“ESCOLA METÓDICA” OU “ESCOLAS METÓDICAS”: UMA HIPÓTESE ACERCA DA
HETEROGENEIDADE DA HISTORIOGRAFIA FRANCESA FIN-DE-SIÈCLE
Clayton Ferreira e Ferreira Borges, UFG.
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INTRODUÇÃO
O presente trabalho procurou realizar uma reflexão acerca das contribuições que
a historiografia francesa produziu entre o final do séc. XIX e início do séc. XX no que tange à
fundamentação epistemológica da disciplina histórica, pois apesar das duras críticas que a
école des Annales efetuaram tanto a seus “pais intelectuais” quanto à geração anterior, em
uma atitude homogeneizadora, defendo a idéia de que autores como Fustel de Coulanges
não podem ser colocados lado a lado com a historiografia da “escola metódica”, como
Lucien Febvre faz em seu livro “Combates pela história”, quando efetua sua veemente
crítica à história tradicional, a que chama pejorativamente de “história historicizante / história
factual”. Pois, a nosso ver, é exatamente neste ponto que ele comete o deslize de
homogeneizar o século XIX, no que se refere aos seus erros, em uma atitude agressiva e
que ainda hoje é equivocadamente reproduzida no âmbito acadêmico brasileiro, herdeiro da
tradição dos Annales.
Deste modo, procurei averiguar a possível existência de duas “escolas
metódicas” no interior da historiografia francesa do respectivo período. Não se trata aqui de
inventar novos rótulos ou de formular variações dos já existentes, mas antes de partir dos
mesmos (considerando seu caráter depreciativo/pejorativo) para podermos pensar sobre
uma possível heterogeneidade de uma produção intelectual tão estigmatizada pela
ascensão institucional da assim chamada “nova história”. O objetivo aqui é o de refletir sobre
o período selecionado através de um olhar compreensivo, buscando identificar suas
contribuições epistemológicas para a disciplina histórica, partindo da bibliografia existente
(ou seja, de se ambientar com o teor das criticas efetuadas) e indo em direção às fontes
primárias (utilizamos para este intento a Revue Historique e a Revue de Synthèse
Historique), pois entendemos que um estudo que se limita a escamotear acerca de um
determinado problema, fazendo uso somente ou dando prioridade às fontes secundárias,
tem o seu resultado comprometido por proceder com idéias pré-concebidas para com as
fontes primárias, ou seja, trata-se de pensar como o trato para com as fontes deve ser
efetuado para que não cometamos o equívoco de reproduzirmos os discursos existentes
sobre o nosso objeto de pesquisa.
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METODOLOGIA
Como fontes principais foram utilizadas a Revue Historique e a Revue de
Synthèse Historique, focando inicialmente uma visão quantitativa do período selecionado.
Estas revistas foram escolhidas porque representam o principal meio de veiculação da
produção acadêmica francesa do referido período (1876-1914).
O trabalho heurístico teve como início a extração das revistas através do site
www.archive.org devido à sua recente digitalização e, posteriormente foi realizado a
catalogação das mesmas (ano, n°, volume), dos artig os e autores procurando construir um
quadro quantitativo que proporcionasse informações (diálogos efetuados e os autores
inseridos nele) suficientes para uma análise qualitativa dos artigos mais interessantes para
nossa pesquisa.
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RESULTADOS
Procurarei então no decorrer de meu trabalho de revisão bibliográfica deliberar
sobre o conceito positivismo, pautado na hipótese de que ‘é preciso defini-lo a partir dos
autores e não o inverso’, ou seja, a nosso ver torna-se mister entender o que cada autor
entende pelo termo e, assim por conseguinte, evitar o erro de buscar encaixá-lo em
compartimentos estanques a partir de uma definição una e portanto vaga do conceito. Neste
sentido, realizamos então um estudo sobre Fustel de Coulanges, autor que julgamos
referência no intuito de efetuar uma releitura do séc. XIX através de um “olhar
compreensivo”, almejando assim conhecer não somente seus problemas, mas também suas
valiosas contribuições para a constituição da ciência histórica.
Buscarei
discorrer
então
com
contornos
mais
específicos
sobre
a
heterogeneidade da historiografia francesa fin-de-siècle a partir de dois autores que se
encontram intimamente relacionados na fundação de um importante meio de veiculação da
produção científica francesa do respectivo período histórico: a Revue Historique.
Procuraremos no decorrer da investigação averiguar até que ponto Fustel de Coulanges e
Gabriel Monod se aproximam (se é que realmente convergiam sobre algum assunto) e em
que outros tantos pontos eles se afastam, pois quando mencionamos que os autores citados
participaram (em diferentes graus, é adequado que se ressalte) da criação da revista que
utilizamos como fonte neste trabalho, pode-se de maneira apressada concluir que os
mesmos compartilhavam de uma única concepção de história.
François Hartog começa sua análise destacando Fustel como um autor
“destoante” de seu tempo, momento este de fundamentação epistemológica da história, e
ainda que ele tivesse recusado “o lugar e a escrita” da história. Segundo ele a Revolução
francesa teria servido de referência para o Fustel pesquisador, e que o historiador Philippe
Ariès via nele um historiador que buscava estabelecer o sentido da história quando
“ressaltava as diferenças entre as épocas” e quando “mostra as diferenças de conjunto de
que as instituições são a resultante e a expressão”. (HARTOG, 2003)
Em seu texto “A erudição francesa” (Compte rendu de l’Académie dês Sciences
Morales, 106, 1876, p. 476-477) Fustel teria como objetivo apresentar a Revue Historique de
Gabriel Monod à academia, assim ele atribui à revista recém lançada as qualidades do
“método” e da “imparcialidade”, tendo como orientação básica a negação do uso de
“generalidades vagas”, dos “sistemas apriorísticos” e da “filosofia da História”. Tais
afirmações são segundo ele justificadas porque a revista e seus componentes estariam
inseridos dentro da “tradição” francesa de “ciência imparcial e rigorosa”. Mas essa relação
harmoniosa se estremeceria quando colocado o problema do método.
Hartog salienta que a partir de 1870 teria tomado forma na França uma “nova
história” que posteriormente seria classificada de “positivista”, e que inicialmente teria em
Monod seu representante mais notável quando se busca estabelecer uma interlocução entre
seus integrantes e Fustel de Coulanges. Este teria travado com Monod um conflito referente
ao método utilizado. Mas cabe perguntar: qual é o teor desta divergência?
Em seu texto intitulado “Da análise dos textos históricos” de 1887 (Revue des
Questions Historiques, 2, 1886, p. 5-35), Fustel responde a uma crítica de Monod,
chamando a atenção para a necessidade de se “apurar o verdadeiro pensamento de quem
escreveu” o texto, pois para ele o processo de análise deveria “examinar” “cada palavra” do
autor do texto utilizado como fonte. Aqui ele explicita a oposição que efetua entre “método
antigo” (que identifica como sendo o de sua prática), que entenderia por análise o “estudo
isolado” do texto, e “método novo” que segundo Fustel entenderia análise como “comentar”
o texto por meio de “comparações” com outros e que seria praticado pelos “jovens eruditos”.
Deste modo, Fustel não era contra o método comparativo, mas sim contra seu uso de forma
arbitrária, ou seja, quando este substituiria a análise. Percebe-se aqui que este conflito
referente ao método provoca uma “ruptura” entre dois pesquisadores que se estimavam,
tendo Fustel vários artigos publicados na própria Revue Historique
Em uma carta, Monod responde às criticas de Fustel argumentando que na
verdade os dois estariam de acordo com relação ao método na “teoria”, mas que
discordariam em sua prática, porque segundo ele Fustel via no “método analítico virtudes”
que ele não “dava o mesmo valor” e que atribuiria problemas ao “método comparativo” que
Monod também via no primeiro. Monod pensava que a análise não se utiliza da
interpretação do documento, e lembra a subjetividade da operação interpretativa ao mesmo
tempo em que a defende. Para ele o historiador deveria corrigir os erros dos autores dos
textos através da sua comparação com outros textos de forma simultânea com a análise,
evitando assim o risco de engano. Aqui Monod ressalta a competência de Fustel no que
tange às suas críticas porque elas o fariam “repensar as idéias aceitas”.
Em seu texto chamado “Como ler” (Revue de Synthèse Historique, 2, 1901, p.
257-259), Fustel afirma que “duvidar nunca é demais” fazendo referência aos “jovens
eruditos”, quando os criticam por proceder à leitura sobre determinado tema a partir de
“fontes secundárias”, segundo os “créditos” a elas “atribuídas” por outrem. Deste modo, tal
método obstruiria o “lugar da dúvida”, pois o pesquisador leria os textos somente para
verificar de forma fragmentada o que foi informado pelo trabalho de outros, ou até julgando
inútil a sua leitura. Neste sentido cairiam no erro de recorrer ao documento/fonte primária
com “explicações” “pré-concebidas” eximindo-se de efetuar uma leitura crítica sobre o texto.
Percebe-se aqui que sua critica à “escola metódica” se refere ao método no trato
com as fontes, pois tal atitude implicaria cair em uma espécie de ‘dogma’, no sentido de se
fazer uma busca do já sabido. Em função disso opõe “método antigo” e “método novo”
porque o primeiro consistiria em “ler primeiro os textos” devendo o historiador seguir os
“pensamentos do autor”, deixando tais pensamentos lhe conduzir a interpretação, mas logo
adiante ressalta os “riscos“ desta prática, pois se poderia cair no erro do próprio autor.
Assim propõe então como solução para este problema, que se “acredite” não em apenas
um, mas na totalidade dos documentos de uma determinada época, eliminando assim os
riscos, pois eles ou se corrigiriam ou se completariam.
Fustel argumenta em seu texto “O espírito de dúvida, o especialismo” (Revue de
Synthèse Historique, 2, 1901, p. 259-261) que o pressuposto básico para a investigação
histórica seria o “espírito de dúvida”, que o sujeito cognoscível deveria possuir em toda
empresa que se colocasse a realizar, pois este constituiria o “ponto de partida” do trabalho
do historiador. “Especialismo” para Fustel é todo método que não busca estabelecer “a
conexão entre os fatos”, limitando desta maneira a pesquisa a um tema isolado e,
posteriormente procura “reunir” grandes quantidades de informações. Hartog observa neste
texto que Fustel declara que a “análise é indispensável” assim como também o é o uso das
“especulações gerais”. Fustel defendia então que a melhor forma de se conduzir a pesquisa
historiográfica, quanto ao trato com os documentos, seria a de se dirigir primeiramente às
fontes primárias de forma minuciosa tentando lhe extrair todos os detalhes possíveis, para
somente depois recorrer às fontes secundárias, para que desta forma não se
comprometesse o trabalho com “idéias pré-concebidas”.
Fustel teria criticado em algumas anotações (traduzidas por Hartog) o que ele
chama de “espírito de sistema”, pois este seria composto por “convicções firmes” e por isso
comprometeria a pesquisa científica, porque os resultados seriam pré-conhecidos, assim as
“crenças” dos homens prejudicariam a busca pela verdade. Percebe-se aqui então a
aversão que Fustel tinha contra os ‘dogmas’ científicos, contrapondo então as ciências
compostas por “elementos variáveis”, neste domínio se encontrando a história, e o das
ciências “invariáveis” que seria o campo da psicologia. Desse modo, para ele o correto seria
proceder da “análise isolada” dos textos para só depois efetuar as “aproximações” entre
documentos (o que, de algum modo ou de outro, nos lembra o proceder do
individual/simples para o geral/complexo de Ranke, como observou Sérgio Buarque de
Hollanda), pois sua acusação contra Monod era a de que este “substituía” a análise dos
textos pela “comparação”, o que segundo Fustel seria uma prática que distorceria o
conteúdo dos mesmos.
François Hartog discorre ainda sobre o caráter político da disputa entre Fustel e
Monod, pois segundo ele os dois buscavam estabelecer através da história uma
“conciliação” para a França em um período pós-guerra. A diferença entre os dois neste
ponto também se refere ao que eles entendem por “conciliação”, pois para Monod a palavra
teria a função de interligar historicamente a “antiga e a nova França”. Enquanto isso para
Fustel ela significaria “desfazer as ilusões”, que a “historia liberal” teria construído para o
Estado-Nação francês, pautado no que ele designa de uma “ilusão revolucionária”, pois
discordava da eficácia da Revolução no que tange às reais mudanças nos valores humanos.
Hartog o situa aqui em uma vertente historiográfica que “atribuiria pouco valor à
ação” e que por isso teria um caráter “tradicional/contra-revolucionário”, opondo-se à outra
vertente que admitiria “possibilidades de ação da vontade”. Assim, segundo Hartog, Fustel
tinha por objetivo de nuance político a tarefa de “reatar o fio da tradição”, por isso ele se
preocupava tanto em defender a erudição francesa (que ele afirmava como a primeira) e o
“método rigoroso”, que segundo ele seria resultante dos séculos de sua produção. Neste
sentido, segundo Hartog, ele queria defender que a “única finalidade” para a história seria a
de “conhecer o passado” de forma objetiva, evitando estabelecer uma “síntese social” como
era o objetivo de Monod. Dentro deste contexto, é interessante notar que o método que
Fustel tanto se opõe é segundo ele mesmo de origem alemã, ou seja, é importante levar em
consideração o caráter político/patriótico da ruptura, pois o debate metódico entre os dois
autores ocorria em um momento delicado nas relações entre as duas culturas (Guerra
franco-prussiana de 1870-1871).
Quando Monod acusa Fustel de limitar o trabalho do historiador à de um “mero
copista”, o critica no que se refere ao método e à posição do historiador em relação ao
passado, pois segundo François Hartog, Fustel “reivindicava cada vez mais o passado pelo
passado” como um “ideal de ciência”, esta também aliaria “dúvida e crença” para assim se
formar “o verdadeiro espírito crítico”. Penso que estas idéias de Fustel não só não limitariam
o trabalho do historiador como buscava fundamentá-lo, enfocando em seus pressupostos
metódicos tais como a negação às idéias “pré-concebidas” ante à pesquisa científica. Assim,
Fustel teria “reconhecido um papel social” do sujeito cognoscível, e sua recomendação de
ausentar-se do presente para estudar o passado tinha o objetivo de “prevenir identificações
enganosas”, ou seja, buscando conhecer o passado de forma objetiva era necessário evitar
o “perigo” de impregnar o passado com o nosso presente. Segundo o autor, Fustel teria
afirmado em um prefácio sobre a necessidade de “se afastar dos acontecimentos e dos
grandes homens” e “inserir-se na longa duração”, pensando o trabalho do historiador como
devendo abranger um “amplo espaço de tempo”. Percebe-se aqui então que Fustel não
restringia sua pesquisa ao fato em si, ao “tempo curto”, mas ao trabalhar sobre as
instituições ele também buscava estender a pesquisa “às perspectivas da longa duração”
nos termos de Braudel e, portanto seria necessário o uso de generalizações. (BRAUDEL,
1978; HARTOG, 2003)
Hartog observa que Fustel em seu artigo sobre a “propriedade fundiária” defende
a singularidade dos “fatos históricos”, pois considera a distinção de seus respectivos
“tempos e os lugares”. O autor destaca que a critica de Fustel é baseada então no “uso
instrumentalista” que Monod faria quanto ao método comparativo, no intuito de apenas se
“confirmar uma hipótese formulada” para que não se cometesse o erro de se buscar
somente provas para o já sabido. Nota-se aí o problema da relação entre o particular e o
universal no conhecimento histórico, pois esta divergência referente ao método analítico e
comparativo relaciona-se aos termos metódicos “análise e síntese”, que exprimem como
este problema foi tratado na França em fins do século XIX.
Fustel considerava então que o método de Monod era “subjetivo” e por isso
“anti-científico”, porque impregnaria o objeto de estudo com as “idéias pessoais” do sujeito
cognoscível. Deste modo, a crítica de Fustel ao método dos “jovens” teria como cerne a
questão da objetividade na história, pois para ele seria impossível atingi-la utilizando-se de
idéias pré-concebidas aos documentos. Assim, o historiador deveria se “desvincular do
presente”, afastar-se dele em direção ao passado, mas não tentando fazê-lo presente.
Em seu texto “A história, ciência pura” de 1875 (proveniente de anotações que o
mesmo não publicou em vida mas que foram “classificadas por C. Jullian” e que Hartog
publicou em seu livro), Fustel defende a imparcialidade na história, pois para ele só assim se
poderia alcançar a verdade histórica, “renunciando ao presente”. Esta recomendação assim
como em Ranke pode ser explicada em decorrência de sua preocupação com a objetividade
na história, pois tendo por “único objetivo” a verdade, era preciso resguardá-la da inserção
de interesses em sua prática. Podemos estabelecer aqui um elo com Ranke, pois este
também defendia a imparcialidade, mas assim como Fustel não pode ser considerado como
“positivista”, pois nunca renunciou às generalizações depois da aplicação de um método
crítico rigoroso. Neste texto, merece destaque também a defesa que Fustel faz da História
enquanto saber científico pautado no valor da “imaginação histórica” para o oficio do
historiador, no intuito de “formar no espírito uma imagem exata das sociedades de outrora”.
Assim, em fins do século XIX ele já defende uma idéia que Collingwood retomará mais de
trinta anos depois na Inglaterra.
Segundo Hartog, o problema do “detalhe” e da “generalização” na história toma
na França o caminho dos métodos correspondentes: “análise e síntese”. O autor cita neste
ponto Henri Berr (fundador da Revue de Synthèse Historique) como um historiador que teria
se lembrado de Fustel nos primeiros números de sua revista, como um pesquisador que
teria utilizado a síntese em uma escala reduzida. Assim, Berr como Fustel pensava que a
“síntese” deveria suceder um “excesso de análise”, ou seja, a preocupação de Fustel com a
objetividade não necessariamente quer dizer que negasse o uso de generalizações, como
também reconheceu Langlois e Seignobos em seu “Introdução aos estudos históricos”,
considerando esta prática de Fustel como uma “falha de método”.
Neste sentido, creio podermos afirmar que Fustel de Coulanges seria avesso à
idéia de “amontoar os fatos” para uma posterior reunião, como seria característica dos
“positivistas”, pois apesar de sua extrema preocupação com a análise, teria feito também
uso de “teorias gerais”, como ele mesmo admite ter realizado em “A cidade antiga”, notando
aqui sua articulação entre o “particular e o geral”. Desta forma, Fustel não pode ser
considerado como um “mero compilador de fatos”, pois estava atento tanto para a busca da
verdade quanto para o geral e as temporalidades mais extensas. (COULANGES, 2000, p. 115).
O conceito “positivismo”, que logo se coloca em questão quando se fala em
“escola metódica”, é importante ressaltar que se trata de um termo de difícil definição, pois
como constatam Bourdé e Martin há uma confusão generalizada entre aquele e o conceito
chamado “espírito positivo”. Destarte, ressaltam o erro de se classificar os “metódicos” de
“positivistas”, porque tal escola histórica não teria tido como “inspirador” o francês August
Comte e sua filosofia científica de cunho “determinista e especulativo”, mas sim o próprio
Leopold Von Ranke e sua “ciência positiva”, que assim seria denominada por buscar a
objetividade na história.
Deste modo, segundo Bourdé e Martin, ao procurar realizar os preceitos de
Ranke (que Sérgio Buarque de Hollanda define como um ideal) à risca os metódicos caíram
em contradições referentes aos “princípios” explícitos e à ação implícita. Talvez fosse então
a prática científica que Hayden White chamaria de “empirismo ingênuo”, a que exclui o
próprio Ranke. Mas novamente lembrando a dificuldade de definição do conceito, torna-se
digno de nota o fato do autor brasileiro José Carlos Reis não ter conseguido definir (ou se
eximido de solucionar tal problema) de forma satisfatória a distinção entre “positivismo” e
“espírito positivo”.
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CONCLUSÃO
Deste modo, concluímos que o valor maior de nosso trabalho está em refletir
sobre os problemas inerentes à fundamentação da História enquanto disciplina científica
através do conceito positivismo segundo a hipótese de que é preciso saber o que cada autor
entende pelos mesmos e, para isso entendemos que o mais plausível seja utilizar as “fontes
originais”, para não corrermos o risco de efetuar interpretações distorcidas sobre a
historiografia do período.
Pautado então no trabalho realizado até agora (levantamento quantitativo das
fontes e qualitativo da bibliografia existente) acredito podermos inferir sobre a possibilidade
de ter existido na França na segunda metade do século XIX não uma, mas talvez duas
“escolas metódicas”, pois, como ficou explícito no decorrer da discussão, Fustel de
Coulanges não compartilhava dos mesmos princípios metodológicos que os “metódicos” em
sua prática historiográfica e, em função disso sustentamos a idéia sobre a heterogeneidade
do período historiográfico analisado.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOURDÉ, G.; MARTIN, H. A escola metódica. In: ______ As escolas históricas. Lisboa:
Publicações Europa-América, s/d, pp. 97-118.
BRAUDEL, F. Escritos sobre a história. São Paulo: Perspectiva, 1978.
COULANGES, N. D. Fustel de. A cidade Antiga. Ed.: Martins fontes, 4º edição, SP, 2000.
FEBVRE, L. Combates pela história. Lisboa: Editorial Presença, v 1, 1977.
HARTOG, F. O século XIX e a História: O caso Fustel de Coulanges. Rio de Janeiro: UFRJ,
2003.
HOLLANDA, S. B. de. O atual e o inatual em Leopold Von Ranke. In: __. (Org.) Ranke:
História. São Paulo: Ática, 1979.
REIS, J. C. A história, entre a filosofia e a ciência. São Paulo: Ática, 1996.
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