O Circo
de
Bruno Eduardo de Urbano Seco Coelho
2007
Voz-Off:
Senhoras e senhores, meninos e meninas... bem-vindos ao maior espectáculo do mundo!
Pedimos a vossa mais calorosa, entusiástica e acolhedora salva de palmas para ...
Os artistas!
(Entrada dos 2 personagens M: mulher, e H: homem.
Um deles toca uma salva num bombo o outro desempenha acrobacias diversas, por exemplo, faz a roda,
dá cambalhotas e executa outros tipos de piruetas, procurando que estas sejam sempre o mais
espantosas possíveis. Podem fazer as acrobacias alternadamente ou estas podem ser executadas por
apenas um deles sem que o outro largue o bombo, ou faz outras acrobacias sendo que o outro elemento
o acompanha musicalmente com uma pandeireta, por exemplo, o tocador de bombo pode realizar uma
breve dança com fitas de ginástica rítmica ou de bolas com fitas.
De qualquer modo, para finalizar o momento introdutório, a pandeireta e o bombo tocam em conjunto e,
de costas voltadas, cada um deles canta para um dos lados do público.)
H:
A história...
M:
Vamos começar...
H:
... a contar-vos...
M:
... o que se passou ...
H:
... é de tempos imemoriais.
M:
... quando ele a ela o encontrou.
H:
Na memória...
2
M:
Aqui neste lugar...
H:
... vai vos ficar...
M:
... a peça que ganhou,...
H:
... a vontade de saber mais.
M:
... ouçam o que diz quem a decorou.
(Param de tocar e pousam os instrumentos.
Começam os dois a andar em círculo, numa posição diametral relativamente um ao outro.
Percorrem vários círculos completos enquanto sopram bolas de sabão para o ar, com pequenos estojos
portáteis e se entreolham.
Devem exagerar nos esgares do rosto para com isso comunicar ao público que já se aperceberam que se
entreolham.
Então H começa a atrasar o passo e M a acelerar o seu até que chocam um com o outro.)
M e H:
Desculpe!
(Em simultâneo.)
M:
Eu pensei que...
H:
Por acaso...
(Pausa.)
(Em simultâneo.)
M:
Porque quando...
3
H:
Estava agora...
(Pausa mais demorada)
(Em simultâneo.)
M:
É...
H:
A...
(Pausa ainda mais demorada.
Sorriem envergonhados um para o outro. Com gestos a M pede licença para falar primeiro ao que H
concorda. Enquanto conversam M vai fazendo bolas de sabão.)
M:
Permita-me que me apresente, sou M.
H:
Muito prazer, H.
M:
Queria apenas reiterar o meu pedido de desculpas.
H:
Oh! Não tem qualquer importância, eu é que lhe devo desculpas, por me encontrar no seu caminho.
M:
Sugiro então que façamos a troca. Aqui tem as minhas desculpas.
(M estende as palmas das mãos juntas na direcção de H que retribui o gesto.)
H:
Não tem de quê! E eu retribui, o oferecendo-lhe também as minhas desculpas.
4
M:
Desculpas aceites. Muito bem! Agora parece-me justo! Recebeu as minhas desculpas e entregou-me as
suas. Já não temos qualquer divida um para com o outro...
H:
Pois não... está tudo saldado, aquilo que me deu, recebeu de volta por igual...
(Pausa)
M:
Bom...
H:
Bem...
(Começam a afastar-se, relutantemente, como se tivesssem de se despedir mas fossem incapazes de o
fazer.)
M:
Já agora!
H:
Sim diga!
M:
Fiquei sem saber por que se encontra por aqui...
H:
Ah, isso tem uma resposta fácil sou um aventureiro!
M:
Ena, um aventureiro, isso parece engraçado!
H (com alguma soberba):
Sim, é um trabalho interessante mas as horas são péssimas...
M:
Ai é?
5
H:
Sabe, ser um aventureiro envolve-nos por inteiro.
A vida pública e a privada, a profissional e a particular tornam-se uma e a mesma.
Quando acordo sou um aventureiro, tenho um dia inteiro pela frente para ir ao encontro das aventuras, o
que faço com afinco e diligência e, mesmo ao adormecer, mantenho o mesmo, preparo-me para explorar
os meus sonhos.
O quotidiano de um aventureiro torna-se uma permanente exploração e descoberta.
O que não deixa de ser desgastante. Às vezes apetecia-me poder ser outras coisas...
E tu o que é que fazes?
M:
Eu? Já te mostrei. Aliás, desde que aqui estamos não tenho feito outra coisa...
Faço bolas de sabão!
H:
Sim, já sei, eu também, mas eu falava do que fazes para ganhar dinheiro.
M:
Ganhar dinheiro?
H:
Nunca pensaste utilizar algum dos teus talentos, porque não deves ter só um talento, para ganhar
dinheiro?
Nunca os utilizaste para ter rendimentos?
M:
Rendimentos?
H:
Sim, uma fonte regular de dinheiro. Dinheiro que todos precisamos, para poder comprar as coisas que
não temos.
M:
Mas quando eu preciso de mais, faço outras bolas de sabão... queres ver?
(Faz mais bolas de sabão)
6
M:
Tenho todas as de que preciso.
(M retira uma argola de ferro de aproximadamente 40 cm de diâmetro de um recipiente com o preparado
de àgua, detergente e glicerina. Começa a suavemente abanar a argola, nunca permitindo que o sabão
se torne uma bola, mas deixando-o tornar-se côncavo, ora para um dos lados da argola ora para o outro)
M:
Para mim fazer bolas de sabão é como respirar.
Uma ténue membrana ondulante transita para um lado ou para o outro dos seus limites... inspira... expira...
inspira... expira... e descontrai...
(Completa a bola, deixando que ela paire e contempla-a. Antes que esta rebente H interpela-a.)
H:
Está bem, está bem mas, não tens outras aspirações? Não tens sonhos que gostarias de concretizar?
(M faz uma pausa pensativa)
M:
Por acaso até tenho!
H:
Ah! Eu sabia, todos nós temos! Temos vontades e procuramos respostas, queremos fazer cada vez
melhor, receber a admiração dos outros e encontrar-nos orgulhosos de nós mesmos.
M:
Os sonhos fazem-me lembrar bolas de sabão.
(faz mais bolas)
Por isso gosto de os ter.
H:
Contas-me quais são os teus sonhos? Espera, espera, conta-me antes apenas o maior dos teus sonhos.
Aquele sonho onde todos os outros encontrariam, o lugar perfeito para eles se realizarem, onde te
sentirias a ser permanentemente, realizando todos os teus anseios, onde te sentirias em plena.
M:
Gostava de ter um circo!
7
H:
Um circo!?
M:
Sim! Sabes, uma tenda gigante
(faz uma bola de sabão sobre a sua cabeça)
para albergar todos os artistas que, sob a protecção desta tenda, podiam desenvolver os seus talentos.
Aprender uns com os outros, os seus ofícios e saberes e partilharem com o público a sua arte.
H:
Vês, para isso precisas inevitavelmente de capital.
M:
Mas tu não disseste que o que eu precisava era de dinheiro?
H:
Dinheiro e capital são a mesma coisa. O dinheiro tem muitos nomes, pode ser moeda, numerário,
rendimentos, a riqueza, o capital, as finanças...
Bom! O importante a saber, e como nunca é demais saber, é a função que o dinheiro tem.
O dinheiro foi a forma que as pessoas estabeleceram, acordaram entre si, para atribuirem um valor às
suas actividades.
M:
É um intermediário!
H:
Precisamente! Algo que está no meio entre duas ou mais pessoas.
M:
Isso quer dizer que, tal como o sabão, o dinheiro é uma fronteira.
(faz uma bola de sabão)
Dos dois lados há ar, o interior e o exterior.
(rebenta a bola)
São em tudo idênticos, o ar interior e o exterior.
(faz outra bola de sabão)
Apenas a bola de sabão permite que se distingam.
É o sabão que cria o que está contido, o ar que a bola tem ou não.
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H:
Assim como o dinheiro cria o valor.
Este valor é aquilo que a pessoa tem ou pode ter.
M:
Pode ser pouco
(usa o instumento portátil para fazer uma bola pequena)
ou muito,
(faz uma bola grande com a argola de ferro)
mas na essência é sempre o mesmo.
H:
Exactamente!
M:
Seja muito ou pouco o dinheiro tem sempre limites.
H:
E como nas bolas de sabão, nada aparece simplesmente feito, na origem é sempre necessário alguém
que faça com que as coisas aconteçam.
M:
Alguém tem de soprar para que haja bolas de sabão.
H:
E alguém tem de sempre fazer algo para que as coisas aconteçam, para que existam as coisas que
compramos.
As pessoas trabalham. Em troca deste investimento em tempo e esforço que colocaram no trabalho,
recebem uma quantia equivalente, seja esta muito ou pouco.
M:
Isso quer dizer que é necessária muita inteligência e segurança na forma como investimos o nosso tempo
e esforço.
Porque sempre que eu estou a fazer uma bola pequena
(M faz uma bola de sabão pequena)
não posso estar a fazer uma grande.
(H faz outra bola de sabão)
9
H:
Realmente temos de ser prudentes ao escolher a nossa profissão. Grande parte da nossa vida envolve o
trabalho que fazemos. Ao dinheiro que se recebe pelo trabalho dá-se o nome de remuneração.
(H faz outra bola de sabão)
M:
E este salário é o que as pessoas depois utilizam, para adquirir bens e serviços de que eles ou a sua
família necessitem.
(M rebenta a bola que H fizera e faz outra sua)
O dinheiro é uma recompensa, é preciso merecê-lo para se receber. Mas tem de ser uma constante.
(faz uma série de bolas de sabão)
(H faz bolas de sabão sucessivas mas pausadamente, uma a uma, tentando manter o maior número de
bolas suspensas)
M:
Quando desaparece uma já ter outra formada que a substitui.
H:
Mas nunca devemos esquecer o dinheiro não vale nada por si só.
M:
Como uma bola de sabão...
(M rebenta a bola que H fizera ou que ela tenha feito antes de falar)
H:
O dinheiro existe como um meio, é o intermediário, como tu ainda agora disseste, para atingir um fim.
Para ser gasto em bens e serviços que sejam necessários ou que dão prazer.
(M faz uma bola e mantêm-a a flutuar)
M:
E existem tantas formas de utilizar o dinheiro quantos tamanhos de bolas de sabão.
(sopra com a argola pequena fazendo, expectavelmente, várias bolas de diferentes dimensões)
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H:
Cada um de nós escolhe a que melhor nos convém. Ao longo das nossas vidas o dinheiro é uma
constante. Temos de o perceber, porque senão não percebemos o mundo.
È por isso que o dinheiro me interessa. Como explorador quero perceber o mundo e para o poder fazer de
um modo sério tenho de perceber os mecanismos do dinheiro, os aspectos financeiros e económicos, não
só pelas bolas de sabão, mas sobretudo pelos acontecimentos quotidianos da nossa vida.
M:
Mas se eu falo sobre o dinheiro com as minhas bolas de sabão é porque ambos são uma constante.
Repara!
As bolas existem já no líquido.
(mostra o recipiente)
São em potência. Quando se dá uma mudança do seu estado materializam-se.
(faz outra bola)
H:
Tal como acontece com o dinheiro que temos no banco, quando este se materializa em dinheiro, ou
naquilo que com ele compramos, porque fazemos uma ordem de pagamento para adquirirmos algo.
M:
Então, se é como eu penso, quando uma pessoa diz que faz uma poupança e deixa o dinheiro no seu
estado original, não o transformando em coisas ou serviços que compra
(faz uma nova bola de sabão)
Poupar é manter o dinheiro mas, tal como eu fiz com esta bola, não quer dizer deixa-lo estar no recipiente,
parado.
É estar a recorrer a uma estratégia possível, uma de entre muitas, para atingir uma meta. Um objectivo é
algo que nós próprios definimos como ponto de chegada e que nos dará prazer ao cumprir.
(M faz uma bola com uma argola maior. H começa também a fazer bolas e depois fazem os dois muitas
bolas pequenas, divertindo-se manifestamente ao fazê-lo)
M:
Que divertido! Explicar o mundo com bolas de sabão é muito mais radical!
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H:
Mas o dinheiro é mesmo assim tão igual às bolas de sabão?
M:
É, o dinheiro também é precioso e delicado. Para além disso como dissemos é essencial nas nossas
vidas, no nosso dia-a-dia, por isso é que é necessário aprender a lidar com ele. Mas, de qualquer forma,
todas as pessoas conseguem lidar com ele. Assim como todas as pessoas conseguem fazer bolas de
sabão.
(voltam ambos a fazer bolas de sabão e no fim riem-se)
H:
Bom é melhor não desperdiçarmos mais.
Lembra-te que para realizares o teu sonho de ter um circo, quer seja para comprares a própria tenda,
para teres de um espaço onde a colocar, para ter os materiais que os diferentes artistas precisam e
também para lhes pagares os salários, há que gerir com muito cuidado... porque para tudo isso o dinheiro
é essencial!
M:
Não.
H;
Não? Mas então, tudo isto, de que estivemos aqui a falar, foi insignificante?
M:
Pelo contrário foi muito importante. Mas esqueces-te que o essencial mesmo é ter os artistas no circo.
H:
Sim... obviamente mas o dinheiro é igualmente fundamental.
Por momentos pensei que te estivesses a referir a tudo o que eu tinha falado.
M:
Que ideia ridícula.
H:
Parece-me que temos em mãos um projecto de aventura!
12
M:
Proponho que façamos uma viagem juntos!
H:
Partamos então à aventura!
M:
Pelos caminhos do nascente e do poente! A norte e a sul! Por todos os quadrantes do mundo!
(utilizando a maior argola possível M faz a maior bola de sabão de todas)
H:
Tu procurarás os artistas e eu os investidores para o nosso circo.
M(dirigindo-se ao público):
Mas antes de partirmos, deixo-vos com uma questão. Como é que, se deste lado há ar,
(faz um cilindro de sabão com a argola média não o fechando e continua)
a bola de sabão se fecha numa esfera perfeita?
(fechando então a bola de sabão
(saem os dois do palco. H reentra de monociclo)
H:
Todas as actividades que fazemos requerem uma boa dose de sensibilidade e de saberes adquiridos.
(H pedala pelo palco)
H:
Se as quisermos fazer mesmo bem
(pára o monociclo numa posição estática mantendo-se em cima dele)
a experiência também entra muito em conta.
(H pedala pelo palco)
H:
Quando se procura o equilíbrio na nossa vida, como eu faço em cima de este monociclo, é porque, se não
nos equilibrarmos, arriscamo-nos a dar uma queda feia.
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(Mantém-se no monociclo no mesmo lugar)
H:
É necessário olhar em frente.
Em linha recta.
Focar um objectivo à distância. Chamaremos a esteobjectivo que focamos à distância um objectivo de
longo prazo. Isto porque sabemos que até o alcançarmos se demora algum tempo, sabemos que este
não é imediato.
(avança na direcção desse suposto objectivo)
H:
E pedalamos ao seu encontro.
(e em seguida retrocede a pedalar regressando ao ponto onde se encontrava inicialmente, sem desviar o
olhar do objectivo)
H:
Frequentemente teremos a tendência para baixar os olhos. Procuramos ver o percurso que está
imediatamente à nossa frente. Esquecemos o objectivo.
(inclinando-se para a frente começa a cair e ergue-se de novo)
H:
Pensamos que tudo o que é necessário para seguir em frente, para estar à frente, para seguir mais
depressa, é ver onde está o pneu.
Esquecemo-nos que o que importa não é o pneu, é para onde vamos, para onde queremos ir.
(Parado, H dá pulos com o monociclo ou se a manobra for demasiado complicada de executar, desmonta
e iça-o e pousa-o com as mãos.)
H:
Pensamos que estamos a lidar com os obstáculos.
(se H ainda não o fizera pára, desmonta e ergue o pneu à altura dos olhos)
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H:
O problema de estar sempre a olhar para o pneu é que não estamos a ir a lado nenhum.
(Volta a montar o monociclo)
H:
Quando fixamos um objectivo, conseguimos ver à mesma o que está à frente das rodas, focando sempre
a meta à distância.
(anda para trás e para a frente mantendo o assento numa posição constante)
H:
Quando começamos a pender numa qualquer direcção, é necessário recuperar a estabilidade.
Manter o equilibrio é muito engraçado
Porque tem tudo a ver com estar atento a todas as direcções em simultâneo.
Como se estivessemos a cair para todas elas, de modo que, na verdade, acabamos por não cair para
nenhuma.
(Mantém-se tão estático quanto possível)
H:
E podemos descansar um pouco, repousar, manter o equilíbrio e quando queremos retomamos caminho.
(recoloca-se num novo ponto do palco)
H:
E quando se aprende o equilíbrio... é como andar de bicicleta, nunca mais se esquece.
(pedala para fora entretanto M entra em cena com uma mesa quadrada de rodas nos pés com varetas
semi-rígidas a cada um dos cantos onde estão cinco pratos e uma vartea suplementar)
M:
Vamos então dar início à primeira reunião de trabalho para preparação do empreendimento que definimos,
o nosso circo.
(pausa)
15
M:
Parece que sou só eu...
(põe um prato a girar)
M:
Quando estamos a preparar qualquer coisa temos de nos saber antecipar.
Por exemplo, se eu quiser colocar outro prato a girar, tenho de me certificar que o primeiro não cai
entretanto.
(põe um segundo prato a girar)
M:
Só podemos colocar outro prato a girar quando estamos certos que nenhum dos outros parará entretanto.
(volta a dar impulso ao primeiro prato)
M:
Antes de decidir que posso pôr outro a girar. Como com o dinheiro que tenho, tenho de decidir o que
quero e posso fazer com ele.
É necessário saber esperar.
O mesmo acontece para realizarmos os nossos desejos.
(mantém os dois pratos a rodar)
M:
E também é preciso decidir. Agora tenho de decidir se preciso de por outro prato a girar. E tenho de os
colocar um de cada vez não os posso pura e simplesmente pôr a todos ao mesmo tempo, e não mais me
preocupar com isso.
(mantém os pratos a rodar)
M:
E antes de pensar em novas acções, tenho de primeiro saber se todos os pratos que eu tenho a girar
estão bem. E certificar-me que estão realmente seguros.
(mantém os pratos a rodar)
16
M:
Agora tenho de saber se este quarto prato é supérfluo. Se posso prescindir dele ou se devo continuar e
pô-lo também a girar.
O que vos parece?
Devo ousar?
(após uma interacção com o público, coloca o terceiro prato)
M:
Aqui era mesmo necessário pôr o prato a girar ou fizemo-lo apenas porque queríamos?
Temos de nos lembrar que os pratos se partem e quando partem, mesmo que se colem, nunca mais
voltam a girar.
Se não formos racionais na nossa forma de gastar, se não pensarmos bem o que fazemos, nunca vamos
entender a diferença entre querer e precisar... entre algo que não é essencial na nossa vida e aquilo sem
o qual a nossa vida parece ficar partida...
(coloca todos os quatro pratos a girar)
M:
É preciso ter diversidade, fomentá-la e saber gerí-la. Ter os quatro pratos a girar, aceitar correr o risco.
Saber que se diminui a probabilidade de perder,porque seum dos pratos cair agora aind fico com três a
girar.
(M pega no quinto prato)
M:
E mehor ainda, conseguir poupar, guardar um prato, para o caso de um dos outros cair, saber que o
posso substituir com este. Dá-me confiança e segurança que preciso para o meu número.
Se eu não tivesse este outro prato, a preocupação de não poder perder nenhum destes que tenho a girar,
para que este número possa funcionar, criava-me preocupações constantes.
(Certifica-se que todos os pratos giram)
M:
Ficaria nevosa, já antes de entrar em palco
É necessário estarmos preparados.
17
(Certifica-se que todos os pratos giram)
M:
Colocar dinheiro numa aplicação financeira é como colocar os pratos a girar. Para aprender a confiar no
dinheiro, saber que posso deixar os pratos ali sozinhos e que eles não vão cair. Porque confio nas
decisões que tomei. Também posso entregar o meu dinheiro e esperar receber uma gratificação futura
por isso sem me sentir ansiosa. Sei que os pratos não vão cair.
(Certifica-se novamente que todos os pratos giram)
M:
Basta-me saber interpretar os sinais correctamente.
Temos de encarar a vida como um jogo, onde importa não perder. Neste caso, importa não deixar os
prato cairem e partirem-se.
(Certifica-se novamente que todos os pratos giram)
M:
As regras do jogo são para cumprir à risca. É necessário comparar que prato realmente precisa de nós,
como disse, basta-me saber interpretar os sinais correctamente.
Porque nós precisamos deles. Há que comparar quais precisam do nosso cuidado, segundo o critério da
urgência.
(verifica os pratos um a um)
M:
A quantidade de dinheiro de disponível é finita. Deve ser gerida de forma sensata, estabelecendo o
prioritário e o acessório.
Quando temos objectivos a longo prazo, como este meu objectivo que eu realizo agora, o de ter todos os
pratos a girar, causa-me uma sensação de plenitude, de satizfação. O dinheiro que sentimos ter, depende
dos nossos objectivos.
(M contempla os pratos e se necessário mantém-os a girar)
M:
Para mim está tudo bem. Não está?
18
M:
Criar uma meta, estabelecer um objectivo, é o que permite avaliar de um modo criterioso, com um
princípio estável, uma situação pessoal. Pois sou eu quem decide sobre o meu comforto.
(M contempla novamente os pratos e se necessário mantém-os a girar)
M:
Mesmo se eu recebesse outro prato, que é como quem diz, mesmo se eu ganhasse mais dinheiro... isso
não alteraria a minha atitude em relação aosmeus pratos.
Se eu já antes não me preocupasse com eles, acabaria sempre por partir um e voltaria ao mesmo
problema.
(verifica os pratos um a um)
M:
O importante é saber que parte do que temos tem de ser um investimento, que tem de ser posto a girar.
Comparar a oferta e sentirmo-nos comfortáveis com os riscos que estamos a tomar.
(Diz decidindo entre que dois pratos girar)
M:
Este?
Ou este?
(certifica-se que todos os pratos estão a girar)
M:
Tenho quatro pratos a girar e um de poupança. Mas não esqueçamos que os nossos objectivos podem
mudar.
Temos de saber fazer reavaliações.
Talvez até mudanças.
(substitui um dos pratos pelo que segurava)
M:
Perguntar-nos se podemos prescindir de um quinto de tudo o que temos.
Sendo que temos quatro quintos a girar.
19
Temos um prato que pode substituir os 20% que perderiamos.
Mas este prato passaria então a corresponder a 25% da nossa riqueza.
Porque então só teriamos 4 pratos para pôr a girar.
E o risco aumentava...
(certificando-se que todos os pratos estão a girar, M entretanto coloca o prato restante que tinha em mãos
a girar numa vareta e eleva-a. H entra apressadamente)
H:
Desculpa-me o atraso fiquei preso no trânsito.
(começa a retirar os pratos um a um)
H:
Ora 25, 50%, 75%, 100!
(H arruma a mesa M pousa o prato e a vareta)
M:
Não faz mal. Utilizei bem o tempo, a preparar algumas coisas, a alinhar ideias.
H:
Ah! Fico contente. Já vejo que decidiste transformar o teu sonho num projecto.
M:
Agora temos de pensar nas fases e fazer a planificação do necessário à sua execução.
H:
Eu também me preparei. Vou-te mostrar o que fiz!
(mostra-lhe um gráfico de queijo)
M:
Uma bola de sabão a duas dimensões!
20
H:
Não, também para ti são tudo bolas de sabão, é um gráfico em forma de queijo
M:
H! É só um círculo de papel, não é um queijo!
H
Sim, mas chama-se gráfico de queijo porque se pode cortar em fatias.
M:
E porque é que não se chama tarte?
H:
Porque não.
M:
Mas porquê não?
H:
Porque não é isso que lhe chamam...
M:
Mas nós não lhe podemos chamar gráfico de tarte...
H:
Podemos!
M:
Então porque é que não chamamos?
H:
Está bem! Vamos mas é falar do que interessa com a tarte!
M:
Ah! Assim está bem...
21
H:
A tarte serve para fazer a distribuição do orçamento disponível. Imagina que o círculo representa o teu
dinheiro, o que tu tens.
M:
Sim...
H(confuso):
Mmm... aahhh...
M:
Sim...
H:
Vamos ler as instruções...
(vira o queijo ao contrário M aproxima-se e limpam as gargantas)
M e H:
(tossir)
(leêm os dois)
H:
Plano de gastos.
M:
Método de planear gastos para não fazer excessos.
H:
Utilize a caneta fornecida.
(H levanta um marcador)
M:
Preenchendo fatias no círculo, correspondentes ao valor de cada uma das parcela das despesas.
22
H:
Obtenha assim um ponto de partida realista para os seus gastos.
M:
Para o ajudar a determinar a opção que melhor se adapta à sua situação financeira.
(levantam-se da leitura)
H:
Serve para decidir o que se pode fazer com o dinheiro que se tem ou ganha.
M:
Então começa a marcar!
H:
Já estou a tratar disso!
(H divide o queijo em quatro partes desenhando cada um dos raios separadamente)
M:
Uma parcela, ou uma parte, para comprarmos a tenda.
(desenha um dos raios)
H:
Outra para adquirirmos um lugar onde a colocar.
(desenha outro raio)
M:
Mais uma parcela os materiais que os diferentes artistas precisam.
(desenha outro raio)
23
H:
E outra também para lhes pagares os salários,
(desenha outro raio)
M:
Espera estão a ficar partes muito pequenas.
H:
Mas o que é que queres que eu faça? Todas estas despesas são necessárias...
M:
Temos de cortar em qualquer lado!
H:
Tens sugestões de como o fazer?
(pausa)
M:
Sim! Com uma faca!
H:
Tu lá sabes...
M:
Sou uma exímia atiradora de facas. Eu descubro já onde é que se podem fazer cortes nesse plano.
(Enquanto H o coloca a num cavalete)
H:
Vou colocá-lo aqui. Assim evitamos danos, em qualquer outra coisa que não seja o queijo.
M:
A tarte!!
H:
Está bem!
24
(Sarcástico)
A tarte! Mas tens de lhe acertar numa das fatias do que podemos cortar.
M:
Muita atenção e cuidado estimado público. O número que se segue é extremamente perigoso. Não
tentem fazer isto em casa. Nós somos profissionais!
(Pausa, M hesita)
M:
Onde é que devo acertar?
H:
Boa pergunta...
(virando-se para o público)
M:
Que vos parece? A tenda? O terreno? O material? Os salários?
H:
Ora não há sugestões criativas?
M:
Onde é que se pode poupar?
H:
Onde é que é ou não viável e razoável efectuar cortes?
M:
Impossível, não se pode cortar em lado nenhum... vamos ter de gastar tudo!
H:
Mas assim não temos liquidez...
M:
Mas o que nós queremos é solidez ou, porque não, gasosez...
25
H:
Já agora... Estás muito espirituosa hoje.
M:
Se calhar precisamos de utilizar outra estratégia... Vamos retirar só um bocadinho de cada fatia.
H:
Isso, em vez de tentarmos eliminar uma fatia por inteiro!
M:
A pouco e pouco consegue-se fazer muito.
H:
Ou talvez não. Repara, se fizermos as contas, projectando os nossos ganhos, expectáveis com os
espectáculos que vamos dar...
M:
Deixa-me adivinhar. Descobrimos que seriam necessários demasiados anos para conseguir os objectivos
H:
Aproximadamente 10 vezes o tempo das nossas vidas...
M:
Dez! Assim não vamos lá... mas porque é que demora tanto?
H:
Todas as coisas têm o seu tempo de desenvolvimento
M:
Ah! Como seria bom se eu pudesse fechar os olhos e todas as bolas de sabão que eu tivesse soprado
fossem desejos. Quando estas rebentassem, os meus desejos tornavam-se realidade... mas não, nada é
instantêneo.
H (pensativo):
Temos de tentar outra estratégia...
26
M: (igualmente pensativa):
Temos de ter um financiamento. Encontrar uma forma de conseguirmos uma quantia de dinheiro para
investir.
H:
Usar o dinheiro que ganhamos para fazer mais dinheiro.
M:
E como ganhámos mais do que tinhamos...
H:
Cada vez que voltarmos a investir ganharemos mais.
M:
É exponencial! Quanto mais dinheiro temos, melhor o podemos aplicar e mais dinheiro temos para aplicar
logo, ganhamos sempre mais!
H:
Quanto mais dinheiro investimos mais vamos ganhar!
M:
É inacreditável!
H:
O que é?
M:
Vamos ser ricos!
H:
Finalmente, os dias de sol estão ao nosso alcance.
M:
E se o tempo mudar, mudaremos de ilha. Fretem-me já esse jacto!
27
H: (falando a um suposto telefone):
Sim? Sim! É sobre as reservas queremos a suite presidencial. Espere um segundo vou buscar o número
do cartão.
M:
O jantar estava óptimo, soberbo, delicioso, superlativamente maravilhoso.
Agora quero dançar! Dançar pela noite a fora!
H:
Vamos já para o casino!
M:
Táxi!
(Dançam ao estilo swing como se estivessem numa discoteca)
H:
É só curtir!
(Soltam gritos efusivos a certa altura M faz a ponte)
M:
Posso dar todas as voltas e reviravoltas que eu quiser!
(a seu lado H continua a dançar)
H:
Calma M, tem cuidado.
(depois de uma sequência cada vez mais elaborada de movimentos de contorcionismo, misturados com
movimentos de break dance, a M acaba por ficar com a sua cabeça presa debaixo da perna ou noutra
forma de entorse que for mais comfortável)
M:
Ai! Aiai a! Ai!... Ai!
28
(Pausa)
M:
Ai!
H:
Passa-se alguma coisa?
M:
Parece-te?
H:
Não sei... tu agora devias levantar a perna, puxar a cabeça para o lado e levantares-te.
(Ao descrever este movimento H executa-o)
H:
Como podes ver. Aqui estou eu, uma pessoa livre e desprendida.
M:
Nota-se...
H:
Na verdade as considerações materiais pouco me dizem. Sou pouco físico, pouco do corpo. Sou dado a
outros prazeres. À descoberta.
(M começa a ficar visivelmente aborrecida com o discurso de H)
H:
À contemplação da arte. Às obras literárias. Sou mais do espírito
M:
Aaaaii! Ai aia ai!
H:
Dores de espírito?
29
M:
Deixa de seres mauzinho...
H:
Não te irrites. Tudo tem solução!
M:
Parece que quanto mais eu me tento mexer mais fico presa.
H:
Começaste a contorcerte demasiado e foste para além da tua flexibilidade.
M:
Foi o entusiasmo de pensar que teríamos todo o dinheiro. Dinheiro ilimitado para resolver a nossa
situação. Pensei que pudesse fazer tudo o que queria... agora...
H:
Agora?
M:
Começámos a acumular gastos e eu comecei a depender de dinheiro que ainda não tinhamos ganho.
As despesas fixas, as casas, os iates, os aviões, tornaram-se incomportáveis.
Pensei que pudesse fazer tudo o que queria...
H:
Ainda estamos longe disso…
M:
Mas estava tudo tão bem. Eu sentia-me hipermóvel e de repente… estou para aqui com as minhas
articulações desfeitas...
H:
Excesso de confiança...
M:
Mas eu sei contorcionismo. Sei os movimentos que posso fazer sem causar rupturas.
30
H:
Todos nós temos um esqueleto idêntico e ele tem limites à sua flexibilidade. Claro que convém não
abusar... Foi só um percalço…
M:
Estou a ver que não saber gerir os nossos movimentos e a estrutura do nosso corpo pode ser tão
comprometedor quanto perder o controle sobre o próprio corpo...
H:
Tu consegues superar isso. Deixa-me tentar ajudar-te. Precisamos de te desembrulhar daí...
(H aproxima-se e tenta soltar M)
H:
Vamos lá ver se, como forma de remediar esta situação de inflexibilidade, podemos... pôr este pé...
M:
Tem cuidado com o que fazes! Podemos estar a acumular novas flexões e a piorar o problema...
(Enquanto se tentam soltar M e H páram numa forma que pode ser simultaneamente interpretada como o
facto de estarem os dois presos ou a efectuarem um movimento de uma dupla de contorcionistas)
H:
A flexibilidade de uma nossa articulação numa direcção em relação ao osso de eixo, não implica que seja
idêntica na oposta.
(H demonstra-o tocando com o polegar no ante-braço e não o conseguindo fazer com o mínimo)
M:
Nem a flexibilidade de todas as outras articulações do corpo.
H:
Um contorcionista pode criar a ilusão de que não tem de se preocupar com os movimentos. Que o seu
corpo não tem esqueleto.
(tentam soltar M que se vai movimentando mas sem deixar de estar presa)
31
M:
Eu sei especializam-se nos movimentos mais impressionantes e criam uma actuação à sua volta.
(H solta-se de M)
H:
Não! Isto tem de ser feito de outra forma.
M:
Deixa estar! Fico assim.
H:
Tens de ser razoável M, estás-te a magoar. Adiar uma decisão ou hesitar agora pode ter consequências
imprevisíveis.
M:
Mas eu não sei o que fazer...
H
Aprendemos! A circulação deve estar a parar devido à tua posição estás deixar de pensar. Temos de
resolver isso agora!
M:
A flexibilidade pode ser adquirida com treino e persistência.
H:
Temos de procurar as causas!
M:
O meu problema de sobreendividamento é sobretudo má gestão orçamental. Não me preocupei em saber
se as minhas despesas, aquilo que eu gastava, eram menores que os meus rendimentos, o que eu
ganhava.
H:
Estar bem informado pode se determinante. A fobia financeira, o medo de movimentares o teu dinheiro,
pode ser explicado por uma falsa noção de complexidade. Como não sabes mexer em dinheiro, tens
atitudes pouco saudáveis em relação ao dinheiro, o que te cria mais problemas e te faz ter cada vez mais
medo e aversão.
32
M:
Eu penso que o meu corpo não consegue fazer um movimento, porque acho que ele é muito complicado
e deixo de conseguir fazer esse movimento.
(M começa a soltar-se e sempre no chão coloca-se de costas para o público deitando-se de costas com a
cabeça)
H
É isso mesmo!
M:
Para sabermoso que podemos fazer temos de nos conhecer a nós mesmos muito bem.
H:
Lembras-te da fórmula para fazer um orçamento? Da matemática do quotidiano?
M:
Duas colunas!
H:
Duas colunas!
M (deitada de costas levanta o braço direito):
Uma para as receitas,
(levanta o braço esquerdo)
outra para as despesas. Discriminadas,
(estica os dedos um a um em simultâneo em ambas as mãos)
uma a uma.
M (cerra as mãos em punhos):
O saldo tem de ser positivo para poupar.
Tenho de ter mais nas receitas
(abre todos os dedos da mão direita)
e menos nas despesas.
(levanta só três dedos)
H:
Para teres um bom nível de poupança
33
(M deixa a mão direita aberta levantada)
M:
São precisos cinco rendimentos mensais.
H:
E agora a pergunta que só ela vale 40 pontos e dá acesso à fase seguinte do nosso concurso... qual é... o
limite da dívida dos créditos que temos?
M:
A prestação, o valor regular que temos de pagar pelos créditos detidos, não pode ser superior a 40% do
rendimento. Isto é em cada 10 que recebemos regularmente não podemos ter de dívida por crédito mais
de 4!
H:
Muito bem!
(M levanta-se)
M:
A flexibilidade é uma vantagem. Sabemos que estamos aptos a resolver problemas.
(H sai com M para fora de cena. Quando H reaparece tem vestido o casaco para a magia e vem enredado
em fios)
H:
Vejam-me só isto!
São as preocupações da dívida. Acabaram por me enredar a mim. E logo agora que soltaramos a M.
Mas como é que eu saio disto...
(M entra em cena com uma máscara em volta dos olhos e uma cartola. Ela agora é o Mágico Mago)
M:
Como está?
34
H:
Como vê. E o senhor?
M:
Cá vou andando...
H:
Não sei se reparou mas, estou a precisar de ajuda. Permita-me que lhe pergunte, o que sabe fazer ?
M:
Deixe cá ver... não isso não faço, aquilo não posso.. é técnico... ora, eu exemplifico!
(de cabeça baixa agarra-se à sua cartola e usando-a como eixo, roda em seu torno até ficar tonto, depois
ergue-se coloca a a cartola na cabeça, fecha os olhos e tenta andar numa linha recta até que cai)
H:
Devo dizer-lhe que não estou nem surpreso nem contente...
Eu sei que me vou arrepender por perguntar mas... não tens outras habilidades, outros talentos?
M (pensa):
Empresta-me um euro!
H:
Desculpe mas não quero ter uma discussão sobre o valor do dinheiro. Porque eu não posso dar o
dinheiro que tenho ao desbarato.
M:
Já acabaste o sermão?
H:
Não é um sermão. Podemos até negociar uma quantia que eu te pagarei, no futuro, se me souberes
soltar destas dificuldades financeiras. Quando isso acontecer eu retribuo-te em dinheiro, faço-te um
pagamento pelos teus serviços.
35
M:
Então, se já acabaste o sermão, dá-me lá o euro. Eu já te o devolvo.
(H relutantemente tira-o a custo de um bolso por causa dos fios que o prendem e dá-o a M que o coloca
na palma das mão. Mostra a cartola ao público, e depois coloca a mão com a moeda no interior da cartola
descrevendo círculos no seu interior)
M:
Pelo poder dos juros e das mais-valias, das taxas e das tarifas, liberta o teu valor acrescentado!
(E ao retirá-la o euro foi transformado em um euro e vinte)
H (surpreso):
Transformaste o euro em duas moedas! Uma de euro e uma de vinte. É um chapéu mágico!
M (apontando para H):
Aplausos para a minha partenere!
E cá está o truque da taxa de valorização de 20%, rendimento garantido, sem risco.
H:
Uau! Para um truque tão... hum... ah... tem um nome muito complicado...
M:
Mas é muito fácil de explicar, aliás no mágico mundo das finanças, tudo tem uma explicação e uma razão
de ser!
H:
Empresta-me a sua cartola, se faz favor.
M:
O que pretende fazer?
H:
Fazer as minhas dívidas desaparecerem dentro do chapéu.
M:
Sim, é uma boa razão!
36
(H faz com que os fios se desenrolem e desapareçam dentro da cartola, fios que ele vai escondendo
numa mão ou no casaco ou de outro modo. M entretanto vem para primeiro plano ecomeça a desenrolar
um fio das suas mãos)
M:
Mas a magia só por si não resolve os nossos problemas...
A magia é como o tempo, necessária ao nosso desenvolvimento, mas não é só por si uma solução.
Como este fio que eu tirei do chapéu mágico, assim vem o tempo a desenrolar-se...
(M segura o fio por uma ponta, na outra mão tem uma tesoura)
M:
Nós estamos aqui no presente.
(abana o fio. Com a mão que tinha a tesoura que entretanto colocou no bolso, pega na outra ponta do fio,
onde M faz um nó)
M:
Este nó representa um prazo limite no futuro.
É como funciona um investimento a prazo.
Estabelece-se uma data na qual recebemos um montante acordado por entregarmos o nosso dinheiro e
pemitirmos que ele possa ser rentabilizado, isto é transformado em mais dinheiro.
(M vai dando nós ao longo do fio enquanto o corta com a tesoura)
M:
Quando fazemos uma aplicação financeira, temos de ter em conta o montante, a quantidade de dinheiro
que vamos investir, e o prazo que damos até o reaver.
(M vai dando mais nós ao longo do fio e supostamente corta-o)
M:
Podemos fazer planos poupança, com datas de entrega periódicos,
(M depois faz desaparecer os nós passando com a mão fechada ao longo do fio)
e no fim recebemos o que nos é devido.
37
(H vem para primeiro plano com o chapéu)
H:
O dinheiro é uma função do tempo disponível. E não há nada de mais mágico que o tempo.
O tempo é um mistério e a magia não é senão o desconhecido. A magia é o misterioso de que podemos
vir a conhecer os segredos, saber os truques por detrás dos passes que vemos alguém desempenhar.
(H manipula um baralho de cartas rodando-as nos dedos)
H:
O tempo também se vai revelando. O que vemos é o que ele nos revela de si.
(H mostra cartas aleatoriamente retiradas do baralho)
H:
No entanto ninguém é capaz de controlar o tempo. Passado, presente, futuro. A sua ordem é inalterável.
(Baralha as cartas e depois abre-as num leque.)
M:
Temos de nos lembrar que os prolemas são transitórios mas o tempo está sempre presente. Podemos ter
dinheiro sem tempo para o gastar. Ter tempo e não ter dinheiro para gastar.
H:
Gastar é um verbo muito instável...
Assim como eu fiz desaparecer as nossas dívidas no chapéu do mágico...
(H faz com que as cartas desapareçam no chapéu)
H:
Também posso gastar, sem consciência de para onde desaparece o meu dinheiro...
M:
Pensamos que estamos tão bem. Pensamos, porque é que não posso usufruir do que temos vindo a
acumular? Há tantas coisas novas e giras e fixes e espectaculares que eu podia ter, que eu queria tanto
ter...
38
H:
Sim que tu querias ter, mas não te esqueças da regra, querer não é precisar. Às vezes pode acontecer o
contrário...
M:
Precisar não ser querer?
H:
Sim também, mas tu disseste que te sentias bem e que por isso te apetecia fazer compras. Muitas vezes
o que acontece é que, quando já estamos em crise e com falta de dinheiro, de flexibilidade e mobilidade,
fazemos compras para anular o sentimento de depressão, para nos sentirmos melhor.
M:
Compramos para nos sentir reconfortados. Gastamos dinheiro porque sentimos que não temos dinheiro
para gastar. Mas isso só acentua e nos adia problemas.
H:
Adiar problemas...
(H deixa cair a cartola quando se aproxima para a apanhar pontapeia-a e ela foge-lhe, tenta ir pelo outro
lado sem sucesso, procurar recorrer a este efeito de comédia como forma de criar uma pausa)
H:
Adiar problemas...
M:
Os problemas não desaparecem apenas se acumulam. É preciso encará-los de frente!
(H coloca-se próximo da cartola de frente para o públco e agarra-a pondo-a na cabeça no mesmo
movimento retira-a e coloca-a à altura do ventre)
M:
Primeiro há que saber o montante da dívida!
(H começa a retirar cartas de um bolso e a pô-las dentro do chapéu. Pára.)
39
M:
Saber qual o valor, a quantia total da dívida.
Todos os juros que vamos pagar por estarmos a dever este dinheiro. Os juros são o custo da nossa
dívida.
(H retira mais duas cartas do bolso)
M:
Podemos agregar as dívidas todas que temos num só empréstimo, juntá-las para que apenas paguemos
um valor regular.
(H atira as duas cartas para a cartola)
M:
Segundo é necessário definir quais são as despesas essenciais e verificar quanto é que sobra...
(H pousa a cartola. tira um grupo de cartas do bolso. Conta-as reconta-as e começa a atirar algumas para
dentro da cartola, ficando com poucas nas mãos)
M:
E o dinheiro que nos sobra depois das despesas é para poupar.
(H coloca as cartas no bolso)
M:
A nossa principal prioridade tem de ser o pagamento de dívidas. Enquanto não o fizermos estamos a ter
uma perda desnecessária. Para fazermos esse pagamento das dívidas é preciso precisamente que se
pare de gastar.
(H interrompe o movimento quando ia retirar algumas das cartas que tinha posto na cartola, soltando-as)
M:
No nosso plano de despesas mensais temos de resevar uma parte, para gastos imprevistos.
(H mostra uma carta e põe-a num bolso)
M:
Para fazer estas poupanças e não termos problemas, precisamos de conhecimentos financeiros básicos.
40
(H assume uma postura de pronto a aprender)
M:
O primeiro destes é saber o que temos na nossa carteira.
(H põe a mão num bolso. Vasculha, vasculha e acaba por puxar o seu interior para fora vazio)
M:
No outro!
(H põe a mão num outro bolso de onde surpreso retira algumas cartas)
M:
Cartões de crédito e de débito.
(H separa as cartas em dois grupos um em cada mão mimando o que M diz)
M:
Os de débito servem para utilizamos o dinheiro que temos.
(H mostra as cartas de uma mão)
M:
E os de crédito para utilizar o dinheiro que não temos.
(H mostra as cartas da outra mão)
M:
Fazendo-o estamos a adquirir, para além daquilo que compramos, uma dívida que teremos de pagar,
mais cedo ou mais tarde.
(H deixa cair as cartas das mãos para dentro da cartola. Retira todas as cartas do seu interior pondo-as
num bolso e começa a girar o chapéu na palma da mão)
M:
É preciso equilibrar as contas.
Podemos tentar aumentar o rendimento...
41
(H põe o chapéu a girar mais rápido)
M:
Procurar novas formas de ganhar dinheiro.
(H atira o chapéu ao ar e tenta apanhá-lo com a cabeça, tenta até conseguir ou repete várias vezes)
M:
Agora estamos prontos para decifrar as regras dos cartões de crédito...
(com a cartola colocada H volta a tirar várias cartas dos bolsos uma a uma)
M:
Quantos mais cartões se tem mais terá de pagar ao banco.
(H pára de tirar cartas assustado e volta a pô-las no bolso até ficar só com duas)
M:
E estamos a pagar por um serviço que não tem qualquer préstimo. Que que dizer que não ganhamos
nada por o ter.
(H retira dois molhos de 8 cartas juntando as duas que tinha a um deles)
M:
Os cartões de crédito têm uma regra fundamental. A regra do juro.
se aplicarmos 10 euros,
(H mostra em leque o molho com as 10 cartas)
por cada 8 euros pagos
(H mostra o outro molho de cartas também em leque)
através do cartão de crédito, com uma taxa de juro de 16%, que é o valor que recebemos por colocarmos
o nosso dinheiro a render, a fazer mais dinheiro, descobriremos que estamos livres das dívidas em 33
meses e ganhamos o jogo!!!
(H atira as cartas ao ar e enquanto as olha a cair)
H:
O importante sempre é perceber para onde está a ir o nosso dinheiro.
42
M:
Analisar o nosso padrão de consumo que é com quem diz, que tipo de compras fazemos. Onde é que
gastamos mais ou menos do dinheiro que temos para gastar.
H:
Não podemos comprar a crédito de forma compulsiva e inconsciente, já sabemos os dois bem isso.
M:
E temos de poupar, poupar, poupar.
H:
Transformar a economia no nosso quotidiano.
M:
Ouve lá H, que é isso de economia?
H:
É a nossa gestão da escassez
M:
Como?
H:
Lembra-te que todo o dinheiro tem um limite. Todos os recursos do mundo têm um limite. Mesmo a àgua
que temos para beber...
M:
Ou o ar para fazer bolas de sabão...
H
Sim, ou para respirar... o que me parece um bocadinho mais importante.
M:
Para ti talvez...
43
H:
Bom! Saber gerir os limites dos nossos recursos, de forma a que deles retiremos os melhores resultados,
fazer com que eles durem o máximo de tempo possível, isso é que é a gestão da escassez, do que é
finito, do que mais cedo ou mais tarde será raro e por isso deve ser agora visto como precioso.
M:
Assim a economia é sobretudo uma questão de escolhas. O ser humano, como ser racional, escolhe a
opção que lhe parece trazer mais benefícios, face a todas as outras que ele consegue ver.
H:
Porque, quando tomamos uma opção, não podemos voltar atrás e fazer outra.
M:
Não, as nossas acções têm consequências.
H:
Não tem nada que saber, basta saber...
M:
Agora já percebemos bem os mecanismos e as regrasdo crédito.
H:
Sabemos que se pedirmos dinheiro agora, vamos ter de o pagar de volta,no futuro
M:
E não só pagaremos o valor que pedimos na totalidade, mas pagamos mais um valor de juro por termos
recebido o dinheiro. O juro é o custo do serviço de receber o dinheiro agora.
H:
O que precisamos é de gastar este dinhero como um investimento..
M:
Utilizarmos o dinheiro que pedirmos emprestado de forma a gerar lucros, de forma a que ganhemos mais
dinheiro. Mais do que nos custam os juros que temos de pagar, para não sentirmos a dívida como um
peso...
44
H:
E o que podemos fazer...
M:
Fazer o pino?
(H tenta fazer o pino mas sem resultados mal consegue andar)
H:
Não, não... talvez piruetas...
(M faz uma série de piruetas e só consegue ficar tonta)
M:
Também não me parece...
H:
Espera estou a lembrar-me de uma vez ter visto um grupo de pessoas que tinham extensões nos pés, o
que lhes permitia fazerem acrobacias espectaculares.
M:
Nós podiamos comprar uns pés-mola desses! E fazer umas coreografias radicais! Mas como é que os
vamos comprar?
H:
Podes fazer a compra com o crédito do telemóvel. Só pagas a conta no fim do mês...
M:
Temos de ter certeza que temos dinheiro até lá.
H:
Até então usaremos já os nossos novos pés-mola para ganhar dinheiro, com o espectáculo que vamos
dar não vai ser difícil...
(M faz como se a mão fosse um telemóvel)
M:
Façamos uma pesquisa por artes e espectáculos. Cá está. Sim, queria fazer uma encomenda!
45
H:
Acaba de chegar a encomenda!
(H trás nas mãos dois conjuntos de pés-mola para saltar. Eles colocam-nas e fazem uma série de
peripécias com tipos de saltos e acrobacias que consigam fazer em palco durante alguns instantes)
M:
Bestial! Estes pés são como um crédito. Permitem-nos ir mais longe do que as nossas possibilidades
financeiras iniciais. Ultrapassar as nossas limitações.
H:
Alargam-nos os passos que podemos dar.
M:
Lembra-te de tudo o que sabemos já sobre a necessidade de sermos equilibrados e prudentes.
H:
E em cima destes pés bem precisamos do equilíbrio...
M:
Vamos treinar!
(M trás uma vara que entrega a H este começa a mimar uma deslocação na corda bamba, sem corda
apenas com a vara em mãos e utilizando os pés-mola para causar a sensação de desiquilíbrio)
M:
Vamos lá a saber como poupar, recordemos que temos de estabelecer um objectivo!
H:
Ter poupados, isto é, ter em nossa posse disponíveis em caso de um imprevisto, os cinco rendimentos
mensais de que falámos à pouco, cinco vezes o valor que recebemos por mês é uma boa poupança.
M:
Vamos lá! São só cinco passos.
M eH (em uníssono):
Um!
46
(H dá um passo)
M:
Agora há que reduzir os custos. Acabar com a redundância, todas as coisas que temos repetidas que
fazem duas despesas ou mais, e para as quais uma chega.
H:
Estar o mais direito possível, mantendo o corpo solto flexível, sem ser rígido, para poder fazer
compensações.
M eH (em uníssono):
Dois!
(H dá um passo)
M:
Temos de comparar preços, comprar em diferentes fornecedores, aproveitar promoções.
M eH (em uníssono):
Três!
(H dá um passo)
M:
E quando formos fazer compras fazer sempre uma lista antes e ser fiel a essa lista! Só comprar o que lá
está!
M eH (em uníssono):
Quatro!
(H dá um passo)
M:
E se tivermos dívidas, amortizar.
(H parece que se desiquilibra quando ouve a palavra amortizar)
47
H:
Oooohhh!
M:
Amortizar é entregar uma quantia, superior à prestação mensal acordada para o pagamento da dívida.
Quando se amortiza estamos a baixar o valor do dinheiro em dívida e a, igualmente, diminuir a prestação
mensal, assim poupamos nos juros.
H:
Verifica se ambos os lados da barra estão equilibrados, ou se precisas de compensar para um dos lados,
e...
M eH (em uníssono):
Cinco!
(H dá um passo)
(H põe a barra de lado, ainda com os pés-mola H e M executam um novo malabarismo enquanto
conversam, vão pondo bolas a saltar no chão, fazendo constantes passagens um ao outro, podem ser
três quatro ou as que os artistas conseguirem malabar. Se conseguirem ir introduzindo bolas ao longo da
conversa melhor)
M:
Vamos vá agora concentrar-nos neste malabarismo.
H:
Para termos uma parceria temos de estar sincronizados, em sintoniapercebermo-nos e conhecermo-nos
bem.
M:
Confiar que o outro vai fazer o gesto certo.
H:
Relembremos como se elabora um orçamento.
M:
Numa coluna as despesas, noutra os rendimentos, o deve e o haver.
48
H:
Como as bolas. Há umas que sobem e outras que descem e as outras sobem e as outras descem...
assim é fácil!
M:
Cortar sempre nos gastos supérfluos. Tudo o que está a ser desperdiçado deixa de o ser!
(M retém uma das bolas numa mão por instantes e depois recoloca-a no malabarismo)
Todas as bolas que descem têm de subir.
(H e M vão retirando todas as bolas do jogo até só estarem a fazer saltar uma, fica assim algum tempo)
M:
Renegociar o pagamento dos créditos em dívida, o dinheiro que devemos permite obter condições de
pagamento mais vantajosas.
(recolocam as bolas no malabarismo)
H:
Tem de haver equilíbrio e comforto, saber quanto sobra para luxos...
(H retém uma das bolas numa mão por instantes e depois recoloca-a no malabarismo)
M:
Gerir dinheiro não é mais do que fazer um plano de despesas. Saber o que há a comprar e com que
frequência. Uma bola agora e agora outra.
H:
Uma bola agora e agora outra.
(continuam o malabarismo)
M:
Saber ver as razões para as diferença de custos dos produtos similares.
Se são pela quantidade que é vendida, pela diferença de qualidade dos produtos, ou por outras
características específicas desse produto, porque este oferece mais benefícios do que o outro e assim
vale o ser mais caro.
49
H:
E podemos optar por comprar o que melhor se adapta às nossas necessidades, o que nem sempre é o
mais barato.
Como diz o dito, às vezes o barato sai caro.
(H e M retêm todas as bolas nas mãos por instantes e depois recolocam-nas no malabarismo)
H:
É preciso programar as despesas varíáveis dos próximos meses.
(no malabarismo entra uma bola nova que sai para voltar a entrar, isto é, uma bola é retida
momentaneamente repetidas vezes)
Deixar uma margem para os gastos imprevistos.
M (retém uma bola):
Comece uma poupança.
(recoloca-a)
H (retém uma bola):
Decidimos que o vamos fazer e podemos pôr esta quantia, a bola, de parte.
M:
O ideal é fazer 10% de poupança, logo no início do mês, ou sempre que se recebe uma quantia de
dinheiro, guardar um décimo dessa quantia.
(retém uma das bolas numa mão por instantes e depois recoloca-a no malabarismo)
H:
Tens tudo o que precisas?
M:
Sim. E tu?
H:
Também!
M:
Estás pronto?
50
H:
Estou.
(Recolhem todas as bolas e saem do palco quando reentram trazem um tapete que colocam no chão e
onde se sentam em cima)
H:
As coisas têm-nos corrido muito bem
M:
Os investimentos têm tido muito retorno, temos uma fonte regular de receitas
H:
E temos a tenda praticamente paga. É um óptimo apoio!
M:
Sabes, desde que ando a vender o nosso circo que me sinto cada vez mais como uma bailarina?
H:
Explica-me lá isso!?
(Levantando-se M começa a menear os ombros)
M:
Vou-te dizer qual é a melhor forma de promover os nossos produtos circenses, de os vender, é uma
fórmula de sucesso.
(M movimenta sempre o corpo a dançar enquanto fala)
M:
Anotar e indicar aos nossos clientes, de uma forma clara, os serviços que prestamos.
Qual é a nossa utilidade, quais é que são os propósitos que temos e os objectivos do negócio de um circo.
Precisamos também saber as características que nos tornam únicos e que façam com que o cliente nos
procure a nós.
H:
E que no nosso caso são?
51
M:
Até parece que não sabes...
(H sorri)
M:
Vamos contratar os melhores artistas. Até sermos o mais espantoso e fabuloso, maravilhoso e fantástico
espectáculo de circo do mundo!
H (deitado no tapete):
Muito bem, apoiado!
M:
Estes são os benefícios específicos, por nós oferecidos, nos nossos serviços. Concentrando-nos nestas
questões prioritárias, concentrando-nos naquilo que fazemos, deitando fora o inútil, podemos trabalhar
para sermos continuamente melhores.
H:
Tendo sempre, com honestidade e transparência, as respostas às suas questões, respeitamos o cliente.
M:
E mais! Deixamos todas as crianças verem o nosso espectáculo de graça!
H:
E a viabilidade económica, como é que ganhamos dinheiro?
M:
Os adultos pagam. Um circo será sempre necessário. As pessoas precisam sempre de alegria.
(H levanta-se e começa a dançar com M)
M:
Trata o teu negócio com amor.
52
H:
Agora é só organizar as finanças. Conhecer os nossos encargos, saber que despesas fixas temos, os
custos de manutenção do circo, incluindo as despesas previsiveis e um seguro... não vá a tenda arder.
(levantam os braços e ondulam-nos como chamas
H:
Com base nestas despesas e no lucro que queremos ter, estabelecemos um preço e cumprimo-lo.
(H agarra M)
H:
Depois continuamos a aumentar os padrões da qualidade do nosso serviço e o preço.
M:
Como vêm vender é uma dança. Ao conhecer os passos, esta torna-se uma experiência enriquecedora e
inspiradora...
(Ambos tombam as cabeças para trás e riem)
M:
Fazendo jus ao facto de ser um circo podemos dizer que esta é uma verdadeira tenda mágica!
H:
Sim e étambém uma excelente forma de guardar dinheiro, de poupá-lo, pagando-a. A melhor forma de se
acumular activos, riqueza, é ser proprietário de algo.
M:
Ou seja este crédito habitação permitiu-nos termos o que outra forma não teriamos!
H:
Mas está na altura de darmos um passo em frente!
M:
Para onde?
H:
Anda! Eu explico-te na viagem.
53
(Sentam-se de pernas cruzadas em cima do tapete e inclinam-se para trás como se fosse o efeito da
velocidade de aceleração, a tenda torna-se um tapete mágico.
Pegam então num estojo de maquilhagem com espelhos e começam a desenhar máscaras de palhaços)
H:
Agora que temos alguma estabilidade económica e podemos partir de uma garantia real, que é a tenda
que adquirimos.
M:
E é nossa.
H:
Por ser nossa pode constituir-se como uma hipoteca, um bem material que nos será retirado, caso não
efectuemos o pagamento da nossa dívida.
Este bem é a garantia, a hipoteca para que nos concedem um empréstimo à taxa variável alargando o
prazo inicial. Pagamos menos mas mais tempo.
M:
Menos é mais e mais é menos.
H:
Compreendes?
M:
Sim, é matemático. Mais tempo a pagar quer dizer que pagamos menos dinheiro de cada vez. Com
menos dinheiro a pagar-se de cada vez, quer dizer que é preciso mais tempo que demoraremos a pagar.
H:
Sim, é o princípio do esticado, barrado...
M:
O crédito realmente funciona como uma forma legítima de se realizarem os nossos desejos, sonhos e
aspirações.
H:
E o crédito também pode ser uma forma de poupança. Recebemos a quantia que queremos ter poupada
de uma vez e as prestações mensais que vamos pagando são a nossa forma de poupança.
54
M:
Dividir em prestações para ter o dinheiro na altura em que dele precisamos sem ter de esperar e perder a
oportunidade. E não há qualquer problema, desde que se pague a dívida.
H:
Como já sabemos, limite do valor de prestação do crédito é 40% do rendimento líquido mensal, isto é, o
dinheiro que realmente recebemos e de que podemos dispôr por mês.
M:
Num mercado onde concorrem diferentes operadores, onde podemos escolher entre o serviço de crádiot
A ou o B...
H:
Ou até C!
M:
Há que comparar as diferentes ofertas de crédito que temos ao nosso dispôr, para o objectivo que temos
em mente
H:
E temos de verificar todas as despesas do crédito e não só comparar as taxas de juro e a de 10% ser
menor que a de 20% ou se se paga num ao ou em 10. É preciso saber o valor total que se paga no fim do
contrato e qual o modelo que nos convém.
M:
Precisamente porque temos concorrência e várias ofertas, temos acesso a crédito barato.
O que é bom, assim como é bom saber que nos últimos anos, apesar das vozes mais negativistas, há
uma melhoria real da qualidade de vida das pessoas.
H:
A nossa sociedade baseia-se na dívida para sustentar a economia. Para que haja dinheiro a circular. Para
que as pessoas tenham actividades para fazer. Para que possam elas próprias ganhar dinheiro, a vender
coisas uns aos outros.
M:
O recurso à dívida não é por si só uma coisa má. O problema está na linha ténue que separa o
endividamento saudável, a dívida que mantém a economia a funcionar, do sobreendividamento. É preciso
evitar as falhas, evitar o sobreendividamento.
55
H:
É que mesmo quando o valor em dívida do crédito é superior ao do rendimento anual, a todo o dinheiro
que ganhamos num ano, isso não constitui uma situação de crise.
Porque o valor em dívida é pago em mais de um ano, logo não estamos em falência...
M:
E para quem não sabe, falência é faltar aos compromissos e suspender os pagamentos por incapacidade
de os efectuar.
H:
Temos de aprender a linguagem do dinheiro, não é só saber como fazer dinheiro.
M:
A base na verdade de saber lidar com o dinheiro é outra. É saber como se deve gastar o dinheiro, que é
um assunto que nós raramente discutimos. Como se o dinheiro não fosse um meio de obter prazer mas
sempre um inconveniente, uma maçada.
H:
E não discutimos abertamente questões de dinheiro porque é uma lingua que não falamos. E como não
falamos a língua do dinheiro, não falamos de dinheiro .
M:
Ou sobre o dinheiro.
H:
Ou acerca do dinheiro.
M:
Ou de dinheiro numa forma que corresponda à presença constante que o dinheiro tem nas nossas vidas.
H:
Se o dinheiro é comunicação...
M:
O modo como o utilizamos é o que dizemos ao mundo.
(pausa continuam a maquilhar-se)
56
H:
Pagaste a viagem com o cartão de crédito?
M:
Paguei, porquê?
H:
Porque o cartão tem associado seguros que podem vir a ser úteis, caso sucedam imprevistos, fizeste bem.
M:
Estamos quase a chegar. Tenho estado a pensar que devia ir eu à negociação porque o crédito é mais
vantajoso para mim.
H:
Como assim?
M:
Ao negociar um crédito os valores a pagar e as condições de pagamento variam de pessoa para pessoa.
É uma forma das instituições de crédito atraírem clientes.
Mas existe também uma razão matemática, de probabilidades. Eles aplicam uma taxa, um valor de juro, o
custo do crédito é variável.
Este valor varia em função do risco da operação.
Com os dados e as informações de todas as pessoas que já lhes pediram dinheiro, as instituições de
crédito, sabem que tipo de pessoas são menos arriscadas. A quem eles podem, com maior segurança,
entregar dinheiro, porque estas pessoas são provavelmente mais certas a cumprir os pagamentos, no
futuro.
H:
E que tipo de pessoas são essas?
M:
Em primeiro lugar são mulheres e quanto a isso...
H:
Pois...
57
M:
Moram em cidades. Têm de idade entre 30 e 40 anos, mas como a uma senhora não se pergunta a idade,
estou safa...
H:
Ainda mais essa...
M:
Em termos de profissão estamos equiparados. Ambos somos empresários. Detemos uma quota parte de
igual valor num circo. O que quer dizer que apesar das flutuações do mercado, de termos menos ou mais
espectadores, como carinhoso e estimado público, eu tenho rendimentos regulares, o que na atribuição
de crédito é uma vantagem.
H:
Estou a ver... Mulher, 30, 40, profissão... rendimentos regulares...
M:
O meu único ponto contra é o estado civil. Não sou casada. Mas nós podiamos tratar já disso...
H (mudando de assunto):
Mas tu não tens tempo para fazeres o pedido de crédito, já estás ocupada com as reuniões com os novos
artistas. Podemos trocar de identidade. Eu fingirei que sou, na verdade, tu.
M:
Mas então eu primeiro tenho de te ensinar como é que eu sou...
(nesta altura as máscaras têm de estar completas. A partir deste momento M e H são respectivamente
Palhaço Pobre e Palhaço Rico. Dão algumas voltas sobre si mesmos para entrar nos personagens)
H:
Muito bom dia! Ora então a minha amiga palhaça vem apresentar a sua candidatura à vaga para palhaça!
M:
Bom dia! Parece que... deve haver um mal-entendido... isto não é uma instituição de crédito?
58
H:
É concerteza e a senhora palhaça está a falar com a pessoa certa.
Aqui eu sou o homem forte.
Atenção, atenção! O homem forte desafia todos e qualquer um a defrontá-lo! Quem quer deparar-se com
a consistência do seu portfólio? Quem quer avaliar a preparação dos seus investimentos? Ninguém irá
contra a sua carteira de activos?
Ninguém?
Ninguém?
(H pega numa suposta barra de ferro)
H:
Admirem-no enquanto ele faz uma aplicação financeira.
(H dobra a suposta barra de ferro)
H:
Como vê está perante um verdadeiro domador financeiro!
(com uma cadeira H finge que está a afastar animais)
H:
Lida com números como ninguém!
O surpreendente aumento dos impostos...
(levanta a cadeira como se estivesse a ser atacado de cima
Mantém os custos e as despesas controlados...
(aponta a cadeira noutra direcção)
É um momento verdadeiramente impressionante senhoras e senhores!
(aponta a cadeira noutra direcção)
A gestão financeira, o preço das operações, o cálculo contabilístico, o somatório, a selva dos números,
estão face a um domador intrépido.
M:
Já estou a ver que o senhor é muitas coisas
H:
É o facto de ter dinheiro sabe, permite-nos ir variando...
59
E eu próprio posso constatar que preenche uma das principais condições para o preenchimento do cargo
de palhaço. É evidentemente uma palhaça!
M:
É, sou, mas a concorrência é muita... ui! Sabe a partir do momento em que não é preciso nenhum tipo de
certificado... o que mais por aí abunda
(abana as nádegas)
são palhaços. Depois o que vai variando é a categoria de cada qual...
H:
Está então a querer dizer-me que ao contrário dos outros tem habilitações?
M:
Tenho! Olhe quer ver?
(vai buscar uma vassoura equilibra-a na mão H olha perplexo)
H:
Mas o que é que está a fazer?
M:
A mostrar as minhas habilitações...
H:
Ó palhaça! Uma habilidade não é uma habilitação!
M:
Ai não?
H:
Claro que não! Então não estava a dizer que hoje em dia, sem certificação, qualquer um era palhaço? O
que eu lhe estou a pedir são as qualificações que tem e lhe permitem ser um palhaço, desmpenhar
profissionalmente essa função.
M:
Ah! Pois... as... pois... é... pois... oh... pois... hum.... pois... qualificações. Não dessas não tenho... mas
canto canções...
60
H:
Muito obrigado, mas não. Não queremos um número músical.
Queremos um palhaço que saiba fazer humor. Para termos na nossa instituição um número final que
deixe o querido e respeitável público bem disposto. Que lhes encha os corações de alegria e o espírito de
esperança e os leve até casa com as suas cabeças um pouco mais leves. Afastadas das preocupações
quotidianas...
M:
Mas eu faço. Faço comédia deitada!
(deita-se de lado virado para o público com a cabeça apoiada na mão)
H:
Mas assim não pode ser...
(vira-se de barriga para cima)
M:
E assim, pode?
H:
Começo a suspeitar que não passa de uma mandriona...
M:
Não, isso é que não! Tenho apenas uma noção diferente da comédia. Não sigo a escola clássica,... lá por
casa somos mais vanguardas sabe...
H:
Cuidado que é muito pequena essa diferença...
Se fores pobre podes pensar que por pena os outros dar-te-ão que chegue para tu viveres. O suficiente
para seres inútil. A pensar só no tempo presente, quando os investimentos só dão resultados ao fim de
um longo prazo de tempo. Quando as oportunidades de criar algo de teu te foram sendo concedidas de
igual modo ao longo da vida e tu nunca as procuraste...
M:
Então no fundo os pobres são os priveligiados? Porque é que hás-de beneficiar os preguiçosos em
relação aos que se esforçam?
61
H:
Se calhar custa-lhes muito mais ser pobres de outros modos. A vida em caridade tem muitas limitações,
são muito poucos os benefícios. Por exemplo assim nunca serás mais do que isso, pobre... é isso que
queres tu ser então?
M:
Não, não, de modo algum! Aliás eu não vim à procura de emprego mas para contrair um empréstimo!
Quero ser uma empresária de circo!
H:
Isso parece-me interessante! Qual é o vosso potencial de crescimento?
M:
Lá no circo? Todos juntos? Diria... 35 cm!
H:
Estou a ver que estou perante uma verdadeira palhaça!
M:
Tem de ser! Sabe é que não nos podemos esquecer, se a felicidade não se compra como é que se dá e
recebe?
E por isso eu decidi dar felicidade!
H:
Sim! Afinal dar é também uma das quatro formas de lidar com dinheiro. Ele serve para comprar o
necessário, poupar o possível, gastar o suficiente e dar o que se pode!
M:
O dinheiro significa sempre mais do que moedas ou notas.
As pessoas medem o sucesso pelo dinheiro alguém tem. É a importância social do dinheiro que define o
nosso estatuto, mas, convém lembrar, que nem tudo tem um preço, nem tudo se compra ou vende, nem
tudo são bolas de sabão...
H:
E a riqueza material depende sempre, em absoluto, da atitude que temos em relação à riqueza em si.
Algumas pessoas falam abertamente do desejo que têm de ser ricas mas no íntimo sentem-se culpadas
por o serem e isso não é saudável.
62
M:
A economia precisa tanto da oferta como da procura. Os indivíduos precisam de aprender a dar, tanto
quanto aprender a receber.
H:
O que importa é o tamanho do coração, não o valor na conta.
M:
Agora uma questão de ética. Os fins justificam os meios?
H:
Eia! Nós ainda não demos essa matéria! Nós não demos isto...
M:
Amigos não se esqueçam, aprendam a pensar e lembrem-se que a vida e os espectáculos têm regras
diferentes...
H:
Os espectáculos terminam sempre numa nota alta, mas a vida tem muitos altos e baixos. Por isso...
H e M (em uníssono):
Que comece o espectáculo!
(voltam a fazer acrobacias e a tocar bombo e pandeireta como no princípio. até saírem do palco)
FIM
63
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