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João 20.26-31 – pregação - EST – 10 de Abril de 2013
Erli Mansk
Numa mesinha à frente, um símbolo: Bíblia com uma vela pequena, acesa, e vários livros de teologia.
Graça e paz a vocês da parte daquele que era, que é e que há de vir. Amém.
Segundo o calendário da igreja, estamos vivendo o Tempo Pascal, que inicia no Domingo da
Páscoa e se estende até o Domingo de Pentecostes. Este é o tempo em que o Cristo ressurreto
é tema central de nossas pregações.
Creio que a história do texto do evangelho de hoje seja bastante conhecida por nós. Quem
não ouviu falar de Tomé?O que nos vêm à mente quando nos lembramos deste discípulo?
Injustamente, ao nome de Tomé, imediatamente associamos palavras como “incredulidade”,
“dúvida”, “descrença”. É desse personagem que surgiu a expressão popularizada "Fulano é
feito Tomé: precisa ver para crer".
Será mesmo Tomé um discípulo incrédulo como a tradição e nós o classificamos?
Retomemos a históriarelatada por João. Porém, vamos retornar a alguns versículos anteriores
ao nosso texto, onde inicia a história da aparição de Jesus aos seus discípulos.
Duas cenas antecedem à cena do nosso texto.
1) Primeira cena: Diz o texto que os discípulos estão reunidos no Primeiro dia da semana,
com as portas trancadas, com medo dos judeus. De repente, Jesus se põe no meio
deles.
Ele os saúda Paz seja convoscoe mostra os sinais de suas chagas. Neste encontro ele
sopra o ES sobre o grupo reunido e o envia à missão. Neste dia, curiosamente, Tomé
não se encontra no meio deles (o motivo não é dito);
2) Segunda cena: os discípulos se encontram com Tomé. Contam-lhe que viram Jesus.
Tomé duvida, dizendo: “se eu não vir nas suas mãos o sinal dos cravos, e ali não puser
o meu dedo, e se não puser a minha mão no seu lado, de modo algum acreditarei”.
3) O terceiro cenário desta história é formado pelo nosso texto. Passados oito dias desde
a primeira aparição de Jesus, os discípulos se encontram novamente reunidos.
E Tomé está entre eles. As portas estão trancadas, Jesus vem e se põe no meio deles.
Jesus os saúda com a mesma frase Paz seja convosco e logo em seguida se dirige a
Tomé, dizendo-lhe:
“põe aqui o dedo e vê as minhas mãos; chega também a mão e põe-na no meu lado;
não sejas incrédulo, mas crente”. Mas Tomé nem mesmo toca Jesus. Sua resposta é a
confissão: Senhor meu, Deus meu!
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Observemos o seguinte: esta história está dividida em três cenas, mas estas cenas
acontecem em dois locais distintos. Vejamos:
Primeira cena – onde acontece? O texto fornece indícios para localizarmos esta cena na
reunião comunitária. Os discípulos estão reunidos no primeiro dia da semana, isto é, no
domingo.
É preciso considerar que para a comunidade joanina, o Domingo já é uma instituição na
vida da comunidade cristã. E era o dia do seu culto! Lembremos que Tomé não estava
presente neste dia.
Segunda cena – onde acontece? Os discípulos se encontram com Tomé e dizem: vimos o
Senhor. E Tomé os questiona, duvida da palavra dos seus companheiros.
Como Tomé não esteve no culto, este encontro pode ser localizado fora dele, isto é, pode
ter sido um encontro casual, num outro dia, em um lugar qualquer.
Terceira cena – onde acontece? Aqui o texto dá novamente indícios de se tratar de uma
reunião comunitária, o culto semanal. É dito:
Passados oito dias, estavam outra vez ali reunidos os seus discípulos. Quer dizer, oito
dias correspondia, na contagem antiga (chamada contagem em série) uma semana depois.
No caso, se o primeiro encontro dos discípulos foi no Domingo seguinte ao da Páscoa, o
segundo foi no Domingo posterior àquele. Desta vez, Tomé estava entre eles.
Recordando, as cenas acontecem em dois locais e momentos distintos: a primeira e a
terceira cenas acontecemna reunião comunitária de Domingo, ou seja, no culto, a segunda
cena acontece fora dele, em algum lugar!
E agora, tendo estas cenasem mente e os locais em que elas se desenrolam, olhemos
novamente para o personagem Tomé, a quem é atribuído a incredulidade, a dúvida, a
descrença.
Lá fora, no encontro casual com seus amigos, na rotina da vida, na luta diária, Tomé reage
de uma forma. Outra coisa é o Tomé no culto, na reunião comunitária.
Lá fora, ele questionou, ele duvidou, pôs em cheque o que seus companheiros disseram.
Dentro, na reunião da comunidade, no culto, Tomé é acolhido por Jesus em sua dúvida.
Nada é dito sobre Tomé ou sobre sua dúvida. Jesus simplesmente vai ao seu encontro. Ele
lhe dirige a sua palavra e a única reação deste discípulo foi uma confissão: Senhor meu,
Deus meu!
E esta não foi uma confissão qualquer. Conforme a exegese deste texto, Tomé é aquele
que confessou a divindade de Cristo.
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Em outros relatos de aparição de Jesus, os discípulos e as discípulas, ao reconhecerem
Jesus, o chamam “Mestre”. Tomé diz mais, ele diz Senhor e Deus! E esta confissão brotou
no espaço do culto!
O culto, como espaço comunitário de cultivo da fé, é fundamental para a vida cristã. Neste
espaço somos acolhidos/as assim como somos, com nossas perguntas, os
questionamentos que fazemos lá fora, na vida diária, quando os sofrimentos por quais
passamos nos esmorecem e perguntamos por Deus.
Pensando, em específico, em nós, como pessoas na EST, podemos muito facilmente nos
identificar com o Tomé de fora, aquele que duvidou!
O estudo de Teologia é ato de investigação. Biblioteca, salas de aula, escrivaninhas são
espaços dessa investigação, - diferentes dos espaços de espiritualidade.
Fazer teologia significa examinar questões da fé como se fossem objeto!
Eu me lembro, por ex., de quando cheguei aqui para estudar teologia.
Especialmente no início do curso, meus colegas e eu tínhamos muita expectativa de que
íamos aprender coisas sobre Deus, sobre o mistério da fé, questõesque até então não
compreendíamos.
Íamos aprender questões que nos ajudariam, quem sabe, a aumentar a nossa fé, masprá
nossa surpresa o que aconteceu, em primeiro lugar, foi o contrário. Veio a dúvida. E, com a
dúvida, veio também o medo de perder a fé.
Sei que isto continua acontecendo com quem chega aqui. Mas, como Tomé, não nos
assustemos!
Olhemos para mais adiante. O evangelista João, através da história de Tomé nos aponta a
saída! O Tomé do nosso texto encontra-se noespaço do culto, da comunidade.
Relembremos: a única reação de Tomé, ao encontrar-se com Jesus e ser acolhido por ele,
foi a confissão de fé: Senhor meu, Deus meu.
Talvez, ele foi capaz de proferir uma confissão tão forte e tão profunda porque ele
conviveu com a dúvida.
A dúvida faz parte da fé, ajuda a crescer e até a aprofundar a fé.
O problema, portanto, não é a investigação teológica nem mesmo o fato de duvidarmos de
Jesus e de o questionarmos.
A questão é ficar nisto, é ficar só com a investigação, só com o questionamento, só com a
teologia acadêmica, só com razão.
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Tomé nos mostra que os dois lugares são igualmente importantes, o espaço de fora, da
objetividade, onde os questionamentos falam mais alto e o espaço de dentro,
da comunidade reunida, onde se cultiva a espiritualidade e se aprofunda a fé, onde nem
mesmo é necessário tocar em Jesus, pois é ele quem nos toca, através da Palavra, da Ceia,
da música, das orações.
Para Tomé, o aprofundamento da fé no Cristo ressurreto aconteceu no espaço
comunitário do culto.
(A propósito, o arquiteto deste prédio conhecia esta história de Tomé muito bem!
Eleprojetou a capela e a biblioteca para estarem frente a frente – a antiga biblioteca
estava localizada, aqui em frente, onde temos agora a sacristia e os andares superiores. Lá,
o espaço da investigação acadêmica, aqui, o espaço da espiritualidade, coexistindo frente
a frente).
Segundo a experiência de Tomé, é no encontro destes dois espaços, o da investigação e o
da espiritualidade, que pode brotar uma profunda confissão de fé. (A simbologia aponta
para esta relação)
O evangelista João, com esta narrativa da aparição de Jesuse da dúvida de Tomé, mostra
que a história da Páscoa, embora seja um tema que suscite especulações, tem como
elemento determinante a fé, fé esta que nasce da pregação e é fortalecida na comunhão
do Corpo de Cristo, na Ceia do Senhor.
Por isso, a reunião da comunidade em culto não é algo opcional, é determinante para a
nossa vida de fé. Amém!
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