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Veículo: O Estado de S.Paulo Data: 14/09/2015 Pág: Online
IPCC quer entender impacto no clima local
Worshop no Instituto de Pesquisas Espaciais(Inpe) discute novos rumos do painel científico às
vésperas de eleição
SÃO PAULO Depois de 25 anos atuando para explicar a ciência das mudanças climáticas
e mostrar ao mundo que o aquecimento global é uma realidade e é causado por ações
humanas, o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) está em
momento de reformulação.
O grupo internacional de cientistas ligado à Organização das Nações Unidas busca, daqui
para frente, aprofundar o conhecimento sobre impactos no nível regional, trabalhar com
soluções, mostrar como é possível integrar mitigação (redução de emissões de gases de
efeito estufa) com adaptação às mudanças do clima e melhorar a comunicação com o
público sobre tudo isso.
Esses são alguns aspectos que devem ser discutidos nesta semana no Brasil em um
workshop do IPCC que será realizado no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(Inpe), em São José dos Campos. Com o tema Projeções Regionais do Clima e seus
Usos em Estudos de Impactos e Riscos, o evento reunirá mais de uma centena de
pesquisadores de 55 países e servirá como um aquecimento para as eleições a
presidente e vice do Painel e copresidentes dos grupos de trabalho. A seleção ocorre
entre 5 e 8 de outubro em reunião na Croácia.
O workshop no Brasil foi organizado pelos grupos de trabalho 1 (que trata da base
científica da mudança do clima) e 2 (que fala de impactos, adaptação e vulnerabilidade),
hoje copresididos por dois dos candidatos à presidência – o físico suíço Thomas Stocker
e o ecólogo norteamericano Christopher Field.
Stocker estará no Brasil juntamente com um terceiro candidato, o climatologista belga
JeanPascal van Ypersele, hoje vicepresidente do IPCC. No Inpe, o evento é organizado
pela matemática brasileira Thelma Krug, que concorre à vicepresidente do painel. Se
eleita, será a primeira mulher no cargo.
Em entrevista ao Estado, os quatro candidatos falaram da importância de a ciência
compreender melhor os impactos da mudança do clima no nível regional a fim de oferecer
subsídios para políticos tomarem decisões. O Inpe foi escolhido para sediar essa
discussão justamente porque há anos desenvolve estudos sobre os riscos do
aquecimento para o Brasil. Mas, em geral, considerase que a análise local para todo o
mundo ainda não alcançou a maturidade.
“A capacidade dos modelos regionais em prover dados numéricos que permitam fazer
previsões confiáveis sobre a evolução do clima para períodos anuais ou decadais ainda é
limitada. A cada novo relatório do IPCC há melhorias nas simulações em escala regional
que geram melhores previsões, particularmente da temperatura. Mas previsões de
precipitação em nível regional são mais incertas devido à variabilidade interna da
precipitação observada”, exemplifica Thelma.
Riscos. De acordo com Field, para começarem a agir, os governantes precisam entender
melhor não só os impactos, mas os riscos regionais. “Esses riscos vêm do sistema
climático físico, vêm das vulnerabilidades de cada local, das dinâmicas sociais, vêm da
exposição e vêm de muitos elementos que contribuem para o caminho do
desenvolvimento”, afirma.
Ele destaca a importância de haver melhores previsões para eventos climáticos extremos.
“A atual seca no Brasil é um bom exemplo do modo como a crise climática pode se
desdobrar e é um exemplo do tipo de problemas que precisamos conhecer melhor”, diz.
“Revela a importância de pensar como a mudança climática desafia a gestão de risco”,
complementa.
Para Stocker, a regionalização depende de haver também mais cientistas de todas as
partes do mundo trabalhando na busca dessas informações. Hoje, a maioria dos
membros do IPCC é proveniente do Hemisfério Norte. “Mas as pessoas mais vulneráveis
e que serão mais impactadas pela mudança do clima estão na região dos trópicos e no
hemisfério sul, principalmente na África e no sudeste da Ásia. Por isso, precisamos de
uma representação de grupo de cientistas (nesses locais) que possam nos informar em
primeira mão sobre suas lições aprendidas a respeito de impactos e riscos, que eles
vivenciam e investigam.”
Ypersele lembra que esse conhecimento é fundamental porque, apesar de as mudanças
climáticas serem globais, os impactos são sempre locais. “Apesar de que eles podem ter
consequências ainda maiores quando ocorrem em muitas regiões ao mesmo tempo,
impactando, por exemplo, o preço dos alimentos. Por isso, fazer projeções regionais é
muito importante para lidar com isso”, afirma o especialista.
Eleições. Ao Estado, Field, Stocker e Ypersele falaram também sobre suas prioridades se
forem eleitos como presidente do IPCC. Eles vão ocupar a vaga que o indiano Rajendra
Pachauri ocupava desde 2002. Ele foi afastado em fevereiro após acusações de assédio
sexual.
“O IPCC tem sido uma fonte definitiva sobre o que sabemos e o que não sabemos na
ciência das mudanças climáticas. Daqui para frente, seremos mais importante em mostrar
não só os riscos, mas as soluções para o clima. Nossa preocupação tem de deixar de ser
o problema, para ser a solução para as mudanças climáticas. Quando falamos sobre essa
crise, se nós não oferecemos um conjunto de soluções viáveis para adotar, nós não
estamos realmente ajudando. E acho que uma das maiores oportunidades para o próximo
relatório é trazer trabalhos que buscam compreender como as oportunidades para
adaptação e mitigação podem se sobrepor", diz Field
Para Ypersele, “a humanidade tem um grande problema e ele vai apenas se tornar maior
se muito mais não for feito em adaptação e mitigação". Mas ele diz acreditar que a
humanidade já "tem os meios para se proteger se buscar o desenvolvimento sustentável."
Ele afirma que uma de suas prioridades é melhor comunicar e explicar como o IPCC
trabalha e o que ele diz, de modo que seja compreensível por todo mundo.
Para o climatologista, isso é importante num momento em que o mundo tenta chegar a
um acordo global para a redução das emissões de gases de efeito estufa, o que deve ser
alcançado na Conferência do Clima da ONU, em Paris, em dezembro. "Traduzir a ciência
do clima em políticas climáticas é um desafio porque os políticos têm de lidar com várias
restrições e objetivos. E fazer a gestão de um bem comum global, como é o sistema
climático, não é fácil se os países só olharem para seus interesses nacionais."
Stocker também colocou como uma de suas prioridades melhorar a comunicação do
IPCC. "Nossa função não é julgar nenhuma ação, mas sim informar de modo objetivo e
transparente quais são as diferentes escolhas para o futuro", diz. Ele também propõe que
os grupos de trabalho 1 (que atua mais sobre a Física do clima) e 2 (que fala sobre os
impactos) do IPCC atuem mais juntos situação que está sendo proposta no workshop do
Inpe nesta semana, com vistas a maior regionalização dos modelos climáticos.
"Precisamos de colaborações próximas em torno de pontos chave que são cruciais para
obter um relatório compreensível e de sucesso. É o caso das projeções climáticas
regionais, em que podemos juntar o aspecto físico com todo o espectro que cobre
impacto, unindo questões sobre adaptação e mitigação", afirma.
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