74
FISIOLOGIA
ARTICULAR
o joelho é a articulação intermédia do membro inferior. É, principalmente, uma articulação
com só um grau de liberdade - a ftexão-extensão -, que lhe pennite aproximar ou afastar,
mais ou menos, a extremidade do membro à sua
raiz, ou seja, regular a distância do corpo com relação ao chão. O joelho trabalha, essencialmente,
em compressão, pela ação da gravidade.
De forma acessória, a articulação do joelho
possui um segundo grau de liberdade: a rotação sobre o eixo longitudinal da perna, que só
aparece quando o joelho está jlexionado.
Do ponto de vista mecânico, a articulação
do joelho é um caso surpreendente, visto que deve conciliar dois imperativos contraditórios:
-
possuir uma grande estabilidade em extensão máxima. Nesta posição o joelho
faz esforços importantes devido ao peso
do corpo e ao comprimento dos braços
de alavanca;
-
adquirir uma grande mobilidade a partir
de certo ângulo de ftexão. Esta mobilidade é necessária na corrida e para a
orientação ótima do pé com relação às
irregularidades do chão.
O joelho resolve estas contradições graças
a dispositivos mecânicos extremamente sofisticados; porém, como suas superfícies possuem
um encaixe frouxo, condição necessária para
uma boa mobilidade, ele está sujeito a entorses
e luxações.
Quando está em ftexão, posição de instabilidade, o joelho está sujeito ao máximo a lesões
ligamentares e dos meniscos.
Em extensão é mais vulnerável a fraturas
articulares e a rupturas ligamentares.
2. MEMBRO INFERIOR 75
76
FISIOLOGIA
ARTICULAR
OS EIXOS DA ARTICULAÇÃO
o primeiro
DO JOELHO
grau de liberdade está condicionado pelo eixo transversal XX' (fig. 2-1, vista interna e 2-2, vista externa do joelho semifiexionado), ao redor do qual se realizam os movimentos de fiexão-extensão no plano sagital. Este eixo XX', contido num plano frontal, atravessa horizontalmente os côndilos femorais.
XX' e o eixo do fêmur e 93° entre XX' e o eixo
da perna. Do qual se deduz que, em máxima fiexão, o eixo da perna não se situa, exatamente por
trás do eixo do fêmur, mas por trás e um pouco
para dentro, o qual desloca o calcanhar em direção ao plano de' simetria: a fiexão máxima faz
com que o calcanhar entre em contato com a
Por causa da forma "em alpendre" do colo
femoral (fig. 2-3), o eixo da diáfise femoral não
está situado, exatamente, no prolongamento do
eixo do esqueleto da perna, e forma com este um
ângulo obtuso, aberto para dentro, de 170-175°:
se trata do valgo fisiológico do joelho.
nádega, no nível da "tuberosidade isquiática.
Contudo, os três centros articulares do quadril (H), do joelho (O) e do tornozelo (C) estão
alinhados numa mesma reta HOC, que representa o eixo mecânico do membro inferior. Na perna, este eixo se confunde com o eixo do esqueleto; porém, na coxa, o eixo mecânico HO forma um ângulo de 6° com o eixo do fêmur.
Por outro lado, o fato de que os quadris
estejam mais separados entre si que os tornozelos faz com que o eixo mecânico do membro
inferior seja ligeiramente
oblíquo para baixo
e para dentro, formando um ângulo de 3° com
a vertical. Este ângulo será mais aberto quanto
mais larga seja a pelve, como no caso da mulher. Isso explica por que o valgo fisiológico
do joelho é mais marcado na mulher do que no
homem.
O eixo de fiexão-extensão XX' é mais horizontal, assim sendo, não constitui a bissetriz
(Ob) do ângulo de valgo: medem-se 81° entre
O segundo grau de liberdade consiste na
rotação ao redor do eixo longitudinal YY' da perna (figs. 2-1 e 2-2), com o joelho em flexão. A
estrutura do joelho toma esta rotação impossível
quando a articulação está em máxima extensão;
assim, o eixo da perna se confunde com o eixo
mecânico do membro inferior e a rotação axial
não se localiza no joelho, mas no quadril que o
substitui.
Na figura 2-1 aparece desenhado um eixo
ZZ' ântero-posterior e perpendicular aos dois ei-
xos mencionados. Este eixo não representa um
terceiro grau de liberdade; quando o joelho está
fiexionado, uma certa folga mecânica permite
movimentos de lateralidade de 1 a 2 em no tornozelo; porém, em extensão completa, estes movimentos de lateralidade desaparecem totalmente: se existissem, deveriam ser considerados patológicos.
Contudo, é necessário saber que os movimentos de lateralidade
sempre que se flexione
aparecem
normalmente
minimamente o joelho;
para saber se são patológicos, é indispensável
compará-Ios com os do lado oposto, com a
condição de que este lado seja normal.
2. MEMBRO INFERIOR
x
Fig.2-2
Fig.2-3
77
78
FISIOLOGIA ARTICULAR
OS DESLOCAMENTOS LATERAIS DO JOELHO
Além das suas yariações fisiológicas dependendo do sexo, o ângulo de valgo sofre variações patológicas dependendo de cada indivíduo (fig. 2-4).
Quando este ângulo se inverte, se trata de
um genu varo (lado esquerdo da figo 2-4): normalmente diz-se que o indivíduo está "cambado" (fig. 2-6); o centro do joelho, representado
pela incisura interespinhosa da tíbia e a incisura
intercondiliana do fêmur, se desloca para fora. O
genu varo pode ser apreciado de duas maneiras:
-
medindo o ângulo entre o eixo diafisário do fêmur e o da tíbia: quando é
maior do que o seu valor fisiológico de
170°, por exemplo, 180 ou 185°, representa uma inversão do ângulo obtuso;
- medindo o deslocamento
externo
(fig. 2-5) do centro do joelho com relação ao eixo mecânico do membro inferior, por exemplo 10, 15 ou 20 mm.
Observa-se D.E. = 15 mm.
Pelo contrário, quando o ângulo de valgo se
"fecha", corresponde ao genu valgo (lado direito da figo 2-4): se diz então que o indivíduo é
"zambro" (fig. 2-8). Também existem dois métodos possíveis para se detectar o genu valgo:
-
medindo o ângulo dos eixos diafisários,
cujo valor estará menor do que o ângulo
fisiológico de 170°: por exemplo 165°.
- medindo o deslocamento
interno
(fig. 2-7) do centro do joelho com relação ao eixo mecânico do membro inferior, por exemplo 10, 15 ou 20 mm.
Observa-se D.I = 15 mm.
A medida do deslocamento externo ou interno é mais rigorosa do que a do ângulo de valgo, porém requer excelentes radiografias de todo o conjunto dos membros inferiores denominadas "de goniometria" (fig. 2-4). No esquema da figura, cúmulo do azar, o indivíduo apresenta um genu valgo à direita e um genu varo à
esquerda. Esta circunstância é estranha, visto
que na maior parte dos casos a deformação é semelhante e bilateral, porém não é obrigatoriamente simétrica, já que um joelho pode estar
mais desviado que o outro; todavia, existem casos muito raros de desvios em "rajada", ou seja,
com os dois joelhos do mesmo lado, como mostra o esquema: esta é uma situação muito incômoda, que provoca um desequilíbrio do lado do
genu valgo; podemos encontrar este caso, quando após uma osfeotomia, se hipercorrigiu um
genu varo em genu valgo; assim sendo, é necessário operar rapidaménte o outro lado para restabelecer o equilíbrio.
Os desvios laterais dos joelhos não são raros,
visto que com o passar do tempo podem gerar
uma artrose; de fato, as cargas não estão repartidas
com igualdade entre os compartimentos externo e
interno do joelho, provocando um desgaste prematuro do compartimento interno, uma artrose
remoro-tibial interna, no genu varo, ou sob o
mesmo mecanismo, uma artrose remoro-tibial
externa no genu valgo; isso pode levar a realizar,
no primeiro caso uma osteotomia tibiaI (ou femoral) de valgização e no segundo caso, uma osteotomia tibiaI (ou femoral) de varização.
Na atualidade, para prevenir estes problemas, se dá muita importância à vigilância dos
desvios laterais dos joelhos nas crianças pequenas. Isto se deve a que o genu valgo bilateral é
muito freqüente nas crianças, e embora desapareça progressivamente durante o crescimento, é
necessário realizar um seguimento desta evolução favorável com radiografias do conjunto dos
membros inferiores, visto que no caso de persistir um desvio importante até o final da infância, seria conveniente avaliar uma intervenção
por epifisiodese tíbio-femoral interna no caso
de genu valgo, ou externa no caso de genu varo,
que deve ser realizada antes do final do período
de crescimento visto que estas intervenções
agem impedindo o crescimento de um lado provocando um maior crescimento do lado "mais
desviado" .
2. 1'1EMBRO INFERIOR
Fig.2-5
Fig.2-4
Fig.2-8
Fig.2-6
79
80
FISIOLOGIA ARTICULAR
OS MOVIMENTOS DE FLEXÃO·EXTENSÃO
A fiexão-extensão é o movimento principal
do joelho. A sua amplitude se mede a partir da
posição de referência definida da seguinte maneira: o eixo da perna se situa no prolongamento do eixo da coxa (fig. 2-9, perna esquerda). De
perfil, o eixo do fêmur segue sem nenhuma angulação, com o eixo do esqueleto da perna. Nesta posição de referência, o membro inferior possui o seu comprimento máximo.
A extensão se define como o movimento
que afasta a face posterior da perna da face posterior da coxa. Na verdade, não existe uma extensão absoluta, pois na posição de referência o
membro inferior está no seu estado de alongamento máximo. Porém, é possível realizar, principalmente passivamente, um movimento de extensão de 5° a 10° a partir da posição de referência (fig. 2-11); este movimento recebe o nome,
sem dúvida errado, de "hiperextensão". Em alguns indivíduos, esta hiperextensão está mais
marcada por razões patológicas, provocando um
genu recun1atum.
A extensão ativa, poucas vezes ultrapassa,
e por pouco, a posição de referência (fig. 2-9) e
esta possibilidade depende essencialmente da
posição do quadril: de fato, a eficácia do reto anterior, como extensor do joelho, aumenta com a
extensão do quadril (ver pág. 148). Isto significa
que a extensão prévia do quadril (fig. 2-10, perna direita) prepara a extensão do joelho.
A extensão relativa é o movimento que
completa a extensão do joelho, a partir de qualquer posição de fiexão (fig. 2-10, perna esquerda); se trata do movimento que se realiza normalmente durante a marcha, quando o membro
"oscilante" se desloca para frente para entrar em
contato com o chão.
A flexão é o movimento que aproxima a face posterior da perna à face posterior da coxa.
Existem movimentos de fiexão absoluta, a partir
da posição de referência, e movimentos de fiexão
relativa, a partir de qualquer posição em fiexão.
A amplitude da flexão do joelho é diferente dependendo da posição do quadril e segundo às modalidades do próprio movimento.
Aflexão ativa atinge os 140° se o quadril
estiver previamente flexionado (fig. 2-12), e
somente chega aos 120° se o quadril estiver em
extensão (fig. 2-13). Esta diferença de amplitude se deve à diminuição da eficácia dos ísquio-tibiais quando o quadril está estendido
(ver pág. 150). Porém, é possível ultrapassar
os 120° de flexão çlo joelho com o quadril estendido, graças à contração balística: os ísquio-tibiais se contraem potente e bruscamente iniciando a flexão do joelho que termina como uma flexão passiva.
Afiexão passiva do joelho atinge uma amplitude de 160° (fig. 2-14) e permite que o calcanhar entre em contato com a nádega. Este
movimento é uma prova muito importante para
comprovar a liberdade da fiexão do joelho. Para
apreciar a sua flexão passiva pode medir-se a
distância que separa o calcanhar da nádega. Em
condições normais, a flexão está limitada apenas
pelo contato elástico das massas musculares da
panturrilha e da coxa. Em condições patológicas, a flexão passiva do joelho está limitada pela retração do aparelho extensor -. principalmente o quadríceps - ou pelas retrações capsulares (ver pág. 108).
Embora sempre seja viável detectar um
déficit de flexão diferenciando o grau de flexão atingido e a amplitude da flexão máxima
(160°), ou também, comprovando a distância
calcanhar/nádega, o déficit de extensão se determina por um ângulo negativo, por exemplo
- 60°: este é o que se mede entre a posição de
extensão passiva máxima e a retitude. Desta
forma, na figura 2-13 também podemos dizer
que a perna esquerda está flexionada a 120°,
ou, se não pode atingir uma extensão maior,
que apresenta um déficit de extensão de
-120°.
2. MEMBRO INFERIOR 81
Fig.2-10
Fig.2-9
Fig.2-14
Fig.2-13
82 FISIOLOGIA ARTICULAR
A ROTAÇÃO AXIAL DO JOELHO
Rotação da perna ao redor do seu eixo
longitudinal: este movimento só pode ser realizado com o joelho flexionado, enquanto com o
joelho estendido o bloqueio articular une a tíbia
com o fêmur.
Para medir a rotação axial ativa, devemos
flexionar o joelho em ângulo reto, o indivíduo
sentado com as pernas penduradas para fora da
mesa de exame (fig. 2-15): a flexão do joelho exclui a rotação do quadril. Na posição de referência, a ponta do pé se dirige ligeiramente para fora (ver pág. 84).
A rotação interna (fig. 2-16) leva a ponta
do pé para dentro e intervém, de forma importante, no movimento de adução do pé (ver pág. 160).
A rotação externa (fig. 2-19) leva a ponta
do pé para fora e também intervém no movimento de abdução do pé.
Para Fick, a rotação externa é de 40° com
relação aos 30° de rotação interna. Esta amplitude varia com o grau de flexão, visto que, segundo este autor, a rotação externa é de 32° quando
o joelho está flexionado a 30° e de 42° quando
está flexionado em ângulo reto.
A medida da rotação axial passiva se realiza com o indivíduo em decúbito prono, com o
joelho flexionado em ângulo reto: o examinador segura o pé com as duas mãos e o gira, levando a sua ponta para fora (fig. 2-18) e para
dentro (fig. 2-19). Como é de se esperar, esta
rotação passiva é um pouco mais ampla que a
rotação ativa.
Finalmente, existe uma rotação axial denominada "automática", visto que está, inevitável e involuntariamente, ligada aos movimentos de flexão-extensão. Ocorre, principalmente.
nos últimos graus de extensão ou no início da
flexão. Quando o joelho se estende, o pé é levado para a rotação extema (fig. 2-20); se indica
uma simples regra mnemotécnica para lembrar
esta associação: EXTensão e rotação EXTerna.
De maneira inversa, quando o joelho está flexionado a perna gira em rotação interna (fig. 2-21).
O mesmo movimento se realiza quando, ao dobrar as pernas sobre o corpo, a ponta do pé é levada para dentro. Esta postura também corresponde à posição fetal.
Mais adiante vamos estudar o mecanismo
desta rotação automática.
82
FISIOLOGIA ARTICULAR
A ROTAÇÃO AXIAL DO JOELHO
Rotação da perna ao redor do seu eixo
longitudinal: este movimento só pode ser realizado com o joelho flexionado, enquanto com o
joelho estendido o bloqueio articular une a tíbia
com o fêmur.
Para medir a rotação axial ativa, devemos
flexionar o joelho em ângulo reto, o indivíduo
sentado com as pernas penduradas para fora da
mesa de exame (fig. 2-15): a flexão do joelho exclui a rotação do quadril. Na posição de referência, a ponta do pé se dirige ligeiramente para fora (ver pág. 84).
A rotação interna (fig. 2-16) leva a ponta
do pé para dentro e intervém, de forma importante, no movimento de adução do pé (ver pág. 160).
A rotação externa (fig. 2-19) leva a ponta
do pé para fora e também intervém no movimento de abdução do pé.
Para Fick, a rotação externa é de 40° com
relação aos 30° de rotação interna. Esta amplitude varia com o grau de flexão, visto que, segundo este autor, a rotação externa é de 32° quando
o joelho está flexionado a 30° e de 42° quando
está flexionado em ângulo reto.
A medida da rotação axial passiva se realiza com o indivíduo em decúbito prono, com o
joelho flexionado em ângulo reto: o examinador segura o pé com as duas mãos e o gira, levando a sua ponta para fora (fig. 2-18) e para
dentro (fig. 2-19). Como é de se esperar, esta
rotação passiva é um pouco mais ampla que a
rotação ativa.
Finalmente, existe uma rotação axial denominada "automática", visto que está, inevitável e involuntariamente, ligada aos movimentos de flexão-extensão. Ocorre, principalmente.
nos últimos graus de extensão ou no início da
flexão. Quando o joelho se estende, o pé é levado para a rotação extema (fig. 2-20); se indica
uma simples regra mnemotécnica para lembrar
esta associação: EXTensão e rotação EXTerna.
De maneira inversa, quando o joelho está flexionado a perna gira em rotação interna (fig. 2-21).
O mesmo movimento se realiza quando, ao dobrar as pernas sobre o corpo, a ponta do pé é levada para dentro. Esta postura também corresponde à posição fetal.
Mais adiante vamos estudar o mecanismo
desta rotação automática.
2. MEMBRO INFERIOR
,
(
I"
~
Fig.2-17
Fig.2-16
Fig.2-18
Fig.2-21
Fig.2-20
Fig.2-19
83
84
FISIOLOGIA
ARTICULAR
ARQUITETURA GERAL DO MEMBRO INFERIOR
. E ORIENTAÇÃO DAS SUPERFÍCIES ARTICULARES
A orientação dos côndilos femorais e dos
platôs tibiais favorece a flexão do joelho
(fig. 2-22, segundo Bellugue). Duas extremidades ósseas móveis uma com relação à outra (a)
modelam rapidamente a sua forma em função
dos seus movimentos (b) (experiência de Fick).
Todavia, a flexão não pode atingir o ângulo reto (c), a menos que não se elimine um fragmento (d) do segmento superior a fim de retardar o
impacto com a superfície inferior. O ponto fraco criado no fêmur se compensa pela transposição para diante (e) da diáfise, o qual desloca
os côndilos para trás. Simetricamente, a tíbia se
torna mais fraca atrás e mais forte adiante (f),
deslocando para trás a superfície tibial. Desta
forma, na flexão máxima, as importantes massas musculares podem situar-se entre a tíbia e o
fêmur.
As curvaturas gerais dos ossos do membro inferior representam os esforços que agem
sobre eles. Obedecem às leis das "colunas
com carga excêntrica" de Euler (Steindler).
Quando uma coluna está articulada pelos seus
dois extremos (fig. 2-23, a), a curvatura ocupa
toda a sua altura, este é o caso da curvatura de
concavidade posterior da diáfise femoral (fig.
2-23, b). Se a coluna está fixada embaixo e é
móvel em cima (fig. 2-24, a), existem duas
curvaturas opostas, a mais alta ocupa 2/3 da
coluna: estas correspondem às curvaturas do
fêmur no plano frontal. Se a coluna estivesse
fixada pelos seus dois extremos (fig. 2-25, a),
a curvatura ocuparia as duas quartas partes
centrais, o que corresponde às curvaturas da
tíbia no plano frontal (fig. 2-25, b). No plano
sagital, a tíbia apresenta três características
(fig. 2-26, b):
- a retrotorção (T), deslocamento posterior citado anteriormente;
- a retroversão (V), declive de 5-6° dos
platôs tibiais para trás;
- a retroflexão (F), curvatura de concavidade posterior de uma coluna móvel em
ambos os extremos (fig. 2-23, a), como
no caso do fêmur.
Durante a flexão (fig. 2-27), as curvaturas
côncavas do fêmur e da tíbia estão face a face,
aumentando, portanto, o espaço disponível para
as massas musculares.
As figuras na margem inferior da página
explicam através de uma espécie de "álgebra
anatômica" as torções axiais sucessivas dos segmentos do membro inferior, vistos desde cima
no esquema.
"
Torção do fêmur (fig. 2-28): se a cabeça e
o colo (1) com o maciço condiliano (2) se unem
(a); sem torção (b), o eixo do colo está no mesmo plano que o eixo dos côndilos; porém, na
verdade, o colo forma um ângulo de 30° com o
plano frontal (c), de modo que o eixo dos côndiIas permanece frontal (d) e é necessário introduzir uma torção da diáfise femoral de -300 por
uma rotação interna que corresponde ao ângulo
de anteversão do colo femora!.
Torção do esqueleto da perna (fig. 2-29):
se a tíbio-tarsiana (1) e os platôs tibiais (2) se
unem (a); sem torção (b), o eixo dos platôs e o
eixo da tíbio-tarsiana são frontais; na verdade
(c), a retroposição do maléolo externo converte
o eixo da tíbio-tarsiana oblíquo para fora e para
trás, o qual corresponde a uma torção do esqueleto da perna de +250 por uma rotação externa.
Se unirmos (fig. 2-30, a) os côndilos (1) e
os platôs, parece que os dois eixos deveriam ser
frontais (b). Na realidade, a rotação axial automática acrescenta +5° de rotação externa da tíbia sobre o fêmur em extensão máxima.
Estas torsões escalonadas ao longo do
membro inferior (-30° +25° +5°) se anulam
(fig. 2-31, a) de tal modo que o eixo da tíbiotarsiana está quase na mesma direção do que o
eixo do colo, ou seja, em rotação externa de
30°, provocando um deslocamento de 300 para
fora do eixo do pé, na posição de pé, com os
calcanhares juntos e a pelve simétrica (b). Durante a marcha, o avanço do membro oscilante
leva o quadril homólogo para diante (c); se a
pelve gira 30°, o eixo do pé se dirige diretamente para frente, no sentido da marcha, o que permite um "ótimo desenvolvimento do passo".
2. MEMBRO INFERIOR 85
c
b
a
a
Fig.2-22
Fig.2-24
a
a
b
b
e
Fig.2-23
Fig: 2-27
a
b
Fig.2-25
Fig.2-26
+30
+
'G-_~
-W-
+30
Fig. 2-28 b
2
a
1W+ --.-
Fi9.2-302
1.6+
Oa
Fig.2-29
-O
@
b
~4b
b
~30~30
---~
Fig.2-31
~+5
O
~;
~30
c
~+25
c
c
86 FISIOLOGIA ARTICULAR
AS SUPERFÍCIES DA FLEXÃÜ-EXTENSÃü
o principal
grau de liberdade do joelho é o
da flexão-extensão, que corresponde ao eixo
transversal. Ele está condicionado por uma articulação de tipo troclear: de fato, as superfícies da extremidade inferior do fêmur constituem uma polia ou, mais exatamente, um segmento de polia (fig. 2-32), que, por sua forma,
lembra um trem de aterrissagem duplo de avião
(fig. 2-33). Os dois côndilos femorais, convexos
em ambos os sentidos, formam as duas faces articulares da polia e correspondem às rodas do
trem de aterrissagem; eles se prolongam para
frente (fig. 2-34) pelas duas faces da tróclea femoral. Quanto à garganta da polia, está representada, adiante, pela garganta da tróc1ea femoral e, atrás, pela incisura intercondiliana, cujo
significado mecânico será explicado mais
adiante. Alguns autores descrevem o joelho como uma articulação bicondiliana; isto é verdadeiro do ponto de vista anatômico, porém do
ponto de vista mecânico é, sem nenhuma dúvida, uma articulação troclear específica.
crista romba ântero-posterior na qual se encaixa
o maciço das espinhas tibiais; adiante, no prolongamento desta ~rista, situa-se a crista romba da
face posterior da patela (P) cujas duas vertentes
prolongam a superficie das glenóides. Este conjunto de superfícies é dotado de um eixo transversal (1), que coincide com o eixo dos côndilos
(U) quando a articulação está encaixada.
Na parte tibial, as superfícies estão inversamente conformadas e se organizam sobre dois
sulcos paralelos, incurvados e côncavos, separados por uma crista romba ântero-posterior
(fig. 2-35): a glenóide externa (GE) e a glenóide
interna (Gr) se localizam cada uma num sulco
da superfície (S), além de estar separadas pela
Considerada somente sob o ângulo de fIexão-extensão e numa primeira aproximação,
podemos imaginar a articulação do joelho como uma superfície em forma de polia deslizando-se sobre um sulco duplo, côncavo e parelho
(fig. 2-36). Porém, como poderemos ver mais
adiante, a realidade é mais complexa.
Assim, as glenóides correspondem aos côndilos enquanto o maciço das espinhas tibiais se
aloja na incisura intercondiliana; fimcionalmente, este conjunto constitui a articulação fêmoro-tibial. Adiante, as duas vertentes da superfície articular da patela correspondem às duas faces da tróclea femoral, enquanto a crista romba
vertical se encaixa na garganta da tróclea, desta
forma se constitui um segundo conjunto funcional, a articulação fêmoro-patelar. As duas articulações funcionais, fêmoro-tibial e fêmoropatelar, estão incluídas numa única e mesma articulação anatômica, a articulação do joelho.
2. MEMBRO INFERIOR
Fig.2-32
Fig.2-33
Fig.2-34
p
GI
~
Fig.2-35
87
88 FISIOLOGIA ARTICULAR
AS SUPERFÍCIES EM FUNÇÃO DA ROTAÇÃO AXIAL
As superfícies articulares, tal corno estão
descritas na página anterior, só permitem um
único movimento que é o da fiexão-extensão.
De fato, a crista romba da superfície inferior, ao
encaixar-se na garganta da polia em todo o seu
comprimento, impede qualquer movimento de
rotação axial da superfície inferior sob a superfície superior.
Para que a rotação axial seja factível, devese modificar a superfície inferior (fig. 2-37) de tal
forma que a crista romba reduza o seu comprimento. Com esta finalidade, se limam (fig. 2-38)
as duas extremidades desta crista, de forma que a
parte média que permanece forme um pivô, encaixado na garganta da polia e ao redor do qual a
superfície inferior pode girar. Este pivô é o maciço das espinhas tibiais que forma a vertente
externa da glenóide interna e a vertente interna
da glenóide externa; por este pivô central, ou
mais concretamente, pela espinha tibial interna,
passa o eixo vertical (R), ao redor do qual se realizam movimentos de rotação longitudinal. Alguns autores designam os dois ligamentos cruzados, denominando-lhes pivô central, considerados o eixo de rotação longitudinal do joelho.
Esta terminologia parece não ser muito apropriada, visto que o conceito de pivô significa um
ponto de apoio sólido, e portanto se deveria reservar para a espinha tibial interna, que é o verdadeiro pivô mecânico do joelho. Quanto ao sis-
--------.-.---
terna dos ligamentos cruzaqos, parece maIS
apropriado o termo união central.
Esta transformação das superfícies articulares é mais fácil' de entender quando se utiliza corno exemplo um m!Jdelo mecânico (ver o modelo lU no final do volume).
Se pegarmos duas peças (fig. 2-39), uma
superior que apresenta urna fenda e outra inferior, com uma espiga de tamanho e medidas inferiores à fenda, as duas peças podem deslizarse com facilidade uma sobre a outra, mas não
podem girar uma com relação à outra.
Se eliminarmos as duas extremidades da
espiga da peça inferior para que permaneça somente a sua parte central, cujos diâmetros não
excedem o comprimento da fenda (fig. 2-40), se
substitui a espiga por um pivô cilíndrico, capaz
de ser encaixado na fenda da peça superior.
Então (fig. 2-41), as duas peças são capazes
de realizar dois tipos de movimento, uma em relação à outra:
- um movimento de deslizamento da espiga central ao longo da fenda, que corresponde à fiexão-extensão;
- um movimento de rotação da espiga no
interior da fenda (seja qual for a posição
na fenda), que corresponde à rotação ao
redor do eixo longitudinal da perna.
2. MEl\IBRO INFERIOR
Fig.2-37 ;
Fig.2-38
Fig.2-39
Fig.2-41
Fig.2-40
89
90 FISIOLOGIA ARTICULAR
PERFIL DOS CÔNDILOS E DAS GLENÓIDES
Vistos pela sua face inferior (fig. 2-42), os
côndilos formam duas proeminências convexas
em ambas as direções e alongadas de diante para
trás. Os côndilos não são estritamente idênticos:
seus grandes eixos ântero-posteriores não são paralelos, mas sim divergentes para trás; além disso,
o côndilo interno (I) diverge mais que o externo
(E) e também é mais estreito. Entre a tróclea e os
côndilos se perfila, de cada lado, a fenda côndilotrodear (r), a interna normalmente mais marcada
que a externa.
A incisura intercondiliana (e) está no eixo
da garganta trodear (g). A face externa da tróclea
é mais proeminente do que a interna.
Num corte frontal (fig. 2-43) nota-se que a
convexidade dos côndilos em sentido transversal
corresponde à concavidade das glenóides.
Para analisar as curvaturas dos côndilos e
das glenóides no plano sagital, é conveniente realizar um corte vértico-sagital nas direções aa' e
bb' (fig. 2-43); de forma que se consegue o perfil
exato dos côndilos e das glenóides sobre o osso
fresco (figs. 2-45 a 2-48). Então, torna-se evidente que o raio da curvatura das superfícies condilianas não é uniforme, mas sim que sofre variações
como se fosse uma espiral.
Em geometria, a espiral de Arquimedes (fig.
2-44) está construída ao redor de um pequeno
ponto denominado centro (C), e cada vez que o
raio R descreve um ângulo igual, aumenta o seu
comprimento na mesma medida.
A espiral dos côndilos é muito diferente; é
verdade que o raio da curvatura cresce regularmente de trás para diante, que varia de 17 a 38 mm
no caso do côndilo interno (fig. 2-45) e de 12 a
60 mm no caso do côndilo externo (fig. 2-46), porém não existe um centro único nesta espiral, exis-
te uma série de centros dispostos, por sua vez, sobre outra espiral mm' (côndilo interno) e nn'
(côndilo externo). Portanto, a curvatura dos côndiIas é uma espiral de espiral, como demonstrou
Fick que denominou curvatura voluta à espiral
dos centros da curvatura.
Por outro lado, a partir de um certo ponto t
do contorno condiliano, o raio da curvatura começa a diminuir, de forma que passa de 38 a 15 mm
pela frente do côndilo interno (fig. 2-45) e de 60 a
16 mm pela frente do côndilo externo (fig. 2-46).
Novamente, os centros da curvatura se alinham
numa espiral m'm" (côndilo interno) e n'n" (côndilo externo). No total, as linhas dos centros da
curvatura fonnam duas espirais juntas, cuja cúspide muito aguda (m' e n') corresponde sobre o
côndilo ao ponto t de transição entre dois segmen-
tos do contorno condiliano:
- atrás do ponto t, a parte do côndilo forma parte da articulação fêmoro-tibial;
- adiante do 'ponto t, a parte do côndilo e
da tróclea formam parte da articulação
fêmoro-patelar.
Portanto, o ponto de transição t representa
o ponto mais adiantado do contorno condiliano
que pode entrar diretamente em contato com a superfície tibial.
O perfil ântero-posterior das glenóides
(figs. 2-47 e 2-48) é diferente segundo a glenóide
de que se trate:
- a glenóide interna (fig. 2-47) é côncava
para cima (o centro da curvatura O está
situado acima) como um raio de curvatura de 80 mm;
- a glenóide externa (fig. 2-48) é convexa
para cima (o centro da curvatura O' está
situado para baixo) como um raio de curvatura de 70 mm.
Enquanto a glenóide interna é côncava nos
dois sentidos, a externa é côncava transversalmente e convexa sagitalmente (no osso fresco). O
resultado desta afirmação é que se o côndilo femoral interno é relativamente estável na sua glenóide,
o côndilo externo está numa posição instável sobre a lombada da glenóide externa e a sua estabilidade durante o movimento depende essencialmente da integridade do ligamento cruzado ântero-externo (LCAE).
Por outra parte, os raios da curvatura
côndilos e das glenóides correspondentes não
iguais, portanto existe uma certa discordância
tre as superfícies articulares: a articulação
dos
são
en-
do
joelho é uma verdadeira imagem das articulações
não concordantes. O restabelecimento da concordância depende dos meniscos (ver pág. 102).
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Fig.2-42
Fig.2-44
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Fig.2-43
Fig.2-48
Fig.2-47
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92 FISIOLOGIA ARTICULAR
DETERMINISMO DO PERFIL CÔNDILO- TROCLEAR
Utilizando um modelo mecânico (fig. 2-49),
em 1967, foi demonstrado (Kapandji) que o contorno da tróc1ea e os côndilos femorais estão determinados corno lugares geométricos que dependem, por uma parte, das relações estabelecidas entre os ligamentos cruzados e suas bases de inserção na tíbia e no fêmur e, por outra parte, das relações existentes entre o ligamento patelar, a pateIa e as asas patelares (ver modelo li ao final do volume). Quando movemos um modelo deste tipo
(fig. 2-50), podemos ver o desenho do perfil dos
côndilos femorais e da tróc1ea como se fosse a
parte envolvente das posições sucessivas das glenóides tibiais e da patela (fig. 2-51).
A parte póstero-tibial do contorno côndilotroclear (fig. 2-51) se determina pelas posições
sucessivas, numeradas de 1 a 5 (além de todas as
intennédias), do platô tibial, "submetidas" ao fêmur pelo ligamento cruzado ântero-externo
(LCAE) (traços pequenos) e o ligamento cruzado póstero-interno (LCPI) (grandes traços), cada um deles descrevendo um arco de círculo centrado pela sua inserção femoral, de raio igual ao
seu comprimento; note-se que numa flexão máxima, a abertura anterior da interlinha fêmoro-tibial
demonstra a "distensão" do LCAE no final da flexão, enquanto o LCPI está contraído.
A parte anterior patelar do contorno côndilo-troc1ear (fig. 2-52) está determinada pelas
posições sucessivas, numeradas de 1 a 6 (e todas
as intermédias), da patela, unidas ao fêmur pelas
asas patelares e à tíbia pelo ligamento patelar.
Entre a parte anterior patelar e a parte posterior tibial do perfil côndilo-troc1ear existe um
ponto de transição t (figs. 2-45 e 2-46) que representa a fronteira entre a articulação fêmoropatelar e a articulação fêmoro-tibial.
Modificando as relações geométricas do
sistema dos ligamentos cruzados, é possível tra-
çar uma família de curvaturas dos côndilos e da
tróclea, a qual demonstra a "personalidade" de
cada joelho: nenhuma se parece com a outra no
plano estritamente geométrico, daí a dificuldade
em se colocarem próteses especificamente adaptadas a cada uma delas: elas somente podem ser
uma aproximação relativamente ,fiel.
A mesma dificuldade se apresenta no caso
das pIastias ou das próteses ligamentares, por
exemplo (fig. 2:53), se a inserção tibial do
LCAE se desloca para diante, o círculo descrito
pela sua inserção feinoral vai deslocar-se também para diante (fig. 2-54), o que vai induzir um
novo perfil condiliano, no interior do que estava antes, determinando por sua vez a aparição de
umjogo mecânico que seria um fator de desgaste das superfícies cartilaginosas.
Mais tarde, em 1978, A. Menschik, de Viena, realizou a mesma demonstração com meios
puramente geométricos.
Evidentemente, toda esta teoria do determinismo geométrico do perfil côndilo-troc1ear se
baseia na hipótese da isometria, isto é, da invariabilidade do comprimento dos ligamentos cruzados, da qual se sabe atualmente (ver abaixo)
que não está confirmada pelos fatos. Isso não
significa que não explique corretamente as COllStatações e possa servir de guia no conceito das
operações sobre os ligamentos cruzados.
Mais recentemente, P. Frain e cols., utilizando um modelo matemático baseado no estudo anatômÍco de 20 joelhos, confirmaram a noção de curvatura-envolvente e de policentrismo
dos movimentos instantâneos, insistindo nas
constantes inter-relações funcionais dos ligamentos cruzados e laterais. O traçado dos vetares de velocidade em cada ponto de contato fêmoro-tibial, feito por computador, reproduz exatamente a envolvente do contorno condiliano.
2. MEMBRO INFERIOR
Fig.2-50
Fig.2-52
Fig.2-54
93
94
FISIOLOGIA
ARTICULAR
OS MOVIMENTOS
DOS CÔNDILOS SOBRE AS GLENÓIDES
NA FLEXÃO-EXTENSÃO
A forma arredondada dos côndilos poderia fazer pensar que eles rolam sobre as superfícies tibiais; esta é uma opinião errônea. De fato, quando
uma roda gira sem resvalar no chão (fig. 2-55) a
cada ponto do chão corresponde só um ponto da
roda; a distância percorrida no chão (OOU) é, portanto, exatamente igual à parte da circunferência
"desenvolvida" no chão (compreendida entre a referência triangular e o retângulo). Se fosse assim
(fig. 2-56), a partir de certo grau de flexão (posição
II), o côndilo bascularia para trás da glenóide produzindo uma luxação - ou então seria necessário que o platô tibial fosse mais longo. A possibilidade de um rolamento puro não seria possível
dado que o desenvolvimento do côndilo é duas vezes maior do que o comprimento da glenóide.
nenhuma, que o côndilo roda e resvala sobre a glenóide simultaneamente. De fato, esta é a única maneira de se evitar a luxação posterior do côndilo permitindo simultaneamente uma flexão máxima (160°:
comparar a flexão nas figs. 2-58 e 2-60).
Supondo agora que a roda resvale sem rolar
(fig. 2-57): toda uma porção de circunferência da
roda corresponderia a um só ponto no chão. É o
que acontece quando uma roda "derrapa" ao deslizar-se sobre uma superfície gelada. Tal deslizamento puro é concebível para ilustrar (fig. 2-58) os
movimentos do côndilo na glenóide: todos os pontos do contorno condiliano corresponderiam a um
único ponto na glenóide; porém se pode constatar
que, deste modo, ajlexão ficaria limitada prematuramente, visto que a margem posterior da glenóide
(seta) representa um obstáculo.
Finalmente, o comprimento do rolamento puro, no início da flexão, é diferente segundo o côndilo considerado:
Também é possível imaginar que a roda gire
e resvale ao mesmo tempo (fig. 2-59): ela derrapa, porém avança. Neste caso, à distância-percorrida no chão (00') corresponde um maior comprimento na roda (entre o losango e o triângulo pretos) que se pode apreciar desenvolvendo-a no chão
(entre o losango preto e o triângulo branco).
Em 1836 a experiência dos irmãos Weber
(fig.2-60) demonstrou que, na realidade, as coisas
ocorriam da seguinte maneira: em várias posições
entre a flexão e a extensão máximas, eles marcaram
os pontos de contato entre o côndilo e a glenóide na
cartilagem. Desta forma, puderam constatar que o
ponto de contato na tlôia recuava com a jlexão
(triângulo preto: extensão - losango preto: flexão)
e, por outra parte, que a distância entre os pontos de
contato marcados no côndilo era duas vezes maior
que a que separava os pontos de contato da glenóide.
Portanto, esta experiência demonstra, sem dúvida
(Estas experiências podem ser Feproduzidas
com o modelo m incluído no final do volume.)
Experiências mais recentes (Strasse, 1917)
demonstraram que a proporção de rolamento e de
deslizamento não era a mesma durante todo o movimento de flexão-extensão: a partir de uma extensão máxima, o côndilo começa a rolar sem resvalar e depois o deslizamento começa progressivamente a predominar sobre o rolamento, de maneira que no fim dajlexão o côndilo resvala sem rolar.
- no caso do côndilo interno (fig. 2-61) este
rolamento ocorre apenas nos primeiros 10
a 15 graus de flexão;
- no caso do côndilo externo (fig. 2-62) o rolamento prossegue até os 20° de flexão.
Isto significa que o côndilo externo rola
muito mais que o côndilo interno, o que explica,
em parte, que o caminho que ele percorre sobre a
glenóide seja mais longo que o percorrido pelo interno. Voltaremos a esta noção importante para explicar a rotação automática (ver pág. 154).
Por outro lado, também é interessante notar
que estes 15 a 20° de rolamento inicial correspondem à amplitude habitual dos movimentos de jlexãoextensão que se realizam durante a marcha normal.
P. Frain e cols. demonstraram que em cada
ponto da curvatura condiliana pode ser definido,
por uma parte, o centro do círculo basculante, que
representa o centro da curvatura condiliana neste
ponto e, por outra parte, o centro do movimento,
que representa o ponto ao redor do qual o fêmur gira com relação à tíbia; somente quando estes dois
pontos se confundem existe um rolamento puro, ou
então a proporção de deslizamento com relação ao
rolamento é mais importante quanto mais afastado
o centro instantâneo esteja do movimento do centro da curvatura.
2. MEMBRO INFERIOR 95
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Fig.2-60
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96
FISIOLOGIA ARTICULAR
OS MOVIMENTOS DOS CÔNDILOS SOBRE AS GLENÓIDES
NOS MOVIMENTOS DE ROTAÇÃO AXIAL
Mais adiante veremos por que os movimentos de rotação axial só podem ser realizados
quando o joelho está fiexionado. Em posição de
rotação neutra (fig. 2-63), joelho fiexionado, a
parte posterior dos côndilos entra em contato
com a parte central das glenóides. Este fato é
posto em evidência pelo diagrama (fig. 2-64), no
qual a silhueta dos côndilos se superpõe por
transparência sobre o contorno tracejado das
glenóides tibiais. Também se pode constatar
neste esquema que a fiexão do joelho separou o
maciço das espinhas tibiais do fundo da incisura
intercondiliana, onde está encaixada durante a
extensão (esta é uma das causas do bloqueio da
rotação axial em extensão).
Durante a rotação externa da tíbia sobre o
fêmur (fig. 2-65), o côndilo externo avança sobre a glenóide externa, enquanto o côndilo interno recua na glenóide interna (fig. 2-66).
Durante a rotação interna (fig. 2-67) produz-se o fenômeno inverso: o côndilo externo
recua na sua glenóide, enquanto o interno avança na sua própria (fig. 2-68).
Os movimentos ântero-posteriores do
côndilos nas suas glenóides correspondentes
não são totalmente semelhantes:
-
o côndilo interno (fig. 2-69) se desloca
relativamente pouco na concavidade da
glenóide interna (1);
-
o côndilo externo (fig. 2-70) pelo contrário, possui um trajeto (L) quase duas
vezes maior sobre a convexidade da glenóide externa. Durante o seu deslocamento na glenóide de diante para trás,
"ascende" primeiro na vertente anterior,
até o vértice da "lombada", e depois
desce novamente sobre a vertente posterior; de forma que muda de "altura" (e).
A diferença de forma entre as duas glenóides repercute na forma das espinhas tibiais
(fig. 2-71). Quando se realiza um corte horizontal XX' do maciço das espinhas, pode-se
constatar que a face externa da espinha externa
é convexa de diante para trás (como a glenóide
externa), enquanto a face interna da glenóide
interna é côncava (como a glenóide interna).
Se a isto juntamos que a espinha interna é nitidamente mais alta do que a externa, se pode
compreender que a espinha interna forme uma
espécie de ressalto sobre o qual o côndilo interno vai embater, enquanto o côndilo externo
contorna a espinha externa. Por conseguinte, o
eixo real da rotação axial não passa entre as
duas espinhas tibiais, mas sim, no nível da
vertente articular da espinha interna que
forma o verdadeiro pivô central. Este deslocamento para dentro se traduz, justamente, por
um trajeto maior do côndilo externo, como vimos anteriormente.
2 . .\IEtvillRO INFERIOR
Fig.2-65
Fig.2-63
Fig.2-68
Fig.2-64
Fig.2-66
e
Fig.2-69
Fig.2-71
Fig.2-70
97
98
FISIOLOGIA ARTICULAR
A CÁPSULA ARTICULAR
A cápsula articular é uma bainha fibrosa
que contorna a extremidade inferior do fêmur e
a extremidade superior da tíbia, mantendo-as em
contato entre si e formando as paredes não ósseas da cavidade articular. Na sua camada mais
profunda está recoberta pela sinovial.
A forma geral da cápsula do joelho
(fig. 2-72) pode ser entendida facilmente se for
comparada com um cilindro ao qual se deprime
a face posterior segundo uma geratriz (a seta
indica este movimento). Assim se forma um
septo sagital cujas estreitas relações com os ligamentos cruzados serão tratadas mais adiante
(ver pág. 126) e que quase divide a cavidade
articular em duas metades, externa e interna.
Na face anterior deste cilindro se abre umajanela, na qual vai "inserir-se" a patela. As margens do cilindro se inserem no fêmur na parte
de cima e na tíbia na parte de baixo.
A inserção sobre o platô tibial é relativamente simples (fig. 2-73): passa (linha de pontos)
para diante e para os lados externo e interno das
superfícies articulares; a inserção retroglenóide
interna se une com a inserção tibial do LCPI;
quanto à linha retroglenóide externa, contorna a
glenóide externa no nível da superfície retroespinhal e se funde de novo com a inserção tibial
do LCPI. Entre os dois ligamentos cruzados, a
cápsula é interrompida e a fenda interligamentar
fica ocupada pela sinovial que recobre os dois ligamentos cruzados; portanto, eles podem ser
considerados como espessamentos da cápsula articular na incisura intercondiliana.
A inserção femoral da cápsula (figs. 2-74 a
2-77) é um pouco mais complexa:
-
pela frente (fig. 2-74), ela contorna a
fosseta supratroc1ear (Fs) por cima; neste local a cápsula forma um profundo
fundo de saco (figs. 2-76 e 2-77), o fundo de saco subquadricipital (Fsq), cuja
importância veremos mais adiante (ver
pág. 108).
-
dos lados (figs. 2-74 e 2-75), a inserção
capsular segue ao longo das faces articulares da tróc1ea, onde forma os fundos
de saco látero-patelares (ver pág. 108),
para depois percorrer a certa distância o
limite cartilaginoso dos côndilos, em
cujas superfícies cutâneas desenha as
rampas capsulares de Chevrier (Rch);
no côndilq externo, a inserção capsular
passa por cima da fosse ta onde se fixa o
tendão do poplíteo (Pop), a inserção
deste músculo é, assim, intracapsular
(figs. 2-147 e 2-232);
-
atrás e em cima (fig. 2-75), a linha de
inserção capsular contorna a margem
póstero-superior da cartilagem condiliana, justamente debaixo da inserção
dos gêmeos (Oe); a cápsula recobre a
face profunda destes músculos, separando-os dos côndilos, neste nível tem
maior espessura e forma as calotas condilianas (Cco) (ver pág. 120);
-
na incisura intercondiliana (figs. 2-76
e 2-77, com o fêmur serrado no plano
sagital), a cápsula se fixa na face axial
dos côndilos em contato com a cartilagem, e no fundo da incisura, de modo
que passa de um lado ao outro da cartilagem. Na face axial do côndilo interno
(fig. 2-76), a inserção capsular passa pela inserção femoral do ligamento cruzado póstero-interno
(LCPI). Na face
axial do côndilo externo (fig. 2-77), a
cápsula se fixa com a inserção femoral
do cruzado ântero-externo (LCAE).
Também neste caso, a inserção dos cruzados se confunde praticamente com a da cápsula,
constituindo os reforços da cápsula.
2. MEMBRO INFERIOR
Rch
Fig.2-75
Fig.2-74
Fig.2-76
Fig.2-73
99
100
FISIOLOGIA ARTICULAR
o LIGAMENTO
ADIPOSO, AS PREGAS, A CAPACIDADE ARTICULAR
Entre a superfície pré-espinhal do platá tibial, a face posterior do ligamento menisco-patelar e a parte inferior da tróc1ea femoral existe um
espaço morto (fig. 2-78), ocupado pelo corpo adiposo do joelho equivalente a uma faixa volumosa
de gordura. Este corpo adiposo (1) tem a forma de
uma pirâmide quadrangular, cuja base repousa na
face posterior (2) do ligamento menisco-patelar
(3) e sobressai da parte anterior da superfície préespinhal. Sua face superior (4) é reforçada por um
cordão celular adiposo que se estende do ápice da
pate1a ao fundo da incisura intercondiliana (figs.
2-78 e 2-79): é o ligamento adiposo (5). Aos lados
(fig. 2-79, o joelho está aberto pela frente e a patela está separada), o corpo adiposo se prolonga
para cima ao longo da metade inferior das margens laterais da pate1a por estruturas adiposas: as
pregas alares (6). O corpo adiposo age como "tapulho" na parte anterior da articulação; na flexão,
ele fica comprimido pelo ligamento patelar e sobressai em cada lado da ponta da pate1a.
O ligamento adiposo é o vestígio do septo
médio, que no embrião divide em dois a articulação até a idade de quatro meses. No adulto existe
normalmente (fig. 2-78) um hiato entre o ligamento adiposo e o septo médio formado pelos ligamentos cruzados (seta I). As metades externa e interna da articulação se comunicam através deste
hiato e também por um espaço situado acima do
ligamento (seta li) e atrás da pate1a. Às vezes, o
septo médio persiste no adulto e a comunicação só
se estabelece acima do ligamento adiposo.
Esta formação também se denomina plica
infrapatellaris ou ligamento mucoso. O sistema
das plicae (plural do latim plica) é composto (fig.
2-83) de três pregas sinoviais, inconstantes porém
muito freqüentes: segundo Dupont, presentes em
85% dos joelhos. Na atualidade, são bem conhecidos graças à artroscopia:
- aplica infrapatellaris (Pif), que prolonga o corpo adiposo infrapatelar, existe em
65,5% dos casos;
-
aplica suprapatellaris (Psp), em 55%
dos casos; forma um septo transversal
mais ou menos completo, acima da pate-
Ia, podendo separar o fundo de saco
subquadricipital da cavidade articular; ela
só é patológica quando obstrui completamente o fundo de saco, provocando um
quadro de "hidrartrose suspensa".
- aplica mediopatellaris (Pmp) existe em
24% dos casos; pode formar um septo incompleto, estendido horizontalmente da
margem interna da pate1a até o fêmur, como uma "prateleira" (shelf dos autores
americanos). Ela pode provocar dor
quando a sua margem livre irrita, por atrito, a margem interna do côndilo interno.
Os problemas cessam imediatamente
com a ressecção artroscópica.
A capacidade articular apresenta variações
de importância, tanto normais quanto patológicas.
Um derrame patológico - hidrartrose ou hemartrose - pode aumentá-Ia consideravelmente (fig.
2-80), sempre que o derrame seja progressivo; o
líquido se acumula nos fundos de saco sub-quadricipitais (Fsq) e látero-patelares, assim como atrás
e abaixo das calotas condilianas, nos fundos de sacos retrocondilianos (Frc). Segundo a posição do
joelho, a distribuição do líquido varia: na extensão (fig. 2-81), os fundos de sacos retrocondilianos estão comprimidos pelos gêmeos em tensão e
o líquido se desloca para diante acumulando-se
nos fundos de sacos subquadricipital e látero-patelares; na flexão (fig. 2-82), são os fundos de sacos
anteriores os que estão comprimidos pelo quadríceps em tensão e o líquido se desloca para trás.
Entre a flexão e a extensão máximas, existe uma
posição denominada "capacidade máxima" (fig.
2-80), na qual a pressão do líquido intra-articular
é menor: é a posição de semiflexão que adotam, de
forma espontânea, os pacientes com derrame articular, porque ela é a menos dolorosa.
Em condições normais, a quantidade de líquido sinovial - ou sinóvia - é escassa (apenas
alguns centímetros cúbicos). Contudo, os movimentos de flexão-extensão asseguram a limpeza
permanente das superfícies articulares pela sinóvia, o que contribui para a boa nutrição da cartilagem e, principalmente, para a lubrificação das zonas de contato.
2. MEMBRO INFERIOR 101
LCAE
5
1
3
2
Fig.2-79
Fig.2-78
Fsq
Psp
Frc
Pmp
Pif
Fig.2-83
Fig.2-82
102 FISIOLOGIA
ARTICULAR
OS MENISCOS INTERARTICULARES
-
o como posterior do menisco interno
(7), no ângulo póstero-interno da superfície retroespinhal;
o como anterior do mesmo menisco
(6), no ângulo ântero-interno da superfície pré-espinhal;
A não concordância das superfícies articulares (ver pág. 90) se compensa pela interposição dos
meniscos ou fibrocartilagens semilunares, cuja
forma é fácil de compreender (fig. 2-84): quando
uma esfera (E) é colocada sobre um plano (P), ela
só entra em contato com o plano através do ponto
tangencial. Se queremos aumentar a superfície de
contato entre ambas, é suficiente interpor um anel
que represente o volume compreendido entre o plano, a esfera e o cilindro (C) tangencial à esfera. Este anel (espaço de cor cinza) tem a mesma forma de
um menisco, triangular quando é seccionado, com
suas três faces (fig. 2-85, os meniscos foram deslocados para cima das glenóides):
-
os dois cornos anteriores se unem pelo
ligamento jugal (8) ou transverso, fixado à pa.tela através dos tratos do corpo
adiposo;
-
as asas menisco-patelares (9), fibras que
se estendem de ambas as margens da pateIa (P) até as faces laterais dos meniscos;
- superior (1) côncava, em contato com os
côndilos;
-
- periférica (2) cilíndrica, sobre a qual se fixa a cápsula (representada pelos traços
verticais) pela sua face profunda;
o ligamento lateral interno (LU) fixa as
suas fibras mais posteriores na margem interna do menisco interno;
-
pelo contrário, o ligamento lateral externo
(LLE) está separado de seu menisco pelo
tendão do mÚsculo poplíteo (Pop), que envia uma expansão fibrosa (10) à margem
posterior do menisco externo; formando o
que alguns denominam o ponto do ângulo póstero-externo ou PAPE e que descreveremos mais adiante quando tratarmos das defesas periféricas do joelho;
-
o tendão do semimembranoso (11) também envia uma expansão fibrosa à margem posterior do menisco (nterno: formando simetricamente o ponto do ângulo póstero-interno ou PAPI;
-
finalmente, diferentes fibras do ligamento cruzado póstero-interno se fixam no
como posterior do menisco externo para
formar o ligamento menisco-femoral
(12). Também existem fibras do ligamento cruzado ântero-externo que se fixam
no corno anterior do menisco interno
(fig. 2-152).
-
-
inferior (3) quase plana, situada na periferia da glenóide interna (GI) e da glenóide
externa (GE).
Estes anéis estão interrompidos ao nível das
espinhas tibiais com uma forma de uma meia-lua,
com um como anterior e outro posterior. Os cornos do menisco externo estão mais próximos entre
si que os do interno, além disso, o menisco externo forma um anel quase completo - tem a forma
de O - enquanto o interno se parece mais com
uma meia-lua - tem a forma de C -. Como norma mnemônica é simples usar a palavra CItrOEn,
para lembrar a forma dos meniscos.
Os meniscos não estão livres entre as duas
superfícies articulares, mas mantêm conexões muito importantes do ponto de vista funcional:
-
já vimos a inserção da cápsula (fig. 2-86)
na face periférica;
-
cada um dos cornos se fixa no platô tibial,
no nível da superfície pré-espinhal (cornos anteriores) e retroespinhal (cornos
posteriores):
- o como anterior do menisco externo
(4), pela frente da espinha externa;
-
o como posterior do mesmo menisco
(5), por trás da espinha externa;
Os cortes frontais (fig. 2-86) e sagitais internos (fig. 2-87) e externos (fig. 2-88) mostram como os meniscos se interpõem entre os côndilos e
as glenóides, exceto no centro de cada glenóide e
nas espinhas tibiais, e corno os meniscos limitam
dois espaços na articulação: o espaço suprameniscal e o espaço submeniscal (fig. 2-86).
2. MEMBRO INFERIOR 103
p
2
6
4
LU
7
GI
Fig.2-87
5
Fig.2-85
Fig.2-86
Fig.2-84
Fig.2-88
104
FISIOLOGIA ARTICULAR
OS DESLOCAMENTOS DOS MENISCOS NA FLEXÃO-EXTENSÃO
Vimos (pág. 94) anteriormente que o ponto de
contato entre os côndilos e as glenóides recua sobre
as glenóides no caso da fiexão e avança no caso da
extensão; os meniscos seguem este movimento, como
se pode constatar perfeitamente numa preparação
anatômica na qual se conservaram apenas os ligamentos e os meniscos. Em extensão (fig. 2-89), a parte posterior das glenóides está descoberta, principalmente a glenóide externa (GE). Emflexão (fig. 2-90),
os meniscos (Me e Mi) cobrem a parte posterior da
glenóide, principalmente o menisco externo que desce pela vertente posterior da glenóide externa.
Uma vista superior dos meniscos sobre as glenóides mostra que a partir da posição de extensão
(fig. 2-91), os meniscos recuam de maneira desigual:
na fiexão (fig. 2-92), o menisco externo (Me) recua
duas vezes mais do que o interno. De fato, o trajeto
do menisco interno é de 6 mm, enquanto o do externo é de 12 mm.
Os esquemas mostram, além disso, que, ao
mesmo tempo que recuam, os meniscos se deformam. Isto se deve a que eles têm dois pontos fixos, os
seus comos, enquanto o remanescente é móvel. O
menisco extemo se deforma e se desloca mais do que
o intemo, visto que as inserções de seus comos estão mais próximas.
Certamente, os meniscos desempenham um papel importante como meios de união elásticos transmissores das forças de compressão entre a tíbia e o
fêmur (setas pretas, figs. 2-94 e 2-95): é necessário
destacar que, na extensão, os côndilos têm o seu raio
de curvatura maior nas glenóides (fig. 2-93) e os meniscos estão peifeitamente intercalados entre as superfícies articulares. Estes dois elementos favorecem
a transmissão das forças de compressão durante a
extensão máxima do joelho. Contudo, no caso da fiexão, os côndilos têm o seu menor raio de curvatura
nas glenóides (fig. 2-96) e os meniscos perdem parcialmente o contato com os côndilos (fig. 2-98): estes dois elementos, junto com a distensão dos ligamentos laterais (ver pág. 114), favorecem a mobilidade em detrimento da estabilidade.
Depois de ter definido os movimentos dos meniscos, vão-se expor os fatores que intervêm neles.
Podem-se classificar em dois grupos: os fatores passivos e os ativos.
Só existe um fator passivo do movimento de
translação dos meniscos: os côndilos empurram os
meniscos para diante, como um caroço de cereja que
foge entre dois dedos. Este mecanismo, que pode pa-
recer muito simples, é muito evidente quando se mobiliza uma preparação anatômica na qual foram eliminadas todas as conexões dos meniscos, exceto as
inserções dos cornos (figs. 2-89 e 2-90): as superfícies são muito deslizantes e a "esquina" do menisco
é expulsa entre a "roda" do côndilo e a "base" da glenóide (portanto, se trata de uma cunha completamente ineficaz).
Os fatores ativos são numerosos:
-
durante..a extensão (figs. 2-94 e 2-95), os
meniscos se deslocam para diante graças às
asas meniscQ-patelares (1) tensas pelo ascenso da patela (ver pág. 112), que arrasta
também o ligamento jugal. Além disso, o
corno posterior do menisco externo (fig. 295) é impulsionado para diante devido à tensão do ligamento menisco-femoral (2), simultânea à tensão do ligamento cruzado
póstero-interno (ver pág. 134);
- durante a ftexão:
-
-
o menisco intemo (fig. 2-97) é impulsionado para trás pela expansão do semimembranoso (3), que se insere na sua
margem posterior, enquanto o como anterior é impulsionado pelas fibras do ligamento cruzado ântero-extemo (4) que se
dirigem até ele;
o menisco extemo (fig. 2-98) é impulsionado para trás pela expansão do poplíteo (5).
A função de articulação de transmissão de forças
de compressão entre o fêmur e a tíbia foi subestimada
até que os primeiros pacientes submetidos a uma meniscectomia "de princípio" começaram a sofrer artrose
antes da idade habitual, em comparação com os pacientes que não foram operados de meniscectomia. A
chegada da artroscopia supõe um grande progresso,
visto que, por uma parte, permitiu conhecer melhor as
lesões meniscais duvidosas naartrografia, ou os falsopositivos, que derivavam numa meniscectomia "à-toa"
(na qual se removia o menisco para ver se estava lesado!), e, por outra parte, fez possível a meniscectomia
"à Ia carte", na qual se extirpa apenas a parte lesada do
menisco que provoca a alteração mecânica e que pode
ser causa de uma lesão das superfícies carti1aginosas.
Também permite entender que a lesão meniscal é somente uma parte do diagnóstico, visto que com muita
freqüência a lesão ligamentar é a que produz ao mesmo tempo a lesão menisca1 e a lesão carti1aginosa.
1-
2. MEMBRO INFERIOR
LU
I.J
I.
"J
I ••
\/11.
~v·
LCPI
LCAE
GE
LCAE
LLE
MI~\\~
Fig.2-90
Fig.2-89
Mi
Fig.2-91
Fig.2-92
~/
Fig.2-96
Fig.2-93
Fig.2-97
Fig.2-94
Fig.2-95
Fig.2-98
105
106
FISIOLOGIA ARTICULAR
OS DESLOCAMENTOS DOS MENISCOS NA ROTAÇÃO AXIAL.
LESÕES MENISCAIS
Durante os movimentos de rotação axial,
os meniscos seguem exatamente os deslocamentos dos côndilos sobre as glenóides (ver
pág. 96). A partir da sua posição em rotação
neutra (fig. 2-99), se pode observar como seguem caminhos opostos sobre as glenóides:
-
durante a rotação externa (fig. 2-100)
da tíbia sobre o fêmur, o menisco externo (Me) é puxado para frente (1) da glenóide externa, enquanto o menisco interno (Mi) se dirige para trás (2);
-
durante a rotação interna (fig. 2-101),
o menisco interno (Mi) avança (3), enquanto o externo (Me) recua (4).
Também neste caso, os meniscos se deslocam ao mesmo tempo que se deformam, em volta dos seus pontos fixos, as inserções dos cornos.
A amplitude total do deslocamento do menisco
externo é duas vezes maior do que a do menisco
interno.
Os deslocamentos meniscais na rotação
axial são, principalmente, passivos - arrastados
pelos côndilos -; contudo, também existe um
fator ativo: a tensão da asa menisco-patelar, devido ao deslocamento da patela com relação à tíbia (ver pág. 112); esta tração arrasta um dos
meniscos para frente.
Os movimentos do joelho podem ocasionar lesões meniscais quando estes não seguem
os deslocamentos dos côndilos sobre as glenóides; assim, eles são "surpreendidos" em posição anormal e terminam "esmagados entre a bigorna e o martelo". É o caso, por exemplo, de
um movimento de extensão brusca do joelho
(como um pontapé numa bola): não há tempo
para que um dos meniscos se desloque para
frente (fig. 2-102), de forma que, quanto mais
forte se estenda o joelho, mais o menisco ficará
entalado entre o côndilo e a glenóide. Este me-
canismo, muito freqüente nos jogadores de futebol, explica (fig. 2-107) as rupturas transversais (a) ou as desinserções do corno anterior
(b), que se dobra como "um canto de um cartão
de visita". O outro mecanismo de lesões meniscais se deve à distorção do joelho associando
(fig. 2-103) um movimento de lateralidade externa (1) e uma rotação externa (2); desta forma, o menisco interno é deslocado para o centro da articuláção, para baixo da convexidade
do côndilo interno, o esforço de endireitamento
lhe surpreende nesta posição e ele fica entalado
entre o côndilo e a glenóide, provocando uma
fissura longitudinal do menisco (fig. 2-104), ou
uma desinserção capsular total (fig. 2-105), ou,
inclusive, uma fissura complexa (fig. 2-106).
Em todas as lesões longitudinais citadas, a parte central livre do menisco pode ficar elevada
dentro da incisura intercondiliana, formando
um menisco em "alça de balde". Este tipo de lesão meniscal é muito freqüente nos jogadores
de futebol (durante as quedas sobre uma perna
dobrada) e nos mineiros que são obrigados a
trabalhar de cócoras nas galerias estreitas das
minas de carvão.
Outro mecanismo de lesão meniscal é a
ruptura de um ligamento cruzado, por exemplo
o LCAE (fig. 2-108). O côndilo interno não fica
forçosamente retido na parte posterior, se desloca "cisalhando" o corno posterior do menisco
interno, provocando uma desinserção capsular
posterior, ou uma fissura horizontal (ver o desenho pequeno).
A partir do momento no qual um menisco
se rompe, a parte lesada não segue os movimentos normais e se encaixa entre o côndilo e a glenóide; conseqüentemente, se produz um bloqueio do joelho numa posição de flexão mais
acentuada quanto mais posterior seja a lesão meniscal: a extensão completa torna-se impossível.
2. 1lEMBRO INFERIOR
Fig.2-100
Fig.2-99
Fig. 2-101
Fig.2-108
b
a
Fig.2-104
Fig.2-105
Fig.2-106
Fig.2-107
107
108 FISIOLOGIA ARTICLLAR
OS DESLOCAMENTOS DA PATELA SOBRE O FÊMUR
o aparelho extensor do joelho se desliza
sobre a extremidade inferior do fêmur como se
fosse uma corda numa polia (fig. 2-109, a). A
tróclea femoral e a incisura intercondiliana
(fig. 2-11 O) formam, de fato, um canal vertical
profundo (fig. 2-109, b), por onde a patela desliza. Desta forma, a força do quadríceps, dirigida obliquamente para cima e ligeiramente
para fora, se converte numa força estritamente vertical.
Portanto, o movimento normal da patela
sobre o fêmur durante a flexão é uma translação
vertical ao longo da garganta da tróclea e até a
incisura intercondiliana (fig. 2-111, segundo radiografias). Assim, o deslocamento da patela é
de duas vezes o seu comprimento (8 cm), sendo
realizado com um giro sobre um eixo transversal; de fato, sua face posterior, dirigida diretamente para trás em posição de extensão (A), se
orienta diretamente para cima quando a pate1a,
no fim do seu trajeto (B), se encaixa, na flexão
extrema, sob os côndilos. Por conseguinte, se
trata de uma translação circunferencial.
Este deslocamento tão importante só é possível porque a patela está unida ao fêmur por conexões com comprimento suficiente. A cápsula
articular forma três fundos de saco profundos ao
redor da patela (fig. 2-111): por cima, o fundo de
saco sllbquadricipital (Fsq) e, a cada lado, os
fundos de saco látero-patelares (Lp). Quando a
patela se desliza por baixo dos côndilos de A a
B, os três fundos de saco se abrem: graças à profundidade do fundos de saco sub-quadricipital, a
distância XX' pode transformar-se em XX" (ou
seja, quatro vezes mais); e graças à profundidade dos fundos de saco látero-patelares, a distância YY' pode transformar-se em YY" (ou seja,
duas vezes mais).
Quando a inflamação une as duas lâminas
dos fundos de saco, estes perdem toda sua profundidade e a patela fica aderida ao fêmur
(XX' e YY' se tornam inextensíveis) e não po-
de deslizar-se pelo seu canal: esta retração
capsular é uma das causas da rigidez do joelho
em extensão após traumatismos ou infecções.
Na sua "descida" a pate1a é acompanhada
pelo ligamento adiposo (fig. 2-112), que passa
da posição ZT à posição ZZ", modificando 1800
a sua orientação. Quando a pate1a "ascende", o
fundo de saco subquadricipital se encaixaria entre a patela e a tróclea, se algumas fibras separadas da face profunda do crural não lhe puxassem
para cima, e que fo.rmam o chamado músculo
subcrural (Msc) ou tensor do fundo de saco
subquadricipital.
Normalmente, a patela só se desloca de cima para baixo e não transversalmente. De fato,
a patela está muito bem encaixada (fig. 2-113)
na sua fenda pelo quadríceps, mais quanto maior
é a flexão (a); no fim da extensão (b), esta força
de coaptação diminui e em hiperextensão (c) inclusive tem a tendência a inverter-se, isto é, a
descolar a pate1a da tróclea. Neste momento (d),
tem tendência a deslocar-se para fora, porque o
tendão quadricipital e o ligamento menisco-patelar formam um ângulo obtuso aberto para fora. O que impede realmente a luxação da patela
para fora (fig. 2-114) é a face externa da tróclea
muito mais proeminente do que a interna (diferença = e). Se, devido a uma malformação congênita (fig. 2-115), a face externa está menos desenvolvida (igualou menos proeminente do que
a interna), a pate1a não está suficientemente fixada e se luxa para fora durante a extensão completa. Este é o mecanismo da luxação recidivante da pate/a.
A torção externa da tíbia debaixo do fêmur,
assim como o genu valgo, ao fechar o ângulo entre o tendão quadricipital e o ligamento menisco-patelar, aumentam o componente dirigido para fora e favorecem a instabilidade externa da
pate1a. Estes são fatores de luxação e de subluxação externas, de condromalacia patelar e de
artrose fêmoro-patelar externa.
~.I
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_~~IIZ
~ .••••.
t
Fig.2-112
...,
Z'
Fig.2-115
c
Fig.2-113
d
110 FISIOLOGIA ARTICULAR
AS LIGAÇÕES FÊMORO-PATELARES
A face posterior da patela (fig. 2-116) está envolvida por uma cartilagem muito espessa
(4 a 5 mm), principalmente no nível da crista
média: é a cartilagem de maior espessura de
todo o organismo. Isto pode ser explicado pelas
consideráveis pressões (300 kg, sem mencionar
os halterofilistas!) que se exercem neste nível
durante a contração do quadríceps sobre o joelho flexionado, por exemplo quando descemos
umas escadas ou quando ficamos de pé estando
agachados.
De um lado e do outro da crista média existem duas faces articulares côncavas em ambos
os sentidos:
-
a face externa, em contato com a superfície externa abaulada da tróclea;
-
a face interna, em contato com a superfície abaulada interna;
-
esta última face se subdivide, por uma
crista oblíqua pouco proeminente, numa
face principal e uma face acessória, situada no ângulo súpero-interno e que se
articula com a margem interna da incisura intercondiliana na flexão máxima.
Durante o seu deslocamento vertical ao
longo da tróclea quando se realiza uma flexão
(fig. 2-117), a patela entra em contato com a tróclea pela sua parte inferior em extensão máxima,
pela sua parte média em flexão de 30° e pela sua
parte superior e a face súpero-externa em flexão
máxima. Observando a topografia das lesões
cartilaginosas, é possível conhecer o ângulo crítico de flexão, e vice-versa, apontando o ângulo de flexão dolorosa para prever o surgimento
de lesões.
Até agora, as conexões da articulação fêmoro-patelar se constatavam por meio de radiografias denominadas "em incidência axial da patela" ou também "em incidência fêmoro-patelar", tomando a interlinha "em fileira" (fig. 2118): se abarcam as duas patelas na mesma placa, flexionando os joelhos a 30° (A), 60° (B) e
90° (C) sucessivamente, com a finalidade de explorar a articulação em toda sua extensão.
Estas radiografias em incidências fêmoropatelares permitem apreciar:
- o centrado da patela, principalmente na
radiografia com flexão de joelho a 30°
(A), por correspondência entre a crista
patelar e a garganta troclear, e pelo
transbordamento do ângulo externo da
patela com o limite da convexidade externa; este procedimento permite diagnosticar uma subluxação externa.
-
a diminuição da espessura da interlinha,
principalmente na sua parte externa, em
comparação com o lado supostamente
sadio e utilizando um compasso de pontas duras; nas artroses já "avançadas",
uma erosão cartilaginosa pode ser observada;
-
a densificação óssea subcondral na face
externa, que representa uma síndrome
de hiperpressão externa;
-
um deslocamento para fora da tuberosidade tibial anterior com relação à
garganta da tróclea; este sinal só pode
ser visto nas radiografias com flexão do
joelho de 30° (A) e de 60° (B); representa uma torção externa da tíbia para
baixo do fêmur nas subluxações e nas
hiperpressões externas.
Atualmente, graças ao escaner, cortes da
articulação fêmoro-patelar em máxima extensão e inclusive em hiperextensão podem ser realizados, o que era impossível com a radiografia;
isto permite observar a subluxação externa da
patela no momento em que a força de coaptação
é nula ou negativa, permitindo assim reconhecer
as instabilidades fêmoro-patelares menores.
Quanto à artroscopia, ela permite diagnosticar as lesões cartilaginosas fêmoro-patelares
que não aparecem nas radiografias em incidência axial e os desequilíbrios dinâmicos.
2. MEMBRO INFERIOR 111
Fig.2-116
Fig.2-117
Fig.2-118
112 FISIOLOGIA ARTICULAR
OS DESLOCAMENTOS DA PATELA SOBRE A TÍBIA
Pode-se-ia imaginar a patela aderi da à tíbia
para formar um olécrano (fig. 2-119) como no
cotovelo. Esta disposição impediria qualquer
movimento da pateIa sobre a tíbia e limitaria de
modo notável a sua mobilidade, impedindo
qualquer movimento de rotação axial.
De fato, a patela realiza dois tipos de movimento sobre a tíbia, dependendo se realiza flexão-extensão ou rotação axial.
Nos movimentos de flexão-extensão (fig.
2-120), a patela se desloca no plano sagital. A
partir da sua posição em extensão (A), ela recua
deslocando-se ao longo de um arco de circunferência cujo centro se situa na tuberosidade anterior da tíbia (O) e cujo raio é igual ao comprimento do ligamento menisco-patelar. Ao mesmo
tempo, bascula 35° sobre si mesma, de forma
que sua face posterior, orientada para trás, se
orienta para trás e para baixo durante a flexão
máxima (B). De modo que realiza um movimento de translação circunferencial, com relação à
tíbia. Este retrocesso da pateIa se deve a dois fatores: por um lado, o deslocamento para trás (D)
do ponto de contato dos côndilos nas glenóides
e, por outro, a redução da distância (R) da pateIa ao eixo de flexão-extensão (+).
Nos movimentos de rotação axial (figs.
2-121 a 2-123), os deslocamentos da patela
com respeito à tíbia se realizam no plano frontal. Em rotação neutra (fig. 2-121), a direção
do ligamento menisco-patelar é ligeiramente
oblíqua para baixo e para fora. Durante a rotação interna (fig. 2-122), o fêmur gira em rotação externa com relação à tíbia, deslocando a
patela para fora: o ligamento menisco-patelar
fica oblíquo para baixo e para dentro. Durante a
rotação externa (fig. 2-123), acontece o contrá-
rio; o fêmur arrasta a patela para dentro, de forma que o ligamento menisco-patelar fica oblíquo para baixo e para fora, porém mais oblíquo
para fora que na rotação neutra.
Conseqüentemente, os deslocamentos da
patela com relação à tíbia são indispensáveis
tanto para os, movimentos de fiexão-extensão
quanto para os de rotação axial.
Graças a um'modelo mecânico se demonstrou (ver modelo II ao final deste volume) que a
patela amolda a tróclea e o perfil anterior dos
côndilos. De fato, nos seus deslocamentos, a patela está unida à tíbia pelo ligamento meniscopatelar e ao fêmur pelas asas patelares (ver página seguinte). Quando os côndilos realizam seu
movimento sobre as glenóides no percurso da
flexão do joelho, a face posterior da patela,
arrastada por suas conexões ligamentares, gera
geometricamente o perfil anterior dos côndilos
representado pela curvatura envolvente das sucessivas posições da face posterior da patela. O
perfil anterior dos côndilos depende essencialmente das conexões mecânicas da pateIa e da
sua disposição, assim como o seu perfil posterior depende dos ligamentos cruzados.
Já citamos anteriormente (pág. 92) de que
maneira o perfil côndilo-troclear está literalmente "fabricado" pela tíbia e a patela, unidas ao fêmur pelo sistema de cruzados por uma parte, e
pelo ligamento e as asas patelares por outra.
Certas intervenções cirúrgicas, ao transpor
a tuberosidade tibial para diante (Maquet) ou para dentro (Elmslie), modificam as conexões entre a patela e a tróclea, e principalmente os componentes de coaptação e subluxação externa, o
que explica que eles se pratiquem nas síndromes patelares.
2. MEMBRO INFERIOR
o
Fig.2-120
Fig.2-122
Fig.2-121
113
114 FISIOLOGIA ARTICULAR
OS LIGAMENTOS LATERAIS DO JOELHO
A estabilidade da articulação do joelho depende de ligamentos poderosos, que são os ligamentos
cruzados e laterais.
-
está separado da face periférica do menisco
externo pela passagem do tendão do poplíteo,que participa no que alguns autores denominam o ponto do ângulo póstero-externo ou PAPE;
-
é oblíquo para baixo e para trás; de forma que a sua direção Sy cruza no espaço
com a direção do ligamento lateral interno (seta B).
Os ligamentos laterais reforçam a cápsula articular pelo seu lado interno e externo.
Eles asseguram
joelho em extensão.
a estabilidade
lateral
do
O ligamento lateral interno (fig. 2-124) se
estende da face cutânea do côndilo interno até a extremidade superior da tíbia (LU):
-
sua inserção
tero-superior
da linha dos
côndi10 (ver
superior se situa na parte pósda face cutânea, atrás e acima
centros da curvatura (XX') do
pág. 90);
-
sua inserção inferior se situa atrás da zona
de inserção dos músculos da "pata de ganso", sobre a face interna da tíbia;
-
suas fibras anteriores são diferentes da cápsula e compõem o seu fascículo superficial;
-
suas fibras posteriores, que seguem as anteriores, se confundem mais ou menos com a
cápsula, formando uma lâmina triangular
de vértice posterior; este feixe profundo
contém inserções muito próximas à face
periférica interna do menisco interno na sua
face profunda, constituindo assim um ponto de união essencial, que alguns autores
denominam o ponto do ângulo póstero-interno ou PAPI;
-. sua direção é oblíqua para baixo e para
diante; portanto, cruzada no espaço com
a direção do ligamento lateral externo
(seta A).
O ligamento lateral externo (fig. 2-125) se
estende da face cutânea do côndilo externo até a cabeça da fíbula (LLE):
-
sua inserção superior está localizada acima
e atrás da linha dos centros da curvatura
(yy') do côndilo externo;
-
sua inserção inferior se localiza na zona anterior da cabeça da fibula; no interior da
zona de inserção do bíceps;
-
se diferencia da cápsula em todo seu trajeto;
Nestes dois esquemas (figs. 2-124 e 2-125) estão desenhadas as asas menisco-patelares (1 e 2) e
as asas patelares (3'e 4) que mantêm a patela ligada à tróclea femoral.
Os ligamentos laterais se contraem durante a extensão (figs. 2-126 e 2-128) e se distendem na flexão (figs. 2-127 e 2-129). Nos esquemas (figs. 2-126 e 2-127) vemos a diferença de
comprimento (d) do ligamento lateral interno entre a extensão e a flexão, além da obliqüidade para diante e para baixo que é um pouco mais acentuada. No lado externo (figs. 2-128 e 2-129), também se põem em evidência uma diferença de comprimento (e) do ligamento lateral externo e urna
mudança de direção: de ser oblíquo para baixo e
para trás, ele passa a ser oblíquo para baixo e ligeiramente para diante.
A mudança de tensão dos ligamentos pode ser
facilmente ilustrada por um modelo mecânico (fig.
2-130): uma cunha C se desliza da posição I à
2 numa prancha B, esta cunha está encaixada num
"estribo" fixo em a na prancha B; quando a cunha C
se desliza de 1 a 2, o estribo, que supostamente é
elástico, se contrai e adquire um novo comprimento
ab', a diferença de comprimento e corresponde à diferença de espessura da cunha entre as duas posições 1 e 2.
Quanto ao joelho, à medida que a extensão se
completa, o côndilo se interpõe, como uma cunha,
entre a glenóide e a inserção superior do ligamento
lateral. O côndilo desempenha a função de urna
cunha porque seu raio de curvatura aumenta regularmente, de trás para diante, e porque os ligamentos laterais se fixam na concavidade da linha dos
centros da curvatura. A flexão de 30° que distende
os ligamentos laterais é a posição de imobilização
após a sutura dos ligamentos laterais.
2. MEMBRO INrERIOR
Fig.2-125
Fig.2-124
Fig.2-130
Fig.2-127
Fig.2-126
Fig.2-128
Fig.2-129
115
116
FISIOLOGIA
ARTICULAR
A ESTABILIDADE
TRANSVERSAL DO JOELHO
o joelho está sujeito a importantes forças
laterais e a estrutura das extremidades ósseas
(fig. 2-131) representa estas violências mecânicas. Do mesmo modo que na extremidade superior do fêmur, se encontram sistemas de trabécuIas ósseas que constituem as linhas de força mecânica:
-
-
a porção inferior do fêmur está estruturada por dois sistemas trabeculares:
um deles se inicia na cortical interna e
se expande ao côndilo do mesmo lado
(fibras de compressão) e ao côndilo contralateral (fibras de tração); e o outro sai
da cortical externa e fica numa disposição simétrica; ele é um sistema de trabéculas horizontais que une ambos os côndilos;
a porção superior da tíbia possui uma
estrutura semelhante, com dois sistemas
que se iniciam nas corticais interna e externa e se expandem para baixo da glenóide do mesmo lado (fibras de compressão) e da glenóide contralateral (fibras de tração); com trabéculas horizontais que unem ambas as glenóides.
Devido à inclinação do eixo femoral para
baixo e para dentro, a força (F) que vai para a
porção superior da tíbia não é totalmente vertical (fig. 2-132), o que permite que ela seja decomposta numa força vertical (v) e em outra
transversal (t) dirigida horizontalmente para
dentro. Ao deslocar a articulação para dentro,
este componente (t) tem a tendência a acentuar
o valgo ao fazer abrir a interlinha em um ângu-
(a) aberto para dentro. O sistema ligamentar
interno é o que norn1almente se opõe a este deslocamento.
10
Quanto mais acentuado é o valgo (fig.
2-133), mais fürte é o componente transversal
(t): para uma direção F2 que corresponde a um
valgo de 1600 (genu valgo), o componente
transversal t2 é duas vezes maior que no caso
de um valgo normal de 1700 (Fj e tJ Daí se
deduz que quanto mais acentuado seja o valgo, mais ele necessita do sistema ligamentar
interno e maior é a tendência a acentuar-se.
Nos traumatismos das faces laterais do
joelho podem produzir-se fraturas da extremidade superior da tíbia. Se o traumatismo se localiza na face interna do joelho (fig. 2-134), ele
tem a tendência a endireitar o valgo fisiológico
e determina em primeiro lugar uma fratura completa do platô tibial interno (1), e também uma
ruptura do ligamento lateral externo (2), se a
força não está esgotada. Quando o ligamento é o
primeiro em romper-se, não se produz a fratura
do platô tibial.
Quando o traumatismo se localiza na face externa do joelho (fig. 2-135), como no caso de um choque ocasionado por um pára-choques de um carro, em primeiro lugar, o côndilo
externo se desloca ligeiramente para dentro, para introduzir-se depois na glenóide externa e finalmente fazer estalar a cortical externa do platô tibial: desta forma, se produz uma fratura
mista (afundamento-separação) do platô tibial
externo.
2. MEMBRO INFERIOR
a
Fig.2-131
Fig.2-132
Fig.2-133
Fig.2-135
117
118 FISIOLOGIA ARTICULAR
A ESTABILIDADE TRANSVERSAL DO JOELHO
(continuação)
Durante a marcha e a corrida, o joelho está
continuamente submetido a forças laterais. Em alguns casos, o corpo está em desequilíbrio interno
sobre o joelho que suporta o peso (fig. 2-136), o
que provoca um aumento do valgo fisiológico e
uma abertura da inter1inha para dentro. Se a força
transversal é muito importante, o ligamento lateral
interno se rompe (fig. 2-137): é o que se denomina entorse grave do ligamento lateral interno (é
necessário reforçar esta,afirmação destacando que
uma entorse grave nunca é o resultado de uma simples posição de desequi1íbrio, para que isto aconteça é necessário um choque violento).
No outro sentido, um desequilíbrio externo
sobre o joelho de suporte de peso (fig. 2-138) tem
a tendência a endireitar o valgo fisiológico e a abrir
a interlinha para fora. Se a face interna do joelho sofre um traumatismo violento, o ligamento lateral externo pode sofrer uma ruptura (fig. 2-139): é a entorse grave do ligamento lateral externo.
Quando existe uma entorse grave do joelho,
os movimentos de lateralidade que se realizam ao
redor de um eixo ântero-posterior podem aparecer.
A exploração destes movimentos anormais se realiza tanto com o joelho em máxima extensão como
em ligeira flexão e sempre se compara com o lado
supostamente normal.
Estando o joelho em extensão (fig. 2"141),
ou até mesmo em hiperextensão, o peso do membro o desloca nesta direção:
-
-
um movimento de lateralidade
externa,
ou em va1go, representa uma ruptura associada do ligamento lateral interno (fig. 2137) e das formações fibroligamentares localizadas atrás; se trata da convexidade
condiliana interna e do PAPI;
o movimento de lateralidade interna, ou
em varo, representa uma ruptura associada
do ligamento lateral externo (fig. 2-138)
e das formações fibro1igamentares posteriores, principalmente a convexidade condiliana externa.
Com o joelho flexionado 10° (fig. 2-142), os
mesmos movimentos anormais representam uma
ruptura isolada do LU ou do LLE respectivamente, visto que as convexidades condilianas estão dis-
tendidas pelos primeiros graus de flexão. O fato de
que não se pode estar seguro da posição em que se
realizaram as radiografias faz com que não seja
fidedigno o diagnóstico radiológico da oscilação da
interlinha interna em va1go forçado ou da oscilação
externa em varo.
Na verdade, é francamente difícil conseguir
um relaxamento muscular total num joelho doloroso que propicie uma exploração válida. Isso indica
o caráter quase obrigatório de uma exploração
com anestesia geral.
A entorse grave do joelho compromete a estabilidade da articulação. De fato, a ruptura de um ligamento lateral impede que o joelho possa opor-se
às forças laterais que o solicitam continuamente
(figs. 2-136 e 2-138).
Nas forças laterais bruscas da corrida e da
marcha, os ligamentos laterais não são os únicos
que asseguram a estabilidade do joelho; eles estão
reforçados pelos músculos que constituem ligamentos ativos autênticos e que são os principais
responsáveis da estabilidade do joelho (fig. 2-140).
O ligamento lateral externo (LLE) está muito reforçado pela banda de Maissiat (BM), contraída pelo tensor dafáscia lata - esta contração aparece no esquema 2-138.
O ligamento lateral interno (LU) também está reforçado pelos músculos da "pata de ganso":
sartório (Sa), semitendinoso (St) e reto interno (Ri)
- a contração do sartório pode ser observada no esquema 2-136.
Portanto, os ligamentos laterais estão "protegidos" por tendões consistentes. Eles também estão reforçados pelo quadríceps cujas expansões diretas (Ed) e cruzadas (Ec) constituem, na face anterior da articulação, uma camada fibrosa. As expansões diretas se opõem à oscilação da interlinha
do mesmo lado, e as expansões cruzadas impedem
a oscilação do lado oposto. Cada músculo age sobre a estabilidade da articulação em ambos os sentidos graças a estes dois tipos de expansões. De
forma que se pode entender perfeitamente a importância da integridade do quadríceps para garantir a estabilidade do joelho e, inversamente, as alterações da estática ('joelho que se afrouxa") que
são o resultado de uma atrofia do quadríceps.
2. MEMBRO INFERIOR
Ed
Ec
Fig.2-140
@
Fig.2-136
Fig.2-138
Fig.2-142
Fig.2-141
~
Fig.2-139
119
120 FISIOLOGIA ARTICULAR
A ESTABILIDADE ÂNTERO-POSTERIOR
A estabilidade do joelho é totalmente diferente se está ligeiramente flexionado ou se está
em hiperextensão.
Em alinhamento normal com ligeira fiexão (fig. 2-143), a força que representa o peso do
corpo passa por trás do eixo de flexão-extensão
do joelho e a flexão tem a tendência a aumentar
por si mesma se a contração estática do quadríceps não intervém; portanto, nesta posição, o
fibrosos. A cada lado, da face aos côndilos, um
engrossamento da cápsula forma os capas condilianas (1), na face posterior, onde se inserem
fibras dos gêmeos. Partindo da estilóide fibular,
se expande um leque fibroso, o ligamento poplíteo arqueado, no qual dois fascículos podem ser
distinguidos:
-
o fascículo externo, ou ligamento lateral
externo curto de Valois, cujas fibras finalizam ná capa condiliana externa (2) e no
sesamóide do gêmeo externo, ou fabela
(3), também nesta camada;
-
o fascículo interno, que se expande em
forma de leque para dentro e cujas fibras
inferiores (4) constituem o ligamento
poplíteo arqueado, arcada onde o poplíteo se introduz (seta branca) para penetrar na articulação; constituindo assim a
margem superior do orifício de penetração deste músculo através da cápsula.
quadríceps é indispensável para a posição de pé.
Pelo contrário, se o joelho se coloca em hiperextensão (fig. 2-144), a tendência natural ao aumento da citada hiperextensão fica rapidamente bloqueada pelos elementos cápsulo-ligamentares
posteriores (em preto), e é possível manter a posição de pé sem a intervenção do qltadríceps: se
trata do bloqueio. Isto explica por que nas paralisias do quadríceps é necessário acentuar o gemi
recurvatum para que o paciente possa estar de pé
ou caminhar.
Quando o joelho está em hiperextensão (fig.
2-145), o eixo da coxa é oblíquo para baixo e para trás, e a força f desenvolvida pode decomporse num vetor vertical (v) que transmite o peso do
corpo para o esqueleto da perna, e um vetar horizontal (h), que se dirige para trás e que tem a
tendência a acentuar a hiperextensão: quanto mais
-oblíqua para trás seja a força f, mais importante
será este vetor (h) e mais solicitados estarão os
elementos do plano fibroso posterior; um gelllt recurvatum muito acentuado termina distendendo os
ligamentos e se agrava a si mesmo.
Embora não se encontre um obstáculo rígido
como é o caso do olécrano no cotovelo, a limitação
da hiperextensão dojoelho é de uma eficácia extrema (fig. 2-146). Esta limitação depende, essencialmente, de elementos cápsulo-ligamentares e de
elementos musculares acessórios.
Os elementos cápsulo-ligamentares contêm:
-
o plano fibroso posterior da cápsula
(fig.2-147);
-
os ligamentos laterais e o cruzado póstero-interno (fig. 2-148).
A parte posterior da cápsula articular
(fig. 2-147) é reforçada por potentes elementos
DO JOELHO
No lado interno, o plano fibroso capsular está reforçado pelo ligamento poplíteo oblíquo (5),
constituído pelo fascículo recorrente, separado
do lado externo do tendão do semimembranoso
(6); dirigindo-se para cima e para fora para terminar na camada condiliana externa e fabela.
Todas as formações do plano fibroso posterior entram em tensão na hiperextensão (fig.
2-148), principalmente as capas condilianas (1).
Já vimos anteriormente que a extensão provoca a
tensão do ligamento lateral externo (7) e do ligamento lateral interno (8). O ligamento cruzado
póstero-interno (9) também entra em tensão durante a extensão. De fato, é fácil constatar que as
inserções superiores (A, B, C) destes elementos
se projetam para diante durante a hiperextensão,
ao redor do centro O. Contudo, trabalhos recentes
demonstraram que o ligamento mais tenso nesta
posição é o cruzado ântero-externo.
Por último, os fiexores (fig. 2-149) são fatores ativos de limitação: os músculos da "pata de
ganso" (10) que passam por trás do côndilo interno, o bíceps (11) e também os gêmeos (12) na
medida em que estejam tensos pela flexão dorsal
da articulação tíbio-tarsiana.
2. MEMBRO INFERIOR 121
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Fig.2-145
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Fig.2-144
Fig.2-147
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Fig.2-148
Fig.2-149
122
FISIOLOGIA ARTICULAR
AS DEFESAS PERIFÉRICAS
As diferentes estruturas cápsulo-ligamentares, descritas até agora de maneira analítica, se organizam em forma de um conjunto estruturado e coerente que constitui as
defesas periféricas do joelho (fig. 2-150).
Neste corte transversal do joelho, no nível da interlinha, se podem reconhecer:
-
por dentro, a glenóide interna (1), com o menisco
interno (2);
-
por fora, a glenóide externa (3), com o menisco
externo (4), unido pela frente com o interno pelo
ligamento jugal (5);
-
pela frente, a patela (6), recobrindo a tuberosidade tibial anterior (TTA) (7), e a inserção anterior
do LCAE (8);
-
por trás, a inserção posterior do LCPI (9).
Três formações principais são responsáveis pelas defesas periféricas do joelho: o ligamento lateral interno, o ligamento lateral externo e o plano cápsulo-fibroso posterior:
-
o ligamento lateral interno (10) apresenta, segundo F. Bonnel, um impedimento à ruptura de
115 kg/cm' e uma deformação à ruptura de 12,5%:
-
o ligamento lateral externo (11) apresenta um
impedimento à ruptura de 276 kg/cm' e uma deformação à ruptura de 19%. Portanto, e surpreendentemente, é mais resistente e mais elástico que o interno;
-
o plano cápsulo-fibroso posterior está formado
pela convexidade condiliana interna (12), a convexidade condiliana externa (13) com o seu sesamóide
ou fabela (14) e os reforços: o ligamento poplíteo
oblíquo (15) e o ligamento poplíteo arqueado (16).
As formações acessórias constituem quatro camadas
fibrotendinosas de resistência e importância diferentes:
• a camada fibrotendinosa póstero-interna
é a
mais importante. F. Bonnel denomina núcleo fibrotendinoso, o que sem dúvida alguma é correto no caso do pósterointerno, porém de jeito nenhum para as outras. G. Bousquet
destaca um ponto de ângulo póstero-interno, abreviado
PAPI, o que representa um aspecto mais cirúrgico que anatômico. Em todo caso, esta camada fibrotendinosa pósterointerna, situada detrás do LU, é constituída por:
-
fibras mais posteriores do LU (10 bis),
-
margem interna da convexidade condiliana interna (12),
-
dois prolongamentos do tendão do sernimembranoso (16), o fascículo refletido (17) que percorre
a margem infraglenóide interna e a expansão meniscal (18), que se fixa na periferia posterior do
menisco interno, da qual constitui um ponto importante de inserção.
DO JOELHO
• a camada fibrotendinosa póstero-externa ou PAPE, bastante menos potente que a interna, visto que o merusco externo, neste nível, está separado da cápsula e do
LLE pela passagem do tendão do poplíteo (19) que se insere no côndilo externo. Contudo, este tendão também tem
uma expansão meniscal (20) que mantém a parte posterior
do menisco externo. O reforço fibroso se completa com o
ligamento lateral externo curto (21) E; a margem externa da
convexidade condiliana externa.
• a camada fibrotendinosa ântero-externa (PAAE)
constituída pela'banda de Maissiat (22), que envia uma
expansão (23) para a margem externa da pateIa, e pelas expansões diretas e cruzadas dos vastos (24) que formam a
parte externa do aparelho extensor.
é
• a camada fibrotendinosa
ântero-interna
(PAAI)
é constituída pelas expansões diretas e cruzadas dos vastos
(25), reforçadas pela expansão do tendão do sartório (26)
que se insere na margem interna da patela.
Os músculos periarticulares também partiCIpam
nas defesas periféricas do joelho: com a sua contração perfeitamente sincronizada no percurso do esquema motor e
na previsão dos possíveis problemas que o córtex cerebral
antecipa, eles se opõem às distorsões articulares, sendo
uma ajuda indispensável para os ligamentos que só podem
reagir passivamente. Entre estes músculos, o mais importante é o quadríceps, sem o qual não é Úável nenhuma estabilidade no joelho; pela sua potência e sua perfeita coordinação, é inclusive capaz, em certa medida, de compensar
as claudicações ligamentares. O seu bom trofismo é uma
condição imprescindível para o sucesso de qualquer intervenção cirúrgica. Sabemos que ele é muito propenso a atrofiar-se e difícil de recuperar, então concluímos que ele merece uma grande consideração por parte dos cirurgiões e
dos fisioterapeutas.
No lado externo, a banda de Maissiat (22) deve considerar-se como o tendão terminal do deltóide glúteo. No
lado póstero-interno se localizam o semimembranoso (16)
e os músculos da "pata de ganso": o sartório (27), o reto interno (28) e o sernitendinoso (29).
No lado póstero-externo se situam dois músculos: o
poplíteo (19), cuja fisiologia será analisada mais adiante, e
o bíceps (30), cujo potente tendão reforça o LLE.
Finalmente, por trás, o espaço está ocupado pelos gêmeos que se inserem por cima e nas convexidades condilianas: o gêmeo interno (31), cuja lâmina tendinosa de inserção cruza em forma de X alongada o tendão do semimembranoso através da bolsa serosa do gêmeo interno e do semimembranoso (32), comunica, amiúde, com a sinovial articular; o gêmeo externo (33), cuja lâmina tendinosa de inserção cruza da mesma maneira o tendão do bíceps, porém
sem interposição da bolsa serosa.
2. MEMBRO INFERIOR 123
6
2
25
4
10
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12
13
29
16
19
Fig.2-150
15
33
14
124 FISIOLOGIA ARTICULAR
OS LIGAMENTOS CRUZADOS DO JOELHO
Quando se abre pela frente a articulação do
joelho (fig. 2-151, segundo Rouviere), observa-se
que os ligamentos cruzados estão situados em
pleno centro da articulação, alojando-se principalmente na incisura intercondiliana.
O primeiro que se encontra é o ligamento cruzado ântero-externo (1), cuja inserção tibial (5) se
localiza (fig. 2-152, segundo Rouviere) na superfí"
cie pré-espinhal, ao longo da glenóide interna, entre a inserção do como anterior do menisco interno
(7) pela frente e a do menisco externo (8) por trás
(ver também a figo 2-73). O seu trajeto é oblíquo
para cima, para trás e para fora e sua inserção femoral (1) se realiza (fig. 2-153, segundo Rouviere) sobre a face axial do côndilo externo, no nível
de uma zona estreita e alongada verticalmente em
contato com a cartilagem, na parte mais posterior
desta face (ver figo 2-77). O ligamento ântero-extemo é o mais anterior sobre a tíbia e o mais externo sobre o fêmur, fazendo jus ao nome que o identifica, de maneira que é preferível seguir denominando-o ântero-externo e não simplesmente anterior, como se faz na atualidade.
ultrapassa (figs. 2-153 e 2-154, segundo Rouviere)
a margem posterior do platô tibial (ver também
figo 2-73). A inserção tibial do cruzado póstero-interno está localizada bem para trás (fig. 2-152) da
inserção dos cornos posteriores do menisco externo (9) e do menisco interno (10). O trajeto do póstero-interno é oblíquo para diante, para dentro e
para cima (fig. 2-154, joelho flexionado em 90°).
Sua inserção femoral (2) ocupa o fundo da incisura intercondiliana (fig. 2-155, segundo Rouviere),
e inclusive ultrapassa nitidamente (fig. 2-154) a
face axial do côndilo interno, ao longo da cartilagem, no limite inferior desta face, numa zona de
inserção alongada horizontalmente (ver também
figo 2-76). O ligamento póstero-interno é o mais
posterior sobre a tíbia e o mais interno sobre o fêmur, por isso merece a sua denominação. De forma
que é mais correto denominá-Io póstero-interno.
Descrevem-se quatro fascículos:
-
o fascículo póstero-externo: o mais posterior sobre a tíbia e o mais externo sobre o
fêmur;
-
o fascículo ântero-interno: o mais anterior
sobre a tíbia e o mais interno sobre o fêmur;
-
o fascículo anterior
constante;
-
o fascículo menisco·femoral de Wrisberg
(3), que se insere no como posterior do menisco interno (figs. 2-152 e 2-153) para, a seguir, aderir-se ao corpo do ligamento ao qual
acompanha normalmente na sua face anterior (fig. 2-151) e inserir-se finalmente com
ele na face axial do côndilo interno. Existe,
às vezes, um equivalente desta mesma disposição para o menisco interno (fig. 2-152):
algumas fibras (12) do LCAE se inserem no
como anterior do menisco interno, próximo
à inserção do ligamento transverso (11).
Descrevem-se três fascículos:
-
o fascículo ântero-interno: o mais longo, o
primeiro que se localiza e o mais exposto
aos traumatismos;
--'-'-o fascículo póstero-externo: oculto pelo anterior, é o que persiste nas rupturas parciais;
- o fascículo intermédio.
Em conjunto, na sua forma se apresenta torcido sobre si mesmo, visto que suas fibras mais anteriores sobre a tíbia apresentam as inserções mais inferiores e mais anteriores no fêmur, e suas fibras
mais posteriores sobre a tíbia se inserem na parte
mais superior do fêmur, embora todas as suas fibras
não tenham o mesmo comprimento.
Segundo F. Bonnel, o comprimento médio das
fibras do LCAE varia entre 1,85 e 3,35 cm; assim
sendo, existe uma grande diferença dependendo da
localização das fibras.
O ligamento cruzado póstero-interno (2) aparece no fundo da incisura intercondiliana, por trás do
ligamento cruzado ântero-externo (fig. 2-151). A sua
inserção tibial (6) se localiza (fig. 2-152) na parte
mais posterior da superfície retroespinhal; inclusive
de Humphrey,
in-
Os ligamentos transversos estão em contato
um com o outro (fig. 2-155, com os ligamentos cruzados perto da sua inserção femoral seccionados)
por sua margem axial, enquanto o ligamento externo passa por fora do interno. Estes ligamentos não
estão livres no interior da cavidade articular, mas estão recobertos pela sinovial (4) e estabelecem im"
portantes conexões com a cápsula, como veremos
na página seguinte.
2. MEMBRO INFERIOR
3
125
3
2
2
Fig.2-151
3
4
2
1
4
Fig.2-154
Fig.2-155
8
10
3
2
6
Fig.2-152
126 FISIOLOGIA ARTICULAR
RELAÇÕES DA CÁPSULA E DOS LIGAMENTOS
Os ligamentos cruzados estabelecem conexões tão íntimas com a cápsula articular que
poderia dizer-se que na realidade eles são espessamentos da cápsula articular, e que, como tais, são parte integrante dela. Na página
98 vimos como a cápsula penetra na incisura
intercondiliana para formar um septo duplo no
eixo da articulação. Por comodidade, dizemos
que a inserção tibial da cápsula (fig. 2-156)
deixava as inserções dos ligamentos cruzados
fora da articulação, quando na realidade a inserção da cápsula passa pela inserção dos ligamentos cruzados. Simplesmente, a espessura capsular dos cruzados se "espalhe" pela face exterior da cápsula e, portanto, no interior
do septo duplo.
Em vista póstero-interna
(fig. 2-157),
após ter sido removido o côndilo interno e seccionado parte da cápsula, o ligamento cruzado
ântero-externo aparece nitidamente "incrustado" na lâmina externa do septo capsular (o ligamento cruzado póstero-interno não pode ser
visto no desenho).
Em vista póstero-externa (fig. 2-158) nas
mesmas condições que a anterior, o ligamento
cruzado póstero-interno aparece "incrustado"
na lâmina interna do septo capsular.
É necessário destacar que nem todas as fibras cruzadas têm o mesmo comprimento, nem
a mesma orientação (ver também figo 2-159):
portanto, durante os movimentos não se contraem todas simultaneamente (ver pág. 130).
Além disso, estes esquemas permitem destacar as capas condilianas, intactas no côndilo
interno (fig. 2-158) e que se ressecaram no côndilo externo (fig. 2-157).
CRUZADOS
Em corte vértico-frontal (fig. 2-156), que
passa pela parte posterior dos côndilos, pode-se
observar a divisão da cavidade articular em
compartimentos (o fêmur e a tíbia se separaram
artificialmente):
-
o septo capsular, reforçado pelos ligamentos cruzados na parte central, e separando a cavidade em duas metades,
externa 0 interna; este septo é prolongado adiante pelo corpo adiposo (ver pág.
100);
- cada uma das duas metades da articulação está separada, por sua vez, pelos
meniscos em dois espaços, o superior ou
suprameniscal, que corresponde à interlinha fêmoro-meniscal, e o interior ou
inframeniscal, que corresponde à interlinha tíbio-meniscal.
A presença dos ligamentos cruzados é o
que modifica profundamente a estrutura desta
articulação troc1ear (do ponto de vista mecânico
não tem nenhum sentido denominá-Ia bicondiliana). O LCAE (fig. 2-159), tomando como posição de partida sua posição média (1), começa
horizontalizando-se (2) sobre o platô tibial durante a flexão de 45-50°, até alcançar a sua posição mais elevada (3) na flexão máxima; quando
desce, se aloja na incisura interespinhosa, como
se o platô das espinhas tibiais estivesse "serrado", como quando cortamos pão (destaque). O
LCPI (fig. 2-160), no percurso da extensão (A) à
flexão máxima (B), varre um setor muito mais
importante (aproximadamente 60°) que o LCAE
e, com relação ao fêmur "secciona" a incisura
intercondiliana, separando as duas convexidades
da tróc1ea fisiológica constituída pelos dois côndilos.
2. MEMBRO INFERIOR
Fig.2-157
Fig.2-156
Fig.2-160
127
128 FISIOLOGIA ARTICULAR
DIREÇÃO DOS LIGAMENTOS CRUZADOS
Vistos em perspectiva (fig. 2-161), os ligamentos cruzados aparecem realmente como cruzados no espaço, um com relação ao outro. No
plano sagital (fig. 2-162) estão cruzados (fig. 2162), o ântero-externo (LCAE) é oblíquo para
cima e para trás, enquanto o póstero-interno
é
oblíquo para cima e para diante. As suas direções também estão cruzadas no plano frontal
(fig. 2-163, vista posterior) visto que as suas inserções tibiais (pontos pretos) estão alinhadas no
eixo ântero-posterior (seta S), enquanto as suas
inserções femorais estão a 1,7 cm de distância:
conseqüentemente,
o póstero-interno
é oblíquo
para cima e para dentro e o ântero-externo
é
oblíquo para cima e para fora. Pelo contrário, no
plano horizontal (ver figo 2-185) eles são paralelos e entram em contato entre si através da sua
margem axial.
Os ligamentos cruzados não estão somente
cruzados entre si, mas também estão cruzados
com o ligamento lateral do lado homólogo. Assim sendo, o cruzado ântero-externo
se cruza
com o ligamento lateral externo (fig. 2-165) e o
cruzado póstero-interno com o ligamento lateral
interno (fig. 2-166). Portanto, existe uma alternância regular na obliqüidade dos quatro liga-
mentos quando eles são considerados
dem, de fora p?fa dentro e vice-versa.
por or-
~xiste uma diferença de inclinação entre
os dois ligamentos cruzados (fig. 2-162); com o
joelho em extensão, o ligamento cruzado ânteroexterno (LCAE) é mais vertical, enquanto o póstero-interno (LCPI) é mais horizontal; acontece
o mesmo com a direção geral das zonas de inserção femorais: a do póstero-interno é horizontal
(b), enquanto a do ântero-externo é vertical (a).
Uma norma mnemotécnica lembra este fato graças ao adágio clássico: "O externo está em pé
quando o interno está deitado."
Com o joelho flexionado (fig. 2-164), o
LCPI, horizontalizado durante a extensão, se endireita verticalmente,
descrevendo um arco de
círculo de mais de 60° com relação à tíbia, enquanto o LCAE se endireita pouco.
A relação de comprimento entre ambos os
ligamentos cruzados varia, dependendo de cada
indivíduo, porém, junto com as distâncias dos
pontos de inserção tibiais e femorais, constitui a
característica própria de cada joelho, visto que
determina entre outras, como já vimos, o perfil
dos côndilos.
2. MEMBRO mFERIOR
a
LCPI
Fig.2-163
~
Fig.2-161
LCAE
LLE
LCPI
LU
Fig.2-165
Fig.2-166
129
130 FISIOLOGIA ARTICULAR
FUNÇÃO MECÂNICA DOS LIGAMENTOS
Existe o costume de considerar os ligamentos cruzados como cordas quase lineares, fixas
por inserções pontudas. Isto só é verdadeiro numa primeira aproximação e tem a vantagem de
esclarecer a ação geral de um ligamento, porém
em nenhum caso permite conhecer as suas reações finas. Por este motivo, é necessário levar
em conta três fatores:
1. A ESPESSURA DO LIGAMENTO
A espessura e o volume do ligamento são
diretamente proporcionais à sua resistência e inversamente proporcionais às suas possibilidades
de alongamento, podendo-se considerar cada fibra como uma pequena mola elementar.
2. A ESTRUTURA DO LIGAMENTO
Devido à extensão das inserções, nem todas
as fibras possuem o mesmo comprimento. Conseqüência importante: não se solicita cada fibra ao
mesmo tempo. Como no caso das fibras musculares, se trata de um verdadeiro recrutamento das
fibras ligamentares durante o movimento, o que
faz variar a sua elasticidade e a sua resistência.
3. A EXTENSÃO E A DIREÇÃO DAS
INSERÇÕES
De fato, as fibras não são sempre paralelas
entre si, se organizam muito amiúde segundo
planos "ladeados", torcidos sobre si mesmos,
porque as linhas de inserção não são paralelas
entre si, mas sim, com freqüência, oblíquas ou
perpendiculares no espaço; além disso, a direção
relativa das inserções varia durante o movimento, o que contribui para "o recrutamento"; modificando a direção da ação do movimento, considerado globalmente. Esta variação na ação da
direção do ligamento não se realiza somente no
plano sagital, mas nos três planos do espaço, o
que demonstra suas ações complexas e simultâneas na estabilidade ântero-posterior, na estabilidade lateral e na estabilidade rotatória.
CRUZADOS
Assim sendo, a geometria dos ligamentos
cruzados determina o perfil côndilo-troclear no
plano sagital e também nos outros dois planos
do espaço.
Globalmente, os ligamentos cruzados asseguram a estabilidade ântero-posterior
do joelho ao mesmo tempo que permitem os movimentos de charneira mantendo as superfícies
articulares em,contato.
A sua função pode ser ilustrada com um
modelo mecânico' (fig. 2-167) fácil de realizar:
duas tábuas A e B (vistas pelo corte) unidas entre si por fitas (ab e cd) que se estendem de um
lado de uma delas ao lado oposto da outra, de
forma que podem bascular uma com relação à
outra, ao redor de duas chameiras: quando a se
confunde com c, e b se confunde com d, porém é
impossível o deslizamento de uma sobre a outra.
Os ligamentos cruzados do joelho têm uma
montagem e um funcionamento semelhantes,
com a diferença de que não existem apenas dois
pontos de chameira, mas uma série de pontos
alinhados sobre a curvatura do côndilo. Como
acontece no modelo, o deslizamento ântero-posterior é impossível.
Seguindo com a demonstração, os ligamentos estão representados de forma linear
(LCAE = ab, LCPI = cd) nas figuras pequenas;
nas maiores estão representadas as fibras extremas e médias, assim como as linhas de inserção.
Partindo da posição de alinhamento normal
(fig. 2-168), ou de uma flexão mínima de 30°
(fig. 2-169), na qual os ligamentos cruzados estão contraídos igualmente, a flexão faz bascular
a base femoral bc (fig. 2-170), enquanto o LCPI
cd se endireita e o LCAE ab se horizontaliza. No
esquema mais completo (fig. 2-171) com flexão
de 60°, a tensão das fibras elementares de cada
um dos ligamentos cruzados varia muito pouco.
2. MEMBRO INFERIOR 131
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30°
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Fig.2-167
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Fig.2-168
Fig.2-169
Fig.2-170
132
FISIOLOGIA ARTICULAR
FUNÇÃO
MECÂNICA
DOS LIGAMENTOS
CRUZADOS
(continuação)
A partir do momento em que a flexão aumenta até 90° (fig. 2-172) e depois até 120°
(fig. 2-173), o LCPI se endireita verticalmente
e se contrai proporcionalmente mais que o
LCAE: no detalhe do esquema (fig. 2-174) se
pode observar que as fibras médias e inferiores
do LCAE estão distendidas (-), enquanto as fibras ântero-superiores são as únicas que estão
tensas (+); pelo contrário, no caso do LCPI as
fibras póstero-superiores estão pouco distendidas (-), enquanto as fibras ântero-inferiores estão tensas (+). O cruzado póstero-interno está tenso em flexão.
Em extensão e hiperextensão (fig. 2-175),
com relação à posição de partida (figs. 2-176 e
2-177), todas as fibras do LCAE estão, pelo contrário, tensas (+), enquanto só as fibras póstero-superiores do LCPI estão tensas (+); por outro lado,
em hiperextensão (fig. 2-178), o fundo da incisura
intercondiliana c se apóia sobre o LCAE que se
contrai como se fosse um cavalete. O cruzado ântero-externo está tenso em extensão e é um dos
freios da hiperextensão.
Então, os trabalhos recentes de F. Bonnel
confirmam o que pensava Strasser (1917); quem,
graças a um modelo mecânico, descobriu que o
LCAE está tenso na extensão e o LCPI na flexão.
Contudo, uma análise mais minuciosa das condições mecânicas confirmam que Roud (1913)
também estava certo, visto que pensava que os
cruzados permanecem sempre tensos em algumas de suas fibras. por causa do seu comprimento diferente. Como acontece amiúde em biomecânica, duas propostas aparentemente contraditórias podem ser certas simultaneamente e não
se exc1uirem.
2. :-'JEMBRO INFERIOR
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Fig.2-172
Fig.2-173
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I Fig.2-177
133
134
FISIOLOGIA ARTICULAR
FUNÇÃO MECÂNICA DOS LIGAMENTOS
CRUZADOS
(continuação)
Antes, analisando o movimento dos côndilos
sobre as glenóides (ver pág. 94), se pôde constatar
que este movimento combina rolamento e deslizamento; assim como o rolamento pode ser explica~
do com facilidade, mas, como explicar o deslizamento numa articulação tão pouco encaixada como o joelho? Certamente, intervêm fatores ativos; os extensores puxam a tíbia sobre ofêmur para diante na extensão (ver pág. 146) e inversamente os tlexores fazem com que o platô tibial se deslize para trás na tlexão; porém, quando os movimentos numa amostra anatômica são estudados,
predomina o papel dos fatores passivos e, mais
concretamente, o dos ligamentos cruzados. Os ligamentos cruzados solicitam aos côndilos de forma que fazem com que se deslizem sobre as glenóides em sentido inverso ao do seu rolamento.
Partindo (fig. 2-179) da extensão (I), se o
côndilo rolasse sem deslizar-se deveria recuar à
posição II e a inserção femoral b do cruzado ântero-externo ab deveria situar-se em b', descrevendo o suposto trajeto bb', eventualidade ilustrada
na figura 2-108 (página 107), e causa das lesões
do como posterior do menisco interno. Contudo, o
ponto b só pode deslocar-se ao longo de uma circunferência de centro e e de raio ab (supondo que
o ligamento seja inextensível), a conseqüência é
que o trajeto real de b não é bb', mas bb", o que
corresponde à posição m do côndilo, mais anterior que a posição II de comprimento e. Durante a
flexão, o cruzado ântero-externo age dirigindo o
côndilo para frente. Então, pode-se dizer que o ligamento cruzado ântero-externo
é responsável
pelo deslizamento do côndilo para diante, associado ao seu rolamento para trás.
Do mesmo modo pode-se demonstrar (fig.
2-180) o papel do cruzado póstero-interno durante
a extensão. Passando da posição I à posição II por
um rolamento simples, o ligamento póstero-interno
cd desloca o côndilo para trás, a trajetória de sua inserção femoral c não é cc', mas sim cc" numa circunferência de centro d e de raio dc. A conseqüência é que o côndilo se desloca a um comprimento f
para trás para situar-se numa posição m. Durante a
extensão, o ligamento cruzado póstero-interno é
responsável pelo deslizamento do côndilo para
trás, associado ao seu rolamento para diante.
Esta demonstração se pode retomar graças a
um modelo mecânico (ver modelo m no final deste volume), que faz reaparecer a tensão alternada
dos ligamentos representados por elásticos.
Os movimentos de gaveta são movimentos
anormais de deslocamento ântero-posterior da tíbia com respeito ao fêmur. Exploram-se em duas
posições: com o joelho tlexionado em ângulo reto
e com o joelho ~m extensão máxima.
Com o joelho fiexionado em ângulo reto
(fig. 183): o paciente em decúbito supino sobre um
plano duro, o joelho que vai ser explorado em ângulo reto, o pé apoiado sobre a mesa de exame; o
examinador bloqueia o pé do paciente sentando-se
em cima dele, para a seguir segurar com ambas as
mãos a extremidade superior da perna; pluando para ele, explora uma gaveta anterior, empurrando
para trás explora uma gaveta posterior; esta exploração deve ser realizada com o pé em rotação neutra - gaveta direta -, o pé em rotação externa gaveta em rotação externa - e o pé em rotação interna - gaveta em rotação interna -. É preferível
esta terminologia à denominação "gaveta rotatória
externa ou interna", que tem implícita uma idéia
de rotação durante o movimento de gaveta.
A gaveta posterior (fig. 2-181) se manifesta
por um deslocamento da tíbia sobre o fêmur para
trás; devido a uma ruptura do cruzado póstero-intemo. A regra mnemotécnica é simples: gaveta
posterior = cruzado posterior.
A gaveta anterior (fig. 2-182) se traduz por
um deslocamento para diante da tíbia sobre o fêmur devido à ruptura do cruzado ântero-externo.
Gaveta anterior = cruzado anterior.
Com o joelho em extensão, uma mão segura
a face posterior da coxa, enquanto a mão anterior,
segurando a extremidade superior da perna, tenta
mover a perna de diante para trás e vice-versa: é o
teste de Lachmann- Trillat. Se um deslocamento
para frente pode ser percebido, este "Lachmann
anterior" é a prova de uma ruptura do LCAE, associada por Bousquet a uma ruptura da camada fibrotendinosa póstero-externa (PAPE); esta exploração é complicada, visto que o movimento é de
escassa amplitude e, por conseguinte, difícil de se
afirmar.
2. MEMBRO INFERIOR 135
Fig.2-180
Fig.2-179
Fig.2-182
Fig.2-181
Fig.2-183
136 FISIOLOGIA ARTICULAR
A ESTABILIDADE ROTATÓRIA DO JOELHO EM EXTENSÃO
Sabemos que os movimentos de rotação
longitudinal do joelho só são viáveis quando ele
está flexionado. Contudo, na extensão máxima,
a rotação longitudinal é impossível: ele está impedido pela tensão dos ligamentos cruzados e
laterais.
(fig. 2-191) determina, por razões inversas à
rotação interna, uma distensão do LCAE (-) e
uma tensão do LCPI (+) assim como do freio
menisco-femoral (seta branca) que se insere no
corno posterior do menisco interno, deslocando-o para diante.
Em visão anterior do joelho em rotação
neutra (fig. 2-184, as superfícies se ilustram "separadas" devido a uma "elasticidade" anormal
dos ligamentos), os ligamentos cruzados estão
bem cruzados um com relação ao outro, e sua
dupla obliqüidade, bem visível em vista de plano (fig. 2-185), faz com que esbocem um movimento de enrolamento um ao redor do outro.
Os ligamentos cruzados impedem a rotação interna do joelho estendido.
Durante a rotação interna da tíbia sobre o
fêmur (fig. 2-186, vista anterior), a direção dos ligamentos é nitidamente mais cruzada no plano
frontal (detalhe), enquanto no plano horizontal
(fig. 2-187, vista superior) entram em contato entre si através da sua margem axial (detalhe); desta fOffi1a,se enrolam um ao redor do outro (fig.
2-188) e se contraem mutuamente (fig. 2-189) como as cordas de um "torniquete", conseguindo a
aproximação das supeifíâes da tiNa e do fêmur,
embora a rotação interna se bloqueie rapidamente.
Simultaneamente, como o centro desta rotação - marcado com uma cruz - (fig. 2-187)
não coincide com o centro da articulação (de fato corresponde à vertente interna da espinha tibial interna), este movimento distende o LCPI
(-) e contrai o LCAE (+) assim como a sua expansão para o como anterior do menisco interno, que se desloca para trás.
Durante a rotação externa da tíbia sobre o
fêmur (fig. 2-190, vista anterior), os ligamentos
têm a tendência a tornar-se paralelos (detalhe),
enquanto no plano horizontal (fig. 2-191, vista
superior) estão mais cruzados, porém perdem o
contato de sua margem axial, distendendo o
"torniquete" e permitindo uma ligeira separação das superfícies articulares (fig. 2-193). Por
conseguinte, a rotação externa não está limitada
pela tensão dos ligamentos cruzados.
Contudo, o fato de que o centro de rotação não coincida com o centro da articulação
A rotação, interna contrai o LCAE e distende o LCPI.
A rotação externa contrai o LCPI e distende o LCAE.
Donald B. Slocum e Robert L. Larson (J. Bone and
Joint Surg., março 68) analisaram a estabilidade rotatória
dojoelho fiexionado nos esportistas, principalmente nos jogadores de futebol, que quando giram bruscamente para o
lado oposto da perna que suporta o peso solicitam bruscamente o seu joelho em rotação externa. Estes autores demonstraram a função relevante que desempenha a parte interna da cápsula:
-
o seu terço anterior está excessivamente exposto à
ruptura se o traumatismo em valgo-rotação externa ocorre com o joelho tlexionado em 30 a 90°;
-
o seu terço posterior é vulnerável sempre que o
joelho esteja estendido;
-
o seu terço médio, assimilado a um fascículo profundo do ligamento lateral interno, se rompe
quando o traumatismo ocorre com o joelho em
tlexão de 30 a 90°.
Além disso, se o joelho está tlexionado em 90° ou
mais, o ligamento cruzado ântero-externo começa a distender-se durante os 15-20 primeiros graus de rotação externa,
para a seguir contrair-se e inclusive romper-se enrolandose na face axial do côndilo externo se a rotação externa
continua.
Finalmente, a metade posterior do menisco interno,
pelas suas conexões capsulares com a tíbia, pode impedir,
por si mesma, a rotação externa com o joelho tlexionado.
Em conclusão, um traumatismo em valgo-rotação
externa com o joelho tlexionado produz sucessivamente e
seguindo uma força crescente:
-
uma ruptura do terço anterior da cápsula;
-
uma ruptura do ligamento lateral interno, começando com a camada profunda primeiro e continuando com as fibras superficiais;
-
uma ruptura do ligamento cruzado ântero-externo;
-
uma desinserção do menisco interno.
Fig.2-185
Fig.2-189
Fig.2-193
Fig.2-190
~
Fig.2-192
Fig.2-188
\ Fig.2-191
J
138 FISIOLOGIA
ARTICULAR
A ESTABILIDADE
ROTATÓRIA DO JOELHO EM EXTENSÃO
(continuação)
A função dos ligamentos laterais na estabilidade rotatória do joelho pode ser explicada
por razões simétricas.
Em posição de rotação neutra (fig. 2-194,
vista superior, côndilos transparentes), a obliqüidade do LU para baixo e para diante, e do
LLE para baixo e para trás, faz com que esbocem um movimento de enrolamento ao redor da
porção superior da tíbia.
A rotação interna (fig. 2-195) se opõe a
este enrolamento, e diminui a obliqüidade dos
ligamentos laterais, embora sua tendência seja a
de converter-se em paralelos (fig. 2-196, vista
póstero-intema: superfícies "separadas"); como
b enrolamento diminui, as superfícies articulares
estão menos coaptadas pelos ligamentos laterais
(fig. 2-197) - enquanto estão mais coaptadas
pelos ligamentos cruzados. O "jogo" que permite a distensão .dos ligamentos laterais é compensado pela tensão dos cruzados.
Ao contrário; a rotação externa (fig. 2-198)
aumenta o enrolamento (fig. 2-200), com o qual
as superfícies articulares se aproximam (fig.
2-200) e se limita o movimento, enquanto os
cruzados se distendem.
Os ligamentos laterais limitam a rotação
externa, os cruzados a rotação interna.
A estabilidade rotatória do joelho em extensão está assegurada tanto pelos ligamentos
laterais quanto pelos ligamentos cruzados.
2. MEMBRO INFERIOR
Fig.2-197
Fig.2-196
Fig.2-194
~
Fig.2-198
Fig.2-200
Fig.2·199
139
140 FISIOLOGIA ARTICULAR
OS TESTES DINÂMICOS EM ROTAÇÃO INTERNA
Junto com os testes estáticos de estabilidade do joelho, tão clássicos como a exploração da
lateralidade ou da gaveta, se elaboraram testes
dinâmicos de estabilidade (ou de instabilidade)
que pretendem a aparição de um movimento
anormal inclusive no percurso de um movimento de prova. Estes testes dinâmicos de instabilidade são numerosos (cada escola de cirurgia do
joelho propõe mais um em cada congresso!), por
isso é necessário tentar classificá-los e, principalmente, destacar os mais significantes.
O mais prático é classificar estes testes dinâmicos em dois grupos:
-
os testes em valgo-rotação interna e
-
os testes em valgo-rotação externa.
Em primeiro lugar vamos analisar os testes
dinâmicos em valgo-rotação interna.
O teste de Mac-Intosh ou lateral Pivot
Shift Test é o mais conhecido e utilizado. Pode ser explorado com o paciente em decúbito
supino (fig. 2-201) ou em inclinação de 45°
(fig. 2-202). No primeiro caso (fig. 2-201), a
mão que segura o pé pela planta força uma rotação interna, enquanto o próprio peso do
membro aumenta um valgo no joelho. No segundo caso (fig. 2-202), a mão segura o pé pela face anterior do tornozelo passando por trás
dele e provocando uma rotação interna com a
extensão do punho. A posição de partida do
joelho é a extensão (fig. 2-201), a mão livre
empurra o joelho para diante para esboçar a
flexão e para baixo para aumentar o valgo. Durante este movimento de flexão (fig. 2-202),
para os 25-30°, após ter experimentado uma
resistência, se percebe de repente um desbloqueio, enquanto se aprecia e se observa o côn-
dilo femoral externo pular, literalmente,
diante do platô tibia1 externo.
para
A positividade do teste de Mac-Intosh, ou
seja, a existência de um ressalto externo em rotação interna, diagnostica uma ruptura
do
LCAE. De fato, o LCAE, ao limitar a rotação interna, se o joelho está em extensão e rotação interna (fig. 2-203), o côndilo femoral externo se
subluxa posteriormente (SLP) sobre a vertente
posterior (1) da "lombada" da glenóide externa;
é mantido nesta situação pelo tensor da fáscia lata (TFL) e pelo valgo que coaptam o côndilo sobre a glenóide. Enquanto a fáscia lata passa pela
frente da lombada, o côndilo permanece bloqueado em subluxação posterior, porém quando
se ultrapassa este ponto devido a uma ftexão
crescente (fig. 2-204), o côndilo supera o vértice
(S) e se bloqueia para diante (2), sobre a vertente anterior onde permanece retido (fig. 2~204) pelo LCPI. Um fato importante é a sensação de ressalto que o paciente percebe espontaneamente.
O jerk test de Hughston é o inverso do MacIntosh. Explora-se também com o paciente em decúbito supino simétrico (fig. 2-205) ou em um decúbito intermédio (fig. 2-206), com uma inclinação de 45°, com as mesmas posições das mãos. A
diferença está em que a posição de partida é de flexão de 35-40° para estender de novo o joelho,
mantendo a rotação interna do pé e a limitação em
valgo do joelho. O côndilo femoral externo parte,
então, de sua posição (fig. 2-203) mais "adiantada" (em pontilhado) correspondendo a um contato (2) com a vertente anterior da glenóide externa,
para "pular" bruscamente (1) em subluxação posterior, sem ficar retido pelo LCAE quando se
aproxima à extensão. A positividade do jerk test
também indica uma ruptura do LCAE.
2. MEMBRO INFERIOR
Fig.2-201
Fig.2-202
Fig.2-205
Fig.2-206
141
142 FISIOLOGIA ARTICULAR
OS TESTES DINÂMICOS DE RUPTURA
DO LIGAMENTO CRUZADO ÂNTERO-EXTERNO
(continuação)
Embora os testes de Mac- Intosh e de
Hughston sejam os mais utilizados, os mais fáceis de explorar e os mais fidedignos, não são os
únicos que permitem diagnosticar uma ruptura
do ligamento cruzado ântero-externo (LCAE).
Podem-se utilizar outros três testes; se trata dos
testes de Losee, de Noyes e de Slocum.
O teste de Losee (fig. 2-207) se explora
com o sujeito em decúbito supino, o examinador
segura o calcanhar com uma mão mantendo o
joelho fiexionado em 30°, com a outra mão mantém o joelho pela sua face anterior, enganchando o seu polegar na cabeça da fíbula. Simultaneamente realiza uma rotação externa com a primeira mão, o que impede qualquer subluxação
posterior do côndilo externo, e um valgo com a
outra mão; conduzindo o joelho em extensão relaxando a rotação externa - este último ponto é
muito importante, visto que no caso contrário
seria em todos os casos negativo. Quando a extensão se completa, o polegar da mão que segura o joelho desloca a fíbula para diante: quando
o teste é positivo, se produz um ressalto do platô tibial para diante ao final da extensão.
O teste de Noyes (fig. 2-208), ou fiexion
rotation drawer test, se explora também com o
paciente em decúbito supino, com o joelho fiexionado em 20 a 30° e rotação neutra, as mãos
do examinador se limitam a segurar a perna, e é
unicamente o peso da coxa o que provoca uma
subluxação posterior do côndilo externo (1) e
uma rotação externa do fêmur. É possível reduzir esta subluxação empurrando a porção superior da tlôia para trás (2), como quando se ex-
pIora uma gaveta posterior, daí o nome inglês
deste teste que indica também uma ruptura do
LCAE.
O teste de Slocum (fig. 2-109) se explora
com o paciente em decúbito supino, semigirado
para o lado oposto e com o membro a explorar
sobre a mesa de exame; desta forma, quando o
joelho está em extensão, o próprio peso da perna provoca um valgo automático - rotação interna; o fato de não ter que segurar o membro é
de grande ajuda nos pacientes obesos. As duas
mãos do examinador se colocam no nível do
joelho, a um e outro lado da interlinha, de forma
que se pode flexionar progressivamente, enquanto o valgo aumenta. Como no teste de MacIntosh, aparece um ressalto nos 30-40° de flexão,
e como no teste de Hughston, se reproduz em
sentido inverso quando o joelho se estende. Este
teste de Slocum também diagnostica uma ruptura do LCAE.
Embora os cinco testes sejam indicativos
de uma ruptura do LCAE, existem duas circunstâncias nas quais não são exatos:
- no caso das adolescentes hiperlaxas:
podem ser positivos sem existir uma
ruptura do ligamento, daí a necessidade
de explorar também o lado oposto que
pode ser também hiperlaxo;
- uma lesão importante da camada fibrotendinosa póstero-interna impede o bloqueio do côndilo externo sob a ação do
valgo e pode dificultar a aparição de um
ressalto.
2. MEMBRO INFERIOR 143
Fig.2-207
Fig.2-208
~
Fig.2-209
-
__
n_
144 FISIOLOGIA ARTICULAR
OS TESTES DINÂMICOS EM ROTAÇÃO EXTERNA
A exploração de um joelho não seria completa sem os testes dinâmicos em rotação externa,
que procuram um ressalto externo em rotação
externa.
O teste em rotação externa, valgo e extensão ou pivot shift reverse test (fig. 2-210) está
constituído pela mesma manobra que o teste de
Mac-Intosh, no qual a rotação interna se substitui
pela rotação externa da perna realizada pela mão
que segura o pé; partindo de uma flexão entre
60-90°, a extensão progressiva combinada com
uma pressão contínua na face externa do joelho
sempre consegue que a extensão não ultrapasse os
30° (fig. 2-211), produzindo-se um ressalto brusco do côndilo femoral externo para a pendente
posterior da glenóide tibial externa.
De fato, quando o joelho está fiexionado, em
rotação externa (fig. 2-212), o côndilo externo, que já
não é retido pela tensão do LCPI em rotação externa
(RE) se subluxa para diante (SLA) sobre a pendente
anterior da lombada da glenóide externa (seta 1); durante a extensão progressiva (fig. 2-213), o tensor da
fáscia lata (TFL) passa para diante do ponto de contato entre o côndilo e a glenóide, embora o côndilo
externo esteja deslocado para trás (fig. 2-212) na sua
posição normal (pontilhado), ultrapassando bruscamente o ponto mais proeminente da lombada e
para entrar em contato (seta 2) com a vertente posterior da glenóide. A percepção do ressalto, pelo
próprio paciente em ocasião dos episódios de instabilidade e pelo examinador quando realiza esta
manobra, se deve à redução brusca da subluxação
anterior do cándilo externo, o que é possível devido à ruptura do LCPI.
O teste em rotação externa, valgo e flexão
(fig. 2-214) se explora com a mesma manobra,
porém partindo da máxima extensão: o ressalto
que se percebe quando a flexão atinge os 30°
corresponde (fig. 2-212) à subluxação anterior
(SLA) do côndilo externo que pula bruscamente
(S) de sua posição normal (seta 2) na pendente
posterior da glenóide externa a uma posição anormal (seta 1) na vertente anterior, o que é possível
graças à ruptura do LCPI.
Outros três testes permitem diagnosticar uma
lesão da camada fibrotendinosa póstero-externa (o
PAPE) e do LLE em ausência de ruptura do LCPI.
O teste da gaveta póstero-externo ou póstero-Iateral drawer test de Hughston: os pés se apóiam planos na mesa de exame, os quadris fiexionados
45° e os joelhos 90°. Sentando-se sobre o pé do paciente, o examinador pode bloquear a rotação do
joelho sucessivamente em rotação neutra, externa
15° e interna 15°. Segurando com ambas as mãos a
porção superior da tíbia, se procura uma gaveta posterior em suas três posições. O teste é positivo quando se aprecia !lma sublu.xação póstero-externa do
platá tibial externo, enquanto o platõ interno não
recua - é, portanto, uma verdadeira gaveta rotatória - pela rotação externa do pé. Esta gaveta rotatória externa se detém em rotação neutra e desaparece
em rotação interna pela tensão do LCPI intacto.
O teste em hipermobilidade
externa de
Bousquet ou HME se explora com o joelho flexionado em 60°; ao acrescentar uma pressão na porção superior da tíbia para tentar que se deslize para baixo e para trás dos côndilos, se percebe um
ressalto posterior enquanto o pé gira em rotação
externa. Portanto, também neste caso se. trata de
uma verdadeira gaveta rotatória externa.
O teste de recurvatum e rotação externa se
pode explorar de duas formas, procurando, em ambos os casos. um bom relaxamento do quadríceps:
- em extensão: ambos os membros inferiores, segurados pela parte anterior do pé. se
elevam em extensão, o que comporta, no
membro lesado, um recurvatum e uma rotação externa, representados por um deslocamento da tuberosidade tibial anterior
(TTA) para fora; a subluxação póstero-externa do platô tibial externo conduz a um
genu varo.
- em flexão: enquanto uma mão segura o pé
e dirige progressivamente o joelho para a
extensão, a mão que mantém o joelho percebe a subluxação póstero-externa da tíbia
representada por um recurvatum, um genu
varo e um deslocamento para fora da tuberosidade tibial anterior.
Todos estes testes, com freqüência difíceis de
demonstrar em um paciente acordado, com um relaxamento muscular imperfeito, aparecem nitidamente sob anestesia geral.
2. MEMBRO INFERIOR
Fig.2-211
Fig.2-214
'-Fig.2-210
Fig.2-213
145
146 FISIOLOGIA ARTICULAR
OS MÚSCULOS EXTENSORES DO JOELHO
o quadríceps crural é o músculo extensor do joelho. Trata-se de um músculo potente:
sua superfície de secção fisiológica é de 148
cm2, o que num trajeto de 8 em lhe confere uma
potência de trabalho de 42 kg. O quadríceps é
três vezes mais potente do que os flexores; o fato da sua luta contra a gravidade o explica. Entretanto, vimos que quando o joelho está em hiperextensão a ação do quadríceps não é necessária para manter a posição de pé (ver pág. 120);
porém quando se inicia uma mínima flexão, uma
intervenção enérgica do quadríceps é necessária
para evitar a queda por flexão do joelho.
O quadríceps (fig. 2-215) é constituído, como o seu nome o indica, por quatro corpos musculares que se inserem por um aparelho extensor, na tuberosidade tibial anterior (TTA):
- três músculos monoarticulares: o crural
(Cr), o vasto externo (VE) e o vasto interno (VI);
- um músculo biarticular: o reto anterior
(RA), cuja fisiologia, um tanto específica, será analisada na página seguinte.
Os três músculos monoarticulares são somente extensores do joelho, embora tenham um
componente lateral, no que se refere a ambos os
vastos; é necessário destacar, falando no vasto
interno, que é mais potente do que o externo,
desce mais para baixo e que seu relativo predonúnio está destinado a opor-se à tendência que a
patela tem para luxar-se para fora. A contração
de ambos os vastos, geralmente equilibrada, engendra uma força resultante dirigida para cima,
no eixo da coxa. Todavia, se um dos vastos predominasse sobre o outro, como seria o caso de
um vasto externo predominante sobre um vasto
interno insuficiente, a patela se "escaparia" para
fora: este é um dos mecanismos causadores da
luxação recidivante da patela, que sem dúvida
alguma é sempre externa. Pelo contrário, é possível evitar a subluxação externa da patela reforçando seletivamente o vasto interno.
A patela é um osso sesamóide que pertence
ao aparelho extensor do joelho entre o tendão
quadricipital por cima e o ligamento meniscopatelar por baixo. Sua função é primordial, visto que aumenta a eficácia do quadríceps deslocando para diante a sua força de tração. Somente devemos traçar o esquema das forças com e
sem patela para estar convencido deste fato.
A força Q do quadríceps efetuada sobre a
patela (fig. 2-216) se pode decompor em dois
vetores: uma ~orça Ql' dirigida para o eixo de
flexão-extensão, que encaixa a patela na tróc1ea,
e uma força Q2' qirigida no prolongamento do
ligamento menisco-patelar. Por sua vez, esta
força Q2' aplicada sobre a tuberosidade anterior
da tíbia pode decompor-se em dois vetores perpendiculares entre eles: uma força Q3 dirigida
para o eixo de flexão-extensão, que encaixa a tíbia sobre o fêmur, e uma força tangencial Q4'
único componente eficaz para realizar a extensão: faz com que a tíbia se deslize para diante
sobre o fêmur.
Se a patela é extirpada - operação denominada "patelectomia" - e se segue o mesmo
raciocínio (fig. 2-217): a força Q do quadríceps,
supondo que seja idêntica, se dirige tangencialmente para a tróc1ea e diretamente sobre a tuberosidade tibial anterior; se pode decompor em
dois vetores: Q5' força de coaptação que encaixa
a tíbia sobre o fêmur, e Q6' força eficaz para a
extensão; o componente tangencial Q6 diminui
consideravelmente enquanto o componente centrípeto Q5 aumenta.
Se compararmos agora as forças eficazes
em ambas as hipóteses (fig. 2-218), se pode
constatar que Q4 é 50% maior que Q6: a pate/a,
afastando o tendão quadricipital como um cavalete, aumenta nitidamente a eficácia do quadríceps. Também se pode constatar que na ausência
de patela a força de coaptação Q5 aumenta, porém este efeito favorável é contrariado pela perda de amplitude da fiexão, devido tanto ao encurtamento do aparelho extensor, quanto à sua
fragilidade. Assim, a patela é muito útil, o que
explica a má reputação e a escassa freqüência da
patelectomia.
2. MEMBRO INFERIOR 147
Fig.2-216
Fig.2-215
Fig.2-217
148
FISIOLOGIA
ARTICULAR
FISIOLOGIA DO RETO ANTERIOR
o reto anterior somente representa a quinta
parte da força total do quadríceps e não pode
realizar a extensão máxima sozinho, porém o fato de ser um músculo biarticular lhe confere um
interesse especial.
Graças a seu trajeto para diante do eixo de
flexão-extensão do quadril e do joelho, o reto
anterior é tanto flexor do quadril quanto extensor do joelho (fig. 2-220), porém sua eficácia como extensor de joelho depende da posição do
quadril, assim como a sua ação como flexor do
quadril está relacionada com a posição do joelho. Isto se deve (fig. 2-219) a que a distância
entre a espinha ilíaca ântero-superior (a) e a
margem superior da tróclea é menor em flexão
(ab) do que em extensão (ab). Esta diferença de
comprimento (e) determina um alongamento relativo do músculo quando o quadril está em flexão e o joelho se flexiona sob o peso da perna
(lI); nestas condições, para obter a extensão do
joelho (lU), os outros três fascículos do quadríceps são muito mais eficazes que o reto anterior,
já distendido pela flexão do quadril.
Pelo contrário, se o quadril passa de uma
posição de alinhamento normal (I) à extensão
(IV), a distância entre as duas inserções do reto anterior aumenta (ad) um certo comprimento (f) que contrai o reto anterior (encurtamento relati vo), e aumenta outro tanto a sua eficácia. Isto é o que acontece durante a marcha ou
a corrida, ao distender o membro posterior
(fig. 2-223): pela ação dos glúteos o quadril se
estende, enquanto o joelho e o tornozelo também se estendem; assim, o quadríceps desenvolve a sua máxima potência, graças à eficácia
aumentada do reto anterior. O glÚteo máximo é
sinérgico-antagonista do reto anterior: antagonista no que diz respeito ao quadril e sinérgico no joelho.
Na fase de apoio unilateral da marcha,
quando o membro oscilante avança (fig. 2-222),
o reto anterior se contrai para realizar a flexão do
quadril e a extensão do joelho ao mesmo tempo.
Então, constata-se que a condição biarticular do
reto anterior é útil nos dois tempos da marcha:
na fase de impulso do membro posterior e na fase de avanço do merp.bro oscilante.
Durante a ação de ficar de pé, partindo da
posição de cócoras, o reto anterior desempenha
um papel muito importante, visto que é o único
dos quatro fascículos do quadríceps que não perde sua eficácia durante o movimento. De fato,
enquanto o joelho se estende, o quadril, sob a
ação do glúteo máximo, também se estende, novamente o reto anterior se contrai na sua inserção superior, conservando assim um comprimento constante no início da ação. Neste caso se
constata outra vez a função exercida como transmissor de força por um músculo potente da raiz
do membro, o glúteo máximo, sobre uma articulação mais distal, o joelho, por um músculo biarticular, o reto anterior.
Finalmente, ao contrário, a flexão do joelho
sob a ação dos ísquio-tibiais favorece a flexão do
quadril pelo reto anterior. Isso pode ser útil no
salto, com os joelhos flexionados (fig. 2-221): os
retos anteriores possuem muita eficácia na flexão
dos quadris. É outro exemplo da relação antagonismo-sinergia entre os ísquio-tibiais, que são flexores do joelho e extensores do quadril, e o reto
anterior, flexor do quadril e extensor do joelho.
2. MEMBRO INFERIOR
Fig.2-219
Fig.2-223
-
Fia. 2-222
Fig.2-221
149
150 FISIOLOGIA ARTICULAR
OS MÚSCULOS FLEXORES DO JOELHO
Os fiexores do joelho formam parte do
compartimento posterior da coxa (fig. 2-224);
se trata dos músculos ísquio-tibiais: bíceps CfUral (B), semitendinoso (ST), semimembranoso
(SM), os músculos da "pata de ganso": reto interno (Ri), sartório (Sa) e o semitendinoso (que
também forma parte dos ísquio-tibiais), o poplíteo (ver pág. seguinte); os gêmeos (Ge) não são
realmente fiexores do joelho, mas sim extensores do tornozelo (ver pág. 218).
Contudo, os gêmeos desempenham um papel importante na estabilização do joelho: se inserem por cima dos côndilos, quando se contraem, durante a fase do passo, isto é, quando o
joelho e o tornozelo se estendem ao mesmo tempo, deslocam os côndilos para frente, de forma
que são antagonistas-sinergistas do quadríceps.
Todos estes músculos, exceto dois, são biarticulares: a porção curta do bíceps e o poplíteo que são monoarticulares (ver página seguinte). Portanto, os fiexores biarticulares possuem
uma ação simultânea de extensão do quadril e
sua ação sobre o joelho depende da posição do
quadril.
O sartório (Sa) é fiexor, abdutor e rotador
externo do quadril, ao mesmo tempo que éfiexor
e rotador interno do joelho.
O reto interno (Ri) é principalmente adutor e
acessório da fiexão do quadril, ao mesmo tempo
que é fiexor do joelho, de maneira que também
forma parte dos ratadores internos (ver pág. 152).
Os ísquio-tibiais são tanto extensores do
quadril (ver pág. 52) quanto flexores do joelho,
e sua ação no joelho está condicionada pela posição do quadril (fig. 2-225). Quando o quadril
se flexiona, a distância ab que separa as inserções destes músculos aumenta regularmente,
visto que o centro do quadril O, ao redor do
qual o fêmur gira, não se confunde com o pon-
to a, ao redor do qual se orientam; deste modo,
quanto mais se flexiona o quadril, maior é o encurtamento relativo dos ísquio-tibiais e mais se
contraem. Quando o quadril está flexionado
40° (posição lI), o encurtamento relativo ainda
pode ser compensado pela flexão passiva do
joelho (ab = ab'), porém no caso de uma flexão
de 90° (posição lU) o encurtamento relativo é
tal, que emboHl o joelho esteja flexionado em
ângulo reto, ainda persiste um encurtamento
relativo importante (f). Se a flexão do quadril
ultrapassa os 90° (posição IV), é muito difícil
manter os dois joelhos (fig. 2-226) em máxima
extensão: a elasticidade dos músculos, que diminui bastante com a falta de exercício, quase
não absorve o encurtamento relativo (g). A entrada em tensão dos ísquio-tibiais pela fIexão do quadril aumenta a sua eficácia como
fIexores do joelho: quando, no percurso de
uma escalada (fig. 2-227), um dos membros inferiores avança, a flexão do quadril favorece a
flexão do joelho. Ao contrário, a extensão do
joelho favorece a ação dos ísquio-tibiais como
extensores do quadril: é o que se produz durante os esforços de endireitamento do tronco a
partir de uma posição de inclinação para frente
(fig. 2-226), e também durante a escalada,
quando o membro inferior, situado anteriormente, passa a ser posterior.
Se agora (fig. 2-225), o quadril se estende
completamente o quadril (posição V), os ísquiotibiais se alongam relativamente (e), o que explica que a fiexão do joelho seja menos intensa
(ver figo2-13); isso ressalta a utilidade dos músculos monoarticulares (poplíteo e porção curta
do bíceps), que conservam a mesma eficácia independentemente da posição do quadril.
A potência global dos fiexores do joelho é
de 15 kg, ou seja, um pouco mais de um terço da
do quadríceps.
2. MEMBRO INFERIOR
Fig.2-224
Fig.2-226
Fig.2-227
151
152 FISIOLOGIA ARTICULAR
OS MÚSCULOS ROTADORES DO JOELHO
Os flexores do joelho são, ao mesmo tempo, os seus rotadores; se dividem em dois grupos segundo o seu ponto de inserção na perna
(fig. 2-228):
-
-
os que se inserem por fora do eixo vertical XX' de rotação do joelho: são os
rotadores externos (RE), representados
(fig. 2-231) pelo bíceps (B) e o tensor
da fáscía lata (TFL). Quando deslocam
a parte externa do platá tibial para trás
(fig. 2-229), fazem o joelho girar de tal
forma que a ponta do pé se dirige diretamente para fora. O tensor da fáscia lata
só age como flexor-rotador externo
quando o joelho está flexionado; num
joelho totalmente estendido, perde a sua
ação de rotação para transformar-se em
extensor: "bloqueia" a extensão. A porção curta do bíceps (fig. 2-232, B ') é o
único músculo rotador externo monoartiCldar; o que significa que a posição do
quadril não repercute em absoluto sobre
a sua ação.
os que se inserem por dentro do eixo
vertical XX' de rotação do joelho: são
os rotadores internos (RI), representados (fig. 2-231) pelo sartório (Sa), o semitendinoso (ST), o semimembranoso
(SM), o vasto interno (VI) e o poplíteo
(fig. 2-232, Pop). Quando deslocam para trás a parte interna do platá tibial (fig.
2-230), o joelho gira de tal forma que a
ponta do pé se dirige para dentro. Agem
como freios da rotação externa com o
joelho flexionado, de forma que protegem os elementos cápsulo-ligamentares
quando estes são requeridos violentamente durante um giro inesperado para
o lado oposto ao da perna que suporta o
peso. O poplíteo (fig. 2-234, vista posterior) é a única exceção desta disposição
geral: se insere na face posterior da porção proximal da tíbia, para penetrar, a
seguir, na cápsula do joelho debaixo da
ogiva que forma o ligaj1lento poplíteo
arqueado (ver também figo2-147); antes
de que isso aconteça, ele envia uma expansão que se insere na margem posterior do menisco externo; no interior da
cápsula
-porém para fora da sinovialse desliza entre o ligamento lateral externo e o
menisco externo (fig. 2-232) para terminar fixando-se no fundo de uma fosseta
que ocupa a parte inferior da superfície
cutânea do cándilo externo. É o único
rotador interno monoarticular, de forma
que a sua ação não está influenciada pela posição do quadril. Esta ação pode ser
compreendida com facilidade por uma
vista superior do platô tibial (fig. 2233): o poplíteo (seta preta) desloca a
parte posterior do platá tibial para fora.
Embora esteja situado por trás da articulação, o poplíteo é extensor do joelho: durante a
flexão, a fosseta de inserção do poplíteo se desloca para cima e adiante (fig. 2-232), estendendo
o músculo e reforçando a sua ação como rotador
interno. Pelo contrário, quando se contrai com o
joelho flexionado e, especialmente, em rotação
externa, desloca a fosseta para baixo e atrás, provocando um deslizamento do cándilo externo para a extensão. Em resumo, o poplíteo é tanto extensor quanto rotador interno do joelho.
Em conjunto, o grupo dos rotadores internos é mais potente (2 kg) do que o grupo dos rotadores externos (1,8 kg); porém, esta diferença
não tem muita importância.
Fig.2-232
Fig.2-234
RE
Fig.2-230
Fig.2-229
154 FISIOLOGIA ARTICULAR
A ROTAÇÃO AUTOMÁTICA DO JOELHO
Já vimos (ver pág. 84) que o fim da extensão
se acompanha de uma ligeira rotação externa e
que o início daflexão não é possível sem uma ligeira rotação interna, e tudo isso de forma automática, sem intervenção de nenhuma ação voluntária.
Esta rotação automática é evidente numa preparação anatômica com a experiência de Round:
-
-
-
-
duas varetas transversais e horizontais, paralelas entre si quando o joelho está em extensão, são introduzidas (fig. 2-235, vista superior) no platô tibial e no maciço condiliano;
se o fêmur se flexiona sobre a tíbia
(fig. 2-236), que permanece fixa, se pode
comprovar como o eixo do fêmur se inclina para trás e para dentro (o desenho
representa um joelho direito); no caso de
uma flexão de 90°, pode-se constatar que
ambas as varetas formam, no plano horizontal, um ângulo de 30° aberto para fora e para trás (Roud propõe 45°);
quando o eixo do fêmur numa direção sagital se situa outra vez (fig. 2-237) podese observar que a vareta tibial se orienta
nesta situação de dentro para fora e de trás
para diante; o que indica uma rotação interna da tíbia sobre o fêmur. Esta vareta
forma um ângulo de 20° com a perpendicular ao eixo do fêmur. Portanto, a ftexão
do joelho se acompanha de uma rotação
interna automática de 20°. A diferença
de 10° se deve a que a vareta femoral (não
ilustrada aqui), por causa do valgo fisiológico do joelho, não é perpendicular ao eixo diafisário, mas sim que forma com ele
um ângulo de 80° (ver figo 2-3);
esta experiência também pode ser realizada
no sentido inverso: partindo de uma posição de ftexão em ângulo reto, em que as varetas divergem (fig. 2-236), para alcançar a
máxima extensão na qual as varetas são paralelas (fig. 2-235): deste modo se evidencia uma rotação externa automática contemporânea da extensão do joelho.
A rotação interna da tíbia aparece porque durante a ftexão do joelho (fig. 2-238) o côndilo externo recua mais do que o interno: com o joelho
estendido, os pontos de contato a e b estão alinhados sobre uma transversal Ox; a ftexão provoca o
retrocesso do côndilo interno de a para a' (5-6 mm)
e do côndilo externo de b para b' (10-12 mm); os
pontos de contato a' e b' que correspondem à flexão estão alinhados sobre Oy que junto com Ox
formam um ângulo xOy de 20°. Para que Oy esteja transversal, é necessário que a tíbia realize uma
rotação interna de 20°.
Este retrocesso diferencial dos côndilos se deve a três fatores:
1) A desigualdade
do desenvolvimento do
contorno condiliano (figs. 2-239 e 2-240).
Quando se desenvolvem as superfícies articulares do côndilo interno (fig. 2-239) e
se comparam com o desenvolvimento das
superfícies do côndilo externo (fig. 2-240)
pode-se constatar que o desenvolvimento
bd' da curvatura posterior do côndilo externo é um pouco maior do que o do interno (ac' = bc'). Isso explica, em parte, que o
côndilo externo rode mais do que o interno.
2) A forma das glenóides: o côndilo interno
recua pouco, visto que está dentro de uma
glenóide côncava (fIg. 2-241), enquanto o
côndilo externo se desliza sobre a vertente posterior da glenóide externa convexa
(fIg. 2-242).
3) A orientação dos ligamentos laterais:
quando os côndilos recuam sobre as glenóides, o ligamento lateral interno entra
em tensão mais rapidamente (fig. 2-241)
que o externo (fig. 2-242); deixando este
último ao côndilo externo mais margem de
retrocesso, devido à sua obliqüidade.
Além disso, existem pares de rotação:
-
a ação predominante dos músculos ftexores-rotadores internos (fig. 2-243), músculos da "pata de ganso" (seta preta) e poplíteo (seta branca);
-
a tensão do ligamento cruzado ântero-extemo no fim da extensão (fig. 2-244): o ligamento passa por fora do eixo, de forma
que a sua tensão provoca uma rotação externa.
2. MEMBRO INFERIOR
155
Fig.2-236
x
Fig.2-237
o .------:
y
Fig.2-238
RI
Fig.2-239
Fig.2-240
RE
Fig.2-244
Fig.2-241
Fig.2-242
156
FISIOLOGIA ARTICULAR
o EQUILÍBRIO
DINÂMICO DO JOELHO
Ao final deste capítulo, parece que a estabilidade do
joelho, articulação frouxamente encaixada, se mantém
graças a um milagre constante. É por este motivo que tentamos expor num esquema sinóptico (fig. 2-245) os principais testes com relação às estruturas implicadas. A escolha destes testes pode gerar discusão, assim como a sua
interpretação, embora se baseie nas publicações mais recentes. De todo modo, devemos ser conscientes de que se
trata de uma classificação provisória.
9)
A gaveta posterior em rotação interna seria
um sinal específico da ruptura do LCPI associada a uma lesão da CFTPl (PAP/).
10)
Um movimento de lateralidade em extensão,
de forma que provoque um ligeiro valgo (+)
corresponde a uma ruptura do LLI; quando o
valgo é mais acentuado (++) indica uma lesão
associada da convexidade condiliana intema:
por último, quando é muito acentuada (+++)
existe, além disso, uma ruptura do LCAE.
11)
Um movimento de lateralidade externa em
ligeira ftexão (10-30°) indica uma ruptura associada do LU, da convexidade condiliana interna e da CFTPI, assim como uma lesão do
corno posterior do menisco interno.
12)
Um movimento de lateralidade interna em
extensão indica, quando existe um varo moderado (+), uma ruptura do LLE que pode estar
ou não associada a uma ruptura da banda de
Maissiat, e quando é acentuado (++), uma ruptura associada da convexidade condiliana externa e da CFTPE (PAPE).
13)
Um movimento de lateralidade interna em
ligeira ftexão (I 0- 30°) indica as mesmas lesões
que no caso anterior, porém sem que a ruptura
da banda de Maissiat esteja associada.
14)
O teste de recurvatum, rotação externa e
valgo ou inclusive o teste de suspensão do dedo polegar do pé indicam uma ruptura associada do LLE e da CFTPE (PAPE).
1) A gaveta anterior em rotação neutra, ou gaveta "direta", pode existir, em menor grau, de
forma fisiológica; portanto, sempre será necessário comparar com o lado supostamente normal. Contudo, quando seu sinal é claro (+)
diagnostica uma ruptura do LCAE. Quando ele
é muito acentuado, se une uma ruptura do LLI
à anterior. Porém, cuidado com uma falsa gaveta anterior que corresponderia à redução de
uma subluxação posterior espontânea por ruptura do LCPI!
2)
3)
4)
5)
A gaveta anterior em rotação interna de
15° constitui um sinal claro de ruptura do
LCAE que pode estar unido com uma lesão
da CFTPE (camada fibrotendinosa pósteroexterna ou PAPE).
A gaveta anterior em rotação interna de
30° traduz uma ruptura do LCAE associada à
do LCPI, e quando se percebe um ressalto se
associa a uma desinserção do corno posterior do menisco externo.
O ressalto externo em valgo, rotação interna
e ftexão, ou lateral pivot shift de Mac-Intosh e
o jerk test de Hughston são sinais claros de
ruptura do LCAE.
A gaveta anterior em rotação externa,
quando é moderado (+) indica uma lesão da
CFTPE (PAPE), e se pode-se perceber um
ressalto se associa a uma desinserção do corno posterior do menisco interno.
Para entender a mecânica do joelho é necessário
compreender que o joelho em movimento realiza um
equilíbrio dinâmico e, principalmente, abandonar a idéia
de um equil1brio de dois termos, como o dos dois pratos
de uma balança. Contudo, uma tábua de vela (fig. 2-246)
é muito mais representativa, visto que corresponde a um
equilíbrio de três termos:
-
o mar, que segura a tábua, corresponde à ação
das supeifícies articulares;
veta posterior direta é o sinal infalível da ruptura do LCPl.
-
o vento, que bate na vela, é a força motora, ou
seja, os músculos;
7) O ressalto externo em valgo, rotação externa
-
o indivíduo, que dirige o movimento pelas suas
constantes reações em função do vento e do mar.
corresponde ao sistema ligamentar.
6) A gaveta posterior em rotação neutra ou ga-
e extensão ou pivot shift reverse test, assim como o ressalto externo em valgo, rotação externa e flexão, indicam uma ruptura do LCPI.
8)
A gaveta posterior em rotação externa traduz uma lesão da CFTPE (PAPE), podendo-se
associar a uma ruptura do LCPI.
O funcionamento do joelho está determinado, em
todo momento, pelas reações mútuas e equilibradas destes três fatores, superfícies articulares, músculos e ligamentos em equilíbrio dinâmico trilateral.
2. MEMBRO INFERIOR
(j)
Res. VURI/FL
@
(Lateral Pivot Shift)
Res. VURI/EX
//
++
TA/R0(Direto)
®
""±
+
157
"\
TAlRE
+çj
+
+
LAT.INT.
EXT
Y
+-;;@
DI
'@VUREC/RE
(Suspensão)
@ TP/R0 (Direto)
Fig.2-245
I
Res. VURE/EX
(J)
(Pivot Shift Reverse Test)
Res VURE/FL
Fig.2-246
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ojoelho é a articulação intermédia do mem- bro inferior. É