UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Rodolfo Daniel Garcia CRISE POLÍTICA E ATIVISMO JUDICIAL ELEITORAL CURITIBA 2010 Rodolfo Daniel Garcia CRISE POLÍTICA E ATIVISMO JUDICIAL ELEITORAL Trabalho de Monografia, apresentado ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do grau de bacharel. Orientadora: Prof.ª Thais Santi Cardoso da Silva. CURITIBA 2010 TERMO DE APROVAÇÃO Rodolfo Daniel Garcia CRISE POLÍTICA E ATIVISMO JUDICIAL ELEITORAL Este Trabalho de Monografia foi julgado e aprovado como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito perante a Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná. Curitiba, ____ de _____________ de 2010. Prof.º Dr. Eduardo de Oliveira Leite Coordenador de Monografia do Curso de Direito Universidade Tuiuti do Paraná Orientadora: Prof.ª Thais Santi Cardoso da Silva Curso de Direito – Universidade Tuiuti do Paraná Banca Examinadora: Prof.º Drº. Curso de Direito – Universidade Tuiuti do Paraná Prof.º Drº. Curso de Direito – Universidade Tuiuti do Paraná Agradeço primeiramente a Deus, pela condução e pela luz. Nesta Terra ninguém mais merece meus agradecimentos que Maria de Lourdes Oliveira, mãe que mesmo longe em distância presente em amor, orações e lágrimas. Aos meus irmãos e irmãs que tanto amo. E por fim aos amigos e companheiros de batalha. Obrigado! RESUMO O objeto deste trabalho e analisar a crise política nacional e sua influência nas decisões judiciais no âmbito do Direito Eleitoral. Discute-se com base em doutrinadores que defendem a atuação do Poder Judiciário de forma política, e de doutrinadores críticos deste atuar. Como fonte utiliza a pesquisa bibliográfica. Mostra-se relevante este estudo diante da influencia que o resultado das decisões proferidas exerce na vida dos indivíduos e da sociedade como um todo. Palavras-chave: constitucionais. justiça eleitoral, crise política, ativismo judicial, princípios SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................07 2 PODER POLÍTICO................................................................................................09 2.1 CONCEITO .......................................................................................................09 2.2 FORMAS DE ORGANIZAÇÃO..........................................................................10 2.3 SISTEMA ELEITORAL BRASILEIRO ...............................................................13 2.3.1 Sistema majoritário de representação.........................................................12 2.3.2 Sistema proporcional de representação......................................................13 2.4 MANDATO ELETIVO ........................................................................................13 3 JUSTIÇA ELEITORAL..........................................................................................15 3.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS ............................................................................15 3.2 ORGANIZAÇÃO................................................................................................16 3.3 COMPETENCIA ................................................................................................17 3.4 PODER REGULAMENTAR DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL .............19 4 CRISE POLÍTICA..................................................................................................23 4.1 TRANSFORMAÇÕES DA DEMOCRACIA.......................................................23 4.2 CRISE DO POSITIVISMO E SUGIMENTO DO ATIVISMO JUDICIAL ............24 5 ATIVISMO JUDICIAL ELEITORAL .......................................................................27 5.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS ...........................................................................27 5.2 LEGITIMIDADE DAS DECISÕES ....................................................................28 5.3 ANÁLISE DE CASO: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL N° 31.942 (AGR-RESPE N.º O31.942/PR) “CASO BELINATI” ............30 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................35 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................38 7 1. INTRODUÇÃO A atuação da Justiça Eleitoral pátria atualmente tem ocupado um papel de destaque nas discussões acerca da atuação ativa dos Tribunais Superiores nas questões de suma importância na vida da sociedade. Uma alternativa a atuação jurisdicional, positivista, onde o magistrado atuava pura e simplesmente como a boca da lei, atualmente busca-se uma adequação da atuação dos magistrados à função social que de fato pretende o ordenamento constitucional. Da mesma sorte, surge à preocupação com relação a este atuar ativo, pois atualmente ocupa proporções bem maiores que em outras épocas, e assim sendo acaba por representar uma ameaça ao sistema político representativo, bem como as instituições constitucionais pátrias. Com relação à atuação da Justiça Eleitoral a discussão alcança proporções maiores, pois intimamente relacionada à vida e ao futuro de uma nação, haja vista suas decisões muitas das vezes decidem que candidatos poderão concorrer ao pleito (no caso de deferimento ou não do registro da candidatura), de que maneira essa disputa se dará (quanto á questão das propagandas eleitoral, forma, e tempo de cada candidato) e até mesmo se o vencedor assumirá ou não o cargo mesmo após haver sido eleito e até diplomado (quando da decisão acerca das ações da Impugnação do mandado Eletivo os candidatos eleitos e diplomados). Diante da importância das decisões dos Tribunais Superiores, surge a preocupação com decisões que eventualmente podem não respeitar precedentes das próprias Cortes, ou até decidir desrespeitando a supremacia dos votos, ou seja, 8 decisões tendenciosas, ou políticas no sentido avesso a atuação política defendida por Peter Häberle1, quando trata da interpretação aberta da Constituição. Assim sendo mostra-se de suma importância, e em resposta a crise política, das instituições e dos órgãos gestores do poder estatal, de representação, instaurada no país, uma postura ativista dos magistrados, visando à realização dos preceitos fundamentais presentes na Carta Magna, contudo com observância dos princípios constitucionais nela presentes, visando resguardar a lisura das eleições, e de todo processo eleitoral. Pretende-se ao final demonstrar de maneira rasa, tal qual característica dos trabalhos desta natureza, por meio de uma análise do desenvolvimento da política, suas formas de organização, e manifestação, do atuar da Justiça Eleitoral, bem como em que elementos se apóiam alguns doutrinadores defensores ou críticos do ativismo judicial, sua legitimidade pautada em seu discurso, por fim tema tão polêmico e controvertido, e que da forma como se desenvolve continuará em evidência por mais alguns anos, bem como presentes nas discussões acadêmicas, sociológicas, jurídicas e da opinião publica. 1 Idéia defendida em seu livro traduzido por Gilmar Ferreira Mendes, Hermenêutica Constitucional em que defende uma interpretação pluralista e procedimental da Constituição. 9 2. PODER POLÍTICO 2.1 CONCEITO O professor José Afonso da Silva conceitua o poder político como sendo, “inerente ao grupo, que se pode definir como uma energia capaz de coordenar e impor decisões visando à realização de determinados fins”. (SILVA, 2007, p. 107) O poder de forma geral é algo latente a todas as formas de organização social. No dizeres do professor Celso Ribeiro Bastos “sem o poder não existiria ordem, organização dentro de uma sociedade e essa rumaria ao caos, pois o poder é natural em qualquer tipo de sociedade”. (BASTOS, 2002, p. 89) Neste sentido, o poder político soberano é indispensável para a vida em sociedade, e para a organização do Estado, pois este é compreendido de vários e distintos grupos sociais, e a estes o poder político, tem que coordenar e impor regras e limites, em funções dos fins globais que o Estado cumpre realizar.2 O poder político e essencial para que se constitua um Estado, como define o professor Paulo Bonavides, “o poder representa sumariamente aquela energia básica que anima a existência de uma comunidade humana num determinado território, conservando-a unida, coesa e solidária”. (2000, p. 106) Nos dizeres de Carlos Ari Sundfeld, “a peculiaridade do poder do Estado (poder político) é, de um lado, o basear-se no uso da força física e, de outro, o reservar-se, com exclusividade, o uso dela”. (2006, p.21). 2 Segundo leciona o Professor José Afonso da Silva, em seu livro Comentário Contextual à Constituição, deste fato decorrem as três características fundamentais do poder político: unidade, indivisibilidade e indelegabilidade. (2009, p. 43). 10 Assim sendo, a gestão da coisa pública (política), esta estreitamente ligada às formas de como é organizado o exercício do poder político nos Estados, o que analisaremos em especial como é exercido no Brasil. 2.2 FORMAS DE ORGANIZAÇÃO A forma de organização do Poder em um Estado determina de fato como o mesmo será exercido. Como assinala Paulo Bonavides (2000), Montesquieu, distinguiu em cada Estado três sortes de poderes, sendo eles o poder Legislativo, Executivo e Judiciário. Esta era a forma de contenção do poder pelo próprio poder. Segundo Paulo Bonavides ao elencar a classificação feita por Aristóteles, cita ser a monarquia3 a primeira das formas no que diz respeito ao número de pessoas que exercem o poder soberano, representa o poder de um só, ou seja, concentram-se na pessoa do monarca as três sortes de poderes. Com relação à forma aristocracia, significa o governo de alguns, o governo dos melhores. E por fim como terceiro tipo de governo, contido nessa classificação, corresponde a democracia, governo que deve atender na sociedade os reclamos de conservação e observância dos princípios de liberdade e igualdade. Na definição de José Afonso da Silva (2009), a forma pela qual o povo participa do poder dá origem a três tipos de democracia, qualificadas como direta, indireta ou representativa e semidireta4. 3 A monarquia caracteriza-se pela ascensão automática, hereditária e vitalícia ao trono. Em seu Curso de Direito Constitucional Positivo (2009, p. 136), explica ser a democracia direta aquela em que o povo exerce, por si, os poderes governamentais, fazendo leis, administrando e julgando; Democracia indireta ou representativa outorga as funções de governo aos seus representantes, que elege periodicamente; e por fim a semidireta, é a representativa com alguns 4 11 Como decorrência do sistema de tripartição e separação do poder, observaremos os seguintes sistemas de governo do Estado, quais sejam o governo parlamentar, governo presidencial e governo de assembléia. A definição de cada forma de governo é citada por Paulo Bonavides como: O governo parlamentar, sob a legítima inspiração do princípio da separação de poderes, é aquela forma que se assenta fundamentalmente na igualdade e colaboração entre executivo e o legislativo, e como tal foi concebido e praticado da fase áurea do compromisso liberal entre monarquia, presa ao saudosismo as idade absolutista, e a aristocracia burguesa da revolução industrial, ligada mais a teórica que efetivamente às novas idéias democráticas. O governo presidencial, segundo as regras técnicas do rito constitucional resulta num sistema de separação rígida dos três poderes: o executivo, o legislativo e o judiciário, ao passo que o regime convencional se toma como um sistema de preponderância da assembléia representativa, em matéria de governo. Daí a designação que também recebeu de “governo de assembléia”. (2000, p.197) Portanto sistemas de governo são técnicas que regem as relações entre Poder Legislativo e o Poder Executivo o exercício das funções governamentais. Segundo José Afonso da Silva, é “o modo como se estabelece esse relacionamento, de sorte a preponderar maior independência ou maior colaboração entre eles, ou combinação de ambos numa assembléia que dá origem aos três sistemas básicos”. (2006, p. 505) Nos dizeres de Carlos Ari Sundfeld, “a separação de órgãos (Poderes), corresponde uma distinção de atividades (funções), que produzem diferentes atos, como segue: Poder Legislativo – função legislativa – lei; Poder Executivo – função administrativa (ou Governo) – ato administrativo; Poder Judiciário – função jurisdicional (ou justiça) – sentença”. (2006, p. 43) institutos de participação direta o povo em funções de governo, institutos que entre outros, integram a democracia participativa. 12 Assim é possível concluir, com fulcro no artigo 1.º da Constituição Federal de 1988, que o Brasil é uma República, democrática representativa, com pluralismo político partidário, com sistema de governo presidencialista. Como afirma Eneida Desirre Salgado, “a Constituição Brasileira de 1988 traz uma concepção de democracia, com contornos singulares, que se marca profundamente pelas noções de liberdade e igualdade, pela soberania popular e pelo pluralismo político”. (2010, p. 31) 2.3 SISTEMA ELEITORAL BRASILEIRO Como vimos o Brasil adota o regime democrático representativo, neste sentido vale frisar que esta democracia pressupõe um conjunto de instituições que disciplinam a participação popular no processo político. Essa representação se desdobra em dois sistemas eleitorais em nosso país, expressos na Carta Magna, são eles o sistema majoritário de representação na eleição de senadores e titulares do executivo e o sistema proporcional na escolha dos ocupantes do legislativo municipal, estadual e federal, ou seja, os vereadores e os deputados. 2.3.1 Sistema majoritário de representação O sistema majoritário de representação prevalece na eleição de presidente e vice-presidente da República, governadores e vice-governadores dos Estados e na 13 eleição direta de senadores federais e seus suplentes, prefeitos municipais e viceprefeitos5. Como pontua Paulo Bonavides, “o eleitor não vota numa idéia ou num partido, em termos abstratos, mas em pessoas com respostas ou soluções objetivas a problemas concretos de governo”. (BONAVIDES, 2000, p. 249.) 2.3.2 Sistema proporcional de representação O sistema proporcional, por sua vez e utilizado nas eleições para a Câmara dos Deputados, Assembléias Legislativas e Câmaras dos Vereadores, no âmbito municipal6. Ao contrário do sistema majoritário, este sistema é marcado pela reflexão sobre a diferenciação dos grupos ideológicos, e por assim ser, confere as minorias igual ensejo de representação de acordo com sua força quantitativa. Os sujeitos, candidatos aos cargos políticos, que sagram-se eleitos, tanto no sistema majoritário, quanto no sistema proporcional, recebe um mandato para ser cumprido. 2.4 MANDATO ELETIVO Existem duas formas de mandato, são eles o mandato representativo e o mandato imperativo. O mandato representativo é coerente com a soberania 5 Neste sistema o candidato eleito será aquele que individualmente atingir o maior número de votos na circunscrição eleitoral que representará. 6 Neste sistema, os partidos elegerão tantos representantes, quantas vezes a totalidade de seus sufrágios contenham o quociente eleitoral. Como ensina Paulo Bonavides “o quociente eleitoral consiste na divisão do número de votos válidos na circunscrição ou pais pelo de mandatos a serem conferidos.” (2000, p.253) 14 nacional, segundo Paulo Bonavides, “a nação se exprime, portanto através dos representantes, invioláveis no exercício de suas prerrogativas soberanas como legisladores que são; titulares de um mandato que não fica preso às limitações ou dependências de nenhum colégio eleitoral particular ou circunscrição territorial”. (2000, p. 260.) Portanto, podemos concluir que o mandato representativo, guarda em si as seguintes características, quais sejam a generalidade, a liberdade, a irrevogabilidade e a independência. De outra sorte, o mandato imperativo, é aquele que sujeita as vontades do mandatário à vontade do mandante, e assim sendo, transforma o eleito em simples depositário da confiança do eleitor. Nas palavras de Paulo Bonavides, “equivale a um acordo de vontades ou a um contrato entre eleito e eleitor e “politicamente” ao reconhecimento da supremacia permanente do corpo eleitoral, é a mais técnica das formas absolutas de poder, quer monárquico, quer democrático, do que em verdade instrumento autêntico do regime representativo.” (2000, p. 262) Desta feita, tanto no regime representativo semidireto, como na democracia semidireta, o mandato imperativo é acolhido, diante do domínio que o eleitor passa a exercer sobre o representante, ainda que este domínio seja apenas de cunho moral e político. Conclui-se, portanto, diante da importância que guarda em si a eleição de um indivíduo integrante da sociedade, para representar essa mesma sociedade, mostra-se essencial, uma fiscalização e um controle das regras deste “jogo”, para que ao final se tenha um mandato que represente a legítima e dominante vontade dos demais indivíduos representados. 15 3. JUSTIÇA ELEITORAL 3.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS O Poder Judiciário, terceiro Poder do Estado, tem por função compor conflitos de interesses em cada caso concreto. Na definição de José Afonso da Silva, “isso é o que se chama de função jurisdicional, ou simplesmente jurisdição, que se realiza por meio de um processo judicial, dito, por isso mesmo, sistema de composição de conflitos de interesses, ou sistema de composição de lides”. (SILVA, 2006, p. 500). Todavia a Justiça Eleitoral pode ser classificada como sui generis, pois tanto seu surgimento quanto sua organização se dá de maneira diversa das demais Justiças, tais como Estadual, Federal ou do Trabalho. A Justiça Eleitoral foi instituída no Brasil, pelo Código Eleitoral de 1932, expedida pelo regime de exceção de Getulio Vargas, em nível infraconstitucional pelo Decreto n.º 21.076 de 1932, cujas atribuições não se limitariam apenas aos julgamentos dos dissídios judiciais, mas adentraria nos aspectos administrativos, de organização, fiscalização e execução das eleições. Ou seja, confiou a um poder desinteressado, a licitação de acesso aos mandatos eletivos, tornando mais equilibrado a disputa. Por fim a Justiça Eleitoral foi erigida ao patamar constitucional, como órgão do Poder Judiciário, na constituição Federal promulgada em 16 de julho de 1934. Como elucidam as palavras de Marcos Ramayana: É imperativo notar que a periodicidade e sucessividade das eleições implicam uma impostergável necessidade de salutar organização permanente e extremamente funcional da Justiça Eleitoral, dos partidos políticos, bem como do Ministério Público Eleitoral, instituições democráticas 16 diretamente responsáveis pela higidez do sufrágio universal, através dos quais os cidadãos são os grandes protagonistas, juntamente com os elegíveis no cenário brasileiro. (2008, p. 15) A Justiça Eleitoral, nos dizeres de Adriano Soares da Costa, “é o órgão jurisdicional, concebido com a finalidade de cuidar da organização, execução e controle dos processos de escolha dos candidatos a mandatos eletivos (eleições), bem como dos processos de plebiscito e referendo”. (2008, p. 245) Como assevera o Professor Armando Antonio Sobreiro Neto, direito eleitoral constitucional, “Fonte primária do direito eleitoral, a Constituição Federal é base de todo o sistema que contempla o Estado Democrático de Direito, fundado na representação e soberania popular.” (2002, p.22) 3.2 ORGANIZAÇÃO A organização e competência da Justiça Eleitoral são determinadas por lei complementar conforme disposição do artigo 121 da Constituição Federal de 1988. Todavia a própria Carta Magna, estampa uma estruturação básica em seu artigo 118, qual seja ser composta por um Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de Tribunais Regionais (TRE), de Juízes Eleitorais e de Juntas Eleitorais. O TSE é composto de sete membros escolhidos mediante eleição pelo voto secreto, três juízes dentre os Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), dois juízes dentre os Ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), dois juízes por nomeação do Presidente da República e os outros dois juízes, dentre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo STF, conforme artigo 119 da CF/88. 17 Já os Tribunais Regionais Eleitorais, um na Capital de Cada Estado e no Distrito Federal, são compostos também mediante eleição, pelo voto secreto de dois juízes, dentre os desembargadores do tribunal de Justiça, de dois juízes dentre juízes de direito, escolhidos pelo Tribunal de Justiça, de um juiz do Tribunal Regional Federal (TRF) com sede na Capital do Estado ou do Distrito Federal, ou se não haver, de um Juiz Federal, escolhido em qualquer caso, pelo TRF respectivo, e por fim os dois últimos juízes, nomeados pelo Presidente da República, dentre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral indicados pelo Tribunal de Justiça, previstos no artigo 120 da CF/88. Os juízes eleitorais são os próprios juízes de direito da organização judiciária dos estados ou do Distrito Federal e as juntas eleitorais são presididas por juízes eleitorais, conforme expõe José Afonso da Silva, “a Constituição não mais lhes indica a composição nem as atribuições, remetendo o assunto à lei complementar”. (2006, p.582) Os juízes eleitorais investidos temporariamente nas zonas eleitorais são de primeira instância ou grau de jurisdição e servem por um biênio, de suas decisões caberá recurso ao TRE. Já à Junta Eleitoral, cabe a nobre missão de expedir os diplomas aos eleitos nas eleições municipais. 3.3 COMPETÊNCIA A competência da Justiça Eleitoral envolve questões compreendidas na fase do alistamento eleitoral, convenções, registro de candidaturas, propaganda política eleitoral e partidária. 18 Também são de sua competência a fiscalização da votação, a apuração e diplomação dos candidatos, além de competir e fiscalizar a prestação de contas anuais dos Partidos Políticos. Cabe a Justiça Eleitoral o controle da legitimidade do processo eleitoral. De um modo geral a Justiça Eleitoral, com base e observância em seus princípios e regras, visa preservar a lisura das eleições, e a garantia de que o mandato obtido no final desse processo é fruto da escolha autentica do eleitor, pois eleições corrompidas e usadas como vasto campo para realização de crimes e abusos do poder econômico ou político atingem diretamente a soberania popular tutelada no art. 1.º, parágrafo único, da Constituição Federal, que preceitua, “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Neste sentido, observa-se que a justiça eleitoral, e os órgãos responsáveis pela sua concretude, devem atuar visando realizar o contido no artigo 23 da lei Complementar n.º 64, de 18 de Maio de 1990 (Lei das Inelegibilidades), que prescreve, “O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstancias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas pares, mas que preservem o interesse público da lisura eleitoral”. [grifo nosso] A importância da lisura eleitoral paira no fato de ser por meio das eleições que, nas democracias representativas o povo, segundo ensinamento de José Afonso da Silva, “participa na formação da vontade do governo”. (2006, p. 368) Por assim ser, podemos dizer que à Justiça Eleitoral cabe o papel de garantir a própria Democracia em nosso país, pois visa garantir a forma onde mais 19 se percebe seu exercício, qual seja o pleno exercício da cidadania, votar e ser votado. Portanto, conclui-se que a Justiça Eleitoral, no desempenho de seu papel constitucional, revela-se instrumento de manutenção do Estado Democrático de Direito, porquanto guardiã dos primados democráticos delineados na nossa Carta Magna e responsável pela administração do processo eleitoral. (2002, p.50). Como bem define Marcos Ramayana, “cumpre à Justiça Eleitoral a nobre missão de resguardar a democracia e o estado Democrático, nos moldes do disposto no art. 1.º e incisos da Constituição Federal, efetivando, praticamente, a soberania popular, a cidadania e o pluralismo político como princípios fundamentais trilhados pelo legislador-constituinte”. (2008, p. 76) Diversas são as competências da Justiça Eleitoral, tanto as administrativas, tais como organização administrativa das zonas eleitorais, locais destinados à votação, apuração, funcionários e o próprio alistamento eleitoral de natureza declaratória administrativa, quanto às atinentes ao poder regulamentar do Tribunal Superior Eleitoral. Passaremos a análise desta ultima, em virtude de sua importância e de suas peculiaridades. 3.4 PODER REGULAMENTAR DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL É da competência do Tribunal Superior Eleitoral processar e julgar, originariamente, o registro e a cassação do registro de partidos políticos e dos seus diretórios nacionais, bem como registro e a cassação dos candidatos a cargos eletivos de presidente e vice-presidente da república. 20 Sua atuação está diretamente ligada ao Direito Eleitoral, que segundo Procurador de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Marcos Ramayana é definido como sendo: Um conjunto de normas jurídicas que regulam o processo de alistamento, filiação partidária, convenções partidárias, registros de candidaturas, propaganda política eleitoral, votação e apuração, proclamação dos eleitos, prestação de contas de campanhas eleitorais e diplomação, bem como as formas de acesso aos mandatos eletivos através dos sistemas eleitorais. (2008, p. 26) Como citado anteriormente, o poder regulamentar do TSE, guarda em sua origem o fato de que o Poder Legislativo, ao editar as leis em matéria eleitoral, deixa sempre uma substanciosa margem de complementariedade afeta ao poder regulamentar do Tribunal Superior Eleitoral. Antes de se analisar como se dá a atuação regulamentar do TSE, se é necessário conceituar doutrinariamente regulamento, suas peculiaridades, funções e limites. Segundo Celso Antonio Bandeira de Mello pode se conceituar regulamento em nosso Direito “como ato geral e de (regra) abstrato, de competência privativa do Chefe do Poder Executivo, expedido com a estrita finalidade de produzir as disposições operacionais uniformizadoras necessárias à execução de lei cuja aplicação demande atuação da Administração Pública”. (2008, p. 337) Os regulamentos ao contrário da lei, não inovam na ordem jurídica, ou seja, é fonte secundária do Direito, inferior e subordinado em relação à lei. Como bem pontuado por Hely Lopes Meirelles, “as leis que trazem recomendação de serem regulamentadas não são exeqüíveis antes da expedição do decreto regulamentar, porque esse ato é conditio júris da atuação normativa da lei.” (2008, p.131) 21 Neste sentido, os regulamentos, estão previstos na Constituição Federal, em virtude de o cumprimento de determinadas leis pressuporem uma interferência dos órgãos da Administração Pública para aplicar o que na mesma está disposto, conforme assiná-la o já citado professor Bandeira de Mello, “sem, entretanto, predeterminar exaustivamente, isto é, com todas as minúcias, a forma exata da atuação administrativa pressuposta.” (2008, p. 345) Assim sendo os regulamentos não poder extrapolar sua finalidade para além da edição de regras que indiquem a maneira de ser observada e executada a regra jurídica, ou seja, produzir normas requeridas para que seja executada a lei que dela decorrer. Este poder regulamentar que detém o TSE é uma marcante característica da legislação eleitoral atualmente em nosso ordenamento jurídico. O Poder Legislativo, ao editar as leis em matéria eleitoral, deixa sempre uma substanciosa margem de complementariedade afeta ao poder regulamentar do Tribunal Superior Eleitoral. O poder regulamentar conforme pontuação de Marcos Ramayana está disciplinado “nos artigos 23, inciso IX, que trata da expedição de instruções convenientes à execução do Código Eleitoral, bem como da legislação eleitoral lato sensu, art. 1.º, parágrafo único, ambos do Código Eleitoral, e nas leis especificas que disciplinam as eleições, v.g., art. 105 da Lei n.º 9.504/97.” (2008, p. 88) A maneira como se processa o poder regulamentar, em matéria eleitoral, é através de resoluções e instruções, que devem situar-se secundum e praeter legem, sob pena de invalidação, ou seja, deve destinar-se a execução da lei eleitoral, e não pode extrapolar os termos do que nela se dispõe. Precisamente definida por Hely Lopes Meirelles, resoluções são: Atos administrativos normativos expedidos pelas altas autoridades do Executivo (mas não pelo Chefe do Executivo, que só deve expedir 22 decretos) ou pelos presidentes de tribunais, órgãos legislativos e colegiados administrativos, para disciplinar matéria de sua competência específica. Por exceção admitem-se resoluções individuais. As resoluções, normativas ou individuais, são sempre atos inferiores ao regulamento e ao regimento, não podendo inová-los ou contrariá-los, mas unicamente complementá-los e explicá-los. (2008, p.185) O artigo 105 da LEI 9504/97, fixa prazo para que o TSE expeça as resoluções necessárias a executoriedade da lei, determinando haja audiência pública, onde serão ouvidos os delegados dos partidos políticos participantes do pleito eleitoral subseqüente, vejamos: Art. 105. Até o dia 5 de março do ano da eleição, o Tribunal Superior Eleitoral, atendendo ao caráter regulamentar e sem restringir direitos ou estabelecer sanções distintas das previstas nesta Lei, poderá expedir todas as instruções necessárias para sua fiel execução, ouvidos, previamente, em audiência pública, os delegados ou representantes dos partidos políticos. Adriano Soares da Costa, acerca da audiência pública, esclarece que: Como até essa data não terá havido ainda a escolha de candidatos em convenção partidária, não se poderá saber quais os partidos participantes do pleito, de modo que da audiência pública podem participar todos que estejam regularizados, ainda que provisoriamente, com aptidão para concorrer aos cargos eletivos através de seus filiados. (2008, p. 629) De suma importância, ressaltarmos que todas as leis eleitorais são complementadas por resoluções do TSE, todavia, este poder regulamentar esta, “interligado ao teor legiferante das próprias leis, não podendo ser contra, mas apenas praeter e secundum legem”. (RAMAYANA, 2008, p. 90) 23 4. CRISE POLÍTICA 4.1 TRANSFORMAÇÕES DA DEMOCRACIA Nas palavras de Paulo Bonavides, “a democracia decaída se transfaz em demagogia, governos das multidões rudes, ignaras e despóticas”. (2000, p. 194) De suma importância para analisar o momento por que passa a democracia no Brasil, é analisar a própria transformação ocorrida com esta hodiernamente. Nas palavras de Norberto Bobbio, “a democracia nasceu de uma concepção individualista da sociedade, isto é, da concepção para qual a sociedade, qualquer forma de sociedade, e especialmente a sociedade política, é um produto artificial da vontade dos indivíduos”. (2002, p. 34) A doutrina democrática funcionaria como imaginada no seu início, tendo por base um Estado sem corpos intermediários, ou seja, uma sociedade política composta pelo povo soberano, soma de todos os indivíduos, e entre esses e seus representantes, não havia sociedades particulares. Contudo, conforme explica Norberto Bobbio (2002) mais adiante em sua obra, ocorrerá o oposto nos Estados democráticos, pois os sujeitos politicamente relevantes tornaram-se grupos, organizações, associações, sindicatos e partidos, ou seja, alterou-se substancialmente sua forma como originariamente fora pensado7. Neste ínterim, convém anotar que o nosso Estado assegura os valores de uma sociedade pluralista, fundamentado no pluralismo político. O pluralismo político também contribui de certa forma para o desenvolvimento da crise política nacional. Nas palavras de José Afonso da Silva 7 O autor em sua obra dá ênfase ao fato de serem os grupos e não mais os indivíduos os protagonistas da vida política em uma sociedade democrática. 24 (2006), optar por uma sociedade pluralista significa acolher uma sociedade conflitiva, de interesses contraditórios e antinômicos, e este acaba por se tornar um problema, conforme expõe: O problema do pluralismo está precisamente em construir o equilíbrio entre as tensões múltiplas e por vezes contraditórias, em conciliar a sociabilidade e o particularismo, em administrar os antagonismos e evitar divisões irredutíveis. (2006, p. 143) Diante do exposto, ainda que de maneira rasa, podemos observar que a soma destes fatos e fatores, dentre outros, imprimiram as transformações ocorridas na democracia representativa em nosso Estado nos dias atuais. Como conseqüências de toda essa problemática surgem inúmeras demandas a serem resolvidas pelo poder Executivo e Legislativo, que ineficientes, ao falharem fazem nascer em seus representados um sentimento de desconfiança, insatisfação e descrédito, “fenômeno da apatia política, que freqüentemente chega a envolver cerca de metade dos que têm direito ao voto”. (BOBBIO, 2002, p.45) 4.2 CRISE DO POSITIVISMO E SURGIMENTO DO ATIVISMO JUDICIAL Como resposta a crise política, ou seja, “lentidão que os complexos procedimentos de um sistema político democrático impõem a classe política no momento de adotar as decisões adequadas” (BOBBIO, 2002, p. 48), surge o ativismo judicial, ou judicialização, nos dizeres do Professor Luis Roberto Barroso, significa: Que algumas questões de larga repercussão política ou social estão sendo decididas por órgãos do Poder Judiciário, e não pelas instâncias políticas tradicionais: o Congresso Nacional e o Poder Executivo – em cujo âmbito se encontram o Presidente da República, seus ministérios e a administração pública em geral. Como intuitivo, a judicialização envolve uma transferência 25 de poder para juízes e tribunais, com alterações significativas na linguagem, 8 na argumentação e no modo de participação da sociedade . Desta feita, observa-se claramente, ser resposta ao problema da crise do positivismo, que se “preso a uma esfera puramente normativa, não pode ser apenas lei de arbitragem, pois precisa influir na realidade social”. (SILVA, 2006, p.121) Neste mesmo sentido, o professor Eros Roberto Grau, ao criticar o positivismo, e a própria lei, assevera: A lei para a grande maioria da população, nas sociedades latinoamericanas, é um dado de pura abstração, inteiramente dissociado da realidade na qual imersa essa maioria. Em nada, absolutamente em nada contribui a legalidade, enquanto apenas expressão formal do Estado de Direito, para alterar as condições sociais de existência dos economicamente desprivilegiados, no modo de produção capitalista. (2005, p. 169) As necessidades atuais, bem como a crise política, ou seja, a inércia do poder executivo e especialmente do legislativo, com relação aos assuntos que interessa a toda nação, mas em muitos casos não aos membros deste poder, merece atenção a situação em que se encontra o sistema político representativo, inegavelmente envolto em uma crise política, conforme expõe Luana Paixão Dantas do Rosário9: Uma das causas que mais influenciam a expansão da jurisdição constitucional no campo das decisões políticas é a paulatina perda de legitimidade do processo político. A complexidade do debate político, o poder econômico, a falta de locais para o debate público, bem como os meios de informação são algumas das razões para a perda de legitimidade dos representantes populares. (2008) 8 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Disponível em <http://www.oab.org.br/oabeditora/users/revista/12 35066670174218181901.pdf>. Acesso em 12/07/2010. 9 ROSÁRIO, Luana Paixão Dantas do. POLITIZAÇÃO E LEGITIMIDADE DISCURSIVA DO JUDICIÁRIO NA DEMOCRACIA CONSTITUCIONAL. Trabalho publicado nos Anais do XVII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em Brasília – DF nos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2008. 26 A junção destes fatos e da situação tem feito com que o Poder Judiciário, no intuito de concretizar os preceitos e princípios constitucionais, atue de maneira ainda mais política, o que comumente é dado o nome de “Ativismo Judicial”. O que vem a ser, nos dizeres do Professor Luis Roberto Barroso, uma judicialização da política, no exato momento em que as instâncias políticas já não respondem satisfatoriamente às aspirações sociais na concretização dos valores e das finalidades da Constituição10. Importante frisar que o positivismo impõe um limite à atuação daqueles ocupantes dos poderes que organizam o Estado, e por assim ser, imprime a todos os indivíduos seu respeito e sua observância. Contudo, esta mesma lei (ainda que inexistente formalmente) deverá “realizar o princípio da igualdade e da justiça não pela sua generalidade, mas pela busca da igualização das condições dos socialmente desiguais”. (SILVA, 2006, p.121) 10 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática. Disponível em <http://www.oab.org.br/oabeditora/users/revista/1235066670174218181901.pdf>. Acesso em 12/07/2010. 27 5. ATIVISMO JUDICIAL ELEITORAL 5.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS Nos dias atuais, como destaca Luis Roberto Barroso: A complexidade da vida contemporânea, tanto no espaço público como no espaço privado; o pluralismo de visões, valores e interesses que marcam a sociedade atual; as demandas por justiça e pela preservação e promoção dos direitos fundamentais; as insuficiências e deficiências do processo político majoritário – que é feito de eleições e debate público; enfim, um conjunto vasto e heterogêneo de fatores influenciaram decisivamente o modo como o direito constitucional é pensado e praticado. (2009, p. 266) Estes fatores ocasionaram um grande choque sobre a hermenêutica jurídica11, bem como sobre a interpretação constitucional. Esta mudança na forma acaba por influenciar em todos os ramos do direito, e assim sendo, também o faz no âmbito do Direito Eleitoral, da atuação da Justiça Eleitoral. Diante da complexidade das questões que atualmente envolvem o processo eleitoral nacional, os Tribunais Regionais Eleitorais, e mais ainda o TSE, muitas das vezes se deparam frente a questões onde a lei não traz respostas prontas, e às vezes nem existe lei, no seu sentido clássico, qual seja elaborada pelo poder legislativo, o que por assim ser gera indefinição e críticas por parte da doutrina. Ou seja, a morosidade e ineficiência do poder legislativo, dentre outras questões que compõem a crise política atual e problemas do sistema representativo acaba por desembocar no judiciário, situações adversas e complexas. A atuação da Justiça Eleitoral, quando observada manifestação de maneira ativa, política, o é visando, na narrativa do professor Fávila Ribeiro: 11 A hermenêutica jurídica, como explica Barroso (2009, p. 269) é um domínio teórico, especulativo, voltado para a identificação, desenvolvimento e sistematização dos princípios de interpretação do Direito. 28 [...] garantir a eficiência de seus lançamentos operativos, aceitando os desafios da realidade cultural, social, econômica e política, para escoimar as distorções assestadas sobre o processo eleitoral. Há a necessidade de ora ampliar de ora ampliar a sua focalização para o macrossocial, ora reduzir a percepção para os aspectos microssociais, para que possa impedir compativelmente, as injunções que assediam o processo 12 eleitoral. Os defensores desta forma de atuação dos tribunais e cortes superiores no âmbito eleitoral reconhecem serem os meios tradicionais inadequados para combater de maneira eficiente os abusos praticados com o intuito de obter benefícios indevidos nos resultados das urnas, e por assim ser, mudanças são inseridas na ordem jurídica, e se as mesmas não o são pela via legislativa, o Poder Judiciário fica a cargo de sua realização por meio de suas decisões. 5.2 LEGITIMIDADE DAS DECISÕES A legitimidade das decisões está no discurso, assim sendo se assenta na observância das regras do discurso racional, na construção do argumento verossímil que, tendo colhido os valores da comunidade e elaborado a sua escolha, tenha o potencial de despertar senão o consenso, algo próximo dele. Ou seja, a legitimidade democrática do Judiciário pode ser compreendida pelo viés do discurso, pela realização da finalidade ou conteúdo da Democracia, os Direitos Fundamentais, ou pelo viés da participação direta do cidadão no Poder Judiciário, considerado como espaço político. Deste modo, pode ser compreendida pela idéia de legitimidade discursiva, da participação política e da representatividade discursiva. Este discurso que legitima as decisões apóia-se na interpretação constitucional, que conforme definição de Luis Roberto Barroso é “uma modalidade 12 RIBEIRO, Fávila. Abuso de poder no direito eleitoral. 3.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 26. 29 de interpretação jurídica e consiste na atividade de revelar ou atribuir sentido a textos ou outros elementos normativos lastreados na Constituição” (2009, p.398) Como assinalado por Adriano Soares da Costa, “a Constituição, como fundamento da validade do ordenamento jurídico positivo, veicula normas jurídicas, cuja linguagem padece de vagueza e ambigüidade”. (2008, p. 15) Para dar respostas as novas demandas, que decorrem da complexidade da vida moderna, foram “identificadas, desenvolvidas e aprofundadas categorias específicas, voltadas, sobretudo para a interpretação constitucional, que incluem: os conceitos jurídicos indeterminados, a normatividade dos princípios, a colisão de direitos fundamentais, a ponderação e a argumentação” (Barroso, 2009, p.399) Esta interpretação constitucional que legitima as decisões, como ensina Peter Häberle, “não é um evento exclusivamente estatal, seja do ponto de vista teórico, seja do ponto de vista prático. A esse processo têm acesso potencialmente todas as forças da comunidade política”. (2002, p. 23) Oportuno citar Luis Roberto Barroso, ao discorrer acerca da justiça, em seu sentido clássico e filosófico, sobre as possibilidades de alcançá-la, observemos: Nesse ambiente, nem sempre será possível falar em resposta correta para os problemas jurídicos, mas sim em soluções argumentativas racionais e plausíveis. A legitimidade da decisão virá de sua capacidade de convencer e conquistar adesão, mediante demonstração lógica de ser a que mais adequadamente realiza a vontade constitucional in concreto. (2009, p. 399) Pode se dizer, portanto, que a legitimidade das decisões esta em seu discurso. Podemos perceber nas palavras de Peter Häberle, concernente a um aumento na legitimação deste discurso, a necessidade da abertura a todos os indivíduos que compõem a sociedade, segue: Até pouco tempo imperava a idéia de que o processo de interpretação constitucional estava reduzido aos órgãos estatais ou aos participantes direto do processo. Tinha-se, pois, uma fixação da interpretação 30 constitucional nos “órgãos oficiais”, naqueles órgãos que desempenham o complexo jogo jurídico-institucional das funções estatais. Isso não significa que se não reconheça a importância da atividade desenvolvida por esses entes. A interpretação constitucional é, todavia uma atividade que, potencialmente, diz respeito a todos. Os grupos mencionados e o próprio individuo podem ser considerados interpretes constitucionais indireto ou a longo prazo. A conformação da realidade da Constituição torna-se também parte da interpretação das normas constitucionais pertinentes a essa realidade. (2002, p. 24) Diante do que, em poucas palavras se expos, podemos concluir que a ampliação do círculo dos interpretes e uma conseqüência da necessidade de interpretação, e é esta, que no discurso legitima as decisões. Neste sentido, e por ter uma influência muito maior e mais importante na vida da sociedade, a que se analisar cuidadosamente o atuar do Poder Judiciário de forma ativa, em especial da Justiça Eleitoral, pois tal atuação determina os rumos em que trilhará uma cidade, um estado da federação e até mesmo o país. 5.3 ANÁLISE DE CASO: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL N° 31.942 (AGR-RESPE N.º O31.942/PR) “CASO BELINATI” O artigo 1.º da Lei Complementar 64 de 1990, prescreve as várias situações em que os cidadãos tornam-se inelegíveis. Todavia, veremos neste trabalho a discussão havida no ano de 2008, no TSE, referente à alínea “g”, do citado artigo, envolvendo o então prefeito e naquela época candidato a reeleição no Município de Londrina – PR, Antonio Casemiro Belinati. A discussão se deu no Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral N° 31.942 (AgR-REspe n.º O31.942/PR)13, do Ministro Relator Marcelo Ribeiro, e onde conforme relatório dos autos do processo, trata-se de agravo regimental interposto pelo Ministério Público Eleitoral (MPE) (fls. 1256-1259) em face da decisão de fls. 13 COLOCAR SITE DO TSE E N. DO JULGADO. 31 1249-1252, em que foi dado provimento ao recurso especial eleitoral interposto por Antônio Casemiro Belinati, deferindo o seu registro de candidatura ao cargo de prefeito do Município de Londrina/PR. Alega o MPE que o agravado teve suas contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná, por irregularidades insanáveis, em decisão que transitou em julgado em 20.7.2007, sem haver provimento judicial que suspendesse os efeitos do julgamento da Corte de Contas. Quando da análise do debate presente na discussão, podemos observar claramente, que há uma divergência na interpretação do dispositivo legal, e que alguns dos Ministros levaram em conta o momento em que se encontrava o pleito eleitoral, bem como aos precedentes da corte e outros não. Com relação à interpretação das normas, Adriano Soares da Costa, desta alguns aspectos, a seguir: Há os que apreendem a interpretação como o processo de atribuição de significado aos enunciados, ou seja, como um processo individual, pessoal, de outorga de significação aos sinais gráficos estampados no papel. O processo hermenêutico, todavia, não pode ser visto como um processo arbitrário, em que o interprete atribui como queira, significado ao texto analisado. (2008, p. 5) Necessário frisar o importante fato de que a esta altura, o agravado já havia sido reeleito com 36.38% (98.432 votos) dos votos válidos em primeiro turno, e 51.73% (138.926 votos) dos votos válidos em segundo turno14. A decisão, por maioria proveu o agravo regimental para manter o acórdão regional que negou registro à candidatura de Antonio Casemiro Belinati, nos termos do voto do Ministro Carlos Ayres Britto, Vencidos os Ministros Marcelo Ribeiro e Arnaldo Versiani. 14 Disponível em <http://www.duplipensar.net/dossies/eleicoes-2008/eleicao-2008-londrina-pr-prefeitovereador.html> acessado em 23/07/2010. 32 A questão central deste interessante e caloroso debate se deu em razão do fato de o Tribunal de Contas do Estado do Paraná conceder efeito suspensivo a inelegibilidade nos ditames no artigo 1.º, inc. I, alínea “g”, da lei complementar 64/90, que prescreve: Art. 1.º São inelegíveis: I – Para qualquer cargo (...) g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se a questão houver sido ou estiver sendo submetida à apreciação do Poder Judiciário, para as eleições que se realizem nos 5 (cinco) anos seguintes, contados a partir da data da decisão. Nas palavras de Adriano Soares da Costa, “se o ordenador das despesas ingressar com alguma ação processual, atacando todos os pontos fundamentais da decisão administrativa que lhe negou aprovação das contas, a anexação da inelegibilidade é suspensa”. (2008, p. 160) No caso em comento, o então candidato ingressou com pedido liminar em ação administrativa rescisória no próprio Tribunal de Contas, e não na justiça, obtendo desta feita em liminar o deferimento do pedido de registro de candidatura. Importante destacar que até aquele momento a jurisprudência do TSE era no sentido de ser esta modalidade possível de afastar a inelegibilidade. Ou seja, naquele momento houve uma “virada de mesa” na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, desrespeitando os precedentes da corte alterando seu entendimento em um momento decisivo do pleito. Necessário trazer a crítica feita por Eneida Desirre Salgado em sua tese, vejamos: A atuação do Tribunal Superior Eleitoral no alegado exercício de sua competência de expedir instruções para a “fiel execução” execução da legislação eleitoral, sem sede constitucional específica, retira a segurança jurídica e a previsibilidade das regras de disputa eleitoral, fundamental para a configuração democrática de um regime político. No direito Eleitoral, braço estrutural do Direito Constitucional, pela atuação da corte sustentada pelo tribunal máximo, para persistir uma prática jurisdicional de construção da 33 regra pelo Poder Judiciário, sem respeito aos precedentes, sem coerência, sem consistência e sem unidade. Uma mistura pragmática (talvez esquizofrênica) entre comum law e civil law. (2010, p. 12) O saudoso Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, ressaltou a importância da questão, e de uma alteração de entendimento da Corte naquele momento, vejamos: Se o candidato se apóia na jurisprudência mansa e pacífica do Tribunal, para este agir, como é possível, às vésperas da eleição, alterarmos esse entendimento? É preciso considerar que, historicamente, o Tribunal sempre decidiu considerando o processo eleitoral em curso. É certo que a jurisprudência varia, mas varia de um processo eleitoral com relação a outro processo eleitoral. Ela não pode ser flexibilizada no mesmo processo eleitoral, sob pena de, com todo o respeito e com todas as vênias, gerarmos insegurança jurídica15. Preocupado com o princípio da segurança jurídica, e respeitando os precedentes o ministro concluiu, “todavia, pondero que, neste momento, a essa altura do processo eleitoral, não devemos, em nenhuma circunstância, alterar a jurisprudência do Tribunal”. Ou seja, ao final a decisão judicial prevaleceu ao resultado das urnas, pois mesmo tendo, o então candidato Antonio Casemiro Belinati, vencido o primeiro e segundo turno, houve novamente segundo turno (“terceiro turno” como popularmente foi chamado) entre os candidatos que ficaram em segundo e terceiro no primeiro turno. Isto porque segundo o TSE, o "terceiro turno" é necessário porque nenhum dos candidatos que concorreram no primeiro turno atingiu mais de 50% dos votos válidos remanescentes depois que os votos do candidato impugnado foram declarados nulos. Com base nas decisões do TSE, o Tribunal Regional Eleitoral 15 http://www.tse.jus.br AgR-REspe n.º O31.942/PR TSE. fl. 22. 34 (TRE) do Paraná convocou o novo segundo turno no município, com o segundo e o terceiro colocado das eleições de 5 de outubro de 2008. O mais interessante na análise desta situação envolvendo o município de Londrina no Paraná, foi o fato de que o deputado federal Barbosa Neto, terceiro colocado no primeiro turno, disputou a eleição com o também deputado federal Luiz Carlos Hauly (PSDB), que havia perdido para Belinati no segundo turno, ou seja, fora segundo colocado também no primeiro turno. Barbosa voltou à disputa por ter sido o terceiro colocado no primeiro turno, e mesmo assim venceu o seu concorrente no segundo turno definitivo. Com 100% das urnas apuradas, Barbosa Neto registrou 54,12% dos votos válidos, com 135.507 votos. Hauly teve 45,88% dos válidos, com 114.877 votos. Os votos brancos somaram 7.004 e os nulos, 15.624 votos. Interessante crítica postula Eneida Desirre Salgado, quando enuncia, “alegase que a intervenção do Poder Judiciário na definição de regras jurídicas, dá-se pela indolência do Poder Legislativo em cumprir sua função principal. Tal argumento, que encontra fácil abrigo em qualquer discurso antidemocrático e também é utilizado para justificar a atuação legislativa do Poder Executivo, contraria todo o sistema representativo”. (2010, p.324) Frise-se o fato da definição do prefeito em questão, se deu cinco meses depois da primeira data de diplomação, ou seja, o município ficou cinco meses sem saber ao certo quem seria o representante do poder executivo. 35 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao final do presente trabalho, é possível concluir, que estamos nos dias atuais diante de uma crise política em nosso país, seja pelo corrompimento de preceitos de morais e ética por parte dos representantes eleitos e ocupantes de cargo públicos eletivos (membros do poder executivo), ou em razão da omissão de outros no tocante a preocupação com a questão legislativa em matéria eleitoral (em relação ao poder legislativo) e de maneira mais gravosa e repugnante, no descaso com a “res publica” (membros da administração pública de um modo geral). Diante da referida crise, é gerada nos cidadãos, e demais integrantes da sociedade, uma desconfiança e descrédito nos gestores políticos da nação, e é neste cenário que surge e se desenvolve a atuação política judicial, ou o ativismo judicial por parte dos magistrados (juízes, desembargadores e ministros). O ativismo judicial, que no princípio era vista de forma positiva e necessária por grande parte dos doutrinadores, e operadores do direito pátrio, como forma de correção das incoerências legislativas, e de realização plena dos princípios constitucionais presentes na Carta Magna, bem como aproximação da realidade jurídica da realidade fática e social. Todavia, no tocante a atuação das cortes quanto à matéria eleitoral, faz-se necessária uma ponderação no que diz respeito ao ativismo judicial. Isto porque ao contrário das relações processuais entre particulares, em que ao final a decisão fará lei entre as partes, e refletirá conseqüências, que em regra, diretamente será afeta apenas aos envolvidos, no direito eleitoral se dará de forma diversa. Nas decisões proferidas pelos tribunais e cortes superiores, os efeitos serão suportados pela coletividade, pela sociedade de modo geral, haja vista relacionar-se 36 com interesses coletivos difusos, de muitíssima importância para vida de todos aqueles que compõem o território onde se dará a aplicação da referida decisão. Assim sendo, a observância dos princípios constitucionais, bem como dos precedentes das respectivas cortes, devem imperar frente a opiniões particulares, teses pessoais, e entendimentos próprios. Ainda que, visando manter a lisura do pleito, não pode tentar forjar de que forma se dará a decisão do eleitorado, de maneira tendenciosa, na escolha de seus representantes, ou seja, ao voto, livre manifestação de vontade e de exercício de poder do povo, deve se reconhecer sua intenção em plenitude. Neste sentido, a que se respeitar o principio da segurança jurídica, evitando que ocorra de maneira injustificada, à luz de princípios constitucionais, viradas de mesa, que tornam-se mais grave se decidida em momentos cruciais do pleito eleitoral. Reconhece-se que um estrito legalismo, considerando a pouca eficiência da atuação e produção das normas legais, bem como o abuso do poder, seja ele econômico, político, por boa parte dos pretendentes a ocupação de cargos eletivos, levaria a desvios e escolhas maculadas por parte dos eleitores. Também apresentará incorreções e desvios, à realização efetiva da verdadeira manifestação da vontade do povo expressada nas urnas, uma atuação por parte daqueles que compõem o poder judiciário, especialmente na seara eleitoral, sem observâncias aos princípios constitucionais, aos precedentes, reiteradas decisões do colegiado e da própria corte, e até mesmo fundada em convicções pessoais e opiniões políticas individuais tendenciosas. Conclui-se que é necessária uma atuação que resguarde a lisura do desenrolar-se do pleito eleitoral, que garanta o cumprimento e a realização dos 37 princípios constitucionais pátrios, reconhecendo haver uma crise política nacional, que deveras contribui para uma atuação política do judiciário, e para o desenvolvimento do ativismo judicial. Todavia observando, e respeitando os mesmos princípios e os demais princípios constitucionais, os tendo como limite, ainda que a linha que os separe seja tênue, e sutil, e que suas conseqüências refletem de maneira significativa, seja positiva ou negativa na vida e realidade da sociedade de maneira geral, pois só desta maneira ainda que a passos lentos, caminhar-se-á em direção a uma sociedade mais justa, eliminando-se gradativamente o abismo social que a permeia desde o seu descobrimento. 38 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 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