar no mundo
maravilhoso do cinema passavam pelo crivo de Mayer e, se
tinham um palminho de cara, um corpo curvilíneo, um físico atlético, eram aceites e logo sujeitos a uma espécie de
lavagem ao cérebro que os ligavam, anos a fio, aos grandes
estúdios da Metro.
Uma cidade do glamour
Estrelas «fabricadas» na Metro fazem hoje parte da grande
história do cinema. Clark Gable, Ava Gardner, Jean Harlow,
Heddy Lamarr, Joan Crawford, Robert Taylor, Esther
Williams, Elizabeth Taylor, John Wayne,Spencer Tracy,
entre muitos outros, foram presença quase diária na cidade
construida por Louis B. Mayer, 195 edificios, entre escritó-
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Ava Gardner, considerada “o mais belo animal do mundo” foi estrela da
Metro. Em baixo, Greta Garbo, a “Marie Waleska” de Charles Boyer
Elizabeth Taylor, a mais mimada estrela do patrão da Metro. Em baixo,
Lana Turner, vedeta “encontrada” num bar e logo transformada em estrela
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Memória
rios, oficinas , comissariado, laboratórios, estúdios e um
sem número de departamentos onde tudo trabalhava para
o êxito dos filmes.
Os seus estúdios eram os maiores do mundo com cenários permanentes e pessoal que mantinha a cidade, noite e
dia, pronta para o que fosse preciso. Telefonistas, seguranças, motoristas, costureiras, carpinteiros, floristas, sapateiros, milhares de homens e mulheres a trabalharem para
a fábrica de sonhos que tornou famoso o nome de
Hollywood.
Conta-se que foi a Metro, ou melhor Louis B. Mayer, a
escolher o primeiro namorado de Elizabeth Taylor, tinha ela
16 anos. Era um jovem herdeiro do proprietário da cadeia de
hotéis Hilton e a participação da produtora foi tão longe que
os noivos casaram numa festa deslumbrante seguida de luade-mel na Europa, tudo a expensas da Metro. O vestido de
Liz Taylor levou dois meses de trabalho, ocupou quinze costureiras, era de cetim branco bordado a pérolas e vidrilhos,
com cauda de 13 metros de cetim e véu de tule de seda.
Como a Metro não deixava nada ao acaso, lançou ao
mesmo tempo um filme chamado «O Pai da Noiva».
Milhares de dólares nos cofres da Metro
Cada filme que saía dos estúdios era um risco para os
patrões da Metro mas os milhares de dólares que entravam,
logo a seguir à estreia, eram um estímulo para mais e maiores fortunas gastas na produção de filmes grandiosos como
por exemplo «Ben-Hur», «Uma Noite na Ópera» ou «O
Feiticeiro de Oz».
E, na rectaguarda, sempre o patrão Louis B. Mayer que
zelava por aquilo a que se convencionou chamar de «estilo
MGM»: «grandes planos suaves, as rugas das damas habilmente dissimuladas pela maquilhagem, penteados refulgentes, sorrisos lânguidos, dentes muito brancos», como
escreveu um crítico inglês Paul Mayersberg.
A constelação de estrelas de que já falámos atrás continuava a aumentar. E tanto podia ser uma actriz ou actor vindos do teatro como uma vedetinha descoberta num bar
como foi o caso da loiríssima Lana Turner.
Antes de se transformarem em estrelas os actores e actrizes recebiam lições de interpretação, de dança, de esgrima,
de equitação. O estúdio tratava de tudo, da vida profissional, da publicidade, das festas onde deviam ir, como
deviam vestir-se e até resolver algum escândalo em que se
tivessem metido.
O rugir do leão acompanhava a frase «Art Gratia Artis» (a
arte pela arte). O leão rugia desde 1924 e rugiu por muitos
e bons anos, «acrescentando um pouco de magia às nossas
vidas». Que mais havíamos de querer? n
Maria João Duarte
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As telefonistas
atendiam mais de
250 mil chamadas
por mês enquanto
mais de 70 oficiais e
seguranças
patrulhavam a cidade
da Metro. Ao lado, o
departamento de
sapataria e, em baixo,
as oficinas onde se
costurava tudo o que
era pedido dos
estúdios
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Olho Vivo
Comer de estufa
Bifes de
Neandertal
Cada espanhol contribui com duas toneladas de
CO2 por ano, para o efeito de estufa, só pelo
simples facto de comer. Um estudo da
Universidade de Almeria confirma ainda que os
excrementos humanos contribuem para a
poluição da água, especialmente em azoto e
fósforo, fornecendo nutrientes para o
crescimento de algas e uma diminuição dos
níveis de oxigénio nos oceanos. Cada
espanhol comeu em média 881 quilos de
alimentos durante o ano de 2005, mas a
agricultura e a criação de gado, mais do que
a digestão de tortilhas e melocotones, são
responsáveis pelas emissões de CO2
estudadas.
Os primeiros humanos
caçaram e comeram
homens de Neandertal, há
28 ou 30 mil anos. Em Les
Rois, no sudoeste de
França, arqueólogos
encontraram restos
cuidadosamente
descarnados de uma
criança neandertal e ossos
com marcas de
instrumentos de corte
usados pela cultura local
de Homo Sapiens. Esta é a
primeira prova biológica
da coexistência (pouco
pacífica) daqueles
hominídeos e do homem
moderno.
Tetris faz bem ao cérebro
Exames ao cérebro por ressonância magnética
mostraram que 26 raparigas que jogaram Tetris
meia hora por dia durante três meses viram a
sua matéria cinzenta aumentada, em certas
áreas do cérebro, ao contrário das colegas de
um grupo de controlo que não jogaram no
computador. O estudo foi publicado pela revista
BMC Research Notes e foi feito por uma equipa
de cientistas de Albuquerque, no Novo México.
Apaga a luz e emagrece
Ratos de laboratório expostos a uma luz ténue durante a noite ao longo de
oito semanas ganharam mais peso, 50% mais, do que outros ratinhos
sujeitos a um regime normal de luz do dia e
escuro de noite. Investigadores da
Universidade Estadual do Ohio, EUA,
verificaram este efeito da luz no
metabolismo. A luz durante a noite levava
os animais a comer fora de horas. Não
comiam mais do que os colegas, mas,
ao fim da experiência, os ratos com luz
de noite estavam mais gordos 12
gramas, contra oito dos que puderam
dormir às escuras.
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Mal empregados
Mais vale desempregado
que mal empregado, diz
um estudo da
Universidade Nacional
Australiana, publicado na
revista de saúde pública
BMC. Já se sabia que um
mau emprego faz qualquer
um infeliz, mas agora
provou-se que isso é pior
para a saúde mental do
que estar desempregado.
Os cientistas definiram
mau emprego como um
posto precário, com uma
carga de trabalho irrealista
e sem perspectivas de
futuro. O estudo incidiu
sobre 4 mil moradores de
Camberra e demorou
quatro anos.
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A n t ó n i o C o s t a S a n t o s ( t ex t o s ) A n d r é L e t r i a ( i l u s t r a ç õ e s )
Há um macaco novo
Uma equipa internacional de primatólogos
descobriu uma nova espécie de macaco no norte
da Birmânia e chamou-lhe Rhinopithecus
Strykeri. Os habitantes dos contrafortes do
Himalaia, porém, chamam-lhe nwoah mey,
que significa “cara metida para dentro”. Não é
um macaco bonito, portanto, mas tem pêlo negro,
com tufos brancos nas orelhas, no queixo e na base
da cauda que é bastante longa. O rosto é que estraga
tudo, côncavo e sem nariz. Por isto também, o macaco é fácil de capturar
quando chove, porque se senta com a cabeça entre as pernas para não criar
uma poça de água na cara.
Beba sumo de nabo
Uma dose diária de sumo de nabo aumenta o fluxo
sanguíneo no cérebro dos idosos e é um potencial
adversário da demência senil, segundo mostrou uma
experiência da Universidade de Wake Forest, dos
Estados Unidos. Já se sabia que o nabo reduz a tensão
arterial, mas agora provou-se que aumenta o volume de
sangue no cérebro, com a sua alta concentração em
nitratos. E o processo é rápido. Os cientistas deram o
sumo durante quatro dias a 14 idosos e verificaram que
o fluxo de sangue nos lóbulos frontais (áreas cuja
degenerescência conduz à demência e outras doenças
cognitivas) aumenta imediatamente. Resta agora criar
uma bebida de nabo que não seja desagradável ao
paladar.
O dedo primeiro
Investigadores da Universidade Vanderbilt, nos
Estados Unidos descobriram que o cérebro usa
dois sistemas diferentes para detectar erros. O
estudo publicado na Science envolveu 22
experientes dactilógrafos e revelou que as mãos
sabem quando se cometeu um erro, antes de o
cérebro ter consciência disso. Sempre que
cometiam um erro, a velocidade do dedo
abrandava instantaneamente, antes de o
cérebro dar ordem de correcção. Os cientistas
pensam que este sistema de detecção de erros
também ocorre, por exemplo, nos
instrumentistas musicais.
Paladar
nos pulmões
Cientistas da Universidade de
Maryland descobriram nos
pulmões receptores para
sabores amargos como existem
na língua. Esta descoberta
poderá transformar, por
exemplo, os tratamentos da
asma. Estimulando os
receptores em pulmões de
ratinhos com asma, os
investigadores conseguiram
diminuir a obstrução das vias
aéreas dos roedores. A
experiência surpreendeu os
médicos que julgavam que as
substâncias amargas
apertavam as vias
respiratórias, em vez de as
distender.
O futuro
dos abusos
Um estudo australiano
publicado em Novembro nos
Anais de Psiquiatria Geral
sugere que as crianças que
são abusadas sexualmente
têm um risco maior de
desenvolverem uma
esquizofrenia em adultas.
Estudos prévios ligavam já os
abusos na infância à
depressão, toxicodependência
e comportamentos suicidas. O
mecanismo de causa-efeito,
contudo, ainda não está
esclarecido, dizem os médicos
da Universidade Monash, de
Victória, na Austrália, que
analisaram os casos de 2759
pessoas abusadas em
crianças.
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A Casa na árvore
Susana Neves
Rainha com pés de elefante
Alta, elegante, perigosa, a faia é uma
árvore dominadora que gosta de
jacintos, livros e tamancos.
N
uma canção popular da Beira Baixa,
um apaixonado chama “Maria Faia” a
uma mulher cujo nome na realidade
desconhece: “Eu não sei como te chamas/ Oh Maria Faia/ Nem que nome te hei de eu
pôr/ Oh Maria Faia oh Faia Maria/ Cravo não que
tu és rosa/ Oh Maria Faia/ Rosa não que tu és flor...”
Imortalizada pela voz de Zeca Afonso, a letra
desta canção de amor elogia a beleza feminina,
opondo-se por isso à conotação pejorativa que a
palavra “faia”, por vezes, adquire quando se diz
de um homem é “um faia”, no sentido de ser
“janota”, “peralta” e “boémio fadista”.
Estes significados da palavra “faia”, comummente usada para designar aquela que é a
“Rainha do Bosque” (“Fagus Sylvatica L.”), árvore consorte do carvalho, revelam a forma pela
qual aparece no imaginário popular português:
elegante e bem vestida, para contemplar mas não
para comer.
E no entanto, o fruto da faia (glande), muito
saboroso apesar da toxicidade e adstringência da
casca, é um dos mais cobiçados por várias espécies de pássaros, ratos, veados e porcos.
Frutificando de forma irregular, nos anos em que
os bosques de faia deram grande abundância de
glande há notícia de ter havido em França verdadeiros movimentos migratórios de animais que a
procuravam “com furor”. Até ao século XIX, os
camponeses franceses também apanhavam este
fruto, não tanto para o comer — forte era a probabilidade de desenvolverem uma dor de cabeça
ou uma “embriaguez furiosa” — mas com o
objectivo de produzirem combustível para iluminação, e azeite destinado à culinária (com 50 quilos de glande produzia-se 10 litros de azeite).
Desta vocação comestível da faia, expressa no
vocábulo grego “phagos” que significa “comer”,
não achamos notícia em Portugal, mas a canção
“Maria Faia” evoca longinquamente a memória
Fotos: Susana Neves
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de outras funções e ritos que esta “Fagaceae” (da
mesma família do castanheiro e do carvalho)
cumpriu no passado. Era ela, desde a época
romana, a árvore dos desejos: no chão, enterravam-se pedaços de madeira com a descrição de
um desejo; no tronco, os amantes inscreviam os
seus nomes para verem o seu amor perpetuado.
Escreve Ovídio, poeta romano, autor de
“Metamorfoses”: «As faias leais guardiães da tua
chama/Carregam nos seus troncos feridos o nome
de Cenone/E assim como os troncos crescem
assim hão-de crescer as letras”.
Árvore da memória e da escrita — as primeiras inscrições rúnicas teriam sido feitas em
madeira de faia — a conexão entre faia e livro,
desaparecida na nossa língua, é porém evidente
nas línguas inglesa e alemã. Em inglês e em
alemão, as palavras faia (“beech” e “buche”) e
livro (“book” e “buch”) são parecidas porque
derivam de um vocábulo comum “bok”.
Árvore da memória da própria espécie, por ser
capaz de se auto-clonar, reproduzindo-se sozinha
através da raiz, caso não haja outras faias nas
redondezas, a faia europeia (não autóctone em
Portugal) resiste desde o neolítico e ganhou má
reputação por ser dominadora, impedindo outras
plantas e árvores de coexistirem no mesmo bosque.
Se a sombra da sua copa harmoniosa impede
muitas outras espécies de medrarem, junto aos
seus pés de gigante (pode atingir 40 metros de
altura), contrastando com o cinzento do tronco
semelhante à cor da pele de um elefante, nasce
na Primavera uma das mais belas, frágeis e inspiradoras flores silvestres: o jacinto dos bosques
(“Hyacinthoides non-scripta”) lilás. A sua floração cria um verdadeiro tapete de fadas que
entre os britânicos, desde 1981, é delito estragar
ou arrancar.
Espécie sagrada entre os celtas (quem nasce
no dia 22 de Dezembro está sob o seu domínio),
associada à prosperidade assente no conhecimento, as faias serviram durante vários séculos
para a confecção de tamancos de madeira. À
sombra das suas folhas dispostas em “mosaico”,
iluminadas no Outono numa diversidade de tons
que vão do amarelo ao vermelho, viviam e tra-
balhavam inúmeros artesãos até outra ser a forma
de calçar.
Na floresta da Brocelândia (Bretanha), onde
Merlin, o Mago, se refugiou, ainda vive uma dessas faias centenárias. Segundo as lendas celtas,
teria sido plantada por desejo divino. Um cavaleiro chamado Pontus queria ter um filho da sua
amada Sidónia e pediu ajuda a Deus e ao Diabo.
Deus não lhe respondeu logo, mas o Diabo foi
rápido e pouco tempo depois nasceu um monstro
peludo. Mal tinha saído do ventre materno já o
recém-nascido dava um salto para se empoleirar
em cima de um grande armário. «Mau sinal!»,
alertou a parteira. Uma forte tempestade destruiu
o castelo onde vivia Pontus e em seu lugar nasceu
uma faia. n
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CONSUMO Em época de Natal, vale a pena reflectir sobre os excessos nas
embalagens dos presentes. Pág. 52 l À MESA A refeição da Consoada é, entre
nós, a grande festa da família, mas nem sempre foi assim… Pág. 54 l LIVRO
ABERTO A celebração do centenário da República conduziu à edição de
interessantes obras ensaísticas e de ficção. Pág. 56 l ARTES A exposição
Utopias Urbanas, homenageam da autarquia de Cascais a Nadir Afonso
por ocasião do seu 90º aniversário, foi prolongada até 9 de Janeiro. Pág. 58 l
MÚSICAS Os regressos de Bryan Ferry com um novo álbum – “Olympia”
– e de Norah Jones com uma colectânea de duetos “…Featuring Norah
Jones”. Pág. 60 l NO PALCO “O Senhor Puntila e o seu criado Matti”, de
Bertolt Brecht, está em cena no Teatro Aberto até Janeiro. Pág. 62 l CINEMA
EM CASA Em destaque, quatro sugestões para os
mais jovens: Toy Story 3, Karate Kid, Príncipe da
Pérsia: as Areias do Tempo e a comédia Juventude
em Revolta. Pág. 64 lGRANDE ECRÃ Celebrizado com
“Belleville Rendez-Vous”, Sylvain Chomet volta a
dar provas do seu talento com “L’Illusionniste” (“O Mágico”). Pág. 65 l
TEMPO INFORMÁTICO Várias sugestões de acessórios úteis, como é o
caso do primeiro medidor de glicemia Plug&Play com software de Gestão
da Diabetes lançado pela Bayer. Pág. 66 l VOLANTE A Renault quer
democratizar o veículo eléctrico, propondo uma gama completa de
veículos “Renault Z.E.” Pág. 67 l SAÚDE Alguns conselhos para evitar as
intoxicações alimentares, tão frequentes e que causam tanto transtorno na
época natalícia. Pág. 68 l PALAVRAS DA LEI Todas as pessoas acima dos 65
anos com um contrato de arrendamento podem ver a sua renda
aumentada, mas de modo faseado, ao longo de 10 anos. Pág. 69
l
BOAVIDA
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Boavida|Consumo
Embalagem rima com imagem
Para além de um efeito persuasivo sobre o consumidor, algumas embalagens têm impactos nocivos
sobre o ambiente. Em época de Natal, vale a pena pensar um pouco sobre isso, antes de embalar os
presentes.
Carlos Barbosa de Oliveira
eixa-me seduzir-te!” parecem dizer as
embalagens nos escaparates, quando percorremos as artérias de um hipermercado
ou de um centro comercial. Latas de
bolachas, pacotes de leite, frascos de perfume, garrafas de
refrigerantes, caixas de bombons e uma parafernália de
produtos tentam seduzir-nos através das suas roupagens,
utilizadas como estratégia de marketing para atrair a
atenção dos consumidores.
Quando optamos pela compra de um produto, nem
sempre nos apercebemos do poder que a embalagem tem
sobre a nossa escolha. No entanto, o seu efeito persuasivo
não é inócuo, como o testemunha o facto de existirem
revistas especializadas sobre embalagens, feiras,
exposições e outros certames para a promover e ter sido
criado, nos anos 90, um curso de pós-graduação em
embalagens com a duração de três anos.
Para os mais cépticos, sobre o poder da embalagem nas
nossas escolhas, lembro uma experiência realizada nos
anos 30 do século passado (a primeira que conheço no
género). Uma bebida, em duas embalagens diferentes, foi
apresentada a um grupo de consumidores, omitindo-se,
porém que o conteúdo era exactamente o mesmo. Uma
das embalagens tinha círculos e a outra triângulos e pediase aos consumidores para escolher uma e justificar a
opção. A maioria dos consumidores escolheu a embalagem com círculos, alegando que “parecia conter um produto com mais qualidade”. Quando provaram o conteúdo
de ambas as embalagens, só 2% dos inquiridos acharam
que, afinal (?), a bebida da garrafa embalada numa embalagem com círculos, era pior! Os restantes mantiveram a
sua opinião inicial.
A embalagem é um vendedor incansável e
omnipresente aos nossos olhos, um manipulador silencioso que nos “ajuda” a optar por determinado dentífrico, sabonete, ou marca de vinho, quando a nossa
escolha não está previamente feita em função da publicidade ou de um qualquer desígnio afectivo ou consuetudinário. Algumas embalagens tornaram-se famosas e
destacam-se facilmente do conjunto de mais de 10 mil
“
52
D
TempoLivre
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que observamos em pouco mais de uma hora que
demoramos a percorrer os corredores de um hipermercado. É o caso, por exemplo, das sopas Campbell’s, das
velhas garrafas de Coca Cola e Pepsi, do atum Bom
Petisco, do ketchup Heinz, ou dos cigarros Marlboro.
Entre estas, há mesmo o caso do frasco de ketchup da
Heinz, cujas dimensões obrigaram, em tempos, a “normalizar” as dimensões das prateleiras dos frigoríficos em
metade do mundo.
No entanto, apesar deste efeito de sedução, as embalagens são, geralmente, um dos maiores inimigos do ambiente. Haveria muito a dizer sobre os “truques” utilizados
na embalagem para seduzir os consumidores mas, por
agora, interessa responder à pergunta: porque razão é a
ANDRÉ LETRIA
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embalagem inimiga do ambiente?
Cada português produz, anualmente, mais de 400 quilos de lixo, sendo que mais de metade é constituído por
embalagens. São sacos de plástico, o papel que embrulha
o fiambre, as embalagens de esferovite da carne ou peixe
pré-embalados, os pacotes de leite e sumos, a lata do
refrigerante ou da conserva, a pizza, o hambúrguer, a
refeição pré-cozinhada e pré-embalada, os papéis de
embrulho com que alindamos os presentes, enfim, uma
vasta parafernália de desperdício.
A embalagem não é, porém, apenas poluente como produto final, isto é, no momento em que nos desfazemos
dela. Antes de aparecer nos escaparates e a recolhermos,
para durante algum tempo a albergarmos em nossas casas
e depois nos despedirmos dela junto ao caixote do lixo, já
a embalagem provocou danos apreciáveis.
O seu impacte ambiental começa na exploração das
matérias-primas como o petróleo ou o ferro, as florestas
que se abatem ou as jazidas a céu aberto e a energia que se
consome na sua produção.
Depois de utilizada e se tornar imprestável, a embalagem atirada para o lixo vai libertar substâncias tóxicas
que vão infiltrar-se nos lençóis freáticos e poluir as reservas de água potável.
Cada um de nós pode contribuir para a redução do
impacte ambiental provocado pelas embalagens. Como? É
fácil…Reduzindo o consumo de muitas destas embalagens
e optando por embalagens reutilizáveis. Comprando líquidos em recipientes de vidro (material reciclável) em detrimento de embalagens de plástico; eliminando os sacos de
plástico quando vamos ao supermercado, à farmácia, à
livraria, etc.; tendo atenção às características da embalagem. Quer quanto ao material de que é feito, quer quanto às suas dimensões.
Quando compramos determinados produtos (especialmente detergentes, bebidas, perfumes e cosméticos) vale a
pena prestar atenção ao facto de muitas das embalagens
serem de tamanho desproporcionado para o conteúdo,
sendo o seu único objectivo iludir os consumidores. Com
isso se desperdiçam matérias - primas e encarece o produto.
Uma recusa de compra desses produtos, ainda que por um
curto espaço de tempo, é uma forma eficaz de obrigar as
empresas a repensarem o embalamento dos seus produtos.
Felizmente, há cada vez mais empresas preocupadas
em acondicionar os seus produtos em embalagens sustentáveis (com menor impacte ambiental), porque uma
empresa que proclama a Responsabilidade Social e se promove como “amiga do ambiente”, não pode praticar o desperdício. Mas nem todas agem assim. Devemos denunciar
as empresas que, embora proclamem a RS, continuam a
utilizar a embalagem como imagem de venda do produto,
sem cuidar da sustentabilidade, e convencer os nossos
amigos a recusar os produtos de uma empresa que nos
mente.
Aproxima-se o Natal, época de desperdício por excelência. Reparem em vossas casas, quando termina a distribuição dos presentes, no amontoado de caixas, papéis,
plásticos ou esferovite que se acumulam na sala e
aproveitem para reflectir sobre tamanho desperdício. É
certo que embalagem rima com imagem e um presente
bem encadernado parece logo mais bonito, mas é importante que, neste mundo onde mais vale “parecê-lo” do que
“sê-lo”, demos o nosso contributo para mudar essa mentalidade. n
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Boavida|À Mesa
Comidas
festivas
do Natal
português
A refeição da Consoada é, entre nós, a
grande festa da família. Nem sempre foi
assim. É assim por o cristianismo ter
transformado as celebrações da Natureza
dos festejos do Solstício de Inverno em
momentos de grande partilha humana, nos
quais as artes da mesa desempenham um
papel de relevo.
David Lopes Ramos
o princípio, eram as festas do Solstício de
Inverno. A vitória da luz sobre a mais longa
noite do ano. As trevas dominavam tudo, estava-se a séculos da descoberta da electricidade,
só a lua era agente de claridade nas noites escuras e sem
nuvens. Reminiscência desses tempos é, sobretudo nas terras do interior português, a queima dos cepos de árvores
adultas que os jovens vão buscar aos campos, em acções
que conservam o carácter de rituais de iniciação. Nas
regiões de Trás-os-Montes, da Beira Interior e no Alentejo
é onde as fogueiras, acesas nos largos principais na noite
de 24 de Dezembro, perto das igrejas onde estão armados
os presépios, durante mais tempo se mantêm acesas. A
reunião das famílias à volta da lareira sai para a rua e
alarga-se a toda a comunidade. Em algumas terras até 6 de
Janeiro, Dia de Reis.
O Alentejo, por razões históricas a mais descristianiza-
N
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TempoLivre
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da das regiões portuguesas é, no entanto, aquela em que
as expressões de religiosidade popular alcançam mais alta
expressão. Por alturas do Natal, o cante ao Deus-Menino
nas “palhas deitado” anima terras transtaganas, havendo
ainda “presépios vivos” e a representação de autos do
Natal. O madeiro do Natal é aceso nas lareiras dos montes
e, em muitas terras, esta manifestação transfere-se para os
largos. É o caso de Barrancos, a vila de fronteira cujos
habitantes têm um linguajar próprio e tradições únicas.
Nos dias que antecedem as Festas, os rapazes vão aos
campos arranjar lenha para fazer o fogo no largo da vila.
Amontoam-se toneladas de raízes e de troncos de árvores e,
na noite da Consoada, acende-se “o lume”. Ritmado pelo
som cavo da zabumba – um cântaro de barro vermelho
com a boca tapada com pele seca de borrego, cabra ou bexiga de porco, travessa por uma cana —, canta-se ao Menino
nas “palhas deitado”, conversa-se, petisca-se, bebe-se o
vinho novo. A porta da igreja fica aberta, para que “o lume”
aqueça os pezinhos do Menino-Deus dos católicos.
ANDRÉ LETRIA
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Foi também a Igreja Católica que marcou a refeição da
noite da Consoada com um carácter particular, ao incluí-la
nos dias de jejum do Advento, com a consequente
proibição de ingestão de comidas “quentes”, como as
carnes, sendo apenas autorizadas as “frias”, ou seja, os
peixes e legumes. Daí o bacalhau e o polvo na Consoada
das famílias do Norte, Beira Interior e Centro, e, no Sul, o
cação, a pescada, e, mais recentemente, também o bacalhau, embora no Alentejo, na refeição que se segue à Missa
do galo, se prefira a carne de porco (“marra”), ou as
cabidelas de peru e de galo. Há algumas particularidades.
Os pescadores da Póvoa de Varzim, por exemplo, não dispensam o peixe seco, como o cação e o ruivo, entre outros,
na ceia da Consoada.
No Minho, sobretudo nas casas maia tradicionais, após
se consoar o bacalhau, polvo, ovos, couve penca ou couve
portuguesa ou “coivão”, grelos, batatas, cenouras, cebolas,
tudo cozido em água abundante e temperado com azeite
cru, ou com o “molho fervido”, de azeite e alhos, assiste-se
à Missa do galo. Só depois dela, em que se assinala o
nascimento de Jesus Cristo, é que se festeja com doces:
mexidos ou formigos, rabanas ou fatias de parida, arroz
doce, aletria, pão-de-ló ou pão leve, bolinhos de jerimu,
bilharacos... e o vinho quente, isto Entre-Douro-e-Minho
ou os melhores vinhos finos na região duriense.
Nessa noite, em algumas casas, o lugar da cabeceira da
mesa é reservado aos que já partiram e a mesa fica posta.
Isto porque os que já morreram não desdenham sentar-se à
mesa da Consoada. No Minho, o primeiro prato da
refeição festiva do Dia de Natal é a “roupa velha”, feita
com as sobras da Consoada, prato refrescado com um
golpe de vinagre. Depois, segundo as regiões e as tradições
de cada família, há o galo mais galaroz da capoeira, o
capão, o cabrito ou o anho, lombo de porco, leitão, pato,
ganso ou peru, em geral assados no forno.
Como se sabe, a comida festiva em terras marcadas pela
ruralidade, como é ainda o nosso caso, é a comezaina. De
Norte a Sul, no Continente e nas Regiões Autónomas da
Madeira (aos madeirenses basta-lhes a palavra “Festa” para
nomear todos os festejos – Consoada, Natal, Ano Novo e
Dia de Reis – deste tempo especial) e dos Açores a
abundância é o traço distintivo das refeições desta época.
E é a doçaria, de uma variedade riquíssima, que encerra as
refeições: rabanadas, velhoses, filhós, sopas secas doces,
sopa dourada, pão-de-ló (de Margaride, de Ovar, de
Arouca, de Alfeizerão...), bilharacos, bolinhos de jerimu,
formigos ou mexidos, fartes, espécies, migas doces, borrachos, bolo de mel, pudins, sonhos, aletria, arroz doce, leite
creme, bolo podre, broinhas e broas doces, bolo-rei,
merendeiras, azevias...
Já se falou do vinho quente que, no Minho, se bebe a
seguir à Missa do Galo. Nas ilhas bebem-se licores caseiros
e os generosos Madeira e Biscoitos e, no Continente, é
altura de se abrirem os melhores Portos datados (10, 20,
30, 40 e mais anos) e os Colheitas, os “vintage” já com barbas e os Moscatel de Setúbal adultos, os Roxos e a relíquia
que é o Bastardinho.
Num belíssimo texto evocativo da noite da Consoada
no Minho, escreveu Ramalho Ortigão, em “As Farpas”:
“Havia o arrastar das cadeiras, o tinir dos copos e dos
talheres, o desdobrar dos guardanapos, o fumegar da
terrina. Tomava-se o caldo, bebia-se o primeiro copo de
vinho, estava-se ombro com ombro, os pés de um lado
tocavam nos pés que tinham defronte. Bom aconchego!
Belo agasalho! As fisionomias tomavam uma expressão
de contentamento, de plenitude. Que diabo! Exigir mais
seria pedir muito. Tudo o que há de mais profundo no
coração do homem, o amor, a religião, a pátria, a
família, estava tudo aí reunido numa doce paz, não
opulenta, mas risonhamente remediada e satisfeita. Não
é tudo?” (...) n
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Boavida|Livro Aberto
Comemorar a República
e a paixão pelo Livro e pela Leitura
Em período de intensas e participadas comemorações do centenário da República, merece ser
sublinhada a quantidade de obras ensaísticas e de ficção dadas à estampa sobre o tema, com uma
qualidade média apreciável, o que significa que o espírito comemorativo tem tido uma expressão
invulgarmente dinâmica também no sector editorial.
José Jorge Letria
esse âmbito, destacamos “A Maçonaria e a
Implantação da República em Portugal”, de Pedro
Ramos Brandão e António Chaves Fidalgo (Casa
das Letras), uma obra de referência fundamental
para se compreender até que ponto o pensamento e a “praxis” maçónicas foram determinantes para o êxito do processo revolucionário que derrubou a monarquia e implantou a
República em Portugal, no dia 5 de Outubro de 1910.
Imbuída desse espírito comemorativo, Maria João
Seixas, actual directora da Cinemateca Nacional, publicou
“República das Mulheres” (Bertrand Editora), com o apoio
do Fundo Cultural da Sociedade Portuguesa de Autores,
obra na qual se juntam 14 entrevistas com nomes representativos de várias gerações e géneros da literatura portuguesa, de Maria Velho da Costa a Hélia Correia, passando por Lídia Jorge e Maria do Rosário Pedreira. Uma forma
feminina e diferente de manter presente o ideal republicano na sua vertente criadora.
N
OUTRO DESTAQUE vai para “Jan Karski” (Teorema), de
Yannick Haenel, Prémio Interaliado 2009, que relatava de
forma concisa e densa, numa narrativa exemplarmente
construída, a tentativa que um herói quase desconhecido
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realizou para tentar evitar que o Holocausto se transformasse na tragédia que foi e que mudou a história da
humanidade. Para ler e dar ler, sobretudo em tempo de
grandes incertezas na história do mundo e das relações
entre os Estados e os povos.
ANTÓNIO LOBO ANTUNES, um dos maiores escritores
mundiais da actualidade está de volta com “Sôbolos Rios
Que Vão” (D. Quixote), um dos seus livros menos extensos mais profundos e tocantes, por se assumir como uma
reflexão ficcional sobre os rios -percursos que cruzam as
novas vidas, convertendo-se em memórias, emoções e em
densa matéria ficcional. Como sempre, um livro a não
perder, por ser de quem é e por trazer sempre a garantia
de inovação e qualidade.
Confirmação de um grande talento narrativo é “As
Memórias Secretas” (D. Quixote), do ficcionista, dramaturgo e ensaísta Miguel Real, que, em tempo de
comemoração do centenário da República, constrói umas
soberbas memórias ficcionadas da última rainha de
Portugal, viúva de D. Carlos I e mãe de D. Manuel II. Um
livro em que realidade e ficção se cruzam de forma
admirável. Dois livros a não perder.
Realce, igualmente, para “A Especulação
Imobiliária”(Teorema), do italiano Ítalo Calvino, texto pelo
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qual o genial autor tinha uma especial e justificada
predilecção. Outra leitura obrigatória.
Ainda quanto a novidades a não perder em matéria de
ficção narrativa, um mais do que merecido destaque para
“Dama de Espadas - Crónica dos Loucos Amantes”, do jornalista e escritor Mário Zambujal, título de estreia da nova
editora Clube do Leitor, com direcção editorial de Cristina Ovídio, vinda da Oficina do
Livro, com uma breve passagem pela
Planeta. Um livro imaginativo, cheio de
ritmo e subtil humor, como sempre acontece na prosa de ficção de Mário Zambujal.
Destaque, igualmente, para o excelente
“Divórcio em Buda”(D.Quixote), do grande
escritor húngaro Sándor Márai, autor, entre
outros, de “As Velas Ardem Até ao Fim”; “A
Identidade”(D.Quixote), do checo naturalizado
francês Milan Kundera, com uma exemplar
tradução de Pedro Tamen; “O Coleccionador de
Chuva” (Europa-América), de Júlia Stuart; “O Navio dos
Homens”, (Clube do Autor), do notável escritor japonês Takiji
Kobayashi, cuja descoberta pelos leitores portugueses é absolutamente obrigatória; e, ainda, “Um Pai de Filme”,
(Teorema), do consagrador escritor chileno António
Skármeta, autor, entre outros, de “o Carteiro de Pablo
Neruda”, adaptado com enorme êxito ao cinema.
EM ÉPOCA NATALÍCIA, saúdem-se algumas oportunas re-
edições de diversos géneros, começando por “O
Meu Dicionário Filosófico”(D. Quixote), de
Fernando Savater, passando pelo segundo volume autobiográfico do chileno Pablo Neruda, de
“Nasci para Nascer” (P. Europa-América), por
uma das obras-primas do judeu italiano Primo
Levi, “A Trégua” (Teorema), sobre os dias, semanas e meses que se seguiram à libertação dos
prisioneiros dos campos de concentração nazis,
obra pujante e comovente, e por “Os Contos da
Sétima Esfera” ( Caminho/Leya), de Mário de
Carvalho, um dos melhores ficcionistas portugueses contemporâneos. Livros a que vale sempre a pena
regressar, seja em que época for. n
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Boavida|Artes
Nadir Afonso: Rigor e Harmonia
A exposição Utopias Urbanas com que a Câmara Municipal de Cascais quis homenagear Nadir Afonso
por ocasião do seu 90º aniversário, planeada para encerrar ao público em Novembro passado,
acabou por ser prolongada até 9 de Janeiro próximo, devido à afluência desusada
e para atender os pedidos de diversas escolas.
Rodrigues Vaz
o seguimento de uma primeira exposição
antológica, igualmente no Centro Cultural de
Cascais, na Gandarinha, esta mostra ilustra à
saciedade o conceito deste peculiar artista português que procura sempre ligar a Matemática à Arte,
uma das razões por que a sua obra é marcada essencialmente pelo rigor visual e geométrico.
Num dos muitos textos teóricos que escreveu pode lerse um excerto esclarecedor do seu pensamento estético,
que, por vir a propósito, transcrevemos: "Três espécies de
relações estéticas unem sujeito e objecto: leis universais,
funções e necessidades. À primeira chamamos: harmonia relação imutável dada pelas leis geométricas universais. Às
segundas chamamos: perfeição - relação mutável dada
pelas funções e necessidades regionais. A partir daqui tudo
se esclarece. Se a obra de arte visa uma ordem interna que
atinja a universalidade, 'como a obra de um Deus criador',
a sua relação a nós só pode ser dada pelas leis universais."
N
TRÊS MULHERES ARTISTAS
Entretanto, nesta época natalícia, salientam-se em Lisboa
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Trabalho de Luisa Nogueira da série "Entre Bichos"
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três exposições de mulheres artistas, três propostas tão
díspares nos objectivos como nas formas, mas as três
eivadas do mesmo sentido de feminilidade que faz, antes
de mais, das suas obras objectos encantatórios a condizer
com o espírito da época.
Luisa Nogueira, quase a dizer adeus à Bélgica, onde
aprendeu a amar as brumas que tão bem sabe representar
esteticamente, mostra na Galeria Movimento Arte
Contemporânea a série "Entre Bichos", composições de
rara beleza visual, onde alia com mestria várias gradações
de cores provocando sensações de movimento sugerido
especialmente pela leveza e pela transparência diáfana
que lhes imprime.
Por sua vez, Brígida Machado mostra na Galeria Trema
os seus últimos bestiários, prosseguindo um percurso que
tem como fundo permanente um fascínio imparável por
animais reais e imaginários.
Lembrando por vezes alguns elementos do universo de
Paula Rego, mas nitidamente a partir de um registo muito
diferente que tem no humor o seu principal leit-motiv e
no aspecto lúdico a sua justificação essencial, Brígida
Machado está a conquistar perseverantemente um lugar
muito especial no universo dos nossos criadores.
Quanto a Helena Justino, com uma exposição de
pequeno formato na Galeria Stuart, até 11 de Janeiro,
regressa a um neo-figurativismo em que se sente como
peixe na água, exprimindo com a sensibilidade que lhe é
habitual a ternura pelas coisas simples e a preferência
pelas cores quentes e vivas, ao mesmo tempo com a liberdade e o rigor com que os seus professores na Escola
Superior de Belas Artes do Porto lhe souberam incutir: a
liberdade criativa do Júlio Resende e o rigor do desenho
de Lagoa Henriques.
RODRIGO COSTA NA GALERIA PAULA CABRAL
Entretanto, saúde-se o reaparecimento da Galeria Paula
Cabral, agora em plena Praça do Príncipe Real, em Lisboa,
num complexo integrando bar e livraria.
A exposição de abertura é do artista portuense Rodrigo
Costa, intitulada Landscapes, onde faz jus ao seu pendor
paisagista, em que é exímio executante.
Preferindo celebrar o Tempo, espaços e verdades que
não lhe mintam, Rodrigo Costa regressa inexoravelmente à
chamada Grande Pintura, que recria em grandes pinceladas
gestuais, próprias de quem está à vontade no ofício e arte.
E faz questão em esclarecer: "Permaneço onde sempre
estive, deste lado da história. Continuam a enlevar-me
alguns trechos de lugares e de gente, composições, ao
todo; o jogo sensual da luz e da sombras, mesmo que do
meu prazer pareça sobressair qualquer drama."n
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Boavida|Músicas
Do“Olympia” de Bryan Ferry
aos duetos de Norah Jones
Bryan Ferry está de regresso ao mercado discográfico com um novo álbum – “Olympia” – e Norah
Jones dá de si com uma colectânea de duetos intitulada “…Featuring Norah Jones”.
Registem-se também as participações de Nile Rodgers,
David Gilmour, Groove Armada, Scissor Sisters, Marcus
Miller, Flea, Mani e Jonny Greenwood.
De salientar, por fim, que “Olympia”, no qual se integra
um DVD, apresenta uma capa/brochura com um trabalho
gráfico notável. Como “cover girl”, surge-nos Kate Moss
fotografada por Adam Whitehead.
DUETOS DE NORAH JONES
Vítor Ribeiro
os 65 anos de idade, completados no passado mês
de Setembro, o cantor e
compositor inglês Bryan
Ferry apresenta ao mundo um novo
CD, com 10 temas (oito dos quais
originais).
Fundador, no início da década de 70
do século passado, dos Roxy Music,
grupo de referência da música por/rock
anglo-americana, Bryan Ferry praticamente desde sempre foi desenvolvendo
uma carreira paralela a solo, distinguindo-se não só como compositor e intérprete, mas também
como criador de versões de outros grandes autores da música
popular. Por exemplo, em 2007 editou o álbum “Dylanesque”,
com versões notáveis de canções de Bob Dylan.
Em “Olympia” sobressaem, mais uma vez, a arte e o
engenho de um compositor, intérprete e produtor que recusa a facilidade, observa os sinais dos tempos, contorna a
estagnação.
Para o novo CD Ferry recorreu à colaboração de “colegas”
dos Roxy Music, designadamente Brian Eno, Phil
Manzanera e Andy Mackay.
A
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“…Featuring Norah Jones” é o título genérico do álbum de
Norah Jones mais recentemente chegado ao mercado discográfico. Com mais de 40 milhões de discos vendidos em
todo o mundo, galardoada com vários grammys
e outras distinções,
Norah Jones, com pouco
mais de 31 anos de
idade, consegue dar-se
ao luxo de publicar um
CD com 18 duetos.
Intérprete, pianista e
compositora matricialmente marcada pelo
jazz, Norah revela nos
seus duetos um ecletismo invulgar, que lhe
possibilitou criar momentos inesquecíveis ao
lado de nomes como Foo
Fighters, Sean Bones, Willie Nelson, Dolly Parton…
Porem, a nossa chamada de atenção, sem menosprezo
pelos restantes seleccionadas para esta colectânea, vai para
dois momentos altos: os duetos com Herbie Hancock e
com Ray Charles.
HANCOCK EM PORTUGAL
E já que estamos a falar de Herbie Hancock, autor maior do
jazz mundial, recordamos que estará em Lisboa, dia 7 de
Dezembro, no Campo Pequeno, pelas 21h30 e no Porto, no
dia 8 de Dezembro, na Casa da Música, pelas 22h00. n
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Boavida|No Palco
Uma história de classes
Até Janeiro, no Teatro Aberto, com encenação de João Lourenço e interpretação de Miguel Guilherme,
entre mais 15 actores, podemos ver a história de “O Senhor Puntila e o seu criado Matti”.
Maria Mesquita
ertolt Brecht escreveu esta peça quando se
encontrava exilado na Finlândia durante a II
Guerra Mundial, inspirando-se nas histórias
locais, na música, bebida e tradição daquele
país de acolhimento, bem como num conto da autoria de
Hella Wuolijok. Assim, retrata-se a vida de Puntila, proprietário rural de algumas terras, de ascendência aristocrática, que se debate com a duplicidade em que o álcool,
neste caso, a bebida, vai transformando a sua personalidade. Quando ébrio é afável e ternurento, capaz de reconhecer a (sua) bondade e ser generoso para com os outros,
tendo como fiel ouvinte e companheiro o criado, Matti. No
B
entanto, enquanto sóbrio, tem a consciência da diferença
entre classes, não permitindo qualquer tipo de manifestação compreensiva para com os mais necessitados, tornando-se frio e cínico. É neste conflito interno em que a
peça se desenrola, principalmente quando essa dualidade
dentro do mesmo homem, deixa um rasto de admiração,
espanto e tristeza aos que o rodeiam, e, de igual forma,
também começa a deixar marcas na sua relação com a
filha, Eva.
Puntila bêbedo quer ver a filha casada com um homem
da mesma classe social, mas Eva sonha perdida de amor
por Matti, numa história que teria um final bem mais
feliz. Será Puntila capaz de ver mais do que a diferença de
classes? Ou será que apenas ganha consciência da sua
mortalidade e igualdade de valores com os outros quando
está embriagado…
FICHA TÉCNICA: Versão: João Lourenço, Vera San Payo de
Lemos; Dramaturgia: Vera San Payo de Lemos; Encenação e
realização vídeo: João Lourenço; Música: Mazgani; Cenário:
António Casimiro, João Lourenço; Figurinos: Bernardo
Monteiro; Coreografia: Cláudia Nóvoa; Supervisão audiovisual:
Aurélio Vasques; Luz: Melim Teixeira;
Com: António Pedro Lima, Cátia Ribeiro, Carlos Malvarez,
Cristóvão Campos, Francisco Pestana, João Fernandez, Luís
Barros, Mafalda Lencastre, Mafalda Luís de Castro, Marta
Dias, Miguel Guilherme, Miguel Tapadas, Patrícia André, Rui
Morrison, Sara Cipriano, Sérgio Praia, Sofia de Portugal,
Vasco Sousa.
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promovido pela Inatel, no mesmo ano. A fórmula vencedora junta-se agora em palco da Trindade para apresentar
a “Ordem”, uma sátira aos procedimentos judiciais, à sua
lentidão e “cegueira”…
FICHA TÉCNICA: De: João Santos Lopes; Coordenação
artística: Sílvia Brito; Espaço cenográfico: António Jorge; Coprodução: Fundação INATEL | Teatro da Trindade | Grupo o
Celeiro
“Snapshots”
“Beijo de Sal com Vento”
Para ver até dia 18 de Dezembro na Companhia de Teatro
do Chiado, uma peça dedicada aos mais pequenos, onde
se explicam os conceitos de amizade e a capacidade para
sonhar com coisas bonitas.
Baseado no conto “O Pescador de Estrelas” de Mathilde
Ferreira Neves, a Companhia de Teatro do Chiado criou a
peça “1 Beijo de Sal com Vento” totalmente dedicado a um
público infanto-juvenil.
Nesta encenação serão explicados e ilustrados conceitos tão simples como a amizade, ou a capacidade de
sonhar, a concretização de objectivos ou o sofrimento de
perda e despedida, nem sempre sentimentos fáceis de
explicar aos mais pequenos.
Podem fotografias corresponder à realidade, ou serão apenas instantes para uma memória fotográfica de alguns
momentos felizes numa vida de solidão. É a pergunta que
se faz em “Snapshots”, uma peça com produção do Teatro
Nacional D. Maria II, em conjunto com o Teatro da
Garagem e Teatro Municipal de Bragança, para ver na Sala
Estúdio até 19 de Dezembro.
FICHA TÉCNICA: Texto e encenação: Carlos J. Pessoa;
Dramaturgia: David Antunes; Cenografia e figurinos: Sérgio
Loureiro; Desenho de luz: Miguel Cruz; Música: Daniel
Cervantes; Vídeo: Pedro dos Santos e Teresa Azevedo Gomes;
Interpretação: Ana Palma, António Banha, Carolina Sales,
David Cabecinha, Dinis Machado, Fernando Nobre, José
Neves, Maria João Vicente, Miguel Mendes, Nuno Nolasco,
Nuno Pinheiro e Tiago Lameiras; Co-produção: Teatro
Nacional D. Maria II, Teatro da Garagem e Teatro Municipal
de Bragança
FICHA TÉCNICA: Ficha Técnica: Interpretação: Anabela
Faustino, Ângela dos Vais, Diogo Lemos; Voz(es) Off: Juliana
Conde; Encenação: Frederico Salvador; Dramaturgia: Anabela
Faustino, Frederico Salvador, Tânia de Brito; Coreografia:
Ricardo Molar; Assistência de Encenação: Juliana Conde;
Produção: CTI - Companhia de Teatro Industrial
A “Ordem”
A “Ordem”, peça co-produzida pela Fundação INATEL, da
autoria de João Santos Lopes e representada pelo Grupo de
Teatro O Celeiro, estará em cena nos dias 4 e 5 de
Dezembro, na Sala Estúdio do Teatro da Trindade.
João Santos Lopes foi o grande vencedor do concurso
INATEL/ Teatro Novos Textos de 2009, com este título. O
Grupo de Teatro O Celeiro, que agora o representa, também foi vencedor na Concurso Nacional de Teatro também
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Boavida|Cinema em Casa
Sugestões juvenis
Quatro sugestões de géneros variados com um alvo comum: o público mais jovem.
Da excelente animação Toy Story 3 passando pelo renovado Karate Kid e a aventura
Príncipe da Pérsia: as Areias do Tempo e, finalmente, a comédia juvenil Juventude
em Revolta. Sérgio Alves
TOY STORY 3
KARATE KID
PRÍNCIPE DA PÉRSIA: AS
JUVENTUDE EM REVOLTA
O regresso de Woody, Buzz e
demais brinquedos! Andy
Parker era o miúdo mais po-
AREIAS DO TEMPO
Nick é um jovem de 14 anos
pular em Detroit, mas a sua
Na mítica Pérsia, um príncipe
que passa por um momento
está prestes a ir para a
Mãe decide mudar-se para a
valente e uma misteriosa
difícil com a separação dos
Universidade e não sabe o
China e tudo vai mudar. Na
princesa correm contra as
Pais. Durante as férias, co-
que fazer aos seus velhos
China, o jovem apaixona-se
forças do mal para defender
nhece e apaixona-se perdida-
brinquedos. Estes, por
pela sua colega Mei Ying mas
um punhal mágico capaz de
mente por Sheeni. Ela é uma
engano, vão
as diferenças culturais tornam
libertar as areias do tempo -
bela rapariga de espírito livre
parar a um
a relação difícil. Para piorar as
um poder dos deuses que pode
e tudo parece correr bem mas,
infantário e
coisas o seu colega Cheng
fazer o tempo voltar atrás e
a família e os ex-namorados
agora terão que
começa a implicar com ele
permitir a domínio do Mundo.
fazem tudo para acabar com a
encontrar uma
até que conhece Mr.Han,
O jovem Dastan, injustamente
relação. Inspirado pela sua
forma de con-
responsável da manutenção
acusado de ter morto o Rei, e a
amada, Nick resolve criar um
seguir fugir e voltar para casa
do seu prédio, que lhe vai
bela Tamina embarcam numa
alter-ego rebelde com o nome
antes que o seu dono parta.
ensinar a melhor forma de se
aventura
de François mas o resultado
Neste terceiro e último capí-
defender: o Kung Fu.
inesquecível pela
será desastroso. Retrato diver-
tulo da série da Pixar/Disney,
Produzido por Will Smith,
defesa do punhal
tido da adolescência, dos
os nossos amigos vão
Karate Kid é uma versão mo-
sagrado e das
desejos, das pequenas lou-
enfrentar vários desafios e a
derna do filme que marcou a
forças do Bem.
curas que se fazem em nome
união será a sua grande força.
geração dos anos 80. Rodado
Inspirado num
Com um excelente acolhi-
quase integralmente em
das paixões de
jogo de computador com o
Verão.
mento da crítica e visto por
Pequim, com
mesmo nome, Príncipe da
Realizado por
milhões de famílias, o filme é
uma realiza-
Pérsia é uma aventura fantásti-
Miguel Arteta,
o grande acontecimento do
ção segura, o
ca com acção, romance e um
o filme tem no
ano na animação e forte can-
filme cumpre
final surpreendente. Grandes
seu protago-
didato ao Óscar nessa catego-
o fito de aler-
intérpretes, efeitos especiais
ria.
tar para o
deslumbrantes e um ritmo
virtude. Michael Cera, já bri-
problema do
TÍTULO ORIGINAL:
REALIZAÇÃO:
acelerado, com a assinatura do
lhante em Juno, apresenta-se
bullying e as diferenças cul-
veterano Mike Newel (Quatro
em grande forma nesta comé-
Toy Story 3;
Lee Unkrich;
nista a maior
turais na China moderna.
Casamentos e um Funeral,
dia.
Joan Cusack, Don Rickles,
Atenção, ainda, para o
Donnie Brasco e Harry Potter e
TÍTULO ORIGINAL:
Michael Keaton; EUA, 103m,
despontar de uma nova
o Cálice de Fogo).
Revolt; REALIZAÇÃO: Miguel
Cor, 2010; EDIÇÃO: Zon
estrela - Jaden Smith - (filho
TÍTULO ORIGINAL:
Lusomundo
de Will Smith) e a confir-
Persia: The Sands of Time;
mação de outra - Jackie Chan.
REALIZAÇÃO:
VOZES:
Tom Hanks, Tim Allen,
TÍTULO ORIGINAL:
TempoLivre
| DEZ 2010
COM:
Mike Newel
Jake Gyllenhaal,
Arteta; COM: Michael Cera,
Portia Doubleday, Jean
Smart, Steve Buscemi, Ray
Liotta; EUA, 90m, cor, 2009;
Kid; REALIZADOR: Harald
Gemma Arterton, Bem
EDIÇÃO:
Zwart; COM: Jaden Smith,
Kingsley, Alfred Molina; EUA,
Multimédia
Jackie Chan, Taraji P.Henson;
116m, cor;
EUA/China, 140m, Cor, 2010;
2010; EDIÇÃO: Zon
EDIÇÃO:
64
The Karate
Prince of
Prísvideo
Lusomundo
Youth in
Castello Lopes
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Boavida|Grande Ecrã
Para toda a família
Celebrizado com “Belleville Rendez-Vous”, um prodigioso filme de animação - nomeado, em 2004, para o
óscar e aclamado em toda a parte -, Sylvain Chomet volta a dar provas do seu talento com “L’Illusionniste”
(“O Mágico”), uma fábula nostálgica e sensível que tem como base um argumento inédito de Jacques Tati,
um dos mais admiráveis e inteligentes actores e realizadores da história do cinema burlesco.
Joaquim Diabinho
omo o título indica, o ilusionista (de nome Tatischeff, que
é, curiosamente, o apelido verdadeiro de Tati) deve ser lido
como uma homenagem a uma forma de
arte performativa que há muito entrou
em declínio mas deve, também, ser
apreendido como uma reflexão filosófica
sobre a vida que se escapa, da irreversibilidade do tempo que passa, da
melancolia, da lembrança e da saudade.
E da capacidade de se renovar, de
renascer.
Evocação poética bem inspirada do
universo de Tati(os seus processos cómicos, o seu assaz incomum sentido de humor), o filme de
Sylvain Chomet -que até convoca Charles Chaplin e a sua
personagem Calvero do belíssimo, “Luzes da Ribalta” – revela-se bastante hábil no estilo narrativo onde quase não
abundam diálogos mas está carregado de sentimento e no
poder visual, repare-se: como se combinam, de forma eficaz os (poucos) efeitos digitais com a fluidez da animação
artesanal, via aquarelas e lápis, cuja estética nos remete
C
forçosamente para a ambiência da “bd”. E repare-se, em
particular, na expressividade da banda sonora.
Surpreendente é, por outro lado, que tudo “isto” surja
num filme de animação que não precisa nada de recorrer
às tão apregoadas virtualidades do sistema tridimensional
do 3D para ganhar a adesão do espectador que valoriza
demais certos e determinados dispositivos hollywoodianos dominantes.
E, pese o absurdo da questão, nunca
saberemos o que seria “L’Illusionniste” se
realizado e interpretado por Jacques Tati. Mas
podemos imaginar....
Para os mais pequenos, a estreia, prevista
para 9 Dezembro, da produção belga, “As
Aventuras de Sammy: A Passagem Secreta,
3D” (outra fábula, mas de natureza ecologista) que narra a odisseia de uma tartaruga
marítima perdida de amores é pretexto para
um alerta pedagógico para os males do aquecimento global que colocam em perigo a vida
do planeta. Não goza, nem de perto nem de
longe, do virtuosismo tecnológico das produções estadounidenses mas diverte e emociona. n
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Boavida|Tempo Informático
Sugestões úteis
É sempre nossa intenção indicar neste espaço os dispositivos
ou acessórios que, entre a enorme quantidade dos lançados
regularmente no mercado, julgamos terem maior utilidade para
um maior número de leitores.
Gil Montalverne
[email protected]
presentamos o novo telemóvel para o mercado
sénior lançado pela AEG. O seu moderno formato de concha, quando abre, mostra desde logo a
dimensão das teclas que facilita a identificação,
escrita e navegação entre os menus, e um amplo ecrã a
cores que torna bem visíveis números e textos de mensagens. Este SP 100 é compatível com aparelhos auditivos,
dando uma excelente audição e pode também ser utilizado
em alta-voz através de altifalante integrado. Tem radio FM
e entre as muitas vantagens para os utilizadores mais
necessitados possui uma tecla SOS, de acesso fácil, que
permite rapidamente fazer uma chamada de emergência
para um número configurável (por defeito o 112) que até
pode ser accionada quando está desligado. Design moderno
adaptado às circunstâncias de dificuldades de visão ou
auditivas mas possuindo o indispensável para o
serviço normal. PVP: 89,90 €
A
ÚTIL É TAMBÉM o
primeiro medidor de
glicemia Plug&Play
com software de Gestão
da Diabetes lançado pela Bayer. O Contour USB resulta
numa grande ajuda para o doente e o profissional pois
recolhe a amostra e interpreta os níveis de glicemia, permitindo a identificação de tendências e padrões problemáticos. Com maior conhecimento do perfil glicémico,
através do software, o controlo torna-se mais efectivo e efi-
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TempoLivre
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ciente, contribuindo para a redução da HbA1c
(hemoglobina glicosilada) melhorando a vida da pessoa
com Diabetes. Tratando-se de um dispositivo semelhante
a uma Pen, a tecnologia Plug&Play permite ligá-lo a qualquer computador e ter de imediato os resultados. Possui
memória para 2.000 resultados, lembretes das próximas
medidas e até adicionar notas das condições como stress,
actividade, doença, etc. Disponível nas farmácias.
NO MERCADO eis um adaptador SATA USB que transforma qualquer disco de 2,5” ou 3,5”, unidade SSD ou Drive
óptica (DVD,Blu-Ray, etc.) em dispositivos externos pela
porta USB 3.0 mas compatível com USB 2, sem necessidade de instalação interna no PC. Prático e económico
permite por exemplo fazer cópias de segurança do computador para o dispositivo ou vice-versa. PVP: 44.90 €
QUEM DISSE que só se podem fazer boas fotografias na
Primavera e Verão? Em qualquer dia do ano, em qualquer
lugar, a qualquer hora, pode conseguir uma
boa fotografia. Mas para isso é necessário
recorrer a quem nos possa explicar o "como".
É isso que o jovem e prestigiado fotógrafo Joel
Santos nos ensina no seu livro
"FOTOGRAFIA: Luz, Exposição, Composição,
Equipamento e Dicas para Fotografar" editado
pelo Centro Atlântico. Ele não desdenha ensinar, inspirar e entusiasmar o leitor, revelando-lhe um sem número de oportunidades
fotográficas. Está lá tudo. (PVP: 24,69 €) n
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Boavida|Ao Volante
Renault
“democratiza”
veículo eléctrico
A aliança Renault/Nissan anunciou, desde 2008, o
objectivo de comercializar, em grande escala,
veículos “zero emissões”. O objectivo da Renault
passa por democratizar o veículo eléctrico,
propondo uma gama completa de veículos
“Renault Z.E.” acessíveis a todos.
Carlos Blanco
U
ma fórmula económica inovadora A Renault irá propor
fórmulas de aquisição
inovadoras para facilitar a democratização dos veículos
eléctricos. É, de facto, a primeira
vez que a propriedade do veículo
e das baterias está dissociada. Os
clientes vão poder comprar ou simplesmente
alugar o veículo, recorrendo aos produtos financeiros propostos pelas mais variadas instituições bancárias. Desde a
compra do automóvel no concessionário, o cliente encontra
resposta às suas necessidades. É a solução “one stop shopping”, que inclui a compra ou o aluguer da viatura, o
aluguer da bateria e a contratação dos serviços a ela associados, o financiamento, o seguro e até a instalação de uma
“wall-box” para uma carga rápida e segura, no domicílio.
A Renault desenvolveu três modos de carregamento
para a gama Renault Z.E.:
A carga standard: é o modo comum e o mais prático
para os utilizadores. Ligando simplesmente a viatura a
uma tomada no domicílio ou num local de carga no exterior (num estacionamento, por exemplo) permite efectuar
uma carga completa entre 3h30/8h, dependendo da potência disponível e do tipo de veículo (3h30 para o Twizy,
entre 6h/8h para o Fluence Z.E., ZOE Preview e Kangoo
Express Z.E.). Para a carga no domicílio a Renault
recomenda a instalação de uma “wall-box” que apresenta
várias vantagens como ergonomia, velocidade, optimização do custo da carga e a segurança de uma instalação
conforme as regras de segurança.
A carga rápida é o modo de carga por excelência. Quando
é necessário recarregar rapidamente a bateria, basta ligar a
viatura a uma das tomadas “carga rápida” instaladas na via
pública para recuperar 50 km de autonomia em 30 minutos.
Numa fase inicial, esta forma de carregamento estará apenas
disponível para o Renault ZOE Preview, seguindo-se o
Renault Fluence Z.E. e o Renault Kangoo Express Z.E..
Carga “quickdrop”: em determinados países vão ser instaladas estações automáticas de troca de baterias. O cliente vai
poder substituir a sua bateria descarregada por uma com
carga total em apenas três minutos. Até ao momento, estas
estações estão previstas para Israel e Dinamarca.
OPTIMIZAR AUTONOMIA
A gestão da autonomia é a principal aposta do veículo
eléctrico. As viaturas da gama Renault Z.E. possuem um
IHM (Interface Homem/Máquina) desenvolvido especificamente para informar o condutor do nível de carga do veículo, bem
como a autonomia (quilómetros)
restante:
- Um indicador mostra o nível de
carga da bateria.
- Um indicador de economia
indica ao condutor, com precisão,
o seu nível de consumo de energia.
Surgem também novos códigos de
cor: azul claro na faixa de utilização “normal”, azul escuro
no funcionamento optimizado e vermelho na zona de sobre
consumo, susceptível de afectar mais rapidamente a autonomia do veículo.
- O computador de bordo está adaptado ao veículo eléctrico. Indica a autonomia em quilómetros, o consumo médio
e instantâneo, bem como o número de kWh que restam.
- O sistema de navegação inteligente Carminat
TomTom® integra informação sobre a autonomia e indica,
em permanência, a localização de estações de carregamento ou de troca de baterias mais próximas.
A recuperação de energia na travagem faz igualmente
parte do programa da gama Renault Z.E., com um dispositivo com a lógica de funcionamento do KERS (Kinetic
Energy Recovery System) utilizado na Fórmula 1.
Aquando da desaceleração, a energia cinética é recuperada e armazenada na bateria.
O Renault Twizy encontra, fácil e rapidamente, um
lugar para estacionar em cidade em locais onde os “microcarros” não conseguem. Com uma velocidade máxima de
75 km/h (para a versão com carta de condução), o Renault
Twizy está à vontade em zonas suburbanas, podendo circular na periferia dos grandes aglomerados (dependendo
da legislação local em vigor). n
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Boavida|Saúde
Natal com mais saúde
Não, não pense que vou dar-lhe conselhos para não abusar dos doces ou para evitar os excessos
alimentares ou de álcool – este último em especial, se tiver de conduzir depois da consoada. Já toda a
gente sabe isso, embora nestes dias de festa, alguns prefiram esquecer…
M. Augusta Drago
medicofamí[email protected]
oje proponho-me dar alguns conselhos, mas
destinados a evitar as intoxicações alimentares,
que são tão frequentes e que causam tanto
transtorno nesta época festiva. Regra geral, os
doentes, quando vêm a uma consulta de urgência, apresentam-se com náuseas, vómitos, cólicas abdominais e
diarreia. Também é comum saberem o diagnóstico.
Costumam dizer: “foi qualquer coisa que comi…”.
A intoxicação alimentar é uma doença aguda extremamente frequente, que resulta da reacção do organismo às
toxinas produzidas por agentes patogénicos – bactérias e
vírus – quando são ingeridos alimentos contaminados.
A contaminação dos alimentos é, normalmente, resultante do manuseio impróprio dos alimentos e do desrespeito pelas regras de higiene.
Os agentes mais frequentemente implicados nestas
infecções são o campilobacter, a listeria e a salmonela.
Qualquer destes agentes é difícil de detectar, quer pelo
aspecto dos alimentos quer pelo cheiro ou mesmo pelo
sabor. A ingestão de alimentos contaminados produz sempre desconforto gastrointestinal, mal-estar geral e, por
vezes, dores musculares, como se fosse uma gripe.
As intoxicações alimentares têm níveis de gravidade
variável, dependendo da quantidade de toxina ingerida e das características do doente. Uma pessoa
adulta saudável, que ingere uma
pequena porção de alimento contaminado, pode resolver o problema sem necessidade de recorrer
aos serviços de saúde. O mesmo
não sucede quando se verifica
uma diarreia intensa e líquida, ou
quando o doente é mais vulnerável, o
que acontece com as crianças, idosos e imunodeprimidos.
Os cuidados de higiene alimentar começam
na compra dos alimentos. As compras devem
ser feitas de preferência em locais onde
temos a garantia de que os produtos são frescos. Cada vez é mais importante verificar os
H
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TempoLivre
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prazos de validade, assim como respeitar as temperaturas
a que os diversos alimentos devem ser conservados e que
vêm escritas nas respectivas embalagens.
Ao comprar carne, peixe e outros alimentos que possam ter algum líquido, é necessário isolá-los bem em
sacos de plástico, para não pingarem e conspurcarem os
outros alimentos. Os produtos frescos devem ser comprados em pequenas quantidades e com maior frequência. Os
alimentos congelados e refrigerados devem ser os últimos
a pôr no carrinho das compras e devem ser guardados, no
frigorífico ou na arca, o mais rapidamente possível.
Em casa, tenha atenção à higiene das bancadas, tábuas,
bem como de todos os utensílios que estão em contacto
com os alimentos. Lave os vegetais e a fruta com água corrente e guarde no frigorífico a uma temperatura inferior a
10º. Coloque os ovos no frigorífico, verifique a data de validade e conserve a embalagem para não se esquecer dela.
Quando estiver a cozinhar, deve manipular separadamente os alimentos frescos e os cozinhados e lavar sempre as mão antes de iniciar a preparação e quando tiver de
mudar de um alimento cru para outro já cozinhado.
Assegure-se que os alimentos ficam bem cozidos no seu
interior, para ter a certeza de que, por exemplo,
o peru, está bem assado, deve utilizar um termómetro que se espeta na carne e dá indicação da temperatura no seu interior, esta
deve chegar pelo menos aos 75º.
Nos dias de festa, é certo que ficam
sempre “restos” que podem e devem
ser consumidos. Porém, não se
recomenda que fiquem mais de dois
dias no frigorífico. A carne, o peixe e
todas as comidas que são confeccionadas com leite e ovos são susceptíveis de contaminação pelas bactérias de
que já falei. A maneira melhor de conservar
estes alimentos é em recipientes de plástico ou
vidro, com tampas herméticas, para evitar o contacto com o ar e com as bactérias.
Espero ter contribuído para um Natal
mais feliz e com mais saúde para si
e para a sua família! n
ANDRÉ LETRIA
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Boavida|Palavras da Lei
Habitação permanente de idosos
?
Habito um T1 desde Dezembro de 1961, com um
contrato de arrendamento celebrado em Novembro de
1966 entre mim e o avô do actual senhorio.
Como eu e o meu marido fomos comprando muitos livros e
objectos, a casa começou a tornar-se pequena, pelo que
adquirimos um apartamento no Concelho de Oeiras, usando-o
como casa de fim-de-semana. Por causa de uma doença de
familiar, tivemos que, durante uns tempos, viver na casa de
Oeiras; após a melhoria dessa pessoa, recebemos um
telefonema do senhorio. O motivo por ele apresentado foi o de
que, por causa de problemas de isolamento de uma empena,
teve que fazer obras. O meu marido concordou em suportar
partes das despesas, desde que lhe fosse apresentado
orçamento para tal. A situação complicou-se, o senhorio
insinuou que não usávamos a casa e a situação está em
Tribunal. A minha idade concede-me alguns direitos sobre um
eventual novo contrato de arrendamento?
Sócia devidamente identificada por “Maria” – Lisboa
Pedro Baptista-Bastos
esde já lhe agradecendo a sua longa carta, que
não posso responder em todos os seus aspectos,
e desejando-lhe felicidades para a sua acção
judicial que tem todas as possibilidades de
êxito – de acordo com o exposto – resumi as suas questões
a uma única, na qual se baseia esta crónica.
Todas as pessoas acima dos 65 anos que tenham um
contrato de arrendamento podem ver a sua renda aumentada, mas este aumento é efectuado de modo faseado, ao
longo de 10 anos. Se, por qualquer motivo, não habitasse
permanentemente no imóvel, a renda seria faseada de dois
em dois anos, independentemente da idade.
No entanto, como está recenseada na freguesia onde se
situa o imóvel, como paga água e luz, como está recenseada
na Junta de Freguesia onde vota, há mais do que indícios suficientes para que o senhorio não possa sequer alegar a necessidade dessa habitação para seu uso, em sede de acção de
despejo. E, embora nenhum advogado prudente goste de
dizer isto, atrevo-me a dizer que terá êxito na sua demanda
judicial, dado que o mais forte motivo para um despejo – a
falta de pagamento de rendas – não se verifica nesta situação.
Por outro lado, os arrendatários com idade superior a 65
anos e rendimento anual bruto corrigido do agregado familiar inferior a cinco salários mínimos anuais ficam excluídos
da aplicação do Novo Regime do Arrendamento Urbano
D
(NRAU), com uma excepção: o fim da transmissibilidade do
contrato por falecimento de um dos arrendatários, salvaguardando-se, no entanto, a situação dos cônjuges, dos
descendentes menores ou em idade escolar, até aos 25
anos, e das pessoas deficientes. Quer isto dizer que o
NRAU não lhe é aplicável na sua situação, excepto na parte
do aumento das rendas, tal como a descrevi acima.
O contrato que vigorará, independentemente do que
suceda em Tribunal, será sempre o celebrado em 1966,
com as actualizações de renda exigidas por Lei, para vossa
protecção e segurança. n
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ClubeTempoLivre > Passatempos
1
Palavras Cruzadas | por José Lattas
Abolis; Sufixo formador de substantivos masculinos, que
indicam uso ou serventia. 3-Para mim; Divina; Capricho. 4Acoitas; Porções. 5-Também não; Contracção de preposição
e artigo (pl.); Essência. 6-Enguias; Sossego; Rego. 7-Planta
anual, palustre e termófila, pertencente à família das
Gramíneas; Lamentação; Aconselhem. 8-Cachaça; Gavinha;
Apuro. 9-Calor; Sapo do Amazonas; Conceito. 10-Berço de
Santa Teresa de Jesus; Atola. 11-Dilecta; Publicou; Anno
Domini (abrev.). 12-Popa; Arvorara; Impostura. 13-Alma;
Arrasas.
Verticais: 1-Possesso; Pedra de altar. 2-Cântico; Claudicas;
Assim seja!. 3-Ministério da Educação (abrev.); Aquentava.
4-O grande amor de D. Pedro; Agrada; Adjectivo latino, que
significa o mesmo. 5-Solteirona (pop.); Lúcido. 6-Rebentos;
Sus. 7-Alucinas-te; Para barlavento (naut.); Termo latino,
que exprime a personalidade autoconsciente. 8-Catedrais;
Caritativo; Admiti. 9-Mau cheiro (Bras.); Apelido de compositor e musicólogo peruano (1900-67). 10-Dezena;
Dinheiros. 11-Antiga possessão portuguesa na Oceânia;
Rotina. 12-Celeridade; Cachorro; Cada uma das cavidades
que, na roda hidráulica, recebe a água, que a faz mover. 13Escusa; Pequena ribeira portuguesa, do distrito de Aveiro.
14-Alguns; Divisa; Enfiada. 15-Pronome pessoal (fem.);
Amigos.
3
4
5
6
7
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9 10 11 12 13 14 15
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3
4
5
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11
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13
SOLUÇÕES
(horizontais): 1-DOMINGO; A; TARDE. 2-EDEN; RISCAIS; OL. 3-ME;
ETEREA; MANIA. 4-O; ASILAS; DOSES. 5-NEM; AOS; G; C. 6-IROS;
S; PAZ; VALA. 7-ARROZ; AIS; DITEM. 8-CANA; ELO; P; LIMA. 9-O;
A; CIO; ARU; VER. 10-AVILA; ATASCA; A. 11-AMADA; EDITOU; AD.
12-RE; ERIGIRA; BULA. 13-ANIMO; O; ASSOLAS.
Horizontais: 1-Romance de Fernando Namora. 2-Paraíso;
2
Ginástica mental| por Jorge Barata dos Santos
N.º 21
Preencha a grelha com os
algarismos de 1 a 9 sem
que nenhum deles se
repita em cada linha,
coluna ou quadrado
N.º 21
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SOLUÇÕES
83:Layout 1 25-11-2010 14:51 Page 1
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ClubeTempoLivre > Novos livros
ÂNCORA EDITORA
BOOKSMILE
NÃO HAVERÁ AMANHÃ
DIÁRIO DE UM VAMPIRO
degelo dos glaciares e seu
Magalhães Pinto
Com a freguesia Sanhoane,
BANANA
impacto nas populações
locais.
como pano de fundo, este
Tim Collins
Nigel é um vampiro
romance transporta os
desajeitado e pouco popular.
consequências do
aquecimento global sobre o
EUROPA-AMÉRICA
cheiros, as cores e as
Transformado
texturas do Douro. Num
aos 15 anos e
cenário aparentemente
condenado a
ratolas e divirta-se com uma
OS SENHORES DA
idílico poderá descobrir uma
lidar com os
bela história em verso,
SOMBRA
visão pouco abonatória da
eternos
ilustrada com pop-ups
problemas da
irresistíveis.
Daniel Estulin
Saiba tudo sobre a elite que
política,
percorrendo
se esconde na sombra, sua
adolescência,
bastidores
Nigel, neste diário, escreve
AS MELHORAS, AVÔ!
agenda
inacessíveis ao
sobre a tentativa
Janey Louise Jones
secreta,
cidadão
desesperada de captar o
jogos de
comum.
amor de Chloe, do embaraço
poder e
As
de ter pais vampiros que, por
intriga… e
personagens e os
vezes, tentam morder os
como os
acontecimentos são do
seus amigos e de nunca ter
domínio da ficção, embora o
tido uma namorada, mesmo
governos e seus serviços
retrato do país se revele
morto há mais de 80 anos!
secretos estão em conluio
diversos
perturbadoramente real.
com traficantes e terroristas
Com a hospitalização do avô,
para benefício e lucro
Poppy fica triste e não
mútuos.
consegue concentrar-se nos
As jogadas na obscuridade
treinos para o torneio de
criam a «realidade»,
ginástica. Será que as suas
inventam os bons e os maus,
prioridades se alteram com a
num jogo fraudulento pelo
doença do avô?
poder, pelo lucro e… pelo
nosso futuro.
DESCOBRIR BUDA
TEM CALMA, BORIS!
EDITORIAL PRESENÇA
FILHOS E AMANTES
teoria e prática da Via do
Sam Lloyd
Boris é um monstro cheio de
HORIZONTES EM BRANCO
D. H. Lawrence
Baseada nas vivências do
Buda ou do Despertar
boas intenções, a quem as
(vulgarmente conhecida por
coisas nem sempre correm
budismo), com análise
bem.
pelo mundo
num romance onde a Sr.ª
comparativa a outras
Ajude Boris e escovar o
na senda dos
Morel desiludida com o
tradições, como a hindu, a
cabelo e perceba como vai
efeitos do
marido, um mineiro rude e
cristã e a ocidental.
tornar-se um herói. Uma
aquecimento
bêbedo,
Descobrir Buda procura
história divertida com um
global que
concentra
conciliar os ensinamentos
fantoche em tamanho real.
evidência as
todas as
Paulo Borges
Estudos e ensaios sobre a
budistas com a meditação
José Maria Abecasis Soares
Uma viagem
autor, a obra explora os
complexos laços emocionais,
impressões do autor sobre
esperanças
séria sobre o seu sentido,
O NATAL DOS RATOS
as expedições ao Aletsch e
no seu filho
reflectindo, em especial,
RATOLAS
Alpes suíços e a
Paul. Mas, à
medida que
identidade pessoal, Deus e o
Jack Tickle
Acompanhe as aventuras
Quilimanjaro.
Uma obra que pretende dar
o rapaz cresce, surgem
conceito de realidade.
natalícias dos atrevidos
visibilidade às
tensões relacionadas com a
temas como a sexualidade, a
72
TempoLivre
| DEZ 2010
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paixão por duas mulheres e
Bernardo Mendes, cuja
Mário Cruz, Miguel Lopes,
com o conflito entre amor e
história se funde com a
Paulo Novais e Tiago Petinga
sentimento de posse.
conturbada fundação da
avivam momentos
nação, terá de vingar a morte
inesquecíveis desta visita
CORAÇÃO EM SEGUNDA
de seu tio e revelar os
papal.
MÃO
segredos d’ O Livro de Cale.
Catherine Ryan Hyde
Vida, de 19 anos, está
LINHAS DAS MÃOS DOS
gravemente doente. Uma
FAMOSOS – APRENDA A
nova esperança, um coração
LER AS SUAS
alheio, fá-la
VOGAIS & COMPANHIA
O DIÁRIO DE UM
BANANA… E O MEU
compreender
Zila
Dedicada à quiromancia,
proposta ao júri, Mia relê o
que só pode
aborda as principais linhas
seu diário e a história
Jeff Kinney
Um diário repleto de
viver se outra
das mãos: formato, cor e
decorre, entrelaçando
ilustrações, com páginas
pessoa
sinais mais frequentes,
incríveis aventuras desse
pautadas e
morrer.
incluindo questões
diário com situações que a
balões de
Entretanto, Richard perdeu a
relacionadas com o amor, a
própria vive no presente.
diálogo vazios
esposa num acidente e o
sorte, a riqueza e a saúde
sofrimento levam-no a querer
das pessoas.
para criar a
LUCERNA
suas histórias
conhecer a pessoa que
Conheça,
recebeu o seu coração. E,
ainda, os
O PAPA EM PORTUGAL
momentos mais marcantes
num misto de emoções,
segredos das
Com prefácio de † Carlos
da sua vida. Uma ideia
surge, inesperadamente a
mãos de
Azevedo, o livro integra
original para mais tarde
paixão!
Manuel Luís
textos dos
Goucha,
jornalistas
e registar os
recordar!
O LIVRO DE CALE —
Merche Romero, Marina
(Ana Santos,
PERFEITOS
BERNARDO MENDES: O
Mota, Toy, Fernando Povoas e
Aura Miguel,
MONGE NEGRO (1060-1089)
de muitos outros famosos.
Manuela
Scott Westerfeld
Tally é perfeita. Tem um rosto
Paixão,
e um corpo fantástico,
Carlos Cordeiro
Reza a lenda que este
Octávio
pergaminho
EVEREST EDITORA
amaldiçoado
namorado giro
Carmo, Rosa Pedroso Lima,
e um guarda-
Susana Lúcio e Teresa Canto
roupa de fazer
- repositório
QUERO SER ESCRITORA
Noronha) que
inveja. A sua
de dados
Paola Zannoner
A obra relata a história de
acompanharam Sua
vida social está
genealógicos
de insignes
Mia, uma miúda de treze
Portugal, incluindo
que uma mensagem sobre o
portucalenses – deu azo a
anos que sonha ser escritora
saudações e discursos de
seu passado imperfeito
infâmias, lutas e
e que decide candidatar-se a
Bento XVI. As fotos de André
destrói a sua alegria. Agora
assassinatos.
um prestigiado curso de
Kosters, António Contrim,
terá de lutar pela vida, pois
Dividido entre o amor da
escrita, tal como Sean, um
Arlindo Homem, Estela Silva,
as autoridades não vão
filha do abade de Santo
atraente rapaz com quem se
Inácio Rosa, Jorge Oliveira,
deixar vivo alguém que saiba
Alberico e a fidelidade aos
cruza no evento.
José Sena Goulão, Luis de
o que ela sabe!
monges do mosteiro rival,
Para apresentar uma boa
Oliveira, Manuel Almeida,
Santidade na visita a
ao rubro, até
Glória Lambelho
OS SEUS AMIGOS VÃO GOSTAR DE AJUDAR
Dar a quem mais precisa. Você escolhe uma entre 28 instituições.
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ClubeTempoLivre > Cartaz
COIMBRA
Camponesas do Alva”em Avô
VIANA DO CASTELO
Atletismo
Concerto de Natal
Circuito de Cinema
S. Silvestre Cidade de
Dia 11 às 21h30 - Coro dos
Dia 11 às 21h30 – filme
Coimbra – dia 29 às 21h00
Pequenos Cantores de
Gomorra na Junta de
decorre a 34ª edição da
Coimbra, Choral Poliphónico
freguesia de Tregosa, pela
corrida de S. Silvestre
de Coimbra e Orquestra de
Associação “A Mó” - Vale do
Cidade de Coimbra, início na
Sopros de Coimbra na Igreja
Neiva; dia 18 às 21h30 – filme
rua General Humberto
de S. José em Coimbra; dia
Patoruzito - O Pequeno índio
Delgado. Informações e
12 às 16h00 – Grupo de
no Grupo Cult. Social Recr. e
inscrições na Agência Inatel
Câmara “Canticus Camerae”
Desp. de Cuide.
em Coimbra.
em Sepins; dia 19 às 16h00 Grupo de Câmara “Canticus
Espectáculo de Teatro
Cantares Natalícios
Camerae” no Salão Nobre da
Dia 19 - Grupo Unhas do
Dia 11 às 21h00 - grupos
C.M de Arganil.
Diabo na Associação Cult. e
Desp. dos Jovens de Sá
típicos de Ançã , “As
Camponesas do Alva” e
Teatro de Outono
ranchos de Sanguinheira e S.
Dia 12 às 15h00 - peça
Associação para o
Tarde Cultural
Mamede Infesta na Igreja
“Lucilina e Antenor “, de
Desenvolvimento e Formação
Dia 19 - Grupo Unhas do
Paroquial de Ançã; dia 31 às
Matilde Rosa Araújo, pela
Profissional de Miranda do
Diabo e R. Folclórico de Cuide
21h30 Rancho Folcl. “As
“Arte à Parte” na ADFP -
Corvo.
em Cuide.
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O Tempo e as palavras
M a r i a A l i c e Vi l a Fa b i ã o
Dos barões assinalados
à propaganda política
[…] De longe muito longe desde o início / O homem soube de si pela palavra / E nomeou a pedra a flor a água / E
tudo emergiu porque ele disse // Com fúria e raiva acuso o demagogo / Que se promove à sombra da palavra / E da
palavra faz poder e jogo / E transforma as palavras em moeda / Como se faz com o trigo e com a terra. //
Sophia de Mello Breyner, Com fúria e raiva, in: O nome das coisas, Lisboa, 1977
D
as praias da Península, partem no medo do mistério do que os aguarda para além daquele mar hostil, que, visto de terra, lhes parece infinito. Em
naus, caravelas ou galeões, em cujo bojo, entre biscoitos, salmouras, ratos e animais de capoeira, levam missais
e missangas para o desconhecido, enfrentam com rezas a fúria
de ventos e vagas, ou as mortais calmarias da terrível imensidão aquática.
Eles são os barões assinalados, os que, em nome de reis
gloriosamente visionários, vão dilatar o Império, para o que,
“devastando as terras viciosas” (Camões o diz!) dos
continentes descobertos, vão, sobretudo, dilatar a Fé, numa
obra de evangelização em que a capacidade persuasiva da
palavra anda de mão dada com a capacidade persuasiva das
armas.
Paradoxalmente, o predomínio da actividade
missionária exercido pelo cristianíssimo Portugal e pela
cristianíssima Espanha ao longo do séc. XVI desagrada a
Roma. Logo, no dia 22 de Junho de 1622, o Papa Gregório
XV promulga a encíclica Incrustabili divinae, que institui a
Congregatio de propaganda fide (Congregação para a
Propagação da Fé), a cujo cargo fica, finalmente, a direcção
suprema dos assuntos eclesiásticos nos países não católicos
e que, informalmente, passa a ser designada por
PROPAGANDA.
Uma nova palavra penetra, assim, nos léxicos dos
principais países europeus na sua forma original de
gerundivo do verbo latino propagare (propagar por estaca,
multiplicar, espalhar, difundir, divulgar): PROPAGANDA.
Inicialmente específico do léxico eclesiástico, o termo
evolui semanticamente, adquire novas funcionalidades. Em
1842, William Brande observa, no Dictionary of Science,
Literature and Art, que “o nome propaganda se aplica na
moderna linguagem política, como termo de recriminação a
associações secretas pela divulgação de opiniões e princípios
considerados com horror e aversão pela maior parte dos
governos”.
É sobretudo como propaganda política que o termo
adquire, simultaneamente, grande importância na vida dos
povos e uma conotação profundamente negativa.
A propaganda é o elemento mais importante da competição política. Como instrumentos indispensáveis à consecução dos seus fins, a propaganda política usa a exploração do
inconsciente colectivo e a palavra escrita ou falada. Só o uso
intensivo de palavra e da “artilharia psicológica” da propaganda política pode explicar o fascínio de Hitler sobre uma
nação que dera ao mundo uma invulgar plêiade de pensadores. Organizada em longos discursos encantatórios, a palavra
era, para Hitler e para o povo alemão, que, incapaz de pensar, o seguia hipnotizado, o que a flauta mágica era para o
caçador de ratos de Hamelin.
“O homem moderno está surpreendentemente disposto a
crer”, comentava Mussolini, querendo certamente dizer, que
está disposto a ser manipulado, a ser conduzido, como os
ratos de Hamelin, para onde quer que qualquer flautista o
leve, inclusive para a sua destruição.
Em plena campanha eleitoral dominada pelo tema central
da crise financeira, a propaganda política do momento passa
quase despercebida, como tal, perde-se, sem que nada se
ganhe com isso, numa luta de palavras que continuamente
se desdizem a si próprias, antes de terem tido oportunidade
de convencer o mais crédulo.
Felizmente, talvez… Afinal, como escreve Jean-Marie
Domenach, “”Propaganda” é uma das palavras mais desacreditadas de qualquer língua”.
Melancolicamente, penso: não tivessem os nossos barões
assinalados substituído a Igreja na sua missão de dilatar a
Fé, que nome se daria agora ao conceito de persuasão por
qualquer método perverso, a que, nas principais línguas
europeias, se dá hoje o nome de PROPAGANDA? n
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Os contos do
O Número dois
A
primeira vez que vi Mariana foi com ela
a meus pés. Era empregada única da
Sapataria Passo-a-Passo e tentava convencer-me que o par de sapatos me
assentava como luvas. Eu contrariava-a, afirmando
que, com efeito, o esquerdo era cómodo mas o parceiro da direita apertava-me sem piedade. Ela ria-se,
um riso claro e sedutor, e lá ia dizendo que o material tem sempre razão, os sapatos eram perfeitos e
condizentes. Se problema existia só podia ser dos
meus pés, um a pedir o número 40 e o outro a contentar-se com o 38.
Para meu prazer, a conversa prolongou-se.
Mariana era uma menina – mulher de feições iluminadas pelo sorriso constante e, nas posições em que
ambos nos encontrávamos, o meu olhar enfiava-se
pelo decote dela descobrindo os seios soltos e rijos.
Afastados os sapatos de primeira escolha apresentou-me, em alternativa, um modelo que recusei de
pronto por terem biqueiras demasiado em bico. Ela
não desarmava o sorriso e o bom humor, insinuando
que os pés eram bonitos mas, desditosamente, um
me crescera mais do que o outro. Partimos para a terceira tentativa, senti com agrado a mão longa a segurar-me os tornozelos enquanto a outra mão forcejava
na calçadeira. Então os sapatos e os meus pés conciliaram-se um com os outros, dei uns passos e declarei-me satisfeito. Ela permanecia ainda de joelhos no
tapete e a alegria contagiante não se despegava do
rosto. Olhei-a com o que ultrapassava a simpatia inicial para se tornar num enlevo e fiz a pergunta óbvia:
— Como se chama?
— Mariana.
Ocorreu-me a contrariedade de ela ser empregada
de sapataria, não me dava pretexto para a visitar com
frequência. Melhor seria que vendesse cafés ou jornais.
Todavia, não decorreu uma semana até voltar à
Passo-a-Passo, agora para comprar sandálias, nada
oportuno para um inverno frio e chuvoso. Ela recebeu-me como se fosse um amigo de longa data, brincou com a pretensa desarmonia dos meus pés –
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“com sandálias não se nota” – e dirigia-me miradas
risonhas enquanto atendia uma freguesa indecisa
quanto ao tom de castanho dos sapatos.
Finalmente sós, não resisti ao impulso de confessar que – quais sandálias nem meio sandálias – o que
me levava ali era o desejo forte de tornar a vê-la.
Primeiro desenhou-se na carinha dela uma
expressão de espanto, depois retomou o sorriso e
disse:
— Também estou contente por ter voltado.
Mesmo que não leve as sandálias.
— Não só comprarei as sandálias como sairei
daqui com elas calçadas, indiferente ao frio e à
chuva, se a Mariana aceitar almoçar comigo. Repare,
é quase uma hora, de certeza vai fechar a loja e, que
diabo, terá de almoçar. Vamos?
A indecisão dela assomou numa frase:
— É estranho, afinal nem o seu nome sei.
— Nelson. E vou gostar do meu nome quando
dito pela sua boca.
Minutos depois segurei-lhe na mão ao atravessarmos a rua, a caminho de um pequeno restaurante
próximo. Comemos robalos assados no carvão acompanhados de um vinho branco frio e amável ao paladar. Mais que tudo saboreei a doçura da voz enquanto me contava, sem um queixume, que o trabalho na
sapataria começara seis meses antes. Não era o que
pretendia mas desempenhava o papel com a meia
satisfação de ter encontrado um emprego. Afinal,
Mariana era a imagem da alegria de viver e teve pena
quando olhou o relógio e quebrou o meu encantamento:
— Tenho de ir, Nelson.
—Já? Não tardarei a aparecer-lhe, nem que seja
para comprar uns chinelos.
Foi então que ela me apertou a mão e disse, baixinho, como que em confidência:
— Não precisa. Apareça sempre que queira verme.
— Arrisca-se a que a visite todos os dias.
Era uma declaração de amor e os olhos dela responderam sim. Nesse momento fiquei certo de me
ANDRÉ LETRIA
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ter enamorado pela empregada de uma sapataria onde
entrara por bênção do acaso.
O problema era Patrícia. Patrícia e eu vivíamos em
satisfatória comunhão ia para dois anos e sempre surgira aos meus olhos como a mais apaixonante das
mulheres. A número um. Teria de confessar-lhe o
súbito encantamento por Mariana pois sempre nos
tínhamos prometido franqueza total. A mesma franqueza com que Patrícia falava da sua paixão por
Gonçalo Milcíades que a repudiara depois de um
esboço de namoro. Sempre fui, para ela, o número
dois. Acertei a situação procurando escudar-me na
ideia de que, afinal, milhões de mulheres se contentam com os homens que têm á falta de um aceno do
Brad Pitt ou do George Clooney. No meu raciocínio,
Gonçalo Milcíades era um desses, excepto quando ela
o intrometia entre nós, recordando com a sua ligeira e
alegre gaguez, a barbicha loura, os cabelos presos com
uma fita grená, o brinco em forma de meia lua.
Aconteceu em momentos de ardor sexual, com
Patrícia abraçada a mim e no auge da excitação me
chamou de Gonçalo. Então eu sentia, desolado, que
nunca passaria do número dois.
— Não será um mero impulso? Tu, um tipo obcecado pelas artes e pelas ciências, querer para companhia de vida uma empregadazita de sapataria? Tens a
certeza Nelson?
— Absoluta. E é bom sentir-me o número um.
Mulher de classe, Patrícia despediu-se de mim com
mimo, e simpatia. Não estranhei. Eu teria sido igualmente atencioso se fosse ela a partir, chamada pelo
Gonçalo Milcíades, seu amor de verdade.
Meses de ardoroso romance foram os que se seguiram. Nos afagos sexuais a harmonia era perfeita e
Mariana surpreendia-me também pelo espírito vivo e
pelo interesse com que me escutava quando eu puxava as conversas para assuntos históricos, de artes ou
de música erudita. Era como lapidar um diamante
raro e nem por um só momento o tédio arrefecia o
nosso mútuo embevecimento. Ela fazia-me rir com
histórias e anedotas que contava em passeios à beirario. Uma tarde chegou a casa esfusiante de felicidade:
por influência de um freguês da sapataria, que lhe
apreciara os méritos, conseguira novo emprego, numa
biblioteca.
A partir daí as sombras começaram a enegrecer.
Cedo a senti diferente, por vezes nem me ouvia, era
como se a mente vogasse por outros lugares. E chegou
o dia em que a vi tão arisca e nervosa que quis saber:
— Que se passa?
— Nada.
— Nada, como? Anda aí problema, salta à vista.
Ela sentou-se com os cotovelos apoiados nas coxas
e a cabeça entre as mãos.
— Gosto de outra pessoa – disse.
Um nó frio entupiu-me a garganta e quebrei o silêncio pesado com uma pergunta sem nexo:
— Eu conheço-o?
—Não. É uma pessoa maravilhosa, conseguiu-me o
emprego na biblioteca, mas não foi por gratidão que
aceitei viver com ele a vida toda. Desculpa, Nelson.
Tentei aparentar serenidade e forcei um sorriso:
— Que tem esse tipo de especial?
— Tudo. Até a graça de ser um poucochinho gago,
ter uma barbicha loura, usar um brinco em forma de
meia-lua e uma fita grená a prender-lhe os cabelos. –
Fez uma pausa, fungou e concluiu: - Ele é a única pessoa de quem gosto mais que de ti.n
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Crónica
Um homem de todos dias
Baptista
-Bastos
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N
unca admitiu que a mulher morrera. A
palavra estava rigorosamente suprimida do seu vocabulário e, por derivação,
do vocabulário dos outros. Uma espécie
de cerimonial do silêncio, respeitado por todos aqueles que haviam conhecido o casal. Quando a ela se
referia, dizia: «Foi indo», e permanecia assim, hirto e
rígido, fixando quem o escutava como num desafio.
A casa estava cheia dela, do seu perfume, dos
seus retratos: uma cronologia de rostos, de sorrisos,
de gestos: o casamento, a viagem a Santiago de
Compostela, os quatro filhos, os três netos. Fora uma
união constituída numa identidade de imperfeições.
Ele costumava dizer: «O nosso casamento resistiu a
tudo, sobretudo aos estragos e às ruínas do tempo. O
único que se manteve, entre os da nossa geração.»
Às vezes vagueia pela casa enorme, conversa com
a mulher que foi indo, criando diálogos derivados
das situações quotidianas. A casa, na avenida
Almirante Reis, possuía um corredor enorme e os
quartos eram espaçosos e claros. Lembra-se de ter
lido, em tempos, «A Escola do Paraíso», de José
Rodrigues Miguéis, que falava daqueles sítios com
áspera ternura. Os romances, então, ensinavam-nos
a olhar as coisas com outras atenções, e até nos treinavam para comentar e criticar a época e os hábitos.
Costumava ler poemas em voz alta para a mulher. Os
poetas daqueles anos, bem entendido, e gostava, particularmente, do «Romance do Terceiro Oficial de
Finanças», um lindo poema de Manuel da Fonseca.
Chegara a conhecer Manuel da Fonseca, numa casa
de pasto às escadinhas do Duque, onde se reuniam
escritores, jornalistas, gente do cinema. Conversara,
avulsamente, com ele, e apreciara o tom arrastado da
sua conversa, uma sabedoria antiquíssima e uma
integridade lisa, limpa e firme.
Tinham ido, todos aqueles de quem gostava.
Ocasionalmente, passeava por esses lugares, e parecia-lhe ver as sombras fugidias, os sons das conversas, o ruído dos copos. Ainda foi tentado a escrever
uns textos breves, sobre aquilo que via. Percebeu,
porém, que lhe faltava o sentimento secreto da escrita, o impulso que, por exemplo, levava Manuel da
Fonseca a contar uma história a que toda a gente
assistira, mas a que ele dava um toque, uma música
muito particular, tornando-a diferente.
A mulher dizia-lhe: «Tenta, tens de insistir.» Ele
sabia que não dispunha dessa música leve e única que
faz com que as palavras pareçam solfejo. Se calhar, as
palavras são mesmo solfejo. Leu-lhe uns casos, inspirados na vida real, mas compreendeu, pelo olhar dela,
que os escritos não prestavam para nada. Desistiu.
Contudo, não deixava de pensar, ao ler livros e histórias dos outros, que escrever era muito fácil.
Tem saudades da mulher, de sentir o corpo quente dela na cama, dos seus ralhos e, até, dos seus constantes queixumes. À medida que o tempo foi correndo o rosto, os gestos, o modo de andar tornaram-se
cada vez mais nítidos e definidos. A voz, o registo da
voz, é que se perdera. A voz é a primeira a desaparecer da nossa memória, uns anos depois da saída da
pessoa amada. Parece uma punição insustentável,
tanto mais que, de contrário, seria bom conversar
com ela, com essa voz.
Ninguém o visitava. Os filhos tinham as suas
vidas; no entanto, bem poderiam, de vez em quando,
ir lá a casa, para ele ver os netos. Era o silêncio em
torno de si. O silêncio não o assustava nem atemorizava. Com frequência permanecia na cama até tarde.
Gostava de pensar em factos remotos, de rememorar
a sua vida sem sentido, cheia de hipóteses incumpridas, de sonhos sem solução. Também gostava de
ir a pé até à Baixa, olhar para as mulheres, sentir os
seus perfumes, os odores dos corpos. Agora, cansava-se muito; até demasiado. E recordava o seu passo
antigo e desenvolto. Mas logo suprimia a imagem
por demasiado penosa.
Apreciava futebol, via alguns jogos na televisão.
A televisão era o sustento do seu tempo, Sentava-se
no sofá, horas e horas a fio, comia umas sandes, uma
peça de fruta, e adormecia. Gostava de ler «A Bola»,
apenas uma vez por semana. Era do tempo do
Cândido de Oliveira, do Vítor Santos, do Carlos
Pinhão, do Alfredo Farinha, do Carlos Miranda,
agora as coisas eram outras, diferentes, e não sabia se
melhores. Aqueles jornalistas serviam-se de palavras
que favoreciam a sua imaginação como se tivesse
visto, directamente, os jogos por eles narrados.
Decidira, naquela manhã, sair um pouco. Talvez
caminhar até ao jardim da igreja dos Anjos, sentar-se
e atirar umas migalhas de pão aos pombos. Sentiu,
de súbito, um imenso cansaço, uma indolência inexplicável, uma desistência do corpo.
Deitou-se, cerrou os olhos e foi indo. n
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