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Maceió-AL, Sexta-Feira, 24 de Junho de 2011.
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A CUPIRA RAINHA
No Sertão de Alagoas, Dona Cícera Cupira, ex-vendedora de roupa, conseguiu, por meio da
apicultura, iniciar a realização de um sonho: ser professora formada
Por Victor de Almeida
Próximo à pequena cidade de Olho D’água do Casado fica localizado o povoado de Umbuzeiro. No povoado
existe uma pequena casa branca, com apenas cinco cômodos. Logo acima no terreno pode-se ver uma
pequena casa de mel construída ao lado de uma escola, com um quadro negro e algumas carteiras. Em volta a
isso, apenas a vegetação nativa do Sertão alagoano.
Quem mora nesta casa branca é Cícera Alves da Silva, mais conhecida como Dona Cícera Cupira. Aos 47 anos,
é casada e mãe de nove filhos. Apicultora desde 2005 viu na atividade uma oportunidade de gerar renda,
melhorar a qualidade de vida, desenvolver sua região e realizar um sonho antigo.
O apelido Cupira veio da família do marido, José Martin da Silva, e é o nome de uma abelha nativa que faz
ninho em cupinzeiros. A família de José vendia mel de Cupira que segundo a crença popular, serve para
combater manchas no olho. Não sabia ela, nem o marido, que as abelhas estariam mais presentes na vida
deles do que no apelido.
Antes de iniciar a criação de abelhas, ela vendia roupas, redes, lençóis e outros artigos têxteis para sustentar a
casa. “Eu comprava em Caruaru e trazia para vender. Eu ia até a casa de todos os moradores da região e
oferecia meus produtos, fazia meu caminho de bicicleta”, recorda.
Isso até 2001, quando Dona Cícera conheceria a apicultura e mudaria de ramo. “Eu vi que era aquilo que eu
queria fazer. Foi amor à primeira vista”, diz.
A chegada das abelhas – Em 2001, a cidade de Olho D’água do Casado recebeu várias palestras promovidas
pelo Fórum de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável (DLIS), sobre as potencialidades produtivas na
região. A ação foi criada pelo programa Comunidade Ativa e é uma instância de articulação das organizações
sociais que atuam na região com o objetivo de fomentar o desenvolvimento. Das propostas apresentadas,
Dona Cícera se interessou pela criação de abelhas e extração do mel.
“Eu queria muito começar a produzir, mas não tinha como. Eu não tinha dinheiro para comprar caixas para
montar minhas primeiras colméias. Aí eu tive a idéia de vender os dois bois que tínhamos para poder investir
nas primeiras caixas de abelha”, diz.
A família de Dona Cícera foi contra a iniciativa. “Meu marido era contra a venda dos bois. Meu pai e minha
mãe, também. Durante muito tempo eles tentaram me convencer do contrário, mas eu sabia que era aquilo
que eu tinha que fazer e bati o pé até que convenci a todos de que deveríamos fazer esse esforço”, lembra.
Com o dinheiro da venda dos bois, foram compradas dez caixas de abelhas e o que sobrou foi investido em
viagens de Dona Cícera para congressos e encontros sobre o tema. Participou, dentre outros eventos, do
Congresso Ibero-latino-americano de Apicultura, referência nacional no setor e contou com a presença de
proprietários de apiários de dezoito países.
“Eu sofri muito preconceito quando estive fora para fazer meus cursos. O povo daqui falava que eu só queria ir
atrás de curso, atrás de abelha e deixava os meninos em casa. Todos diziam que eu só queria estar na rua e
que eu não queria cuidar da casa. Mas eu não liguei, sabia que era importante aprender com quem já
produzia”, explica.
O programa – Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2001 Alagoas tinha
cerca de 300 apicultores com uma produção de 21 mil quilos de mel. Já em 2004, somente o município de Pão
de Açúcar havia produzido 24 mil quilos de mel e o Estado, 116 mil. Dados que comprovam o rápido
crescimento da atividade.
É nesta realidade, que é lançado em Alagoas, no ano de 2004, o Programa de Arranjos Produtivos Locais
(PAPL). A iniciativa faz parte de um modelo de desenvolvimento local com base em ações integradas para
consolidar atividades potenciais de cada região.
Os arranjos são um conjunto de empresas e empreendedores, localizados em um mesmo território, que
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apresentam especialização produtiva e mantêm algum vínculo de articulação e cooperação entre si e com
outros atores locais.
O objetivo é, através de parcerias com instituições públicas e privadas, definir uma estratégia de atuação
visando mobilizar ações coletivas e integradas para gerar renda e emprego, direcionando os esforços para o
desenvolvimento dos micro e pequenos negócios regionais.
A ação estava prevista no Plano Plurianual (PPA) do Governo federal para o período de 2004-2007. Segundo o
plano: “O fortalecimento dos arranjos produtivos locais confere ao País uma oportunidade singular para a
desconcentração espacial da produção e a valorização dos recursos potenciais dispersos no território nacional".
Em Alagoas, o PAPL foi lançado pelo Governo do Estado, via Secretaria de Estado do Planejamento e do
Orçamento (Seplan), em parceria com o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Alagoas
(Sebrae/AL). Primeiramente, havia nove arranjos visando desenvolver, dentre outras atividades, a apicultura.
O APL de Apicultura no Sertão, também lançado em 2004, visa promover as atividades da cadeia produtiva no
Estado. Ao todo são treze municípios envolvidos, escolhidos segundo critérios do programa: Água Branca,
Delmiro Gouveia, Olho D’água das Flores, Olho D’Água do Casado, Olivença, Palestina, Pão de Açúcar,
Pariconha, Piranhas, Poço das Trincheiras, Santana do Ipanema, São José da Tapera e Senador Rui Palmeira.
A escolha se deu pela potencialidade, características socioeconômicas e proximidade de cada município. O
Sertão de Dona Cícera Cupira foi diagnosticado como o maior setor produtivo de apicultura de Alagoas. Entre
os dez maiores produtores de mel do Estado, quatro se localizam na região. (ver tabela)
“Quando fizemos o rastreamento dos produtores em Alagoas, percebemos a existência de três grandes cadeias
produtivas de mel. Além de pesquisar a potencialidade das regiões para a atividade também verificamos o
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e o grau de escolaridade da população. Quanto maior a
potencialidade e menor desenvolvimento, maior a probabilidade da localidade receber um arranjo. O Sertão foi
a região que apresentava o maior potencial para a cultura do mel e os piores indicadores sociais”, destaca
Mário Alberto Paiva, coordenador do PAPL pela Seplan.
Com a região escolhida, restava montar um plano de ações para cada cadeia produtiva e traçar um
planejamento estratégico. Uma das prioridades era introduzir no produtor a consciência de coletividade, a
visão cooperativista aplicada ao mundo dos negócios.
“O programa traz muitos benefícios para os produtores e para o Estado como um todo. O maior deles seria a
introdução da cultura do cooperativismo e do associativismo em Alagoas. Costume que ainda não tínhamos, já
que no passado muitos produtores atuavam por conta própria”, conta Mário Alberto Paiva.
Através de oficinas e treinamentos com a temática cooperativista, Dona Cícera e os demais apicultores da
região fundaram a Cooperativa dos Apicultores do Sertão de Alagoas (Coopeapis). A cooperativa tem a função
de representar os interesses da coletividade junto a fornecedores, compradores e representantes.
“Associadas, as empresas podem se fortalecer atuando coletivamente. Isso ocorre de tal forma, que as
empresas chegam a atuar como uma grande, a depender, claro, do nível de coalização do arranjo. Isto quer
dizer que as empresas continuam com seus aspectos positivos, a exemplo da questão do emprego e reforçamse em aspectos negativos, tais como barganha com fornecedores, capacidade para contratação de consultorias
técnicas, criação de marcas para atuar no mercado, criação de uma cultura local de produção de determinado
item, geração de mão-de-obra qualificada, entre diversas outras vantagens”, explica o pesquisador da
Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), Marcel Pinto.
Associativismo que também está presente na propriedade de Dona Cícera. Vizinha a pequena escola próxima
de sua casa fica a casa do mel “Amigos em Ação”. Lá todos os produtores da região que ainda não tem como
processar o mel por conta própria, levam sua produção e beneficiam o mel.
“Aqui todos produzem como podem. Antes de eu conseguir comprar meu próprio equipamento eu usava a casa
do mel comunitária que é da cooperativa. Agora que eu tenho, além de extrair o meu, os produtores da região
também utilizam”, diz Dona Cícera apontando para o equipamento que usa na extração.
Não só o cooperativismo é fruto do modelo de desenvolvimento do APL. Dentre outras coisas, faz surgir postos
de emprego. O que antes era uma atividade isolada, pode se transformar, através de cooperativas de produção
e trabalho, em um mercado empregador em potencial.
Ainda segundo o pesquisador da Univasf, os APL apresentam uma importância fundamental no
desenvolvimento do Brasil e, principalmente, na região nordeste. “A importância dos APL na economia
brasileira, nordestina, ou de qualquer outra região do país, relaciona-se com a contribuição das pequenas
empresas neste cenário, isto porque os APL são associações desse tipo. A primeira contribuição refere-se à
questão do emprego. Pequenos e médios empreendimentos, de um modo geral, geram mais postos de
trabalho do que os maiores”, explica.
Desde 2004 já foram investidos mais de R$ 2,6 milhões no arranjo produtivo. Dentre as ações, destacam-se:
instalação de Casas do Mel e Entreposto de Mel e Cera de Abelhas, inclusão do mel na merenda escolar e
formação de equipe de Agentes de Desenvolvimento Rural (ADR) para prestar acompanhamento tecnológico
aos produtores, além da formação da Coopeapis.
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Em 2009, a boa notícia para Dona Cícera, para a cooperativa e demais apicultores inseridos no programa é o
investimento de cerca de R$ 1 milhão, a ser empregado na campanha de promoção do Mel do Sertão,
realização de consultoria técnicas, aquisição de mel para doação e realização de feiras e eventos dos
apicultores.
Realizando um sonho – “Com a formação do APL eu finalmente, convenci minha família a vender os dois
bois e comprar as caixas de abelha. Em 2004, povoei as caixas. E em 2005, produzi o meu primeiro mel”,
conta Dona Cícera Cupira.
A produção do mel gerou dinheiro suficiente para que ela comprasse de volta os dois bois que vendeu e
adquirisse mais duas caixas para criar abelhas. Começando, então, a formar uma visão para os negócios.
“Eu não gasto todo o dinheiro que recebo. Tudo que eu ganho eu coloco no papel, tudo que eu gasto, também.
Assim eu sei quanto eu estou ganhando, quanto eu estou gastando e o que eu preciso diminuir para comprar
alguma coisa”, diz.
Foi assim que ela conseguiu comprar geladeira, máquina de lavar, fogão, os sofás, motocicleta, equipamento
para a casa do mel e, mais recentemente, computador. Das dez caixas de abelha iniciais de 2004, Dona
Cícera, tem hoje em sua propriedade 44 caixas. Algumas delas chegam a ter cerca de 80 mil abelhas e
produzir 12 quilos de mel a cada 15 dias.
O sucesso com o mel, a experiência adquirida nas viagens e em visitas técnicas a apiários deram à Dona
Cícera reconhecimento e lhe renderam, entre outras coisas, capacitação para atuar como Agente de
Desenvolvimento Rural (ADR) na região do APL, indicação para representante de Olho D’água do Casado na
Coopeapis e até cargo como Secretaria Municipal de Ação Social.
Mas, a maior conquista de Dona Cícera, depois de cinco anos de apicultura, não foi o cargo de secretária,
representante da cooperativa ou o de agente de desenvolvimento. Em 2008, ela foi aprovada no vestibular
para o curso de Pedagogia na Faculdade de Tecnologia e Ciência (FTC/AL). Agora, divide o tempo das
atividades relacionadas à produção do mel, com os estudos e trabalhos da faculdade. Segundo ela é o início da
realização de um sonho. O sonho de ser professora formada.
“Eu agora divido meu tempo entre a apicultura e as tarefas da faculdade. As abelhas me deram tudo o que eu
tenho. Foram elas que realizaram meu sonho de estudar para ser professora”, finaliza.
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