MANUELINO. DISCUSSÃO DO
CONCEITO
O Tardo-Gótico e o Manuelino.
Problematização dos conceitos e estado da questão: de
Francisco Varnhagen (1842) a Hélder Carita (1999).
O polimorfismo Manuelino, alguns exemplos: Paço de
Sintra, Charola do Convento de Cristo, Capela funerária
de Garcia de Resende.
Manuelino: questões para discutir
1. O que é um «estilo»?
2. Os estilos exprimem o «Zeitgeist», i.e., o «espírito de uma época»?
3. Em que contexto nasce o conceito de «Manuelino»?
4. Existem estilos nacionais? Qual a interacção entre o conceito de
Manuelino e a construção da identidade nacional portuguesa nos
sécs. XIX-XX?
5. Como pode ser sintetizada a polémica em torno do Manuelino?
Quais as suas principais figuras (de Varnhagen a Carita)?
6. O Manuelino é um estilo? Qual a sua relação com o Tardo-Gótico?
7. O que é que define o Manuelino em termos artísticos?
8. O reinado de D. Manuel é caracterizado pela unidade estilística ou
pela diversidade?
Estilo
1.
Corresponde ao conjunto dos elementos formais (e, em menor grau, aos
elementos estruturais, materiais e ao vocabulário ornamental) apresentados
por uma obra de arte que permitem a sua integração numa categoria
comum, agrupando numa mesma série diferentes objetos unidos pela
autoria, local de produção ou período.
2.
Pode ser identificado em termos individuais (estilo de um artista), coletivos
(uma escola regional) ou em termos de grandes categorias classificativas da
HA (estilo, transregional, de um período).
3.
Estes elementos formais distintivos encontram-se na análise da modelação
da cor, do tipo de traço, do volume, da textura, dos ornatos, das técnicas
empregues, e, em termos mais globais, no modo de articular esses
elementos com a especificidade de um determinado medium.
4.
Os elementos formais comuns podem ter, ou não, uma dimensão ideológica
(exs. diferença entre os uniformes nazis e soviéticos na II GM [elitismo vs.
igualitarismo]; utilização dos grotescos em Portugal no séc. XVI).
Principais referências
1.
Francisco Varnhagen (1816-1878). Texto de 1842 sobre o Mosteiro dos Jerónimos
(Noticia Historica e Descriptiva do Mosteiro de Belem, Lisboa).
2.
Joaquim de Vasconcelos (1849-1936). Várias obras, sobretudo texto de 1885 sobre o
Manuelino (Da Architetcura Manuelina, Coimbra).
3.
Reinaldo dos Santos (1880-1970). Várias obras, em especial uma de 1952 (O Estilo
Manuelino, Lisboa).
4.
Vergílio Correia (1888-1944). Várias obras, sobretudo cap. sobre arte manuelina
editado em 1933 (História de Portugal, Barcelos, vol. IV).
5.
Mário Tavares Chicó (1906-1966). Sobretudo capítulo sobre arquitetura editado em
1948 (A. Lacerda, ed., História da Arte em Portugal, vol. II, Porto).
6.
Pedro Dias (1950-…). Várias obras, sobretudo um livro de 1988 (A Arquitetura
Manuelina, Porto)
7.
Hélder Carita (1950-…). Livro de 1999 (Lisboa Manuelina e a formação de modelos
urbanísticos da época moderna : 1495-1521, Lisboa)
8.
Paulo Pereira (1957-…). Livro de 1990 (A Obra Silvestre e a Esfera do Rei, Coimbra).
Francisco Varnhagen (1816-1878), na introdução do seu opúsculo sobre o mosteiro
dos Jerónimos, apresenta o Manuelino como “um estylo original portuguez não
defenido até agora” (Varnhagen, 1842: I). Defendia-se a ideia de que o manuelino
havia resultado de um conflito entre o medieval e o clássico, sendo um estilo
nacional que tentava resistir aos avanços da Renascença: “Quasi que sósinha a terra
dos nomes acabados em I, proclama a imitação, lavra-lhe o decreto, assigna-o, passa-o
pela chancellaria e fa-lo promulgar na lingua italiana. – E todos imitámos, porque
não houve quem dissesse que isso não era o melhor” (1842: 8). Por isso, não
surpreende a criação e posterior fortuna de um estilo «nacional», «anti-clássico»,
numa época em que se começava a aliar ao olhar apaixonado pela arte medieval
uma maior capacidade analítica e taxonómica. Assim, a originalidade do gótico
final português acabaria por ser identificada e definida por dez características
morfológicas identificadas por Varnhagen, às quais se juntava, como cimento
ideológico dessa expressão artística, a actividade dos descobrimentos marítimos e
do novo comércio intercontinental. De facto, logo desde a origem que a definição do
manuelino implicava uma associação ao período dos descobrimentos: “Belem junta
ao complexo de todas estas idéias architectonicas [as dez características
morfológicas] a associação da obra toda á memoria do infante D. Henrique, dos
descobrimentos e de S. Jeronymo” (Varnhagen, 1842: 11).
Almeida Garrett considera, em 1846, que “Belem e os Luziadas são as cousas mais
indisputavelmente portuguezas e originaes que há em Portugal”.
Joaquim de Vasconcelos, ao contrário do que geralmente se diz, não negava a
existência de uma decoração que se pudesse adjectivar como «manuelina»,
resultante da “desorganisação do systema gothico” (Vasconcelos, 1885: 14). Em
contrapartida, aquilo que Vasconcelos negava por completo era qualquer
possibilidade do manuelino se poder classificar como um estilo arquitectónico por
lhe faltar a ordem e a clareza necessárias. De facto, demonstrando possuir uma
visão semi-sacra da arquitectura, Joaquim de Vasconcelos afirma que a construção
manuelina “(...) é uma obra cheia de remendos mais ou menos interessantes, mais ou
menos pitorescos, mas [onde] a harmonia, a ordem, a clareza de concepção, a lei
suprema, sem a qual não ha obra de arte completa – desapareceu”, daí “a sua
importância secundaria, a sua bastardia” (Vasconcelos, 1885: 13).
O desprezo de Vasconcelos pelo manuelino leva-o a considerá-lo “um eclectismo que
aceita o novo e o velho sem critica; uma accumulação de elementos contradictorios,
uma ostentação vã, porque não obedece a nenhum principio superior” (idem: 14), era,
enfim, a expressão da “(...) indisciplina na arte, como reflexo da indisciplina nos
costumes” (idem: 15). E insistindo na ideia da ignorância dos lusos, Vasconcelos
contrapõe o manuelino às virtudes do classicismo: “(...) uma prova flagrante do
triumpho da mediocridade e da ignorancia sobre uma doutrina, como a de Vitruvio,
cujas obras toda a Renascença, toda a Europa culta respeitava como um Evangelho.
Repetimo-lo mais uma vez: triumphava o capricho, o diletantismo, que tractava a arte
como cousa venal” (Vasconcelos, 1885: 15).
Para Joaquim de Vasconcelos, portanto, a identidade do manuelino não é estrutural,
mas tão só decorativa, e esta é insuficiente para definir um estilo. Segundo o autor,
“Tudo o que diz respeito á ornamentação é pois um accidente, e tem uma importancia
secundária” (1885: 9). E para ser mais claro, lembra que “n’esses edifícios manuelinos”
grassa “a confusão de elementos decorativos, provenientes de varios paizes, uma
amalgama que não obedece aos preceitos de nenhuma eschola, o producto do acaso, do
capricho, e muitas vezes de uma phantasia desregrada” (idem: 13). Mas mesmo
reconhecendo, pela negativa, as características da ornamentação dita manuelina,
Joaquim de Vasconcelos considera que ela não possuía a originalidade absoluta que se
lhe reclamava, devendo antes ser colocada a par do isabelino ou plateresco espanhóis,
negando-lhe assim a possibilidade de ser inteiramente «portuguesa»: “Nem em Belem,
nem na Batalha, nem em Thomar ha construcção manuelina que exceda os primores de
Salamanca, Valhadolid, Segovia, Toledo e Burgos; a mesma, senão maior riqueza, uma
imaginação prodigiosamente fecunda, uma variedade immensa de motivos de
ornamentação, e um lavor que desafia a comparação com tudo o que temos de mais
perfeito na epocha manuelina” (Vasconcelos, 1885: 10). Ou ainda, “(...) até hoje
ninguem provou, pela critica comparada dos monumentos da Europa meridional, que os
caracteres d’esse estylo sejam propriedade exclusiva dos nossos edificios da epocha
manuelina” (Vasconcelos, 1885: 7). A má opinião em que Vasconcelos tem a decoração
manuelina estende-se àquilo que ele identificou como falta de coerência escultórica, na
medida em que no manuelino coexistiam formas estilizadas ao lado de formas
naturalistas, além de se utilizarem motivos com escalas diferentes, que supostamente
funcionariam em simetria, e de se sobreporem motivos distintos sem a menor ligação
entre si (idem: 14).
Principais arquitetos
1. Diogo de Boitaca (c.1460-1528?), genro de Mateus Fernandes .
Obras: igreja de Jesus (Setúbal);, c.1490-1500 mosteiro da Batalha,
c.1509-20; início da igreja de Belém, c.1502-16; mosteiro de Santa
Cruz de Coimbra (c.1507-13); igreja da Pena (Sintra, c.1507)
2. Diogo de Arruda (c.1480-1531). Obras: Baluarte do Paço da Ribeira
(1508-1510); fachada ocidental do Convento de Cristo em Tomar
(1510-13);
3. Francisco de Arruda (c.1480-1547), irmão do anterior e pai de
Miguel de Arruda. Obras: Torre de Belém (1514-19); Fortes de
Azamor, Safim, Mazagão (Marrocos, c.1513-15);
4. João de Castilho (c.1470-1552). Obras: capela-mor da Sé de Braga
(1509); ig. Matriz de Vila do Conde (c.1510); fachada S da igreja de
Tomar (c.1513-15); fachada S e abóbadas da ig. de Belém (1517c.1530);
Paço de Sintra
Polimorfismo manuelino:
- polimorfismo material: as mesmas formas surgem em diferentes suportes (azulejo,
pintura mural, carpintaria, pedraria)
- polimorfismo estilístico: o mesmo suporte/medium apresenta diferentes estilos. Por
ex., PM testemunha a simultaneidade do revival «mourisco» de D. Manuel e o
interesse pelas ilusões tridimensionais renascentistas (aplicadas apenas a
determinadas formas geométricas como paralelepípedos, prismas, cubos, etc.)
- PM do Paço de Sintra representa também, paradoxalmente, o expoente da
complementaridade, da emulação e da oposição entre pintura mural e azulejaria
nos inícios do século XVI.
Azulejo alicatado, c. 146070.
CAPELA PALATINA
JARDIM DA PRETA
JARDIM DA PRETA
SINTRA
LEIRIA
LEIRIA
SINTRA
REBOREDA
SINTRA
BRAGA
Principais “escolas“ do
mudejarismo ibérico
TOMAR
SINTRA
PÁTIO CENTRAL
PÁTIO CENTRAL
CASA dos BICOS
QUINTELA de
LAMPAÇAS
TÁVORA
VILA MARIM
O REI D. MANUEL E A REFORMA
DA IGREJA DE TOMAR
– O recheio artístico:
• O recheio da nave: o cadeiral e outras obras.
• Uma verdadeira Gesamtkunstwerk - a Charola como Obra
de Arte Total : pintura mural, pintura de cavalete, escultura
de vulto, talha, guadamecis, estuques, vitrais.
Desenho de 1809. Olivier de Gand e
Fernão Muñoz (1511-13).
[Coro da Igreja do Convento de Cristo e Cadeiral (lado Sul)]. Gravura do mesmo autor da anterior.
In Monumentos de Portugal de Inácio Vilhena Barbosa Lisboa, Lisboa, 1886, p. 200, com a
designação “Prospecto de um lado do coro do Convento de Christo, em Thomar” Vol. I, tomo 1, p.
115. Este desenho, que como o anterior deve datar de 1809, foi depois editado em Postal ilustrado.
Cópia de um desenho antigo. Collecção da Havanesa, n.º 39.
FUNCHAL
COIMBRA
Figos: putti no meio de festões constituídos por ramagens e folhagens de figueira e
figos. (Capialço do janelão do Tramo 5).
Capela funerária de Garcia de Resende
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Apresentação do PowerPoint