S E D E R A P Q U AT R O ED S P I D A S A I E H C A D I E UM A V l em tempo Despojamento totae-se de sonhos. ch de crise. A ca sa en mpletam-nos. Os acessórios co para ser feliz? sa De que mais preci para 2013 numa te Menos é mais. Mo à arquitectura. edição dedicada Revistaa dist Revist disttrib ribuíd uída íd com o Diár Diário io Eco E nóm ómico ico co nº 5647 56647 d 05 de Abr de A ill de Ab d 201 2013. 3. Pos Poster terior iormen m te ven men vendid didaa em banc banc a a aoo pre preço ç de cap ço capaa de de 11,60 ,60 eu euros ros os.. since 1852 Hästens | Rua de S. Bernardo 43B Lisboa | +351 213 975 106 | 2ª a Sáb. 10:30 - 19:30h | [email protected] | www.facebook.com/hastensemportugal | www.melhorcamadomundo.com dormir numa cama Hästens é dormir saudavelmente, como se estivesse no seio da Natureza SU M Á R IO A b r i l 2 0 13 14 O que mudou na arquitectura das cidades e um almoço com o arquitecto mais ‘fashion’ de sempre, Peter Marino. E ainda, o melhor dos projectos nacionais pelo mundo. 38 Oitoemponto celebra o 20º aniversário. Um negócio de arquitectura de interiores que começou por fazer sucesso no Porto mas que já rompeu fronteiras. 50 A moda de Almodóvar. O realizador espanhol que não descura o guarda-roupa dos seus filmes, onde não faltam marcas como Chanel, Dolce & Gabbana ou Jean-Paul Gaultier. Presidente Nuno Vasconcellos Vice-presidente Rafael Mora Administradores Paulo Gomes, António Costa e Gonçalo Faria de Carvalho Director Geral Comercial Bruno Vasconcelos Redacção, Administração e Publicidade Rua Vieira da Silva, nº45, 1350-342 Lisboa, Telf. 21 323 67 00/ 21 323 68 00 - Fax 21 323 68 01 Delegação Porto Exponor - Feira Internacional do Porto, Avenida Dr. António Macedo, 4450-617 Leça da Palmeira, Telf. 22 543 90 20 66 Parecem casas de bonecas que compõem o cenário verde do Parque das Pedras Salgadas. São ‘eco houses’ com assinatura e decoração ‘clean’ e minimal, como exige a natureza. 76 Ao longo do último quarto de século, o restaurante Vela Latina tem acolhido empresários, políticos e diplomatas. Por ali, delinearam-se planos e traçaram-se negócios. (coordenadora), Cristina Oliveira, Denise Fernandes, Luis Reis Pires, Margarida Peixoto, Marta Moitinho Oliveira, Paula Cravina de Sousa Política Ana Petronilho, Filipe Gracia, Inês David Bastos e Márcia Galrão Empresas Patrícia Silva Dias (coordenadora), Cátia Simões, Dírcia Lopes e Sara Piteira Mota Finanças Tiago Freire (editor), Catarina Melo, Maria Ana Barroso, Margarida Vaqueiro Lopes, Marta Marques Silva e Rui Barroso Internacional Pedro Duarte Desporto Paulo Pereira (editor) Media Catarina Madeira e Rebeca Venâncio Universidades e Emprego Madalena Queirós (editora), Carla Castro (coordenadora), Joana Moura Projectos Especiais Irina Marcelino (editora), Director António Costa Director-executivo Bruno Proença Subdirectores Francisco Ferreira da Silva, Helena António Albuquerque (coordenador), Raquel Carvalho Opinião Ricardo da Costa Nunes (editor) DE online Pedro Cristina Coelho e Pedro Sousa Carvalho Editores Executivos João Pedro Oliveira e Renato Santos Editora de Fecho Latoeiro (coordenador), Rogério Junior (webdesigner), Alberto Teixeira, António Sarmento, Mariana Adam e Rita Gisa Martinho Fora de Série Rita Ibérico Nogueira (editora), Ana Filipa Amaro (coordenadora), Catarina Moura e Paz Infografia Susana Lopes (coordenadora), Mário Malhão e Marta Carvalho Fotografia Paulo Figueiredo (editor), Inês Queiroz (textos), Cristina Borges (secretariado), Colaboradores Catarina Palma, Fernando Guerra, Manuel Cristina Bernardo, Paula Nunes e Paulo Alexandre Coelho Assistente de Direcção Rita Rodrigues Secretariado Geral Damião, Mariana Béu de Carvalho, Pedro Ferreira, Pedro Marta Santos, Rodrigo Moita de Deus e Susana Torrão Dulce Costa Redacção do Porto Elisabete Felismino (coordenadora), António Freitas de Sousa, Sónia Santos Pereira Produção Ana Marques (chefia), Artur Camarão, Carlos Martins, João Santos Tratamento de imagem Samuel Rainho e Mira Fernandes (secretária) Tradutores Ana Pina Departamento Gráfico Paulo Couto (director de arte), Pedro (coordenador), Paulo Garcia e Tiago Maia Grandes Repórteres Ana Maria Gonçalves, Hermínia Saraiva, Lígia Simões, Fernandes e Rute Marcelino (coordenadores), Ana Antunes, Jaime Ribeiro, Patricia Castro, Sandra Costa e Vanda Luís Rego, Maria Teixeira Alves e Nuno Miguel Silva Destaque Mónica Silvares (editora) Economia Catarina Duarte Clemente Exclusivos Corriere della Sera, El Mundo, Expansión e Financial Times. 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Mas os tempos mudaram, chegou o novo milénio, instalou-se a crise financeira e a história dita que, em tempos de contracção, as modas viram-se para o lado oposto. Expansão. Opulência. Sumptuosidade. Mais é mais e a moda reflecte o estado do bolso dos utilizadores: quanto mais vazios, mais rica ela – a moda – se mostra. Excepção feita para a arquitectura, que, ao contrário da moda, não obedece à sazonalidade. Não respeita a mesma velocidade vertiginosa da moda. Pelo contrário, pode mesmo dizer-se que, nesta matéria, as tendências são lentas a imporem-se. Porquê? Há quem diga que tem a ver com a incerteza, cada vez maior, que se tem do tempo que os proprietários irão permanecer nas suas casas. Isso faz com que haja uma necessidade de adaptar as construções a um gosto mais generalista e estandardizado. Daí que as tendências arquitectónicas tenham mantido, ao longo dos anos, um indissociável lado ‘clean’, passível de agradar aos mais minimais, e de ser transformado em algo mais barroco, se for esse o caso. A arquitectura, o ‘design’ e a construção são talvez a área onde é mais complicado falar em tendências. Para as ter, é preciso fazer quase um exercício de análise do passado, associado a capacidades de adivinhação. Mas os especialistas já têm prognósticos muito claros, que reflectem o modo de vida das sociedades actuais. Sabe-se, por exemplo, que em 2013 vamos continuar a ter construções adaptadas, fachada de traça antiga e clássica com interiores contemporâneos, recheados de ‘features’ modernas. Vamos viver cada vez mais nas cidades, adaptando o nosso estilo de vida a apartamentos. Neste âmbito, veremos surgir ainda uma sub-tendência, o ‘microliving’, que passa por criar casas cada vez mais pequenas (com entre 20 a 30 metros quadrados) para solteiros, nas grandes cidades. Uma tendência já em expansão em Nova Iorque, ideia do ‘mayor’ Michael Bloomberg, que requer organização e soluções para arrumação em espaços tão… microscópicos. Vamos tornar-nos também cada vez mais ‘eco-friendly’, tornando as casas em espaços ecologica12 Fora de Série Abril 2013 mente sustentáveis e energeticamente eficientes, escolhendo materiais duráveis e de baixa manutenção. Por exemplo? Os relvados estão em vias de extinção. Gastam muitos recursos hídricos e serão, por isso, substituídos por soluções decorativas mais focadas no ambiente, nomeadamente pátios e ‘decks’. E são apenas alguns exemplos. Tudo isto para dizer que, no que toca ao lugar onde escolhemos viver, conta mais o coração e a carteira do que as tendências e as previsões dos media. Afinal, se é para ser de sonho, cada qual tem o seu, não é? Nesta edição da Fora de Série exploramos este conceito. Convidámos a actriz Mariana Monteiro a desempenhar um papel diferente. Nas novíssimas paredes brancas do Palácio Mesquitela, ela despiu-se de bens materiais. Deixou-se fotografar em ‘lingerie’ e apenas alguns (luxuosos) acessórios para provar que uma mulher não precisa de muito para ser feliz. Apenas uma casa de sonho, os sapatos certos, carteiras ‘it’, um ou outro casaco de peles, jóias. E muita atitude. Fomos ainda saber o que atrai e o que repele nas grandes cidades (Lisboa incluída, até porque foi eleita há poucas semanas a quarta cidade mais bonita do mundo para se visitar). O que é naturalmente belo e o que é projectado pelo homem. Uma oportunidade para recordar Oscar Niemeyer e os seus edifícios intrinsecamente belos. Almoçámos no Four Seasons, em Londres, com Peter Marino, arquitecto de renome internacional, e que revelou a sua faceta mais rebelde. Vestido de cabedal dos pés à cabeça, ‘motard’ assumido, dá cartas no mundo da moda, onde conta como clientes com as casas mais afamadas: Chanel, Louis Vuitton, Armani, entre outros. Fomos conhecer os projectos arquitectónicos assinados por portugueses pelo mundo fora. Para podermos orgulhar-nos ainda mais do que se faz por cá. E aproveitamos para dar a conhecer o que é ‘trendy’ em matéria de ‘design’ de interiores e decoração. E provamos que, tendência ou não, menos pode sempre ser mais. Tanto em arquitectura como em moda. Mas como nem tudo nesta edição se faz de betão, vidro, aço e pedra, há espaço na FS de Abril para restaurantes míticos, carros a sério, Tom Ford, cinema de Pedro Almodóvar, vestidos que vêm em caixas, acessórios únicos, beleza, spas, neve e hotéis que parecem casas de bonecas no fim de Portugal. Chega? Senão, em Maio há mais. Até lá! Capa: Fotografia de Pedro Ferreira. Mariana Monteiro com ‘soutien’ preto (56,90 euros) Chantelle, no El Corte inglès. Saia Filipe Faísca (preço sob consulta). Sandálias douradas com calcanhar encarnado (322,50 euros) Maliparmi, na Loja das Meias. Sumário: Fotografia cedida pela Sha Wellness Clinic. D DESTAQUE ARQUITECTURA A beleza será o ideal da urbanidade, basta pensarmos na chegada por mar ou rio a Istambul, Veneza ou Nova Iorque, nas montanhas do Rio de Janeiro ou nas cerejeiras em flor em Quioto (nas fotos). A BELEZA DAS CIDADES 14 Fora de Série Abril 2013 A arquitectura das cidades mudou. Os céus são agora rasgados por grandes edifícios e os lugares são desenhados a régua e esquadro. Há emoção nestes projectos, claro, mas o que é feito da beleza natural? T E X T O D E E D W I N H E AT H C O T E PEQUIM Sair das largas e banais avenidas de Pequim e deambular pelo emaranhado de ruas dos bairros tradicionais da capital, os ‘hutong’. NOVA IORQUE “A BELEZA É A FINALIDADE DA EVOLUÇÃO”, escreveu Joseph Brodsky. E se a cidade é o apogeu da civilização, então, a beleza será o ideal da urbanidade. É-o muitas vezes na imaginação ou na memória. Basta pensarmos na chegada por mar ou rio a Istambul, Veneza ou Nova Iorque, reluzindo acima do seu próprio reflexo. Ou nas montanhas que servem de enquadramento ao Rio de Janeiro ou nas cerejeiras em flor em Quioto. A certas cidades, a beleza foi-lhes simplesmente imposta. Paris foi planeada como Cidade das Luzes. Nela se rasgaram avenidas ladeadas de árvores e se construíram praças urbanas, nas quais altura, volume e ornamentos foram meticulosamente controlados para criar harmonia. Outras cidades devem a sua beleza ao enquadramento natural, como São Francisco e Sidney, com as suas inconfundíveis baías e vistas arrebatadoras. Outras ainda tornam-se belas pela mão dos seus arquitectos, caso de Siena, S. Petersburgo, Viena ou Barcelona. Outras há que devem a beleza ao carácter intenso da sua urbanidade, como Hong Kong ou Manhattan, inconfundíveis no seu emaranhado de torres e luzes de néon. De que falamos quando falamos na beleza de uma cidade? Ainda seremos capazes de criar tal beleza? Será desejável? Talvez tenhamos perdido o jeito para criar cidades belas. Roterdão, Shenzhen ou Dubai, pouco importa, as tentativas inábeis de criar novas formas de urbanidade, novas ideias de beleza, deixaram profundas cicatrizes nas cidades contemporâneas. Tal como na arte, a busca da beleza tornou-se tabu. Quando o extraordinário arquitecto brasileiro Oscar Niemeyer morreu em Dezembro, com 104 anos, o homem que criou a iconografia de Brasília foi criticado por ter construído edifícios que, apesar de elegantes, não são funcionais. Ou seja, foi criticado por ter sacrificado a funcionalidade em nome da beleza. Os críticos têm razão. Brasília não soube conciliar formalidade e informalidade, trânsito e vias pedestres. Embora a maior parte dos arquitectos modernos tenham sido castigados por criarem edifícios feios e não funcionais, pelo menos Niemeyer estava Admirar um daqueles edifícios incoerentemente Vitorianos sem elevador, com escadas de incêndio e letreiros ferrugentos de marcas há muito esquecidas, que o arranha-céus mais próximo reduz à escala de um anão. LONDRES Fugir do bulício de Regent Street e mergulhar na grandiosidade neoclássica de Air Street, ao estilo de Piranesi, e nas ruas secundárias do Soho. ISTAMBUL Entrar no Grande Bazar e deixar-se surpreender pelos raios de sol que, súbita e momentaneamente, irrompem pelos poços de luz do tecto suspendendo o tempo, as conversas, o fumo dos cigarros, o vapor do chá e do café. Abril 2013 Fora de Série 15 D DESTAQUE ARQUITECTURA A natureza devia ocupar o coração da cidade, é nisto que acredita o movimento City Beautiful, que dá como exemplo Manhattan e o Central Park (ao lado). 50% certo. No fundo, as críticas reflectem a dificuldade, senão a impossibilidade, de construir novas e belas cidades. Já passaram 100 anos desde a última vez que se debateu seriamente a beleza urbana, quando o City Beautiful Movement (Movimento da Cidade Bela) floresceu nos Estados Unidos e noutras partes do mundo. O movimento surge enquanto reacção à fealdade dos imóveis de habitação nas grandes cidades, defendendo a criação de parques e zonas verdes, avenidas ladeadas de árvores, edifícios civis e espaços culturais gritantemente clássicos no coração das cidades, de Washington D.C. a Camberra. Ao colocar os parques no centro das cidades, o City Beautiful transmitia uma mensagem clara: a natureza devia ocupar o coração da cidade, mesmo que a paisagem fosse artificial na sua emulação do natural. A natureza e a topografia desempenham um papel importante na construção da beleza. O fascínio de Central Park reside, por um lado, no contraste dos gigantescos relvados com a densidade urbana que o rodeia e, por outro, na forma como o leito de rocha se transforma em magníficos afloramentos rochosos, imagem mítica de Manhattan. Londres não é uma cidade com uma beleza convencional, mas os seus magníficos parques têm servido de modelo e inspiração a muitos outros no mundo. TALVEZ TENHAMOS PERDIDO O JEITO PAR A CRIAR CIDADES BELAS. ROTERDÃO, SHENZHEN OU DUBAI SÃO TENTATIVAS INÁBEIS. Mas, acima de tudo, falamos da grandiosidade, do espectáculo e da beleza da escala. Falamos de cidades com uma beleza de conto de fadas, de clichés. Há quem diga que o excesso de beleza acaba por prejudicar uma cidade. Pensemos em Veneza, uma cidade turística que se afunda no reflexo do seu próprio passado, uma cidade que se tornou um parque temático de beleza decadente. Pensemos em Londres e no facto de o epíteto “bela” só se aplicar a algumas partes da cidade ou a pormenores da urbe, que esteve em risco de perder o estatuto de Cidade Património Mundial da Unesco devido à construção de edifícios-torre cada vez mais feios e histriónicos, que ofuscam as vistas históricas de Westminster ou da Torre de Londres. LISBOA Contemplar os magníficos motivos decorativos da calçada portuguesa, arte maior que ganhou novo ímpeto após o terramoto de 1755. LOS ANGELES Desfrutar das vistas que Mulholland Drive oferece sobre a cidade. David Lynch imortalizou-a no filme homónimo e dános uma perspectiva sombria típica do ‘film noir’, em que o destino controla as acções dos seus habitantes. 16 Fora de Série Abril 2013 D HONG KONG DESTAQUE ARQUITECTURA Descobrir os mercados nocturnos que invadem as ruas de Mongkok, cercadas de gigantescos edifícios de habitação. VENEZA Emergir da escuridão de um ‘sottoportego’ – passagem que liga, através dos pátios das casas, uma rua à outra – e deixar-se ofuscar pela luz resplandecente do Grande Canal. As escadas de incêndio são uma imagem típica dos edifícios em Nova Iorque (em cima). Mais acima, os ‘hutong’, bairros tradicionais de Pequim, e os arranha-céus de Hong Kong. Ao lado, o Grande Canal em Veneza, que continua a ter uma luz resplandecente. Noutras metrópoles, como Nova Iorque, Chicago ou Hong Kong, os arranha-céus são a essência da cidade. Em Londres, porém, é mais difícil pensar assim, visto grande parte das torres que invadem a paisagem serem inestéticas e de má qualidade arquitectónica. Na verdade, esta aparente negligência municipal permite à cidade adaptar-se e manter-se relevante. Esta é, aliás, uma das razões porque Londres conseguiu manter o seu estatuto de centro mundial de comércio nos últimos 600 anos. Mas talvez seja melhor procurar a beleza não apenas à escala macro, mas também micro, para alargar o espectro de possibilidades mesmo nas metrópoles mais feias. Vistas de cortar a respiração e perspectivas inesperadas são sempre um festival para os sentidos, mas a emoção do inesperado ou do feliz acaso também fazem as nossas delícias. Deambular por uma ruela estreita e desembocar numa pequena praça com uma fonte é um desses momentos deliciosos. 18 Fora de Série Abril 2013 Londres não é uma cidade com uma beleza convencional, mas os seus magníficos parques têm servido de modelo e inspiração a muitos outros no mundo. Em cima, foto de Hyde Park. Assim como desembocar num pátio onde não se percepciona uma fronteira clara entre o espaço público e privado – seja num ‘hutong’ em Pequim ou num claustro algures em Itália –, ou presenciar a transformação temporária de uma praça num mercado de rua, que lhe confere uma nova vitalidade. Elaborar uma lista das cidades mais belas, no sentido convencional, seria perfeitamente inútil, na medida em que venceriam as ditas “panorâmicas”. E essas são cidades turísticas. Os momentos de beleza que ficam gravados na memória de quem habita a cidade e não de quem está de visita, de passagem, são mais privados ou, pelo menos, são mais marcantes do que as vistas familiares. São essas delícias da vida quotidiana que definem a vida numa cidade. No meu caso, o pensamento foge imediatamente para as veredas de St. James Park e para as charmosas ruas empedradas nas imediações. Ou para Budapeste, quando dobro a esquina de uma rua apinhada de gente e dou por mim no pátio de um bloco de apartamentos, inalando o aroma do almoço de domingo acabado de fazer. Ou ainda para as escadas de incêndio de um edifício em Nova Iorque, que nos elevam o olhar até ao topo para descobrirmos uma perspectiva inesperada sobre a cúpula do edifício Chrysler. São esses deliciosos momentos de justaposição e surpresa que mantêm a cidade viva. O Marquês de Sade dizia que a beleza é a regra e a fealdade a excepção. Com efeito, é frequente centrarmos a nossa atenção na fealdade das cidades, no desejo de fuga para o campo ou no isolamento que uma redoma de luxo proporciona. É precisamente pelo facto de a beleza ser vulgar que a procuramos nos lugares errados. FOTOGRAFIAS DE CORBIS/VMI VISTAS DE CORTAR A RESPIR AÇÃO SÃO SEMPRE UM FESTIVAL PAR A OS SENTIDOS, MAS A EMOÇÃO DO INESPER ADO TAMBÉM FAZ AS NOSSAS DELÍCIAS. D DESTAQUE ARQUITECTURA PETER MARINO: ARQUITECTO, DESIGNER E MOTARD Três em um. E é ainda o arquitecto melhor relacionado com o mundo da moda. Peter Marino, o responsável por algumas das mais fantásticas lojas do mundo, é um durão, mas nesta entrevista as lágrimas encheram-lhe os olhos por duas vezes. Mesmo assim, não perdeu a pose, que nega ter. T E X T O D E VA N E S S A FRIEDMAN 20 Fora de Série Abril 2013 bom que se diga que quando os ‘habitués’ das semanas da moda por esse mundo fora falam em “vedetas do ‘design’” raramente se referem a arquitectos. Aposto que se Rem Khoolhas, que criou numerosas lojas Prada, fosse assistir a um desfile da marca, passaria despercebido. Aposto que se James Carpenter, responsável pela renovação da imagem das lojas Gucci – em colaboração com a directora criativa da marca, Frida Giannini –, ficasse sentado na primeira fila de um qualquer desfile, ninguém lhe prestaria atenção. No caso de Peter Marino, a história é outra. Na semana da moda de Paris, quando foi assistir ao ‘show’ da Chanel – e das casas Dior, Céline e Louis Vuitton, para as quais já criou diversas lojas –, os ‘flashes’ dos fotógrafos disparavam sem cessar, toda a gente queria falar com ele e as suas fotografias na primeira fila dos vários desfiles invadiram as redes sociais. E porquê? Porque Marino se tornou no principal responsável pela mais recente tendência de transformar lojas de moda numa “experiência”, graças aos espaços que criou por todo o mundo, de Barcelona a Xangai, e às encomendas que fez a artistas como Olafur Eliasson, Gary Hume e Anish Kapoor, para personalizar as lojas por si desenhadas. Mas não só. O seu ‘look’ alternativo também ajudou ao “culto Marino”. O arquitecto de 62 anos adora vestir-se integralmente de cabedal preto, qual ‘motard’, de cortar o cabelo à Mohawk e de exibir as suas (cinco) tatuagens. Aparentemente, Marino é uma excepção em muitos contextos, como no restaurante do Four Seasons, em Nova Iorque, onde o ‘dress code’ para homens é “blazer e gravata”. Também aqui o deixam vestir o que quer. “E no University Club”, acrescenta, referindo-se a um outro “clássico” de Manhattan com regras da velha Manhattan. “Quando terminei o projecto da nova boutique de (Ermenegildo) Zegna na 5ª Avenida, decidiram fazer um jantar de pré-inauguração no University Club. Zegna ligou para lá e disse: ‘Como sabem, este jantar é uma homenagem ao Peter, por isso, é bom que ele lá esteja. Está a ver a pinta dele?’. Depois disto, enviaram uma fotografia minha por fax para os donos avaliarem. Mais tarde disseram que sim, que podia entrar”. Quando acaba a frase solta uma gargalhada sonora. Toda a gente fica a saber que Marino – ou “Pedro”, nome que utiliza para se referir a si próprio – está no restaurante. Olha em volta e identifica alguns dos presentes. Vestem fato e gravata. “Parecem todos iguais. Não percebo”, comenta em voz baixa. Despe o blusão de cabedal, tira o boné (também de cabedal) e senta-se descontraidamente com os cotovelos sobre a mesa, de ‘t-shirt’ e colete de cabedal. “Há uma coisa que costumo dizer aos miúdos que trabalham comigo: ‘Esqueçam o meio. Procurem as extremidades’. As pessoas particularmente inseguras não gostam de dar nas vistas. Dizem que é no ‘meio’ que está a virtude. É aí que se sentem mais seguras e confortáveis. Comigo passa-se o contrário, asfixia-me”. Conheço Marino há alguns anos. Encontramo-nos em desfiles de moda, na inauguração das lojas que criou para diferentes marcas de luxo ou nos jantares oferecidos por um amigo comum, Azzedine Alaïa. É bem-disposto e divertido, e sabe pôr toda a gente a rir. São muitas as razões para este “Almoço com o FT”: uma exposição em Paris das suas primeiras esculturas em bronze (confidenciou-me que já vendeu dez por 160 mil euros cada), o facto de o seu projecto para a construção de um spa e de um centro comercial em Beirute ter sido escolhido em detrimento dos projectos de Zaha Ha- PETER MARINO TORNOU-SE NO PRINCIPAL RESPONSÁVEL PELA MAIS RECENTE TENDÊNCIA DE TR ANSFORMAR LOJAS DE MODA NUMA “EXPERIÊNCIA”. Peter Marino é o arquitecto “oficial” das grandes marcas de luxo e o que encontrou o seu lugar na moda. did e Norman Foster, e de ser o único ‘player’ mundial no mundo da moda. Com efeito, não conheço mais ninguém que trabalhe simultaneamente para marcas rivais como a Chanel, Dior e Armani. Mas o mais extraordinário é ver como o seu ‘look’ por vezes se sobrepõe ao seu currículo. Figura nas listas dos melhores arquitectos do mundo, tem fama de “durão” e de perfeccionista, veste-se de uma forma algo datada e tem cinco motas – uma Ducati, uma Triumph e três Harleys. Mas posso dizer que as lágrimas lhe vieram aos olhos pelo menos duas vezes durante o almoço. Talvez seja melhor explicar o contexto. Tu- do começou quando consultávamos a ementa. Escolho ‘carpaccio’ de atum e ele pede o mesmo. O empregado serve-nos a entrada e Marino fica a contemplar o prato. Depois de a filha nascer – hoje tem 21 anos –, ele e a mulher, a figurinista Jane Trapnell, engordaram nove quilos. “Foi horrível. Percebemos logo que não íamos conseguir perder peso sozinhos, por isso arranjámos um ‘personal trainer’. Não volta a acontecer”. Hoje em dia, treina todos os dias em casa, de manhã, antes de seguir para o ateliê, mesmo ao lado de casa e muito perto do Four Seasons. Quando festejou 50 anos e fez o ‘check-up’ anual, o médico disse-lhe: “Tem seis meses de vida. O que é que gostaria de fazer?”. Marino respondeu: “Gostava de fazer esqui e de jogar ténis com mais frequência”. A reacção do médico foi imediata: “O que está à espera?”. Passou a fazer esqui um mês por ano em Aspen, onde tem casa – à qual chama “museu Anselm Kiefer”, por estar decorada com numerosas pinturas do artista – e a jogar ténis todos os fins-semana na sua propriedade em Hamptons. “Foi o melhor conselho que alguma vez me deram”. Foi também por esta altura que começou a vestir-se integralmente de cabedal. Antes consumia fatos, especialmente Armani, por ter trabalhado com o estilista depois do seu primeiro grande trabalho ligado ao mundo da Abril 2013 Fora de Série 21 D O Emir do Qatar (ao lado) é um dos clientes ‘vip’ de Marino, o arquitecto que colecciona obras de artistas contemporâneos como Damien Hirst (abaixo). moda: a renovação dos armazéns Barneys, em Nova Iorque. Antes disso, quando estudava arquitectura na Universidade de Cornell (licenciou-se em 1971), usava ‘jeans’ e blusão de cabedal, e foi quando comprou a primeira mota. Filho de pais italianos – o pai era engenheiro na Northrop Grumman, uma empresa em sistemas electrónicos de defesa, e a mãe secretária na Merrill Lynch –, teve uma infância difícil. Só começou a andar aos sete anos. Quando lhe pedi para contar a história, as lágrimas vieram-lhe aos olhos. “Não gosto de falar sobre isso”, disse, primeiro baixando os olhos em direcção à mesa e depois desviando o olhar. Senti-me pouco à vontade com a situação. Quando entrevisto pessoas famosas não é habitual haver momentos tão pessoais e delicados como este. Não sabia o que fazer. Feliz coincidência: o empregado vem levantar os pratos. Marino respira fundo e diz-me que uma das primeiras coisas que fez quando os pais emigraram para Nova Iorque foi inscrever-se em aulas de dicção de inglês. Cresceu no bairro de Queens e, na altura de ir para a universidade, escolheu Cornell porque queria estudar arte, mas teve de negociar com o pai, para quem o fi lho só podia seguir matemática. Uma das suas irmãs propôs uma solução de compromisso aceite por ambos: arquitectura. Foi então que decidiu estudar italiano para aprender a falar como “os Agnelli”. Uma estratégia vencedora, visto os seus primeiros clientes privados terem sido os industriais italianos – a par da família Wertheimer, dona do grupo Chanel. Marino oscila entre o puro sotaque britânico e o calão nova-iorquino. O seu mundo divide-se em tensão alta e tensão baixa. Tanto está muito tranquilo, como solta frases provocadoras. Tanto acha isto ou aquilo o “máximo”, como se põe a dissertar sobre a sua grande paixão: o Renascimento e os bronzes do período barroco. Começou a coleccioná-los na década de 1980 – já vai em 53 peças –, mas também investe em obras de artistas contemporâneos como Damien Hirst, Richard Prince e, claro, Anselm Kiefer. Pergunto-lhe se foi pelo seu ‘look’ que se tornou numa figura tão querida no universo da moda. “Não faço ideia, não me visto assim a pensar nos outros. É uma questão pessoal. 22 Fora de Série Abril 2013 Além disso, não tenho tempo para pensar em roupa”. Literalmente: a sua vida é uma correria. Mas não fico totalmente convencida. Uma pessoa como Marino sabe muito bem que o seu ‘look’ tem um papel importantíssimo numa indústria que vive centrada na imagem. Ironicamente, a faceta mais visível do seu trabalho é uma gota de água no seu negócio. O grosso do trabalho divide-se entre projectos de casas particulares e edifícios públicos. As encomendas vêm de clientes tão distintos como o empresário Chris Whittle, o fi nanceiro Steve Schwarzman ou o Emir do Qatar, que comprou recentemente uma ‘penthouse’ no edifício com os apartamentos mais caros do mundo, One Hyde Park, mesmo em frente ao Hyde Park, em Londres. Além disso, também está a trabalhar num gigantesco complexo de escritórios em Seul, propriedade da família Samsung. O empregado serve o ‘carpaccio’ e Marino prossegue: “Sei muito bem o que dizem de mim. ‘O Marino não é aquele que desenha lo- “SEI O QUE DIZEM DE MIM. ‘O MARINO NÃO É AQUELE QUE DESENHA LOJAS DE MODA?’ ESTOUME NAS TINTAS. O PESSOAL DA MODA TEM SIDO FANTÁSTICO”. jas de moda?’ Estou-me nas tintas. O pessoal da moda tem sido fantástico para mim, além de muito interessante em termos financeiros”. Como a maior parte dos projectos de renovação de lojas de luxo se estendem por vários anos – “Sabemos que vêm aí entre 10 a 15 lojas Chanel, número idêntico para a Louis Vuitton e cerca de cinco no caso da Dior, a somar a umas quantas da Fendi, Céline, Loewe, Hublot e Graf” –, Marino tem um rendimento base garantido e uma equipa de 150 pessoas a trabalhar para ele a tempo inteiro. “Abençoado seja o Frank Gehry por ter devolvido a criatividade à arquitectura. Nos anos 80, o que é que os “reis das ‘junk bonds’” queriam? Casas ao estilo Tudor em Greenwich. Foi então que Renzo Piano, Herzog e De Meuron apareceram, criando obras que reconciliaram a arquitectura com a estética”. Quando lhe peço para eleger o projecto de que mais se orgulha fala-me nas paredes envidraçadas da loja Chanel no bairro de Ginza, em Tóquio. Um conceito da sua autoria, que funciona como televisor no exterior, mantendo a transparência característica do vidro no interior. Depois, fala-me na sede de uma empresa que produz monitores cardíacos, a Datascope, em Nova Jérsia. “É fabulosa e já saiu em dois artigos da imprensa especializada, mas ninguém se interessa porque não é uma marca de perfumes”. Embora diga que se está nas tintas para o que os outros pensam, é difícil acreditar que isso seja verdade. No ano passado, quando foi um dos nomes escolhidos para renovar a Burlington Arcade, muitos criticaram-no por “querer destruir um edifício classificado”. Mais tarde, acabou por retirar a sua proposta. Mas não são histórias como esta que o incomodam. A lágrima volta a brilhar ao canto do olho – pela segunda vez neste encontro – quando diz que a filha trocou a licenciatura em História da Arte por Antropologia. Pelo que pude perceber, nada o tira do sério a não ser a família. Marino pede um café. O chefe de sala traz o pedido, acompanhado de um prato com algodão-doce cor-de-rosa. Ao que parece é uma “surpresa” reservada aos clientes habituais no seu aniversário, mas Marino tem direito a este mimo sempre que cá vem. Porquê, não sei. Mais uma excepção inexplicável, como o seu ‘dress code’. “Ficava a matar como chapéu. Ainda vou experimentar” e ri-se. As suas gargalhadas ecoam pelo restaurante. Preparamo-nos para sair. Marino veste o blusão de cabedal Dior feito à medida. Olhei para ele e disse: “Lembra os casacos que se usam na esgrima”. A resposta foi acutilante: “A vida é uma batalha: ou lutamos ou somos esmagados”. Sobe para a mota e arranca. Pedro – e Peter – saíram do Four Seasons. FOTOGRAFIAS DE CORBIS/VMI E CEDIDAS PELA ZEGNA DESTAQUE ARQUITECTURA D DESTAQUE ARQUITECTURA Teatro e Auditório de Poitiers, em França, um projecto de João Luís Carrilho da Graça. 24 Fora de Série Abril 2013 ARQUITECTURA PORTUGUESA NO MUNDO Finalmente é o “Ano da Arquitectura Portuguesa”. Durante 2013, dez países vão poder ver e conhecer os rabiscos e os traços nacionais, que muitas vezes saltam do papel para os guias de lugares obrigatórios a visitar. Seguem-se cinco desses casos. Mas há mais, no futuro vai poder correr o mundo atrás do melhor da arquitectura nacional. T E X T O D E A N A F I L I PA A M A R O Abril 2013 Fora de Série 25 D DESTAQUE ARQUITECTURA Á LVA RO SIZ A V IEIR A MUSEU DE ARQUITECTURA – FUNDAÇÃO INSEL HOMBROICH, DUSSELDORF, ALEMANHA 26 Fora de Série Abril 2013 No local onde hoje está o Museu de Arquitectura – Fundação Insel Hombroich, havia um antigo campo militar. Mas este projecto passou por várias alterações e chegou a ser pensado para acolher um instituto de biofísica. NA ABERTURA E NESTAS PÁGINAS, FOTOGRAFIAS DE FERNANDO GUERRA Carlos Castanheira, outro nome incontornável da arquitectura portuguesa, faz uma descrição perfeita do trabalho de Siza Vieira: “Este projecto é um dos exemplos de perseverança de Álvaro Siza”. A explicação desenrola-se com a história: antes de ser um museu foi um projecto para um instituto de biofísica. A diferença não podia ser mais profunda. Durante 13 anos, as ideias do que fazer naquele espaço em Hombroich foram mudando, e mudando muito. Mas o arquitecto português foi acompanhando todas essas mudanças, que culminaram em mais um espectáculo arquitectónico de Siza. No local havia um antigo campo militar que foi desmobilizado e adquirido pela Fundação Insel Hombroich para que se pudesse construir um espaço cultural. É nesta fase que Siza é procurado para que, juntamente com o arquitecto alemão Rudolf Finsterwalder – que na altura, em 1995, estava a trabalhar no atelier de Siza, no Porto –, pensassem num espaço único que pudesse acolher grandes obras. E assim foi. Num desenho absolutamente geométrico, o arquitecto pensou o edifício como se tivesse duas partes. Uma primeira em forma de “U”, com três lados que culminam num terraço, onde ficam os espaços de exposições. Daqui sai a ligação ao outro espaço (à outra parte) através de um longo muro, onde fica o arquivo fotográfico. Lá dentro, os detalhes são ricos e executados de forma primorosa, com madeira de carvalho e os tectos forrados a madeira, também de carvalho. A descrição do museu corre o risco de ser redutora, por isso valemo-nos mais uma vez de Carlos Castanheira: “O edifício do Museu de Arquitectura da Fundação Insel Hombroich é um daqueles pequenos edifícios que pela sua tranquilidade, contenção e uso de materiais, quase que parece banal. Olhando melhor apercebemo-nos da riqueza dos espaços, da mestria de utilização e da tranquilidade que nos transmite. Percebemo-nos que uma grande obra até pode ser pequena. Apercebemo-nos, também, que a perseverança também é uma arte”. JOÃO LUÍS C A R R ILHO DA GR AÇ A TEATRO E AUDITÓRIO DE POITIERS, FRANÇA Se um trabalho de arquitectura deve emocionar em apenas um olhar, o projecto de Carrilho da Graça em Poitiers consegue-o na perfeição. Pensado para receber eventos e espectáculos, o Teatro e Auditório de Poitiers dominam agora a paisagem local, com o promontório de calcário numa cidade construída na época romana. Localizada no centro-oeste de França, às margens do Rio Clain, o nome da cidade deriva, precisamente, do romano ‘Pictavium’. Ora, a História parece ter influenciado o arquitecto português. O projecto dá vida à ideia de Acrópole através da suspensão de dois volumes rectangulares que deixam a luz ser um dos protagonistas do trabalho. Esses dois volumes correspondem exactamente ao auditório, com 1100 lugares, e ao teatro, capaz de receber até 700 pessoas. Estes foram construídos numa plataforma com vista para o vale, detalhes que valorizam o que é simples e revelam o trabalho minuciosamente reflectido. O vidro opalino que rodeia os dois espaços permite que o edifício se transforme em algo absolutamente novo sempre que nele é projectado uma luz, uma imagem, uma cor. A servir de apoio e de ligação a estes dois lugares de arte – ou que vão receber arte ou que já são, eles próprios, arte –, João Luís Carrilho da Graça pensou num pátio no piso térreo, que permite uma leitura imediata do conceito que para ali pensou. Porque, afinal, a arquitectura também se lê. A História da cidade que acolhe este Teatro e Auditório parece ter influenciado o arquitecto português na hora de desenhar. O projecto dá vida à ideia de Acrópole através da suspensão de dois volumes rectangulares. Nesta “Acrópole” a luz é a principal protagonista. O VIDRO OPALINO QUE RODEIA OS DOIS ESPAÇOS PERMITE QUE O EDIFÍCIO SE TR ANSFORME EM ALGO NOVO SEMPRE QUE É PROJECTADA UMA LUZ. Abril 2013 Fora de Série 27 D DESTAQUE ARQUITECTURA La Pallaresa, em Barcelona, é um conjunto de três edifícios brancos com janelas geometricamente colocadas, que rompe com a malha urbana de um bairro que cresceu sem controlo. Este foi, aliás, um dos desafios de Souto de Moura quando desenhou o projecto. EDUA R DO SOU TO DE MOUR A UM DOS PRESSUPOSTOS DO PROJECTO ER A LIBERTAR ESPAÇO SUFICIENTE PAR A CRIAR NOVOS ESPAÇOS VERDES. 28 Fora de Série Abril 2013 Sabemos que os projectos de Souto de Moura são mais desafios do que… projectos. E este, em Barcelona, entra nessa categoria. Numa vista aérea, é incontornável o trabalho concebido pelo arquitecto português, La Pallaresa. Um conjunto de três edifícios brancos com janelas geometricamente colocadas, que rompe com a malha urbana de um bairro que cresceu sem controlo. Essa foi, aliás, uma das características que mais marcaram este projecto, já que o terreno está na fronteira de duas zonas cuja morfologia é muito diferente, exactamente por culpa desse crescimento desenfreado. Souto de Moura viu-se com alguns problemas em mãos: por um lado, o limite com o centro histórico; por outro, o limite do bairro de Singuerlin, que teve também um desenvolvimento desordenado. Foi nesta “confusão” urbana que se ergueu La Pallaresa, que tinha, à partida, vários pressupostos. Um deles era libertar espaço suficiente para criar espaços verdes, como prolongamento do parque Europa, ali ao lado, e com ligação ao complexo lúdico Can Zam. Seguia-se a necessidade de construir os edifícios em altura, para que se aproveitassem da luz. Assim, nasceram três edifícios de alturas diferentes: um baixo, onde fica um hotel e um cinema; e dois altos, que servem de habitação. O hotel tem nove pisos e relaciona-se com a torre de 24 pisos e com uma outra de 14. Todos os espaços têm ligação através de uma praça central. Os três edifícios compõem um novo cenário na paisagem, é um organizado bairro dentro de um outro bairro. O objectivo foi cumprido. FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELO ATELIER LA PALLARESA, BARCELONA, ESPANHA D DESTAQUE ARQUITECTURA O Atelier Promontório quis dar ao edifício Lubango Center uma identidade própria. Conseguiu-o através das paredes exteriores onde utilizou tijolos de cor castanha, inspirados nos tijolos de barro angolanos. ATELIER PROMON TÓR IO LUBANGO CENTER, HUÍLA, ANGOLA FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELO ATELIER Angola continua a ser um destino óbvio de empresas que querem expandir-se. Fazem-se contactos, estabelecem-se parcerias, até ao dia em que se torna obrigatório ter uma sede própria no país. Os ateliers de arquitectura ganham com isso na hora de desenhar novos espaços, num país onde ainda há muito por fazer. Foi o que aconteceu com o Atelier Promontório que aceitou um projecto no centro da capital da Huíla, o Lubango Center. João e Paulo Perloiro, Paulo Martins Barata, João Luis Ferreira e Pedro Appleton, os arquitectos responsáveis pelo atelier, foram desafiados a projectar um edifício de habitação, de escritórios e de comércio, juntos num só bloco. Assim, nos primeiros quatro pisos estão os escritórios, que foram preparados para receber uma ou mais empresas por piso. Os apartamentos ficam nos andares superiores, para tirarem partido da vista sobre a cidade, e foram pensadas tipologias do T1 Studio ao T4. No entanto, a equipa do Promontório teve o cuidado de conceber acessos e ‘halls’ de entrada diferenciados para que a privacidade de quem ali vai morar esteja garantida. No piso 0, está uma zona de lojas e de serviços. O Promontório quis dar ao edifício uma identidade própria. Conseguiu-o através das paredes exteriores onde utilizou tijolos de cor castanha, inspirados nos tijolos de barro angolanos. Nada disto foi inocente, o tijolo é um traço distintivo na cultura de Angola e a equipa do Promontório quis fazer parte dessa cultura, até mesmo na escolha da cor, o castanho, uma ligação clara à terra, como se tratasse de uma produção local. Uma fusão sempre desejada da arquitectura à região que está a ser trabalhada. AS EMPRESAS SEGUEM UM RUMO QUASE OBRIGATÓRIO PAR A ANGOLA E OS ATELIERS GANHAM COM ISSO NA HOR A DE DESENHAR NOVOS ESPAÇOS. 30 Fora de Série Abril 2013 D DESTAQUE ARQUITECTURA Sky Residence II, Sky Business e Sky Gallery, são estes três espaços que dão vida ao Sky Center, em Luanda, e que foram desenhados pelo Atelier Risco. Os arquitectos portugueses pensaram, numa primeira fase, nas habitações e nos escritórios, e só depois, na zona comercial. ATELIER R ISCO 32 Fora de Série Abril 2013 Sky Residence II, Sky Business e Sky Gallery, são estes três espaços que dão vida ao Sky Center, em Luanda. O Atelier Risco aceitou o desafio, num primeiro momento, para desenhar e executar os apartamentos e os escritórios dos dois primeiros espaços, ambos com 24 pisos. Integrados num conjunto de quatro torres, a ideia da equipa do Risco – liderado pelos arquitectos Tomás Salgado, Nuno Lourenço, Carlos Cruz e Jorge Estriga – foi, no Residence II, desenhar apartamentos confortáveis que tirassem partido da vista desafogada sobre o mar. Assim, com apartamentos ‘duplex’ e ‘simplex’, aumentaram a dimensão da estrutura original e criaram saliências nas fachadas laterais do edifício. Uma decisão que permitiu que 80% dos apartamentos tenham agora vista de mar. Na torre Business, os arquitectos foram confrontados com o facto de ainda não se saber se esta iria servir um conjunto de escritórios, se um escritório por piso ou, ainda, se a torre seria toda ela a sede de uma empresa. Perante a dúvida, a estratégia foi também diferente. Com todos os cenários em aberto, a equipa optou por desenhar um sistema versátil, capaz de responder a qualquer uma das hipóteses, sem que a arquitectura ficasse comprometida. Uma entrada imponente, acessos eficazes e pisos “limpos”, para que pudessem ser usados de forma personalizada caso a solução fosse uma empresa por piso, e uma imagem exterior imediatamente reconhecível, foram estes os aspectos que o Risco teve em consideração. E com sucesso já que, posteriormente, o atelier português voltou a ser chamado para desenhar uma pequena galeria comercial, localizada no piso 1, assim como um espaço com bares e restaurantes no terraço, que fica também na base do edifício e faz a ligação entre as torres. O Sky Center deverá estar a funcionar a 100% no final deste ano. FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELO ATELIER AS SALIÊNCIAS CRIADAS NAS FACHADAS LATER AIS DO EDIFÍCIO PERMITIR AM QUE 80% DOS ANDARES TENHAM AGOR A VISTA DE MAR. SKY CENTER, LUANDA, ANGOLA D DESTAQUE ARQUITECTURA O MILIONÁRIO QUE QUER MAIS DO QUE “COISAS” N i co l a s B e r g g r u e n , 51 anos , é um d os h o m e n s m a i s r i co s d o m u n d o . I nv e s t i d o r e f i l a n t ro p o , B e r g g r u e n o p to u p o r n ã o te r c a s a . V i v e e m h o té i s d e c i n c o e s t re l a s . P a r a u n s é u m e xc ê n t r i c o . P a r a o u t ro s , u m m o d e l o d e g e n te r i c a q u e g os ta d e d es fr u ta r d o q u e “n ã o é material ”. O q u e é p re c i s o p a r a a t i n g i r e s te “ n i r v a n a ” ? E n t re o u t r a s co i s a s , d i n h e i ro . T E X T O D E M A FA L D A DE A AV VELAR F O T O G R A F I A D E PA AU LO ALEXANDRE COELHO 34 Fora de Série Abril 2013 ão tem casa própria, avião, jacto, helicóptero, barco ou qualquer uma dessas mordomias consideradas “outro mundo” para o comum dos mortais. Não anda de transporte próprio mas corre o mundo, chegando mesmo a dormir em várias capitais na mesma semana. Um luxo para uns. Um cansaço para outros. O certo é que Nicolas Berggruen, considerado um dos homens mais ricos do mundo, não se cansa de correr, de investir e de tentar diversificar o seu portfólio de investimentos. Tudo isso com um estilo muito próprio e excêntrico. E sem nunca esquecer o seu ingrediente favorito: paixão. Reconhecido como o milionário sem tecto, Berggruen, que ocupa a 206ª posição no ‘ranking’ “dos mais ricos do mundo” segundo a revista “Forbes”, não tem, “por opção”, como gosta de frisar, casa própria. Há 13 anos decidiu “não ter mais bens materiais” e vendeu o seu apartamento em Manhattan e a sua ilha privada perto de Miami. “No meu caso trata-se de uma escolha, é mais confortável, é mais flexível e dá-me mais liberdade”, diz em conversa com a Fora de Série. Apaixonado por festas, Berggruen adora o glamour e aparece sempre na companhia de monarcas, modelos e outros figurinos internacionais que o tornam assim “não tão diferente” da nata internacional, que tem dinheiro e, normalmente, mansões com grandes claustros ou, num estilo mais moderno, com grandes obras de arte contemporânea, que às vezes chegam a ocupar os metros quadrados de qualquer T4. Não é o caso de Berggruen. Nicolas, que vive num registo T4 em versão de quarto de hotel, com cinco estrelas encriptadas, não tem, hoje, casa nem obras de arte. Já teve. O seu apartamento de 5ª Avenida, em Nova Iorque, por exemplo, era conhecido pelo seu valioso recheio de obras de arte. E não era para menos dadas as suas raízes familiares ligadas ao mun- do da arte e do espetáculo. Filho de Heinz Berggruen, um grande coleccionador e amigo pessoal de Picasso, e da actriz alemã Bettina Moissi, Nicolas, que nasceu em Paris, tem dupla nacionalidade – alemã e americana – e é, indiscutivelmente, um cidadão do mundo. Habituado desde sempre a pontes áreas, Nicolas sempre viveu rodeado de luxos e (verdadeiras) elites. Também por isso a sua ligeireza e reconhecida descontração em qualquer ambiente mundano. Filho rebelde de uma sofisticada família, Nicolas sempre gostou “de ser diferente” e chegou mesmo a ser expulso de um colégio suíço. Consta que por “insubordinação”. Para os registos ficou ainda a afi rmação de que jamais aprenderia uma palavra de inglês na escola porque “era a língua do imperialismo”. Mas, e fazendo valer a máxima “nunca digas nunca”, aprendeu não só inglês como se licenciou em Finanças em Nova Iorque. E cedo provou que o seu ADN junta arte, risco e prazer. Perante este ‘cocktail’, não é de estranhar que em 2000 tenha abdicado de viver “com coisas”. “No meu caso, necessito menos do mundo físico e não me interesso assim tanto pelo sentimento de posse. Do meu ponto de vista é bastante humano e saudável não ter que acumular coisas”, afirma. “E onde guarda os seus livros, os seus ob- Abril 2013 Fora de Série 35 DESTAQUE ARQUITECTURA jectos pessoais?”, perguntamos, curiosos. “O que nos torna especiais como seres humanos é que podemos armazenar várias coisas na nossa mente. Nos dias de hoje, somos capazes de guardar muita coisa de forma anacrónica. A ideia de poder experienciar e activar coisas, para mim, é muito mais interessante. É algo meu e pessoal”. “E será que não sente falta de chegar a casa e gritar: ‘I’m back’ (estou de volta)?”, insistimos, ainda com a mesma curiosidade. “Para mim, casa é o sítio onde estou no momento. O único entusiasmo que sinto é o dos desafios do amanhã. A ideia de descanso é muito importante, mas não é o meu foco principal. Quando venho a Portugal e fico em Lisboa, sinto-me em casa. As pessoas são fantásticas, há aqui oportunidades, é um sítio vibrante. Como tal, não posso pedir mais. Tenho muita sorte por poder escolher não ter dias sempre iguais”, responde, acrescentando: “Porque não tornar isto numa escolha exclusiva!?”. Berggruen é o investidor que comanda um império que está debaixo de um só chapéu: Berggruen Holdings, entidade que fundou em 1988, à qual pertencem 37 grandes empresas, entre elas – e com presença em Portugal – a Prisa, que comanda a Media Capital. Mas há mais: Nicolas, que foi sócio de Julio Mario Santo Domingo Jr. (filho mais velho de um magnata colombiano e pai de Tatiana Santo Domingo, noiva do príncipe Andrea Casiraghi, filho de Carolina do Mónaco), é amigo e sócio do português Pais do Amaral, a quem faz rasgados elogios. Dono do “Le Monde”, um dos principais accionistas da cadeia Burger King e da gigante alemã Karstadt, Berggruen está presente em muitos e grandes investimentos. Algo que pode ser traduzido com um só número: 2,3 mil milhões de dólares. Uma fortuna para quem não tem casa. Mas não ter casa não implica não ter amigos. Nem no caso particular de Nicolas isso faria sentido. O investidor, que nos falou da sua vida pessoal e empresarial, deu muito enfoque aos projectos africanos (a conversa, aliás, foi interrompida três vezes por chamadas oriundas desse continente). Mas da conversa saiu outra certeza: Berggruen vai investir mais em Portugal. Do lado pessoal, é impossivel não destacar o espírito de trabalho do mi- lionário que quer mudar o mundo. Ao seu estilo. Sem bens materiais, com a camisa rufadinha (que gasta até ao limite), fazendo jus ao que defende – o que mostra seriedade –. Ainda assim, Nicolas consegue ter estilo, um estilo que enche as suas festas, onde não faltam celebridades. A mais badalada de todas é a festa do Óscar que Nicolas promove em LosAngeles, anualmente, durante a entrega da estatueta principal do cinema. Esta festa ocorria, invariavelmente, no hotel Chateau Marmont, conhecido por ser o preferido de Leonardo DiCaprio e de Paris Hilton. Ocorria, porque este ano não ocorreu. O que deu origem a um dos mais comentados assuntos pela capital cinematográfica norte –americana. “Uma das grandes desilusões nesta semana dos Óscares, é não haver a festa de Nicolas Berggruen no Chateau Marmont”, escreveu o correspodente do “The Los Angeles Post”. O que terá acontecido? Especula-se que o milionário – que acaba de lançar um livro “Governação Inteligente para o NESTA PÁGINA, RETRATOS DE PAULO ALEXANDRE COELHO E FOTOGRAFIAS DE REUTERS D “NÃO ME INTERESSO PELO SENTIMENTO DE POSSE. É BASTANTE HUMANO E SAUDÁVEL NÃO TER QUE ACUMULAR COISAS”. século XXI” (obra também lançada em Portugal) – está empenhado em ganhar destaque no mundo da alta finança por ser um “pensador” que quer promover o debate intelectual entre as nações. E assim parece. Nicolas, que preside ao “The Berggruen Institute”, conseguiu reunir nomes sonantes da esfera política e económica no seu instituto. Fernando Henrique Cardoso, Francis Fukuyama, Gerhard Schroeder, Felipe González, Tony Blair e Joseph Stiglitz são apenas alguns dos nomes que fazem parte deste novo projecto de vida de Nicolas, para o qual não lhe falta determinação. Visionário, Nicolas Berggruen é um milionário que não tem casa mas que habita o melhor dos mundos: o das ideias. E até ai está a ganhar terreno. Para já, ainda paga condomínio na “casa global” que escolheu como sua, mas em breve, conquistará a “arte”. Uma “arte” que prova que é possível ter uma vida diferente. Para isso só é preciso ter imaginação. E essa, não há dinheiro que compre. A entrevista completa a Nicolas Berggruen, gravada no programa “Ideias em Estante”, poderá ser vista no site do Económico (www.economico.pt). Nicolas Berggruen é amigo e sócio de Miguel Pais do Amaral (em cima). Mais acima, o ex-chanceler alemão Gerhard Schröder com Heinz Berggruen, o pai de Nicolas. Em cima, o Chateau Marmont. 36 Fora de Série Abril 2013 Negócio A Oitoemponto celebra 20 anos e quem se tornar cliente desta loja no Porto pode, com o tempo, virar amigo de Artur Miranda e Jacques Bec, os dois responsáveis por este negócio de arquitectura de interiores. UMA LOJA COM ITINER ÁRIO E GEOGR AFIA A Oitoemponto tem 20 anos. Faz arquitectura de interiores mas ao gosto diz nada. Ao contrário, aos amigos diz muito. Artur Miranda e Jacques Bec ao vivo. T E X T O D E A N T Ó N I O F R E I TA S D E S O U S A / F O T O G R A F I A D E B R U N O B A R B O S A 38 Fora de Série Abril 2013 E m 1990, a Europa parecia que tinha chegado ao culminar do seu sonho dourado de cinco décadas: as Alemanhas, a de Leste e a de Oeste, voltavam a ser outra vez uma (como em 1870); e o ex-sindicalista Lech Walesa era eleito presidente da Polónia. Tudo está bem quando acaba bem, diriam até os mais cépticos, face a uma Europa que já respirava os avatares que a levariam à moeda única e a um mundo em redor razoavelmente em paz consigo próprio – descontando-se as inquietudes habituais de Saddam Hussein, a quem deu para anexar o Kuwait como se tudo aquilo não passasse de um monte de areia. Artur Miranda, que vivia há sete anos numa Suécia que só viria a ser o maior exemplo do tino europeu uns 20 anos mais tarde, chegou a Portugal em 1990 e encontrou um país homologado pelos ricos, a abarrotar de esperanças sólidas em si mesmo, e pronto a gastar o dinheiro da Europa como se não houvesse amanhã. Entretanto, em Paris – a única cidade do universo que tem uma luz própria e irrepetível – Jacques Bec acertava as horas ao mundo com a precisão de um relojoeiro destinado ao ‘design’. Artur Miranda decidiu soltar-se do mundo da moda – que o tinha levado à Suécia – e apostar na decoração. Primeiro, com a timidez própria dos primeiros tactos (em lojas e ‘show rooms’), mas depois de forma mais consistente e forte, que se consubstanciou na abertura da Oitoemponto. A opção era clara: não se tratava ali de decoração de interiores – ou talvez também fosse isso mas não era só isso – mas sim de arquitectura de interior. A década corria célere já no ano de 1993 – tudo continuava bem: Bill Clinton arredava os belicosos Republicanos do poder e a Europa acreditou que voltava a ser o espelho onde os Estados Unidos queriam reflectir-se – como céleres eram também os negócios da Oitoemponto. Entretanto, em Paris, Jacques Bec apanhava um avião para Portugal – por uma dessas razões impossíveis de descortinar nas cartas marcadas pelo destino ou nos sulcos indecifráveis das mãos – e de repente decidiu que era aqui, no Porto, uma cidade quase sem luz, cinzenta e morna, que queria ficar. E ficou também na Oitoemponto, cujo capital acabaria por partilhar equitativamente com Artur Miranda. Estão ali os dois sentados – no meio de uma azáfa- ma de receber amigos, porque a Oitoemponto faz 20 anos a 23 de Março e é sempre preciso mimar os amigos, dar-lhes as atenções todas, com sorrisos e copos de champanhe – e, no espaço curto de um escritório comprido e densamente povoado por móveis que podiam ser de decoração, há uma cumplicidade. É a palavra certa. Há outras palavras, possivelmente certas, mas desta vez também inesperadas: “Isto [a decoração] tem muito pouco a ver com gosto, é técnica e dedicação”, diz Artur Miranda. Jacques Bec levanta-se para ir fazer qualquer coisa urgente, como se para ele a frase fizesse todo o sentido que as palavras devem ter. Cumplicidades. Mas como é isso de decoração sem gosto? “O gosto é um passa-tempo; a decoração é uma profissão”. Certo, mas e a loja? O escritório comprido e densamente povoado fica por cima da loja da Oitoemponto e dentro dela, da loja, há um itinerário de bom gosto: nas paredes, nos cantos, nos recantos que parece que recriam pedaços de casas onde apetece estar quando há chuva, nos pormenores que só se descobrem quando se aproxima o olhar, na sofisticação de cada peça, na beleAbril 2013 Fora de Série 39 MAS COMO É ISSO DE DECOR AÇÃO SEM GOSTO? “O GOSTO É UM PASSATEMPO; A DECOR AÇÃO É UMA PROFISSÃO”, DIZ ARTUR MIR ANDA. za inesperada de quase todas elas, nos metais frios e nas madeiras mornas, nas soluções iridescentes ou a preto-e-branco, nas madeiras velhas, nos cromados hiper-modernistas, há ali um itinerário. E um mapa: a geografia da loja parece um planisfério a três dimensões aberto em cima de uma mesa, com bocados de arte e de cultura por cima. Mas isso não importa nada. “Quando fazemos a decoração de um interior, só queremos saber uma coisa: do que é que a pessoa não gosta”. Jacques Bec volta a sentar-se: mudou de óculos e tem no rosto uma estampa feliz de quem vai receber os amigos. “Não tenho nenhumas saudades de Paris”, tinha dito uns minutos antes – será possível? “É, vou mais vezes à Ópera de Paris desde que vivo no Porto que quando vivia lá”, a culpa é da Transavia. Voltemos atrás: “Depois de saber o que os clientes não gostam, queremos saber quais são as suas lou- Cerca de 80% dos negócios da Oitoemponto, que chegam aos 10 milhões de euros, uros, são assegurados no estrangeiro. Angola gola e Brasil são os seus melhores clientes. 40 Fora de Série Abril 2013 curas. Qualquer loucura: uma cama para três, qualquer coisa. Entramos na sua intimidade para que as pessoas se confessem”. Entre aspas, ou talvez mesmo sem elas, há ali uma promiscuidade construtiva que é preciso esmiuçar para que, no final, a arquitectura de interiores seja, para quem a “comprou”, absolutamente pessoal. Sem essa promiscuidade, as subtilezas, as minudências e os pormenores haviam de parecer coisa vã, como que deslocada, que pudesse servir a qualquer um. Mas essa promiscuidade tem outro resultado evidente: “Os nossos clientes acabam a maior parte das vezes por tornarem-se nossos amigos” – Artur e Jacques ali de conversa, dois cigarros acesos, e os amigos lá em baixo quase à espera – “o que resulta numa coisa engraçada: fazemos as casas de filhos e até de netos de pessoas que se tornaram nossos clientes há 20 anos”. É preciso mimá-los, aos amigos: estão quase à espera lá em baixo, na loja que tem um itinerário e é um mapa, e durante muitos anos, nos dias 8 de cada mês, às 8 horas da noite, organizavam jantares para 8 pessoas – como é que ninguém lhes perguntou o que raio há com o número 8? “Era uma espécie de ‘cocktail molotov’” sem lista prévia nem outras obrigações, que ia ao sabor do que, aos amigos, lhes desse na gana – que é a forma mais amiga de se tratar os amigos. Fazia-se tarde, desceu-se as escadas, as pessoas estavam como que numa festa, mas os tipos dos jornais são sempre uma seca: perguntava-se ao Rui Moreira se já tinha a candidatura independente à Câmara do Porto e à Estela Barbot se ainda tinha pachorra para aturar os sujeitos do FMI – a Sandra passou com o seu cabelo de algas e distraiu tudo – mas as respostas, como iam de champanhe na mão, reservam-se. Cumplicidades. Vinte anos depois de 1993, Portugal está vazio, exangue. Ali tão perto do Porto, quase morto. A Europa podia ficar para lá da porta da Oitoemponto mas não é isso: já não existe, suicidou-se numa fúria de dívidas a que todos (absolutamente todos) chegaram a chamar bondosas, já não é o espelho dos Estados Unidos, nem de si, nem de nada. Não há, não é cúmplice. “Claro que sentimos a crise na Oitoemponto, mas talvez seja mais o pensar duas vezes antes de gastar. O certo é que, no fim, acabam por gastar”, diz Jacques Bec lá do alto do seu metro e 85 e da sua empresa confortável. Mas há um segredo que, cúmplice, Artur Mifo randa revelaria mais tarde: “Uns 80% dos negócios da ra Oitoemponto – que chegam aos 10 milhões de euros O – são assegurados no estrangeiro”. Os culpados são os do costume – bom, os do costume não, só serão do costume daqui por uns anos. “Sempre fizemos coisas para tu fora, mas começámos mais a sério há seis anos em Lufo anda”. Depois os azimutes rodaram para o Brasil – “o an passa a palavra de boca a orelha é a nossa melhor pupa blicidade” – e depois descontrolaram-se, já não se sabe. bl Seja lá como for, revela Artur Miranda – lá fora quase a Se noite dos intervencionados que já não têm ‘spreads’ a n 0,35% –, “fizemos sempre tudo com capitais próprios; 0, não é por modéstia mas com toda a humildade que o n digo. Resultado: “Viajamos 200 dias por ano”. Mas não di é sempre pelos clientes: “Também vamos à procura de peças” – que podem estar num lado qualquer: antiquápe rios, casas antigas, leilões, ou na loja do João – que tori dos tratávamos por Metralha porque eram muitos irdo mãos e que é o tipo mais simpático do Porto, lá do alto m do seu sorriso de um metro e 80 e da sua mota de enorme cilindrada. O grosso das peças, mesmo assim, sai m dos lápis e dos pormenores demorados dos desenhos do dos dois e são mandados fazer algures por ali, nos sído tios onde as sabedorias antigas são guardadas como se ti fossem um tesouro. fo Depois ia ser o jantar: despediram-se os amigos para irem às suas vidas e um punhado deles que restou em redor foi mandado para a zona antiga do Porto, para uma dessas ruas onde só cabe um automóvel de cada vez e os que lá moram é que mandam – mesmo que tenha de ser com navalha e finura linguística. O reste taurante era como a rua: estreito, cheio de sombra, certa to para as confidências e as histórias de fazer rir pela noite dentro. E foi isso que aconteceu. n OBJECTOS FOTOGRAFADOS POR NUNO SAT Negócio Saleiro e pimenteiro em bandeja “Jardim do Éden” Christofle. Preço: 640 euros. Almofada ‘chevron’ coral (por cima) e almofada ‘Ikat’ antiga (por baixo) da Casa do Passadiço. Preços: 360 e 219 euros, respectivamente. fs Terrina em forma de abóbora Dior. Preço sob consulta. Mesa de matraquilhos Pinel & Pinel. Preço sob consulta. Sofá “Mr. Softy” azul-marinho com capa removível, da colecção “Successful Living from Diesel with Moroso”, da Diesel. Preço: 1580 euros. Porta relógios feito à mão, com capacidade para quatro relógios, da Pinel & Pinel. Preço: 6000 euros. Mesa “Arborescence” Christofle. Preço: 4900 euros. Uma casa não é só paredes. Aliás, uma casa revela-se pelo que a veste e a decora. Um sofá ‘vintage’, uma peça de ‘design’, um livro rigorosamente guardado. Ficam algumas sugestões. Arrojadas, claro. Prato raso “Forum”, prato de copa “Butterfly Parade” e prato de sobremesa “Forum”, todos da Vista Alegre em parceria com a ‘maison’ Christian Lacroix. Preço: 26, 39 e 25 euros, respectivamente. Perfume “Volutes” Diptyque, na Fashion Clinic. Preço: 95 euros, 75 ml. A N A F I L I PA A M A R O R I TA I B É R I C O N O G U E I R A T E X TO D E SE L ECÇ ÃO D E Jarras inspiradas em canos da Pinel & Pinel. Preço sob consulta. Livro “Poker – The Ultimate Book” da Assouline, na Fashion Clinic. Preço: 54 euros. Abre-cartas da colecção “Jardim do Éden” Christofle. Preço: 160 euros. Moradas: CASA DO PASSADIÇO: Largo de S. João do Souto – Braga. Tel.: 253619988; CHRISTOFEL: Av. Eng. Duarte Pacheco, nº 24 A – Lisboa. Tel.: 213855483; DIESEL: Praça Luís de Camões, nº 28 a 32 – Lisboa. Tel.: 213421980; DIOR: em www.dior.com; FASHION CLINIC: Tivoli Fórum, Av. da Liberdade, nº 182, loja nº 5 – Lisboa. Tel.: 213549040; PINEL & PINEL: em www.pineletpinel.com; VISTA ALEGRE: Largo do Chiado, nº 20 – Lisboa. Tel.: 213461401. Abril 2013 Fora de Série 41 Estilo NA MODA E NA ARQUITECTUR A, QUANDO MENOS É MAIS Uma mulher bonita. Boa ‘lingerie’. E a casa perfeita. De que é que uma pessoa precisa mais? O expoente máximo da sofisticação e elegância é acertar na equação “menos é mais”. O resultado é muito brilho e pequenos apontamentos de cor, para brincar com a geometria das paredes brancas e as divisões ainda vazias do Palácio Mesquitela. T E X TO D E J OANA M O U R A FOTO G R A F IA D E P ED RO F ER R EI R A A S SIS T I D O P O R R I C A R D O L AM EG O P R O D U Ç ÃO D E MAN U EL DAM IÃO M A Q U I L H A G E M D E S A N D R A A L M E I D A C A B E L O S D E P I N I PA R A G R I F F E M A R I A N A M O N T E I R O R E P R E S E N TA D A P E L A G L A M A G R A D E C I M E N T O S A O PA L Á C I O M E S Q U I T E L A P O R T O D A S A S FA C I L I D A D E S C O N C E D I D A S a protagonista foi a actriz Mariana Monteiro, que se imaginou “uma diva de cinema de uma outra época”, uma espécie de Rita Hayworth, despida de tudo menos “da classe e de um par de carteiras e jóias”. Num duplex do mais recente condomínio de luxo da zona histórica da cidade de Lisboa, o Palácio Mesquitela, o tecto alto combina com as grandes janelas clássicas por onde entra a luz do sol. As escadas que dividem a casa são também um pormenor que faz a diferença e que esta “diva do cinema” soube aproveitar da melhor forma. Podia viver ali. Ela, a sua roupa, as cartei42 Fora de Série Abril 2013 ras, os sapatos, as jóias e… as paredes vazias. As dicas do fotógrafo Pedro Ferreira foram fundamentais para a criação de um personagem que Mariana Monteiro diz ser muito diferente daqueles que representa em televisão. “Aqui, a expressão conta mais. A fotografia capta apenas uma imagem que tem que ser capaz de passar uma mensagem. Em televisão, a expressão existe, mas de forma menos carregada, uma vez que se faz acompanhar por texto”, explica a actriz. Daí a atitude forte, quase agressiva, impondo-se ao espaço. Ela e os “seus” acessórios de luxo. Abril 2013 Fora de Série 43 Estilo Na abertura, saia (254,80 euros) Missoni, na Nude. Bolero (207 euros) Patrizia Pepe. Colar “Blanche” em ouro rosa e pérolas barrocas brancas (3800 euros) Mimi. ‘Soutien’ preto (56,90 euros) Chantelle, no El Corte inglès. ‘Clutch’ “Serpenti” ‘fuchsia’ (1300 euros) Bulgari, no El Corte Inglès. Em cima, colar “Saphir flower” (42000 euros) Bulgari, no El Corte Inglès. Casaco de vison (5245,50 euros) Rizel e ‘négligé’ em seda preta (405 euros) Lingerie La Perla, tudo na Loja das Meias. Anel “Cocktail” em ouro rosa e quartzo (4500 euros) Mimi. Ao lado, casaco de vison com cinto em pele (5245,50 euros) Rizel, ‘cardigan’ em malha dourado (1070 euros) e ‘top’ em malha dourado (820 euros), ambos Dior, e sandálias douradas com calcanhar encarnado (322,50 euros) Maliparmi, tudo na Loja das Meias. Anel “Cocktail” em ouro rosa e quartzo (4500 euros) Mimi. 44 Fora de Série Abril 2013 Abril 2013 Fora de Série 45 Estilo 46 Fora de Série Abril 2013 Abril 2013 Fora de Série 47 Estilo Na dupla anterior, colete preto (200 euros) Hôtel Particulier, ‘leggings’ com lantejoulas, (334,80 euros) By Malene Birger, sandálias pretas com aplicações no salto, (561 euros) Moschino Cheap and Chic, tudo na Nude. ‘Soutien’ Filipe Faísca (preço sob consulta), colar “Saphir flower” em safiras, pavé de diamantes e ouro (42000 euros) Bulgari, no El Corte Inglès. Em cima, casaco com estampagem (837 euros) Philosophy by Alberta Ferretti e sapatos rosa (492 euros) Dior, tudo na Loja das Meias. ‘Soutien’ preto (56,90 euros) Chantelle e cinta preta Passionata (preço sob consulta), tudo no El Corte Inglès. Mala “Isabela” em pele de crocodilo lilás e azul, (10000 euros) e colar “Saphir flower” em safiras, pavé de diamantes e ouro (42000 euros), ambos Bulgari, no El Corte Inglès. Moradas: EL CORTE INGLÈS: Av. António Augusto de Aguiar, nº 31 – Lisboa. Tel.: 213711700; FILIPE FAÍSCA: Calçada do Combro, nº 99 – Lisboa. Tel.: 213420699; LOJA DAS MEIAS: Av. Eng. Duarte Pacheco, Centro Comercial Amoreiras, loja 2001 a 2004 – Lisboa. Tel.: 213833786; MIMI JÓIAS na JOALHARIA FERREIRA MARQUES: Praça D. Pedro IV, nº 7/9 - Lisboa. Tel.: 213423723; NUDE: Av. Infante Santo, nº 60 J – Lisboa. Tel.: 213951297; PATRIZIA PEPE: Av. da Liberdade, nº 180 – Tivoli Fórum, Loja 3-B – Lisboa. Tel.: 213161392. 48 Fora de Série Abril 2013 50 Fora de Série Abril 2013 Estilo A MODA DE ALMODÓVAR “Los Amantes Pasajeros” de Almodóvar estreia no próximo dia 18 de Abril. Antonio Banderas, Penélope Cruz e Paz Veja voltam a ser as estrelas do realizador espanhol, que mais uma vez não descura o guarda-roupa. O estilo de Almodóvar está patente em todos os seus filmes e marcas como Chanel, Dolce & Gabbana ou Jean-Paul Gaultier também. T E X T O D E P E D R O M A R TA S A N T O S Abril 2013 Fora de Série 51 Estilo “Os Amantes Passageiros” conta com peças e figurinos criados por David Delfín (foto em baixo), o criador mais aplaudido da Espanha contemporânea. Em todos os seus filmes, Almodóvar sempre fez questão de marcar o seu estilo, numa enorme cumplicidade com o mundo da moda. A lmodóvar, como diz o próprio, é um “fabulador”. Há mais de trinta anos que é ele a escrever, desenhar, compor e dirigir os ambientes dos seus filmes. O sonho era ser romancista, mas quando percebeu que se exprimiria melhor em termos visuais, os temas da identidade, do sexo, do desejo encontraram palco no cinema. Almodóvar encena sonhos ‘kitsch’, lutas ‘camp’, batalhas sentimentais onde os géneros homem/mulher se confundem até se esbaterem nas cores garridas da Espanha pós-franquista. Nessa encenação, há personagens inconfundíveis, dolo, orgasmos, pares desfeitos, música vibrante, famílias ressuscitadas, mas há também moda. Muita moda. Almodóvar, sem nunca ter criado uma peça de roupa, é um dos maiores estilistas do cinema actual. A 19ª longa-metragem do manchego (nasceu em Calzada de Calatrava, uma terrinha perto de Ciudad Real, na região de Castilla – La Mancha, onde Cervantes colocou D. Quixote a cavalgar contra moinhos) é um regresso à comédia estouvada mas socialmente perspicaz de “Mulheres à Beira de Um Ataque de Nervos”. 52 Fora de Série Abril 2013 1988 2013 Este mês em estreia nas salas portuguesas, “Os Amantes Passageiros” tem acção num voo acidentado de uma companhia aérea fictícia, a Peninsula. O avião pode estar preste a cair, mas o trio festivamente ‘gay’ de tripulantes de bordo assegura que a viagem seja aprazível para o banqueiro corrupto, a vidente, o actor famoso ou o par recém-casado – são alguns dos turistas e amantes do voo 2549. Com participações especiais do duo que transformou em estrelas planetárias – será o 7º filme de Antonio Banderas com Almodóvar e o 5º de Penélope Cruz –, o ‘cocktail’ musical sugere Almodóvar ‘vintage’, e os diálogos deverão confirmar o ouvido único do realizador para as idiossincracias que nos matam (e nos salvam). Mas há algo mais que é suposto manter-se: o irreverentíssimo sentido “fashion”. “Os Amantes Passageiros” conta com peças e figurinos criados por David Delfín, o criador mais aplaudido da Espanha contemporânea, num banho de verdes claros e azuis marinhos que compensam o caos a sete mil metros de altura. Delfín foi a grande figura da última Semana da Moda de Madrid, num desfile em ritmo ‘rock’ guiado pela mão gigante de Rossy de Palma – a diva almodovariana por excelência –, sob o olhar de Marisa Paredes, outra figura incontornável do cineasta. O ‘designer’ de Malága é apenas o último de uma longa lista de colaboradores, e procura brilhar nos céus de “Os Amantes Passageiros” ao lado de um vestido às flores de Dolce & Gabbana (colado à pele crocante de Blanca Suárez), de um ‘necessaire’ vermelho de pele da Bulgari e dos estampados da Etro que Norma Boss (Cecilia Roth) nos faz o favor de passear. Um vestido, também florido, de Dolce & Gabbana já tinha sido essencial na intriga, entre o melodrama e o ‘thriller’ de horror, do penúltimo filme de Almodóvar, “A Pele Onde Eu Vivo” – era o símbolo da transformação da personagem de Elena Anaya, enclausurada pelo Frankenstein pós-‘yuppie’ de Antonio Banderas. A moda e a roupa estão lá desde o início. Almodóvar não segue as modas, cria-as. Desde os tempos da ‘movida’ madrilena do final dos anos 70, quando Pedro se mudou da província que o fascina e traumatiza – os costumes asfixiantes, o internato num colégio de padres, que exorcizará em “A Má Educação” – para uma capital a antecipar a democracia. Entre os espectáculos de ‘punk’ transformista que protagoniza a altas horas, a escrita de fotonovelas pornográficas e o emprego de rotina das 9 às 5 no gigante de telecomunicações Telefonica, Pedro junta dinheiro para comprar uma câmara de Super 8, a seguir uma de 16mm, e cria curtas-metragens de fúria erótica e sátira violenta com títulos como “Dos Putas, o historia de amor que termina en boda”, “La Caída de Sódoma”, “Sexo Va, Sexo Viene” e “Folle...Folle...Fólleme, Tim”. Aprende as técnicas, apura o sentido narrativo e, entre 1980 e 1986, coincidindo com a abertura do país à liberdade do quotidiano pós-ditatorial, estreia um conjunto de longas-metragens ácidas e sem contemplações, que expõem os vícios e problemas da nova Espanha – fascínio mediático, fantasmas religiosos, consumismo desenfreado, hipocrisia do casamento –, não deixando pedra sobre pedra (basta lembrar as freiras ‘junkie’ de “Negros Hábitos”). Em 1986, chega à maturidade, e não é por acaso que o seu melhor filme até então inaugura uma parceria mais rigorosa com o criador de guarda-roupa Jose María de Cossío, que o acompanhará por mais de uma década. O filme é “Matador”, a história de paixão fatal – como o “Duelo ao Sol” de King Vidor, citado directamente – entre o toureiro Diego Montes (Nacho Martínez), que mata raparigas, e María Cardenal (Assumpta Serna), uma advogada que assassina os seus amantes. A capa de toureiro, a ouro e escarlate, usada por Maria para consumar os seus rituais de morte marca a entrada de Almodóvar nas grandes ideias de vestuário. O veterano estilista de Valência, Francis Montesinos, também AS CORES GARRIDAS REPRODUZEM AS CRISES IDENTITÁRIAS DAS PERSONAGENS. EM “SALTOS ALTOS” ALMODÓVAR RECORRE PELA PRIMEIRA VEZ ÀS CASAS DE ALTA-COSTURA. Em cima, o realizador espanhol com Anna Wintour, editora da “Vogue” norte-americana, e Karl Lagerfeld, que sempre considerou Almodóvar “um génio”. Mais abaixo, com Gaultier, o estilista que redesenhou o fato de Victoria Abril para o filme “Kika” (à drt). 1993 2004 2011 Em “A Pele Que Habito”, Almodóvar precisava de um fato que fosse como uma segunda pele. As costuras e os chumaços em certas áreas sugerem as cicatrizes da personagem. Jean-Paul Gaultier produziu na perfeição a ideia do realizador (em cima). a impressão de que ela estava nua mas, também, de que a sua pele tinha um brilho particular, de certa forma artificial; o fato de Jean-Paul permite transmitir isso mesmo”. Ao 19º filme, prestes a completar 40 anos de carreira (a primeira curta-metragem, “Filme Político”, é de 1974), Pedro Almodóvar Caballero, cavaleiro alegre de La Mancha, é tão reconhecido no universo do cinema como no mundo da moda. Em Março de 2010, a “Harper’s Bazaar” dedicou-lhe uma produção de antologia, onde o inevitável Gaultier surge trajado como as freiras heroinómanas de “Negros Hábitos”, Sonia Rykiel veste a pele da Carmen Maura de “Mulheres à Beira de Um Ataque de Nervos”, a amiga Andrea Missoni (Almodóvar surgiu há pouco na delirante campanha Primavera-Verão de 2013 da marca) reinterpreta a dona de casa de “Que Fiz Eu Para Merecer Isto?” e Karl Lagerfeld, que sempre considerou Almodóvar “um génio”, aparece de revólver em punho junto ao cineasta numa encenação policial de “Em Carne Viva”. Quando o espanhol foi homenageado em 2011 durante a cerimónia anual dedicada ao cinema do Moma (Museum of Modern Art) de Nova Iorque, Anna Wintour, a toda-poderosa editora da “Vogue” norte-americana, não faltou, sorrindo orgulhosa ao lado do “fabulador”. Melhor do que ninguém, ela sabe que Almodóvar nunca passa de moda. Abril 2013 Fora de Série 53 FOTOGRAFIAS DE CORBIS/VMI E CEDIDAS PELA PRIS AUDIOVISUAIS dará uma ajuda nos vestidos encarnados que pontuam a intriga e, dois anos depois, “Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos” leva à descoberta internacional do cineasta manchego. As cores começam a fixar-se: a Espanha de Almodóvar – e é quase como se a Espanha se tornasse um filme dele – é uma explosão de cores intensas. Os rosas choque, os amarelos vivos, os vermelhos sangue reproduzem as crises identitárias das personagens, os seus desejos de vingança, as suas paixões furiosas, a ausência de leis do seu desejo. O ‘designer’ gráfico Juan Gatti incorpora no genérico elementos das revistas femininas de moda dos anos 50 e 60, Antonio Alvarado tem um dedo no vestuário de Carmen Maura e, em “Saltos Altos”, além da colaboração de Sybilla, Almodóvar recorre pela primeira vez às casas de alta-costura para traduzir a personalidade e antagonismo das suas protagonistas, Marisa Paredes e Victoria Abril: Paredes veste um saia-casaco Armani, Victoria Abril um ‘tailleur’ Chanel (é o início da amizade com Karl Lagerfeld). Todos os pormenores da ‘mise en scéne’, dos cenários aos adereços, da arquitectura ao guarda-roupa, são agora controlados pelo cineasta – assina apenas “una pelicula de Almodovár” –, sem- pre com a ajuda de De Cossío. Haverá uma parceria mais duradoira, com um iconoclasta da sua envergadura: Jean-Paul Gaultier. Conhecem-se ainda nos anos 80 na já lendária discoteca parisiense “Les Bains Douches”. Têm o sentido de humor em comum, Gualtier conhece e admira as fitas de Almodóvar, Almodóvar aprecia o trabalho do francês para o guarda-roupa de “O Cozinheiro, O Ladrão, a Mulher e o Amante Dela” de Peter Greenaway. Exulta com o corpete e o soutien pontiagudo de Gaultier para a ‘tournée’ “Blonde Ambition” de Madonna e pede ao ‘designer’ para conceber os fatos de seios nus, literalmente sangrentos, da jornalista Andrea Caracortada (Victoria Abril) em “Kika”. “O seu talento é vivo e versátil; tanto pode colher inspiração no ‘trash’ ou no ‘streetwear’ como em estilistas franceses clássicos como Yves Saint-Laurent ou Patou”. É o início de uma bela amizade: Gaultier reinventa o ícone da canção espanhola Sara Montiel através de Gael Garcia Bernal em “A Má Educação” e, já em 2011, após experiências de sucesso com estilistas como Tatiana Hernández, Sonia Grande (que trabalhou para Woody Allen em “Vicky Cristina Barcelona”) ou Paco Delgado, recém vencedor do Óscar pelo vestuário de “Os Miseráveis”, Almodóvar volta a pedir ajuda ao seu cúmplice para criar os fatos a imitar pele que revestem o corpo de Vera, interpretada por Elena Anaya em “A Pele Que Habito”. “Quando o Jean-Paul faz roupas explicitamente eróticas, cria-as de uma forma inocente, como um garoto mal-comportado faria. Em ‘A Pele Que Habito’, precisava de um fato que fosse como uma segunda pele. As costuras e os chumaços em certas áreas sugerem as cicatrizes da personagem. Ao mesmo tempo, ao apresentar Vera num plano geral, quis criar Estilo O ARTISTA COMERCIAL Gosta de acrescentar valor às coisas e por isso o serviço que hoje mais valoriza é o ‘su misura’. A sua maior inspiração na moda é Giorgio Armani e quando arriscou no cinema achou que tinha “divagado”. Dez minutos de aplausos convenceram-no do contrário. Falamos de Tom Ford, o “artista comercial no universo da moda”. T E X T O D E J E R Y L B R U N N E R / C E L E B R I T E X T/ A I C 54 Fora de Série Fevereiro 2013 É difícil imaginar Tom Ford fracassar no que quer que seja, por mais invulgar que o desafio se afigure. Nasceu em Austin, Texas, e desistiu de estudar aos 17 anos porque transbordava de trabalho. “Algures na minha adolescência, dei por mim a fazer 12 anúncios publicitários em simultâneo. Facturava centenas de milhares de dólares por ano”. Como o seu objectivo na vida era dar ordens e não recebê-las, desistiu da publicidade e foi estudar arquitectura na Parsons New School for Design, em Nova Iorque. Expedito e desembaraçado, convenceu a casa Chloe, em Paris, de que tinha todas as competências necessárias para lhe oferecerem um estágio na marca. “Agarrei nuns quantos esboços e disse que tinha um diploma da Parsons. Ninguém perguntou qual era a minha área de especialização”. Graças a Ford, a marca francesa ganhou novo alento: as receitas dispararam para os 3 mil milhões de dólares (2,3 mil milhões euros) e o número de fãs não parou de aumentar, de Jennifer Lopez a Brad Pitt. Em 2005, criou a marca Tom Ford e lançou a sua linha de produtos de beleza e perfume homónimo, numa lógica de “luxo pronto-a-usar”, assim como uma linha de vestuário, calçado e acessórios feitos à medida. Ford tem lojas em Nova Iorque e Milão, e está prevista a abertura de novos espaços em diferentes pontos do planeta. Todas as lojas são desenhadas à imagem de uma casa particular com sala e lareira, bar, obras de arte da colecção privada de Ford e até mordomos. Mais. Estreou-se na realização com o filme “Um Homem Singular”, em 2009, elogiado pela crítica e nomeado para os Óscares L AO SERVIÇO DA MODA e Globos de Ouro. Ford é extremamente prolífico, experimenta as mais diversas áreas e faz tudo com enorme talento. Se alguma vez anunciasse que ia candidatar-se à presidência dos Estados Unidos, limitar-nos-íamos a sorrir e a pensar se iria desenhar o fato da tomada de posse. Estamos a falar de Tom Ford, certo? Em criança, o que queria ser quando fosse grande? Comecei a ter muito trabalho e decidi abandonar a escola durante quatro anos para fazer anúncios televisivos e participar como actor em séries de televisão, todas péssimas, por sinal. Depois percebi que detestava ser actor porque era controlado em vez de controlar. Recebia ordens e não achava graça nenhuma. Decidi voltar a estudar. Mas nesse tempo ganhava muito di- nheiro. A dada altura fiz 12 anúncios ao mesmo tempo e facturei umas boas centenas de milhares de dólares num ano. Foi em 1979… era um adolescente. Já desenhou fatos para Daniel Craig… o próprio e na pele de James Bond. Sim, desenhei o guarda-roupa de Bond em “007: Quantum of Solace”. Conhecia-o socialmente e já há algum tempo que lhe desenhava algumas peças. O Daniel é fantástico e adoro vesti-lo. Porque diz isso? Porque sabe exactamente o que quer. Gosta de estilo q.b., nada de excessos. Quando usa um ‘smoking’, recusa qualquer tipo de acessório associado. Quanto muito quer uns botões de punho personalizados, mais nada. Sabendo o que ele quer é fácil pô-lo elegante. Fevereiro 2013 Fora de Série 55 Estilo Como foi a sua experiência como realizador? Enriqueceu-o de alguma forma? Há quem me pergunte: “Julgas-te artista, é isso?” Há ‘designers’ de moda que são artistas. Não é esse o meu caso. Considero-me um artista comercial no universo da moda. O que quer dizer com isso? Para mim, a moda é um processo de criação artística, ainda que indissociável de outro processo: a venda. E a moda vende algo que é absolutamente magnífico, algo que dá cor à vida das pessoas, que as faz sentir bem. Realizar um filme é expressar-me de uma forma mais completa. É a forma de expressão mais pura, a criação mais artística que alguma vez assinei. Teve algum momento de paralisia criativa, receio de não ser compreendido? Por mais que se goste profundamente de uma coisa, a dado momento comecei a ter dúvidas… Será que divaguei, será que as pessoas vão perceber a mensagem? Mas depois da primeira exibição do filme em Veneza e de uma ovação que durou uns dez minutos, a sensação foi fantástica e muito emotiva. Foi o culminar de um trabalho: “Fantástico. Consegui comunicar com as pessoas!”. O que mais gosta na criação de peças “feitas à medida”? Como vivemos num mundo em que as coisas são cada vez mais descartáveis – em que a estética é ditada pelas tendências e a qualidade pelo efémero –, queria criar algo cujo valor perdurasse no tempo. O que criou, concretamente? O objectivo foi criar um fato que fosse totalmente diferente dos outros em termos de estilo e de toque. O resultado é muito britânico, embora tenha a leveza do corte italiano. Digamos que é um estilo internacional híbrido. O segredo está em combinar corte clássico com a minha filosofia de ‘design’ para criar um conjunto intemporal. Quer dizer que os fatos ficam datados? Como é que “envelhecem”? As nossas peças de vestuário ganham com o passar do tempo porque são de alta qualidade. É aí que reside a magia do trabalho manual: torna o fato quase orgânico, uma espécie de segunda pele. Pode, inclusive, ter um bolso feito à medida para o seu BlackBerry… Sim, tenho um bolso no casaco expressamente para o meu BlackBerry. Se for a uma das nossas lojas e quiser comprar um fato feito à medida, pode levar os objectos ou acessórios de que não prescinde no dia-a-dia, que nós fazemos todos os bolsos que necessita – e no sítio certo. O nosso princípio não vai contra os ditames da moda, mas também não é refém da mesma. Tudo o que faço é a pensar no cliente. 56 Fora de Série Abril 2013 anne Moore e Em cima, Julianne Colin Firth, oss protagonistas do filme assinado nado por Tom Ford, “Um Homem omem Singular”. Ao lado, Daniel el Craig que vestiu a pele de James Bond em “Quantum m of Solace”, e cujo guarda-roupa a-roupa foi da responsabilidade dade de Ford. No seu trabalho, ho, o estilista assume que é do serviço ‘su misura’ que mais gosta. É verdade que personaliza as suas ‘t-shirts’ “Fruit of the Loom” para que o final das mangas fique mesmo acima dos músculos tricípites? Sim, em casa, fora do ambiente de trabalho, gosto de usar ‘t-shirts’ da linha “Fruit of the Loom”, mas com um toque pessoal. Se as mangas ficarem mesmo acima dos tricípites, os braços ganham outro contorno. Ficam mais giros. O que é que as pessoas não sabem sobre Saville Row? Apesar de as pessoas associarem uma imagem de ‘glamour’ a Saville Row, a experiência propriamente dita não é memorável: convidam-no a entrar para uma sala pequena, o alfaiate chega para lhe tirar as medidas e a pessoa fica ali especada… e nua. Haverá quem pense: isto não tem de ser uma tortura. Ora, os fatos britânicos são um tanto ao quanto rígidos. Um dia inteiro enfiado num fato pesado arruína as costas de qualquer pessoa. Queria criar um fato que fosse mais orgânico e que fluísse com o corpo, acompanhando os movimentos de uma forma natural. Conte-nos algumas das suas experiências em Saville Row. Mandei fazer um fato na Anderson & Sheppard, uma referência maior da alfaiataria ainda no activo, que já vestiu alguns dos homens mais elegantes do mundo. Trabalhei com o cortador chefe, John Hitchcock, por quem tinha enorme apreço. Mas… Mas o ambiente era muito austero. Sentia-me um miúdo pequeno prestes a ser repreendido pelo director da escola. A casa tem um estilo e uma tradição de que se orgulha e não admite desvios a essa “escola”. Discutia imenso com John e dizia-lhe como queria a lapela do casaco, qual o volume do chumaço que pretendia nos ombros e se o fato teria um corte mais, ou menos, direito. As suas lojas são famosas pelo serviço. É realmente importante? Actualmente, as pessoas parece que se esqueceram daquilo que é a essência do serviço. A oferta ao nosso dispor é imensa, mas o que realmente faz a diferença é o toque humano e a atenção ao detalhe. Tudo mais é incaracterístico, vazio e desinteressante. Num mundo cada vez mais automatizado – a comunicação faz-se por computador e telefone –, ter alguém que nos ajude e garanta que o resultado será exactamente aquele que nós queremos, acrescenta enorme valor à experiência, à compra de uma coisa nova. Onde se inspirou para criar o seu estilo? Sempre adorei o padrão de beleza masculino dos anos 70 do século XX. Eram homens robustos e maduros. Quando escolhemos modelos, tentamos sempre promover a figura do homem mais maduro. Tem alguma referência em termos de estilo? Há alguém que o inspire em particular? Giorgio Armani. Nada se parece com as roupas que ele cria: suaves, mas assertivas, minimais, focadas no tom e no padrão. Foi ele quem inventou aqueles crepes e drapeados com um ‘look’ muito anos 80 que dominaram o mundo. A mensagem de Armani é simples: qualquer homem pode vestir um fato e ter um ar ‘cool’. Existe algum aspecto surpreendente que Tom Ford ainda não tenha revelado ao mundo? A maior parte das pessoas não acredita que sou incrivelmente tímido. É raro deixar que as pessoas entrem no meu mundo e conheçam a minha intimidade. Não é a imagem que se tem de si... A moda é a minha faceta mais superficial. De facto, passo grande parte do tempo a trabalhar no mundo material, mas o mais importante é não levarmos isso demasiado a sério. A moda pode ser uma coisa verdadeiramente fantástica que acrescenta qualidade à nossa vida. Em tempos disse que, umas vezes, as pessoas precisam de sofrer, outras, de se sentir belas e atraentes. É mesmo assim? Com a queda abrupta da venda de fatos, talvez tenha de acrescentar um terceiro aspecto: a demografia. Em todo o caso, o meu ‘design’ é marcadamente íntegro: penso no cliente, concentro-me no produto que vou criar e não faço cedências. Acredito que as pessoas apaixonadas por roupa, que adoram vestir bem e gostam de se ver com certas peças cuidam do seu corpo. Mesmo quando sofremos para atingir o resultado que pretendemos, fazêmo-lo por uma boa causa. Passa o tempo a viajar… no regresso, a que lugar chama “casa”? É uma boa pergunta, pois vivo simultaneamente em Londres, Los Angeles, Santa Fé, Nova Iorque e Milão. Estou sempre em viagem. Enquanto ‘designer’ acho muito positivo estar exposto a diferentes culturas ao mesmo tempo. É inspirador! FOTOGRAFIA DE ABERTURA DE CORBIS/VMI. NESTA PÁGINA, FOTOGRAFIAS DE REUTERS “OS FATOS BRITÂNICOS SÃO RÍGIDOS. UM DIA INTEIRO ENFIADO NUM FATO PESADO ARRUÍNA AS COSTAS DE QUALQUER PESSOA”. Estilo UM PROJECTO ‘IN’ OU ‘OUT OF THE BOX’ ? O aluguer pode ser feito de seis meses a 48 horas antes da data do evento e, para garantir que tudo corre bem, é enviado um segundo tamanho sendo A primeira empresa com uma plataforma que a cliente pode até pedir para ex‘on-line’ de aluguer de vestidos exclusivos de alta qualidade em Portugal chama-se perimentar o vestido com antecedênStyle in a Box. Uma ideia que ganhou forma cia, sem custos adicionais. O vestido é nos corredores de uma universidade. enviado por correio para um dos 350 pontos ‘Pick Me’ nacionais e chega T E X T O D E C ATA R I N A M O U R A FOTO G R AF IA S D E B RU N O BAR B OSA mesmo a tempo de ser usado no dia que é preciso. Para o devolver, quatro dias depois, basta colocar uma etiqueta pré-paga no exterior da caixa e entregá-la, sendo que a Style in a Box er uma boa ideia não é suficiente para trata de pequenas reparações e da limpeza do vestido. construir uma empresa com sucesso. Até hoje, não existia na Península Ibérica um serFilipa Neto e Lara Vidreiro sabem isso. viço de aluguer de vestidos como este, com base, soQuando estavam ainda na faculdade, bretudo, no ‘on-line’. Aquilo que o diferencia é a apostiveram uma grande ideia, a de criar ta que é feita nos vestidos. Estes são escolhidos pela um ‘website’ que permitisse o aluguer ‘stylist’ residente, Juliana Lapa, que procura, durante a de vestidos de luxo ‘trendy’, a uma fracção do preço. ‘fashion week’ de Paris, as peças mais especiais, aque“Com as consecutivas galas e festas às quais tínhalas em que a maioria das mulheres não investiria tanmos de ir e o dinheiro que investíamos em vestidos to, dado que as tendências têm um prazo de validade para cada uma dessas ocasiões, começámos a pensar muito curto. Isto significa que o ‘stock’ é substituído que seria benéfico termos os vestidos nas alturas que a cada estação. Os vestidos são todos exclusivos, senqueríamos e não acumulá-los nos armários e usá-los do apenas possível encontrá-los em algumas lojas dos apenas uma vez”, conta Lara, de 22 anos. Deste presestilistas, em Nova Iorque ou Paris, por exemplo, e alsuposto nasceu a Style in a Box, em Dezembro do ano guns são até feitos especialmente para a Style in a Box. houve mesmo clientes que, espontaneamente, enviapassado, e teve logo de início um enorme sucesso, Neste momento, estão disponíveis vestidos de marcas ram um ‘e-mail’ a descrever todas as “imperfeições” marcando já presença em Espanha. As jovens emprecomo RED Valentino, Erin Fetherston, Love Moschique vêm em si próprias e a pedir um vestido que as disendedoras responsáveis pelo projecto, Filipa Neto e no, Galliano, Catherine Malandrino e Karen Millen. farçasse. A empresa começou também a disponibilizar Lara Vidreiro – que hoje contam com Ivone Silva e JuO ‘website’ está preparado para facilitar a escolha o aluguer de acessórios para completar o ‘look’ final. liana Lapa na equipa –, falam de trabalho, sacrifício e dos vestidos, que estão organizados por estilista e por Filipa e Lara começaram a desenvolver o projecflexibilidade, como algo que foi imprescindível para ocasião, mas um serviço ao to para o apresentar num concliente de excelência não deiconseguirem implementar a sua ideia. curso de empreendedorismo, o “Realize o Seu Sonho”, da Apesar de receberem visitas das pessoas que prexa de ser uma das grandes preferem ver os vestidos ao vivo, na sua sede, em Guiocupações. Por isso, os mais Acredita Portugal. De cerca de O ALUGUER DO marães, a Style in a Box, é, sobretudo, um negócio indecisos podem pedir ajuda a três mil candidatos, ficaram VESTIDO PODE pensado como uma plataforma ‘on-line’ (www.styem segundo lugar e ganhaJuliana Lapa, que está sempre leinabox.com), com um processo simplificado ao mádisponível para guiar as clienram 50 mil euros em serviços, SER FEITO DE ximo. Para alugar um vestido, depois de passar um tes no processo de decisão, mas, ainda mais importante, SEIS MESES A 48 tempinho a descobrir as dezenas de opções, o acto aconselhando desde qual o tiganharam o estímulo e a conHORAS ANTES DA de “compra” é tão simples como fazer um aluguer de po de vestido que mais favorefiança de que precisavam paDATA DO EVENTO. um quarto de hotel ‘on-line’, garante Filipa, também ce a pessoa, a quais os acessóra levar o projecto para a frencom 22 anos. Os preços dos vestidos representam cerrios, o penteado e a maquilhate. “Pensámos: nós chegámos ca de 15% do PVP e variam entre os 65 e os 180 euros. gem que esta deve utilizar. Já aqui, porque é que não vamos T 58 Fora de Série Fevereiro 2013 CRISTINA AMARO Apresentadora e empresária INSIDER “As empresas portuguesas têm de perder o medo e ganhar autoconfiança” Apresenta o “Imagens de Marca”, na SIC Notícias, há 9 anos. É sócia fundadora da produtora de televisão Olho Azul e lançou o ano passado um novo magazine, o “Portugal Marca”. O que descobriu sobre as nossas imagens de marca? Portugal tem um património de imagens de marcas, mais relacionadas com a nossa cultura e com a nossa história, que não são devidamente promovidas. No que toca às marcas portuguesas relacionadas com empresas, Portugal tem evoluído bastante. Os portugueses estão a tornar-se mais empreendedores? Acho que sim. Mas por outro lado também há uma maior apetência, por parte da comunicação social, para dar mais enfoque a algo que já existia antes. Hoje, até pela forma como está o país, há mais gente a ter que se virar. Mas ainda bem que existe mais empreendedorismo, porque nós precisamos disso para que haja emprego em Portugal. Quais as marcas que são o nosso cartão de visita? Há uma marca que leva muito a nossa imagem para o estrangeiro, o futebol. Falar de Cristiano Ronaldo e de Mourinho é falar de Portugal. Há outros sectores onde começamos a dar cartas, como o do azeite, do vinho, da cortiça e do calçado, e existem os casos da Gallo, da Oliveira da Serra, da Renova, da Compal e da Água das Pedras. Como é que as empresas podem aumentar a sua presença no estrangeiro? Têm de perder o medo e ganhar autoconfiança, são duas coisas imprescindíveis. Não podemos ter medo de nos fazermos a outros países e de nos adaptarmos a eles. Os descobridores portugueses não tinham medo de se “atirarem ao mar” e de irem procurar novas rotas. Qual o papel das incubadoras e das iniciativas ao empreendedorismo? São importantíssimas para o desenvolvimento de pequenos negócios que podem vir a crescer no futuro. Quais as marcas de luxo que Portugal tem? Não sei se tem alguma... A Style in a Box tem disponíveis vestidos de marcas como RED Valentino, Erin Fetherston, Love Moschino, Galliano, Catherine Malandrino e Karen Millen, e aluga também acessórios. sonhar mais alto?”, conta Filipa. Durante os meses seguintes, incubadas na Startup Lisboa, procuraram fazer contactos no mundo da moda e encontrar investidores. A meio do caminho encontraram Ivone Silva, fundadora da revista “NStyle”, que tinha experiência e um grande ‘know-how’ na área da moda. Era a peça do ‘puzzle’ que faltava e, a partir daí, a equipa trabalhou, durante cerca de oito meses, para preparar o lançamento da plataforma. O projecto ambicioso – cujo investimento foi de 500 mil euros – de duas estudantes de faculdade apaixonadas por moda ganhou vida devido ao trabalho e consistência: às noites seguidas em que ficavam até à meia-noite na Universidade Católica, à “lata” que tiveram a contactar as pessoas que precisavam e a uma equipa que funciona em grande harmonia. Apenas três meses depois do lançamento da Style in a Box, Filipa e Lara ainda não tiveram tempo para parar e reflectir sobre o percurso, no mínimo invulgar, que fizeram até aqui. No entanto, já estão a pensar num futuro a longo prazo e conseguem dizer, com confiança, que o seu objectivo é tornar a Style in a Box “a plataforma de referência da Europa em aluguer de produtos de moda”. Como se justifica isso? A Portugal ainda lhe falta acreditar que é possível criar marcas cá. Não existe ainda a tradição de criar marcas a partir dos bons produtos que temos. O que é preciso fazer para desenvolver o sector do luxo? O luxo vive da capacidade de uma marca se tornar aspiracional. Itália, por exemplo, tem uma capacidade de criação de marcas que Portugal não tem, e não é por ter menos qualidade. Há mercado para o luxo em Portugal? Indiscutivelmente. Se não existisse, não tínhamos as marcas que temos na Avenida da Liberdade e o mercado dos automóveis a crescer. Uma marca que represente aquilo que Portugal deve fazer com os seus produtos? A Renova é uma marca completamente inovadora. Tornar o papel higiénico, que é um produto básico, quase num produto ‘premium’ é uma coisa fantástica. Um desejo consumista? Apesar de ter um programa de marcas, não tenho, definitivamente, desejos consumistas. Um livro? “O Poder do Agora” e “Conversando com Deus”. Tenho muitos livros espirituais, que me ajudaram a encontrar-me como pessoa. A banda sonora? Seguramente, uma música francesa. Um dia perfeito? Um dia em que acordo bem-disposta, em que consigo superar os meus desafios e em que as pessoas de quem gosto estejam todas bem. É um dia em que não perco o sorriso. T E X T O D E C ATA R I N A M O U R A Fevereiro 2013 Fora de Série 59 Estilo PODEMOS ESQUECER A BIRKIN? Sim, esqueçamos a “Birkin” e, já que estamos para aí virados, esqueçamos também a “Kelly”. Será mais ou menos o mesmo que voltar a construir a arca de Noé e deixar de fora o elefante e o leão. Mas às vezes é preciso. Às vezes... T E X T O D E I N Ê S Q U E I R O Z C rescemos a ouvir falar nelas. Na qualidade delas, mas também no preço delas. Sobretudo, nas listas de espera intermináveis para se conseguir chegar a uma delas. São símbolos inegáveis de estatuto que não passam de moda, mas que passam de mãe para filha e de filha para neta. É a pele escolhida a dedo, o corte perfeito, a minúcia de cada ponto dado à mão, as peças metálicas numeradas, os múltiplos detalhes vistos e revistos sob olho clínico. A garantia é vitalícia e em qualquer altura é possível substituir alças, fechos, aplicações... Os modelos são perenes, como as folhas de certas árvores. Multiplicam-se as cores, variam os materiais, crescem e diminuem os tamanhos, mas os modelos permanecem. É assim com a Hermès. Sempre o foi e sempre será. Mas se é assim com a “Birkin” e com a “Kelly”, também o é com a “Jypsière” ou com a “Lindy”, dois exemplos entre tantas outras carteiras da marca. Então como explicar esta universal obsessão com as duas primeiras? “A ‘Kelly’ e a ‘Birkin’ são carteiras que têm elegância e que conferem elegância. Marcam um estilo muito próprio, é quase como se fizessem parte de um clube do bom gosto francês”, explica Couli Jobert, a directora criativa do departamento de marroquinaria da Hermès. Mas se nalguns clubes é possível reservar o direito de admissão a uma mão cheia de eleitos escolhidos a dedo, noutros, como é o caso, é o poder de compra de cada um que dita essa mesma adesão. Ora, tendo em conta que o “bom gosto” é provavelmente um dos dons humanos mais bem distribuídos do universo – porque é pouco provável que exista alguém que não esteja plenamente satisfeito com o seu – não será difícil imaginar o resultado desta realidade multiplicado por milhares de Birkins e Kellys de todas as cores, espalhadas por todo o planeta. Em Julho do ano passado, a “Forbes” publicava um artigo com um título curioso: “Terá a ‘Birkin’ Hermès perdido o seu fascínio?”. A forma interrogativa do título era justificada logo à partida com outra pergunta: “Será que a ‘Birkin’ continua a ser a mãe de todas as carteiras quando todas as mulheres com que nos cruzamos ao almoço têm uma?”. Focado essencialmente numa realidade asiática, muito particularmente em Hong Kong e em Singapura onde, de acordo com o autor do texto, “as ‘Birkins’ são tão omnipresentes quanto as Coach nos Estados Unidos”, o artigo lá seguia, à procura de resposta que foi encontrar junto do bloguer singapurense “Bagaholicboy”, um “viciado” em carteiras como o próprio nome do blogue indica e para quem o fenómeno “Birkin” vai muito além do acessório propriamente dito. No fundo, a mais famosa carteira Hermès acaba por ser “o supremo símbolo de estatuto, seja para quem poupou dinheiro durante meses para comprar a sua primeira ‘Birkin’, seja para a coleccionadora que faz questão de ter uma de cada cor e tamanho. É mais do que uma carteira, é um estilo de vida”. TODAS DIFERENTES... TODAS IGUAIS Um estilo de vida tão badalado que há já quem lhe torça o nariz, como é o caso de Masako Kumakura, directora executiva do ramo asiático da consultora Karla Otto, uma empresa internacional vocacionada 60 Fora de Série Fevereiro 2013 “HÁ DEMASIADAS PESSOAS QUE NÃO TÊM A MAIS PEQUENA NOÇÃO DE ESTILO AO USAR UMA ‘BIRKIN’. E LEVAM-NA PARA TODO O LADO (...) NÃO É NADA CHIQUE”, DIZ MASAKO. A nova colecção de carteiras da Hermès aposta nas cores e num ‘look’ desportivo mas sempre chique: ‘Chic le Sport’ é, aliás, o mote da ‘maison’ para a Primavera. Na foto, a colecção “Berline”. para as áreas de luxo, moda, beleza, ‘lifestyle’, arte e ‘design’. “Há demasiadas pessoas que não têm a mais pequena noção de estilo a usá-la [a ‘Birkin’]. E levam-na para todo o lado. Na Ásia, tenho visto mulheres com Birkins enormes em jantares formais, o que não é nada chique”, disse Masako à “Forbes”. É um facto que tudo o que acontece no continente asiático acontece à escala megalómana, mas num mais comedido ocidente a realidade não parece estar muito distante do cenário oriental. Não há estrela de cinema ou celebridade que não tenha a sua “Birkin” e/ou a sua “Kelly”, quantas vezes multiplicada por todas as cores do arco-íris. Victoria Beckham é talvez o melhor exemplo... uma verdadeira coleccionadora, mas há outros, como Lindsay Lohan, Pamela Anderson, Katie Holmes, Lady Gaga, Catherine Zeta-Jones, Courtney Love, Eva Longoria, Julia Roberts, Sarah-Jessica Parker, Joan Rivers, Nicole Richie, as irmãs Kardashian e até a própria Jane Birkin – a actriz francesa que inspirou a criação da famosa carteira, em 1984, da mesma forma que, 28 anos antes, o nome de Grace Kelly ficou para sempre ligado a uma outra, criada em 1935 por Robert Dumas. Apesar do preço que, no caso dos modelos mais básicos andará pelos 5500 euros mas que, consoante o exotismo da pele, poderá ir bastante mais longe; apesar das listas de espera para se conseguir uma, que chegam mesmo a ultrapassar os 12 meses, porque, apesar de tudo, sempre estamos a falar de artigos de manufactura, o certo é que ambas as carteiras, principalmente a “Birkin”, parecem estar a banalizar-se. Será? Melhor ainda, há mesmo quem se dê ao luxo de as vandalizar em nome da arte, como foi o caso de Francesca Eastwood, a filha do actor/realizador Clint Eastwood que, o ano passado, pegou fogo a uma “Birkin” como mote de inspiração para o namorado, o fotógrafo Tyler Shields. FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELA MARCA MAS PODEMOS MESMO ESQUECER A “BIRKIN” ? E, já que estamos para aí virados, podemos esquecer a “Kelly” também? Como costuma dizer-se, “há mais Marias na Terra” e, no que diz concreto respeito à Hermès, todas elas feitas com o mesmo rigor e precisão, com o mesmo desvelo e carinho dedicado às duas que vamos tentar esquecer. Carteiras que, à semelhança destas, contam histórias interessantes e/ou que receberam o nome de alguém interessante. É o caso da “Évelyne”, nascida em 1978 e baptizada com o nome de Évelyne Bertrand, a então directora artística do departamento de equitação da Hermès. É o caso da “Berline”, um modelo que, “não sendo ainda histórico, tem uma bonita história”, como diz Couli Jobert que recorda que foi ao olhar para uma maqueta de um assento de automóvel que lhe surgiu a ideia de reproduzir o canelado dos estofos numa carteira. Olhando para o passado, distante ou recente, a directora criativa do departamento de marroquinaria da Hermès enumera: a “Passe Guide”, criada em 1975 pelo ‘designer’ Henry D’Origny e “que é um verdadeiro exemplo de ‘savoir faire’”; a “Lindy”, concebida em 2006 por Frédérick Vidal, uma carteira que parece ter sido “feita ao contrário” e que “é a eleita de numerosas mulheres pelo seu lado ultra prático e menos convencional”. E quando perguntamos a Couli Jobert quais são os outros modelos de carteiras Hermès que maior procura vão tendo actualmente, a resposta lança-nos para um universo ainda mais vasto. A “Lindy” é uma delas, outra é a “Jypsière”, curiosamente ou não, “uma prima da ‘Birkin’ e da ‘Kelly’”, mas há mais: a “Constance”, “que é a favorita das jovens por causa do seu estilo muito feminino e a assinatura” (o fecho em forma de H), a “Victoria”, um verdadeiro todo-terre- Couli Jobert é a directora criativa do departamento de marroquinaria da Hermès e considera que a “Kelly” e a “Birkin” é quase como se fizessem parte de um clube do bom gosto francês. Em cima (da esquerda para a direita), carteiras “Bourlingue”; “Double Sens”; “Constance”; e “Soie Cool”. no “que agrada tanto às mulheres como aos homens”, a “Garden”, “o saco incontornável” e descontraído, ou a “Double Sens”, “um saco bicolor simplicíssimo e totalmente reversível”. Quanto às cores preferidas não há uma regra definida, tudo depende, até porque, como lembra Couli Jobert, “nem todas as cores ficam bem em todos os tipos de pele ou em todos os modelos”. Cor de referência da Hermès, “naturalmente que o laranja é um ‘must’, mas o bege estopa é também um grande clássico”, salienta a directora criativa acrescentando que as pessoas procuram “cada vez mais as cores emblemáticas da estação e, frequentemente, as cores vivas”. A cor é, aliás, a tónica dominante do ano que corre cujo tema é ‘Chic le Sport’ e que se exprime em tonalidades fortes “como o azulão, o verde forte, o amarelo enxofre, o vermelho sanguíneo”, mas também através dos efeitos gráficos como sejam “os jogos de riscas, as carteiras bicolores ou multicolores”, enumera Couli Jobert. Este ano o ‘look’ é desportivo e chique... sempre chique, claro. As novidades apostam nesse lado ‘cool’ que se revê, por exemplo, “na ‘Bourlingue’, uma sacola descontraída com um estilo desportivo”, ou no divertido “saco de ginástica ‘Soie-Cool’” ou então, se quisermos continuar a bater na mesma tecla, numa “Kelly Golf” ou numa “Birkin Sailor”, para variar um bocadinho. As sugestões são múltiplas e as cores também. Por isso mesmo, perguntamos a Couli Jobert que conselho daria a uma jovem mulher, de espírito assumidamente desportivo, na altura de comprar a sua primeira carteira Hermès. “Em primeiro lugar, que não seja razoável e que se deixe levar pela paixão”. Quanto à escolha, talvez “uma mini ‘Berline’, pelo seu espírito desportivo e pela sua bonita gama de cores”. Mas, acima de tudo: “Que seja ousada nas cores!”. Fevereiro 2013 Fora de Série 61 Estilo FÁTIMA LOPES CRIADORES PORTUGUESES ESPALHAM PERFUME EM PARIS Houve desassossego. Cravos e metralhadoras. Odes ao diamante. Nas ‘passerelles’ ou num frasco de perfume em forma de pedra preciosa, Luís Buchinho, Felipe Oliveira Baptista e Fátima Lopes lançaram o seu aroma pela semana de moda de Paris. T E X T O D E M A R I A N A B É U D E C A R VA L H O , E M PA R I S “L ança menina, lança todo este perfume / Desbaratina, não dá para ficar imune / ao teu amor, que tem cheiro de coisa maluca. Lança! Lança perfume!”. Estes versos são-lhe familiares? Está a estranhar a ligação entre eles e o “Paris” que surge à frente do nome da jornalista? Não é caso para isso. “Lança Perfume”, da brasileira Rita Lee, ecoa por entre o burburinho ruidoso que toma conta do St. Fiacre, um espaço de eventos no centro de Paris, de aspecto urbano e minimal, envolto numa luz azul de poucos ‘watts’, que lhe dá um aspecto de quase penumbra. A escolha musical não podia ser mais oportuna. A criadora Fátima Lopes lança perfume. Mais concretamente, a sua primeira fragrância, a que escolheu dar o nome de Be Mine. Mas lança também perfume de uma forma ainda mais literal. De frasco na mão – a lembrar a forma de um solitário de diamante – borrifa a sua fragrância sobre os convidados que enchem o espaço na festa de lançamento, enquanto se desdobra em sorrisos, conversas de ocasião, entrevistas e poses para a fotografia. É sabido que Fátima Lopes desenha a pensar em si. Confirmar-nos-ia isso mesmo no dia seguinte, na sequência do seu 29º desfile na semana de moda de Paris – o 18º com o apoio do Portugal Fashion. Neste caso não seria diferente. “A Fátima disse-me: ‘quero algo que cheire a mim, mas também que não cheire a nada que exista no mercado’. Esta foi a premissa”, explica à FS 62 Fora de Série Abril 2013 Aurélien Guichard, perfumista da Givaudan e o nariz por detrás de Be Mine. “O Aurélien interpretou-me”, sintetiza Fátima, mesmo ao seu lado. “Este perfume sou eu, o meu ADN”. Há três anos, Fátima teve um sonho. “Não há nenhum criador de moda que não deseje criar o seu perfume. É o clímax de uma carreira”, explica. Mãos à obra, havia que encontrar a empresa certa e o nariz perfeito. Em Paris, claro. “A roupa pode fazer-se em Portugal; um perfume não. Tem de ser francês. Temos de nos juntar aos melhores e a Givaudan é a número um”, remata a criadora. O processo foi longo, desdobrado em três anos de conversas semanais ao telefone. Aurélien em Paris, Fátima em Lisboa. “Normalmente levo um ou dois anos a trabalhar numa fragrância, mas esta foi diferente. A Fátima mostrou-me o seu trabalho e fui aos seus desfiles, por isso o resultado é uma mistura do trabalho que ela faz e a mulher que ela é. Há uma parte do meu trabalho que implica observar e sentir quem é a pessoa. E isso leva tempo. É preciso escolher os ingredientes com os quais vamos contar esta história”, explica o perfumista. Três anos e mais de quinhentos testes depois, o resultado. O aroma, suave mas com personalidade, lembra o cheiro da madeira com uma pitada de incenso. “Tem notas de cidra, benzoína, cedro e baunilha. Isto é a parte essencial. Depois há mais ingredientes como, por exemplo, a groselha preta”, decifra Aurélien. “O produto final traduz uma soma entre uma certa escuridão, força e, ao mesmo tempo, sensualidade LUIS BUCHINHO “LIVRO DO DESASSOSSEGO” SERVIU DE INSPIRAÇÃO A FELIPE OLIVEIRA BAPTISTA, UMA COLECÇÃO COM PADRÕES ANIMAIS. e extra-feminilidade”, acrescenta. O perfume, que chegará em Setembro às lojas francesas e só depois a Portugal, é vestido por um frasco de linhas rectas, que se desmultiplica em várias facetas. Tal como um diamante. “Lembra um solitário de diamantes, que foi uma das primeiras peças que desenhei e é icónico”, lembra a criadora. “Aqui em Paris sou muito conhecida pelo desfile em biquíni de diamantes e fiquei muito ligada a esta pedra. Se tinha de ser o meu ADN, fazia sentido que inspirasse o perfume”. PERFUME NA PASSERELLE Do diamante para o perfume, do perfume para a colecção. No penúltimo dia da semana de moda de Paris – e mesmo antes do desfile da casa Chanel – Fátima Lopes espalhou o seu aroma sob a forma de uma colecção que em tudo remetia para o brilho e forma da pedra preciosa. A pensar na próxima estação fria, a criadora idealizou uma base cromática negra, pontuada por um degradé de diversos tons de azul, do mais pastel ao azul ‘royal’. “Quando o diamante brilha, brilha de muitas cores”, remata Fátima, que potencializou esse brilho com o uso de cetim e sedas, que se entrelaçam com lã, caxemira e cabedal. As formas são estruturadas e gráficas – assim como os padrões exclusivos que lembram a superfície esquinada do diamante – e a riqueza de detalhes está em todo o lado, como por exemplo no cabedal texturizado e na colagem gráfica dos tecidos. “É talvez a colecção mais complicada que fiz até hoje. Não é qualquer atelier que a consegue pôr em prática”. Além da linha de acessórios criada em colaboração com a marca belga PP From Longwy, a criadora apresentou, pela primeira vez, coordenados masculinos. E como nem só de perfumes se fez o aroma da moda portuguesa em Paris, Luís Buchinho trouxe, seis dias antes, borrifadelas do Portugal pós-revolu- cionário dos anos 70. As metralhadoras, os cravos vermelhos e os cartazes políticos com que se festejava a liberdade moldaram-lhe o imaginário para esta colecção e foram reinventados nos padrões de cravos (ainda que dissimulados) e nas cores da paleta, a oscilar entre o branco, o preto e o encarnado. A estes ícones, Buchinho juntou a imagem de uma mulher forte e urbana. “Achei que fazia sentido pegar nestas referências e transpô-las para a ideia de uma mulher muito afirmativa, muito pragmática, que quando sai à rua é notada”, explica o criador. As peças, estruturadas e de corte recto, assim como o uso de cabedal, lãs feltradas, crepes e ‘tweeds’, reforçam a inspiração do criador, que desfila em Paris desde 2009. Já Felipe Oliveira Baptista, criador português que está à frente da direcção criativa da Lacoste, perfumou de desassossego a icónica Place Vendôme parisiense. Ao som da melodia forte e quase tribal de “As Ayabás”, de Maria Bethânia, e inspirado pela releitura do “Livro do Desassossego” de Pessoa, recriou uma inquietude traduzida nos padrões animais, desenvolvidos em exclusivo com olhos de águia ampliados e bocas de lobo, numa trama que faz lembrar um camuflado. A estética portuguesa, com os seus contrastes, também marcou presença. “Temos um lado austero, um drama nas formas e nos volumes, que está em dicotomia com uma sensualidade luminosa”, considera o criador, que vive em Paris e que se estreou na semana de pronto-a-vestir parisiense com o apoio do Portugal Fashion há quatro anos, depois de cinco na edição de alta-costura. A influência lusa, um inédito no seu trabalho, passou também para a paleta, onde predominam o negro, o azul e o cinza, os tons da natureza “bruta” dos Açores da sua infância. “É uma colecção que vem de Portugal para o mundo”, sintetiza Felipe. O caminho, afinal, que percorrem estes três criadores. FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELOS CRIADORES FELIPE OLIVEIRA BAPTISTA Aurélien Guichard é o perfumista da Givaudan e o responsável pelo perfume Be Mine de Fátima Lopes. A estilista portuguesa lançou a sua primeira fragância que chegará em Setembro a Portugal. Abril 2013 Fora de Série 63 Estilo É a mais nova descendente da família La Mer e não foge à herança da marca. A colecção “Soleil de La Mer” é fruto do namoro entre o sol e o mar, chega ao mercado em meados da Primavera e está pronta para abraçar o Verão. T E X T O D E C ATA R I N A M A D E I R A E I N Ê S Q U E I R O Z O sol e o mar são daquelas coisas que temos sempre tendência para imaginar emparelhadas. Mesmo em tempos como estes, em que o primeiro insiste em fazer-se caro e o segundo faz questão de mostrar o mais cáustico dos seus feitios, sol e mar ligam sempre bem um com o outro. Por isso mesmo, se por mais razão nenhuma, uma linha solar La Mer só poderia mesmo chamar-se assim. “Soleil de La Mer” soa bem. Soa àqueles fins de tarde de letargia em que, meio enterrados na areia quente, nos deixamos embalar pelo doce calor estival e pelo marulhar das ondas ao longe. Soa a dias compridos e a noites cálidas, soa a férias, soa a Verão e às saudades que temos do Verão. “Soleil de La Mer” soa também a qualquer coisa que faltava e que chega, finalmente, com a proximidade do Verão. Afinal de contas, desde 1965 que a marca Crème de La Mer tem vindo a marcar posição no mundo como a ‘crème de la crème’ dos produtos de beleza e já vão longe os tempos em que o cientista da NASA, Max Huber, chegou à tão célebre fórmula à base de algas marinhas que haveria de marcar profundamente o mundo da cosmética: o “Miracle Broth” (primeira foto ao lado). Com o passar dos anos, a marca foi crescendo, desdobrando-se em novos produtos, novas texturas e novas especificidades. Mas faltava-lhe uma linha solar. Ela aí está, pacientemente à espera do Verão de 2013 e, posto isto, será talvez caso para perguntar: porquê só agora? À pergunta responde Andy Bevacqua, vice-presidente do departamento de investigação e desenvolvimento da Max Huber Research Labs. “A linha ‘Soleil de la Mer’ levou algum tempo a ser desenvolvida. Nós queríamos criar fórmulas de protecção solar de alta performance que defendessem a pele dos raios UVA e UVB mas que, ao mesmo tempo, tirassem o melhor partido do efeito da luz solar e que fossem profundamente eficazes em termos de reparação, hidratação e renovação do aspecto da pele”, explica salientando que, obviamente, a ideia central era “criar um produto que respondesse aos mesmos padrões de luxo da La Mer”. E se o propósito era criar uma linha solar que cumprisse os dois objectivos: protecção solar, por um lado, e reparação da pele, por outro, a receita só poderia ser uma. “No centro da colecção ‘Soleil de La Mer’ está a estrela da La Mer, o lendário ‘Miracle Broth’ que ajuda a dar à pele a energia de que esta necessita para renovar o seu aspecto”, explica Andy Bevacqua. À lenda vieram juntar-se ainda outros ingredientes chave, como seja “o fermento de Algas Douradas” (segunda foto ao lado), um novo composto que, de acordo com o mesmo responsável, “ajuda a reduzir a irritação e retém a hidratação” da pele. Estas Algas Douradas foram colhidas na costa da Bretanha, em França, onde subsistem diariamente às duras provações do sol intenso e a água salgada. Condições agrestes que, no fundo, acabam por fortalecer as capacidades regeneradoras da planta que, na pele, se traduzem na prevenção da inflamação e desidratação provocadas pelo sol ao mesmo tempo que estimulam produção de colagénio. Garantem assim um bronzeado dourado desde o primeiro dia, combatendo, em simultâneo, o envelhecimento cutâneo. A par do fermento de Algas Douradas, a linha “Soleil de La Mer” foi ainda enriquecida com peptídeos marinhos, que estimulam a produção de elastina e refor64 Fora de Série Fevereiro 2013 EXCLUSIVAMENTE PARA A MULHER EUROPEIA Mas há mais novidades a acrescentar à colecção “Soleil de La Mer”. A saber, é a primeira linha La Mer criada a pensar exclusivamente na mulher europeia, o que não deixa de ser um facto curioso, particularmente se tivermos em conta que se trata de uma marca norte-americana. A decisão foi ditada pela forma como as mulheres europeias encaram o sol e as suas vantagens e desvantagens para a pele, por oposição às norte-americanas que privilegiam o bronzeado rápido, deixando as preocupações com o envelhecimento cutâneo para mais tarde ou para outro tipo de soluções mais radicais. Já a pensar no próximo Verão, a nova colecção “Soleil de La Mer” prepara-se para chegar ao mercado entre finais de Abril e inícios de Maio trazendo consigo esta dupla vertente de protecção solar mais tratamento da pele em simultâneo. Uma vertente transversal a todos os produtos da linha que, para já, serão três: dois protectores solares de factor 30, para o rosto e para o corpo, e um auto-bronzeador ‘gradual tan’ para usar e abusar antes e/ou depois da exp exposição solar. A LINHA “SOLEIL DE LA MER” PROTEGE A PELE DO SOL E TEM UM E EFEITO REPARADOR, DE HIDRATAÇÃO E DE RENOVAÇÃO. FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELA MARCA PARA OS DIAS DE SOL E DE MAR çam a capacidade de resistência da pele e ainda extractos de ‘Alaria Esculenta’ uma alga castanha considerada o mais poderoso anti-oxidante marinho. Rica em nutrientes, ácidos gordos Ómega 3 e 6 e lípidos, esta alga ajuda a proteger a pele dos radicais livres, sendo um excelente regenerador celular. N OTAS SO LTAS DAVID ROSAS ABRE NOVA LOJA NA AVENIDA DONA DA GUCCI PODE MUDAR DE NOME São 700 m2 e três pisos. A nova loja da David Rosas na Avenida da Liberdade, agora remodelada e ampliada, é um dos maiores projectos na área da relojoaria e joalharia no país. O espaço está agora distribuído por várias zonas, uma dedicada à alta joalharia masculina; outra dedicada ao público feminino, com várias marcas de jóias e relógios; uma sala privada para atendimentos personalizados; e um ‘lounge’ com apresentações privadas e de imprensa. A abertura da nova loja é já em Maio. A PPR SA, dona da Gucci e da Puma, está a equacionar uma mudança de nome para Kering. A ideia é capitalizar a sua transformação em um especialista de artigos desportivos de luxo, de acordo com fontes do mercado. O plano de ‘re-branding’ deverá ser anunciado brevemente. A mudança de nome do grupo será já a quinta desde que a empresa integrou a lista de cotadas na bolsa de Paris, em 1998, e tem como objectivo assinalar um novo capítulo no desenvolvimento da empresa. O grupo PPR está a desfazer-se de algumas lojas para se concentrar apenas nos artigos de luxo e desporto, que são as mais rentáveis e têm melhores perspectivas de crescimento. VESTIDOS DE NOIVA PORTUGUESES CONQUISTA M O DUBA I Joana Montez e Patricia de Melo foram as primeiras estilistas portuguesas a participar na Pasarela Gaudí Novias. O desfile decorreu a bordo do paquete Costa Atlântica, atracado no Dubai. THIERRY MUGLER RESCINDE COM PISTORIUS Depois das suspeitas que levaram Oscar Pistorius a ser preso e indiciado pelo homicídio da sua namorada, Reeva Steenkamp, a Thierry Mugler decidiu rescindir o contrato que tinha com o atleta – que era desde a Primavera de 2011 o rosto do perfume de homem “A*men”, num negócio que chegou aos três milhões de dólares. A marca disse em comunicado que “com todo o respeito pelas famílias implicadas na tragédia”, tinha decidido retirar todas as campanhas publicitárias de Oscar Pistorius do mercado”. Antes da marca francesa, já a Oakley tinha rescindido contrato com o atleta olímpico, a que se seguiu a Nike e a British Telecom. SUBMARINOS SÃO O NOVO BRINQUEDO DOS RICOS Paul Allen, um dos fundadores da Microsoft, Roman Abramovich e o também milionário Richard Branson já aderiram à mais recente coqueluche do luxo: são proprietários de um submarino individual, com apenas dois lugares. Entediados com o luxo dos grandes iates, os “megaricos” estão a fazer disparar esta nova tendência de mercado. É que os submarinos recreativos estão a começar a ganhar espaço. O primeiro submarino familiar de cinco lugares tem, aliás, dado que falar no mercado e poderá em breve entrar na corrida para se tornar o novo brinquedo ‘must-have’ dos milionários. “Vestidos de noiva que acompanhem as tendências da moda do momento”. É assim que a dupla de estilistas caracteriza o seu trabalho: vestidos de noiva de tecidos leves, como tule, organza, seda e musselina, com sobreposições, transparências e bordados, que levaram Joana Montez e Patricia de Melo a serem as primeiras portuguesas a integrar a lista de criadores escolhidos que apresentam as suas colecções na Pasarela Gaudí Novias. No âmbito da Barcelona Bridal Week, o prestigiado “J Winter Fashion Show 2013” aconteceu a bordo do luxuoso paquete Costa Atlântica, atracado nas docas do Dubai, a 17 de Janeiro. E a colecção da dupla portuguesa foi tão apreciada que, actualmente, têm a sua marca representada por uma das melhores lojas de alta-costura, situada na Jumeirah Road, onde se concentram as lojas e os ateliers mais luxuosos do Dubai. “Após o desfile, fomos convidadas a ter a nossa marca numa loja em Jumeirah Road – a Le Paon Blanc”, conta Joana Montez. Ambas tiraram o curso de moda na Escola de Moda de Lisboa, completando a sua formação com uma pós-graduação no Gabinete Promostyl, em Paris, e desde 1998 que têm um atelier sediado em Cascais. Dizem que “a colecção se distingue por um corte distinto mas alegre e moderno, longe do conceito tradicional do vestido de noiva”. Uma colecção de vestidos por ano. Mas, e no Dubai? “Nesta primeira fase não houve adaptação da colecção”, explica Joana Montez, que continua: “obviamente, os nossos vestidos destinam-se aos estrangeiros ‘residents’ ou que visitam o Dubai. O traje de casamento nobre é completamente diferente. Mas temos uma proposta para desenvolver colecções de noiva e de festa adaptadas ao mercado local”. Para já, a presença recente neste mercado não está a sentir as diferenças culturais. E a dupla até tem planos de regressar aos Emirados, desta vez para fazer um estudo de mercado mais aprofundado. Haja festa! Joana Montez e Patricia de Melo foram as primeiras portuguesas a participar na Pasarela Gaudí Novias, no Dubai. E por lá ficaram. LVMH QUER COMPRAR BURBERRY O grupo LVMH está a preparar uma tomada de poder, no sentido de aumentar as suas receitas que, baseadas nas vendas das carteiras Louis Vuitton, têm vindo a cair nos últimos quatro anos. O Berenberg Bank veio dizer que a marca de 67 mil milhões de euros estará a pensar comprar o grupo Burberry, o maior produtor de bens de luxo do Reino Unido. Depois de ter adquirido a italiana Bulgari, em 2011, a LVMH poderá estar também interessada na Tiffany & Co, a maior joalheira nova-iorquina, que vale mais de 62 mil milhões de euros, disse a empresa de investimentos Cantor Fitzgerald LP. CALÇADO PORTUGUÊS NOS EUA Presente no mercado americano desde Setembro passado, a marca portuguesa de calçado Carlos Santos marcou presença na edição da FN Platform, em Las Vegas, em Fevereiro. Esta é considerada uma das maiores feiras de calçado da região Oeste dos EUA – que vai já na sua 6ª edição – e tem vindo a crescer cerca de 25% em cada ano. O administrador e fundador da marca, Carlos Santos, revela: “O saldo desta participação é positivo e vem reforçar ainda mais a entrada da marca naquele país”. Um evento onde se reuniram cerca de 1600 marcas num ambiente destinado ao público profissional. T E X TO D E J OANA M O U R A Abril 2013 Fora de Série 65 Evasão PRIMAVER A NUMA CASA DE BONECAS É possível ser feliz em 60 metros quadrados. Apertado? Não se tudo o que for preciso para um fim-de-semada de bem-estar em família estiver à mão. É o caso das ‘eco houses’ no Parque das Pedras Salgadas, onde a vida se vive em ‘doll size’. T E X T O D E R I TA I B É R I C O N O G U E I R A “M ãe, quando é que voltamos à nossa casa das Pedras Salgadas?”. A pergunta é repetida até à exaustão nos últimos meses. Talvez porque ainda não tenha obtido uma resposta satisfatória para arrumar o assunto. “A nossa casa”, o sentimento de posse bem frisado a cada investida. “A casa não é nossa, mas tenho pena”, apetece-me responder. Mas não o faço. Deixo passar. Permito-me sonhar junto com ele e atiro-lhe com um vago “um dia destes…”. Há, neste ritual de pergunta-resposta, que se repete desde o início do ano, uma certa sensação de vitória, de dever cumprido. Vale sempre a pena investir num fi m-de-semana em família. Se uma criança de três anos – que não percebe nada de arquitectura, que não usufruiu de nenhum tratamento no spa e não vive a sonhar com o dia em que vai poder libertar-se do ‘stress’ do dia-a-dia – ficou seduzida, que dizer de nós, adultos, depois de um relaxante fim-de-semana passado no meio do bosque das Pedras Salgadas? Chegámos de madrugada, com a “amena” temperatura de zero graus centígrados para nos receber, depois de uma paragem obrigatória na Mealhada para um jantar de leitão. Um desvio já elevado à qualidade de culto na família. Quatro adultos, três crianças adormecidas, a habitual confusão de sacos, malas, 66 Fora de Série Abril 2013 bolachas e brinquedos vários que as acompanham. E uma vontade imensa de desligar da azáfama da cidade e mergulhar naquele bosque centenário. Recebeu-nos o guarda, já com os carrinhos de golfe cobertos – para enfrentar o frio nocturno – a postos. É que os carros não podem entrar no parque. Ficam estacionados em baixo, junto do edifício principal, onde fica o spa e a recepção, e a partir daí os hóspedes deslocam-se a pé. Ou de bicicleta. Ou de carro de golfe, o meio de transporte ecológico e silencioso adoptado pelo hotel para ajudar no ‘check in’. Por um caminho acidentado, o veículo deixa-nos naquelas que seriam – pelo menos naquele fi m-de-semana, ainda que alguns gostassem de lhe chamar sempre suas – as nossas casas, “Abeto” e “Cipreste”. Construções modulares envidraçadas com madeira e ardósia (materiais abundantes na região) cujos interiores se revelaram surpreendentemente… quentes. Era mesmo o que apetecia, depois de enfrentar aquela madrugada húmida. Demos uma volta apressada de apresentação pelas casas, para perceber a dinâmica da coisa, antes de mergulharmos nos edredões até ao dia seguinte. Fomos tão bem recebidos que nos sentimos em casa e não tardamos a cair num sono profundo e reparador. PEQUENO-A LMOÇO A CHEIR A R A V ER DE Somos acordados por um bater suave na porta. São dez horas e o sol brilha através dos estores cerrados. Abrimos e, no chão, à porta de casa, “olha-nos” uma grande cesta de vime tapada com um pano branco imaculado. O cheiro é promissor e acorda-nos os sentidos ainda adormecidos: hora do pequeno-almoço! No super-moderno balcão da cozinha, toda branca, revela-se a melhor refeição dos últimos tempos. Os ‘croissants’ são deliciosos. Tudo tem um ar absolutamente caseiro. O pão; o fiambre e o queijo fatiados e O arquitecto Luís Rebelo de Andrade foi feliz neste projecto ‘clean’ e minimal. As casas, construídas pela Modular System, surgem entre as árvores. Com cerca de 60 metros quadrados de área, comportam confortavelmente seis pessoas. BANHO TOMADO E ESTAMOS PRONTOS A FAZER-NOS AO CAMINHO. CHEIR AMOS A “VERDE”, CORTESIA DA MOLTON BROWN, E O AROMA NÃO PODIA SER MAIS INSPIR ADOR. em caixinhas; os frasquinhos de doce e mel; os iogurtes; os cereais… Banho tomado na boxe de vidro da casa-de-banho e estamos prontos a fazer-nos ao caminho. Cheiramos a “verde”, cortesia das ‘toiletries’ “Green Park”, da Molton Brown, e o aroma não podia ser mais inspirador. O frio da noite deu lugar a um dia fresco e ensolarado e o bosque das Pedras Salgadas dá-nos as boas-vindas naquela manhã. À luz do dia conseguimos aperceber-nos da disposição das sete ‘eco houses’ que ocupam o bosque de forma completamente integrada na paisagem. O nosso grupo ocupa duas, frente-a-frente, mas apenas para dormir, pois cabemos perfeitamente os sete numa só casa e optamos por fazer as refeições sempre juntos, na nossa casa de bonecas. O arquitecto Luís Rebelo de Andrade foi feliz neste trabalho de volumetria moderna e com uma arquitectura de interiores ‘clean’ e minimal. As casas, desenvolvidas especificamente para este projecto e construídas pela empresa portuguesa Modular System, respeitam o perfil natural do terreno e surgem entre as árvores. Com capacidade para seis pessoas, em cerca de 60 metros quadrados de área, foram pensadas para garantir conforto: têm um quarto, uma área com duas camas, sala com sofá-cama, ‘kitchenette’ equipada, casa-de-banho, ‘hall’ e um ‘deck’ exterior com espreguiçadeiras, num ambiente tão em contacto com a natureza que não dá vontade de sair. SA LUS PER AQUA M Mas o parque convida à descoberta. Quanto mais não seja perceber o que fez desta vila termal o destino preferido para as férias da realeza. Reza a história que tudo começou em 1873, quando as águas da nascente de Pedras Salgadas foram premiadas na Exposição Internacional de Viena de Áustria. O prémio deu origem à construção do Balneário Termal, em 1879, que, desde a inauguração, nunca deixou de receber os mais ilustres visitantes. Um médico de Vila real, o Dr. Henrique Ferreira Botelho, propôs que se fundasse uma empresa para exploração destas águas medicinais e, com a descoberta de novas nascentes e com a visita, em 1884, do Rei D. Fernando ao parque, estavam criadas as condições para que as Pedras Salgadas se tornassem num prestigiado complexo turístico. Mas o sucesso só chegaria no novo século, quando, em 1906, o Rei D. Carlos por ali se instalou para usufruir dos tratamentos termais. Daí à chegada da linha de caminho-de-ferro foi um pulo e, anos depois, nascia o Casino das Termas (que nunca chegou a ser casino, pois não tinha licença de jogo, mas sim uma espécie de requintado salão de festas). Os tratamentos termais viveram tempos de glóAbril 2013 Fora de Série 67 Evasão ria no século XX, mas foram, aos poucos, perdendo terreno para os modernos spas. Só em 2009 é que o Balneário daquele tempo foi renovado pelo arquitecto Álvaro Siza Vieira e deu origem ao moderno Spa Termal que hoje encontramos no edifício principal, cheio de ‘glamour’ com a junção entre os interiores em ‘art nouveau’ e a estética depurada que caracteriza o trabalho deste arquitecto. Já as ‘eco-houses’, só chegaram no final do ano passado, por isso, o Pedras Salgadas Spa & Nature Park está a dar agora os seus primeiros passos enquanto complexo turístico da actualidade. Até ao final deste ano, mais cinco se juntarão às sete já existentes, e ainda outras três casas instaladas na copa das árvores. O Casino, que está a ser renovado, tem abertura prevista para este Verão, e há-de renascer o Grande Hotel, mas não é para já. No parque, que se espraia por oito quilómetros de caminhos, destacam-se os jardins, lindos e com assinatura. O autor foi Jacinto de Matos, horticultor, jardineiro e paisagista oriundo do Porto dos finais do século XIX e início do XX, que lhes conferiu o carácter romântico que hoje mantêm, com os seus recantos, as grutas, as casas de pássaros, a água a correr das fontes, o observatório meteorológico. Por estes caminhos, a pé ou de bicicleta, é possível conhecer uma a uma as fontes de água termal – a Fonte D. Fernando, a Fonte D. Maria Pia, a Fonte Penedo e Grande Alcalina, a Fonte Pedras Salgadas e a Fonte Preciosa. E, de caminho, ficar a conhecer a piscina exterior – e dar um mergulho se caso for –, o campo de mini-golfe, o parque infantil, o enorme lago – onde se pode andar de barco e fazer passeios de gaivota, observar carpas coloridas (Koi) – e desfrutar da fauna local, nomeadamente os afamados esquilos-vermelhos (que por causa do frio não tivemos oportunidade de ver, mas que, agora na Primavera, se passeiam pelo bosque livremente), as cegonhas, as garças e os pica-paus. Quem gosta da natureza vai deliciar-se com os muitos e centenários exemplares de árvores raras, como a sequóia-sempre-verde, a sequóia-gigante, o abeto-de-Douglas, o cipreste-do-Buçaco, a faia, a metasequóia ou a cuningamia. Claro que os mais radicais também vão encon- Siza Vieira pegou, em 2009, no antigo Balneário e renovou-o, conferindo ao edifício já de si glamoroso, com os seus interiores em ‘art nouveau’, a estética depurada que lhe é característica. Nasceu assim o moderno Spa Termal. UM PROJECTO ORIENTADO PAR A FAMÍLIAS E AMIGOS ONDE É IMPOSSÍVEL NÃO NOS SENTIRMOS PARTE DO CENÁRIO. SE FOSSEM PR ECISOS M A IS A RGUMENTOS… …para fazer as quatro horas de caminho que separam Lisboa do Parque das Pedras Salgadas (sorte de quem vem do Porto, que só tem uma hora de estrada pela frente), aqui vai mais um: este projecto foi o único de nacionalidade portuguesa a figurar en- 68 Fora de Série Abril 2013 PEDRAS SALGADAS SPA & NATURE PARK 5450-140 Bornes de Aguiar Portugal trar, nestes 20 hectares de zona verde, com que se entreter. Actividades ao ar livre não faltam, desde BTT a simples passeios na ciclovia que liga Pedras Salgadas a Vila Pouca de Aguiar. ‘Slide’ e ‘rafting’ também estão contemplados, bem como passeios pelo rio Douro e visitas guiadas às minas de ouro romanas. E, quanto mais não seja, descobrir onde nasce a famosa Água das Pedras. E os adeptos do ‘relax’ mais puro não vão dizer que não aos inúmeros tratamentos termais de bem-estar e estética disponibilizados no spa, com as suas 14 salas de tratamento, a piscina interior aquecida com corredor de marcha, a sauna, o banho turco, a hidromassagem, o duche de agulheta, o duche Vichy e as salas de relaxamento, todas tirando partido dos benefícios da água termal naturalmente gaseificada das fontes de Pedras Salgadas, reconhecidas na comunidade científica nacional e internacional como terapias benéficas para doenças metabólico-endócrinas, do aparelho digestivo, do aparelho respiratório, reumáticas e musculo-esqueléticas. tre os 14 edifícios fi nalistas do concurso promovido pelo ‘site’ “ArchDaily” – a publicação ‘on-line’ de arquitectura mais visitada do mundo, com cerca de 280 mil visitas diárias e 70 milhões de ‘pageviews’ mensais – para eleger os melhores edifícios construídos em 2012. Entre as 70 construções seleccionadas de todo o mundo, a arquitectura portuguesa já estava de parabéns, pois tinha dez ateliers a concurso. Mas, no fi nal, restaram as sete modernas ‘eco houses’ de Luís Rebelo de Andrade para fazer as honras da casa na categoria de Hotéis e Restaurantes. Foram contabilizados cerca de 70 mil votos dos utilizadores registados do ‘website’, que foram depois avaliados por arquitectos. Segundo o “ArchDaily”, o lote de 14 vencedores “é único em vários aspectos, das suas qualidades espaciais às suas estruturas e materiais, mas também em termos do que representam para a sociedade e do seu impacto nas comunidades locais”. Impacto esse que não é de desprezar na localidade, situada entre Vila Real e Chaves, onde se destacou, sobretudo, o sistema modular que forma este ‘eco resort’ que lhe dá uma flexibilidade única, permitindo que as casas se encaixem em qualquer parte da zona verde onde estão implantadas. Um projecto hoteleiro orientado para famílias e amigos onde é impossível não nos sentirmos parte do cenário. Quando voltamos à nossa casa das Pedras Salgadas? Um dia destes. Afinal, ela é nossa. FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELO HOTEL Telefone para reservas: +351 259437140 E-mail: reservations@ pedrassalgadaspark.com Site: www.pedrassalgadaspark.com Preços: ‘Eco house’ com capacidade para seis pessoas entre 120 e 200 euros por noite (consoante a época do ano e o número de pessoas). Evasão GSTAAD CONTINUA A SURPREENDER... CEM ANOS DEPOIS É o mais recente ‘hot-spot’ da estância de esqui de Gstaad, na Suíça. Demorou 15 anos a ser construído mas o resultado final está a deixar residentes e turistas rendidos ao Alpina Gstaad. T E X T O D E L U C I A VA N D E R P O S T, E M G S TA A D G staad, uma das estâncias de esqui mais luxuosas da Suíça, fervilha de entusiasmo com a inauguração do primeiro hotel de cinco estrelas em 100 anos, o Alpina Gstaad. Jornalistas de todo o mundo vieram ver o ‘resort’ de que todos falam, enquanto os habitantes da pequena cidade invadem o átrio, enchem o bar e experimentam os tratamentos do spa e restaurantes. O projecto levou 15 anos a concretizar, mas tudo indica que será mais um sucesso a somar à oferta de qualidade da estância alpina. Um dos residentes, por exemplo, está de tal forma viciado no restaurante japonês Megu, cujo ‘flagship’ se encontra em Nova Iorque, que passou a almoçar aqui diariamente. Pedidos obrigatórios: ‘sushi’ e uma garrafa de vinho que custa 2 mil francos suíços, qualquer coisa como 1500 euros. Os habitantes de Gstaad são assim mesmo: pedem o vinho que realmente lhes apetece beber. O preço é um pormenor de somenos importância. O hotel, onde foram investidos mais de 250 milhões de euros, é uma ‘joint-venture’ entre Marcel Bach, um jovem agricultor local de sucesso, e Jean-Claude Mimran, empresário franco-argelino que tem casa em Gstaad, Genebra e Monte Carlo. Foi construído numa encosta da montanha sobranceira à cidade, razão pela qual todos os quartos têm varanda e vista sobre a cidade e as montanhas envolventes. Dispõe de 25 quartos e de 31 suites com dimensões generosas e decoração elegante – “pormenores” que fazem toda a diferença quando comparados com a oferta da concorrência no mesmo segmento. Muitos dos quartos têm lareira e acendê-la não podia ser mais fácil: é só clicar num botão e já está! Além disso, 70 Fora de Série Abril 2013 as soluções de iluminação são absolutamente fantásticas e inovadoras. Por exemplo, se decidirmos ir à casa de banho a meio da noite, uma luz discreta ilumina o suficiente sem incomodar terceiros. Mas não só. A decoração também presta homenagem a uma certa estética suíça ‘vintage’ e aqui e ali percebe-se um certo “toque alpino”, como badalos a servir de candeeiros, traves de madeira recuperadas de antigas quintas de Saanenland e pedra característica desta região. Marcus Lindner, antigo ‘chef’ de mesa, duas estrelas Michelin, em Zurique, é responsável pela ementa dos três restaurantes do Alpina. O Sommet, que oferece um menu de degustação de sete pratos, o já referido Megu – os espargos em crosta ou o ‘carpaccio’ de vaca Kobe são imperdíveis –, e o Stübli, cuja decoração é ligeiramente ‘kitsh’, onde se servem especialidades locais como ‘fondues’, ‘raclettes’ e ‘rösti’. Todos os hóspedes têm direito a um crédito de 150 francos suíços por dia (120 euros), não reembolsável, para gastar nos restaurantes do ‘resort’. O mimo absoluto, porém, é o Six Senses Spa, com cerca de 2 mil metros quadrados. Pessoalmente, ir ao spa não é a minha prioridade quando estou numa estância de esqui, prefiro desfrutar ao máximo das pistas. Mas reconheço que o Six Senses é especialmente fantástico: tem uma piscina aquecida de 25m e um leque de tratamentos de luxo altamente diversificado, além de programas de perda de peso e desintoxicação. Falando agora da pequena cidade de Gstaad, o que mais se destaca é o seu carácter profundamente alpino, como acontece com a maior parte das estâncias de esqui suíças. Entre finais da década de 1980 e finais de 1990, vinha até aqui regularmente. Passados quase 15 anos, é notório que foram introduzidas melhorias, mas sempre com a preocupação de não descaracterizar Gstaad. Diria que é uma versão idêntica à que conheci no passado, mas com mais gente. Num primeiro olhar, descobrimos os ‘chalets’ privados característicos da cidade e aldeias circundantes, novos e antigos, todos respeitando a traça local, onde se destacam os telhados tipicamente inclinados. Os decoradores internacionais só tiveram autorização para dar largas à imaginação no interior dos O Alpina Gstaad foi construído numa encosta da montanha sobranceira à cidade. Tem 25 quartos e 31 suites com uma decoração elegante e ‘vintage’. Muitos dos quartos têm lareira, fácil de acender. O hotel tem três restaurantes cujas ementas são da responsabilidade de Marcus Lindner, ‘chef’ duas estrelas Michelin. O mimo absoluto é o Six Senses Spa, com piscina aquecida e um leque imenso de tratamentos de luxo. GSTAAD FERVILHA DE ENTUSIASMO COM A INAUGURAÇÃO DO PRIMEIRO HOTEL DE CINCO ESTRELAS EM 100 ANOS. enquadradas por montanhas que, embora relativamente pequenas, oferecem excelentes encostas para os esquiadores intermédios. Quando fiz o ‘check-out’, o Alpina Gstaad estava ao rubro: nem um quarto livre e conseguir mesa num dos restaurantes parecia verdadeiramente uma missão impossível. Neste período do ano, uma semana no Alpina num quarto duplo ‘deluxe’ – a gama de quartos mais baixa, mas ainda assim fantásticos – ronda os 4.650 euros, embora o que mais pese na factura, como acontece em todos os hotéis de luxo, sejam os extras. Chá para uma pessoa e bolachas (aparentemente, não servem um sem o outro) custa 9 euros, mas uma coisa é certa: ficar alojado num hotel de topo nos Alpes suíços é como ter um iate – se tiver de perguntar pelo preço é porque não pode dar-se a esse luxo, certo? Lucia van der Post viajou a convite do Alpina Gstaad (www. thealpinagstaad.ch) e da companhia aérea Swiss (www.swiss.com). Quarto duplo a partir de 650 euros, incluindo pequeno-almoço e um crédito de 120 euros para utilizar nos restaurantes do hotel. Abril 2013 Fora de Série 71 FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELO ‘RESORT’ E DE CORBIS/VMI ‘chalets’. No exterior, tudo está ‘comme il faut’. Muitos agricultores e carpinteiros locais recusam-se a vender as suas propriedades a esquiadores ricos, por mais generosa que seja a sua oferta. Peter, o instrutor de esqui que nos levou ao topo do glaciar Diablerets, dá aulas de esqui no Inverno e cultiva a terra no Verão. Para ele é ponto de honra que os terrenos herdados da família passem para a geração seguinte, os seus cinco filhos. “A partir do momento em que vendemos os terrenos, nunca mais conseguimos recuperá-los”, diz. Apesar de ser uma das estâncias mais badaladas, Gstaad consegue manter um charme tangível devido às convicções de quem quer preservar a memória e a propriedade dos seus antepassados. Os ricos que aqui compram casa – ou melhor, um ‘chalet’ – sentem que, apesar de tudo, há qualquer coisa de genuíno no ar. Existem perto de 200 agricultores no activo na região, cujas quintas se situam maioritariamente nas faldas da cidade. Vacas é coisa que não falta, uma vez que atravessam Gstaad a caminho dos pastos. Depois, há a igreja, com 800 anos, que ainda hoje é o ponto de encontro de locais e visitantes, restaurantes típicos, como o Café Charlie, onde todos vão tomar café e que é conhecido pelos seus deliciosos – e proibitivamente calóricos – bolos e pastéis, e o hotel mais antigo da cidade, o Posthotel Rössli, construído em 1823, e um dos poucos sobreviventes do grande incêndio de 1899. As pistas ficam entre bosques e terreno aberto, Evasão MUDAR DE VIDA Sha significa luminosidade em japonês, nobreza em árabe e ar puro em hindu. Em inglês e para o mundo, Sha Wellness Clinic é um templo dedicado à saúde e ao bem-estar eleito por celebridades à procura de uma fonte da juventude. E o incrível é que a encontram, a dois passos de Alicante. T E X T O D E C ATA R I N A PA L M A , E M A L I C A N T E N o interior da Sha Wellness Clinic, a percepção do tempo muda. Os hóspedes são encorajados a esquecer os maus hábitos do seu antigo quotidiano e a sintonizarem-se em alcançar um corpo e mente saudáveis. Aqui os dias passam tranquilos, ao ritmo das consultas, actividades e tratamentos marcados na nossa agenda pessoal (consultada no iPad fornecido no ‘check-in’) e iluminados pelo céu quase sempre azul da Costa Blanca. O Sha abriu em finais de 2008 e já recebeu variadíssimos prémios internacionais de “melhor spa” do ano, de Espanha, da Europa e do mundo. Para confirmar esta fama, tem uma lista de clientes célebres como Naomi Campbell, Carine Roitfeld, Elsa Pataky, Kylie Minogue e François Pinault. Mas o que tem este lugar de especial? Não será a localização, pois apesar da bonita vista panorâmica sobre a charmosa baía de Altea, fica mesmo ao lado de Benidorm, a 50 quilómetros de Alicante, o que, convenhamos, não é um grande atractivo. A verdade é que Sha não é um hotel com um spa, nem mesmo um spa com um hotel, é uma clínica médica dedicada à saúde e ao bem-estar pioneira no mundo, porque se baseia na dieta macrobiótica e na fusão da medicina ocidental com a medicina oriental, combinando-as com poder curativo das terapias naturais e com um tratamento personalizado e muito exclusivo. UM SONHO TORNADO REALIDADE Este lugar existe graças à experiência de Alfredo Bataller Parietti, o proprietário, que durante anos seguiu um tratamento ineficaz com fármacos prescritos pela medicina tradicional para combater os problemas digestivos que o acompanhavam desde a juventude. “Perante um diagnóstico mais preocupante, o meu pai foi aconselhado a experimentar uma dieta macrobiótica que, surpreendentemente, o curou em dois meses”, 72 Fora de Série Fevereiro 2013 AS ACTIVIDADES Para garantir o sucesso dos tratamentos, os hóspedes são encorajados a não deixar as instalações da clínica por iniciativa individual, mantendo-lhes a agenda ocupada. Todas as manhãs, às oito, a recepção serve de ponto de encontro para passeios ao ar livre, que incluem visitas ao farol de Altea, caminhadas na praia ou passeios nórdicos (com diferentes níveis de intensidade). A meio da manhã há aulas de pilates, ‘fitness’ aquático e GAP (glúteos, abdómen e pernas). A seguir ao almoço, é a vez das aulas de cozinha ou palestras sobre temas como a medicina tradicional chinesa, produtos macrobióticos ou tratamentos holísticos. E ao final da tarde, realizam-se sessões de ‘tai chi’, ioga, meditação e alongamentos. REGR AS BÁSICAS PAR A UMA VIDA MELHOR A macrobiótica tem a sua origem etimológica nas palavras gregas “makro” e “bios”, significando literalmente “grande vida”. Não é um regime alimentar rígido, mas sim uma forma sensata de encarar a alimentação, tendo em conta factores como o clima, a idade e a saúde de cada um. Não há alimentos proibidos, mas sim que devem ser evitados ou reduzidos ao máximo, como é o caso da carne (com o frango podem fazer-se algumas excepções), leite e derivados (deve ser substituído por leite de aveia, amêndoa e arroz – não de soja), ovos, cereais refinados, açúcares refinados, refrigerantes e sumos com aditivos, alimentos processados e café. Já os cereais integrais, legumes, algas, frutas (sempre da estação e que cresçam no país/região onde vive), sementes e soja, desde que fermentada, são permitidos e aconselhados. As paisagens sobre a baía de Altea são arrebatadoras e ajudam à estadia. No entanto, para garantir o sucesso dos tratamentos, os hóspedes são encorajados a não deixar as instalações da clínica por iniciativa individual. A agenda é preenchida com várias actividades. Fevereiro 2013 Fora de Série 73 Evasão UMA DIETA GOUR MET “Através de uma dieta baseada no equilíbrio dos alimentos, a macrobiótica ajuda o corpo a curar-se a si próprio, eliminando as toxinas acumuladas ao longo de uma vida e a recuperar as suas defesas naturais”. É assim que a macrobiótica é apresentada quando nos sentamos pela primeira vez à mesa do Shamadi, o restaurante do Sha, cujas ementas são elaboradas pelo ‘chef’ Pablo Montoro, um discípulo de Ferran Adrià que consegue transformar as dietas prescritas pelos nutricionistas – Kushi (mais restrita), Bio Light (programa detox) ou Sha (mais ‘gourmet’, com direito a sobremesas e vinho orgânico) – em experiências de alta gastronomia, no sabor e na apresentação dos pratos. Um conceito que, aliás, faz parte da filosofia da Wellness Clinic: provar que uma dieta saudável pode ser muito atractiva. E se os três dias que estivemos no Sha não são suficientes para testemunhar o resultado dos programas específicos, garantimos que sim, é possível sobreviver alegremente sem carne, leite, ovos ou café – pelo menos quando temos na cozinha um ‘chef’ como Montoro. Inicialmente estranha-se que sirvam uma sopa ‘miso’ ao pequeno-almoço (é muito alcalina, purifica o sangue, e tem propriedades desintoxicantes e antialérgicas) ou um espesso creme de arroz integral, mas rapidamente vai habituar-se. Uma advertência: no segundo dia de dieta podem surgir algumas (ou muitas) dores de cabeça – a falta de café e de açúcar são os culpados –, mas os sintomas desaparecem rapidamente, dando lugar a uma incrível sensação de bem-estar. INICIALMENTE ESTRANHA-SE QUE SIRVAM UMA SOPA ‘MISO’ AO PEQUENO-ALMOÇO MAS DEPOIS VAI HABITUAR-SE. conta Alejandro Bataller, o filho mais novo, director de marketing do Sha. Decidido a entender melhor o poder auto curativo das terapias naturais, este homem de negócios de origem argentina começou a investigar, o que o levou até Michio Kushi, o pai da macrobiótica moderna, presidente da Associação Mundial de Medicina Natural e consultor da OMS. Inspirado por este encontro e com o apoio dos filhos, Bataller deu início à construção da Sha Wellness Clinic num terreno de família, sobre a Praia de Albir, e convidou Kushi para director de medicina natural da primeira clínica macrobiótica da Europa. Seguindo um conceito multidisciplinar único, o Sha coloca à disposição dos seus clientes os melhores especialistas em nutrição e terapias naturais, utilizando diversas técnicas orientais – acupunctura, ‘shiatsu’, ioga, ‘tai-chi’, ‘watsu’, ‘reiki’, reflexoterapia, meditação – que se cruzam com os conhecimentos de uma equipa de profissionais na vanguarda das últimas descobertas da medicina preventiva, genética, estética e anti-envelhecimento. Existem vários tipos de programas à escolha (anti-stress, anti-tabaco, desintoxicação...), no entanto, à chegada à clínica são realizadas consultas de avaliação, análises e exames que permitem à equipa médica adaptar a dieta e os tratamentos às necessidades de cada hóspede. Mas se os resultados a curto prazo são um objectivo para quem aqui chega, a equipa do Sha pretende ir mais longe e promover uma mudança de hábitos. Por isso, todos são convidados a frequentar aulas de cozinha macrobiótica e palestras sobre medicina tradicional chinesa para adquirirem as ferramentas necessárias a um estilo de vida saudável e duradouro. Existe até um serviço de acompanhamento pós-internamento, o “Sha Coaching”. PARAÍSO ZEN Ocupando uma área de 25.000 metros quadrados numa encosta do Parque Natural da Serra Gelada, o Sha Wellness Clinic é constituído por cinco edifícios inde74 Fora de Série Abril 2013 PROGR AMAS À MEDIDA O ‘chef’ Pablo Montoro é o responsável pela cozinha do Shamadi, o restaurante do Sha, e transforma as dietas prescritas pelos nutricionistas em experiências de alta gastronomia. pendentes mas comunicantes, num projecto assinado pelo arquitecto uruguaio Carlos Gilardi, e a ‘designer’ espanhola Elvira Blanco Montenegro. O branco é a cor denominante no exterior e nos interiores, sóbrios e minimalistas, para transmitir um ambiente de tranquilidade (até porque há hóspedes que permanecem aqui durante mais de um mês). Os 2000 metros quadrados de área Wellness, com 40 salas de consultas e tratamentos (onde até a comum massagem “Deep Tissue” fica na memória) e uma zona ‘aqua-lab’ com piscinas terapêuticas, camas de fisio-hidromassagem e várias áreas ‘chill-out’, confirmam a aposta num serviço de alto nível. Um tratamento de luxo que se estende aos quartos, na verdade 93 suites com áreas que variam entre os 80 e os 320 metros quadrados (da Royal Suite que dispõe de três quartos, sala, cozinha, solário e piscina privada, mordomo, ‘chauffeur’ e serviço de helicóptero por 6000 euros/dia). Seguem-se o elegante Shamadi, restaurante de cozinha saudável onde se fazem as três (e únicas) refeições diárias, as fotogénicas piscinas exteriores, as cascatas, os jardins ‘zen’ e zonas ‘relax’ com vista para o mediterrâneo. Com pouco mais de quatro anos de existência, o Sha já é uma marca de renome mundial. “Fomos contactados para replicar o conceito em outras partes do mundo, mas ainda estamos a estudar essa possibilidade”, diz Alejandro Bataller, sem disfarçar o orgulho. Tudo graças ao método inovador que reconcilia o corpo, a mente e o espírito, ensinando-nos a viver mais e melhor. A Sha Wellness Clinic oferece diversos programas de tratamentos. Existem estadias de dois (500 euros) e de quatro dias (950 euros), apenas para entender como funciona a clínica ou relaxar um pouco. Porque, para sentir os efeitos do método Sha e garantir que estes se mantêm, são recomendadas estadas mínimas de sete dias e, idealmente, com duração de duas semanas. É o caso do programa “Intensive Detox & Weigth Loss”, pensado para combater o excesso de peso, a fadiga e a ansiedade. Entre outras coisas, inclui um ‘check-up’ médico, análises clínicas, consulta de nutrição, genética e terapias naturais, ‘personal trainer’, dieta macrobiótica, cinco massagens ‘detox’, cinco curas hidroenergéticas, duas sessões de acupunctura, três de hidro-cólon-terapia, uma drenagem linfática, massagens terapêuticas e três sessões de pressoterapia. O preço é de 3950 euros por sete dias (o programa de 14 dias custa 6900 euros). Existem outros programas como o “Anti-Tabaco” (2300 euros/sete dias); o “Sleep Well” (2300 euros/sete dias); o “Anti-Stress” (1880 euros/sete dias); ou o “Emagrecimento” (2100 euros/sete dias ou 3250/14 dias). Uma das últimas novidades é o programa de fertilidade, que custa 12.900 euros e implica duas visitas à clínica, com um intervalo de dois meses. Destaque especial para o revolucionário “Programa de Rejuvenescimento”, que custa 6000 euros/sete dias ou 10.000 euros/14 dias, e cujo objectivo é atrasar o processo de envelhecimento e reactivar o potencial de saúde do paciente. Para este fim, é realizado um teste genético para determinar a idade biológica, que raramente coincide com a cronológica. Os programas de estética centram-se em técnicas de rejuvenescimento minimamente invasivas (sem plásticas) e têm preços que variam entre os 840 e os 4860 euros. PREÇOS E RESERVAS Nenhum dos programas propostos inclui o preço do alojamento, que varia de acordo com a suite escolhida: Deluxe Suite Individual (230 euros/noite); Deluxe Dupla (290 euros/noite); Suite Superior (desde 450 euros/noite); Grand Suite (750 euros); Suite Presidencial (2500 euros); e Royal Suite (6000 euros). Reservas através do site www. shawellnessclinic.com, e-mail [email protected], ou pelo telf. +34966811199. COMO IR A TAP tem voos directos de Lisboa para Valência (a partir de 165 euros, ida e volta), que fica a cerca de 130 quilómetros de Altea. O ideal será pedir um ‘transfer’ à Sha Wellness Clinic no acto da reserva. evasao.com VO OS . D E STIN OS . H OTÉIS . CO M PR AS . VIAG ENS . SPAS . N OVIDAD E S www.united.com . LO JAS . T U D O O N - LI N E www.pestana.com/pt A TEMPO E HORAS NOVAS AVENTURAS Os meses de Janeiro e Fevereiro, na United Airlines, foram marcados pela pontualidade. A companhia aérea americana superou, pela primeira vez desde 2003, o patamar dos 80% de chegadas dentro do horário previsto nos primeiros meses do ano. A percentagem das chegadas internacionais dentro do horário foi de 80,5% e, no caso dos voos domésticos, o número foi ainda superior, 80,8%. Como recompensa pelo trabalho e dedicação, a United decidiu entregar um bónus de 100 dólares aos colaboradores que tiveram um melhor desempenho. O mapa geográfico do grupo Pestana torna-se cada vez mais global, marcando agora presença em Marrocos e na América do Norte, pela primeira vez. No mesmo ano em que comemora o 40º aniversário, a maior cadeia hoteleira de Portugal vai abrir dois novos hotéis: Pestana South Beach e Pestana Palace Casablanca. As cidades europeias e a América do Sul vão continuar, nos próximos anos, a ser o alvo para o crescimento da marca Pestana. PR IMEIRO BOUTIQUE CLUB DE LISBOA www.zaha-hadid.com AEROPORTO PRECISA-SE O presidente da Câmara de Londres anunciou os planos para a construção de um novo aeroporto no sudeste da cidade que servirá todo o país, em especial a capital. A grande notícia é o facto de o trabalho ter sido entregue à arquitecta Zaha Hadid. O ‘mayor’ explicou que é necessário um novo ‘hub’ para incentivar a economia britânica e para dar resposta a uma concorrência global. www.restaurante-olivier.com/honra COMIDA D’HONRA Foi à sua avó de 86 anos que o ‘chef’ Olivier foi pedir ajuda, quando estava a criar a sua interpretação de alguns dos pratos da cozinha tradicional portuguesa para o seu novo restaurante, o Honra by Olivier. Situado na Praça da Figueira, em Lisboa, o novo espaço foi criado com o intuito de fazer uma homenagem ao melhor da gastronomia nacional, a começar pelos próprios ingredientes que são produzidos em Portugal. O Pastel de Nata d’Honra e os ‘cocktails’ com inspiração em bebidas portuguesas, como o vinho do Porto, são outras atracções. Puro Vício é um dos mais recentes ‘spots’ de Lisboa. Fica em Alcântara e vai ter boa comida e boa música. Mais argumentos? Só se for a esplanada que promete abrir com o bom tempo. Os ‘boutiques clubs’, também conhecidos por ‘design bars’ ou ‘lifestyle bars’, ganharam notoriedade em grandes cidades como, por exemplo, Londres, Nova Iorque e São Francisco, e multiplicaram-se depois em vários outros lugares do mundo. Com uma dimensão significativamente menor do que a das discotecas, estes apostam, sobretudo, na diferenciação e no serviço focado no cliente, sempre dentro de ambientes intimistas e acolhedores. O espaço Puro Vício, situado em Alcântara e assinado pela arquitecta de interiores Mónica Penaguião, reabriu as suas portas no fi nal do mês de Fevereiro, apresentando-se agora como o primeiro ‘boutique club’ em Portugal. Este passou a ser composto por três áreas: a do Lisbon Boutique Club, a do Cocktail Bar e a do Finger Food Bar, onde o ‘chef’ chileno Leo Guzman vai dar a provar as suas criações de ‘street food international’, como o ‘ceviche’, as ‘bruschettas’, o ‘fondue’ e os ‘tartars’. Direccionado para um público eclético, exigente e conhecedor, o Puro Vício procura ser o espaço ideal para beber um copo e petiscar ao fi nal da tarde, ou até pela madrugada fora. De segunda a quarta-feira, a programação musical convida o público a dançar, à quarta-feira ao ritmo de ‘jazz’ e do ‘house’; à quinta ao som de DJ’s femininas; e à sexta-feira durante ‘one hour only’, o tema da noite. Assim que o clima o permitir, o passeio em frente vai dar lugar a uma esplanada com capacidade para 50 pessoas e, no Verão, o Lisbon Boutique Club vai oferecer ‘cocktails’ sensoriais. Este projecto foi desenvolvido por José Paulo do Carmo e por Sérgio Nóbrega e promete tornar o espaço num ponto obrigatório da cidade de Lisboa e deixar as pessoas “viciadas” na comida e na qualidade musical. www.flytap.com VINHO PORTUGUÊS EM ALTOS VOOS A TAP está a criar uma nova carta de vinhos. Para isso, a companhia realizou uma prova de vinhos com 9 especialistas, que provaram 40 brancos, 40 tintos e 10 espumantes, todos eles portugueses, primeiro em terra, e, depois de selecionados os melhores dentro de cada categoria, a bordo de um voo da TAP. O objectivo era perceber como os vinhos se comportavam de forma diferente a 30 mil pés de altitude e que características é que se tornavam mais interessantes. www.longchamp.com NOVA VITRINA LONGCHAMP Trata-se do site, em versão renovada, onde o destaque recai nas imagens que surgem em formato “ecrã cheio”. Cada página surge menos preenchida para que a navegação seja mais simples e os produtos saltem à vista. “É um dos primeiros sites no sector de luxo a integrar o ‘responsive design’, que oferece uma experiência de navegação personalizada e estética a cada visitante”, explicou a responsável ‘web’ da Longchamp. As novas “páginas” serão lançadas ao longo de 2013. T E X T O S D E C ATA R I N A M O U R A Abril 2013 Fora de Série 75 Paladares 25 ANOS DE VELA LATINA Deveria ter integrado um complexo que incluía uma estalagem com vista para o Tejo, chegou a ter um ginásio mas foi uma sala de refeições privada. Ao longo do último quarto de século, o restaurante Vela Latina tem acolhido empresários, políticos e diplomatas. Por ali se gizaram planos e traçaram negócios apenas ouvidos pelas paredes da sala Yacht Club. T E X T O D E S U S A N A T O R R Ã O / F O T O G R A F I A D E PA U L O A L E X A N D R E C O E L H O O s 15 minutos de caminho a partir do centro da cidade são essenciais a quem marca um almoço de negócios no Vela Latina. Durante esse tempo, ultimam-se os últimos pormenores e trocam-se impressões ao telefone para que aquele almoço seja o início – ou até o selar – de mais um bom acordo. A localização do emblemático restaurante lisboeta, que este ano cumpre 25 anos, é bem mais do que uma vista privilegiada para o rio, a Torre de Belém e a outra banda. Aliás, para muitos dos que já lá passaram tardes inteiras em reuniões de trabalho, a paisagem é o que menos conta, uma vez que, por norma, estas têm lugar na sala Yacht Club, uma sala privada, no interior do edifício, eleita muitas vezes como o escritório fora do escritório. Curiosamente, aquele que é um dos elementos-chave para a fama do Vela Latina, surgiu como uma solução de recurso. “A sala Yacht Club não foi pensada de início. Mas o pé-direito do edifício era muito alto entre a entrada e o bar e decidimos fazer um aproveitamento do espaço com uma sobreloja e uma sala com capacidade para 18 pessoas. E, logo desde o início, foi muito procurada! No tempo do governo de António Guterres chegou a acolher um conselho de ministros ao longo de uma semana”, recorda António Machaz, um dos sócios que iniciou o projecto. A família Machaz estava ligada aos hotéis Tivoli, cadeia fundada por Joaquim José Machaz, pai de António e Joaquim Machaz (dois dos três sócios fundadores do Vela Latina) e avô de Salvador Machaz (filho de Joaquim), que entrou para o negócio depois da morte do pai, há dois anos. A família sempre esteve ligada ao mar, desde os tempos do avô, que tinha uma chata na ria de Aveiro. Joaquim Machaz tinha uma verdadeira paixão pela náutica de recreio e era frequentador da Associação Naval. Foi neste contexto que ele e o irmão, António, foram desafiados por Manuel Folgado Ramalhete a lançar um empreendimento à beira rio, junto à Torre de Belém. Pioneiro para a época, do plano inicial 76 Fora de Série Abril 2013 fazia também parte uma estalagem, que deveria ser instalada no edifício da guarda-fiscal. “O senhor Ramalhete já tinha a autorização para o restaurante e propôs negócio ao meu irmão”, recorda António Machaz. Avançaram com o restaurante, esplanada, ‘snack-bar’ e um pequeno ginásio que funcionava na cave do restaurante, já a pensar na futura estalagem. “Mas a abertura coincidiu com a fusão entre a GNR e a Guarda Fiscal, e o projecto acabou por não se concretizar”, revela António Machaz. Pouco tempo depois, Manuel Ramalhete abandonou o negócio, a ideia do ginásio foi posta de lado, mas o restaurante e o ‘snack-bar’ tornaram-se projectos de sucesso que se mantêm até hoje. Quem vai ao Vela Latina sente que acabou de entrar num mundo de amantes de vela. Nas paredes há cartas antigas do Porto de Lisboa e, um pouco por todo o lado, há referências ao mundo da náutica de recreio. Nos escritórios, longe dos olhares do público, está uma imagem do Vela Latina – o antigo veleiro da família – em prova durante a 4ª Volta a Portugal à Vela, em 1993, na qual se classificou em terceiro lugar da classe A. As muitas janelas envidraçadas dão luz ao espaço e mostram a marina de Belém, os jardins do restaurante – cujas árvores foram crescendo ao longo destes 25 anos, garantindo uma melhor vista da paisagem – e a foz do rio. O ambiente é clássico, intemporal e intimista, o que convém a almoços que se querem, ao mesmo tempo, agradáveis e discretos. R ESTAUR A NTE DO PODER Desde a sua génese que o Vela Latina surgiu ligado ao mundo da política e dos negócios. A qualidade é a carta apresentada pelos sócios como principal trunfo do espaço: “Buy the best and you’ll have less labour to make it good (compra o melhor e terás menos trabalho a torná-lo bom”, é o lema seguido desde sempre por António Machaz. Mas a existência de uma sala reservada com capacidade para quase duas dezenas de pessoas, também é determinante. Pela sala do Yacht Club passam governantes, empresários, por vezes em reuniões conjuntas, diplomatas e gestores. Foi assim desde o início e a tendência está para durar. O Vela Latina sempre foi visto como um “restaurante do poder”. Parcerias que viriam a dar que falar, negócios que acabaram nas primeiras páginas dos jornais – por boas e más razões – começaram a ser pensados a dois passos da Torre de Belém. Manuel Costa Lúcio (em cima) é o chefe de sala do Vela Latina há 23 anos e tem sido testemunha discreta de vários acontecimentos. Sabe que muita coisa importante foi decidida ali mas manteve sempre a discrição, jamais quebra a confiança que os clientes depositam nele. “Os clientes têm muitíssima confiança em mim e há um código de conduta que tem que ser mantido (...) não transpira nada”, garante. Abril 2013 Fora de Série 77 Paladares Os filetes de pescada ou os fígados de aves em tarte de maçã são dois clássicos da cozinha do Vela Latina, que há 22 anos está sob a supervisão do ‘chef’ Benjamin Vilaças (à direita). Manuel Costa Lúcio, chefe de sala do Vela Latina há 23 anos, tem sido testemunha discreta de todos estes acontecimentos. “Há certas coisas que não digo a ninguém”, assegura. “Os clientes têm muitíssima confiança em mim e há um código de conduta que tem que ser mantido. Em certas alturas, não deixo entrar na sala qualquer pessoa. Não se interrompem as conversas, não transpira nada. Os maiores negócios que vi fazerem-se no Vela Latina foi na sala privada”, conta. Em reuniões que por vezes começam à hora de almoço e se estendem até já depois do cair da noite, há momentos que nem o chefe Lúcio pode testemunhar. “A partir de uma certa altura, dizem: daqui por meia hora não quero ninguém aqui. Eu mantenho-me sempre em contacto visual, para que me possam avisar quando já é permitido entrar”, explica. Em mais de duas décadas de casa já lhe pediram para confirmar a existência de aparelhos de escuta na sala e já ouviu, em primeira mão, muitas das histórias que marcaram a política e a economia nacionais nos últimos 20 anos. Mas o chefe Lúcio é um poço de discrição. “Por vezes ouço coisas que não digo nem aos meus colaboradores mais directos. Mas saio daqui e esqueço tudo! Bom… tudo, tudo, não, que há coisas difíceis de esquecer”, admite com algum humor. As mais de duas décadas passadas no Vela Latina permitiram a Manuel Lúcio conhecer quase de cor os hábitos dos clientes mais antigos. “Sou eu que lhes escolho o prato, o vinho, e se vêm duas ou três vezes por semana e eu sei que comeram determinado prato num dia, já sei que no outro será escolhido um outro prato que é costume pedir e, de antemão, vou preparar o vinho adequado. É algo que raramente falha”, afirma o chefe de sala. MESA S PER SONA LIZA DA S Não foram só as refeições a ganhar adeptos incondicionais. Há mesas que, de tão escolhidas, já têm “dono”. Há a mesa de Francisco Pinto Balsemão, a mesa da Embaixada da Indonésia, ou a mesa de Marques Mendes – que mudou quando o político deixou de fumar. As preferências de cada um têm, sobretudo, a ver com a privacidade. “As pessoas gostam de estar descansadas a falar. E quando há clientes que sei que conhecem certas pessoas, não os coloco em mesas contíguas”, diz Manuel Lúcio. “E depois também há os clientes vaidosos que gostam de dar nas vistas. E esses sabemos onde os temos que pôr: no meio da sala”, refere. É algo que acontece mais no meio empresarial e, por norma, coincide com bons momentos da vida das empresas. Ao longo dos quase 24 anos que tem de casa, o chefe de sala tem acompanhado a vida de muita gente: namoros, casamentos, filhos e até algumas traições e divórcios. Ao longo de todo este tempo, por ali passaram figuras de proa da vida política nacional e internacional. Durante os acordos de Bicesse, era ali que, muitas das vezes, os diversos intervenientes almoçavam. Quando está em Lisboa, Durão Barroso não perde os filetes de pescada e Manuela Ferreira Leite, Jorge Coelho, Jorge de Mello (cujo pai, Alfredo, já lá ia) ou Basílio Horta também são presenças habituais. Por ali também já passaram Xanana Gusmão e Ramos Horta, o antigo-presidente Joaquim Chissano e o ex-presidente da Guiné Bissau, Kumba Ialá, que assinou o livro de honra. Paulo Morgado, administrador delegado e ‘senior vice-president’ da Capgemini, é hoje um dos clientes habituais. “Devo ter descoberto o Vela Latina em 1995 num almoço ou jantar de trabalho, e vou lá assiduamente”, conta. Valoriza a boa relação qualidade/ 78 Fora de Série Abril 2013 HÁ A MESA DE FR ANCISCO PINTO BALSEMÃO, A MESA DA EMBAIX ADA DA INDONÉSIA OU A MESA DE MARQUES MENDES – QUE MUDOU QUANDO ESTE DEIXOU DE FUMAR. preço, o “conjunto de empregados já bastante antigo que conhece os hábitos e preferências de cada um, o que dá um certo conforto a quem lá vai”, o menu e o estacionamento. Mas o maior louvor vai para o nível de qualidade e para os empregados: “Cada vez mais as casas com alguma tradição são valorizadas e o nível de qualidade é o mais importante. Às vezes, numa altura em que tudo muda todos os dias, haver este tipo de lugares, acaba por funcionar como um porto seguro”. Maria Eduarda Monteiro Grillo vive actualmente em Abu Dhabi, onde o marido é embaixador, mas a cada vinda a Portugal visita o Vela Latina: “É o meu sítio de eleição”. A decoradora elege o restaurante para “matar saudades da boa comida portuguesa, requintada e com serviço cinco estrelas”, de preferência numa das mesas do ‘deck’. É talvez das clientes mais antigas do Vela Latina, que recorda o espaço ainda a dar os primeiros passos: “Lembro-me das expectativas criadas à volta desse novo projeto da família Machaz, de tantas tradições hoteleiras em Portugal, encabeçada pelos então jovens Quim e Tó Machaz. Foi um sucesso, uma referência de boa gastronomia que os mais novos conseguem manter”. LOCA L DE TERTÚLI A À noite, o Vela Latina é local de jantares intimistas e encontros familiares e, desde sempre, foi local de vá- rias tertúlias. A mais antiga é a do Benfica, que reúne vários membros da direção de Manuel Damásio. Há também a tertúlia do grupo de um MBA da Universidade Católica e, em tempos, houve uma associada à Lisgráfica, na altura liderada por João Ruella Ramos. Depois da morte do sócio da Lisgráfica, os amigos homenagearam-no com uma placa que hoje está na sala Yacth Club. Gisela Lopes, responsável pelo agendamento dos jantares de grupo, está no Vela Latina desde 1992, onde chegou como secretária da administração, depois de passar pelos hotéis Tivoli. É ela quem garante que, logo no início do ano, a sala Yacht Club já tem marcações feitas até Dezembro, para os dias das reuniões das tertúlias. Ao contrário do que acontecia há 25 anos, hoje o Vela Latina é procurado por mais turistas e recebe mais almoços e jantares de grupo, alguns especiais. “Há dois anos, uma das nossas clientes fez 90 anos e a filha, que está nos Estados Unidos, decidiu organizar-lhe um jantar surpresa. Antes, marcou-lhe um almoço com uma amiga, no qual lhe servimos a ementa escolhida para o jantar de aniversário, sem que ela soubesse. No fim, perguntei-lhe a opinião e ela deu algumas sugestões, que eu apontei. Só quando chegou o dia do aniversário é que ela se apercebeu que tínhamos estado a ultimar os pormenores da ementa alguns dias antes. No fim disse-me: ‘Então, sabia de tudo e não me disse nada?!’”, conta Gisela. MUDA M-SE OS TEMPOS Em 25 anos o Vela Latina assistiu a uma pequena revolução nos hábitos alimentares. “As pessoas não comem o que comiam nem bebem o que bebiam”, afirma Salvador Machaz. Os ‘whiskeys’ no fim de um almoço de negócios quase desapareceram e, em alguns, a água é a única bebida servida à refeição. “Antigamente, em quatro pessoas, vendiam-se dois aperitivos, ao longo da refeição bebiam-se pelo menos duas garrafas de vinho e, com os cafés, pelo menos A CABEÇA E O COR AÇÃO Chefe Manuel Lúcio e ‘chef’ Benjamin Vilaças são dois elementos-chave para o sucesso do Vela Latina. Conheça o percurso de dois homens que acompanham a história do restaurante há mais de 20 anos. O ‘CHEF’ DE COZINHA Benjamin Vilaças cresceu em Angola, onde viveu com os pais até aos 12 anos, mas é transmontando, de Souto Maior, concelho de Sabrosa. Durante a infância veio duas ou três vezes a Portugal. “Era um choque… o clima e o choque cultural também. As férias eram três ou quatro meses e lembro-me de fazer um mês ou dois de escola. E era muito diferente: tudo mais fechado, o recreio mais violento, parecia um filme!”, recorda. Regressou a Portugal, e a Souto Maior, em 1975. Mas na altura ninguém lhe adivinhava o futuro como ‘chef’. “Sou um bom garfo, só não gosto de duas ou três coisas: cebola cozinhada, café e pouco mais”. A cozinha aconteceu por acaso. Veio para Lisboa com 19 anos, já depois de ter vivido quatro ou cinco anos na aldeia, onde ainda fez o 11º ano. “Há momentos de decisão. Os tempos hoje são difíceis mas na altura eram bem mais e eu tive que me fazer à vida. Fui experimentando várias coisas e fui parar à cozinha do Hotel Fénix, que deveria ser mais um emprego de passagem. Mas acabei por ficar lá uns bons quatro anos, saí com 23 anos, no ano em que me casei”. Abriu um pequeno restaurante na margem sul, mas passados dois anos decidiu voltar à profissão e “tentar chegar ao topo”. Arranjou emprego no Apolo 70, onde esteve meio ano como sub-‘chef’. Passou por mais alguns sítios e acabou por entrar para a cozinha do Vela Latina para dar apoio ao ‘chef’ da altura. “Parecia-me muito longe… estava habituado a trabalhar no centro de Lisboa. Ainda estavam a construir o CCB e isto parecia-me um bocado fora de rota. Vim com a ideia de ficar meio ano”. Ficou até hoje. Gisela Lopes (em cima) é a responsável pelo agendamento dos jantares de grupo do Vela Latina, desde 1992. A sala Yacht Club é a que mais trabalho lhe dá, já tem reservas feitas até Dezembro. um digestivo vendia-se. Hoje as pessoas vão ao bar, por vezes não bebem nada, evitam o vinho e as sobremesas – evitam o açúcar. O que conseguimos vender são os nossos pastéis de nata, que são muito afamados, a acompanhar o café”, explica Manuel Lúcio. Actualmente, um almoço de negócios típico consta de uma entrada leve, seguida de um peixe grelhado. Antigamente eram escolhidos pratos mais consistentes e elaborados, à base de carne. Contudo, há um conjunto de clássicos, como os filetes de pescada ou os fígados de aves em tarte de maçã. Por trás da criação destes e de outros pratos está o ‘chef’ Benjamin Vilaças, há 22 anos na cozinha do Vela Latina. Quando chegou, o estilo da ementa já estava desenhado e o desafio a que se propôs foi manter o estilo e apresentar uma carta sempre renovada. Isto, ao mesmo tempo que lidera uma equipa que fornece, em simultâneo, o restaurante e o ‘self-service’. “É uma cozinha única, não é fácil. Exige muito trabalho e muita dedicação e uma equipa extensa e competente”, afirma Benjamin Vilaças. Não restam dúvidas a Benjamin Vilaças – ‘chef’ que não gosta de cebola cozinhada e do sabor do café – que as principais mudanças na alimentação começam na cozinha, por adaptação aos tempos e aos ventos que sopram do estrangeiro. “Começam a introduzir-se outras texturas, outros aromas e paladares, e o cliente adere. Aqui há uns 15 anos eliminámos tudo o que era peixe de segunda linha. Foi uma decisão caríssima. Um restaurante que habitue o cliente ao peixe fresco, cozinhado com todo o cuidado e com guarnições simples, quase não precisa de muita variação. Mas vou introduzindo alterações e depois o cliente faz a triagem”, conta. Em 25 anos o país mudou. Quando Benjamin chegou ao Vela Latina seria impensável criar pratos com ‘foie gras’. “Nessa altura pediam-nos 150 euros o quilo para importar ‘foie gras’. Só com a abertura das fronteiras, dos mercados é que se tornou mais acessível. Nesse ano produzi um prato, Fígados de Aves em Tarte de Maçã, que originalmente era para ser feito com ‘foie gras’. Foi uma solução de recurso que resultou extraordinariamente bem e que se tornou um clássico”, relata o ‘chef’. A terrina de ‘foie gras’, que criou depois de um estágio com Alain Ducasse no restaurante Luís XV, no Mónaco, também seria impensável nos primeiros tempos no Vela Latina. Por outros motivos, se na altura apresentasse o ‘sashimi’ de atum braseado, o mais normal seria que os clientes não aderissem. “O bife de atum tinha muita fama na cozinha portuguesa mas era cozinhado em excesso, como se fosse um bife de carne. Hoje passou a cozinhar-se mal passado, ao estilo japonês”. Para os próximos anos do Vela Latina, os sócios querem continuar a apostar na qualidade e na tradição, sem contudo deixar de inovar. Já este ano, abrirá uma nova esplanada, afecta ao ‘self-service’, virada para o rio e para a Torre de Belém, que estará aberta de Março a Outubro. No restaurante, a equipa que está na casa desde sempre continuará a adivinhar as preferências de quem frequenta o Vela Latina e a assistir em primeira mão, e com a discrição de sempre, às decisões que constroem o futuro do país. Abril 2013 Fora de Série 79 FOTOGRAFIAS DE COMIDA DE TELMO MILLER Manuel Lúcio é alentejano, de Entradas, entre Beja e Castro Verde. Aos 14 anos veio para Lisboa, andou por várias casas de pasto até chegar ao Hotel Franckfort, no Rossio, propriedade de Alexandre Almeida. Recorda-o como um “hotel de terceira, muito bonito, com a sala de jantar no primeiro andar que dava para a Praça da Figueira”. Foi nessa altura que passou a frequentar a escola de hotelaria, indo às aulas de manhã, antes do trabalho. Seguiu-se um estágio no Hotel Palácio do Estoril, onde ficou dez anos. Depois, esteve na Suíça – onde se arrepende de não ter ficado – e chegou há 23 anos ao Vela Latina. Quem o vê, circunspecto, andando pela sala do restaurante, está longe de pensar que está na presença de um atleta. Mas Manuel Lúcio adora andar de bicicleta. Aos domingos, no Inverno, depois de se juntar com os amigos em Corroios, vai pedalar para a mata da Apostiça. No Verão, por estrada, faz mais de 100 quilómetros, de Setúbal vai até ao Montijo, Alcochete, até regressar ao Laranjeiro, onde vive. “No Inverno, a lama e aquela chuvinha é que dá gozo!”, diz. À bicicleta, junta a natação e chegou mesmo a praticar triatlo. Motores PORQUÊ CONTENTAR-SE COM MENOS QUANDO TEM O XF À SUA ESPERA? A mais recente versão do Jaguar XF tem um maior impacto visual e alia elegância e avanço tecnológico. T E X T O D E S A R A P I T E I R A M O TA CONSUMOS DE FAZER INVEJA Apesar dos 200 cavalos de potência, este “felino” de quatro rodas consegue, mesmo com uma utilização mais enérgica em cidade, manter-se no patamar que vai dos 7 aos 8 litros aos 100 km. Consumos que, para um carro grande, largo e pesado, são bastante razoáveis. Se se tratar de um condutor preocupado com a poupança nos consumos, é possível consegui-los inferiores a 7 litros de gasóleo em meio urbano. Em auto-estrada, com velocidade estabilizada, o XF 2.2 D está de parabéns pois regista consumos entre os 5 e os 6 litros aos 100 km. Ainda a destacar neste XF é a caixa de velocidades automática de oito relações, que o grupo partilha 80 Fora de Série Fevereiro 2013 em diversos modelos. A caixa, que dispõe de comandos sequenciais no volante, é accionada pelo botão rotativo que se eleva na consola central assim que o motor é ligado. Um pormenor que torna a condução do XF bastante agradável, além de ser muito fácil de utilizar. A direcção assistida do XF é sensível à velocidade, o que permite que o seu curso diminua quanto mais depressa andar o veículo. Esta característica aliada ao controlo dinâmico de estabilidade torna o XF num excelente carro de estrada, capaz de percorrer longas distâncias sem dar fadiga ao condutor. Ao nível dos acabamentos, como seria de esperar, o XF 2.2 D não desilude. O requinte dos detalhes está à vista em todo o habitáculo. Destacam-se as saídas dos ventiladores retrácteis do ar condicionado, a patilha metálica cromada do travão de mão eléctrico, a pele dos estofos ou as madeiras utilizadas. Tudo materiais de alta qualidade. FELINO XF É PRODUZIDO NA ÍNDIA No início deste ano, a Jaguar Land Rover (JLR) transferiu a produção do Jaguar XF para as suas instalações em Pune, na Índia, com componentes provenientes da fábrica de Castle Bromwich, em Birmingham, Inglaterra. O XF equipado com o motor diesel de 2.2 litros, é uma estreia no mercado indiano. Rohit Suri, vice-presidente da JLR, explicou que o Land Rover Freelander 2 e o Jaguar XF são os modelos mais vendidos no seu mercado, como tal seria lógico que fossem produzidos na Índia. “O Jaguar XF tornou-se extremamente popular devido às suas prestações desportivas, elegância e linhas contemporâneas. O seu motor e tecnologia tornaram-no merecedor de mais de cem galardões internacionais”, referiu o gestor. A fabricante JLR vai também investir 575 milhões de euros no Centro de Produção de Motores no Reino Unido e contratar 1400 novos funcionários, tendo como objectivo produzir os novos motores de quatro cilindros. Os motores ainda estão em desenvolvimento e a produção começará em 2015. “Como parte da estratégia a longo prazo da JLR, desenharemos, criaremos e fabricaremos toda uma nova gama de avançados motores. Trata-se do maior compromisso feito pela companhia até à data e produziremos motores inovadores e altamente eficientes para os futuros modelos da JLR”, sublinhou Ralf Speth, CEO da Jaguar. FICHA TÉCNICA Jaguar XF 2.2 Diesel Premium Luxury Motor Cilindrada Potência Velocidade máxima A Jaguar redesenhou alguns detalhes do XF e fez um ‘upgrade’ do motor 2.2 diesel, cuja potência foi elevada para os 200 cavalos. P.V.P. (preço base 45.854 euros) com extras Diesel 2179 c.c. 200 CV (140 kw) EEC 225 Km/h 70.007,60 euros FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELA MARCA A s “más línguas” que disseram que a marca Jaguar teria um futuro incerto depois de passar das mãos da gigante norte-americana Ford para o grupo indiano Tata, enganaram-se. O grupo Tata, dono da Jaguar Land Rover, está determinado em manter os seus modelos na vanguarda da tecnologia automóvel. E, como resposta às exigências dos mais sofisticados clientes, redesenhou alguns detalhes exteriores do XF e fez um ‘upgrade’ do motor 2.2 diesel, cuja potência foi elevada de 190 para 200 cavalos, mantendo consumos muito interessantes. Como resultado destas alterações o XF ficou ainda melhor, mantendo preços bastante competitivos para o segmento em que se insere. E não existem dúvidas de que estas alterações, ainda aperfeiçoam mais a mistura entre o luxo e o conforto ao mesmo tempo que mantêm o carácter desportivo do XF. Crónica Sulistas Elitistas e Liberais . Rodrigo Moita de Deus PEQUENO MOME MOMENTO DE BLASFÉMIA IA GEOGRÁFICA GEOGR S ão só alguns exemplos. Zoroastro, Moisés, Maomé, Isaías ou Siddharta. Todo os eles têm em comum Deus e uma montaa nha. A revelação fez-se entre a peregrinaçção e o alpinismo. Mas podemos ir mais long nge. Dos livros sagrados à literatura ‘pop’. “O Profeta”, de Kahlil Gibran, descobriu Deus na montanha. O “Alquimista”, de Paulo Coelho, encontrou Deus na montanha. Toda a gente encontra Deus na montanha. Dêem-me uma serra e eu dar-vos-ei um profeta. E fica estatisticamente comprovada a relação entre os acidentes geográficos e a Fé. Quanto mais alto, maior a revelação. Quanto menos oxigénio, maior a religiosidade. E o contrário também é verdade. Norte do país, acidentado logo religioso. Alentejo, longas planícies logo comunistas. Não há mensageiros de Deus em países planos. Não há introspecção na planura. E por isso a Holanda é um país de ateus. UMA QUESTÃO DE ESCALA. O tesoureiro do Partido Popular Espanhol foi apanhado com 22 milhões na Suíça. Esqueçam. Este não é um momento de moralidade ou ética. A minha ética ficava-se logo nos 5 milhões. Talvez nos três. A questão não é essa. Vai para além disso. É que em Espanha, tudo é grande. Tudo é à grande. E estar em Elvas com Badajoz à vista é sempre pouco lisonjeiro. A comparação é sempre muito pouco abonatória. O director de urbanismo da Amadora é apanhado com 75 mil euros na conta. Vara é apanhado com caixas de robalos. Isaltino com duzentos mil euros. Até no Monte Branco o valor não passa dos nove milhões. Mas em Espanha... Ah! Espanha! Vinte e dois milhões de euros. Os grandes de Espanha fazem à grande e à espanhola. Vinte e dois! Isto sim é um val valor. Se é para roubar, então vinte e dois. Se é para nos conscons purcarmos no lamaçal da corrupção, pção, então vinte e dois. Vinte e dois. É daqueles núm úmeros que dá sempre para dormir bem à noite. 82 Fora de Série Abril 2013 FUI PENHORADO Pago alguns milhares de euros por ano de impostos. Há pouco mérito nisso. Apesar de tudo, todos os anos sou chamado para ir mostrar papéis que nunca encontro. Tipo obsessão. Este ano já recebi 11 cartas. Nenhuma namorada me escreveu tanto. Mesmo as mais furiosas. Em jeito de vingança, quase todos os anos tenho um pequeno conflito institucional. Discuto, reclamo, escrevo. E discuto outra vez. Tive até alguma felicidade quando descobri que me cobravam imposto de circulação de duas motas roubadas há mais de uma década. Menos felicidade quando descobri que não podia descontar a pensão de alimentos dos miúdos porque não tinha um acórdão de tribunal. E reclamei e reclamei e reclamei. Da última vez que tentei ir às Finanças tirei a senha 145. Estava no número 32. Desisti. Por um lado ainda bem. Da penúltima vez que tentei ir às Finanças saltei para o outro lado das mesas para tentar bater no homenzinho. A demora é incentivo à produtividade: quer pagar impostos sobre o seu trabalho? Então tire um dia de férias e venha até cá. E reclamei e reclamei e reclamei. Reclamei mais ainda quando me explicaram que tinha de pagar para reclamar. Avisei que não pagava e eles avisaram que me penhoravam. Ganharam eles. Penhoraram-me a conta bancária, o ordenado e outros rendimentos. Em causa 300 euros. Mais juros. Penhoraram-me três ou quatro vezes o valor em causa. Posto isto, olho para as Finanças com um misto de ódio e admiração. Num Portugal onde a administração central não funciona, as Finanças são um zeloso exemplo de eficácia. São, aliás, a única coisa que funciona no país. PESADELOS Vejo na televisão Teodora Cardoso a falar sobre as contas públicas. Reconheço o género e o estilo. Vejo a minha professora de estatística. Ela e o rebuçado de mentol na boca. Sentada numa camilha com ‘napperon’ em cima. Já tive pesadelos com Teodora Cardoso.