Indicação no. 02/2013
Sr. Presidente, ilustres consócios:
Solicitei a urgência para apreciação da questão objeto da indicação por entender
que a demora em sua tramitação no Instituto prejudicaria de forma irreparável a
emergência desta discussão.
Trata-se de indicação oferecida pelo Dr. Jacksohn Grossmann relativa ao
impedimento apresentado pelo presidente eleito da Venezuela, Cel. Hugo
Chávez, para a posse no prazo previsto na Constituição daquele país.
Como é notório, o impedimento apresentado pelo candidato eleito foi
apreciado pela Suprema Corte Venezuelana , que decidiu pela possibilidade
de ser a Presidência da Republica assumida pelo vice presidente anterior,
Nicolas Maduro, alegando princípios de continuidade administrativa.
A indicação foi considerada pertinente, o que ultrapassa , desde logo, a
apreciação de questão que fatalmente surge nas discussões do Instituto sobre
a possibilidade de discussão sobre temas que envolvam a auto determinação
das nações e que se possa considerar como ingerência indevida nesta seara.
Ao argumento, note-se que a indicação menciona questões jurídicas de
relevância, ressaltando-se que esta casa não é nação a se imiscuir em razoes
de Estado de outras, mas casa de estudo e de apreciação político jurídica
inafastavel quando apontada a violação da ordem internacional.
Assim tem se posicionado o IAB, mesmo quando examina questões de
ordem internacional delicada e polemica: esta casa considera cabíveis tais
debates , até mesmo para informação e esclarecimento de seus membros , a
menos, evidentemente , aquelas de cunho partidário proselitista, o que não
ocorre na espécie.
Portanto , sendo cabível tal apreciação, relata-se que o Presidente eleito da
Venezuela encontra-se afastado do cargo desde dezembro de 2012 , por
motivos de doença. Eleito em outubro de 2012, não chegou a indicar seu Vice
Presidente, nem a tomar posse , ressaltando-se que , no modelo eleitoral
venezuelano, a eleição para o cargo majoritário é exclusivamente para o
posto de Presidente da Republica, cabendo ao mesmo indicar o Vice
Presidente de sua escolha exclusiva.
Ora , na espécie isto não ocorreu, e foi dada a posse ao Vice Presidente
anterior, não eleito, escolhido ou de qualquer forma selecionado para
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ocupação deste cargo, o que, viola, desde logo, a própria legislação
venezuelana. Ao argumento da vontade popular e pretenso apoio a esta
solução canhestra opõem-se os mais comezinhos princípios de direito
internacional e constitucional comparados, o que salta aos olhos como
monstruosa aplicação de golpe revestido de legalidade, pelo endosso da Corte
Suprema da Venezuela.
A prejudicar este entendimento , o da legalidade presumida , lembra-se que
também Adolf Hitler teve posse legal como chanceler da Alemanha
escolhido pelo senil Almirante Hindenburg. Também a Junta Militar que
apoderou-se da nação brasileira nos idos de 1969 o fez de forma legal,
amparada por texto legal de encomenda , da lavra de ilustre jurista a serviço
dos usurpadores do poder e mais outras tantas violências
foram
perpetradas contra a ordem constitucional constituída por tantos outros
juristas de aluguel a serviço das ditaduras a que serviam.
Não se trata aqui de coisa diversa: sem juízo de valor sobre a figura do
Presidente eleito, aponta-se como violada a ordem constitucional
venezuelana, pelo argumentos mesmo lançados na indicação e , mesmo que
referendada a violação pela Suprema Corte daquele pais, o odor não é bom.
Ao contrario, tem cheiro de golpe, cara de golpe e esta America Latina já se
ressente há longo tempo destas mal cheirosas práticas que acabam dando
exemplo de possibilidades de que não cogita a norma legal democrática,
aquele votada por parlamentares e consolidada sob a forma da uma
constituição.
A interpretação conferida pela corte da Venezuela é incompatível com a
democracia que se pretende, a final, ver instaurada no continente, e
inaceitavel, senão como copia canhestra de caudilhismo antigo e superado.
Como bem assinalado pelo autor da indicação , o Tratado de Assunção ,
aditado pelo Protocolo de Ushuaia , ao criar e regulamentar o MERCOSUL
prescreveu de forma absolutamente translúcida o caráter imperioso de
obediência aos princípios da democracia como verdadeiro pré requisito para
que os Estados Partes fossem partícipes daquele bloco político econômico.
Esta a letra do art. 1o do
verbis:
Protocolo de Ushuaia,
“A plena vigência das instituições democráticas é
condição essencial para o desenvolvimento dos
processos de integração entre os Estados Partes do
presente Protocolo.”
Aduzem , mais , os art. 3 o e 4o do referido Tratado , que em caso de ruptura
da ordem democrática em um Estado Parte devam ser promovidas consultas
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entre os mesmos e o Estado afetado e que , se resultarem infrutíferas
acarretariam as sanções descritas no art. 5 do referido tratado.
A indicação, ao final , requer a apreciação do tema pela Comissão de Direito
Internacional, para a finalidade já requerida de reconhecimento de violação
por parte da Venezuela
dos dispositivos deste tratado, apos o que,
aprovado o parecer seja encaminhado o mesmo ao Ministério de Relações
Exteriores e às autoridades máximas dos Poderes da República (sic)
Trata-se , portanto de estabelecer se houve ruptura da ordem democrática na
sucessão da Venezuela, ignorada pelo Estado brasileiro, a ensejar o reclamo
das consultas e atos subseqüentes previstos no Protocolo Adicional de
Ushuaia.
É questão delicada , mesmo, já que o Estado pretensamente afetado não
considera ter havido a ruptura e , pelo contrario, sanciona a apontada violação
pela sua Corte Suprema., por unanimidade. Daí a delicadeza do tema e que , ã
primeira vista , induz à perplexidade .
Todavia , a perplexidade desaparece ao se examinar , mesmo que
perfunctoriamente, as razões de decidir da Suprema Corte da Republica
Bolivariana da Venezuela, que decidiu que em uma reeleição exsurge o
principio da “continuidade administrativa “, a permitir que um candidato- e
este é o nome correto- eleito possa exercer seu mandato sem tomar posse.
Desconheço tal princípio , entendendo a razão de decidir como cheque em
branco para a instituição de uma ditadura, pois pela lógica utilizada bastaria
uma posse e o exercício de um dia de mandato para que se operasse o
teratológico “principio” proclamado pela Suprema Corte daquele país.
Repito não se tratar de juízo de valor sobre a figura do candidato eleito, mas
justo repúdio à manobra de uma corte que se mostra subserviente ao mesmo,
contrariando princípios comezinhos de direito constitucional e da ciência
política primária.
Este poder , que autoriza o governo de uma nação por Vice Presidente de
mandato findo, representando candidato eleito de quem não se tem notícia e
que sequer nomeou tal Vice Presidente , certamente escuda-se não só no
apontado realismo fantástico de Garcia Marquez , como em antigo filme de
Hollywood, de Anthony Mann, de 1961
Ah, El Cid....Nobre guerreiro castelhano, Rodrigo Diaz de Vivar, faleceu em
Valencia , em 10 de julho de 1099, morte festejada pelos mouros , seus
inimigos. Sua mulher ,porem, mandou amarrar seu corpo ao
seu cavalo,
atando sua espada à mão inerte, mandando-o este estranho conjunto ao campo
de batalha. Reza a lenda que ao ver El Cid em cima de seu cavalo os mouros
fugiram e foram derrotados pelo exército de do Cid, “El Campeador”.
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Livro de Garcia Marquez, lenda espanhola, filme americano ou ópera bufa, a
atitude tomada pela Corte Suprema da Venezuela desafia , como já dito, os
fundamentos da democracia moderna , esgarçando e quiçá rompendo esta
delicada tessitura, violando, , por conseguinte, o Tratado de Assunção ,
como aditado pelo Protocolo de Ushuaia.
Assim, voto pelo acolhimento da indicação , entendendo, porém, que o
encaminhamento de expediente deva ser feito ao Ministério de Relações
Exteriores ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados , alem das demais
autoridades a quem se considere relevante a comunicação.
Sala de Sessões, em 30 de janeiro de 2013.
Carlos Roberto Schlesinger.
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Indicação no. 02/2013 - Instituto dos Advogados Brasileiros