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Brasil indo-lusitano: As influências socioculturais das Índias
Orientais na colonização brasileira
V Mostra de
Pesquisa da PósGraduação
Rodrigo Araújo Maciel, Profª Drª Ruth Maria Chittó Gauer (orientadora)
Programa de Pós-Graduação em História, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, PUCRS.
Introdução
A construção do Império Ultramarino Português, fenômeno iniciado no decorrer do
século XV, não deve ser concebida como uma simples ampliação do mercado e suas
decorrentes implicações econômicas. A expansão marítima portuguesa transcendeu a
instalação de postos comerciais, fundação de feitorias e construção de fortalezas nas terras
alcançadas pelas embarcações. Foi mais do que uma simples ampliação das fronteiras
lusitanas para fora da Península Ibérica: representou o começo de um diálogo entre todos os
continentes, inclusive os recentemente atingidos, e o Velho Mundo.
Dos recantos mais distantes do planeta, que há muito já permeavam o imaginário
europeu, foram trazidos não somente os visados bens materiais (GREENBLATT, 1996). No
mesmo convés das naus e caravelas que carregavam as especiarias, foram transportadas
inúmeras novidades, que tanto maravilharam quanto amedrontaram os navegadores. Na
medida em que foram divulgadas, ampliaram de forma considerável os horizontes europeus.
Uma nova concepção de mundo se tornou possível, quando não inevitável.
Auxiliados pelo apontamento do historiador Arno Wehling, onde afirma que “tanto ou
mais que as relações Europa-Brasil, muitas vezes superestimadas, a troca de influências entre
o Brasil, as ilhas do Atlântico, a África, a Índia e a China marcaram a vida social e econômica
e os quadros mentais da Colônia,” (WEHLING e WEHLING, 1999: 62) nossa investigação
busca justamente as influências das possessões ultramarinas orientais no plural processo de
colonização do Brasil.
Para que seja possível tal intento, não devemos estudar o fenômeno da colonização
brasileira como isolada ou deslocada do panorama maior em que está inserida. Um
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entendimento mais satisfatório da ocupação pressupõe levar em consideração a participação
importante do Brasil no extenso império português, que nesse tempo ainda consolidava seus
domínios.
Ao aprofundarmos a abordagem da colonização brasileira, fica evidente que o enfoque
prioritário é o da miscigenação resultante do contato entre a tríade compostos por europeus
(português), africanos (escravo) e ameríndios (autóctone) e a interação de suas características
culturais; a conhecida “Fábula das três raças” (DAMATTA, 1990: 58) onde são colocados,
ideologicamente, esses três elementos na tentativa de construção de uma identidade da
sociedade brasileira.
Não
podemos, perpetuando essa convenção, ignorar a forte tradição
oriental que também se faz presente. Precisamos considerar esse fator que - embora não tenha
figurado necessariamente como elemento étnico, nem contributo genético - teve grande
importância na construção da colônia. Os bens e as idéias não deixaram de ser trazidos no
trânsito intercolonial de pessoas, costumes e produtos.
Para que seja possível alcançar, ao menos, relativo êxito nesse intuito, devemos
superar a relação exclusivamente dicotômica entre metrópole e colônia, investigando e
sublinhando a importância dos contatos entre as demais possessões envolvidas nesse processo
que deu origem à colônia brasileira. Ao reduzir a formação do Brasil e do brasileiro ao
resultado exclusivo da miscigenação dos povos, ignoramos aspectos não menos relevantes,
evidenciados não só materialmente como no pensamento e na estrutura da sociedade colonial.
Essa herança foi relegada a um número de citações breves na historiografia já produzida sobre
o assunto, figurando no senso comum como irrelevante e superficial.
Assim sendo, a pesquisa propõe desenvolver justamente um estudo sobre o tema, que
esclareça o papel negligenciado à influência oriental na formação do Brasil colonial. Para
perseguir tal resposta, lançaremos mão de um estudo multidisciplinar, por considerarmos
residir nessa abordagem uma alternativa viável para complementar as leituras anteriormente
efetuadas sobre o objeto em questão (LOVEJOY, 2005). Alinhamo-nos com o que escreve
Freyre, ao concluir que “dificilmente se admite que um ser social e cultural tão cercado de
‘objetos materiais’ do Oriente, como o brasileiro – ou o português do Brasil -” nesse extenso
período colonial, até o século XIX, com a chegada da corte à colônia, “não sofresse
influências orientais nos seus modos de pensar e sentir.” (FREYRE, 1985: 475)
Metodologia
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Partindo do que foi exposto podemos contextualizar a colônia brasileira como parte
integrante do extenso Império Português. Lembramo-nos assim que, por não ser resultado
unicamente de uma relação dicotômica, entre colônia e metrópole, a colonização do Brasil
apresenta características exteriores ao fluxo Portugal e Brasil; que convencionalmente foi
estabelecido como base para a análise da história colonial. Na medida em que tange o
envolvimento das demais possessões - como as localizadas na Índia - nesse complexo
processo mediado pelo colonizador português, apontamos nas evidências materiais uma série
de dados possíveis de serem analisados sob esse enfoque. Mary Douglas afirma que os bens
são “necessários para dar visibilidade e estabilidade às categorias da cultura” e eles “carregam
significação social”, pois são “comunicadores” (DOUGLAS, Mary; ISHERWOOD, Baron.
2004).
Seguindo os aportes até então estabelecidos se tem realizado, aliado ao levantamento
bibliográfico contínuo, a formulação de um corpus documental, através da investigação e
contato com diversos materiais, desde a correspondência dos Vice-Reis aos alvarás com força
de lei e decretos reais instituídos pela coroa portuguesa.
Resultados e Discussão
As afirmativas permitiram evitar o levantamento desconexo de bens materiais sem
uma interpretação aprofundada do processo à que pertencem. A documentação que
consultamos até agora aponta para uma assimetria da sociedade brasileira, e essa pode ser
pensada como a transgressão dos cânones portugueses. Investigamos agora se tal transgressão
pode ser atribuída à dinâmica do processo da expansão ultramarina portuguesa que envolveu
Ocidente e Oriente.
Referências
DAMATTA, Roberto. Relativizando, uma introdução à antropologia social. Rio de Janeiro: Rocco, 1990.
DOUGLAS, Mary; ISHERWOOD, Baron. O mundo dos bens: Para uma antropologia do consumo. Rio de
Janeiro: UFRJ, 2004.
FREYRE, Gilberto. Sobrados e mucambos: decadência do patriarcado rural e desenvolvimento do urbano. Rio
de Janeiro: José Olympio, 1987.
GREENBLATT, Stephen Jay. Possessões maravilhosas: O deslumbramento do novo mundo. São Paulo:
EDUSP, 1996.
LOVEJOY, Arthur O. A grande cadeia do ser. São Paulo: Editora Palíndromo, 2005
WEHLING, Arno; WEHLING, Maria José C. M. Formação do Brasil colonial. Rio do Janeiro: Nova Fronteira,
1999.
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