UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO
CARLOS ALBERTO DE SOUZA CABELLO
RELAÇÕES INSTITUCIONAIS PARA O ENSINO DA NOÇÃO
DE JUROS NA TRANSIÇÃO ENSINO MÉDIO E ENSINO SUPERIOR
SÃO PAULO
2010
CARLOS ALBERTO DE SOUZA CABELLO
MESTRADO ACADÊMICO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
RELAÇÕES INSTITUCIONAIS PARA O ENSINO DA NOÇÃO
DE JUROS NA TRANSIÇÃO ENSINO MÉDIO E ENSINO SUPERIOR
Dissertação submetida à Banca Examinadora
da Universidade Bandeirante de São Paulo,
como exigência parcial para a obtenção do
título de Mestre em Educação Matemática.
Orientador: Prof. Dra. TÂNIA MARIA MENDONÇA
CAMPOS e Coorientadora Prof.ª Dra. MARLENE
ALVES DIAS.
SÃO PAULO
2010
Cabello, Carlos Alberto de Souza
Relações Institucionais para o Ensino da Noção de Juros na Transição
Ensino Médio e Ensino Superior. / Carlos Alberto de Souza Cabello. São
Paulo: [s.n.], 2010.
163f. Il. ; 30 cm.
Dissertação de Mestrado para a obtenção do título de Mestre em
Educação Matemática. Programa de Pós Graduação em Educação
Matemática da Universidade Bandeirante de São Paulo.
Orientadora: Prof. Dra. Tânia Maria Mendonça Campos e Coorientadora
Prof.ª Dra Marlene Alves Dias.
À minha amada família,
MARIÂNGELA, RAFAELA e MARIA EDUARDA.
Em todas as minhas realizações,
sempre presentes.
AGRADECIMENTOS
A DEUS, por ter me concedido mais uma oportunidade na vida.
À PROFESSORA DOUTORA TÂNIA MARIA MENDONÇA
CAMPOS
e à PROFESSORA DOUTORA
MARLENE ALVES DIAS, pelo carinho, dedicação e paciência com os quais orientou esta
pesquisa.
Fica
muito
difícil
encontrar
palavras
que
demonstrem
meus
agradecimentos a vocês.
Ao PROFESSOR DOUTOR HERMÍNIO BORGES NETO, que participou da minha
qualificação dando sugestões que permitiram melhorar o trabalho.
Às queridas “professoras da Linha de Pesquisa Ensino e Aprendizagem”,
PROFESSORA DOUTORA LULU, PROFESSOR DOUTOR ALESSANDRO e PROFESSORA
DOUTORA VERA, pelos conhecimentos transmitidos de forma tão cuidadosa e
comprometida ao longo de todo o programa. Não posso deixar de registrar meu
carinhoso agradecimento.
A todos os colegas do programa de Pós-Graduação em Educação Matemática da
Universidade Bandeirante de São Paulo, companheiros de caminhada com quem
muito aprendi.
Agradeço, em especial, à minha esposa e às minhas filhas, por entenderem a minha
falta em alguns momentos na preparação deste trabalho.
A todos os professores do programa de Pós-Graduação em Educação Matemática
da Universidade Bandeirantes de São Paulo, por todo o aprendizado e experiência
que proporcionaram.
RESUMO
CABELLO, Carlos Alberto de Souza. Relações Institucionais para o ensino da noção
de juros na transição Ensino Médio e Ensino Superior. 2010. 197f. Dissertação de
Mestrado – Programa de Pós Graduação em Educação Matemática. Universidade
Bandeirante de São Paulo, São Paulo.
O objetivo deste trabalho é apresentar as possíveis relações institucionais para o
ensino da noção de juros na transição Ensino Médio e Ensino Superior por meio de
documentos oficiais, análise de livros didáticos e de alguns planos de ensino de
universidades federais e particulares. Para o desenvolvimento da pesquisa
escolheu-se como referencial central a abordagem antropológica de Chevallard e
Bosch (1999), tendo como referenciais teóricos de apoio os trabalhos de Robert
(1997), sobre os três níveis de conhecimentos esperados dos estudantes, e de
Douady (1984; 1992), sobre articulações de domínios de quadros. Iniciamos a
investigação a partir do trabalho de Bosch e Chevallard (1999), com intuito de
fundamentar uma análise dos Parâmetros Curriculares do Estado de São Paulo, de
três livros didáticos do Ensino Médio, dois do Ensino Superior e alguns planos de
ensino de universidades federais e particulares. Analisamos o “topos” esperado do
professor e do estudante. Elaboramos uma grade de análise para auxiliar a
identificação dos ostensivos e não ostensivos nas tarefas apresentadas nos livros
didáticos e planos de ensino. Essa grade de análise também propiciou condições de
identificarmos os quadros numérico, algébrico e geométrico encontrados nas tarefas
resolvidas e propostas. Na conclusão dessas análises identificamos pouca relação
entre o conhecimento esperado do estudante diante das relações institucionais e
livros didáticos, ou seja, os estudantes, por alguma razão, não apropriaram
conhecimentos, tais como progressão aritmética, função afim, ao manipularem
tarefas com juros simples e função exponencial, e noções de logaritmos, ao
resolverem tarefas com o uso de conceitos de juros compostos. Percebemos que
existe pouca coerência entre o que os estudantes trazem do Ensino Médio e o que é
pedido e ensinado no Ensino Superior. Com poucas articulações entre os
conhecimentos esperados e trazidos do Ensino Médio, não conseguem articular o
aprendido na etapa escolar anterior para apropriar do novo conhecimento.
Palavras-chave: Noções de juros, ostensivos e não ostensivos níveis de
conhecimentos, domínio ou quadros.
ABSTRACT
CABELLO, Carlos Alberto de Souza. Institutional Relations for Teaching Concept of
Interest in Transition School and Higher Education. 2010. 197f. Master Thesis –
Graduate Program in Mathematics Education. Bandeirantes University of São Paulo,
São Paulo.
The aim of this paper is to present the possible institutional relationships to the
teaching of the concept of interest in the transition and Higher Secondary Education
by official documents, analysis of textbooks and teaching plans for some federal and
private universities. To develop the research was chosen as a central reference
anthropological approach Bosch and Chevallard (1999), having as theoretical
support the work of Robert (1997) on the three levels of knowledge expected of
students and Douady (1984, 1992 ) on areas of joint frames. We began this research
from the work of Bosch and Chevallard (1999), in order to justify an analysis of the
Curriculum of the State of Sao Paulo, three high school textbooks, two of Higher
Education and some private education in federal and individuals. We analyze the
"Topos” expected of the teacher and student. We developed a grid analysis to help
identify the overt and not ostentatious in the tasks presented in textbooks and
teaching plans. This grid of analysis also provided conditions for identifying the
frames numerical, algebraic and geometric found and solved the tasks proposed. At
the conclusion of this analysis we identified little relationship between knowledge
expected of the student in the face of institutional relations and textbooks, or students
for any reason not appropriated knowledge such as arithmetic progression, function
in order to handle tasks with simple interest and exponential function and notions of
logarithms to solve tasks using the concepts of compound interest. We realize there
is little consistency between what students bring to school and what is required and
taught in higher education with few links between the expected knowledge and
brought high school. They can not articulate what they learned in school prior to step
ownership of new knowledge.
Keywords: Concepts of interest, and not ostentatious ostentatious, levels of
knowledge, domain, or frames.
LISTA DE TABELAS
TABELA 1: TAREFAS ANALISADAS .......................................................................
98
TABELA 2: OBRAS ANALISADAS NA PESQUISA ..................................................
110
TABELA 3: TAREFAS RESOLVIDAS E PROPOSTAS NA OBRA DE DANTE,
2008................................................................................................................... 122
TABELA 4: TAREFAS RESOLVIDAS E PROPOSTAS NA OBRA DE GIOVANNI E
BONJORNO, 2005. ........................................................................................... 127
TABELA 5: TAREFAS RESOLVIDAS E PROPOSTAS NA OBRA DE XAVIER &
BARRETO, 2005. .............................................................................................. 131
TABELA 6: TAREFAS RESOLVIDAS E PROPOSTAS NA OBRA DE SOBRINHO,
2000................................................................................................................... 136
TABELA 7: TAREFAS RESOLVIDAS E PROPOSTAS NA OBRA DE PUCCINI,
2008...................................................................................................................ERRO! INDICADO
.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................
12
1
PROBLEMÁTICA, OBJETIVO E METODOLOGIA DA PESQUISA........................
18
1.1 CONTEXTO DA PESQUISA .............................................................................
18
1.2 PROBLEMÁTICA DA PESQUISA .....................................................................
21
1.3 OBJETIVOS DA PESQUISA .............................................................................
23
1.4 METODOLOGIA DA PESQUISA ......................................................................
24
ABORDAGEM ANTROPOLÓGICA NA ANÁLISE DAS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS PARA O ENSINO DA NOÇÃO DE JUROS NA TRANSIÇÃO
ENSINO MÉDIO E ENSINO SUPERIOR...................................................................
27
2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................
27
2.2 REFERENCIAL TEÓRICO CENTRAL ...............................................................
29
2.3 AS NOÇÕES DE QUADRO E MUDANÇA DE QUADRO CONFORME
DEFINIÇÃO DE DOUADY (1984, 1992) ...........................................................
41
2.4 OS TRÊS NÍVEIS DE CONHECIMENTO ESPERADOS DOS ESTUDANTES
CONFORME DEFINIÇÃO DE ROBERT (1997, 1998)......................................
42
2.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...............................................................................
44
O “TOPOS” DO ESTUDANTE E DO PROFESSOR NOS DOCUMENTOS OFICIAIS .........................................................................................................................
45
3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................
45
3.2 OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO MÉDIO
(PCNEM) ...........................................................................................................
48
3.3 OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO MÉDIO
(PCN+)...............................................................................................................
59
3.4 OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO MÉDIO
(PCN+) – PROPOSTAS PARA ENSINO DE MATEMÁTICA FINANCEIRA .....
59
3.5 A NOVA PROPOSTA CURRICULAR DO ESTADO DE SÃO PAULO..............
62
3.6 ESTUDOS DE QUATRO PLANOS DE ENSINO DE UNIVERSIDADES
PÚBLICAS E PRIVADAS ..................................................................................
68
3.7 ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DE DUAS UNIVERSIDADES FEDERAIS
E DUAS UNIVERSIDADES PRIVADAS ............................................................
69
2
3
3.7.1
ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DA UNIVERSIDADE FEDERAL
DO AMAZONAS (UFAM) .......................................................................
70
3.7.2
Diretrizes curriculares do curso de Administração de Empresas ..........
70
3.7.3
Plano de ensino da Universidade Federal do Amazonas ......................
71
3.7.4
Comentários e análises .........................................................................
73
3.8 ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO
GRANDE DO SUL – INSTITUTO DE MATEMÁTICA – DEPARTAMENTO DE
MATEMÁTICA PURA E APLICADA ..................................................................
74
3.8.1
4
5
Comentários e análises .........................................................................
75
3.9 ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DAS FACULDADES DAS AMÉRICAS .....
75
3.9.1 Comentários e análise ..............................................................................
77
3.10 PLANO DE ENSINO DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS – SÃO PAULO.....
77
3.10.1 Comentários e análises ..........................................................................
80
3.11 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................................
80
OS TIPOS DE TAREFAS SOBRE JUROS SIMPLES E COMPOSTOS QUE
SUSTENTAM AS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS DO ENSINO MÉDIO E
SUPERIOR ................................................................................................................
82
4.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................
82
4.2 AS FERRAMENTAS DE ANÁLISE UTILIZADAS NA CONSTRUÇÃO DA
GRADE ..............................................................................................................
82
4.3 AS TAREFAS USUAIS SOBRE AS NOÇÕES DE JUROS SIMPLES E
COMPOSTOS QUE ALIMENTAM AS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS TANTO
PARA O ENSINO MÉDIO COMO PARA O ENSINO SUPERIOR ....................
97
4.4 A GRADE DE ANÁLISE ....................................................................................
98
4.5 FUNCIONAMENTOS DA GRADE: EXEMPLOS:...............................................
99
4.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................................
106
AS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS EXISTENTES PARA INTRODUÇÃO E
DESENVOLVIMENTO DAS NOÇÕES DE JUROS SIMPLES E COMPOSTOS
NA TRANSIÇÃO ENSINO MÉDIO E ENSINO SUPERIOR ..................................... 108
5.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................
108
5.2 ANÁLISE DA OBRA DE DANTE ET AL. (2008) ................................................
112
5.2.1 Comentários e análise ..............................................................................
112
5.2.2
O “topos” do professor e do estudante ..................................................
118
5.3 ANÁLISE DA OBRA DE GIOVANNI & BONJORNO ET AL. (2005)..................
124
5.3.1 Comentários e análise ..............................................................................
123
5.3.2
O “topos” do professor e do estudante ..................................................
125
5.4 ANÁLISE DA OBRA DE XAVIER E BARRETO ET AL. (2005) ........................
127
5.4.1
5.5
O “topos” do professor e do estudante ..................................................
130
ANÁLISE DA OBRA DE SOBRINHO ET AL. (2000) ........................................
131
5.5.1
Comentários e análise ...........................................................................
131
5.5.2 O “topos” do professor e do estudante ....................................................
135
5.6 ANÁLISE DA OBRA DE PUCCINI ET AL. (2008) .............................................
138
5.6.1 Comentários e análise ..............................................................................
138
5.6.2
O “topos” do professor e do estudante ..................................................
143
5.7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................................
145
CONSIDERAÇÕES FINAIS E PERSPECTIVAS FUTURAS..........................................
148
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................
152
ANEXOS
ANEXO 1: DIRETRIZES CURRICULARES DO CURSO DE ADMINISTRAÇÃO DE
EMPRESAS ............................................................................................................... 157
ANEXO 2: PLANO DE AULAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
(UFAM) ...................................................................................................................... 159
ANEXO 3: PLANO DE AULAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO
SUL (UFRGS) ............................................................................................................ 160
ANEXO 3 (CONT.)............................................................................................................
161
ANEXO 4: PLANO DE AULAS DA FACULDADE DAS AMÉRICAS ................................
162
ANEXO 5: PLANO DE AULAS DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS DE SÃO PAULO
(FGV-SP) ................................................................................................................... 163
12
INTRODUÇÃO
Em nossa prática, trabalhando com o Ensino Superior observamos que, em
geral, alguns estudantes não se apropriam de certos conhecimentos desenvolvidos
no Ensino Médio, o que é necessário para o desenvolvimento adequado do
processo de ensino e aprendizagem. Quando consideramos, mais especificamente,
a Matemática Financeira e, em particular, as noções de juros simples e compostos,
temos a sensação que nada foi trabalhado sobre essas noções nas etapas
anteriores da escolaridade.
Nas propostas institucionais as noções de juros simples e compostos são
abordadas no Ensino Fundamental e revisitadas no Ensino Médio. Além disso, em
nosso país, considerando as taxas de juros, as correções mensais de contas a
pagar e impostos, os cheques especiais e as vendas a prazo, entre outros
exemplos, parece-nos importante para os estudantes que terminam o Ensino Médio
dispor das ferramentas matemáticas necessárias para efetuar esses cálculos e
assim exercerem adequadamente a cidadania.
Dessa forma, nesta pesquisa nosso objetivo é estudar as possíveis relações
institucionais trabalhadas no Ensino Médio, quando se consideram as noções de
juros simples e compostos, de modo a identificar os conhecimentos prévios que
podem ser pelo menos mobilizados pelos estudantes que iniciam o curso de
Administração no Ensino Superior.
Ou seja, o que se desenvolve no Ensino Médio sobre a noção de juros
simples e compostos pode servir de apoio para o desenvolvimento da disciplina de
Matemática Financeira nos cursos universitários de Administração de Empresa.
Iniciamos este estudo a partir do seguinte questionamento:
13
1. Quais os conhecimentos prévios sobre a noção de juros simples e compostos
são desenvolvidos no Ensino Médio?
2. Quais as articulações entre esses conhecimentos e os conhecimentos
matemáticos necessários para o controle e justificativa das técnicas
associadas às noções de juros simples e compostos?
3. Qual o papel esperado do professor no trabalho com essas noções?
4. Qual o papel esperado dos estudantes no trabalho com essas noções?
5. Quais as indicações das Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de
graduação em Administração para o ensino da noção de juros simples e
compostos para o curso de Administração?
6. Existe uma coerência entre o que é proposto para o Ensino Médio e Superior,
isto é, os conhecimentos prévios supostos disponíveis são trabalhados no
Ensino Médio conforme a expectativa do Ensino Superior?
O referencial teórico central escolhido para sustentar as análises propostas e
responder as questões acima são a Teoria Antropológica do Didático de Chevallard
(1992), Chevallard (1994) e Bosch e Chevallard (1999), que estuda, mais
especificamente, as relações institucionais que sobrevivem atualmente quando se
trabalha com as noções de juros e simples e compostos tanto no Ensino Médio
como no Ensino Superior.
Por outro lado, para melhor compreender as organizações matemáticas e
didáticas encontradas, recorremos ainda às noções de quadros e mudanças de
quadros segundo definição de Douady (1984, 1992) e níveis de conhecimento
esperados dos estudantes, conforme definição de Robert (1997).
Escolhido o referencial teórico, dividimos o trabalho de coleta dos dados em
três fases que correspondem à construção da ferramenta de análise dos livros
didáticos, o estudo das relações institucionais esperadas e existentes para o
trabalho com as noções de juros simples e compostos no Ensino Médio e na
14
sequência realizamos o mesmo estudo para o Ensino Superior, conforme descrição
das fases apresentadas abaixo.
Na primeira fase, construímos uma grade de análise, inspirada naquela
desenvolvida por Dias (1998) em sua tese, que estuda os problemas da articulação
de pontos de vista cartesiano e paramétrico no ensino de Álgebra Linear e que
serviu de ferramenta para a análise dos livros didáticos tanto de Ensino Médio como
do Ensino Superior.
Na segunda fase, analisamos as relações institucionais esperadas e
existentes, isto é, quais as organizações matemáticas e didáticas a que, em geral,
os estudantes se submetem quando se trabalha com as noções de juros simples e
compostos no Ensino Médio?
Esse conceito é articulado com outras noções
matemáticas desenvolvidas nesta mesma etapa da escolaridade.
Essas análises, quando se considera o Ensino Médio, foram desenvolvidas
por meio do estudo dos documentos oficiais, em que são apresentadas as
expectativas
institucionais
ou
relações
institucionais
esperadas
para
o
desenvolvimento das noções matemáticas a serem trabalhadas no Ensino Médio, e
de alguns livros didáticos indicados pelo Programa Nacional do Livro Didático do
Ensino Médio (PNLEM, 2009), e que, para efeito de análise, consideramos relações
institucionais existentes, isto é, as organizações matemáticas e didáticas a que, em
geral, os estudantes se submetem atualmente quando passam por essa etapa
escolar.
Na terceira fase, analisamos as relações institucionais esperadas e existentes
para o trabalho com a noção de juros simples e compostos nos cursos de
Administração no Ensino Superior.
Essas análises foram realizadas via planos de ensino de duas universidades
públicas e duas faculdades privadas para as relações institucionais esperadas e
livros didáticos indicados na bibliografia básica dos mesmos cursos para as relações
institucionais existentes, ou seja, o mesmo tipo de análise foi conduzido para
15
identificar algumas das organizações matemáticas e didáticas que sobrevivem
atualmente tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior.
Numa quarta fase realizamos a construção de uma grade de análise,
inspirada na grade de Dias (1998), para o exame das relações institucionais
existentes. Observamos que a grade de análise permite identificar as tarefas usuais
que sobrevivem atualmente no processo de ensino e aprendizagem e estudar as
práticas institucionais privilegiadas nesse processo.
Em uma quinta fase fizemos um estudo das relações institucionais existentes
por meio da grade de análise construída com esse objetivo, via livros didáticos
indicados acima, tanto para o Ensino Médio como para o Ensino Superior.
E em uma última fase elaboramos uma análise das similaridades e diferenças
entre os resultados encontrados nos itens 3 e 4, ou seja, nos estudos das relações
institucionais esperadas e existentes tanto para o Ensino Médio como para o Ensino
Superior.
Os resultados deste estudo são aqui apresentados da seguinte forma.
No capítulo 1 caracterizamos nosso trabalho apresentando o contexto da
pesquisa, sua problemática e a metodologia específica empregada para o seu
desenvolvimento.
No capítulo 2 apresentamos o referencial teórico da pesquisa explicitando as
noções que servem de ferramenta de análise quando da construção da grade de
análise.
O capítulo 3 utilizou a noção de “Topos” do estudante e do professor
introduzida por Chevallard (1997) para examinar os documentos oficiais que
correspondem às relações institucionais que se espera sejam trabalhadas por
professores e estudantes do Ensino Médio e do Ensino Superior.
Os documentos analisados são: os Parâmetros Curriculares Nacionais, a
Nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo quando se consideram o Ensino
16
Médio, as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação de
Administração, os planos de ensino de duas universidades públicas e duas
faculdades privadas para o Ensino Superior.
No capítulo 4, apresentamos a grade de análise construída para identificar os
tipos de tarefas e as respectivas técnicas que constituem a prática atual para o
desenvolvimento da noção de juros simples e compostos tanto no Ensino Médio
como no Ensino Superior.
No capítulo 5 apresentamos os resultados das análises sobre as diferentes
propostas de trabalho com a noção de juros simples e compostos tanto para o
Ensino Médio como para o Ensino Superior.
Essas análises se apoiam na grade apresentada no capítulo 4, e, além de
permitir qual o trabalho privilegiado quando se introduz a noção de juros simples e
compostos no Ensino Médio e Superior, possibilita a comparação entre as relações
institucionais esperadas e existentes para uma mesma etapa escolar e a
identificação dos conhecimentos prévios que podem ser considerados pelo menos
mobilizável para os estudantes que ingressam no Ensino Superior.
Nas considerações finais constatamos que existe uma preocupação
institucional em propor mudanças tanto para “topos” do professor como para o
“topos” dos estudantes, em que o primeiro deve desenvolver seu trabalho como
orientador de tarefas que permitam aos estudantes encontrar suas próprias
soluções, a partir de seus conhecimentos prévios e procurando novas situações que
lhes deem autonomia para controlar a aprendizagem, sendo essa uma competência
importante para sua atuação na sociedade e no mundo do trabalho.
Mas essa nova relação institucional não é simples de alcançar e conduz a
necessidade de pesquisas e propostas de cursos que auxiliem os professores a
desenvolver
diferentes
tipos
de
atividades,
em
particular,
as
situações
contextualizadas, como propõem os documentos oficiais para motivar esse trabalho.
17
Observamos aqui que, mesmo considerando importante esse tipo de trabalho
a ser desenvolvido pelo professor, os documentos oficiais pouco ajudam, pois não
trazem orientações mais específicas sobre como desenvolver esse trabalho.
Finalmente, ressaltamos que os livros didáticos podem auxiliar professores na
proposta de novas tarefas e na articulação de diferentes conhecimentos e os
estudantes na organização de seus estudos.
Ressaltamos a importância e interesse do caderno da Nova Proposta do
Estado de São Paulo por ter sido construído sob a óptica de apresentar exemplos de
situações contextualizadas, o qual pode ser de grande valia para os professores.
Entretanto, vale observar que neles os conhecimentos prévios esperados, como
disponíveis são os conceitos de função afim e progressão aritmética para solucionar
tarefas que envolvem juros simples e função exponencial e progressão geométrica,
para resolver tarefas que envolvem juros compostos.
Tais
conhecimentos
supostos
pelo
menos
mobilizáveis
devem
ser
identificados enquanto tal, pois podem dificultar o trabalho dos professores quando
isso não ocorrer, ou seja, os materiais didáticos analisados são ferramentas
importantes que precisam ser avaliadas e trabalhadas por professores e estudantes
em um mesmo compasso, para que as expectativas institucionais possam se
realizar.
18
Capítulo 1
PROBLEMÁTICA, OBJETIVO
E METODOLOGIA DA PESQUISA
1.1 CONTEXTO DA PESQUISA
Após me formar em Administração de Empresas com ênfase em Análises de
Sistemas, trabalhei em um Banco Comercial atuando como Analista de Suporte a
Sistemas Financeiros, e nessa profissão senti que as necessidades da Matemática
eram grandes, mas o conhecimento desenvolvido na escola pouco me auxiliavam no
desenvolvimento de minhas tarefas profissionais. Em função das necessidades do
Banco, fui convidado a envolver-me em Sistemas Financeiros e Sistemas
Informatizados. Para melhorar meu desempenho fiz uma Especialização Pedagógica
com ênfase em Matemática.
A partir de 1992, iniciei minha carreira como professor em uma Escola
Técnica, na qual ministrava aulas de Matemática e Administração Comercial. Nesse
contexto, algumas inquietações foram surgindo em minha prática.
Esse novo tipo de trabalho me levou ao curso de especialização em
Psicopedagogia, pois procurava entender as razões das dificuldades dos estudantes
e como poderia amenizá-las. Nessa época, tive a oportunidade de ingressar na
Docência do Ensino Superior, tendo a tarefa de trabalhar com Matemática
Financeira no Curso de Administração.
Reflexo da crise que as Instituições Financeiras enfrentavam naquela época,
acabei por ficar somente na carreira docente.
Em 2008, iniciei o mestrado em Educação Matemática, e, em função do meu
trabalho no curso de Administração com a disciplina de Matemática Financeira,
propus um projeto que pudesse me auxiliar a compreender as dificuldades
encontradas pelos estudantes do curso de Administração em relação às noções de
juros simples e compostos.
19
Como não trabalho essa disciplina no Ensino Médio, consideramos
interessante a possibilidade de inserir essa proposta no projeto Capes – Cofecub
que vem sendo desenvolvido por professores da Uniban, mais especificamente as
questões da transição entre o Ensino Médio e o Ensino Superior.
Nesse projeto, as questões associadas à transição entre o Ensino Médio e
Superior referem-se preferencialmente à Matemática que se trabalha nos primeiros
anos dos cursos de Bacharelado e Licenciatura em Matemática, o que difere em
relação ao trabalho a ser desenvolvido com os estudantes dos cursos de
Administração de Empresas, em que a Matemática funciona como ferramenta
explícita para desenvolver e explicar questões financeiras.
Outros estudos vêm sendo realizados por pesquisadores internacionais,
destacamos os trabalhos franceses de Artigue (2004) e Gueudet (2008), que são
pesquisadores com os quais estamos desenvolvemos o projeto de transição.
Em seu artigo de 2004, Artigue afirma que para as carreiras científicas
existem muitos desafios que indicam a necessidade da atenção dos pesquisadores
de Educação Matemática: massificação do ensino, defasagem em relação às
mudanças que se efetuaram no secundário e que não ocorre no universitário e a
evolução das novas tecnologias que afetam tanto as práticas matemáticas como a
ação didática.
Observamos aqui que, mesmo não se tratando de uma carreira científica, o
curso de Administração de Empresas enfrenta esse mesmo problema, e a questão
da inserção das novas tecnologias é uma das necessidades dos estudantes, uma
vez que no mercado profissional elas são dominantes, em particular, as calculadoras
financeiras e as planilhas tipo Excel.
Além disso, em Artigue (2004) notamos que a autora, ao estudar os trabalhos
sobre a aprendizagem de Matemática no nível universitário, mostra a evolução dos
mesmos e considera que eles colocam em evidência as questões sobre a
articulação de conhecimentos e representações, da flexibilidade na aprendizagem,
20
da crescente consideração das abordagens antropológicas e socioculturais e do
desenvolvimento de pesquisas sobre novos domínios ou setores de formação.
Essas novas questões são importantes para a nossa pesquisa, pois nela
tentamos compreender quais as propostas institucionais desenvolvidas no Ensino
Médio e Superior para diferentes tipos de instituições e verificar como esse trabalho
pode auxiliar professores e estudantes dessas duas etapas escolares a melhor
compreender e utilizar seus conhecimentos sobre as noções de juros simples e
compostos.
Observamos ainda que Gueudet (2008) considera que é possível analisar as
questões ligadas à transição entre o Ensino Médio e Superior de diferentes formas,
a saber: sobre os modos de pensar, sobre as organizações de conhecimentos,
sobre as linguagens de modos de comunicação e sobre as instituições.
No nosso trabalho nos centramos particularmente no estudo dos modos de
comunicação e nas matemáticas praticadas nas instituições. Ou seja, tratamos a
questão da comunicação observando as diferenças entre os sinais e os discursos
utilizados no Ensino Médio e o que se espera no Ensino Superior, e como as novas
regras de comunicação impõem um trabalho que ultrapassa a simples determinação
do resultado, mas é preciso discuti-lo e justificar seu impacto. No que se refere às
práticas das instituições, escolhemos o estudo das propostas institucionais via
documentos oficiais e livros didáticos para o Ensino Médio e Superior.
Acreditamos que o estudo comparado das propostas institucionais para o
Ensino Médio e Superior, que corresponde às relações institucionais esperadas, e a
análise dos livros didáticos indicados para essas duas etapas escolares podem
auxiliar a compreender tanto as novas regras de comunicação como as diferenças
que se impõem quando da transição entre o Ensino Médio e Superior, ou seja,
escolhemos a Teoria Antropológica do Didático como central para a realização
desse trabalho. Observamos ainda que ao iniciar nosso trabalho, fizemos uma
pesquisa das dissertações e teses dos últimos dez anos e encontramos apenas o
trabalho de Nascimento (2004), cujo objetivo é identificar o que sabem os
21
estudantes e o que pensam os professores do Ensino Médio a respeito da
Matemática Financeira nessa etapa da escolaridade.
Isso mostra que existem poucos estudos sobre as questões associadas à
Matemática Financeira, em particular, quando se considera a transição entre o
Ensino Médio e Superior e mais especificamente para um domínio diferente da
Matemática, ou seja, o curso de Administração de Empresas, no qual a Matemática
serve de ferramenta explícita para o cálculo dos resultados associados ao mercado
financeiro.
Apresentado o contexto da pesquisa, passamos à descrição da problemática.
1.2 PROBLEMÁTICA DA PESQUISA
Nesta pesquisa procura-se identificar, por meio do estudo documental das
relações institucionais esperadas e existentes, como estão sendo trabalhadas as
noções de juros simples e compostos na transição entre o Ensino Médio e Superior.
Observamos que este estudo pode auxiliar na proposição de novas formas de
comunicação e linguagem, assim como de novos tipos de tarefas e técnicas, que
poderão auxiliar professores e estudantes, tanto do Ensino Médio como do Ensino
Superior, a melhor desenvolver seu papel ao trabalharem com a noção de juros
simples e compostos. Ressaltamos que é importante para os estudantes dos cursos
de Administração de Empresas que eles tenham um discurso coerente que explique
e justifique os resultados encontrados.
Portanto, é preciso que os estudantes de Administração de Empresas, ao
terminarem o curso universitário, sejam capazes de utilizar seus conhecimentos
sobre as questões de Matemática Financeira em que as noções de juros simples e
compostos, em particular de juros compostos, serão objetos de reflexão diária para a
tomada de decisões.
Ressaltamos ainda que, embora em proporção menor, o mesmo ocorre com
os estudantes do Ensino Médio, que precisam da noção de juros compostos para ao
22
menos exercerem a cidadania, uma vez que o cotidiano exige o domínio desse
conhecimento para a tomada de decisão, pelo menos, para seus gastos pessoais.
Dessa forma, consideramos que é importante o trabalho com as diferentes
ferramentas matemáticas que possibilitam compreender as noções de juros simples
e compostos no Ensino Médio, e que é preciso saber que conhecimentos sobre
essas noções foram desenvolvidos nessa etapa escolar e, ainda, se os mesmos
podem servir de apoio para o estudo de Matemática Financeira no Ensino Superior,
isto é se desejamos trabalhar de forma articulada precisamos identificar as
ferramentas que temos a nossa disposição.
Para isso, partimos da questão enunciada abaixo, que possibilitou uma
primeira
reflexão
e
o
questionamento
mais
específico
em
função
do
desenvolvimento da pesquisa.
O estudo das práticas institucionais esperadas e existentes para o trabalho com a
noção de juros simples e compostos na transição entre o Ensino Médio e Superior
permite identificar uma tendência que permita dar significado à sua aprendizagem?
Entendam-se aqui por práticas institucionais esperadas e existentes as
propostas institucionais em relação aos diferentes tipos de tarefas e técnicas que
são consideradas como conhecimentos a serem desenvolvidos nas instituições tanto
de Ensino Médio como de Ensino Superior visando à aprendizagem e aplicação das
noções de juros simples e compostos.
A partir desse questionamento consideramos que o trabalho desenvolvido no
Ensino Médio pode servir de apoio para a introdução da Matemática Financeira nos
cursos de Administração de Empresas e que em função disso no Ensino Superior é
preciso mostrar a relação entre o que foi desenvolvido no Ensino Médio, o que pode
ser utilizado da mesma forma e os novos modos de funcionamento em que se
consideram os novos modos de pensar, as novas linguagens, as novas formas de
comunicação e as novas expectativas institucionais que estão associadas às novas
práticas com a introdução das novas tecnologias.
23
Dessa
forma,
nesta
pesquisa
procuramos
compreender
como
os
conhecimentos associados às noções de juros simples e compostos desenvolvidos
no Ensino Médio podem ser considerados pelo menos como mobilizáveis quando se
fazem necessários na disciplina de Matemática Financeira para os cursos de
Administração de Empresas no Ensino Superior.
Delineada a problemática da pesquisa, descrevemos abaixo o objetivo da
mesma.
1.3 OBJETIVOS DA PESQUISA
O objetivo desta pesquisa é identificar por meio da análise documental as
expectativas institucionais para o trabalho com as noções de juros simples e
compostos na transição entre o Ensino Médio e Superior quando se considera a
disciplina de Matemática Financeira para os cursos de Administração de Empresas.
Em função desse objetivo, os objetivos específicos são:
1. A identificação das relações institucionais esperadas do ponto de vista das
organizações matemáticas, didáticas e pedagógicas propostas tanto para o Ensino
Médio como para o Ensino Superior.
2. A identificação das relações institucionais existentes, ou seja, das propostas de
trabalho com as noções de juros simples e compostos que sobrevivem atualmente,
tanto para o Ensino Médio como para o Ensino Superior.
3. Verificar se existe coerência entre as relações institucionais esperadas e existentes e
qual a possibilidade do trabalho a ser efetuado na disciplina de Matemática
Financeira dos cursos de Administração de Empresas do Ensino Superior se apoiar
nos conhecimentos que se supõem tenham sido trabalhados e fazem parte da
estrutura cognitiva dos estudantes que ingressam no Ensino Superior.
Apresentados os objetivos da pesquisa passamos à metodologia utilizada para executá-la.
24
1.4 METODOLOGIA DA PESQUISA
Escolhemos o método da pesquisa documental para desenvolver esta
pesquisa, uma vez que nosso objetivo é identificar as expectativas institucionais
para o trabalho com as noções de juros simples e compostos, tanto no Ensino Médio
como no Ensino Superior, e verificar a possibilidade de utilizar os conhecimentos
desenvolvidos no Ensino Médio pelo menos como conhecimentos prévios
mobilizáveis quando da introdução da disciplina de Matemática Financeira nos
cursos de Administração de Empresas no Ensino Superior.
Para isso, utilizamos os documentos oficiais para o Ensino Médio:
Diretrizes Curriculares para o Ensino Médio (1998), Parâmetros Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio (2000, 2002) e Nova Proposta Curricular do Estado
de São Paulo (2008).
Para o Ensino Superior pesquisamos as Diretrizes Curriculares Nacionais
para os Cursos de Administração de Empresas (Resolução n.º 04, de 13.07.2005) e
planos de ensino de quatro universidades, sendo dois de universidades federais:
Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS).
Analisamos também o plano de ensino da Fundação Getúlio Vargas (FGVSP) – Escola de Administração de Empresas de São Paulo e Faculdade das
Américas. Esses documentos permitem a análise das relações institucionais
esperadas. As relações institucionais existentes foram analisadas por meio de livros
didáticos indicados no Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio
(PNLEM – 2009), e as obras escolhidas para análise foram: Matemática, volume
único, de Luiz Roberto Dante (2008) avaliado e novamente aprovado pelo Programa
Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio (PNLEM, 2009), que, segundo os
avaliadores, traz uma abordagem inovadora dos conteúdos a serem trabalhados no
Ensino Médio.
25
Com o mesmo critério escolhemos a segunda obra, Matemática aula por aula,
de Claudio Xavier da Silva e Benigno Barreto Filho, et al. (2005), terceiro ano,
também reavaliada e aprovada pelo PNLEM (2009) e que trata explicitamente o
desenvolvimento histórico da matemática financeira.
Ainda em relação ao Ensino Médio, selecionamos a obra Matemática
completa, de José Ruy Giovanni e José Roberto Bonjorno, et al. (2005), primeiro
ano, que também compõe a lista dos livros analisados e aprovados pelo PNLEM
(2009) e que propõe exemplos de situações contextualizadas.
Para a análise no Ensino Superior, as obras selecionadas referem-se às
sugeridas nos Planos de Ensino, aos quais tivemos acesso.
A primeira obra escolhida é Matemática financeira, de José Dutra Vieira
Sobrinho, et al. (2000), em que percebemos que na abordagem proposta existe
pouca preocupação de justificar as técnicas desenvolvidas por meio de tecnologias
que mostram a possibilidade para o cálculo das diferentes aplicações financeiras,
em particular, quando se trabalha com a noção de juros compostos. A segunda obra,
Matemática financeira, de Abelardo de Lima Puccini, et al. (2008).
O estudo foi desenvolvido em seis fases:
1. Estudo dos trabalhos de pesquisa existentes, no contexto brasileiro, francês e
outros, sobre a problemática em questão, ou seja, a transição entre o Ensino
Médio e Superior, em particular, quando se considera o domínio da
Matemática Financeira e mais especificamente às noções de juros simples e
compostos.
2. Escolha e estudo do referencial teórico adotado como ferramenta de análise
para a pesquisa.
3. Estudo das relações institucionais esperadas para a introdução das noções
de juros simples e compostos, por meio da ferramenta didática “topos” do
professor e do estudante, via documentos oficiais tanto para o Ensino Médio
como para o Ensino Superior.
26
4. Construção de uma grade de análise, inspirada na grade de Dias (1998), par
análise das relações institucionais existentes. Observamos que a grade de
análise permite identificar as tarefas usuais que sobrevivem atualmente no
processo de ensino e aprendizagem e estudar as práticas institucionais
privilegiadas nesse processo.
5. Estudo das relações institucionais existentes por meio da grade de análise
construída com esse objetivo via livros didáticos indicados acima, tanto para o
Ensino Médio como para o Ensino Superior.
6. Análise das similaridades e diferenças entre os resultados encontrados nos
itens 3 e 4, ou seja, nos estudos das relações institucionais esperadas e
existentes tanto para o Ensino Médio como para o Ensino Superior.
Apresentados o contexto, a problemática, o objetivo e a metodologia da
pesquisa, relatamos no próximo capítulo o referencial teórico que sustenta as
análises propostas.
27
Capítulo 2
ABORDAGEM ANTROPOLÓGICA NA ANÁLISE DAS RELAÇÕES
INSTITUCIONAIS PARA O ENSINO DA NOÇÃO DE JUROS
NA TRANSIÇÃO ENSINO MÉDIO E ENSINO SUPERIOR
2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Sendo o objetivo deste trabalho estudar as possíveis relações institucionais
tratadas no Ensino Médio, quando se reputam as noções de juros simples e
compostos, de forma a identificar os conhecimentos prévios que podem ser pelo
menos mobilizados pelos estudantes do curso de Administração que iniciam o
Ensino Superior, escolhemos como referencial teórico central a Teoria Antropológica
do Didático de Chevallard (1992, 1994, 1996) e Bosch e Chevallard (1999). Essa
teoria permite identificar as diferentes organizações para a introdução e o
desenvolvimento de um conceito matemático, no nosso caso, a noção de juros
simples e compostos quando se considera a transição entre o Ensino Médio e
Superior, em particular, quando se trabalha com essa noção nos cursos de
Administração.
Partimos assim da identificação das relações institucionais, e, como já
anunciado na introdução, distinguimos as relações institucionais esperadas, que
aqui são analisadas via documentos oficiais, em que observamos as diferentes
abordagens propostas para o trabalho com a noção de juros simples e compostos,
tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior, e as relações institucionais
existentes, para as quais utilizamos os livros didáticos indicados pelo Programa
Nacional do Livro para o Ensino Médio PNLEM (2009), caderno do aluno e do
professor (2008), quando se considera mais especificamente a Nova Proposta
Curricular do Estado de São Paulo, 1 livros didáticos indicados na bibliografia
básica para os cursos de Administração dos planos de ensino de duas universidades
federais (Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Instituto de Matemática –
1
Nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo: um conjunto de documentos dirigidos aos
professores da Rede Pública do Estado de São Paulo.
28
Departamento de Matemática Pura e Aplicada) e Universidade Federal do
Amazonas – Departamento de Administração) e duas Faculdades Privadas de São
Paulo (Faculdade das Américas – Curso Administração de Empresas) e Fundação
Getulio Vargas. (IMQ – Departamento de Informática e de Métodos Quantitativos
aplicados
à
Administração
–
FGV-EAESP).
As
universidades
escolhidas
correspondem àquelas em que tivemos acesso aos planos de ensino.
Como já anunciamos acima, essas análises estão fundamentadas na Teoria
Antropológica do Didático (TAD), de Chevallard (1992, 1994, 1996) e de Bosch e
Chevallard (1999). Portanto, na sequência apresentamos uma breve discussão
sobre a Teoria Antropológica do Didático e sua evolução.
Chevallard (1992) posiciona o ensino no campo da antropologia do
conhecimento ou antropologia do ensino da matemática, que corresponde ao
subcampo antropologia da matemática, ou seja, o estudo do homem em confronto
com a matemática. Esse posicionamento conduz a uma expansão do quadro
escolar, uma vez que a didática está densa em toda a matemática ou ainda toda
atividade matemática supõe uma atividade de estudo. Isso conduz a conceber a
didática da matemática como a ciência do estudo e da ajuda ao estudo das questões
de matemática. Para isso, Chevallard (1992) parte do princípio de “que tudo é
objeto”, distinguindo dois tipos de objeto específicos: as instituições (I), as pessoas
(X) e suas posições nas instituições. Dessa forma, ele considera que as pessoas
contribuem para a existência das instituições, e o conhecimento e o saber podem
ser vistos como uma forma de organização. Isso lhe permite conceber a noção de
relação entre o que ele chama de elementos primitivos da Teoria Antropológica do
Didático: instituição (I), objeto do saber (O) e as pessoas (X), conforme CHEVALLARD,
1992, p. 86-87, apud COSTA, 2008, p. 8.
No caso particular do nosso estudo, as pessoas são os professores e os
estudantes que compõem as instituições de Ensino Médio e Superior, em particular
aqueles que contribuem para a existência dessas instituições e que participam do
processo de transição entre elas. O objeto do saber é a noção de juros simples e
compostos, e procuramos identificar qual a relação das pessoas e instituições com
esse objeto do saber.
29
Lembramos que Chevallard (1992) considera a relação entre o objeto do
saber (O) e os outros elementos de sua teoria, isto é, instituição (I) e as pessoas (X).
Isso lhe permite introduzir as instituições, os objetos do saber e as pessoas como
elementos primitivos que compõem a Teoria Antropológica do Didático (TAD), e a
partir deles considerar a questão das relações existentes entre esses elementos por
meio de uma forma que ele mesmo considera como quase axiomática.
Sem ser exaustivo, na sequência fazemos uma breve descrição dos principais
elementos da teoria antropológica do didático que servem de ferramenta para a
nossa pesquisa e que dessa forma são considerados como parte do que
denominamos referencial teórico central.
2.2 REFERENCIAL TEÓRICO CENTRAL
No desenvolvimento deste estudo, utilizamos como fonte para o nosso
referencial teórico central o trabalho desenvolvido por Bosch e Chevallard (1999)
sob o título A sensibilidade das atividades matemáticas aos ostensivos – objeto de
estudo e problemática, que trata das atividades matemáticas, de sua composição
enquanto materiais manipuláveis usados nas atividades matemáticas e em termos
de conceitos, ideias e representações.
Iniciamos com as noções de tarefas, técnicas, tecnologias e teorias que nos
permitem identificar as diferentes organizações do saber, denominadas por Bosch e
Chevallard (1999) de organizações praxeológicas, ou seja, as organizações que
permitem modelar as práticas sociais, seus componentes, sua evolução e seu
produto. Segundo os autores, a palavra praxeologia salienta a estrutura da
organização tarefa (T), técnica (  ), tecnologia (  ) e teoria (  ). Essa palavra
composta da palavra grega práxis, que significa “prática” e que envia ao bloco
prático técnico [tarefa (T), técnica (  )], e da palavra grega logos, que significa
“discurso fundamentado” e que envia ao bloco tecnológico-teórico [tecnologia (  ) e
teoria (  )]. Os autores consideram ainda que o bloco [tarefa (T), técnica (  )] está
associado ao saber-fazer e o bloco [tecnologia (  ) e teoria (  )], ao saber.
30
Sendo assim, essas organizações auxiliam a compreender as diferentes
propostas para o ensino e aprendizagem de uma determinada noção matemática, no
nosso caso a noção de juros simples e compostos, isto é, qual o papel do saberfazer e nas práticas sociais existentes.
Para justificar nossas escolhas e melhor compreender a proposta de Bosch e
Chevallard (1999), apresentamos a seguir um breve histórico sobre a evolução da
didática da matemática e da teoria antropológica do didático, segundo esses
autores.
Eles utilizam duas definições de “didática da matemática” apresentada por
Brousseau em dois momentos diferentes para mostrar que a didática evolui do
estudo das atividades de ensino, conforme Brousseau (1984), para o estudo das
condições de difusão dos saberes matemáticos úteis para as sociedades e para as
instituições da humanidade, segundo Brousseau (1994, 1995), isto é, o objeto de
estudo da didática da matemática se estende para além das práticas matemáticas
escolares, o que justifica seu estudo em termos de organizações praxeológicas,
segundo BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 79, apud COSTA, 2008, p. 8.
Esse avanço da didática da matemática permite que busquemos diferentes
contextos elementos que auxiliem a composição de organizações praxeológicas que
levem em conta as necessidades do indivíduo para seu desenvolvimento pessoal e
profissional, uma vez que a didática da matemática ultrapassa o estudo restrito ao
quadro escolar, passando a considerar toda atividade matemática que supõe uma
atividade de estudo.
Dessa forma, o estudo dos diferentes tipos de tarefas relacionadas à noção
de juros simples e compostos e as necessidades matemáticas para o seu
desenvolvimento podem auxiliar na identificação das práticas existentes úteis para a
humanidade e até mesmo na construção de novas práticas que cumpram essa nova
função da didática da matemática.
Para exemplificar como a didática da matemática passa a considerar como
objeto de estudo toda atividade matemática, Bosch e Chevallard (1999) se refere à
31
noção de situação fundamental, introduzida por Brousseau (1994), cuja função é
caracterizar os conhecimentos matemáticos, isto é, um conhecimento é descrito por
meio de uma situação, conforme BOSCH
E
CHEVALLARD, 1999, p. 80-81, apud COSTA,
2008, p. 9.
Após ressaltarem que o conhecimento matemático pode ser descrito por meio
de uma situação, ainda referindo-se à teoria das situações de Brousseau (1994),
Bosch e Chevallard (1999) observam que a teoria das situações fornece uma nova
ruptura epistemológica, pois, segundo essa teoria, podemos aprender os
conhecimentos matemáticos por meio de atividades e problemas que esses
conhecimentos permitem realizar e resolver, conforme BOSCH
E
CHEVALLARD, 1999,
p. 81-82, apud COSTA, 2008, p. 10.
Isso conduz Bosch e Chevallard (1999) a considerar que as matemáticas
como uma atividade estruturada, que no caso da teoria das situações pode ser
desenvolvida em diferentes fases, que se realizam em situações e contra um meio.
Após mostrar que a teoria das situações já considera que se podem aprender os
conhecimentos matemáticos por meio de atividades e problemas que eles permitem
resolver, Bosch e Chevallard (1999) atentam para o fato de que é a noção de
transposição didática que possibilita o desenvolvimento da dupla ruptura
epistemológica provocada pela teoria das situações, isto é, a primeira ruptura que
consiste em reputar a matemática como a essência dos fenômenos didáticos e a
segunda que consiste em elaborar uma ciência do estudo desses fenômenos, o que
implica explicitar os modelos utilizados e submetê-los à prova, sujeitando-os às leis
da epistemologia experimental, que possibilita tratar a questão da especificidade
matemática da didática.
Segundo os autores, a transposição didática mostra que o saber matemático
é a origem de toda a problemática didática, podendo ser questionado. Isso os
conduz a considerar que as pesquisas em didática da matemática estão
condicionadas ao tipo de modelagem da matemática que utilizamos.
O texto abaixo deixa evidentes as afirmações acima, permitindo uma melhor
compreensão das relações entre a teoria das situações didáticas de Brousseau e a
32
noção de transposição didática de Chevallard, ou seja, como essas duas teorias se
complementam.
Nesse sentido, a noção de transposição didática deve ser
interpretada como a possibilidade de desenvolver a dupla ruptura
epistemológica provocada pela teoria das situações. Porque sua
principal contribuição não é somente colocar em evidência a
distância que separa o saber sábio do saber ensinado, e, portanto as
transformações necessárias a que deve ser submetido todo objeto
matemático para poder ser ensinado. O que mostra a noção de
transposição didática é que o saber matemático (seja “sábio”,
“ensinado” ou “a ensinar”) é a origem de toda problemática didática.
Segue, então, que esse saber não pode ser tomado como um dado
inquestionável e que as pesquisas em didática das matemáticas são
condicionadas pelo tipo de modelagens da matemática a que
recorremos [...] (BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 82, apud COSTA,
2008, p. 12).
A importância do questionamento do saber matemático e a possibilidade de
aprender os conhecimentos matemáticos por meio de situações e problemas nos
conduziram ao estudo das relações institucionais esperadas e existentes no
processo de ensino e aprendizagem da noção de juros simples e compostos, pois
esse estudo nos permite identificar os diferentes tipos de tarefas propostas pela
comunidade educativa, as técnicas disponíveis, a possibilidade de criar e difundir
novas técnicas e as tecnologias e teorias que justificam e explicitam essas técnicas
e os tipos de tarefas a elas associados.
Para isso nos referimos, mais especificamente, ao trabalho de Chevallard
(1992), que por meio de uma exposição quase axiomática introduz os primeiros
elementos da Teoria Antropológica do Didático, ou seja, as noções de instituição (I),
objeto do saber (O) e pessoas (X) e suas posições nas instituições para considerar a
noção de relação institucional e relação pessoal com o objeto do saber.
Bosch e Chevallard (1999) consideram o saber matemático como uma forma
particular de conhecimento que possibilita algumas práticas institucionais que
necessitam de um método para a sua análise. Para eles, esse método deve permitir
a descrição das diferentes práticas e o estudo das condições para que elas possam
se realizar.
33
O texto abaixo coloca em evidência o que leva Bosch e Chevallard a
introduzir as noções de tipos de tarefas, técnicas, tecnologias e teorias como
elementos de um método de análise das práticas sociais das matemáticas. Esses
elementos constituem as organizações praxeológicas já definidas acima:
O saber matemático, enquanto forma particular de conhecimento é,
portanto, fruto da ação humana institucional: é qualquer coisa que se
produz se utiliza se ensina ou, mais genericamente, se transpõe nas
instituições. Mas, a matemática, é, ainda, um termo primitivo,
substância de algumas práticas institucionais – as práticas sociais
das matemáticas. O que falta é a elaboração de um método de
análise das práticas institucionais que permitem a descrição e o
estudo das condições de realização (BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p.
83, apud COSTA, 2008, p. 13).
Bosch e Chevallard (1999) associam os primeiros termos da teoria
antropológica à noção de organização praxeológica justificando que são essas
noções que permitem modelar as atividades matemáticas, pois toda prática
institucional pode ser analisada por meio de um sistema de tarefas que se dividem
no fluxo da prática, conforme BOSCH
E
CHEVALLARD, 1999, p. 84, apud COSTA, 2008,
p. 14. No nosso caso, analisamos o sistema de tarefas que constituem a introdução
e o desenvolvimento da noção de juros simples e compostos na transição entre o
Ensino Médio e Superior, observando quais os conhecimentos matemáticos que
sustentam o desenvolvimento das técnicas utilizadas.
Dando continuidade à explicitação desse novo método de análise das práticas
institucionais existentes para a modelagem das atividades matemáticas, Bosch e
Chevallard (1999) observam que a delimitação das tarefas depende do ponto de
vista adotado para essas análises.
No nosso caso, utilizamos documentos oficiais, livros didáticos e planos de
ensino de algumas instituições de Ensino Superior, pois nosso objetivo é identificar
os conhecimentos prévios desenvolvidos no Ensino Médio que podem ser pelo
menos mobilizados pelos estudantes do Ensino Superior. A delimitação das
diferentes tarefas em uma determinada prática institucional, na sequência explicitam
o que eles consideram como a noção de tarefa e que para eles a existência de uma
34
tarefa está associada à operacionalização de uma técnica, isso os conduz a
considerar diversos exemplos como podemos observar no texto abaixo.
Tudo, portanto, não é tarefa, existe em toda instituição atividade não
analisada tipo de tarefa, e cuja menção por meio de verbos de ação
de acepção mais ampla (por exemplo, “calcular”, “demonstrar”, etc.)
deixa o conteúdo mal definido – falamos então de gênero de tarefa.
A noção de tarefa vai se tornar restrita, com efeito, pelo segundo
postulado, que supõe que o cumprimento de toda tarefa resulta da
operacionalização de uma técnica. Aqui, ainda, pode-se entender o
termo técnica no sentido amplo, como uma “maneira particular de
fazer”, e não segundo a acepção comum de procedimento
estruturado e metódico, mesmo algorítmico – que é um caso
particular da técnica. Existe, com efeito, técnicas para resolver
equações do segundo e do terceiro grau, mas também para fazer
demonstrações por recorrência, para abrir portas, para se procurar
uma informação por telefone (ou na Internet), para ler um jornal, para
escrever um artigo de pesquisa, para rever sua lição, para fazer
ficarem quietos os alunos no início das aulas, etc. Colocamos assim
em execução, cotidianamente, um grande número de técnicas, com
maior ou menor frequência. Pois toda técnica tem uma extensão
limitada, uma vez que ela nos permite agir em certos casos e não em
outros (tal equação não pode ser fatorada, a maçaneta desta porta é
ao contrário, hoje os alunos estão muito falantes, etc.) (BOSCH E
CHEVALLARD, 1999, p. 84, apud COSTA, 2008, p. 16).
Bosch
e
Chevallard
(1999)
ressaltam
ainda
que
existem
formas
institucionalizadas para cumprir determinadas tarefas, o que tende à identificação do
tipo de tarefa à técnica normalmente utilizada. Após considerar que a vida
institucional é constituída de um amplo conjunto de tarefas para as quais existem
técnicas institucionalizadas, Bosch e Chevallard (1999) mostram como esses novos
conceitos se articulam com as noções primitivas da teoria antropológica,
esclarecendo o que eles entendem por relação institucional a um objeto do saber e
como essa relação faz emergir a relação pessoal de cada indivíduo com o objeto do
saber.
Isso conduz a considerar que a relação pessoal a um objeto do saber está
associada à instituição em que o sujeito se encontra num determinado momento ou
às instituições a que ele se submete durante sua vida, isto é, podem ocorrer distintas
relações desse mesmo sujeito com um mesmo objeto. Aqui observamos também a
importância desse tipo de análise quando se considera a transição Ensino Médio e
Superior, momento em que os indivíduos já dispõem de determinadas relações
35
pessoais associadas ao objeto do nosso estudo, ou seja, a noção de juros simples e
compostos.
Além de colocar em evidência a possibilidade de existência de diversas
relações institucionais e pessoais para um mesmo objeto do saber, Bosch e
Chevallard (1999) consideram ainda o fato de existirem tarefas e técnicas que se
tornam rotineiras, não provocando qualquer dificuldade em fazer uso delas, mas que
podem também existir tarefas problemáticas em que as técnicas desenvolvidas e
que já são rotineiras não são suficientes para resolvê-las. Isso conduz à geração de
uma nova técnica ou à adaptação de uma determinada técnica, o que caracteriza
certa evolução diante de uma necessidade nova.
Nesse momento, Bosch e Chevallard (1999) alertam que é comum o
abandono de uma tarefa problemática quando esta é desafiadora e as técnicas
existentes não permitem resolvê-las. Essa dificuldade está associada à necessidade
de produzir uma nova técnica, como se pode observar no texto abaixo, em que os
autores consideram alguns exemplos para justificar a necessidade de um estudo
que permita produzir novas técnicas.
[...] Partimos assim de um tipo de tarefas problemáticas – por
exemplo, ”Como resolver uma equação do segundo grau?”, “Como
medir o tempo?”, ”Como contar o número de pessoas em uma
multidão?”, “Como introduzir a noção de número decimal?”. Se isto
ocorrer, chegamos, após um processo de estudo mais ou menos
longo, a produzir as técnicas que permitem fornecer as respostas às
questões inicialmente colocadas. Um novo “saber-fazer” é
construído, que devemos ainda organizar para lhe assegurar um
funcionamento regular nas instituições (BOSCH E CHEVALLARD, 1999,
p. 85, apud COSTA, 2008, p. 17).
Após esclarecer o que eles consideram como tipos de tarefas e as técnicas
que lhes podem ser associadas, Bosch e Chevallard (1999) apresentam o terceiro
postulado antropológico que concerne à ecologia das tarefas e técnicas, isto é, às
condições que possibilitam o uso nas instituições das novas técnicas produzidas
para resolver as tarefas problemáticas. Isto os conduz a reputar a necessidade de
um discurso descritivo e justificativo, denominado por eles de discurso tecnológico
ou tecnologia da técnica.
36
Essas tecnologias também necessitam de uma justificativa, o que conduz
Bosch e Chevallard (1999) a considerar como teoria da técnica o discurso que
justificar tecnologia da mesma técnica. Os autores observam ainda que essa
distinção tem caráter funcional e está associada ao tipo de tarefa a que nos
referimos. Para melhor explicitar o que eles denominam técnica, tecnologia e teoria,
Bosch e Chevallard (1999) consideram o exemplo abaixo.
Assim, a determinação do sinal do discriminante de uma equação do
segundo grau pode ser um elemento de uma técnica de resolução
deste tipo de equações, mas pode também ser considerado como
um ingrediente tecnológico visando explicar e justificar um tipo de
técnica mais elementar fundamentada na escrita e fatoração de uma
diferença de dois quadrados. Inversamente, o que, num dado
momento ou numa dada instituição, aparece como a justificação de
certa técnica, pode também ser considerado, em outro momento,
como uma tarefa (a tarefa consistindo em justificar uma técnica), que
supõe execução de uma técnica particular e a elaboração de um
ambiente tecnológico-teórico conveniente (BOSCH E CHEVALLARD,
1999, p. 86, apud COSTA, 2008, p.18).
Dessa forma, Bosch e Chevallard (1999) demonstraram como a abordagem
antropológica pode modelar o saber matemático em termos de objetos e suas
relações por meio da identificação dos diferentes tipos de tarefas, das técnicas que
lhes são associadas, das tecnologias e das teorias que as justificam.
Na sequência, Bosch e Chevallard (1999) salientam que a distinção entre
tipos de tarefas, técnicas, tecnologias e teorias cria uma diferenciação na
organização do conhecimento matemático, mas não determina a natureza deste.
Para isso, Bosch e Chevallard (1999) partem do seguinte questionamento:
Quais os ingredientes que compõem uma técnica, uma tecnologia, uma teoria?
Como podemos descrever a utilização de uma técnica? Segundo que critérios
podemos constatar essa utilização em uma situação particular? Como distinguir uma
técnica da outra? Existiriam invariantes transinstitucionais?
Para Bosch e Chevallard (1999) esse questionamento, apresentado por seu
aspecto teórico, mas que não esconde sua versão metodológica coincide com a
problemática que a didática se propõe a estudar, isto é, as condições de
37
desenvolvimento da atividade matemática e as restrições que regem seu ensino e
aprendizagem.
Observamos aqui a pertinência de nossa escolha em estudar as relações
institucionais esperadas e existentes por meio das atividades propostas aos
estudantes quando se considera a transição entre o Ensino Médio e Superior, pois
nossas análises permitem identificar as condições e as restrições do processo de
ensino e aprendizagem.
Esclarecida a forma de análise das possíveis organizações do conhecimento
matemático, Bosch e Chevallard (1999), ao questionar os critérios para a análise das
diferentes técnicas, de suas tecnologias e teorias, são conduzidos a considerar que
na cultura ocidental as práticas humanas são estruturadas entre atividades
“manuais” e “intelectuais”, em que se privilegiam as atividades intelectuais.
Para o caso da matemática, Bosch e Chevallard (1999) mostram que
seguimos essa mesma estrutura, isto é, em matemática trabalhamos “com a cabeça”
e utilizamos instrumentos materiais como lápis, régua, compasso, computador, etc.,
e não materiais, porém sensíveis como escritas, formalismos, discurso, etc. que,
mesmo tendo certas especificidades, só intervêm na atividade matemática como
sinais dos objetos que eles representam.
Após observar que na cultura ocidental o trabalho em matemática é efetuado
principalmente “com a cabeça” por meio de noções, raciocínios, ideias, intuições, e
que os instrumentos materiais e as representações são apenas suportes que não
fazem parte da atividade, Bosch e Chevallard (1999) questionam se é apenas a
ausência de um conceito que bloqueia a evolução do pensamento matemático.
Para eles, as ferramentas materiais e sensíveis podem modificar de maneira
catastrófica o desenvolvimento da atividade matemática. Isso lhes conduz a
considerar essa dimensão como parte da atividade, como se pode constatar no texto
a seguir:
Sabemos que a ausência de um conceito pode bloquear a evolução
do “pensamento” matemático, tanto no nível histórico de uma
38
comunidade como no nível individual do pesquisador ou do aluno.
[...] Acreditamos que a análise didática do desenvolvimento do saber
matemático – capturado no tempo histórico, na história de vida de
uma pessoa, ou na vida de uma classe – não pode considerar como
secundária esta dimensão da atividade, lhe atribuindo apenas uma
função instrumental na construção dos conceitos (BOSCH E
CHEVALLARD, 1999, p. 90, apud COSTA, 2008, p. 23).
Após considerarem o problema da natureza dos objetos matemáticos e de
sua função na atividade matemática, Bosch e Chevallard (1999) são conduzidos a
estabelecer uma dicotomia fundamental entre esses objetos distinguindo-os em dois
tipos: os objetos ostensivos e os objetos não ostensivos.
Para Bosch e Chevalllard (1999) os objetos ostensivos são aqueles que
adquirem para o sujeito humano uma forma material, sensível. Como exemplos de
objetos materiais eles consideram uma caneta, um compasso, etc., e como objetos
sensíveis, os gestos (ostensivos gestuais), as palavras, o discurso (ostensivos
discursivos), os esquemas, os desenhos, os grafismos (ostensivos gráficos), as
escritas e os formalismos (ostensivos escriturais).
Eles observam ainda que a característica dos ostensivos é que eles podem
ser manipulados, e isso vale tanto para os ostensivos materiais como para os
ostensivos sensíveis. Além disso, o não ostensivos só podem ser evocados por meio
da manipulação dos ostensivos que lhe são associados. Após definirem objetos
ostensivos e não ostensivos, Bosch e Chevallard (1999) explicitam a função deles
na atividade matemática e que se trata de objetos institucionais cuja existência, em
geral, não depende de uma única pessoa.
Além disso, toda técnica supõe a ativação de um conjunto de ostensivos e
não ostensivos, e a manipulação dos ostensivos são regrados pelos não ostensivos
que são evocados com a ajuda dos ostensivos. Isso conduz à existência de uma
dialética necessária entre ostensivos e não ostensivos, como podemos observar no
seguinte texto:
[...] os objetos ostensivos e os objetos não ostensivos estão unidos
por uma dialética que considera os segundos como os emergentes
da manipulação dos primeiros e, ao mesmo tempo, como meios de
guiar e controlar esta manipulação (BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p.
90-91, apud COSTA, 2008, p. 24).
39
O exemplo abaixo permite compreender como funcionam ostensivos e não
ostensivos na atividade matemática:
É pelo fato de poderem ser concretamente manipulados que os
objetos ostensivos se distinguem dos não ostensivos. A notação logo
e a palavra “logaritmo” são objetos ostensivos. Ao contrário, a noção
de logaritmo é um objeto não ostensivo que não é possível manipular
no sentido precedente. Podemos somente “tornar presente”
representá-la – pela manipulação de certos objetos ostensivos
associados, como a notação logo por exemplo. Na maioria dos
casos, os objetos institucionais se veem associados a um objeto
ostensivo privilegiado, seu nome, que permitirá uma evocação
mínima. “Observamos, aqui, o jogo metafórico pelo qual os atores
são frequentemente conduzidos a utilizar como se os objetos não
ostensivos se mostrassem e pudessem ser efetivamente
manipulados” (BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 90, apud COSTA,
2008, p. 26).
Quando consideramos nossa prática diária no trabalho com Matemática
Financeira no curso de Administração de Empresas no Ensino Superior, destacamos
que, ao desenvolvermos atividades sobre o regime de capitalização exponencial,
necessitamos identificar o ostensivo capital, prazo de uma aplicação, taxa capital
resgatado e logaritmo, pois é o não ostensivo logaritmo que deverá ser manipulado
de forma a obter o prazo da referida aplicação.
Os pesquisadores atentam para o fato que toda atividade humana se
descreve, aparentemente, por meio da manipulação de objetos ostensivos, porém o
ser humano só é capaz de efetuar esta manipulação por meio dos objetos não
ostensivos que não aparecem como elementos principais da atividade desenvolvida.
Depois de explicitada a existência de uma dialética entre objetos ostensivos e
não ostensivos, não apenas no ambiente escolar, Bosch e Chevallard (1999)
mostram a importância dos ostensivos e não ostensivos no desenvolvimento das
atividades matemáticas em todos os seus níveis, isto é, técnico, tecnológico e
teórico. São eles que permitem executar as atividades, assim como compreendê-las
e controlá-las, conforme BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 93, apud COSTA, 2008, p. 29.
Isso conduz Bosch e Chevallard a enfatizar que na análise de uma
determinada atividade matemática, se consideramos os ostensivos apenas como
40
sinal dos não ostensivos que constituem seu significado, faz prevalecer à dimensão
não ostensiva da atividade, considerando sua dimensão ostensiva como secundária.
Mas para Bosch e Chevallard (1999), se considerarmos a dimensão ostensiva
como constituintes fundamentais das organizações praxeológicas, não podemos
separar sua função semiótica de sua função instrumental, isto é, o ostensivo é
fundamental tanto na produção de sentido como na manipulação das técnicas,
tecnologias e teorias. A importância dos objetos ostensivos e não ostensivos para o
desenvolvimento das atividades matemáticas e sua valorização cultural dependem,
segundo Bosch e Chevallard (1999), de certo “desmatematização” da atividade
matemática. Como exemplo, os autores citam o caso do formalismo algébrico
presente no processo de algebrização das organizações matemáticas.
Consideramos assim que analisar as propostas de desenvolvimento do
processo de ensino e aprendizagem das noções de juros simples e compostos e as
necessidades em termos de ostensivos e não ostensivos matemáticos necessários
para a execução dessas propostas pode tornar esse trabalho mais eficaz, pois
podemos identificar conhecimentos prévios tanto do ponto de vista das noções (não
ostensivos) como de suas representações (ostensivos), e utilizá-los como
conhecimentos disponíveis para a introdução de novos conhecimentos.
Sendo nossas análises efetuadas por meio de uma grade de análise, para a
construção consideramos as tarefas habitualmente encontradas no Ensino Médio e
Superior e exame dos livros didáticos para a identificação das organizações
matemáticas existentes tanto no Ensino Médio como no Superior, de forma a
compreender quais as possibilidades de que serão encontrados meios para auxiliar
os estudantes a ultrapassar os obstáculos presentes na transição entre o Ensino
Médio e Superior.
Para tal foi necessário introduzir ainda como referenciais teóricos de apoio a
noção de quadro e mudança de quadros conforme definição de Douady (1984,
1992) e a noção de níveis de conhecimento esperados dos estudantes, segundo
definição de Robert (1997, 1998).
41
Iniciamos com uma breve descrição das noções de quadro e mudança de
quadro introduzido por Douady (1984) em sua tese.
2.3 AS NOÇÕES DE QUADRO E MUDANÇA DE QUADRO CONFORME
DEFINIÇÃO DE DOUADY (1984, 1992)
Sob uma perspectiva de teorização didática, Douady (1984, 1992) introduz a
noção de quadro em sua tese. Fundamentada em uma análise epistemológica da
forma de trabalho do matemático profissional, Douady (1984) considera que os
conceitos matemáticos funcionam como ferramentas explicitam antes de adquirirem
o status de objeto e serem trabalhados como tal.
Isso conduz Douady a definir as noções de ferramentas implícitas e
explícitas como:
Ferramenta implícita e explícita: Uma ferramenta implícita
corresponde a um conceito em elaboração, e isto pode durar vários
anos. Uma ferramenta explícita corresponde a uma utilização
intencional de um objeto para resolver um problema (DOUADY, 1992,
p. 134, apud ANDRADE, 2006, p. 12).
Segundo Douady, a noção de objeto é a seguinte:
Por objeto, entendemos o objeto cultural tendo seu lugar em um
edifício mais amplo que é o saber das matemáticas, num dado
momento, reconhecido socialmente. O objeto é matematicamente
definido, independentemente de sua utilização. (DOUADY, 1992, p.
134, apud ANDRADE, 2006, p. 12).
Para exemplificar as definições de ferramenta implícita e explícita e objeto,
considerando as definições de Douady, escolhemos as situações abaixo que
correspondem ao nosso objeto matemático de pesquisa, ou seja, a noção de juros
simples e compostos. Quando se introduz a noção de juros simples e compostos no
Ensino Médio, em geral, consideram-se exemplos do tipo: Uma pessoa aplicou $
10.000,00 a juro composto de 1,8% ao mês. Após quanto tempo terá um total de $
11.543,00?
42
Nesse caso o estudante pode calcular juros sobre juros que corresponde a
aplicar a ferramenta implícita até encontrar o valor dado e assim determinar o tempo.
Após esse trabalho pode-se explicitar a ferramenta utilizada e escrever a fórmula
que corresponde à forma algébrica para o calculo de juros compostos. Isso conduz a
considerar que o objeto matemático segundo a definição de Douady (1992) se situa
em uma teoria bem definida, sendo assim um elemento do domínio do trabalho
matemático que Douady (1992) denomina quadro. No exemplo anterior observamos
que o trabalho matemático é desenvolvido no quadro numérico e ao se deduzir a
fórmula que permite calcular juros compostos é preciso traduzir o problema para o
quadro algébrico.
Segundo Douady(1992)”um quadro é constituído dos objetos de um ramo das
matemáticas. Considerando o trabalho do matemático, Douady (1992) define
mudança de quadros, que consiste na passagem de um quadro a outro e no
retorno quando necessário. O exemplo acima mostra possibilidade de passagem do
quadro numérico para o quadro algébrico. A didática de Douady(1992) define na
realidade ao transpor as características do trabalho dos matemáticos para os jogos
de quadros e dialética ferramenta-objeto. Os jogos de quadros são transposições
didáticas das mudanças de quadros organizados pelos professores O exemplo
apresentado acima deixa evidente a dialética ferramenta objeto que funciona na
passagem de um quadro para o outro.
Após essa breve descrição das noções de quadro e mudança de quadros e
de suas possibilidades para a análise didática, realizamos uma sucinta exposição
dos três níveis de conhecimentos esperados dos estudantes segundo definição de
Robert (1997 1999).
2.4 OS TRÊS NÍVEIS DE CONHECIMENTO ESPERADOS DOS ESTUDANTES
CONFORME DEFINIÇÃO DE ROBERT (1997, 1998)
A abordagem teórica dos três níveis de conhecimento esperados dos
estudantes, segundo definição de A. Robert (1997, 1999), é a seguinte:
43
O nível técnico corresponde a um trabalho isolado, local e concreto. Está
relacionado principalmente às ferramentas e definições utilizadas em uma
determinada tarefa. Para nossa pesquisa, sobre juros simples e compostos
identificamos as tarefas abaixo como correspondentes à aplicação direta da fórmula
para o cálculo de juros simples e montante.
Uma pessoa aplicou $ 3.000,00 à taxa de 2% ao mês durante 5 meses.
a) Quanto receberá de juros se o regime for de juros simples?
b) Que montante terá ao fim dessa aplicação?
O nível mobilizável corresponde a um início de justaposição de saberes de
um certo domínio, podendo até equivaler a uma organização. Vários métodos
podem ser mobilizados. O caráter ferramenta e objeto do conceito está em jogo,
mas o que se questiona é explicitamente pedido. Um saber é considerado
mobilizado quando o estudante o utiliza corretamente. Exemplos:
Determine o prazo em que duplica um capital aplicado à taxa de juro simples de 4%
ao mês.
b) Calcule o juro composto que será obtido na aplicação de $ 25.000,00 a 25% ao
ano, durante 72 meses.
Nessas tarefas é pedido explicitamente o cálculo dos juros simples e
composto, sendo necessário apenas mobilizar as fórmulas que permitem
desenvolver esses cálculos. O nível disponível corresponde, a saber, responder
corretamente o que é proposto sem indicações, de poder, por exemplo, dar
contraexemplos (encontrar ou criar), mudar de quadro (fazer relações), aplicar métodos
não previstos. Esse nível de conhecimento está associado à familiaridade, ao
conhecimento de situações de referências variadas, de ser capaz de questionar, de
dispor de uma organização. Exemplo:
Se uma mercadoria cujo preço é de $ 200,00 for paga em 6 meses, com taxa de
20% ao ano, quanto será pago de juros, no regime de capitalização linear?
2.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após essa breve descrição do referencial teórico utilizado na pesquisa,
passamos ao próximo capítulo, em que analisamos algumas das relações
institucionais esperadas dos professores e estudantes do Ensino Médio e Superior.
44
Essas análises levam em conta tanto o trabalho a ser realizado por cada qual
desses atores do processo de ensino e aprendizagem como a parte do conteúdo a
ser desenvolvido que lhes é proposta, isto é, qual o papel que professor e estudante
devem desempenhar para garantir o sucesso do processo de ensino e
aprendizagem.
Para isso, utilizamos a noção de “topos” do professor e do estudante, e com
essa ferramenta analisamos qual o papel esperado destes por meio de documentos
oficiais introduzidos a partir da Lei de Diretrizes e Bases de 1999 (L 9.394, de
20.12.1996).
45
Capítulo 3
O “TOPOS” DO ESTUDANTE E DO PROFESSOR
NOS DOCUMENTOS OFICIAIS
3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Consideramos neste capítulo a análise das relações institucionais esperadas
dos estudantes e dos professores tanto do Ensino Médio como do Ensino Superior.
Para o Ensino Médio essas análises são feitas à luz dos Parâmetros Curriculares
Nacionais e da Nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo, e para o Ensino
Superior utilizamos as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação de
Administração e alguns planos de ensino de universidades públicas e privadas.
A escolha desses documentos e dos planos de ensino se deve ao fato que
eles representam propostas de diferentes formas de tratamento do conteúdo de
juros simples e compostos para as duas etapas escolares consideradas nessa
pesquisa.
Com o objetivo de melhor compreender o que é esperado do professor e do
estudante, propomos estudar o “topos”, 2 que, conforme definição de Chevallard e
Grenier (1997) corresponde ao momento em que o estudante desempenha com
certa autonomia o seu papel na execução de uma tarefa didática que, em geral, lhe
é proposta pelo professor, cujo papel é de organizador do trabalho a ser realizado
pelo estudante e mediador, quando necessário.
Sendo assim, quando se introduz a noção de juros simples e compostos,
objeto de estudo desta pesquisa, podemos considerar que o papel do professor é de
organizar o estudo dessa noção reconhecendo os diferentes tipos de tarefas que
correspondem a esse tema. Isso se realiza com a ajuda das propostas institucionais,
dos livros didáticos e de outros documentos. Ao organizar essas tarefas, cabe ao
professor escolher as técnicas e tecnologias adequadas, ou seja, o papel central do
2
Topos: palavra grega que significa “lugar”. O “topos” do aluno é o lugar onde ele opera com relativa
autonomia em relação ao professor o papel que lhe é próprio na realização de uma tarefa didática.
Este trabalho que reúne professor e aluno exige uma ação orquestrada, em que ambos são
chamados a desempenhar seu papel em fases cooperativas (CHEVALLARD e GRENIER, 1997, p. 186,
apud COSTA, 2000, p. 39).
46
professor é organizar o trabalho do estudante, enquanto ao estudante cabe aceitar o
professor como uma ajuda ao estudo. No entanto, o professor deve aos poucos ir se
desligando
para
o
estudante
se
tornar
responsável
pelo
seu
próprio
desenvolvimento, adquirindo assim autonomia para realizar seu percurso de estudo.
Em resumo, o “topos” do professor está associado à organização matemática
e à didática de situações que permitam o desenvolvimento dos estudantes, de modo
que os mesmos sejam capazes de utilizar seus conhecimentos de forma autônoma
tanto para resolver problemas escolares como os que serão confrontados no seu
cotidiano, ou seja, o “topos” dos estudantes corresponde à possibilidade de construir
seu próprio percurso de estudo.
Para identificar o que se espera tanto do professor como do estudante do
Ensino Médio em relação aos seus “topos”, utilizamos os PCNEM e PCN+, a Nova
Proposta Curricular do Estado de São Paulo e as Diretrizes Curriculares, pois estes
documentos possibilitam identificar propostas que contribuem com o professor em
sua prática diária. Este pode realizar, por meio desses documentos, as escolhas
mais adequadas às características dos estudantes de uma determinada etapa
escolar, articulando ainda com as possíveis aplicações em seu ambiente de
trabalho. Sendo assim, numa primeira fase, analisamos a relação institucional
esperada para o trabalho com a noção de juros simples e juros compostos no
Ensino Médio e sua articulação com os conceitos matemáticos desenvolvidos nesta
etapa da escolaridade, identificando a função do professor e do estudante no
processo de ensino e aprendizagem respectivamente. Essas análises foram
desenvolvidas por meio do estudo dos documentos oficiais, quando se considera a
relação institucional esperada. Examinamos inicialmente os Parâmetros Curriculares
Nacionais privilegiando a identificação dos conhecimentos prévios esperados dos
estudantes quando se introduz a noção de juros. Similar procedimento foi adotado
para a verificação da nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo, ou seja,
destacando a “expectativa” da noosfera quanto ao papel a ser desempenhado tanto
pelo estudante como pelo professor, levando em conta nas propostas os
conhecimentos prévios do estudante e do professor. Finalizamos as análises
associando as nossas indagações em função das relações institucionais esperadas
para o Ensino Médio, tecendo um comentário sobre as regularidade e diferenças
47
existentes nestes documentos. Analisamos ainda sob a mesma óptica qual o papel a
ser desempenhado por estudantes e professores dos cursos de graduação em
Administração via Diretrizes Curriculares dos cursos de Administração e planos de
ensino de duas universidades públicas, Universidade Federal do Amazonas e
Universidade Federal do Rio Grande do Sul e duas Universidades Privadas,
Fundação Getulio Vargas e Faculdade das Américas, em função da disponibilidade
de seus planos de ensino.
Terminamos nosso estudo comparando o que é esperado do professor e
estudante nas duas etapas escolares examinadas e verificando se existe uma
coerência nessas duas propostas.
Iniciamos assim pela análise da proposta nacional, ou seja, os Parâmetros
Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM), em que identificamos que
nesses documentos a proposta é a de que os professores (topos do professor) não
se preocupem apenas em aprofundar os conhecimentos adquiridos no Ensino
Fundamental, mas que eles preparem seus estudantes para agirem como cidadãos
preparados para o mundo do trabalho. Isto corresponde a considerar uma formação
que os prepare para atuar de forma autônoma e ética em relação à compreensão e
desenvolvimento dos processos produtivos, ou seja, observamos a proposta de
formação de um estudante cujo “topos” é realizar seu trabalho escolar de forma
autônoma e responsável a fim de se desligar do professor e se tornar responsável
pelo seu próprio desenvolvimento escolar e profissional. No caso do nosso objeto de
estudo, essa autonomia é importante, pois o estudante deve estar preparado para
aplicar seus conhecimentos na sua vida profissional, em que não contará com o
professor para auxiliá-lo nos momentos de dificuldade. O texto abaixo deixa evidente
essa proposta do que se deseja do trabalho de professores e estudantes do Ensino
Médio, ou seja, do “topos” social 3 esperado dos estudantes do Ensino Médio:
[...] dentre as finalidades do Ensino Médio não constam apenas a
consolidação e aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no
Ensino Fundamental, com objetivo de ser uma continuidade, mas
também de preparar para o trabalho e o exercício da cidadania, o
3
“Topos” social: consideramos aqui como “topos” social as expectativas quanto o papel que
professores e estudantes devem desempenhar no contexto social em que estão inseridos.
48
desenvolvimento da autonomia intelectual, a formação ética e a
compreensão de como ocorrem os processos produtivos. (BRASIL,
1998, p. 69).
Essa reformulação do Ensino Médio é importante, pois leva em conta, além dos
conteúdos matemáticos, a inserção do indivíduo na sociedade por meio de sua cultura.
Entretanto, os professores podem encontrar dificuldades para desenvolver essas
orientações, pois elas não vêm acompanhadas de sugestões sobre as formas de
tratamento pedagógico que podem ser utilizadas para desenvolver esse tipo de trabalho,
nem de indicações mais precisas sobre novas abordagens didáticas que auxiliem a
construção de novas organizações didáticas, ou seja, não existe preocupação de, pelo
menos, citar trabalhos de Educação Matemática, os quais poderiam ajudar os
professores a encontrar novos caminhos para suas práticas habituais. Após essa rápida
apresentação da ferramenta utilizada para as análises e da forma como essa será
conduzida, dos objetivos e finalidades do novo Ensino Médio, e observando que as
análises propostas na sequência possibilitam compreender o enfoque relativo à
ampliação do debate sobre o ensino da Matemática e a socialização dos
conhecimentos nela desenvolvidos, passamos ao estudo mais específico do “topos”
do professor e do estudante nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino
Médio.
3.2 OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO MÉDIO
(PCNEM)
A proposta do novo Ensino Médio, em termos da lei que a regulamenta, deixa
evidente que esta etapa escolar não deve preparar apenas para a inserção no
Ensino Superior ou no ensino profissionalizante, mas deve contribuir para completar
a Educação Básica e preparar o indivíduo para a cidadania.
As mudanças propostas nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o
Ensino Médio – PCNEM (BRASIL, 2002) refletem a necessidade de preparar os
estudantes para a vida, propiciando condições para que sejam cidadãos autônomos
capazes de exigir e exercer a cidadania por meio da procura constante de novos
desafios e de suas próprias condições para resolvê-los.
49
Acreditamos, assim, que é preciso estar constantemente em contato com as
novas estratégias e possibilidades de tratamento das ciências, em particular da
Matemática no desenvolvimento das diferentes formas de tratamento dos desafios
cotidianos que podem surgir quando da necessidade de encontrar solução para as
diferentes atividades cotidianas, especialmente aquelas que estão associadas ao
conhecimento científico. Nos PCNEM observamos que são inicialmente explicitadas
as condições gerais do processo de ensino e aprendizagem, isto é, se explica como
efetuar a escolha de conteúdos; algumas formas de trabalhar com os conteúdos
escolhidos, a importância da construção de um projeto pedagógico específico para
os diferentes grupos de estudantes, em que se levam em conta seus conhecimentos
prévios em função do novo conhecimento que se deseja introduzir e exemplos de
organização curricular que articulam conteúdos a serem trabalhados, formas de
tratamentos destes e projeto pedagógico.
Ao apontar que para a escolha dos conteúdos é preciso refletir sobre os
propósitos da formação matemática pretendida, destaca-se que se espera que os
estudantes, ao final do Ensino Médio, saibam usar a Matemática para solucionar
problemas da vida prática e articular soluções com outras áreas do conhecimento.
Nesse documento se ressalta ainda a importância de compreender a Matemática na
sua forma intrínseca, trabalhada por meio de teoremas e suas demonstrações, que
esse conhecimento é social e historicamente construído e, portanto permite o
avanço das ciências, sendo assim um instrumento essencial para o desenvolvimento
tecnológico e científico. Aqui podemos dizer que o “topos” do professor é mostrar a
importância da Matemática como ferramenta para o desenvolvimento da sociedade,
e fica a cargo do estudante procurar na escola e na sociedade exemplos que
possam ampliar os conhecimentos trabalhados no grupo ao qual ele pertence,
tornando-se assim autônomo e capaz de conduzir sua própria aprendizagem,
enxergando o professor como um orientador nesse processo, o que corresponde a
uma das expectativas institucionais propostas para o novo Ensino Médio.
Nos PCNEM observamos ainda que existem orientações sobre a forma de
desenvolver determinados conteúdos em que se enfatiza o desenvolvimento de
valores formativos articulados com o desenvolvimento dos conteúdos matemáticos.
Ou seja, espera-se que o professor seja capaz de criar situações que valorizem o
50
desenvolvimento do raciocínio lógico matemático que ele os estudantes a formular
novas questões, criar seus próprios modelos, desenvolver procedimentos lógicodedutivos. Para isso, a proposta considera que o professor pode mostrar a
importância das propriedades matemáticas por meio de um discurso justificativo que
articule a fórmula com os teoremas e propriedades que as sustentam e permitem
resolver diferentes tipos de tarefas, incluindo as de aplicação da Matemática em
situações cotidianas e nas outras ciências. Ou seja, espera-se que o professor
disponha de um conjunto de tipos de tarefas cujas técnicas possam ser justificadas
por meio de tecnologias adequadas tanto no nível técnico tecnológico como no nível
tecnológico teórico, isto é, mesmo não utilizando esse termo, o que se propõe é que
o professor disponha de uma organização praxeológica 4 adequada ao grupo de
estudantes que participam do processo de ensino e aprendizagem.
Trata-se de uma proposta corrente, mas que necessita de um estudo mais
aprofundado que auxilie o professor a desenvolver o seu papel. Vemos aqui um
caminho que poderia ser trabalhado na formação de professores, pois, segundo
Boero (2008), cabe a noosfera:
O termo “noosfera” é utilizado por Chevallard para designar o sistema de
instituições e pessoas que administram as relações entre a matemática dos
matemáticos e a matemática do sistema de ensino. Os processos
realizados na noosfera são sensíveis a influências externas (provenientes
de política, cultura, etc.), mas eles se desenvolvem com relativa autonomia
e inércia. Apesar dessa autonomia e inércia, os membros da noosfera têm
responsabilidades especiais na preparação dos professores e no
desenvolvimento curricular (em particular, os pesquisadores em educação
matemática), agindo frequentemente sob a luz das teorias epistemológicas
e psicológicas, acarretando na identificação sobre o que é matemática e
como os estudantes aprendem. (BOERO, 2008, p. 3).
Apesar de alertar os professores sobre a necessidade de articulação dos
novos conteúdos e aqueles já trabalhados no Ensino Fundamental e nos três anos
do Ensino Médio, de levar em conta os conhecimentos prévios dos estudantes e de
4
Organização Praxeológica: Uma organização praxeológica ou praxeologia é composta de um certo
tipo de tarefa que deve ser realizada por meio de uma certa técnica, que deve ser justificada por
meio de uma tecnologia que permite ao mesmo tempo pensá-la e produzi-la, devendo ainda ser
justificada mediante uma teoria. A palavra praxeologia ressalta a estrutura da organização
[tarefa/técnica/tecnologia/teoria], pois a palavra grega práxis, que significa “prática”, envia ao bloco
prático-técnico, e a palavra grega logos, que significa “razão”, envia ao bloco tecnológico-teórico,
conforme definição apresentada em Chevallard (2002).
51
revisitá-los sempre que possível propondo situações de maior complexidade, uma
vez que se espera que os estudantes tenham mais maturidade, não existe nenhuma
orientação a respeito de como realizar esse trabalho. Tanto a articulação de
conhecimentos como o trabalho considerando os conhecimentos prévios dos
estudantes são objetos de pesquisa que poderão auxiliar professores e estudantes a
compreender melhor o papel da Matemática tanto no âmbito escolar como no
profissional.
É
importante
destacar
que
o
documento,
ao
enfatizar
o
desenvolvimento do valor formativo, coloca em evidência que é preciso abandonar
as práticas de memorização de um conjunto de regras, de utilização direta de
fórmulas, de resolução de exercícios repetitivos não acompanhados de explicações
e explicitações que, utilizando os termos de Chevallard, correspondem às
tecnologias das técnicas empregadas. Aqui observamos que cabe ao professor
encontrar meios para justificar a utilização das regras e fórmulas propondo tarefas
que despertem o interesse dos estudantes.Observamos ainda que, mesmo fazendo
parte do “topos” do professor, não existem orientações sobre como realizar esse
trabalho, o que é compreensível, pois se trata de uma questão que vem sendo
pesquisada em Educação Matemática e que precisa ser trabalhada intensamente na
formação de professores.
Quando se considera, mais especificamente, o tema Números e Operações,
que corresponde ao conteúdo associado aos conhecimentos prévios essenciais para
a introdução e desenvolvimento da noção de juros simples e compostos, o
documento enfatiza a necessidade de o professor criar situações que desenvolvam
a capacidade de solucionar problemas rotineiros sobre as noções de números
inteiros e decimais, destacando para esse último a importância de reputar suas
diferentes representações. Além disso, o documento ressalta a importância da
articulação desse conteúdo com as noções de porcentagem, proporcionalidade
direta e inversa, observando a relevância do cálculo mental e do uso de calculadoras
e a necessidade de levar em conta as representações por meio de tabelas e gráficos
na resolução de problemas envolvendo essas noções.
Nesse caso, o documento apresenta uma sugestão de situação cotidiana que
corresponde à leitura e interpretação de faturas, mais especificamente das contas de
água e luz. Apesar de justificar a utilização desses documentos no desenvolvimento
52
do trabalho matemático, observamos que se trata de uma forma de mostrar a
importância desse trabalho na formação do cidadão, mas que pouco auxilia o
trabalho do professor, que, mesmo tendo como justificar a importância da noção
matemática na vida cotidiana, pode não dispor das ferramentas matemáticas
essenciais para institucionalizar o conhecimento matemático em jogo de modo que
este possa ser utilizado em diferentes situações que nem sempre estão diretamente
relacionadas com as necessidades diárias dos estudantes.
Além disso, muitas dessas situações são trabalhadas de forma teórica, pois
são adaptadas ao conteúdo e não correspondem à realidade. Temos aqui mais uma
tarefa que faz parte do “topos” do professor, que necessita de formação específica
para ser desenvolvida de forma eficaz, pois o exemplo discutido no documento não
é tipicamente matemático, pois pode ser resolvido mentalmente sem a utilização das
representações mais específicas do conteúdo a que foi associado, no caso ao
estudo de funções.É importante observar que o documento corresponde a uma
proposta de trabalho em que não se levam em conta as diferentes conjunturas
sociais, culturais e educacionais que possam ser encontradas pelo professor, o que
justifica o fato de este enfatizar que o professor deve privilegiar a qualidade em
detrimento da quantidade de conteúdos a serem desenvolvidos no Ensino Médio,
proporcionando a possibilidade de criação de diversas organizações praxeológicas,
que, mesmo sendo adequadas a certo número de estudantes, podem no futuro ser
consideradas fontes de dificuldades. As escolhas dessas organizações ficam assim
totalmente a cargo do professor, que precisa estar bem preparado para não cometer
enganos que possam prejudicar o desenvolvimento de seus estudantes.
Observamos ainda que o documento ofereça orientações sobre a necessidade de
revisitar conteúdos, tais como as propriedades com números reais e as regras de
sinais para os números inteiros, mas também nesse caso apenas se salienta a
maturidade dos estudantes e nenhuma orientação mais específica é dada sobre
como se poderia realizar esse trabalho. Aqui, poderiam ser indicados trabalhos de
pesquisa em Educação Matemática para auxiliar o professor a encontrar novas
formas para o desenvolvimento dos conteúdos do Ensino Médio, em que se
pudessem articular conhecimentos da própria Matemática e das outras Ciências e
revisitar conhecimentos prévios supostos disponíveis, de modo que esses últimos se
tornem mais ricos, mais elaborados e mais diferenciados, e que tanto eles como os
53
novos conhecimentos adquiram significado para o aprendiz, tornado-se assim mais
estável, conforme afirmação de Moreira (2005), para caracterizar aprendizagem
significativa. Quando se consideram mais especificamente as orientações sobre o
conteúdo funções, observamos que essa noção deve ser tratada do ponto de vista
de suas aplicações em outras ciências, em particular como modelo de resolução de
problemas de movimento em física e de rendimentos financeiros associados às
aplicações financeiras que possam ser encontradas no cotidiano.Para isso, propõese que se dê ênfase ao estudo do gráfico de uma função e sua interpretação por
meio de exemplos e situações contextualizadas que possam motivar os estudantes
à procura de novas situações cuja solução possa ser planejada e executada
mediante a utilização da noção de função e que as propriedades das funções
possam servir como ferramentas de justificativa e controle dos resultados
encontrados, ou seja, a noção de função é usada como uma tecnologia para
justificar as técnicas associadas aos modelos construídos para a resolução das
tarefas propostas aos estudantes. Como exemplo, é apresentado o caso da função
quadrática que pode ser desenvolvida por meio de situações contextualizadas e que
permite revisitar conceitos como o de gráfico de uma função, identificação da função
por meio de seu gráfico, estudo dos zeros de uma função e sua representação no
sistema cartesiano ortogonal, estudo do crescimento e do decrescimento por meio
do gráfico, relação entre o sinal dos coeficientes de uma função quadrática e as
propriedades do gráfico dessa função e estudo dos máximos e mínimos dessa
função. No documento é destacada a necessidade de tratar essas propriedades das
funções quadráticas por intermédio de situações que permitem compreendê-las,
evitando assim a memorização de regras, ou seja, dá-se destaque à discussão das
técnicas utilizadas para justificar as tarefas propostas pelo professor, o que supõe
que este disponha de uma tecnologia adequada. Nesse momento, observamos mais
uma vez que é papel do professor encontrar situações apropriadas para o
desenvolvimento do trabalho proposto, julgando que ele tenha sido preparado para
conceber esse tipo de tarefa. As propriedades das funções quadráticas podem ser
destacadas mediante a escolha de uma tarefa que necessite dessas propriedades,
que devem ser explicitadas pela tecnologia da técnica, como podemos observar no
exemplo abaixo. Todas essas propriedades das funções quadráticas possibilitam
explorar problemas como o apresentado abaixo.
54
Fonte: HAZZAN E BUSSAB, 2003, p. 83.
Para resolver a parte (a) dessa questão basta multiplicar a função demanda
por x que representa o preço do produto. Obtém-se assim uma função quadrática de
x que representa a função receita. Determinando a abscissa do vértice da parábola
que representa a variação dessa função, e substituindo na função demanda,
encontra-se o preço que maximiza essa função. Sendo a função lucro definida como
função receita menos função custo, para a solução da parte (b) obtém-se novamente
uma função quadrática, e para determinar o preço que maximiza o lucro basta
estabelecer o valor da abscissa do vértice da parábola que representa a função lucro
e substituir na função demanda. Se construirmos o gráfico da parábola que
representa a função lucro podemos determinar o intervalo em que o lucro é positivo.
A discussão apresentada acima mostra a necessidade de um discurso
tecnológico para descrever, explicar e justificar as técnicas empregadas na solução
da tarefa. Voltando ao documento e considerando ainda as noções de funções,
encontramos orientações sobre a organização matemática dos conteúdos
associados a essas noções e observamos que se propõe que se revisite a
trigonometria no triângulo retângulo e suas relações antes de abordar as noções
função seno e cosseno, mas ainda aqui não existem indicações para auxiliar o
professor a desenvolver esse trabalho. Outro exemplo está diretamente associado
ao nosso objeto de estudo, ou seja, às aplicações de Matemática Financeira, que
são propostas como motivadoras de situações que possibilitam a articulação das
noções matemáticas de função afim com a noção de juros simples e funções
exponencial, inversa e logarítmica com situações contextualizadas sobre juros
compostos.
55
Nesse caso, podemos mais uma vez lembrar que existem pesquisas em
Educação Matemática que podem auxiliar os professores a desenvolver esse
trabalho, lembrando que ele não é simples nem imediato e necessita de orientações
mais específicas.
Apesar disso, podemos dizer que as orientações constituem
uma primeira abordagem, pois as indicações podem levar os professores à procura
de novos meios para tratar as questões apresentadas no documento. Isso possibilita
que o professor encontre uma nova forma de ação que pode influenciar os
estudantes e assim ambos serão capazes de cumprir os papéis que lhes são
atribuídos nessa nova concepção do Ensino Médio. Focamos aqui as noções
associadas à nossa pesquisa, mas o documento apresenta sugestões para o
conjunto de conteúdos matemáticos destacados para serem tratados no Ensino
Médio. Todos esses conteúdos, quando possível, são associados a aplicações em
outras ciências e situações contextualizadas.
Podemos resumir a análise acima das propostas do PCNEM que
correspondem às expectativas institucionais para o desenvolvimento da Matemática,
em particular, das aplicações de Matemática Financeira, utilizando nosso referencial
teórico central, isto é, a teoria antropológica do didático associada à noção de
“topos” do professor e do estudante da seguinte maneira:
 Propor tarefas que permitam a contextualização dentro da própria
matemática e nas outras ciências (“topos” “do professor”).
 Trabalhar com os objetos ostensivos (discursivos, visuais, gestuais,
gráficos) reconhecendo os não ostensivos que lhes são associados,
isto é, interpretar as diversas formas de representação dos objetos
matemáticos estudados no Ensino Médio (“topos” do professor e do
estudante).
 Justificar as diferentes etapas do desenvolvimento de uma técnica por
meio de um discurso tecnológico, ou seja, evocar os não ostensivos e
as propriedades e teoremas que lhe são associados na manipulação
dos ostensivos que permitem a solução de um determinado tipo de
tarefa
que
constitui
a
organização
praxeológica
para
o
56
desenvolvimento de uma determinada noção matemática (“topos” do
professor e do estudante).
 Identificar e construir situações que auxiliem os estudantes a
reconhecer os ostensivos e não ostensivos e dessa forma sejam
capazes de produzir um discurso tecnológico que os auxilie a
ultrapassar as dificuldades e os obstáculos encontrados na solução
das tarefas que lhes são propostas (“topos” do professor).
 Mostrar, por meio de um discurso tecnológico, a diferença entre os
ostensivos e sua relação com os não ostensivos e a necessidade de
escolhas adequadas que permitem resolver outras situações em
diferentes momentos e contextos (“topos” do professor).
 Encontrar e construir novas tarefas e situações para o seu próprio
desenvolvimento, isto é, utilizar conhecimentos matemáticos de forma
autônoma para a solução de problemas escolares e nos diferentes
contextos que possam ser solicitados (“topos” do professor e do
estudante).
As expectativas apresentadas no PCNEM nos conduzem a considerar que se
espera que os estudantes, ao terminarem o Ensino Médio, sejam capazes de
identificar os ostensivos e não ostensivos mais adequados para resolver tarefas
escolares, profissionais e cotidianas em que esses conhecimentos representam uma
possibilidade de solução. Em relação ao “topos” do professor, ou seja, às
expectativas em relação ao trabalho do professor, identificamos a necessidade de
encontrar meios para reconhecer os conhecimentos prévios dos estudantes e criar
situações que se apoiem nesses conhecimentos para que estes possam auxiliar na
construção de novos conhecimentos. Apesar de deixar evidente que cabe ao
professor identificar os conhecimentos prévios dos estudantes e encontrar meios de
introduzir novos conhecimentos levando em conta a disponibilidade desses
conhecimentos, não encontramos nenhuma orientação que possa auxiliar o
professor no desenvolvimento desse trabalho. Lembramos aqui que, segundo
Moreira (2005), a noção de conhecimento prévio é a variável que mais influencia a
57
aprendizagem. No entanto, observamos que a aprendizagem significativa, ainda
conforme Moreira (2005) caracteriza-se pela interação entre o novo conhecimento e
o conhecimento prévio.
As observações acima deixam evidente que é preciso
preparar o professor para que ele seja capaz de reconhecer os conhecimentos
prévios de seus estudantes e criar situações adequadas para os diferentes grupos
com os quais ele trabalha, ou seja, o professor precisa conhecer diferentes
organizações praxeológicas para que possa construir aquelas que mais se adaptam
a um determinado grupo de estudantes. Parece-nos interessante que os estudantes
sejam capazes de reconhecer seus conhecimentos prévios e aplicá-los em
diferentes situações, mas certamente esse trabalho deve ser desenvolvido desde as
primeiras séries do Ensino Fundamental para que os estudantes do Ensino Médio
sejam capazes de construir seu próprio conhecimento como prevê o texto abaixo:
Construir seu conhecimento utilizando seus conhecimentos prévios a
partir da solução de situações propostas pelo professor; explicitar
seu trabalho e o de seus pares na solução das situações que lhe são
propostas; persistir e estimular seus colegas quando dificuldades se
apresentarem (BRASIL, 1998, p. 40).
A análise do documento mostra que existe uma grande expectativa de que os
estudantes ao final do Ensino Médio sejam capazes de construir seus
conhecimentos e apresentá-los coerentemente, cooperando com seus pares diante
de dificuldades. Mas para isso é preciso que os professores sejam preparados para
desenvolver as atividades que correspondem ao seu “topos” e que os estudantes
sejam alertados do papel que eles devem desempenhar no processo de ensino e
aprendizagem. Devemos considerar ainda as situações adversas encontradas nesse
processo tanto por professores como por estudantes, e é preciso encontrar novos
meios que facilitem a execução dessa proposta. Na sequência apresentamos a
expectativas descritas nos PCN+ para o papel a ser desempenhado pelo professor e
estudante do Ensino Médio.
3.3 OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO MÉDIO
(PCN+)
Inicialmente o PCN+ apresenta seus objetivos e enfatiza que não possui
pretensão normativa, tendo apenas a intenção de complementar os PCNEM,
58
oferecendo orientações educacionais, tendo em vista em sua essência o
desenvolvimento da escola em sua totalidade, concentrando-se assim nas
disciplinas da área de Ciências da Natureza, Matemática e suas tecnologias.
Descreve as mudanças do novo Ensino Médio apresentando alterações para que
este deixe de ser apenas uma fase preparatória para o Ensino Superior e assuma a
responsabilidade de complementar a Educação Básica, preparando os jovens para a
vida e também propiciando condições de continuidade na vida acadêmica e/ou de
enfrentar um mercado de trabalho extremamente competitivo. No documento se
destaca que, mesmo com as propostas de mudanças pelas quais o Ensino Médio
passa no Brasil e no mundo, essas novas propostas não menosprezaram as
disciplinas das áreas que lhe estão associadas – as Ciências da Natureza e
Matemática, Ciências Humanas, Linguagens e Códigos –, mas tentam suscitar a
interdisciplinaridade sem diluir e eliminar as disciplinas agregadas a essas áreas.
Segundo o documento, a função do Ensino Médio de complementar a
formação geral do estudante provoca uma ação articuladora sistêmica no interior de
cada área e em sua totalidade, de forma que existe a preocupação de dar sentido ao
conhecimento já no Ensino Médio por meio de situações contextualizadas que
necessitam da aplicação dos diferentes conhecimentos, por exemplo, relacionando
os conteúdos das disciplinas de Matemática e Física de modo que os estudantes
possam aplicar seus conhecimentos matemáticos para interpretar fenômenos físicos,
que podem ser considerados em situações de introdução de um novo conceito tanto
na disciplina de Matemática como na disciplina de Física, evitando o estudo
intradisciplinar que se desenvolveu durante um longo tempo.
Nas orientações do documento é possível identificar a atenção dada ao fato
de que a sociedade atual, que está condicionada a mudanças globais e
instantâneas, e na qual a informação tem sido gerada e propagada com uma
velocidade cada vez maior, necessita não somente de produzir um grande número
de dados, mas é preciso que o cidadão seja capaz de manipular e interpretar esses
dados transformando-os em conhecimento e agregando valor. O texto abaixo nos
descreve de forma mais detalhada as expectativas em relação às necessidades de
formação dos futuros cidadãos, ou seja, do “topos” que o estudante deve
desempenhar na escola e na sociedade.
59
O PCN+ aponta as transformações que estão ocorrendo nas escolas
posicionando o novo papel que professor e estudante devem desempenhar na
sociedade e destaca assim o novo significado da escola que precisa levar em conta
as necessidades da sociedade no desenvolvimento dos conhecimentos das
diferentes disciplinas que compõem áreas distintas, não restando fechada entre
seus muros sem se preocupar com seu entorno. Para isso, no documento podemos
identificar que os estudantes precisam assumir seu papel, porém para isso é preciso
que eles compreendam qual o papel da escola e do professor, ou seja,
necessitamos de estudos que mostrem como professores e estudantes podem se
apropriar de seus “topos” da forma como eles são definidos nos documentos oficiais.
Trata-se de propostas inovadoras e interessantes, mas que exigem um
preparo
dos
professores
e
estudantes
para
que
possam
ser
realmente
implementadas, não basta apenas descrevê-las no documento sem indicar como
trabalhá-las. A inovação do papel da escola articulada com as orientações contidas
nos PCNEM, contemplando elementos que não eram explicitamente abordados,
demonstra novas preocupações, em que cada disciplina foca um conjunto de
saberes, não se limitando apenas a determinados tópicos, mas articulando
competências gerais e habilidades no sentido formativo. Mas, para que esse
trabalho tenha resultado, temos ainda que realizar diversas pesquisas e preparar
professores e estudantes para essa nova forma de apropriação do conhecimento.
Apresentamos a seguir as propostas de Matemática Financeira para o Ensino
Médio identificando qual o “topos” esperado do professor e do estudante.
3.4 OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO MÉDIO
(PCN+) – PROPOSTAS PARA ENSINO DE MATEMÁTICA FINANCEIRA
Entre as inovações sugeridas pelo PCN+ está o envolvimento de cada escola
e professores por meio da criação de um projeto pedagógico que possibilite o
desenvolvimento das competências almejadas, em que diversos fatores influenciam
60
a constituição desse projeto, e a escolha dos temas ligados às disciplinas tem uma
importância definidora.
Entre as sugestões encontramos: a exploração dos conteúdos associados
aos diferentes temas, à identificação da articulação de diferentes formas do
pensamento matemático, a contextualização do conhecimento matemático e a
possibilidade de considerar as razões históricas que deram origem e importância a
esses conhecimentos, porém se observa a necessidade de escolhas organizadas e
coerentes para evitar um trabalho centrado apenas na quantidade de informações.
Segundo os PCN+, os temas escolhidos devem apresentar relevância científica e
cultural, ou seja, quando se consideram a origem e a importância histórica devemos
levar em conta o potencial explicativo do material escolhido de modo que os
estudantes possam compreender os princípios estéticos e éticos associados aos
fatos mundiais que deram origem e relevância ao fato matemático estudado. Essa
forma de tratamento da história pode auxiliar os professores no desenvolvimento das
tecnologias associadas às técnicas por eles utilizadas para o desenvolvimento das
tarefas possíveis de serem trabalhadas no Ensino Médio, tanto quando se reputam
as aplicações na própria Matemática como nas outras ciências.
No último caso é preciso que o professor fique atento para o fato de que o
estudante deve dispor de conhecimentos associados a esse novo campo de
aplicação da noção matemática que se deseja trabalhar. Os temas são agrupados
entre grandes eixos, a saber:
Álgebra: números e funções;
Geometria e medidas e Análise de dados
A noção de juros simples e compostos, objeto de estudo desta pesquisa,
encontra-se no bloco Álgebra: números e funções. Para essa noção a sugestão é
que se revisite a ideia de proporcionalidade e de juros simples e compostos, que já
deve ter sido trabalhada no Ensino Fundamental, articulando-a com o conceito de
função, ou seja, a noção de juros faz parte do bloco Álgebra: números e funções,
sendo articulada ao estudo das funções, que, conforme o PCN+ deve permitir que os
estudantes adquiram a linguagem algébrica justificando tratar-se da linguagem das
ciências. Em relação a esse citamos Chevallard (1994), que apresenta dois
61
exemplos de técnicas para a noção de proporcionalidade ressaltando que a
compreensão de uma noção difere segundo a técnica utilizada. Apresentamos
abaixo o exemplo proposto por Chevallard para mostrar duas técnicas que
sobrevivem atualmente no tocante à noção de proporcionalidade, ou seja, duas
praxeologias distintas para o tratamento dessa noção:
Fonte: CHEVALLARD, 1994, p. 6.
Além disso, sabemos que a álgebra se mostra bastante adequada para
modelar fenômenos intra e extrasmatemáticos e, em geral, seu ostensivo de
representação gráfica se mostra o mais adaptado para a interpretação e controle
dos resultados encontrados, principalmente para os tipos de tarefas trabalhadas no
Ensino Médio. Na sequência das sugestões para o desenvolvimento da noção de
função propõe-se abandonar o tratamento tradicional, em que se introduzem o
conjunto dos números reais e a noção intuitiva de conjuntos e suas operações e
relações, sendo a noção de função um caso particular da noção de relações entre
conjuntos, para dar ênfase à descrição de situações de dependência entre duas
grandezas, isto é, as situações contextualizadas que podem ser modeladas por meio
dos ostensivos de representação algébrica e representação gráfica que devem
permitir o planejamento, execução, justificação e controle do modelo desenvolvido.
Sugere-se ainda que se evite o tratamento formal excessivo, o que conduz ao
abandono das noções de funções injetoras, sobrejetoras e bijetoras, que, sendo
utilizadas para tratar problemas em computação e informática, poderiam ser
contextualizadas nesse campo, que é atualmente bastante escolhido pelos
estudantes que desejam continuar seus estudos, ou seja, parece que existe certa
tendência em trabalhar com situações cotidianas deixando à margem as situações
contextualizadas em outras ciências. Isso pode se explicar pela necessidade de
dispor de conhecimentos prévios associados a essas ciências. Segundo as
62
sugestões dos PCN+, o tratamento dessas propriedades das funções fica totalmente
a cargo do Ensino Superior, o que corresponde a uma mudança nas relações
institucionais anteriores a esse documento, que ainda precisa ser assimilada.
Mesmo não se tratando de um conceito que tem relação direta com a noção
desenvolvida na nossa pesquisa, ela se mostra importante para que possamos
compreender a importância de estar atento à ecologia dos conhecimentos
matemáticos nas diferentes propostas de ensino e aprendizagem. No documento é
dada ênfase ao fato de que as funções permitem uma vasta gama de aplicações que
podem ser retiradas do cotidiano e das outras ciências. Nele se coloca em evidência
que a Matemática Financeira é uma área de conhecimentos que permite a aplicação
das funções exponenciais e logarítmicas, a análise da variação entre duas variáveis
para as quais a variável independente tem crescimento muito rápido, ou seja, além
de sugerir a aplicação dessas funções no estudo da Matemática Financeira,
recomenda-se que se interpretem os resultados mostrando como se dá a variação
de uma grandeza em relação à outra. Aqui podemos observar a necessidade de
uma tecnologia associada à técnica para justificar os resultados encontrados.
Apresentamos a seguir as expectativas institucionais que estão sendo
implementadas no estado de São Paulo a partir de 2008.
3.5 A NOVA PROPOSTA CURRICULAR DO ESTADO DE SÃO PAULO
A nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo foi lançada em 2008 e
pretende ser inovadora e ousada, apoiando-se em vários materiais pedagógicos
(apostilas, jornais e DVDs) que foram distribuídos a todas as escolas da rede pública
do Estado de São Paulo, ou seja, observamos aqui a necessidade de melhor
explicitar as propostas anteriores, um papel que pretende desempenhar essa nova
proposta a partir de seu lançamento.Inicialmente foi distribuído o Jornal do Aluno
(caderno com atividades para que os estudantes revisitem conteúdos trabalhados
nas séries anteriores), que corresponde a um dos materiais pedagógicos
desenvolvidos nessa Nova Proposta que deveria ser utilizado nos primeiros
quarenta dias letivos do ano de 2008.
63
O objetivo desse jornal era oferecer subsídios para professores e estudantes
na realização das atividades em sala de aula, para ser trabalhada em um período
chamado de recuperação intensiva, que enfatizaria a leitura, a produção de textos
pelos alunos e a Matemática. Esse recurso foi apresentado de acordo com as
orientações que constam do texto abaixo:
O material foi dividido em fundamental e médio, por disciplina/série e
apresentava em seu teor o número específico de aulas necessárias
para a aplicação de cada conteúdo predeterminado e trouxe de
forma detalhada possibilidades de aplicação e de avaliação das
atividades propostas para o aluno portador do Jornal (SÃO PAULO,
2008, p. 50).
Na sequência da implantação da nova Proposta Curricular do Estado de São
Paulo, após o período de recuperação intensiva com uso do Jornal do Aluno,
Revista do Professor e Vídeos Tutoriais, todas as escolas da rede receberam da
Secretaria de Estado da Educação o novo material, “Caderno do Professor”, que
indicaria os conteúdos e a forma de tratamento destes, que deveriam ser
trabalhados por professores e estudantes no início do primeiro bimestre.
A introdução desses cadernos está associada à necessidade de garantir pelo
menos o trabalho sobre um conteúdo mínimo e uma relação institucional mais
uniforme para as diversas escolas do Estado de São Paulo, como podemos
observar no texto abaixo:
O texto de Apresentação da Cartilha vem assinado pela Secretaria
da Educação do Estado de São Paulo Maria Helena Guimarães de
Castro que justifica a necessidade de uma Proposta Curricular com a
seguinte frase: “A criação da Lei de Diretrizes e Bases (LDB), que
deu autonomia às escolas para que definissem seus próprios
projetos pedagógicos, foi um passo importante. Ao longo do tempo,
porém, essa tática descentralizada mostrou-se ineficiente” (SÃO
PAULO, 2008a, SP).
A nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo é constituída por:
Ciências da Natureza e suas Tecnologias – Biologia, Química e Física – Matemática
e Ciências Humanas e suas Tecnologias História, Geografia, Filosofia e Psicologia e
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias – Língua Portuguesa, Língua Estrangeira
Moderna, Arte e Educação Física.
64
Os objetivos essenciais expostos no documento pressupõem oferecer aos
estudantes uma formação vinculada com seu tempo, em que a escola assume uma
nova postura e uma aprendizagem que dá ênfase à articulação dos conteúdos e que
leve em conta o contexto cultural. O documento destaca ainda a importância do
saber fazer baseado na leitura e escrita, valorizando a produção de textos e
articulação das competências com a aprendizagem e o mundo do trabalho.
No texto abaixo identificamos as observações acima e mais uma vez
verificamos que existe uma preocupação para que se desenvolva uma relação
institucional com uma base comum de conhecimentos e competências nas diversas
escolas públicas estaduais de São Paulo.
A apresentação da Proposta Curricular do Estado de São Paulo está
dividida em dois tópicos: Uma educação à altura dos desafios
contemporâneos e Princípios para um currículo comprometido com o
seu tempo. (Este segundo tópico apresenta os seguintes itens: I)
Uma escola que também aprende; II) O currículo como espaço de
cultura; III) As competências como referência; IV) Prioridade para a
competência da leitura e da escrita; V) Articulação das competências
para aprender e VI) Articulação com o mundo do trabalho. Assegura
ainda que esta iniciativa procura “[...] garantir a todos uma base
comum de conhecimentos e competências, para que nossas escolas
funcionem de fato como uma rede [...]” priorizando a competência de
leitura e escrita (SÃO PAULO, 2008a, p.15).
Podemos observar que as sugestões apresentadas na proposta ressaltam
que o trabalho é uma forma de associar o currículo com a realidade enfrentada pelos
estudantes, bem como que o currículo contribui para o entendimento da importância
do trabalho. Além disso, observamos a necessidade de que todos os integrantes do
processo de ensino e aprendizagem tenham uma participação ativa e comprometida
para propiciar aos jovens condições de caminhar em uma nova sociedade, em que
alguns fatores vêm sendo alterados e inovados, por exemplo, a necessidade de
comprovar as competências aprendidas na escola, cujo papel é oferecer uma
educação de qualidade que possibilite a inserção dos indivíduos, em particular, os
mais pobres, na sociedade.
Atentamos que uma das preocupações da nova
Proposta Curricular do Estado de São Paulo é destacar que existe a necessidade de
as escolas públicas proporcionarem condições de aprendizado para que os
estudantes se apropriem do conhecimento de forma a se tornarem esclarecidos e
65
saberem utilizar o conhecimento obtido na escola para agregar valores e enfrentar
os desafios da sociedade moderna.
Adverte que “[...] não há liberdade sem possibilidade de escolhas
[...]”, portanto é necessário que os alunos tenham “[...] acesso a um
amplo conhecimento dado por uma educação geral, articuladora, que
transite entre o local e o mundial [...]” (SÃO PAULO, 2008a, p. 11).
A Proposta Curricular ora discutida apresenta como princípios
centrais: “[...] a escola que aprende, o currículo como espaço de
cultura, as competências como eixo de aprendizagem, a prioridade
da competência de leitura e de escrita, a articulação das
competências para aprender e a contextualização no mundo do
trabalho” (SÃO PAULO, 2008a, p. 11). Tendo um currículo que
promove a aprendizagem de competências e habilidades, a atuação
do professor, os conteúdos propostos, as metodologias e a
aprendizagem dos alunos compõem um sistema comprometido com
a formação de crianças e jovens em adultos aptos a exercer suas
responsabilidades – trabalhar, constituir uma família e ser autônomo
– e com condições de atuar na sociedade de forma produtiva (SÃO
PAULO 2008a, p. 13).
A principal característica dessa nova Proposta é desenvolver um currículo que
favoreça o desenvolvimento de competências e habilidades em que o “topos” do
professor e do estudante está centrado na responsabilidade e comprometimento de
ambos para que possam executar o projeto pedagógico em uma ação orquestrada
em que cada um cumpre seu papel, o que deve conduzir os estudantes à aplicação
dos conhecimentos aprendidos na escola de forma autônoma e produtiva no
contexto social e cultural que o cerca.Observa-se também que essa nova proposta
permite identificar um novo “topos” do professor que deve analisar as necessidades
dos diferentes grupos de estudantes e propor um trabalho que leve em conta seus
conhecimentos prévios e que permita a inserção de todos evitando as
desigualdades. Para isso, supõe-se que o professor encontre meios para estimular
os mais frágeis criando uma diversidade de tratamentos, isto é, não se escolhe um
tratamento igual para todos, mas procura-se manter pelo menos uma base comum.
Certamente cabe ao professor buscar novas estratégias e metodologias para
trabalhar essas diversidades.
Este currículo amparado no conceito de competências propõe que a
escola e o professor indiquem claramente o que o aluno vai
aprender, o que é indispensável que este aluno aprenda, garantindo
desta forma a todos “[...] igualdade de oportunidades, diversidade de
66
tratamento e unidade de resultados. Quando os pontos de partida
são diferentes, é preciso tratar diferentemente os desiguais para
garantir a todos uma base comum” (SÃO PAULO, 2008a, p. 15).
Os propósitos apresentados na nova Proposta Curricular do Estado de São
Paulo lembram a autonomia concedida às escolas pela Lei de Diretrizes e Bases
para que definam seus próprios projetos pedagógicos. Passo importante e inovador
diante da heterogeneidade da população estudantil brasileira. O documento oferece
subsídios aos profissionais ligados à educação. Notamos que a preocupação central
do documento está em realizar um amplo levantamento do acervo documental e
técnico pedagógico existente e envolver escolas e professores com o objetivo de
sistematizar e compartilhar boas práticas articulando sucessos anteriores e novos
para uma significativa contribuição a todos os estudantes.
Identificamos princípios para promover uma escola que permita a promoção
de competências necessárias aos estudantes para que estes tenham condições de
enfrentar os novos desafios sociais e globais. Entre os objetivos da Nova Proposta
Curricular do Estado de São Paulo está o de aproximar conteúdos escolares com o
universo da cultura buscando instrumentos que deem aos estudantes condições de
enfrentar o mercado de trabalho. Uma das características da nova proposta é
manter a Matemática como uma área específica, proposta que sobreviveu a várias
sugestões passageiras e que hoje é ponto de partida para atualizações e novas
práticas.
No Estado de São Paulo, nas propostas curriculares elaboradas a
partir de 1986 e em vigor até o presente momento, a Matemática era
apresentada como uma área específica. Tais propostas constituíram
um esforço expressivo, e em alguns sentidos pioneiro, na busca de
uma aproximação entre os conteúdos escolares e o universo da
cultura, especialmente no que tange às contextualizações e à busca
de uma instrumentação crítica para o mundo do trabalho. Essa rica
herança pedagógica sobreviveu a uma avalanche de novidades
passageiras e serve agora de ponto de partida para que,
incorporadas as necessárias atualizações, novos passos sejam
dados para sua efetivação nas práticas escolares. Particularmente
no que tange às áreas em que se organiza, a nova proposta inspirouse na anterior, mantendo a área de Matemática como um terreno
específico, distinto tanto das Linguagens quanto das Ciências
Naturais (SÃO PAULO, 2008, p. 38).
67
Na sequência, o texto releva e resgata a posição da Matemática em outras
épocas apresentando a posição da Matemática e língua materna que em todas
essas propostas têm sido consideradas como eixo fundamental para a formação do
cidadão. Tendo afinidade ou não com a Matemática, as crianças estudam essa
ciência durante toda a Educação Básica e a utilizam de forma consciente ou não em
sua vida cotidiana, pois em nossa sociedade todas as pessoas direta ou
indiretamente lidam com números, medidas, gráficos nas mais variadas situações,
por exemplo, nas decisões de compra e venda em que os conhecimentos
matemáticos os auxiliam nas tomadas de decisões. O texto acima justifica a
manutenção de uma área específica para a Matemática e seu papel de ferramenta
para resolução de problemas em outras ciências, o que permite tratar exemplos
contextualizados, principalmente no Ensino Médio em que podemos articular os
conhecimentos matemáticos com os desenvolvidos nas disciplinas de física,
química, biologia, desde que os estudantes disponham de conhecimentos básicos
sobre essas ciências. Ou seja, quando existe a possibilidade de um trabalho
interdisciplinar, que vem sendo incentivado e que pode contribuir para incentivar os
estudantes a encontrar as relações entre os conhecimentos desenvolvidos nas
diferentes disciplinas, cabe ao professor buscar novas estratégias para favorecer
esse trabalho. Observamos ainda que os conteúdos matemáticos estão distribuídos
por séries e bimestre e que para as noções de função exponencial e logarítmica
supõe-se que sejam desenvolvidas no 3.º bimestre da 1.ª série do Ensino Médio e é
nesse momento que podemos trabalhar as noções de juros compostos. Mesmo se
esse trabalho não é proposto explicitamente nos documentos e cadernos,
lembramos aqui que se trata de uma aplicação muito frequente na vida cotidiana e
que pode auxiliar os estudantes a melhor exercer sua cidadania, pois estes são
constantemente bombardeados com propagandas que não correspondem à
realidade, as quais muitos deles não são capazes de avaliar corretamente.




Função exponencial e logarítmica
Crescimento exponencial
Função exponencial, equações e inequações.
Logaritmos
68
Nesse momento, os professores poderiam recorrer a essas propagandas para
contextualizar o trabalho com as funções exponenciais e logarítmicas e mostrar sua
utilidade, mesmo para aqueles que não desejam continuar seus estudos ou que se
interessa por áreas em que não é necessário conhecimento específico desse tipo de
função. Considerando as necessidades para o desenvolvimento da disciplina de
Matemática Financeira nos cursos de Administração, identificamos, via planos de
ensino de duas universidades públicas, Universidade Federal do Amazonas e
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e duas universidades privadas,
Fundação Getúlio Vargas – Escola de Administração de Empresas de São Paulo e
Faculdade das Américas, que conhecimentos matemáticos trabalhados durante a
Educação Básica são supostos disponíveis ou se esses são revisitados durante a
introdução de novos conhecimentos de forma a auxiliar os estudantes na solução de
tarefas que serão submetidos durante sua vida escolar e profissional.
Apresentamos a seguir as análises realizadas nos planos de ensino das
quatro universidades citadas acima.
3.6 ESTUDOS DE QUATRO PLANOS DE ENSINO DE UNIVERSIDADES
PÚBLICAS E PRIVADAS
A análise dos quatro planos de ensino nos auxilia a compreender quais as
relações institucionais esperadas dos estudantes do Ensino Superior e se existe
uma preocupação em revisitar as noções de juros simples e compostos associandoas aos novos conhecimentos ou se elas são supostas disponíveis e consideradas
apenas como parte do “topos” do estudante, que deverá se apropriar desses
conhecimentos
de
forma
autônoma.
Procuramos
assim
identificar
nesses
documentos qual a relação institucional esperada dos estudantes dos cursos de
Administração quando se trabalha com Matemática Financeira e como os
conhecimentos matemáticos desenvolvidos no Ensino Médio são considerados
nessas propostas, ou seja, são supostos disponíveis ou são revisitados por meio de
exemplos específicos da disciplina, ou melhor, existe uma preocupação em
contextualizar a Matemática que se supõe tenha sido desenvolvida na Educação
Básica.
69
Observamos assim qual o “topos” esperado dos professores e estudantes
tanto do ponto de vista das noções matemáticas trabalhadas nesses cursos como do
trabalho didático que os professores devem realizar ao qual se espera que os
estudantes se submetam.
Para isso, consideramos nos conteúdos propostos se existem sugestões para
o tratamento das noções de juros simples e compostos. Essa análise é levada em
conta em função da bibliografia básica e complementar encontrada nesses
documentos, ou seja, isso nos permite identificar quais as relações institucionais
esperadas para o desenvolvimento das noções de juros simples e composto e como
essas noções devem ser reputadas e trabalhadas. Para identificar o “topos” de
professores e estudantes quanto ao trabalho didático a ser realizado, foram
considerados a metodologia proposta e o processo de avaliação.Os resultados
dessas análises são cruzados com os encontrados para o Ensino Médio e assim
respondemos a questão: Existe uma coerência entre o que é proposto para o Ensino
Médio e Superior?
No quadro abaixo, apresentamos as universidades escolhidas, sobre as quais
encontramos material na internet ou que professores disponibilizaram esse material.




Universidade Federal do Amazonas
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Fundação Getúlio Vargas – Escola de Administração de Empresas de São Paulo
Faculdade das Américas
Apresentamos na sequência o estudo do trabalho esperado de professores e
estudantes do Ensino Superior via planos de ensino das universidades citadas
acima.
3.7 ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DE DUAS UNIVERSIDADES FEDERAIS E
DUAS UNIVERSIDADES PRIVADAS
Nessa análise identificamos inicialmente se existe coerência entre os planos
de ensino, das universidades consideradas e as orientações apresentadas nas
Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de graduação em Administração
(anexo 1), quando se considera a noção de juros simples e compostos.
70
Verificamos também, nesses mesmos planos de ensino, qual a proposta para
o “topos” do professor e do estudante. Essa análise será fundamentada na
metodologia de ensino indicada nesses planos. Outra preocupação foi verificar que
conceitos são revisitados e quais os assuntos trabalhados pela primeira vez. Para
essa tarefa, identificamos nos conteúdos propostos se existem sugestões para o
tratamento das noções de juros simples e compostos ou se essas noções são
tratadas como conhecimentos disponíveis.Outro aspecto da análise dos planos de
ensino é verificar se o conteúdo programático indicado é coerente com o
desenvolvido nos livros didáticos que constituem a bibliografia básica e
complementar. Iniciamos pela análise do plano de ensino da Universidade Federal
do Amazonas (UFAM).
3.7.1
ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO
AMAZONAS (UFAM)
Para facilitar o entendimento de nossa análise preparamos dois quadros: o
primeiro demonstrando o que é indicado pelas Diretrizes Curriculares do Curso de
Graduação em Administração e, em seguida, outro quadro apresentando o plano de
ensino da UFAM (anexo 2), finalizando com uma análise centrada na identificação
do “topos” do professor e do estudante e na forma como é proposto o trabalho com
as noções de juros simples e compostos.
3.7.2
DIRETRIZES CURRICULARES DO CURSO DE ADMINISTRAÇÃO DE
EMPRESAS
O quadro abaixo demonstra os conteúdos curriculares indicados nas
Diretrizes Curriculares para os cursos de Administração de Empresas.
Os cursos de graduação em Administração deverão contemplar, em seus projetos
pedagógicos e em sua organização curricular, conteúdos que atendam aos seguintes
campos interligados de formação:
I – Conteúdos de Formação Básica: estudos relacionados com as Ciências Sociais, a
Filosofia, a Psicologia, a Ética, a Política, o Comportamento, a Linguagem, a Comunicação e
71
Informação;II – Conteúdos de Formação Profissional, compreendendo Estudos da Teoria da
Administração e das Organizações e suas respectivas funções, dos Fenômenos
Empresariais, Gerenciais, Organizacionais, Estratégicos e Ambientais, estabelecidas suas
inter-relações com a realidade social, objetivando uma visão crítica da validade de suas
dimensões, bem como os aspectos legais e contábeis;
III – Conteúdos de Formação Complementar, compreendendo Estudos Econômicos,
Financeiros e de Mercado, e suas inter-relações com a realidade nacional e internacional,
segundo uma perspectiva histórica e contextualizada de sua aplicabilidade no âmbito das
organizações e na utilização de novas tecnologias;
IV – Conteúdos de Estudos Quantitativos e suas Tecnologias, abrangendo Pesquisa
Operacional, Teoria dos Jogos, Modelos Matemáticos e Estatísticos e aplicação de
tecnologias que contribuam para a definição e utilização de estratégias e procedimentos
inerentes à Administração.
Fonte: Diretrizes Curriculares do Curso de Administração. Parecer n. 67 CES/CNE 0146/2002, p. 15.
Atentamos que não existe uma preocupação específica em propor conteúdos
para as disciplinas dos cursos de Administração e que as orientações dão ênfase à
inter-relação entre conteúdos básicos, de formação profissional e complementar,
assim como os estudos quantitativos associados às tecnologias, que permitam a
utilização de estratégias e procedimentos próprios à Administração. Esse trabalho
faz parte do “topos” dos professores que compõem o grupo e que deverão organizar
os diferentes conteúdos de forma a integrá-los conforme a proposta acima.
Observamos ainda que existe a preocupação em propiciar ao egresso do curso de
Administração condições de ser flexível ao tratar situações inesperadas e
divergentes em seu campo de atuação.
3.7.3
PLANO DE ENSINO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
Os objetivos do plano de ensino da UFAM:
Desenvolver a capacidade de raciocinar em termos financeiros, ou seja, com referência à
diferenciação do valor do dinheiro no tempo; Desenvolver a capacidade de manipular fluxos de caixa
com vistas a avaliar valores presentes e futuros de entradas e saídas de recursos financeiros em uma
empresa; Dominar a metodologia de consulta às Tabelas Financeiras e o manuseio de calculadora
financeira.
Fonte: Plano de Ensino da Universidade Federal do Amazonas, 2007, p. 1.
72
A metodologia:
Aulas expositivas com auxílio do quadro branco, pincéis e retroprojetor.
Utilização, pelos alunos, de Tabelas Financeiras e de Calculadora Financeira para dar suporte ao
aprendizado dos métodos e técnicas expostos em sala de aula.
Realização de trabalhos em grupo na própria classe, para consolidar a compreensão dos conceitos,
métodos e técnicas ensinados nas aulas expositivas.
Consulta, pelos alunos, da Biblioteca e da Internet.
Fonte: Plano de Ensino da Universidade Federal do Amazonas, 2007, p. 1.
A análise do plano de ensino da UFAM permite verificar que existe coerência
com o sugerido pelas Diretrizes Curriculares do Curso de Administração, sendo
muito importante o entendimento da participação da relação do dinheiro no tempo
perante as flutuações do mercado financeiro nacional e internacional. O
conhecimento da capitalização linear e exponencial, ou seja, juros simples e juros
compostos possibilitam uma visão sobre os fatos financeiros e contábeis e suas
repercussões na sociedade como um todo, proporcionando ao estudante o exercício
de cidadania quando diante de negociações de compra venda e ou financiamentos.
Isso permite considerar que o “topos” esperado do estudante de
Administração está associado à capacidade de entender os processos gerenciais
econômicos financeiros e de produção. Essa competência é privilegiada no plano de
ensino da UFAM. Atentamos que as Diretrizes Curriculares sugerem processos para
aprendizagem
do
estudante
diante
de
novas
realidades
em
um
mundo
organizacional competitivo. Identificamos no plano de ensino da UFAM a
preocupação em desenvolver condições para que o estudante seja capaz de pensar
financeiramente, articulando a relação do dinheiro no tempo, e entender a
necessária importância do papel dos recursos financeiros para a sobrevivência das
organizações. Outro aspecto da análise dos planos de ensino é verificar se o
conteúdo programático indicado é coerente com o desenvolvido nos livros didáticos,
relação dos conhecimentos existentes, que constituem a bibliografia básica e
complementar e que permite observar se existe uma preocupação de revisitar as
noções de juros simples e compostos desenvolvidos no Ensino Médio.
73
Para isso, identificamos os dois livros apontados na bibliografia básica –
Abelardo de Lima Puccini, Matemática financeira objetiva e aplicada, mencionado
neste trabalho por livro 1, e José Dutra Vieira Sobrinho, Manual de aplicações
financeiras HP-12C, indicado neste trabalho como livro 2.
No livro 2, nota-se que ocorre um forte destaque para o uso da Calculadora
Financeira HP12C, o que reflete bem as habilidades esperadas pelas empresas dos
egressos do curso de administração. Nesse livro, as noções de juros simples e
compostos são supostas disponíveis, ficando a cargo de o professor revisitá-las
quando necessário ou simplesmente deixar esse trabalho sob a responsabilidade
dos estudantes, ou ainda indicar outros meios que os auxiliem a se apropriar desses
conhecimentos. No livro 2, a ênfase é dada para a resolução de problemas
direcionados ao mercado imobiliário e bancário. Nesse caso, as noções de juros
simples e compostos também são supostas disponíveis.As indicações bibliográficas
deixam evidente que se espera que os estudantes disponham das ferramentas
matemáticas necessárias para o desenvolvimento dos conteúdos de matemática
financeira nos diferentes contextos associados à profissão do administrador.
3.7.4
COMENTÁRIOS E ANÁLISES
Observamos que existe certa coerência entre as Diretrizes Curriculares e o
Plano de Ensino da UFAM e que as noções de juros simples e compostos são
supostas disponíveis se considerarmos os livros indicados na bibliografia básica.
No entanto, existe a possibilidade de revisitar esses conteúdos, uma vez que
no apêndice dessas obras essas noções são consideradas por meio de fórmulas e
exemplos, o que indica a necessidade de um trabalho autônomo específico que fica
a cargo dos estudantes que não dispõem desses conhecimentos, ou seja, revisitar
conhecimentos prévios supostos disponíveis corresponde ao “topos” do estudante.
Na bibliografia complementar são sugeridos outros livros de Matemática
Financeira aplicada à análise de investimento, o que corresponde à capacidade de
transferir conhecimentos da vida e de experiências cotidianas para o campo
profissional, como indicam as Diretrizes Curriculares do Curso de Administração.
74
As análises mostram coerência entre as indicações das Diretrizes
Curriculares e o plano de ensino da UFAM, deixando evidente que as noções de
juros simples e compostos são consideradas como conhecimentos prévios
disponíveis, ficando a cargo de o professor revisitá-las, ou deixando esse trabalho
para os estudantes, que nessa etapa escolar se supõe tenham autonomia suficiente
para identificar suas dificuldades e procurar meios para superá-las.
Apresentamos a seguir as análises do plano de ensino da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS (anexo 3).
3.8 ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO
GRANDE DO SUL – INSTITUTO DE MATEMÁTICA – DEPARTAMENTO DE
MATEMÁTICA PURA E APLICADA
Seguindo a mesma organização para a análise, apresentamos apenas um
quadro com o plano de ensino da UFRGS e alguns comentários conforme nossa
proposta inicial.
Os objetivos do plano de ensino da UFRGS:
Entender e resolver os problemas de empréstimos financeiros mais usuais do mercado financeiro
através dos conceitos da Matemática Financeira.
Valer-se tanto de fórmulas quanto de recursos de cálculo pré-programados encontrados em
calculadoras financeiras para a solução dos problemas com empréstimos financeiros.
Fonte: Plano de Ensino da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2008, p. 1.
A metodologia:
O principal recurso didático é o de aulas expositivas. O conteúdo enfocará sempre
aplicações práticas do mundo dos negócios. As provas de avaliação serão antecedidas por
aulas de revisão da matéria. O uso da calculadora financeira será o principal instrumento de
apoio.
Fonte: Plano de Ensino da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2008, p. 1.
75
A análise das Diretrizes Curriculares do Curso de Administração e do Plano
de Ensino da UFRGS permite identificar que o objetivo do Curso de Administração
dá ênfase às aplicações voltadas para o mundo dos negócios, o que coincide com
indicações das Diretrizes Curriculares. É possível identificar como “topos” do
professor a necessidade de revisitar os conteúdos desenvolvidos durante o curso
antes das avaliações. Nesse caso, podemos supor que as noções de juros simples e
compostos também podem ser revisitadas nas aulas durante o curso. Ao identificar
as relações institucionais esperadas em função dos livros didáticos considerados na
bibliografia básica, observamos que existe uma preocupação constante em revisitar
as noções matemáticas trabalhadas no Ensino Médio de forma contextualizada e,
quando possível, utilizando ferramentas de informática que integram o campo
profissional, como o Aplicativo Microsoft Excel.
3.8.1
COMENTÁRIOS E ANÁLISES
A análise dos objetivos e da metodologia propostos no plano de ensino da
UFRGS permite concluir que existe coerência com as indicações das Diretrizes
Curriculares do Curso de Administração. Em relação ao conteúdo, cabe também ao
professor escolher a melhor maneira de trabalhá-lo, e as noções de juros simples e
compostos parecem ser objeto de estudo quando os estudantes encontram
dificuldades, pois se considera um momento para revisão dos conteúdos antes das
avaliações, e podemos supor que nessas revisões é possível revisitar noções e
conceitos matemáticos que apresentam dificuldades para os estudantes.Além disso,
podemos mais uma vez considerar que esses estudantes têm autonomia suficiente
para procurar outros meios para superar as dificuldades encontradas, principalmente
aquelas
associadas
à
falta
de
conhecimentos
prévios
supostos
disponíveis.Apresentamos a seguir as análises propostas para o Curso de
Administração da Faculdade das Américas.
3.9 ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DAS FACULDADES DAS AMÉRICAS
Dando continuidade à análise de planos de ensino das universidades
escolhidas, consideramos agora a Faculdade das Américas (anexo 4), uma
instituição privada de Ensino Superior localizada no interior de São Paulo.
76
Expomos abaixo os objetivos indicados no plano de ensino do Curso de
Administração da Faculdade das Américas para verificar se ele é coerente com as
Diretrizes Curriculares do curso.
Os objetivos do plano de ensino da Faculdade das Américas:
Fornecer subsídios para que o estudante seja capaz de agir, refletir, encontrar soluções para
situações novas, saber pesquisar, dominar técnicas e conceitos de matemática financeira. Analisar e
solucionar problemas que envolvam decisões quanto ao uso de dinheiro no tempo, tanto para as
empresas
como
para
os
cidadãos.
Fonte: Plano de Ensino da Faculdade das Américas, 2009, p. 1.
O objetivo do curso é coerente com a proposta das Diretrizes Curriculares do
Curso de Administração, deixando claro que o egresso deste curso deve estar
preparado para solucionar problemas que envolvam decisões sobre as melhores
formas de utilização do dinheiro tanto para a aplicação no desenvolvimento das
empresas como para suas próprias escolhas enquanto cidadão. Para isso, cabe ao
estudante realizar trabalhos individuais e em grupos para complementar os estudos
desenvolvidos em sala de aula com o professor, isto é, o professor desenvolve o
conteúdo e propõe trabalhos para que os estudantes ampliem seus conhecimentos,
aprendam a trabalhar em grupo e se tornem autônomos, sendo capazes de resolver
situações escolares e profissionais para as quais eles deverão apresentar as
competências necessárias no final do curso. Observamos também que cabe ao
professor identificar os conteúdos que não são disponíveis e revisitá-los de modo
que a interação entre conhecimentos prévios e novos conhecimentos tornem os
primeiros mais ricos, mais diferenciados, mais elaborados em termos e significados,
e os segundos possam adquirir significado para o aprendiz, conforme afirma Moreira
(2005).Ressaltamos ainda que a bibliografia básica do curso é composta pelas
mesmas obras das universidades públicas aqui analisadas, ou seja, a relação
institucional esperada para o desenvolvimento do curso varia em função do trabalho
do professor e dos estudantes, ou seja, os livros podem auxiliar tanto professor
como estudante no desenvolvimento de uma relação pessoal aos objetos de
Matemática Financeira propostos no curso.
77
Ressaltamos ainda que esse curso, assim como os que já foram analisados,
considera importante o uso da calculadora financeira, e que esse recurso faz parte
do contexto diário das empresas, devendo assim ser reputado como mais uma
competência para os estudantes dos Cursos de Administração.
3.9.1 COMENTÁRIOS E ANÁLISE
A análise do plano de ensino da Faculdade das Américas permite considerar
que cabe ao professor identificar as dificuldades de seus estudantes e utilizar novas
estratégias para propor situações e tarefas que permitam que os estudantes
adquiram as competências necessárias para utilizar a Matemática Financeira como
uma ferramenta de trabalho que possa auxiliá-los na solução de problemas tanto
empresariais como cotidianos, bem como escolher a melhor forma de pagamento na
compra de uma determinada mercadoria. Certamente esse trabalho não fica
somente a cargo do professor; os estudantes também podem propor novas
situações que permitam ampliar seus conhecimentos e que os tornem autônomos na
análise e decisão do valor do dinheiro no tempo. Apresentamos a seguir uma breve
discussão sobre o que se espera do trabalho do professor e do estudante quando se
considera a disciplina de Matemática Financeira para o Curso de Administração da
Fundação Getulio Vargas – SP, uma das mais renomadas instituições dessa área.
3.10 PLANO DE ENSINO DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS – SÃO PAULO
Iniciamos com a apresentação da cópia dos objetivos do curso de Matemática
Financeira da Fundação Getulio Vargas – SP – FGV-SP (anexo 5).
Objetivos do plano de ensino da FGV-SP:
Esta disciplina tem por objetivo ensinar o aluno as diversas formas de fazer financiamentos
e analisar investimentos como funções do valor do dinheiro no tempo.
Ensinar o aluno a utilizar calculadora financeira e algumas funções financeiras do Excel.
Instrumentar o aluno com ferramentas básicas para poder entender o valor do dinheiro no
tempo e através disso poder avaliar a conveniência de financiamentos e investimentos e
encontrar as melhores alternativas para cada caso, tanto do lado do agente financeiro
quanto de seu cliente ou parceiro.
78
Acompanhar e decidir sobre a melhor alternativa a cada momento de financiamentos e
projetos de investimentos de longo prazo que requerem intervenções pela mudança das
situações de mercado verificadas ao início.
Desenvolver nos alunos a lógica do raciocínio dedutivo e indutivo próprio dos assuntos
relacionados à Matemática Financeira e ampliar o uso desse raciocínio a outras situações
de negócios e do dia a dia.
Fonte: Plano de Ensino da Fundação Getúlio Vargas – SP, 2009, p. 1.
Considerando o plano de ensino apresentado acima, verificamos que, ao
descrever que o objetivo é o estudante aprender as diversas formas de
financiamentos e investimentos utilizando calculadora financeira e Excel, cabe ao
professor propor situações que permitam trabalhar com esse material e supõe-se
que os estudantes já disponham das noções de juros simples e compostos e
possam utilizá-las nessas situações. Espera-se ainda que os estudantes se tornem
autônomos e sejam capazes de aplicar a lógica do raciocínio dedutivo e indutivo em
situações de negócios e do cotidiano.Comportamento esperado de professores e
estudantes – Compromisso de ética entre professores e estudantes:
Respeito do professor a todos os alunos, preparando-se para as aulas, respondendo às dúvidas dos
alunos e avaliando-os com isenção e imparcialidade, e procurando ajudá-los no que estiver ao seu
alcance.
Respeito dos alunos ao professor e aos seus colegas comportando-se nas aulas de maneira a não
prejudicar seu andamento normal e enriquecendo sempre que possível com perguntas e dúvidas
pertinentes aos assuntos que estão sendo tratados.
Preparar-se para as aulas de maneira a aproveitar ao máximo os ensinamentos oferecidos.
Realização das provas por parte dos alunos de maneira totalmente individual sem procurar
vantagens ilícitas, de modo a representar nas provas o caráter que prevalecerá no exercício de
suas profissões e de seu comportamento perante a sociedade.
Fonte: Plano de ensino da Fundação Getulio Vargas, 2009, p. 1.
No plano de ensino da Fundação Getulio Vargas-SP encontramos a descrição
explícita do comportamento esperado dos professores e estudantes, em que é
possível identificar que cabe ao professor identificar as dificuldades dos estudantes
e encontrar estratégias para auxiliá-los.
Mas o estudante também é responsável por sua aprendizagem devendo se
preparar para as aulas e mesmo enriquecê-las com perguntas pertinentes, ou seja, o
estudante deve ser autônomo e ter responsabilidade por sua aprendizagem não
esperando que todo o trabalho fique a cargo do professor e possa ser objeto de
79
estudo somente em sala de aula. Essa explicitação do “topos” do professor e do
estudante é importante para a aprendizagem, pois deixa evidente que no processo
de ensino e aprendizagem é preciso que todos desenvolvam seu papel e se
respeitem. Finalizando a análise de planos de ensino,atentamos que a Fundação
Getulio Vargas apresenta algumas peculiaridades e similaridades.Entre as
semelhanças com os planos de ensino das outras duas Universidades e da
Faculdade analisados, percebemos a preocupação em seguir as sugestões das
Diretrizes Curriculares do Curso de Administração, destacando o uso do aplicativo
Excel e da calculadora financeira HP 12C, no que se refere a posicionar o estudante
diante das inovações tecnológicas, segundo o texto abaixo:
Conteúdos de Estudos Quantitativos e suas Tecnologias,
abrangendo Pesquisa Operacional, Teoria dos Jogos, Modelos
Matemáticos e Estatísticos e aplicação de tecnologias que
contribuam para a definição e utilização de estratégias e
procedimentos inerentes à Administração (Parecer n. 67 CES/CNE
0146/2002, p. 15).
Analisando as associações entre plano de ensino e Diretrizes Curriculares do
Curso de Administração verifica-se que um dos destaques é possibilitar aos
estudantes a apropriação de avaliação de financiamentos e investimentos, fato esse
que não ficou muito explícito nos planos de ensino das outras instituições
analisadas. A grande distinção do plano de ensino da Fundação Getulio Vargas com
os outros planos aqui examinados está no fato de que o plano da Fundação prevê o
comportamento esperado para professores e estudantes por meio do “Compromisso
de Ética entre Professores e Estudantes”, que deixa evidente qual o “topo” do
professor e do estudante desse curso, pois se trata de um compromisso válido para
todas as disciplinas do curso.Isso conduz o estudante a desenvolver uma forma de
trabalho, pois lhe é cobrada a responsabilidade pelo seu aprendizado explicitamente
por meio desse compromisso.
Finalmente, identificamos que, ao analisarmos as relações institucionais
esperadas em função dos conteúdos a serem trabalhados e dos livros didáticos
indicados na bibliografia básica, existe pouca diferença entre os quatro cursos e que
as mesmas estão diretamente associadas ao trabalho de professores e estudantes
80
no desenvolvimento do curso e na responsabilidade individual de cada um, como
deixa evidente o termo de compromisso desse curso.
3.10.1 COMENTÁRIOS E ANÁLISES
O estudo do Plano de Ensino da Fundação Getulio Vargas – Escola de
Administração de Empresas de São Paulo-SP apresenta como diferencial em
relação aos três outros analisados acima a introdução do “Compromisso de Ética
entre Professores e Estudantes”, que coloca em evidência a existência de um papel
para o professor e para o estudante no processo de ensino e aprendizagem, e
ambos devem trabalhar de forma orquestrada para não provocar ruídos que
prejudiquem o bom desenvolvimento da disciplina em particular e do curso de um
modo geral. Na sequência, fazemos algumas considerações sobre o capítulo no qual
analisamos o “topos” do professor e dos estudantes nos documentos oficiais, ou
seja, qual o papel que eles devem desempenhar segundo as propostas oficiais.
3.11 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Verificamos que existe uma preocupação institucional em propor mudanças
tanto para “topos” do professor como para o “topos” dos estudantes, em que o
primeiro deve desenvolver seu trabalho como orientador de tarefas que permitam
que
os
estudantes
encontrem
suas
próprias
soluções,
utilizando
seus
conhecimentos prévios e procurando novas situações que os permitam adquirir
autonomia para controlar sua aprendizagem, sendo essa uma competência
importante para sua atuação na sociedade e no mundo do trabalho.No entanto, essa
nova relação institucional não é simples de alcançar e conduz à necessidade de
pesquisas e propostas de cursos que auxiliem os professores a desenvolver
atividades constituídas de situações contextualizadas como propõem os documentos
oficiais, mas que dão poucas orientações sobre como desenvolver esse trabalho.
Apesar de os cadernos da Nova Proposta do Estado de São Paulo ter sido
construídos
sob
essa
óptica
e
apresentarem
exemplos
de
situações
contextualizadas, observamos que neles os conhecimentos prévios dos estudantes
81
são considerados uniformes e podem dificultar o trabalho dos professores quando
isso não ocorrer.Para os planos de ensino analisados verificamos que o principal
recurso didático são as aulas expositivas. no tocante ao conteúdo nos quatro planos
estudados, ocorre uma ênfase em aplicações práticas do mundo dos negócios.
Outro fato que observamos foi o uso da calculadora financeira HP12C; todos os
planos examinados induzem ao uso da máquina, e também há forte preocupação de
posicionar o estudante diante das relações do dinheiro no tempo.Notamos que de
uma forma geral nos planos analisados não existe explicitamente uma preocupação
em revisitar conceitos recorrentes, ficando a cargo do professor identificar as
dificuldades associadas a esses conceitos e propor estratégias que possibilitem o
avanço dos estudantes, que também são responsáveis por seu próprio
desenvolvimento e devem ser capazes de identificar dificuldades e procurar meio de
superá-las.
82
Capítulo 4
OS TIPOS DE TAREFAS SOBRE JUROS SIMPLES
E COMPOSTOS QUE SUSTENTAM AS RELAÇÕES
INSTITUCIONAIS DO ENSINO MÉDIO
E SUPERIOR
4.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Neste capítulo estudamos os tipos de tarefas que alimentam as relações
institucionais sobre as noções de juros simples e compostos tanto no Ensino Médio
como no Ensino Superior.
Para isso, a partir dos diferentes tipos de tarefas identificadas para essas
duas etapas escolares construíram uma grade de análise que permite identificar o
tipo de situação exposta no enunciado, os quadros em que a tarefa é enunciada e
aqueles que possibilitam sua solução, os ostensivos manipulados na execução das
tarefas e os não ostensivos evocados neste trabalho, o nível de conhecimento
esperado dos estudantes tanto em relação ao novo conhecimento como aos
conhecimentos prévios necessários para o desenvolvimento da tarefa. Essa grade
foi construída a partir da grade apresentada por Dias (1998), em sua tese que trata
da articulação de pontos de vista cartesiano e paramétrico no ensino de Álgebra
Linear.Antes de apresentar os tipos de tarefa com exemplos sobre o funcionamento
da grade, consideramos os quadros por nós identificados, os ostensivos e não
ostensivos, que são utilizados nas tarefas identificadas e que possibilitam a
descrição, interpretação e justificativa das técnicas empregadas, assim como
algumas das possíveis técnicas que sobrevivem institucionalmente quando se
trabalha com as noções de juros simples e compostos.
4.2 AS FERRAMENTAS DE ANÁLISE UTILIZADAS NA CONSTRUÇÃO DA
GRADE
Uma das noções que utilizamos como ferramenta para a análise das tarefas
sobre as noções de juros simples e compostos, que, em geral, são consideradas no
83
Ensino Médio e Superior, é aquela sobre quadro para a qual distinguimos: quadro
numérico, quadro algébrico e quadro geométrico. Para esses quadros apresentamos
sua descrição, assim como os conhecimentos esperados, conhecimentos prévios
disponíveis e um exemplo de ilustração.
 Quadro numérico: quando se utilizam apenas dados numéricos para
enunciar e resolver a tarefa. Os conhecimentos prévios supostos disponíveis
são as noções de números naturais, inteiros, racionais e reais e suas
operações e propriedades. O exemplo abaixo corresponde a uma tarefa
simples de cálculo de porcentagem.
Exemplo:
Qual o valor de 45% de 60?
Fonte: Dante , 2008, p. 334
Solução: 45% = 0,45
45% de 60 = 0,45 x 60 = 27
27 é o valor que corresponde a 45% de 60.
Nessa tarefa espera-se que o estudante transforme a taxa percentual (45%)
em decimal (0,45) e então realize o produto para encontrar o valor pedido. Para isso,
é preciso dispor de conhecimentos sobre: porcentagem, sua representação decimal
e multiplicação com decimais.
 Quadro algébrico: quando é necessário identificar as variáveis por letras que
no caso representam: prazo taxa, valor presente, valor futuro. É necessário
dispor de uma fórmula para determinar o que se pede na tarefa. No caso de
operações com capitalização linear (juros simples, M = C + j, j = C*i*t, onde M
= montante, C=capital, j = juros, i = taxa e t = tempo) e em capitalização
exponencial (juros compostos, M=C* (1 + i)t, onde M= montante, C= capital, i=
taxa, t=tempo) é preciso associar os dados da tarefa com as variáveis que as
representam na fórmula correspondente.
84
Exemplo:
Quanto receberá de juros, no fim de um semestre, uma pessoa que investiu, a juros
compostos, a quantia de R$ 6.000,00, à taxa de 1% ao mês?
Fonte: Dante 2008, p.335
Solução:
Primeira técnica: Calcular
1% de 6000 = 0,01. 6000 = 60
1% de 6060 = 60,6 1% de 6120,6= 61,206
1% de 6181, 806 = 61,81806
1% de 6243,6241 = 62,436241
1% de 6306,0603 = 63,060603
Somando: 60 + 60,6 + 61,206 + 61,81806 + 62,436241 + 63,060603 = 369,1209
Logo, a pessoa receberá 369,12 de juros.
A partir da primeira técnica podemos deduzir a fórmula: M=C (1 + i)t e utilizar a segunda
técnica para resolver a tarefa.
Segunda técnica: Identificar os dados da tarefa com as varáveis correspondentes e
determinar o que se pede.
C = 6000, t = 1 semestre= 6 meses, i = 1% = 0,01
M = 6000(1 + 0,01)6 = 6369,120604
Logo, a pessoa receberá 369,12 de juros.
A primeira técnica é bastante adequada para a passagem do quadro
numérico para o quadro algébrico, pois podemos resolver pelo menos uma tarefa
por meio dessa técnica e, a partir dela, deduzir a fórmula utilizada na segunda
técnica, o que permite mostrar que a álgebra torna o trabalho matemático mais
econômico. Nos dois casos é interessante utilizar uma calculadora, e, dependendo
dessa ferramenta, é necessário um trabalho específico para o seu uso.
Observamos ainda que, se a tarefa proposta exige apenas o cálculo de juros
simples, podemos associar essa noção com os conceitos de função afim e
progressões aritméticas e suas propriedades, enquanto para a noção de juros
85
compostos os conceitos de função exponencial e logarítmica e progressão
geométrica podem ser articulados para mostrar que as noções de juros simples e
compostos são casos particulares dos conceitos matemáticos considerados.
Atualmente no Ensino Médio a articulação considerada acima é indicada nos
Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio e trabalhada nos livros
didáticos. Esse trabalho articulado possibilita uma melhor compreensão tanto dos
conceitos matemáticos evocados quanto das noções de juros simples e compostos,
pois trata-se de uma forma de revisitar conhecimentos prévios de maneira a tornálos mais ricos, mais diferenciados, mais elaborados em termos de significado,
adquirindo
assim
mais
estabilidade.
Além
dessa
interação
entre
novos
conhecimentos e conhecimentos prévios, esses últimos podem ser utilizados para o
desenvolvimento
de
situações
contextualizadas
como
a
apresentada
acima.Consideramos que trabalhar a passagem do quadro numérico para o quadro
algébrico pode servir também para mostrar para os estudantes um dos papéis da
álgebra que é reduzir os cálculos e facilitar o desenvolvimento do trabalho
matemático.
 Quadro geométrico: corresponde à representação gráfica seja da função
afim que possibilita o estudo da noção de juros simples, seja da função
exponencial que permite tratar as questões de juros compostos. Na realidade,
o quadro geométrico poderia ser considerado apenas como uma conversão
entre o registro de representação algébrica de uma função e o registro de
representação gráfica se nos referíssemos ao trabalho de Duval (1995), e
quando articulamos as noções de juros simples e compostos com as noções
de função afim e a função exponencial respectivamente. O exemplo abaixo
ilustra
a
possibilidade
de
trabalhar
no
quadro
geométrico
para
o
desenvolvimento da tarefa.
Exemplo:
Supondo um capital de R$ 800,00, aplicado à taxa de 40% ao ano, representar graficamente a
relação entre juros (em Reais) e tempo (em anos).
Fonte: DANTE 2008, p. 339
86
Solução proposta pelo autor:
Fonte: DANTE, 2008, p. 339.
Trata-se de uma tarefa que poderia ser resolvida diretamente por meio da
fórmula de juros simples (j = C*.i*.t, onde j = juros, C = capital, i = taxa e t = tempo).
Como capital e taxa são constantes, o produto Ci também é constante, logo os juros
variam com o tempo por meio da função j = f(t) = C*i*t, que representa uma função
linear. Isso permite a passagem ao quadro geométrico em que, por meio gráfico, é
possível verificar que se trata de uma função crescente, ou seja, os juros aumentam
no decorrer do tempo. Certamente esse trabalho só é proposto no Ensino Médio,
cujo objetivo é preparar o cidadão e não considerar apenas as aplicações
associadas ao mercado de trabalho, o que é enfatizado nos planos de ensino das
universidades analisadas no capítulo anterior, observando que estudamos os cursos
de Administração de Empresas cujo objetivo é justamente o desenvolvimento
profissional.
Na realidade, o estudo da função por meio de seu gráfico permite uma melhor
visualização, o que pode ser utilizado como recurso para apresentações e
principalmente para comparar resultados. A comparação de resultados é muito
importante para os Administradores de Empresas, mas o exemplo acima é pouco
adequado para o setor financeiro, em que, em geral, se trabalha com aplicações que
variam exponencialmente com o tempo, isto é, onde se privilegia a noção de juros
compostos. Outra ferramenta por nós utilizada para a distinção dos tipos de tarefas
87
sobre a noção de juros simples e compostos que alimentam as relações
institucionais são as noções de não ostensivos e ostensivos que correspondem às
representações
internas
(ou
mentais)
e
às
representações
externas
respectivamente, sendo que o primeiro permite evocar o conceito ou noção que se
utiliza e o segundo, a manipulação desse mesmo conceito ou noção, ou seja, existe
uma relação dialética entre elas.Indicamos abaixo os não ostensivos e ostensivos
que, em geral, são evocados no desenvolvimento das tarefas sobre juros simples e
compostos habitualmente desenvolvidas no Ensino Médio e Superior.
 Não ostensivos e ostensivos
-
Adição, subtração, multiplicação, porcentagem e decimais.
Exemplo 1:
Se a taxa de inflação de janeiro é de 6% e a de fevereiro é de 5%, então a taxa de inflação do
bimestre janeiro-fevereiro será de?
Fonte: DANTE, 2008, p. 335.
Solução: Primeira técnica:
Como se trata de juros sobre juros podemos calcular 5% de 6% que é igual a 0,05. 0,06 = 0, 003 =
0,3%. Portanto a taxa total é igual 5% + 6% + 0,3% = 11,3%
Logo, a taxa de inflação no bimestre é de 11,3%.
Segunda técnica: solução do autor f1 = 1+0,06 = 1,06
f2=1+0,05= 1,05
f acumulado = 1,06*1,05 = 1, 113 logo, a taxa de inflação é de 11,3% = 0,113
Fonte: DANTE, 2008, p. 335.
Para a primeira técnica é preciso dispor apenas dos ostensivos de
representação percentual e decimal e da representação de multiplicação e adição e
os não ostensivos porcentagem, números decimais, operações de adição e
multiplicação de números inteiros e decimais. Para a segunda técnica é preciso
considerar o capital inicial para o cálculo, o que corresponde a somar uma unidade
aos juros correspondentes, ou seja, o ostensivo de representação simbólica f = 1 + i.
No cálculo dos juros acumulados encontramos o valor final. Para determinar a taxa
entre os dois meses considerados é preciso tomar a taxa na representação decimal
88
e transformá-la para a representação percentual. Nesse caso, utilizamos os
ostensivos de representação simbólica, de representação percentual e de
representação decimal, e os não ostensivos em jogo são as noções de número
decimal e porcentagem.
Exemplo 2:
Fonte: DANTE, 2008, p. 336.
Na tarefa acima verificamos que o autor propõe duas técnicas para a sua
solução. Na primeira técnica os ostensivos em jogo são a representação percentual,
a representação decimal e as operações de multiplicação, adição e divisão de
números inteiros e decimais. Os não ostensivos correspondem às noções de
porcentagem, número decimal, multiplicação, divisão e adição. Na segunda técnica
os ostensivos são os mesmos, e para o cálculo do valor final é utilizada a fórmula 1
+ i, onde 1 representa o capital inicial e i, os juros, ou seja, é preciso dispor de
conhecimentos sobre o não ostensivo capital inicial e juros para compreender essa
nova formulação.
Para melhor ilustrar os ostensivos e não ostensivos, separamos as tarefas
sobre juros simples e compostos em função das operações e noções que permitem
sua solução, como é possível verificar no caso abaixo sobre juros compostos.
– Porcentagem, potenciação, logaritmos e regra de três.
Exemplo:
89
Fonte: DANTE, 2008, p. 339.
Para a tarefa acima é preciso dispor do ostensivo de representação algébrica
do montante para juros compostos (M = C * ft) cujo não ostensivo matemático
associado é a noção de função exponencial. Como é pedido o tempo em que o
capital dobra, necessitamos de uma representação simbólica para o não ostensivo
dobro. Após substituir os ostensivos de representação simbólica, onde f = 1 + i e i é
transformado em sua representação decimal, utiliza-se o não ostensivo logaritmo e
suas propriedades, cujo ostensivo é indicado por log. Finalmente, é preciso
transformar 0,64 de ano em meses, o que corresponde ao não ostensivo regra de
três cujo ostensivo é a multiplicação em cruz. As noções de juros simples e
compostos, como já indicamos acima, podem ser articuladas com as noções de
progressões aritméticas e geométricas respectivamente. Apresentamos abaixo
exemplos dessa articulação identificando os ostensivos e não ostensivos em jogo.
– Progressão aritmética, progressão geométrica e suas propriedades.
Exemplo: Progressão Aritmética e Juros Simples:
90
Fonte: DANTE, 2008, p. 152.
A primeira técnica utilizada pelo autor corresponde ao cálculo dos juros sobre
o capital utilizando apenas os ostensivos de representação percentual e decimal e a
multiplicação. O valor encontrado vai ser adicionado sucessivamente utilizando
apenas o ostensivo adição. Nesse caso, os não ostensivos em jogo são as noções
de porcentagem, número decimal, multiplicação e adição. Para determinar uma
fórmula que corresponde à representação simbólica para o cálculo de juros simples,
o autor articula a noção de juros simples com a noção de progressão aritmética.
Para isso, o autor relaciona o ostensivo de representação simbólica do termo geral
de uma progressão aritmética associando seus elementos, isto é, o n-ésimo termo
corresponde ao montante (a n = M); o primeiro termo corresponde ao capital inicial
acrescido do juro do primeiro mês (a 1 = C + C.i); a razão corresponde aos juros (r =
C.i); e o tempo corresponde a calcular (n – 1) quando n = t, ou podemos considerar
uma progressão aritmética em que o primeiro termo é a 0 , o que corresponde à M =
C + C*i*t, ou seja, M = C*(1 + i*t) .
O não ostensivo progressão aritmética é utilizada como meio para deduzir o
ostensivo de representação simbólica para a determinação de uma fórmula para o
cálculo de juros simples.
91
Exemplo: Progressão Geométrica e Juros Compostos:
Quanto receberá de juros, no fim de um semestre, uma pessoa que investiu, a juros
compostos, a quantia de R$ 6.000,00 à taxa de 1% ao mês.
Primeira técnica: Calculamos os valores relativos aos 6 meses.
Mês 0: 6.000,00
Mês 1: 6.000,00 + 6.000,00 x 0,01 = 6.060,00
Mês 2: 6.060,00 + 6.060,00 x 0,01 = 6.120,60
Mês 3: 6.120,60 + 6.120,60 x 0,01 = 6.181,806
Mês 4: 6.181,806 + 6.181,806 x 0,01 = 6.243,6241
Mês 5: 6.243,6241 + 6.243,6241 x 0,01 = 6.306,0603
Mês 6: 6.306,0603 + 6.306,0603 x 0,01 = 6.369,1209
Segunda Técnica: Podemos representar a sequência de valores por uma progressão
geométrica usando o termo geral a n como o montante (a n = M) como primeiro termo o
capital inicial ou valor principal (a 1 = C + Cj), a razão é igual a 1 + j (q = 1 + j), e o tempo
igual ao número de termos (n = t). Assim, fazendo as trocas convenientes em a n = a 1 qn – 1
temos: M = (C + Cj).(1+j)t-1 , considerando uma progressão geométrica onde o primeiro
termo é a 0 , temos: M = C(1 + j)t.
C= 6000; t= 1 semestre = 6 meses j= 1% (0,01) ao mês M = C * (1+j)t M = 6000*(1+0,01)6
M = 6.369,12
Fonte: DANTE , 2008, p. 338.
Observamos que na primeira técnica é preciso calcular a cada mês o juro
correspondente ao valor acumulado no mês anterior. Ao identificar a fórmula do
montante para juros compostos com a de uma progressão geométrica, observando a
diferença quando se considera o primeiro termo a0 ou a1, podemos mostrar para os
estudantes a importância desse conceito matemático para justificar a fórmula
utilizada e seu papel facilitador dos cálculos, principalmente quando se trabalha com
prazos maiores. Na primeira técnica, que corresponde ao cálculo sucessivo dos
juros nos meses considerados, utilizamos apenas os ostensivos de representação
percentual e decimal e a multiplicação e adição. O valor encontrado para cada mês
é tomado como novo capital para o mês seguinte. Nesse caso, os não ostensivos
em jogo são as noções de porcentagem, número decimal, multiplicação e adição.
92
Para determinar uma fórmula que corresponde à representação simbólica
para o cálculo de juros compostos podemos articular essa noção com o conceito de
progressão geométrica. Para isso, é preciso relacionar o ostensivo de representação
simbólica do termo geral de uma progressão geométrica associando seus elementos
com as noções de montante, capital inicial, taxa e tempo, conforme descrição
apresentada acima para a segunda técnica. O não ostensivo progressão geométrica
é utilizada como meio para deduzir o ostensivo de representação simbólica para a
determinação de uma fórmula para o cálculo de juros compostos. Podemos
considerá-lo como o objeto matemático que permite descrever, interpretar e justificar
a representação simbólica usualmente usada para o cálculo de juros compostos, ou
seja, a teoria da tecnologia que corresponde aos cálculos sucessivos que podem ser
representados por uma função exponencial.Na sequência, consideramos as
grandezas direta e inversamente proporcionais que correspondem a ostensivos
usualmente utilizados em tarefas que envolvem as noções de juros simples e
compostos.
– Grandezas diretamente e inversamente proporcionais
Exemplo: Grandezas Diretamente Proporcionais. Edgar teve um aumento de
8% e passou a receber R$ 1.680,00. Qual era seu salário antes do reajuste? O
salário anterior correspondia a 100%. Como houve um aumento de 8%, o novo
salário passou a corresponder a 100% + 8% = 108%. Observe que as grandezas
são diretamente proporcionais, logo teremos salário antes do reajuste:
R$ 1.555,55.
Porcentagem
100%
108%
Salário
X
1680
Fonte: GIOVANNI & BONJORNO , 2005, p. 286.
Ao resolver essa tarefa, uma das possíveis formas para tal é o uso de uma
regra de três que corresponde a uma das técnicas para o cálculo de grandezas
diretamente proporcionais. Nesse caso, a regra de três corresponde a um dos
93
ostensivos para manipular grandezas diretamente proporcionais. Poderíamos
também considerar o não ostensivo função linear e associá-lo à noção de grandezas
diretamente proporcionais e por meio da manipulação dos ostensivos associados a
essa função determinar a solução da tarefa proposta, conforme exemplo abaixo.
Considerando 100% = 1, 108% = 1,08, f(1) = x e f(1,08) = 1680. Sendo f
linear, temos: f(1,08) = f(1,08 * 1) = 1,08 f(1). Logo, 1680 = 1,08.x, x = 1555,55.
Nesse caso, é necessário fazer a passagem do ostensivo de representação
percentual para o ostensivo de representação decimal.
Ambas as técnicas
sobrevivem atualmente, mas no Ensino Médio no Brasil, em geral, privilegia-se a
primeira técnica, mesmo se a noção de função linear integrar a proposta curricular
dessa etapa escolar. Outra noção muito utilizada nas tarefas sobre porcentagem e
juros simples é a noção de equação do primeiro grau. – Equações do primeiro
grau. Exemplo 1:
A quantia de R$ 1.890,00 foi repartida entre três pessoas da seguinte forma: Marta recebeu
80% da quantia de Luís e Sérgio recebeu 90% da quantia de Marta. Quanto recebeu cada
pessoa?
Fonte: DANTE , 2008, p. 336.
Solução: Luis: x
Marta: 0,8 x Sérgio: 0,9x(0,8x) x + 0,8 x+ 0,72x = 1890
2,52x = 1890 x = 750 (Luis)
0,8 x = 0,8.750 = 600 (Marta) 0,72 x = 0,72.750 = 540 (Sérgio)
Sérgio recebeu 1890-750-600 = 540. Portanto, Luis recebeu R$ 750,00, Marta recebeu R$ 600,00 e
Sérgio recebeu R$ 540,00.
Fonte: DANTE , 2008, p. 336.
Na tarefa acima, após identificar as diferentes partes efetuando a passagem
do ostensivo de representação em língua natural em representação simbólica
explícita e modelar a tarefa recaindo em uma equação do primeiro grau, é preciso
manter um discurso em língua natural para justificar o trabalho com o não ostensivo
equação, que será manipulado por meio das regras e leis do cálculo literal, que
correspondem aos não ostensivos em jogo na tarefa.
94
Exemplo 2:
Um quadro, cujo preço de custo era R$ 800,00, foi vendido por R$ 980,00. Qual a porcentagem do
lucro sobre o preço de custo?
Fonte: GIOVANNI & BONJORNO 2005, p. 290
Solução:
Fazendo L= lucro; C= preço de custo e V= preço de venda, teremos: V = L+C
L= 980 – 800
L= 180. A taxa percentual do lucro sobre o custo é de:
L= V – C
L 180
= 0,225

C 800
logo L = 22,5%.
Fonte: GIOVANNI & BONJORNO, 2005, p. 290.
No exemplo 2 é preciso identificar os elementos do enunciado e considerar a
equação que relaciona preço de custo, preço de venda e lucro, para em seguida
determinar qual a porcentagem de lucro sobre o preço de custo.
Na realidade, trata-se de um problema de modelagem que possibilita a
aplicação da noção de equação, que necessita de um discurso adequado para seu
planejamento, execução e interpretação dos resultados encontrados. Estes supõem
ainda a passagem da representação decimal para a representação percentual que é
pedida na tarefa. Também, nesse caso, o não ostensivo equação é manipulada por
meio das regras e leis do cálculo literal, que correspondem aos não ostensivos em
jogo na tarefa. Outro não ostensivo importante para o desenvolvimento da noção de
juros simples e compostos é a noção de calendário contábil.
– Calendário contábil.
Exemplo: mês de trinta dias, ano com trezentos e sessenta dias;
Uma aplicação de R$ 50.000,00 pelo prazo de 180 dias obteve um rendimento de
R$ 8.250,00. Indaga-se: Qual a taxa anual correspondente a essa aplicação?
Fonte: Sobrinho, 2000, p. 22.
95
Solução: P= 50.000,00
J= 8.250,00
N= 180 dias
I=?
I = J: (C*n) I= 8.250,00: (50.000,00*180) = 0,00091667 ou 0,091667 ao dia.
Conforme é solicitado à taxa em anos, teremos Taxa anual = 360* 0,00091667, ou seja, 0,33
ou ainda 33% ao ano.
Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 22.
Para desenvolver essa tarefa, além de dispor da noção de calendário contábil,
observamos que na fórmula I =
J: (C*n), o não ostensivo divisão é representada
pelo ostensivo dois-pontos e o não ostensivo multiplicação é representado pelo
ostensivo * que correspondem às representações utilizadas, em geral, nas
calculadoras. É importante utilizar a equivalência de taxas para resolver tarefas
sobre variação financeira, ou seja, se a taxa é dada em anos, deve-se transformar o
prazo em anos. – Equivalência de taxas (EM, ES) Exemplo:
Uma pessoa aplica R$ 15.000,00 num título de renda fixa com vencimento no final de 61
dias, a uma taxa de 72% ao ano. Calcular o seu valor de resgate.
Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 43.
Primeira Técnica: P= 15.000,00 n= 61 dias = 61/360; I = 72% ao ano S =?
S= P* (1+i)n
S= 15.000*(1+0,72)61/360
S = 15.000*(1,72) 61/360
S= 16.443,73
Segunda Técnica:
P= 15.000,00; N= 61 dias; I = 72% ao ano; S =? Por regra de três simples, temos:
1 ano -------- 360dias
n -------S= P* (1+i)n
61
1*61 = 360xn
n = 0, 1694 anos
S= 15.000*(1+0,72)0,1694
S= 16.443,73
Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 43.
Na primeira técnica dividimos o número de dias por 360, que correspondem
ao ano contábil e aplicamos a fórmula em que a multiplicação também é
representada pelo ostensivo, uma vez que os cálculos precisam ser efetuados em
uma calculadora.A diferença entre a primeira técnica e a segunda está na
proposição do cálculo da proporção de dias em relação ao ano contábil. Isso permite
revisitar a noção de proporcionalidade e assim compreendê-la melhor. Certamente o
96
trabalho proposto pelo autor é adequado para os cursos de Administração, mas
ressaltamos que esse mesmo exemplo pode ser utilizado como meio para auxiliar os
estudantes do Ensino Médio a articular a noção de calendário contábil e
proporcionalidade, que pode ser tratada por meio da técnica denominada “regra de
três simples” ou da técnica da função linear. Podemos ainda articular a noção de
juros simples com a noção de função linear e interpretar os resultados encontrados
por meio do ostensivo de representação gráfica.
– Juros simples e representação gráfica (EM, ES)
Exemplo: Suponhamos o capital de R$ 800,00 aplicado à taxa de 40% ao
ano. Qual seria a representação gráfica quando obtemos os juros em função do
tempo de aplicação por meio da equação.
J=320*t
Essa funçaõ apresenta uma equação do tipo função linear
Fonte: DANTE , 2008, p. 339.
A representação gráfica dos juros em função do tempo, além de permitir a
articulação entre a noção de juros simples e função linear, auxilia a interpretação
dos resultados, pois é fácil verificar que a reta é crescente, ou seja, que os juros
aumentam proporcionalmente com o tempo. Na sequência, apresentamos a grade
de análise construída para identificar os diferentes tipos de tarefas e técnicas que
sobrevivem atualmente tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior. Além
disso, é mediante essa grade que analisamos no capítulo que segue, por meio de
três livros didáticos indicados para o Ensino Médio e de dois livros do Ensino
Superior escolhido em função das bibliografias propostas nos planos de ensino
97
analisados, as relações institucionais existentes quando se trabalha a noção de juros
simples e compostos nessas duas etapas escolares.
4.3 AS TAREFAS USUAIS SOBRE AS NOÇÕES DE JUROS SIMPLES E
COMPOSTOS QUE ALIMENTAM AS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS TANTO
PARA O ENSINO MÉDIO COMO PARA O ENSINO SUPERIOR
Na tabela abaixo relacionamos as tarefas sobre juros simples e compostos
usualmente encontradas tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior.
Tarefa 1: Situação matemática para cálculo de acréscimo ou desconto (EM, ES).
Tarefa 2: Situação matemática para cálculo de Juros Simples (EM, ES).
Tarefa 3: Situação matemática para cálculo de Juros Compostos (EM, articulação entre
juros simples e compostos e as noções de função afim, progressão aritmética e função
exponencial, progressão geométrica respectivamente, ES sem articulação).
Tarefa 4: Situação matemática para cálculo de juros sobre depósito à vista, o Método
Hamburguês (ES).
Tabela 1: Tarefas analisadas
Apresentamos a seguir nossa grade de análise que, como anunciado acima,
segue o modelo construído por Dias (1998) em sua tese para a análise dos
diferentes tipos de tarefas que permitem a articulação entre os pontos de vista
cartesianos e paramétricos no ensino de Álgebra Linear.
4.4 A GRADE DE ANÁLISE
Na grade identificamos os tipos de tarefas usualmente encontradas no
processo de ensino e aprendizagem das noções de juros simples e compostos tanto
para o Ensino Médio como para o Ensino Superior. Para as variáveis das tarefas
destacamos os quadros em que a tarefa é enunciada e os possíveis quadros de
solução das mesmas. Além disso, destacamos os ostensivos e não ostensivos que
permitem a solução das tarefas, destacando os não ostensivos que correspondem
98
aos conhecimentos prévios tanto dos estudantes como dos professores, observando
que os professores devem dispor de conhecimentos teóricos que permitem utilizar
os ostensivos discursivos necessários para descrever, interpretar e justificar as
técnicas escolhidas para desenvolver as diferentes tarefas. Dessa forma, para
especificar as tarefas em relação às diferentes técnicas, que segundo Chevallard
(1994), possibilitam a compreensão de um conceito, pois este depende da técnica
em que é utilizado e a técnica depende de todo o sistema de objetos não ostensivos
e ostensivos que ela permite ativar.
Escolhemos assim as variáveis de tarefa abaixo que nos parecem
importantes para identificar as diferentes relações institucionais associadas às
noções de juros simples e compostos, que podem ser trabalhadas tanto no Ensino
Médio como no Ensino Superior.
-
Situação apresentada no enunciado;
-
Quadros em que a tarefa é apresentada;
-
Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem
aos conhecimentos prévios dos estudantes e do professor;
-
Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa;
-
Os quadros que podem ser usados na resolução da tarefa;
-
Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa.
Apresentamos abaixo alguns exemplos de funcionamento da grade para as
quatro tarefas destacadas acima.
4.5 FUNCIONAMENTOS DA GRADE: EXEMPLOS:
Com o objetivo de apresentar o funcionamento da grade de análise,
consideramos a tarefa em geral seguida de exemplos que permitem melhor
compreender as possíveis técnicas que podem ser trabalhadas no Ensino Médio ou
no Ensino Superior.
– Tarefa 1: Situação matemática para cálculo de acréscimo ou desconto
(EM, ES). Exemplo 1:
99
Uma mercadoria que custa R$ 450,00 está sendo vendida com desconto de 8%. Qual o
valor do desconto e por quanto a mercadoria será vendida?
Fonte: DANTE, 2008, p. 333.
Situação apresentada no enunciado
Determinar o desconto.
Quadro em que a tarefa é apresentada: Numérico.
Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos
conhecimentos prévios dos estudantes e do professor: Porcentagem, operações de multiplicação
e divisão (“topos” do estuDante e do professor).
Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa: Discurso oral, representação escrita,
representação em língua natural, representação gestual, representação percentual e representação
decimal associados aos não ostensivos descritos acima.
Os quadros que podem ser usados na resolução da tarefa: Numérico.
Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa:
Destacamos duas técnicas para a solução dessa tarefa, ambas são desenvolvidas no quadro
numérico e o nível de conhecimento esperado dos estudantes é o mobilizável, pois o desconto é
pedido explicitamente no enunciado. Observamos abaixo quais conhecimentos
devem ser
disponíveis para a manipulação da técnica.
Primeira técnica: Calculamos a diferença 100% - 8% = 92%, que corresponde ao fator decimal 0,92 e
multiplicamos pelo valor da mercadoria. Nesse caso, o estuDante deve dispor de conhecimentos
sobre porcentagem, passagem da representação percentual (92%) para representação decimal (0,92)
e multiplicação de decimais, quando não utiliza uma calculadora.
Segunda técnica: Calculamos 8% = 0,08 do valor total da mercadoria e subtraímos o valor encontrado
do valor total. Essa técnica exige que os estudantes disponham dos mesmos conhecimentos
destacados na técnica anterior.
Exemplo 2:
Durante a entresafra o preço do café, que era de R$ 30,00 a saca, sofreu aumentos sucessivos de
10%, 5% e 15% nos três primeiros meses. Determinar o preço atual?
Fonte: BARRETO & CHAVIER , 2005, p. 28 .
Primeira técnica:
O preço atual é dado por: P 1 = 30,00*1,1 = 33,00 P 2 = 33,00*1,05 = 34,65 P 3 = 34,65*1,15 = 39,85
P = R$ 39,95 P i = C*(1+j i ). Calcula-se cada P j até obter o resultado final P.
100
A partir dos P j podemos deduzir que P = C* (1+j 1 )* (1+j 2 )* (1+j 3 )*..... *(1+j n ).
Segunda técnica:
P= 30,00*(1+10:100)* (1+5:100)*(1+15:100) P= 30,00*1,1*1,05*1,15 P = R$ 39,95
A partir dos P j podemos deduzir que P = C*(1+j 1 )* (1+j 2 )* (1+j 3 )*..... *(1+j n ).
Fonte: BARRETO & CHAVIER ET AL., 2005, p. 28.
Situação apresentada no enunciado:
Determinar o acréscimo (no caso, juros sobre juros).
Quadro em que a tarefa é apresentada: Numérico.
Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos
conhecimentos prévios dos estudantes e do professor: Porcentagem, operações de adição e
multiplicação de decimais (“topos” do estuDante e do professor).
Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa: Discurso oral, representação escrita,
representação
gestual,
representação
em
linguagem
natural,
representação
percentual
e
representação decimal.
Os quadros que podem ser usados na resolução da tarefa: Numérico.
Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa:
Nível mobilizável em relação à noção de juros sobre juros.
A primeira técnica exige apenas que o estuDante disponha de conhecimentos sobre a multiplicação
com decimais quando não utiliza uma calculadora.
Para utilizar a segunda técnica é preciso dispor de conhecimentos sobre a multiplicação e suas
propriedades e da multiplicação de decimais. É preciso dispor da propriedade associativa da
multiplicação e de situações de referência em que se deduz a fórmula utilizada na segunda técnica.
– Tarefa 2: Situação matemática para cálculo de Juros Simples (EM ES)
Exemplo 1:
Um capital de R$ 12.000,00 é aplicado à taxa de juros simples de 2% ao mês. Determine o valor do
montante após 6 meses.
Fonte: BARRETO & CHAVIER 2005, p. 23.
101
Primeira técnica: 2% de R$ 12.000,00 = 2:100 * 12.000,00= R$ 240,00 (Corresponde ao
juros em 1 mês); 6 * R$ 240,00 = R$ 1.440,00 (rendimento de juros simples ao final de 6
meses); Montante M= 12.000,00+1.440,00 = R$ 13.440,00 ( Montante após 6 meses).
Segunda técnica:
Montante= C+J onde J = J= C*i*n
M= C +J
M = 12000+1440
J= C*i*n
J= 12000*0,02*6 = 1.440
M= 13.440,00.
Situação apresentada no enunciado
Determinar a variação de um capital a juros simples.
Quadros em que a tarefa é apresentada: Numérico e algébrico.
Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos
conhecimentos prévios dos estudantes e do professor: Porcentagem, operações de adição e
multiplicação, porcentagem, equação do primeiro grau (“topos” do estuDante e do professor).
Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa: Discurso oral, representação gestual,
representação escrita, representação em linguagem natural, representação percentual e
representação decimal.
Os quadros que podem ser usados na resolução da tarefa: Numérico e algébrico.
Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa:
Em relação a noção de juros simples a tarefa exige apenas o nível mobilizável, pois esse é
tratado explicitamente no enunciado.
Na primeira técnica utiliza-se apenas o quadro numérico, mas é preciso um discurso para
justificar o trabalho efetuado. Deve-se dispor de conhecimentos sobre adição e multiplicação
de decimais quando não se utiliza uma calculadora.
A segunda técnica é desenvlvida no quadro algébrico e se supõe que as fórmulas para o
cálculo do juros e do montante sejam disponiveis, além de conhecimentos sobre adição e
multiplicação de decimais quando não se utiliza uma calculadora.
Exemplo 2:
Determine o prazo em que se duplica um capital aplicado à taxa de juro
simples de 4% ao mês.
Fonte: GIOVANNI & BONJORNO et al., 2005, p. 295
Técnica: Para que um capital duplique temos M=2*C (montante)
102
M=2C
I=4% a.m = 0,04 a.m
M=C+J
M= C+ (C*i*n)
1=0,04n
n=1:0,04
2C=C*(1+0,04n)
2=1 +0,04n
2 – 1 = 0,04*n
n= 25 (meses)
Situação apresentada no enunciado
Determinar a variação de um capital a juros simples.
Quadros em que a tarefa é apresentada: Numérico e algébrico.
Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos
conhecimentos prévios dos estudantes e do professor: Porcentagem, operações de adição e
multiplicação, noção de dobro, triplo..., equação do primeiro grau (“topos” do estudante e do
professor). Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa: Discurso oral, representação escrita,
representação gestual representação em linguagem natural, representação algébrica, representação
de equação do primeiro grau, representação percentual e representação decimal.
Quadro que pode ser usado na resolução da tarefa: Algébrico.
Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa:
Trata-se de uma tarefa que exige apenas que se mobilizem conhecimentos associados à noção de
juros simples.
A técnica supõe que se disponha de conhecimento sobre a forma algébrica para representar dobro e
as regras e leis do cálculo algébrico para resolver uma equação do primeiro grau.
– Tarefa 3: Situação matemática para cálculo de Juros Compostos (EM,
articulação entre juros simples e compostos
progressão
aritmética
e
função
e as noções de função afim,
exponencial,
progressão
geométrica,
respectivamente, ES sem articulação). Exemplo 1:
Qual deve ser o tempo para que a quantia de 30.000,00 gere um montante de 32.781,81, quando
aplicado à taxa de 3% ao mês, no sistema de juros compostos.
Fonte: DANTE , 2008, p. 338
Técnica:
C= 30.000,00 M= 32.781,81 i= 3% ao mês – 0,03 a.m t=?
M=C*(1+i)t
(1+i)t = M : C
(1+0,03)t = 32.781,81 : 30.000,00
103
(1,03)t = 1,092727
t . log1,03 = log1,092727
t = (log 1,092727) : (log 1,03) = 3
Logo, o tempo deverá ser de 3 meses.
Fonte: DANTE., 2008, p. 338
Situação apresentada no enunciado: Situação financeira.
Quadros em que a tarefa é apresentada: Numérico e algébrico.
Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos
conhecimentos prévios dos estudantes e do professor: Porcentagem, números decimais,
operações de adição e multiplicação de números reais, equação do primeiro grau, equação
exponencial, logaritmos e suas propriedades (“topos” do estuDante e do professor). Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa: Discurso oral, representação escrita,
representação em linguagem natural, representação algébrica de equações exponenciais e equações
do primeiro grau, representação percentual e representação decimal.
Os quadros que podem ser usados na resolução da tarefa: Numérico e algébrico.
Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa: Em relação à noção de juros compostos, é preciso apenas mobilizar conhecimentos sobre a fórmula para cálculo. Para a manipulação da técnica é preciso dispor de conhecimentos sobre equações
exponenciais para identificá-la, de logaritmos e suas propriedades e das regras e leis para
resolver uma equação do primeiro grau.
Observamos que para desenvolver a tarefa é
importante supor a possibilidade de utilizar uma calculadora.
Exemplo 2:
O capital de R$ 2.000,00, aplicado a juros compostos, rendeu após quatro meses juros de R$ 165,00.
Qual foi a taxa de juros?
Fonte: DANTE , 2008, p. 338.
Primeira técnica: C= 2.000,00 J = 165 M= C+J
t= 4 meses M=C*(1+i)
t
(1+i )4 =1,0825
2.165 = 2.000*(1+i )
M= 2.000+165 = 2165 i= ?
4
(1+i )4 = 2.165 : 2.000
((1+i )4 )1/4 = (1,0825) ¼ (1+i) = 1,020015981
i= 1,020015981 – 1 = 0,020015981
i= 0,020015981 * 100 = 2,0015981%
Logo a taxa de juros foi de aproximadamente de 2% ao mês.
Segunda técnica: C= 2.000,00 J = 165 M= C+J
i= ? t= 4 meses M=C*(1+i)t
(1+i )4 =1,0825
2.165 = 2.000*(1+i )4
4*log(1+i) = log1,0825
M= 2.000+165 = 2165
(1+i )4 = 2.165 : 2.000
log(1+i) = (log1,0825):4
104
log(1+i) = 0,008607
(1+i)= 100,008607
1 + i = 1,02001
i = 1,02001 – 1
i = 0,02001 i = 2%
Fonte: DANTE , 2008, p. 338
Situação apresentada no enunciado: Situação financeira.
Quadros em que a tarefa é apresentada: Numérico e algébrico.
Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos
conhecimentos prévios dos estudantes e do professor: Porcentagem, números decimais,
operações de adição, multiplicação, potenciação e radiciação, equação do primeiro grau, equação
exponencial, logaritmos e suas propriedades (“topos” do estuDante e do professor). Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa: Discurso oral, representação escrita,
representação em linguagem natural, representação algébrica de equações exponenciais e
equações
do
primeiro
grau,
representação
percentual
e
representação
decimal,
representação fracionária, representação de logaritmos.
Quadros que podem ser usados na resolução da tarefa: Numérico e algébrico.
Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa:
Em relação à noção de juros compostos é preciso apenas mobilizar conhecimentos sobre a fórmula
para cálculo.
Para a manipulação da primeira técnica é preciso dispor de conhecimentos sobre equações
exponenciais para identificá-la e de potenciação, radiciação e suas propriedades. É preciso dispor
também da noção de equação do primeiro grau.
Na manipulação da segunda técnica é preciso dispor da noção de equações do primeiro grau e
exponencial e da noção de logaritmo.
Observamos que para desenvolver a tarefa utilizando a primeira ou a segunda técnica é importante
supor a possibilidade de utilizar uma calculadora.
– Tarefa 4: Situação matemática para cálculo de juros sobre depósito à vista,
o Método Hamburguês (ES). Exemplo 1:
Calcular o valor dos juros referentes às aplicações dos
capitais R$ 20.000,00,
R$ 10.000,00 e R$ 40.000,00, pelos prazos de 65 dias, 72 dias e 20 dias, respectivamente, sabendose que a taxa considerada é de 25,2% ao ano.
Fonte: SOBRINHO ET AL., 2000, p. 27
Técnica:
P 1 = 20.000,00
P 2 = 10.000,00
P 3 = 40.000,00
105
N 1 = 65 dias
N 2 = 72 dias
N 3 = 20 dias
I = 25,2% a.a
I = 25,2% a.a
I = 25,2% a.a
J 1 =?
J 2 =?
J 3= ?
Como a taxa é anual e os prazos são expressos em número de dias, é preciso considerar a taxa em
dias. No caso de juros simples temos: Taxa diária = 0, 252: 360 = 0, 0007 ou 0,07% ao dia.
J = C*I*N
J T = 20.000*65*0,0007+10.000*72*0,0007+40000*20*0,0007= 1.974,00
Onde J T é o total dos juros dos três capitais. Situação apresentada no enunciado: Situação financeira. Quadros em que a tarefa é apresentada: Numérico e algébrico. Não ostensivos possíveis para o
seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos conhecimentos prévios dos
estudantes e do professor: Porcentagem, números decimais, operações de adição,
multiplicação, equação do primeiro grau, calendário contábil (“topos” do estudante e do professor).
Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa: Discurso oral, representação escrita,
representação em linguagem natural, representação algébrica de equações do primeiro grau,
representação percentual e representação decimal
Os quadros que podem ser usados na resolução da tarefa: numérico e algébrico.
Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa:
Em relação à noção de juros basta mobilizar conhecimentos sobre cálculo de juros e conversão da
taxa anual em taxa diária.
É preciso mobilizar ainda o Método Hamburguês que consiste em determinar a soma dos juros
obtidos.
4.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A identificação dos diferentes tipos de tarefas sobre a noção de juros simples
e compostos que sobrevivem no Ensino Médio e Superior possibilitou verificar que,
se tratarmos essas noções apenas do ponto de vista das aplicações financeiras, o
trabalho a ser realizado será muito reduzido, mas permitirá a utilização de técnicas
diferentes que estão associadas ao conhecimento prévio esperados dos estudantes,
principalmente no Ensino Médio. Em geral, as técnicas propostas exigem apenas a
utilização dos quadros numéricos e algébricos, sendo esse último privilegiado por
facilitar o trabalho matemático em jogo e reduzir os cálculos. As possíveis
articulações entre as noções de juros simples e compostos e funções afim e
106
exponencial e progressões aritméticas e geométricas, respectivamente, são
importantes,
pois
permitem
revisitar
conteúdos
que
já
fazem
parte
dos
conhecimentos prévios dos estudantes do Ensino Médio. Atentamos que pode ser
uma forma de auxiliá-los a controlar os resultados encontrados na solução de tarefas
tanto escolares como da vida profissional, pois a noção de juros compostos é muito
utilizada no mercado financeiro. Observamos finalmente que o nível de
conhecimento exigido para a solução de tarefas que envolvem as noções de juros
simples e compostos é o mobilizável, mas que é preciso dispor de conhecimentos
sobre equações de primeiro grau e equações exponenciais, assim como das regras
e leis que permitem manipulá-las. Além disso, é preciso estar atento para o fato de
que as tarefas, em geral, exigem cálculos que necessitam que se disponha de uma
calculadora científica e que se tenha habilidade para fazê-la funcionar.
Para melhor compreender como se desenvolve o trabalho com a noção de
juros simples e compostos tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior,
estudamos no capítulo que segue as relações institucionais existentes via análise de
alguns livros didáticos sugeridos para essas duas etapas escolares.
107
Capítulo 5
AS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS EXISTENTES PARA INTRODUÇÃO
E DESENVOLVIMENTO DAS NOÇÕES DE JUROS SIMPLES
E COMPOSTOS NA TRANSIÇÃO ENSINO MÉDIO
E ENSINO SUPERIOR
5.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Para o estudo das relações institucionais existentes, quando se consideram a
introdução e o desenvolvimento das noções de juros simples e compostos na
transição entre o Ensino Médio e Superior, foram pesquisados alguns livros didáticos
dessas duas etapas escolares que correspondem a uma das ferramentas didáticas
importantes para apoiar o trabalho de professores e estudantes, e que é indicada
pelo Ministério da Educação, pois este fornece livros didáticos para o Ensino Médio
e exige que os cursos superiores disponham desse material em suas bibliotecas
como fonte de apoio para todos os que sentirem necessidade.
Observamos que os livros didáticos do Ensino Médio, distribuídos
gratuitamente para os estudantes, são avaliados por uma comissão do Ministério da
Educação e escolhidos pelos professores, o que permite identificar a proposta mais
ampla do trabalho do professor que tem a possibilidade de modificar a ordem e
complementar a organização apresentada no livro, utilizando-o como material de
apoio ao estudante. É com essa concepção que estudamos as possíveis relações
institucionais existentes para a introdução da noção de juros simples e compostos
no Ensino Médio. Igualmente, consideramos como instrumento de análise os livros
didáticos do Ensino Superior, pois eles, quando indicados nos planos de ensino,
permitem uma identificação das escolhas das instituições, representando uma das
fontes para o desenvolvimento das disciplinas a que se destinam. Sendo assim,
optamos por analisar três livros indicados para o Ensino Médio e dois para o Ensino
Superior, para os quais faremos uma breve justificativa da escolha a seguir.
A primeira obra escolhida para compor as análises das relações institucionais
existentes para o Ensino Médio é Matemática, volume único de Luiz Roberto Dante
108
(na sequência denominado apenas Dante, 2008), avaliado e novamente aprovado
pelo Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio (PNLEM, 2009), que,
segundo os avaliadores, traz uma abordagem inovadora dos conteúdos a serem
trabalhados no Ensino Médio. Os avaliadores observam ainda que o autor distribui o
conteúdo em uma sequência lógica privilegiando uma integração harmoniosa entre
os tópicos, ou seja, articulando conhecimentos prévios e novos conhecimentos.
Isso nos conduziu a escolher essa obra para análise, levando em conta
principalmente a questão da articulação de conhecimentos e a forma como o autor
introduz as noções associadas à Matemática Financeira, em particular, as noções de
juros simples e compostos que são trabalhadas após a introdução dos conceitos de
função afim e exponencial e progressões aritméticas e geométricas. Isso possibilita
uma revisita a esses conhecimentos tornando-os assim mais estáveis. Além do
resultado da avaliação, observamos se a obra atende às orientações institucionais
de preparar o estudante para exercer de forma autônoma a cidadania, sendo capaz
de tomar decisões tanto para a solução de problemas pessoais como para os que
envolvem o campo profissional, uma vez que estamos interessados em identificar as
relações institucionais esperadas e existentes para o trabalho com as noções de
juros simples e compostos na transição entre o Ensino Médio e Superior, ou seja,
que conceitos trabalhados no Ensino Médio podem servir como conhecimento prévio
para o desenvolvimento da disciplina de Matemática Financeira no Ensino Superior.
Com o mesmo critério escolhemos a segunda obra, Matemática aula por aula,
de Claudio Xavier da Silva e Benigno Barreto Filho, et al., 2005, terceiro ano,
também reavaliada e aprovada pelo PNLEM (2009). A justificativa dessa seleção se
deve ao fato de ela apresentar uma proposta em que se revisitam conhecimentos
prévios para a introdução de novas noções e se utiliza a história da Matemática e as
outras ciências para propor aplicações e motivar os estudantes, ou seja, trata-se de
uma obra que atende às propostas institucionais para o desenvolvimento da
Matemática no Ensino Médio. Ainda em relação ao Ensino Médio, selecionamos a
obra Matemática completa, de José Ruy Giovanni e José Roberto Bonjorno, et al.,
2005, primeiro ano, que também compõe a lista dos livros analisados e aprovados
pelo PNLEM (2009).
109
Observamos que, assim como as obras anteriores, o livro didático escolhido
também foi reavaliado em 2009, ou seja, as três obras compõem as diferentes listas
do PNLEM e vêm sendo utilizadas e aperfeiçoadas continuamente. Ressaltamos
ainda que sua escolha está associada também à proposta de revisitar
conhecimentos que se supõem tenham sido trabalhados no Ensino Médio e ao papel
de destaque dado ao uso de calculadoras, em particular, quando se introduzem as
noções de Matemática Financeira, ou seja, dentro da proposta institucional de
trabalho no Ensino Médio a obra atende às expectativas institucionais apresentadas
anteriormente. Apresentadas as justificativas de escolha das três obras do Ensino
Médio, passamos a breve descrição sobre a escolha das duas obras destinadas ao
Ensino Superior.
A primeira obra escolhida é Matemática financeira, de José Dutra Vieira
Sobrinho na sequência designado de Sobrinho et al., 2000, em que percebemos que
na abordagem proposta existe pouca preocupação de justificar as técnicas
desenvolvidas por meio de tecnologias que mostram a possibilidade para o cálculo
das diferentes aplicações financeiras, em particular, quando se trabalha com a
noção de juros compostos. No geral, justificam-se os termos utilizados no mercado
financeiro e a ênfase é dada à associação dos elementos da fórmula com esses
termos para a identificação e aplicação imediata. Ou seja, trata-se de um curso em
que a Matemática Financeira é trabalhada por meio da prática usual do mercado
financeiro, isto é, reconhecimento dos elementos que compõem uma fórmula e
aplicação da mesma, não é feita uma revisita de conhecimentos anteriores, isto é, os
conhecimentos prévios são supostos disponíveis.
Passamos à segunda obra, Matemática financeira, de Abelardo de Lima
Puccini, et al., 2008. Sua escolha está associada ao fato de se tratar do livro didático
contemplado nas bibliografias básicas de duas das quatro universidades para as
quais analisamos, via planos de ensino, as relações institucionais esperadas para o
desenvolvimento
da
disciplina
de
Matemática
Financeira
nos
cursos
de
Administração de Empresas. Outra motivação para essa escolha é que, em geral,
utilizamos essa obra nos nossos cursos de Matemática Financeira com as turmas de
Administração de Empresas, curso superior focado nesta pesquisa.
110
Observamos ainda que nesse livro o conteúdo de Matemática Financeira é
desenvolvido especificamente para cursos de administração e gestão, focando o uso
da calculadora HP12C, ou seja, trabalha-se com as aplicações cotidianas que fazem
parte das operações financeiras das instituições que compõem o mercado, em que
as noções de juros, em particular, juros compostos, estão constantemente em jogo.
Além disso, o autor articula os conhecimentos de juros simples e compostos
desenvolvidos no Ensino Médio quando justifica as técnicas empregadas para os
exemplos resolvidos, ou seja, existe uma preocupação de justificar técnicas
desenvolvidas por meio de tecnologias que mostram as diferentes possibilidades
para o cálculo das aplicações financeiras, em particular, quando se trabalha com a
noção de juros compostos. Após essa breve justificativa das escolhas dos livros a
serem analisados, indicamos na tabela 2 as obras examinadas neste trabalho e
observamos que o ano indicado na tabela para as obras do Ensino Médio
correspondem à primeira publicação da obra, que já havia sido avaliada e que foi
novamente indicada pelo PNLEM (2009), ou seja, trata-se de obras que vêm se
consolidando em função das expectativas institucionais que correspondem às
propostas indicadas nos PCNEM (1998) e Parâmetros Curriculares Nacionais PCN+
(2005). Para as obras do Ensino Superior consideradas neste trabalho indicamos
apenas o ano da edição utilizada nesta pesquisa.
Livro
Ano
PNLEM
Etapa
1ª Matemática- Dante- Dante et al., Volume Único
2008
2009
EM
2ª Matemática- aula por aula- Xavier & Barreto et.al., 3ª
série
2005
2009/2010/2011
EM
3ª Matemática- Completa – Giovanni, Giovanni & Bonjorno
et al., 1ª série
2005
2009
EM
1ª Matemática Financeira- Sobrinho et al.
2000
ES
2ª Matemática Financeira Puccini et al.
2008
ES
Tabela 2: Obras analisadas na pesquisa
Uma vez escolhidas as obras a serem analisadas, para efeito de análise,
consideramos a introdução teórica, os exercícios resolvidos e os exemplos de
111
aplicações como a parte a ser desenvolvida pelo professor (“topos” do professor),
ficando a cargo dos estudantes os exercícios propostos (“topos” do estudante).
Para melhor identificar a proposta dos diferentes autores utilizamos a grade
de análise apresentada no capítulo anterior, que possibilita evidenciar a ênfase dada
à aplicação direta do conceito de juros simples e compostos ou da articulação
desses conceitos com as noções de função afim e exponencial e progressão
aritmética e geométrica respectivamente.
Delineada a forma como será apresentada a análise, expõe-se a seguir as
questões que a norteiam:

Quais os conhecimentos sobre a noção de juros simples e compostos desenvolvidos no
Ensino Médio que podem ser considerados como conhecimentos prévios disponíveis?

Quais as articulações entre esses conhecimentos e os conhecimentos matemáticos
necessários para o controle e justificativa das técnicas que lhes são associadas?

Qual o papel esperado do professor no trabalho com as noções de juros simples e
compostos?

Qual o papel esperado dos estudantes no trabalho com as noções de juros simples e
compostos?

Existe uma coerência entre as relações institucionais esperadas, ou seja, o que é
proposto para o Ensino Médio e Superior e as relações institucionais existentes?
Iniciamos assim nossas análises pelas obras do Ensino Médio, seguindo a
apresentação das justificativas da escolha, ou seja, a primeira obra é a de Dante
(2008).
5.2 ANÁLISE DA OBRA DE DANTE ET AL. (2008)
5.2.1 COMENTÁRIOS E ANÁLISE
O autor inicia mostrando a importância das noções de Matemática Financeira
para aplicações do cotidiano como: cálculo de prestações, pagamento de impostos,
rendimento de caderneta de poupança, entre outros, e motiva seu estudo por meio
112
de um exemplo em que o sujeito deve escolher entre deixar seu dinheiro aplicado na
caderneta de poupança e efetuar o pagamento da compra de um bem de consumo à
vista ou a prazo.A partir dessa observação, o autor introduz a noção de números
proporcionais, o que corresponde a revisitar as noções de fração, equivalência de
frações, grandezas diretamente e inversamente proporcionais, como podemos
observar no quadro abaixo.
Fonte: DANTE, 2008, p. 332.
Como exemplo de divisão em partes proporcionais, o autor considera a
criação de uma sociedade em que os sócios investem quantias diferentes e,
portanto, devem receber diferentes partes do lucro, como mostra o exemplo abaixo.
Fonte: DANTE, 2008, p. 333.
No exemplo acima identificamos a forma como o autor articula conhecimentos
prévios com novos conhecimentos, ou seja, ele introduz as questões associadas ao
mercado financeiro para motivar e nivelar os estudantes que tenham ainda
113
dificuldades em aplicar as noções identificadas acima como necessárias para o
desenvolvimento dos conceitos de Matemática Financeira.
Atentamos que a
introdução de números proporcionais e grandezas direta e inversamente
proporcionais só são trabalhadas na obra do Dante, ou seja, trata-se de uma
abordagem
específica
desse
autor
que
tem
a
preocupação
de
revisitar
conhecimentos prévios articulando-os com os novos conhecimentos. Ressaltamos a
importância dessa revisitação tanto do ponto de vista da possibilidade de tornar os
conhecimentos prévios mais estáveis e, portanto, disponíveis como da motivação do
trabalho a ser efetuado posteriormente, em que as noções apresentadas servem de
ferramenta explícita para o desenvolvimento das técnicas associadas à noção de
juros simples. Além dos conceitos de números proporcionais e divisão em partes
proporcionais, o autor revisita a noção de porcentagem, não ostensiva desenvolvida
no Ensino Fundamental e que se supõe possa ser evocada pelos estudantes do
Ensino Médio, o que leva à rápida apresentação e manipulação dos ostensivos de
representação escrita associados, ou seja, 9% é o mesmo que 9
100
ou 0,09.
Nesse caso, o autor supõe que os estudantes do Ensino Médio possam
mobilizar o conceito de porcentagem e de suas diferentes formas de representação,
o que será considerado como conhecimento prévio disponível para o Ensino
Superior. Após essa rápida observação, o autor introduz as aplicações que
envolvem o cálculo da porcentagem de uma determinada quantia. Ainda nesse caso,
o trabalho apresentado deixa evidente que o autor supõe que os estudantes já
disponham desses conhecimentos, o que lhe faz considerar a questão dos
aumentos e descontos, assim como dos aumentos e descontos sucessivos, e a
propor problemas que envolvem porcentagem e outros conhecimentos prévios,
como a noção de equação, para encontrar uma solução, conforme mostra o exemplo
abaixo.
114
Fonte: DANTE, 2008, p. 333.
A partir da articulação entre conhecimentos prévios e conceitos de aplicações
para cálculo de aumentos e descontos que fazem parte do cotidiano do mercado
financeiro e da vida do cidadão, o autor introduz novos termos de Matemática
Financeira associando-os com seu significado e com a representação que permite
escrever as fórmulas que serão utilizadas para manipulá-los, como: capital, taxa de
juros, montante e período (tempo), como mostra o exemplo do quadro abaixo:
Fonte: DANTE, 2008, p. 337.
Essa introdução dos termos importantes de Matemática Financeira facilita a
introdução da noção de juros simples por meio de uma tarefa para a qual a técnica
utilizada é justificada adotando o conceito de porcentagem e aumentos sucessivos,
que corresponde à noção de juros simples, cuja fórmula que pode ser aplicada em
qualquer situação do mesmo tipo é generalizada. Percebemos que o autor trabalha
a passagem da representação em língua natural para a representação algébrica que
permite a manipulação da técnica e, consequentemente, sua descrição, explicação e
justificativa por meio de um discurso associado à teoria que o sustenta. Da mesma
forma, para a noção de juros compostos o autor apresenta um exemplo articulado
115
com os componentes envolvidos na fórmula, que corresponde ao ostensivo de
representação algébrica que possibilita a manipulação da técnica, como mostra o
exemplo abaixo:
Fonte: DANTE, 2008, p. 338.
Após essa introdução dos conceitos de juros simples e compostos, o autor
articula esses novos conhecimentos com as noções de função afim e exponencial
respectivamente, mostrando a importância do ostensivo de representação gráfica
para a visualização do trabalho algébrico desenvolvido no cálculo de juros por meio
da fórmula. As noções de funções afim e função exponencial são supostas
disponíveis para o estudantes do Ensino Médio e consequentemente para os
estudantes do Ensino Superior. Ressaltamos que as noções de Matemática
Financeira são propostas para serem trabalhadas após a introdução das noções de
função afim, quadrática, exponencial, logarítmica e trigonométrica, ou seja, a
Matemática Financeira é considerada uma aplicação em que são essas noções que
permitem justificar o trabalho matemático em jogo.Observamos que essa articulação
proposta por Dante para ser trabalhada no Ensino Médio é importante para os
estudantes de Administração de Empresas, pois o ostensivo de representação
gráfica permite uma rápida visualização dos resultados, o que se espera que se
apresente aos interessados a evolução e o desempenho da empresa no mercado de
forma simples e objetiva.O autor introduz ainda a noção de equivalência de capitais
destacando que o valor de uma quantia dependerá do momento em que ocorrer a
operação. Apresenta um exemplo dando ao estudante condições de realizar
116
escolhas ao trabalhar com a aplicação de capital em determinado tempo, como é
apresentado no exemplo abaixo:
Fonte: DANTE, 2008, p. 340.
Observamos finalmente que o autor é fiel à proposta dos documentos oficiais,
pois no capítulo destinado às progressões aritméticas e geométricas a articulação é
feita no sentido oposto, ou seja, os conhecimentos de Matemática Financeira e
função afim e exponencial são articulados com as noções de progressões
aritméticas e geométricas, ou seja, existe a preocupação constante de revisitar
conhecimentos prévios e utilizá-los como apoio para a introdução de novos
conhecimentos.
Logo, fica a cargo dos professores e estudantes interpretar, descrever,
explicar e justificar a articulação entre os conhecimentos de juros simples e
compostos e as noções de função afim e exponencial e progressões aritméticas e
geométricas, uma vez que a obra apresenta as condições necessárias para esse
trabalho. A seguir, apresentamos a parte do trabalho que consideramos para efeito
de análise como a ser desenvolvida pelo professor (“topos” do professor) e pelo
estudante (“topos” do estudante).
117
5.2.2
O “TOPOS” DO PROFESSOR E DO ESTUDANTE
Contextualizando as aplicações da Matemática com as necessidades do
mercado financeiro, deixando claro e evidente a necessidade do conhecimento da
Matemática Financeira para todos na sociedade, o autor destaca exemplos do
cotidiano de compra e venda, fazendo uma revisitação nas aplicações de números
proporcionais e porcentagem de uma quantia. Percebemos nessa breve introdução
realizada pelo autor a necessidade de o estudante possuir o domínio dos quadros
numérico e algébrico considerados no capítulo anterior. O exemplo sobre aplicações
de fator de atualização, aumentos e descontos sucessivos coloca em evidência a
necessidade dos conhecimentos associados aos dois quadros acima, que, em geral,
são desenvolvidos no Ensino Fundamental.
Fonte: DANTE, 2008, p. 335.
É importante observar que é necessário que o professor, ao introduzir os
conceitos de proporcionalidade e de porcentagem, tenha a preocupação de mostrar
a relação entre a Matemática e as aplicações financeiras, uma vez que os conceitos
matemáticos
sustentam
os
cálculos
associados
Fonte: DANTE, 2008, p. 335.
a
essas
aplicações.
118
Na sequência, o autor introduz as noções de capitalização linear, juros
simples, contextualizando com aplicações bancárias em que destaca o uso de
quadro numérico e algébrico para identificar as incógnitas na resolução das tarefas
propostas. As tarefas estão associadas às aplicações financeiras como operações
de compra-venda e aplicação bancária, o que exige um estudo específico tanto do
professor como do estudante, pois as aplicações financeiras, em geral, na são
trabalhadas nos cursos de Matemática e exigem assim que professores articulem
diferentes conhecimentos, ou seja, trata-se aqui de tarefas que ultrapassam a
aplicação da Matemática no desenvolvimento de outras noções matemáticas. As
noções associadas aos quadros numérico e algébrico servem de ferramentas
explícitas para o desenvolvimento de tarefas do quadro da Matemática Financeira
que necessita do conhecimento de termos e representações próprios para o seu
desenvolvimento.
Fonte: DANTE, 2008, p. 338.
A tarefa abaixo se centra em uma aplicação bancária, em que professor e
estudante devem associar o enunciado às respectivas representações para
aplicarem a fórmula de cálculo de montante que na Matemática pode ser
considerada como uma função exponencial ou uma progressão geométrica.
Fonte: DANTE, 2008, p. 338.
119
Depois de apresentar as possibilidades de utilização das noções associadas à
Matemática Financeira colocando, em jogo os ostensivos que permitem manipulá-las
e os não ostensivos matemáticos que, ao serem evocados, descrevem, explicam e
justifica essa manipulação, o autor introduz o conceito de equivalência de capital,
que é muito usada em aplicações financeira bancárias e comerciais, demonstrando
por meio de algumas tarefas as possibilidades de articulação entre o numérico,
algébrico e geométrico. Além disso, no desenvolvimento desse trabalho o autor
apresenta exemplos em que é necessário utilizar a noção de logaritmo e suas
propriedades, que se supõe mobilizável, pois deve ter sido introduzida quando da
definição de função logarítmica e sua associação coma noção de função
exponencial. O autor finaliza o capítulo mostrando que os conceitos introdutórios de
equivalência de capitais podem ser mais bem compreendidos quando se trabalha no
quadro geométrico, o que facilita a introdução de fluxo de caixa em uma relação de
capital no tempo. Observamos que, ao relacionar prazo e capital, o autor espera que
o estudante disponha de conhecimentos das noções associadas aos quadros
considerados na pesquisa, pois esses conhecimentos podem facilitar a interpretação
das tarefas propostas, seja em aplicação em regime de capitalização linear, seja em
regime de capitalização exponencial, como é possível visualizar nos exemplos
abaixo:
Suponhamos o capital de R$ 800,00 aplicado à taxa de 40% ao ano. Qual seria a
representação gráfica quando obtemos os juros em função do tempo de aplicação
por meio da equação.
J=320t
Essa função apresenta uma equação do tipo função linear
Fonte: DANTE, 2008, p. 339.
Fonte: DANTE, 2008, p. 339.
120
Os exemplos acima e abaixo correspondem à articulação entre a noção de
juros simples e a noção de função linear e afim, ou seja, o autor mostra como a
noção de função pode auxiliar a visualizar o resultado da operação financeira
considerada.
Fonte: DANTE, 2008, p. 339.
O exemplo que segue foi introduzido pelo autor para mostrar a articulação
entre a noção de juros compostos e a função exponencial. Esse trabalho auxilia a
compreender mais rapidamente a variação das duas funções e deixa evidente que o
gráfico da função exponencial cresce mais rapidamente que o da função afim,
deixando clara a escolha da aplicação a juros compostos pelo sistema financeiro.
Fonte: DANTE, 2008, p. 340.
Após a explicitação do trabalho, que para efeitos de análise é considerado
como a parte do professor, certamente considerando que o mesmo se realiza em
121
uma ação orquestrada com seus estudantes, passamos à verificação das tarefas
propostas que são aqui reputadas como a parte a ser desenvolvida pelos
estudantes. Tendo por referência nossa grade de análise apresentada no capítulo
anterior, indicamos abaixo a relação entre o número de tarefas que se supõe
comporem o trabalho do professor e do estudante no desenvolvimento das questões
associadas às noções relativas aos conteúdos de Matemática Financeira.
Resolvidas
Propostas
Tarefa
Quantidade
%
Tarefa
Quantidade
%
Tarefa 1
4
29
Tarefa 1
3
14
Tarefa 2
2
14
Tarefa 2
8
36
Tarefa 3
8
57
Tarefa 3
11
50
Tarefa 4
0
0
Tarefa 4
0
0
Total
14
1
Total
22
1
Tabela 3: Tarefas resolvidas e propostas na obra de Dante,2008.
Ainda para efeito de análise, consideramos as tarefas resolvidas como a parte
que corresponde ao trabalho (“topos”) do professor, e as tarefas propostas são
identificadas como pertencentes ao desenvolvimento dos conhecimentos de forma
autônoma (“topos”) pelos estudantes.
Atentamos que nessa obra o tipo de tarefa 1, “Situação Matemática para
Cálculo de Acrescimo ou Desconto”, apresenta 29% das tarefas resolvidas pelos
autores, possibilitando aos estudantes uma visão do uso da matemática para
trabalhar em situações do cotidiano diante de transações comerciais de varejo e em
situações de investimentos por instituições financeiras.
Observamos também que na obra se propõe 14% desse tipo de tarefa como
trabalho a ser realizado pelos estudantes, o que é compreensível, pois essa questão
corresponde a uma revisita aos conhecimentos já trabalhados no Ensino
Fundamental, e aqui se trata apenas de aprofundá-los e mostrar sua aplicabilidade.
122
A análise permite identificar que nessa obra a tarefa 2, “Situação Matemática
para Cálculo de Juros Simples”, foi privilegiada em apenas 14% das tarefas
resolvidas.Acreditamos que tal fato esteja associado a sua pouca utilidade quando
se consideram as aplicações financeiras, ou seja, aqui ela é útil para ilustrar as
noções matemáticas de função linear e afim e progressão aritmética.Isso fica mais
evidente quando se observa que 36% das tarefas propostas aos estudantes são do
tipo 2, proporcionando uma revisita aos conteúdos já trabalhados anteriormente, isto
é, existe uma intenção de tornar os conhecimentos prévios mais estáveis e mostrar
a aplicabilidade e importância deles. A tarefa 3, “Situação Matemática para Cálculo
de Juros Compostos”, pode ser considerada como a mais importante para o trabalho
com Matemática Financeira, pois 57% do que se considera como a parte a ser
desenvolvida pelo professor é composta de tarefas desse tipo, e a parte, que
segundo a forma de análise fica a cargo dos estudantes, corresponde a 50% de
tarefas do tipo 3. A ênfase dada a esse tipo de tarefa está associada a sua
importância nas aplicações financeiras, cujo regime de capitalização é o de juros
compostos. Observamos que a tarefa do tipo 3, além de ser a que corresponde às
aplicações do mercado financeiro, possibilita a revisita das noções de função
exponencial e logaritmo e suas propriedades permitindo assim uma articulação entre
a Matemática Financeira e as noções matemáticas que servem de ferramenta para a
sua sobrevivência.A tarefa 4, “Situação matemática para Cálculo de Juros sobre
Depósito à Vista – o Método Hamburguês”, não é trabalhada, pois trata-se de uma
aplicação específica que representa a premiação do cliente que mantém um capital
em conta corrente.Finalmente, podemos considerar que nessa obra o autor utiliza a
Matemática Financeira como exemplo de aplicação das noções de função afim,
linear e exponencial, da noção de logaritmo e suas propriedades e dos conceitos de
progressão aritmética e geométrica, o que lhes permite articular diferentes quadros e
manipular as técnicas que lhe são associadas por meio de ostensivos de
representação que permitem descrevê-las, explicá-las e justificá-las, evocando os
não ostensivos que os sustentam. Na sequência, apresentamos uma breve análise
da obra de Giovanni e Bonjorno et al. (2005).
123
5.3 ANÁLISE DA OBRA DE GIOVANNI & BONJORNO ET AL. (2005)
5.3.1 COMENTÁRIOS E ANÁLISE
Os autores iniciam a obra revisitando o conceito de porcentagem, destacando
a etimologia da palavra e articulando com operações varejistas do cotidiano das
pessoas.O exemplo abaixo mostra o tipo de tarefa utilizado para motivar os
estudantes no estudo da noção de porcentagem que se supõe tenha sido trabalhada
no Ensino Fundamental, e aqui servirá de suporte para o desenvolvimento das
noções de juros simples e compostos.
Fonte: GIOVANNI E BONJORNO, 2005, p. 286.
Observamos, por meio da tarefa acima, que implicitamente os autores
consideram os conceitos de equação e proporcionalidade como disponíveis, assim
como a noção de porcentagem, ou seja, eles apresentam um exemplo em que essas
noções são utilizadas como ferramentas explícitas do trabalho matemático a ser
desenvolvido. O novo conceito é a aplicação das noções matemáticas em exemplos
da vida cotidiana. Notamos também que entre as tarefas propostas existe a
preocupação em proporcionar ao estudante, por meio do encarte abaixo, o papel da
taxa de juros realizado pelo Banco Central no controle de emissão ou redução da
moeda.
124
Fonte: GIOVANNI E BONJORNO, 2005, p. 299.
A obra trata as noções de lucro e prejuízo via tarefas contextualizadas de
operações rotineiras de compra e venda e pequenos investimentos.
Além disso, na obra encontramos diferentes técnicas para resolver as tarefas
associadas às noções de acréscimos e descontos sucessivos, juros simples e
compostos, enfatizando que para o estudo dos juros composto é preciso dispor do
conceito de logaritmo e suas propriedades.
Nas tarefas resolvidas é possível identificar um discurso que justifica a técnica
empregada, assim como os não ostensivos utilizados para evocar os ostensivos
manipulados no desenvolvimento dessas técnicas.
Os ostensivos orais e gestuais estão implícitos no desenvolvimento da tarefa,
cabendo ao professor recuperá-los. No exemplo abaixo, quando os autores indicam
que estão utilizando o não ostensivo logaritmo, o professor deve usar ostensivos oral
e gestual (dos dois lados da igualdade) para explicitar a aplicação da propriedade.
125
Fonte: GIOVANNI E BONJORNO, 2005, p. 300.
Finalizam o capítulo oferecendo aos estudantes uma tabela demonstrando o
valor das parcelas de uma compra de um carro e descrevendo as variações para
negociação a prazo. Essa tarefa incentiva o estudante a usar a calculadora.
Observamos também que os autores deixam a cargo do professor a elaboração de
um discurso tecnológico adequado para justificar as diferentes técnicas.
Certamente isso se deve ao fato de que o livro será utilizado por estudantes
que se encontram em diferentes níveis em relação aos conhecimentos prévios
necessários para a execução da tarefa. Consideramos aqui os níveis técnico,
mobilizável e disponível definidos por Robert (1997). Para melhor identificar o
trabalho a ser realizado por professores e estudantes, apresentamos uma breve
descrição do que se supõe que esteja a cargo dos mesmos em função da grade de
análise desenvolvida no capítulo anterior.
5.3.2
O “TOPOS” DO PROFESSOR E DO ESTUDANTE
Na sequência fazemos a análise do “topos” do professor e do estudante
considerando a tabela abaixo, em que, para efeito de análise, as tarefas resolvidas
são da incumbência do professor e as propostas, dos estudantes.
126
Resolvidas
Propostas
Tarefa
Quantidade
%
Tarefa
Quantidade
%
Tarefa 1
5
36
Tarefa 1
10
19
Tarefa 2
4
29
Tarefa 2
14
27
Tarefa 3
5
36
Tarefa 3
28
54
Tarefa 4
0
0
Tarefa 4
0
0
Total
14
100
Total
52
100
Tabela 4: Tarefas resolvidas e propostas na obra de Giovanni e Bonjorno, 2005.
A tarefa 1, “Situação Matemática para Cálculo de Acrescimo ou Desconto”,
que corresponde a 36% das resolvidas e 19% das propostas, exige apenas que os
estudantes disponham de conhecimentos sobre as operações de multiplicação,
divisão e a noção de proporcionalidade e porcentagem. Já na tarefa 2, “Situação
Matemática
para Cálculo de Juros Simples”, a obra apresenta uma situação
contextualizada, e 29% das tarefas propostas ficam a cargo do professor, e quase
na mesma proporção é esperado o empenho dos estudantes, uma vez que 27% das
tarefas propostas são do tipo 2.Verificamos assim que as tarefas 1 e 2 são utilizadas
como uma nova forma de revisitar conhecimentos associados às noções de
operações com números racionais, proporcionalidade, porcentagem e equação do
primeiro grau.A tarefa 3, “Situação Matemática para Cálculo de Juros Compostos”,
como na obra anterior, é privilegiada, pois cabe ao professor desenvolver 36% das
tarefas propostas, e para os estudantes ela corresponde à mais da metade do
trabalho a ser desenvolvido.
Como já discutido nas análises da obra anterior, essa ênfase pode ser vista
como a possibilidade de utilização da Matemática desenvolvida no Ensino Médio
como ferramenta para o cálculo das aplicações financeiras, atualmente muito
usadas pelos profissionais dessa área. A tarefa 4, “Situação matemática
para
Cálculo de Juros sobre Depósito à Vista – o Método Hamburguês”, como na obra
anterior, não é abordada nessa obra.A grande diferença entre essa obra e a anterior
é que não existe uma preocupação dos autores em articular as noções de função
afim, linear exponencial e progressões aritméticas e geométricas com os conceitos
de Matemática Financeira, ou seja, revisitam-se apenas a noção de logaritmo e suas
127
propriedades para desenvolver os cálculos necessários.Os autores distribuem
equitativamente o trabalho do professor no desenvolvimento das três tarefas, mas
dão ênfase à tarefa 3 quando se considera o “topos” do estudante.Seguimos
apresentando uma breve análise da obra de Xavier e Barreto et al. (2005).
5.4 ANÁLISE DA OBRA DE XAVIER E BARRETO ET AL. (2005)
Os autores iniciam a obra fazendo um comentário sobre a importância da
Matemática Financeira, explicitando seu vínculo com a economia de mercado e
destacando a necessidade desse conhecimento para melhor interpretar os
mecanismos das operações financeiras com as quais nos confrontamos diariamente.
Após revisitar os conceitos de proporcionalidade e porcentagem, indica-se a
representação percentual em forma de fração como essencial para o trabalho a ser
desenvolvido na obra. Apresenta como exemplo motivador uma questão da prova do
Enem, exposta abaixo, em que se utilizam ostensivos de representação numérica.
Fonte: XAVIER E BARRETO, 2005, p. 19-20.
128
Essa escolha em apresentar temas sociais e econômicos do cotidiano é
sentida no desenvolvimento da obra. Notamos uma preocupação dos autores em
mostrar as diferentes formas de representação das porcentagens, o que permitirá a
aplicação mais adequada quando necessário. bO encaminhamento dado às
questões de Matemática Financeira na obra segue as orientações dos Parâmetros
Curriculares Nacionais, mas os exemplos retirados do Enem, em geral, são artificiais
e pouco ajuda na introdução do novo conceito.
O
exemplo
abaixo
deixa
evidente a falta de articulação entre a situação contextualizada e o conceito de
porcentagem que se deseja introduzir. Não existe um discurso que justifique como
tratar os dados da tabela.
Fonte: XAVIER E BARRETO, 2005, p. 20.
Para tratarem da noção de juros simples, os autores associam os dados da
tarefa aos elementos da fórmula e calculam os juros sem apresentar um discurso
que descreva, explique e justifique o trabalho matemático realizado.
A noção de equação é suposta disponível e o discurso sobre o
desenvolvimento da técnica fica a cargo do professor.
129
Fonte: XAVIER E BARRETO, 2005, p. 23.
No exemplo acima fica mais evidente que os autores consideram os
conhecimentos sobre porcentagem e suas representações, assim como a noção de
equação do primeiro grau como disponíveis utilizando apenas um discurso que
justifica os termos de Matemática Financeira dados na tarefa e os elementos da
fórmula que permite efetuar os cálculos.
Como já descrito para os exemplos anteriores, as tarefas desenvolvidas na
obra sobre aumentos e descontos sucessivos seguem a mesma abordagem, ou
seja, converte-se o enunciado nos elementos da fórmula e efetuam-se os cálculos,
podendo utilizar uma calculadora. O exemplo abaixo de aumentos sucessivos ilustra
a forma de trabalho própria da obra.
Fonte: XAVIER E BARRETO, 2005, p. 28
A noção de juros compostos não é introduzida nessa obra. Verificamos que
os autores introduzem a Matemática Financeira como um novo conteúdo, utilizando
como conhecimentos prévios as operações com números racionais, as noções de
proporcionalidade, porcentagem, equação do primeiro grau, supondo-as como
disponíveis. A articulação entre as noções de juros simples com os conceitos de
função afim, linear e progressões aritméticas não é trabalhada nessa obra;
130
encontramos esse trabalho apenas na primeira obra analisada neste estudo. Na
sequência, apresentamos uma breve descrição do trabalho esperado de professores
e estudantes segundo nossa proposta de análise.
5.4.1 O “TOPOS” DO PROFESSOR E DO ESTUDANTE
Semelhante ao processo que estamos desenvolvendo nas obras anteriores,
fazemos uma análise do “topos” do professor e do estudante considerando as
tarefas resolvidas atribuídas ao professor e as tarefas propostas conferidas aos
estudantes.
Resolvidas
Propostas
Tarefa
Quantidade
%
Tarefa
Quantidade
%
Tarefa 1
2
50
Tarefa 1
5
45
Tarefa 2
2
50
Tarefa 2
6
55
Tarefa 3
0
0
Tarefa 3
0
0
Tarefa 4
0
0
Tarefa 4
0
0
Total
4
100
Total
11
100
Tabela 5: Tarefas resolvidas e propostas na obra de Xavier & Barreto, 2005.
A tabela acima mostra que apenas as tarefas do tipo 1 e 2 são desenvolvidas
na obra. Destacamos a proporcionalidade encontrada no trabalho do professor e do
estudante. Considerando as propostas institucionais, observamos que o professor e
o estudante devem procurar outros materiais para desenvolver e estudar a noção de
juros compostos, que não é abordada explicitamente na obra e pode ser um fator de
dificuldade para aqueles que continuarem seus estudos, em particular, nos cursos
de Administração. Consideramos que a obra não apresenta explicitamente a noção
de juros compostos, mas esta é tratada por meio de uma tarefa complementar sobre
a trajetória histórica do cálculo de juros na Babilônia. Além disso, os autores tomam
em conta a noção de “juros sobre juros” que na realidade corresponde à noção de
juros compostos, permitindo assim que o professor escolha se deve ou não
aprofundar o tema. Isso mostra que os autores tentam contemplar as exigências
131
institucionais, mas algumas necessitam de um aprofundamento que depende das
diferentes turmas, e que fica a cargo do professor. Certamente, cabe ao professor
escolher e adaptar o trabalho apresentado na obra em função de sua turma e das
exigências institucionais de sua região, o que é indicado nos Parâmetros
Curriculares Nacionais e mostra a importância das diferentes obras, que possibilitam
uma flexibilidade no trabalho do professor, que pode adequá-las em função dos
conhecimentos prévios de seus estudantes.
Continuando
a
nossa
análise,
passamos aos livros por nós escolhidos e que fazem parte das ementas dos cursos
superiores de Administração considerados neste trabalho, em que é oferecida
Matemática Financeira.
5.5
ANÁLISE DA OBRA DE SOBRINHO ET AL. (2000)
5.5.1
COMENTÁRIOS E ANÁLISE
O autor inicia a obra agradecendo o sucesso dela entre os profissionais que
militam no mercado financeiro, demonstrando assim a recepção apropriada do livro
entre os técnicos, gerentes executivos e estudantes dessa matéria. O livro é
composto de onze capítulos e dois apêndices, sendo que o apêndice A traz uma
revisão sobre potências, progressões e interpolação, e o apêndice B apresenta as
tabelas financeiras. No capítulo 1, apresenta os conceitos de juros, capital e taxa
enfatizando a relação entre possuir o capital para a compra de bens de consumo ou
serviços e a possibilidade de emprestá-lo, assim como os riscos dessa segunda
opção.
Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 19.
132
Após mostrar a importância do uso do capital e suas consequências, o autor
faz a exposição do trabalho algébrico que permite manipular os cálculos associados
ao regime de capitalização linear, ou juros simples.
Na sequencia, é apresentada uma série de tarefas resolvidas e propostas em
que se espera que o estudante disponha de conhecimentos sobre o conjunto dos
números naturais, racionais, inteiros e suas operações, noção de cálculo algébrico e
de equações do primeiro grau e mobilize os novos conhecimentos associados à
identificação dos elementos dados no enunciado com os conceitos e as
representações usados nas fórmulas para os cálculos de juros, montante, capital,
prazo e taxa. Ainda no capítulo 1, o autor apresenta o método hamburguês
mostrando que algum tempo atrás os bancos pagavam juros sobre os depósitos à
vista, propiciando assim uma reflexão entre oferta e demanda de capital pelos
bancos. É interessante destacar que o método hamburguês é um dos precursores
do cheque especial de hoje, em que se efetua o cálculo de juros sobre o saldo
devedor. Essas contas eram denominadas contas garantidas. Isso auxilia
professores e estudantes a entender melhor o desenvolvimento
do sistema
financeiro e até mesmo das influências econômicas no País e principalmente a
importância do conhecimento da Matemática nesse contexto, propiciando condições
de exercer plenamente a cidadania consciente ao se relacionar com instituições
financeiras.
Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 29.
133
No capítulo 2, “Capitalização Composta”, é trabalhada o conceito de
Montante e valor atual para pagamento único. O autor inicia o capítulo apresentando
os conceitos e simbologias utilizados para manipular as fórmulas que permitem
executar os cálculos associados a esse regime de capitalização. O trabalho é
realizado quase que exclusivamente no quadro algébrico e os conhecimentos
prévios de álgebra elementar como o conceito de equação do primeiro grau de
funções linear, afim e exponencial, assim como de logaritmos e suas propriedades
são supostos disponíveis. O discurso que acompanha as tarefas resolvidas, em
geral, explicita a conversão dos dados do problema para as representações
algébricas correspondentes, ou seja, trata-se principalmente da identificação dos
termos: prazo taxa valor futuro, valor presente, representação gráfica na relação do
valor futuro com taxa possibilitando uma melhor visualização e interpretação dos
resultados.
Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 27.
O autor apresenta diversas situações-problema detalhando suas respectivas
soluções. É abordada também a questão da “Equivalência de taxas”, noção
importante para o estudo do processo da variação da taxa em função do prazo. O
exemplo abaixo deixa evidente que na obra o objetivo é descrever, explicar e
justificar os conceitos de Matemática Financeira, e a Matemática subjacente é
134
suposta disponível, ficando a cargo do professor e estudante explicitar esse trabalho
quando necessário.
Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 27.
Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 42.
O autor incentiva o uso da calculadora financeira HP12C e mostra a
necessidade de explicitar a forma como se calculam os juros de um empréstimo
quando se introduz essa nova ferramenta no curso, ou seja, a calculadora exige uma
nova técnica e consequentemente um novo discurso que a justifique. Observamos
que, ao introduzir a calculadora, o professor deve estar consciente da importância de
descrever, explicar e justificar a nova forma de cálculo que faz uso de outros
ostensivos de representação que precisam ser identificados nos botões da
calculadora, como é possível observar nos exemplos abaixo.
135
Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 347
Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 349.
Na sequencia, apresentamos as análises sobre o que se espera de
professores e estudante em função da nossa proposta de estudo do papel desses
dois atores na ação que se desenvolve no processo de ensino e aprendizagem.
5.5.2 O “TOPOS” DO PROFESSOR E DO ESTUDANTE
De acordo com a grade de análise criada no capítulo anterior, diante das
tarefas resolvidas e propostas no livro analisado, procuramos identificar a relação
entre o que corresponde à parte a ser desenvolvida pelo professor e o que fica a
cargo do estudante, ou seja, o “topos” do professor e o “topos” do estudante. A
tabela abaixo mostra a distribuição das tarefas de juros simples e compostos na
obra.
136
Resolvidas
Propostas
Tarefa
Quantidade
%
Tarefa
Quantidade
%
Tarefa 1
0
0
Tarefa 1
0
0
Tarefa 2
10
59
Tarefa 2
23
49
Tarefa 3
05
29
Tarefa 3
21
45
Tarefa 4
02
12
Tarefa 4
03
6
Total
17
100
Total
47
100
Tabela 6: Tarefas resolvidas e propostas na obra de Sobrinho, 2000.
Observando a tabela, verificamos que a tarefa 1, “Situação Matemática para
Cálculo de Acrescimo ou Desconto”, não é trabalhada na obra, o que permite supor
que se trata de um conhecimento prévio que pode estar disponível e que tenha sido
suficientemente trabalhado no Ensino Médio.Quanto à tarefa 2, “Situação
Matemática para Cálculo de Juros Simples”, notamos que o autor preocupa em
enfatizar aplicações do cotidiano do mercado financeiro deixando a cargo dos
estudantes revisitar os conceitos de progressão aritmética e geométrica e fazer a
articulação necessária, ou seja, o autor considera esse conhecimento pelo menos
mobilizável pelos estudantes, uma vez que ele é tratado apenas no apêndice, que é
indicado para estudos complementares. Esse apêndice também é usado para
indicar procedimentos para resolução de tarefas com o auxílio da calculadora
financeira HP 12C. Em relação ao número de tarefas, conforme nossa proposta de
análise, o professor desenvolve 59% das tarefas propostas e o estudante 49%, o
que é proporcional, pois o número de tarefas resolvidas é menor que o de tarefas
propostas.
No tocante à tarefa 3, “Situação Matemática
para Cálculo de Juros
Compostos”, observamos que existe uma preocupação do autor em deixar a cargo
do estudante o desenvolvimento de tarefas como essa, pois entre aquelas resolvidas
encontramos 29% associadas a esse tipo, e que se supõe destinadas ao professor,
e 45% de tarefas propostas que ficam a cargo do estudante. É importante observar
que o autor dá
ênfase às tarefas de juros simples e compostos tanto para o
desenvolvimento do trabalho suposto do professor como do estudante.
137
Além disso, a articulação desses conhecimentos com as noções de
progressão aritmética e geométrica, mesmo ficando a cargo do estudante, é
proposta em apêndice e pode ser trabalhada pelo professor.
A tarefa 4, “Situação Matemática para Cálculo de Juros sobre Depósito à
Vista – o Método Hamburguês”, em geral, introduzida no Ensino Superior e que se
apoia sobre as noções de juros, em especial, juros compostos, é suposta como o
novo conhecimento a ser introduzido, correspondendo principalmente à parte do
professor, 12% das tarefas resolvidas e 6% das propostas. Observamos ainda que o
autor aprensenta um diferencial quanto à abordagem do Método Hamburguês, pois
traz um histórico sobre esse método destacando sua aplicação no Brasil, ou seja, a
passagem da conta garantida para o cheque especial atual, em que a incidência e
necessidade de manipular juros compostos são evidentes.
Além disso, o livro faz referência a temas atuais mostrando por exemplo o
papel dos bancos na economia, evidenciando assim a importância da Matemática
Financeira tanto para estudantes do Ensino Médio quanto para os do Ensino
Superior, pois possibilita a escolha consciente das condições de pagamentos em
transanções comerciais e aquisições no mercado financeiro.Verificamos que nessa
obra o destaque é para aplicações bancárias e imobiliárias, pois as tarefas
pivilegiam essa porção do mercado financeiro, que nos parece a mais operante
atualmente.As tarefas são desenvolvidas quase que exlusivamente no quadro
algébrico e pouco se utiliza a representação gráfica que permitiria uma melhor
visualização dos resultados.
Em função da necessidade dos estudantes de conhecer a forma de trabalho
do mercado financeiro, a calculadora financeira HP 12C é introduzida no curso, e o
autor deixa evidente a necessidade de explicitar o trabalho a ser realizado, pois
temos uma nova representação para os objetos de Matemática Financeira.
Na sequência apresentamos a segunda e última obra escolhida para nossas
análises, lembrando que se trata do material que utilizamos em nossos cursos de
Matemática Financeira, bem como é citada nos quatro planos de ensino das
universidades discutidos neste trabalho.
138
5.6 ANÁLISE DA OBRA DE PUCCINI ET AL. (2008)
5.6.1 COMENTÁRIOS E ANÁLISE
O autor inicia a obra destacando os termos de Matemática Financeira e as
representações que possibilitam escrever as fórmulas que permitem manipular as
técnicas associadas à resolução das tarefas a serem desenvolvidas no
curso.Quanto à abordagem escolhida, o autor esclarece que o presente curso tem
como objetivo privilegiar as aplicações do mercado financeiro, o que o conduz a
introduzir a calculadora financeira HP12C e planilha eletrônica Excel.
Nos nove capítulos iniciais, todo o conteúdo é desenvolvido tendo como
princípio a hipótese de aplicação da Matemática Financeira em países onde a
moeda é estável, ou seja, a inflação é controlada. A obra traz ainda dois Apêndices
– Apêndice “A”, em que faz uma apresentação das principais funções financeiras
da calculadora financeira HP12C e um Simulador, auxiliando o estudante no
reconhecimento dessa nova forma de representação que implicará uma nova
maneira de trabalho com a Matemática. No Apêndice “B” são indicadas as funções
financeiras do aplicativo Microsoft Excel.
Tais recursos correspondem à outra forma de representar e calcular,
diferentes das anteriores, que necessita de um estudo em que explicite a maneira
de manipular esse novo ostensivo, mesmo que os não ostensivos que serão
evocados sejam os mesmos.
O autor se preocupa ainda em contextualizar os conceitos desenvolvidos nos
diferentes capítulos por meio de tarefas que são habitualmente usadas pelo
mercado financeiro, em particular, o mercado imobiliário e bancário. No capítulo 1,
“Conceitos básicos e Simbologia”, são oferecidos os conceitos de juros, unidades de
medidas articulados a fluxo de caixa, dando ao estudante uma visão conceitual do
valor do dinheiro no tempo e os objetivos da Matemática Financeira.
139
A introdução desse curso necessita de um discurso que justifica o trabalho
matemático a ser executado, tornando mais evidente à importância da tecnologia
que justifica a técnica.
Fonte: PUCCINI, 2008, p. 2.
Fonte: PUCCINI, 2008, p. 4.
Para introduzir a noção de fluxo de caixa, o autor
insere uma nova
representação, ou seja, um ostensivo de representação gráfico dado na forma de
diagrama que permite visualizar a relação entre os diferentes períodos, enfatizando
que eles não são contínuos.
Na sequencia, o autor descreve e explica como efetuar os cálculos usando a
calculadora financeira HP 12C. Observamos aqui a necessidade de um longo
discurso tecnológico quando se introduz essa nova forma de representar os
elementos e de calculá-los.
140
Fonte: PUCCINI, 2008, p. 5.
Fonte: PUCCINI, 2008, p. 5.
No capítulo 2, “Juros Simples e Compostos – Conceitos” segue o autor
revisitando os conceitos de juros simples e compostos utilizando situações-problema
específicas, para as quais se supõe que as noções de proporcionalidade e
porcentagem, números reais, suas representações e propriedade, equações de
primeiro grau, função linear e afim, equação exponencial, função exponencial,
logaritmos e suas propriedades e suas respectivas representações sejam
conhecimentos prévios disponíveis.
141
Apresentamos abaixo o discurso seguido de uma situação contextualizada
considerada na obra e que colocam em evidência as afirmações expostas acima.
Fonte: PUCCINI, 2008, p. 13.
Fonte: PUCCINI, 2008, p. 13.
No capítulo 3, “Juros Simples – Fórmulas Básicas” são apresentadas as
fórmulas básicas de juros simples, e as tarefas resolvidas e propostas correspondem
à
manipulação
dessas
fórmulas,
que,
como
já
indicamos
acima,
exige
conhecimentos prévios que se supõe tenham sido desenvolvidos no Ensino Médio,
sendo, portanto, disponíveis.
O exemplo abaixo justifica nossa interpretação quanto ao nível que se deseja
que os estudantes disponham em relação aos conhecimentos prévios necessários
para o desenvolvimento do curso.
142
Fonte: PUCCINI, 2008, p. 13.
No final do capítulo, o autor retoma o diagrama padrão de fluxo de caixa e
utiliza um discurso em língua natural, que poderá ser enfatizado pelo professor para
descrever, explicar e apresentar a relação entre o diagrama e a fórmula que
possibilita o cálculo dos juros. A obra faz uso de uma tecnologia adequada onde o
autor articula os conhecimentos sobre juros simples e suas representações
desenvolvidas no Ensino Médio com as novas técnicas e representações propostas
no Ensino Superior, e que correspondem à forma de tratamento do mercado
financeiro.
Fonte: PUCCINI, 2008, p. 25.
143
No capítulo 4, “Juros Compostos – Capitalização e Desconto”, o autor
apresenta os conceitos de juros compostos utilizando a mesma abordagem
considerada no capítulo anterior, e é a partir desse momento que introduz uma nova
forma de cálculo, ou seja, a calculadora financeira HP 12C, que é um novo ostensivo
para trabalhar as técnicas associadas à noção de juros compostos.
A própria noção de juros compostos, suas representações, as técnicas
desenvolvidas no Ensino Médio, assim como os conhecimentos prévios necessários
para manipular essas técnicas, são aqui supostos disponíveis. O exemplo abaixo
ilustra e justifica as afirmações descritas acima.
Fonte: PUCCINI, 2008, p. 48.
Apenas os quatro primeiros capítulos tratam explicitamente as noções de
juros simples e compostos, portanto nos retivemos nos exames desses capítulos e
apresentamos a seguir o que, segundo nossa forma de análise, corresponde ao
trabalho do professor e do estudante.
5.6.2
O “TOPOS” DO PROFESSOR E DO ESTUDANTE
Como para as obras anteriores, analisamos via grade de análise apresentada
no capítulo anterior o que se supõe como “topos” do professor e do estudante,
conforme nossa proposta de análise. A tabela abaixo permite distinguir a quantidade
de tarefas que correspondem ao trabalho do professor e do estudante e que o
144
número total de tarefas resolvidas é próximo do de tarefas propostas. Isso mostra
que o trabalho é distribuído proporcionalmente.
Resolvidas
Propostas
Tarefa
Quantidade
%
Tarefa
Quantidade
%
Tarefa 1
0
0
Tarefa 1
0
0
Tarefa 2
8
40
Tarefa 2
12
46
Tarefa 3
12
60
Tarefa 3
14
54
Tarefa 4
0
0
Tarefa 4
0
0
Total
20
100
Total
26
100
Tabela 7: Tarefas resolvidas e propostas na obra de Puccini, 2008.
Analisando a tabela acima, observamos que o autor supõe disponível a tarefa
1, “Situação Matemática para Cálculo de Acréscimo ou Desconto”, isto é, fica a
cargo de professores e estudantes revisitar os conhecimentos matemáticos
necessários para a sua solução.
Para a tarefa 2, “Situação Matemática para Cálculo de Juros Simples”, o
autor propõe uma revisitação aos conceitos básicos necessários para sua solução
por meio de uma situação-problema que articula o novo conhecimento, ou seja, a
noção de fluxo de caixa com os conhecimentos prévios supostos disponíveis.
Esse trabalho nos parece interessante, pois permite estabilizar os
conhecimentos prévios e dar significado ao novo conhecimento. Observamos ainda
que a noção de fluxo de caixa é importante no desenvolvimento do curso de
Administração. A diferença dessa obra para a anterior é a proposta do estudo das
formas de aplicação do dinheiro no tempo por meio de contextualizações associadas
às situações inflacionárias. Essa obra, como a anterior, enfatiza o uso da
calculadora financeira HP 12C e, além disso, propõe a utilização do aplicativo
Microsoft Excel, dando exemplos de tarefas em que os cálculos são desenvolvidos
por meio desse aplicativo. Cabe ao professor escolher a melhor forma de trabalho
com seus estudantes.
145
Para a tarefa 2, observamos que o número de tarefas resolvidas e propostas
são proporcional, o que indica que professores e estudantes são responsáveis pelo
bom desenvolvimento da disciplina. A tarefa 3, “Situação Matemática para Cálculo
de Juros Compostos”, que corresponde ao trabalho com a noção de juros
compostos, também é distribuída proporcionalmente quando se considera o trabalho
de professores e estudantes.O autor propõe um curso cuja responsabilidade de seu
sucesso depende do trabalho orquestrado de professores e estudantes na ação que
se desenvolve no processo de ensino e aprendizagem.
Verificamos que nessa obra o destaque é para aplicações bancárias e
investimentos, com evidência da utilização das ferramentas, como a calculadora
financeira HP 12C e o software Microsoft Excel, que compõem habitualmente a
prática dos profissionais da área financeira. Finalizamos apresentando algumas
considerações sobre as obras analisadas para mostrar que as relações institucionais
existentes são coerentes com as relações institucionais esperadas, e que, se o
trabalho existente para ser realizado no Ensino Médio for colocado em prática, os
estudantes de Administração terão mais condições de compreender as propostas
para o Ensino Superior e desenvolvê-las com maior autonomia.
5.7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao iniciar a obra Matemática, Dante et al. (2008), especificamente o capítulo
27 – Noções de Matemática Financeira, comentam que entre suas aplicações estão
os recursos para auxiliar nas soluções de problemas financeiros.
A obra revisita o conceito de proporcionalidade e de juros simples e
compostos, utilizando como conhecimentos prévios mobilizáveis as noções de
números reais e suas representações, porcentagem e suas representações,
equação do primeiro grau, função afim e linear e suas representações, progressão
aritmética, equação exponencial, função exponencial e suas representações,
logaritmos e suas propriedades. Observamos que essa obra destinada ao Ensino
Médio, entre as outras analisadas, é a única que trabalha explicitamente a
articulação entre as noções de juros simples e compostos com as noções de
funções afim e linear e exponencial e progressões aritméticas e geométricas.
146
Esse trabalho possibilita uma maior estabilidade desses conhecimentos
prévios e permitem a utilização de outras formas de tratamento, em particular, as
representações gráficas das funções que auxiliam na visualização dos resultados.
É importante observar que o autor se preocupa em desenvolver tarefas que
correspondem a situações cotidianas de compra e venda e aplicações no mercado
financeiro. A obra Matemática completa, de Giovanni e Bonjorno et al. (2005),
também inicia revisitando a noção de porcentagem e suas representações e supõe
como disponíveis os conhecimentos sobre as noções de números reais e suas
representações, porcentagem e suas representações, equação do primeiro grau,
equação exponencial e logaritmos e suas propriedades.
Nesse caso, revisitar esses conhecimentos fica a cargo de professores e
estudantes. Ambos têm a mesma responsabilidade e podem negociar como efetuar
esse trabalho. A obra contextualiza os conceitos com aplicações financeiras do
cotidiano. Ao compararmos com a obra do Dante, percebemos algumas
similaridades, principalmente em relação às tarefas resolvidas e propostas em que
se privilegiam as transações bancárias e de varejo.
Um detalhe interessante é que na obra de Dante é destacada a importância
do contextualizar com o estudante conceitos e aplicações do fator de atualização,
conceito não encontrado em nenhuma das outras obras examinadas, nem nas obras
sugeridas para o Ensino Superior. Atentamos também que Bonjorno recorre a
alguns fatos históricos associados ao conceito tratado e conduz o estudante ao uso
da calculadora financeira. Ao considerar a obra de Xavier e Barreto (2005),
verificamos que a Matemática Financeira é apresentada como um pequeno
apêndice sintetizando conceitos de porcentagem, juros simples, compostos, lucros e
descontos.
Podemos concluir que, nas três obras indicadas pelo PNLEM (2009), está
presente uma preocupação em desenvolver o caráter ferramenta das noções de
juros simples e compostos, com exceção da obra de Dante que, ao articular essas
noções com as funções e progressões que lhe são associadas, também desenvolve
147
o caráter ferramenta e possibilita a descrição, explicação e justificativa da tecnologia
utilizada para efetuar esse mesmo trabalho sobre as técnicas.
Ao examinar as obras indicadas para o Ensino Superior, percebemos que na
obra de Sobrinho et al. (2000), Matemática financeira, existe a preocupação em
apresentar os conceitos essenciais das aplicações de juros, oferecendo os diversos
contextos vinculados a essas noções por meio das tarefas resolvidas, que
correspondem ao “topos do professor”.Verificamos também nessa obra a
preocupação em introduzir a nova forma de representação que corresponde ao
trabalho com a calculadora financeira HP12C.
Notamos também que o autor não se preocupou apenas em explicitar alguns
procedimentos e recursos da calculadora, mas propõe um apêndice em que
descreve, explica e justifica tanto os procedimentos necessários para utilizar esse
instrumento como a forma de trabalhar com tarefas específicas do mercado
financeiro. A outra obra analisada, Matemática financeira, de Puccini et al. (2008),
também introduz a nova representação que corresponde à calculadora financeira HP
12C, indo além ao tratar do uso do software Microsoft Excel, atualmente muito
utilizado no mercado financeiro. Nas duas obras analisadas, que correspondem ao
Ensino Superior, observamos que em relação às noções de juros simples e
compostos o trabalho desenvolvido no Ensino Médio é considerado como pelo
menos mobilizável para os estudantes que escolhem o curso de Administração.
Isso mostra a importância do trabalho a ser realizado pelos professores e
estudantes do Ensino Médio para que se possa executar de forma mais satisfatória
o que se planeja para ser desenvolvido com os estudantes de Administração do
Ensino Superior.Observamos que existem todos os meios para efetuar esse trabalho
de forma que os estudantes, ao iniciarem o Ensino Superior, não sejam
desestimulados pela falta de conhecimentos prévios e possam pelos menos
mobilizar esses conhecimentos quando necessário, isto é, que a transição entre o
Ensino Médio e Superior possa se realizar de forma menos traumática e sem tantas
dificuldades.
148
CONSIDERAÇÕES FINAIS
E PERSPECTIVAS FUTURAS
Finalizamos este trabalho com algumas considerações finais e perspectivas
futuras para as pesquisas sobre as relações institucionais esperadas e existentes
quando se considera a transição entre o Ensino Médio e Ensino Superior, em
particular, quando se introduz a noção de juros simples e compostos e quando se
revisita essa noção na disciplina de Matemática Financeira no Ensino Superior.
Retomamos aqui as questões iniciais que nortearam esta pesquisa e para as
quais avançamos alguns elementos de resposta, mas que ainda podem ser
trabalhadas e melhor elucidadas por pesquisas futuras associadas à aprendizagem
dos estudantes, quando considerados os conhecimentos prévios que podem ser
reputados pelo menos mobilizáveis na transição entre o Ensino Médio e Superior
para os estudantes, dos cursos de Administração.
1. Quais os conhecimentos prévios sobre a noção de juros simples e compostos são
desenvolvidos no Ensino Médio?
2. Quais as articulações entre esses conhecimentos e os conhecimentos matemáticos
necessários para o controle e justificativa das técnicas associados às noções de
juros simples e compostos?
3. Qual o papel esperado do professor no trabalho com essas noções?
4. Qual o papel esperado dos estudantes no trabalho com essas noções?
5. Quais as indicações das diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de graduação
em Administração para o ensino da noção de juros simples e compostos para o
curso de Administração?
6. Existe uma coerência entre o que é proposto para o Ensino Médio e Superior, isto é,
os conhecimentos prévios supostos disponíveis são trabalhados no Ensino Médio
conforme a expectativa do Ensino Superior?
Inicialmente, para esclarecer nossas escolhas tanto do referencial teórico
utilizado como das noções matemáticas, ressaltamos que a proposta do estudo das
relações institucionais esperadas e existentes quando se consideram as noções de
149
juros simples e compostos na transição entre o Ensino Médio e o Ensino Superior se
deve ao fato que se trata de um conceito que é utilizado por todos para o controle da
vida pessoal, pois vivemos em um mundo onde em geral tudo varia em função do
capital em relação ao tempo. A escolha da Teoria Antropológica do Didático (TAD)
como referencial teórico central para as análises propostas na pesquisa permite
mostrar a força dessa teoria para esse tipo de análise, pois possibilita compreender
melhor as organizações matemáticas e didáticas existentes em função de suas
práticas, isto é, dos tipos de tarefas e das técnicas associadas e do discurso que
permite descrever, explicar e justificar essas técnicas tanto do ponto de vista
tecnológico como teórico.
Além disso, complementamos essas análises com as
abordagens teóricas em termos de quadro conforme definição de Douady (1984,
1992) e de níveis de conhecimento esperado dos estudantes conforme definição de
Robert (1997), que possibilitou identificar a forma como a noção estudada é
trabalhada no Ensino Médio e Superior e o nível de conhecimento esperado nas
duas etapas da transição. Observamos que a noção de juros simples e compostos é
abordada de diferentes formas no Ensino Médio, sendo considerados diferentes
quadros e sua articulação com noções reputadas como conhecimentos prévios, pelo
menos mobilizáveis, nessa etapa escolar.
Dessa forma, ressaltamos que, se realmente o trabalho proposto no Ensino
Médio for desenvolvido, as propostas encontradas para o Ensino Superior serão
adequadas, pois nesse momento podemos utilizar essas noções apenas como
ferramentas do trabalho matemático a ser efetuado e dar mais ênfase à introdução
de novas tecnologias, como a calculadora financeira e as planilhas eletrônicas.
Para melhor compreender as conclusões apresentadas acima, destacamos
que a análise das relações institucionais esperadas para o Ensino Médio e Superior
via documentos oficiais, ou seja, Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino
Médio (PCNEM) e Nova Proposta do Estado de São Paulo e os planos de ensino de
quatro Universidades, sendo duas públicas e duas privadas, respectivamente,
mostra que existe uma coerência entre o que é proposto no Ensino Médio e o
trabalho a ser realizado no Ensino Superior. Além disso, para o Ensino Médio, o
papel do professor e do estudante é bem definido tanto no que se refere às
organizações matemáticas quanto o que cada um deve dispor enquanto
150
conhecimento para caminhar em conjunto na introdução de novos conhecimentos,
como as organizações didáticas que deixam evidente a necessidade do trabalho
individual e autônomo dos estudantes no decorrer do processo de ensino e
aprendizagem. A análise das relações institucionais existentes via alguns livros
didáticos do Ensino Médio e Superior mostra que há coerência entre as expectativas
institucionais e o trabalho que, pela forma como se conduziram as análises, se
supõe seja desenvolvido por professores e estudantes.
Certamente, para cada obra analisada existem outras questões que poderiam
ter sido levadas em conta, mas estas ficam a cargo do professor que pode ou não
completar esse trabalho em função do conhecimento prévio de seus estudantes e da
participação deles no curso, isto é, se estão interessados em aprender e ser
autônomos ou apenas em repetir tarefas próximas para ter sucesso nas provas.
Além disso, consideramos que as análises dos livros didáticos possibilitam
identificar, de forma geral, qual o nível de conhecimento sobre as noções de juros
simples e compostos que podemos reputar como pelo menos mobilizável para os
estudantes que terminam o Ensino Médio, ou seja, trata-se do nível mobilizável em
relação à nomenclatura e às formulas associadas a esses conceitos. A questão da
articulação com as noções de função afim e exponencial e progressões aritméticas e
geométricas que poderia auxiliar a melhor compreenderem essas noções é
considerada apenas em um dos livros do Ensino Médio avaliado, e não é tratada no
Ensino Superior. Portanto, tanto para o Ensino Médio como para o Ensino Superior
os conhecimentos matemáticos necessários quando do trabalho com as noções de
juros simples e compostos necessitam apenas das noções de proporcionalidade,
operações com números reais, equações do primeiro grau, equações exponenciais e
a noção de logaritmo e suas propriedades.
No
entanto,
uma
articulação
entre
esses
conhecimentos
e
outros
conhecimentos, já discutidos acima, poderia auxiliar a melhor compreender esses
conceitos e tornar ambos mais ricos e estáveis. Finalmente observamos, por meio
da grade de análise construída para identificar os diferentes tipos de tarefas que
sobrevivem tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior, que existe um número
151
reduzido de tarefas e que estas poderiam ser mais bem aproveitadas quando se
introduzem as noções de juros simples e compostos no Ensino Superior.
Como exemplo consideramos que os conhecimentos de progressão aritmética
associados aos processos de crescimento, quando uma série de valores, podem ter
sua variação (crescimento ou decrescimento). Os exemplos abaixo colocam em
evidência a possibilidade de articulação entre juros simples, proposta aritmética,
proporcionalidade e regra de três.
Exemplo 1: Qual o montante final de uma aplicação de $2.000,00, a juros simples contratados a 2%
ao mês, por 6 meses?
Observa-se
também
que
no
tratamento
de
juros
simples
existe
proporcionalidade entre taxa e tempo, em que os juros são lineares. É possível
também fazer uso da aplicação de “regras de três”, tal como a tarefa abaixo:
Exemplo 2: Qual a taxa mensal de juros simples que, em uma aplicação por 5 meses, elevou um
capital de $ 2.000,00 para $ 2.450,00?
Dessa forma, sendo a Matemática Financeira uma das formas de aplicar
determinados conceitos matemáticos, considera-se que para desenvolver esse
trabalho é necessário dispor de conhecimentos associados à articulação de
conceitos explicitados acima. É importante destacar que os estudantes não estão
partindo do “zero”, dado que possuem alguns conhecimentos como: progressão
aritmética (PA), regra de três, função afim, função exponencial, noções logaritmos.
Nossa prática deixa evidente que um dos grandes desafios é articular esses
conhecimentos na resolução de tarefas que envolvem “juros simples” e “juros
compostos”, foco deste trabalho. A articulação entre esses conhecimentos que os
estudantes já possuem acreditamos fazer parte do “topos” do professor, que é
mediar e demonstrar como utilizar na resolução de novas tarefas.
152
Parece-nos
que
trabalhar
essas
tarefas
articulando
conhecimentos
específicos de Matemática Financeira e conhecimentos matemáticos poderiam
auxiliar os estudantes, reduzindo o número de fracassos e evasões.
Esses conhecimentos são requisitos essenciais aos estudantes egressos dos
cursos superiores ao exercerem uma determinada profissão, tais como Gerente
Financeiro, Contador ou até mesmo Analista de Investimentos.
Isso sugere a necessidade de continuar essa pesquisa, a partir dos resultados
encontrados nas análises das relações institucionais esperadas e existentes. Poderse-ia
construir
uma
nova
organização
centrada
na
articulação
entre
os
conhecimentos matemáticos desenvolvidos no Ensino Médio e as noções de juros
simples e compostos já trabalhadas com as novas tecnologias.Os estudantes dos
cursos de Administração devem se apropriar para motivar e dar sentido a estas
noções, uma vez que a Matemática Financeira pode ser considerada como uma
contextualização
de
conhecimentos
matemáticos
desenvolvidos
no
Ensino
Fundamental e Médio.Essa nova proposta mostra mais uma vez a importância das
análises das relações institucionais esperadas e existentes ou das organizações
praxeológicas para a identificação do que já está construído e do que é possível
propor para continuar e melhorar sem começar tudo do zero.
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ANEXOS
Anexo 1: Diretrizes Curriculares do Curso de Administração de Empresas
158
Anexo 1 (cont.)
159
Anexo 2: Plano de Aulas da Universidade Federal do Amazonas (UFAM)
160
Anexo 3: Plano de Aulas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
161
Anexo 3 (cont.)
162
Anexo 4: Plano de Aulas da Faculdade das Américas
163
Anexo 5: Plano de Aulas da Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP)
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relações institucionais para o ensino da noção de juros na