A PSICOLOGIA NO CONTEXTO ESCOLAR DE GUAÍBA:
SAPPE/CURSO DE PSICOLOGIA/ULBRA
RESUMO
O presente artigo apresenta o Serviço de Assessoria e Pesquisa em Psicologia Escolar SAPPE -, do Curso de Psicologia da Universidade Luterana do Brasil, Campus Guaíba, que
tem como proposta oferecer atendimento psicológico às instituições de ensino e também a
projetos na área da Educação. Este serviço foi idealizado a partir de demandas de escolas dos
municípios de Guaíba e Eldorado do Sul - principalmente da rede pública estadual e
municipal - que constantemente encaminham pedidos de assessoria em Psicologia para a
ULBRA. A Universidade, cumprindo com o compromisso social que tem com estas
comunidades, participa com projetos e ações desenvolvidas pelo SAPPE, no sentido de
contribuir com seu saber para minimizar as dificuldades mais imediatas do sistema público
educacional.
PALAVRAS-CHAVE: Psicologia Escolar – Assessoria em Psicologia - Aprendizagem
REFLETINDO SOBRE O CONTEXTO EDUCACIONAL
A Educação tem sido exigida, cada vez mais intensamente, a repensar sua práxis. A
aceleração em que acontecem as mudanças sociais e tecnológicas impõe grandes
transformações, as quais as escolas nem sempre estão preparadas para enfrentar. A Educação
formal, no Brasil, tem sido um grande problema e também representa um grande desafio!
Num país de massa, com tantas e profundas desigualdades, faz-se necessária, principalmente,
uma contra-ofensiva às formas de teorização e práticas educacionais que partem de análises
reducionistas de suas questões intrínsecas.
A Educação só vai desempenhar seu papel quando considerar que no contexto das
escolas, ao lado do processo de aprendizagem dos alunos, estão acontecendo, constantemente,
fenômenos que remetem a questões culturais, econômicas e políticas. Portanto, não é mais
possível ignorar estes aspectos e perpetuar concepções de aluno não precisa pensar, criticar,
posicionar-se, nem levar seus conhecimentos adquiridos na vida para o ambiente escolar e que
só deve “aprender” e reproduzir aquilo que o professor “ensina”. Ao contrário, hoje sabemos
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que o espaço escolar deve estar conectado com a realidade, pois os educandos têm outras
expressivas fontes de aprendizagem (às vezes muito mais eficientes do que a escola oferece).
Os processos educacionais têm de ser analisados, portanto, numa perspectiva relacional e
dialética. A atual imagem social da escola, especialmente a pública, parece estar em xeque, de
tal maneira que os profissionais da área mostram-se frequentemente pouco motivados e
acometidos de uma espécie de falta aguda de credibilidade profissional. É possível pensar que
se a imagem social da escola está tão ameaçada, algo de ameaçador está acontecendo também
com a cidadania brasileira, uma vez que não há cidadania sustentável sem escola (AQUINO,
1998).
O ambiente escolar deve ser um espaço onde se discutem temas como discriminação,
justiça social, respeito às diferenças. Esta proposta não significa jogar fora o que já foi
construído, mas é necessário desfazer certos mitos, como, por exemplo, ver no professor o
único detentor do saber e que deve ter respostas para tudo, negando-se a condição de que o
bom professor é aquele que devolve o questionamento para o aluno para que ambos possam,
juntos, buscar as soluções dos problemas vivenciados. Ou, então, a crença de que aluno que
critica, atrapalha a aula. Ou, ainda, a idéia que articulações políticas não podem acontecer
dentro da escola.
Portanto, urge que as outras ciências, como a Psicologia, também se engajem no
movimento de mudanças e entendam que a atualidade pede novas reflexões e que precisa
fazer parte do cotidiano das relações escolares. A Psicologia Escolar já vem contribuindo com
análises que se fazem imprescindíveis e urgentes sobre questões como fracasso escolar,
exclusão, evasão e repetência. Em nível institucional, a Psicologia pode colaborar na
compreensão da função social da escola, nos aspectos filosóficos, políticos e ideológicos
envolvidos, na realidade do trabalho educacional frente à diversidade e nas demais discussões
para que se possa alcançar o ensino de qualidade que tanto se almeja. O compromisso da
Psicologia, portanto, nesta área, é de colocar à disposição o seu saber e a possibilidade de
intervir, na busca do entendimento da dimensão mais ampla da Educação. Coll (1997)
assinala que qualquer proposta educacional comporta sempre um projeto social e cultural,
uma visão do tipo de sociedade e de pessoa que se pretende promover com a escola. Define a
educação escolar como uma atividade de natureza social com uma função basicamente
socializadora.
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O psicólogo escolar, numa visão interdisciplinar, soma-se aos demais profissionais
de educação na construção de uma escola que proporciona o acesso a uma aprendizagem mais
significativa, à autonomia como um direito de todos e ao respeito à diversidade. O psicólogo
escolar deve ter recursos para entender a escola como um universo singular, e para
desenvolver ações junto aos professores, alunos, funcionários e familiares. Sua formação lhe
permite intervir preventivamente e estimular a formação de redes de apoio nas comunidades
como alternativas de ajuda e crescimento social para todos. Para que interdisciplinaridade
aconteça de fato, é necessário quebrar com os dogmatismos, ter a coragem de provocar
mudanças e posicionar-se politicamente diante dos desafios. Sabe-se hoje que o conhecimento
nasce da dúvida, do questionamento, da tentativa de encontrar novo caminho. Portanto, as
incertezas é que alimentam o crescimento intelectual e a crítica é que leva à construção do
conhecimento.
A instituição escolar precisa ser percebida concretamente, mas também pelo que
significa para cada uma das pessoas que lá estão. Portanto, precisa cumprir suas funções de
orientação de vidas humanas, ter clareza sobre sua razão de ser e compreender que seu futuro
depende de todos os seus integrantes. Conforme Outeiral (1994), a escola tem uma
significação muito forte para o aluno, pois, junto com os aspectos constitucionais e os
vínculos familiares, forma a base do processo de seu desenvolvimento pessoal. Portanto, a
importância da escola é inquestionável, pois, mais do que o espaço físico, é o lugar imaginário
que se confunde com a própria história, desejos e expectativas de cada um de seus membros.
Na escola pública, muitas são as queixas presentes em todos os níveis: culpam-se o
“Sistema”, a Secretaria de Educação, a pobreza dos alunos, a desvalorização dos professores todas razões verdadeiras -, mas que dificilmente ajudam a tornar a realidade melhor. Os
profissionais da Educação, dentre eles o psicólogo escolar, devem analisar e articular suas
atividades no sentido de melhorar a prática educativa na escola. É a partir da implantação de
políticas sociais que a realidade será modificada. Trabalhar em instituições, portanto,
pressupõe estar atento às múltiplas expressões do poder, à história da instituição, à totalidade
de universos que delas fazem parte.
Apesar de sua importância, a presença da Psicologia na área educacional ainda é
muito reduzida, especialmente nas escolas públicas. Esta realidade faz com que as
universidades, através dos cursos de Psicologia se comprometam com as comunidades. Uma
das formas de participar é criando serviços de assessoria em Psicologia Escolar,
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disponibilizando psicólogos e estagiários às instituições de ensino, para a formação das já
referidas redes de apoio aos professores, alunos, pais e comunidades. O universo das escolas é
muito complexo, o que exige dos profissionais e estagiários de assessoria em Psicologia
Escolar profundo conhecimento, sensibilidade e uma percepção apurada da realidade,
especialmente por sua condição de não pertencer àquela comunidade. Muitas vezes, as
contradições presentes no contexto escolar, as resistências da instituição em aceitar mudanças,
os estereótipos, o entendimento da expressão e simbolização do que é verbalizado dificultam
imensamente o trabalho. É preciso "desacomodar" os grupos e provocá-los no sentido de
compreenderem melhor sua própria situação, de buscarem nos próprios recursos pessoais a
condição para desenvolver o processo de ensinagem e aprendizagem.
APRESENTANDO O SAPPE
O Curso de Psicologia, da ULBRA/Campus Guaíba, ao manter o Serviço de
Assessoria e Pesquisa em Psicologia Escolar – SAPPE, pensa estar contribuindo efetivamente
para com a realidade educacional da região em que está inserido. Evidentemente, esta
proposta também visa acrescentar possibilidades na formação dos acadêmicos do Curso,
oportunizando estágios e atividades práticas, nesta área. Os estagiários, ao desenvolver as
atividades, têm oportunidade de aprimoramento de seus conhecimentos, competências e
habilidades na atuação como psicólogo na área educacional. Além disso, representa mais uma
oportunidade para a Universidade estimular a prática de investigação e produção científica em
Psicologia Escolar.
A etapa inicial de implantação do Serviço de Assessoria e Pesquisa em Psicologia
Escolar – SAPPE, em 2004, constituiu-se de discussão da proposta pela coordenadora do
Curso e professora responsável pelo serviço. Também foi decidido que o SAPPE participaria,
como parceiro, em projetos com cunho social desenvolvidos pela comunidade, desde que
relevantes para a área da Psicologia Escolar. Como segunda ação, no primeiro semestre de
2005, apresentou-se o Serviço para diretores e orientadores educacionais de oito escolas da
região. Foram discutidos os aspectos mais específicos da operacionalização do trabalho e foi
solicitado que as instituições, através de documento, manifestassem o desejo de receberem o
SAPPE. Destas escolas, quatro (duas de Guaíba e duas de Eldorado do Sul) confirmaram seu
interesse no trabalho, explicitando as necessidades mais imediatas.
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No segundo semestre de 2005, após a seleção de três estagiárias, foi composto o
primeiro grupo de trabalho do SAPPE. Foram visitadas as escolas, objetivando que os
estagiários as conhecessem, observando, contatando com os grupos e discutindo as propostas
de trabalho. Algumas das intervenções já foram previamente definidas nas demandas
manifestadas formalmente pelas escolas. As pricipais atividades desenvolvidas foram grupos
operativos com professores, oficinas sobre diversos temas e dinâmicas de grupo com os
diferentes segmentos da escola: professores, funcionários, pais.
Além do desenvolvimento de projetos nas escolas, o SAPPE também contribuiu, em
2004/2005 com o Projeto Segundo Tempo - Canoa Brasil. O mesmo é uma iniciativa da
Confederação Brasileira de Canoagem – CBCa, com o apoio do Ministério do Esporte. Tem
abrangência nacional e objetiva ser um meio para crianças e adolescentes melhorarem seu
rendimento escolar, saúde e alimentação, para serem incluídas na área digital e tomarem
ciência da preservação ambiental, sendo estas melhorias estendidas para os familiares de
todos os participantes. Visa, ainda, possibilitar o acesso à informática, acompanhamento
médico, odontológico e assistência psicológica. Para estes atendimentos, a coordenação do
Projeto buscou parcerias em instituições locais. A ULBRA, valorizando a iniciativa, ofereceu
atendimento aos participantes do Projeto, através do Serviço de Assessoria e Pesquisa em
Psicologia Escolar. Foi realizado acompanhamento grupal aos adolescentes - atletas da
Equipe de Canoagem -, visando auxiliar na reflexão sobre as alterações biológicas, cognitivas,
emocionais e sociais da adolescência, sobre as suas vivências pessoais e coletivas e sobre seus
projetos de vida. Os grupos foram coordenados por acadêmicos do Curso de Psicologia,
estagiários do SAPPE e voluntários, com a supervisão da coordenadora pelo SAPPE.
Outra inserção do trabalho do SAPPE foi na Brinquedoteca, atendimento a crianças
com dificuldades de aprendizagem oferecido pelo Curso de Pedagogia, da ULBRA/Campus
Guaíba. Este constutui-se em um novo desafio para o Serviço. O projeto aborda um tema
inovador, de caráter lúdico, com o qual procura estimular os profissionais da educação para
novas práticas do fazer pedagógico. Além do atendimento oferecido às crianças de escolas de
Guaíba, o trabalho lúdico-pedagógico, desenvolvido na Brinquedoteca, objetiva provocar o
surgimento de outros projetos desta natureza nas escolas. Os estagiários do SAPPE têm
concentrado sua participação especialmente no atendimento a grupos de pais destas crianças,
diversificando, desta forma, o serviço oferecido.
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No ano de 2006, houve necessidade de ampliar a abrangência do SAPPE, não só com
mais instituições sendo atendidas, mas também no número de estagiários. Hoje, são seis
alunos em estágio acadêmico e sete escolas, além da Brinquedoteca. São elas: Escola
Municipal de Ensino Fundamental Cônego Eugênio Mees e Escola Municipal de Ensino
Fundamental Profa. Luiza Maria Binfaré Cezar, de Eldorado do Sul, Escola Estadual de
Ensino Fundamental Com. Ismael Chaves Barcellos, Escola Estadual de Ensino Fundamental
Otero Paiva Guimarães, Escola Estadual de Ensino Médio Nestor de Moura Jardim, Escola
Estadual de Ensino Fundamental e Médio Moura e Cunha e Escola Estadual de Ensino Médio
Ruy Coelho Gonçalves, de Guaíba. As atividades desenolvidas mantém-se como no prjeto
inicial, já menciondas.
Outras escolas já manifestaram o interesse em acolher o trabalho e seus pedidos são
alvo de análise no início de cada semestre. Nestes momentos, as escolas são visitadas e é
avaliada a necessidade da assessoria. Os estagiários fazem as visitas para que possam se
apropriar dos espaços de trabalho, observando, conhecendo os grupos e para discutir as
propostas com as direções e setores das instituições. As ações desenvolvidas constituem-se de
grupos operativos com professores, alunos e pais, oficinas sobre diversos temas, dinâmicas de
grupo e outras atividades inerentes ao trabalho de Psicologia Escolar, procurando manter o
enfoque preventivo e abrangente próprio deste campo da Psicologia.
AVALIANDO O TRABALHO
Talvez o maior desafio de um serviço de assessoria seja conquistar a credibilidade das
pessoas envolvidas, especialmente por sua condição de não pertencer à comunidade escolar.
Muitas vezes, as contradições presentes no contexto, as resistências da instituição em aceitar
mudanças, os estereótipos, o entendimento do que é simbolizado e não verbalizado exigem,
além de conhecimento e sensibilidade, de coragem para mostrar o que precisa ser mostrado e
para propor intervenções, às vezes até consideradas pouco ortodoxas no campo da Psicologia.
É preciso "desacomodar" os grupos e provocá-los no sentido de “arriscarem- se mais”, de
fazer leituras mais abrangentes de sua situação, de reconhecer os próprios sentimentos como
os mais preciosos recursos para se relacionar e favorecer o desenvolvimento dos alunos.
É importante ressaltar a importância das parcerias construídas com os profissionais de
Orientação Educacional, Supervisão Escolar e Psicopedagogia nos projetos. Administrar as
questões do cotidiano escolar exige uma visão conjunta, em que o psicólogo escolar contribui
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significamente, - com seu saber - para analisar, interpretar, perceber os pontos de conflitos,
ajudar a suportar angústias e contribuir com estratégias de ação que considerem a realidade
política, social e econômica das pessoas e das instituições. Estas iniciativas precisam, ao
mesmo tempo, valorizar o que já foi construído, mas também buscar possibilidades
inovadoras, que rompam responsavelmente com o tradicional.
A competência dos estagiários, o comprometimento, o dinamismo, as parcerias
conquistadas, têm norteado o fazer da Psicologia nas instituições. As avaliações das
instituições envolvidas têm comprovado esta realidade, inclusive com iniciativas e
mobilizações de diretores e professores que extrapolam os objetivos iniciais, mostrando que o
trabalho do SAPPE torna-se, apesar de muito recente, uma parte essencial na estrutura das
escolas. Além disso, as dificuldades, quando surgem, são entendidas como excelentes
oportunidades de crescimento e são trabalhadas no acompanhamento sistemático da
supervisão local e da supervisão acadêmica.
Concluindo-se, é fundamental reafirmar que todas as propostas de intervenção em
Psicologia Escolar devem prioritariamente integrar aprendizagem, cultura e desenvolvimento
(COLL, 1997). Só assim, as contribuições que chegam ao campo educacional estarão
respeitando o que é mais importante: o indivíduo escolarizado, os conteúdos escolares e a
própria instituição formal de ensino, enfim, tudo o que diz respeito a este mundo complexo
que é a Escola. E, sobretudo, respeitando a sociedade e a organização de cada cultura.
Referências Bibliográficas:
AQUINO, J. A indisciplina e a escola atual. Rev. Fac. Educ. vol. 24 n.2 São Paulo: Jul/Dez.,
1998.
COLL, C. Psicologia e currículo: uma aproximação psicopedagógica à elaboração do
currículo escolar. 2. ed. São Paulo: Ática, 1997.
OUTEIRAL, J. O. Adolescer - Estudos sobre Adolescência. Porto Alegre: Artes Médicas Sul,
1994.
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