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Paula Bessa
cobertas de pinturas, desta feita com uma grande sofisticação de arranjo dos programas
na sua articulação com a arquitectura e, por vezes, como acontece com o Pentecostes,
por exemplo, de grande qualidade de composição e de execução.
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Como se terá constituído a clientela desta oficina? Tudo indica que era integrada,
por exemplo, por D. Jorge de Almeida, bispo-conde de Coimbra24, D. Fernando de
Meneses Coutinho e Vasconcelos, D. Pedro de Castro25, o herdeiro de João Teixeira
de Macedo26, o abade de S. Julião de Montenegro, o abade de Tresminas, o capelão de
Santiago de Folhadela. Em relação a todos eles convém lembrar que todos auferiam nas
igrejas para as quais mandaram realizar pinturas murais de importantes rendimentos27.
Será que esta rede de clientes correspondia de algum modo a uma rede social?
Ao aperceber-me de que vários notáveis encomendadores (D. Jorge de Almeida, D.
Fernando de Meneses Coutinho, D. Pedro de Castro, por exemplo) escolheram esta
mesma oficina de pintura pareceu-me relevante proceder a indagações de carácter
genealógico28.
De facto, laços de família ligavam vários importantes prelados – e encomendadores
– da primeira metade do século XVI. Assim, D. Jorge de Almeida, bispo-conde de
Coimbra, era tio de D. Fernando de Meneses Coutinho, uma vez que era irmão da
mãe de D. Fernando, D. Isabel da Silva.
O arcebispo de Braga D. Diogo de Sousa era primo de D. Fernando de Meneses
Coutinho e Vasconcelos, uma vez que ambos descendiam, por via masculina, de
Gonçalo Mendes de Vasconcelos e de D. Teresa Ribeiro. Na verdade, por via
feminina, D. Fernando de Menezes Coutinho e Vasconcelos e D. Diogo de Sousa
eram descendentes de D. Pedro de Menezes, Governador de Ceuta, uma vez que
D. Fernando era neto de filha legítima de D. Pedro, D. Isabel de Menezes, sendo D.
Diogo de Sousa neto de D. Isabel de Menezes, filha bastarda do mesmo D. Pedro
de Menezes. Vemos, portanto, que D. Fernando e D. Diogo, para além dos laços de
parentesco que os uniam, tinham também ligações próximas à casa de Vila Real.
Ora, um outro encomendador a esta oficina sobre cuja actividade vimos reflectindo
foi D. Pedro de Castro, capelão do marquês de Vila Real e abade de S. Salvador
24
Joaquim Inácio Caetano propôs uma autoria comum para as pinturas murais da capela-mor de Santa Leocádia, por
exemplo, e para o chamado retábulo de S. Simão ou de S. Salvador no Museu de Aveiro e que usam um mesmo motivo
de padrão de adamascado; note-se que no reverso dos volantes deste retábulo está pintado o brasão de armas de
D. Jorge de Almeida. A propósito da atribuição da autoria deste retábulo e de pinturas murais à oficina que vimos
comentando veja-se a comunicação de Joaquim Inácio Caetano (De la fragmentation du regard à l’identification des
ensembles, ou le formalisme dans l’étude des peintures murales des Xvème et XVIème siècles au Nord de Portugal) ao Ciclo
de conferências «Out of the Stream: new perspectives in the study of Medieval and Early Modern mural paintings»
organizado por Luís Afonso na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa em 2006.
25O encomendador das pinturas murais para a igreja de Nossa Senhora de Guadalupe (Mouçós, Vila Real), datadas
de 1529. Sobre este assunto poderá ver-se BESSA, 2006 b.
26O encomendador das pinturas murais para a parede fundeira da capela de S. Brás (Vila Real). Sobre este assunto
poderá ver-se BESSA, 2003: 67-95.
27 Sobre este assunto veja-se BESSA, 2007: vol I, 211-214.
28 Estas indagações de carácter genealógico foram feitas recorrendo ao Nobiliário de Famílias de Portugal de Felgueiras
Gaio e à Pedatura Lusitana de Cristóvão de Alão de Morais. As referências bibliográficas sobre estas questões seriam
demasiado extensas para esta publicação, razão pela qual as publicarei noutra ocasião.
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