UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
FACULDADE DE ECONOMIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA
Três ensaios sobre ações afirmativas no ensino superior brasileiro: Acesso, progressão e
simulações de diferentes políticas de cotas para a Universidade do Estado do Rio de
Janeiro
ALVARO ALBERTO FERREIRA MENDES JUNIOR
Niterói (RJ)
2013
i
ALVARO ALBERTO FERREIRA MENDES JUNIOR
Três ensaios sobre ações afirmativas no ensino superior brasileiro: Acesso, progressão e
simulações de diferentes políticas de cotas para a Universidade do Estado do Rio de
Janeiro
Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação
em
Ciências
Econômicas
da
Universidade Federal Fluminense como parte dos
requisitos para obtenção do Grau de Mestre em
Economia.
Área de Concentração: Economia Aplicada
Orientador: Professor Doutor Fábio Domingues Waltenberg
Coorientação: Professor Doutor Alberto de Mello e Souza
Niterói (RJ)
2013
ii
ALVARO ALBERTO FERREIRA MENDES JUNIOR
Três ensaios sobre ações afirmativas no ensino superior brasileiro: Acesso, progressão e
simulações de diferentes políticas de cotas para a Universidade do Estado do Rio de
Janeiro
Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação
em
Ciências
Econômicas
da
Universidade Federal Fluminense como parte dos
requisitos para obtenção do Grau de Mestre em
Economia.
Banca Examinadora:
_____________________________________________________
Prof. PhD. Fábio Domingues Waltenberg (Orientador)
Faculdade de Economia – UFF
_____________________________________________________
Prof. Dr. Alberto de Mello e Souza (Coorientador)
Faculdade de Economia – UERJ
_____________________________________________________
Prof. PhD. Maria Eduarda Tannuri-Pianto
Faculdade de Economia – UNB
_____________________________________________________
Prof. Dra. Danielle Carusi Machado
Faculdade de Economia – UFF
Niterói (RJ)
2013
iii
Ao Deus que alegra a minha juventude.
“Et introibo ad altare Dei ad Deum qui lætificat juventutem meam” (Salmos 43:4)
iv
AGRADECIMENTOS
Reimont Otoni, querido amigo, bem expôs uma vez em seu último aniversário que a
vida que é guardada para si é perdida enquanto aquela que é compartilhada, é ganha. Dito
isto, gostaria de dedicar este espaço para compartilhar os meus agradecimentos com todos
aqueles que em algum momento me ajudaram nesta trajetória.
Embora muitas pessoas tenham contribuído em algum momento para que eu pudesse
chegar até aqui, gostaria de agradecer nominalmente a algumas delas. Primeiramente, os
meus pais, avós e madrinha pelo suporte desde o berço. Ao meu irmão, meu confessor, a
quem eu costumo expor em primeiro lugar as minhas angústias e aspirações. E à Patrícia
Kenny, por ter andado ao meu lado desde o início do processo seletivo, e depois, por grande
parte do mestrado.
Também devo este momento em grande parte a dois amigos meus: Gustavo Ribeiro e
Leandro Oliveira. Foram quatro fins de semana seguidos em abril de 2010 ouvindo entre
alguns copos de cerveja, a importância de eu retomar o meu projeto rumo ao pós-doutorado.
As palavras deles estavam recheadas de autoridade, pois já eram funcionários públicos em
lugares que tinham como objetivo estar. Foram para mim o que o grande professor Orlando
Fedeli costumava afirmar “As palavras convencem mas é o exemplo que arrasta”. Sem
sombra de dúvidas, não teria feito a prova da ANPEC - e por consequência a aprovação no
mestrado - se não fosse por eles.
Já no mestrado agradeço aos amigos Alan Gusmão e Manoel Tabet, companheiros
nessa caminhada. Foram muitos os desafios pelos quais nós passamos juntos nesse período.
Também não poderia esquecer dois grandes mestres da Economia da Educação no país. Ao
professor Fábio Waltenberg pela orientação e disponibilidade e ao professor Alberto de Mello
por ter me apresentado o tema na graduação e por ter aceitado a coorientação. Às professoras
Danielle Machado (UFF) e Maria Eduarda (UNB) pelas valiosas contribuições. Também
agradeço à consultora de Business Intelligence da UERJ, Érika Araújo. Foram muitas as
vezes que eu tive de pedir ajuda sobre levantamento dos dados e sobre as particularidades da
UERJ e ela sempre se prontificou a responder às questões que levantava.
E por último o principal, repetindo o gesto da missa tridentina, quando respondemos
ao padre que proclama a entrada no altar com o Introibo (“Et introibo ad altare Dei”... )
...“Ao Deus que alegra a minha juventude” (“ad Deum qui lætificat juventutem
meam”).
v
RESUMO
Esta dissertação é formada por três diferentes capítulos. O primeiro apresenta uma análise de
diversas dimensões da política de cotas vigente na Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ), pioneira na aplicação de tais políticas no Brasil. Utilizando estatísticas descritivas
detalhadas e modelos econométricos, revelamos que a política claramente alcança o objetivo
de tornar a universidade mais acessível a grupos desfavorecidos. Porém identificamos pontos
que precisam ser melhorados, como a necessidade de alinhamento da presença de alguns
grupos à incidência populacional no estado ou dos excessivos diferenciais de notas dos
cotistas e não cotistas classificados. Em relação ao segundo capítulo, mostramos que há um
hiato de desempenho em termos de coeficientes de rendimento médio acumulado entre
cotistas e não cotistas. Também foi possível perceber que a diferença entre os grupos
aumenta em cursos com maior nível de dificuldade relativa. Por outro lado, encontramos
resultados originais para o caso da UERJ. Primeiro, devido ao fato de não ter sido possível
perceber uma queda no hiato de desempenho entre cotistas e não cotistas ao longo do curso.
Depois, pelo motivo de que as taxas de graduação entre cotistas se revelaram maiores que a
de grupos não cotistas. Nossa explicação para esta particularidade reside no fato de que para
o caso brasileiro, onde existem grandes desigualdades de oportunidade, os cotistas tendem a
atribuir um alto valor ao curso que ingressam. Por isto, persistem em uma maior proporção
na universidade a despeito de menores coeficientes de rendimento médios. O último capítulo
analisa de que medida uma política do tipo color-blind pode contribuir para o aumento da
diversidade racial e assim melhorar as condições de acesso dos negros sem discriminar
diferentes indivíduos pela cor. Simulando bases com diferentes processos de admissão,
mostramos que a presença de negros na UERJ desabaria na ausência da ação afirmativa,
pricipalmente em cursos de alto prestígio social. Além disto, uma política color-sighted que
reserve 20% das vagas se revelou suficiente para equalizar as oportunidades entre os
indivíduos de cor preta mas não foi eficaz em suprir as necessidades por redistribuição dos
pardos. Devido a baixa autodeclaração de pardos como negros, também encontramos que a
política color blind de escola e renda pode ser mais adequada para uma maior representação
dos pardos do que as duas políticas do tipo color-sighted definidas.
vi
ABSTRACT
This dissertation consists in three different chapters. The first presents an analysis of various
dimensions of the affirmative action policy currently effective at the Universidade do Estado
do Rio de Janeiro (UERJ), which pioneered the implementation of such policies in Brazil.
Using detailed descriptive statistics and econometric models we revealed that the AAP
clearly reach their goal of providing more access to students coming from disfavored
backgrounds. However, there are issues that need to be improved, such as the need to balance
the incidence of students belonging to each group or when we consider the differentials of
grades between quota and non-quota applicants. With respect to the second chapter, we
showed that there is a performance gap in terms of grade point averages built up among nonquota and quota students. It was also possible to notice that the difference between the groups
increases in courses with higher level of relative difficulty. On the other hand, we found
original results for the UERJ case. First, due to the fact that it was not possible to notice any
drop in the performance gap between quota and non-quota students throughout the course.
Second, due to the reason that graduation rates among quota students ended up being higher
in comparison to non-quota groups. Our explanation for this particular issue is in the fact
that, for the Brazilian case, where there are high inequalities of opportunities, quota students
usually highly value the course they have started. Thus, they remain at a higher proportion in
university, despite having lower grade point averages. The last chapter examines in which
extent the color-blind policy can contribute to increasing racial diversity and thus improving
the access of black individuals without discriminating people by their color of skin.
Simulating bases with different admissions process, we showed that the presence of blacks in
UERJ collapses in the absence of affirmative action, especially at courses with high social
prestige. In addition, a color-sighted policy that reserves 20% of seats proved sufficient to
equalize opportunities among black individuals but was not effective in meeting the needs of
brown people to redistribution. Due to the low self-declaration of browns as black, we also
found that the color blind school policy may be more suitable for a wider representation of
brown people than the two types of policies defined as color-sighted.
vii
LISTA DE TABELAS
Tabela 1.1. Estatísticas Descritivas do Vestibular...................................................................11
Tabela 1.2. Quantidade de Vagas, Candidatos, Relação Candidato/Vaga e Matriculados no
Período 2008/2011................................. .................................................................................13
Tabela 1.3. Relação Candidato Vaga em 2010: Grupos Cotistas e Não Cotistas...................15
Tabela 1.4. Relação de Notas Mínimas dos Matriculados no Vestibular 2010.......................16
Tabela 1.5. Percentis de Distribuição da Nota........................................................................17
Tabela 1.6. Representação Populacional de Tipo de Escola, Cor da Pele e Renda Bruta......19
Tabela 1.7. Determinantes Socioeconômicos do Acesso – Método MQO...............................21
Tabela 1.8. Determinantes do Acesso – Método Logit.......... ..................................................29
Tabela 1.9. Candidatos Cotistas Não Beneficiados pelo Sistema de Cotas.............................34
Tabela 1.10. Análise dos Candidatos Afetados pelo Sistema de Cotas....................................35
Tabela 2.1. Coeficiente de rendimento acumulado médio dos alunos ingressantes em 2005 e
com status cursando em 2006 e 2009 ......................................................................................45
Tabela 2.2. Coeficientes de rendimento médio acumulado. Visão consolidada por carreira
Tabela 2.3. Coeficiente de rendimento acumulado médio dos alunos ingressantes em 2005 e
com status concluído até 2012.................................................................................................46
Tabela 2.4. Porcentagem de concluintes até 2009, 2010 e 2011 dos alunos ingressantes em
2005..........................................................................................................................................47
Tabela 2.5. Porcentagem de concluintes até 2009, 2010 e 2011 dos alunos ingressantes em
2005 (por dificuldade relativa do curso).................................................................................49
Tabela 2.6. Taxa de evasão no primeiro ano dos ingressantes em 2005...............................51
Tabela 2.7. Taxa de evasão entre o segundo e quarto ano dos ingressantes em 2005............52
Tabela 3.1. Opinião dos estudantes da UERJ em relação às reservas de vagas (em %)........60
Tabela 3.2. Estatísticas descritivas do Vestibular (em %)..................................................60
Tabela 3.3. Simulação da composição dos candidatos em diferentes políticas de cotas........68
Tabela 3.4. Análise Displacing e Displaced sob diferentes políticas de cotas......................69
Tabela 3.5. Racial, Social e Schooling Balance sob diferentes políticas de cotas................73
Tabela 3.6. Pretos e Pardos classificados em relação ao total de candidatos autodeclarados
com a mesma cor (em %).........................................................................................................76
Tabela 3.7. Determinantes do Acesso - logit, logistic e efeitos marginais para diferentes
políticas de cotas.....................................................................................................................78
viii
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................................3
CAPÍTULO 01: UMA ANÁLISE DOS DETERMINANTES DO ACESSO À
UNIVERSIDADE SOB A PRIMEIRA AÇÃO AFIRMATIVA BRASILEIRA NO
ENSINO SUPERIOR: O CASO DA UERJ...........................................................................6
1.1 Introdução...............................................................................................................6
1.2. Descrição da política de cotas vigente na UERJ.................................................8
1.3. Descrição da base de dados...................................................................................9
1.3.1 Base do vestibular UERJ 2010..............................................................................9
1.3.2 Business Intelligence – UERJ...............................................................................9
1.4. Análise do acesso (e falta de acesso) à UERJ....................................................10
1.4.1 Estatísticas descritivas de aprovados e reprovados no vestibular, por curso.10
1.4.2 Determinantes do desempenho no vestibular da UERJ....................................20
1.4.3 Determinantes da classificação no vestibular da UERJ....................................28
1.4.4 A análise da fronteira: candidatos “displaced” e “displacing” .........................32
1.5. Conclusão.............................................................................................................36
CAPÍTULO 02. UMA ANÁLISE DA PROGRESSÃO DOS ALUNOS COTISTAS SOB
A PRIMEIRA AÇÃO AFIRMATIVA BRASILEIRA NO ENSINO SUPERIOR: O
CASO DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO...............................38
2.1 Introdução. ...........................................................................................................38
2.2 Desempenho Educacional e Ações Afirmativas.................................................40
2.3 Retornos Educacionais e A UERJ......................................................................42
2.3.1 CRs acumulados médios em 2006 e 2009 para os ingressantes em
2005..............................................................................................................................44
2.3.2 CRs acumulados médios dos alunos formados......................................47
2.3.3 Taxas de conclusão até 2009, 2010 e 2011............................................48
2.3.4 Evasão no primeiro ano e evasão no restante dos anos.........................52
2.4 Conclusão..............................................................................................................55
CAPÍTULO 03. QUAL A EFICÁCIA DE POLÍTICAS DO TIPO COLOR-BLIND
PARA O AUMENTO DA DIVERSIDADE RACIAL?
SIMULAÇÕES PARA O
PROCESSO SELETIVO DA UERJ.....................................................................................58
3.1 Introdução.............................................................................................................58
1
3.2 Descrição e justificativa das bases simuladas para o vestibular UERJ 2010..61
3.2.1 Base do vestibular UERJ 2010................................................................61
3.2.2 Base: Escola pública e renda. ................................................................61
3.2.3 Base: Cor “Preta” ..................................................................................64
3.2.4 Base: Raça negra e renda. .....................................................................66
3.2.5 Base: Meritocrático. ...............................................................................67
3.3 Resultados das Simulações...................................................................................68
3.3.1 Candidatos Cotistas por Política ............................................................68
3.3.2 Análise da Fronteira: Displacing/Displaced. .........................................69
3.3.3 A Igualdade Proporcional: Racial, Social e Schooling Balance.............72
3.3.4 Oportunidades em carreiras de alto prestígio........................................75
3.3.5 Avaliação econométrica das probabilidades de acesso – Método Logit.77
3.4 Conclusões.............................................................................................................84
CONCLUSÕES......................................................................................................................87
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................................90
2
INTRODUÇÃO
Em 2001, a assembleia legislativa do estado do Rio de Janeiro sancionou a lei n°
3.708 através da qual acaba por estabecer a primeira ação afirmativa brasileira no ensino
superior. Nos anos subsequentes, a porcentagem de universidades públicas que utilizam as
políticas de reserva de vagas ou bônus na nota para estudantes com alguma desvantagem
sócio-econômica tem crescido continuamente. Zylberstajn (2010) mostra que sete anos após a
experiência pioneira da UERJ, a porcentagem de vagas destinadas a alunos cotistas já
representava cerca de 11% do total de vagas disponíveis em universidades públicas.
Sowell (2004) em sua análise sobre diversas ações afirmativas implantadas ao redor
do mundo, mostra que tais políticas nunca se revelaram temporárias, pelo contrário, tendem a
se expandir. A explicação reside no fato de que conforme um grupo com desvantagem
socioeconômica adquire um maior poder político, consegue se organizar de tal forma que
acaba por exercer uma pressão política crescente com o intuito de expandir os programas
sociais que os beneficiam. Também se percebe o aumento dos tipos de grupos favorecidos.
Afinal, se um determinado grupo conseguiu obter reservas de vagas por não possuir
igualdade de oportunidades, outros grupos que se veem na mesma condição tendem a se
organizar e pleitear os mesmos beneficios.
No Brasil não foi diferente, após uma considerável difusão de políticas de ação
afirmativa em diversas universidades públicas e privadas do país, os defensores deste tipo de
política acabaram por obter duas vitórias significativas no ultimo ano. Em abril de 2012, o
Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro declarou como constitucional a adoção pela UNB
do critério de cota racial em seu processo seletivo. Em agosto, foi sancionada pela presidente
Dilma Rousseff a lei n° 12711 que estabelece 50% das vagas das universidades federais para
o sistema de cotas. A partir deste momento, as instituições de ensino superior (IES) do
governo federal passam a ter como meta atingir durante os próximos anos o total de 50% de
reserva de vagas para alunos oriundos do ensino médio público. Sendo que dentro deste
percentual deve haver uma outra reserva, considerando a proporção de pretos, pardos e
indígenas em cada estado.
Desta forma, as políticas de ação afirmativa têm sido amplamente debatidas no pais,
tanto em relação à sua validade, quanto em relação aos possíveis desenhos que ela pode
assumir. É uma das principais politicas de inclusão do governo e, talvez, a mais polêmica.
3
Também são poucos os estudos empíricos no Brasil desta natureza e neste sentido, esta
dissertação pretende fornecer resultados que possam contribuir para o debate.
Dentre as contribuições brasileiras, destacamos algumas publicações. Tannuri-Pianto
e Francis (2012a; 2012b) abordam o acesso e a progressão dos alunos da Universidade
Nacional de Brasília (UNB) e não encontram evidências relativas a diferenciais no
coeficiente de rendimento (CR) apresentados pelos grupos cotistas e não cotistas. Pedrosa
et.al (2007) mostra que os cotistas apresentaram um melhor desempenho relativo na
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) do que os não cotistas quando comparados
os rankings de classificação no vestibular e ao final da graduação. Utlizando os dados do
Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (ENADE), Waltenberg e Carvalho (2012)
revelam que há um diferencial de performance entre não cotistas e cotistas para as
universidades públicas. Não encontraram diferenças significativas entre os estudantes de IES
privadas.
Nos propusemos a avaliar a experiência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ) utilizando bases até então pouco exploradas. Esta dissertação se encontra organizada
em três diferentes capítulos.
O primeiro aborda as questões relativas ao acesso à
universidade e como as ações afirmativas afetam a composição do corpo estudantil.
Identificamos que para o vestibular de 2010 a relação candidato/vaga entre os grupos cotistas
foi de 1,17. Como consequência da baixa concorrência, para a maioria dos cursos, só foi
necessário tirar uma nota acima do mínimo para ter uma vaga garantida na instituição. Em
relação aos não cotistas, a alta concorrência se traduziu em notas médias de classificação
consideravelmente maiores em todos os cursos. Também percebemos que a UERJ foi eficaz
em captar candidatos que de outra forma não conseguiriam se classificar. Da análise dos
candidatos afetados pela política foi possível perceber que o perfil sócioeconômico dos
beneficiados pela reserva de vagas é considerávelmente pior do que o dos prejudicados pelo
sistema. Por último percebemos que a política visivelmente prejudica candidatos brancos de
classe pobre e média advindos de colégios privados.
O segundo analisa a progressão de alunos cotistas e não cotistas com o intuito de
responder como tem se mostrado o desempenho destes grupos. Percebemos diferenciais em
termos de CRs médios entre grupos não cotistas e cotistas e que tal diferencial aumenta em
cursos com um alto nível de dificuldade relativa. Porém, quando analisamos as taxas de
graduação, foi possível perceber que os cotistas se graduam à taxas maiores que os não
cotistas. Justificamos estes resultados através da argumentação de que apesar de possuírem
4
maiores dificuldades em progredir, na média, os cotistas atribuem um maior valor para o
curso que estão matriculados e por isto persistem até o final da graduação.
Por fim, procuramos verificar no terceiro capítulo como outras políticas podem alterar
as probabilidades de admissão de diferentes indivíduos. Para isto, simulamos composições de
candidatos cotistas com base em outras políticas de reservas de vagas. Encontramos como
principal resultado que a política racial favorece a composição de pretos na universidade mas
se mostrou menos eficaz que uma política que não discrimina por cor para aumentar a
composição racial de pardos. Percebemos ainda que a política voltada para alunos oriundos
do ensino médio publico pode aumentar a proporção de estudantes pardos e pretos em dois
pontos percentuais.
Pelas principais contribuições listadas acima e por outras detalhadas ao longo dos
capítulos, acreditamos que os resultados encontrados ao longo desta dissertação podem
contruibuir amplamente com o debate em torno das ações afirmativas.
5
CAPÍTULO 01: UMA ANÁLISE DOS DETERMINANTES DO ACESSO À
UNIVERSIDADE SOB A PRIMEIRA AÇÃO AFIRMATIVA BRASILEIRA NO
ENSINO SUPERIOR: O CASO DA UERJ*
1.1 Introdução
Pesquisas cujo objeto de estudo são ações afirmativas no ensino superior têm sido
tema recorrente entre economistas e demais cientistas sociais. Muitas experiências foram
analisadas nos últimos anos, refletindo-se em uma literatura internacional considerável. Nos
Estados Unidos, Bowen e Bok (1998) mostram que a proporção de negros nas principais
universidades pesquisadas caíria de 7,8% para 2,1% na ausência de ações afirmativas. Os
indianos optaram pela definição do sistema de cotas para as castas mais prejudicadas, de
forma que entre 22,5% e 49,5% das vagas nas universidades federais são preenchidas pelos
grupos discriminados (BERTRAND e HANNA, 2008). Entre 1982 e 2004, a porcentagem de
negros matriculados na University of Cape Town avançou de 13% para 49%. (WYDICK,
2008). Aumento que se explica pelo fato de a raça favorecida pelo sistema de cotas sulafricano ser a negra.
Contrastando com a experiência internacional, ainda são raros os artigos empíricos
sobre a avaliação de ações afirmativas no Brasil. Destacamos as publicações de TannuriPianto e Francis (2012a; 2012b) que abordam o acesso e a progressão dos alunos da
Universidade Nacional de Brasília (UNB). Percebemos contribuições no campo normativo,
feitas por pesquisadores de outras áreas, tais como Arruda (2007), Brandão (2007), Feres
Junior e Zoninsein (2006) e Peria (2004). Há ainda economistas que abordam questões
importantes mas que de alguma forma fogem das preocupações centrais deste trabalho, como
o impacto da introdução do sistema de cotas na eficiência dos gastos públicos (ANDRADE,
2004) e no esforço empregado por candidatos cotistas e não cotistas na preparação para o
vestibular (FERMAN, 2006; ZYLBERSTAJN, 2010).
A escassez de publicações nesta área de conhecimento é conseqüência da experiência
brasileira recente com ações afirmativas, resultado natural do declínio da teoria da
democracia racial e do fortalecimento daqueles que acreditam haver no Brasil um racismo de
fato (TELLES, 2003). Além de recente, tais ações foram implantadas sem debate político
*
Uma versão deste capítulo foi apresentada no XL Encontro Nacional de Economia em Porto de Galinhas - PE
6
entre a população, sendo resultado de decretos ministeriais e da aplicação da lei nas
universidades estaduais do Rio de Janeiro (MAGGIE E FRY, 2002). Com a existência de
experiências consolidadas em território nacional, é possível avançarmos das avaliações
iniciais, exclusivamente ideológicas, para um debate que possa se valer de evidências
empíricas.
Para contribuir com este debate, avaliamos o acesso de alunos da primeira e maior
política de ação afirmativa brasileira: a reserva de vagas para a Universidade do Estado do
Rio de Janeiro (UERJ). Ela iniciou-se em 2001 com a promulgação da lei regulamentadora.
Muitos autores consideram o projeto de lei original da assembléia estadual fluminense como
o principal marco para o inicio deste tipo de política no Brasil (BRANDÃO, 2007; PERIA,
2004; SANTOS, 2006). Trata-se de uma universidade que oferece 57 cursos de graduação
distribuídos por cinco campi (Maracanã, São Gonçalo, Baixada Fluminense, Resende e Nova
Friburgo), são cerca de 38 mil candidatos concorrendo a mais de 5 mil vagas oferecidas no
vestibular (dados de 2010). Cesar apud Brandão (2007) lista as universidades UNB, UNEB,
UFPR, UEMS, UFBA, UFPA como alguns dos exemplos que comprovam a rápida
disseminação para os outros estados da federação. Zylberstajn (2010) mostra a expansão da
porcentagem de vagas destinadas a cotas em universidades públicas de 3,1% em 2004 para
11,2% em 2008.
Apesar do mérito da instituição pesquisada de fomentar questões relativas ao debate
em termos de igualdade de oportunidades, percebem-se como consequência do pioneirismo,
alguns problemas. Na época da promulgação da lei das reservas de cotas não havia
experiências no Brasil que pudessem servir como exemplo para uma análise criteriosa acerca
de questões importantes sobre os grupos a serem beneficiados e o quantitativo de vagas que
deveria ser reservado a cada um deles. Consequentemente há de se esperar que esta política,
em particular, contenha alguns pontos passíveis de aprimoramento.
A boa notícia é que durante este período houve o estabelecimento de uma base
histórica sólida pelo departamento de informática da UERJ sobre a qual pudemos trabalhar.
Ao fornecemos números sobre a atual política da UERJ pretende-se contribuir para um
melhor entendimento do acesso e progressão de candidatos provenientes de grupos
desfavorecidos, nas universidades brasileiras.
A estrutura do capítulo segue o seguinte formato. A seção 1.2 descreve o atual
formato da política de cotas e do processo de admissão do vestibular da UERJ. A seção 1.3
informa sobre as bases de dados específicas da UERJ utilizadas na presente pesquisa. A seção
7
1.4 apresenta as estatísticas descritivas do acesso, detalha os determinantes da classificação
por meio da aplicação de técnicas econométricas e aborda a análise dos candidatos que são
diretamente afetados pela política de ação afirmativa. A seção 1.5 apresenta a conclusão com
as principais questões identificadas nos itens anteriores.
1.2. Descrição da política de cotas vigente na UERJ
O sistema de cotas da UERJ é regulamentado por lei e teve início no vestibular para o
acesso à universidade em 2003. Após revogações e alterações nos projetos originais, a lei
vigente que estabelece as diretrizes desta política é a de N°5346/2008. Ela identifica cinco
tipos de grupos minoritários com consideráveis desvantagens socioeconômicas, que
concorrem à vagas assim repartidas: 20% para estudantes negros e indígenas; 20% para os
estudantes oriundos da rede pública de ensino; 5% para pessoas com deficiências e filhos de
policiais civis, militares, inspetores de segurança ou administração penitenciária mortos ou
incapacitados por razão de serviço. Para todas essas situações o candidato deve atender a uma
condição de carência em termos de renda per capita que a instituição estipula ano a ano.
Atualmente a imposição é de que a renda per capita mensal bruta da família do beneficiário
seja igual ou inferior a R$960 reais. (Doravante quando se fizer referências a algum desses
grupos, entenda-se que se considere o atendimento à condição de carência.)
Nos vestibulares, como se sabe, aqueles que obtiverem as maiores notas dentro de
cada carreira são selecionados. Na UERJ, devido ao sistema de cotas, a competição entre os
alunos se faz dentro de cada categoria, considerando o percentual que lhes cabe. Caso haja
vagas não preenchidas por algum dos grupos cotistas, elas são automaticamente
redirecionadas para os não cotistas.
O vestibular é composto por duas fases. A primeira etapa é o exame de qualificação,
composto de 60 questões objetivas. A nota do vestibulando é atribuída por faixas que vão de
“A” (melhor rendimento) a “E” (pior rendimento). Uma recomendação “A” acrescenta um
bônus de 20 pontos à nota final do individuo e as demais, 15, 10 e cinco respectivamente. O
exame de qualificação é realizado duas vezes ao ano e a principal nota é a considerada pela
instituição. Aqueles que conseguiram obter em uma das duas tentativas uma recomendação
melhor que “E” estão aptos para concorrer na segunda etapa. A segunda fase é o exame
discursivo. Neste momento o candidato deve escolher o curso e informar se deseja concorrer
por uma vaga reservada pelo sistema de cotas, caso em que deve comprovar a carência e a
8
categoria. Para cada carreira são realizadas três provas discursivas que valem 20 pontos cada.
As disciplinas que compõem as três provas variam com a carreira pretendida e cada uma
delas possui uma prova com peso “2” cuja nota é duplicada. A nota final de um candidato
varia de zero a cem e é a soma dos resultados de cada uma das fases.
1.3. Descrição da base de dados
1.3.1 Base do vestibular UERJ 2010
Parte dos dados que utilizamos são provenientes da base do vestibular realizado pela
UERJ para o ano de 2010. Ela contém informações detalhadas sobre cada aluno, das quais
destacamos as notas finais, carreira escolhida, idade, gênero, status do aluno e as respostas
dos candidatos ao questionário sociocultural.
A amostra original contempla 32.557
candidatos, 2.592 dos quais foram eliminados por falta à prova e 2.549 foram extraídos da
base devido ao não preenchimento dos questionários sócio-culturais. Somando-se a duas
observações outliers excluídas pela baixa idade apresentada, temos disponíveis para a análise
econométrica um total de 27.415 observações.
Comparamos as notas médias dos alunos que responderam ao questionário com os
que optaram por não fazer. Foi percebida uma diferença de apenas 3,4% a favor daqueles que
não se propuseram a preencher o questionário (42,08 pontos contra 40,68). Logo, não há
motivos aparentes para supormos que a ausência de resposta siga um padrão diferente de um
comportamento aleatório.
A base de dados possui informações sobre os classificados e não sobre os
efetivamente matriculados. Isto implica que aqueles que acabaram por se tornar alunos da
instituição através de ciclos de reclassificação não foram contabilizados dentre aqueles
admitidos. Para o vestibular de 2010, 23% das matrículas foram efetivadas em ciclos de
reclassificação. Por isto alertamos que a leitura correta da variável dependente em regressões
logísticas (seção 4) deve ser entendida como a probabilidade de classificação, e não de
matrícula. O fato de as vagas serem reservadas pode servir como um possível amenizador da
inexistência de uma variável do tipo “matriculado” nos dados disponibilizados.
1.3.2 Business Intelligence – UERJ
9
O Business Intelligence (BI) é uma ferramenta desenvolvida pelo departamento de
informática da UERJ (DINFO). Sua função é fornecer aos gestores da instituição dados
relevantes sobre o vestibular e a progressão dos alunos na universidade. A ferramenta extrai
informações detalhadas das bases de dados da UERJ de vestibular e graduação, as transforma
e depois as consolida em estatística descritiva. É um processo definido como ETL
(extract,transform and load) e o seu resultado final é uma interface amigável capaz de
municiar gestores com dados relevantes para tomadas de decisão. O sistema possibilita a
geração de indicadores através da definição pelo usuário dos filtros a serem aplicados. Desta
forma foi possível verificar diferentes dimensões: cotistas e não cotistas, séries temporais e
visões detalhadas por carreira são alguns exemplos. Ao contrário dos microdados
mencionados na subseção 3.1, esta base possui informações sobre os efetivamente
matriculados, de forma que se torna possível a exposição de indicadores que envolvem a
variável matrícula.
1.4. Análise do acesso (e falta de acesso) à UERJ
A estratégia empírica para avaliação do acesso se dividirá em três subseções.
Inicialmente analisamos os dados consolidados do vestibular em forma de estatística
descritiva. São verificadas questões como a distribuição dos perfis socioeconômicos por
faixas de notas, relação candidato/vaga, ociosidade, notas mínimas e vagas por carreira. Após
isto, seguimos com abordagens econométricas. Aplicamos as técnicas de mínimos quadrados
ordinários para estimar como fatores relativos à renda, ensino dos pais, tipo de escola e raça
afetam a nota dos candidatos. Regressões logísticas são utilizadas com controles para cursos e
tipo de vaga visando se verificar as probabilidades de classificação em diferentes grupos. Por
fim, procuramos entender o impacto da introdução do sistema de cotas através da análise do
perfil socioeconômico dos alunos afetados e do quantitativo de alunos cotistas que não
precisariam da política de ação afirmativa para obter uma vaga na universidade.
1.4.1 Estatísticas descritivas de aprovados e reprovados no vestibular, por curso.
Ao aplicar o ferramental de estatística descritiva a este capítulo pretendemos gerar
resultados empíricos relevantes para apoiarmos duas visões iniciais que precisam ser
consideradas por formuladores de políticas de ação afirmativa. Primeiro, abordaremos como
10
os condicionantes econômicos e sociais podem agir como uma barreira, ou então como um
facilitador, no desempenho final de um candidato ao vestibular da UERJ. Em um segundo
momento, será analisada a estrutura da oferta de vagas pela universidade e as compensações
(ou distorções) causadas pelo sistema de cotas, uma vez que, dependendo das características
de um candidato (cotista ou não cotista) e de suas escolhas de carreira, elas também podem
agir como restrições ou oportunidades de acesso.
Utilizando as informações disponíveis na base da universidade, investigamos os
resultados apresentados por candidatos com diversos perfis socioeconômicos. Para isto,
separamos os indivíduos em cinco faixas de notas no vestibular com um intervalo de vinte
pontos cada e verificamos suas diversas características. Os resultados são reveladores e se
encontram dispostos na Tabela 1.1. A distribuição das notas finais dos candidatos é mais um
indício da baixa qualidade da educação básica brasileira. Mais de 50% dos candidatos
apresentaram uma nota máxima de 40 pontos. Na outra ponta, apenas 12% dos indivíduos se
situaram na faixa daqueles que apresentaram uma média final acima de 60 pontos.
Tabela 1.1. Estatísticas Descritivas do Vestibular
>80 Variáveis
0 - 20
>20 - 40 >40 - 60 >60 - 80
100
Distribuição das notas
6.89% 47.52% 32.40% 11.49%
1.70%
Distribuição da taxa de classificação
0.00% 38.01% 36.91% 21.34%
3.48%
Sexo Feminino
59.63% 57.20% 52.10% 52.54% 55.91%
Fez Pré Vestibular
55.56% 53.97% 51.01% 54.42% 72.47%
Fez Vestibular Anterior
68.70% 74.57% 80.44% 82.45% 91.40%
Cor
Ensino da Mãe
Branca
43.75% 54.85% 67.28% 75.14% 73.97%
Parda
30.77% 26.64% 21.72% 17.48% 17.84%
Preta
21.92% 14.81%
8%
4.80%
6.40%
Amarelo
2.38%
2.52%
2.03%
1.65%
1.07%
Indígena
1.16%
1.15%
0.94%
0.85%
0.64%
Nenhum
3.60%
1.70%
0.82%
0.22%
0.21%
Fundamental
29.23% 20.91% 11.26%
6.29%
5.37%
Médio
42.84% 41.06% 32.60% 23.90% 22.58%
Superior
20.81% 34.13% 53.83% 68.56% 70.96%
11
Ensino do Pai
Não Informado
3.49%
2.17%
1.47%
1.01%
0.86%
Nenhum
3.76%
1.86%
0.88%
0.41%
0.22%
Fundamental
28.28% 20.77% 12.32%
6.87%
5.59%
Médio
39.46% 38.96% 31.54% 24.13% 20.43%
Superior
19.07% 32.15% 51.54% 65.86% 71.40%
Não Informado
9.43%
6.26%
3.72%
2.73%
2.37%
Menor que 3
48.94% 31.18% 15.07%
7.88%
7.31%
Entre 3 e 5
30.24% 30.00% 22.83% 16.47% 10.97%
Renda Bruta
Entre 5 e 10
13.77% 23.69% 29.11% 26.89% 26.02%
Domiciliar
Entre 10 e 20
5.14% 10.98% 20.89% 26.83% 30.97%
Entre 20 e 30
1.38%
2.91%
7.91% 13.45% 14.84%
Maior do que 30
0.53%
1.24%
4.19%
8.49%
9.89%
Estadual
53.13% 33.05% 12.99%
4.13%
3.87%
Privada
41.47% 55.12% 65.51% 67.93% 68.39%
Municipal ou
Tipo de Escola
Federal
2.38%
7.71% 14.56% 14.14% 13.33%
3.02%
4.13%
Fora do RJ e/ou
Brasil
6.94% 13.80% 14.41%
IDH abaixo de 8,5
26.48% 22.98% 15.68%
9.22%
9.03%
IDH entre 9 e 8,5
12.18% 13.54% 13.31% 11.41%
9.89%
Bairros da cidade
IDH entre 9,5 e 9
10.06% 14.03% 18.73% 19.39% 20.86%
do RJ
IDH acima de 9,5
3.81%
6.35% 14.98% 22.98% 27.31%
Fora da cidade do
RJ
47.46% 43.10% 37.31% 37.00% 32.90%
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
Ao analisarmos o perfil socioeconômico dos candidatos por faixa de nota podemos
perceber fortes correlações entre as características listadas e o resultado apresentado no
vestibular. Conforme a nota avança, percebemos incrementos nas proporções daqueles que
prestaram vestibular em ano anterior ou pré-vestibular. Os autodeclarados brancos aumentam
a sua nota final progressivamente entre os níveis de 44% para 74%. Já os autodeclarados
pretos seguem o caminho inverso, de 22% para 6,4%. Alunos cujos pais possuem ensino
superior são apenas 20% dos que apresentaram os piores resultados enquanto esta proporção
12
aumenta para 70% no topo da distribuição. Efeitos dessas magnitudes são percebidos nas
outras variáveis que incluímos para análise. Aqueles que possuem renda familiar maior do
que vinte salários mínimos foram menos de 2% do total dos que obtiveram os piores
resultados. Este número aumenta continuamente até o patamar de 25%. Os egressos de
escolas privadas e federais avançam na composição por faixa de nota em detrimento daqueles
que saíram de escolas municipais ou estaduais. O mesmo comportamento se percebe nos
candidatos advindos de bairros com altos índices de desenvolvimento humano em detrimento
daqueles que moram em locais com baixo IDH.
Avaliamos os impactos da estrutura da oferta de vagas e da ação afirmativa nas
chances de um candidato. Partindo do sistema de BI mapeamos questões relativas ao acesso
na Tabela 1.2. Os dados disponibilizados se referem aos anos de 2008 a 2011. Neste período
a quantidade de candidatos aumentou 38% enquanto as vagas disponíveis permaneceram
praticamente estáveis. Como resultado a relação candidato/vaga aumentou tanto para os
cotistas quanto para os não cotistas. O indicador alcançou no vestibular 2011 o resultado de
doze candidatos/vaga entre os não cotistas.
Já para os grupos beneficiados, o acesso
continuou em níveis próximos a um. Entre os portadores de deficiência e filhos de alguns
tipos de servidores mortos em função do exercício da profissão, a relação candidato vaga tem
se mostrado inexpressiva. Logo, quando analisamos os dados para os últimos anos,
concluímos que estamos próximos de um patamar onde não há concorrência entre os
candidatos dos tipos contemplados pelas cotas.
Tabela 1.2. Quantidade de Vagas, Candidatos, Relação Candidato/Vaga e Matriculados no
Período 2008/2011
Relação
Ano
2008
Cotista
Negros
Port. deficiência/indígena
Rede Pública
Não Cotista
2009
Cotista
Quantidade de
Total de
Candidato
Total de
Vagas
Candidatos
/ Vaga
Matriculados
5,215
2,392
1,048
295
1,049
2,823
5,223
2,396
27,586
2,022
673
57
1,292
25,564
34,220
2,822
5.29
0.85
0.64
0.19
1.23
9.06
6.55
1.18
4,870
1,127
423
28
676
3,743
4,864
1,384
13
Negros
Port. deficiência/indígena
Rede Pública
Não Cotista
2010
Cotista
Negros/Indígenas
Port. deficiência/FM...
Rede Pública
Não Cotista
2011
Cotista
Negros/Indígenas
Port. deficiência/FM...
Rede Pública
Não Cotista
Total geral
1,050
296
1,050
2,827
5,287
2,424
1,062
300
1,062
2,863
5,292
2,427
1,063
301
1,063
2,865
21,017
1,149
74
1,599
31,398
32,765
2,830
1,174
35
1,621
29,935
38,159
3,360
1,477
36
1,847
34,799
84,932
1.09
0.25
1.52
11.11
6.20
1.17
1.11
0.12
1.53
10.46
7.21
1.38
1.39
0.12
1.74
12.15
4.04
541
53
790
3,480
4,716
1,510
648
24
838
3,206
4,978
1,563
683
22
858
3,415
18,195
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
Diante da primeira descoberta, optamos por verificar os dados em um nível detalhado
por carreira. A Tabela 1.3 mostra o cenário da distribuição das vagas com uma visão centrada
nos cursos oferecidos e nas taxas de ociosidade do vestibular 2010. Das 57 carreiras, 41
(71%) não foram totalmente preenchidas pelos grupos cotistas. Entre os cursos de altíssimo e
alto prestígio1, o preenchimento das vagas tende a 100%. A maior porcentagem de ociosidade
para carreiras classificadas como altíssimo prestígio não ultrapassa 5%. Entre as carreiras
com baixo prestígio as taxas de ociosidade com frequência têm atingindo os valores de 70% a
90%. Uma vez que os cursos de alto prestígio são concorridos, acreditamos que para estas
carreiras, a quantidade de cotistas aptos está sendo suficiente para o preenchimento das
vagas. Possivelmente os candidatos cotistas estão aproveitando a oportunidade para concorrer
a cursos com maior prestígio; em um sistema sem a reserva de vagas, não vislumbrariam a
possibilidade de classificação.
1
Cursos de altíssimo prestígio: Desenho industrial, engenharia química, jornalismo e medicina. Cursos de alto
prestígio: Ciências biológicas, direito, engenharia de produção, engenharia mecânica, geologia, odontologia,
psicologia, química e relações públicas. As carreiras foram classificadas em altíssimo, alto, médio ou baixo
prestígio de acordo com as respectivas disposições de relação candidato-vaga: acima de 15, entre 15 e 10,
entre 10 e 5, abaixo de 5.
14
Tabela 1.3. Relação Candidato Vaga em 2010: Grupos Cotistas e Não Cotistas
Preenchimento
Carreiras*
Tipo de
Cotista
das vagas por
Prestígio
Total
cotistas (em
Não
Total
Cotista geral
%)
Desenho Industrial (RIO)
Altíssimo
2.63
100.00
35.79 20.63
Engenharia Química (RIO)
Altíssimo
2.47
100.00
27.43 16.20
Ciências Biológicas (RIO)
Alto
1.87
100.00
22.30 12.51
Direito (RIO)
Alto
2.81
100.00
18.95 11.50
Engenharia de Produção (RIO)
Alto
1.21
100.00
19.84 11.15
Engenharia Mecânica (RIO)
Alto
2.07
100.00
23.41 13.45
Administração (RIO)
Médio
2.07
98.15
16.02
9.74
Ciências Contábeis (RIO)
Médio
1.57
98.15
9.11
5.72
Ciências Econômicas (RIO)
Médio
0.89
70.31
10.20
5.94
Ciências Sociais (RIO)
Médio
1.35
100.00
9.22
5.60
Enfermagem (RIO)
Médio
1.72
100.00
12.57
7.69
Engenharia Cartográfica (RIO)
Médio
0.58
29.17
9.04
4.98
Engenharia Civil (RIO)
Médio
1.48
100.00
15.03
8.93
Engenharia de Computação (NF)
Médio
1.17
75.00
11.31
6.44
Artes Visuais (RIO)
Baixo
0.88
59.38
8.24
4.87
Ciências Atuariais (RIO)
Baixo
0.19
14.29
4.21
2.33
Ciências Biológicas (SG)
Baixo
0.78
50.00
5.05
3.13
Educação Física (RIO)
Baixo
0.59
33.93
6.47
3.73
Engenharia de Produção (RS)
Baixo
0.59
41.30
7.76
4.46
Engenharia Mecânica (NF)
Baixo
0.72
61.11
7.93
4.69
Estatística (RIO)
Baixo
0.14
9.52
4.23
2.32
Filosofia (RIO)
Baixo
0.46
41.30
4.22
2.49
* a relação completa para todas as carreiras pode ser solicitada para os autores.
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
Para analisarmos os efeitos dentro de cada tipo particular de cota, investigamos a
concorrência pelas vagas em um segundo nível, agora entre as diversas categorias
15
contempladas no vestibular de 2010. Em todos os cursos, a reserva de 5% para deficientes e
filhos de mortos em razão de serviço se manteve em níveis menor ou igual a um
candidato/vaga. Em muitas delas não houve candidato. Podemos concluir que há vagas
demais para esta categoria. A relação candidato-vaga entre os cotistas atinge o máximo para a
carreira mais concorrida da UERJ, medicina. Mesmo entre os negros e estudantes de escola
pública, foram diversas as carreiras que apresentaram uma relação menor do que um. Como
consequência, passamos a esperar que as notas mínimas de classificação dos grupos cotistas
flutuassem próximas ao nível estabelecido para que um candidato não seja reprovado por
nota (20 pontos). Esta intuição foi confirmada, conforme se observa na Tabela 1.4, que
mostra os matriculados por notas mínimas em alguns dos cursos oferecidos pela instituição.
Para desenho industrial, um curso de altíssimo prestígio, os alunos não cotistas precisaram
atingir a nota mínima de 73,25, enquanto entre os cotistas a linha de corte atingiu os
22,5pontos.
Tabela 1.4. Relação de Notas Mínimas dos Matriculados no Vestibular 2010
Tipo de Vaga
Carreira
Prestígio
Negros
Rede Pública
Deficientes
Não Cotista
Desenho Industrial (RIO) Altíssimo
22.5
44.5
Sem candidatos
73.75
Direito (RIO)
Alto
38.25
42.75
21.5
44.25
Informática (RIO)
Médio
20.5
20
28.5
42.25
Educação Física (RIO)
Baixo
20
20.25
25.25
25
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
O Rio de Janeiro é caracterizado por ser uma unidade da federação com muitas
universidades de alta qualidade e, como consequência, muitos candidatos classificados não
realizam matrículas na UERJ, optando por outras instituições. Esse efeito se materializa
através de relações candidato/vaga superestimadas. A porcentagem dos candidatos que
obtiveram nota maior que a mínima necessária para realização da matrícula mitiga este tipo
de problema. Desta forma, a não efetivação da inscrição passa a depender tão somente da
decisão do candidato. Os resultados encontrados estão expostos na Tabela 1.5. Entre os
cotistas, uma parcela pequena da distribuição está sendo contemplada pelas vagas. A alta
concorrência dentro do tipo resulta na seleção de candidatos que se encontram na faixa dos
12,78% e 14,57% melhores da carreira de administração e engenharia mecânica, por
16
exemplo. Para o curso de desenho industrial, apenas 3,57% são convocados no primeiro
momento pela UERJ para realização da matrícula. Ao analisarmos os grupos cotistas, os
resultados se direcionam para a ponta inferior da distribuição. Todos os cotistas negros e
advindos de escolas públicas que optaram por ciências atuariais foram convocados. Os
valores com freqüência atingem de 80 a 90% da distribuição nos tipos cotistas.
Particularmente, para a reserva relativa aos “deficientes e filhos de mortos / incapacitados”, a
distribuição atinge a totalidade dos candidatos, desde que eles consigam obter as notas
mínimas.
Tabela 1.5. Percentis de Distribuição da Nota
Percentil da distribuição classificada no vestibular
Carreira**
Grupo de Prestígio
NC
DF
NI
RP
*
100.00%
29.03%
Desenho Industrial
Altíssimo
3.51%
Engenharia Química
Altíssimo
11.88% 100.00%
47.50%
50.00%
Ciências Biológicas
Alto
17.65%
61.29%
61.70%
Direito
Alto
56.06% 100.00%
36.87%
36.56%
Engenharia de Produção
Alto
28.22% 100.00%
80.00%
100.00%
Engenharia Mecânica
Alto
14.57% 100.00%
73.33%
81.08%
Administração
Médio
12.78% 100.00%
60.98%
55.00%
Ciências Contábeis
Médio
22.55%
*
74.19%
72.92%
Ciências Econômicas
Médio
44.15%
*
96.15%
96.15%
Ciências Sociais
Médio
28.20% 100.00%
87.10%
88.46%
Enfermagem
Médio
15.20%
0.00%
63.64%
67.57%
Engenharia Cartográfica
Médio
31.55%
*
55.56%
60.00%
Engenharia Civil
Médio
19.50%
0.00%
77.78%
77.78%
Engenharia de Computação
Médio
48.74%
*
0.00%
90.00%
Artes Visuais
Baixo
38.29%
*
91.67%
92.31%
Ciências Atuariais
Baixo
67.96%
*
100.00% 100.00%
Ciências Biológicas-FFP
Baixo
55.26%
*
100.00%
68.42%
Educação Física
Baixo
55.43% 100.00%
80.00%
64.71%
Engenharia de Produção
Baixo
45.48%
100.00% 100.00%
*
*
17
Engenharia Mecânica-IPRJ
Baixo
29.82%
*
100.00%
93.75%
Estatística
Baixo
68.05%
*
66.67%
66.67%
Filosofia
Baixo
60.66%
*
100.00%
93.33%
*sem candidatos.
** a relação completa para todas as carreiras pode ser solicitada para os autores.
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
Desses resultados, emergem dois posicionamentos normativos que podem respaldar
diferentes ações no campo de políticas de ação afirmativa. Os defensores da diminuição da
porcentagem de reserva de vagas podem se valer do que Roemer (1998) define como
igualdade de oportunidades. Os defensores desta teoria argumentam que o resultado de um
indivíduo é devido em parte aos condicionantes socioeconômicos aos quais está submetido;
em parte aos seus esforços. Desta forma, apenas a parcela das desigualdades atribuídas aos
diferenciais de circunstâncias seria injusta, devendo por tanto ser corrigida. Traduzindo para
os dados da Tabela 1.5, isto significa aproximar os diversos percentis de nota no vestibular
entre os grupos cotistas e não cotistas. Uma consequência direta desta política para o caso da
UERJ implica diminuir drasticamente as reservas de vagas para os grupos cotistas.
Apesar de parecerem injustas certas características do sistema de cotas da UERJ, a
baixa concorrência identificada entre os tipos favorecidos pode ser justificada pelo que Fryar
e Hawes (2011) chamam de “pipeline effect”. Nela, os pesquisadores vêem a progressão dos
alunos pelos diferentes níveis de ensino como um fluxo que deve passar por toda uma rede de
encanamentos (“pipelines”) até o mercado de trabalho. Como os grupos socialmente
desfavorecidos se graduam a taxas bem menores no ensino médio, pode ocorrer que a oferta
de candidatos não seja suficientemente alta para garantir um pleno acesso à universidade
destes grupos, mesmo diante de uma oferta considerável de vagas pelas instituições. O que
implica em relações candidato-vaga consideravelmente menores para grupos cotistas. Com o
objetivo de comprovarmos empiricamente esta hipótese, confrontamos os dados da UERJ
com a PNAD e os resultados se encontram na Tabela 1.6. No ensino médio 75% da
população estudam em escolas públicas. Apesar de ser o tipo de escola da maioria dos
estudantes fluminenses, a proporção desses alunos matriculados em alguma carreira da UERJ
foi de apenas 33,67% em 2010. A baixa proporção dos matriculados que pertenceram às
escolas estaduais é explicada pela melhor preparação dos alunos egressos do ensino médio
privado, responsáveis por 53,62% das matrículas. Ao comparamos a representatividade de
pretos e pardos na população do Rio de Janeiro em relação àqueles matriculados no ensino
18
superior, percebemos que, apesar de serem 32,53% e 11,11%, respectivamente, dos
habitantes do estado eles compõem apenas 24,01% e 5,41% das matrículas nas universidades
do Rio de Janeiro.
Tabela 1.6. Representação Populacional de Tipo de Escola, Cor da Pele e Renda Bruta
Tipo de Escola (RJ)
Nível de Ensino
Cor da Pele (RJ)
Renda Bruta (RJ)
Baixa
Publica
Particular
Branco
Pardo
Preto
(Abaixo
de 3 S.M)
Alta
(Acima
de 3
S.M)
Ensino
Fundamental
74.64%
25.36%
49.87% 38.44% 11.25%
66.60%
33.40%
Ensino Médio
75.60%
24.40%
40.50% 39.24% 18.98%
53.69%
46.31%
Ensino Superior
25.50%
74.50%
70.35% 24.01% 5.41%
16.09%
83.91%
UERJ - Candidatos 33.67%
66.33%
60.77% 24.13% 11.81%
32.21%
67.79%
46.37%
53.62%
55.27% 25.24% 16.10%
24.10%
75.90%
47.92%
52.08%
83.33% 14.58% 2.08%
20.80%
79.20%
N/A
N/A
55.90% 32.53% 11.11%
57.08%
42.92%
UERJ Matriculados
Mestrado ou
doutorado
Representatividade
na População do
RJ
Fonte: Elaboração própria com dados da PNAD e Business Intelligence - UERJ.
Se considerarmos as desigualdades proporcionais como aquelas dadas pela diferença
entre a representação de certo grupo na população e o que é efetivamente verificado nas
universidades, percebemos que este tipo de desigualdade é menor na UERJ em relação às
outras instituições de ensino superior, devido em grande parte, ao sistema de cotas.
Segundo Feres Junior (2006), este conceito é amplamente utilizado para justificação e
estabelecimento de percentuais de reserva de vagas para diferentes castas na Índia. Aplicando
para o caso da UERJ, percebe-se que tais diferenças são amenizadas em relação aos pardos e
completamente suprimidas para os pretos. Cabe notar que ao adotar um sistema de cotas para
a cor preta, o impacto na admissão de candidatos pretos se torna significativamente forte.
19
Como resultado, temos que, ao invés de equalizar oportunidades entre as diversas cores, a
UERJ fomenta desigualdades em favor dos autodeclarados pretos.
Dentre as variáveis mapeadas, as desigualdades de renda são as de maior magnitude
quando se analisa o acesso ao ensino superior. Embora a composição da população
fluminense seja de 57,08% de pessoas com renda per capita até 1 S.M, o universo de
matriculados em instituições do ensino superior que possuem a faixa mais baixa de renda
declarada é de 16,09% no Rio de Janeiro e 24,10% na UERJ.
Através da análise das informações da PNAD, percebemos que o problema do fluxo
de alunos com um background familiar desfavorável se revelou uma questão empírica
relevante em nosso objeto de estudo. O ensino médio público de baixa qualidade aliado às
condições socioeconômicas precárias que caracterizam essas pessoas, acabam sendo
determinantes para que milhares de potenciais candidatos não concorram a uma vaga na
UERJ. Para aqueles que ascendem ao vestibular e optam por concorrer a uma carreira via
reserva de vagas, as chances de entrada aumentam consideravelmente. A concorrência dentro
dos grupos de cotistas é baixa, devido à combinação do “efeito encanamento” e de um
percentual elevado de reserva de vagas. O desempenho inferior das pessoas contempladas
pela ação afirmativa se traduz em relações candidato/vaga inexpressivas, notas mínimas
próximas aos patamares de eliminação e taxas de ociosidade de vagas relevantes entre os
grupos beneficiados.
1.4.2 Determinantes do desempenho no vestibular da UERJ
Utilizando a base de dados do vestibular da UERJ nós investigamos como os
determinantes sócio-econômicos podem influenciar o desempenho de um candidato. Para
isto, utilizamos o método de mínimos quadrados ordinários (MQO) onde a variável
dependente é a nota do candidato no vestibular. A Tabela 1.7 apresenta os resultados
encontrados em seis regressões diferentes.
As duas primeiras englobam a totalidade dos candidatos que prestaram a última etapa
do vestibular. A diferença entre elas reside no fato de que para a segunda foram retirados os
controles por tipo de carreira e tipo de vaga. O objetivo é verificar como os coeficientes
respondem ao novo modelo uma vez que candidatos mais fracos tendem a optar por carreiras
menos concorridas e por exercer o direito das cotas. Assim, esperamos que a inclusão dessas
20
variáveis acabe por diminuir os diferenciais de desempenho encontrados entre os candidatos
não cotistas e cotistas.
As demais regressões separam a amostra considerando carreiras com diferentes níveis
de prestígio. Mantivemos todas as principais variáveis, com exceção da binária “cotista”.
Dividimos a amostra em quatro grandes grupos de acordo com a carreira para qual o
candidato esta concorrendo. Classificamos estas carreiras dentro de grupos de prestígio.
Altíssimo prestígio é uma variável binária que recebe o valor de um, caso o curso possua uma
relação candidato vaga acima de 15. As demais seguem os seguintes valores. Alto prestígio
caso esteja entre 10 e 15. Médio prestígio entre cinco e 10. Baixo prestígio se a relação
candidato vaga for menor do que cinco. Ao condicionar as regressões a um universo limitado
de concorrentes, tivemos como pretensão identificar se alguma variável socioeconômica
ganha em relevância conforme avançamos nas relações candidato-vaga dos cursos.
Tabela 1.7. Determinantes Socioeconômicos do Acesso – Método MQO
Variáveis
Sexo
Bairro - Fora do RJ
Bairro - IDH acima de 9,5
Bairro - IDH entre de 9,5 e
9,0
Bairro - IDH entre de 9,0 e
8,5
(1)
(2)
Altíssimo
Alto
Médio
Baixo
(3)
(4)
(5)
(6)
-1.3314*** -0.7045*** -1.4188*** -1.8054*** -1.4364*** -1.2478***
(0.1668)
(0.1740)
(0.4622)
(0.3208)
(0.2569)
(0.3251)
0.7768***
0.8822***
1.2194*
0.1363
0.3298
0.8700**
(0.2186)
(0.2254)
(0.7380)
(0.4122)
(0.3297)
(0.4119)
5.3911***
6.0242***
6.7283***
5.2402***
3.9129***
5.8136***
(0.3361)
(0.3557)
(0.8931)
(0.5852)
(0.5202)
(0.9431)
2.1202***
1.9105***
3.3290***
2.2254***
1.7084***
1.5018**
(0.2834)
(0.2962)
(0.8700)
(0.5335)
(0.4161)
(0.5890)
1.3848***
1.3603***
2.5226***
2.0186***
1.0953***
-0.0527
(0.2852)
(0.2981)
(0.9115)
(0.5455)
(0.4135)
(0.5746)
Tipo de Escola - Municipal
e Estadual
Tipo de Escola - Federal
-4.7148*** -5.0515*** -9.4231*** -5.6855*** -3.6592*** -2.7376***
(0.2133)
(0.2165)
(0.7811)
(0.4249)
(0.3110)
(0.3687)
4.0650***
5.0258***
1.3974**
4.3792***
4.9993***
5.3020***
(0.2873)
(0.2963)
(0.6835)
(0.5177)
(0.4303)
(0.7856)
21
Tipo de Escola - Escola
Fora do RJ
Idade
Idade ao Quadrado
3.2412***
6.2823***
2.9977***
1.4216*
0.9763
2.1438**
(0.3995)
(0.4335)
(0.7233)
(0.7845)
(0.7696)
(0.8751)
0.3894***
0.3528***
3.2264***
0.1685
-0.3061**
0.0244
(0.0873)
(0.0906)
(0.3774)
(0.2014)
(0.1436)
(0.1386)
-0.4819
0.3477
-0.1073
-0.6883*** -0.7197*** -5.3837***
(0.1401)
(0.1443)
(0.7100)
(0.3394)
(0.2355)
(0.2155)
0.8181***
1.1291***
5.3267***
-0.3618
-0.5564**
-0.4868
(0.1652)
(0.1735)
(0.4824)
(0.3124)
(0.2570)
(0.3183)
2.9406***
3.1939***
6.1475***
2.8513***
1.7861***
2.0837***
(0.1968)
(0.1995)
(0.5887)
(0.3711)
(0.3072)
(0.3746)
1.4092***
1.4747***
1.9025**
1.5625***
1.1218***
1.2864***
(0.2275)
(0.2332)
(0.7898)
(0.4428)
(0.3476)
(0.3892)
3.7830***
4.0416***
5.0171***
4.3406***
2.4842***
3.2138***
(0.2593)
(0.2677)
(0.8238)
(0.4941)
(0.3975)
(0.4752)
6.6566***
7.2197***
8.1117***
7.0048***
4.9366***
5.9715***
(0.3176)
(0.3325)
(0.9138)
(0.5892)
(0.4859)
(0.6782)
6.2368***
6.6502***
(0.7478)
(1.2571)
Fez Pré Vestibular
Fez Vestibular Anterior
Renda Bruta - Entre 3 e 5
S.M.
Renda Bruta - Entre 5 e 10
S.M.
Renda Bruta - Entre 10 e 20
S.M.
Renda Bruta - Entre 20 e 30
S.M.
Renda Bruta - Maior que 30
S.M.
Pai - Ensino Fundamental
Pai - Ensino Médio
Pai - Ensino Superior
Pai - Candidato Não Sabe
Informar
Mãe - Ensino Fundamental
8.9559*** 10.0468*** 10.9026*** 9.5317***
(0.4442)
(0.4736)
(1.0696)
(0.7681)
10.8845*** 12.1125*** 10.0144*** 12.0820*** 9.1854***
8.9924***
(0.5634)
(0.5912)
(1.2832)
(0.8993)
(0.9915)
(1.9226)
0.8920
0.8437
0.3018
2.4445*
0.1869
1.3169
(0.6683)
(0.6932)
(2.2897)
(1.4218)
(1.1165)
(1.0722)
0.8622
0.7466
0.4971
2.2199
-0.0381
1.3395
(0.6757)
(0.7014)
(2.2646)
(1.4288)
(1.1269)
(1.1000)
2.8225***
3.0501***
2.4732
4.8255***
1.5362
2.2761**
(0.6912)
(0.7187)
(2.2837)
(1.4508)
(1.1535)
(1.1438)
0.5292
0.4287
-0.1449
1.9829
-0.1439
0.7447
(0.7350)
(0.7622)
(2.5805)
(1.5359)
(1.2240)
(1.1773)
0.8847
1.1881*
2.9668
1.0062
0.0012
0.6588
(0.6788)
(0.6889)
(2.2542)
(1.6041)
(1.0974)
(1.0197)
22
Mãe - Ensino Médio
Mãe - Ensino Superior
Mãe - Candidato Não Sabe
Informar
Cor - Preta
Cor - Parda
Cor - Amarela
Cor - Indígena
Carreira - Altíssimo
Prestigio
Carreira - Alto Prestigio
0.9472
1.3101*
3.2751
0.5510
0.0729
0.8467
(0.6879)
(0.6983)
(2.2223)
(1.6199)
(1.1057)
(1.0508)
3.0938***
3.8680***
6.5838***
2.6707
1.7106
2.0678*
(0.7051)
(0.7179)
(2.2412)
(1.6497)
(1.1350)
(1.0977)
0.5605
0.9160
4.2097
0.9289
-0.5797
-0.3602
(0.8917)
(0.9180)
(3.2866)
(1.9191)
(1.4620)
(1.3391)
-3.1402*** -3.1060*** -3.1238*** -4.4690*** -1.8951*** -2.5935***
(0.2558)
(0.2640)
-1.2160*** -1.3145***
(0.8780)
-1.2606**
(0.4806)
(0.3864)
(0.4345)
-1.1166*** -1.2008*** -1.1363***
(0.1977)
(0.2079)
(0.5798)
(0.3836)
(0.3028)
(0.3622)
-1.0834**
-1.6318***
-2.7796*
-1.9042*
-0.3281
-0.3531
(0.5246)
(0.5411)
(1.6335)
(1.0050)
(0.7696)
(1.0650)
-2.4140***
-2.0397**
-4.8750**
-0.9180
-1.6329
-1.6261
(0.8147)
(0.8342)
(2.1861)
(1.6490)
(1.2258)
(1.4933)
12.8895***
(0.2949)
4.6027***
(0.2249)
Carreira - Médio Prestigio
1.2551***
(0.2053)
Cotista
Constante
1.4958***
(0.2713)
22.5643*** 25.9229***
-9.1066*
30.5400*** 37.8558*** 28.8032***
(1.4425)
(1.4768)
(5.0869)
(3.1398)
(2.2865)
(2.3560)
N
27415
27415
5211
7898
8917
5389
adj. R2
0.319
0.245
0.259
0.264
0.181
0.161
AIC
219618.00
222464.71
43811.51
63405.35
69205.96
41408.68
BIC
219897.44
222711.28
44008.27
63614.58
69418.83
41606.44
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
Primeiramente abordamos questões relativas a preocupações comuns em regressões
econométricas, como: viés por variável omitida, heterocedasticidade, multicolinearidade, viés
de seleção amostral e qualidade dos ajustes.
23
Em um primeiro momento nos certificamos em incluir como controle todas as
principais variáveis disponíveis com o objetivo de mitigarmos problemas de um viés por
variável omitida, conforme sugerido por Angrist e Krueger (1999). A referida técnica é
plausível sob a hipótese de seleção de observáveis, que se justifica quando sabemos muito
sobre o processo que gera a variável dependente de interesse. Como foi possível incluir todo
o conjunto relevante de variáveis abordadas em artigos que analisam os determinantes de
resultados em provas e concursos, acreditamos que foi possível minorar o problema de viés
por variáveis omitidas.
Ainda em atenção a esta questão, optamos por modelar nas equações uma variável não
percebida em outras pesquisas, nomeada de “bairro”. A partir dos dados obtidos em Cardoso
(2004), agrupamos os diferentes bairros do município do Rio de Janeiro em quatro categorias
de IDH, onde a faixa máxima reúne todos os candidatos que moram em bairros com IDH
maior do que 9,5. A inclusão dessa variável se justifica por dois fatores. O Rio de Janeiro é
uma cidade com grandes desigualdades e elas se manifestam em bolsões bem delimitados de
pobreza e de riqueza. Esperamos que escolas públicas e particulares de regiões como Gávea e
Ipanema sejam consideravelmente melhores do que as de regiões pobres no Rio de Janeiro.
Ou ainda, que tais bairros concentrem a maior proporção de pais com ensino superior e altas
rendas domiciliares. Por isto, tratar o viés por variável omitida em pesquisas com foco no
nosso estado passa pela inclusão desta variável. A segunda razão advém de distorções dentro
do município do Rio de Janeiro. Indivíduos que moram nesses bairros têm um maior contato
com amigos, vizinhos e parentes que valorizam a educação e que em muitos momentos
acabam por influenciar positivamente as decisões por educação dos candidatos. Desta forma,
a variável bairro também funciona como uma proxy para o capital social. Os candidatos que
residem em outras cidades foram reunidos em uma variável binária.
Com o intuito de corrigir o efeito da heterocedasticidade, usamos erros-padrões
robustos em todas as regressões.
Atentamos que os coeficientes calculados pelo modelo se referem aos determinantes
da nota de um indivíduo condicionado ao fato de o mesmo ter realizado a prova do vestibular.
Acreditamos que existem fatores não observados que afetem tanto o processo de inscrição
quanto a nota final do vestibular e esta hipótese fundamenta uma provável existência de viés
de seleção amostral em nossas regressões. Os inscritos não são aleatórios, pelo contrário, a
tendência é que aqueles que realizem as inscrições pertençam à parcela dos candidatos com
maior autoconfiança e mais preparados para o vestibular. Ocorre, portanto, que grupos com
24
condições socioeconômicas desfavoráveis têm menos chances de estar incluídos na amostra
do que sua contraparte favorável.
Uma técnica amplamente utilizada para tratar este problema é a aplicação da correção
de Heckman utilizando dados das observações que não possuem a variável dependente, para
eliminar o viés. Tal procedimento é de fácil aplicação em muitas áreas, onde normalmente se
encontram disponíveis observações relativas a toda a população. No processo do vestibular
isso não ocorre. Toda a população apta a se inscrever e que não se inscreveu, pela própria
característica das bases, é naturalmente indisponível para tratamento pelos pesquisadores.
No único artigo percebido que procura tratar esta inconsistência, Emilio et al. (2004)
aplicaram hipóteses fortes acerca dos pesos e efetuaram a correção para o problema do viés
de seleção amostral utilizando dados da PNAD. Concluíram que houve uma pequena redução
da magnitude dos estimadores aliada a uma melhora insignificante do ajuste do modelo. O
efeito do viés se revelou essencialmente quantitativo. Castelar et al. (2010) argumenta que
tais procedimentos não são garantias de bons resultados. Optamos por assumir alguma
distorção na magnitude dos coeficientes estimados e entendemos que se mantém possível a
extração de muitas conclusões importantes sobre os determinantes da nota do aluno.
Todos os modelos apresentaram um valor p para o teste F tendendo a zero e por isto,
podemos rejeitar a hipótese nula de que as variáveis independentes não exercem influência
sobre a nota média de um candidato. O R² ajustado dos modelos variou entre 0,319 e 0,161.
Os dois modelos completos apresentaram valores de ajuste adequados para dados em crosssection uma vez que regressões com este tipo de dados costumam apresentar coeficientes de
determinação significativamente menores do que os verificados em modelos com séries
temporais.
Em relação aos resultados apresentados pelos modelos, nós descobrimos que a renda
per capita parece ser o principal determinante sócioeconômico das notas de um candidato no
vestibular. Revelou-se significante no nível de 1% em todas as regressões em que está
inclusa. A cada faixa de renda há uma variação relevante nas notas médias em todas as
regressões. A explicação da importância desta variável pode residir no fato de que pais com
alto poder aquisitivo matriculam seus filhos em escolas particulares que possuem maior
qualidade. Moram em regiões com maior capital social, onde os indivíduos são mais
instruídos. Também favorece o acesso dessas pessoas a recursos educacionais que impactam
diretamente na nota do aluno, como cursos específicos de inglês ou espanhol.
25
O tipo de escola se mostrou decisivo no resultado do vestibular. A média de
candidatos de escolas privadas se revelou cinco pontos maior do que os que concluíram o
ensino médio em escolas públicas estaduais.
A variável bairro apresentou alta magnitude. Esperamos que, em parte, esta variável
ajude a capturar as relações dos candidatos com familiares, vizinhos, amigos e de outros
moradores que tem o poder de melhorar o conjunto de informações disponíveis para o
candidato. O seu efeito percebido foi maior do que aquele verificado no nível de escolaridade
dos pais. Este fato traz à tona um papel que acreditamos ser relevante e que hoje se encontra à
margem das discussões sobre os condicionantes socioeconômicos em produtos educacionais,
a análise das influências de diferentes pessoas sobre o candidato.
O nível de ensino da mãe apresentou coeficientes estatisticamente maiores, quando
comparado com os dos pais. É uma evidência que esperávamos encontrar dado o fato de que
é a mãe que, culturalmente, costuma sacrificar horas de trabalho em prol de uma maior
presença na criação e educação dos filhos.
Se o racismo no Brasil for um problema social relevante, é de se esperar que
encontremos coeficientes expressivamente negativos frente aos brancos mesmo após a
inclusão de controles para renda, tipo de escola e ensino dos pais. Em um país racista, o
acesso à educação do tipo reprimido é menor. Indivíduos destes grupos sofrem com a
discriminação dos socialmente favorecidos, possuem baixa autoestima e sofrem do estigma
da incompetência (HEILMAN, 1996). A forma com que a sociedade trata o grupo excluído
pode ser em parte representada por uma proxy como a nota dos alunos em um vestibular.
Nossa hipótese é de que quando isolamos os efeitos dos outros controles socioeconômicos, o
coeficiente da variável “cor preta” se torne altamente correlacionado com as conseqüências
do racismo. Esperamos que este problema social esteja em boa parte refletido na magnitude
do coeficiente.
Quando comparamos as autodeclarações de cor, percebemos que em todas as
regressões os brancos apresentaram maior desempenho que as demais classificações. Ao
incluirmos os controles progressivamente, todos os coeficientes de cor se reduziram,
mantendo-se, com a exceção dos indígenas, significantes ao nível de 1%. No modelo
completo, o impacto verificado mostra um desempenho médio dos pretos de três pontos a
menos que a categoria de referência dos brancos.
Os resultados encontrados parecem indicar que outros fatores sócio-econômicos
afetam em maior grau as notas de um candidato. A renda bruta, o tipo de escola, o bairro de
26
origem do candidato e a escolaridade dos pais indicam uma maior influência no desempenho
do indivíduo do que o fator da cor da pele. Mediante esta constatação, esperávamos que os
coeficientes relativos à cor preta caíssem a níveis modestos depois que inserimos o controle
para todas as outras variáveis do modelo, o que não ocorreu. Isolando os efeitos de todas as
demais características, os autodeclarados de cor preta apresentaram um rendimento médio de
menos três pontos em relação aos brancos. É um resultado que parece refletir as
complexidades do racismo brasileiro que sempre se manifestou de uma forma velada e
envergonhada. Bem diferente das discriminações formais estadunidenses presenciadas
durante grande parte de sua história até meados do século passado.
Em relação à variável “sexo” identificamos que as mulheres ainda possuem um
desempenho, em média, menor do que o dos homens. No pior dos cenários a diferença na
média final não tem ultrapassado os dois pontos. Em relação ao total de matrículas, as
mulheres conseguiram ultrapassar os homens e são a maioria do corpo discente ingressante
em 2012. São 2.207 novas alunas contra 2.024 do sexo masculino. Isto indica que a diferença
de gênero é baixa no Brasil e que é consideravelmente menor do que a cor. Elas são maioria
em três dos quatro cursos rotulados como de altíssimo prestígio. Em quatro cursos a
porcentagem de mulheres matriculadas ultrapassa 84% dos alunos. Na outra ponta, com
menos de 20% de participação, estão carreiras exatas. São quatro engenharias e o curso de
ciências da computação.
Quando inserimos grupos de controle para separar as observações de candidatos que
concorrem a cursos de diferentes relações candidato/vaga, se tornou possível verificar um
importante efeito na variável “pré-vestibular”. Nos dois modelos que utilizam a amostra
completa, o fato de o aluno ter estudado em um pré-vestibular se mostrou significativo,
porém com efeitos marginais em seu desempenho. Ao isolarmos os candidatos por grupos de
prestígio, percebemos uma alteração de comportamento relevante neste coeficiente. Para os
candidatos que concorrem a cursos de alto prestígio, o pré-vestibular aumentou em média
cinco pontos nos resultados finais. Para as demais carreiras, o coeficiente se tornou negativo.
Nossa explicação é de que os candidatos que concorrem às carreiras com alta relação
candidato/vaga se matriculam em pré-vestibulares particulares, caros e que concentram os
melhores professores. A motivação destes alunos em perseguir melhores resultados contribui
para um efeito positivo, forte e significativo na variável. Os demais cursos são compostos por
candidatos que fizeram pré-vestibulares com baixa qualidade de infraestrutura e professores.
Este tipo de escola não foi capaz de incrementar a nota do aluno. É uma descoberta
27
importante que contraria aqueles que defendem os pré-vestibulares comunitários como bons
substitutos para a existência de uma eventual política de cotas (WYDICK, 2008).
Por fim, analisamos as variáveis explicativas utilizadas apenas no primeiro modelo.
Em relação aos controles por tipo de carreira, quem optou por concorrer a cursos de altíssimo
prestígio terminou com uma nota média maior de cerca de doze pontos quando comparados
aos candidatos para cursos de baixo prestígio.
Com o controle para todas as demais explicativas, o sinal do coeficiente para os
candidatos cotistas se mostrou positivo.
Para nós, isso se revelou uma surpresa. Mesmo
isolando para os diversos fatores socioeconômicos esperávamos que o coeficiente persistisse
negativo, o que não ocorreu. Uma explicação razoável é o fato de que possivelmente os
candidatos cotistas que se propõem a enfrentar a etapa do vestibular tenham na média,
aplicado um esforço relativo maior. Ao controlarmos para todos os demais fatores, o
resultado implicaria em um impacto positivo na nota final do concorrente pela reserva de
vagas.
1.4.3 Determinantes da classificação no vestibular da UERJ
Com o intuito de analisarmos o efeito das restrições de ofertas de vagas e do sistema
de cotas nas chances de classificação para a UERJ, optamos por expandir a análise
econométrica utilizando o modelo Logit. Sabemos que existe uma demanda alta por ensino
superior público não atendida pelas ofertas de vagas de instituições públicas. As restrições de
ofertas de vagas variam entre diferentes cursos e isto afeta as chances de admissão. A
probabilidade de um candidato passar para uma carreira de medicina é muito mais baixa
quando comparamos com pedagogia.
A ação afirmativa também altera as chances de admissão. Desta vez em favor dos
candidatos que provêm de backgrounds familiares desfavoráveis em detrimento daqueles que
não são contemplados pela referida política. Uma regressão logística pode fornecer insights
importantes sobre as distorções causadas pela introdução deste sistema.
Como se sabe, neste tipo de modelo a variável dependente é uma binária que recebe o
valor de “1” caso o candidato seja classificado ou “0” caso contrário. O vetor de variáveis
explicativas que utilizamos compreende sexo, renda bruta, nível de ensino do pai e da mãe,
cor da pele, tipo de escola, carreira, bairro de origem e tipo de cota. Com o intuito de
melhorar o ajuste do modelo transformamos as variáveis de ensino dos pais e renda bruta em
28
quantitativas. Cada uma das faixas de resposta no questionário sociocultural recebeu um
valor. Desta forma, a renda bruta se tornou uma variável que vai de um a seis. O ensino do
pai e da mãe possui quatro valores possíveis ordenados da seguinte maneira: nenhum,
fundamental ou não sei, médio e superior. A justificativa do agrupamento das observações
entre aqueles que declararam “não sei” ou “fundamental” reside na proximidade das médias
finais dos dois grupos. O mesmo problema de viés da seleção amostral que afeta a magnitude
dos coeficientes do MQO também pode ser verificado aqui, de modo que os resultados
devam ser vistos com essa reserva em mente.
Os resultados se encontram na Tabela 1.8. As cores (com exceção da preta), o ensino
do pai e as escolas fora do Rio de Janeiro foram as únicas variáveis não significantes ao nível
de 10%. O valor p do teste qui-quadrado tende a zero e por isto, podemos rejeitar a hipótese
nula de que as variáveis independentes não exercem influência sobre a probabilidade de
sucesso de um candidato. O modelo apresentou um pseudo-R2 de 0,275. Outra medida de
ajustamento frequentemente utilizada em regressões logísticas é o percentual de observações
corretamente
preditas.
Os
valores
positivos
foram
corretamente
avaliados
em
aproximadamente 66% das classificações e em 88% das não classificações para ambas os
modelos. O valor ponderado das predições corretas se situou em cerca de 85,6%. O grau de
ajuste se revelou alto, principalmente quando comparamos com outros estudos sobre
determinantes de acesso no vestibular (TANNURI-PIANTO E FRANCIS, 2012a) ou em
concurso público (CASTELLAR ET AL, 2010).
Tabela 1.8. Determinantes do Acesso – Método Logit
Sexo
Bairro - Fora do RJ
Bairro - IDH entre de 9,0 e 8,5
Bairro - IDH entre de 9,5 e 9,0
Bairro - IDH acima de 9,5
Logit
Logistic (Odds Ratio)
Marginal Effects
-0.0890**
0.9148**
-0.0083**
(0.0384)
(0.0351)
(0.0036)
0.1477***
1.1591***
0.0139***
(0.0540)
(0.0626)
(0.0051)
0.1510**
1.1629**
0.0147**
(0.0693)
(0.0805)
(0.0070)
0.2923***
1.3395***
0.0295***
(0.0664)
(0.0889)
(0.0072)
0.5872***
1.7990***
0.0657***
29
(0.0759)
(0.1366)
(0.0099)
0.1909***
1.2102***
0.0178***
(0.0184)
(0.0223)
(0.0017)
0.0781***
1.0812***
0.0073***
(0.0299)
(0.0323)
(0.0028)
0.0782***
1.0813***
0.0073***
(0.0303)
(0.0327)
(0.0028)
0.0769
1.0799
0.0071
(0.0473)
(0.0510)
(0.0043)
-0.1584**
0.8535**
-0.0141**
(0.0653)
(0.0557)
(0.0055)
-0.0214
0.9788
-0.0019
(0.1851)
(0.1812)
(0.0170)
0.0398
1.0405
0.0037
(0.1314)
(0.1367)
(0.0126)
Tipo de Escola - Municipal e
-0.4014***
0.6693***
-0.0346***
Estadual
(0.0535)
(0.0358)
(0.0042)
0.5321***
1.7025***
0.0587***
(0.0619)
(0.1053)
(0.0079)
Tipo de Escola - Escola Fora do
-0.2119**
0.8090**
-0.0184**
RJ
(0.0975)
(0.0789)
(0.0078)
-3.7247***
0.0241***
-0.1857***
(0.0842)
(0.0020)
(0.0031)
-2.8262***
0.0592***
-0.1930***
(0.0582)
(0.0034)
(0.0037)
-1.9593***
0.1409***
-0.1505***
(0.0475)
(0.0066)
(0.0036)
3.5484***
34.758***
0.6660***
(0.0667)
(2.3186)
(0.0110)
Renda Bruta
Escolaridade do Pai
Escolaridade da Mãe
Cor - Branca
Cor - Preta
Cor - Indígena
Cor - Amarela
Tipo de Escola - Federal
Carreira - Altíssimo Prestigio
Carreira - Alto Prestigio
Carreira - Médio Prestigio
Cotista
Constante
N
-1.4485***
(0.1183)
27418
27418
30
pseudo R2
0.275
AIC
18369.88
BIC
18534.26
Marginal effects after logit: y = Pr(classificado) (predict)
0.1044
Standard errors in parentheses * p<0.10, ** p<0.05, *** p<0.01
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
Com controles para tipo de carreira e tipo de vaga, percebe-se que incrementos na
renda e no ensino dos pais aumentam as chances de classificação no vestibular. Estudar em
uma escola pública federal implica em um odds ratio favorável de 1,70 na aprovação quando
comparamos com estudantes de escolas privadas. Ser do sexo masculino e ter cor de pele
parda também impactam positivamente nas chances de entrada.
Sabemos que o perfil de candidato branco, estudante de escola privada ou federal,
com alta renda familiar, morador de um bairro com alto IDH e que possui pais com ensino
superior completo é aquele que, na ausência do sistema de cotas, teria as maiores chances de
admissão. Acontece que a existência de uma política de ação afirmativa tende a distorcer as
chances de entrada de diferentes tipos. Dos resultados das regressões logísticas percebemos
que os maiores determinantes da probabilidade de entrada na UERJ não são de ordem
socioeconômica. As chances foram acima de tudo afetadas pela oferta de vagas e o sistema de
cotas.
Tudo mais constante, concorrer a uma carreira de altíssimo prestígio apresenta um
odds ratio relativo ao baixo prestígio de 0,025. Dito de outra forma, as chances de entrada em
um curso de baixo prestígio são de quarenta para um, quando comparamos com os de
altíssimo prestigio. Em relação aos não cotistas, o sistema de cotas beneficia o candidato
cotista com uma chance de classificação de trinta e três para um.
A alteração nas probabilidades de acesso dada pelas duas variáveis pode ser percebida
através da definição de tipos “clássicos” de indivíduos com alto background familiar e baixo
background familiar. Realizamos este detalhamento com os dados da Tabela 1.8. Para os
cursos de altíssimo prestigio, descobrimos que um candidato típico cotista proveniente de
condições socioeconômicas desfavoráveis possui uma probabilidade de classificação ao redor
de 15%, enquanto um candidato não cotista com condições favoráveis possui uma
31
probabilidade de classificação consideravelmente menor, 6,7%2.
Se os candidatos
pertencentes aos perfis detalhados optam por concorrer a cursos de baixo prestígio, as
probabilidades de admissão aumentam respectivamente para 72,8% e 88,5%. Com a
introdução do sistema de cotas, os candidatos que possuem um baixo perfil socioeconômico e
que são contemplados pela reserva de vagas passam a obter maiores probabilidades de
classificação do que os candidatos pertencentes às elites do Rio de Janeiro.
Outra forma possível de se interpretar os resultados do modelo logit é através dos
efeitos marginais. Em um modelo de regressão logística o efeito marginal das explicativas
não é constante. Desta forma, uma prática comum é o cálculo do impacto dos regressores
considerando os seus valores médios (caso a explicativa seja contínua) ou uma mudança
discreta no regressor (caso a explicativa seja binária).
Analisando os resultados por este método temos que um candidato com as
características padrão possui 10,44% de probabilidade de se classificar. Essa probabilidade
pode ser aumentada em 6,57 pontos percentuais se ele vier de um bairro com IDH acima de
9,5 ou em 1,78 a cada patamar maior de renda bruta familiar. Caso aplique por uma das
reservas de vagas, suas probabilidades de classificação aumentam em 66 pontos percentuais.
Por outro lado, se decidir concorrer por uma carreira de altíssimo prestígio, sua probabilidade
diminui em 18,57 pontos percentuais.
Lembramos que na presença da ação afirmativa algumas situações não se
materializam de fato. Um candidato branco egresso do ensino médio privado não pode se
candidatar à vaga de cotista. Como conseqüência, embora o resultado do logit possa
apresentar um valor probabilístico alto para este caso, a restrição imposta pela ação
afirmativa impede que tal estimativa se concretize.
1.4.4 A análise da fronteira: candidatos “displaced” e “displacing”
2
Atributos definidos para o “não cotista típico”: Homem com renda bruta maior que 30 salários mínimos,
morador de bairro com IDH acima de 9,5, possui pais com ensino superior, se autodeclara branco e é
estudante egresso de escola particular. Atributos definidos para o “cotista típico”: Homem com renda bruta
menor que 3 salários mínimos, morador de bairro com IDH menor que 8,5, possui pais com ensino
fundamental, se autodeclarou preto e é egresso de escola pública estadual.
32
Nesta seção centraremos a análise no impacto da inclusão do sistema de cotas na
composição sócio-econômica dos alunos. Existem candidatos que são afetados pela
introdução de uma ação afirmativa e outros que não são. Os melhores são aprovados com ou
sem a existência desta política e aqueles que, dentro de cada carreira, apresentam
rendimentos bem inferiores, são eliminados de qualquer forma. Para estes indivíduos, a ação
afirmativa não possui nenhum impacto direto. É importante ressaltar a expressão “impacto
direto” porque há evidências de que a introdução de uma ação afirmativa altera o esforço que
os candidatos cotistas e não cotistas pretendem aplicar na preparação ao vestibular
(ZYLBERSTAJN, 2010).
Há, porém, uma parcela de candidatos que se encontra na fronteira do processo
seletivo. São aqueles afetados diretamente pela introdução do sistema de cotas. A literatura
internacional divide esse grupo em dois (TANNURI-PIANTO e FRANCIS, 2012a.).
“Displacing” são os beneficiados. Aqueles que não se classificariam em um processo seletivo
puramente meritocrático, onde as notas do vestibular são os únicos parâmetros para a
admissão. “Displaced” são os prejudicados. Aqueles que se classificariam em um processo
seletivo puramente meritocrático mas que foram eliminados com a inclusão da ação
afirmativa. Como as vagas nas universidades são limitadas, isto equivale a dizer que os
candidatos displaced foram rejeitados para que os displacing pudessem ser selecionados.
A Tabela 1.9 mostra o quantitativo dos candidatos que concorrem pelo grupo dos
cotistas que se classificaria mesmo se o sistema de cotas não existisse. Ela foi elaborada com
base na manipulação dos microdados. Como observações incompletas foram excluídas, o
quantitativo de vagas utilizado na análise e os candidatos cotistas observados não
correspondem ao real mas a um número aproximado que chamaremos de “vagas válidas”. Ao
considerarmos as 979 vagas válidas para as carreiras de altíssimo e alto prestígio foi possível
identificar que apenas 12 cotistas estariam matriculados em um sistema puramente
meritocrático, 1,2% do total dos classificados. Mesmo em carreiras de baixo prestígio onde
esperávamos um impacto menor das cotas, apenas 7,67% dos candidatos não precisariam da
ação afirmativa para suceder no processo do vestibular. Os resultados encontrados parecem
indicar que a política está sendo eficaz em selecionar candidatos advindos de circunstâncias
adversas.
33
Tabela 1.9. Candidatos Cotistas Não Beneficiados pelo Sistema de Cotas
Cotistas que
Grupos
se
Candidatos
No.
classificariam
cotistas não
de
No.
vagas
sem o sistema
impactados
Prestígio
vagas
válidas
de cotas
(em %)
Altíssimo
259
239
2
0.83
Alto
804
740
10
1.35
Médio
1537
1413
42
2.97
Baixo
2647
2346
180
7.67
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
Confirmamos as impressões anteriores ao analisar o perfil sócio-econômico dos
candidatos displacing e displaced constantes na Tabela 1.10. Conforme evidenciado pelas
análises econométricas, a renda é o maior determinante das notas de um aluno. Entre os
candidatos prejudicados, 37% declaram possuir uma renda per capita maior que dez salários
mínimos, estando no topo da distribuição de riqueza. Para os cotistas esse número é de
apenas 0,85%. Quando o foco se direciona para aqueles que vêm de piores condições
econômicas, os valores se invertem: 62% dos candidatos prejudicados declararam possuir
renda per capita menor do que dez salários mínimos, enquanto entre os favorecidos, este
número aumenta para 99,12%. Para os níveis de educação dos pais o fenômeno se repete.
Entre os displaced, a maioria dos pais vem de níveis de ensino superiores em contraste com
os displacing, que registram uma maior proporção de pais com baixos níveis de ensino.
Podemos identificar que os tipos mais beneficiados são: as mulheres, os estudantes da rede de
ensino pública estadual, os negros, aqueles que possuem menor faixa de renda definida, os
filhos de mães com ensino médio e pais com ensino fundamental. O resultado desta análise é
claro: estão sendo admitidos os alunos provenientes de famílias com circunstâncias
reconhecidamente desfavoráveis. Entre os prejudicados temos outro perfil. São os homens, os
estudantes provenientes do ensino privado, os autodeclarados brancos, aqueles com renda
familiar entre cinco e 10 salários mínimos e os que possuem pais que concluíram o ensino
superior. O perfil dos prejudicados parece espelhar o estudante típico da classe média, branco
e aluno de escolas particulares.
34
Tabela 1.10. Análise dos Candidatos Afetados pelo Sistema de Cotas
Variáveis
Displacing
Displaced
Mulheres
55.54%
50.59%
Fez Pré Vestibular
57.51%
50.03%
Fez Vestibular Anterior
80.48%
81.19%
IDH acima de 9,5
3.77%
17.61%
IDH entre 9,5 e 9
7.31%
20.75%
IDH entre 8,5 e 9
14.78%
13.91%
IDH abaixo de 8,5
31.83%
13.67%
Fora da cidade do RJ
42.30%
34.06%
Público - Estadual
65.25%
10.53%
Público - Federal
15.01%
14.62%
Privado
16.27%
68.78%
3.45%
6.05%
Cor "Branca"
31.31%
71.12%
Cor "Negra"
33.28%
5.35%
Cor "Parda"
31.86%
20.45%
Cor "Amarela"
1.80%
2.12%
Cor "Indígena"
1.70%
0.94%
RB menor que 3
61.05%
13.21%
RB entre 3 e 5
29.50%
19.43%
RB entre 5 e 10
8.57%
29.74%
RB entre 10 e 20
0.78%
23.05%
RB entre 20 e 30
0.07%
9.28%
RB > 30
0.00%
5.27%
Mãe Nenhum
4.01%
0.78%
Fundamental
38.39%
9.91%
Mãe Ens.Médio
42.64%
32.03%
Mãe Ens.Superior
11.72%
55.86%
Mãe "Não Sei"
3.22%
0.78%
Pai Nenhum
4.24%
0.62%
Pai Ens.Fundamental
38.39%
8.96%
Pai Ens.Médio
37.05%
29.50%
9.99%
57.19%
10.30%
3.69%
3.54%
4.40%
Bairro
Tipo de Escola
Fora do Rio de Janeiro
Cor da Pele
Renda Familiar
Mãe Ens.
Educação da Mãe
Educação do Pai
Pai Ens.Superior
Pai "Não Sei"
Pessoas na Família 1 Pessoa na Família
35
2 Pessoas na Família
13.76%
13.21%
3 Pessoas na Família
30.05%
25.33%
4 Pessoas na Família
34.22%
36.74%
5 Pessoas na Família
13.53%
15.81%
6 Pessoas na Família
3.30%
2.83%
7 Pessoas na Família
1.57%
1.65%
1271
1271
Tamanho da Amostra
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
Bertrand, Hanna e Mullainathan (2008) afirmam que uma ação afirmativa focada em
um tipo pode prejudicar um outro que também é historicamente desfavorecido. Os
pesquisadores abordam a experiência indiana onde as cotas acabam por prejudicar o acesso
das mulheres, uma vez que em castas discriminadas a maior quantidade de candidatos é do
sexo masculino. Encontramos uma evidência oposta para o caso da UERJ. A atual política
também contribui para a igualdade de gênero, uma vez que mais mulheres foram admitidas
em relação às não admitidas. Isto não isenta a possibilidade de que existam grupos
prejudicados que terminem por estar sub-representados neste caso analisado. Um argumento
comum é de que os brancos pobres provenientes de escola particular estejam sendo
prejudicados por este sistema. Os resultados empíricos respaldam esta opinião, uma vez que
71,12% dos displaced são brancos, 68,78% estudam em escolas privadas e 62,38 % possuem
uma renda bruta familiar menor que 10 salários mínimos.
1.5. Conclusão
Os resultados da análise empírica do acesso à UERJ com foco no vestibular de 2010
foram reveladores. Na seção de estatística descritiva do acesso, descobrimos fortes distorções
socioeconômicas entre as diversas faixas de notas. A proporção de pretos e egressos do
ensino médio público caiu consideravelmente em níveis mais altos de notas do vestibular. As
tabelas subsequentes mostram um contraste relevante nas competições entre candidatos
cotistas e não cotistas. Para o primeiro grupo foram identificadas relações candidato/vaga
inexpressivas, notas mínimas próximas aos patamares de eliminação e ociosidade de vagas
em diversas carreiras. Em relação ao segundo grupo, o comportamento é similar ao de outros
vestibulares pelo país: alta competição se traduzindo em notas mínimas acentuadas e pleno
preenchimento das vagas. A diferença nos comportamento dos dois tipos foi justificada pelos
36
diferentes fluxos de alunos dos grupos cotistas e não cotistas. A quantidade de candidatos não
cotistas que passa por todos os níveis de ensino até chegar ao vestibular costuma ser dez
vezes maior do que a soma dos grupos com vagas reservadas. Uma condição necessária para
que possamos garantir um volume significativo de candidatos cotistas é a de que os gestores
na área da educação básica consigam prover um ensino público de qualidade razoável.
Em um segundo momento, efetuamos as análises econométricas e foi possível
verificar que a renda bruta é a principal determinante da nota de um aluno, seguida pelo tipo
de escola, bairro, níveis de ensino dos pais, cor e gênero. Acreditamos que os resultados
encontrados possam favorecer a argumentação dos advogados de políticas color-blind que
traduzem as ações afirmativas em políticas não discriminatórias por cor. Da análise por grupo
de prestígio, percebemos que os resultados preliminares do coeficiente sobre pré-vestibular
parecem indicar que esta não é uma política suficiente para substituir o sistema de cotas. Em
relação às probabilidades de entrada, mostramos que o alto quantitativo de vagas reservadas
em comparação à baixa demanda pelas mesmas acaba por tornar a variável “cotista” a maior
responsável pelo aumento de chances de um candidato. Uma oferta de vagas insuficiente em
cursos de altíssimo prestígio também impacta negativamente nas chances de um candidato.
A última seção trouxe mais descobertas importantes relativas ao acesso. Como
resultado da avaliação dos candidatos que se encontram na fronteira, percebemos o sucesso
que a UERJ tem tido em recrutar pessoas que vêm de condições sócio-econômicas
desfavoráveis. Mostramos através da análise do microdados que são pouquíssimos os
candidatos cotistas que se classificariam caso o sistema de cotas não existisse. Aqueles que se
encontram entre os displacing estão vindo de um baixo background familiar enquanto os
displaced são provenientes das classes média e alta do Rio de Janeiro.
Acreditamos que as descobertas consolidadas neste capítulo possam servir como
contribuições significativas para diversas discussões no campo da economia da educação.
Reforçam a necessidade de um ensino básico de melhor qualidade para melhorar o fluxo dos
alunos entre os diferentes níveis. Fornecem critérios objetivos para justificar ou desconstruir
posicionamentos normativos acerca das ações afirmativas. E, por fim, trazem questões
importantes para apreciação pelos gestores públicos da UERJ.
37
CAPÍTULO 02. UMA ANÁLISE DA PROGRESSÃO DOS ALUNOS COTISTAS SOB
A PRIMEIRA AÇÃO AFIRMATIVA BRASILEIRA NO ENSINO SUPERIOR: O
CASO DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
2.1 Introdução
Existem várias pesquisas que evidenciam os benefícios privados e públicos da
educação. Neri (2008) conclui que os salários médios de quem possui o ensino superior no
Brasil são mais do que o dobro daqueles que têm o ensino médio como grau máximo.
Ioschpe (2004) mostra estudos que utilizam variações da equação de Mincer e taxas internas
de retorno para comprovar o prêmio aos salários que mais anos de estudo trazem a um
indivíduo. Suliano e Siqueira (2012) mostram que os retornos por um ano de estudo no
sudeste e no nordeste estão em cerca 13% e 16%, respectivamente. Belfield (2003) cita outro
conjunto de artigos que comprova o impacto positivo da educação no bem-estar da
população, como: queda média de aprisionamentos, de cigarros consumidos e de pessoas
viciadas em drogas ilícitas, além do aumento da participação política e dos gastos por filho.
Assim, quando o governo investe em universidades públicas de alta qualidade, o faz
por duas razões. Primeiro porque espera que os egressos, com o conhecimento adquirido em
sala de aula, obtenham uma maior produtividade no mercado de trabalho. Depois pelo motivo
da educação ser reconhecidamente uma fonte geradora de externalidades positivas dentro de
uma nação.
Porém, para que os benefícios da educação sejam sólidos, é preciso que os recémmatriculados na universidade se graduem com um desempenho satisfatório. Assim, além do
benefício dos anos de estudos a mais, o egresso é capaz de obter um retorno maior devido ao
efeito-diploma.
Conseguir manter os alunos até a formatura é então uma condição
necessária para que a missão de uma instituição de ensino superior (IES) seja cumprida
integralmente. Isto no sentido de que sejam formados indivíduos preparados para o mercado
de trabalho e com uma maior consciência social.
Através da análise dos outputs educacionais no ensino superior muitos estudos
internacionais procuram avaliar em que grau a universidade está conseguindo cumprir com a
38
sua missão. Eles costumam ser avaliados no campo econômico sob três óticas: as taxas de
graduação, os coeficientes de retorno médio (CRs) e os salários no mercado de trabalho.
Em relação a retenção, Levin et al. (1984) e Robst, Keil e Russo (1998) mostram que
ela depende de muitos fatores externos ao controle das IES. Apontam o background familiar,
a influência da comunidade, a realização escolar anterior, habilidades mentais, atitudes e
motivação do aluno como algumas explicativas do processo de graduação. Em relação a
estas características, as IES possuem um espaço reduzido para atuação.
Existem, porém, variáveis que estão sob o controle das IES e que por isto são
passíveis de administração. Bowen e Bok (1998) e Carnevale e Rose (2003) mostram que,
quanto maior a qualidade da universidade, maior a probabilidade de graduação. Isto se daria
pelo fato de estas instituições possuírem uma melhor infraestrutura para tratar casos
problemáticos e por terem uma composição de alunos conscientes do valor agregado daquele
ensino aos seus retornos salariais. Muriel e Giroletti (2010) citam exemplos de organização
interna que podem impactar positivamente as taxas de graduação como uma ouvidoria
eficiente além de apoio psicopedagógico e financeiro para alunos em dificuldades.
No processo de retenção, três variáveis que são proxies do desempenho anterior do
aluno têm se mostrado particularmente importantes. O coeficiente de rendimento médio do
ensino médio, a posição do aluno universitário na sua escola de ensino médio e o resultado
obtido no SAT (“scholastic aptitude test”). Scott, Bailey e Kienzl (2006) mostram que um
aumento médio de 100 pontos no SAT leva a um ganho de 7% nas taxas de graduação.
Outros estudos também expõem a importância do desempenho acadêmico anterior para a
conclusão com êxito de um aluno no nível universitário. (BAI E CHI, 2011; COHN ET AL.,
2004; O’REAR; SUTTON; RUBIN, 2010).
As explicativas que mais afetam as probabilidades de graduação parecem ser as
mesmas que impactam o desempenho em termos de nota no ensino superior. Griffith (2008)
evidencia que as três variáveis relacionadas acima também são importantes preditoras dos
CRs médios do ensino superior (GPAs). Robst, Keil e Russo (1998) concluem que o próprio
GPA é correlacionado com as taxas de graduação e afirma que o aumento em um ponto do
primeiro indicador impacta as taxas de graduação em 9%. Waltenberg e Carvalho (2012)
mostram que ingressantes por ações afirmativas em IES públicas estaduais apresentam em
média um desempenho 8,8% inferior no ENADE quando comparados aos não beneficiários.
Este é um resultado esperado para as universidades estaduais, na medida em que ingressantes
39
por ações afirmativas se classificam, na média, com um desempenho relativamente baixo no
vestibular.
Restringir a análise às duas primeiras dimensões pode não ser suficiente para uma
melhor avaliação dos benefícios da educação. Olbrecht (2009) revela que os atletas bolsistas
analisados em uma universidade americana apresentaram menores coeficientes de rendimento
do que o restante da faculdade. Mesmo assim, obtiveram um salário médio 10,7% maior em
empregos convencionais do que os alunos regulares. Esta aparente contradição possui uma
justificativa teórica razoável. O autor argumenta que os atletas possuem uma maior
autodisciplina e capacidade de trabalhar em equipe. Tais fatores exerceriam uma influência
positiva na produtividade e, por conseqüência, nos salários dos egressos que foram atletas
bolsistas durante a faculdade.
O objetivo deste capítulo é avaliar como o desempenho de cotistas e não cotistas se
manifestam em uma universidade com ações afirmativas no Brasil. Para isto utilizaremos
estatísticas descritivas para identificar como estão os dois grupos em termos de taxas de
progressão e coeficiente de rendimento médio. A estrutura do capítulo segue o seguinte
formato. A seção 2.2 contém revisão bibliográfica sobre retornos educacionais e ações
afirmativas. A seção 2.3 aborda o caso da UERJ com os dados disponíveis via ferramenta de
indicadores gerenciais. A seção 2.4 apresenta a conclusão com as principais questões
identificadas nos itens anteriores.
2.2 Desempenho Educacional e Ações Afirmativas
As ações afirmativas distorcem os outputs educacionais de uma universidade. Assim,
precisamos considerar este fato ao analisarmos os indicadores de progressão e as notas
médias.
Ao criar um grupo relevante de alunos com características socioeconômicas
diferentes dos outros ingressantes, a política de cotas da UERJ afeta a progressão de duas
formas principais. Primeiro, pelo fato de a nota média de entrada dos alunos cotistas ser
inferior à dos alunos não cotistas. Mostramos na introdução que o desempenho anterior
costuma ser uma explicativa relevante dos resultados no ensino superior. Assim, esperamos
encontrar um desempenho menor entre candidatos cotistas. Este risco é percebido na
argumentação de Pedrosa et. al (2007) que explicita a possibilidade de que ações afirmativas
40
possam terminar por diminuir os resultados acadêmicos do corpo estudantil das IES.
Segundo, porque os alunos cotistas possuem uma renda domiciliar menor e tal característica
pode influenciar para uma maior probabilidade de abandono dos estudos no nível de ensino
superior. Esta correlação se justifica pelo fato de que pessoas com menor renda se vêem mais
pressionados a trabalhar e, como explica Feres Junior (2006), os pobres também possuem um
menor acesso a recursos escolares como xérox, livros e passagens.
Existem alguns estudos que abordam a relação entre ações afirmativas e a retenção
dos alunos até a conclusão do curso.
Sander (2004) argumenta que a eliminação de
preferências baseadas em raça pode levar a um aumento na produção de advogados negros.
Isto porque os negros entrariam em faculdades menos seletivas, onde possuiriam uma maior
chance de graduação. Assim, o hiato das notas entre cotistas e não cotistas, quando relevante,
poderia prejudicar aqueles que estão tentando ajudar. Ele chama esta conseqüência de
“mismatch hypothesis”. Crosby e VanDeVeer (2000) argumentam que em universidades de
elite minorias medíocres podem sofrer de ansiedade e dúvida extra que não sentiriam em
universidades menos seletivas. Sowell (2004) concorda com esta argumentação e mostra que
na Universidade da Califórnia em Berkeley, onde as diferenças entre as médias do SAT de
não cotistas e cotistas ultrapassaram trezentos pontos em 1988, 70% dos negros não
concluíram a faculdade.
Porém outros estudos têm mostrado que todos os grupos aumentam a probabilidade de
graduação quando frequentam universidades seletivas, como por exemplo, Bowen e Bok
(1998) e Carnevale e Rose (2003). Griffith (2008) mostra que mais cem pontos na média do
SAT apresentado pelos alunos matriculados aumenta em 1,7% a probabilidade de graduação
em seis anos. Logo, como os cotistas se graduam mais quando alocados em instituições de
ponta, a mismatch hypothesis não seria válida. Além disto, os cotistas que se graduam em
uma instituição seletiva apresentam um maior prêmio salarial no mercado de trabalho em
comparação com cotistas egressos de IES com um menor desempenho no SAT. Sobre isto,
Dale e Krueger (2002) mostram que estudantes com um perfil socioeconômico desfavorecido
aumentam em 8% seus ganhos caso se matriculem em uma faculdade com mais de 200
pontos no SAT médio apresentado pelos calouros.
Embora a instituição das cotas pareça realmente favorecer os grupos contemplados,
isto não significa que inexista um problema de diferenciais de desempenho entre aqueles não
beneficiados e os beneficiados.
Bowen e Bok (1998), renomados defensores de ações
afirmativas, mostram que há diferenciais de CRs médios em todos os níveis de seletividade
41
das instituições pesquisadas (SEL-1, SEL-2 e SEL33). Griffith (2008) mostra que o hiato no
CR dos cotistas e não cotistas inicia-se em 0,2 no primeiro ano, reduzindo a magnitude até o
final do curso. Knapp, Kelly-Reid e Ginder (2010) revelam que as taxas de graduação no
ensino superior em seis anos para as principais raças estadunidenses estão com a seguinte
proporção: Afro americanos (39%), hispânicos (49%) e brancos (59%). Wei Chi (2011)
chega à conclusão de que as minorias também obtiveram CRs médios inferiores no ensino
superior chinês.
Estes estudos parecem indicar em sua maioria que tais políticas têm sido benéficas
para os candidatos-alvo das ações afirmativas. Porém, também revelam que há um custo para
a sociedade em termos de um hiato no desempenho entre os grupos não cotistas e cotistas.
Diferenças são percebidas tanto a nível dos CRs médios quanto ao nível das taxas de
conclusão.
A seção abaixo detalha os resultados encontrados na UERJ, que revelam tanto
conclusões que vão ao encontro das experiências internacionais, como particularidades não
verificadas em artigos anteriores.
2.3 Retornos Educacionais e A UERJ
A UERJ é a primeira instituição de ensino superior a adotar ações afirmativas no
Brasil. No período de 2003 até 2012, ingressaram pelo sistema de cotas 16607 pessoas das
quais 4738(28,53%) já se formaram e 4985 (30,01%) evadiram. Os demais alunos cotistas
se encontram matriculados vivendo o desafio de terminar a faculdade mesmo sofrendo com
um background familiar desfavorável. Desta forma, entender como os grupos cotistas e não
cotistas passam pelos diversos períodos rumo à evasão ou conclusão é de grande interesse
para gestores de políticas educacionais. Isto porque um bom desempenho relativo pelos
cotistas pode servir como um forte argumento para a manutenção da política de cotas e um
resultado contrário, como uma justificativa para a sua reforma ou eliminação.
3
Os pesquisadores dividiram as instituições pesquisadas em três níveis de acordo com as médias que os alunos
obteram no SAT. As instituições que têm em seu corpo estudantil um melhor resultado médio no SAT foram
alocadas ao grupo das universidades integrantes da SEL-1. As demais, também de acordo com as médias do
seu corpo estudantil, foram alocadas nos grupos SEL-2 e SEL-3.
42
Em nossa pesquisa sobre a progressão na UERJ nos concentramos em avaliar tão
somente os outputs educacionais e não como a organização interna da universidade pode
influenciar este desempenho. Assim, não é objeto de estudo a avaliação dos processos que
conduzem ao atual patamar de retenção e notas médias. Desta forma, a intensificação de
iniciativas como o Proiniciar4 podem melhorar os resultados dos alunos cotistas. Como
consequência, novas avaliações da política de cotas têm condições de apresentar resultados
diferentes do que apontamos aqui.
Para verificarmos a progressão na UERJ, analisamos as informações extraídas da
ferramenta BI5 sobre os CRs dos candidatos cotistas e as taxas de conclusão. As bases de
dados da progressão e do vestibular atualmente não são relacionadas, de forma que isto
impossibilita que recorramos neste momento a modelos econométricos.
Utilizamos como corte na avaliação da progressão na UERJ, os ingressantes pelo
vestibular de 2005. Temos informações disponíveis para 43 carreiras. Cada uma delas possui
particularidades que podem fazer com que um candidato cotista se saia melhor ou pior do que
um não cotista. Robst, Keil e Russo (1998) mostram, por exemplo, que a probabilidade de
negros e mulheres se formar aumenta quando estão matriculados em carreiras onde a
proporção de estudantes ou professores com as suas características é maior.
Em nossa pesquisa consideramos que a “dificuldade relativa do curso” é a principal
das particularidades que pode afetar o desempenho dos estudantes cotistas. Devido em boa
parte aos condicionantes socioeconômicos aos quais estão submetidos, os cotistas obtiveram
resultados significativamente piores no vestibular. Sabemos que o vestibular é uma boa
proxy para capturar os efeitos do conhecimento anterior do aluno. Desta forma, esperamos
que os cotistas apresentem um rendimento inferior quando deparados com cursos
4
O Proiniciar é uma política de permanência da UERJ para os estudantes oriundos de reserva de vagas. Além
das atividades acadêmicas, estes alunos recebem a Bolsa Permanência, atualmente no valor de R$ 300,00
(trezentos reais) durante todo o curso universitário, desconto no restaurante universitário e parte do material
didático para realização das suas atividades.
5
O Business Intelligence (BI) é uma ferramenta desenvolvida pelo departamento de informática da UERJ
(DINFO). Sua função é fornecer aos gestores da instituição dados relevantes sobre o vestibular e a progressão
dos alunos na universidade. A ferramenta extrai informações detalhadas das bases de dados da UERJ de
vestibular e graduação, as transforma e depois consolida em estatística descritiva. É um processo definido
como ETL (extract,transform e load) e o seu resultado final é uma interface amigável capaz de municiar
gestores com dados relevantes para tomadas de decisão. Desta forma, o sistema possibilita a geração de
indicadores através da definição pelo usuário dos filtros a serem aplicados.
43
desafiadores, com uma alta carga de matérias exatas, por exemplo. Tais carreiras exigem em
maior grau um conhecimento anterior que pode ser decisivo para a progressão dos cotistas.
Para lidar com esta questão criamos uma variável chamada de “dificuldade relativa do
curso” que foi definida a partir do CR médio apresentado em 2009 pelos ingressantes em
2005 regularmente matriculados na universidade. Considerando esta classificação, separamos
as carreiras em três grupos: alta, média e baixa dificuldade relativa.
Nossa visão se fundamenta no seguinte processo. Esperamos que ótimos alunos em
carreiras “fáceis” devam apresentar um coeficiente de rendimento bom. Ótimos alunos em
carreiras “difíceis” e alunos medianos em carreiras “fáceis” tendem a apresentar um CR
razoável e os alunos medianos em carreiras “difíceis” provavelmente obterão os piores
resultados. Assim, acreditamos que o CR médio de cada carreira em 2009 seja uma boa
forma de se capturar as dificuldades que os alunos estão tendo em progredir. A tabela 2.1
mostra uma relação parcial de cursos por nível de dificuldade relativa.
As carreiras de história e engenharia química são bons exemplos para uma exposição
da relação da qualidade dos alunos com a dificuldade do curso. Em 2005, ambos os cursos
apresentaram relações candidato/vaga em torno de dez. Seguindo a metodologia do capítulo
anterior, eles seriam definidos como carreiras de alto prestígio. Tais carreiras são
caracterizadas por uma alta concorrência com consequentes notas de corte elevadas. Assim,
pelo bom desempenho anterior dos alunos, poderíamos imaginar que em ambas as carreiras o
coeficiente de rendimento médio no ensino superior seja elevado. Isto não ocorre para o caso
da engenharia química. Ele se encontra entre aqueles definidos como de alta dificuldade
relativa, ou seja, é um dos cursos que possui um baixo CR médio.
Entendemos que este diferencial se dá principalmente pelas exigências do curso de
engenharia, que são reconhecidamente maiores que as de outras áreas. Este é um fenômeno
que parece comum em carreiras com um alto grau de concentração de disciplinas exatas,
onde destacamos a estatística, a matemática e as ciências econômicas.
2.3.1 CRs acumulados médios em 2006 e 2009 para os ingressantes em 2005.
Iniciamos a análise do desempenho dos alunos cotistas e não cotistas através dos CRs
acumulados médios dos alunos ingressantes em 2005 e que continuaram cursando a faculdade
em 2006 e em 2009. Como uma minoria consegue se formar antes de 2009, esses estão
44
excluídos da amostra. Os que desistiram ou foram expulsos da faculdade, também. As
informações com uma visão por carreira se encontram expostas na tabela 2.1.
Tabela 2.1. Coeficiente de rendimento acumulado médio dos alunos ingressantes em 2005 e
com status cursando em 2006 e 2009
Diferencial de CR
Dificuldade
Ranking
Carreira*
Relativa
CR acumulado
CR acumulado
CR acumulado
acumulado médio
médio
médio (NC)
médio (C)
entre NC e C
2006
2009
2006
2009
2006
2009
2006
2009
16,17%
16,36%
1 Ciência da Computação
Alta
4,48
4,25
4,81
4,56
4,14
3,92
2 Física
Alta
5,20
5,22
5,25
5,09
5,05
5,50
3,96%
-7,48%
3 Estatística
Alta
4,70
5,46
4,75
5,53
4,20
4,98
12,96%
11,18%
4 Matemática
Alta
5,43
5,46
5,48
5,53
5,25
5,23
4,26%
5,84%
5 Ciências Atuariais
Alta
5,71
5,58
5,95
5,82
4,58
4,35
30,01%
33,56%
15 Administração
Média
7,46
6,90
7,47
6,73
7,45
7,04
0,28%
-4,39%
16 Artes Visuais
Média
7,29
7,09
7,12
7,09
7,63
17 Filosofia
Média
7,01
7,09
7,11
7,33
6,79
6,72
4,78%
9,04%
18 Letras - Port / Francês
Média
7,14
7,13
7,98
7,83
6,37
6,50
25,28%
20,42%
19 Ciências Sociais
Média
7,53
7,16
7,72
7,48
7,35
6,91
5,12%
8,36%
29 Letras - Port / Literatura
Baixa
7,81
7,52
7,99
7,74
7,59
7,29
5,22%
6,23%
30 Letras - Port / Grego
Baixa
7,01
7,54
6,91
7,48
7,57
7,75
-8,78%
-3,44%
31 Letras - Inglês
Baixa
7,74
7,59
8,18
7,98
6,81
6,87
20,12%
16,11%
32 Letras - Port / Inglês
Baixa
8,18
7,68
8,24
7,80
7,34
6,39
12,23%
22,01%
33 Desenho Industrial
Baixa
8,09
7,72
8,43
8,02
7,69
7,52
9,57%
6,68%
CR médio das carreiras de alta dificuldade
5,10
5,19
5,25
5,31
4,64
4,80
12,97%
10,64%
CR médio das carreiras de média dificuldade
7,29
7,07
7,48
7,29
7,12
6,79
5,13%
7,37%
CR médio das carreiras de baixa dificuldade
7,77
7,61
7,95
7,81
7,40
7,16
7,39%
8,94%
CR médio de todas as carreiras
7,10
7,03
7,26
7,19
6,81
6,74
6,57%
6,72%
-
-6,65%
-
* A relação completa para todas as carreiras pode ser solicitada para o autor.
Fonte: Business Intelligence da UERJ. Elaboração própria.
Em relação aos hiatos nos CRs entre ambos os grupos, nota-se que a diferença média
das notas entre não cotistas e cotistas para todas as carreiras foi de 6,57% em 2006 e 6,72%
em 2009. Em cursos difíceis, o diferencial chega a 12,97% e naqueles definidos como
relativamente mais fáceis, o hiato diminui para 7,39% no primeiro ano.
Os dados da tabela 2.2 são uma consolidação dos resultados verificados
anteriormente. Nela podemos perceber que em 80% dos casos, o desempenho dos não
cotistas foi melhor. A diferença em termos de notas médias subiu conforme aumentamos a
dificuldade relativa do curso.
Nos cursos listados como mais difíceis, os não cotistas
45
apresentam um rendimento melhor em 92,86% das carreiras, sendo que em um terço delas, a
diferença nos CRs se torna superior a 10%.
Tabela 2.2. Coeficientes de rendimento médio acumulado. Visão consolidada por carreira
Melhor desempenho no CR
Dificuldade
médio acumulado (em %)
Grupo
Relativa
Diferença maior do que 10%
em ambos períodos
1 Ano
4 Anos
Não Cotistas
92,86%
92,86%
35,71%
Cotistas
7,14%
7,14%
0,00%
Não Cotistas
85,71%
57,14%
14,28%
Cotistas
14,29%
28,57%
0,00%
Sem informação
0,00%
14,29%
0,00%
Não Cotistas
73,33%
80,00%
20,00%
Cotistas
26,67%
20,00%
0,00%
Alta
Média
Baixa
Melhor desempenho no CR
Dificuldade
Grupo
Relativa
médio acumulado (em %)
Melhor desempenho no total
dos casos analisados
1 Ano
4 Anos
Não Cotistas
83,72%
76,74%
80,23%
Cotistas
16,28%
18,60%
17,44%
Sem informação
0,00%
4,65%
2,33%
Total
Magnitude do hiato em todas as
2006
6,57%
carreiras
2009
6,72%
Houve queda no hiato de performance
Sim
51,22%
entre 2006 e 2009?
Não
48,78%
Fonte: Business Intelligence da UERJ. Elaboração própria.
Esperávamos que, uma vez dentro da faculdade, os alunos cotistas conseguissem
diminuir a diferença nos rendimentos entre o primeiro e o quarto ano. A evasão de muitos
alunos não cotistas no primeiro ano e o efeito de pares dado pela convivência entre os dois
grupos poderia gerar uma tendência de melhora nos resultados dos cotistas ao longo do curso.
A tendência se revelou indefinida uma vez que o hiato médio das notas aumentou em 2009
porém, quando olhamos para uma visão por carreiras, os cotistas melhoraram marginalmente
seu desempenho relativo (51,22%).
46
Assim, entendemos que há um diferencial significativo em termos de notas médias
para os grupos não cotistas e cotistas e que ele tende a aumentar diante de cursos que exigem
uma maior dedicação e conhecimento anterior dos alunos.
2.3.2 CRs acumulados médios dos alunos formados.
Com o intuito de entendermos melhor como se revela o hiato das notas entre os
cotistas e não cotistas, expandimos a análise considerando apenas os estudantes ingressantes
em 2005 e que se formaram na UERJ entre os anos de 2005 e 2012.
Os dados se encontram na tabela 2.3. Através deles é possível verificar os diferenciais
de desempenho para aqueles que tiveram sucesso em obter o diploma da graduação e que por
isto, estão em condições de exercer a sua profissão no mercado de trabalho.
Tabela 2.3. Coeficiente de rendimento acumulado médio dos alunos ingressantes em 2005 e
com status concluído até 2012.
Ranking
Carreira*
Dificuldade
Relativa
CR acumulado CR acumulado
médio (Não
médio
cotista)
(Cotista)
Diferencial de CR
acumulado
médio entre não
cotistas e cotistas
1 Ciência da Computação
6,83
4,77
43,19%
2 Física
8,04
4,64
73,17%
6,94
5,85
18,70%
4 Matemática
7,07
7,06
0,15%
6 Ciências Econômicas
7,51
6,77
10,98%
15 Administração
7,39
7,09
4,29%
17 Filosofia
8,51
6,75
26,10%
8,82
7,55
16,82%
19 Ciências Sociais
7,96
7,31
8,90%
21 Letras - Port / Espanhol
7,95
7,42
7,16%
8,22
8,02
2,47%
7,90
7,74
2,07%
3 Estatística
18 Letras - Port / Francês
29 Letras - Port / Literatura
30 Letras - Port / Grego
Alta
Média
Baixa
47
31 Letras - Inglês
8,37
7,34
14,08%
32 Letras - Port / Inglês
8,04
7,60
5,74%
34 Nutrição
8,21
7,71
6,46%
CR médio das carreiras de alta dificuldade
7,40
6,36
16,35%
CR médio das carreiras de média dificuldade
8,05
7,48
7,71%
CR médio das carreiras de baixa dificuldade
8,42
8,05
4,69%
CR médio de todas as carreiras
7,96
7,33
8,50%
* A relação completa para todas as carreiras pode ser solicitada para o autor.
Número de observações: 878 não cotistas e 547 cotistas.
Fonte: Business Intelligence da UERJ. Elaboração própria.
Quando comparamos com as informações expostas na seção anterior, a diferença
percebida em relação aos CRs médios dos alunos não cotistas e cotistas aumentou de 6,5%
para 8,5% entre os concluintes até 2012. Nos cursos de maior dificuldade a diferença média
ultrapassou os 16%, caindo gradativamente para 7,71% e 4,69% quando considerados as
carreiras de média e baixa dificuldade relativa, respectivamente.
Da análise do comportamento detalhado por carreiras, foi possível perceber diferenças
significantes em muitas delas. Podemos destacar o diferencial de 43,19% para o curso
apontado como o de maior dificuldade relativa, ciências da computação. Ou de 73,17% para a
física, onde os cotistas graduados apresentaram um CR médio de apenas 4,64 pontos contra
8,04 dos não cotistas. Outras diferenças substanciais de rendimento puderam ser percebidas
para as carreiras de estatística, filosofia, letras (português-francês) e letras (portuguêsitaliano). Para todos estes casos, a diferença no CR médio acumulado final, ultrapassou os
15%.
O aumento nos diferenciais de desempenho entre os concluintes mostram que talvez
muitos cotistas estejam persistindo até a conclusão, diminuindo a média deste grupo na
comparação com os não cotistas. Essas impressões foram confirmadas na análise seguinte,
que se concentra na proporção de alunos cotistas e não cotistas que se graduam na UERJ.
2.3.3 Taxas de conclusão até 2009, 2010 e 2011
As próximas seções se concentram nas taxas de progressão. Mais precisamente na
conclusão e evasão dos estudantes. Iniciamos esta análise verificando as taxas de conclusão
48
dos alunos em três diferentes anos. As informações da tabela 2.4 mostram a porcentagem dos
ingressantes de 2005 que se formaram até 2009, até 2010 e até 2011. Os cortes foram
escolhidos para que aproximássemos o indicador para uma visão que evidencia o universo de
alunos que concluiu a faculdade em quatro, cinco ou seis anos. Desta forma, o foco na nossa
avaliação é o ano de saída da faculdade.
Tabela 2.4. Porcentagem de concluintes até 2009, 2010 e 2011 dos alunos ingressantes em
2005.
Ranking
1
2
3
4
5
15
16
17
Carreira e Tipo de Vaga*
Ciência da Computação
Até 2009
Até 2010
Até 2011
0,00%
0,00%
5,66%
Cotista
0,00%
0,00%
4,00%
Não Cotista
0,00%
0,00%
7,14%
1,75%
2,34%
4,09%
Cotista
0,00%
0,00%
8,00%
Não Cotista
2,05%
2,74%
3,42%
10,58%
15,38%
23,08%
Cotista
0,00%
14,29%
42,86%
Não Cotista
11,34%
15,46%
21,65%
20,88%
27,06%
30,59%
Cotista
25,00%
35,00%
38,33%
Não Cotista
20,00%
25,36%
28,93%
Ciências Atuariais
14,62%
22,31%
26,15%
Cotista
0,00%
0,00%
4,76%
Não Cotista
17,43%
26,61%
30,28%
39,39%
43,94%
53,03%
Cotista
42,59%
50,00%
64,81%
Não Cotista
37,18%
39,74%
44,87%
0,00%
25,00%
25,00%
Cotista
0,00%
0,00%
0,00%
Não Cotista
0,00%
33,33%
33,33%
3,51%
9,65%
12,28%
Física
Estatística
Matemática
Administração
Artes Visuais
Filosofia
49
18
19
29
30
31
32
33
Cotista
0,00%
4,00%
12,00%
Não Cotista
4,49%
11,24%
12,36%
14,29%
28,57%
28,57%
Cotista
22,22%
38,89%
38,89%
Não Cotista
8,33%
20,83%
20,83%
4,76%
13,33%
21,90%
Cotista
4,44%
8,89%
20,00%
Não Cotista
5,00%
16,67%
23,33%
42,24%
52,17%
54,04%
Cotista
50,82%
59,02%
62,30%
Não Cotista
37,00%
48,00%
49,00%
Letras - Port / Grego
30,00%
40,00%
40,00%
Cotista
100,00%
100,00%
100,00%
Não Cotista
22,22%
33,33%
33,33%
26,03%
42,47%
46,58%
Cotista
30,43%
43,48%
47,83%
Não Cotista
24,00%
42,00%
46,00%
Letras - Port / Inglês
53,66%
58,54%
60,98%
Cotista
25,00%
25,00%
25,00%
Não Cotista
56,76%
62,16%
64,86%
41,67%
75,00%
80,56%
Cotista
37,50%
62,50%
75,00%
Não Cotista
45,00%
85,00%
85,00%
35,71%
28,57%
42,86%
50,00%
57,14%
71,43%
66,67%
73,33%
73,33%
Letras - Port / Francês
Ciências Sociais
Letras - Port / Literatura
Letras - Inglês
Desenho Industrial
Porcentagem de cursos de alta dificuldade
com maior graduação de cotistas em
relação a não cotistas
Porcentagem de cursos de média
dificuldade com maior graduação de
cotistas em relação a não cotistas
Porcentagem de cursos de baixa dificuldade
com maior graduação de cotistas em
relação a não cotistas
50
Porcentagem de cursos com maior
graduação de cotistas em relação a não
cotistas
51,16%
53,49%
62,79%
* A relação completa para todas as carreiras pode ser solicitada para o autor.
Fonte: Business Intelligence da UERJ. Elaboração própria.
Os resultados são reveladores.
Ao contrário do que é percebido em estudos
internacionais, no caso da UERJ são os cotistas que possuem as maiores taxas de graduação.
Conforme avançamos os anos, os cotistas se graduam cada vez mais em relação aos não
cotistas. O percentual de cursos com maior graduação pelos beneficiários da ação afirmativa
aumenta de 51,16% das carreiras em 2009 para 53,49% em 2010 e 62,79% em 2011.
Observamos as taxas de conclusão consolidadas por nível de dificuldade relativa e
tipo de vaga na tabela 2.5. As taxas de conclusão só são maiores para os não cotistas se
considerarmos os anos de 2010 e 2011 para a carreira de alta dificuldade relativa. Em todos
os outros casos, são os beneficiários das ações afirmativas aqueles que mais se graduam.
Tabela 2.5. Porcentagem de concluintes até 2009, 2010 e 2011 dos alunos ingressantes em
2005 (por dificuldade relativa do curso).
Ranking
Alta Dificuldade
Média Dificuldade
Baixa Dificuldade
Total
Carreira e Tipo de Vaga
Até 2009
Até 2010
Até 2011
Cotistas
12,45%
19,54%
28,74%
Não cotistas
12,42%
23,05%
29,72%
Cotistas
27,21%
42,24%
49,04%
Não cotistas
23,49%
38,38%
42,07%
Cotistas
40,57%
55,49%
61,40%
Não cotistas
35,74%
50,66%
53,83%
Cotistas
27,07%
39,47%
46,74%
Não cotistas
24,16%
37,67%
42,15%
Fonte: Business Intelligence da UERJ. Elaboração própria.
O hiato a favor dos cotistas se mostra claro em duas dimensões: conforme avançam
os anos e à medida que diminui a dificuldade relativa.
Em relação à primeira questão, as
taxas de graduação entre os cotistas cresce num ritmo maior com o passar dos anos. Em
51
carreiras marcadas como de dificuldade média, por exemplo, houve um aumento de 27,21%
para 49,04% entre 2009 e 2011. Ou seja, 22 pontos percentuais. Entre aqueles não cotistas, o
aumento foi de 23,49% para 42,07%. Um acréscimo de 19 pontos percentuais.
Sobre a dimensão da dificuldade relativa, podemos perceber que os hiatos entre
cotistas e não cotistas para cursos de alta dificuldade são mínimos em 2009. Porém ele
cresce de forma significativa nas carreiras mais fáceis, atingindo um diferencial de 5p.p. O
fenômeno se repete para os anos de 2010 e 2011 onde os diferenciais verificados nos grupos
de baixa dificuldade relativa apontam para uma conclusão pelos cotistas em cinco e sete
pontos percentuais a mais, respectivamente.
Da análise das taxas de conclusão percebemos que, apesar de obterem um resultado
pior do que aqueles não cotistas em termos de notas médias, os cotistas estão se formando a
taxas maiores que o grupo não beneficiado. A nossa hipótese é de que embora estejam
apresentando uma dificuldade elevada em progredir, a utilidade da faculdade para os grupos
cotistas parece ser maior e tal valoração tem se traduzido em uma maior persistência e taxas
de graduação.
2.3.4 Evasão no primeiro ano e evasão no restante dos anos
Para complementar o entendimento da graduação entre os grupos cotistas e não
cotistas, expandimos a abordagem para analisar a evasão entre os dois grupos. Optamos por
dividir as taxas de evasão em duas tabelas. A tabela 2.6 que avalia os alunos que saíram da
UERJ durante o primeiro ano e a tabela 2.7, que concentra os estudantes que evadiram da
faculdade no intervalo de um a quatro anos.
Tabela 2.6. Taxa de evasão no primeiro ano dos ingressantes em 2005
Não cotistas
Ranking
Carreiras*
Dificuldade
% de
Relativa
Evasão
19,19%
Ciência da
1 Computação
Alta
0,00%
% de Evasão por
grupo de
dificuldade
relativa
18,00%
Cotistas
% de
Evasão
7,69%
0,00%
% de Evasão
por grupo de
dificuldade
relativa
7,21%
52
2 Física
31,01%
4,00%
3 Estatística
16,48%
0,00%
4 Matemática
20,93%
10,00%
5 Ciências Atuariais
17,17%
4,76%
17,14%
5,56%
0,00%
0,00%
15 Administração
16
Artes Visuais
17 Filosofia
Média
29,73%
15,40%
4,00%
18 Letras - Port / Francês
25,00%
5,56%
19 Ciências Sociais
27,45%
13,33%
29 Letras - Port / Literatura
23,71%
11,48%
30
44,44%
0,00%
Letras - Port / Grego
31 Letras - Inglês
Baixa
20,83%
12,83%
13,04%
32 Letras - Port / Inglês
9,59%
12,50%
33
0,00%
0,00%
Desenho Industrial
7,26%
3,87%
* A relação completa para todas as carreiras pode ser solicitada para o autor.
Fonte: Business Intelligence da UERJ. Elaboração própria.
A divisão nestas duas tabelas se inspira no artigo de Fletcher e Tienda (2008). Eles
argumentam que o primeiro ano serve para que os estudantes se aclimatem às exigências do
ensino superior. Assim, nos EUA muitos dos alunos cotistas de uma IES costumam desistir
já no inicio da faculdade. Como os melhores beneficiados tendem a permanecer, há uma
tendência de queda no hiato de performance entre os grupos favorecidos e não favorecidos.
Os autores mostraram que, mesmo controlando para uma série de variáveis, o diferencial de
CR entre cotistas e não cotistas reduziu-se em 50% no intervalo de seis semestres.
Entendemos que o comportamento da evasão no primeiro ano pode ser diferente do
verificado nos EUA.
A explicação para que este fenômeno possa apresentar um efeito
contrário no Rio de Janeiro se justifica pelo fato de existirem inúmeras IES de alta qualidade
no estado. Desta forma, esperamos que muitos dos alunos não cotistas que passam em mais
de um vestibular acabem por optar por outras instituições, mesmo depois de terem efetuado a
matrícula na UERJ. Há ainda aqueles que não atribuem um alto valor para a carreira em que
iniciaram a faculdade e que por isto, trancam suas matrículas para tentar um novo curso ou
faculdade no ano posterior.
Essa subvaloração por não cotistas pode ser explicada em parte pela sua
autoconfiança, pois sabem que são capazes de entrar em outra faculdade pública e em parte
53
pelo background familiar favorável, pois sabem que suas famílias podem arcar com os custos
de uma faculdade privada de alta qualidade. Por estes fatores, ao contrário da argumentação
dos autores supracitados, supomos inicialmente que a evasão entre não cotistas fosse
particularmente expressiva no primeiro ano. Imaginamos ainda, que o hiato em termos de
CRs médios diminuísse quando comparamos ambos os grupos, pois uma parcela razoável dos
melhores não cotistas acaba por abandonar a faculdade no primeiro ano. Se em relação aos
CRs não percebemos uma queda significativa no hiato de performance entre períodos, para a
evasão os dados confirmaram nossas expectativas.
Entre os alunos não cotistas, 15,6% abandonaram a UERJ no primeiro ano. Este
número é percentualmente cerca de três vezes maior do que o apresentado pelos cotistas
(5,8%). Esta diferença sugere que a instituição deva se preocupar também com a persistência
dos não cotistas. A evasão se revelou particularmente alta em cursos de alta dificuldade
relativa com uma tendência de queda significativa em carreiras mais fáceis. A evasão pelos
não cotistas atingiu o seu máximo em oceanografia, onde 69% dos alunos abandonaram a
faculdade no primeiro ano. Quando analisamos o universo dos cotistas, a evasão máxima no
primeiro ano foi de 26% em química. Mesmo em cursos de baixa dificuldade, a evasão entre
os não cotistas permaneceu alta, em 12,8%.
Este valor é três vezes maior do que o
apresentado pelos beneficiários da ação afirmativa, 3,8%.
Após isto, avaliamos o comportamento da evasão entre o segundo e o quarto ano. O
objetivo é captar como os alunos estão progredindo a partir do término dos desafios do
primeiro ano dos seus cursos. A diferença entre os dois grupos cai, porém ela se mantém
favorável aos cotistas, que continuam apresentando as menores taxas de evasão. Entre os não
cotistas a evasão no período se aproximou de 40% e para os cotistas, o resultado chegou a
32,8%.
Tabela 2.7. Taxa de evasão entre o segundo e quarto ano dos ingressantes em 2005
Não cotistas
Ranking
Carreiras*
Dificuldade
Relativa
% de
Evasão
39,35%
1 Ciência da
Alta
7,14%
% de Evasão
por grupo de
dificuldade
relativa
30,79%
Cotistas
% de
Evasão
32,88%
0,00%
% de Evasão por
grupo de
dificuldade
relativa
26,45%
54
Computação
2 Física
37,67%
24,00%
3 Estatística
36,08%
14,29%
4 Matemática
46,07%
50,00%
5 Ciências Atuariais
37,61%
38,10%
15 Administração
57,69%
44,44%
16 Artes Visuais
0,00%
100,00%
17 Filosofia
Média
38,20%
47,16%
40,00%
18 Letras - Port / Francês
45,83%
38,89%
19 Ciências Sociais
25,00%
11,11%
54,00%
49,18%
39,83%
Letras - Port /
29 Literatura
30 Letras - Port / Grego
31 Letras - Inglês
22,22%
Baixa
50,00%
7,14%
44,97%
34,78%
32 Letras - Port / Inglês
66,22%
62,50%
33 Desenho Industrial
15,00%
6,25%
32,66%
* A relação completa para todas as carreiras pode ser solicitada para o autor.
Fonte: Business Intelligence da UERJ. Elaboração própria.
A maior diferença percebida foi na dinâmica da evasão. No primeiro ano as evasões
se concentraram em carreiras com alta dificuldade. Para os demais períodos, os abandonos
são maiores em cursos de baixa dificuldade independente do tipo de vaga. Uma posição
normativa que respalde os resultados encontrados pode se centrar no fato de que as carreiras
mais difíceis filtram os alunos com maior persistência e/ou habilidade já nos primeiros
semestres, devido ao rigor das disciplinas que devem ser cursadas nos períodos iniciais. Os
“sobreviventes” desta primeira etapa estariam preparados para progredir com sucesso pelos
demais períodos. Entre carreiras de menor dificuldade, os desafios iniciais são superáveis
com uma maior facilidade e por isto a evasão neste tipo de curso parece mostrar um
comportamento mais homogêneo entre os semestres.
2.4 Conclusão
Os resultados da análise empírica do acesso à UERJ com foco na progressão dos
alunos que se matricularam na UERJ durante o ano de 2005 foram reveladores. Indo ao
encontro das pesquisas internacionais, identificamos que o desempenho dos não cotistas em
55
termos de coeficiente médio de rendimento é superior. Entre os que possuíam matrícula ativa
nos anos de 2006 e 2009, a diferença a favor dos não cotistas se mostrou positiva em 6,5%.
Quando o universo dos alunos passou a ser a dos concluintes até o ano de 2012, a diferença
aumentou para 8,5%. Percebemos também que a magnitude do hiato entre os alunos subiu
com o aumento da dificuldade relativa do curso, atingindo os 16% entre os concluintes das
carreiras mais difíceis.
Como os candidatos não cotistas são os mais preparados, é de se esperar que, além de
um resultado superior em termos de notas médias, eles apresentassem maiores taxas de
graduação.
Desta forma, o processo seletivo puramente meritocrático seria aquele que
geraria os maiores retornos educacionais. Isto pode não ser verdade para o caso da UERJ.
Em nossa pesquisa, descobrimos que a persistência dos cotistas é maior e isto se traduz em
maiores taxas de graduação. Logo, embora tenham se graduado com um coeficiente médio
menor do que os não cotistas, foi o grupo cotista quem percentualmente mais se formou pela
UERJ. Mostramos que as taxas de graduação entre os cotistas são maiores ao final de todos
os anos analisados (2009, 2010 e 2011), atingindo no final de 2011 uma taxa de 46,74%
contra 42,15% dos não beneficiários. Foi visto também que esta tendência se acentuou em
cursos com baixa dificuldade relativa, chegando a sete pontos percentuais em 2011.
Quando analisamos as evasões no primeiro ano e nos três anos subsequentes,
percebemos que o abandono pelos não cotistas foi particularmente alto no primeiro ano e se
manteve superior à da contraparte cotista na abordagem consolidada dos períodos seguintes.
A evasão entre ambos os grupos foi grande em cursos de alta dificuldade no primeiro ano e,
nos cursos de baixa e média dificuldade, após os dois primeiros períodos. Isto sugere que os
cursos mais difíceis têm filtrado os melhores alunos já no começo da jornada dos potenciais
formandos, o que não tem acontecido nas demais carreiras.
Da análise dos indicadores abordados neste capítulo, percebemos que apesar de
obterem um resultado inferior em termos de notas médias, os cotistas estão se formando a
taxas maiores que o grupo não beneficiado. Entendemos que embora estejam apresentando
uma dificuldade elevada em progredir, a utilidade da faculdade para os grupos cotistas parece
ser maior e tal valoração tem se traduzido em uma maior persistência e taxas de graduação.
Se por um lado, há uma perda de eficiência da universidade pelas graduações cotistas
traduzidas em um CR menor e consequente menor habilidade esperada, por outro há um
ganho vindo de maiores taxas de conclusão que se traduz em um menor desperdício de
recursos.
56
Os críticos das ações afirmativas argumentam que tal política invariavelmente traz
perdas significantes de eficiência para a universidade e consequentemente, para o país. Ao
contrário do que poderíamos esperar, o resultado que a política de cotas trouxe para a
sociedade se revelou indefinido e apresentou dois comportamentos contrários. Um positivo,
através de maiores taxas de graduação e um negativo, resultado de coeficientes de rendimento
menores.
Desta forma, entendemos que há bastante espaço para pesquisas no Brasil que foquem
no papel das ações afirmativas e retornos educacionais. Se outras pesquisas no país vierem a
confirmar maiores taxas de progressão para alunos cotistas ou altos retornos salariais para
estes grupos no mercado de trabalho, pode ser possível que cheguemos no futuro a não
rejeitar uma hipótese que hoje seria visto como controversa, a de que no Brasil as ações
afirmativas possam trazer uma maior eficiência da universidade e dos gastos públicos.
Para que este fenômeno ocorra seria necessário entender se o benefício das maiores
taxas de graduação e de eventuais retornos no mercado de trabalho entre cotistas superam os
custos indiretos (ex.: de um coeficiente médio menor) e diretos (ex.: gastos com o processo
seletivo, bolsas e programas de manutenção) das instituições de ensino superior que adotam a
política de cotas como instrumento de reparação de injustiças sociais e fomento de igualdade
de oportunidades.
Caso as taxas de graduação de cotistas em outras universidades públicas brasileiras
não sejam significativas, o debate normativo sobre a porcentagem ideal de cotas, ou se elas
são pertinentes, deve se valer de instrumentos que mostrem o quanto a sociedade perde - ou
ganha - de eficiência ou equidade com cada escolha.
57
CAPÍTULO 03. QUAL A EFICÁCIA DE POLÍTICAS DO TIPO COLOR-BLIND
PARA O AUMENTO DA DIVERSIDADE RACIAL?
SIMULAÇÕES PARA O
PROCESSO SELETIVO DA UERJ.
3.1 Introdução
O debate sobre a pertinência da aplicação de cotas raciais em universidades é um fato
amplamente documentado por pesquisadores estrangeiros.
Bowen e Bok (1998) defendem
no seu livro seminal as políticas de ações afirmativas como a melhor forma de se fechar o
hiato de preparação entre negros e brancos, causados por anos de diferenças de renda,
recursos, qualidade da escola e ambiente familiar. Os ex-reitores de Princeton e Harvard
mostraram que a presença de negros nas universidades pesquisadas desabaria na ausência da
utilização da cor como mais um critério válido nas admissões.
Se considerarmos as
universidades definidas como as mais seletivas nesta pesquisa, a queda da participação dos
negros em uma política que não leva em consideração a raça (“race neutral” ou “color-blind”)
seria de 7,8% para 2,1% do corpo estudantil. Concluem como consequência direta que a
única forma de se criar uma classe onde pretos e brancos possuam as mesmas médias de SAT
(“Scholastic Aptitude Test”) é discriminando contra os pretos.
Se no processo seletivo, a
defesa se baseia nas circunstâncias sobre as quais os negros são submetidos, na progressão a
argumentação se concentrou nas taxas de conclusão. Bowen e Bok (1998) evidenciaram que
as taxas de conclusão dos negros são altas e que são maiores na SEL-1, quando comparadas
aos demais grupos de seletividade. Eles apontam esta como uma importante descoberta
empírica que deporia contra os críticos da política. Fryer e Loury (2005) também expõem a
discriminação positiva como ferramenta útil para correção das violações históricas das
igualdades de oportunidades entre diferentes raças argumentando que qualquer outra ação
afirmativa é menos eficiente que a política “color-sighted”6 para atingir o mesmo nível de
diversidade racial.
6
Color-sighted é uma política de ação afirmativa no qual o critério racial é explicíto. Em contraposição a
políticas do tipo “color blind”, que possuem como objetivo diminuir as diferenças de oportunidades entre
indivíduos a partir de outros critérios sócio-econômicos, como por exemplo, renda ou tipo de escola.
58
Autores relevantes se posicionam contra as ações afirmativas em pesquisas empíricas
e posições normativas. Sowell (2004) avalia os resultados de diferentes políticas seguindo
uma perspectiva global. Em sua análise foram considerados casos na Nigéria, Sri Lanka,
Malásia, Índia e Estados Unidos. Concluí que, invariavelmente, onde foram implantadas, as
ações afirmativas fomentaram polarizações, ressentimentos e violências entre grupos étnicos.
A hipótese “cream layer” foi percebida em todos os casos. Segundo esta teoria, as reservas
de vagas acabam por beneficiar majoritariamente determinados subtipos com melhores
condições sócio-econômicas dentro de um tipo (Ex.: em um tipo que só considera “cor”,
negros ricos são beneficiados em detrimento de negros pobres). Como conseqüência, aponta
que as políticas de ação afirmativa pouco vêm contribuindo para o aumento do bem-estar dos
grupos desfavorecidos. Para legitimar a sua posição, reserva um capítulo com o objetivo de
criticar e contrapor os resultados encontrados por Bowen e Bok (1998). Heilman (1996)
destaca as consequências contraditórias que podem mitigar parte relevante dos ganhos para os
beneficiários, dentre eles: o estigma da incompetência que a população atribui aos cotistas; o
sentimento de inferioridade dada a auto-percepção de favorecimento no processo seletivo e a
reação de grupos não favorecidos pela política. Wydick (2008) acrescenta um efeito negativo
que pode ocorrer quando determinado tipo é frequentemente beneficiado por políticas de
ações afirmativas. Alega que se um empregador pode identificar o grupo das cotas no
mercado de trabalho (ex.: negros) mas não pode identificar indivíduos dentro de um grupo
(ex.: separar os negros que foram contemplados ou não por algum privilégio) então o salário
oferecido para todo o grupo beneficiário será menor que o grupo dos não cotistas. Outros
pesquisadores têm baseado sua argumentação na mismatch hypothesis (ROTHSTEIN;
YOON, 2008; GROVE; HUSSEY, 2011) afirmando que os estudantes negros se graduariam
com maior probabilidade se fossem admitidos em uma universidade onde os seus
desempenhos no vestibular estivessem de acordo com as notas médias dos demais candidatos.
Como a revisão da literatura norte-americana evidencia, e devido ao seu forte passado
de discriminação racial, o debate em torno deste tema se reduziu à pertinência ou não da
aplicação das ações afirmativas diretas. As cotas raciais se tornaram sinônimos de privilégios
para negros, indígenas e hispânicos desde o inicio das políticas na década de 60 até meados
dos anos 90, quando o cenário começou a se alterar nos Estados Unidos. Sabbagh (2011)
mostra que neste período os tribunais de Texas, Califórnia e Flórida proibiram qualquer ação
afirmativa direta para beneficiar os negros e que um princípio forte vem ganhando projeção
desde então, o “color-blindness”.
Segundo os advogados deste argumento, seria
59
intrinsecamente errado fazer distinções com base na cor. Eles se contrapõem tanto àqueles
que defendem o sistema meritocrático quanto àqueles que são a favor de cotas raciais. É uma
crítica que se concentra em torno de quais são os tipos válidos. A solução que surge desta
visão de mundo reside no advento de ações afirmativas indiretas. São iniciativas que visam
aumentar a participação de grupos desfavorecidos sem a utilização do critério racial (por ex.,
através da admissão dos melhores alunos de cada escola pública).
Analisando o caso brasileiro, César (2007) lista quais as porcentagens de vagas
reservadas por 25 universidades brasileiras. Dessas, 21 (84% do total) possuem alguma
reserva para negros. O mesmo percentual é verificado para alunos oriundos do sistema
público de ensino. Entre os outros critérios utilizados, temos a UERJ que utiliza recortes por
renda. A UFTO procura captar indígenas e a UEDI, residentes do Vale do Jequitinhonha.
Conclui-se que os dois tipos de ações afirmativas mais utilizadas no Brasil são aquelas que
reservam vagas para negros e estudantes de escola pública.
Entendemos que a instituição de reservas de vagas para o primeiro tipo sofra uma
rejeição significativamente maior pelos não beneficiados no Brasil. Confirmamos este
entendimento analisando os dados da UERJ expostos na tabela 3.1. Foi possível perceber que
apenas 22% dos candidatos não cotistas concordam com cotas para negros carentes enquanto
este número sobe para 50,75% quando eles são interrogados para cotas de egressos carentes
da escola pública.
Tabela 3.1. Opinião dos estudantes da UERJ em relação às reservas de vagas (em %)
Concordam
Negros e
com a atual
Total
Não Cotistas
Indígenas
Escola Publica
Deficientes
reserva de
vagas para:
Negros?
Sim
Não
Sim
Não
Sim
Não
Sim
Não
Sim
Não
27,08
72,92
22,82
77,18
85,27
14,73
52,03
47,97
72,72
27,28
pública?
54,81
45,19
50,75
49,25
89,26
10,74
96,32
3,68
87,87
12,13
Deficientes?
43,35
56,65
40,43
59,57
76,30
23,70
61,12
38,88
87,87
12,13
Escola
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
Aliado a isto, a tabela abaixo mostra como os candidatos pretos e pardos se
concentram em alguns grupos que são passíveis de serem representados por ações
60
afirmativas. Em relação ao tipo de escola, os autodeclarados pretos são 20,78% (quase duas
vezes a incidência populacional no estado do Rio de Janeiro) dos estudantes do ensino médio
publico estadual ao passo que na escola privada a sua proporção cai para 8,62%.
Se
considerarmos a questão da renda, a proporção de negros com renda bruta domiciliar menor
do que 3 salários mínimos é de 21,1% enquanto esta mesma proporção cai para 2,62% entre
aqueles que vêm de famílias que possuem acima de 30 salários mínimos. Assim nos
propusemos a investigar neste capítulo como a adoção de uma política do tipo color-blind
pode aumentar a representação de candidatos autodeclarados negros na UERJ.
Tabela 3.2. Estatísticas descritivas do Vestibular (em %)
Nome da Variável
Sexo Feminino
Fez Pré Vestibular
Fez Vestibular Anterior
Nenhum
Fundamental
Ensino da Mãe
Médio
Superior
Não Informado
Nenhum
Fundamental
Ensino do Pai
Médio
Superior
Não Informado
Menor que 3
Entre 3 e 5
Entre 5 e 10
Renda Bruta Domiciliar
Entre 10 e 20
Entre 20 e 30
Maior do que 30
Municipal ou Estadual
Privada
Tipo de Escola
Federal
Fora do RJ e/ou Brasil
IDH abaixo de 8,5
IDH entre 9 e 8,5
Bairros da cidade do RJ
IDH entre 9,5 e 9
IDH acima de 9,5
Fora da cidade do RJ
Indigena Amarela
0,92
2,69
1,02
2,59
1
2,23
Parda
24,47
25,59
23,94
Preta
12
12,72
11,92
Branca
59,92
58,08
60,91
2,36
2,36
34,99
22,46
37,83
1,06
2,83
34,25
20,49
41,37
1,16
2,5
26,76
13,88
55,7
0,86
1,74
17,38
6,2
73,82
2,24
3,79
28,44
17,08
48,45
2,21
2,88
36,28
19,91
38,72
1,17
3,16
32,41
18,68
44,58
0,95
2,26
26,55
13,61
56,63
0,95
1,8
17,48
6,07
73,7
1,77
2,54
29,02
20,19
46,48
1,44
2,53
31,35
21,1
43,58
1,03
2,67
27,34
13,81
55,15
0,92
2,08
22,58
8,75
65,67
0,8
1,77
15,93
4,53
76,97
0,83
1,4
14,36
2,62
80,79
1
1,9
12,04
2,31
82,75
0,95
2,35
32,92
20,78
43
1,06
2,22
20,18
8,62
67,92
1,03
2,06
26,59
10,92
59,4
1,4
2,2
21,19
7,94
67,27
1,15
2,44
30,13
17,93
48,35
0,92
1,79
24,85
11,67
60,77
1
1,98
19,16
7,2
70,66
0,68
1,69
15,21
3,4
79,02
1,16
2,53
25,54
13,12
57,65
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
61
A estrutura do capítulo segue o seguinte formato. A seção 3.2 descreve o processo de
construção e a justificativa de utilização de cada uma das bases. A seção 3.3 mostra os
resultados estatísticos e econométricos encontrados pela avaliação das bases simuladas e a
seção 3.4 apresenta as principais conclusões do capítulo.
3.2 Descrição e justificativa das bases simuladas para o vestibular UERJ 2010.
A partir do arquivo original descrito no capítulo anterior é possível realizar
simulações da composição dos alunos sob diferentes políticas de ação afirmativa. A cada
simulação, alteram-se os parâmetros de admissão para que se tenha um novo corpo de
candidatos beneficiados, prejudicados e classificados. Desta forma, foram criadas bases que
definem a classificação teórica dos candidatos sob diferentes distribuições de vagas entre
cotistas e não cotistas. Foram definidos os critérios meritocrático7, cor preta, raça negra mais
renda e escola pública mais renda. A razão para estas escolhas reside no fato de que estamos
interessados em investigar a composição dos alunos de cor negra sob as principais políticas
de admissão adotadas no Brasil. Para que seja possível a comparação das diferentes bases
criadas, foi estabelecido o mesmo percentual de reserva de vagas para todas (20%).
Concordamos com a argumentação de Feres Junior (2006) que afirma que a definição do
percentual de 20% para cotas, comum a quase todas as medidas adotadas, não parece ter tido
uma justificativa nítida. Estas impressões são facilmente atestadas quando, por exemplo, o
mesmo percentual de reserva de vagas para cor é adotado por instituições em estados que
possuem ampla diferença de composição racial. Escolhemos este percentual exclusivamente
devido a sua ampla utilização e aceitação. Como ressalva, defendemos que as decisões
devam se respaldar em avaliações empíricas detalhadas tanto para o acesso quanto para a
progressão dos alunos em uma universidade.
7
Embora a meritocracia possa ser entendida em um sentido mais amplo, do caminho percorrido por cada
candidato, vamos adotar uma visão simplista e liberal do conceito. A ideia é definir como um sistema
meritocrático aquele que não possui reserva de vagas e utiliza apenas a nota final como critério de
classificação.
62
3.2.1 Base do vestibular UERJ 2010
Conforme detalhado no capítulo anterior, esta base contém as informações de todos os
alunos que prestaram o vestibular de 2010 da UERJ. Como se trata da base original é a única
que não possui apenas 20% de reserva de vagas. Quando nos referirmos a esta política, está
implícita a atual composição de cotas definida por lei que estabelece 45% das vagas para
grupos cotistas, distribuídas da seguinte forma:
20% para negros e indígenas, 20% para
estudantes de escola pública e 5% para outros grupos (deficientes e filhos de policiais mortos
em serviço, por ex.). Lembramos que todas as vagas possuem um recorte de renda, que para
o ano de 2010 foi definido em 960 reais.
3.2.2 Base: Escola pública e renda.
Dentro do contexto das ações afirmativas indiretas, o argumento normativo que
emerge pelos adeptos da linha de pensamento “color-blindness” centra-se no fato de que as
vidas marcadas pela pobreza e má educação são menos hábeis para se defender de qualquer
opressão social, independente de sua natureza. (RODRIGUEZ, 2003) O foco das ações
deveria se dirigir à correção dessas distorções sócio-econômicas independente da cor de um
indivíduo. Se nem todos os negros são igualmente discriminados, pois aqueles não educados
e pobres são os mais vulneráveis ao racismo, então uma solução que corrija as distorções de
renda beneficiaria aqueles dentro de cada tipo de cor, os que mais necessitam de suporte.
Ao analisar a representatividade dos pobres nas universidades dos Estados Unidos,
pesquisadores concluem que a distribuição de renda tem sido uma barreira significativamente
maior do que o racismo. Hill e Winston (2008) mostram que apenas 10% dos estudantes
pesquisados vêm dos 40% mais pobres. Carnevale e Rose (2003) revelam que os pobres
estadunidenses têm sido sub-representados em larga escala, mesmo quando comparado com
outras minorias alvo de ações afirmativas. Africanos e hispânicos são 6% de 146 faculdades
pesquisadas enquanto suas composições na população norte-americana giram em torno de
15% e 13% respectivamente. Em relação às distorções do acesso motivadas pela renda, foi
63
verificado que apenas 10% dos alunos se encontram entre os 50% mais pobres. Ou seja, se
entendermos como justo o ponto em que a proporção de jovens de um tipo no país se iguala a
proporção de jovens do mesmo tipo na universidade, temos que os referidos tipos estão subrepresentados nos estados unidos.
Se o critério de renda se mostra tão relevante na literatura internacional assim como
nos resultados das regressões apresentadas no capítulo anterior, se torna necessária a
avaliação do quão determinante ele é para a entrada no vestibular de uma instituição
brasileira. Além de ser fundamental separar os alunos pela renda, acreditamos que uma
política justa deva procurar mitigar possíveis favorecimentos dentro de um tipo. Fenômeno
este que, como vimos, é denominado por pesquisadores estrangeiros como “cream layer”.
O ensino médio público no Brasil é reconhecidamente de pior qualidade8 quando
comparamos com a iniciativa privada. Portanto, alunos provenientes de um melhor sistema
de ensino seriam favorecidos em um critério que levasse em conta apenas a renda familiar.
Por isto, seria recomendável, além da instituição do critério de renda, um que limite a reserva
aos candidatos provenientes do sistema público de ensino.
Alguns podem considerar
importante a criação de uma outra reserva que também contemple os pobres que cursaram o
ensino médio em escolas privadas. Estaríamos neste caso com um sistema que reserva dois
percentuais de vagas. Um para estudantes pobres egressos da escola pública, outro para a
contraparte que cursou o ensino médio em escolas privadas ou federais. Esta divisão evitaria
que alunos carentes vindos de um sistema de ensino fossem chamados em detrimento dos que
vieram de outro, por exemplo. Além disto, fortaleceria as oportunidades de todos os alunos
pobres quando comparados aos de maior classe social.
Não estamos sozinhos neste posicionamento normativo, outros pesquisadores
argumentam sobre possíveis ganhos na esfera da justiça distributiva que reservas com um
duplo critério podem trazer. Amadei (2007) afirma que para melhor corrigir as distorções
sociais é necessária uma combinação de tipos.
Waltenberg (2007) expõe que uma política
combinada de ensino público e cor pode ser recomendável diante do seguinte cenário: negros
ricos sendo favorecidos diante dos pobres do mesmo tipo e estudantes de escola pública
8
Embora o ensino médio público estadual seja reconhecidamente de menor qualidade média, isto não é
verdade para as escolas federais. Mesmo assim, optamos por utilizar ambos os tipos de escola em conjunto.
O motivo disto reside no fato que estamos interessados em simular políticas utilizadas no Brasil e elas, na sua
grande maioria, não discriminam estes tipos de escola.
64
brancos apresentando melhores resultados que a sua contraparte negra. Os resultados
encontrados no primeiro capítulo aparentam corroborar com esta visão. Mostramos que a
UERJ adota um corte econômico e que está obtendo sucesso no objetivo de aumentar a
igualdade de oportunidades. Pode-se afirmar isto através da constatação de que a referida
universidade vem captando em sua maioria estudantes de condições adversas que não
conseguiriam se classificar pelo sistema meritocrático.
Para que seja possível fornecer dados empíricos que embasem ou comprovem a
pertinência desta visão de mundo, simulamos como seria a composição dos alunos sob um
duplo critério, de renda e escola pública. Para criar esta base, selecionamos os candidatos
concorrentes pela reserva de cor e deficientes físicos que vieram do ensino médio público e
acrescentamos essas observações ao respectivo universo dos cotistas que estudam em escolas
públicas. Com isto, a amostra dos candidatos cotistas foi acrescida em 683 observações, das
quais 660 vieram da reserva para negros e a restante, dos deficientes físicos.
3.2.3 Base: Cor “Preta”
Conforme mostrado na introdução, as ações afirmativas para negros vivem dois
momentos distintos nos EUA e no Brasil. Se no país norte americano as cotas para cor se
deparam com constantes ataques por setores que defendem a meritocracia ou pelos
partidários do princípio “color-blindness”, no Brasil a política de reserva de vagas para
negros “color-sighted” se encontra no seu máximo histórico. Em abril de 2012, o superior
tribunal federal brasileiro votou com unanimidade à favor da constitucionalidade das ações
afirmativas raciais como um meio de correção legítimo das desigualdades sociais. Outro
passo importante rumo à consolidação das cotas raciais se materializou no decreto assinado
pela presidente brasileira em outubro de 2012 determinando que todas as universidades
federais passem a reservar vagas para cor. Estas decisões implicarão em uma expansão
significativa deste tipo de política no ensino superior brasileiro durante os próximos anos.
O conceito da raça negra é um projeto ideológico. Movimentos raciais negros no
Brasil vêm tentando consolidar uma identidade negra com raízes na cultura afro.
A
consequência desta abordagem reside no fato de que a sociedade deveria entender um novo
65
conceito onde o negro deixa de ser aquele que possui a cor preta. Nesta nova abordagem o
negro passa a ser todo aquele que possui pele escura (preta ou parda) e que se identifica
plenamente com questões sociais e históricas predominantes entre os africanos e seus
descendentes brasileiros. Conforme mostra Pinto (2006) o individuo passa agora por um
processo de descoberta. “Me descobri negro há xx anos”, “Só me dei conta de que sou negro
há xx anos”, “Estou aprendendo a ser negra”. Assim, procuram unir na mesma classificação
os autodeclarados pretos e pardos como “negros”.
O ato de se utilizar o termo “negro” para vincular os pardos àqueles que se
autodeclaram pretos vem se revelando polêmico e possui oposição tanto de setores contra
ações afirmativas (KAMEL, 2006) quanto daqueles que as apoiam (FERES JUNIOR E
ZONINSEIN, 2006). A argumentação de Feres Junior centra-se no fato de que apenas
0,68% da população de pardos brasileira se autodeclara como negros. Investigamos os dados
para o caso da UERJ e chegamos a conclusão que apenas 3,63% dos pardos se candidataram
pelas cotas. Logo, mesmo possuindo três vezes o contingente populacional dos pretos, os
pardos são apenas 23% da composição de candidatos que concorrem pela reserva de vagas
por cor.
Tal definição se torna problemática na seguinte situação. Em um primeiro momento,
para justificar um percentual elevado de reserva de vagas, os partidários das ações afirmativas
têm utilizado o conceito de negros. Desta forma há um aumento considerável de potenciais
candidatos com desvantagens socioeconômicas. Uma vez a política implantada, é possível
perceber que a grande maioria dos candidatos vem da cor preta e não há uma iniciativa desses
mesmos grupos em buscar uma maior participação dos pardos nas vagas reservadas.
Dada a baixa autodeclaração de pardos como negros, a incorporação de observações
desta cor no conceito de raça fica prejudicada. Por este motivo e pela inviabilidade de se
saber quais pardos se declarariam por cotas para negros, optamos por criar esta base
considerando somente aqueles que responderam o questionário sociocultural marcando a
opção de cor como “preta”.
A criação de uma base para negros que não considera o recorte de renda é natural para
muitos defensores de cotas raciais. Santos (2006) , por exemplo, se mostra contrário à lei
vigente de cotas da UERJ pelo fato de ela combinar o corte de renda ao critério étnico-racial.
Argumenta o autor que dessa maneira dividem-se os negros entre cotistas carentes e não
66
cotistas. Este fato prejudicaria a unidade da identidade negra coletiva. Bowen e Bok (1998)
citam a crítica de que as ações afirmativas raciais admitem minorias mais ricas, em melhores
lares e escolas. Eles respondem argumentando que isso é justificável por expiar um legado de
opressão e pelo fato de a referida política poder compensar os grupos reprimidos por
contínuas discriminações na sociedade.
Por fim, o critério de cor é aquele que maximiza a diversidade racial.
Como
conseqüência, a simulação desta base é importante tanto para opositores quanto para os
advogados do critério racial. Para aqueles que a defendem, entender a nova composição dos
alunos é transparente e fundamental. Para os críticos é importante saber o quanto uma
política que desconsidera a existência de raças pode avançar na igualdade racial em relação à
política para pretos. Ao definirmos os cotistas como os autodeclarados “pretos” chegamos à
base com o maior número de candidatos, 3235.
3.2.4 Base: Raça negra e renda.
A razão para verificar um critério de cor combinado com a renda é basicamente a
mesma da base de escola pública e renda. Evitar o efeito “cream layer”. Ou seja, que
subgrupos privilegiados dentro de um tipo historicamente desfavorecido se beneficiem com
uma grande maioria das vagas. A instituição do recorte de renda para a cor evita que negros
privilegiados egressos de escolas de ótima qualidade consigam as vagas que seriam de outra
forma, ocupadas por negros carentes. É uma visão de mundo que pode ser resumida através
do relato de Rodriguez (2003): “Eu não concordo que todos os negros são igualmente
negros. Aqueles não educados e mais pobres são os mais vulneráveis ao racismo”.
Neste critério, optamos por manter o recorte socioeconômico de renda para os
candidatos cotistas. Para viabilizar esta ação, trouxemos para o universo dos cotistas negros,
todos aqueles candidatos pelas demais reservas e que se autodeclararam como pretos no
questionário sociocultural. Como resultado, aumentamos a amostra original cotista negra em
125 candidatos. Desses, 119 vieram das reservas para estudantes de escola pública e quatro
para deficientes.
67
3.2.5 Base: Meritocrático.
O critério que não reserva vagas, comumente chamado de meritocrático, é também
historicamente o mais utilizado no país. Sob esse sistema, o único parâmetro de admissão
válido é o resultado em provas de proficiência, que, no ensino superior, é chamado de
vestibular. Antes da instituição do regime de cotas pela UERJ, todas as instituições de ensino
superior (IES) públicas brasileiras utilizavam esta forma de acesso em seus processos de
seleção.
Os defensores desta política argumentam que qualquer sistema de cotas discrimina
contra aqueles mais aptos e que por isto deporia contra o mérito. A conclusão natural desta
afirmativa centra-se na constatação de que a meritocracia é justa pelo fato de que somente ela
garante uma igualdade de todos perante a lei. Os meritocratas também afirmam que este é o
processo seletivo que conduz ao melhor aproveitamento dos recursos escassos aplicados no
ensino superior. Assim, costumam expor preocupações relativas à piora nos resultados de
universidades que adotam o regime de cotas.
Além dos fatores relacionados, outra justificativa para a utilização da presente base
reside no fato de que esta política reflete, por hipótese, a composição natural dos alunos da
UERJ. Composição essa que se estabeleceria em um regime de não intervenção estatal na
definição das reservas de vagas. Esta é a base contrafactual. Ao compararmos as demais
simulações com esta, podemos inferir como as diferentes reservas de vagas afetam as
oportunidades de acesso dos grupos desfavorecidos definidos.
3.3 Resultados das Simulações
3.3.1 Candidatos Cotistas por Política
Como cada política de reserva de cotas se respalda em uma visão normativa e age
para corrigir uma determinada injustiça social, ela acaba por implicar em universos diferentes
68
de candidatos. A tabela 3.2 mostra que apesar de possuírem uma reserva de vagas de 45%,
apenas 10% dos candidatos atuais da UERJ são cotistas.
Tabela 3.3. Simulação da composição dos candidatos em diferentes políticas de cotas
Tipo de política de
cotas
% de
Total de
% de
Total de
reserva de
candidatos
candidatos
candidatos
vagas
cotistas
cotistas
não cotistas
Vigente da UERJ
45
2616
10,56
24769
Renda
20
2190
8,69
25195
Raça Negra + Renda
20
1199
4,58
26186
Pretos
20
3235
13,40
24150
0
0
0,00
27385
Escola Pública +
Sem Cotas
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
Devido ao fato de as simulações de “raça negra e renda” e “escola pública e renda”
possuírem tipos mais restritos, naturalmente este número cai nas simulações e atinge o valor
de 4,58% no primeiro caso. Quando retiramos a condição de carência do critério relativo à
cor, a composição do universo cotista sobe quase três vezes, para 13,40% do universo total de
candidatos. O contingente de candidatos sobe de tal forma que excede a atual política de
cotas da UERJ. Tal porcentagem de candidatos inclusive ultrapassa a proporção da mesma
cor no estado do Rio de Janeiro, 11,11%.
3.3.2 Análise da Fronteira: Displacing/Displaced.
Conforme mostramos no capítulo sobre o acesso, displacing são os alunos afetados
positivamente pela introdução do sistema de cotas e displaced são os que foram rejeitados
pela instituição, para que os cotistas pudessem ser admitidos. A tabela 3.3 mostra os perfis
socioeconômicos dos candidatos que se encontram na fronteira sobre diferentes políticas de
ação afirmativa.
Tabela 3.4. Análise Displacing e Displaced sob diferentes políticas de cotas
69
UERJ
Variáveis / Tipo de política
Displacing
Escola pública e renda
Displaced
Displacing
Displaced
Mulheres
55,54%
50,59%
56,17%
49,58%
Fez Pré Vestibular
57,51%
50,03%
54,03%
50,41%
Fez Vestibular Anterior
80,48%
81,19%
79,40%
82,57%
Público - Estadual
65,25%
10,53%
74,46%
13,40%
Tipo de
Público - Federal
15,01%
14,62%
22,40%
13,56%
Escola
Privado
16,27%
68,78%
0,00%
67,33%
3,45%
6,05%
3,13%
5,69%
Cor "Branca"
31,31%
71,12%
41,51%
68,84%
Cor "Negra"
33,28%
5,35%
22,40%
7,53%
Cor da Pele Cor "Parda"
31,86%
20,45%
32,78%
19,93%
Cor "Amarela"
1,80%
2,12%
2,14%
2,68%
Cor "Indigena"
1,70%
0,94%
1,15%
1,00%
RB menor que 3
61,05%
13,21%
58,64%
14,90%
RB entre 3 e 5
29,50%
19,43%
30,10%
22,78%
Renda
RB entre 5 e 10
8,57%
29,74%
10,70%
27,80%
Familiar
RB entre 10 e 20
0,78%
23,05%
0,32%
22,27%
RB entre 20 e 30
0,07%
9,28%
0,16%
7,70%
RB > 30
0,00%
5,27%
0,00%
4,52%
IDH acima de 9,5
3,77%
17,61%
4,77%
13,56%
IDH entre 9,5 e 9
7,31%
20,75%
8,07%
21,10%
IDH entre 8,5 e 9
14,78%
13,91%
15,98%
13,06%
IDH abaixo de 8,5
31,83%
13,67%
31,46%
16,58%
Fora da cidade do RJ
42,30%
34,06%
39,07%
35,67%
4,01%
0,78%
3,13%
0,33%
Ens. Fundamental
38,39%
9,91%
38,22%
12,39%
Ens.Medio
42,64%
32,03%
43,32%
35,17%
Ens.Superior
11,72%
55,86%
10,70%
50,08%
"Não Sei"
3,22%
0,78%
4,61%
2,01%
Nenhum
4,24%
0,62%
4,44%
0,67%
Ens.Fundamental
38,39%
8,96%
40,69%
11,39%
Ens.Medio
37,05%
29,50%
36,07%
32,83%
9,99%
57,19%
8,73%
51,08%
"Não Sei"
10,30%
3,69%
10,04%
4,02%
1 Pessoa
3,54%
4,40%
2,65%
5,36%
2 Pessoas
13,76%
13,21%
11,03%
14,90%
3 Pessoas
30,05%
25,33%
30,14%
22,11%
Fora da cidade do RJ
Bairro
Nenhum
Educação da
Mãe
Educação do
Pai
Ens.Superior
Pessoas na
Família
70
4 Pessoas
34,22%
36,74%
33,60%
37,01%
5 Pessoas
13,53%
15,81%
15,65%
15,41%
6 Pessoas
3,30%
2,83%
4,61%
3,18%
7 Pessoas
1,57%
1,65%
2,30%
2,01%
Tamanho da Amostra
1271
1271
603
603
Negros e renda
Variáveis / Tipo de política
Displacing
Negros
Displaced Displacing
Displaced
Mulheres
55,76%
50,93%
51,53%
48,26%
Fez Pré Vestibular
58,97%
49,20%
56,51%
50,00%
Fez Vestibular Anterior
84,31%
81,83%
81,22%
82,88%
Público - Estadual
53,30%
12,92%
27,77%
15,96%
Público - Federal
10,58%
14,79%
12,83%
13,07%
Privado
33,64%
66,66%
55,55%
65,00%
Fora da cidade do RJ
2,45%
5,61%
3,83%
5,96%
Cor "Branca"
2,83%
70,41%
0,00%
72,11%
Cor "Negra"
72,02%
5,24%
100,00%
0,38%
Cor "Parda"
22,49%
20,03%
0,00%
22,69%
Cor "Amarela"
0,00%
3,18%
0,00%
3,84%
Cor "Indigena"
2,64%
1,12%
0,00%
0,96%
RB menor que 3
60,30%
15,91%
28,73%
16,34%
RB entre 3 e 5
31,56%
20,41%
33,71%
20,76%
Renda
RB entre 5 e 10
7,37%
27,15%
24,71%
27,69%
Familiar
RB entre 10 e 20
0,75%
22,84%
9,19%
21,73%
RB entre 20 e 30
0,00%
8,42%
2,49%
8,46%
RB > 30
0,00%
5,24%
1,14%
5,00%
IDH acima de 9,5
3,59%
15,16%
4,02%
13,26%
IDH entre 9,5 e 9
5,86%
21,72%
12,45%
22,11%
IDH entre 8,5 e 9
14,17%
13,10%
14,17%
14,42%
IDH abaixo de 8,5
31,79%
15,54%
31,41%
14,42%
Fora da cidade do RJ
44,99%
34,45%
37,93%
35,76%
3,78%
0,18%
1,34%
0,38%
Ens. Fundamental
36,48%
11,23%
22,98%
10,76%
Ens.Medio
44,23%
34,26%
42,33%
36,15%
Ens.Superior
11,90%
52,24%
30,84%
50,96%
"Não Sei"
3,59%
2,05%
2,49%
1,70%
Nenhum
3,21%
0,37%
1,34%
0,96%
Ens.Fundamental
36,29%
12,54%
20,11%
11,73%
Ens.Medio
36,48%
29,21%
39,27%
30,00%
Tipo de Escola
Cor da Pele
Bairro
Nenhum
Educação da
Mãe
Educação do
Pai
71
Pessoas na
Família
Ens.Superior
10,39%
53,55%
31,22%
52,30%
"Não Sei"
13,61%
4,30%
8,04%
5,00%
1 Pessoa
3,40%
5,43%
4,21%
5,38%
2 Pessoas
17,20%
15,35%
13,98%
14,61%
3 Pessoas
32,13%
22,47%
27,01%
22,30%
4 Pessoas
31,37%
36,70%
34,86%
37,69%
5 Pessoas
11,34%
14,60%
14,36%
15,57%
6 Pessoas
3,78%
3,55%
3,06%
3,07%
7 Pessoas
0,75%
1,87%
2,49%
1,34%
532
532
521
521
Tamanho da Amostra
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
O tamanho da amostra na análise displacing e displaced é fundamental para sabermos
o impacto da política. Uma vez que estamos analisando apenas os candidatos diretamente
afetados pela introdução do sistema de cotas, quanto maior o número de observações maior o
impacto da política na redefinição dos classificados. Das bases simuladas, a denominada
“escola pública e renda” é aquela que mais classificou candidatos cotistas que não se
classificariam no sistema puramente meritocrático (603) e a de somente pretos a que menos
alterou a composição dos alunos (532).
Em relação aos fatores socioeconômicos, tanto a atual política da UERJ quanto as
demais simulações que possuem recortes de renda mostram que estas políticas atendem ao
objetivo de se redistribuir vagas de alunos com condições favoráveis para aqueles que
provêm de situações de carência.
Nas três bases com condição de carência (atual política, escola pública e raça) mais de
50% dos candidatos do tipo displaced possuem pais com ensino superior enquanto cerca de
40% dos displacing possuem pais com no máximo, o ensino fundamental. Em relação ao
tipo de bairro, 35% dos eliminados vieram de locais com IDH maior do que 9,5. Em relação
aos cotistas, cerca de 30% dos agora classificados vieram de bairros com o menor IDH
definido, abaixo de 8,5. Este comportamento que é similar nas três bases se verifica também
para as outras características socioeconômicas expostas. Desta forma, podemos concluir que
na avaliação consolidada para todos os cursos, essas três bases excluem candidatos de classe
média alta em prol de um perfil de alunos que vêm de classe média baixa.
72
Quando comparamos o critério de cor à atual política e às demais bases, a simulação
apresenta um perfil semelhante apenas para os candidatos excluídos da amostra. A grande
diferença se revela no perfil dos candidatos classificados (displacing) pelo sistema de cotas.
Quando retiramos o critério da renda e consideramos apenas a cor do candidato, o
perfil socioeconômico dos beneficiados sobe, sugerindo que em boa parte os pretos
beneficiados são aqueles advindos de um background familiar favorável. Se sobre o duplo
recorte renda-cor, apenas 10% dos admitidos possuíam mãe com ensino superior, sobre o
critério de cor essa proporção sobe para 30%. Quanto ao tipo de escola, a representação de
pretos egressos de escolas com uma menor qualidade média (estadual) cai de 53% para 27%.
Nesta simulação, as maiorias dos classificados por causa da política viriam de escolas
privadas. O mesmo fenômeno se repete nos outros condicionantes socioeconômicos. Ao
beneficiar somente a cor, este critério contribui em menor grau para a amenização das demais
injustiças sociais que se manifestam de diversas maneiras, como em tipos de escola, bairros
de origem ou renda bruta.
3.3.3 A Igualdade Proporcional: Racial, Social e Schooling Balance
Segundo Sowell (2004), alguns pesquisadores estadunidenses defendem que a
proporção das raças no emprego dos principais setores da economia deve refletir a
composição racial da força de trabalho. Feres Júnior (2006) mostra que um conceito
amplamente utilizado nas ações afirmativas indianas é o de igualdade proporcional, segundo
o qual as reservas de vagas para cada casta devem espelhar sua composição nacional.
Partindo deste arcabouço teórico podemos entender então como justa a seguinte situação. Um
país onde cada um dos diferentes tipos, pertencendo a circunstâncias favoráveis ou não, têm a
mesma proporção na educação e emprego que é percebida na população. Ou seja, se um país
possui uma população com 70% de negros e 30% de brancos consideramos como justo o
ponto onde se verifica a mesma proporção de ambos os tipos na universidade e no mercado
de trabalho.
Do ponto de vista igualitário, é desejável minimizar as distorções da subrepresentação das minorias no ensino superior e quanto mais sub-representado a minoria
estiver na educação e nos empregos em comparação com a sua proporção na população, mais
73
injusta é a sociedade. Desta forma, expandimos o conceito inicial dos autores citados e
analisamos as composições raciais, de renda e tipo de escola no Rio de Janeiro comparando
com a representatividade desses mesmos grupos na UERJ sob diferentes políticas de ação
afirmativa. Os resultados dessa análise se encontram na tabela 3.4.
Para que fosse possível descobrir a proporção de cada grupo na população do Brasil e
do Rio de Janeiro, utilizamos os dados da PNAD 2009. Ao restringirmos a amostra para o
estado no qual a UERJ se localiza, temos que 11,11% da população se autodeclara de cor
preta e 32,53% de cor parda. 75,6% das pessoas que se formaram no ensino médio vieram de
escola pública e 57,08% foram caracterizados por nós como de renda per capita baixa (menor
que um salário mínimo por pessoa no domicilio).
Pela visão normativa da igualdade
proporcional, o melhor sistema de cotas seria aquele que aproxima a composição dos alunos
às proporções desses mesmos grupos na população.
Tabela 3.5. Racial, Social e Schooling Balance sob diferentes políticas de cotas
Composição
Composição da
Política
Escola
da população
população do
Sem
atual da
pública e
brasileira
Rio de Janeiro
cotas
UERJ
renda
(em%)
(em %)
(45%)
(20%)
Parda
47,52%
32,53%
22,10%
25,24%
Branca
44,57%
55,90%
66,03%
Preta
7,31%
11,11%
Amarela
0,35%
Índigena
Negros
Somente
e renda
pretos
(20%)
(20%)
23,82%
22,45%
19,68%
55,27%
62,46%
58,39%
58,10%
8,59%
16,10%
10,50%
16,07%
19,51%
0,24%
2,25%
2,19%
2,21%
1,92%
1,83%
0,23%
0,16%
0,97%
1,18%
0,98%
1,14%
0,86%
Baixa
-
57,08%
19,26%
24,10%
24,87%
24,25%
20,63%
Alta
-
42,92%
80,74%
75,90%
75,13%
75,75%
79,37%
Pública
-
75,60%
30,94%
45,73%
39,84%
34,96%
32,21%
Particular
-
24,40%
64,60%
50,50%
56,02%
60,93%
63,56%
-
-
4,46%
3,75%
4,12%
4,09%
4,23%
Variável
Cor
Renda*
Tipo de
Escola**
Fora do
Rio
*As carências foram definidas da seguinte forma. Abaixo de 3. S.M (UERJ) e até 01 S.M. per capita (PNAD).
**Tipo de escola do candidato egresso do ensino médio.
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
74
Na atual política de cotas, a composição de pretos na UERJ ultrapassa a proporção da
população brasileira. Considerando o estado do Rio de Janeiro, a representação pela cor é
menor em cerca de 2%. Por esta visão de mundo, a atual política de cotas superdimensiona a
representação da população de cor preta, aumentando a participação de alunos desta cor para
o patamar de 16,10%. Se a reserva de 20% para candidatos de cor preta for estabelecida, a
proporção aumenta para cerca de 19% ou mais de duas vezes e meia a proporção de
autodeclarados pretos no país. Assim, a política que melhor aproxima os pretos da sua
proporção no Rio de Janeiro e por tanto a mais justa, seria a reserva para estudantes de escola
pública carentes. Nas simulações ela também é a que mais favorece a composição de pardos,
aumentando a participação de 22,10% no caso sem cotas para 23,82%. Embora melhore
significativamente a composição de alunos pardos, a atual política de cotas ainda se encontra
longe de atingir a atual representação de pardos no país.
Quando consideramos o critério de renda, também a simulação da escola pública com
o critério de carência é aquela que captaria a maior proporção de pessoas com características
sócio-econômicas desfavoráveis. Classificamos como “pobres” aqueles que se declararam
como pertencentes a menor faixa de renda na UERJ ou que possuem menos de 1 salário
mínimo per capita domiciliar na PNAD.
Neste caso, a referida base teria entre os
classificados, quase 25% de alunos carentes. Na outra ponta, se encontram as políticas
meritocráticas e somente negros, que têm como resultado apenas 20% de candidatos
marcados como pobres.
No que se refere ao tipo de escola, a atual política de cotas da UERJ é a que mais
favorece a entrada de alunos oriundos da rede pública estadual de ensino. Seguido pela
simulação de escola pública com critério de renda. Este fenômeno era esperado pelo fato de
que muitos dos alunos cotistas negros vêm de escola pública. Desta forma, a reserva de
vagas real da UERJ para estudantes egressos do ensino público é maior do que 20%.
Em relação às igualdades proporcionais, podemos perceber que a atual política de
cotas e as cotas para “pobres e escola pública” apresentam uma melhor igualdade
proporcional. As cotas para “negros e renda” apresentam um desempenho relativamente
inferior, superdimensionando a representação da cor preta e perdendo para a cota de escola
pública no tocante a cor parda e às demais características.
O sistema color-sighted
75
apresentou um desempenho que permite incluí-lo em um estágio entre a meritocracia e as
demais políticas de reserva de vagas, devido a sua menor capacidade redistributiva.
3.3.4 Oportunidades em carreiras de alto prestígio
Sabemos que as probabilidades de classificação de um candidato variam
significativamente entre cursos de alto e baixo prestígio. É de se esperar que para as carreiras
com uma alta relação candidato-vaga, as circunstâncias acabem por ser decisivas para
delimitar o perfil socioeconômico dos estudantes. Assim, em uma carreira como Medicina, a
maior parte (ou totalidade) da turma virá de um background familiar favorável. Por isto, na
inexistência de ações afirmativas, sabemos que os pretos e pardos tendem a se concentrar em
carreiras com menor prestigio. Isto pela consequência de estarem em sua maior parte,
representados em parcelas pobres da população.
Uma ação afirmativa eficaz do ponto de vista redistributivo deve proporcionar uma
maior oportunidade de classificação às carreiras antes inacessíveis pela população
discriminada. Logo, resolvemos investigar como a composição de negros se alteraria em
cada grupo de prestígio dentro das simulações propostas. Os resultados se encontram na
tabela 3.5.
Tabela 3.6. Pretos e Pardos classificados em relação ao total de candidatos autodeclarados
com a mesma cor (em %).
Pretos classificados em relação ao total da cor (em %)
Grupos
de
prestígio
Atual
Sem
política de
cotas
cotas da
UERJ
Escola
pública e
renda
Negros e
Somente
renda
pretos
Altíssimo
3,33%
17,57%
7,95%
17,99%
20,08%
Alto
3,24%
16,19%
5,40%
14,76%
20,00%
Médio
6,08%
18,11%
9,05%
17,69%
19,95%
Baixo
12,36%
14,70%
13,21%
15,32%
19,03%
Pardos classificados em relação ao total da cor (em %)
76
Grupos
de
prestígio
Atual
Sem
política de
cotas
cotas da
UERJ
Escola
pública e
renda
Negros e
Somente
renda
pretos
Altíssimo
16,25%
23,84%
20,08%
17,15%
13,38%
Alto
17,02%
26,21%
21,48%
19,91%
14,86%
Médio
19,53%
23,14%
21,51%
19,75%
15,99%
Baixo
26,01%
26,34%
26,30%
25,41%
24,02%
Fonte: Microdados da UERJ.Elaboração própria.
Se considerarmos a posição normativa do racial balance, então uma composição justa
de pretos na UERJ deveria ser próxima aos 11% e a de pardos, cerca de 32%. No sistema
meritocrático, os alunos pretos seriam minoria em cursos com altíssimo prestígio, apenas 3%
do total de pessoas matriculadas. Já entre os pardos, a composição atingiria os 16%, ou seja,
metade da proporção desta cor na população. Este número sobe para 12,36% e 26,03% em
carreiras com baixo prestígio para pretos e pardos respectivamente.
A atual política expande o acesso dos pretos para 17,57% das vagas nas principais
carreiras, um salto que vai além da composição desta mesma cor na sociedade brasileira. O
mesmo não se verifica em relação à cor parda, onde o aumento de sete pontos percentuais não
é suficiente para suprir as necessidades de indivíduos desta cor por redistribuição.
A política color-sighted de raça e renda eleva a participação de pretos para cerca de
18% em cursos de altíssimo prestígio. A participação dos pretos ultrapassa a dos pardos
mesmo este último sendo quase três vezes maior do que o contingente populacional de
pessoas de cor preta no Rio de Janeiro.
A maior surpresa se mostrou em relação à comparação da composição dos pardos
entre as bases com cotas para escola pública e renda e raça negra e renda. A primeira
política, apesar de possuir um critério exclusivamente social, pode vir a contribuir para uma
maior participação dos pardos do que a cota de raça e renda. A justificativa teórica para este
resultado contra-intuitivo reside no fato já exposto de que os pardos não se identificam como
negros. Desta forma, as reservas de vagas para negros são em sua maioria utilizadas por
pretos.
77
Ainda em relação à política color-blind proposta, a proporção de pretos aumenta em
todos os tipos de carreira mas não consegue atingir a composição racial desejada. Em cursos
de altíssimo prestígio, a participação de pretos mais do que dobra, quando comparamos com
um sistema dito meritocrático, saindo de 3,33% para 7,95%. Já em cursos de alto prestígio,
apesar de aumentar em mais de dois pontos percentuais a composição de alunos pretos, a
proporção se mantém muito abaixo do total de pessoas desta cor no Rio de Janeiro.
Logo, em nossas simulações é possível perceber que a presença de negros na UERJ
desabaria na ausência da atual política de cotas. Que as políticas do tipo color-sighted
invariavelmente incorreriam numa super-representação da cor preta na UERJ e que uma cota
de 20% voltada para escola pública e renda não supriria totalmente as necessidades por
redistribuição de indivíduos pretos ou pardos mas que se revelou mais adequada para a
promoção de oportunidades para os pardos do que as políticas color- sighted.
3.3.5 Avaliação econométrica das probabilidades de acesso – Método Logit
Com o intuito de entendermos como variam as probabilidades de classificação dos
negros sobre diferentes políticas de ação afirmativa, optamos por utilizar o modelo logit em
todas as bases descritas na seção anterior, são elas: “Base do vestibular UERJ”, “cotas para
escola pública e renda”, “cotas para negros e renda”, “cotas para pretos” e “meritocracia”. Os
resultados se encontram na tabela 3.6.
Tabela 3.7. Determinantes do Acesso - logit, logistic e efeitos marginais para diferentes
políticas de cotas.
Política de cotas vigente na UERJ
Sem cotas
Logistic
Logistic
Variáveis
Idade
(Odds
Marginal
(Odds
Marginal
Logit
Ratio)
Effects
Logit
Ratio)
Effects
0,0526**
1,0539
0,0049
0,0746***
1,0774
0,0081
(0,0210)
(0,0221)
(0,0019)
(0,0200)
(0,0216)
(0,0021)
78
-0,0987***
0,9059
-0,0092
-0,1238***
0,8835
-0,0135
(0,0349)
(0,0316)
(0,0032)
(0,0331)
(0,0293)
(0,0036)
-0,0905**
0,9134
-0,0084
-0,0386
0,9621
-0,0042
(0,0387)
(0,0353)
(0,0036)
(0,0360)
(0,0346)
(0,0039)
0,1419***
1,1524
0,0133
0,1841***
1,2021
0,0204
(0,0542)
(0,0624)
(0,0051)
(0,0533)
(0,06413)
(0,0059)
Bairro - IDH entre de
0,1555**
1,1682
0,0151
0,2002***
1,2216
0,0231
9,0 e 8,5
(0,0694)
(0,0810)
(0,0070)
(0,0667)
(0,08147)
(0,0081)
Bairro - IDH entre de
0,3029***
1,3538
0,0306
0,3550***
1,4261
0,0424
9,5 e 9,0
(0,0667)
(0,0902)
(0,0073)
(0,0622)
(0,08873)
(0,0081)
Bairro - IDH acima de
0,6014***
1,8246
0,0674
0,6205***
1,8598
0,0809
9,5
(0,0763)
(0,1392)
(0,0100)
(0,0693)
(0,1288)
(0,0105)
Número de Pessoas na
0,2921***
1,3391
0,0272
0,1586**
1,1719
0,0173
Família
(0,0672)
(0,0899)
(0,0062)
(0,0617)
(0,07234)
(0,0067)
Número de Pessoas na
-0,0375***
0,9631
-0,0034
-0,0211**
0,9790
-0,0023
Família ao Quadrado
(0,0089)
(0,0086)
(0,0008)
(0,0082)
(0,0080)
(0,0009)
0,1910***
1,2104
0,0178
0,2072***
1,2302
0,0226
(0,0190)
(0,0230)
(0,0017)
(0,0169)
(0,02076)
(0,0018)
0,0715**
1,0741
0,0066
0,1203***
1,1277
0,0131
(0,0301)
(0,0323)
(0,0028)
(0,0283)
(0,0319)
(0,0031)
0,0654**
1,0675
0,0060
0,0668**
1,0690
0,0073
(0,0311)
(0,0331)
(0,0029)
(0,0294)
(0,0314)
(0,0032)
-0,0821*
0,9212
-0,0075
-0,1346***
0,8740
-0,0143
(0,0474)
(0,0436)
(0,0042)
(0,0444)
(0,0388)
(0,0046)
-0,2317**
0,7931
-0,0201
-0,3832***
0,6816
-0,0375
(0,0617)
(0,0489)
(0,005)
(0,0638)
(0,0435)
(0,0055)
-0,0985
0,9061
-0,0088
-0,1139
0,8923
-0,0119
(0,1841)
(0,1669)
(0,0159)
(0,1823)
(0,1627)
(0,0183)
0,0402
0,9605
-0,0036
-0,0609
0,9408
-0,0065
(0,1285)
(0,1234)
(0,0116)
(0,1192)
(0,1122)
(0,0124)
Tipo de Escola -
-0,4131***
0,6616
-0,0354
-0,4379***
0,6453
-0,0441
Municipal e Estadual
(0,0541)
(0,0357)
(0,0042)
(0,0516)
(0,0333)
(0,0047)
Tipo de Escola -
0,5236***
1,6880
0,0575
0,5024***
1,6527
0,0636
Federal
(0,0621)
(0,1048)
(0,0079)
(0,0566)
(0,0935)
(0,0081)
Tipo de Escola - Escola
-0,2027**
0,8165
-0,0176
-0,1339
0,8747
-0,014
Fora do RJ
(0,0984)
(0,0803)
(0,0079)
(0,0867)
(0,0758)
(0,0086)
Carreira - Altíssimo
-3,7383***
0,0237
-0,1856
-3,3365***
0,0355
-0,2026
Prestigio
(0,0844)
(0,0020)
(0,0032)
(0,0763)
(0,0027)
(0,0032)
Carreira - Alto
-2,8302***
0,0589
-0,1927
-2,4637***
0,0851
-0,2009
Idade ao Quadrado
Sexo
Bairro - Fora do RJ
Renda Bruta
Escolaridade do Pai
Escolaridade da Mãe
Cor - Parda
Cor - Preta
Cor - Indígena
Cor - Amarela
79
Prestigio
(0,0585)
(0,0034)
(0,0037)
(0,0524)
(0,0045)
(0,0038)
Carreira - Médio
-1,9675***
0,1398
-0,1506
-1,7061***
0,1815
-0,1559
Prestigio
(0,0478)
(0,0066)
(0,0036)
(0,0436)
(0,0079)
(0,0038)
3,5328***
34,2209
0,6628
(0,0670)
(2,2918)
(0,0112)
Cotista
-2,5221***
-2,6113***
(0,3405)
(0,3218)
N
27385
27385
pseudo R2
0,276
0,174
AIC
18321,91
20876,96
BIC
18519,14
21065,97
Corretly classified
85,69%
83,06%
Constante
Marginal effects after logit
0,1041
0,1249
Standard errors in parentheses
* p<0,10, ** p<0,05, *** p<0,01
Cotas para negros e renda
Cotas para pretos
Logistic
Logistic
Variáveis
(Odds
Marginal
Logit
Ratio)
Effects
0,0082
0,0633***
1,0653
0,0069
(0,0224)
(0,0021)
(0,0197)
(0,0210)
(0,0021)
-0,1388***
0,8703
-0,0144
-0,1087***
0,8970
-0,0118
(0,0346)
(0,0301)
(0,0036)
(0,0326)
(0,0292)
(0,0035)
-0,0592
0,9425
-0,0061
-0,0484
0,9527
-0,0052
(0,0369)
(0,0347)
(0,0038)
(0,0361)
(0,0344)
(0,0039)
0,1840***
1,2019
0,0193
0,1037**
1,1092
0,0114
(0,0535)
(0,0642)
(0,0057)
(0,0522)
(0,0578)
(0,0057)
Bairro - IDH entre de
0,2239***
1,2509
0,0247
0,1426**
1,1533
0,0162
9,0 e 8,5
(0,0676)
(0,0845)
(0,0079)
(0,0659)
(0,0759)
(0,0077)
Bairro - IDH entre de
0,3468***
1,4145
0,0394
0,2719***
1,3124
0,0318
9,5 e 9,0
(0,0639)
(0,0904)
(0,0079)
(0,0620)
(0,0813)
(0,0077)
Bairro - IDH acima de
0,6779***
1,9697
0,0857
0,5742***
1,7757
0,0739
9,5
(0,0713)
(0,1404)
(0,0107)
(0,0694)
(0,1231)
(0,0103)
Número de Pessoas na
0,2775***
1,3198
0,0288
0,2089***
1,2323
0,0228
Família
(0,0641)
(0,0845)
(0,0066)
(0,0620)
(0,0764)
(0,0067)
Número de Pessoas na
-0,0363***
0,9643
-0,0037
-0,0266***
0,9737
-0,0029
Família ao Quadrado
(0,0085)
(0,0082)
(0,0009)
(0,0082)
(0,0080)
(0,0009)
Idade
Idade ao Quadrado
Sexo
Bairro - Fora do RJ
(Odds
Marginal
Logit
Ratio)
Effects
0,0794***
1,0826
(0,0207)
80
0,2039***
1,2262
0,0211
0,1980***
1,2189
0,0216
(0,0176)
(0,0215)
(0,0018)
(0,0171)
(0,0208)
(0,0018)
0,1070***
1,1129
0,0111
0,1232***
1,1310
0,0134
(0,0289)
(0,0321)
(0,003)
(0,0283)
(0,0320)
(0,0030)
0,0654**
1,0676
0,0067
0,0612**
1,0630
0,0066
(0,0299)
(0,0319)
(0,0031)
(0,0293)
(0,0311)
(0,0032)
-0,1027**
0,9023
-0,0104
-0,1046**
0,9006
-0,0111
(0,0459)
(0,0414)
(0,0046)
(0,0461)
(0,0415)
(0,0048)
-0,3481***
0,7059
-0,0326
(0,0671)
(0,0473)
(0,0056)
-0,1805
0,8347
-0,0175
-0.0932
0,9109
-0,0098
(0,1806)
(0,1508)
(0,0163)
(0,1895)
(0,1727)
(0,0193)
-0,1580
0,8537
-0,0154
-0,1593
0,8527
-0,0164
(0,1280)
(0,1092)
(0,0118)
(0,1276)
(0,1088)
(0,0124)
Tipo de Escola -
-0,4234***
0,6547
-0,0405
-0,5323***
0,5872
-0,0526
Municipal e Estadual
(0,0515)
(0,0337)
(0,0045)
(0,0512)
(0,0300)
(0,0045)
0,5006***
1,6497
0,0604
0,4625***
1,5880
0,0578
(0,0586)
(0,0967)
(0,0081)
(0,0569)
(0,0903)
(0,0080)
Tipo de Escola - Escola
-0,1308
0,8773
-0,013
-0,1683*
0,8451
-0,0173
Fora do RJ
(0,0909)
(0,0797)
(0,0086)
(0,0881)
(0,0744)
(0,0086)
Carreira - Altíssimo
-3,4868***
0,0305
-0,1977
-3,2619***
0,0383
-0,1994
Prestigio
(0,0789)
(0,0024)
(0,0032)
(0,0761)
(0,0029)
(0,0032)
-2,6068***
0,0737
-0,1999
-2,4255***
0,0884
-0,1981
(0,0545)
(0,0040)
(0,0038)
(0,0522)
(0,0046)
(0,0038)
Carreira - Médio
-1,8115***
0,1634
-0,156
-1,6872***
0,1850
-0,1542
Prestigio
(0,0450)
(0,0073)
(0,0037)
(0,0436)
(0,0080)
(0,0038)
3,1275***
22,817
0,6221
1,0802***
2,9453
0,1583
(0,0862)
(1,9672)
(0,0162)
(0,0533)
(0,1570)
(0,0097)
Renda Bruta
Escolaridade do Pai
Escolaridade da Mãe
Cor - Parda
Cor - Preta
Cor - Indígena
Cor - Amarela
Tipo de Escola - Federal
Carreira - Alto Prestigio
Cotista
-2,8777***
-2.5037***
(0,3313)
(0,3188)
N
27385
27385
pseudo R2
0,209
0,178
AIC
19995,41
20781,99
BIC
20192,64
20971,00
Corretly classified
83,97%
83,21%
Constante
Marginal effects after logit
0,1177
0,1247
Standard errors in parentheses
* p<0,10, ** p<0,05, *** p<0,01
81
Cotas para escola pública e renda
Logistic
Variáveis
(Odds
Marginal
Logit
Ratio)
Effects
0,0750***
1,0779
0,0080
(0,0204)
(0,0219)
(0,0021)
-0,1295***
0,8785
-0,0138
(0,0340)
(0,0298)
(0,0036)
-0,0612*
0,9406
-0,0065
(0,0365)
(0,0342)
(0,0039)
0,1741***
1,1902
0,0188
(0,0526)
(0,0626)
(0,0057)
Bairro - IDH entre de
0,2135***
1,2379
0,0241
9,0 e 8,5
(0,0660)
(0,0817)
(0,0079)
Bairro - IDH entre de
0,3374***
1,4012
0,0392
9,5 e 9,0
(0,0629)
(0,0881)
(0,0079)
Bairro - IDH acima de
0,6653***
1,9451
0,0860
9,5
(0,0703)
(0,1368)
(0,0107)
Número de Pessoas na
0,2458***
1,2786
0,0262
Família
(0,0634)
(0,0810)
(0,0067)
Número de Pessoas na
-0,0310***
0,9695
-0,0033
Família ao Quadrado
(0,0084)
(0,0081)
(0,0009)
0,1978***
1,2186
0,0211
(0,0175)
(0,0213)
(0,0018)
0,0963***
1,1011
0,0102
(0,0286)
(0,0315)
(0,0030)
0,0645**
1,0666
0,0068
(0,0296)
(0,0315)
(0,0031)
-0,1142**
0,8921
-0,0119
(0,0446)
(0,0397)
(0,0045)
-0,4215***
0,6560
-0,0398
(0,0623)
(0,0408)
(0,0052)
-0,1387
0,8704
-0,0141
(0,1820)
(0,1584)
(0,0175)
-0,0975
0,9070
-0,0101
(0,1214)
(0,1101)
(0,0121)
Tipo de Escola -
-0,4477***
0,6390
-0,0439
Municipal e Estadual
(0,0551)
(0,0352)
(0,0049)
Idade
Idade ao Quadrado
Sexo
Bairro - Fora do RJ
Renda Bruta
Escolaridade do Pai
Escolaridade da Mãe
Cor - Parda
Cor - Preta
Cor - Indígena
Cor - Amarela
82
Tipo de Escola -
0,5734***
1,7742
0,0725
Federal
(0,0573)
(0,1016)
(0,0084)
Tipo de Escola - Escola
-0,1506*
0,8602
-0,0153
Fora do RJ
(0,0902)
(0,0775)
(0,0087)
Carreira - Altíssimo
-3,3722***
0,0343
-0,1991
Prestigio
(0,0774)
(0,0026)
(0,0032)
-2,5067***
0,0815
-0,198
(0,0531)
(0,0043)
(0,0038)
Carreira - Médio
-1,7519***
0,1734
-0,1558
Prestigio
(0,0443)
(0,0076)
(0,0038)
2,1693***
8,7522
0,4002
(0,0674)
(0,5897)
(0,0154)
Carreira - Alto Prestigio
Cotista
Constante
-2,6883***
(0,3263)
N
27385
pseudo R2
0,192
AIC
20453,78
BIC
20651,01
Corretly classified
83,79%
Marginal effects after
logit
0,1215
Standard errors in parentheses
* p<0,10, ** p<0,05, *** p<0,01
A variável dependente é uma binária que recebe o valor de “1” caso o candidato tenha
se classificado sob a política simulada ou “0” caso negativo. As explicativas utilizadas são a
idade, idade ao quadrado, número de pessoas na família, número de pessoas na família ao
quadrado, sexo, IDH do bairro, renda bruta, escolaridade dos pais, cor, tipo de escola, tipo de
carreira e tipo de vaga.
As transformações nas variáveis de renda bruta e ensino dos pais seguiram a
metodologia proposta no primeiro capítulo e foram transformadas em variáveis discretas,
recebendo respectivamente quatro e seis valores.
Em todas as simulações o sexo do candidato e as cores indígena e amarelo foram não
são significantes. Com exceção dessas três variáveis, todas as demais se revelaram
83
estatisticamente significantes ao nível de 10%, independente do modelo. Os pseudo-R2 dos
modelos variaram entre 0,276 para a atual política da UERJ e 0,174 para o sistema
meritocrático e os valores foram corretamente preditos em no mínimo 83% para todos os
modelos.
Para cada um dos cinco modelos extraímos as razões das chances e os efeitos
marginais das variáveis explicativas. A estimação dos efeitos marginais é calculada utilizando
o impacto de um regressor que se encontra no seu valor médio (caso a explicativa seja
contínua) ou em sua mudança discreta (caso a explicativa seja binária). O beneficio desta
abordagem reside no fato de que ela melhora a interpretação dos resultados apresentados
pelos coeficientes dos regressores na variável dependente de interesse. Em nosso caso, na
probabilidade de classificação no vestibular.
Considerando os efeitos marginais, podemos entender como varia a probabilidade de
classificação dos autodeclarados pretos. No sistema meritocrático, um preto possui 8,74%9 de
probabilidade de aprovação. Em relação ao sistema de cotas para escola pública e renda ele
se depara com uma probabilidade de 8,17% de chances de classificação caso não seja cotista
ou de 48,19% caso aplique para reserva de vagas. Neste caso, suas chances caem ainda mais
se não for alvo da ação afirmativa, ao passo que sendo contemplado, possuirá quase 50% de
chances de classificação. A reserva de vagas para raça e renda também divide os pretos entre
não cotistas e cotistas. Neste cenário, as chances saltam de 8,51% para 70,72% também
separando os candidatos em probabilidades muito distintas.
Nas simulações expostas acima, os pardos estão inclusos na amostra cotista negra.
Assim também foi possível verificar como varia a probabilidade de indivíduos deste tipo.
Em todas as bases, as probabilidades de classificação dos pardos são maiores que a de pretos.
Considerando a ausência de cotas, por exemplo, as probabilidades de classificação dos pardos
são três pontos percentuais maior, 11,06%. Já no sistema de cotas para escola pública e renda
9
Para o cálculo das probabilidades, efetua-se o seguinte procedimento. Soma-se o coeficiente dos “efeitos
marginais após o logit” (“Marginal effects after logit”) aos dos demais regressores que pretendemos variar.
Assim, para o cálculo da probabilidade marginal de classificação dos pretos temos a soma de 0,1249 com 0,0375. Ou seja, 0,08740 ou 8,74%. Lembramos que as probabilidades variam muito com a definição de
diferentes tipos. Um exercício que sugerimos ao leitor seria a mudança discreta da carreira de baixo prestígio
para altíssimo prestígio.
84
eles se deparam com uma probabilidade de 10,96% de chances de classificação caso não
sejam cotistas ou de 50,98% caso apliquem para a reserva de vagas.
Por fim, temos o sistema de cotas somente para pretos. Nesta base a variável de cor
preta foi excluída, pois todo candidato autodeclarado preto foi definido como cotista. Desta
forma, as duas variáveis explicativas são perfeitamente colineares, o que implica na
necessidade de se retirar uma das duas do modelo. A instituição das cotas pela cor mais do
que triplica as chances de classificação de um preto em comparação com a base sem cotas.
Nesta política, as probabilidades são de 28,3%. Este número só não é maior pelo fato de que
a reserva de vagas por cor atrai uma grande quantidade de candidatos e institui uma ampla
concorrência entre cotistas em comparação com os demais sistemas, onde a demanda quase
não supre as reservas estipuladas para a UERJ.
3.4 Conclusões
Dado que existe uma alta rejeição da sociedade brasileira às cotas com critérios
raciais, que se manifestou na nossa pesquisa em uma não aprovação desta política por três
quartos dos estudantes não cotistas, nos propusemos a avaliar como uma política color-blind
pode afetar a composição racial dos estudantes da UERJ.
A partir da análise sobre as bases simuladas da UERJ em cima do vestibular 2010, foi
possível revelar dados importantes para o desenho de políticas de ações afirmativas.
Percebemos, por exemplo, que os beneficiários das políticas (displacing) foram aqueles
vindos de um baixo background familiar.
Exceção feita quando retiramos o critério de
renda. Na base onde se considera apenas os candidatos autodeclarados pretos percebemos
um claro efeito do tipo “cream layer” e muitos dos classificados passaram a ser da classe
média ou alta.
Em relação às composições populacionais, a política color-blind elevou a proporção
de pretos e pardos na UERJ em cerca de dois pontos percentuais. Com isto, ela quase iguala
a proporção de pretos, mas ainda se encontra bastante defasada em relação aos pardos. A
principal dificuldade se revelou no aumento do número de pardos. Inclusive a atual política
85
da UERJ, que apresenta um percentual de reserva de vagas consideravelmente maior, não foi
capaz de se aproximar da porcentagem de pardos do Rio de Janeiro.
Quando comparamos as políticas de raça e renda contra escola pública e renda no que
se refere a participação dos pardos na UERJ, os resultados são reveladores. A política colorblind levaria a uma composição maior de pardos na ordem de 4 pontos percentuais. Ou seja,
a política color-sighted não é eficiente para ajudar os pardos, conforme pretende.
Explicamos isto pelo fato do conceito de negros como pretos e pardos ser algo restrito aos
movimentos negros e aos estudiosos ligados às ações afirmativas. Mostramos que ,tanto para
o país, como no caso da UERJ, a identificação de pardos como pertencentes à raça negra é
consideravelmente baixa. Assim, uma cota para escola pública acaba por se tornar uma
política preferível na captação de candidatos pardos.
No passo seguinte, avaliamos a composição de pretos e pardos por grupos de prestígio
em cada política de cotas. Como resultado, foi possível perceber que na ausência de cotas a
proporção de pretos desabaria nas carreiras de médio, alto e altíssimo prestígio. Uma reserva
para a raça negra de 20% já seria o suficiente para super-representar a cor preta em todos os
níveis de carreira enquanto a política de escola pública e renda elevaria a participação de
pretos em quatro pontos percentuais para carreiras de altíssimo prestígio. Em relação ao
número de pardos, também foi percebida uma queda na proporção de classificados em um
sistema meritocrático. Uma maior autodeclaração dos pretos na cota de raça e renda faz com
que este grupo esteja mais representado do que os pardos em carreiras de altíssimo prestígio e
que a política de escola pública e renda capte mais alunos pardos em todos os níveis de
prestígio das carreiras.
Como último passo, procuramos entender como variam as probabilidades de acesso
dos pretos e pardos sobre diferentes ações afirmativas.
Através da análise dos efeitos
marginais extraídos do modelo logit, foi possível verificar que as probabilidades dos negros
cotistas crescem de forma exponencial. Mostramos que as probabilidades de classificação de
um negro podem aumentar de 8,74% em um sistema meritocrático para 48%, quando
consideramos as cotas para escola pública e renda. Já as probabilidades de classificação de
pardos são sempre maiores que a dos pretos e para estes casos, se situaram em 11,06% e
50,98% respectivamente.
86
Por fim, em nossas simulações a reserva de vagas de escola pública e renda seria
capaz de captar mais candidatos pardos e indivíduos com menor perfil socioeconômico do
que as políticas color-sighted. Além disto, neste tipo de política, a proporção de pretos
praticamente alcança a população do estado do rio de janeiro. Como ponto negativo, foi
possível perceber um aumento insuficiente de pretos em carreiras de alto prestígio. Desta
forma podemos concluir que uma política do tipo color-blind com apenas 20% de reserva de
vagas já pode ser capaz de alterar significativamente o corpo de alunos da instituição,
favorecendo em grande parte as probabilidades de classificação de indivíduos pretos e
pardos.
CONCLUSÕES
Investigamos a experiência da primeira ação afirmativa no ensino superior do Brasil.
Utilizando bases de dados até então pouco exploradas, procuramos entender como se
desenvolve o acesso à universidade e a progressão dos alunos cotistas e não cotistas dentro da
UERJ. Também simulamos outras políticas de ação afirmativa comumente utilizadas no país.
Em relação ao acesso de grupos cotistas e não cotistas à institução pesquisada,
identificamos algumas questões importantes. A primeira é a de que praticamente inexiste
uma concorrência entre grupos cotistas.
Isto se traduziu em notas de classificação
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consideravelmente baixas para o referido grupo. A relação candidato vaga para o grupo
cotista em 2010 foi de 1,16 contra 10,46 dos não cotistas. Indo ao encontro de literaturas
anteriores, perebemos que a renda bruta, o ensino dos pais e a cor da pele são determinantes
de um melhor desempenho. Em nossa pesquisa adicionamos também a questão geográfica e
a separação do ensino médio público em estadual e federal. Ambas variáveis também se
mostraram significantes. Em relação ao desenho da política, ela se mostrou eficaz em captar
pessoas com um baixo condicionante socioeconômico.
Isto porque apenas 0,83% dos
candidatos cotistas que concorreram para cursos de altíssimo prestígio se classificariam em
um sistema que não utiliza reserva de vagas. Além disto, da análise displacing e displaced
percebemos que a maioria dos candidatos admitidos vêm de condições bastante adversas. Já
os que perderam a sua vaga possuem um perfil majoritário de classe média. Talvez o grupo
mais prejudicado pela implantação da política seja a dos brancos, de classe média baixa,
egressos de escolas privadas. Isto porque 71,12% dos displaced são brancos, 68,78% estudam
em escolas privadas e 62,38% possuem uma renda bruta familiar menor que 10 salários
mínimos.
Os vários resultados apresentados no primeiro capítulo revelam possíveis iniciativas
governamentais para aperfeiçoamento da política. A primeira é a diminuição da distorção da
relação candidato/vaga entre os grupos cotistas e não cotistas que viria idealmente como
resultado de uma melhor qualidade do ensino médio público e consequente melhor fluxo de
estudantes egressos do ensino médio público. Um político que defenda posições liberais,
pode sugerir a diminuição da proporção de vagas para as cotas com o intuito de se aumentar a
concorrência entre cotistas na etapa do vestibular, aumentar as médias de entrada deste grupo
e ainda diminuir a alta concorrência entre não cotistas. Outra possível ação seria a de se
utilizar parte da reserva de vagas existente para criação de um grupo específico visando o
aumento da proporção de pobres oriundos do ensino médio privado. Como resultado teríamos
uma possível queda na proporção de “displaced” deste grupo.
No segundo capítulo observamos a progressão dos candidatos cotistas e não cotistas e
percebemos que os alunos cotistas possuem um pior desempenho em termos de coeficientes
de rendimento médios. Tal efeito aumenta com o acréscimo da dificuldade relativa do curso.
Assim, o diferencial médio entre não cotistas e cotistas foi de 8,50% em todas as carreiras,
chegando a 16,35% naquelas definidas como de alta dificudade relativa. Em relação às taxas
de graduação, os cotistas se saíram melhor. Com exceção das carreiras com alta dificuldade
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relativa, onde os não cotistas se graduam em maior proporção em quase 60% das carreiras.
Nos demais cursos, são os cotistas que se formam mais. Tal fenômeno se expande conforme
os anos passam e a dificuldade relativa diminui.
Se considerarmos o corte para os
inngressantes em 2005 e que se formaram em 2011 para os cursos de baixa dificuldade
relativa, chegamos a um total de 73,33% de carreiras com uma maior proporção de cotistas
formados.
Verficamos também que existe uma evasão particularmente alta entre os não
cotistas no primeiro ano. São 19,19% contra 7,69% dos não cotistas. Os dados analisados
mostram que apesar de obterem um pior resultado em termos de coeficiente de rendimento
médio, os cotistas estão se graduando a taxas mais elevadas. Justificamos este
comportamento pelo fato de que os cotistas atribuem um maior valor para universidade do
que os não cotistas.
Esta valoração acaba se traduzindo em uma maior persistência e
consequente maiores taxas de graduação.
Mesmo diante de um alto diferencial de performance na entrada do vestibular, os
cotistas conseguiram se graduar a taxas mais elevadas. Este se revelou um ponto importante
para a justificativa de manutenção do programa. A análise da progressão também revela
outras iniciativas importantes. A evasão dos não cotistas preocupa, o que sugere que a
instituição deva dedicar esforços para uma melhor progressão deste grupo.
Devido ao
diferencial de notas e evasão nos cursos de alta dificuldade relativa, a instituição poderia
dedicar um maior esforço no sentido de suportar alunos cotistas matriculados em carreiras
relativamente mais difíceis.
O último capítulo trata da simulação de outras ações afirmativas e também aqui
descobrimos resultados importantes. O principal deles é que as políticas do tipo color-sighted
mesmo focadas em atender as populações pretas e pardas, acaba por ser menos eficiente na
inclusão de pardos do que uma política do tipo color blind. A proporção de pardos na UERJ
seria de 23,82% na reserva para escola pública e 22,45% na reserva para negros, em ambos
incluída a condição de carência. Nossa explicação se deve ao fato de que a maioria da
população entende o termo negro como sinônimo de pretos ao passo de que o meio
acadêmico vem adotando o termo negro como representação de uma identidade racial que
une pretos e pardos sobre uma raça. O resultado disto é de que os pardos se candidatam a
cotas sociais em uma maior proporção quando comparamos com as cotas raciais. Apesar de
aumentar a proporção de pretos na universidade de 8,59% para 10,50%, a política color
sighted de escola pública impacta menos a composição desta cor em cursos de altíssimo
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prestígio. Neste caso, apenas 7,95% dos alunos seriam da cor preta. Este resultado porém é
significativo, pois na ausência de cotas a presença de pretos seria de apenas 3,33%.
Quando avaliamos a política color blind de escola pública, apesar de não possuir um
impacto da mesma magnitude termos de proporção dos pretos do que a política color sighted,
consideramos que ela tende a ser eficaz em aumentar a proporção de negros na UERJ. E o faz
mediante uma reserva de apenas 20% das vagas. Isto pode significar que uma política que
combine critérios de renda com tipo de escola pode se mostrar adequada no sentido de atingir
uma maior quantidade de objetivos que a política color-sighted. Isto porque aumentaria em
maior grau a proporção de alunos carentes e conseguiria um impacto relevante na proporção
de negros sem discriminar por cor. Um sistema que poderia ser aconselhável por defensores
das políticas não discriminatórias por cor é o de uma dupla reserva de vagas. Um para
estudantes de escola pública e um outro para os egressos de escola privada, estando os dois
grupos submetidos às condições de carência.
Com a evolução desta política no Brasil, muitas perspectivas se abrem para estudos
relativos as ações afirmativas. Na UERJ, uma unificação das bases do vestibular e da
progressão poderia permitir análises econométricas do desempenho dos alunos cotistas e não
cotistas. Para o Brasil, se evidencia a necessidade de novas pesquisas por economistas em
outras universidades de modo que com maiores informações disponíveis, os gestores de
políticas publicas possam aperfeiçoar a condução das ações afirmativas no ensino superior
brasileiro.
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