Necessidades em Portugal: Tradição e Tendências Emergente
Súmula dos resultados do inquérito por questionário
O ESTUDO
Face às mudanças recentes da sociedade portuguesa, que necessidades emergem? Quais as
mais prementes? O que falta para se ser feliz, vivendo em Portugal? De que já não abdicamos e
de que precisamos ainda quando falamos de qualidade de vida? Que exigências de inovação
espreitam na resolução de novas e velhas necessidades?
A partir de uma reflexão sobre as transformações contemporaneamente observadas na
sociedade portuguesa, o estudo Necessidades em Portugal – tradição e tendências
emergentes propõe-se concretizar uma identificação alargada das necessidades consideradas
não satisfeitas em Portugal continental, conferindo particular atenção às tendências latentes e
emergentes que, na actualidade e a breve trecho, perturbam e prejudicam a optimização das
oportunidades da vida individual e colectiva do país.
Promovido pela TESE – Associação para o Desenvolvimento e efectivado, desde Janeiro de
2008, sob Coordenação Científica do Centro de Estudos Territoriais do Instituto Superior de
Ciências do Trabalho e da Empresa, o Estudo tem como Parceiros, o Instituto da Segurança
Social e a Fundação Calouste Gulbenkian. São consultores científicos do projecto, a Young
Foundation (GB) e o Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.
Tendo como base o estudo “Mapping Britain’s Unmet Needs”, desenvolvido pela Young
Foundation em 2006, este projecto radica na constatação, quer das melhorias registadas no
desenvolvimento humano em Portugal, quer da persistência de tradicionais e severos
fenómenos de pobreza e exclusão social. Ancora-se ainda na atenção conferida a novas
fragilidades em âmbitos de desenvolvimento aparentemente resolvidos, aos renovados
contornos de velhos problemas e à emergência de fenómenos e riscos, efectivamente, novos.
O que entendemos por necessidade? Na perspectiva do Estudo, a compreensão do que é ter
ou estar em necessidade, apela à distinção entre duas dimensões, não necessariamente
sobreponíveis:
• do ponto de vista subjectivo, necessidades referem-se a um conjunto multidimensional
de percepções de carência ou de falta de algo desejado num tempo presente (e não futuro,
hipotético e/ou ideal);
• do ponto de vista objectivo, ter ou estar em necessidade de algo reporta a um conjunto
de danos (ou problemas) físicos, psíquicos ou sociais, individualmente e/ou socialmente
identificados e reconhecidos como expressões ou manifestações práticas de estados de
carência.
O presente relatório dá conta de alguns dos principais resultados de um inquérito por
questionário aplicado, em Novembro de 2008, junto da população residente em Portugal
Continental.
Preparada, lançada, em articulação com a equipa TESE/CET-ISCTE, pelo Centro de Estudos e
Sondagens de Opinião da Universidade Católica Portuguesa (CESOP-UCP), esta inquirição
teve como objectivo a identificação extensiva de danos e de percepções de carência
representativamente expressos no referido território.
1 Necessidades em Portugal: Tradição e Tendências Emergente
Súmula dos resultados do inquérito por questionário
Seguindo o plano de investigação, o inquérito antecede a realização da fase subsequente do
estudo (actualmente em execução), dedicada ao estudo de casos/situações sociais
considerados como indícios de problemas emergentes na sociedade portuguesa.
O INQUÉRITO
Dirigido a residentes no continente português com 18 ou mais anos, obtiveram-se 1237
inquéritos válidos. Foram definidos 46 pontos de amostragem, tendo sido aleatoriamente
seleccionadas freguesias em cada região do Continente (NUT II).
A unidade de sondagem foi a Família, na escolha das quais foi seguido um caminho aleatório
sistemático, com passos definidos para a realização dos inquéritos. Para garantir a
aleatoriedade, a selecção do inquirido foi feita escolhendo-se entrevistar, entre as pessoas do
alojamento que pertencem ao universo, a última a ter feito anos. As entrevistas foram
realizadas dias 22 e 23, 29 e 30 de Novembro de 2008. O erro máximo da amostra, com um
grau de confiança de 95%, é de 2,9%.
OS RESULTADOS DO INQUÉRITO
O inquérito debruçou-se sobre dimensões temáticas diversas: trabalho e emprego; nível de
vida e gestão de rendimentos; habitat, ambiente local e mobilidades; educação e
competências; redes de apoio; bem-estar subjectivo e saúde física e mental. Apresentam-se,
neste breve relatório, alguns dos principais resultados. As questões colocadas exploram
elementos que, na perspectiva teórica que suporta a investigação, remetem para diferentes
tipos de necessidades:
Necessidades
físicas e de
recursos
Condições materiais necessárias para assegurar a sobrevivência e
evitar a privação (recursos económicos, abrigo e condições da
habitação, acesso ao emprego, condições de trabalho, saúde e
segurança ambiental).
Necessidades de
competências e
capacidades
Competências e aptidões necessárias para a integração na
sociedade, exercício da liberdade e possibilidade de influenciar e gerir
mudança(s).
Necessidades
sócio-afectivas
Necessidades de relacionamento (amizade, trabalho, família e
parentesco), sentimentos de pertença, suporte emocional,
aconselhamento, compreensão, participação na comunidade local,
constituição de identidades sociais.
Necessidades de
desenvolvimento
pessoal e bemestar
Necessidades associadas ao reconhecimento, realização pessoal,
bem-estar e felicidade.
A precariedade assume-se como traço marcante no mercado de emprego, insinuando-se na
condição dos inquiridos perante o trabalho, bem como nos regimes laborais por eles
experimentados.
2 Necessidades em Portugal: Tradição e Tendências Emergente
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Em termos totais, destaca-se a existência de 10,5% de desempregados, no total dos quais
64% são mulheres. Até aos 54 anos, o desemprego é a segunda condição mais frequente
entre os respondentes. O fenómeno do desemprego assume também maior expressão
percentual entre os inquiridos com níveis mais baixos de instrução formal: 84,6% dos
desempregados estudou, no máximo, até ao 6º ano/2ºciclo do ensino Básico.
Note-se que, entre os respondentes que se encontram nessa situação, o tempo médio na
condição de desempregado é de cerca de 3 anos.
Gráfico 1: Condição perante o trabalho (%)
Com actividade profissional remunerada 57,3
Reformados
21,6
Desempregados Estudantes À procura de 1º emprego Domésticas Doença/invalidez
Outra 10,5
3,7
0,4
4,2
1,1
1,1
No que concerne ao tipo de regimes contratuais, observa-se que 41,3% dos inquiridos
experimenta, na sua actividade principal 1 , vínculos passíveis de traduzir condições de alguma
precariedade – somando-se, à ausência de contrato (12,3%), os contratos a termo certo
(20,4%), a termo incerto (6,9%) e a categoria recibos verdes cumprindo horário (1,7%),
considerada como uma situação de falsa prestação de serviço.
Entre os 8% de respondentes que exercem alguma actividade remunerada para além da sua
profissão principal, a maioria (79,5%) afirma fazê-lo por necessidade económica decorrente da
insuficiência do rendimento habitualmente obtido.
Num contexto económico marcado pela incerteza, sobressai, paradoxalmente, entre os
respondentes, a tendencial crença na estabilidade da sua situação profissional. A hipótese de
vir a perder o emprego ou ser despedido é considerada improvável pela maioria dos inquiridos
(74,8%). Também improváveis são a possibilidade de vir a ter mais do que um trabalho (63,9%)
e de vir a ter de mudar de lugar de residência para trabalhar (75%) – embora, curiosamente, a
maioria dos respondentes considere estas últimas, em teoria, mudanças positivas.
A percepção de alguma estabilidade afigura-se também presente na crença de que será
provável, segundo 60,1% dos inquiridos, vir a trabalhar na mesma empresa/instituição até se
reformar – algo considerado positivo, em teoria, por 72,8% dos respondentes.
Considerado enquanto importante dimensão da vida, o valor médio de satisfação com o
trabalho atinge, numa gradação de 1 (nada satisfeito) até 10 (totalmente satisfeito), o valor de
6,56, acima do ponto médio da escala. Embora globalmente positiva, a apreciação das
condições de trabalho é prejudicada pela injustiça da remuneração auferida (para 50% dos
1
Considera-se actividade principal, aquela que mais contribui financeiramente para o total do rendimento auferido pelo
indivíduo.
3 Necessidades em Portugal: Tradição e Tendências Emergente
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inquiridos); pela ausência de perspectivas de ser promovido no emprego (algo apenas
maioritariamente considerado possível pelos mais jovens, entre os 18 e 24 anos); e pela falta
de autonomia e capacidade de decisão na prossecução das tarefas. Como elementos
considerados particularmente positivos, sublinha-se a crença no trabalho como factor de
realização e bem-estar pessoal (para 86% dos inquiridos) e como factor de melhoria do país
(algo considerado verdadeiro por 84,3%). A maioria dos respondentes considera, ainda, que o
seu trabalho é adequado às suas qualificações.
Entre a não desprezível percentagem de indivíduos que manifesta vontade de mudar a sua
situação profissional – 30,6% no total da amostra – observa-se a ausência de qualquer
iniciativa que, na prática, pudesse concretizar esse desejo. Destes últimos, 37,5% confessa
não ter feito nem estar a fazer nada para que tal possa acontecer. Embora tendencialmente
optimistas, a percepção de que, em caso de perda de emprego, seria difícil ou muito difícil
encontrar um emprego compatível, quer com o actual nível de vida (79,6%), quer com o actual
nível de qualificações (72,2%) pode, a este respeito, constituir um particular bloqueio a
qualquer iniciativa. Refira-se que a hipótese de montar uma empresa ou negócio próprio
conquista, entre os inquiridos que desejam mudar a sua situação profissional, um valor residual
(5,2%).
Como eventuais indiciadores de transformação social na esfera do trabalho e emprego,
destaca-se, desde logo, a vontade de mudança profissional entre as mulheres (representam
57,7% dos respondentes com vontade de mudar) e a relevante percentagem de indivíduos com
vontade de aproveitar a oportunidade de estudar ou trabalhar temporariamente noutro país
(37,2%). Ganhar mais dinheiro assume-se como o principal motivo que levaria a tomar esta
última opção, sendo invocado por 59,77% destes respondentes. Note-se, contudo, que a
possibilidade de conhecer novas culturas – elemento descentrado de uma preocupação de
pendor mais materialista – se afirma como segundo motivo mais frequente (14,81%), a par da
falta de perspectivas de emprego em Portugal.
Por parte dos mais jovens, parece assistir-se à assimilação da instabilidade dos percursos
profissionais: entre os inquiridos com idades entre os 18 e os 34 anos, e ao contrário da
tendência geral, a maioria considera improvável vir a trabalhar na mesma instituição até se
reformar (61,3%) e metade (51,9%) acredita ser provável vir a ter mais do que um emprego.
No que diz respeito ao nível de vida das famílias, verifica-se que mais de metade dos
agregados considerados na totalidade da amostra (56,8%) aufere até 900€ mensais. Mais de
metade dos casais com filhos menores (50,2%) e dos casais sem filhos (57,6%) encontra-se
nesta situação.
4 Necessidades em Portugal: Tradição e Tendências Emergente
Súmula dos resultados do inquérito por questionário
Gráfico 2: Rendimento líquido mensal (%)
27,8
Menos de 500€ (menos de 100 contos)
29,1
De 505€ a 900€ (de 101 a 180 contos)
25,7
De 905€ a 1500€ (de 181 a 300 contos)
11,4
De 1505€ a 2990€(de 301 a 600 contos)
De 3000€ a 5000€ (de 601 a 1000 contos)
Mais de 5000€ (mais de 1000 contos)
4,1
2,0
Importa assinalar que a condição mais penalizadora – ganhar até 500€ líquidos – é algo
mensalmente experimentado pela maior parte das famílias monoparentais (38%), pela maior
parte dos respondentes com 55 ou mais anos (42,6%), e também pela maioria das pessoas
que vive só (entre 25 e 64 anos, 39,4%; com 65 ou mais anos, 69,6%).
Refira-se que a maioria dos agregados com rendimento mensal inferior a 500€, localiza-se na região
Norte, seguida de LVT. Estas regiões concentram, respectivamente, 44,9% e 21,3% do total destes
2
agregados .
A análise da capacidade para obter ou realizar um conjunto de aspectos, permitiu construir um
Índice de Privação, variável entre 0 (nenhuma privação) e 7 (privação máxima, no caso de não
conseguir realizar nenhum dos itens indicados). No gráfico exposto, a privação nula
corresponde aos casos em que os indivíduos afirmam conseguir garantir a realização de todos
os aspectos em consideração: “manter a sua casa devidamente aquecida”; “anualmente, pagar
uma semana de férias fora de casa, sem ficar em casa de familiares”; “ fazer diariamente uma
refeição com carne ou peixe, se quiser”; “receber amigos ou família em casa, para uma
refeição ou um café/copo, quando quer”; “usufruir do total do período de baixa médica sem
grandes restrições para o orçamento familiar”; “em datas festivas, comprar presentes para
oferecer às pessoas” e “comprar todos os medicamentos que lhe são receitados” 3 .
Como se pode observar no gráfico 3, prevalece na amostra uma privação baixa ou nula,
embora 35% das respostas dos inquiridos apontem para uma privação média e alta.
2
Nas regiões Norte, Alentejo e Algarve, o rendimento mensal auferido mais frequente é igual ou inferior a 500€. A
maioria dos inquiridos residentes na região Centro afirma ganhar um rendimento líquido mensal situado entre os 505€
e os 900€.
3
Privação baixa (uma ou duas privações de entre os sete itens); privação média (três privações) e privação alta (quatro
ou mais privações).
5 Necessidades em Portugal: Tradição e Tendências Emergente
Súmula dos resultados do inquérito por questionário
Gráfico 3: Índice de privação (%)
No que parece ir ao encontro dos dados conhecidos sobre o risco de pobreza em Portugal 4 ,
regista-se que cerca de 1/5 dos respondentes apresentou dificuldade em cumprir, nos 12
meses anteriores à aplicação do inquérito, despesas específicas. O pagamento das infraestruturas do fogo (electricidade, água, gás) suscitou particulares dificuldades, para 26% dos
inquiridos. Seguem-se, para cerca do recorrente 1/5 dos inquiridos, despesas com a
renda/prestação da casa, alimentação e escolas, creches ou ATL dos filhos.
A dificuldade em assegurar despesas prende-se não apenas com gastos quotidianos,
directamente associados à subsistência dos indivíduos. A análise dos aspectos mais gravosos
permite destacar que mais de metade dos respondentes afirma não ser possível, no seu caso,
por razões económicas, usufruir do total do período de baixa médica e pagar uma semana de
férias fora de casa, anualmente. Importa destacar que 13% dos indivíduos não consegue
comprar a totalidade dos medicamentos que lhe são receitados.
4
Em 2007, a percentagem de população em risco de pobreza alcançava, em Portugal, os 40% (antes das
transferências sociais - descendo para 18%, depois destas transferências) (INE, 2007).
6 Necessidades em Portugal: Tradição e Tendências Emergente
Súmula dos resultados do inquérito por questionário
Gráfico 4: Despesas que tem dificuldade em realizar
92,6%
86,6%
83,7%
67,4%
66,8%
61,9%
49,1% 50,9%
38,1%
33,2%
32,6%
16,3%
13,4%
7,4%
Manter a sua casa
devidamente
aquecida
Anualmente, pagar
uma semana de
férias fora de casa,
sem ficar em casa
de familiares
Fazer diariamente Receber amigos ou
uma refeição com
família em casa,
carne ou peixe
para uma refeição
ou um café/copo
Sim, consigo se quiser
Usufruir do total
período de baixa
médica sem
grandes restrições
para o orçamento
familiar
Em datas festivas Comprar todos os
(aniversários,
medicamentos que
Natal...), comprar lhe são receitados
presentes para
oferecer às pessoas
Não, não consigo
Relativamente à sua capacidade de poupança, mais de metade dos inquiridos (59%) afirma
que nada lhe sobra por mês depois de pagas as despesas fixas. Salvaguardando a natureza
relativa destas apreciações, será interessante constatar que a pouca ou nenhuma capacidade
de poupança é uma percepção maioritária em todos os escalões de rendimento líquido mensal
auferido 5 . No total da amostra, a percentagem de indivíduos a quem sobra mais de 25% do
rendimento, atinge apenas cerca de 7% dos inquiridos.
A avaliação da suficiência dos rendimentos auferidos é decerto uma medida que depende
(também) dos modos de vida e dos níveis de consumo a que as famílias estão habituadas e/ou
desejam. Refira-se que o sentimento de privação manifesta-se em cerca de 66% dos
inquiridos, os quais confessam deixar de fazer coisas por falta de dinheiro.
As carências colocadas em particular evidência são, a este respeito: a impossibilidade de viajar
ou passear (23,5%), de usar o carro com maior frequência (11,4%), o comprar produtos de pior
qualidade (8,7%) e o não proceder a melhorias na habitação (obras, compra de mobílias, etc.,
5,7%).
São muitas, e complexas, as razões do endividamento das famílias em Portugal, sendo que os
presentes resultados seguem os estudos conhecidos - quer no que se refere ao nível desse
endividamento (que atinge mais de 1/3 dos inquiridos - 35%), quer no que reporta às fontes do
mesmo. Em mais de metade do total dos inquiridos que tem dívidas, estas referem-se
sobretudo à habitação (66%) seguida da compra do carro (35%).
5
Entre os agregados que ganham até 500€, em 76,5% dos casos “nada ou quase nada” lhes sobra por mês
– sendo que esta percentagem é de 36,8% entre os agregados que auferem mais de 5000€ líquidos mensais.
7 Necessidades em Portugal: Tradição e Tendências Emergente
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Os resultados da inquirição demonstram que mais de 43% dos respondentes têm dívidas
superiores a 25% do seu rendimento familiar. A habitação própria (66%), seguida da compra de
carro (35%) e de electrodomésticos e outros equipamentos para a casa (10%) afiguram-se as
três principais fontes de endividamento.
Numa gradação de 1 até 10 (em que 1 = nada satisfeito e 10 = muito satisfeito), casa e área
de residência são aspectos que suscitam apreciações positivas por parte dos inquiridos. No
total da amostra, em termos médios, estas últimas situam-se acima do ponto médio da escala,
assumindo o valor de 6,96, no caso da casa, e de 7,11, no caso da área de residência.
O quadro regionalmente observado revela, no que respeita às mínimas condições de
habitabilidade, um pendor positivo, sendo minoritária a ocorrência das situações tradutoras de
maior precariedade – casas abarracadas (2,5%) e, eventualmente, o quarto ou parte de casa
(1,5%) e sublinhando-se a ausência (ou não revelação, por parte dos inquiridos) de queixas
quanto às condições estruturais do fogo residencial. Ainda assim, e embora atingindo uma
expressão minoritária, alguns aspectos prevalecem como particularmente penalizadores do
conforto residencial. A impossibilidade em conseguir manter a casa devidamente aquecida, por
exemplo, é manifesta por 32,6% dos inquiridos, mais de 1/3 do global da amostra. Importa
também olhar a algumas disparidades regionais interessantes. Embora minoritariamente
referenciado em todas as regiões, o problema de falta de água quente em casa atinge, no
Alentejo, 10,8% dos respondentes. A apreciação da área de residência suscita a maior
expressão de vulnerabilidades e necessidades. Neste âmbito, as principais reivindicações
centram-se na afirmação da conveniência do investimento em mais transportes públicos,
melhoria das condições de segurança, maior número de espaços verdes e de lazer e, no que
sobressai também como um dos aspectos considerados menos satisfatórios, a melhoria do
arranjo e limpeza do espaço público.
Dado inquietante no que respeita à dimensão da educação e competências, observa-se que,
não só a maioria dos indivíduos (75,2%) não frequentou nos últimos 3 anos qualquer curso,
6
como apenas uma minoria deseja voltar a estudar . Aliás, acima dos 35 anos, a maioria dos
indivíduos afirma não ter intenção de voltar a estudar.
Incapacidades e condicionalismos próprios justificam a maior parte desta recusa, esbatendo-se
a importância de motivos associados às condições da oferta formativa. A percepção de já não
ter idade para estudar (para 51,1% dos indivíduos que não querem voltar a estudar) e a falta de
tempo para tal (para cerca de 1/4 dos mesmos) justificam a maioria das respostas. A vontade
de aprender mais manifesta-se de modo mais expressivo a propósito de um conjunto de
competências de âmbito informal.
Não se sentindo preparados sobretudo para comunicar em línguas estrangeiras (64,9%) e
utilizar a internet/computador (53,6%), para ambas as competências observa-se o
6
O principal motivo para ter frequentado um curso (para 33,7% dos inquiridos) foi melhorar a situação profissional.
8 Necessidades em Portugal: Tradição e Tendências Emergente
Súmula dos resultados do inquérito por questionário
reconhecimento maioritariamente positivo da necessidade de aprender mais 7 . O défice de
preparação assume-se, nestas duas competências, particularmente penalizador para as
mulheres.
Sublinhe-se que Lisboa e Vale do Tejo é a única região em que a maioria dos respondentes
(58,2%) sente estar preparado para utilizar o computador/internet. Em todas as outras regiões,
inverte-se a tendência de resposta. O interesse em melhorar tal competência é
percentualmente dominante em todas as regiões, à excepção do Algarve.
Registe-se ainda duas importantes tendências de resposta, particularmente importantes num
contexto nacionalmente marcado pelo genérico défice de formação, pelo abandono e
insucesso escolares e pela incidência de baixos graus de literacia. Acompanhar os filhos na
vida escolar é a terceira tarefa em que a falta de preparação dos indivíduos alcança maior
expressão percentual relativa: 28,4% dos inquiridos consideram não estar preparados para tal.
Mais de metade dos respondentes (60%) na totalidade da amostra sente necessidade de
aprender mais sobre como fazê-lo. Sentindo-se maioritariamente preparados mas querendo
aprender mais, encontra-se a actividade explicar ideias por escrito (57,2%), algo presente nos
três níveis de ensino considerados.
A satisfação com a vida tem sido considerada como uma das medidas mais profícuas na
medição do bem-estar, estando esta mais relacionada com processos de avaliação das
condições objectivas de vida.
A satisfação pode estar relacionada com a felicidade – estando esta directamente relacionada
com processos mais emocionais e afectivos – mas é comum o grau de felicidade ser superior
ao grau de satisfação, demonstrando potencialmente um desfasamento maior entre condições
objectivas de vida e percepção do bem-estar, como se pode observar na amostra, cujos
valores de satisfação com a vida em geral são de 6,6 e 7,3 de felicidade (numa escala de 1 a
10).
Numa análise geral, pode-se concluir que os níveis mais elevados da satisfação estão
associados às dimensões mais privadas, relacionais e provavelmente identitárias da vida. A
vida familiar, as relações de amizade e a área de residência são as dimensões que acolhem
níveis mais elevados de satisfação, seguidas de muito perto pelo estado de saúde e pela casa.
Ainda pontuada, em termos médios, na vizinhança deste ponto da escala, mas com valores
inferiores, encontramos a dimensão do trabalho (6,56). Como anteriormente referido, o trabalho
é apreciado de forma positiva como contributo para a realização pessoal e melhoria do próprio
país, mas avaliado negativamente no que concerne à remuneração auferida e à ausência de
perspectivas de promoção na carreira.
As três dimensões de maior insatisfação provêm de esferas de natureza bastante diferente: o
nível de vida, dimensão estruturadora das condições de vida e, assim, do bem-estar, por
implicar distintos recursos accionáveis na satisfação das necessidades, o que pode indicar
constrangimentos relevantes na obtenção desses recursos ou na capacidade de os mobilizar; a
7
Sentindo necessidade de aprender mais sobre como comunicar em línguas estrangeiras: 63,1% dos inquiridos. Com
necessidade de aprender mais sobre aprender a utilizar melhor a internet/computador: 55,3%.
9 Necessidades em Portugal: Tradição e Tendências Emergente
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vida espiritual e a participação cívica, decorrendo de necessidades mais imateriais e da ordem
do ser e da realização pessoal, apresentam aqui a menor satisfação entre as dimensões
consideradas.
Ter mais dinheiro, mais saúde (ou melhor acesso a cuidados de saúde) e arranjar trabalho ou
mudar de emprego constituem os ingredientes, no contexto actual da sociedade portuguesa,
que segundo os entrevistados, potenciariam um aumento da qualidade de vida. Estes são
factores que correspondem a necessidades do ter, intimamente relacionadas com
necessidades físicas e de recursos cuja não satisfação compromete seriamente as condições e
a qualidade de vida. Se acrescentarmos, particularmente no escalão etário mais novo (18-34
anos), a referência ao comprar/mudar de casa (por troca com as questões da saúde bastante
mais relevantes, como seria de esperar, no último escalão) configura-se um quadro de
necessidades limitadas às condições básicas de vida, excluindo as dimensões mais
relacionadas com necessidades do ser, seja de tipo sócio-afectivo e relacional, seja de
desenvolvimento pessoal e social.
Gráfico 5: Níveis médios de satisfação com as várias dimensões da vida
7,72 Vida familiar
Relações de amizade 7,49 Área de residência 7,11
Estado de saúde 7,00
Casa 6,96
Nível de educação/formação 6,60
Trabalho 6,56
Tempo livre 6,03
Nível de vida
5,95
Vida espiritual 5,90
Participação cívica
5,11
As três principais medidas para melhorar a qualidade de vida em Portugal, por ordem de
prioridades, estabelecidas pelos inquiridos são: em primeiro lugar, o tornar a habitação
financeiramente mais acessível (24,4%), em segundo combater a corrupção (16,7%) e, em
terceiro, reduzir ou evitar criminalidade violenta (15,2%).
No quadro abaixo pode-se verificar que as respostas mais frequentes como primeira prioridade
são, por ordem decrescente: tornar a habitação financeiramente mais acessível, apoio a idosos
para combater o seu isolamento e solidão e combater a corrupção. Já as respostas mais
frequentes como segunda prioridade são, por ordem decrescente: combater a corrupção,
reduzir ou evitar criminalidade violenta, apoio a idosos para combater o seu isolamento e
solidão. Finalmente, as respostas mais frequentes como terceira prioridade para melhorar a
qualidade de vida em Portugal são, por ordem decrescente: reduzir ou evitar a criminalidade
violenta, apoio a idosos para combater o seu isolamento e solidão e combater a violência nas
escolas.
10 Necessidades em Portugal: Tradição e Tendências Emergente
Súmula dos resultados do inquérito por questionário
Quadro 1: Prioridades para melhorar a qualidade de vida em Portugal (%) 1ª Prioridade
Habitação financeiramente
mais acessível
24,4
2ª Prioridade
Combater a corrupção
16,7
3ª Prioridade
Reduzir ou evitar a criminalidade
violenta
15,2
Apoio a idosos para
combater o seu isolamento
e solidão
23,1
Reduzir ou evitar
criminalidade violenta
15,9
Apoio a idosos para combater o seu
isolamento e solidão
11,8
Combater a corrupção
20,9
Apoio a idosos para
combater o seu isolamento
e solidão
14,6
Combater a violência nas escolas
9
A confiança depositada nos outros alcança, numa gradação de 1 a 10, um valor médio
situado abaixo do ponto médio da escala: 4,52. Em média, os homens confiam mais nos outros
(4,68) do que as mulheres (4,37). Os mais jovens, com idades compreendidas entre os 18 e os
34 anos, apresentam um nível médio de confiança nas pessoas de 4,83, sendo este menor
para os inquiridos com 35 ou mais (4,37). Os inquiridos com um nível de instrução superior,
revelam um nível médio de confiança nos outros de 5,21. Este valor diminui à medida que
diminui também o nível de instrução: no caso dos respondentes com o ensino Secundário, o
nível médio de confiança nos outros é igual a 4,64; no caso dos com o ensino Básico, é 4,42.
Quanto à confiança nas instituições, a maioria os inquiridos manifesta alguma ou muita
confiança no conjunto de instituições expostas à sua apreciação. Entre as instituições que
conquistam maiores níveis de confiança por parte dos inquiridos, destacam-se as associadas
ao sector privado e 3º sector: ensino privado, sistemas de saúde privados e associações de
solidariedade social. As instituições que nos governam merecem um menor nível de confiança
dos inquiridos, concentrando um maior número de respostas nas categorias pouca ou
nenhuma confiança. O ensino Público apresenta-se como a instituição do sector público à qual
é atribuída maior confiança, seguindo-se a Segurança Social Pública e o Serviço Nacional de
Saúde.
11 Necessidades em Portugal: Tradição e Tendências Emergente
Súmula dos resultados do inquérito por questionário
Gráfico 6: Confiança nas instituições (%)
Segurança Social Pública
Ensino Público
Instituições que nos governam
Serviço de saúde público 8,4
17,7
Ensino Privado
17,6
Muita confiança
13,2
Alguma confiança
15,8
31,5 47,3
Sistemas de saúde privados
11,5
31,3
48,8
Sistemas de protecção social privados (PPR, etc.) 5,5
Associações de solidariedade social (IPSS, ONG)
32,5 37,1
27,8
2,6
5,9
27,3 55,6
11,3
10,5
30,6 50,3
8,6
17,6
56,2
17,2
58,8
21,7 56,1
Pouca confiança
8,5
6,4
9,0
Nenhuma confiança
A disposição e os sentimentos predominantes são, além de indicadores de bem-estar,
indicadores de saúde física e psíquica dos indivíduos. Os inquiridos demonstram uma
tendência para a expressão de sentimentos e disposições predominantemente positivas – ou
seja, as percentagens incidentes nas categorias frequentemente/muito frequentemente são
quase sempre superiores nos aspectos positivos, relativamente aos negativos.
Criou-se um índice de sentimentos positivos e um índice de sentimentos negativos,
posteriormente cruzados com: o sexo, a idade, o grau de instrução, a condição perante o
trabalho, o índice de privação, o facto de possuir algum tipo de limitação física ou psíquica, o
grau de confiança interpessoal, e os tipos de precarização pelo tempo.
No caso dos sentimentos negativos, a variável com mais impacte é o índice de privação quanto maior é a privação dos indivíduos, mais estes tenderão a desenvolver sentimentos
negativos, como irritação, zanga, ansiedade, depressão ou isolamento. A média dos
sentimentos negativos é maior entre as mulheres do que entre os homens e é mais baixa entre
os indivíduos activos do que entre aqueles que não exercem profissão.
Em relação aos sentimentos positivos, a variável explicativa com mais impacte é a idade do
inquirido, sendo que à medida que aumenta a idade diminui a média deste tipo de sentimentos.
É, portanto, entre os mais jovens que se encontra uma maior expressão de sentimentos
positivos.
12 Necessidades em Portugal: Tradição e Tendências Emergente
Súmula dos resultados do inquérito por questionário
Gráfico 7: Sentimentos predominantes (%)
SENTIMENTOS POSITIVOS
Com vontade de arriscar 22,1
39,4
38,5 43,8
Contente
47,2
32,3
Enérgico(a)
38,5
31,2
Optimista
9,0
29,2 36,7
32,2 SENTIMENTOS NEGATIVOS
32,3
Ansioso(a)
16,2 Irritado(a)
Deprimido(a)
Excluído(a)
45,2
44,9
10,1 6,6 30,9
38,9 59,0 20,5
Frequentemente/muito frequentemente
22,5 72,9 Às vezes
Raramente/nunca 13 Necessidades em Portugal: Tradição e Tendências Emergente
Súmula dos resultados do inquérito por questionário
ENTIDADE PROMOTORA
COORDENAÇÃO CIENTÍFICA
ENTIDADES PARCEIRAS
CONSULTORES CIENTÍFICOS
ENTIDADE FINANCIADORA
14 
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Súmula dos Resultados do Inquérito por Questionário (Junho