UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO “A VEZ DO MESTRE”
DOCÊNCIA SUPERIOR
PROJETO GENOMA
JONAS EDUARDO RODRIGUES
ORIENTADOR:
Prof. Mestre Robson Materko
RIO DE JANEIRO
DEZ - 2001
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO “A VEZ DO MESTRE”
DOCÊNCIA SUPERIOR
PROJETO GENOMA
JONAS EDUARDO RODRIGUES
Trabalho monográfico apresentado como requisito
parcial para a obtenção do Grau de Especialista em
Docência Superior.
RIO DE JANEIRO
DEZ - 2001
3
À Deus por sua infinita misericórdia.
A minha esposa e filhos.
4
AGRADECIMENTOS
Às amigas Eurídice, Fátima Rodrigues, Fátima
Naame e Heloisa Heleno, Pelo apoio irrestrito durante
todo o curso.
5
RESUMO
O Projeto Genoma Humano (PGH), com uma precisão de durabilidade de 15 anos,
iniciou-se formalmente nos Estados Unidos em 1990. Em seguida, vários outros países,
incluindo o Brasíl, passaram a participar desse projeto. Seus objetivos básicos são o
mapeamento dos genes humanos e o seqüenciamento de todo o nosso genoma. O PGH tem se
desenvolvido muito rapidamente e algumas das metas propostas, como o mapa genético de
marcadores, já foram atingidas. Igualmente, estão sendo observados os efeitos dos novos
conhecimentos adquiridos pelo PGH no diagnóstico de doenças genéticas, bem como na
identificação de novos genes.
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO
07
2. CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS A RESPEITO DA EVOLUÇÃO DAS
IDÉIAS DE HEREDITARIEDADE
2.1 O pré formismo - século XVII
2.2 A herança pelo sangue
2.3 Mendel e os fatores hereditários
2.4 A teoria cromossômica da herança - década de 20
08
09
09
10
10
3. O PROCESSO HISTÓRICO DO PROJETO GENOMA
3.1 Cronologia
13
20
4. O PROJETO GENOMA
4.1 Definição do termo “genoma”
4.2 Mapeamento dos genes
4.3 Sequenciamento dos genes
4.4 Pós genoma
23
24
25
26
28
5. AS QUESTÕES ÉTICAS
30
6. CONCLUSÃO
33
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
35
ANEXO
36
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1. INTRODUÇÃO
Um dos maiores e mais ambiciosos projetos científicos de todos os tempos é o Projeto
Genoma Humano. Este projeto envolve principalmente a sociedade científica e o governo
americano. A principal meta do projeto é a determinação da localização (locus) e estrutura
(sequência de nucleotídeos) de todos os genes encontrados em nossos cromossomos. Este
projeto estará, como tudo indica, concluído nos primeiros anos do próximo século.
Uma vez que os experimentos envolvendo genética humana são particularmente
complicados por questões éticas e uma vez também que muito do nosso conhecimento de
genética é oriundo de observações feitas em outros organismos, o Projeto Genoma Humano
inclui não somente o seqüenciamento do genoma humano mas também de outros organismos
de interesse experimental. Hoje em dia os mapas do genoma humano já possuem milhares de
pedaços de DNA conhecidos (localização e estrutura).
Os mapas dos genes humanos nos permitem localizar genes de importância médica,
genes que, por exemplo, causam doenças específicas. E com o Projeto Genoma Humano os
cientistas serão capazes de identificar os genes responsáveis por problemas mais complicados
como obesidade e problemas do coração.
O Projeto Genoma Humano é a maior prova do poder que a biologia moderna conquistou
enquanto ciência prática e também teórica. Uma vez que o projeto tem como principal alvo os
genes humanos, o andamento deste traz também a necessidade que a sociedade discuta os
limites de tal empreitada.
Até onde queremos saber quando o conhecimento sobre nossos genes pode,
potencialmente, nos limitar o acesso a um seguro de saúde ou mesmo um emprego? Com a
conclusão do projeto saberemos que independente do fato de parecermos fortes e sadios todos
nós possuímos genes deletérios estando todos sob o risco da discriminação.
O maior desafio do Projeto Genoma Humano ainda está na definição de como o
conhecimento adquirido ao longo da realização do mesmo será utilizado pela sociedade de um
modo geral. Este conhecimento pode ser utilizado de modo positivo, a favor do indivíduo ou
pode atuar no sentindo oposto, criando uma nova ética social.
8
2. CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS A RESPEITO DA EVOLUÇÃO DAS IDÉIAS
DE HEREDITARIEDADE
A pangênese foi a primeira hipótese de que se tem notícia sobre hereditariedade.
Proposta em 410, por Hipócrates - médico e filósofo grego (460 a.C. - 377 a.C ) - conhecido
como o "pai" da Medicina e também como um dos "pais" da Genética. Segundo a pangênese,
cada órgão ou parte do corpo de um organismo vivo produziria partículas hereditárias
chamadas gêmulas, que seriam transmitidas aos descendentes no momento da concepção.
Essas gêmulas, produzidas e provenientes de todas as partes do corpo, migrariam para o
sêmen e seriam passadas para os filhos. O novo ser construiria seu corpo a partir das gêmulas
recebidas dos pais. Esse método de investigação científica não é correto, mas tem valor, pois
Hipócrates foi capaz de identificar o problema a ser investigado, talvez o passo mais difícil do
procedimento científico, propondo uma hipótese criativa e plausível para a herança dos
caracteres. Essa explicação foi aceita até o final do século XIX. Charles Darwin chegou a
adotá-la como explanação para a hereditariedade, o que, mais tarde, trouxe críticas à sua
teoria evolucionista.
Aproximadamente um século depois de Hipócrates, Aristóteles escreveu um tratado
em que falava sobre o desenvolvimento e hereditariedade dos animais. Nesse, ele defendia a
existência, no sêmen do pai, de algum tipo de substância responsável pela herança.
Descartava, assim, certas idéias então vigentes, que atribuíam as semelhanças entre pais e
filhos exclusivamente a causas espirituais e emocionais. Aristóteles fez diversas críticas à
pangênese. Segundo ele, essa hipótese não explicava como uma pessoa podia herdar
características presentes nos avós, mas ausentes em seus pais. O exemplo em que Aristóteles
se baseou foi o de uma mulher branca, casada com um homem negro, cujo filho era branco, e
o neto tinha pele quase negra.
Os antigos sabiam da importância do líquido seminal dos machos para o nascimento
dos filhotes, porém, desconheciam como a fêmea participava do processo. A dúvida sobre a
participação efetiva das fêmeas dos mamíferos na reprodução provinha do fato de se ignorar,
que também elas, como as aves e os peixes, produzem óvulos. Essa ignorância permaneceu
9
até 1672, quando o holandês Graaf, dissecando fêmeas de várias espécies de mamíferos,
descobriu que, na época da reprodução, apareciam pequenos inchaços na superfície de seus
ovários.
Em 1667, o microscopista holandês Antonie van Leeuwenhoek (1632 - 1723)
descobriu que o sêmen expelido pelos machos no ato sexual continha milhares de criaturas
microscópicas, que nadavam freneticamente: os espermatozóides. Ele imaginou que os
espermatozóides podiam ter relação com o nascimento de um novo ser, penetrando no ovo e
estimulando seu desenvolvimento. Essa idéia, confirmada 2 séculos mais tarde, foi
inicialmente contestada por muitos cientistas, que achavam que os espermatozóides eram
simplesmente micróbios parasitas que se desenvolviam no sêmen.
2.1 O pré formismo - século XVII
Os microscópios eram ainda precários e suas imagens de má qualidade. Apesar disso,
alguns pesquisadores, usando a força da imaginação, julgaram ter visto um pequeno indivíduo
no interior de cada espermatozóide. Surgia, assim, a hipótese pré-formista, ou pré-formismo,
segundo a qual o espermatozóide continha, em seu interior, um ser microscópico totalmente
formado. Curiosamente, havia também aqueles que advogavam a presença de um ser préformado no óvulo, e não no espermatozóide. Com o desenvolvimento dos microscópios, o
pré-formismo foi descartado.
Em meados do século XIX foi demonstrado que os espermatozóides penetram no
óvulo, confirmando a antiga previsão de Leeuwenhoek. Logo em seguida, estudos
microscópicos mostraram que os espermatozóides se originam de células presentes nos finos
túbulos que formam os testículos.
A ligação entre estas e outras descobertas foi consolidando a idéia de que um novo ser
surge sempre da união de duas células, os gametas (do grego gamos, união, casamento ), uma
fornecida pelo pai - o espermatozóide - e outra fornecida pela mãe - o óvulo.
2.2 A herança pelo sangue
A noção de que os caracteres hereditários são transmitidos aos filhos através do sangue
existe desde a Antiguidade e estende-se até o século XIX. Daí provêm expressões que usamos
10
até hoje, como casamento consangüíneo, para indicarmos a união entre pessoas da mesma
família; cavalo puro-sangue, quando nos referimos a um cavalo de raça; pessoa com sangue
índio, para dizermos que alguém tem ancestrais índios.
2.3 Mendel e os fatores hereditários
Em 1865, o monge austríaco Gregor Mendel concluiu que cada característica era
determinada por um par de fatores hereditários. No momento de formar gametas, os fatores se
separavam (segregavam), de modo que o gameta era portador de apenas um fator relativo a
cada característica. Na época em que foram publicados, os trabalhos de Mendel não tiveram o
devido reconhecimento. Cerca de 35 anos depois, no início do século XX, as idéias
enunciadas por Mendel foram redescobertas, lançando as bases da Genética. Somente em
1900, depois da morte de Mendel, três outros cientistas, Correns, Tshermak e De Vries, de
forma independente, confirmaram através de experimentos os resultados e as conclusões de
Mendel.
2.4 A teoria cromossômica da herança - década de 20
No início do século XX os fatores hereditários idealizados por Mendel foram
localizados: estavam nos cromossomos de todas as células. Na década de 1920, consolidavase a teoria cromossômica da herança, segundo a qual os fatores hereditários, já então
denominados genes, se distribuíam ao longo do comprimento dos cromossomos. Muitos
genes começaram a ser localizados, mapeados e estudados através das análises de
cruzamentos experimentais. Surgia, assim, a Genética moderna.
- A descoberta do material hereditário
Na década de 1940 foram obtidas as primeiras evidências de que a substância
hereditária era o ácido desoxirribonucléico, conhecido pela sigla DNA.
Em 1953, James Watson e Francis Crick propuseram o famoso modelo da dupla-hélice
para a molécula de DNA, que explicava as características dessa substância como material
constituinte dos genes.
11
- A decifração do código genético
Na década de 1960 os cientistas descobriram que os genes contêm instruções escritas
em uma espécie de código molecular, o código genético.
Atualmente já é possível isolar genes de um organismo e transplantá-los para outro,
onde esses genes podem vir a funcionar. Isso é feito através da Engenharia Genética. A
Engenharia Genética, mais apropriadamente chamada tecnologia do DNA recombinante, é um
conjunto de técnicas que permite aos cientistas identificar, isolar e multiplicar genes dos mais
diversos organismos. Espera-se que, até o final do século XX, esse procedimento responda
muitas questões teóricas e práticas da Biologia ajudando a humanidade a melhorar a qualidade
de vida.
- O Projeto Genoma Humano
A Engenharia Genética ou tecnologia do DNA recombinante, é o conjunto de técnicas
que permite aos cientistas identificar, isolar e multiplicar genes dos mais diversos organismos.
Algumas dessas importantes aplicações já podem ser executadas na prática:
-
a insulina foi a primeira proteína humana produzida em células de bactéria (transgênica ) e
aprovada, em 1985, para uso em pacientes diabéticos.
-
tornou possível clonar o gene humano para somatotrofina e induzir bactérias
(transgênicas) a produzirem esse hormônio de crescimento, liberado comercialmente em
1985.
-
linfócitos (glóbulos brancos) produzem anticorpos monoclonais (puros); esses, além da
utilização na cura de certas doenças, têm se revelado auxiliares preciosos nos diagnósticos
médicos para testes de gravidez (em baixíssima concentração), detecção de meningite (em
poucos minutos), diagnóstico de câncer de próstata (detecta antígeno específico,
produzido pelas células cancerosas); "no futuro", os anticorpos monoclonais poderão
funcionar como "tiro ao alvo" contra células cancerosas, reduzindo ou eliminando a
necessidade de quimioterapia.
-
vacina contra hepatite - o gene do vírus responsável pela produção desse antígeno de
superfície foi isolado e em seguida enxertado em célula de leveduras de cerveja
(transgênicas) - Saccharomyces cerevisiae. A levedura assim transformada é cultivada em
laboratório e produz grandes quantidades da proteína desejada. Essa é a primeira vacina
feita por Engenharia Genética em quantidade suficiente para sua comercialização.
-
fornece recursos para a transferência de genes de uma espécie para outra, com produção
de organismos chamados transgênicos:
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-
Tracy - uma ovelha transgênica, possui o gene humano para produzir a proteína alfa-1antitripsina (AAT) e a excreta no leite. As pessoas incapazes de produzir essa proteína
(1:2000), apresentam deficiência hepática e alta suscetibilidade ao enfisema pulmonar.
-
foram implantados em camundongos genes humanos responsáveis pela produção de
hormônio de crescimento. Em alguns filhotes o gene se expressou de forma mais intensa,
o que resultou em maior produção de hormônios: esses filhotes cresceram muito mais do
que os normais.
-
"Quando aperfeiçoada", esta técnica possibilitará o melhoramento genético de animais de
importância econômica, como o gado, levando-o a produzir maiores quantidades de leite
ou de carne, através do enxerto de genes específicos.
-
plantas inseticidas - pesquisadores isolaram um gene de uma bactéria (Bacillus
thuringiensis), responsável pela produção de uma proteína tóxica para lagartas de
lepidópteros (borboletas e mariposas). A partir da cultura de células, obtêm-se plantas
inteiras, que contêm o gene para a produção de inseticida. Esse gene acaba conferindo
proteção a essas plantas contra determinada lagarta que costuma atacar suas folhas.
-
produção do fator VIII - um dos fatores de coagulação, ausente nos hemofílicos. A
produção, em escala de laboratório, já é possível, através do enxerto de DNA
complementar em células de mamíferos.
-
Geneterapia - teoricamente, seria possível substituir ou adicionar no indivíduo afetado
uma cópia correta do alelo responsável por certas doenças genéticas.
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3. O PROCESSO HISTÓRICO DO PROJETO GENOMA
As primeiras discussões sobre o Projeto Genoma Humano (PGH) remontam à década
de 1980 quando o Departamento de Energia dos EUA promoveu um workshop para avaliar os
métodos disponíveis para detecção de mutações durante o qual divulgou a idéia de mapear o
genoma humano. Neste mesmo período foi criado na França o Centre d'Etude du
Polymorsphisme Humaine (CEPH - Centro de Estudos do Polimorfismo Humano). Este
centro coleta amostras de sangue e tecidos de famílias extensas e tornou-se o principal
fornecedor de material para a elaboração dos mapas de ligação realizados pelo Généthon.
A idéia de mapear o genoma levantou desde o princípio uma série de controvérsias.
Para muitos pesquisadores tratava-se na época de um projeto irrealizável. Para outros não
havia sentido em mapear o genoma pois as informações obtidas seriam desencontradas e não
valeriam o esforço. Por outro lado, alguns pesquisadores viram naquela oportunidade a
chance de transformar a biologia (e mais especificamente a genética) em big science, com
direito a financiamentos gigantescos e divulgação ampla. O projeto foi lançado nos EUA
quatro anos depois, patrocinado pelo NIH (National Institutue of Health) e pelo DOE
(Department of Energy).
A proposta era mapear todo o patrimônio genético do homem. Em seguida
laboratórios da Europa, do Japão e da Austrália uniram-se ao projeto. Surgiu então um
organismo de coordenação internacional chamado HUGO (Human Genome Organization),
para sintonizar o trabalho e organizar o conhecimento adquirido em um banco de dados
centralizado, o Genome Database. Seu presidente do HUGO, H. Van Ommen, afirmou em
1998 que a missão do HUGO era facilitar e coordenar a iniciativa global de mapear,
sequenciar e analisar funcionalmente o genoma humano e promover a aplicação destes
conhecimentos ao melhoramento da saúde humana.
Na fase final de sua primeira missão o HUGO assume seu próximo papel para a
disseminação das análises funcionais do genoma e o fornecimento de diretrizes responsáveis
para as aplicações e implicações do genoma.
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Desde os seus primeiros anos o projeto se caracterizou por um misto de otimismo
exagerado, brigas entre os diferentes grupos participantes e notáveis avanços técnicos e
científicos. Segundo Jordan (1993) o verdadeiro objetivo inicial do PGH não era o
seqüenciamento, muito complexo, caro e trabalhoso, mas um mapeamento detalhado do
genoma humano. No decorrer do processo os progressos tecnológicos foram tão grandes que
propiciaram o seqüenciamento mesmo antes do prazo previsto. De qualquer forma
mapeamento e não seqüenciamento foi a estratégia francesa. Os alemães foram sempre os
mais reticentes quanto ao projeto. A verba destinada ao projeto foi de US$ 53 bilhões e o
objetivo era mapear todos os genes e 3,6x109 pares de bases do genoma humano até 2005.
Um percentual de 5% da verba foi destinado às questões éticas, sociais e legais, abordadas
através do programa ELSI (aspectos éticos, legais e sociais). Atualmente o projeto ocorre em
escala mundial, inclusive com participação brasileira, envolvendo mais de 5000 cientistas em
250 laboratórios. Talvez a maior evidência da cooperação internacional seja o mapa de
ligação elaborado pelo Généthon, laboratório francês mantido em parte por familiares de
pacientes com miopatias.
Nem sempre esta cooperação é fácil. Problemas de financiamento do projeto e outras
discussões como conflito de interesse entre os pesquisadores ameaçam constantemente a
integração e levantam sempre a possibilidade de centralização da pesquisa. Para Shattuck
(1998) uma análise isenta recomendaria revisões de procedimento, prioridades, financiamento
e supervisão. Como um exemplo do que ocorre, pode-se citar a competição entre mais de 30
laboratórios durante a descoberta do X-Frágil em 1991. Finalmente, o artigo francês enviado a
Science em 25/10/90 foi publicado em 15/02/91 e o artigo inglês enviado a Cell em 15/01/91
foi publicado em 22/02/91. Para Jordan (1995) o projeto deve evitar esse tipo de desperdício
que resulta de um distanciamento excessivo dos pesquisadores em relação às conseqüências
de seus trabalhos. Nesse sentido as associações de pacientes desempenham um papel
essencial, confrontando os cientistas com a realidade quotidiana da doença bem como com as
necessidades do doente e de sua família. É preciso compreender que o desenvolvimento
científico também vive de dubiedades, mas como diz Garcia (1994) devemos lutar por meios
que impeçam a má utilização do conhecimento e que diminuam a distância entre a bioética e o
progresso científico.
Anexados ao PGH existem vários outros projetos genomas de organismos
experimentais, como da mosca das frutas (Drosophila melanogaster) - já terminado, do
camundongo (Mus musculus) e de um nematóide de vida livre (Caenorhabditis elegans), entre
vários outros. Estes projetos servem de auxílio para o mapeamento de genes humanos. Além
15
disso uma série de instrumentos e técnicas, como PCR (Reação em Cadeia da Polimerase),
YAC (Cromossomos Artificiais de Levedura), ABI (Seqüenciadores automáticos) CA repeats
(repetições de dinucleotídeos utilizadas como marcadores de localização gênica), etc foram
desenvolvidos a partir de necessidades do PGH e hoje são disponíveis para laboratórios de
pesquisa e diagnóstico não envolvidos diretamente no mapeamento de genes.
O Brasil também tem dado sua cota de contribuição ao projeto. Além de iniciativas
isoladas, como os diferentes genes clonados pelo laboratório da pesquisadora Mayana Zatz na
USP, uma iniciativa conjunta da FAPESP, Instituto Ludwig, UNICAMP, EPM e Faculdade
de Medicina da USP criou o Projeto Genoma Humano do Câncer. Este projeto utiliza o
mesmo método de seqüenciamento (ORESTES) desenvolvido em São Paulo para o
seqüenciamento de uma praga de lavouras, Xillela fastidiosa. Esta iniciativa demonstra a
importância do projeto, capaz de congregar diferentes instituições, a necessidade de
financiamento pesado e a possibilidade de utilização de metodologias desenvolvidas e
testadas em organimos menores. Em março de 2000, o Instituto Ludwig solicitou o
patenteamento de um oncogene.
Liderados por Luca Cavalli-Sforza um grupo de geneticistas lançou um projeto
paralelo ao PGH, o Projeto da Diversidade do Genoma Humano, que pretende estudar e
preservar a herança genética de populações humanas. Seus objetivos relacionam-se a estudos
sobre as origens humanas e movimento de populações pré-históricas, adaptação a doenças e
antropologia forense. Esses geneticistas preocupam-se que o "Genoma Humano" que está
sendo decifrado pelo PGH não corresponde ao genoma humano de todos os indivíduos mas de
uma parcela que está representada nas amostras. De fato, esse "Genoma Humano" não
pertence a uma pessoa identificável mas é proveniente de várias amostras utilizadas
principalmente em laboratórios ocidentais. Os defensores do PDGH advogam a favor das
diferenças entre grupos humanos e contra o reducionismo do genoma a um tipo único. A
importância de estudar grupos humanos específicos é reconhecida também por empresas de
biotecnologia como a americana Coriell Cell que em 1996 anunciou na Internet amostras de
DNA de índios brasileiros a venda. O fato gerou um debate entre cientistas brasileiros acerca
do armazenamento de DNA dos indígenas e suas possíveis repercussões comerciais.
Os objetivos do PGH em saúde envolvem a melhoria e simplificação dos métodos de
diagnóstico de doenças genéticas, otimização das terapêuticas para essas doenças e prevenção
de doenças multifatoriais. Para Pena (1992) a problemática ELSI vai convergir na interação
de três elementos: os pesquisadores que geram o novo conhecimento, a comunidade
empresarial que transforma este conhecimento em produtos e a população que vai absorver e
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incorporar os novos conhecimentos em sua visão de mundo e suas práticas sociais, além de
consumir os novos produtos. Nesse sentido Clotet (1995) alerta para a responsabilidade
científica, uma vez que os: cientistas devem imaginar as conseqüências morais da aplicação
comercial de testes genéticos.
Os críticos do PGH argumentam que seus objetivos eram tratar, curar ou prevenir
doenças. Para eles este é um longo caminho e por enquanto seu principal resultado são as
companhias de biotecnologia comercializando kits diagnósticos. Para Zancan (1994) o
mapeamento genético para detecção de doenças levanta ainda dúvidas sobre as suas
conseqüências sociais, dada a distância que separa o diagnóstico das técnicas terapêuticas.
Para ela é hora da comunidade acadêmica sair da discussão intra-muros e levar à sociedade
suas preocupações quanto ao controle social das novas tecnologias biológicas,
independentemente das regulamentações. É preciso lembrar que a análise genética não é
infalível e seus dados são com freqüência mal interpretados em virtude de uma tendência
ideológica da qual os pesquisadores, participam mais ou menos inconscientemente: uma
deriva que passa muito facilmente e depressa de uma observação centrada no estado de saúde
atual de uma pessoa a um diagnóstico fundamentado exclusivamente na análise de seus genes
(Jordan, 1995). Para Wilkie (1994) tamanha ênfase na constituição genética da humanidade
pode nos levar a esquecer que a vida humana é mais do que a mera expressão de um programa
genético escrito na química do DNA.
Todo ser humano tem uma identidade genética própria e, segundo a Declaração da
Unesco, o genoma humano é propriedade inalienável de toda a pessoa e por sua vez um
componente fundamental de toda a humanidade. Dessa maneira ele deve ser respeitado e
protegido como característica individual e específica pois todas as pessoas são iguais no que
se refere a seus genes, afinal unicidade e diversidade são propriedades de grande valor da
natureza humana (Clotet, 1995). As informações advindas do projeto devem servir para
proteger a vida e melhorar a saúde. Isto pode ser verdadeiro nos casos em que há uma
antecipação do processo terapêutico pela antecipação da doença, entretanto é preciso tomar
cuidado quanto aos aspectos prejudiciais deste processo (Clotet, 1995). Para Annas (19??)
desde que os testes sejam voluntários e os resultados divulgados apenas com autorização do
indivíduo, os testes baseados no PGH apresentam uma alteração de grau, não de gênero. Isso
não é verdadeiro se considerarmos os testes preditivos. Jordan (1995) acredita que "tomamos
um caminho perigoso: ao invés de julgar um indivíduo pelo que ele é hoje, vamos indagar
sobre seu status de doente em potencial (e quem não é?) para tratá-lo como deficiente antes do
tempo e sem ter a certeza de que se tornará". Para ele isso significa definir a afecção pelo
17
genótipo, pelo que está inscrito no DNA e não mais pelo fenótipo, pelo estado presente da
pessoa.
Para Khoury (1999) uma rápida transição da descoberta do gene a integração na
pratica clinica pode resultar no desenvolvimento e oferecimento prematuro de testes
genéticos. Estudos epidemiológicos são necessários para validação de testes genéticos,
monitorização de seu uso pela população e determinação da segurança e efetividade dos testes
em diferentes populações. Ele propõe a criação de uma nova disciplina, a Epidemiologia do
Genoma Humano (HuGE), combinando dados de epidemiologia genética e epidemiologia
molecular. De maneira semelhante Pena (1994) sugere a substituição de um paradigma
tipológico por um paradigma populacional. No primeiro existem os alelos normais, ideais,
perfeitos e os que não o são. Já no segundo a variabilidade é composta por mutantes
subótimos e lida com ambientes diversos. O fenótipo, portanto, é dinâmico e emerge da
interação do genótipo como um todo (milhares de genes) com o infinitamente complexo
ambiente. É a mudança do paradigma monogênico de determinismo genético (atraente e
perigoso em sua simplicidade) pelo paradigma interativo epigenético não determinista.
Por outro lado os críticos argumentam que o PGH dissemina a idéia de panacéia com
vocabulários expansivos, promessas e termos hiperbólicos, mesmo em documentos oficias "o Graal da genética humana ...a resposta final do mandamento 'conhece-te a ti mesmo' " (W.
Gilbert in Shattuck, 1998).
O PGH traz comparações com o Projeto Manhattan e o Projeto Appollo, e transformou
a Biologia em big science, como a física, isto é, a noção de um conhecimento (ou ciência)
imparável no sentido de controlar a natureza. A imprensa leiga aproveitou a idéia e
diariamente veicula as promessas do projeto, como: "Pensávamos que nosso destino
permanecia nos astros. Agora sabemos que, em larga medida, o nosso destino está nos genes."
Vários autores alertam para o de uma eugenia mais sutil, promovida pelo PGH ao
fornecer instrumentos para testes (Shattuck, 1998; Annas). Alguns participantes do projeto,
como James Watson acreditam que há um "potencial extraordinário para o melhoramento
humano". A questão do melhoramento e da eugenia refere-se basicamente ao quanto se
confere à genética na responsabilidade por condições multifatoriais. Assim mistura-se a
identificação e tratamento de doenças genéticas com as outras causas de doença (álcool,
drogas, pobreza,...), considerando-as todas de origem genética e divulgando a esperança de
que um dia encontremos uma "solução genética" para estas condições de saúde. Supondo que
realmente existam genes da inteligência, genes responsáveis por comportamento anti-social,
genes alcoólatras e drogados, genes neuróticos, genes de infidelidade. A questão é, como
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coloca Ztaz (1994), o que se pode fazer com esse conhecimento? Clotet (1995) alerta para o
fato de que não se deve utilizar estratégias genéticas para solução de problemas sociais,
reconhecendo um risco potencial para o surgimento de um movimento eugênico baseado no
conhecimento do genoma.
Ao mesmo tempo não devemos atribuir ao PGH mais importância do que ele
realmente pode ter. Tome-se por exemplo a anemia falciforme, uma das doenças genéticas
mais se conhecidas e a primeira a ter seu gene identificado. Chama a atenção o atraso das
pesquisas e a pouca participação da genética na melhoria da condição de saúde dos pacientes
e o PGH não vai mudar essa situação a curto prazo pois o conhecimento de um gene não é
uma garantia de avanço terapêutico. Da mesma forma, a discriminação de seus portadores e
os abusos que se fizeram no teste desta doença não foram decorrentes dos avaços do PGH
(Wilkie, 1994).
De qualquer forma as questões éticas envolvidas continuam sendo motivo de debate,
tanto no que diz respeito às informações obtidas quanto ao patenteamento de genes. Em 1991
o Congresso americano iniciou o exame de um projeto de lei dedicado à preservação das
informações concernentes ao genoma humano (Human Genome Privacy Act). No ano
seguinte a 44ª Assembléia da Associação Médica Mundial reunida na Espanha lançou a
Declaração de Marbella, em que se declarou contra o patenteamento do genoma humano,
solicitando garantias contra discriminação e diretrizes básicas para prevenir a estigmatização
de populações em risco para doenças genéticas. Neste mesmo ano, James Watson pediu
demissão do seu cargo de diretor do PGH por ser contra o patenteamento de genes.
A questão do patenteamento só foi resolvida em 1995 quando o HUGO publicou uma
declaração condenando o patenteamento de seqüências sem função conhecida mas favorável
ao patenteamento da descoberta das funções biológicas de novos genes ou suas aplicações. O
argumento utilizado foi de que o custo do projeto é muito elevado e sua realização seria
impossível sem o concurso de empresas privadas, as quais estão interessadas em obter
exclusividade sobre suas descobertas. Essa atitude faz com que pesquisadores tenham que
assinar contratos com empresas comprometendo-se a não divulgar seus resultados. Nesse caso
a pesquisa científica deixa de ser objeto de discussão entre cientistas para tornar-se uma
propriedade industrial, como ocorreu recentemente com o gene da asma. Um grupo de
pesquisadores anunciou na revista Science a localização de uma região candidata para o gene
da asma porém não deu absolutamente nenhum detalhe a respeito da sua descoberta por
motivos contratuais. Esses foram inclusive o motivo que os levou a divulgar a descoberta do
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locus candidato pois há uma exigência legal de comunicar aos acionistas da empresa que uma
descoberta recente pode ter um possível impacto sobre a valorização das suas ações.
A preocupação com o patenteamento é tanta que motivou uma declaração da
UNESCO em que é reafirmado que o genoma humano é propriedade inalienável da pessoa e
patrimônio comum da humanidade. Segundo este mesmo documento o nosso DNA nos
pertence, temos a propriedade e a posse mas desconhecemos o seu significado. Esse é
justamente o objetivo do PGH, cujo final parece ter sido antecipado para 2003. Mas
provavelmente o conhecimento completo dos 3,6x109 pares de bases do genoma humano não
seja o fim, mas sim o início desse processo de compreensão. Que novas perspectivas sobre os
seres humanos trará o seqüenciamento dos 3 bilhões de pares de bases do genoma humano? A
função mais importante do projeto talvez seja a de transcender a si mesmo e nos ensinar, ou
lembrar, que os genes e a genética não são a base fundamental da vida humana. O PGH pode
redefinir o nosso sentido de nosso próprio valor moral e descobrir um meio de afirmar, em
face de todos os detalhes técnicos da genética, que a vida humana é maior do que o DNA de
que brotou e que os seres humanos conservam um valor moral que transcende a seqüência de
3,5 bilhões de bases contidas no genoma humano (Wilkie, 1994)
Em 14 de março de 2000, o presidente norte-americano, Bill Clinton, e o primeiro
ministro do Reino Unido, Tony Blair, apelaram para que tudo que diga respeito a
decodificação do genoma humano seja mantido no âmbito público. Isto significa que todos os
cientistas tenham acesso ao sequenciamento bruto do genoma humano. Os mandatários
propuseram que os inventos possam ser patenteados e explorados economicamente.
O cientista e empresário Craig Venter, sócio da Celera Genomics Corporation,
informou, em 06 de abril de 2000 que a sua empresa já concluiu o sequenciamento bruto do
genoma de uma única pessoa. Em janeiro havia anunciado que este processo estava quase
terminado. No próximo mes de maio esta companhia irá iniciar a ordenação dos dados
obtidos. O Dr. Venter é contrário a divulgação pública e universal dos dados, defendendo a
posição de que as sequencias, mesmo as que ainda não se conheçam as funções associadas,
podem ser patenteadas.
Em julho de 2000 foi anunciado que os pesquisadores do Projeto Genoma Humano
haviam seqüenciado a quase totalidade do genoma humano. O anúncio foi feito na Casa
Branca, pelo Presidente Bill Clinton. Na solenidade estavam presentes os pesquisadores do
HUGO e o presidente da Celera. A imprensa mundial saudou o anúncio com grande
empolgação. Houve uma compreensão inadequada do que estava sendo divulgado. Muitos
jornais e revistas afirmaram que o genoma humano estava desvendado. A população ficou
20
com a informação de que toda esta etapa estava vencida, quando sequer foi iniciada a
totalidade de identificação de genes humanos em todos os cromossomos. O volume de
interpretações corresponde ao de um texto de 800 volumes semelhantes ao de uma Bíblia, só
que não se sabe em que idioma está escrito.
3.1 Cronologia
___ 1953 - O biólogo norte-americano James Watson (um dos ganhadores do Nobel de
Medicina de 1962) e o físico inglês Francis Crick descrevem a estrutura da molécula de DNA
como uma dupla hélice.
___1956 - Jo Hin Tjo e Albert Levan demonstram que o número de cromossomos humanos é
46 distribuídos em 23 pares.
___1973 - Stanley Cohen e Herbert Boyer constroem um DNA recombinado com fragmentos
de moléculas e o introduzem numabactéria que, ao se reproduzir, multiplica o DNA alterado.
___1977 - Fred Sanger, Walter Gilbert e Allan Maxan descobrem um método de seqüenciar
os pares de bases de DNA, técnica decisiva para o que viria a seguir.
___1982 - Anunciado o primeiro medicamento fabricado por manipulação genética, uma
forma de insulina humana produzida por bactérias.
___1985 - Criada a técnica da Reação em Cadeia de Polimerase (PCR), que permite obter
bilhões de de cópias de um fragmento de DNA.
___1986 - O FDA aprova a vacina contra a hepatite B humana, o primeiro imunizante
geneticamente manipulado.[...]
___[...]1989 - Criado o Centro Nacional para Pesquisa do Genoma Humano, nos EUA, com
verba de US$ 3 bilhões e meta de seqüenciar o DNA humano até 2005.
___1990 - Início oficial do Projeto Genoma Humano internacional, com participação de
pesquisadores americanos e europeus.
21
___1991 - Pela primeira vez um gene, localizado no cromossomo 17, é relacionado a certos
tipos de câncer de mama e ovário.
___1993 - A equipe do francês Daniel Cohen constrói um mapa genérico dos 23 pares dos
cromossomos humanos.
___1995 - A Science publica o seqüenciamento do primeiro seqüenciamento genético de um
ser vivo, a bactéria Haemophilus influenzae.
___1997 - O geneticista escocês Ian Wilmut obtém a ovelha Dolly, primeiro clone de um
mamífero criado a partir de uma célula adulta.
___1998 - O Brasil ingressa no restrito clube mundial da pesquisa genética com o início do
seqüenciamento da bactéria Xylella fastidiosa. - Termina o seqüenciamento do bacilo da
tuberculose, o Tycobacterium tuberculosis. - Craig Venter funda a empresa Celera Genomics
e anuncia projeto privado para decodificar todo o genoma humano.[...]
___[...]1999 - O Projeto Genoma conclui o primeiro seqüenciamento de um cromossomo
completo, o 22. - Começa o projeto brasileiro Genoma Humano do Câncer
___ Janeiro/2000 - A Celera informa que completou mais de 90% do primeiro rascunho do
genoma.
___Fevereiro/2000 - Cientistas brasileiros concluem o seqüenciamento genético da Xilella. O
feito é publicado na Nature.
___Março/2000 - Conclusão do seqüenciamento do genoma da Drosophila melanogaster, a
mosca das frutas, o mais completo ser vivo já decodificado.
___Abril/2000 - Venter anuncia ter concluído 99% do seqüenciamento genético.
___Junho/2000 - A Celera e o Projeto Genoma concluem o seqüenciamento completo do
cromossomo 21.
22
___Julho/2000 - O Projeto Genoma Humano do Câncer desenvolvido no Brasil dobra as
metas e as verbas, mobilizando US$ 20 milhões.
23
4. O PROJETO GENOMA
O Projeto Genoma Humano é o grande empreendimento científico-tecnológico, deste
final de século. O seu principal objetivo é mapear todos os genes do genoma humano, bem
como descrever a seqüência completa de todos os nucleotídeos que formam a longa hélice de
DNA nos 23 pares de cromossomos humanos. A partir daí pretende-se determinar as possíveis
causas para muitas doenças de fundo genético. Com a identificação destas causas, deverão ser
desenvolvidas terapias genéticas para a cura destas doenças; a promessa maior deste projeto.
Como iniciativa primeira do Departamento de Energia dos EUA, o Projeto Genoma
Humano surgiu a partir da idéia de se identificar as possíveis anomalias genéticas
relacionadas a radiação e agentes químicos mutagênicos. Hoje este projeto está sendo
desenvolvido por grandes laboratórios e Institutos Nacionais de Pesquisa, dos EUA e da
Europa, bem como, por centenas de laboratórios governamentais e particulares de várias
partes do mundo, dedicados a mapear e seqüenciar o genoma humano. No Brasil, por
exemplo, iniciativas governamentais e privadas estão desenvolvendo o Projeto Genoma
Humano do Câncer, com a aplicação de um método de seqüenciamento, denominado
ORESTES, desenvolvido em São Paulo para a praga da lavoura, Xyllela fastidiosa
(amarelinho).
Numa primeira fase do Projeto Genoma Humano, foi feito o mapeamento físico dos
genes, ou seja, a localização no cromossomo de determinadas seqüências do DNA,
correspondentes a cada gene do genoma. Numa segunda fase cada laboratório ou instituto de
pesquisa, recebeu um cromossomo e ficou incumbido de determinar a seqüência ordenada e
completa dos nucleotídeos que compõe aquele cromossomo, o que inclui genes e regiões
controladoras da expressão destes.
Há poucos meses atrás as principais autoridades mundiais solenemente anunciaram o
sequenciamento parcial de todos os genes que compõe o genoma humano. O sequenciamento
completo e muito mais acurado de todos os genes, é esperado por volta de 2003.
24
4.1 Definição do termo “genoma”
O genoma é todo o DNA (ácido desoxirribonuclêico) que um determinado organismo
tem nas suas células. O DNA é uma molécula comprida linear composta por quatro unidades
muito parecidas, como uma cadeia formada por quatro tipos semelhantes de elos. As
unidades, chamadas desoxirribonucleótidos, são simbolizadas por quatro letras: A, T, C e G e
se repetem milhões de vezes formando uma cadeia linear de DNA.
Para que o DNA esteja completo, duas cadeias lineares se complementam e se
entrelaçam para formar uma dupla hélice. Cada unidade de uma das cadeias se une com outra
unidade da cadeia enfrentada formando um par, chamado normalmente de par de bases.
O DNA humano é formado por 3000 milhões de pares de bases. Um gene é uma
porção do DNA que contêm a informação para se fabricar uma proteína requerida pelo
organismo. A informação contida nos genes, que determinará em grande parte as
características de um ser humano, é dada pela ordem em que se encontram as quatro unidades.
Os 3000 milhões de pares de bases do DNA humano não formam uma única molécula linear,
mas se encontram separadas em 24 diferentes cadeias e condensadas, formando assim os
cromossomos.
Para que os cromossomos sejam identificados e estudados, eles foram numerados de 1
a 22. Os dois restantes são os cromossomos sexuais: X e Y. Nossas células possuem duas
cópias de cada tipo de cromossomo, uma cópia herdada da mãe e a outra do pai, totalizando
assim 46 cromossomos. As mulheres possuem os 22 pares de cromossomos numerados, mais
dois cromossomos X. Os homens possuem os 22 pares de cromossomos numerados, mais um
cromossomo X e um cromossomo Y.
25
O genoma, ou conjunto dos genes de um ser, é comparado a um livro, no qual estão
escritas todas as instruções que guiam a formação do indivíduo e são transmitidas aos seus
descendentes. Esse livro é tão extenso quanto 800 exemplares da Bíblia.
Ele está dividido em capítulos, os cromossomos. As células humanas contêm 46
cromossomos, por sua vez divididos em 23 pares semelhantes, herdados do pai e da mãe. O
espermatozóide e o óvulo contêm cada um 23 cromossomos, que se unem na formação de um
indivíduo.
Os capítulos estão organizados em parágrafos, que correspondem aos genes. Estima-se
que existam de 40 mil a 130 mil parágrafos, ou genes, no livro da vida.
maioria dos parágrafos dá a receita para a produção das proteínas, os blocos
fundamentais que "constroem" os seres vivos. Apenas 3% de todo o livro corresponde a
parágrafos legíveis. Os outros 97% são uma série desordenada de letras, cujo significado
ainda é desconhecido. Os próprios parágrafos são entrecortados por essas seqüências.
Os parágrafos são formados por palavras, chamadas de códons. O livro do genoma,
com 23 capítulos, contém cerca de 1 bilhão de palavras.
As palavras, por sua vez, são sempre formadas por apenas três letras. E, em vez de
usar todas as letras do alfabeto, o livro do genoma usa apenas quatro: A, T, C e G. Essas letras
são as iniciais dos nomes de quatro bases nitrogenadas: adenina (A), timi na (T), citosina (C)
e guanina (G). As letras não estão em páginas planas, mas grudadas em longas correntes de
açúcar e fosfato, as moléculas de DNA. Cada cromossomo é um par de moléculas muito
longas de DNA (sigla em inglês para ácido desoxirribonucléico).
4.2 Mapeamento dos genes
Dentre as principais técnicas de mapeamento genético temos os mapas de ligação
baseados nas análises de padrões de herança humanos, onde as distâncias entre os genes são
medidas em centimorgans, uma medida da frequência de recombinação. Este foi o principal
método utilizado pelo laboratório frances Génethón, que permitiu o mapeamento de genes
importantes como o da distrofia miotônica e o da Doença de Tay-Sachs. A técnica mais
utilizada, entretanto, é a do mapeamento físico onde as distancias entre as características são
medidas em unidades físicas reais, ou seja, número de pares de bases. Estes são os chamados
mapas físicos de alta resolução, construídos pela técnica das enzimas de restrição. Estas
enzimas funcionam como bisturis microscópicos, cortando a dupla hélice de DNA em regiões
específicas, como no caso da enzima EcoRI, que reconheçe a sequência GAATTC do DNA.
26
Desta maneira, determinado cromossomo é cortado em pequenos pedaços, que então serão
clonados e ordenados.
A clonagem é realizada com a tecnologia do DNA recombinante. Um organismo
hospedeiro que pode ser uma bactéria ou levedura, pode replicar qualquer fragmento de DNA
estranho que nele for introduzido. A introdução deste fragmento se faz com o auxílio dos
cosmídeos (bacteriófago ou vírus), organismos que infectam as bactérias. Se neste cosmídeo
for inserido um segmento de DNA humano, este segmento também será reproduzido pela
maquinaria da bacteria, formando, assim, os clones. A clonagem de diferentes segmentos
justapostos pode formar longos segmentos, ou mesmo, o total comprimento de um
cromossomo. Assim, os laboratórios podem produzir uma biblioteca ordenada de clones.
Cada bloco contínuo de clones ordenados é conhecido como contig, que resulta num mapa de
contig, onde a localização física de cada gene pode ser acuradamente determinada.
Com este método foi construído o mapa do cromossomo 19, onde totalizaram-se 54
milhões de pares de bases, cerca de 95% daquele cromossomo. Entre os genes mais
importantes localizados no cromossomo 19 está o gene da distrofia muscular, o gene
responsável pela pseudocondroplasia (um tipo de nanismo) e uma forma congênita de doença
renal. Cerca de 2000 genes estão sendo descobertos neste cromossomo.
O cromossomo 16, também foi mapeado com a mesma técnica de clonagem. Neste
cromossomo foram encontrados os genes responsáveis por certas desordens do tecido
sanguíneo, outra forma de doença renal, leucemia e cânceres de pulmão e próstata.
4.3 Sequenciamento dos genes
Feito o mapeamento físico do genoma, ou seja, a localização precisa de todos os genes
nos cromossomos, está aberto o caminho para outra grande meta do Projeto Genoma
Humano: o sequenciamento, ou ordenamento exato, de todos os pares de bases (A, T, C e G)
que compõe o DNA dos 23 cromossomos humanos. Desta maneira estaremos sequenciando
cada um dos 100.000 genes que compõe o genoma humano, e também aquelas sequências de
DNA cujas funções ainda não conheçemos, mas que podem estar envolvidas em processos
importantes como o controle da expressão de diversos genes. Dos três bilhões de pares de
bases que compõe nosso genoma, foram sequenciados e armazenados centenas de milhões de
pares, a maioria dos quais vindas de curtos fragmentos clonados (a biblioteca de clones
27
descrita no processo de mapeamento). Apenas 30 milhões de pares de bases (1 por cento do
total) foram sequenciados a partir de longos segmentos de DNA.
Outro dado importante é que todos os segmentos de DNA, longos ou curtos, devem
ser sequenciados muitas vezes, para revelar diferenças que indicam formas diferentes de um
mesmo gene.
Entre os principais métodos de sequenciamento temos o método Sanger. Na primeira
etapa deste método, denominada de subclonagem, o cromossomo a ser sequenciado é
quebrado em muitos pedaços curtos. Posteriormente, cada pedaço será utilizado como modêlo
para gerar um conjunto de fragmentos, diferentes entre si, por uma única base. Cada conjunto
de fragmentos será separado por eletroforese (corantes fluorescentes permitem a separação de
todos os quatro fragmentos numa única pista sobre o gel). Este processo recria a sequência
original dos As, Ts, Cs e Gs de cada uma das curtas peças geradas na primeira etapa. Os
resultados do sequenciamento são mostrados num cromatograma de quatro cores em que cada
pico representa cada uma das quatro bases de DNA. Depois que as bases são lidas os
computadores reúnem as sequências em longos e contínuos trechos que são analisados com
relação a regiões que codificam genes e outras características.
Devemos saber, entretanto, que o sequenciamento do genoma humano não
corresponde ao genoma específico de determinada pessoa. Para este projeto foram
coletadas amostras de sangue (mulheres) e esperma (homens) de um grande número de
doadores, os quais tem sua identidade protegida, ao ponto de que nem os doadores nem os
pesquisadores sabem quais DNAs estão sendo sequenciados. A Celera, por exemplo, uma das
mais importantes empresas privadas que estão participando deste projeto, coletou amostras
vindas de cinco doadores, identificados como Hispanico, Asiático, Caucasiano, Africano e
Americano. A idéia é de que o conhecimento obtido poderá ser aplicado a qualquer pessoa, já
que compartilhamos o mesmo conjunto básico de genes e regiões reguladoras do genoma.
Outro empenho deste projeto será a identificação das pequenas regiões de DNA que variam
entre indivíduos (polimorfismos), associadas à certas doenças. As amostras para estes estudos
estão vindo de doadores anônimos de ancestralidade Européia, Africana, Americana e
Asiática.
É bom lembrar também que até o presente foi feito apenas um sequenciamento
rascunho do genoma humano. Este procedimento é de baixa precisão, pois cada trecho do
DNA é sequenciado apenas 5 vezes e não é contínuo através dos 3 bilhões de bases do
genoma humano. Para se obter um sequenciamento de alta precisão deve-se sequenciar 10
vezes cada trecho de DNA, o que diminui para um único erro na leitura de 10.000 bases. Este
28
sequenciamento de alta precisão com a leitura das brechas e com a correção dos possíveis
erros deixados de lado no sequenciamento rascunho, está previsto para 2003 ou 2005.
4.4 Pós genoma
Depois de levantar todo o código genético, cientistas decifram as estruturas dos
componentes básicos da vida.
O mundo ainda comemora o resultado do Projeto Genoma, a identificação da quase
totalidade dos genes do corpo humano. Mas o empreendimento, embora grandioso, é apenas
um passo. A decodificação é como escrever um livro de receitas no qual só aparecem os
ingredientes, sem as instruções de como misturá-los, se devem ser cozidos, assados ou fritos.
Para preparar o jantar, o cozinheiro precisa conhecer os detalhes de cada prato.
A fórmula dos ingredientes, ou dos genes, contida na molécula de DNA serve para
ordenar a fabricação das proteínas. Os tijolos da vida são os aminoácidos. Apenas 20,
combinados em seqüências diferentes, formam todas as proteínas usadas pelos seres vivos das bactérias aos humanos - para executar tarefas vitais como movimentar-se, respirar, pensar
e gastar energia.
Se geneticistas brasileiros brilharam ao identificar o código genético da bactéria
Xylela fastidiosa, causadora da praga do amarelinho, o mesmo pode acontecer agora com os
pesquisadores de proteínas. Os pesquisadores brasileiros vêm se concentrando numa área que
afeta diretamente a população mais pobre: as doenças tropicais.
Para entender como esse enorme equipamento, com o tamanho de um campo de futebol, é
usado na investigação das proteínas, é preciso recuar até a molécula de DNA. Ela é formada
por combinações de quatro grupos moleculares: A, C, T e G. Cada conjunto de três grupos
codifica um aminoácido. Por exemplo: AAA é a receita da fenilalanina; TCT é da arginina.
Assim que uma seqüência de aminoácidos é enfileirada para formar uma proteína, ela se
dobra e enrosca de uma forma tridimensional ainda imprevisível. Isso acontece porque cada
aminoácido tem suas cargas elétricas que empurram ou atraem as cargas dos outros.
Graças ao seqüenciamento do Genoma, em muito breve poderemos diagnosticar no
primeiro dia de vida se um bebê vai ou não ter este tipo de doença. Será possível fazer o
diagnóstico dessas doenças antes delas se manifestarem. A Medicina, que hoje é quase que
totalmente terapêutica, vai se tornar uma ciência preditiva.
29
Nos próximos cinco anos, teremos condições de predizer se uma pessoa que já tem um
histórico familiar de determinada doença genética, vai ou não ter uma das 12 mil doenças
genéticas, como por exemplo diabete ou câncer de mama, muitos anos antes dos primeiros
sinais e sintomas aparecerem.
Médicos, que lidarão com indivíduos sãos e não apenas com doentes, poderão tentar
modificar o meio-ambiente que cerca essa pessoa, ou prescrever medicamentos
personalizados baseados no código genético do indivíduo, ou ainda, no futuro, mudar o
genoma dessa pessoa no sentido de tentar impedir que ela venha desenvolver a doença.
Num segundo momento, em torno de dez anos, o conhecimento completo do material
genético permitirá medicações individualizadas a cada paciente. Saberemos se a pessoa vai
aceitar ou não o medicamento, que poderá ser mais específico e com menos efeitos colaterais.
A longo prazo, digamos 30 anos, o sonho dos cientistas é poder consertar o que
houver de errado no Genoma Humano. O transplante de genes é uma técnica que ainda está
engatinhando, mas eu costumo lembrar que o transplante de órgãos praticamente não existia
há 30 anos. Daqui a 30 anos, o transplante de genes talvez seja tão comum como é hoje um
transplante de fígado. Em termos de Medicina e de Ciência, 30 anos é muito pouco tempo.
Chegará o momento da cura propriamente dita para esses erros genéticos que hoje estão sendo
descobertos. Isso vai acontecer ou colocando um gene normal dentro da célula ou colocando a
própria proteína que o gene codifica dentro da célula.
30
5. AS QUESTÕES ÉTICAS
Como toda nova descoberta científica, a desafiadora tarefa de mapear e seqüenciar o
genoma humano levanta diversas questões de cunho ético, social e legal. Se cada gene é
patrimonio individual, seria correto a sua patente por uma empresa privada, por exemplo?
Esta é uma das principais questões levantadas quando se pensa nos milhares de genes que
estão para ser descobertos e caracterizados e naqueles que já foram patenteados por empresas
privadas como mostra a tabela abaixo:
Mal de Alzheimer — patente no 5.508.167, da Duke University, cedida à Glaxo.
Hipertensão — patente no 5.589.584, da Fundação de Pesquisa da Utah University, cedida à
Myriad Genetics.
Obesidade — patente no 5.646.040, Millenium Pharmaceuticals, cedida à Hoffman-La Roche
Artrite reumática — patente no 5.556.767, Human Genome Sciences.
Suscetibilidade ao câncer de mama e ovário — patente no 5.693.473, Myriad Genetics.
Osteoporose — patente no 5.501.969, Human Genome Sciences.
Câncer do cólon — patente no 5.648.212, John Hopkins University, Fundação Japonesa para
a Pesquisa do Câncer e Zeneca.
Doenças Cardiovasculares — patente pendente, Myriad Genetics e Novartis.
Mal de Parkinson — patente pendente, National Institutes of Health.
Calvície — patente pendente, Columbia University.
Uma das metas principais, senão a principal, do Projeto Genoma Humano, é a criação
de uma medicina genética, que poderá num futuro próximo identificar falhas ou êrros no
genoma de um indivíduo e com isso criar uma terapia genética para corrigi-los. Devemos
saber, entretanto, que esta é uma visão muito determinista e reducionista do que seja um
indivíduo e suas características, mesmo aquelas relacionadas à doenças de fundo genético.
Até que ponto a genética é a única responsável por condições multifatortiais? (alcolismo,
suscetibilidade a drogas, criminalidade, e etc). Não podemos esquecer que o gene não atua
sozinho na determinação das características individuais. A expressão do gene é modelada pelo
31
ambiente, por fatores epigenéticos (do desenvolvimento), e por fatores aleatórios. Neste
sentido, a expressão de uma doença, enquanto característica individual, pode ter também a
influência destes fatores. Resumindo, se uma doença vai se expressar ou não, numa dada
pessoa, talvez não dependa única e exclusivamente de determinado gene.
A partir disso surge outro ponto de debate importante, relacionado, agora, a
disseminação de testes genéticos voltados primeiramente para a identificação de genes
"doentes". A utilização destes testes, se não for submetida a controles mais rígidos e a criação
de uma legislação relacionada a sua prática, poderá levar à caminhos perigosos. Podemos
antever uma situação na qual tais testes serão utilizados para se determinar a potencialidade
de um indivíduo em desenvolver doenças de fundo genético, e com isso discriminá-lo como
um doente em potencial, sem ter a certeza de que ele se tornará um. Daí para este tipo de
prática ser aplicado por empresas, quando da admissão de possíveis empregados, não está
muito longe, visto que esta situação já foi relatada, embora isoladamente. Será que podemos
utilizar estratégias genéticas para solucionar problemas sociais, sem correr o risco do
surgimento de um movimento eugênico mais sutil, fundamentado no conhecimento do
genoma? Muitas autoridades receiam que não. Tal preocupação é justificada quando
personalidades como James Watson declaram que existe um "potencial extraordinário para o
melhoramento humano", e, por outro lado, quando recordamos os terríveis programas de
eugenia praticados por países desenvolvidos como Estados Unidos e Dinamarca, em meados
deste século, baseados nos conhecimentos científicos de então. O próprio Ian Wilmut, um dos
"pais" da ovelha Dolly e proponente da genômica e da transgênese, coloca, de maneira
cautelosa, que "em mãos erradas tamanho poder, poderia ser assustador."
O mesmo Wilmut, porém, afirma que "eticamente direcionado, o potencial para fazer
o bem é imenso." Assim, não podemos fechar os olhos para os progressos advindos destas
novas biotecnolgias, apenas pelo receio de que estes sejam direcionados para fins maléficos. É
o risco que se corre toda vez que surge uma nova descoberta ou um novo avanço da ciência.
Como todas as conseqüências de inovações tecnológicas ou científicas de grande impacto, que
se estendem dentro e além do âmbito da ciência, as realizações do Projeto Genoma carecem
de mais estudos quanto as questões éticas, sociais e legais, advindas do seu progresso. Uma
ética relacionada a estas descobertas deveria partir dos princípios da declaração da UNESCO
sobre os direitos fundamentais humanos e sobre o genoma humano. Segundo esta declaração,
por exemplo, todo indivíduo que queira se submeter à terapias genéticas deve ser informado
sobre todos os riscos possíveis de tal intervenção no seu genoma. De acordo com estes
princípios, as práticas contrárias a dignidade humana não devem ser permitidas, e todos os
32
benefícios advindos do Projeto Genoma Humano para as áreas biológica, genética e médica,
deverão estar disponíveis para todos. O genoma humano é propriedade inalienável de toda a
pessoa e por sua vez um componente fundamental de toda a humanidade.
33
6. CONCLUSÃO
O mapeamento do código genético do ser humano inaugura uma nova, imensa e
estonteante fronteira da ciência e da atividade humana. O ser humano ultrapassou um limiar e
entra num novo mundo, ao mesmo tempo, fascinante e assustador. Esse feito da ciência traz à
mente o descobrimento pelos europeus das Américas, no final do Século XV, e sua
exploração e dominação efetivas. A descoberta de vastos territórios, habitados, com muitas
riquezas e muitas promessas, deslumbrou o imaginário do homem europeu da época. As
justificações para a colonização foram a evangelização cristã dos povos nativos e a ambição
por riquezas, as minerais, particularmente, em suma, religião e riquezas. Hoje, o potencial de
uma nova medicina, personalizada e profunda, de um lado, e, de outro, um imenso mercado
que se abre (sobretudo para a indústria farmacêutica) é revelador das expectativas e dos
interesses em jogo.
Seguramente, essa terá sido a maior façanha já realizada pela ciência na área das
ciências da vida, só possível pela descoberta de novas técnicas e pelo avanço da informática.
Em razão disso, nunca como agora o ser humano esteve tão próximo da vida, nunca reuniu
tanto conhecimento e nunca teve tanto poder sobre si mesmo. Esse conhecimento acumulado
abre para uma imensidão a ser explorada e conhecida. Sem dúvida, no topo desta montanha de
novos conhecimentos acumulados, o ser humano parece estar se dando conta que aumentou e
muito a sua ignorância. Nesse sentido, se o desvendamento do código genético humano se
constituiu na abertura de um novo e imenso cenário, também significa o quão pouco se
conhece apesar do muito de conhecimento que a Humanidade já acumulou. Está-se diante de
um novo começo nas ciências da vida, com múltiplas implicações sobre todas as atividades.
Caberá a Humanidade, aos governos, às organizações civis, fazer prevalecer o interesse de
todos, colocando esses limites. Do contrário,
não demorará muito para que nos jogos
olímpícos, além dos exames antidoping realizados para detectar substâncias proibidas serão
necessários outros, mas para detectar genes artificialmente modificados, destinados a
aumentar tamanho, agilidade, velocidade e outros atributos considerados estratégicos no
esporte cada vez mais competitivo. Não demorará muito para que se tenha duas olimpíadas,
34
uma com os humanos e outra, com os super atletas produzidos pela Engenharia Genética sob
medida para vencer em certas modalidades esportivas. E nesse ponto, seguramente, o ser
humano já terá experimentado mais uma vez do fruto proibido da “árvore do bem e do mal”.
35
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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THE ETHICAL IMPLICATIONS OF GENETIC RESEARCH THE UNIVERSAL
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http://www.unesco.org/opi/29gencon/egenkit.htm
36
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