“SER JOVEM” E “SER ALUNO”- O QUE OS JOVENS ALUNOS TÊM A DIZER?
Fernanda Cristina Soares Silvino1
Rua Pita, 310, Pompéia, BH, MG
31-3461-7462/8809-5752
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Atualmente a escola tem passado por um processo de transformação que alguns
autores, como Dubet (2005), têm chamado de declínio do programa institucional. De acordo
com este autor, o declínio institucional se deve ao fato de que os princípios das instituições
modernas, como a escola e a família, não correspondem mais aos papéis que inicialmente lhes
eram atribuídos. No caso da escola, esta instituição foi criada com o intuito de preservar os
ideais do início da sociedade moderna; era direcionada para poucos alunos pertencentes às
elites e “(...) era impelida pelo projeto de instalar uma cidadania nova e pela legitimidade das
instituições republicanas” (DUBET, 2003, p.03). Ou seja, a escola não tinha como intenção
formar para o trabalho, mas transmitir a ideologia republicana. Porém, esta não é mais a
realidade no espaço escolar que, atualmente, tem como alunos os filhos das camadas
populares e que tendem a buscar ali um caminho que lhes possibilite a inserção na sociedade,
principalmente no mercado de trabalho.
Entretanto, como a escola não foi pensada para alunos das camadas populares, a
entrada dos mesmos neste espaço, com o processo de massificação escolar, tem gerado alguns
conflitos, principalmente na relação professor/aluno. Devido a isso, com o intuito de
compreender as mudanças que têm ocorrido, é importante refletir sobre esta relação. Relação
esta que tem seu lugar específico na sala de aula e se constitui como um dos aspectos
fundamentais de tais transformações. Na tentativa de vislumbrar um caminho para tal
compreensão, pretendo apresentar neste trabalho um projeto realizado no segundo semestre de
2007, entre os meses de agosto a dezembro, denominado “Diálogos com a Juventude”. Este
projeto foi realizado pela equipe do Observatório da Juventude2 da Universidade Federal de
1
Faculdade de Educação – UFMG
O Observatório da Juventude é um grupo de pesquisa da Faculdade de Educação da Universidade Federal de
Minas Gerais que foca seus estudos nos jovens, não apenas no espaço escolar, mas em diversos espaços sociais.
A equipe é formada por graduandos, pós-graduandos e professores universitários, e é coordenada pelo Profº Drº
Juarez Tarcísio Dayrell.
2
Minas Gerais, que foi convidada por uma escola da Rede Municipal de Ensino de Belo
Horizonte para promover encontros com os alunos e professores, com a intenção de repensar
o papel da escola para estes sujeitos. O projeto ocorreu no período noturno, tendo como foco
os jovens alunos do Ensino Fundamental.
O projeto tinha como objetivo buscar um diálogo entre os jovens alunos e a escola,
com a intenção de refletir sobre os entraves na relação professor/aluno que, muitas vezes,
acabava em conflito aberto entre ambos na sala de aula. Para realizar tal trabalho, o projeto
contava com oito monitores que trabalhavam diretamente com os jovens alunos, inicialmente
distribuídos em quatro turmas com trinta alunos cada. Dos oito monitores, quatro eram
provenientes da universidade à qual o projeto estava vinculado, e os outros quatro pertenciam
à comunidade onde o projeto estava sendo realizado. A equipe contava com uma monitora,
atuando diretamente com os professores, e um coordenador que trabalhava com os monitores
para o planejamento dos encontros semanais.
O “Diálogos com a Juventude” é um dos diversos projetos realizados pelo
Observatório da Juventude, sendo que este foca a relação professor/aluno, atuando
diretamente nas escolas. Geralmente, o Observatório da Juventude é convidado pelas próprias
escolas para intermediar essa relação, e as equipes das escolas quase sempre apontam a
questão da indisciplina como a razão para o convite e como principal motivo para a relação
tensa que tende a ser estabelecida dentro das salas de aula. No caso desta escola, a equipe do
Observatório da Juventude também foi convidada a atuar dentro deste espaço, sendo que a
questão da indisciplina novamente foi apontada pelos professores. Por isto, o projeto buscou
entender como que os alunos enxergavam aquele espaço, o porquê de estarem ali e como
compreendiam a questão da indisciplina apontada pelos professores. Para discutirmos tais
questões, era realizado um encontro por semana com os alunos e professores, sendo que o dia
escolhido para tais encontros foi terça-feira, pois de acordo com a equipe da escola, este era
um dos melhores dias de frequência dos alunos, já que na segunda e na sexta a presença dos
mesmos era baixa.
A dinâmica dos encontros com os alunos consistia em discutir questões ligadas ao “ser
aluno” e “ser jovem” no espaço escolar, sempre dando ênfase aos depoimentos e opiniões
destes. Na seleção das dinâmicas eram priorizadas aquelas que promoviam a interação do
grupo e a utilização de formas de registros diferenciadas do registro escrito, tais como, a
expressão oral e artística.
Os dados levantados durante o projeto permitiram verificar que os jovens alunos
tinham em suas trajetórias escolares um histórico de repetência e evasão escolar, a grande
maioria trabalhava em empregos que exigiam uma baixa qualificação, sendo que grande parte
se encontrava no mercado informal recebendo menos de um salário mínimo por uma longa
jornada de trabalho. Os alunos tinham entre quinze e vinte e cinco anos, e grande parte deles
residiam em comunidades próximas à escola.
1. JUVENTUDES: ALGUMAS REFLEXÕES TEÓRICAS
Ao assumirmos o projeto “Diálogos com a Juventude”, uma das primeiras
preocupações foi a definição da forma de realização, visto que o mesmo seria realizado
através do trabalho direto com os jovens. Uma questão permanecia: quais aspectos a serem
considerados? Como estabelecermos um canal de comunicação com os jovens alunos no qual
eles pudessem se expressar sem qualquer receio? A construção articulada do projeto
demandou várias reuniões da equipe responsável com o objetivo de pensarmos o eixo que
nortearia a nossa prática e, principalmente, considerar os sujeitos jovens alunos e suas
experiências sociais.
Descobrimos que pensar o que é ser jovem e como ele vivencia esta fase não é algo
simples. Spósito (2005), busca compreender um pouco das especificidades que o termo
juventude apresenta, afirmando que “(...) a juventude é vivida como um processo definido a
partir de uma inegável singularidade: é a fase da vida em que se inicia a busca dessa
autonomia, marcada tanto pela construção de elementos de identidades – pessoal e coletiva –
como por uma atitude de experimentação (Galland, 1996; Sindy, 2000)” (p.89). Contudo,
vários autores, como por exemplo, Dayrell (2007), Spósito (2005), SOUZA (2003), entre
outros, afirmam que o termo juventude é uma construção social e que, em cada momento
histórico ou em contextos sociais diferentes, ser jovem pode tomar um caminho distinto. De
acordo com Dayrell, “na realidade, não há tanto uma juventude e sim jovens, enquanto
sujeitos que a experimentam e sentem segundo determinado contexto sociocultural onde se
inserem” (2007, p.07). Esses teóricos nos ajudaram a compreender que devíamos estar atentos
à multiplicidade de sujeitos com os quais iríamos nos relacionar, pois apesar de vivenciarem a
mesma realidade sociocultural, diferentes elementos estavam presentes no processo de
construção de cada um, como os estilos musicais (pagode, samba, rap, etc), o trabalho, os
grupos de amigos, as vivências familiares e escolares. Dessa forma, muito mais do que
juventudes seria importante entender a condição juvenil vivida por estes alunos, afinal o
jovem,
constitui-se como um ator plural, produto de experiências em contextos sociais
múltiplos(...). Pertence assim, simultaneamente no curso de sua trajetória de
socialização, a universos sociais variados, ampliando os universos sociais de
referência. (Setton, 2005; Lahire, 2002 apud DAYRELL, 2007, p.22).
Além disso, seria de grande relevância compreendermos como os jovens alunos se
enxergavam neste processo de construção de si, como aponta Corti e Souza (2004); afinal,
mais do que compreendê-los, mostra-se necessário entender como o sujeito se vê neste
processo. Por isso, no projeto “Diálogos com a Juventude” consideramos de fundamental
importância a escuta dos jovens: a necessidade de ouvir o que os jovens alunos tinham a falar.
O estudo teórico também contribuiu para definirmos a metodologia de trabalho. Ao
considerarmos que a juventude não representa algo homogêneo e, sim, uma grande variedade
do jeito de ser jovem, optamos por dinâmicas que não fossem rígidas, que deixassem aberto o
espaço para os jovens se expressarem. Isso possibilitaria que os jovens alunos pudessem
revelar as suas formas de viver a juventude por meio de poesia, grafite, música, colagens.
2. “MAS, QUEM SÃO ESTES JOVENS?” O OLHAR DA ESCOLA SOBRE SEUS
ALUNOS.
A escola onde o projeto foi realizado fica localizada no Bairro Alto Vera Cruz e
pertence à Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte, ofertando somente o Ensino
Fundamental. Esta escola é um espaço de referência para os moradores deste bairro e é bem
vista pelos mesmos. Na história da Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte, esta escola
sempre foi exemplo de excelência, pois trabalhava com projetos inovadores e seus alunos
sempre participavam de movimentos culturais e políticos, estando na vanguarda na educação.
Atualmente, a boa fama deve-se mais à referência do passado – mas que ainda é cultivada
pela comunidade.
A estrutura física da escola é ampla, mas o sinal da depredação é visível. As salas
ficam inundadas quando chove, os ventiladores e alguns vidros das janelas estão quebrados, a
mesa de pingue-pongue está completamente deteriorada e, por falta de material, os alunos
praticam o esporte com as próprias mãos substituindo as raquetes. A direção da escola
responsabilizou os alunos jovens pelo estado do prédio, que jogam pedras nos telhados e nos
vidros, picham os muros, e etc...
Durante o projeto “Diálogos com a Juventude” foi possível apreender que a escola
onde estudam é um espaço importante na vida destes jovens, porém, há alguns anos, eles não
tinham acesso a ela. A entrada destes jovens neste espaço só foi possível devido à
massificação escolar – que iniciou-se na década de 80 - e que tem acarretado um “(...)
aumento expressivo do número de jovens que chegam aos bancos escolares (...)” (CORTI E
SOUZA, 2004, p.101). No caso desta escola, um forte indicador do aumento de jovens nas
salas de aula foi o fato de que o noturno possui hoje aproximadamente noventa por cento de
alunos jovens, e que há cinco anos essa não era a realidade deste turno.
Um morador próximo da escola revelou que, anteriormente, os alunos da mesma não
moravam no entorno dela, que alguns vinham de muito longe para estudar e que, na época da
matrícula, costumava haver filas enormes onde varavam noite adentro para conseguirem uma
vaga. Contudo, com a regionalização da educação, atualmente os alunos da escola são os que
moram em seu entorno, mudando o público atendido pela mesma.
Assim como é elucidado pelos teóricos, verificamos que uma das questões que se
apresentaram para o projeto foi que os jovens com os quais iríamos trabalhar, provenientes
das camadas populares, não se reconheciam dentro da escola. Acreditamos que isso se deve
ao fato de que este espaço não foi originalmente construído para este jovem, mas para aqueles
provenientes das camadas médias e altas, como mostra Dubet (2003) ao analisar o contexto
educacional francês.
Dayrell aponta que “se a escola se abriu para receber um novo público, ela ainda não
se redefiniu internamente, não se reestruturou a ponto de criar pontos de diálogos com os
sujeitos e sua realidade” (2007, p.05). E isso tem ficado claro no caso desta escola,
principalmente com a dificuldade apontada pela coordenação do turno em lidar com os jovens
alunos, que têm gradualmente ocupado o lugar dos alunos adultos no noturno.
Porém, estudiosos como Corti e Souza (2004), Perrenoud (1995) e outros, afirmam
que a escola tem buscado homogeneizar os jovens de acordo com a categoria aluno,
desconsiderando toda a multiplicidade que estes trazem neste momento de suas vidas. Eles
acreditam que os jovens têm resistido a tal homogeneização, gerando um conflito entre alunos
e professores. Esse conflito era visível nas falas dos alunos, pois reclamavam da necessidade
do uso do uniforme, de não poderem ir de boné ou outro tipo de chapéu, de não terem espaço
para mostrarem o que faziam fora dali – já que muitos tinham grupos de dança, faziam grafite,
teatro etc. Contudo, vários alunos conseguiam burlar a vigilância da escola e trocavam de
roupa no banheiro, traziam os chapéus escondidos nas mochilas, pequenos aparelhos de som
para dançarem na hora do recreio e etc. Mas, quando estes eram descobertos, ou os
professores os colocavam para fora de sala ou os impedia de entrar, o que geralmente
terminava em discussão, sendo o aluno encaminhado para a direção. Ou seja,
o conflito instalado remete, de um lado, a uma instituição que se vê ameaçada por
comportamentos e símbolos de ‘fora’, frequentemente associados ao mundo da rua,
e, de outro lado, aos alunos jovens que resistem à homogeneização proposta pela
escola e buscam levar suas identidades juvenis para dentro dela, afirmando-as de
forma explícita (CORTI e SOUZA, 2004, p.120).
Durante o projeto pudemos perceber que os professores não possuem uma boa visão
dos jovens alunos, sendo estes principalmente marcados pela violência, pois de acordo com os
professores “os alunos jovens são bem violentos, eles se agridem o tempo todo, não criam
nenhum laço de afetividade nem entre si”3. Entretanto, este aspecto não se revelou no projeto,
pois existiam vários grupos de afinidades entre os mesmos e que faziam praticamente todas as
atividades juntos.
Algumas das visões sobre os alunos jovens revelavam que os mesmos eram vistos na
perspectiva da negatividade e da falta. Para os professores, a falta de uma estrutura familiar, a
convivência com a violência – doméstica e na rua -, o mundo das drogas, o álcool, a falta de
motivação e o desemprego se mostravam como elementos que afastavam esse aluno da
escola, esvaziando esse espaço de qualquer sentido para eles.
Outro aspecto importante manifestado pelos professores era a consideração de que os
jovens alunos não criavam expectativas sobre suas vidas e que nem construíam sonhos, o que
acabava os distanciando ainda mais do mundo escolar.
Observamos que, devido a essa visão, os professores relataram se sentir frustrados,
pois não conseguiam estabelecer nenhum vínculo com os alunos que pudesse fazer com que o
conhecimento escolar tivesse sentido para eles. Percebemos nos professores certa esperança
na reversão dessa situação. O contato mais prolongado com os professores nos possibilitou
constatar a afirmativa de Dayrell (2007), “(...) os professores não se sentem preparados para
lidar com essa nova realidade, negando-a ou demandando uma formação que lhes dêem
elementos para se adequarem a ela” (p.06). Ou seja, os professores se encontram perdidos
nesta nova realidade, não tendo nenhum referencial ou apoio para encontrarem outra forma de
trabalhar com este novo aluno.
3
Fala dos professores em uma reunião que ocorreu na escola com a equipe do projeto
3. ”QUE ESCOLA É ESTA?” A VISÃO DOS JOVENS ALUNOS SOBRE A ESCOLA
ONDE ESTUDAM.
Quando o projeto iniciou tinha ao todo, quatro turmas com 30 alunos em cada, que
ficaram a cargo de dois monitores por turma, um da universidade e outro da própria
comunidade, como já foi dito anteriormente. Toda semana trazíamos uma pergunta que
pudesse gerar um debate entre os alunos sobre a relação destes com o espaço escolar.
Algumas das perguntas foram: “Que escola eu tenho? Que escola eu gostaria de ter?”, “Como
eu sou dentro da escola?” “Existe um professor e um aluno ideal?” “Por que estou
estudando?” entre outras. Porém, apesar das perguntas estarem ligadas ao cotidiano escolar,
ficávamos atentos aos elementos da vida diária dos jovens que aparecessem em suas falas,
como o trabalho, a família, os namoros e outras atividades. Não foram poucas as vezes em
que estes elementos se mostraram e apareciam sempre como importantes mediadores para
pensar a relação que esses jovens tinham com a escola.
Contudo, até chegarmos às falas dos alunos, não foi fácil. Inicialmente, estes pareciam
arredios e nem sempre respondiam às perguntas feitas pelos monitores, como se esperassem
que ali se repetisse o contexto da sala de aula, onde o professor fala e o aluno escuta. Isto
reforça ainda mais a idéia da lógica escolar que vem “(...) atingindo, principalmente, as
crianças e jovens, reforçando ainda mais sua identidade como alunos; como se essa fosse a
sua condição natural” (DAYRELL, 2007, p.24). Além disso, alguns alunos só aceitavam
registrar as suas opiniões se não tivessem que colocar nome nos trabalhos, temendo qualquer
retaliação por parte da escola. Nos primeiros trabalhos aceitamos algumas dessas imposições,
mas aos poucos conseguimos transpor essas barreiras, principalmente ao conquistarmos a
confiança desses alunos. A partir deste ponto, os debates fluíram de uma forma melhor e os
jovens passaram a expressar as suas opiniões sem medo de qualquer represália.
Entretanto, em quase todas as discussões possibilitadas, os jovens colocavam a
necessidade de serem ouvidos, para que pudessem falar de suas vidas e dificuldades.
Relatavam que sentiam que os professores não sabiam quem eles eram, e que não
demonstravam nenhum interesse sobre as suas vidas. Falaram de inúmeras vezes em que
tentaram se expressar, mas os professores não os quiseram escutar. Em contrapartida, o
depoimento dos jovens deixou claro que comportamentos ríspidos e, algumas vezes,
violentos, eram a resposta destes para o desinteresse dos professores. Era comum a frase "Se
eles não me escutam eu também não os escuto"4. E de acordo com os próprios alunos, tal
comportamento era o principal motivo dos desentendimentos entre estes e os professores, já
que os últimos queriam que os alunos prestassem atenção aos conteúdos a serem explicados,
enquanto os primeiros se negavam a fazer tal coisa por resistência.
Outra questão apontada pelos alunos era o desrespeito para com eles. Diziam que em
determinadas aulas não podiam fazer nenhuma pergunta sem receberem má resposta do
professor, e por isso alegavam que nestas aulas faziam bagunça intencionalmente, como uma
vingança. Além disso, não falavam o nome nem dos professores e nem das disciplinas em que
isso ocorria, temendo qualquer tipo de reação por parte da escola. Também apontaram que
alguns funcionários da escola – como serventes, porteiros e até o guarda municipal daquela
unidade – os tratavam mal, o que era respondido com atitudes como matarem aulas
escondidos na quadra, quebrarem lâmpadas e saírem correndo, e até pularem os muros da
escola.
Porém, a diretora da escola não é apontada por todos os alunos como fonte de
desrespeito, mas é criticada por aplicar as suspensões e ocorrências solicitadas pelos
professores sem questionar o motivo. Parece que os alunos esperavam por parte da Diretora
da escola – a autoridade máxima – uma atitude de escutá-los antes de aplicar qualquer
penalidade e que, ao ouvi-los, questionasse as ordens do professor.
Para os alunos o professor ideal seria “aquele que não só passa montanhas de
exercícios no quadro, ou que grita com eles, mas aquele que pergunta pelo menos se eles
estão bem, explica novamente quando não entendem e que não lhes dêem respostas agressivas
quando questionados”5, afinal “(...) os jovens esperam que os professores os ajudem a se
situarem, a perceberem que determinada matéria tem a ver com eles” (CORTI e SOUZA,
2004, p.110).
Alguns professores foram mais apontados do que outros como desafetos dos alunos,
enquanto apenas uma professora se mostrou querida pelos mesmos, e o ponto mais freqüente
relacionado a tais conflitos era a escuta. Um aluno, por exemplo, disse que ao chegar atrasado
na aula porque a rua tinha sido fechada por traficantes, foi explicar para o professor, e ele
simplesmente não quis saber e disse que o mesmo não poderia assistir à aula devido ao atraso.
O aluno se irritou e o insultou, o que resultou numa advertência escrita ao mesmo. Contudo,
este aluno não queria apenas entrar na sala para assistir aula, queria contar a sua experiência,
queria ser ouvido e compreendido como alguém que enfrenta problemas no dia-a-dia. Parece
4
5
Fala de alguns alunos nos debates promovidos em sala de aula nos encontros semanais do projeto.
Fala de alunos nos encontros semanais do projeto.
que há uma desconsideração de que os problemas interferem muitas vezes diretamente no
relacionamento do jovem com a escola, mas, como foi visto apenas como aluno, nada pode
fazer, a não ser se rebelar contra o professor que se recusou a escutá-lo.
4. REFLETINDO SOBRE UMA POSSIBILIDADE DE INCLUSÃO
Ao refletir um pouco sobre a situação apresentada acima, podemos perceber que as
discussões possibilitadas pelo projeto trouxeram à tona uma questão que de uma forma geral
tende a permear a relação entre alunos e professores, que é a tensão entre o "ser jovem" e o
"ser aluno". Os professores parece esperarem encontrar em sala de aula os “alunos”,
obedientes, silenciosos e com sede de aprender o saber escolar, enquanto os jovens querem
"ser jovem", querem falar de suas vidas, de suas experiências, fazer amigos e ter os
professores também como amigos. Corti e Souza (2004) apontam que os jovens alunos
compreendem que o professor é uma peça fundamental no seu processo de aprendizagem, e
por isso tendem a acreditar que se fossem amigos aprenderiam mais.
Provavelmente, uma possibilidade para uma real inclusão dos jovens alunos na escola
seja reconhecer que eles são jovens antes de serem alunos e que, de forma alguma, podemos
ignorar este ponto. Entretanto, ainda se mostra necessário vislumbrar caminhos para abrir as
portas da escola aos jovens (e não só aos alunos), pois, talvez, na forma como conhecemos a
escola, não exista ainda o espaço para esse novo sujeito que já entrou, mas que ainda não
conseguiu ter espaço. Foi possível apreender que os jovens alunos querem que a escola não
seja apenas o lugar de aprender conteúdos, mas também o lugar de ser feliz, de se relacionar e
fazer amigos depois de um longo dia de trabalho.
REFERÊNCIAS
CORTI, A P.; SOUZA, Raquel. Diálogos com o mundo juvenil: subsídios para
educadores. São Paulo: Ação Educativa, 2004.
DAYRELL, Juarez. “A Escola faz a juventude? Reflexões em torno da socialização
juvenil”; 2007. Disponível em <http://www.fae.ufmg.br:8080/objuventude/acervo.php>
acesso em 26/11/2007.
DUBET, François. “A Escola e a Exclusão”, in Cadernos de Pesquisa, nº 119, São Paulo
2003.
Disponível
em
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S010015742003000200002&script=sci_arttext&tlng=pt, acesso em 22/02/2008.
DUBET, François. El Declive de la instituición: professiones, sujetos e individuos ante la
reforma del estado. Trad. Luciano Padilla. [S.l} Ed. Gedisa. 2005.
PERRENOUD, P. Ofício de aluno e sentido do trabalho escolar. Porto: Porto Editora, 1995
SOUZA, Regina Magalhães de. Escola e juventude: o aprender a aprender. São Paulo.
Educ/Paulus, 2003
SPÓSITO, M.P. “Algumas reflexões e muitas indagações sobre a relação juventude e escola
no Brasil.”In, Retratos da Juventude Brasileira: análises de uma pesquisa nacional. Org.
Helena Wendel Ábramo e Paulo Martoni Branco. Ed. Fundação Perseu Ábramo. 2005.
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