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SEMINÁRIO INTERNACIONAL VIGÉSIMO ANIVERSÁRIO DA ABACC
Rio de Janeiro, 10/11 de novembro, 2011
Odilon Marcuzzo do Canto, Ph.D.
Secretário da ABACC
Argentina e Brasil iniciaram seus esforços na área nuclear mais ou
menos na mesma época. No início da década de 50 do século passado.
A força motora que impulsionou esses esforços foi igualmente muito
parecida: a noção partilhada tanto pelo governo quanto pela
comunidade científica e tecnológica de que o desenvolvimento na área
nuclear passaria a ser um divisor de águas no balanço de poder do
mundo pós-guerra. Alem disso, as possibilidades de uso das
tecnologias nucleares nos diferentes setores de interesse da sociedade,
começavam a ser evidentes e chamavam a atenção das lideranças
nacionais.
Tais sentimentos, aliados à percepção de que os conhecimentos no
setor nuclear teriam que ser desenvolvidos de forma autônoma ou o
país ficaria de fora dessas tecnologias, impulsionaram os dois países
em ações de desenvolvimento do setor.
Apesar dos atrasos na implantação das centrais elétricas nucleares, - a
Argentina iniciou a operação de seu primeiro reator nuclear de potência,
o Atucha I, em 1974, enquanto Angra I entrou em operação em 81- os
dois países desenvolveram ao longo dos anos 50-80 programas mais
ou menos intensos, envolvendo todas as fases do ciclo nuclear. Podese afirmar que o clima inicial de desconfiança e de rivalidade entre os
dois programas, foi aos poucos sendo substituído por confiança mútua e
cooperação.
Segundo algumas interpretações, ajudaram muito na construção do
clima de cooperação, não somente a percepção do ganho mútuo trazido
pela sinergia de esforços, mas, também o fato de que os programas
nucleares dos dois países estavam produzindo um clima de
desconfiança na comunidade internacional, acarretando preocupações
sobre proliferação nuclear. Tal estado de coisas começava a trazer
sérias dificuldades ao desenvolvimento das atividades nucleares nos
dois países.
A existência de um arranjo internacional de não-proliferação nuclear
visto tanto pelo Brasil como pela Argentina como não balanceado e
prejudicial aos interesses dos países não nuclearmente armados, levou
à necessidade de criação de um sistema comum de controle aos dois
países que, de alguma forma, fornecesse garantias à comunidade
internacional, da finalidade pacífica de seus programas.
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A assinatura, em 18 de julho de 1991, do Acordo Bilateral para o Uso
Estritamente Pacifico da Energia Nuclear, criou o Sistema Comum de
Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares, o SCCC, e uma
agência binacional para gerir este sistema, a Agência BrasileiroArgentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares, a
ABACC. O Acordo selou, de forma definitiva e clara, o compromisso
com a utilização exclusivamente para fins pacíficos de todo o material e
instalações nucleares submetidas à jurisdição ou controle de ambos os
países. O Sistema ABACC representa hoje um marco paradigmático do
longo processo de integração econômica, política, tecnológica e cultural
dos dois países.
O Acordo Quadripartite assinado em dezembro do mesmo ano entre os
dois países, a ABACC e a AIEA, completou o quadro normativo legal
para a aplicação do sistema de salvaguardas abrangentes.
A criação de um Sistema Comum, garantiu o estabelecimento de
procedimentos de salvaguardas uniformes a serem aplicados tanto na
Argentina como no Brasil; assim, todos os requisitos e procedimentos
de salvaguardas se tornaram aplicáveis nos dois países e os
operadores das instalações nucleares de ambos, passaram a seguir as
mesmas regras de controle dos materiais nucleares e serem
submetidos ao mesmo tipo de verificação e controle.
Argentina e Brasil foram capazes de estabelecer um sistema de
salvaguardas que é hoje único no mundo e que, consolidado e
amadurecido ao longo desses vinte anos, se tornou respeitado pela
comunidade internacional.
Na verdade, pode-se afirmar que este sistema apresenta algumas
vantagens em comparação com os acordos gerais de salvaguardas. O
Acordo Quadripartite vai alem de um regime de salvaguardas usual que
conecta um estado-parte com a AIEA. Ele envolve dois estados-parte
vizinhos, uma agencia criada por eles – a ABACC- e a Agencia
Internacional de Energia Atômica. Portanto, representa um regime de
salvaguardas bem mais completo. O conceito “neighbors watching
neighbors” é reconhecido como eficiente e eficaz.
Durante estes vinte anos a ABACC vem operando com políticas
institucionais voltadas para a contínua capacitação técnica de seus
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recursos humanos e estabelecemento de uma estrutura eficiente e
eficaz para realizar suas funções. A aplicação de tais políticas, aliada ao
uso de equipamentos sempre no “estado-da-arte”, são fatores
relevantes envolvidos no sucesso da ABACC e na independência de
suas conclusões.
Da mesma forma, a relação madura com a AIEA, construída ao longo
do tempo, permite que ambas as agencias trabalhem em sintonia e
com grande objetividade. Os arranjos de cooperação técnica entre as
duas agencias para a aplicação de salvaguardas, estão especificados
num Protocolo assinado pelas quatro partes signatárias do Acordo
Quadripartite, tendo como princípios básicos:
A necessidade de conclusões independentes por parte da AIEA e
da ABACC.
A necessidade de coordenar, na medida do possível, as
atividades das duas agencias para a ótima implementação do
Acordo, e em particular para evitar duplicação desnecessária das
salvaguardas da ABACC.
Na execução de suas atividades, ABACC e AIEA deverão, sempre
que possível trabalhar juntas, de acordo com os critérios
compatíveis das duas agencias
A necessidade de proporcionar a AIEA o total cumprimento de
suas obrigações dentro do Acordo, mantendo a exigência de
preservação dos segredos tecnológicos.
Baseados nestes princípios, foram desenvolvidos mecanismos para
atuação conjunta, como o uso comum de equipamentos (Joint Use
Agreement), permitindo alcançar grande otimização de recursos.
A forte integração da ABACC com os demais atores internacionais
envolvidos na aplicação de regimes de salvaguardas propicia a troca
de experiências e de conhecimentos extremamente enriquecedora para
todos. A ABACC tem se beneficiado de cooperações técnicas com a
AIEA, com a Comunidade Européia, em particular a EURATOM e com o
Departamento de Energia dos Estados Unidos. Com este último,
consideramos, entre outras importantes cooperações, os exercícios de
intercomparação laboratorial como de extrema relevância na
qualificação dos laboratórios envolvidos. O relacionamento com outros
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parceiros internacionais, notadamente com a França, no fornecimento
de equipamentos, Japão, Reino Unido e Coréia do Sul no
desenvolvimento conceitual da aplicação de salvaguardas e Canadá no
desenvolvimento de cursos de treinamento, tem sido relevantes. A
participação em fóruns internacionais, como os congressos de
associações com interesse no campo de salvaguardas como a
ESARDA e o INMM, tem propiciado uma troca de idéias e experiências
extremamente produtivas para a qualificação da ABACC.
Fator determinante para o sucesso alcançado é o apoio contínuo e o
reconhecimento, por parte dos governos do Brasil e da Argentina,
demonstrados não somente na série histórica de declarações conjuntas
que ultrapassam os últimos governos. Eles tomam forma concreta no
suporte financeiro às ações e programas da ABACC. Também
aparecem, de forma muito palpável, na cooperação técnica da ABACC
com os laboratórios dos diferentes órgãos e instituições dos dois países,
sempre com o mais completo respaldo dos dois governos.
A própria formação dos quadros da ABACC, tanto o corpo funcional
quanto o conjunto de inspetores, é demonstração inequívoca desta
cooperação. Todos eles são arregimentados nas instituições que
contribuem para a área nuclear dos dois países. Como a ABACC não
dispõe de laboratórios próprios, ela utiliza uma rede de laboratórios dos
dois países para suas necessidades em Analise Destrutiva, Análise
Ambiental e no suporte técnico ao desenvolvimento de técnicas de
Análise Não Destrutiva.
Finalizando, podemos afirmar sem sombra de dúvida que as ações de
cooperação técnica com parceiros do Brasil e da Argentina e com
outros atores internacionais do setor de salvaguardas nucleares,
representam uma fonte constante de aprimoramento e qualificação da
ABACC. Desta forma, a continuidade de tais ações devem ser
estimuladas e fortalecidas.
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