S
E
D
E
R
A
P
Q U AT R O
ED S P I D A S
A
I
E
H
C
A
D
I
E UM A V
l em tempo
Despojamento totae-se de sonhos.
ch
de crise. A ca sa en mpletam-nos.
Os acessórios co para ser feliz?
sa
De que mais preci para 2013 numa
te
Menos é mais. Mo à arquitectura.
edição dedicada
Revistaa dist
Revist
disttrib
ribuíd
uída
íd com o Diár
Diário
io Eco
E nóm
ómico
ico
co nº 5647
56647
d 05 de Abr
de
A ill de
Ab
d 201
2013.
3. Pos
Poster
terior
iormen
m te ven
men
vendid
didaa em banc
banc
a a
aoo pre
preço
ç de cap
ço
capaa de
de 11,60
,60 eu
euros
ros
os..
since 1852
Hästens | Rua de S. Bernardo 43B Lisboa | +351 213 975 106 | 2ª a Sáb. 10:30 - 19:30h | [email protected] | www.facebook.com/hastensemportugal | www.melhorcamadomundo.com
dormir numa cama Hästens é dormir saudavelmente, como se estivesse no seio da Natureza
SU M Á R IO
A b r i l 2 0 13
14
O que mudou na arquitectura
das cidades e um almoço com
o arquitecto mais ‘fashion’ de
sempre, Peter Marino. E ainda,
o melhor dos projectos
nacionais pelo mundo.
38
Oitoemponto celebra o 20º
aniversário. Um negócio de
arquitectura de interiores que
começou por fazer sucesso
no Porto mas que já rompeu
fronteiras.
50
A moda de Almodóvar. O
realizador espanhol que não
descura o guarda-roupa dos
seus filmes, onde não faltam
marcas como Chanel, Dolce &
Gabbana ou Jean-Paul Gaultier.
Presidente Nuno Vasconcellos Vice-presidente Rafael Mora Administradores Paulo Gomes, António Costa e Gonçalo
Faria de Carvalho Director Geral Comercial Bruno Vasconcelos Redacção, Administração e Publicidade Rua Vieira
da Silva, nº45, 1350-342 Lisboa, Telf. 21 323 67 00/ 21 323 68 00 - Fax 21 323 68 01 Delegação Porto Exponor - Feira
Internacional do Porto, Avenida Dr. António Macedo, 4450-617 Leça da Palmeira, Telf. 22 543 90 20
66
Parecem casas de bonecas que
compõem o cenário verde do
Parque das Pedras Salgadas.
São ‘eco houses’ com assinatura
e decoração ‘clean’ e minimal,
como exige a natureza.
76
Ao longo do último quarto de
século, o restaurante Vela Latina
tem acolhido empresários,
políticos e diplomatas. Por ali,
delinearam-se planos
e traçaram-se negócios.
(coordenadora), Cristina Oliveira, Denise Fernandes, Luis Reis Pires, Margarida Peixoto, Marta Moitinho Oliveira,
Paula Cravina de Sousa Política Ana Petronilho, Filipe Gracia, Inês David Bastos e Márcia Galrão Empresas Patrícia
Silva Dias (coordenadora), Cátia Simões, Dírcia Lopes e Sara Piteira Mota Finanças Tiago Freire (editor), Catarina
Melo, Maria Ana Barroso, Margarida Vaqueiro Lopes, Marta Marques Silva e Rui Barroso Internacional Pedro Duarte
Desporto Paulo Pereira (editor) Media Catarina Madeira e Rebeca Venâncio Universidades e Emprego Madalena
Queirós (editora), Carla Castro (coordenadora), Joana Moura Projectos Especiais Irina Marcelino (editora),
Director António Costa Director-executivo Bruno Proença Subdirectores Francisco Ferreira da Silva, Helena
António Albuquerque (coordenador), Raquel Carvalho Opinião Ricardo da Costa Nunes (editor) DE online Pedro
Cristina Coelho e Pedro Sousa Carvalho Editores Executivos João Pedro Oliveira e Renato Santos Editora de Fecho
Latoeiro (coordenador), Rogério Junior (webdesigner), Alberto Teixeira, António Sarmento, Mariana Adam e Rita
Gisa Martinho Fora de Série Rita Ibérico Nogueira (editora), Ana Filipa Amaro (coordenadora), Catarina Moura e
Paz Infografia Susana Lopes (coordenadora), Mário Malhão e Marta Carvalho Fotografia Paulo Figueiredo (editor),
Inês Queiroz (textos), Cristina Borges (secretariado), Colaboradores Catarina Palma, Fernando Guerra, Manuel
Cristina Bernardo, Paula Nunes e Paulo Alexandre Coelho Assistente de Direcção Rita Rodrigues Secretariado Geral
Damião, Mariana Béu de Carvalho, Pedro Ferreira, Pedro Marta Santos, Rodrigo Moita de Deus e Susana Torrão
Dulce Costa Redacção do Porto Elisabete Felismino (coordenadora), António Freitas de Sousa, Sónia Santos Pereira
Produção Ana Marques (chefia), Artur Camarão, Carlos Martins, João Santos Tratamento de imagem Samuel Rainho e Mira Fernandes (secretária) Tradutores Ana Pina Departamento Gráfico Paulo Couto (director de arte), Pedro
(coordenador), Paulo Garcia e Tiago Maia Grandes Repórteres Ana Maria Gonçalves, Hermínia Saraiva, Lígia Simões, Fernandes e Rute Marcelino (coordenadores), Ana Antunes, Jaime Ribeiro, Patricia Castro, Sandra Costa e Vanda
Luís Rego, Maria Teixeira Alves e Nuno Miguel Silva Destaque Mónica Silvares (editora) Economia Catarina Duarte
Clemente Exclusivos Corriere della Sera, El Mundo, Expansión e Financial Times.
Propriedade S.T. & S.F., Sociedade de
Publicações, Lda. Contribuinte 502642807
Edição S.T. & S.F., Sociedade de Publicações,
Lda. Registo Comercial de Lisboa
2958911033 Registo ICS 124569 Administração Rua Vítor Cordon, nº 19 1º 1200-482
Lisboa Telefone 213236700 Redacção
e Produção Rua Vieira da Silva, nº 45
1350-342 Lisboa Telefone 213236700 Fax
213236800 Assinaturas Telf. 213236816/6771
E-Mail [email protected].
com Impressão e Acabamento Jorge
Fernandes Lda. Tiragem média 34000
exemplares.
CARLOS RAMOS
BL O G
NÃO DEIXE
DE ACOMPANHAR
TAMBÉM TODAS
AS NOVIDADES
FORA DE SÉRIE
NUM ESPAÇO
‘ON-LINE’ QUE CELEBRA
O 2º ANIVERSÁRIO
RITA IB ÉRICO NOGUEIRA
[email protected]
http://foradeserie.economico.sapo.pt
MENOS É MAIS
M
uito ‘last season’? O conceito
rendeu nos anos 90, com montes de minimalismo, androginia e aquela estética vanguardista de inspiração japonesa
que nunca mais saiu de cena.
Mas os tempos mudaram, chegou o novo milénio,
instalou-se a crise financeira e a história dita que, em
tempos de contracção, as modas viram-se para o lado
oposto. Expansão. Opulência. Sumptuosidade. Mais
é mais e a moda reflecte o estado do bolso dos utilizadores: quanto mais vazios, mais rica ela – a moda
– se mostra.
Excepção feita para a arquitectura, que, ao contrário da moda, não obedece à sazonalidade. Não respeita a mesma velocidade vertiginosa da moda. Pelo contrário, pode mesmo dizer-se que, nesta matéria, as tendências são lentas a imporem-se. Porquê?
Há quem diga que tem a ver com a incerteza, cada
vez maior, que se tem do tempo que os proprietários
irão permanecer nas suas casas. Isso faz com que haja uma necessidade de adaptar as construções a um
gosto mais generalista e estandardizado. Daí que as
tendências arquitectónicas tenham mantido, ao longo dos anos, um indissociável lado ‘clean’, passível de
agradar aos mais minimais, e de ser transformado
em algo mais barroco, se for esse o caso.
A arquitectura, o ‘design’ e a construção são talvez a área onde é mais complicado falar em tendências. Para as ter, é preciso fazer quase um exercício de
análise do passado, associado a capacidades de adivinhação. Mas os especialistas já têm prognósticos
muito claros, que reflectem o modo de vida das sociedades actuais. Sabe-se, por exemplo, que em 2013
vamos continuar a ter construções adaptadas, fachada de traça antiga e clássica com interiores contemporâneos, recheados de ‘features’ modernas. Vamos
viver cada vez mais nas cidades, adaptando o nosso
estilo de vida a apartamentos. Neste âmbito, veremos
surgir ainda uma sub-tendência, o ‘microliving’, que
passa por criar casas cada vez mais pequenas (com
entre 20 a 30 metros quadrados) para solteiros, nas
grandes cidades. Uma tendência já em expansão em
Nova Iorque, ideia do ‘mayor’ Michael Bloomberg,
que requer organização e soluções para arrumação
em espaços tão… microscópicos.
Vamos tornar-nos também cada vez mais ‘eco-friendly’, tornando as casas em espaços ecologica12
Fora de Série Abril 2013
mente sustentáveis e energeticamente eficientes, escolhendo materiais duráveis e de baixa manutenção.
Por exemplo? Os relvados estão em vias de extinção.
Gastam muitos recursos hídricos e serão, por isso,
substituídos por soluções decorativas mais focadas
no ambiente, nomeadamente pátios e ‘decks’. E são
apenas alguns exemplos. Tudo isto para dizer que, no
que toca ao lugar onde escolhemos viver, conta mais
o coração e a carteira do que as tendências e as previsões dos media. Afinal, se é para ser de sonho, cada
qual tem o seu, não é?
Nesta edição da Fora de Série exploramos este
conceito. Convidámos a actriz Mariana Monteiro a
desempenhar um papel diferente. Nas novíssimas
paredes brancas do Palácio Mesquitela, ela despiu-se de bens materiais. Deixou-se fotografar em ‘lingerie’ e apenas alguns (luxuosos) acessórios para
provar que uma mulher não precisa de muito para
ser feliz. Apenas uma casa de sonho, os sapatos certos, carteiras ‘it’, um ou outro casaco de peles, jóias.
E muita atitude.
Fomos ainda saber o que atrai e o que repele nas
grandes cidades (Lisboa incluída, até porque foi eleita há poucas semanas a quarta cidade mais bonita do
mundo para se visitar). O que é naturalmente belo e
o que é projectado pelo homem. Uma oportunidade
para recordar Oscar Niemeyer e os seus edifícios intrinsecamente belos. Almoçámos no Four Seasons,
em Londres, com Peter Marino, arquitecto de renome internacional, e que revelou a sua faceta mais rebelde. Vestido de cabedal dos pés à cabeça, ‘motard’
assumido, dá cartas no mundo da moda, onde conta
como clientes com as casas mais afamadas: Chanel,
Louis Vuitton, Armani, entre outros. Fomos conhecer os projectos arquitectónicos assinados por portugueses pelo mundo fora. Para podermos orgulhar-nos ainda mais do que se faz por cá. E aproveitamos
para dar a conhecer o que é ‘trendy’ em matéria de
‘design’ de interiores e decoração. E provamos que,
tendência ou não, menos pode sempre ser mais. Tanto em arquitectura como em moda.
Mas como nem tudo nesta edição se faz de betão,
vidro, aço e pedra, há espaço na FS de Abril para restaurantes míticos, carros a sério, Tom Ford, cinema
de Pedro Almodóvar, vestidos que vêm em caixas,
acessórios únicos, beleza, spas, neve e hotéis que parecem casas de bonecas no fim de Portugal. Chega?
Senão, em Maio há mais. Até lá!
Capa: Fotografia de Pedro Ferreira. Mariana Monteiro com ‘soutien’
preto (56,90 euros) Chantelle, no El Corte inglès. Saia Filipe Faísca
(preço sob consulta). Sandálias douradas com calcanhar encarnado
(322,50 euros) Maliparmi, na Loja das Meias.
Sumário: Fotografia cedida pela Sha Wellness Clinic.
D
DESTAQUE
ARQUITECTURA
A beleza será o
ideal da urbanidade,
basta pensarmos
na chegada por
mar ou rio a
Istambul, Veneza
ou Nova Iorque,
nas montanhas do
Rio de Janeiro ou
nas cerejeiras em
flor em Quioto (nas
fotos).
A BELEZA
DAS CIDADES
14
Fora de Série Abril 2013
A arquitectura das cidades mudou. Os céus
são agora rasgados por grandes edifícios
e os lugares são desenhados a régua
e esquadro. Há emoção nestes projectos, claro,
mas o que é feito da beleza natural?
T E X T O D E E D W I N H E AT H C O T E
PEQUIM
Sair das largas e banais
avenidas de Pequim
e deambular pelo
emaranhado de ruas
dos bairros tradicionais
da capital, os ‘hutong’.
NOVA IORQUE
“A BELEZA É A FINALIDADE DA EVOLUÇÃO”,
escreveu Joseph Brodsky. E se a cidade é o apogeu da
civilização, então, a beleza será o ideal da urbanidade. É-o muitas vezes na imaginação ou na memória.
Basta pensarmos na chegada por mar ou rio a Istambul, Veneza ou Nova Iorque, reluzindo acima do seu
próprio reflexo. Ou nas montanhas que servem de
enquadramento ao Rio de Janeiro ou nas cerejeiras
em flor em Quioto.
A certas cidades, a beleza foi-lhes simplesmente
imposta. Paris foi planeada como Cidade das Luzes.
Nela se rasgaram avenidas ladeadas de árvores e se
construíram praças urbanas, nas quais altura, volume e ornamentos foram meticulosamente controlados para criar harmonia. Outras cidades devem a sua
beleza ao enquadramento natural, como São Francisco e Sidney, com as suas inconfundíveis baías e vistas arrebatadoras. Outras ainda tornam-se belas pela
mão dos seus arquitectos, caso de Siena, S. Petersburgo, Viena ou Barcelona. Outras há que devem a beleza ao carácter intenso da sua urbanidade, como Hong
Kong ou Manhattan, inconfundíveis no seu emaranhado de torres e luzes de néon.
De que falamos quando falamos na beleza de
uma cidade? Ainda seremos capazes de criar tal beleza? Será desejável? Talvez tenhamos perdido o jeito para criar cidades belas. Roterdão, Shenzhen ou
Dubai, pouco importa, as tentativas inábeis de criar
novas formas de urbanidade, novas ideias de beleza, deixaram profundas cicatrizes nas cidades contemporâneas. Tal como na arte, a busca da beleza
tornou-se tabu.
Quando o extraordinário arquitecto brasileiro Oscar Niemeyer morreu em Dezembro, com 104
anos, o homem que criou a iconografia de Brasília foi
criticado por ter construído edifícios que, apesar de
elegantes, não são funcionais. Ou seja, foi criticado
por ter sacrificado a funcionalidade em nome da beleza. Os críticos têm razão. Brasília não soube conciliar formalidade e informalidade, trânsito e vias pedestres. Embora a maior parte dos arquitectos modernos tenham sido castigados por criarem edifícios
feios e não funcionais, pelo menos Niemeyer estava
Admirar um
daqueles edifícios
incoerentemente
Vitorianos sem
elevador, com escadas
de incêndio e letreiros
ferrugentos de marcas
há muito esquecidas,
que o arranha-céus
mais próximo reduz à
escala de um anão.
LONDRES
Fugir do bulício
de Regent Street
e mergulhar na
grandiosidade
neoclássica de Air
Street, ao estilo de
Piranesi, e nas ruas
secundárias do Soho.
ISTAMBUL
Entrar no Grande
Bazar e deixar-se
surpreender pelos
raios de sol que, súbita
e momentaneamente,
irrompem pelos
poços de luz do tecto
suspendendo o tempo,
as conversas, o fumo
dos cigarros, o vapor
do chá e do café.
Abril 2013 Fora de Série
15
D
DESTAQUE
ARQUITECTURA
A natureza devia
ocupar o coração da
cidade, é nisto que
acredita o movimento
City Beautiful, que
dá como exemplo
Manhattan e o Central
Park (ao lado).
50% certo. No fundo, as críticas reflectem a dificuldade, senão a impossibilidade, de construir novas e
belas cidades.
Já passaram 100 anos desde a última vez que se
debateu seriamente a beleza urbana, quando o City Beautiful Movement (Movimento da Cidade Bela) floresceu nos Estados Unidos e noutras partes do
mundo. O movimento surge enquanto reacção à fealdade dos imóveis de habitação nas grandes cidades,
defendendo a criação de parques e zonas verdes, avenidas ladeadas de árvores, edifícios civis e espaços
culturais gritantemente clássicos no coração das cidades, de Washington D.C. a Camberra.
Ao colocar os parques no centro das cidades, o City Beautiful transmitia uma mensagem clara: a natureza devia ocupar o coração da cidade, mesmo que
a paisagem fosse artificial na sua emulação do natural. A natureza e a topografia desempenham um papel importante na construção da beleza. O fascínio
de Central Park reside, por um lado, no contraste dos
gigantescos relvados com a densidade urbana que o
rodeia e, por outro, na forma como o leito de rocha se
transforma em magníficos afloramentos rochosos,
imagem mítica de Manhattan. Londres não é uma
cidade com uma beleza convencional, mas os seus
magníficos parques têm servido de modelo e inspiração a muitos outros no mundo.
TALVEZ TENHAMOS
PERDIDO O JEITO
PAR A CRIAR CIDADES
BELAS. ROTERDÃO,
SHENZHEN OU DUBAI
SÃO TENTATIVAS
INÁBEIS.
Mas, acima de tudo, falamos da grandiosidade,
do espectáculo e da beleza da escala. Falamos de
cidades com uma beleza de conto de fadas, de clichés. Há quem diga que o excesso de beleza acaba
por prejudicar uma cidade. Pensemos em Veneza,
uma cidade turística que se afunda no reflexo do
seu próprio passado, uma cidade que se tornou um
parque temático de beleza decadente. Pensemos em
Londres e no facto de o epíteto “bela” só se aplicar a
algumas partes da cidade ou a pormenores da urbe,
que esteve em risco de perder o estatuto de Cidade
Património Mundial da Unesco devido à construção de edifícios-torre cada vez mais feios e histriónicos, que ofuscam as vistas históricas de Westminster ou da Torre de Londres.
LISBOA
Contemplar os
magníficos motivos
decorativos da calçada
portuguesa, arte
maior que ganhou
novo ímpeto após o
terramoto de 1755.
LOS ANGELES
Desfrutar das vistas que
Mulholland Drive oferece
sobre a cidade. David
Lynch imortalizou-a no
filme homónimo e dános uma perspectiva
sombria típica do ‘film
noir’, em que o destino
controla as acções dos
seus habitantes.
16
Fora de Série Abril 2013
D
HONG KONG
DESTAQUE
ARQUITECTURA
Descobrir os
mercados nocturnos
que invadem as
ruas de Mongkok,
cercadas de
gigantescos edifícios
de habitação.
VENEZA
Emergir da escuridão
de um ‘sottoportego’
– passagem que liga,
através dos pátios das
casas, uma rua à outra
– e deixar-se ofuscar
pela luz resplandecente
do Grande Canal.
As escadas de incêndio são uma imagem típica dos edifícios em
Nova Iorque (em cima). Mais acima, os ‘hutong’, bairros tradicionais
de Pequim, e os arranha-céus de Hong Kong. Ao lado, o Grande
Canal em Veneza, que continua a ter uma luz resplandecente.
Noutras metrópoles, como Nova Iorque, Chicago
ou Hong Kong, os arranha-céus são a essência da cidade. Em Londres, porém, é mais difícil pensar assim, visto grande parte das torres que invadem a paisagem serem inestéticas e de má qualidade arquitectónica. Na verdade, esta aparente negligência municipal permite à cidade adaptar-se e manter-se relevante. Esta é, aliás, uma das razões porque Londres
conseguiu manter o seu estatuto de centro mundial
de comércio nos últimos 600 anos.
Mas talvez seja melhor procurar a beleza não apenas à escala macro, mas também micro, para alargar
o espectro de possibilidades mesmo nas metrópoles
mais feias. Vistas de cortar a respiração e perspectivas inesperadas são sempre um festival para os sentidos, mas a emoção do inesperado ou do feliz acaso também fazem as nossas delícias. Deambular por
uma ruela estreita e desembocar numa pequena praça com uma fonte é um desses momentos deliciosos.
18
Fora de Série Abril 2013
Londres não é uma cidade com uma beleza convencional, mas os
seus magníficos parques têm servido de modelo e inspiração a
muitos outros no mundo. Em cima, foto de Hyde Park.
Assim como desembocar num pátio onde não se percepciona uma fronteira clara entre o espaço público e privado – seja num ‘hutong’ em Pequim ou num
claustro algures em Itália –, ou presenciar a transformação temporária de uma praça num mercado de
rua, que lhe confere uma nova vitalidade.
Elaborar uma lista das cidades mais belas, no sentido convencional, seria perfeitamente inútil, na medida em que venceriam as ditas “panorâmicas”. E essas são cidades turísticas. Os momentos de beleza que
ficam gravados na memória de quem habita a cidade
e não de quem está de visita, de passagem, são mais
privados ou, pelo menos, são mais marcantes do que
as vistas familiares. São essas delícias da vida quotidiana que definem a vida numa cidade. No meu caso,
o pensamento foge imediatamente para as veredas de
St. James Park e para as charmosas ruas empedradas
nas imediações. Ou para Budapeste, quando dobro
a esquina de uma rua apinhada de gente e dou por
mim no pátio de um bloco de apartamentos, inalando o aroma do almoço de domingo acabado de fazer.
Ou ainda para as escadas de incêndio de um edifício
em Nova Iorque, que nos elevam o olhar até ao topo
para descobrirmos uma perspectiva inesperada sobre a cúpula do edifício Chrysler. São esses deliciosos
momentos de justaposição e surpresa que mantêm a
cidade viva.
O Marquês de Sade dizia que a beleza é a regra e
a fealdade a excepção. Com efeito, é frequente centrarmos a nossa atenção na fealdade das cidades, no
desejo de fuga para o campo ou no isolamento que
uma redoma de luxo proporciona. É precisamente pelo facto de a beleza ser vulgar que a procuramos nos
lugares errados.
FOTOGRAFIAS DE CORBIS/VMI
VISTAS DE CORTAR A
RESPIR AÇÃO SÃO SEMPRE
UM FESTIVAL PAR A OS
SENTIDOS, MAS A EMOÇÃO
DO INESPER ADO TAMBÉM
FAZ AS NOSSAS DELÍCIAS.
D
DESTAQUE
ARQUITECTURA
PETER MARINO: ARQUITECTO,
DESIGNER E MOTARD
Três em um. E é
ainda o arquitecto
melhor relacionado
com o mundo da
moda. Peter Marino,
o responsável por
algumas das mais
fantásticas lojas do
mundo, é um durão,
mas nesta entrevista
as lágrimas
encheram-lhe
os olhos por duas
vezes. Mesmo
assim, não perdeu
a pose, que nega ter.
T E X T O D E VA N E S S A
FRIEDMAN
20
Fora de Série Abril 2013
bom que se diga que quando os ‘habitués’ das
semanas da moda por esse mundo fora falam
em “vedetas do ‘design’” raramente se referem
a arquitectos. Aposto que se Rem Khoolhas,
que criou numerosas lojas Prada, fosse assistir a um desfile da marca, passaria despercebido. Aposto que se James Carpenter, responsável pela renovação da imagem das lojas Gucci – em colaboração com a directora criativa
da marca, Frida Giannini –, ficasse sentado na
primeira fila de um qualquer desfile, ninguém
lhe prestaria atenção. No caso de Peter Marino,
a história é outra. Na semana da moda de Paris, quando foi assistir ao ‘show’ da Chanel – e
das casas Dior, Céline e Louis Vuitton, para as
quais já criou diversas lojas –, os ‘flashes’ dos
fotógrafos disparavam sem cessar, toda a gente queria falar com ele e as suas fotografias na
primeira fila dos vários desfiles invadiram as
redes sociais.
E porquê? Porque Marino se tornou no
principal responsável pela mais recente tendência de transformar lojas de moda numa
“experiência”, graças aos espaços que criou por
todo o mundo, de Barcelona a Xangai, e às encomendas que fez a artistas como Olafur Eliasson, Gary Hume e Anish Kapoor, para personalizar as lojas por si desenhadas. Mas não
só. O seu ‘look’ alternativo também ajudou ao
“culto Marino”. O arquitecto de 62 anos adora
vestir-se integralmente de cabedal preto, qual
‘motard’, de cortar o cabelo à Mohawk e de exibir as suas (cinco) tatuagens.
Aparentemente, Marino é uma excepção
em muitos contextos, como no restaurante do
Four Seasons, em Nova Iorque, onde o ‘dress
code’ para homens é “blazer e gravata”. Também aqui o deixam vestir o que quer. “E no
University Club”, acrescenta, referindo-se a
um outro “clássico” de Manhattan com regras
da velha Manhattan. “Quando terminei o projecto da nova boutique de (Ermenegildo) Zegna na 5ª Avenida, decidiram fazer um jantar de
pré-inauguração no University Club. Zegna ligou para lá e disse: ‘Como sabem, este jantar é
uma homenagem ao Peter, por isso, é bom que
ele lá esteja. Está a ver a pinta dele?’. Depois
disto, enviaram uma fotografia minha por fax
para os donos avaliarem. Mais tarde disseram
que sim, que podia entrar”.
Quando acaba a frase solta uma gargalhada
sonora. Toda a gente fica a saber que Marino –
ou “Pedro”, nome que utiliza para se referir a si
próprio – está no restaurante. Olha em volta e
identifica alguns dos presentes. Vestem fato e
gravata. “Parecem todos iguais. Não percebo”,
comenta em voz baixa. Despe o blusão de cabedal, tira o boné (também de cabedal) e senta-se descontraidamente com os cotovelos sobre
a mesa, de ‘t-shirt’ e colete de cabedal. “Há uma
coisa que costumo dizer aos miúdos que trabalham comigo: ‘Esqueçam o meio. Procurem
as extremidades’. As pessoas particularmente
inseguras não gostam de dar nas vistas. Dizem
que é no ‘meio’ que está a virtude. É aí que se
sentem mais seguras e confortáveis. Comigo
passa-se o contrário, asfixia-me”.
Conheço Marino há alguns anos. Encontramo-nos em desfiles de moda, na inauguração das lojas que criou para diferentes marcas de luxo ou nos jantares oferecidos por um
amigo comum, Azzedine Alaïa. É bem-disposto e divertido, e sabe pôr toda a gente a rir. São
muitas as razões para este “Almoço com o FT”:
uma exposição em Paris das suas primeiras
esculturas em bronze (confidenciou-me que já
vendeu dez por 160 mil euros cada), o facto de
o seu projecto para a construção de um spa e de
um centro comercial em Beirute ter sido escolhido em detrimento dos projectos de Zaha Ha-
PETER MARINO
TORNOU-SE
NO PRINCIPAL
RESPONSÁVEL
PELA MAIS
RECENTE
TENDÊNCIA DE
TR ANSFORMAR
LOJAS DE
MODA NUMA
“EXPERIÊNCIA”.
Peter Marino
é o arquitecto
“oficial” das
grandes marcas
de luxo e o que
encontrou o seu
lugar na moda.
did e Norman Foster, e de ser o único ‘player’
mundial no mundo da moda. Com efeito, não
conheço mais ninguém que trabalhe simultaneamente para marcas rivais como a Chanel,
Dior e Armani. Mas o mais extraordinário é
ver como o seu ‘look’ por vezes se sobrepõe ao
seu currículo. Figura nas listas dos melhores
arquitectos do mundo, tem fama de “durão” e
de perfeccionista, veste-se de uma forma algo
datada e tem cinco motas – uma Ducati, uma
Triumph e três Harleys. Mas posso dizer que
as lágrimas lhe vieram aos olhos pelo menos
duas vezes durante o almoço.
Talvez seja melhor explicar o contexto. Tu-
do começou quando consultávamos a ementa.
Escolho ‘carpaccio’ de atum e ele pede o mesmo. O empregado serve-nos a entrada e Marino fica a contemplar o prato. Depois de a filha
nascer – hoje tem 21 anos –, ele e a mulher, a
figurinista Jane Trapnell, engordaram nove
quilos. “Foi horrível. Percebemos logo que não
íamos conseguir perder peso sozinhos, por isso arranjámos um ‘personal trainer’. Não volta
a acontecer”. Hoje em dia, treina todos os dias
em casa, de manhã, antes de seguir para o ateliê, mesmo ao lado de casa e muito perto do
Four Seasons.
Quando festejou 50 anos e fez o ‘check-up’
anual, o médico disse-lhe: “Tem seis meses de
vida. O que é que gostaria de fazer?”. Marino
respondeu: “Gostava de fazer esqui e de jogar
ténis com mais frequência”. A reacção do médico foi imediata: “O que está à espera?”. Passou
a fazer esqui um mês por ano em Aspen, onde
tem casa – à qual chama “museu Anselm Kiefer”, por estar decorada com numerosas pinturas do artista – e a jogar ténis todos os fins-semana na sua propriedade em Hamptons. “Foi
o melhor conselho que alguma vez me deram”.
Foi também por esta altura que começou a
vestir-se integralmente de cabedal. Antes consumia fatos, especialmente Armani, por ter
trabalhado com o estilista depois do seu primeiro grande trabalho ligado ao mundo da
Abril 2013 Fora de Série
21
D
O Emir do Qatar
(ao lado) é um
dos clientes
‘vip’ de Marino,
o arquitecto
que colecciona
obras de artistas
contemporâneos
como Damien
Hirst (abaixo).
moda: a renovação dos armazéns Barneys, em
Nova Iorque. Antes disso, quando estudava arquitectura na Universidade de Cornell (licenciou-se em 1971), usava ‘jeans’ e blusão de cabedal, e foi quando comprou a primeira mota.
Filho de pais italianos – o pai era engenheiro na Northrop Grumman, uma empresa em
sistemas electrónicos de defesa, e a mãe secretária na Merrill Lynch –, teve uma infância difícil. Só começou a andar aos sete anos. Quando lhe pedi para contar a história, as lágrimas
vieram-lhe aos olhos. “Não gosto de falar sobre
isso”, disse, primeiro baixando os olhos em direcção à mesa e depois desviando o olhar. Senti-me pouco à vontade com a situação. Quando
entrevisto pessoas famosas não é habitual haver momentos tão pessoais e delicados como
este. Não sabia o que fazer.
Feliz coincidência: o empregado vem levantar os pratos. Marino respira fundo e diz-me
que uma das primeiras coisas que fez quando
os pais emigraram para Nova Iorque foi inscrever-se em aulas de dicção de inglês. Cresceu no bairro de Queens e, na altura de ir para
a universidade, escolheu Cornell porque queria estudar arte, mas teve de negociar com o
pai, para quem o fi lho só podia seguir matemática. Uma das suas irmãs propôs uma solução de compromisso aceite por ambos: arquitectura. Foi então que decidiu estudar italiano
para aprender a falar como “os Agnelli”. Uma
estratégia vencedora, visto os seus primeiros
clientes privados terem sido os industriais italianos – a par da família Wertheimer, dona do
grupo Chanel.
Marino oscila entre o puro sotaque britânico e o calão nova-iorquino. O seu mundo divide-se em tensão alta e tensão baixa. Tanto está
muito tranquilo, como solta frases provocadoras. Tanto acha isto ou aquilo o “máximo”, como se põe a dissertar sobre a sua grande paixão: o Renascimento e os bronzes do período
barroco. Começou a coleccioná-los na década
de 1980 – já vai em 53 peças –, mas também investe em obras de artistas contemporâneos como Damien Hirst, Richard Prince e, claro, Anselm Kiefer.
Pergunto-lhe se foi pelo seu ‘look’ que se
tornou numa figura tão querida no universo
da moda. “Não faço ideia, não me visto assim
a pensar nos outros. É uma questão pessoal.
22
Fora de Série Abril 2013
Além disso, não tenho tempo para pensar em
roupa”. Literalmente: a sua vida é uma correria. Mas não fico totalmente convencida. Uma
pessoa como Marino sabe muito bem que o seu
‘look’ tem um papel importantíssimo numa
indústria que vive centrada na imagem.
Ironicamente, a faceta mais visível do seu
trabalho é uma gota de água no seu negócio.
O grosso do trabalho divide-se entre projectos
de casas particulares e edifícios públicos. As
encomendas vêm de clientes tão distintos como o empresário Chris Whittle, o fi nanceiro
Steve Schwarzman ou o Emir do Qatar, que
comprou recentemente uma ‘penthouse’ no
edifício com os apartamentos mais caros do
mundo, One Hyde Park, mesmo em frente ao
Hyde Park, em Londres. Além disso, também
está a trabalhar num gigantesco complexo de
escritórios em Seul, propriedade da família
Samsung.
O empregado serve o ‘carpaccio’ e Marino prossegue: “Sei muito bem o que dizem de
mim. ‘O Marino não é aquele que desenha lo-
“SEI O QUE
DIZEM DE MIM.
‘O MARINO
NÃO É AQUELE
QUE DESENHA
LOJAS DE
MODA?’ ESTOUME NAS TINTAS.
O PESSOAL
DA MODA
TEM SIDO
FANTÁSTICO”.
jas de moda?’ Estou-me nas tintas. O pessoal
da moda tem sido fantástico para mim, além
de muito interessante em termos financeiros”.
Como a maior parte dos projectos de renovação de lojas de luxo se estendem por vários
anos – “Sabemos que vêm aí entre 10 a 15 lojas Chanel, número idêntico para a Louis Vuitton e cerca de cinco no caso da Dior, a somar a
umas quantas da Fendi, Céline, Loewe, Hublot
e Graf” –, Marino tem um rendimento base garantido e uma equipa de 150 pessoas a trabalhar para ele a tempo inteiro.
“Abençoado seja o Frank Gehry por ter devolvido a criatividade à arquitectura. Nos anos
80, o que é que os “reis das ‘junk bonds’” queriam? Casas ao estilo Tudor em Greenwich. Foi
então que Renzo Piano, Herzog e De Meuron
apareceram, criando obras que reconciliaram
a arquitectura com a estética”. Quando lhe peço para eleger o projecto de que mais se orgulha fala-me nas paredes envidraçadas da loja
Chanel no bairro de Ginza, em Tóquio. Um
conceito da sua autoria, que funciona como
televisor no exterior, mantendo a transparência característica do vidro no interior. Depois,
fala-me na sede de uma empresa que produz
monitores cardíacos, a Datascope, em Nova
Jérsia. “É fabulosa e já saiu em dois artigos da
imprensa especializada, mas ninguém se interessa porque não é uma marca de perfumes”.
Embora diga que se está nas tintas para o
que os outros pensam, é difícil acreditar que isso seja verdade. No ano passado, quando foi um
dos nomes escolhidos para renovar a Burlington Arcade, muitos criticaram-no por “querer
destruir um edifício classificado”. Mais tarde,
acabou por retirar a sua proposta. Mas não são
histórias como esta que o incomodam. A lágrima volta a brilhar ao canto do olho – pela segunda vez neste encontro – quando diz que a
filha trocou a licenciatura em História da Arte
por Antropologia. Pelo que pude perceber, nada o tira do sério a não ser a família.
Marino pede um café. O chefe de sala traz
o pedido, acompanhado de um prato com algodão-doce cor-de-rosa. Ao que parece é uma
“surpresa” reservada aos clientes habituais
no seu aniversário, mas Marino tem direito
a este mimo sempre que cá vem. Porquê, não
sei. Mais uma excepção inexplicável, como o
seu ‘dress code’. “Ficava a matar como chapéu.
Ainda vou experimentar” e ri-se. As suas gargalhadas ecoam pelo restaurante. Preparamo-nos para sair. Marino veste o blusão de cabedal Dior feito à medida. Olhei para ele e disse:
“Lembra os casacos que se usam na esgrima”. A
resposta foi acutilante: “A vida é uma batalha:
ou lutamos ou somos esmagados”. Sobe para
a mota e arranca. Pedro – e Peter – saíram do
Four Seasons.
FOTOGRAFIAS DE CORBIS/VMI E CEDIDAS PELA ZEGNA
DESTAQUE
ARQUITECTURA
D
DESTAQUE
ARQUITECTURA
Teatro e Auditório
de Poitiers, em
França, um projecto
de João Luís
Carrilho da Graça.
24
Fora de Série Abril 2013
ARQUITECTURA
PORTUGUESA NO MUNDO
Finalmente é o “Ano
da Arquitectura
Portuguesa”. Durante
2013, dez países vão
poder ver e conhecer
os rabiscos e os traços
nacionais, que muitas
vezes saltam do papel
para os guias de
lugares obrigatórios
a visitar. Seguem-se
cinco desses casos.
Mas há mais, no futuro
vai poder correr
o mundo atrás do
melhor da arquitectura
nacional.
T E X T O D E A N A F I L I PA A M A R O
Abril 2013 Fora de Série
25
D
DESTAQUE
ARQUITECTURA
Á LVA RO SIZ A V IEIR A
MUSEU DE ARQUITECTURA
– FUNDAÇÃO INSEL
HOMBROICH, DUSSELDORF,
ALEMANHA
26
Fora de Série Abril 2013
No local onde hoje está o Museu de Arquitectura – Fundação
Insel Hombroich, havia um antigo campo militar. Mas este
projecto passou por várias alterações e chegou a ser
pensado para acolher um instituto de biofísica.
NA ABERTURA E NESTAS PÁGINAS, FOTOGRAFIAS DE
FERNANDO GUERRA
Carlos Castanheira, outro nome incontornável
da arquitectura portuguesa, faz uma descrição
perfeita do trabalho de Siza Vieira: “Este projecto é um dos exemplos de perseverança de
Álvaro Siza”. A explicação desenrola-se com a
história: antes de ser um museu foi um projecto
para um instituto de biofísica. A diferença não
podia ser mais profunda. Durante 13 anos, as
ideias do que fazer naquele espaço em Hombroich foram mudando, e mudando muito. Mas
o arquitecto português foi acompanhando todas essas mudanças, que culminaram em mais
um espectáculo arquitectónico de Siza.
No local havia um antigo campo militar que foi
desmobilizado e adquirido pela Fundação Insel
Hombroich para que se pudesse construir um
espaço cultural. É nesta fase que Siza é procurado para que, juntamente com o arquitecto
alemão Rudolf Finsterwalder – que na altura,
em 1995, estava a trabalhar no atelier de Siza,
no Porto –, pensassem num espaço único que
pudesse acolher grandes obras. E assim foi.
Num desenho absolutamente geométrico, o arquitecto pensou o edifício como se tivesse duas
partes. Uma primeira em forma de “U”, com
três lados que culminam num terraço, onde ficam os espaços de exposições. Daqui sai a ligação ao outro espaço (à outra parte) através de
um longo muro, onde fica o arquivo fotográfico.
Lá dentro, os detalhes são ricos e executados
de forma primorosa, com madeira de carvalho e os tectos forrados a madeira, também de
carvalho.
A descrição do museu corre o risco de ser redutora, por isso valemo-nos mais uma vez de
Carlos Castanheira: “O edifício do Museu de Arquitectura da Fundação Insel Hombroich é um
daqueles pequenos edifícios que pela sua tranquilidade, contenção e uso de materiais, quase
que parece banal. Olhando melhor apercebemo-nos da riqueza dos espaços, da mestria de
utilização e da tranquilidade que nos transmite.
Percebemo-nos que uma grande obra até pode
ser pequena. Apercebemo-nos, também, que a
perseverança também é uma arte”.
JOÃO LUÍS C A R R ILHO DA GR AÇ A
TEATRO E AUDITÓRIO
DE POITIERS, FRANÇA
Se um trabalho de arquitectura deve
emocionar em apenas um olhar, o projecto
de Carrilho da Graça em Poitiers consegue-o
na perfeição. Pensado para receber eventos
e espectáculos, o Teatro e Auditório de
Poitiers dominam agora a paisagem local,
com o promontório de calcário numa cidade
construída na época romana. Localizada no
centro-oeste de França, às margens do Rio
Clain, o nome da cidade deriva, precisamente,
do romano ‘Pictavium’. Ora, a História parece
ter influenciado o arquitecto português. O
projecto dá vida à ideia de Acrópole através
da suspensão de dois volumes rectangulares
que deixam a luz ser um dos protagonistas do
trabalho. Esses dois volumes correspondem
exactamente ao auditório, com 1100 lugares, e
ao teatro, capaz de receber até 700 pessoas.
Estes foram construídos numa plataforma
com vista para o vale, detalhes que valorizam
o que é simples e revelam o trabalho
minuciosamente reflectido. O vidro opalino
que rodeia os dois espaços permite que o
edifício se transforme em algo absolutamente
novo sempre que nele é projectado uma luz,
uma imagem, uma cor.
A servir de apoio e de ligação a estes dois
lugares de arte – ou que vão receber arte ou
que já são, eles próprios, arte –, João Luís
Carrilho da Graça pensou num pátio no piso
térreo, que permite uma leitura imediata do
conceito que para ali pensou. Porque, afinal, a
arquitectura também se lê.
A História da cidade
que acolhe este Teatro
e Auditório parece
ter influenciado o
arquitecto português
na hora de desenhar.
O projecto dá vida
à ideia de Acrópole
através da suspensão
de dois volumes
rectangulares. Nesta
“Acrópole” a luz é a
principal protagonista.
O VIDRO
OPALINO QUE
RODEIA OS
DOIS ESPAÇOS
PERMITE QUE
O EDIFÍCIO SE
TR ANSFORME
EM ALGO NOVO
SEMPRE QUE É
PROJECTADA
UMA LUZ.
Abril 2013 Fora de Série
27
D
DESTAQUE
ARQUITECTURA
La Pallaresa, em
Barcelona, é um
conjunto de três
edifícios brancos
com janelas
geometricamente
colocadas, que
rompe com a malha
urbana de um
bairro que cresceu
sem controlo. Este
foi, aliás, um dos
desafios de Souto
de Moura quando
desenhou o projecto.
EDUA R DO SOU TO DE MOUR A
UM DOS
PRESSUPOSTOS
DO PROJECTO
ER A LIBERTAR
ESPAÇO
SUFICIENTE
PAR A CRIAR
NOVOS ESPAÇOS
VERDES.
28
Fora de Série Abril 2013
Sabemos que os projectos de Souto de
Moura são mais desafios do que… projectos.
E este, em Barcelona, entra nessa categoria.
Numa vista aérea, é incontornável o trabalho
concebido pelo arquitecto português, La
Pallaresa. Um conjunto de três edifícios
brancos com janelas geometricamente
colocadas, que rompe com a malha urbana
de um bairro que cresceu sem controlo. Essa
foi, aliás, uma das características que mais
marcaram este projecto, já que o terreno está
na fronteira de duas zonas cuja morfologia
é muito diferente, exactamente por culpa
desse crescimento desenfreado. Souto de
Moura viu-se com alguns problemas em mãos:
por um lado, o limite com o centro histórico;
por outro, o limite do bairro de Singuerlin,
que teve também um desenvolvimento
desordenado.
Foi nesta “confusão” urbana que se ergueu
La Pallaresa, que tinha, à partida, vários
pressupostos. Um deles era libertar espaço
suficiente para criar espaços verdes, como
prolongamento do parque Europa, ali ao
lado, e com ligação ao complexo lúdico Can
Zam. Seguia-se a necessidade de construir os
edifícios em altura, para que se aproveitassem
da luz. Assim, nasceram três edifícios de alturas
diferentes: um baixo, onde fica um hotel e um
cinema; e dois altos, que servem de habitação.
O hotel tem nove pisos e relaciona-se com
a torre de 24 pisos e com uma outra de 14.
Todos os espaços têm ligação através de uma
praça central. Os três edifícios compõem um
novo cenário na paisagem, é um organizado
bairro dentro de um outro bairro. O objectivo
foi cumprido.
FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELO ATELIER
LA PALLARESA,
BARCELONA, ESPANHA
D
DESTAQUE
ARQUITECTURA
O Atelier
Promontório quis
dar ao edifício
Lubango Center uma
identidade própria.
Conseguiu-o
através das paredes
exteriores onde
utilizou tijolos de cor
castanha, inspirados
nos tijolos de barro
angolanos.
ATELIER PROMON TÓR IO
LUBANGO CENTER,
HUÍLA, ANGOLA
FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELO ATELIER
Angola continua a ser um destino óbvio de
empresas que querem expandir-se. Fazem-se
contactos, estabelecem-se parcerias, até ao
dia em que se torna obrigatório ter uma sede
própria no país. Os ateliers de arquitectura
ganham com isso na hora de desenhar novos
espaços, num país onde ainda há muito por
fazer. Foi o que aconteceu com o Atelier
Promontório que aceitou um projecto no centro
da capital da Huíla, o Lubango Center.
João e Paulo Perloiro, Paulo Martins Barata,
João Luis Ferreira e Pedro Appleton, os
arquitectos responsáveis pelo atelier, foram
desafiados a projectar um edifício de habitação,
de escritórios e de comércio, juntos num só
bloco. Assim, nos primeiros quatro pisos estão
os escritórios, que foram preparados para
receber uma ou mais empresas por piso. Os
apartamentos ficam nos andares superiores,
para tirarem partido da vista sobre a cidade,
e foram pensadas tipologias do T1 Studio ao
T4. No entanto, a equipa do Promontório teve
o cuidado de conceber acessos e ‘halls’ de
entrada diferenciados para que a privacidade de
quem ali vai morar esteja garantida. No piso 0,
está uma zona de lojas e de serviços.
O Promontório quis dar ao edifício uma
identidade própria. Conseguiu-o através das
paredes exteriores onde utilizou tijolos de
cor castanha, inspirados nos tijolos de barro
angolanos. Nada disto foi inocente, o tijolo é um
traço distintivo na cultura de Angola e a equipa
do Promontório quis fazer parte dessa cultura,
até mesmo na escolha da cor, o castanho, uma
ligação clara à terra, como se tratasse de uma
produção local. Uma fusão sempre desejada da
arquitectura à região que está a ser trabalhada.
AS EMPRESAS
SEGUEM UM
RUMO QUASE
OBRIGATÓRIO
PAR A ANGOLA
E OS ATELIERS
GANHAM COM
ISSO NA HOR A
DE DESENHAR
NOVOS
ESPAÇOS.
30
Fora de Série Abril 2013
D
DESTAQUE
ARQUITECTURA
Sky Residence II,
Sky Business e Sky
Gallery, são estes
três espaços que dão
vida ao Sky Center,
em Luanda, e que
foram desenhados
pelo Atelier Risco.
Os arquitectos
portugueses
pensaram, numa
primeira fase, nas
habitações e nos
escritórios, e só
depois, na zona
comercial.
ATELIER R ISCO
32
Fora de Série Abril 2013
Sky Residence II, Sky Business e Sky Gallery, são
estes três espaços que dão vida ao Sky Center,
em Luanda. O Atelier Risco aceitou o desafio, num
primeiro momento, para desenhar e executar os
apartamentos e os escritórios dos dois primeiros
espaços, ambos com 24 pisos. Integrados num
conjunto de quatro torres, a ideia da equipa do
Risco – liderado pelos arquitectos Tomás Salgado,
Nuno Lourenço, Carlos Cruz e Jorge Estriga – foi,
no Residence II, desenhar apartamentos confortáveis que tirassem partido da vista desafogada
sobre o mar. Assim, com apartamentos ‘duplex’ e
‘simplex’, aumentaram a dimensão da estrutura
original e criaram saliências nas fachadas laterais
do edifício. Uma decisão que permitiu que 80%
dos apartamentos tenham agora vista de mar.
Na torre Business, os arquitectos foram confrontados com o facto de ainda não se saber se esta
iria servir um conjunto de escritórios, se um escritório por piso ou, ainda, se a torre seria toda
ela a sede de uma empresa. Perante a dúvida, a
estratégia foi também diferente. Com todos os
cenários em aberto, a equipa optou por desenhar
um sistema versátil, capaz de responder a qualquer uma das hipóteses, sem que a arquitectura
ficasse comprometida. Uma entrada imponente,
acessos eficazes e pisos “limpos”, para que pudessem ser usados de forma personalizada caso a solução fosse uma empresa por piso, e uma imagem
exterior imediatamente reconhecível, foram estes
os aspectos que o Risco teve em consideração. E
com sucesso já que, posteriormente, o atelier português voltou a ser chamado para desenhar uma
pequena galeria comercial, localizada no piso 1,
assim como um espaço com bares e restaurantes
no terraço, que fica também na base do edifício e
faz a ligação entre as torres. O Sky Center deverá
estar a funcionar a 100% no final deste ano.
FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELO ATELIER
AS SALIÊNCIAS
CRIADAS NAS
FACHADAS
LATER AIS
DO EDIFÍCIO
PERMITIR AM
QUE 80% DOS
ANDARES
TENHAM
AGOR A VISTA
DE MAR.
SKY CENTER, LUANDA,
ANGOLA
D
DESTAQUE
ARQUITECTURA
O MILIONÁRIO QUE QUER
MAIS DO QUE “COISAS”
N i co l a s B e r g g r u e n ,
51 anos , é um d os
h o m e n s m a i s r i co s
d o m u n d o . I nv e s t i d o r
e f i l a n t ro p o ,
B e r g g r u e n o p to u p o r
n ã o te r c a s a . V i v e
e m h o té i s d e c i n c o
e s t re l a s . P a r a u n s é
u m e xc ê n t r i c o . P a r a
o u t ro s , u m m o d e l o
d e g e n te r i c a q u e
g os ta d e d es fr u ta r
d o q u e “n ã o é
material ”. O q u e é
p re c i s o p a r a a t i n g i r
e s te “ n i r v a n a ” ?
E n t re o u t r a s co i s a s ,
d i n h e i ro .
T E X T O D E M A FA L D A
DE A
AV
VELAR
F O T O G R A F I A D E PA
AU LO
ALEXANDRE COELHO
34
Fora de Série Abril 2013
ão tem casa própria, avião, jacto, helicóptero,
barco ou qualquer uma dessas mordomias consideradas “outro mundo” para o comum dos
mortais. Não anda de transporte próprio mas
corre o mundo, chegando mesmo a dormir em
várias capitais na mesma semana. Um luxo
para uns. Um cansaço para outros. O certo é
que Nicolas Berggruen, considerado um dos
homens mais ricos do mundo, não se cansa de
correr, de investir e de tentar diversificar o seu
portfólio de investimentos. Tudo isso com um
estilo muito próprio e excêntrico. E sem nunca esquecer o seu ingrediente favorito: paixão.
Reconhecido como o milionário sem tecto, Berggruen, que ocupa a 206ª posição no
‘ranking’ “dos mais ricos do mundo” segundo
a revista “Forbes”, não tem, “por opção”, como
gosta de frisar, casa própria.
Há 13 anos decidiu “não ter mais bens materiais” e vendeu o seu apartamento em Manhattan e a sua ilha privada perto de Miami.
“No meu caso trata-se de uma escolha, é mais
confortável, é mais flexível e dá-me mais liberdade”, diz em conversa com a Fora de Série.
Apaixonado por festas, Berggruen adora o glamour e aparece sempre na companhia de monarcas, modelos e outros figurinos internacionais que o tornam assim “não tão diferente”
da nata internacional, que tem dinheiro e, normalmente, mansões com grandes claustros ou,
num estilo mais moderno, com grandes obras
de arte contemporânea, que às vezes chegam
a ocupar os metros quadrados de qualquer T4.
Não é o caso de Berggruen. Nicolas, que vive
num registo T4 em versão de quarto de hotel,
com cinco estrelas encriptadas, não tem, hoje, casa nem obras de arte. Já teve. O seu apartamento de 5ª Avenida, em Nova Iorque, por
exemplo, era conhecido pelo seu valioso recheio de obras de arte. E não era para menos
dadas as suas raízes familiares ligadas ao mun-
do da arte e do espetáculo.
Filho de Heinz Berggruen, um grande coleccionador e amigo pessoal de Picasso, e da
actriz alemã Bettina Moissi, Nicolas, que nasceu em Paris, tem dupla nacionalidade – alemã e americana – e é, indiscutivelmente, um
cidadão do mundo. Habituado desde sempre a
pontes áreas, Nicolas sempre viveu rodeado de
luxos e (verdadeiras) elites. Também por isso a
sua ligeireza e reconhecida descontração em
qualquer ambiente mundano.
Filho rebelde de uma sofisticada família,
Nicolas sempre gostou “de ser diferente” e chegou mesmo a ser expulso de um colégio suíço.
Consta que por “insubordinação”. Para os registos ficou ainda a afi rmação de que jamais
aprenderia uma palavra de inglês na escola
porque “era a língua do imperialismo”. Mas, e
fazendo valer a máxima “nunca digas nunca”,
aprendeu não só inglês como se licenciou em
Finanças em Nova Iorque. E cedo provou que
o seu ADN junta arte, risco e prazer. Perante
este ‘cocktail’, não é de estranhar que em 2000
tenha abdicado de viver “com coisas”. “No meu
caso, necessito menos do mundo físico e não
me interesso assim tanto pelo sentimento de
posse. Do meu ponto de vista é bastante humano e saudável não ter que acumular coisas”,
afirma.
“E onde guarda os seus livros, os seus ob-
Abril 2013 Fora de Série
35
DESTAQUE
ARQUITECTURA
jectos pessoais?”, perguntamos, curiosos. “O
que nos torna especiais como seres humanos é
que podemos armazenar várias coisas na nossa mente. Nos dias de hoje, somos capazes de
guardar muita coisa de forma anacrónica. A
ideia de poder experienciar e activar coisas,
para mim, é muito mais interessante. É algo
meu e pessoal”.
“E será que não sente falta de chegar a casa e gritar: ‘I’m back’ (estou de volta)?”, insistimos, ainda com a mesma curiosidade. “Para
mim, casa é o sítio onde estou no momento. O
único entusiasmo que sinto é o dos desafios do
amanhã. A ideia de descanso é muito importante, mas não é o meu foco principal. Quando venho a Portugal e fico em Lisboa, sinto-me
em casa. As pessoas são fantásticas, há aqui
oportunidades, é um sítio vibrante. Como tal,
não posso pedir mais. Tenho muita sorte por
poder escolher não ter dias sempre iguais”,
responde, acrescentando: “Porque não tornar
isto numa escolha exclusiva!?”.
Berggruen é o investidor que comanda
um império que está debaixo de um só chapéu: Berggruen Holdings, entidade que fundou em 1988, à qual pertencem 37 grandes empresas, entre elas – e com presença em Portugal – a Prisa, que comanda a Media Capital.
Mas há mais: Nicolas, que foi sócio de Julio
Mario Santo Domingo Jr. (filho mais velho de
um magnata colombiano e pai de Tatiana Santo Domingo, noiva do príncipe Andrea Casiraghi, filho de Carolina do Mónaco), é amigo
e sócio do português Pais do Amaral, a quem
faz rasgados elogios.
Dono do “Le Monde”, um dos principais accionistas da cadeia Burger King e da gigante
alemã Karstadt, Berggruen está presente em
muitos e grandes investimentos. Algo que pode ser traduzido com um só número: 2,3 mil
milhões de dólares. Uma fortuna para quem
não tem casa.
Mas não ter casa não implica não ter amigos. Nem no caso particular de Nicolas isso
faria sentido. O investidor, que nos falou da
sua vida pessoal e empresarial, deu muito enfoque aos projectos africanos (a conversa, aliás, foi interrompida três vezes por chamadas
oriundas desse continente). Mas da conversa saiu outra certeza: Berggruen vai investir
mais em Portugal. Do lado pessoal, é impossivel não destacar o espírito de trabalho do mi-
lionário que quer mudar o mundo. Ao seu estilo. Sem bens materiais, com a camisa rufadinha (que gasta até ao limite), fazendo jus ao
que defende – o que mostra seriedade –. Ainda
assim, Nicolas consegue ter estilo, um estilo
que enche as suas festas, onde não faltam celebridades.
A mais badalada de todas é a festa do Óscar
que Nicolas promove em LosAngeles, anualmente, durante a entrega da estatueta principal do cinema. Esta festa ocorria, invariavelmente, no hotel Chateau Marmont, conhecido por ser o preferido de Leonardo DiCaprio e
de Paris Hilton. Ocorria, porque este ano não
ocorreu. O que deu origem a um dos mais comentados assuntos pela capital cinematográfica norte –americana. “Uma das grandes desilusões nesta semana dos Óscares, é não haver a festa de Nicolas Berggruen no Chateau
Marmont”, escreveu o correspodente do “The
Los Angeles Post”. O que terá acontecido? Especula-se que o milionário – que acaba de lançar um livro “Governação Inteligente para o
NESTA PÁGINA, RETRATOS DE PAULO ALEXANDRE COELHO E FOTOGRAFIAS DE REUTERS
D
“NÃO ME
INTERESSO
PELO
SENTIMENTO
DE POSSE. É
BASTANTE
HUMANO E
SAUDÁVEL
NÃO TER QUE
ACUMULAR
COISAS”.
século XXI” (obra também lançada em Portugal) – está empenhado em ganhar destaque no
mundo da alta finança por ser um “pensador”
que quer promover o debate intelectual entre
as nações. E assim parece. Nicolas, que preside
ao “The Berggruen Institute”, conseguiu reunir nomes sonantes da esfera política e económica no seu instituto. Fernando Henrique
Cardoso, Francis Fukuyama, Gerhard Schroeder, Felipe González, Tony Blair e Joseph Stiglitz são apenas alguns dos nomes que fazem
parte deste novo projecto de vida de Nicolas,
para o qual não lhe falta determinação.
Visionário, Nicolas Berggruen é um milionário que não tem casa mas que habita o melhor dos mundos: o das ideias. E até ai está a
ganhar terreno. Para já, ainda paga condomínio na “casa global” que escolheu como sua,
mas em breve, conquistará a “arte”. Uma “arte” que prova que é possível ter uma vida diferente. Para isso só é preciso ter imaginação. E
essa, não há dinheiro que compre.
A entrevista completa a Nicolas Berggruen,
gravada no programa “Ideias em Estante”,
poderá ser vista no site do Económico
(www.economico.pt).
Nicolas Berggruen é amigo e sócio
de Miguel Pais do Amaral (em cima).
Mais acima, o ex-chanceler alemão
Gerhard Schröder com Heinz
Berggruen, o pai de Nicolas. Em
cima, o Chateau Marmont.
36
Fora de Série Abril 2013
Negócio
A Oitoemponto celebra 20 anos e quem se
tornar cliente desta loja no Porto pode, com
o tempo, virar amigo de Artur Miranda e
Jacques Bec, os dois responsáveis por este
negócio de arquitectura de interiores.
UMA LOJA
COM ITINER ÁRIO
E GEOGR AFIA
A Oitoemponto tem 20 anos. Faz arquitectura de interiores mas ao gosto diz nada.
Ao contrário, aos amigos diz muito. Artur Miranda e Jacques Bec ao vivo.
T E X T O D E A N T Ó N I O F R E I TA S D E S O U S A / F O T O G R A F I A D E B R U N O B A R B O S A
38
Fora de Série Abril 2013
E
m 1990, a Europa parecia que tinha chegado ao culminar do seu
sonho dourado de cinco décadas: as Alemanhas, a
de Leste e a de Oeste, voltavam a ser outra vez uma
(como em 1870); e o ex-sindicalista Lech Walesa era
eleito presidente da Polónia. Tudo está bem quando
acaba bem, diriam até os mais cépticos, face a uma
Europa que já respirava os avatares que a levariam à
moeda única e a um mundo em redor razoavelmente
em paz consigo próprio – descontando-se as inquietudes habituais de Saddam Hussein, a quem deu para
anexar o Kuwait como se tudo aquilo não passasse de
um monte de areia.
Artur Miranda, que vivia há sete anos numa Suécia que só viria a ser o maior exemplo do tino europeu uns 20 anos mais tarde, chegou a Portugal em
1990 e encontrou um país homologado pelos ricos, a
abarrotar de esperanças sólidas em si mesmo, e pronto a gastar o dinheiro da Europa como se não houvesse amanhã. Entretanto, em Paris – a única cidade do
universo que tem uma luz própria e irrepetível – Jacques Bec acertava as horas ao mundo com a precisão
de um relojoeiro destinado ao ‘design’.
Artur Miranda decidiu soltar-se do mundo da moda – que o tinha levado à Suécia – e apostar na decoração. Primeiro, com a timidez própria dos primeiros
tactos (em lojas e ‘show rooms’), mas depois de forma mais consistente e forte, que se consubstanciou
na abertura da Oitoemponto. A opção era clara: não
se tratava ali de decoração de interiores – ou talvez
também fosse isso mas não era só isso – mas sim de
arquitectura de interior. A década corria célere já no
ano de 1993 – tudo continuava bem: Bill Clinton arredava os belicosos Republicanos do poder e a Europa acreditou que voltava a ser o espelho onde os Estados Unidos queriam reflectir-se – como céleres eram
também os negócios da Oitoemponto. Entretanto,
em Paris, Jacques Bec apanhava um avião para Portugal – por uma dessas razões impossíveis de descortinar nas cartas marcadas pelo destino ou nos sulcos
indecifráveis das mãos – e de repente decidiu que era
aqui, no Porto, uma cidade quase sem luz, cinzenta e
morna, que queria ficar. E ficou também na Oitoemponto, cujo capital acabaria por partilhar equitativamente com Artur Miranda.
Estão ali os dois sentados – no meio de uma azáfa-
ma de receber amigos, porque a Oitoemponto faz 20
anos a 23 de Março e é sempre preciso mimar os amigos, dar-lhes as atenções todas, com sorrisos e copos
de champanhe – e, no espaço curto de um escritório comprido e densamente povoado por móveis que
podiam ser de decoração, há uma cumplicidade. É a
palavra certa.
Há outras palavras, possivelmente certas, mas
desta vez também inesperadas: “Isto [a decoração]
tem muito pouco a ver com gosto, é técnica e dedicação”, diz Artur Miranda. Jacques Bec levanta-se para ir fazer qualquer coisa urgente, como se para ele a
frase fizesse todo o sentido que as palavras devem ter.
Cumplicidades. Mas como é isso de decoração sem
gosto? “O gosto é um passa-tempo; a decoração é uma
profissão”. Certo, mas e a loja?
O escritório comprido e densamente povoado fica por cima da loja da Oitoemponto e dentro dela,
da loja, há um itinerário de bom gosto: nas paredes,
nos cantos, nos recantos que parece que recriam pedaços de casas onde apetece estar quando há chuva,
nos pormenores que só se descobrem quando se aproxima o olhar, na sofisticação de cada peça, na beleAbril 2013 Fora de Série
39
MAS COMO É ISSO DE
DECOR AÇÃO SEM GOSTO?
“O GOSTO É UM PASSATEMPO; A DECOR AÇÃO
É UMA PROFISSÃO”, DIZ
ARTUR MIR ANDA.
za inesperada de quase todas elas, nos metais frios e
nas madeiras mornas, nas soluções iridescentes ou a
preto-e-branco, nas madeiras velhas, nos cromados
hiper-modernistas, há ali um itinerário. E um mapa:
a geografia da loja parece um planisfério a três dimensões aberto em cima de uma mesa, com bocados
de arte e de cultura por cima.
Mas isso não importa nada. “Quando fazemos a
decoração de um interior, só queremos saber uma
coisa: do que é que a pessoa não gosta”. Jacques Bec
volta a sentar-se: mudou de óculos e tem no rosto
uma estampa feliz de quem vai receber os amigos.
“Não tenho nenhumas saudades de Paris”, tinha dito
uns minutos antes – será possível? “É, vou mais vezes
à Ópera de Paris desde que vivo no Porto que quando
vivia lá”, a culpa é da Transavia.
Voltemos atrás: “Depois de saber o que os clientes
não gostam, queremos saber quais são as suas lou-
Cerca de 80% dos negócios da Oitoemponto,
que chegam aos 10 milhões de euros,
uros, são
assegurados no estrangeiro. Angola
gola e Brasil
são os seus melhores clientes.
40
Fora de Série Abril 2013
curas. Qualquer loucura: uma cama para três, qualquer coisa. Entramos na sua intimidade para que as
pessoas se confessem”. Entre aspas, ou talvez mesmo
sem elas, há ali uma promiscuidade construtiva que
é preciso esmiuçar para que, no final, a arquitectura
de interiores seja, para quem a “comprou”, absolutamente pessoal. Sem essa promiscuidade, as subtilezas, as minudências e os pormenores haviam de parecer coisa vã, como que deslocada, que pudesse servir a qualquer um.
Mas essa promiscuidade tem outro resultado evidente: “Os nossos clientes acabam a maior parte das
vezes por tornarem-se nossos amigos” – Artur e Jacques ali de conversa, dois cigarros acesos, e os amigos lá em baixo quase à espera – “o que resulta numa coisa engraçada: fazemos as casas de filhos e até
de netos de pessoas que se tornaram nossos clientes
há 20 anos”.
É preciso mimá-los, aos amigos: estão quase à espera lá em baixo, na loja que tem um itinerário e é
um mapa, e durante muitos anos, nos dias 8 de cada
mês, às 8 horas da noite, organizavam jantares para 8 pessoas – como é que ninguém lhes perguntou
o que raio há com o número 8? “Era uma espécie de
‘cocktail molotov’” sem lista prévia nem outras obrigações, que ia ao sabor do que, aos amigos, lhes desse na gana – que é a forma mais amiga de se tratar os
amigos.
Fazia-se tarde, desceu-se as escadas, as pessoas estavam como que numa festa, mas os tipos dos jornais
são sempre uma seca: perguntava-se ao Rui Moreira
se já tinha a candidatura independente à Câmara do
Porto e à Estela Barbot se ainda tinha pachorra para
aturar os sujeitos do FMI – a Sandra passou com o
seu cabelo de algas e distraiu tudo – mas as respostas, como iam de champanhe na mão, reservam-se.
Cumplicidades.
Vinte anos depois de 1993, Portugal está vazio,
exangue. Ali tão perto do Porto, quase morto. A Europa podia ficar para lá da porta da Oitoemponto mas
não é isso: já não existe, suicidou-se numa fúria de dívidas a que todos (absolutamente todos) chegaram a
chamar bondosas, já não é o espelho dos Estados Unidos, nem de si, nem de nada. Não há, não é cúmplice.
“Claro que sentimos a crise na Oitoemponto, mas
talvez seja mais o pensar duas vezes antes de gastar.
O certo é que, no fim, acabam por gastar”, diz Jacques
Bec lá do alto do seu metro e 85 e da sua empresa confortável. Mas há um segredo que, cúmplice, Artur Mifo
randa revelaria mais tarde: “Uns 80% dos negócios da
ra
Oitoemponto – que chegam aos 10 milhões de euros
O
– são assegurados no estrangeiro”. Os culpados são os
do costume – bom, os do costume não, só serão do costume daqui por uns anos. “Sempre fizemos coisas para
tu
fora, mas começámos mais a sério há seis anos em Lufo
anda”. Depois os azimutes rodaram para o Brasil – “o
an
passa a palavra de boca a orelha é a nossa melhor pupa
blicidade” – e depois descontrolaram-se, já não se sabe.
bl
Seja lá como for, revela Artur Miranda – lá fora quase a
Se
noite dos intervencionados que já não têm ‘spreads’ a
n
0,35% –, “fizemos sempre tudo com capitais próprios;
0,
não é por modéstia mas com toda a humildade que o
n
digo. Resultado: “Viajamos 200 dias por ano”. Mas não
di
é sempre pelos clientes: “Também vamos à procura de
peças” – que podem estar num lado qualquer: antiquápe
rios, casas antigas, leilões, ou na loja do João – que tori
dos tratávamos por Metralha porque eram muitos irdo
mãos e que é o tipo mais simpático do Porto, lá do alto
m
do seu sorriso de um metro e 80 e da sua mota de enorme cilindrada. O grosso das peças, mesmo assim, sai
m
dos lápis e dos pormenores demorados dos desenhos
do
dos dois e são mandados fazer algures por ali, nos sído
tios onde as sabedorias antigas são guardadas como se
ti
fossem um tesouro.
fo
Depois ia ser o jantar: despediram-se os amigos para irem às suas vidas e um punhado deles que restou
em redor foi mandado para a zona antiga do Porto, para uma dessas ruas onde só cabe um automóvel de cada vez e os que lá moram é que mandam – mesmo que
tenha de ser com navalha e finura linguística. O reste
taurante era como a rua: estreito, cheio de sombra, certa
to para as confidências e as histórias de fazer rir pela
noite dentro. E foi isso que aconteceu.
n
OBJECTOS FOTOGRAFADOS POR NUNO SAT
Negócio
Saleiro e pimenteiro
em bandeja “Jardim
do Éden” Christofle.
Preço: 640 euros.
Almofada
‘chevron’ coral
(por cima) e almofada
‘Ikat’ antiga (por baixo) da
Casa do Passadiço. Preços:
360 e 219 euros, respectivamente.
fs
Terrina em
forma de
abóbora Dior.
Preço sob
consulta.
Mesa de matraquilhos
Pinel & Pinel. Preço
sob consulta.
Sofá “Mr. Softy” azul-marinho com capa
removível, da colecção “Successful Living
from Diesel with Moroso”, da Diesel.
Preço: 1580 euros.
Porta relógios
feito à mão, com
capacidade para
quatro relógios, da
Pinel & Pinel. Preço:
6000 euros.
Mesa
“Arborescence”
Christofle. Preço:
4900 euros.
Uma casa não
é só paredes. Aliás,
uma casa revela-se pelo
que a veste e a decora.
Um sofá ‘vintage’,
uma peça de ‘design’,
um livro rigorosamente
guardado. Ficam
algumas sugestões.
Arrojadas, claro.
Prato raso “Forum”,
prato de copa
“Butterfly Parade”
e prato de sobremesa
“Forum”, todos da
Vista Alegre em
parceria com a
‘maison’ Christian
Lacroix. Preço:
26, 39 e 25 euros,
respectivamente.
Perfume
“Volutes”
Diptyque, na
Fashion Clinic.
Preço: 95
euros, 75 ml.
A N A F I L I PA A M A R O
R I TA I B É R I C O N O G U E I R A
T E X TO D E
SE L ECÇ ÃO D E
Jarras
inspiradas
em canos
da Pinel
& Pinel.
Preço sob
consulta.
Livro “Poker – The Ultimate Book”
da Assouline, na Fashion Clinic.
Preço: 54 euros.
Abre-cartas da colecção “Jardim do Éden”
Christofle. Preço: 160 euros.
Moradas: CASA DO PASSADIÇO: Largo de S. João do Souto – Braga. Tel.: 253619988; CHRISTOFEL: Av. Eng. Duarte
Pacheco, nº 24 A – Lisboa. Tel.: 213855483; DIESEL: Praça Luís de Camões, nº 28 a 32 – Lisboa. Tel.: 213421980;
DIOR: em www.dior.com; FASHION CLINIC: Tivoli Fórum, Av. da Liberdade, nº 182, loja nº 5 – Lisboa. Tel.: 213549040;
PINEL & PINEL: em www.pineletpinel.com; VISTA ALEGRE: Largo do Chiado, nº 20 – Lisboa. Tel.: 213461401.
Abril 2013 Fora de Série
41
Estilo
NA MODA E NA
ARQUITECTUR A,
QUANDO
MENOS É MAIS
Uma mulher bonita. Boa ‘lingerie’. E a casa perfeita. De que é que uma pessoa precisa
mais? O expoente máximo da sofisticação e elegância é acertar na equação “menos
é mais”. O resultado é muito brilho e pequenos apontamentos de cor, para brincar com
a geometria das paredes brancas e as divisões ainda vazias do Palácio Mesquitela.
T E X TO D E J OANA M O U R A FOTO G R A F IA D E P ED RO F ER R EI R A A S SIS T I D O P O R R I C A R D O L AM EG O P R O D U Ç ÃO D E MAN U EL DAM IÃO
M A Q U I L H A G E M D E S A N D R A A L M E I D A C A B E L O S D E P I N I PA R A G R I F F E M A R I A N A M O N T E I R O R E P R E S E N TA D A P E L A G L A M
A G R A D E C I M E N T O S A O PA L Á C I O M E S Q U I T E L A P O R T O D A S A S FA C I L I D A D E S C O N C E D I D A S
a protagonista foi a actriz Mariana Monteiro, que se
imaginou “uma diva de cinema de uma outra época”,
uma espécie de Rita Hayworth, despida de tudo menos “da classe e de um par de carteiras e jóias”. Num
duplex do mais recente condomínio de luxo da zona
histórica da cidade de Lisboa, o Palácio Mesquitela, o
tecto alto combina com as grandes janelas clássicas
por onde entra a luz do sol. As escadas que dividem
a casa são também um pormenor que faz a diferença
e que esta “diva do cinema” soube aproveitar da melhor forma. Podia viver ali. Ela, a sua roupa, as cartei42
Fora de Série Abril 2013
ras, os sapatos, as jóias e… as paredes vazias.
As dicas do fotógrafo Pedro Ferreira foram fundamentais para a criação de um personagem que Mariana Monteiro diz ser muito diferente daqueles que representa em televisão. “Aqui, a expressão conta mais.
A fotografia capta apenas uma imagem que tem que
ser capaz de passar uma mensagem. Em televisão,
a expressão existe, mas de forma menos carregada,
uma vez que se faz acompanhar por texto”, explica a
actriz. Daí a atitude forte, quase agressiva, impondo-se ao espaço. Ela e os “seus” acessórios de luxo.
Abril 2013 Fora de Série
43
Estilo
Na abertura, saia (254,80 euros) Missoni, na Nude. Bolero (207 euros) Patrizia Pepe. Colar “Blanche” em ouro rosa e pérolas barrocas brancas (3800 euros) Mimi. ‘Soutien’
preto (56,90 euros) Chantelle, no El Corte inglès. ‘Clutch’ “Serpenti” ‘fuchsia’ (1300 euros) Bulgari, no El Corte Inglès.
Em cima, colar “Saphir flower” (42000 euros) Bulgari, no El Corte Inglès. Casaco de vison (5245,50 euros) Rizel e ‘négligé’ em seda preta (405 euros) Lingerie La Perla, tudo
na Loja das Meias. Anel “Cocktail” em ouro rosa e quartzo (4500 euros) Mimi.
Ao lado, casaco de vison com cinto em pele (5245,50 euros) Rizel, ‘cardigan’ em malha dourado (1070 euros) e ‘top’ em malha dourado (820 euros), ambos Dior, e sandálias
douradas com calcanhar encarnado (322,50 euros) Maliparmi, tudo na Loja das Meias. Anel “Cocktail” em ouro rosa e quartzo (4500 euros) Mimi.
44
Fora de Série Abril 2013
Abril 2013 Fora de Série
45
Estilo
46
Fora de Série Abril 2013
Abril 2013 Fora de Série
47
Estilo
Na dupla anterior, colete preto (200 euros) Hôtel Particulier, ‘leggings’ com lantejoulas, (334,80 euros) By Malene Birger, sandálias pretas com aplicações no salto, (561
euros) Moschino Cheap and Chic, tudo na Nude. ‘Soutien’ Filipe Faísca (preço sob consulta), colar “Saphir flower” em safiras, pavé de diamantes e ouro (42000 euros) Bulgari,
no El Corte Inglès.
Em cima, casaco com estampagem (837 euros) Philosophy by Alberta Ferretti e sapatos rosa (492 euros) Dior, tudo na Loja das Meias. ‘Soutien’ preto (56,90 euros) Chantelle
e cinta preta Passionata (preço sob consulta), tudo no El Corte Inglès. Mala “Isabela” em pele de crocodilo lilás e azul, (10000 euros) e colar “Saphir flower” em safiras, pavé
de diamantes e ouro (42000 euros), ambos Bulgari, no El Corte Inglès.
Moradas: EL CORTE INGLÈS: Av. António Augusto de Aguiar, nº 31 – Lisboa. Tel.: 213711700; FILIPE FAÍSCA: Calçada do Combro, nº 99 – Lisboa. Tel.: 213420699; LOJA DAS
MEIAS: Av. Eng. Duarte Pacheco, Centro Comercial Amoreiras, loja 2001 a 2004 – Lisboa. Tel.: 213833786; MIMI JÓIAS na JOALHARIA FERREIRA MARQUES: Praça D. Pedro
IV, nº 7/9 - Lisboa. Tel.: 213423723; NUDE: Av. Infante Santo, nº 60 J – Lisboa. Tel.: 213951297; PATRIZIA PEPE: Av. da Liberdade, nº 180 – Tivoli Fórum, Loja 3-B – Lisboa.
Tel.: 213161392.
48
Fora de Série Abril 2013
50
Fora de Série Abril 2013
Estilo
A MODA
DE ALMODÓVAR
“Los Amantes Pasajeros” de Almodóvar estreia no próximo dia 18 de Abril.
Antonio Banderas, Penélope Cruz e Paz Veja voltam a ser as estrelas do
realizador espanhol, que mais uma vez não descura o guarda-roupa. O
estilo de Almodóvar está patente em todos os seus filmes e marcas como
Chanel, Dolce & Gabbana ou Jean-Paul Gaultier também.
T E X T O D E P E D R O M A R TA S A N T O S
Abril 2013 Fora de Série
51
Estilo
“Os Amantes Passageiros” conta
com peças e figurinos criados por
David Delfín (foto em baixo), o
criador mais aplaudido da Espanha
contemporânea. Em todos os seus
filmes, Almodóvar sempre fez
questão de marcar o seu estilo,
numa enorme cumplicidade com o
mundo da moda.
A
lmodóvar, como diz o próprio, é um “fabulador”. Há
mais de trinta anos que é ele
a escrever, desenhar, compor e dirigir os ambientes
dos seus filmes. O sonho era
ser romancista, mas quando percebeu que se
exprimiria melhor em termos visuais, os temas da identidade, do sexo, do desejo encontraram palco no cinema. Almodóvar encena
sonhos ‘kitsch’, lutas ‘camp’, batalhas sentimentais onde os géneros homem/mulher se
confundem até se esbaterem nas cores garridas da Espanha pós-franquista. Nessa encenação, há personagens inconfundíveis, dolo, orgasmos, pares desfeitos, música vibrante, famílias ressuscitadas, mas há também moda.
Muita moda. Almodóvar, sem nunca ter criado uma peça de roupa, é um dos maiores estilistas do cinema actual.
A 19ª longa-metragem do manchego (nasceu em Calzada de Calatrava, uma terrinha
perto de Ciudad Real, na região de Castilla –
La Mancha, onde Cervantes colocou D. Quixote a cavalgar contra moinhos) é um regresso à
comédia estouvada mas socialmente perspicaz
de “Mulheres à Beira de Um Ataque de Nervos”.
52
Fora de Série Abril 2013
1988
2013
Este mês em estreia nas salas portuguesas, “Os
Amantes Passageiros” tem acção num voo acidentado de uma companhia aérea fictícia, a Peninsula. O avião pode estar preste a cair, mas
o trio festivamente ‘gay’ de tripulantes de bordo assegura que a viagem seja aprazível para o
banqueiro corrupto, a vidente, o actor famoso
ou o par recém-casado – são alguns dos turistas e amantes do voo 2549. Com participações
especiais do duo que transformou em estrelas
planetárias – será o 7º filme de Antonio Banderas com Almodóvar e o 5º de Penélope Cruz
–, o ‘cocktail’ musical sugere Almodóvar ‘vintage’, e os diálogos deverão confirmar o ouvido
único do realizador para as idiossincracias que
nos matam (e nos salvam). Mas há algo mais
que é suposto manter-se: o irreverentíssimo
sentido “fashion”. “Os Amantes Passageiros”
conta com peças e figurinos criados por David
Delfín, o criador mais aplaudido da Espanha
contemporânea, num banho de verdes claros
e azuis marinhos que compensam o caos a sete mil metros de altura. Delfín foi a grande figura da última Semana da Moda de Madrid,
num desfile em ritmo ‘rock’ guiado pela mão
gigante de Rossy de Palma – a diva almodovariana por excelência –, sob o olhar de Marisa
Paredes, outra figura incontornável do cineasta. O ‘designer’ de Malága é apenas o último
de uma longa lista de colaboradores, e procura
brilhar nos céus de “Os Amantes Passageiros”
ao lado de um vestido às flores de Dolce & Gabbana (colado à pele crocante de Blanca Suárez),
de um ‘necessaire’ vermelho de pele da Bulgari e dos estampados da Etro que Norma Boss
(Cecilia Roth) nos faz o favor de passear. Um
vestido, também florido, de Dolce & Gabbana
já tinha sido essencial na intriga, entre o melodrama e o ‘thriller’ de horror, do penúltimo filme de Almodóvar, “A Pele Onde Eu Vivo” – era
o símbolo da transformação da personagem de
Elena Anaya, enclausurada pelo Frankenstein
pós-‘yuppie’ de Antonio Banderas.
A moda e a roupa estão lá desde o início.
Almodóvar não segue as modas, cria-as. Desde
os tempos da ‘movida’ madrilena do final dos
anos 70, quando Pedro se mudou da província
que o fascina e traumatiza – os costumes asfixiantes, o internato num colégio de padres,
que exorcizará em “A Má Educação” – para
uma capital a antecipar a democracia. Entre os
espectáculos de ‘punk’ transformista que protagoniza a altas horas, a escrita de fotonovelas
pornográficas e o emprego de rotina das 9 às
5 no gigante de telecomunicações Telefonica,
Pedro junta dinheiro para comprar uma câmara de Super 8, a seguir uma de 16mm, e cria
curtas-metragens de fúria erótica e sátira violenta com títulos como “Dos Putas, o historia
de amor que termina en boda”, “La Caída de
Sódoma”, “Sexo Va, Sexo Viene” e “Folle...Folle...Fólleme, Tim”. Aprende as técnicas, apura
o sentido narrativo e, entre 1980 e 1986, coincidindo com a abertura do país à liberdade do
quotidiano pós-ditatorial, estreia um conjunto de longas-metragens ácidas e sem contemplações, que expõem os vícios e problemas da
nova Espanha – fascínio mediático, fantasmas
religiosos, consumismo desenfreado, hipocrisia do casamento –, não deixando pedra sobre
pedra (basta lembrar as freiras ‘junkie’ de “Negros Hábitos”). Em 1986, chega à maturidade,
e não é por acaso que o seu melhor filme até
então inaugura uma parceria mais rigorosa
com o criador de guarda-roupa Jose María de
Cossío, que o acompanhará por mais de uma
década. O filme é “Matador”, a história de paixão fatal – como o “Duelo ao Sol” de King Vidor, citado directamente – entre o toureiro
Diego Montes (Nacho Martínez), que mata raparigas, e María Cardenal (Assumpta Serna),
uma advogada que assassina os seus amantes. A capa de toureiro, a ouro e escarlate, usada por Maria para consumar os seus rituais
de morte marca a entrada de Almodóvar nas
grandes ideias de vestuário. O veterano estilista de Valência, Francis Montesinos, também
AS CORES GARRIDAS
REPRODUZEM AS CRISES
IDENTITÁRIAS DAS
PERSONAGENS.
EM “SALTOS ALTOS”
ALMODÓVAR RECORRE
PELA PRIMEIRA
VEZ ÀS CASAS DE
ALTA-COSTURA.
Em cima, o realizador espanhol com Anna Wintour,
editora da “Vogue” norte-americana, e Karl Lagerfeld,
que sempre considerou Almodóvar “um génio”. Mais
abaixo, com Gaultier, o estilista que redesenhou o fato de
Victoria Abril para o filme “Kika” (à drt).
1993
2004
2011
Em “A Pele Que Habito”, Almodóvar precisava de um
fato que fosse como uma segunda pele. As costuras e
os chumaços em certas áreas sugerem as cicatrizes da
personagem. Jean-Paul Gaultier produziu na perfeição a
ideia do realizador (em cima).
a impressão de que ela estava nua mas, também, de que a sua pele tinha um brilho particular, de certa forma artificial; o fato de Jean-Paul permite transmitir isso mesmo”.
Ao 19º filme, prestes a completar 40 anos de
carreira (a primeira curta-metragem, “Filme
Político”, é de 1974), Pedro Almodóvar Caballero, cavaleiro alegre de La Mancha, é tão reconhecido no universo do cinema como no mundo da moda. Em Março de 2010, a “Harper’s Bazaar” dedicou-lhe uma produção de antologia,
onde o inevitável Gaultier surge trajado como
as freiras heroinómanas de “Negros Hábitos”,
Sonia Rykiel veste a pele da Carmen Maura de
“Mulheres à Beira de Um Ataque de Nervos”, a
amiga Andrea Missoni (Almodóvar surgiu há
pouco na delirante campanha Primavera-Verão de 2013 da marca) reinterpreta a dona de
casa de “Que Fiz Eu Para Merecer Isto?” e Karl
Lagerfeld, que sempre considerou Almodóvar “um génio”, aparece de revólver em punho
junto ao cineasta numa encenação policial de
“Em Carne Viva”. Quando o espanhol foi homenageado em 2011 durante a cerimónia anual dedicada ao cinema do Moma (Museum of
Modern Art) de Nova Iorque, Anna Wintour, a
toda-poderosa editora da “Vogue” norte-americana, não faltou, sorrindo orgulhosa ao lado do
“fabulador”. Melhor do que ninguém, ela sabe
que Almodóvar nunca passa de moda.
Abril 2013 Fora de Série
53
FOTOGRAFIAS DE CORBIS/VMI E CEDIDAS PELA PRIS AUDIOVISUAIS
dará uma ajuda nos vestidos encarnados que
pontuam a intriga e, dois anos depois, “Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos” leva à descoberta internacional do cineasta manchego.
As cores começam a fixar-se: a Espanha de Almodóvar – e é quase como se a Espanha se tornasse um filme dele – é uma explosão de cores
intensas. Os rosas choque, os amarelos vivos,
os vermelhos sangue reproduzem as crises
identitárias das personagens, os seus desejos
de vingança, as suas paixões furiosas, a ausência de leis do seu desejo. O ‘designer’ gráfico Juan Gatti incorpora no genérico elementos das
revistas femininas de moda dos anos 50 e 60,
Antonio Alvarado tem um dedo no vestuário
de Carmen Maura e, em “Saltos Altos”, além
da colaboração de Sybilla, Almodóvar recorre pela primeira vez às casas de alta-costura
para traduzir a personalidade e antagonismo
das suas protagonistas, Marisa Paredes e Victoria Abril: Paredes veste um saia-casaco Armani, Victoria Abril um ‘tailleur’ Chanel (é o
início da amizade com Karl Lagerfeld). Todos
os pormenores da ‘mise en scéne’, dos cenários
aos adereços, da arquitectura ao guarda-roupa,
são agora controlados pelo cineasta – assina
apenas “una pelicula de Almodovár” –, sem-
pre com a ajuda de De Cossío. Haverá uma parceria mais duradoira, com um iconoclasta da
sua envergadura: Jean-Paul Gaultier.
Conhecem-se ainda nos anos 80 na já lendária discoteca parisiense “Les Bains Douches”. Têm o sentido de humor em comum,
Gualtier conhece e admira as fitas de Almodóvar, Almodóvar aprecia o trabalho do francês para o guarda-roupa de “O Cozinheiro, O
Ladrão, a Mulher e o Amante Dela” de Peter
Greenaway. Exulta com o corpete e o soutien
pontiagudo de Gaultier para a ‘tournée’ “Blonde Ambition” de Madonna e pede ao ‘designer’
para conceber os fatos de seios nus, literalmente sangrentos, da jornalista Andrea Caracortada (Victoria Abril) em “Kika”. “O seu talento
é vivo e versátil; tanto pode colher inspiração
no ‘trash’ ou no ‘streetwear’ como em estilistas franceses clássicos como Yves Saint-Laurent ou Patou”. É o início de uma bela amizade:
Gaultier reinventa o ícone da canção espanhola Sara Montiel através de Gael Garcia Bernal
em “A Má Educação” e, já em 2011, após experiências de sucesso com estilistas como Tatiana
Hernández, Sonia Grande (que trabalhou para
Woody Allen em “Vicky Cristina Barcelona”)
ou Paco Delgado, recém vencedor do Óscar pelo vestuário de “Os Miseráveis”, Almodóvar
volta a pedir ajuda ao seu cúmplice para criar
os fatos a imitar pele que revestem o corpo de
Vera, interpretada por Elena Anaya em “A Pele
Que Habito”. “Quando o Jean-Paul faz roupas
explicitamente eróticas, cria-as de uma forma
inocente, como um garoto mal-comportado faria. Em ‘A Pele Que Habito’, precisava de um fato que fosse como uma segunda pele. As costuras e os chumaços em certas áreas sugerem as
cicatrizes da personagem. Ao mesmo tempo,
ao apresentar Vera num plano geral, quis criar
Estilo
O ARTISTA COMERCIAL
Gosta de acrescentar valor às coisas e por
isso o serviço que hoje mais valoriza é o ‘su
misura’. A sua maior inspiração na moda
é Giorgio Armani e quando arriscou no
cinema achou que tinha “divagado”. Dez
minutos de aplausos convenceram-no do
contrário. Falamos de Tom Ford, o “artista
comercial no universo da moda”.
T E X T O D E J E R Y L B R U N N E R / C E L E B R I T E X T/ A I C
54
Fora de Série Fevereiro 2013
É difícil imaginar Tom Ford fracassar no que quer que
seja, por mais invulgar que o desafio se afigure. Nasceu em Austin, Texas, e desistiu de estudar aos 17 anos
porque transbordava de trabalho. “Algures na minha
adolescência, dei por mim a fazer 12 anúncios publicitários em simultâneo. Facturava centenas de milhares de dólares por ano”. Como o seu objectivo na vida
era dar ordens e não recebê-las, desistiu da publicidade e foi estudar arquitectura na Parsons New School
for Design, em Nova Iorque. Expedito e desembaraçado, convenceu a casa Chloe, em Paris, de que tinha todas as competências necessárias para lhe oferecerem
um estágio na marca. “Agarrei nuns quantos esboços
e disse que tinha um diploma da Parsons. Ninguém
perguntou qual era a minha área de especialização”.
Graças a Ford, a marca francesa ganhou novo alento: as receitas dispararam para os 3 mil milhões de
dólares (2,3 mil milhões euros) e o número de fãs não
parou de aumentar, de Jennifer Lopez a Brad Pitt. Em
2005, criou a marca Tom Ford e lançou a sua linha de
produtos de beleza e perfume homónimo, numa lógica
de “luxo pronto-a-usar”, assim como uma linha de vestuário, calçado e acessórios feitos à medida. Ford tem
lojas em Nova Iorque e Milão, e está prevista a abertura de novos espaços em diferentes pontos do planeta.
Todas as lojas são desenhadas à imagem de uma casa
particular com sala e lareira, bar, obras de arte da colecção privada de Ford e até mordomos. Mais. Estreou-se
na realização com o filme “Um Homem Singular”, em
2009, elogiado pela crítica e nomeado para os Óscares
L AO SERVIÇO DA MODA
e Globos de Ouro. Ford é extremamente prolífico, experimenta as mais diversas áreas e faz tudo com enorme
talento. Se alguma vez anunciasse que ia candidatar-se
à presidência dos Estados Unidos, limitar-nos-íamos a
sorrir e a pensar se iria desenhar o fato da tomada de
posse. Estamos a falar de Tom Ford, certo?
Em criança, o que queria ser quando fosse grande?
Comecei a ter muito trabalho e decidi abandonar a escola durante quatro anos para fazer anúncios televisivos e participar como actor em séries de televisão, todas péssimas, por sinal. Depois percebi que detestava
ser actor porque era controlado em vez de controlar.
Recebia ordens e não achava graça nenhuma. Decidi
voltar a estudar. Mas nesse tempo ganhava muito di-
nheiro. A dada altura fiz 12 anúncios ao mesmo tempo
e facturei umas boas centenas de milhares de dólares
num ano. Foi em 1979… era um adolescente.
Já desenhou fatos para Daniel Craig… o próprio
e na pele de James Bond.
Sim, desenhei o guarda-roupa de Bond em “007:
Quantum of Solace”. Conhecia-o socialmente e já há
algum tempo que lhe desenhava algumas peças. O
Daniel é fantástico e adoro vesti-lo.
Porque diz isso?
Porque sabe exactamente o que quer. Gosta de estilo q.b., nada de excessos. Quando usa um ‘smoking’,
recusa qualquer tipo de acessório associado. Quanto
muito quer uns botões de punho personalizados, mais
nada. Sabendo o que ele quer é fácil pô-lo elegante.
Fevereiro 2013 Fora de Série
55
Estilo
Como foi a sua experiência como realizador?
Enriqueceu-o de alguma forma?
Há quem me pergunte: “Julgas-te artista, é isso?” Há
‘designers’ de moda que são artistas. Não é esse o meu
caso. Considero-me um artista comercial no universo da moda.
O que quer dizer com isso?
Para mim, a moda é um processo de criação artística,
ainda que indissociável de outro processo: a venda. E
a moda vende algo que é absolutamente magnífico,
algo que dá cor à vida das pessoas, que as faz sentir
bem. Realizar um filme é expressar-me de uma forma mais completa. É a forma de expressão mais pura, a criação mais artística que alguma vez assinei.
Teve algum momento de paralisia criativa, receio de não ser compreendido?
Por mais que se goste profundamente de uma coisa, a
dado momento comecei a ter dúvidas… Será que divaguei, será que as pessoas vão perceber a mensagem?
Mas depois da primeira exibição do filme em Veneza
e de uma ovação que durou uns dez minutos, a sensação foi fantástica e muito emotiva. Foi o culminar de
um trabalho: “Fantástico. Consegui comunicar com
as pessoas!”.
O que mais gosta na criação de peças “feitas à
medida”?
Como vivemos num mundo em que as coisas são cada vez mais descartáveis – em que a estética é ditada
pelas tendências e a qualidade pelo efémero –, queria
criar algo cujo valor perdurasse no tempo.
O que criou, concretamente?
O objectivo foi criar um fato que fosse totalmente
diferente dos outros em termos de estilo e de toque.
O resultado é muito britânico, embora tenha a leveza do corte italiano. Digamos que é um estilo internacional híbrido. O segredo está em combinar corte
clássico com a minha filosofia de ‘design’ para criar
um conjunto intemporal.
Quer dizer que os fatos ficam datados? Como é
que “envelhecem”?
As nossas peças de vestuário ganham com o passar
do tempo porque são de alta qualidade. É aí que reside a magia do trabalho manual: torna o fato quase
orgânico, uma espécie de segunda pele.
Pode, inclusive, ter um bolso feito à medida para o seu BlackBerry…
Sim, tenho um bolso no casaco expressamente para o meu BlackBerry. Se for a uma das nossas lojas e
quiser comprar um fato feito à medida, pode levar os
objectos ou acessórios de que não prescinde no dia-a-dia, que nós fazemos todos os bolsos que necessita
– e no sítio certo. O nosso princípio não vai contra os
ditames da moda, mas também não é refém da mesma. Tudo o que faço é a pensar no cliente.
56
Fora de Série Abril 2013
anne Moore e
Em cima, Julianne
Colin Firth, oss protagonistas
do filme assinado
nado por Tom
Ford, “Um Homem
omem Singular”.
Ao lado, Daniel
el Craig que
vestiu a pele de James Bond
em “Quantum
m of Solace”,
e cujo guarda-roupa
a-roupa foi da
responsabilidade
dade de Ford.
No seu trabalho,
ho, o estilista
assume que é do serviço ‘su
misura’ que mais gosta.
É verdade que personaliza as suas ‘t-shirts’
“Fruit of the Loom” para que o final das mangas
fique mesmo acima dos músculos tricípites?
Sim, em casa, fora do ambiente de trabalho, gosto de
usar ‘t-shirts’ da linha “Fruit of the Loom”, mas com
um toque pessoal. Se as mangas ficarem mesmo acima dos tricípites, os braços ganham outro contorno.
Ficam mais giros.
O que é que as pessoas não sabem sobre Saville
Row?
Apesar de as pessoas associarem uma imagem de
‘glamour’ a Saville Row, a experiência propriamente dita não é memorável: convidam-no a entrar para
uma sala pequena, o alfaiate chega para lhe tirar as
medidas e a pessoa fica ali especada… e nua. Haverá
quem pense: isto não tem de ser uma tortura. Ora, os
fatos britânicos são um tanto ao quanto rígidos. Um
dia inteiro enfiado num fato pesado arruína as costas de qualquer pessoa. Queria criar um fato que fosse mais orgânico e que fluísse com o corpo, acompanhando os movimentos de uma forma natural.
Conte-nos algumas das suas experiências em
Saville Row.
Mandei fazer um fato na Anderson & Sheppard, uma
referência maior da alfaiataria ainda no activo, que
já vestiu alguns dos homens mais elegantes do mundo. Trabalhei com o cortador chefe, John Hitchcock,
por quem tinha enorme apreço.
Mas…
Mas o ambiente era muito austero. Sentia-me um miúdo pequeno prestes a ser repreendido pelo director da
escola. A casa tem um estilo e uma tradição de que se
orgulha e não admite desvios a essa “escola”. Discutia
imenso com John e dizia-lhe como queria a lapela do casaco, qual o volume do chumaço que pretendia nos ombros e se o fato teria um corte mais, ou menos, direito.
As suas lojas são famosas pelo serviço. É realmente importante?
Actualmente, as pessoas parece que se esqueceram daquilo que é a essência do serviço. A oferta ao nosso dispor é imensa, mas o que realmente faz a diferença é o
toque humano e a atenção ao detalhe. Tudo mais é incaracterístico, vazio e desinteressante.
Num mundo cada vez mais automatizado – a comunicação faz-se por computador e telefone –, ter alguém que
nos ajude e garanta que o resultado será
exactamente aquele que nós queremos,
acrescenta enorme valor à experiência,
à compra de uma coisa nova.
Onde se inspirou para criar o seu
estilo?
Sempre adorei o padrão de beleza masculino dos anos 70 do século XX. Eram homens robustos e maduros. Quando escolhemos modelos, tentamos sempre promover a figura do homem mais maduro.
Tem alguma referência em termos
de estilo? Há alguém que o inspire
em particular?
Giorgio Armani. Nada se parece com as roupas que
ele cria: suaves, mas assertivas, minimais, focadas no
tom e no padrão. Foi ele quem inventou aqueles crepes
e drapeados com um ‘look’ muito anos 80 que dominaram o mundo. A mensagem de Armani é simples:
qualquer homem pode vestir um fato e ter um ar ‘cool’.
Existe algum aspecto surpreendente que Tom
Ford ainda não tenha revelado ao mundo?
A maior parte das pessoas não acredita que sou incrivelmente tímido. É raro deixar que as pessoas entrem
no meu mundo e conheçam a minha intimidade.
Não é a imagem que se tem de si...
A moda é a minha faceta mais superficial. De facto,
passo grande parte do tempo a trabalhar no mundo
material, mas o mais importante é não levarmos isso demasiado a sério. A moda pode ser uma coisa verdadeiramente fantástica que acrescenta qualidade à
nossa vida.
Em tempos disse que, umas vezes, as pessoas
precisam de sofrer, outras, de se sentir belas e
atraentes. É mesmo assim?
Com a queda abrupta da venda de fatos, talvez tenha
de acrescentar um terceiro aspecto: a demografia.
Em todo o caso, o meu ‘design’ é marcadamente íntegro: penso no cliente, concentro-me no produto que
vou criar e não faço cedências. Acredito que as pessoas apaixonadas por roupa, que adoram vestir bem
e gostam de se ver com certas peças cuidam do seu
corpo. Mesmo quando sofremos para atingir o resultado que pretendemos, fazêmo-lo por uma boa causa.
Passa o tempo a viajar… no regresso, a que lugar
chama “casa”?
É uma boa pergunta, pois vivo simultaneamente em
Londres, Los Angeles, Santa Fé, Nova Iorque e Milão.
Estou sempre em viagem. Enquanto ‘designer’ acho
muito positivo estar exposto a diferentes culturas ao
mesmo tempo. É inspirador!
FOTOGRAFIA DE ABERTURA DE CORBIS/VMI. NESTA PÁGINA, FOTOGRAFIAS DE REUTERS
“OS FATOS BRITÂNICOS SÃO
RÍGIDOS. UM DIA INTEIRO
ENFIADO NUM FATO PESADO
ARRUÍNA AS COSTAS DE
QUALQUER PESSOA”.
Estilo
UM PROJECTO
‘IN’ OU ‘OUT
OF THE BOX’ ?
O aluguer pode ser feito de seis meses
a 48 horas antes da data do evento e,
para garantir que tudo corre bem, é
enviado um segundo tamanho sendo
A primeira empresa com uma plataforma
que a cliente pode até pedir para ex‘on-line’ de aluguer de vestidos exclusivos
de alta qualidade em Portugal chama-se
perimentar o vestido com antecedênStyle in a Box. Uma ideia que ganhou forma
cia, sem custos adicionais. O vestido é
nos corredores de uma universidade.
enviado por correio para um dos 350
pontos ‘Pick Me’ nacionais e chega
T E X T O D E C ATA R I N A M O U R A
FOTO G R AF IA S D E B RU N O BAR B OSA
mesmo a tempo de ser usado no dia
que é preciso. Para o devolver, quatro
dias depois, basta colocar uma etiqueta pré-paga no exterior da caixa e
entregá-la, sendo que a Style in a Box
er uma boa ideia não é suficiente para
trata de pequenas reparações e da limpeza do vestido.
construir uma empresa com sucesso.
Até hoje, não existia na Península Ibérica um serFilipa Neto e Lara Vidreiro sabem isso.
viço de aluguer de vestidos como este, com base, soQuando estavam ainda na faculdade,
bretudo, no ‘on-line’. Aquilo que o diferencia é a apostiveram uma grande ideia, a de criar
ta que é feita nos vestidos. Estes são escolhidos pela
um ‘website’ que permitisse o aluguer
‘stylist’ residente, Juliana Lapa, que procura, durante a
de vestidos de luxo ‘trendy’, a uma fracção do preço.
‘fashion week’ de Paris, as peças mais especiais, aque“Com as consecutivas galas e festas às quais tínhalas em que a maioria das mulheres não investiria tanmos de ir e o dinheiro que investíamos em vestidos
to, dado que as tendências têm um prazo de validade
para cada uma dessas ocasiões, começámos a pensar
muito curto. Isto significa que o ‘stock’ é substituído
que seria benéfico termos os vestidos nas alturas que
a cada estação. Os vestidos são todos exclusivos, senqueríamos e não acumulá-los nos armários e usá-los
do apenas possível encontrá-los em algumas lojas dos
apenas uma vez”, conta Lara, de 22 anos. Deste presestilistas, em Nova Iorque ou Paris, por exemplo, e alsuposto nasceu a Style in a Box, em Dezembro do ano
guns são até feitos especialmente para a Style in a Box.
houve mesmo clientes que, espontaneamente, enviapassado, e teve logo de início um enorme sucesso,
Neste momento, estão disponíveis vestidos de marcas
ram um ‘e-mail’ a descrever todas as “imperfeições”
marcando já presença em Espanha. As jovens emprecomo RED Valentino, Erin Fetherston, Love Moschique vêm em si próprias e a pedir um vestido que as disendedoras responsáveis pelo projecto, Filipa Neto e
no, Galliano, Catherine Malandrino e Karen Millen.
farçasse. A empresa começou também a disponibilizar
Lara Vidreiro – que hoje contam com Ivone Silva e JuO ‘website’ está preparado para facilitar a escolha
o aluguer de acessórios para completar o ‘look’ final.
liana Lapa na equipa –, falam de trabalho, sacrifício e
dos vestidos, que estão organizados por estilista e por
Filipa e Lara começaram a desenvolver o projecflexibilidade, como algo que foi imprescindível para
ocasião, mas um serviço ao
to para o apresentar num concliente de excelência não deiconseguirem implementar a sua ideia.
curso de empreendedorismo,
o “Realize o Seu Sonho”, da
Apesar de receberem visitas das pessoas que prexa de ser uma das grandes preferem ver os vestidos ao vivo, na sua sede, em Guiocupações. Por isso, os mais
Acredita Portugal. De cerca de
O ALUGUER DO
marães, a Style in a Box, é, sobretudo, um negócio
indecisos podem pedir ajuda a
três mil candidatos, ficaram
VESTIDO PODE
pensado como uma plataforma ‘on-line’ (www.styem segundo lugar e ganhaJuliana Lapa, que está sempre
leinabox.com), com um processo simplificado ao mádisponível para guiar as clienram 50 mil euros em serviços,
SER FEITO DE
ximo. Para alugar um vestido, depois de passar um
tes no processo de decisão,
mas, ainda mais importante,
SEIS MESES A 48
tempinho a descobrir as dezenas de opções, o acto
aconselhando desde qual o tiganharam o estímulo e a conHORAS ANTES DA
de “compra” é tão simples como fazer um aluguer de
po de vestido que mais favorefiança de que precisavam paDATA
DO
EVENTO.
um quarto de hotel ‘on-line’, garante Filipa, também
ce a pessoa, a quais os acessóra levar o projecto para a frencom 22 anos. Os preços dos vestidos representam cerrios, o penteado e a maquilhate. “Pensámos: nós chegámos
ca de 15% do PVP e variam entre os 65 e os 180 euros.
gem que esta deve utilizar. Já
aqui, porque é que não vamos
T
58
Fora de Série Fevereiro 2013
CRISTINA AMARO
Apresentadora e empresária
INSIDER
“As empresas portuguesas
têm de perder o medo
e ganhar autoconfiança”
Apresenta o “Imagens de Marca”, na SIC Notícias,
há 9 anos. É sócia fundadora da produtora
de televisão Olho Azul e lançou o ano passado um
novo magazine, o “Portugal Marca”.
O que descobriu sobre as nossas imagens de marca?
Portugal tem um património de imagens de marcas, mais
relacionadas com a nossa cultura e com a nossa história, que
não são devidamente promovidas. No que toca às marcas
portuguesas relacionadas com empresas, Portugal tem
evoluído bastante.
Os portugueses estão a tornar-se mais empreendedores?
Acho que sim. Mas por outro lado também há uma maior
apetência, por parte da comunicação social, para dar mais
enfoque a algo que já existia antes. Hoje, até pela forma como
está o país, há mais gente a ter que se virar. Mas ainda bem
que existe mais empreendedorismo, porque nós precisamos
disso para que haja emprego em Portugal.
Quais as marcas que são o nosso cartão de visita?
Há uma marca que leva muito a nossa imagem para o
estrangeiro, o futebol. Falar de Cristiano Ronaldo e de
Mourinho é falar de Portugal. Há outros sectores onde
começamos a dar cartas, como o do azeite, do vinho, da
cortiça e do calçado, e existem os casos da Gallo, da Oliveira
da Serra, da Renova, da Compal e da Água das Pedras.
Como é que as empresas podem aumentar a sua
presença no estrangeiro?
Têm de perder o medo e ganhar autoconfiança, são duas
coisas imprescindíveis. Não podemos ter medo de nos
fazermos a outros países e de nos adaptarmos a eles. Os
descobridores portugueses não tinham medo de se “atirarem
ao mar” e de irem procurar novas rotas.
Qual o papel das incubadoras e das iniciativas ao
empreendedorismo?
São importantíssimas para o desenvolvimento de pequenos
negócios que podem vir a crescer no futuro.
Quais as marcas de luxo que Portugal tem?
Não sei se tem alguma...
A Style in a Box tem disponíveis vestidos de marcas como RED
Valentino, Erin Fetherston, Love Moschino, Galliano, Catherine
Malandrino e Karen Millen, e aluga também acessórios.
sonhar mais alto?”, conta Filipa. Durante os meses seguintes, incubadas na Startup Lisboa, procuraram fazer contactos no mundo da moda e encontrar investidores. A meio do caminho encontraram Ivone Silva,
fundadora da revista “NStyle”, que tinha experiência
e um grande ‘know-how’ na área da moda. Era a peça
do ‘puzzle’ que faltava e, a partir daí, a equipa trabalhou, durante cerca de oito meses, para preparar o lançamento da plataforma.
O projecto ambicioso – cujo investimento foi de 500
mil euros – de duas estudantes de faculdade apaixonadas por moda ganhou vida devido ao trabalho e consistência: às noites seguidas em que ficavam até à meia-noite na Universidade Católica, à “lata” que tiveram a
contactar as pessoas que precisavam e a uma equipa
que funciona em grande harmonia. Apenas três meses depois do lançamento da Style in a Box, Filipa e Lara ainda não tiveram tempo para parar e reflectir sobre
o percurso, no mínimo invulgar, que fizeram até aqui.
No entanto, já estão a pensar num futuro a longo prazo
e conseguem dizer, com confiança, que o seu objectivo
é tornar a Style in a Box “a plataforma de referência da
Europa em aluguer de produtos de moda”.
Como se justifica isso?
A Portugal ainda lhe falta acreditar que é possível criar
marcas cá. Não existe ainda a tradição de criar marcas a
partir dos bons produtos que temos.
O que é preciso fazer para desenvolver o sector do luxo?
O luxo vive da capacidade de uma marca se tornar
aspiracional. Itália, por exemplo, tem uma capacidade de
criação de marcas que Portugal não tem, e não é por ter
menos qualidade.
Há mercado para o luxo em Portugal?
Indiscutivelmente. Se não existisse, não tínhamos as marcas
que temos na Avenida da Liberdade e o mercado dos
automóveis a crescer.
Uma marca que represente aquilo que Portugal deve
fazer com os seus produtos?
A Renova é uma marca completamente inovadora. Tornar o
papel higiénico, que é um produto básico, quase num produto
‘premium’ é uma coisa fantástica.
Um desejo consumista?
Apesar de ter um programa de marcas, não tenho,
definitivamente, desejos consumistas.
Um livro?
“O Poder do Agora” e “Conversando com Deus”. Tenho
muitos livros espirituais, que me ajudaram a encontrar-me
como pessoa.
A banda sonora?
Seguramente, uma música francesa.
Um dia perfeito?
Um dia em que acordo bem-disposta, em que consigo superar
os meus desafios e em que as pessoas de quem gosto estejam
todas bem. É um dia em que não perco o sorriso.
T E X T O D E C ATA R I N A M O U R A
Fevereiro 2013 Fora de Série
59
Estilo
PODEMOS ESQUECER
A BIRKIN?
Sim, esqueçamos a “Birkin” e, já que estamos para aí virados, esqueçamos também
a “Kelly”. Será mais ou menos o mesmo que voltar a construir a arca de Noé e deixar de fora
o elefante e o leão. Mas às vezes é preciso. Às vezes... T E X T O D E I N Ê S Q U E I R O Z
C
rescemos a ouvir falar nelas. Na qualidade delas, mas também no preço delas. Sobretudo, nas listas de espera intermináveis para se conseguir chegar
a uma delas. São símbolos inegáveis
de estatuto que não passam de moda,
mas que passam de mãe para filha e de filha para neta.
É a pele escolhida a dedo, o corte perfeito, a minúcia de
cada ponto dado à mão, as peças metálicas numeradas,
os múltiplos detalhes vistos e revistos sob olho clínico. A garantia é vitalícia e em qualquer altura é possível substituir alças, fechos, aplicações... Os modelos
são perenes, como as folhas de certas árvores. Multiplicam-se as cores, variam os materiais, crescem e diminuem os tamanhos, mas os modelos permanecem.
É assim com a Hermès. Sempre o foi e sempre será.
Mas se é assim com a “Birkin” e com a “Kelly”,
também o é com a “Jypsière” ou com a “Lindy”, dois
exemplos entre tantas outras carteiras da marca. Então como explicar esta universal obsessão com as duas primeiras?
“A ‘Kelly’ e a ‘Birkin’ são carteiras que têm elegância e que conferem elegância. Marcam um estilo
muito próprio, é quase como se fizessem parte de um
clube do bom gosto francês”, explica Couli Jobert, a
directora criativa do departamento de marroquinaria da Hermès. Mas se nalguns clubes é possível reservar o direito de admissão a uma mão cheia de eleitos escolhidos a dedo, noutros, como é o caso, é o poder de compra de cada um que dita essa mesma adesão. Ora, tendo em conta que o “bom gosto” é provavelmente um dos dons humanos mais bem distribuídos do universo – porque é pouco provável que exista
alguém que não esteja plenamente satisfeito com o
seu – não será difícil imaginar o resultado desta realidade multiplicado por milhares de Birkins e Kellys
de todas as cores, espalhadas por todo o planeta.
Em Julho do ano passado, a “Forbes” publicava
um artigo com um título curioso: “Terá a ‘Birkin’
Hermès perdido o seu fascínio?”. A forma interrogativa do título era justificada logo à partida com outra
pergunta: “Será que a ‘Birkin’ continua a ser a mãe
de todas as carteiras quando todas as mulheres com
que nos cruzamos ao almoço têm uma?”. Focado essencialmente numa realidade asiática, muito particularmente em Hong Kong e em Singapura onde, de
acordo com o autor do texto, “as ‘Birkins’ são tão omnipresentes quanto as Coach nos Estados Unidos”, o
artigo lá seguia, à procura de resposta que foi encontrar junto do bloguer singapurense “Bagaholicboy”,
um “viciado” em carteiras como o próprio nome do
blogue indica e para quem o fenómeno “Birkin” vai
muito além do acessório propriamente dito. No fundo, a mais famosa carteira Hermès acaba por ser “o
supremo símbolo de estatuto, seja para quem poupou dinheiro durante meses para comprar a sua primeira ‘Birkin’, seja para a coleccionadora que faz
questão de ter uma de cada cor e tamanho. É mais do
que uma carteira, é um estilo de vida”.
TODAS DIFERENTES... TODAS IGUAIS
Um estilo de vida tão badalado que há já quem lhe
torça o nariz, como é o caso de Masako Kumakura,
directora executiva do ramo asiático da consultora
Karla Otto, uma empresa internacional vocacionada
60
Fora de Série Fevereiro 2013
“HÁ DEMASIADAS PESSOAS
QUE NÃO TÊM A MAIS
PEQUENA NOÇÃO DE ESTILO
AO USAR UMA ‘BIRKIN’.
E LEVAM-NA PARA TODO
O LADO (...) NÃO É NADA
CHIQUE”, DIZ MASAKO.
A nova colecção de carteiras da Hermès aposta nas cores e num
‘look’ desportivo mas sempre chique: ‘Chic le Sport’ é, aliás, o mote
da ‘maison’ para a Primavera. Na foto, a colecção “Berline”.
para as áreas de luxo, moda, beleza, ‘lifestyle’, arte e
‘design’. “Há demasiadas pessoas que não têm a mais
pequena noção de estilo a usá-la [a ‘Birkin’]. E levam-na para todo o lado. Na Ásia, tenho visto mulheres
com Birkins enormes em jantares formais, o que não
é nada chique”, disse Masako à “Forbes”.
É um facto que tudo o que acontece no continente asiático acontece à escala megalómana, mas num
mais comedido ocidente a realidade não parece estar
muito distante do cenário oriental. Não há estrela de
cinema ou celebridade que não tenha a sua “Birkin”
e/ou a sua “Kelly”, quantas vezes multiplicada por todas as cores do arco-íris. Victoria Beckham é talvez
o melhor exemplo... uma verdadeira coleccionadora,
mas há outros, como Lindsay Lohan, Pamela Anderson, Katie Holmes, Lady Gaga, Catherine Zeta-Jones,
Courtney Love, Eva Longoria, Julia Roberts, Sarah-Jessica Parker, Joan Rivers, Nicole Richie, as irmãs
Kardashian e até a própria Jane Birkin – a actriz francesa que inspirou a criação da famosa carteira, em
1984, da mesma forma que, 28 anos antes, o nome de
Grace Kelly ficou para sempre ligado a uma outra,
criada em 1935 por Robert Dumas.
Apesar do preço que, no caso dos modelos mais
básicos andará pelos 5500 euros mas que, consoante o exotismo da pele, poderá ir bastante mais longe;
apesar das listas de espera para se conseguir uma,
que chegam mesmo a ultrapassar os 12 meses, porque, apesar de tudo, sempre estamos a falar de artigos de manufactura, o certo é que ambas as carteiras,
principalmente a “Birkin”, parecem estar a banalizar-se. Será? Melhor ainda, há mesmo quem se dê ao
luxo de as vandalizar em nome da arte, como foi o
caso de Francesca Eastwood, a filha do actor/realizador Clint Eastwood que, o ano passado, pegou fogo a
uma “Birkin” como mote de inspiração para o namorado, o fotógrafo Tyler Shields.
FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELA MARCA
MAS PODEMOS MESMO ESQUECER A
“BIRKIN” ?
E, já que estamos para aí virados, podemos esquecer a “Kelly” também? Como costuma dizer-se, “há
mais Marias na Terra” e, no que diz concreto respeito à Hermès, todas elas feitas com o mesmo rigor e
precisão, com o mesmo desvelo e carinho dedicado
às duas que vamos tentar esquecer.
Carteiras que, à semelhança destas, contam histórias interessantes e/ou que receberam o nome de alguém interessante. É o caso da “Évelyne”, nascida em
1978 e baptizada com o nome de Évelyne Bertrand, a
então directora artística do departamento de equitação da Hermès. É o caso da “Berline”, um modelo
que, “não sendo ainda histórico, tem uma bonita história”, como diz Couli Jobert que recorda que foi ao
olhar para uma maqueta de um assento de automóvel que lhe surgiu a ideia de reproduzir o canelado
dos estofos numa carteira.
Olhando para o passado, distante ou recente, a directora criativa do departamento de marroquinaria
da Hermès enumera: a “Passe Guide”, criada em 1975
pelo ‘designer’ Henry D’Origny e “que é um verdadeiro exemplo de ‘savoir faire’”; a “Lindy”, concebida em
2006 por Frédérick Vidal, uma carteira que parece
ter sido “feita ao contrário” e que “é a eleita de numerosas mulheres pelo seu lado ultra prático e menos
convencional”.
E quando perguntamos a Couli Jobert quais são
os outros modelos de carteiras Hermès que maior
procura vão tendo actualmente, a resposta lança-nos para um universo ainda mais vasto. A “Lindy” é
uma delas, outra é a “Jypsière”, curiosamente ou não,
“uma prima da ‘Birkin’ e da ‘Kelly’”, mas há mais: a
“Constance”, “que é a favorita das jovens por causa do
seu estilo muito feminino e a assinatura” (o fecho em
forma de H), a “Victoria”, um verdadeiro todo-terre-
Couli Jobert é a directora criativa do departamento de
marroquinaria da Hermès e considera que a “Kelly” e a “Birkin”
é quase como se fizessem parte de um clube do bom gosto francês.
Em cima (da esquerda para a direita), carteiras “Bourlingue”;
“Double Sens”; “Constance”; e “Soie Cool”.
no “que agrada tanto às mulheres como aos homens”,
a “Garden”, “o saco incontornável” e descontraído, ou
a “Double Sens”, “um saco bicolor simplicíssimo e totalmente reversível”.
Quanto às cores preferidas não há uma regra definida, tudo depende, até porque, como lembra Couli Jobert, “nem todas as cores ficam bem em todos os
tipos de pele ou em todos os modelos”. Cor de referência da Hermès, “naturalmente que o laranja é um
‘must’, mas o bege estopa é também um grande clássico”, salienta a directora criativa acrescentando que
as pessoas procuram “cada vez mais as cores emblemáticas da estação e, frequentemente, as cores vivas”.
A cor é, aliás, a tónica dominante do ano que corre cujo tema é ‘Chic le Sport’ e que se exprime em tonalidades fortes “como o azulão, o verde forte, o amarelo enxofre, o vermelho sanguíneo”, mas também
através dos efeitos gráficos como sejam “os jogos de
riscas, as carteiras bicolores ou multicolores”, enumera Couli Jobert.
Este ano o ‘look’ é desportivo e chique... sempre
chique, claro. As novidades apostam nesse lado ‘cool’ que se revê, por exemplo, “na ‘Bourlingue’, uma sacola descontraída com um estilo desportivo”, ou no
divertido “saco de ginástica ‘Soie-Cool’” ou então, se
quisermos continuar a bater na mesma tecla, numa
“Kelly Golf” ou numa “Birkin Sailor”, para variar um
bocadinho.
As sugestões são múltiplas e as cores também. Por
isso mesmo, perguntamos a Couli Jobert que conselho daria a uma jovem mulher, de espírito assumidamente desportivo, na altura de comprar a sua primeira carteira Hermès. “Em primeiro lugar, que não seja
razoável e que se deixe levar pela paixão”. Quanto à
escolha, talvez “uma mini ‘Berline’, pelo seu espírito
desportivo e pela sua bonita gama de cores”. Mas, acima de tudo: “Que seja ousada nas cores!”.
Fevereiro 2013 Fora de Série
61
Estilo
FÁTIMA LOPES
CRIADORES PORTUGUESES
ESPALHAM PERFUME
EM PARIS
Houve desassossego. Cravos e metralhadoras. Odes ao diamante.
Nas ‘passerelles’ ou num frasco de perfume em forma de
pedra preciosa, Luís Buchinho, Felipe Oliveira Baptista e Fátima
Lopes lançaram o seu aroma pela semana de moda de Paris.
T E X T O D E M A R I A N A B É U D E C A R VA L H O , E M PA R I S
“L
ança menina, lança
todo este perfume /
Desbaratina, não dá
para ficar imune / ao
teu amor, que tem
cheiro de coisa maluca. Lança! Lança
perfume!”. Estes versos são-lhe familiares? Está a estranhar a ligação entre eles e o “Paris” que surge à frente do
nome da jornalista? Não é caso para isso. “Lança Perfume”, da brasileira Rita
Lee, ecoa por entre o burburinho ruidoso que toma conta do St. Fiacre, um
espaço de eventos no centro de Paris, de
aspecto urbano e minimal, envolto numa luz azul de poucos ‘watts’, que lhe
dá um aspecto de quase penumbra.
A escolha musical não podia ser
mais oportuna. A criadora Fátima Lopes lança perfume. Mais concretamente, a sua primeira fragrância, a que escolheu dar o nome de Be Mine. Mas lança
também perfume de uma forma ainda
mais literal. De frasco na mão – a lembrar a forma de um solitário de diamante – borrifa a sua fragrância sobre os
convidados que enchem o espaço na festa de lançamento, enquanto se desdobra
em sorrisos, conversas de ocasião, entrevistas e poses para a fotografia.
É sabido que Fátima Lopes desenha
a pensar em si. Confirmar-nos-ia isso
mesmo no dia seguinte, na sequência
do seu 29º desfile na semana de moda
de Paris – o 18º com o apoio do Portugal Fashion. Neste caso não seria diferente. “A Fátima disse-me: ‘quero algo
que cheire a mim, mas também que
não cheire a nada que exista no mercado’. Esta foi a premissa”, explica à FS
62
Fora de Série Abril 2013
Aurélien Guichard, perfumista da Givaudan e o nariz por detrás de Be Mine.
“O Aurélien interpretou-me”, sintetiza
Fátima, mesmo ao seu lado. “Este perfume sou eu, o meu ADN”.
Há três anos, Fátima teve um sonho.
“Não há nenhum criador de moda que
não deseje criar o seu perfume. É o clímax de uma carreira”, explica. Mãos à
obra, havia que encontrar a empresa
certa e o nariz perfeito. Em Paris, claro.
“A roupa pode fazer-se em Portugal; um
perfume não. Tem de ser francês. Temos
de nos juntar aos melhores e a Givaudan
é a número um”, remata a criadora.
O processo foi longo, desdobrado em
três anos de conversas semanais ao telefone. Aurélien em Paris, Fátima em
Lisboa. “Normalmente levo um ou dois
anos a trabalhar numa fragrância, mas
esta foi diferente. A Fátima mostrou-me
o seu trabalho e fui aos seus desfiles, por
isso o resultado é uma mistura do trabalho que ela faz e a mulher que ela é. Há
uma parte do meu trabalho que implica
observar e sentir quem é a pessoa. E isso
leva tempo. É preciso escolher os ingredientes com os quais vamos contar esta
história”, explica o perfumista.
Três anos e mais de quinhentos testes depois, o resultado. O aroma, suave
mas com personalidade, lembra o cheiro da madeira com uma pitada de incenso. “Tem notas de cidra, benzoína,
cedro e baunilha. Isto é a parte essencial. Depois há mais ingredientes como, por exemplo, a groselha preta”, decifra Aurélien. “O produto final traduz
uma soma entre uma certa escuridão,
força e, ao mesmo tempo, sensualidade
LUIS BUCHINHO
“LIVRO DO DESASSOSSEGO” SERVIU DE
INSPIRAÇÃO A FELIPE OLIVEIRA BAPTISTA,
UMA COLECÇÃO COM PADRÕES ANIMAIS.
e extra-feminilidade”, acrescenta.
O perfume, que chegará em Setembro às lojas francesas e só depois a Portugal, é vestido por um frasco de linhas rectas, que se desmultiplica em
várias facetas. Tal como um diamante.
“Lembra um solitário de diamantes,
que foi uma das primeiras peças que
desenhei e é icónico”, lembra a criadora. “Aqui em Paris sou muito conhecida pelo desfile em biquíni de diamantes e fiquei muito ligada a esta pedra.
Se tinha de ser o meu ADN, fazia sentido que inspirasse o perfume”.
PERFUME NA PASSERELLE
Do diamante para o perfume, do perfume para a colecção. No penúltimo dia
da semana de moda de Paris – e mesmo
antes do desfile da casa Chanel – Fátima
Lopes espalhou o seu aroma sob a forma de uma colecção que em tudo remetia para o brilho e forma da pedra preciosa. A pensar na próxima estação fria,
a criadora idealizou uma base cromática negra, pontuada por um degradé de
diversos tons de azul, do mais pastel ao
azul ‘royal’. “Quando o diamante brilha,
brilha de muitas cores”, remata Fátima,
que potencializou esse brilho com o uso
de cetim e sedas, que se entrelaçam com
lã, caxemira e cabedal. As formas são estruturadas e gráficas – assim como os
padrões exclusivos que lembram a superfície esquinada do diamante – e a riqueza de detalhes está em todo o lado,
como por exemplo no cabedal texturizado e na colagem gráfica dos tecidos. “É
talvez a colecção mais complicada que
fiz até hoje. Não é qualquer atelier que a
consegue pôr em prática”.
Além da linha de acessórios criada
em colaboração com a marca belga PP
From Longwy, a criadora apresentou,
pela primeira vez, coordenados masculinos.
E como nem só de perfumes se fez o
aroma da moda portuguesa em Paris,
Luís Buchinho trouxe, seis dias antes,
borrifadelas do Portugal pós-revolu-
cionário dos anos 70. As metralhadoras, os cravos vermelhos e os cartazes
políticos com que se festejava a liberdade moldaram-lhe o imaginário para
esta colecção e foram reinventados nos
padrões de cravos (ainda que dissimulados) e nas cores da paleta, a oscilar
entre o branco, o preto e o encarnado.
A estes ícones, Buchinho juntou a imagem de uma mulher forte e urbana.
“Achei que fazia sentido pegar nestas
referências e transpô-las para a ideia de
uma mulher muito afirmativa, muito
pragmática, que quando sai à rua é notada”, explica o criador. As peças, estruturadas e de corte recto, assim como o
uso de cabedal, lãs feltradas, crepes e
‘tweeds’, reforçam a inspiração do criador, que desfila em Paris desde 2009.
Já Felipe Oliveira Baptista, criador
português que está à frente da direcção criativa da Lacoste, perfumou de
desassossego a icónica Place Vendôme
parisiense. Ao som da melodia forte e
quase tribal de “As Ayabás”, de Maria
Bethânia, e inspirado pela releitura do
“Livro do Desassossego” de Pessoa, recriou uma inquietude traduzida nos
padrões animais, desenvolvidos em exclusivo com olhos de águia ampliados
e bocas de lobo, numa trama que faz
lembrar um camuflado. A estética portuguesa, com os seus contrastes, também marcou presença. “Temos um lado austero, um drama nas formas e nos
volumes, que está em dicotomia com
uma sensualidade luminosa”, considera o criador, que vive em Paris e que
se estreou na semana de pronto-a-vestir parisiense com o apoio do Portugal
Fashion há quatro anos, depois de cinco na edição de alta-costura. A influência lusa, um inédito no seu trabalho,
passou também para a paleta, onde
predominam o negro, o azul e o cinza,
os tons da natureza “bruta” dos Açores
da sua infância. “É uma colecção que
vem de Portugal para o mundo”, sintetiza Felipe. O caminho, afinal, que percorrem estes três criadores.
FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELOS CRIADORES
FELIPE OLIVEIRA BAPTISTA
Aurélien Guichard é o perfumista da Givaudan e o responsável pelo perfume Be Mine de Fátima Lopes.
A estilista portuguesa lançou a sua primeira fragância que chegará em Setembro a Portugal.
Abril 2013 Fora de Série
63
Estilo
É a mais nova descendente da família La Mer e não foge à herança da marca. A colecção
“Soleil de La Mer” é fruto do namoro entre o sol e o mar, chega ao mercado em meados
da Primavera e está pronta para abraçar o Verão.
T E X T O D E C ATA R I N A M A D E I R A E I N Ê S Q U E I R O Z
O
sol e o mar são daquelas coisas que temos sempre tendência para imaginar
emparelhadas. Mesmo em tempos
como estes, em que o primeiro insiste
em fazer-se caro e o segundo faz questão de mostrar o mais cáustico dos
seus feitios, sol e mar ligam sempre bem um com o outro. Por isso mesmo, se por mais razão nenhuma, uma
linha solar La Mer só poderia mesmo chamar-se assim.
“Soleil de La Mer” soa bem. Soa àqueles fins de tarde
de letargia em que, meio enterrados na areia quente, nos
deixamos embalar pelo doce calor estival e pelo marulhar das ondas ao longe. Soa a dias compridos e a noites
cálidas, soa a férias, soa a Verão e às saudades que temos
do Verão. “Soleil de La Mer” soa também a qualquer coisa que faltava e que chega, finalmente, com a proximidade do Verão. Afinal de contas, desde 1965 que a marca
Crème de La Mer tem vindo a marcar posição no mundo como a ‘crème de la crème’ dos produtos de beleza e
já vão longe os tempos em que o cientista da NASA, Max
Huber, chegou à tão célebre fórmula à base de algas marinhas que haveria de marcar profundamente o mundo da cosmética: o “Miracle Broth” (primeira foto ao lado). Com o passar dos anos, a marca foi crescendo, desdobrando-se em novos produtos, novas texturas e novas
especificidades. Mas faltava-lhe uma linha solar. Ela aí
está, pacientemente à espera do Verão de 2013 e, posto
isto, será talvez caso para perguntar: porquê só agora?
À pergunta responde Andy Bevacqua, vice-presidente do departamento de investigação e desenvolvimento
da Max Huber Research Labs. “A linha ‘Soleil de la Mer’
levou algum tempo a ser desenvolvida. Nós queríamos
criar fórmulas de protecção solar de alta performance
que defendessem a pele dos raios UVA e UVB mas que,
ao mesmo tempo, tirassem o melhor partido do efeito da
luz solar e que fossem profundamente eficazes em termos de reparação, hidratação e renovação do aspecto da
pele”, explica salientando que, obviamente, a ideia central era “criar um produto que respondesse aos mesmos
padrões de luxo da La Mer”.
E se o propósito era criar uma linha solar que cumprisse os dois objectivos: protecção solar, por um lado, e
reparação da pele, por outro, a receita só poderia ser uma.
“No centro da colecção ‘Soleil de La Mer’ está a estrela da
La Mer, o lendário ‘Miracle Broth’ que ajuda a dar à pele a
energia de que esta necessita para renovar o seu aspecto”,
explica Andy Bevacqua. À lenda vieram juntar-se ainda
outros ingredientes chave, como seja “o fermento de Algas Douradas” (segunda foto ao lado), um novo composto que, de acordo com o mesmo responsável, “ajuda a reduzir a irritação e retém a hidratação” da pele.
Estas Algas Douradas foram colhidas na costa da
Bretanha, em França, onde subsistem diariamente às
duras provações do sol intenso e a água salgada. Condições agrestes que, no fundo, acabam por fortalecer as capacidades regeneradoras da planta que, na pele, se traduzem na prevenção da inflamação e desidratação provocadas pelo sol ao mesmo tempo que estimulam produção de colagénio. Garantem assim um bronzeado dourado desde o primeiro dia, combatendo, em simultâneo, o
envelhecimento cutâneo.
A par do fermento de Algas Douradas, a linha “Soleil de La Mer” foi ainda enriquecida com peptídeos marinhos, que estimulam a produção de elastina e refor64
Fora de Série Fevereiro 2013
EXCLUSIVAMENTE PARA A MULHER
EUROPEIA
Mas há mais novidades a acrescentar à colecção “Soleil
de La Mer”. A saber, é a primeira linha La Mer criada a
pensar exclusivamente na mulher europeia, o que não
deixa de ser um facto curioso, particularmente se tivermos em conta que se trata de uma marca norte-americana. A decisão foi ditada pela forma como as mulheres
europeias encaram o sol e as suas vantagens e desvantagens para a pele, por oposição às norte-americanas que
privilegiam o bronzeado rápido, deixando as preocupações com o envelhecimento cutâneo para mais tarde ou
para outro tipo de soluções mais radicais.
Já a pensar no próximo Verão, a nova colecção “Soleil
de La Mer” prepara-se para chegar ao mercado entre finais de Abril e inícios de Maio trazendo consigo esta dupla vertente de protecção solar mais tratamento da pele em simultâneo. Uma vertente transversal a todos os
produtos da linha que, para já, serão três: dois protectores solares de factor 30, para o rosto e para o corpo, e um
auto-bronzeador ‘gradual tan’ para usar e abusar antes
e/ou depois da exp
exposição solar.
A LINHA “SOLEIL
DE LA MER”
PROTEGE A PELE
DO SOL E TEM UM
E
EFEITO REPARADOR,
DE HIDRATAÇÃO
E DE RENOVAÇÃO.
FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELA MARCA
PARA OS DIAS DE SOL
E DE MAR
çam a capacidade de resistência da pele e ainda extractos
de ‘Alaria Esculenta’ uma alga castanha considerada o
mais poderoso anti-oxidante marinho. Rica em nutrientes, ácidos gordos Ómega 3 e 6 e lípidos, esta alga ajuda
a proteger a pele dos radicais livres, sendo um excelente
regenerador celular.
N OTAS SO LTAS
DAVID ROSAS ABRE
NOVA LOJA NA AVENIDA
DONA DA GUCCI
PODE MUDAR DE NOME
São 700 m2 e três pisos.
A nova loja da David Rosas na Avenida
da Liberdade, agora remodelada
e ampliada, é um dos maiores
projectos na área da relojoaria e
joalharia no país. O espaço está agora
distribuído por várias zonas, uma
dedicada à alta joalharia masculina;
outra dedicada ao público feminino,
com várias marcas de jóias e relógios;
uma sala privada para atendimentos
personalizados; e um ‘lounge’
com apresentações privadas
e de imprensa. A abertura da nova
loja é já em Maio.
A PPR SA, dona da Gucci e da Puma,
está a equacionar uma mudança
de nome para Kering. A ideia é
capitalizar a sua transformação
em um especialista de artigos
desportivos de luxo, de acordo
com fontes do mercado. O plano de
‘re-branding’ deverá ser anunciado
brevemente. A mudança de nome
do grupo será já a quinta desde
que a empresa integrou a lista de
cotadas na bolsa de Paris, em 1998,
e tem como objectivo assinalar um
novo capítulo no desenvolvimento
da empresa. O grupo PPR está a
desfazer-se de algumas lojas para se
concentrar apenas nos artigos de luxo
e desporto, que são as mais rentáveis
e têm melhores perspectivas de
crescimento.
VESTIDOS DE NOIVA
PORTUGUESES
CONQUISTA M O DUBA I
Joana Montez e Patricia de Melo foram as primeiras estilistas
portuguesas a participar na Pasarela Gaudí Novias. O desfile
decorreu a bordo do paquete Costa Atlântica, atracado no Dubai.
THIERRY MUGLER RESCINDE
COM PISTORIUS
Depois das suspeitas que levaram
Oscar Pistorius a ser preso e indiciado
pelo homicídio da sua namorada,
Reeva Steenkamp, a Thierry Mugler
decidiu rescindir o contrato que
tinha com o atleta – que era desde a
Primavera de 2011 o rosto do perfume
de homem “A*men”, num negócio que
chegou aos três milhões de dólares.
A marca disse em comunicado que
“com todo o respeito pelas famílias
implicadas na tragédia”, tinha
decidido retirar todas as campanhas
publicitárias de Oscar Pistorius do
mercado”. Antes da marca francesa,
já a Oakley tinha rescindido contrato
com o atleta olímpico, a que se seguiu
a Nike e a British Telecom.
SUBMARINOS SÃO O NOVO
BRINQUEDO DOS RICOS
Paul Allen, um dos fundadores da
Microsoft, Roman Abramovich e o
também milionário Richard Branson já
aderiram à mais recente coqueluche
do luxo: são proprietários de um
submarino individual, com apenas
dois lugares. Entediados com o
luxo dos grandes iates, os “megaricos” estão a fazer disparar esta
nova tendência de mercado. É que
os submarinos recreativos estão a
começar a ganhar espaço. O primeiro
submarino familiar de cinco lugares
tem, aliás, dado que falar no mercado
e poderá em breve entrar na corrida
para se tornar o novo brinquedo
‘must-have’ dos milionários.
“Vestidos de noiva que acompanhem as tendências da moda do momento”. É assim que a dupla de estilistas caracteriza o seu trabalho:
vestidos de noiva de tecidos leves, como tule, organza, seda e musselina, com sobreposições, transparências e bordados, que levaram
Joana Montez e Patricia de Melo a serem as primeiras portuguesas
a integrar a lista de criadores escolhidos que apresentam as suas colecções na Pasarela Gaudí Novias.
No âmbito da Barcelona Bridal Week, o prestigiado “J Winter Fashion
Show 2013” aconteceu a bordo do luxuoso paquete Costa Atlântica,
atracado nas docas do Dubai, a 17 de Janeiro. E a colecção da dupla
portuguesa foi tão apreciada que, actualmente, têm a sua marca representada por uma das melhores lojas de alta-costura, situada na Jumeirah Road, onde se concentram as lojas e os ateliers mais luxuosos
do Dubai. “Após o desfile, fomos convidadas a ter a nossa marca numa
loja em Jumeirah Road – a Le Paon Blanc”, conta Joana Montez.
Ambas tiraram o curso de moda na Escola de Moda de Lisboa, completando a sua formação com uma pós-graduação no Gabinete Promostyl, em Paris, e desde 1998 que têm um atelier sediado em Cascais. Dizem que “a colecção se distingue por um corte distinto mas
alegre e moderno, longe do conceito tradicional do vestido de noiva”.
Uma colecção de vestidos por ano.
Mas, e no Dubai? “Nesta primeira fase não houve adaptação da colecção”, explica Joana Montez, que continua: “obviamente, os nossos
vestidos destinam-se aos estrangeiros ‘residents’ ou que visitam o
Dubai. O traje de casamento nobre é completamente diferente. Mas
temos uma proposta para desenvolver colecções de noiva e de festa
adaptadas ao mercado local”.
Para já, a presença recente neste mercado não está a sentir as diferenças culturais. E a dupla até tem planos de regressar aos Emirados, desta vez para fazer um estudo de mercado mais aprofundado. Haja festa!
Joana Montez e Patricia de Melo foram as
primeiras portuguesas a participar na Pasarela
Gaudí Novias, no Dubai. E por lá ficaram.
LVMH QUER COMPRAR
BURBERRY
O grupo LVMH está a preparar
uma tomada de poder, no sentido
de aumentar as suas receitas que,
baseadas nas vendas das carteiras
Louis Vuitton, têm vindo a cair nos
últimos quatro anos. O Berenberg
Bank veio dizer que a marca de 67
mil milhões de euros estará a pensar
comprar o grupo Burberry, o maior
produtor de bens de luxo do Reino
Unido. Depois de ter adquirido a
italiana Bulgari, em 2011, a LVMH
poderá estar também interessada
na Tiffany & Co, a maior joalheira
nova-iorquina, que vale mais de 62 mil
milhões de euros, disse a empresa de
investimentos Cantor Fitzgerald LP.
CALÇADO PORTUGUÊS
NOS EUA
Presente no mercado americano
desde Setembro passado, a marca
portuguesa de calçado Carlos
Santos marcou presença na edição
da FN Platform, em Las Vegas, em
Fevereiro. Esta é considerada uma
das maiores feiras de calçado da
região Oeste dos EUA – que vai
já na sua 6ª edição – e tem vindo
a crescer cerca de 25% em cada
ano. O administrador e fundador
da marca, Carlos Santos, revela: “O
saldo desta participação é positivo
e vem reforçar ainda mais a entrada
da marca naquele país”. Um evento
onde se reuniram cerca de 1600
marcas num ambiente destinado ao
público profissional.
T E X TO D E J OANA M O U R A
Abril 2013 Fora de Série
65
Evasão
PRIMAVER A
NUMA CASA
DE BONECAS
É possível ser feliz em 60 metros quadrados. Apertado? Não se tudo o que for preciso para
um fim-de-semada de bem-estar em família estiver à mão. É o caso das ‘eco houses’ no
Parque das Pedras Salgadas, onde a vida se vive em ‘doll size’. T E X T O D E R I TA I B É R I C O N O G U E I R A
“M
ãe, quando é que voltamos à nossa casa das Pedras
Salgadas?”. A pergunta é repetida até à exaustão nos
últimos meses. Talvez porque ainda não tenha obtido uma resposta satisfatória para arrumar o assunto.
“A nossa casa”, o sentimento de posse bem frisado a
cada investida. “A casa não é nossa, mas tenho pena”,
apetece-me responder. Mas não o faço. Deixo passar.
Permito-me sonhar junto com ele e atiro-lhe com um
vago “um dia destes…”. Há, neste ritual de pergunta-resposta, que se repete desde o início do ano, uma
certa sensação de vitória, de dever cumprido. Vale
sempre a pena investir num fi m-de-semana em família. Se uma criança de três anos – que não percebe
nada de arquitectura, que não usufruiu de nenhum
tratamento no spa e não vive a sonhar com o dia em
que vai poder libertar-se do ‘stress’ do dia-a-dia – ficou seduzida, que dizer de nós, adultos, depois de um
relaxante fim-de-semana passado no meio do bosque
das Pedras Salgadas?
Chegámos de madrugada, com a “amena” temperatura de zero graus centígrados para nos receber, depois de uma paragem obrigatória na Mealhada para
um jantar de leitão. Um desvio já elevado à qualidade de culto na família. Quatro adultos, três crianças
adormecidas, a habitual confusão de sacos, malas,
66
Fora de Série Abril 2013
bolachas e brinquedos vários que as acompanham.
E uma vontade imensa de desligar da azáfama da cidade e mergulhar naquele bosque centenário. Recebeu-nos o guarda, já com os carrinhos de golfe cobertos – para enfrentar o frio nocturno – a postos. É que
os carros não podem entrar no parque. Ficam estacionados em baixo, junto do edifício principal, onde
fica o spa e a recepção, e a partir daí os hóspedes deslocam-se a pé. Ou de bicicleta. Ou de carro de golfe, o
meio de transporte ecológico e silencioso adoptado
pelo hotel para ajudar no ‘check in’.
Por um caminho acidentado, o veículo deixa-nos
naquelas que seriam – pelo menos naquele fi m-de-semana, ainda que alguns gostassem de lhe chamar
sempre suas – as nossas casas, “Abeto” e “Cipreste”.
Construções modulares envidraçadas com madeira
e ardósia (materiais abundantes na região) cujos interiores se revelaram surpreendentemente… quentes.
Era mesmo o que apetecia, depois de enfrentar aquela madrugada húmida. Demos uma volta apressada
de apresentação pelas casas, para perceber a dinâmica da coisa, antes de mergulharmos nos edredões até
ao dia seguinte. Fomos tão bem recebidos que nos
sentimos em casa e não tardamos a cair num sono
profundo e reparador.
PEQUENO-A LMOÇO A CHEIR A R A V ER DE
Somos acordados por um bater suave na porta. São
dez horas e o sol brilha através dos estores cerrados.
Abrimos e, no chão, à porta de casa, “olha-nos” uma
grande cesta de vime tapada com um pano branco
imaculado. O cheiro é promissor e acorda-nos os sentidos ainda adormecidos: hora do pequeno-almoço!
No super-moderno balcão da cozinha, toda branca,
revela-se a melhor refeição dos últimos tempos. Os
‘croissants’ são deliciosos. Tudo tem um ar absolutamente caseiro. O pão; o fiambre e o queijo fatiados e
O arquitecto Luís Rebelo de Andrade foi feliz neste
projecto ‘clean’ e minimal. As casas, construídas
pela Modular System, surgem entre as árvores.
Com cerca de 60 metros quadrados de área,
comportam confortavelmente seis pessoas.
BANHO TOMADO E ESTAMOS
PRONTOS A FAZER-NOS AO
CAMINHO. CHEIR AMOS
A “VERDE”, CORTESIA
DA MOLTON BROWN, E O
AROMA NÃO PODIA SER
MAIS INSPIR ADOR.
em caixinhas; os frasquinhos de doce e mel; os iogurtes; os cereais…
Banho tomado na boxe de vidro da casa-de-banho
e estamos prontos a fazer-nos ao caminho. Cheiramos a “verde”, cortesia das ‘toiletries’ “Green Park”,
da Molton Brown, e o aroma não podia ser mais inspirador. O frio da noite deu lugar a um dia fresco e
ensolarado e o bosque das Pedras Salgadas dá-nos as
boas-vindas naquela manhã. À luz do dia conseguimos aperceber-nos da disposição das sete ‘eco houses’ que ocupam o bosque de forma completamente
integrada na paisagem. O nosso grupo ocupa duas,
frente-a-frente, mas apenas para dormir, pois cabemos perfeitamente os sete numa só casa e optamos
por fazer as refeições sempre juntos, na nossa casa
de bonecas.
O arquitecto Luís Rebelo de Andrade foi feliz neste trabalho de volumetria moderna e com uma arquitectura de interiores ‘clean’ e minimal. As casas,
desenvolvidas especificamente para este projecto e
construídas pela empresa portuguesa Modular System, respeitam o perfil natural do terreno e surgem
entre as árvores. Com capacidade para seis pessoas,
em cerca de 60 metros quadrados de área, foram pensadas para garantir conforto: têm um quarto, uma
área com duas camas, sala com sofá-cama, ‘kitchenette’ equipada, casa-de-banho, ‘hall’ e um ‘deck’ exterior com espreguiçadeiras, num ambiente tão em
contacto com a natureza que não dá vontade de sair.
SA LUS PER AQUA M
Mas o parque convida à descoberta. Quanto mais
não seja perceber o que fez desta vila termal o destino preferido para as férias da realeza. Reza a história
que tudo começou em 1873, quando as águas da nascente de Pedras Salgadas foram premiadas na Exposição Internacional de Viena de Áustria. O prémio deu
origem à construção do Balneário Termal, em 1879,
que, desde a inauguração, nunca deixou de receber
os mais ilustres visitantes. Um médico de Vila real, o
Dr. Henrique Ferreira Botelho, propôs que se fundasse uma empresa para exploração destas águas medicinais e, com a descoberta de novas nascentes e com
a visita, em 1884, do Rei D. Fernando ao parque, estavam criadas as condições para que as Pedras Salgadas
se tornassem num prestigiado complexo turístico.
Mas o sucesso só chegaria no novo século, quando,
em 1906, o Rei D. Carlos por ali se instalou para usufruir dos tratamentos termais. Daí à chegada da linha de caminho-de-ferro foi um pulo e, anos depois,
nascia o Casino das Termas (que nunca chegou a ser
casino, pois não tinha licença de jogo, mas sim uma
espécie de requintado salão de festas).
Os tratamentos termais viveram tempos de glóAbril 2013 Fora de Série
67
Evasão
ria no século XX, mas foram, aos poucos, perdendo
terreno para os modernos spas. Só em 2009 é que o
Balneário daquele tempo foi renovado pelo arquitecto Álvaro Siza Vieira e deu origem ao moderno Spa
Termal que hoje encontramos no edifício principal,
cheio de ‘glamour’ com a junção entre os interiores
em ‘art nouveau’ e a estética depurada que caracteriza o trabalho deste arquitecto. Já as ‘eco-houses’, só
chegaram no final do ano passado, por isso, o Pedras
Salgadas Spa & Nature Park está a dar agora os seus
primeiros passos enquanto complexo turístico da actualidade. Até ao final deste ano, mais cinco se juntarão às sete já existentes, e ainda outras três casas
instaladas na copa das árvores. O Casino, que está a
ser renovado, tem abertura prevista para este Verão,
e há-de renascer o Grande Hotel, mas não é para já.
No parque, que se espraia por oito quilómetros de
caminhos, destacam-se os jardins, lindos e com assinatura. O autor foi Jacinto de Matos, horticultor, jardineiro e paisagista oriundo do Porto dos finais do século XIX e início do XX, que lhes conferiu o carácter
romântico que hoje mantêm, com os seus recantos, as
grutas, as casas de pássaros, a água a correr das fontes,
o observatório meteorológico. Por estes caminhos, a
pé ou de bicicleta, é possível conhecer uma a uma as
fontes de água termal – a Fonte D. Fernando, a Fonte D.
Maria Pia, a Fonte Penedo e Grande Alcalina, a Fonte
Pedras Salgadas e a Fonte Preciosa. E, de caminho, ficar a conhecer a piscina exterior – e dar um mergulho
se caso for –, o campo de mini-golfe, o parque infantil,
o enorme lago – onde se pode andar de barco e fazer
passeios de gaivota, observar carpas coloridas (Koi) – e
desfrutar da fauna local, nomeadamente os afamados
esquilos-vermelhos (que por causa do frio não tivemos oportunidade de ver, mas que, agora na Primavera, se passeiam pelo bosque livremente), as cegonhas,
as garças e os pica-paus. Quem gosta da natureza vai
deliciar-se com os muitos e centenários exemplares de
árvores raras, como a sequóia-sempre-verde, a sequóia-gigante, o abeto-de-Douglas, o cipreste-do-Buçaco, a
faia, a metasequóia ou a cuningamia.
Claro que os mais radicais também vão encon-
Siza Vieira pegou, em 2009, no antigo
Balneário e renovou-o, conferindo ao
edifício já de si glamoroso, com os seus
interiores em ‘art nouveau’, a estética
depurada que lhe é característica.
Nasceu assim o moderno Spa Termal.
UM PROJECTO ORIENTADO
PAR A FAMÍLIAS E AMIGOS
ONDE É IMPOSSÍVEL NÃO
NOS SENTIRMOS PARTE
DO CENÁRIO.
SE FOSSEM PR ECISOS M A IS
A RGUMENTOS…
…para fazer as quatro horas de caminho que separam Lisboa do Parque das Pedras Salgadas (sorte de
quem vem do Porto, que só tem uma hora de estrada pela frente), aqui vai mais um: este projecto foi
o único de nacionalidade portuguesa a figurar en-
68
Fora de Série Abril 2013
PEDRAS SALGADAS SPA
& NATURE PARK
5450-140 Bornes de Aguiar
Portugal
trar, nestes 20 hectares de zona verde, com que se entreter. Actividades ao ar livre não faltam, desde BTT
a simples passeios na ciclovia que liga Pedras Salgadas a Vila Pouca de Aguiar. ‘Slide’ e ‘rafting’ também estão contemplados, bem como passeios pelo rio
Douro e visitas guiadas às minas de ouro romanas. E,
quanto mais não seja, descobrir onde nasce a famosa
Água das Pedras.
E os adeptos do ‘relax’ mais puro não vão dizer
que não aos inúmeros tratamentos termais de bem-estar e estética disponibilizados no spa, com as suas
14 salas de tratamento, a piscina interior aquecida
com corredor de marcha, a sauna, o banho turco, a
hidromassagem, o duche de agulheta, o duche Vichy
e as salas de relaxamento, todas tirando partido dos
benefícios da água termal naturalmente gaseificada
das fontes de Pedras Salgadas, reconhecidas na comunidade científica nacional e internacional como
terapias benéficas para doenças metabólico-endócrinas, do aparelho digestivo, do aparelho respiratório,
reumáticas e musculo-esqueléticas.
tre os 14 edifícios fi nalistas do concurso promovido pelo ‘site’ “ArchDaily” – a publicação ‘on-line’ de
arquitectura mais visitada do mundo, com cerca de
280 mil visitas diárias e 70 milhões de ‘pageviews’
mensais – para eleger os melhores edifícios construídos em 2012. Entre as 70 construções seleccionadas de todo o mundo, a arquitectura portuguesa já estava de parabéns, pois tinha dez ateliers a
concurso. Mas, no fi nal, restaram as sete modernas
‘eco houses’ de Luís Rebelo de Andrade para fazer
as honras da casa na categoria de Hotéis e Restaurantes. Foram contabilizados cerca de 70 mil votos
dos utilizadores registados do ‘website’, que foram
depois avaliados por arquitectos. Segundo o “ArchDaily”, o lote de 14 vencedores “é único em vários aspectos, das suas qualidades espaciais às suas
estruturas e materiais, mas também em termos do
que representam para a sociedade e do seu impacto
nas comunidades locais”.
Impacto esse que não é de desprezar na localidade, situada entre Vila Real e Chaves, onde se destacou, sobretudo, o sistema modular que forma este
‘eco resort’ que lhe dá uma flexibilidade única, permitindo que as casas se encaixem em qualquer parte da zona verde onde estão implantadas. Um projecto hoteleiro orientado para famílias e amigos onde
é impossível não nos sentirmos parte do cenário.
Quando voltamos à nossa casa das Pedras Salgadas?
Um dia destes. Afinal, ela é nossa.
FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELO HOTEL
Telefone para reservas:
+351 259437140
E-mail: reservations@
pedrassalgadaspark.com
Site: www.pedrassalgadaspark.com
Preços: ‘Eco house’ com capacidade
para seis pessoas entre 120 e 200
euros por noite (consoante a época
do ano e o número de pessoas).
Evasão
GSTAAD CONTINUA A
SURPREENDER...
CEM ANOS DEPOIS
É o mais recente ‘hot-spot’ da estância de
esqui de Gstaad, na Suíça. Demorou 15 anos
a ser construído mas o resultado final está
a deixar residentes e turistas rendidos ao
Alpina Gstaad.
T E X T O D E L U C I A VA N D E R P O S T, E M G S TA A D
G
staad, uma das estâncias de esqui mais
luxuosas da Suíça, fervilha de entusiasmo com a inauguração do primeiro hotel de cinco estrelas em 100 anos, o Alpina Gstaad. Jornalistas de todo o mundo
vieram ver o ‘resort’ de que todos falam,
enquanto os habitantes da pequena cidade invadem o
átrio, enchem o bar e experimentam os tratamentos do
spa e restaurantes.
O projecto levou 15 anos a concretizar, mas tudo indica que será mais um sucesso a somar à oferta de qualidade da estância alpina. Um dos residentes, por exemplo, está de tal forma viciado no restaurante japonês Megu, cujo ‘flagship’ se encontra em Nova Iorque, que passou a almoçar aqui diariamente. Pedidos obrigatórios:
‘sushi’ e uma garrafa de vinho que custa 2 mil francos
suíços, qualquer coisa como 1500 euros. Os habitantes
de Gstaad são assim mesmo: pedem o vinho que realmente lhes apetece beber. O preço é um pormenor de
somenos importância.
O hotel, onde foram investidos mais de 250 milhões
de euros, é uma ‘joint-venture’ entre Marcel Bach, um jovem agricultor local de sucesso, e Jean-Claude Mimran,
empresário franco-argelino que tem casa em Gstaad,
Genebra e Monte Carlo. Foi construído numa encosta
da montanha sobranceira à cidade, razão pela qual todos
os quartos têm varanda e vista sobre a cidade e as montanhas envolventes. Dispõe de 25 quartos e de 31 suites
com dimensões generosas e decoração elegante – “pormenores” que fazem toda a diferença quando comparados com a oferta da concorrência no mesmo segmento.
Muitos dos quartos têm lareira e acendê-la não podia ser
mais fácil: é só clicar num botão e já está! Além disso,
70
Fora de Série Abril 2013
as soluções de iluminação são absolutamente fantásticas e inovadoras. Por exemplo, se decidirmos ir à casa
de banho a meio da noite, uma luz discreta ilumina o
suficiente sem incomodar terceiros. Mas não só. A decoração também presta homenagem a uma certa estética
suíça ‘vintage’ e aqui e ali percebe-se um certo “toque
alpino”, como badalos a servir de candeeiros, traves de
madeira recuperadas de antigas quintas de Saanenland
e pedra característica desta região.
Marcus Lindner, antigo ‘chef’ de mesa, duas estrelas
Michelin, em Zurique, é responsável pela ementa dos
três restaurantes do Alpina. O Sommet, que oferece um
menu de degustação de sete pratos, o já referido Megu –
os espargos em crosta ou o ‘carpaccio’ de vaca Kobe são
imperdíveis –, e o Stübli, cuja decoração é ligeiramente
‘kitsh’, onde se servem especialidades locais como ‘fondues’, ‘raclettes’ e ‘rösti’. Todos os hóspedes têm direito a
um crédito de 150 francos suíços por dia (120 euros), não
reembolsável, para gastar nos restaurantes do ‘resort’.
O mimo absoluto, porém, é o Six Senses Spa, com cerca de 2 mil metros quadrados. Pessoalmente, ir ao spa
não é a minha prioridade quando estou numa estância
de esqui, prefiro desfrutar ao máximo das pistas. Mas
reconheço que o Six Senses é especialmente fantástico:
tem uma piscina aquecida de 25m e um leque de tratamentos de luxo altamente diversificado, além de programas de perda de peso e desintoxicação.
Falando agora da pequena cidade de Gstaad, o que
mais se destaca é o seu carácter profundamente alpino,
como acontece com a maior parte das estâncias de esqui
suíças. Entre finais da década de 1980 e finais de 1990,
vinha até aqui regularmente. Passados quase 15 anos,
é notório que foram introduzidas melhorias, mas sempre com a preocupação de não descaracterizar Gstaad.
Diria que é uma versão idêntica à que conheci no passado, mas com mais gente. Num primeiro olhar, descobrimos os ‘chalets’ privados característicos da cidade e
aldeias circundantes, novos e antigos, todos respeitando
a traça local, onde se destacam os telhados tipicamente inclinados. Os decoradores internacionais só tiveram
autorização para dar largas à imaginação no interior dos
O Alpina Gstaad foi
construído numa
encosta da montanha
sobranceira à cidade.
Tem 25 quartos e
31 suites com uma
decoração elegante
e ‘vintage’. Muitos
dos quartos têm
lareira, fácil de
acender. O hotel tem
três restaurantes
cujas ementas são da
responsabilidade de
Marcus Lindner, ‘chef’
duas estrelas Michelin.
O mimo absoluto é o
Six Senses Spa, com
piscina aquecida e
um leque imenso de
tratamentos de luxo.
GSTAAD FERVILHA
DE ENTUSIASMO COM
A INAUGURAÇÃO DO
PRIMEIRO HOTEL DE CINCO
ESTRELAS EM 100 ANOS.
enquadradas por montanhas que, embora relativamente pequenas, oferecem excelentes encostas para
os esquiadores intermédios. Quando fiz o ‘check-out’,
o Alpina Gstaad estava ao rubro: nem um quarto livre e conseguir mesa num dos restaurantes parecia
verdadeiramente uma missão impossível. Neste período do ano, uma semana no Alpina num quarto duplo ‘deluxe’ – a gama de quartos mais baixa, mas ainda assim fantásticos – ronda os 4.650 euros, embora
o que mais pese na factura, como acontece em todos
os hotéis de luxo, sejam os extras. Chá para uma pessoa e bolachas (aparentemente, não servem um sem
o outro) custa 9 euros, mas uma coisa é certa: ficar
alojado num hotel de topo nos Alpes suíços é como
ter um iate – se tiver de perguntar pelo preço é porque não pode dar-se a esse luxo, certo?
Lucia van der Post viajou a convite do Alpina Gstaad (www.
thealpinagstaad.ch) e da companhia aérea Swiss (www.swiss.com).
Quarto duplo a partir de 650 euros, incluindo pequeno-almoço e um
crédito de 120 euros para utilizar nos restaurantes do hotel.
Abril 2013 Fora de Série
71
FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELO ‘RESORT’ E DE CORBIS/VMI
‘chalets’. No exterior, tudo está ‘comme il faut’.
Muitos agricultores e carpinteiros locais recusam-se a vender as suas propriedades a esquiadores ricos,
por mais generosa que seja a sua oferta. Peter, o instrutor de esqui que nos levou ao topo do glaciar Diablerets,
dá aulas de esqui no Inverno e cultiva a terra no Verão.
Para ele é ponto de honra que os terrenos herdados da
família passem para a geração seguinte, os seus cinco
filhos. “A partir do momento em que vendemos os terrenos, nunca mais conseguimos recuperá-los”, diz. Apesar
de ser uma das estâncias mais badaladas, Gstaad consegue manter um charme tangível devido às convicções
de quem quer preservar a memória e a propriedade dos
seus antepassados. Os ricos que aqui compram casa –
ou melhor, um ‘chalet’ – sentem que, apesar de tudo, há
qualquer coisa de genuíno no ar.
Existem perto de 200 agricultores no activo na região, cujas quintas se situam maioritariamente nas faldas da cidade. Vacas é coisa que não falta, uma vez que
atravessam Gstaad a caminho dos pastos. Depois, há a
igreja, com 800 anos, que ainda hoje é o ponto de encontro de locais e visitantes, restaurantes típicos, como o
Café Charlie, onde todos vão tomar café e que é conhecido pelos seus deliciosos – e proibitivamente calóricos
– bolos e pastéis, e o hotel mais antigo da cidade, o Posthotel Rössli, construído em 1823, e um dos poucos sobreviventes do grande incêndio de 1899.
As pistas ficam entre bosques e terreno aberto,
Evasão
MUDAR DE VIDA
Sha significa luminosidade em japonês, nobreza em árabe e ar puro em hindu. Em inglês e para o mundo,
Sha Wellness Clinic é um templo dedicado à saúde e ao bem-estar eleito por celebridades à procura de uma fonte
da juventude. E o incrível é que a encontram, a dois passos de Alicante. T E X T O D E C ATA R I N A PA L M A , E M A L I C A N T E
N
o interior da Sha Wellness Clinic, a
percepção do tempo muda. Os hóspedes são encorajados a esquecer os
maus hábitos do seu antigo quotidiano e a sintonizarem-se em alcançar
um corpo e mente saudáveis. Aqui os
dias passam tranquilos, ao ritmo das consultas, actividades e tratamentos marcados na nossa agenda pessoal
(consultada no iPad fornecido no ‘check-in’) e iluminados pelo céu quase sempre azul da Costa Blanca.
O Sha abriu em finais de 2008 e já recebeu variadíssimos prémios internacionais de “melhor spa” do ano,
de Espanha, da Europa e do mundo. Para confirmar esta fama, tem uma lista de clientes célebres como Naomi
Campbell, Carine Roitfeld, Elsa Pataky, Kylie Minogue
e François Pinault. Mas o que tem este lugar de especial? Não será a localização, pois apesar da bonita vista
panorâmica sobre a charmosa baía de Altea, fica mesmo ao lado de Benidorm, a 50 quilómetros de Alicante,
o que, convenhamos, não é um grande atractivo. A verdade é que Sha não é um hotel com um spa, nem mesmo um spa com um hotel, é uma clínica médica dedicada à saúde e ao bem-estar pioneira no mundo, porque
se baseia na dieta macrobiótica e na fusão da medicina ocidental com a medicina oriental, combinando-as
com poder curativo das terapias naturais e com um tratamento personalizado e muito exclusivo.
UM SONHO TORNADO REALIDADE
Este lugar existe graças à experiência de Alfredo Bataller Parietti, o proprietário, que durante anos seguiu
um tratamento ineficaz com fármacos prescritos pela
medicina tradicional para combater os problemas digestivos que o acompanhavam desde a juventude. “Perante um diagnóstico mais preocupante, o meu pai foi
aconselhado a experimentar uma dieta macrobiótica
que, surpreendentemente, o curou em dois meses”,
72
Fora de Série Fevereiro 2013
AS ACTIVIDADES
Para garantir o sucesso dos tratamentos, os hóspedes
são encorajados a não deixar as instalações da clínica
por iniciativa individual, mantendo-lhes a agenda
ocupada. Todas as manhãs, às oito, a recepção serve
de ponto de encontro para passeios ao ar livre, que
incluem visitas ao farol de Altea, caminhadas na
praia ou passeios nórdicos (com diferentes níveis de
intensidade). A meio da manhã há aulas de pilates,
‘fitness’ aquático e GAP (glúteos, abdómen e pernas).
A seguir ao almoço, é a vez das aulas de cozinha ou
palestras sobre temas como a medicina tradicional
chinesa, produtos macrobióticos ou tratamentos
holísticos. E ao final da tarde, realizam-se sessões de
‘tai chi’, ioga, meditação e alongamentos.
REGR AS BÁSICAS
PAR A UMA VIDA MELHOR
A macrobiótica tem a sua origem etimológica nas palavras
gregas “makro” e “bios”, significando literalmente “grande
vida”. Não é um regime alimentar rígido, mas sim uma forma
sensata de encarar a alimentação, tendo em conta factores
como o clima, a idade e a saúde de cada um. Não há alimentos proibidos, mas sim que devem ser evitados ou reduzidos
ao máximo, como é o caso da carne (com o frango podem fazer-se algumas excepções), leite e derivados (deve ser substituído por leite de aveia, amêndoa e arroz – não de soja),
ovos, cereais refinados, açúcares refinados, refrigerantes
e sumos com aditivos, alimentos processados e café. Já os
cereais integrais, legumes, algas, frutas (sempre da estação
e que cresçam no país/região onde vive), sementes e soja,
desde que fermentada, são permitidos e aconselhados.
As paisagens sobre a baía de Altea são arrebatadoras e
ajudam à estadia. No entanto, para garantir o sucesso
dos tratamentos, os hóspedes são encorajados a não
deixar as instalações da clínica por iniciativa individual.
A agenda é preenchida com várias actividades.
Fevereiro 2013 Fora de Série
73
Evasão
UMA DIETA GOUR MET
“Através de uma dieta baseada no equilíbrio dos alimentos, a macrobiótica ajuda o corpo a curar-se a si próprio,
eliminando as toxinas acumuladas ao longo de uma vida e a
recuperar as suas defesas naturais”. É assim que a macrobiótica é apresentada quando nos sentamos pela primeira
vez à mesa do Shamadi, o restaurante do Sha, cujas ementas são elaboradas pelo ‘chef’ Pablo Montoro, um discípulo de Ferran Adrià que consegue transformar as dietas
prescritas pelos nutricionistas – Kushi (mais restrita), Bio
Light (programa detox) ou Sha (mais ‘gourmet’, com direito
a sobremesas e vinho orgânico) – em experiências de alta
gastronomia, no sabor e na apresentação dos pratos. Um
conceito que, aliás, faz parte da filosofia da Wellness Clinic:
provar que uma dieta saudável pode ser muito atractiva.
E se os três dias que estivemos no Sha não são suficientes
para testemunhar o resultado dos programas específicos,
garantimos que sim, é possível sobreviver alegremente
sem carne, leite, ovos ou café – pelo menos quando temos
na cozinha um ‘chef’ como Montoro. Inicialmente estranha-se que sirvam uma sopa ‘miso’ ao pequeno-almoço (é muito alcalina, purifica o sangue, e tem propriedades desintoxicantes e antialérgicas) ou um espesso creme de arroz integral, mas rapidamente vai habituar-se. Uma advertência:
no segundo dia de dieta podem surgir algumas (ou muitas)
dores de cabeça – a falta de café e de açúcar são os culpados –, mas os sintomas desaparecem rapidamente, dando
lugar a uma incrível sensação de bem-estar.
INICIALMENTE ESTRANHA-SE QUE SIRVAM UMA SOPA
‘MISO’ AO PEQUENO-ALMOÇO MAS DEPOIS
VAI HABITUAR-SE.
conta Alejandro Bataller, o filho mais novo, director
de marketing do Sha. Decidido a entender melhor o
poder auto curativo das terapias naturais, este homem
de negócios de origem argentina começou a investigar, o que o levou até Michio Kushi, o pai da macrobiótica moderna, presidente da Associação Mundial de
Medicina Natural e consultor da OMS. Inspirado por
este encontro e com o apoio dos filhos, Bataller deu início à construção da Sha Wellness Clinic num terreno
de família, sobre a Praia de Albir, e convidou Kushi
para director de medicina natural da primeira clínica
macrobiótica da Europa.
Seguindo um conceito multidisciplinar único, o
Sha coloca à disposição dos seus clientes os melhores
especialistas em nutrição e terapias naturais, utilizando diversas técnicas orientais – acupunctura, ‘shiatsu’, ioga, ‘tai-chi’, ‘watsu’, ‘reiki’, reflexoterapia, meditação – que se cruzam com os conhecimentos de uma
equipa de profissionais na vanguarda das últimas descobertas da medicina preventiva, genética, estética e
anti-envelhecimento.
Existem vários tipos de programas à escolha (anti-stress, anti-tabaco, desintoxicação...), no entanto, à
chegada à clínica são realizadas consultas de avaliação, análises e exames que permitem à equipa médica adaptar a dieta e os tratamentos às necessidades de
cada hóspede.
Mas se os resultados a curto prazo são um objectivo para quem aqui chega, a equipa do Sha pretende ir
mais longe e promover uma mudança de hábitos. Por
isso, todos são convidados a frequentar aulas de cozinha macrobiótica e palestras sobre medicina tradicional chinesa para adquirirem as ferramentas necessárias a um estilo de vida saudável e duradouro. Existe
até um serviço de acompanhamento pós-internamento, o “Sha Coaching”.
PARAÍSO ZEN
Ocupando uma área de 25.000 metros quadrados numa encosta do Parque Natural da Serra Gelada, o Sha
Wellness Clinic é constituído por cinco edifícios inde74
Fora de Série Abril 2013
PROGR AMAS À MEDIDA
O ‘chef’ Pablo Montoro é o responsável pela cozinha do Shamadi,
o restaurante do Sha, e transforma as dietas prescritas pelos
nutricionistas em experiências de alta gastronomia.
pendentes mas comunicantes, num projecto assinado
pelo arquitecto uruguaio Carlos Gilardi, e a ‘designer’
espanhola Elvira Blanco Montenegro. O branco é a cor
denominante no exterior e nos interiores, sóbrios e minimalistas, para transmitir um ambiente de tranquilidade (até porque há hóspedes que permanecem aqui
durante mais de um mês).
Os 2000 metros quadrados de área Wellness, com
40 salas de consultas e tratamentos (onde até a comum
massagem “Deep Tissue” fica na memória) e uma zona ‘aqua-lab’ com piscinas terapêuticas, camas de fisio-hidromassagem e várias áreas ‘chill-out’, confirmam a
aposta num serviço de alto nível. Um tratamento de luxo que se estende aos quartos, na verdade 93 suites com
áreas que variam entre os 80 e os 320 metros quadrados
(da Royal Suite que dispõe de três quartos, sala, cozinha, solário e piscina privada, mordomo, ‘chauffeur’
e serviço de helicóptero por 6000 euros/dia). Seguem-se o elegante Shamadi, restaurante de cozinha saudável onde se fazem as três (e únicas) refeições diárias, as
fotogénicas piscinas exteriores, as cascatas, os jardins
‘zen’ e zonas ‘relax’ com vista para o mediterrâneo.
Com pouco mais de quatro anos de existência, o Sha
já é uma marca de renome mundial. “Fomos contactados para replicar o conceito em outras partes do mundo, mas ainda estamos a estudar essa possibilidade”, diz
Alejandro Bataller, sem disfarçar o orgulho. Tudo graças ao método inovador que reconcilia o corpo, a mente
e o espírito, ensinando-nos a viver mais e melhor.
A Sha Wellness Clinic oferece diversos programas de tratamentos. Existem estadias de dois (500 euros) e de quatro
dias (950 euros), apenas para entender como funciona a
clínica ou relaxar um pouco. Porque, para sentir os efeitos
do método Sha e garantir que estes se mantêm, são recomendadas estadas mínimas de sete dias e, idealmente, com
duração de duas semanas. É o caso do programa “Intensive
Detox & Weigth Loss”, pensado para combater o excesso de
peso, a fadiga e a ansiedade. Entre outras coisas, inclui um
‘check-up’ médico, análises clínicas, consulta de nutrição,
genética e terapias naturais, ‘personal trainer’, dieta macrobiótica, cinco massagens ‘detox’, cinco curas hidroenergéticas, duas sessões de acupunctura, três de hidro-cólon-terapia, uma drenagem linfática, massagens terapêuticas
e três sessões de pressoterapia. O preço é de 3950 euros
por sete dias (o programa de 14 dias custa 6900 euros).
Existem outros programas como o “Anti-Tabaco” (2300
euros/sete dias); o “Sleep Well” (2300 euros/sete dias); o
“Anti-Stress” (1880 euros/sete dias); ou o “Emagrecimento” (2100 euros/sete dias ou 3250/14 dias).
Uma das últimas novidades é o programa de fertilidade,
que custa 12.900 euros e implica duas visitas à clínica, com
um intervalo de dois meses. Destaque especial para o revolucionário “Programa de Rejuvenescimento”, que custa
6000 euros/sete dias ou 10.000 euros/14 dias, e cujo objectivo é atrasar o processo de envelhecimento e reactivar
o potencial de saúde do paciente. Para este fim, é realizado
um teste genético para determinar a idade biológica, que
raramente coincide com a cronológica.
Os programas de estética centram-se em técnicas de rejuvenescimento minimamente invasivas (sem plásticas) e
têm preços que variam entre os 840 e os 4860 euros.
PREÇOS E RESERVAS
Nenhum dos programas propostos inclui o preço do alojamento, que varia de acordo com a suite escolhida:
Deluxe Suite Individual (230 euros/noite); Deluxe Dupla
(290 euros/noite); Suite Superior (desde 450 euros/noite);
Grand Suite (750 euros); Suite Presidencial (2500 euros);
e Royal Suite (6000 euros). Reservas através do site www.
shawellnessclinic.com, e-mail [email protected],
ou pelo telf. +34966811199.
COMO IR
A TAP tem voos directos de Lisboa para Valência (a partir
de 165 euros, ida e volta), que fica a cerca de 130 quilómetros de Altea. O ideal será pedir um ‘transfer’ à Sha Wellness Clinic no acto da reserva.
evasao.com
VO OS
.
D E STIN OS
.
H OTÉIS
.
CO M PR AS
.
VIAG ENS
.
SPAS
.
N OVIDAD E S
www.united.com
.
LO JAS
.
T U D O O N - LI N E
www.pestana.com/pt
A TEMPO E HORAS
NOVAS AVENTURAS
Os meses de Janeiro e Fevereiro, na
United Airlines, foram marcados pela
pontualidade. A companhia aérea
americana superou, pela primeira
vez desde 2003, o patamar dos
80% de chegadas dentro do horário
previsto nos primeiros meses do
ano. A percentagem das chegadas
internacionais dentro do horário
foi de 80,5% e, no caso dos voos
domésticos, o número foi ainda
superior, 80,8%. Como recompensa
pelo trabalho e dedicação, a United
decidiu entregar um bónus de 100
dólares aos colaboradores que
tiveram um melhor desempenho.
O mapa geográfico do grupo Pestana
torna-se cada vez mais global,
marcando agora presença em
Marrocos e na América do Norte, pela
primeira vez. No mesmo ano em que
comemora o 40º aniversário, a maior
cadeia hoteleira de Portugal vai abrir
dois novos hotéis: Pestana South
Beach e Pestana Palace Casablanca.
As cidades europeias e a América do
Sul vão continuar, nos próximos anos,
a ser o alvo para o crescimento da
marca Pestana.
PR IMEIRO BOUTIQUE
CLUB DE LISBOA
www.zaha-hadid.com
AEROPORTO PRECISA-SE
O presidente da Câmara de Londres
anunciou os planos para a construção
de um novo aeroporto no sudeste da
cidade que servirá todo o país, em
especial a capital. A grande notícia é o
facto de o trabalho ter sido entregue
à arquitecta Zaha Hadid. O ‘mayor’
explicou que é necessário um novo
‘hub’ para incentivar a economia
britânica e para dar resposta a uma
concorrência global.
www.restaurante-olivier.com/honra
COMIDA D’HONRA
Foi à sua avó de 86 anos que o
‘chef’ Olivier foi pedir ajuda, quando
estava a criar a sua interpretação
de alguns dos pratos da cozinha
tradicional portuguesa para o seu
novo restaurante, o Honra by Olivier.
Situado na Praça da Figueira, em
Lisboa, o novo espaço foi criado com
o intuito de fazer uma homenagem
ao melhor da gastronomia nacional, a
começar pelos próprios ingredientes
que são produzidos em Portugal.
O Pastel de Nata d’Honra e os
‘cocktails’ com inspiração em bebidas
portuguesas, como o vinho do Porto,
são outras atracções.
Puro Vício é um dos mais recentes ‘spots’ de Lisboa.
Fica em Alcântara e vai ter boa comida e boa música.
Mais argumentos? Só se for a esplanada que
promete abrir com o bom tempo.
Os ‘boutiques clubs’, também conhecidos por ‘design bars’ ou ‘lifestyle bars’,
ganharam notoriedade em grandes cidades como, por exemplo, Londres,
Nova Iorque e São Francisco, e multiplicaram-se depois em vários outros
lugares do mundo. Com uma dimensão significativamente menor do que
a das discotecas, estes apostam, sobretudo, na diferenciação e no serviço
focado no cliente, sempre dentro de ambientes intimistas e acolhedores.
O espaço Puro Vício, situado em Alcântara e assinado pela arquitecta de
interiores Mónica Penaguião, reabriu as suas portas no fi nal do mês de Fevereiro, apresentando-se agora como o primeiro ‘boutique club’ em Portugal.
Este passou a ser composto por três áreas: a do Lisbon Boutique Club, a do
Cocktail Bar e a do Finger Food Bar, onde o ‘chef’ chileno Leo Guzman vai
dar a provar as suas criações de ‘street food international’, como o ‘ceviche’,
as ‘bruschettas’, o ‘fondue’ e os ‘tartars’. Direccionado para um público eclético, exigente e conhecedor, o Puro Vício procura ser o espaço ideal para
beber um copo e petiscar ao fi nal da tarde, ou até pela madrugada fora.
De segunda a quarta-feira, a programação musical convida o público a dançar, à quarta-feira ao ritmo de ‘jazz’ e do ‘house’; à quinta ao som de DJ’s femininas; e à sexta-feira durante ‘one hour only’, o tema da noite. Assim que
o clima o permitir, o passeio em frente vai dar lugar a uma esplanada com
capacidade para 50 pessoas e, no Verão, o Lisbon Boutique Club vai oferecer
‘cocktails’ sensoriais.
Este projecto foi desenvolvido por José Paulo do Carmo e por Sérgio Nóbrega e promete tornar o espaço num ponto obrigatório da cidade de Lisboa e
deixar as pessoas “viciadas” na comida e na qualidade musical.
www.flytap.com
VINHO PORTUGUÊS
EM ALTOS VOOS
A TAP está a criar uma nova carta
de vinhos. Para isso, a companhia
realizou uma prova de vinhos com
9 especialistas, que provaram 40
brancos, 40 tintos e 10 espumantes,
todos eles portugueses, primeiro em
terra, e, depois de selecionados os
melhores dentro de cada categoria, a
bordo de um voo da TAP. O objectivo
era perceber como os vinhos se
comportavam de forma diferente
a 30 mil pés de altitude e que
características é que se tornavam
mais interessantes.
www.longchamp.com
NOVA VITRINA LONGCHAMP
Trata-se do site, em versão renovada,
onde o destaque recai nas imagens
que surgem em formato “ecrã cheio”.
Cada página surge menos preenchida
para que a navegação seja mais
simples e os produtos saltem à vista.
“É um dos primeiros sites no sector
de luxo a integrar o ‘responsive
design’, que oferece uma experiência
de navegação personalizada e
estética a cada visitante”, explicou a
responsável ‘web’ da Longchamp. As
novas “páginas” serão lançadas ao
longo de 2013.
T E X T O S D E C ATA R I N A M O U R A
Abril 2013 Fora de Série
75
Paladares
25 ANOS DE
VELA LATINA
Deveria ter integrado um complexo que incluía uma estalagem
com vista para o Tejo, chegou a ter um ginásio mas foi uma
sala de refeições privada. Ao longo do último quarto de século,
o restaurante Vela Latina tem acolhido empresários, políticos
e diplomatas. Por ali se gizaram planos e traçaram negócios
apenas ouvidos pelas paredes da sala Yacht Club.
T E X T O D E S U S A N A T O R R Ã O / F O T O G R A F I A D E PA U L O A L E X A N D R E C O E L H O
O
s 15 minutos de caminho a partir do centro da cidade são essenciais a
quem marca um almoço de negócios no Vela Latina. Durante esse tempo, ultimam-se os últimos pormenores e trocam-se impressões ao telefone para
que aquele almoço seja o início – ou até o selar – de
mais um bom acordo. A localização do emblemático
restaurante lisboeta, que este ano cumpre 25 anos, é
bem mais do que uma vista privilegiada para o rio,
a Torre de Belém e a outra banda. Aliás, para muitos
dos que já lá passaram tardes inteiras em reuniões de
trabalho, a paisagem é o que menos conta, uma vez
que, por norma, estas têm lugar na sala Yacht Club,
uma sala privada, no interior do edifício, eleita muitas vezes como o escritório fora do escritório.
Curiosamente, aquele que é um dos elementos-chave para a fama do Vela Latina, surgiu como uma
solução de recurso. “A sala Yacht Club não foi pensada de início. Mas o pé-direito do edifício era muito alto entre a entrada e o bar e decidimos fazer um
aproveitamento do espaço com uma sobreloja e uma
sala com capacidade para 18 pessoas. E, logo desde
o início, foi muito procurada! No tempo do governo
de António Guterres chegou a acolher um conselho
de ministros ao longo de uma semana”, recorda António Machaz, um dos sócios que iniciou o projecto.
A família Machaz estava ligada aos hotéis Tivoli,
cadeia fundada por Joaquim José Machaz, pai de António e Joaquim Machaz (dois dos três sócios fundadores do Vela Latina) e avô de Salvador Machaz (filho de Joaquim), que entrou para o negócio depois da
morte do pai, há dois anos.
A família sempre esteve ligada ao mar, desde os
tempos do avô, que tinha uma chata na ria de Aveiro.
Joaquim Machaz tinha uma verdadeira paixão pela
náutica de recreio e era frequentador da Associação
Naval. Foi neste contexto que ele e o irmão, António,
foram desafiados por Manuel Folgado Ramalhete a
lançar um empreendimento à beira rio, junto à Torre de Belém. Pioneiro para a época, do plano inicial
76
Fora de Série Abril 2013
fazia também parte uma estalagem, que deveria ser
instalada no edifício da guarda-fiscal. “O senhor Ramalhete já tinha a autorização para o restaurante e
propôs negócio ao meu irmão”, recorda António Machaz. Avançaram com o restaurante, esplanada, ‘snack-bar’ e um pequeno ginásio que funcionava na cave do restaurante, já a pensar na futura estalagem.
“Mas a abertura coincidiu com a fusão entre a GNR
e a Guarda Fiscal, e o projecto acabou por não se concretizar”, revela António Machaz.
Pouco tempo depois, Manuel Ramalhete abandonou o negócio, a ideia do ginásio foi posta de lado,
mas o restaurante e o ‘snack-bar’ tornaram-se projectos de sucesso que se mantêm até hoje.
Quem vai ao Vela Latina sente que acabou de entrar num mundo de amantes de vela. Nas paredes há
cartas antigas do Porto de Lisboa e, um pouco por todo o lado, há referências ao mundo da náutica de recreio. Nos escritórios, longe dos olhares do público,
está uma imagem do Vela Latina – o antigo veleiro
da família – em prova durante a 4ª Volta a Portugal
à Vela, em 1993, na qual se classificou em terceiro lugar da classe A.
As muitas janelas envidraçadas dão luz ao espaço
e mostram a marina de Belém, os jardins do restaurante – cujas árvores foram crescendo ao longo destes
25 anos, garantindo uma melhor vista da paisagem
– e a foz do rio. O ambiente é clássico, intemporal e
intimista, o que convém a almoços que se querem, ao
mesmo tempo, agradáveis e discretos.
R ESTAUR A NTE DO PODER
Desde a sua génese que o Vela Latina surgiu ligado
ao mundo da política e dos negócios. A qualidade é a
carta apresentada pelos sócios como principal trunfo do espaço: “Buy the best and you’ll have less labour to make it good (compra o melhor e terás menos trabalho a torná-lo bom”, é o lema seguido desde
sempre por António Machaz.
Mas a existência de uma sala reservada com capacidade para quase duas dezenas de pessoas, também
é determinante. Pela sala do Yacht Club passam governantes, empresários, por vezes em reuniões conjuntas, diplomatas e gestores. Foi assim desde o início e a tendência está para durar. O Vela Latina sempre foi visto como um “restaurante do poder”. Parcerias que viriam a dar que falar, negócios que acabaram nas primeiras páginas dos jornais – por boas e
más razões – começaram a ser pensados a dois passos
da Torre de Belém.
Manuel Costa Lúcio (em cima) é o chefe de sala do Vela Latina há 23 anos
e tem sido testemunha discreta de vários acontecimentos. Sabe que
muita coisa importante foi decidida ali mas manteve sempre a discrição,
jamais quebra a confiança que os clientes depositam nele. “Os clientes
têm muitíssima confiança em mim e há um código de conduta que tem
que ser mantido (...) não transpira nada”, garante.
Abril 2013 Fora de Série
77
Paladares
Os filetes de pescada ou os fígados de aves em tarte de maçã são
dois clássicos da cozinha do Vela Latina, que há 22 anos está sob a
supervisão do ‘chef’ Benjamin Vilaças (à direita).
Manuel Costa Lúcio, chefe de sala do Vela Latina há 23 anos, tem sido testemunha discreta de todos estes acontecimentos. “Há certas coisas que não
digo a ninguém”, assegura. “Os clientes têm muitíssima confiança em mim e há um código de conduta que tem que ser mantido. Em certas alturas, não
deixo entrar na sala qualquer pessoa. Não se interrompem as conversas, não transpira nada. Os maiores negócios que vi fazerem-se no Vela Latina foi na
sala privada”, conta. Em reuniões que por vezes começam à hora de almoço e se estendem até já depois
do cair da noite, há momentos que nem o chefe Lúcio pode testemunhar. “A partir de uma certa altura, dizem: daqui por meia hora não quero ninguém
aqui. Eu mantenho-me sempre em contacto visual,
para que me possam avisar quando já é permitido
entrar”, explica.
Em mais de duas décadas de casa já lhe pediram
para confirmar a existência de aparelhos de escuta
na sala e já ouviu, em primeira mão, muitas das histórias que marcaram a política e a economia nacionais nos últimos 20 anos. Mas o chefe Lúcio é um poço de discrição. “Por vezes ouço coisas que não digo
nem aos meus colaboradores mais directos. Mas saio
daqui e esqueço tudo! Bom… tudo, tudo, não, que há
coisas difíceis de esquecer”, admite com algum humor.
As mais de duas décadas passadas no Vela Latina
permitiram a Manuel Lúcio conhecer quase de cor os
hábitos dos clientes mais antigos. “Sou eu que lhes
escolho o prato, o vinho, e se vêm duas ou três vezes
por semana e eu sei que comeram determinado prato
num dia, já sei que no outro será escolhido um outro
prato que é costume pedir e, de antemão, vou preparar o vinho adequado. É algo que raramente falha”,
afirma o chefe de sala.
MESA S PER SONA LIZA DA S
Não foram só as refeições a ganhar adeptos incondicionais. Há mesas que, de tão escolhidas, já têm “dono”. Há a mesa de Francisco Pinto Balsemão, a mesa
da Embaixada da Indonésia, ou a mesa de Marques
Mendes – que mudou quando o político deixou de
fumar. As preferências de cada um têm, sobretudo,
a ver com a privacidade. “As pessoas gostam de estar descansadas a falar. E quando há clientes que sei
que conhecem certas pessoas, não os coloco em mesas contíguas”, diz Manuel Lúcio. “E depois também
há os clientes vaidosos que gostam de dar nas vistas.
E esses sabemos onde os temos que pôr: no meio da
sala”, refere. É algo que acontece mais no meio empresarial e, por norma, coincide com bons momentos da vida das empresas. Ao longo dos quase 24 anos
que tem de casa, o chefe de sala tem acompanhado a
vida de muita gente: namoros, casamentos, filhos e
até algumas traições e divórcios.
Ao longo de todo este tempo, por ali passaram figuras de proa da vida política nacional e internacional. Durante os acordos de Bicesse, era ali que, muitas das vezes, os diversos intervenientes almoçavam.
Quando está em Lisboa, Durão Barroso não perde os
filetes de pescada e Manuela Ferreira Leite, Jorge Coelho, Jorge de Mello (cujo pai, Alfredo, já lá ia) ou Basílio Horta também são presenças habituais. Por ali
também já passaram Xanana Gusmão e Ramos Horta, o antigo-presidente Joaquim Chissano e o ex-presidente da Guiné Bissau, Kumba Ialá, que assinou o
livro de honra.
Paulo Morgado, administrador delegado e ‘senior
vice-president’ da Capgemini, é hoje um dos clientes habituais. “Devo ter descoberto o Vela Latina em
1995 num almoço ou jantar de trabalho, e vou lá assiduamente”, conta. Valoriza a boa relação qualidade/
78
Fora de Série Abril 2013
HÁ A MESA DE FR ANCISCO
PINTO BALSEMÃO, A
MESA DA EMBAIX ADA DA
INDONÉSIA OU A MESA DE
MARQUES MENDES – QUE
MUDOU QUANDO ESTE
DEIXOU DE FUMAR.
preço, o “conjunto de empregados já bastante antigo
que conhece os hábitos e preferências de cada um,
o que dá um certo conforto a quem lá vai”, o menu
e o estacionamento. Mas o maior louvor vai para o
nível de qualidade e para os empregados: “Cada vez
mais as casas com alguma tradição são valorizadas
e o nível de qualidade é o mais importante. Às vezes,
numa altura em que tudo muda todos os dias, haver
este tipo de lugares, acaba por funcionar como um
porto seguro”.
Maria Eduarda Monteiro Grillo vive actualmente
em Abu Dhabi, onde o marido é embaixador, mas a
cada vinda a Portugal visita o Vela Latina: “É o meu
sítio de eleição”. A decoradora elege o restaurante
para “matar saudades da boa comida portuguesa, requintada e com serviço cinco estrelas”, de preferência numa das mesas do ‘deck’. É talvez das clientes
mais antigas do Vela Latina, que recorda o espaço
ainda a dar os primeiros passos: “Lembro-me das expectativas criadas à volta desse novo projeto da família Machaz, de tantas tradições hoteleiras em Portugal, encabeçada pelos então jovens Quim e Tó Machaz. Foi um sucesso, uma referência de boa gastronomia que os mais novos conseguem manter”.
LOCA L DE TERTÚLI A
À noite, o Vela Latina é local de jantares intimistas e
encontros familiares e, desde sempre, foi local de vá-
rias tertúlias. A mais antiga é a do Benfica, que reúne
vários membros da direção de Manuel Damásio. Há
também a tertúlia do grupo de um MBA da Universidade Católica e, em tempos, houve uma associada à
Lisgráfica, na altura liderada por João Ruella Ramos.
Depois da morte do sócio da Lisgráfica, os amigos homenagearam-no com uma placa que hoje está na sala Yacth Club. Gisela Lopes, responsável pelo agendamento dos jantares de grupo, está no Vela Latina
desde 1992, onde chegou como secretária da administração, depois de passar pelos hotéis Tivoli. É ela
quem garante que, logo no início do ano, a sala Yacht
Club já tem marcações feitas até Dezembro, para os
dias das reuniões das tertúlias.
Ao contrário do que acontecia há 25 anos, hoje o
Vela Latina é procurado por mais turistas e recebe
mais almoços e jantares de grupo, alguns especiais.
“Há dois anos, uma das nossas clientes fez 90 anos e
a filha, que está nos Estados Unidos, decidiu organizar-lhe um jantar surpresa. Antes, marcou-lhe um almoço com uma amiga, no qual lhe servimos a ementa escolhida para o jantar de aniversário, sem que ela
soubesse. No fim, perguntei-lhe a opinião e ela deu
algumas sugestões, que eu apontei. Só quando chegou o dia do aniversário é que ela se apercebeu que
tínhamos estado a ultimar os pormenores da ementa
alguns dias antes. No fim disse-me: ‘Então, sabia de
tudo e não me disse nada?!’”, conta Gisela.
MUDA M-SE OS TEMPOS
Em 25 anos o Vela Latina assistiu a uma pequena
revolução nos hábitos alimentares. “As pessoas não
comem o que comiam nem bebem o que bebiam”,
afirma Salvador Machaz. Os ‘whiskeys’ no fim de um
almoço de negócios quase desapareceram e, em alguns, a água é a única bebida servida à refeição. “Antigamente, em quatro pessoas, vendiam-se dois aperitivos, ao longo da refeição bebiam-se pelo menos
duas garrafas de vinho e, com os cafés, pelo menos
A CABEÇA
E O COR AÇÃO
Chefe Manuel Lúcio e ‘chef’ Benjamin Vilaças
são dois elementos-chave para o sucesso
do Vela Latina. Conheça o percurso de
dois homens que acompanham a história
do restaurante há mais de 20 anos.
O ‘CHEF’ DE COZINHA
Benjamin Vilaças cresceu em Angola, onde viveu com
os pais até aos 12 anos, mas é transmontando, de Souto
Maior, concelho de Sabrosa. Durante a infância veio duas
ou três vezes a Portugal. “Era um choque… o clima e o
choque cultural também. As férias eram três ou quatro
meses e lembro-me de fazer um mês ou dois de escola.
E era muito diferente: tudo mais fechado, o recreio mais
violento, parecia um filme!”, recorda.
Regressou a Portugal, e a Souto Maior, em 1975. Mas na
altura ninguém lhe adivinhava o futuro como ‘chef’. “Sou
um bom garfo, só não gosto de duas ou três coisas: cebola
cozinhada, café e pouco mais”. A cozinha aconteceu por
acaso. Veio para Lisboa com 19 anos, já depois de ter
vivido quatro ou cinco anos na aldeia, onde ainda fez
o 11º ano. “Há momentos de decisão. Os tempos hoje
são difíceis mas na altura eram bem mais e eu tive que
me fazer à vida. Fui experimentando várias coisas e fui
parar à cozinha do Hotel Fénix, que deveria ser mais um
emprego de passagem. Mas acabei por ficar lá uns bons
quatro anos, saí com 23 anos, no ano em que me casei”.
Abriu um pequeno restaurante na margem sul, mas
passados dois anos decidiu voltar à profissão e “tentar
chegar ao topo”.
Arranjou emprego no Apolo 70, onde esteve meio ano
como sub-‘chef’. Passou por mais alguns sítios e acabou
por entrar para a cozinha do Vela Latina para dar apoio
ao ‘chef’ da altura. “Parecia-me muito longe… estava
habituado a trabalhar no centro de Lisboa. Ainda estavam
a construir o CCB e isto parecia-me um bocado fora de
rota. Vim com a ideia de ficar meio ano”. Ficou até hoje.
Gisela Lopes (em cima) é a responsável pelo agendamento dos
jantares de grupo do Vela Latina, desde 1992. A sala Yacht Club é
a que mais trabalho lhe dá, já tem reservas feitas até Dezembro.
um digestivo vendia-se. Hoje as pessoas vão ao bar,
por vezes não bebem nada, evitam o vinho e as sobremesas – evitam o açúcar. O que conseguimos vender são os nossos pastéis de nata, que são muito afamados, a acompanhar o café”, explica Manuel Lúcio.
Actualmente, um almoço de negócios típico consta de uma entrada leve, seguida de um peixe grelhado. Antigamente eram escolhidos pratos mais consistentes e elaborados, à base de carne. Contudo, há
um conjunto de clássicos, como os filetes de pescada
ou os fígados de aves em tarte de maçã.
Por trás da criação destes e de outros pratos está o
‘chef’ Benjamin Vilaças, há 22 anos na cozinha do Vela Latina. Quando chegou, o estilo da ementa já estava desenhado e o desafio a que se propôs foi manter o
estilo e apresentar uma carta sempre renovada. Isto,
ao mesmo tempo que lidera uma equipa que fornece, em simultâneo, o restaurante e o ‘self-service’. “É
uma cozinha única, não é fácil. Exige muito trabalho
e muita dedicação e uma equipa extensa e competente”, afirma Benjamin Vilaças.
Não restam dúvidas a Benjamin Vilaças – ‘chef’
que não gosta de cebola cozinhada e do sabor do café
– que as principais mudanças na alimentação começam na cozinha, por adaptação aos tempos e aos ventos que sopram do estrangeiro. “Começam a introduzir-se outras texturas, outros aromas e paladares, e o
cliente adere. Aqui há uns 15 anos eliminámos tudo
o que era peixe de segunda linha. Foi uma decisão caríssima. Um restaurante que habitue o cliente ao peixe fresco, cozinhado com todo o cuidado e com guarnições simples, quase não precisa de muita variação.
Mas vou introduzindo alterações e depois o cliente
faz a triagem”, conta.
Em 25 anos o país mudou. Quando Benjamin chegou ao Vela Latina seria impensável criar pratos com
‘foie gras’. “Nessa altura pediam-nos 150 euros o quilo para importar ‘foie gras’. Só com a abertura das
fronteiras, dos mercados é que se tornou mais acessível. Nesse ano produzi um prato, Fígados de Aves em
Tarte de Maçã, que originalmente era para ser feito
com ‘foie gras’. Foi uma solução de recurso que resultou extraordinariamente bem e que se tornou um
clássico”, relata o ‘chef’. A terrina de ‘foie gras’, que
criou depois de um estágio com Alain Ducasse no
restaurante Luís XV, no Mónaco, também seria impensável nos primeiros tempos no Vela Latina. Por
outros motivos, se na altura apresentasse o ‘sashimi’
de atum braseado, o mais normal seria que os clientes não aderissem. “O bife de atum tinha muita fama
na cozinha portuguesa mas era cozinhado em excesso, como se fosse um bife de carne. Hoje passou a cozinhar-se mal passado, ao estilo japonês”.
Para os próximos anos do Vela Latina, os sócios
querem continuar a apostar na qualidade e na tradição, sem contudo deixar de inovar. Já este ano, abrirá
uma nova esplanada, afecta ao ‘self-service’, virada
para o rio e para a Torre de Belém, que estará aberta de Março a Outubro. No restaurante, a equipa que
está na casa desde sempre continuará a adivinhar as
preferências de quem frequenta o Vela Latina e a assistir em primeira mão, e com a discrição de sempre,
às decisões que constroem o futuro do país.
Abril 2013 Fora de Série
79
FOTOGRAFIAS DE COMIDA DE TELMO MILLER
Manuel Lúcio é alentejano, de Entradas, entre Beja e Castro
Verde. Aos 14 anos veio para Lisboa, andou por várias
casas de pasto até chegar ao Hotel Franckfort, no Rossio,
propriedade de Alexandre Almeida. Recorda-o como um
“hotel de terceira, muito bonito, com a sala de jantar no
primeiro andar que dava para a Praça da Figueira”. Foi
nessa altura que passou a frequentar a escola de hotelaria,
indo às aulas de manhã, antes do trabalho. Seguiu-se um
estágio no Hotel Palácio do Estoril, onde ficou dez anos.
Depois, esteve na Suíça – onde se arrepende de não ter
ficado – e chegou há 23 anos ao Vela Latina.
Quem o vê, circunspecto, andando pela sala do
restaurante, está longe de pensar que está na presença
de um atleta. Mas Manuel Lúcio adora andar de bicicleta.
Aos domingos, no Inverno, depois de se juntar com os
amigos em Corroios, vai pedalar para a mata da Apostiça.
No Verão, por estrada, faz mais de 100 quilómetros,
de Setúbal vai até ao Montijo, Alcochete, até regressar
ao Laranjeiro, onde vive. “No Inverno, a lama e aquela
chuvinha é que dá gozo!”, diz. À bicicleta, junta a natação e
chegou mesmo a praticar triatlo.
Motores
PORQUÊ CONTENTAR-SE
COM MENOS QUANDO
TEM O XF À SUA ESPERA?
A mais recente versão do Jaguar XF tem um maior impacto visual e alia elegância e avanço
tecnológico. T E X T O D E S A R A P I T E I R A M O TA
CONSUMOS DE FAZER INVEJA
Apesar dos 200 cavalos de potência, este “felino” de
quatro rodas consegue, mesmo com uma utilização
mais enérgica em cidade, manter-se no patamar que
vai dos 7 aos 8 litros aos 100 km. Consumos que, para um carro grande, largo e pesado, são bastante razoáveis. Se se tratar de um condutor preocupado com
a poupança nos consumos, é possível consegui-los
inferiores a 7 litros de gasóleo em meio urbano. Em
auto-estrada, com velocidade estabilizada, o XF 2.2 D
está de parabéns pois regista consumos entre os 5 e
os 6 litros aos 100 km.
Ainda a destacar neste XF é a caixa de velocidades automática de oito relações, que o grupo partilha
80
Fora de Série Fevereiro 2013
em diversos modelos. A caixa, que dispõe de comandos sequenciais no volante, é accionada pelo botão
rotativo que se eleva na consola central assim que o
motor é ligado. Um pormenor que torna a condução
do XF bastante agradável, além de ser muito fácil de
utilizar. A direcção assistida do XF é sensível à velocidade, o que permite que o seu curso diminua quanto mais depressa andar o veículo. Esta característica
aliada ao controlo dinâmico de estabilidade torna o
XF num excelente carro de estrada, capaz de percorrer longas distâncias sem dar fadiga ao condutor.
Ao nível dos acabamentos, como seria de esperar,
o XF 2.2 D não desilude. O requinte dos detalhes está
à vista em todo o habitáculo. Destacam-se as saídas
dos ventiladores retrácteis do ar condicionado, a patilha metálica cromada do travão de mão eléctrico, a
pele dos estofos ou as madeiras utilizadas. Tudo materiais de alta qualidade.
FELINO XF É PRODUZIDO
NA ÍNDIA
No início deste ano, a Jaguar Land Rover (JLR) transferiu a produção do Jaguar XF para as suas instalações em
Pune, na Índia, com componentes provenientes da fábrica de Castle Bromwich, em Birmingham, Inglaterra. O XF
equipado com o motor diesel de 2.2 litros, é uma estreia no
mercado indiano.
Rohit Suri, vice-presidente da JLR, explicou que o Land Rover Freelander 2 e o Jaguar XF são os modelos mais vendidos no seu mercado, como tal seria lógico que fossem produzidos na Índia. “O Jaguar XF tornou-se extremamente
popular devido às suas prestações desportivas, elegância
e linhas contemporâneas. O seu motor e tecnologia tornaram-no merecedor de mais de cem galardões internacionais”, referiu o gestor.
A fabricante JLR vai também investir 575 milhões de euros no Centro de Produção de Motores no Reino Unido e
contratar 1400 novos funcionários, tendo como objectivo
produzir os novos motores de quatro cilindros. Os motores
ainda estão em desenvolvimento e a produção começará
em 2015. “Como parte da estratégia a longo prazo da JLR,
desenharemos, criaremos e fabricaremos toda uma nova
gama de avançados motores. Trata-se do maior compromisso feito pela companhia até à data e produziremos
motores inovadores e altamente eficientes para os futuros
modelos da JLR”, sublinhou Ralf Speth, CEO da Jaguar.
FICHA TÉCNICA
Jaguar XF 2.2 Diesel Premium Luxury
Motor
Cilindrada
Potência
Velocidade máxima
A Jaguar redesenhou alguns detalhes do XF e fez um ‘upgrade’ do
motor 2.2 diesel, cuja potência foi elevada para os 200 cavalos.
P.V.P. (preço base 45.854 euros)
com extras
Diesel
2179 c.c.
200 CV (140 kw) EEC
225 Km/h
70.007,60 euros
FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELA MARCA
A
s “más línguas” que disseram que a
marca Jaguar teria um futuro incerto
depois de passar das mãos da gigante
norte-americana Ford para o grupo
indiano Tata, enganaram-se. O grupo
Tata, dono da Jaguar Land Rover, está
determinado em manter os seus modelos na vanguarda da tecnologia automóvel. E, como resposta às exigências dos mais sofisticados clientes, redesenhou alguns detalhes exteriores do XF e fez um ‘upgrade’ do
motor 2.2 diesel, cuja potência foi elevada de 190 para
200 cavalos, mantendo consumos muito interessantes. Como resultado destas alterações o XF ficou ainda
melhor, mantendo preços bastante competitivos para o segmento em que se insere. E não existem dúvidas de que estas alterações, ainda aperfeiçoam mais
a mistura entre o luxo e o conforto ao mesmo tempo
que mantêm o carácter desportivo do XF.
Crónica
Sulistas Elitistas e Liberais . Rodrigo Moita de Deus
PEQUENO MOME
MOMENTO
DE BLASFÉMIA
IA GEOGRÁFICA
GEOGR
S
ão só alguns exemplos. Zoroastro, Moisés,
Maomé, Isaías ou Siddharta. Todo
os eles
têm em comum Deus e uma montaa nha.
A revelação fez-se entre a peregrinaçção e
o alpinismo. Mas podemos ir mais long
nge.
Dos livros sagrados à literatura ‘pop’. “O Profeta”, de
Kahlil Gibran, descobriu Deus na montanha. O “Alquimista”, de Paulo Coelho, encontrou Deus na montanha. Toda a gente encontra Deus na montanha. Dêem-me uma serra e eu dar-vos-ei um profeta. E fica
estatisticamente comprovada a relação entre os acidentes geográficos e a Fé. Quanto mais alto, maior a
revelação. Quanto menos oxigénio, maior a religiosidade. E o contrário também é verdade. Norte do país,
acidentado logo religioso. Alentejo, longas planícies
logo comunistas. Não há mensageiros de Deus em
países planos. Não há introspecção na planura. E por
isso a Holanda é um país de ateus.
UMA QUESTÃO DE ESCALA.
O tesoureiro do Partido Popular Espanhol foi apanhado com 22 milhões na Suíça. Esqueçam. Este não
é um momento de moralidade ou ética. A minha ética ficava-se logo nos 5 milhões. Talvez nos três. A
questão não é essa. Vai para além disso. É que em Espanha, tudo é grande. Tudo é à grande. E estar em Elvas com Badajoz à vista é sempre pouco lisonjeiro.
A comparação é sempre muito pouco abonatória. O
director de urbanismo da Amadora é apanhado com
75 mil euros na conta. Vara é apanhado com caixas
de robalos. Isaltino com duzentos mil euros. Até no
Monte Branco o valor não passa dos nove milhões.
Mas em Espanha... Ah! Espanha! Vinte e dois milhões de euros. Os grandes de Espanha fazem à grande e à espanhola. Vinte e dois! Isto sim é um val
valor. Se
é para roubar, então vinte e dois. Se é para nos conscons
purcarmos no lamaçal da corrupção,
pção, então vinte e
dois. Vinte e dois. É daqueles núm
úmeros que dá sempre
para dormir bem à noite.
82
Fora de Série Abril 2013
FUI PENHORADO
Pago alguns milhares de euros por ano de impostos.
Há pouco mérito nisso. Apesar de tudo, todos os anos
sou chamado para ir mostrar papéis que nunca encontro. Tipo obsessão. Este ano já recebi 11 cartas. Nenhuma namorada me escreveu tanto. Mesmo as mais furiosas. Em jeito de vingança, quase todos os anos tenho um pequeno conflito institucional. Discuto, reclamo, escrevo. E discuto outra vez. Tive até alguma
felicidade quando descobri que me cobravam imposto
de circulação de duas motas roubadas há mais de uma
década. Menos felicidade quando descobri que não podia descontar a pensão de alimentos dos miúdos porque não tinha um acórdão de tribunal. E reclamei e
reclamei e reclamei. Da última vez que tentei ir às Finanças tirei a senha 145. Estava no número 32. Desisti.
Por um lado ainda bem. Da penúltima vez que tentei
ir às Finanças saltei para o outro lado das mesas para
tentar bater no homenzinho.
A demora é incentivo à produtividade: quer pagar
impostos sobre o seu trabalho? Então tire um dia de férias e venha até cá. E reclamei e reclamei e reclamei. Reclamei mais ainda quando me explicaram que tinha de
pagar para reclamar. Avisei que não pagava e eles avisaram que me penhoravam. Ganharam eles. Penhoraram-me a conta bancária, o ordenado e outros rendimentos.
Em causa 300 euros. Mais juros. Penhoraram-me três ou
quatro vezes o valor em causa. Posto isto, olho para as
Finanças com um misto de ódio e admiração. Num Portugal onde a administração central não funciona, as Finanças são um zeloso exemplo de eficácia. São, aliás, a
única coisa que funciona no país.
PESADELOS
Vejo na televisão Teodora Cardoso a falar sobre as contas públicas. Reconheço o género e o estilo. Vejo a minha
professora de estatística. Ela e o rebuçado de mentol na
boca. Sentada numa camilha com ‘napperon’ em cima.
Já tive pesadelos com Teodora Cardoso.
Download

quatro paredes despidas e uma vida cheia - Económico