Construções Pré-fabricadas em Zonas Sísmicas
Júlio Appleton
(Professor Catedrático do IST)
1. INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objectivo abordar os aspectos particulares das estruturas préfabricadas de betão armado pré-esforçado localizados em zonas sísmicas. Serão
abordadas as estruturas de edifícios e de pontes.
A – A pré-fabricação é em muitos casos utilizada como um processo de fabrico de uma
estrutura monolítica.
Neste caso o comportamento destas estruturas pouco deferirá das estruturas
igualmente executadas in situ. Apenas há que abordar qual o grau de monolitismo
atingido nas ligações executadas in situ, entre peças pré-fabricadas.
B – A pré-fabricação é noutros casos concebida como um processo de fabrico que
conduz a estruturas com um grau de monolitismo/hipersticidade inferior à das
estruturas integralmente executadas in situ.
Neste caso o comportamento destas estruturas apresentará aspectos particulares
quando comparados com as estruturas executadas in situ.
No que se refere à concepção sísmica das estruturas constata-se existir uma evolução
significativa dos conhecimentos nas últimas décadas.
Numerosos sismos têm evidenciado grande fragilidade nas construções realizadas nas
últimas décadas, nomeadamente nas de betão armado, em especial, em resultado de
erros de concepção.
Em paralelo com os desenvolvimentos na modelação analítica, a utilização de mesas
sísmicas com capacidade para ensaiar estruturas de dimensão apreciável está a
contribuir para avaliar e visualizar o comportamento das estruturas quando sujeitas aos
sismos e estudar a influência de diversos parâmetros e aspectos construtivos.
Evoluiu-se nas últimas décadas do conceito de focalizar a resistência dos elementos e
estruturas para o conceito de ductilidade e dissipação de energia dos elementos
estruturais. Actualmente assiste-se a uma nova evolução no sentido de que as estruturas
devem assegurar um bom comportamento (sem danos estruturais e não estruturais) para
sismos de intensidade média e só para sismos muito intensos se aceitarão danos que
requeiram uma intervenção de reabilitação/reforço após ocorrência de um sismo. Esta
concepção irá conduzir à utilização crescente de sistemas de isolamento de base e à
utilização de dispositivos especiais de controlo/dissipação.
Nos capítulos seguintes apresentam-se algumas considerações sobre concepção sísmica
de edifícios e pontes para as situações mais correntes em Portugal.
No que se refere à utilização de pré-fabricação em estruturas de edifícios em zonas
sísmicas há a referir que na ocorrência de sismos recentes (Spitak – Arménia, 1988;
Northbridge – E.U.A., 1994) se verificaram ocorrência de danos e ruína superior aos das
estruturas executadas in situ, o que se atribuiu essencialmente às seguintes causas:
− Deficiente funcionamento dos pisos como diafragmas no seu plano.
− Reduzida hiperstaticidade
− Reduzida ductilidade na ligação entre elementos pré-fabricados.
2. ESTRUTURAS DE EDIFÍCIOS
a) Estrutura com parede resistente
Em edifícios com vários pisos é usual a adopção de paredes resistentes (ou
núcleos de paredes resistentes) as quais deverão absorver a quase totalidade dos
efeitos das acções horizontais.
Para esta concepção são fundamentais os seguintes aspectos:
− Localização dos elementos de parede de forma a limitar os efeitos de torção.
− Calcular e pormenorizar esses elementos de parede por forma a dotá-los da
resistência, deformabilidade e ductilidade necessárias.
− Garantir que os pavimentos podem funcionar como diafragmas distribuindo as
acções para os núcleos de paredes.
Fig. 1 - Efeito de diafragma dos pavimentos (Ref. 4)
Para esta concepção os pilares deverão ser contínuos e a ligação entre as vigas e
pilares poderá ser articulada ou monolítica. As paredes terão um comportamento
tipo consola.
O efeito de diafragma dos pisos deverá ser cuidadosamente estudado (fig. 6.17). A
análise local é feita tratando a laje como uma viga parede utilizando por exemplo
os modelos de escora e tirante (strut-and-tie). O efeito de diafragma poderá ser
garantido através de uma betonagem in situ (com armaduras) da face superior das
lajes (estabelecendo assim a ligação entre elementos pré-fabricados.
Fig. 2 - Modelação do efeito de diafragma (Ref. 4)
A zona mais crítica é a ligação entre o pavimento e as paredes (shear walls). Em
pisos pré-fabricados é fundamental garantir a resistência no corte das juntas entre
elementos pré-fabricados.
No que se refere à comparação estrutura executada in situ/estruturas pré-fabricadas
é de assinalar que para esta concepção não há diferença significativa no que se
refere ao comportamento para as acções sísmicas. Em geral nas zonas de maior
risco sísmico a estrutura deverá ser dotada de monolitismo e elevada
hiperstaticidade pelo que as ligações viga pilar deverão aproximar-se do
comportamento de estruturas executadas in situ.
b) Estruturas sem parede resistente
Outra alternativa é realizar uma estrutura tipo reticulada em que se pretende
concentrar a dissipação de energia em rótulas plásticas nas vigas.
Neste tipo de estruturas pode ser realizada a ligação viga/pilar junto à face do pilar
ou nas vigas.
Se os nós de ligação viga/pilar forem articulados os pilares funcionam
praticamente como consolas.
Em geral em edifícios de um ou dois pisos poderá adoptar-se esta solução.
Se os nós de ligação viga/pilar forem contínuos a estrutura tem um funcionamento
tipo pórtico podendo ser dissipada energia em rótulas plásticas em vigas.
Deverá evitar-se localizar as ligações entre elementos pré-fabricados nas regiões
críticas dos nós viga/pilar. O EC 8 (Anexo B da parte 1.3) penaliza a colocação
das juntas nas zonas críticas impondo um coeficiente majorativo de 1.5 ou 2.0 a
aplicar aos esforços de cálculo das ligações localizadas nas zonas críticas (para as
classes de ductilidade L ou M respectivamente).
Fig. 3 - Estruturas não contraventadas com ligações articuladas ou monolíticas vigapilar (Ref. 4)
Neste contexto referem-se os seguintes trabalhos realizados em Portugal:
Em 1991 João Appleton apresentou a tese para especialista do LNEC
“Solidarização de Estruturas Pré-fabricadas de Grande Vão”.
O objectivo era estudar o comportamento, face à acção sísmica, de estruturas préfabricadas do tipo industrial de grande vão e de um piso, correntes em Portugal.
Em particular pretendeu-se estudar as soluções de solidarização entre elementos e
travamento da estrutura.
Em 1983 Pompeu dos Santos apresentou a tese para especialista do LNEC
“Comportamento de Ligações de Estruturas Pré-Fabricadas de Betão”.
O objectivo era avaliar o grau de monolitismo de pilares, de vigas e da ligação
viga pilar realizada com pilares pré-fabricados vazadas e vigas pré-fabricadas
sendo a parte superior da viga e interior do pilar betonado in situ e colocados no
nó as armaduras de continuidade.
Desse estudo experimental concluiu-se para os modelos de ligação viga/pilar, que,
embora com uma resposta semelhante às estruturas monolíticas integralmente
executadas in situ, nas estruturas pré-fabricadas a deformabilidade é um pouco
superior. No que se refere ao comportamento do conjunto e de nó são aplicáveis
os conceitos estabelecidos no REBAP para as estruturas de ductilidade melhorada
e em particular deverá ser verificada a sobre-resistência do pilar em relação à
resistência das vigas que concorrem num nó. O coeficiente de comportamento
deverá ser inferior ao das estruturas monolíticas integralmente betonado in situ.
Em 1996 Jorge Proença apresentou a tese de doutoramento: “Comportamento
Sísmico de Estruturas Pré-fabricadas e desenvolvimento de um Sistema
Reticulado Contínuo”.
Neste trabalho e considerando uma ligação entre peças pré-fabricadas nas vigas
através de chapas metálicas na face superior e inferior, ensaiou-se um elemento de
viga incorporando uma ligação. A concepção desse sistema é aproveitar a região
da junta para aí introduzir um sistema dissipativo.
Foram ensaiadas duas localizações para a junta e diferentes geometrias para as
chapas de continuidade.
Conclui-se que a concepção indicada conduz a estruturas com elevada capacidade
de dissipação de energia em virtude da elevada ductilidade em rotação das juntas.
Em 1998 António Santos Silva apresentou a dissertação de mestrado “Ligações
entre Elementos Pré-fabricados de Betão”.
Trata-se de um trabalho de síntese, actual, sobre as exigências e soluções de
ligações entre elementos pré-fabricados de betão e a análise de mecanismos de
transmissão de forças nessas ligações.
c) Outra alternativa possível é adoptar um sistema de isolamento de base ou
dispositivo de controlo/dissipação de energia,
Esta alternativa que conduz a reduzir significativamente a deformação e esforço
da estrutura para as acções sísmicas é especialmente interessante em estruturas
pré-fabricadas.
Neste contexto refere-se a tese de doutoramento apresentada por Luís Guerreiro
“Isolamento Sísmico de Edifícios” em 1996.
Fig. 4
3. PONTES
Também nas pontes a concepção sísmica sofreu a mesma evolução do que nos edifícios
com a diferença que a utilização dos dispositivos de controlo sísmico está vulgarizado
nos países com sismicidade relevante. Há umas décadas era usual a solução de ligar o
tabuleiro a um encontro fixo onde se concentrava a quase totalidade da resistência
sísmica. Tal solução torna a acção sísmica elevada dada a rigidez do encontro e para que
seja eficaz requer a devida amarração do tabuleiro ao encontro e a capacidade do
tabuleiro para suportar a força de amarração.
Uma solução actualmente corrente em Portugal para viadutos consiste em fixar (na
direcção longitudinal, o tabuleiro aos pilares centrais e libertar a ligação longitudinal
entre o tabuleiro e os restantes pilares e encontros. Nessa solução as acções sísmicas
reduzem-se e a capacidade de dissipação de energia fica essencialmente localizada na
região inferior dos pilares.
A adopção de dispositivos de controlo sísmico pode envolver a transferência total para
esses dispositivos da capacidade de dissipação da energia ou pode corresponder a uma
solução de participação entre os pilares e esses aparelhos.
Fig. 5 - Concepção sísmica envolvendo a participação de pilares e dispositivos de
controlo (Ref. 1)
Neste contexto refere-se o seguinte trabalho recente realizado em Portugal.
Em 1995 Carlos Oliveira Silva apresentou a dissertação de Mestrado “Isolamento
Sísmico em Pontes”.
No que se refere à utilização da pré-fabricação em pontes é de referir que em qualquer
das concepções sísmicas anteriormente referidas se admitiu a continuidade do tabuleiro.
Assim a utilização da solução com recurso à pré-fabricação, no contexto referido em
1.A de produção de uma estrutura monolítica não deverá oferecer objecções especiais.
REFERÊNCIAS PRINCIPAIS
(1) Derron, M.H. – Effects Des Séismes sur les Ouvrages d’Art Des Vois de
Circulation, EPFL, 1980.
(2) Appleton, João − Solidarização de Estruturas Pré-Fabricadas de Grande Vão, Tese
de Especialista, LNEC, 1981.
(3) Pompeu dos Santos, S. – Comportamento de Ligações de Estruturas Pré-Fabricada
de Betão, Tese de Especialista, LNEC, 1983.
(4) FIP Planning and Design Handbook on Precast Building Structures, FIP 1994.
(5) Proença, Jorge – Comportamento Sísmico de Estruturas Pré-Fabricadas, Tese de
Doutoramento, IST, 1996.
(6) Santos Silva, A.M. – Ligações entre Elementos Pré-Fabricados de Betão,
Dissertação de Mestrado, IST, 1998.
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