Acórdãos STA
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:
0439/08
Data do Acordão:
03-12-2008
Tribunal:
2 SECÇÃO
Relator:
PIMENTA DO VALE
Descritores:
IVA
DEDUÇÃO DE IMPOSTO
Sumário:
Se os peritos dos Serviços da Fiscalização Tributária
detectaram dedução indevida de IVA pelo impugnante,
não tendo o mesmo apresentado a sua escrita e tendo essa
mesma dedução sido efectuada com suporte em
documentos sem a forma legal, que originou que a
Administração tivesse procedido, nos termos do disposto
no artº 82º do CIVA, a uma liquidação adicional para
pagamento daquele montante, apurado com base em
correcções e sem que tivesse, assim, havido recurso a
presunções ou estimativas, justifica-se o recurso a métodos
de avaliação directa.
Nº Convencional:
Nº do Documento:
Recorrente:
Recorrido 1:
Votação:
JSTA0009810
SA2200812030439
A...
FAZENDA PÚBLICA
UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral
Texto Integral:
Acordam
nesta Secção do Contencioso Tributário do
Supremo Tribunal Administrativo:
1 – A..., Lda, melhor identificada nos autos, não se
conformando com a sentença do Tribunal Administrativo
e Fiscal de Lisboa que julgou improcedente a impugnação
judicial que deduziu contra o acto de liquidação de IVA,
relativo ao ano de 1996, no valor 56.250.070$00 (€
280.574,17) e respectivos juros compensatórios, dela vem
interpor o presente recurso, formulando as seguintes
conclusões:
1. O objecto do presente recurso tem como pretensão saber
se o método de avaliação directa utilizada pela
Administração Tributária foi o correcto e legal, para o
apuramento da matéria tributária, ou se, pelo contrário, e
como entende a ora Recorrente, ter sido utilizado o
método indirecto.
2. A fixação da matéria tributável precede o acto de
liquidação do tributo correspondente.
3. Quando se está perante situações de autoliquidação é o
Sujeito Passivo quem determina o montante do tributo, e é
a este que cabe a fixação da matéria tributável, sendo que,
nos restantes casos, a avaliação da matéria tributável, é
sempre feita pela Administração Fiscal, quer se trate de
avaliação directa, quer indirecta.
4. Até, mesmo nessas situações, em que a avaliação é
realizada pela Administração Fiscal, o Sujeito Passivo não
é, completamente, alheio à fixação da matéria tributável.
5. Pois, nos casos de avaliação directa as suas
declarações, contabilidade e escrita, cuja veracidade em
princípio se presume, desempenham um papel importante,
conforme o preceituado artigo 70º, n° 1, da LGT.
6. Ora, na avaliação indirecta o Sujeito Passivo participa,
no procedimento respectivo, designadamente, através de
perito por si designado, podendo, também, intervir na
avaliação indirecta através do exercício do seu direito de
audiência - antes da decisão - Cfr. artigo 70.°, n.° 1 e 60°,
n° 1, alínea c), ambos da LGT.
7. Assim, resulta que quer a avaliação directa quer a
indirecta destinam-se a determinar o valor dos
rendimentos ou bens sujeitos a tributação.
8. Nos termos da avaliação directa, como é sabido, esta
incide sobre elementos de prova do valor real dos bens ou
rendimentos tributáveis, de forma a determinar com
exactidão tal valor.
9. Pelo contrário, nos casos de avaliação indirecta quando não existem elementos fiáveis suficientes para
demonstrar exactamente o valor real dos bens ou
rendimentos, como acontece in casu -, aquela é feita com
base em indícios, presunções ou outros elementos de que a
Administração Fiscal disponha.
10. Pelo que, a Administração Fiscal, in casu, apenas
poderia ter procedido ao método de avaliação indirecta,
porquanto trata-se de um caso em que não é possível
determinar a matéria tributável, através de avaliação
directa, nomeadamente, por falta de elementos e
documentos que tomem possível comprovar tal situação.
11. Até porque a avaliação indirecta é subsidiária da
avaliação directa. - Cfr. artigo 85°, n° 1, da LGT.
12. Acresce que, o método de avaliação indirecta, deve
utilizar-se nos casos de impossibilidade de comprovação e
quantificação directa e exacta dos elementos
indispensáveis à correcta determinação da matéria
tributável de qualquer imposto. - Cfr. alínea b), do artigo
87°, da LGT.
13. Nesse sentido, determina a alínea a), do artigo 88°, da
LGT, que a “impossibilidade de comprovação e
quantificação directa e exacta dos elementos
indispensáveis à correcta determinação da matéria
tributável” resultará da “inexistência ou insuficiência de
elementos de contabilidade”, quando inviabilizarem o
apuramento da matéria tributável.
14. Relembre-se que, a Recorrente, ficou impossibilitada
de exibir a sua contabilidade, o que, nos termos da lei,
equivale à sua inexistência.
15. Assim, outra situação não seria admissível senão o
quanto previsto e prescrito na LGT, designadamente, a
Administração Fiscal apenas se poderia ter socorrido do
método de avaliação indirecta e nunca do método de
avaliação directa.
16. Ao decidir a sentença que o método de avaliação
directa era o correcto, no caso em apreço, praticou um erro
sobre os pressupostos de direito.
17. Tanto mais que, a não adopção do método da avaliação
indirecta, retirou à ora Recorrente, os meios defesa
consagrados na Lei, e na Constituição da República
Portuguesa, designadamente o principio do contraditório,
o que consubstancia uma ilegalidade prevista no CPPT.
18. Pois, ao actuar, como actuou, a Administração Fiscal
violou o princípio da legalidade, previsto na LGT e,
constitucionalmente, consagrado na CRP.
A Fazenda Pública não contra-alegou.
O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer
no sentido de ser negado provimento ao recurso, “devendo
ser confirmado o julgado recorrido”.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
2 – A sentença recorrida considerou provada a seguinte
matéria de facto:
a) A impugnante exerce, a sua actividade económica na
área da produção, exportação, importação,
comercialização e divulgação de produtos audiovisuais;
b) No âmbito da actividade referida em a) a impugnante
foi sujeita a uma acção inspectiva da administração
tributária, que se iniciou em 16.11.1998;
c) Em consequência da impugnante ter alegado
dificuldade na apresentação de elementos contabilísticos, a
acção inspectiva foi suspensa por 90 dias;
d) Em 23 de Março de 1999 a gerente da impugnante foi
notificada para proceder à organização da escrita e
apresentar os demais elementos de contabilidade, no prazo
de 30 dias;
e) Findo esse prazo a impugnante não apresentou a sua
escrita para os exercícios de 1994, 1995 e 1996;
f) Nesse período a impugnante deduziu IVA no montante
de 56.250.070$00;
g) No termo da inspecção foi elaborado o relatório de fls.
38 e ss., cujo teor se dá aqui por integralmente
reproduzido;
h) Foi notificada da liquidação adicional datada de
23.11.1999, para proceder ao pagamento do montante
referido na al. anterior (280 574,17 €), com a seguinte
fundamentação: “Liquidação adicional feita nos termos do
art° 82° do Código do IVA e com base em correcção
efectuada pelos Serviços de Inspecção Tributária - Motivo
05: Dedução de imposto sem suporte em documentos sem
a forma legal (n° 2 do art° 19° do CIVA) - NÃO HOUVE
RECURSO A PRESUNÇÕES OU ESTIMATIVAS”.
3 – Antes do mais, importa referir que os factos tributários
em causa se reportam ao ano de 1996, pelo que não é aqui
aplicável a Lei Geral Tributária, que entrou em vigor
apenas no dia 1/1/99 (cfr. artº 6º do Decreto-Lei nº 398/98
de 17/12).
Dito isto, passemos, então à apreciação do objecto do
presente recurso.
Consiste este em saber se o método de avaliação directa
utilizado pela Administração Fiscal na fixação do
montante de IVA a deduzir foi correcto ou se, pelo
contrário, devia ter sido utilizado o método de avaliação
indirecta, como pretende a recorrente.
O apuramento do IVA faz-se nos termos que constam no
artº 19º e seguintes do CIVA, na redacção de então.
Não obstante, as declarações feitas pelos sujeitos passivos
podem vir a sofrer alterações (cfr. artºs 82º e 83º do
CIVA).
Só quando o montante do imposto a liquidar não for
possível apurar mediante a declaração do contribuinte,
depois de corrigida, se for caso disso, é possível à
Administração afastar-se dessa declaração e tributar o
contribuinte mediante o uso de estimativas ou presunções
(cfr. artºs 82º e 84º do CIVA).
Sendo assim e como bem anota o Exmº Procurador-Geral
Adjunto no seu douto parecer “há uma preferência legal
absoluta pela utilização de métodos de avaliação directa
para fixação da matéria tributável, o que se compreende
por serem maiores as garantias de rigor que estes métodos
fornecem”.
Como vem sendo entendimento pacífico desta Secção do
STA, “a tributação por métodos indirectos não só não
constitui o meio normal, como a possibilidade do seu uso
está restringida aos casos em que a lei expressamente a
admite, verificados que estejam determinados
pressupostos” (vide, por todos, os Acórdãos desta secção
do STA de 7/5/03, in rec. nº 243/03 e de 2/2/06, in rec. nº
1.011/05, citados por aquele Magistrado).
No caso dos autos e como resulta do probatório, os peritos
dos Serviços da Fiscalização Tributária detectaram a
dedução indevida de IVA pelo impugnante e que o mesmo
não apresentou a sua escrita, pelo que a dedução foi
efectuada com suporte em documentos sem a forma legal
(cfr. artº 19º, nº 2 do CIVA), o que originou que a
Administração tivesse procedido, nos termos do disposto
no artº 82º do CIVA, a uma liquidação adicional para
pagamento daquele montante, apurado com base em
correcções e sem que tivesse, assim, havido recurso a
presunções ou estimativas (vide als. f), g) e h) do
probatório).
Deste modo, é evidente que face a um tal probatório,
aceita-se a consequência tirada na sentença recorrida,
segundo o qual se justificou o recurso ao método de
avaliação directa.
Sendo assim e face ao circunstancialismo exposto, nada
justificava que a Administração recorresse a métodos
indirectos, que neste campo age vinculadamente, por não
se verificarem os seus pressupostos, nem à recorrente era
lícito exigir o apuramento do imposto em causa de acordo
com esses métodos, pois não pode falar-se num direito dos
contribuintes a esta modalidade de tributação, uma vez
que está, sobretudo, prevista para defesa dos interesses do
Estado.
4 – E, ao contrário do alegado pela recorrente, não foi,
igualmente, desrespeitado o princípio da legalidade, uma
vez que foi, ainda, no cumprimento de tais princípios que
o mesmo acto de liquidação foi praticado, com recurso às
faladas correcções.
5 – Nestes termos, acorda-se em negar provimento ao
recurso e manter a sentença recorrida.
Custas pela recorrente, fixando-se a procuradoria em 50%.
Lisboa, 3 Dezembro de 2008. – Pimenta do Vale (relator)
– António Calhau – Brandão de Pinho.
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