A MODA COMO UMA EXPERIÊNCIA
COLETIVA DO CONTEMPORÂNEO
Luciana Pavão
“Bem vindo à Era Virtual”, era o que dizia a mídia na virada
do novo século, e é o que diz Luciana Pavão nesse artigo
onde enfatiza as mudanças comportamentais e o novo modo
de vida a que somos conduzidos. A influência da imagem na
moda e da virtualidade sobre o aspecto cotidiano e sobre o
homem.
Angústia, ansiedade e uma profunda sensação de vazio
Vivemos em tempos contraditórios, conflitos, desastres, miséria, luxo, novas
tecnologias, clonagem, contestações... tudo co-habita.
Não era exatamente este paradoxo que pretendíamos encontrar em uma mudança de
século. Quem sabe os “Jetsons” ainda estão por vir?! Ainda pode ser uma conseqüência das
inconseqüências do próprio homem.
O resultado de tantas mudanças no comportamento humano nos faz refletir o papel
do ser humano na terra, nos faz repensar nossos instintos, de onde viemos (da natureza) e
para onde vamos (ao encontro de tecnologias cada vez mais avançadas, que pela
perversidade do próprio homem, nem sempre o completam, podendo até substituí-lo.
Tornar-se mais necessário... imagine “Matrix”!). Por quais caminhos andamos, para onde
vamos, e qual é o ideal para a humanidade? Precisamos rever conceitos, ir de encontro ao
nosso interior, rever necessidades e desejos, medos e entusiasmos.
Vivemos duas realidades; uma realidade interior que busca incansavelmente por
“tais respostas” e os poderosos anseios públicos controladores da mídia e da população,
uma realidade coletiva.(Melinda Davis, A Nova Cultura do Desejo). Empreendemos uma
grande busca para a satisfação do ser humano enquanto indivíduo em um mundo material.
Ao não alcançarmos o equilíbrio interior, frustamo-nos e partimos para uma busca em
outros limites: A realidade imagética.
Como preencher o vácuo que existe entre realidades?
Que realidade vivemos então?
O mundo imagético parece nos despir fronteiras para que consigamos continuar esta
busca constante de respostas para a construção de uma individualidade. Mas, o
desprendimento de um mundo físico para uma realidade tão etérea e “fantasiosamente
real” ainda é tão recente que nem nos damos conta desta transição; deixando então os níveis
de equilíbrio coletivo abalados.
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Vivemos em busca de sensações e poderes, uma realidade baseada na consciência.
Passamos a encarar coletivamente uma vida extra-existente no universo intangível do
pensamento, da imagem e da idéia.
A internet foi a grande propulsora do desvinculamento em massa de um mundo
físico para ambientes virtuais. Viramos reféns de um mundo enlouquecedor que realmente
tirou nosso ponto de equilíbrio. A WEB é real! Vivemos “o grande mundo imagético que
criamos”. Vivemos a “desrealização”. As fronteiras do invisível foram quebradas.
Bem vindo a Era Imagética
Situe-se, até nosso dinheiro é imagético, o poderoso cartão de crédito, nosso
patrimônio líquido é a matéria prima da qual são feitos os sonhos.
Os vírus infectam não só a nós, mas também nossas máquinas. Somos obrigados a
acreditar que nosso poder mental afeta nossa integridade física - o stress; e também a cura,
através do poder da mentalização da própria cura.
O sexo possui seu lugar bem definido na era imagética, a fantasia sexual “linkada” à
mídia e à pornografia on-line. Os limites da ciência habitam regiões invisíveis, já não se
consegue provar todas as teorias experimentalmente, existem forças (des-conhecidas,
partículas minúsculas, física quântica, DNA, clonagem; assuntos obstantes fazem parte do
dia-a-dia, são uma possibilidade real).
Começamos a experimentar tal experiência desde a década de 50 com o cinema e a
televisão que passaram a fazer parte de nossas vidas. Hoje a mídia alcança vários níveis:
eletrônicos, televisão, rádio, imprensa, jogos de computador, internet, chats on-line, mp3...
Somos bastante afastados da realidade física. A realidade virtual não ocupa apenas nosso
tempo pessoal e social, mas também grande parte de nossos cérebros.
Considere o mundo físico e o “Brave New World” imagético; podemos nos
localizar na transição para uma 2° etapa da História do Homem, onde nossos níveis de
capacidade de compreensão e interação variam drasticamente.
Hoje tentamos incansavelmente dar sentido a uma nova condição humana
incompreensível. Tudo de mais importante se passa dentro de nós de maneira
extremamente confusa. A cabeça funciona ininterruptamente. Atenção! Estamos totalmente
desestabilizados. Não conseguimos impedir nem ao menos controlar a quantidade de
estímulos que recebemos.
Qual a verdadeira relação de tempo e espaço hoje?
O que somos em um universo inconstante onde vivemos transitando
“entre vidas”?
Em um mundo digitalizado onde a forma de expressão imagética é variável,
momentânea e totalmente volúvel, as pessoas passam a viver superficialmente. Uma
tentativa (desesperada) para encontrar-se em meio a duas realidades.
“Quem somos se a toda hora somos mais um personagem de nós mesmos?”
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Tentamos nos encaixar em qualquer padrão, todos decadentes em um mundo onde
os padrões já não existem mais. Em contrapartida o corpo ganha importância, passa a ser
tão somente o veículo pelo qual se expressam as mais profundas verdades, forma de
expressão do inconsciente, materialização da verdadeira individualidade, onde conseguimos
visualizar desejos, anseios e súplicas.
Nas palavras de Virgínia Woolf, com relação às roupas “mudam sua visão do
mundo e a visão do mundo sobre nós”.
Levando em consideração a roupa como forma de expressão, e a moda no seu papel
social, com a função de criar e materializar novas sensibilidades causando sensações e
reflexões, questionando e incomodando, podemos citar alguns profissionais e suas críticas
sobre o mundo que nos cerca:
Yohji Yamamoto e o equilíbrio assimétrico da natureza humana, que é imperfeita;
Martin Margiela e a padronização dos corpos, as dimensões “corretas”, o
consumismo e a massificação da moda em si;
Rei Kawakubo e a organicidade dos corpos em contrapartida à perfeição geométrica;
Alexander Mc Queen e as contradições entre ver e ser visto, sanidade e loucura,
dose prazer, narcisismo e solidão.
O ser humano vive em constante mudança, o objetivo é alcançar o equilíbrio, afinal
não fomos preparados para este novo mundo em que começamos a viver, passamos dia
após dia sofrendo como se tudo fosse normal. Estamos sempre em desvantagem. Essa
pressão interna nos faz enlouquecer. Lutamos por nossa saúde mental.
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