Abertura Boas Vindas Tema do Congresso Comissões Sessões Programação Áreas II Congresso Nacional de Formação de Professores XII Congresso Estadual Paulista sobre Formação de Educadores Títulos Trabalho Completo A METODOLOGIA DO ENSINO DE MATEMÁTICA NO CURSO DE PEDAGOGIA: O QUE AS PESQUISAS VEM APONTANDO NOS ÚLTIMOS DEZ ANOS? Viviane Lovatti Ferreira, Laurizete Ferragut Passos Eixo 1 - Formação inicial de professores para a educação básica - Relato de Pesquisa - Apresentação Oral A pesquisa sobre a temática da formação do professor que ensina matemática nos anos iniciais do ensino fundamental vem crescendo na área de Educação Matemática. A questão do desempenho dos alunos dos anos iniciais, especialmente em relação à matemática, tem sido objeto de preocupação dos sistemas de ensino, gerando debates que parecem decorrentes dos resultados apontados pelas avaliações nacionais da educação básica. O que os resultados apontam tem originado uma preocupação com a formação inicial dos licenciandos que ensinarão matemática nos anos iniciais. No curso de Pedagogia destacase uma disciplina cujo objetivo é fornecer ao futuro professor elementos teóricometodológicos para o trabalho com o ensino da Matemática nos anos iniciais da educação básica. O objetivo deste estudo foi apresentar um panorama acerca de algumas pesquisas produzidas no âmbito educacional, especialmente do campo da educação matemática, que possuem alguma relação com a Metodologia do Ensino de Matemática no curso de Pedagogia. Neste artigo, trabalhamos na perspectiva dos estudos históricos no campo do Currículo, que possibilita sua compreensão como construção social (GOODSON, 1997). A história do currículo permite uma compreensão acerca dos embates que permeiam a institucionalização de certos saberes em detrimento de outros, uma vez que as disciplinas são vistas como amálgamas de subgrupos e de tradições, e que vão influenciando as mudanças curriculares (GOODSON, 2001). A análise documental permeou a construção deste trabalho, tendo como foco a análise de algumas dissertações e teses que problematizam a disciplina Metodologia do Ensino de Matemática no curso de Pedagogia. 1803 Ficha Catalográfica A METODOLOGIA DO ENSINO DE MATEMÁTICA NO CURSO DE PEDAGOGIA: O QUE AS PESQUISAS VEM APONTANDO NOS ÚLTIMOS DEZ ANOS? Viviane Lovatti Ferreira. PUC, SP. FAPESP; Laurizete Ferragut Passos. PUC, SP. Introdução Formar o professor dos anos iniciais em nível superior é uma prática almejada desde as primeiras décadas do século XX, e que vem ocorrendo no interior dos cursos de Pedagogia nas últimas três décadas, sem estar devidamente instrumentada (TANURI, 2000). A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (9.394/96) determina que a formação de professores para atuação na educação básica deve ocorrer em cursos de licenciatura plena. As Diretrizes Curriculares Nacionais (Resolução CNE 01/2006) apontam o curso de Pedagogia como o lócus da formação inicial de professores para atuação na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental. A pesquisa sobre a temática da formação do professor que ensina matemática nos anos iniciais do ensino fundamental vem crescendo na área de Educação Matemática. A questão do desempenho dos alunos dos anos iniciais, especialmente em relação à matemática, tem sido objeto de preocupação dos sistemas de ensino, gerando debates que parecem decorrentes dos resultados apontados pelas avaliações nacionais da educação básica. O que os resultados apontam tem originado uma preocupação com a formação inicial dos licenciandos que ensinarão matemática nos anos iniciais. No curso de Pedagogia destaca-se uma disciplina cujo objetivo é fornecer ao futuro professor elementos teórico-metodológicos para o trabalho com o ensino da Matemática nos anos iniciais da educação básica. Neste artigo, faremos um estudo acerca da Metodologia do Ensino da Matemática, procurando compreender o status desta disciplina no currículo da Pedagogia em uma perspectiva histórica. No entanto, o foco deste estudo é apresentar um panorama acerca de algumas pesquisas produzidas no âmbito educacional, especialmente aquelas do campo da educação matemática, que possuem alguma relação com a Metodologia do Ensino de Matemática no curso de Pedagogia. Neste artigo, trabalhamos na perspectiva dos estudos históricos no campo do Currículo, que possibilita sua compreensão como construção social (GOODSON, 1997). A história do currículo permite uma compreensão acerca dos embates que permeiam a institucionalização de certos saberes em detrimento de outros, uma vez que as disciplinas são vistas como amálgamas de subgrupos e de tradições, e que vão 1804 1 influenciando as mudanças curriculares (GOODSON, 2001). A análise documental permeou a construção deste trabalho, tendo como foco a análise de algumas dissertações e teses que problematizam a disciplina Metodologia do Ensino de Matemática no curso de Pedagogia. A Metodologia do Ensino de Matemática no curso de Pedagogia: um pouco de história Formar o professor dos anos iniciais em nível superior é uma prática almejada desde as primeiras décadas do século XX, quando os defensores do movimento da Escola Nova instituíram o curso de formação de professores primários no Instituto de Educação da Universidade de São Paulo (IEUSP) em 1934 (EVANGELISTA, 2002). Oferecido em dois anos, o curso de formação de professor primário do IEUSP contava com algumas cadeiras, dentre elas: Biologia Educacional, Psicologia Educacional, Sociologia Educacional, História e Filosofia da Educação, Higiene Escolar, Educação Comparada, além de contar com Matérias e Prática do Ensino Primário durante os dois anos de curso. Tal disciplina encarregava-se de oferecer aos futuros professores os fundamentos gerais de cada matéria do curso primário: leitura, escrita, linguagem, cálculo, geografia, história, história natural, higiene, desenho, música, moral e educação cívica (USP, 1936). O IEUSP também oferecia cursos de formação pedagógica do professor secundário e curso de administradores escolares. A experiência inovadora do IEUSP foi extinta em 1938, durante o governo estadonovista de Getúlio Vargas. Com a extinção do IEUSP, seu corpo docente foi transferido para a Seção de Educação da antiga Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL-USP). Com a organização da Faculdade Nacional de Filosofia (FNFi) em 1939, criou-se oficialmente o curso de Pedagogia como um curso de bacharelado semelhante aos demais cursos oferecidos pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. O objetivo inicial do curso de bacharelado em Pedagogia era formar especialistas para o exercício das funções técnico-administrativas. A conclusão do curso do bacharelado em Pedagogia permitia ao pedagogo a realização do curso de Didática, de apenas um ano letivo, com o qual ele poderia obter a licença ao exercício do magistério secundário, atuando nas Escolas Normais, na formação de professores para as escolas primárias (SILVA, 2003; BRZEZINSKI, 2010; CRUZ, 2011). Com mais de setenta anos de existência, o curso de Pedagogia sofreu algumas reformulações curriculares, fato que atingiu a identidade profissional do pedagogo, conforme apontam os estudos acerca da história deste curso (SILVA, 2003; BRZEZINSKI, 2010; CRUZ, 2011). Deste modo, a metodologia de ensino percorreu o 1805 2 currículo de Pedagogia desde a criação deste curso (FERREIRA e PASSOS, 2013), apresentando-se, inicialmente, no curso de Didática, especificamente na disciplina de Didática Especial, por meio de alguns elementos teórico-metodológicos, auxiliando o futuro professor da Escola Normal a trabalhar com seus alunos. Depois, nos anos 1970, a Metodologia do Ensino de 1º Grau, disciplina oferecida na habilitação Magistério das Disciplinas Pedagógicas da Escola Normal, aglomerava as diferentes metodologias de ensino dos anos iniciais em uma única disciplina, sendo alvo de críticas, pois apresentava uma instrumentação pedagógica insuficiente de conteúdos de 1ª a 4ª séries, um aligeiramento de conteúdos bem como desarticulação com o restante do curso, além de contar com professores com pouca formação específica (GATTI, 1996). Em consequência da oferta de diferentes habilitações no currículo do curso de Pedagogia (Parecer 252/69), a fragmentação do trabalho pedagógico gerou inúmeras críticas a partir dos anos 1970, pois tal fragmentação amparava-se em uma tendência reducionista e tecnicista de escola. A defesa de uma base comum nacional para o curso de Pedagogia incorporou novas habilitações aos currículos, voltando-se, essencialmente, ao campo da docência, tais como anos iniciais do ensino fundamental, educação infantil, educação de jovens e adultos, e educação especial, conforme apontam os estudos de CHAMLIAN (1996), TANURI (2000), XAVIER (2009), CRUZ (2011). A criação destas novas habilitações (...) motivou um esforço para ampliação das disciplinas de instrumentação, diversificando-as de modo a cobrir os diversos componentes curriculares dos anos iniciais da escolaridade: metodologia do ensino da matemática, dos estudos sociais, da alfabetização, das artes (TANURI, 2000, p. 84). A oferta de disciplinas de instrumentação nos cursos de Pedagogia gerou, por sua vez, uma demanda por parte dos professores envolvidos – especialistas nas diferentes áreas – que passaram a trabalhar pela construção de um corpus teórico-metodológico que oferecesse sustentação a esses diferentes campos disciplinares. Situação atual das metodologias específicas: levantamento dos currículos de Pedagogia A educação no país vem passando por avaliações em larga escala, compreendendo desde o ensino fundamental à pós-graduação. Para BONAMINO (2012, p. 131), “vivemos tempos de avaliação”. A partir dos anos 1990, houve um crescimento bem como uma adesão às diferentes avaliações – PISA, SAEB, Prova Brasil, Provinha Brasil, ENEM, Exame Nacional de Cursos (Provão), ENADE, entre outros – preocupando e despertando o país para a aplicação de algumas políticas públicas, tendo em vista os resultados 1806 3 obtidos abaixo da média. Grande parte dos professores vem assumindo a docência sem o domínio de habilidades e conhecimentos necessários ao ensino-aprendizagem. A preocupação acerca da formação inicial de professores deve-se, exclusivamente, a esses “resultados preocupantes advindos do desempenho obtido pelos estudantes do ensino fundamental e médio nas avaliações nacionais e internacionais sobre qualidade do ensino básico no Brasil” (GATTI e NUNES, 2009, p. 9), gerando, portanto, um intenso debate sobre os elementos envolvidos na melhoria desta qualidade do ensino. Neste caso, a formação de professores vem sendo apontada como um dos principais fatores desses resultados. Para pesquisar a atual situação dos cursos presenciais de licenciatura em Pedagogia, GATTI e NUNES (2009) fizeram um mapeamento acerca das propostas curriculares deste curso em todo o país. Em 2006 havia 1.562 cursos presenciais de Pedagogia em todo o país, com, aproximadamente, 280 mil alunos matriculados. Deste total, 38% das matrículas estavam concentradas em instituições públicas e 62% em instituições privadas. Foram listadas 3.513 disciplinas nas grades curriculares dos 71 cursos analisados, distribuídas em três grandes núcleos: estudos básicos, aprofundamentos e diversificação de estudos, e estudos integradores. De acordo com as autoras, “a variedade de nomenclatura de disciplinas encontradas em cada curso e entre os cursos de Pedagogia é muito grande, o que sinaliza que o projeto de cada instituição procura sua vocação em diferentes aspectos do conhecimento, com enfoque próprio, o que se reflete na denominação das disciplinas” (GATTI e NUNES, 2009, p. 21). As disciplinas de instrumentação compõem o núcleo de conhecimentos relativos à formação profissional específica. As autoras ressaltam suas ementas: (...) registram preocupação com as justificativas sobre o porquê ensinar, o que, de certa forma contribuiria para evitar que essas matérias se transformassem em meros receituários. Entretanto, só de forma muito incipiente registram o quê e como ensinar. Um grande número de ementas registra frases genéricas não permitindo identificar conteúdos específicos. Há instituições que propõem o estudo dos conteúdos de ensino associados às metodologias mas, ainda assim, de forma panorâmica e pouco aprofundada. Então, mesmo nesse conjunto de 28% de disciplinas que podem ser classificadas como voltadas à formação profissional específica, o que sugerem as ementas é que esta é feita de forma ainda muito insuficiente (GATTI e NUNES, 2009, p. 22). Quanto à nomenclatura das disciplinas relacionadas às metodologias de ensino, há uma variação enorme: “conteúdo e metodologia”, “metodologia do ensino de”, “fundamentos e metodologia de”, “saberes e metodologia de”, “teoria e metodologia de”, “didática e metodologia de”, “fundamentos teórico-metodológicos do ensino de”, e “metodologia e prática de ensino de”. A variedade de nomes para as disciplinas metodológicas pressupõe que elas enfatizam o “embasamento teórico das práticas, como 1807 4 é o caso de fundamentos e teorias associados às metodologias. As ementas registram preocupação com teorias de ensino e com justificativas sobre por que ensinar, mas só de forma muito incipiente registram o quê e como ensinar” (GATTI e NUNES, 2009, p. 38). Além da generalidade nas ementas de metodologias de ensino, GATTI e NUNES (2009) também afirmam que não houve disciplina destinada aos “conteúdos substantivos” que os professores de cada área terão de lecionar nos anos iniciais: Dentre as universidades públicas analisadas, nenhuma destina disciplina para os conteúdos substantivos de cada área, nem mesmo para Língua Portuguesa e Matemática. Tais conteúdos permanecem implícitos nas disciplinas relativas às metodologias de ensino, ou na concepção de que eles são de domínio dos alunos dos cursos de formação (GATTI e NUNES, 2009, p. 33). LIBÂNEO (2010) também fez um recorte sobre os currículos de 25 instituições de ensino que ofereciam os cursos de Pedagogia no estado de Goiás, e constatou que as disciplinas de metodologias de ensino ofereciam uma diversidade de nomenclaturas e cargas horárias. Para o autor: “as ementas, em sua maioria, apresentam os elementos metodológicos da Matemática, às vezes com alguma menção à epistemologia da disciplina, mas raramente em articulação com o conteúdo específico” (LIBÂNEO, 2010, p. 570). Quanto aos conteúdos específicos do currículo do ensino fundamental, LIBÂNEO (2010, p. 578) constatou que “estão praticamente ausentes”, evidenciando grave lacuna na formação do professor. Para o autor, há um descompasso entre a formação dos professores dos anos iniciais e a formação dos professores dos anos finais do ensino fundamental: Vive-se no Brasil, no âmbito da formação de docentes, um estranho paradoxo: professores dos anos iniciais do ensino fundamental, que precisam dominar conhecimentos e metodologias de conteúdo muito diferentes, como Português, Matemática, História, Geografia, Ciências e, às vezes, Artes e Educação Física, não recebem esses conteúdos específicos em sua formação, enquanto que os professores dos anos finais, preparados em licenciaturas específicas, passam quatro anos estudando uma só disciplina, aquela em que serão titulados (LIBÂNEO, 2010, p. 580-581). Considerando que a formação inicial do aluno – oferecida nos anos iniciais do ensino fundamental – precisa ser adequada tanto para dar conta da introdução dos mesmos aos diferentes campos do saber, quanto para a natural continuidade dos estudos na sequencia do ensino escolar. Sendo assim, torna-se necessário que a formação do professor dos anos iniciais seja mais específica no que se refere aos conteúdos ministrados. Se durante muitos anos o simples conhecimento dos conteúdos serviu de base para a crítica à formação tecnicista e, eventualmente, acrítica dos professores dos anos iniciais, em particular a partir da década de 1980, a primeira 1808 5 década do século XXI vem constituindo o que se poderia caracterizar como uma reflexão crítica em direção oposta. Deste modo, a reflexão de FIORENTINI (2008) nos ajuda a compreender o quadro atual em que se encontra o ensino da Matemática na formação inicial dos professores dos anos iniciais do ensino fundamental: A reduzida carga didática que os cursos de Pedagogia e Licenciatura para as séries iniciais do Ensino Fundamental têm destinado à formação conceitual e didático-pedagógica da matemática tem sido um problema crônico e que não foi contemplado pelas atuais Diretrizes Curriculares. Além da falta de um domínio conceitual da matemática, os alunos-docentes que ingressam nesses cursos de formação docente trazem crenças e atitudes geralmente negativas e pré-conceituosas em relação à matemática e seu ensino FIORENTINI (2008, p. 56-57). Dessa forma, o paradoxo apontado por LIBÂNEO (2010) não resultaria apenas em falta de conhecimento específico por parte do professor dos anos iniciais. Um resultado particularmente problemático, no que se refere ao ensino de Matemática, é a construção e eventual manutenção, para os alunos desses professores, de estigmas em relação à Matemática, considerada, então, como disciplina que apresenta grandes dificuldades e destinada a poucos alunos. Tal problema traria efeitos multiplicadores, como aponta FIORENTINI (2008, p. 57): “O não enfrentamento ou tratamento desse problema, durante a formação inicial, tem sérias implicações na prática docente desses alunos e alunas”. Retomando GATTI e NUNES (2009), entendemos que há uma ênfase na preocupação com as teorias de ensino, com ementas que procuram justificar o “por que” ensinar, com pouco ou nenhum cuidado com “o quê” e “como” ensinar. Essa consideração parece estar presente também nos estudos acadêmicos consultados para esse trabalho, que trazemos a seguir. A Matemática da formação do professor dos anos iniciais: o que dizem as dissertações e teses? O desenvolvimento da pós-graduação no Brasil, especialmente nos últimos trinta anos, implicou na ampliação da produção de pesquisa em diversas áreas de conhecimento. No campo educacional, muita pesquisa vem sendo produzida acerca da formação inicial e continuada de professores que trabalham na educação básica. Nos últimos dez anos, houve um crescimento considerável de estudos voltados para a formação de professores que ensinam Matemática nos anos iniciais do ensino fundamental. No que se refere à formação matemática fornecida no curso de Pedagogia, alguns trabalhos vêm sendo desenvolvidos no intuito de se apresentar que Matemática vem sendo estudada e/ou indicada nesse curso, além de compreender aspectos 1809 6 relacionados a este ensino, tais como crenças, concepções e atitudes de alunos de Pedagogia. Estudos realizados acerca da Metodologia do Ensino de Matemática apontam que esta disciplina vem se apresentando com uma carga horária reduzida e insuficiente para uma abordagem significativa de conteúdos, fundamentos e métodos, indicando, possivelmente, lacunas na formação do professor (CURI, 2004; CAZORLA e SANTANA, 2005; BARBOSA, 2009; BATISTA, 2009; SANTOS, 2009; LIBÂNEO, 2010; LACERDA, 2011; ORTEGA, 2011). Ao apresentar uma história bem como o quadro atual dos cursos de formação de professores polivalentes, CURI (2004) analisa a trajetória histórica do curso normal, do curso de habilitação ao magistério e do curso de Pedagogia. CURI (2004) analisa como vem sendo contemplados os conhecimentos de conteúdos, os conhecimentos didáticos e os conhecimentos sobre o currículo, no que se refere à formação em Matemática. Dentre as grades curriculares dos cursos de Pedagogia que analisou, a presença da disciplina Metodologia do Ensino de Matemática foi predominante nos currículos, aparecendo em 66% dos casos, e a disciplina Conteúdos e Metodologia do Ensino de Matemática apareceu em 25% das grades. Para CURI (2004, p. 67), “90% dos cursos de Pedagogia elegem as questões metodológicas como essenciais à formação de professores polivalentes”. Pouquíssimas grades curriculares apresentavam as disciplinas Estatística Aplicada à Educação e Matemática Básica. Com o objetivo de analisar as características, os fundamentos e as tendências da formação matemática dos cursos de Pedagogia no estado de São Paulo, BATISTA (2009) fez o levantamento do número de instituições que abrigavam o curso de Pedagogia bem como o levantamento das disciplinas relacionadas à formação matemática nas grades curriculares das dez instituições analisadas. De acordo com o autor, até 2009 os cursos de Pedagogia das instituições privadas correspondiam a 94% do total de cursos oferecidos. BATISTA (2009) também encontrou uma variedade de nomenclaturas para as disciplinas: Metodologia do Ensino de Matemática (I e II); Estatística, Estatística Aplicada à Educação; Fundamentos do Ensino da Matemática; Escola e Cultura Matemática; Matemática, Conteúdos e seu Ensino; Metodologia do Ensino Fundamental nos Anos Iniciais; Noções matemáticas e estudo do ambiente na educação infantil; Metodologia de Matemática nos anos iniciais do ensino fundamental; Prática de Ensino e Metodologia do ensino da matemática e ciências. Dentre as disciplinas de formação matemática encontradas nas grades curriculares, constatou-se que a carga horária indicada era insuficiente para um trabalho satisfatório dos conteúdos e da metodologia necessários à formação inicial do professor dos anos iniciais. 1810 7 O trabalho de BARBOSA (2009) teve como objetivo analisar a atual formação matemática que vem sendo fornecida aos futuros professores dos anos iniciais do ensino fundamental. Inicialmente, a autora fez uma análise reflexiva acerca da constituição histórica dos cursos que formaram professores dos anos iniciais, dentre eles a Escola Normal e o curso de habilitação ao magistério. A autora também retratou as dificuldades que os professores vem encontrando na docência, além de abordar a defasagem desses professores em relação aos conteúdos matemáticos. O diferencial de seu estudo foi a análise comparativa entre as grades curriculares dos cursos de formação de professores dos anos iniciais de instituições brasileiras e portuguesas. A autora analisou os currículos de três instituições portuguesas. Citando como exemplo o currículo proposto pela Universidade do Minho, a autora constatou a presença de sete disciplinas relacionadas à formação matemática: Elementos de Matemática I, Elementos de Matemática II, Geometria e Medida, Números e Probabilidades, Geometria e Padrões, Didática da Matemática Elementar e Monografia em Matemática Elementar. As demais instituições portuguesas também apresentavam uma carga horária significativa para os conteúdos matemáticos. De acordo com os estudos da autora, a carga horária destinada à formação matemática do professor em instituições brasileiras é muito reduzida se comparada à formação obtida em instituições portuguesas, em que a carga horária destinada à formação matemática chega a ser 16 vezes maior que no Brasil. Desta forma, BARBOSA (2009, p. 73) constatou que “o curso pretende oferecer ao futuro professor conhecimentos matemáticos que vão além do que ele deveria ensinar aos seus alunos”. A pesquisa de SANTOS (2009) constitui-se em um estudo de caso. A autora buscou verificar se os conhecimentos acerca dos números naturais dos alunos do curso de Pedagogia, adquiridos durante a realização do curso de Pedagogia, ampliaram seus saberes matemáticos e deram um novo significado às práticas docentes. acerca do desenvolvimento do conteúdo números naturais em cursos de licenciatura em Pedagogia. Inicialmente, a autora faz uma contextualização histórica do curso de Pedagogia. A análise apontou que os alunos do curso de Pedagogia não ressignificaram suas práticas pedagógicas a partir dos estudos universitários na disciplina de Matemática. O estudo também apontou a vontade dos alunos de aprender como ensinar Matemática e ter atividades práticas no curso. O estudo de BAUMANN (2009) procurou investigar como se apresentam os projetos de formação de professores que lecionam Matemática nos anos iniciais do ensino fundamental, tendo como foco os cursos de licenciatura em Pedagogia e Matemática da Universidade Federal de Goiás, bem como a legislação que regulamentou estes cursos e seus projetos político-pedagógicos. A motivação para este estudo é que nas escolas municipais de Goiânia (GO), os licenciados em Matemática vêm ganhando espaço no 1811 8 trabalho com os anos iniciais do ensino fundamental. Em suma, BAUMANN (2009) conclui que os cursos de licenciatura em Pedagogia e em Matemática da Universidade Federal de Goiás, expõem em suas intenções a contemplação da formação do professor de Matemática dos anos iniciais. No entanto, a análise crítica, analítica e reflexiva dos projetos pedagógicos de ambos os cursos revelam que essa formação não é trabalhada. Para BAUMANN (2009, p. 230), “o professor formador está mais preocupado em desenvolver suas pesquisas do que com o ensino, em especial com o Ensino Básico, pois, em geral, não trazem para a discussão, aspectos de interesse para a atuação do professor em formação na Educação Básica”. A pesquisa de LACERDA (2011) centrou-se no curso de Pedagogia da PUC/SP, analisando seu projeto pedagógico, seu currículo, os programas das disciplinas relacionadas à formação matemática e os depoimentos de professores relacionados ao trabalho com estas disciplinas. Ao abordar as disciplinas de conteúdos matemáticos, a autora observa que “esses conhecimentos são de domínio do aluno e o trabalho proposto é de estudo de questões relacionadas à metodologia, currículo e novas perspectivas na área de ensino de Matemática” (LACERDA, 2011, p. 131), residindo aí as dificuldades evidenciadas pelas professoras entrevistadas. A análise das ementas das disciplinas relacionadas à formação matemática evidencia a intenção de uma proposta dos estudos de conteúdo de ensino de maneira integrada. Com o objetivo de conhecer o perfil do aluno concluinte do curso de Pedagogia e investigar o processo de construção de saberes desses alunos em relação à Matemática durante sua formação inicial, ORTEGA (2011) acompanhou um grupo de alunos de Pedagogia durante os quatro anos de realização do curso. A autora concluiu que os saberes desses futuros professores dos anos iniciais vão sendo ressignificados por meio da influência das diferentes disciplinas que vão sendo estudadas ao longo do curso. As mudanças mais significativas foram em relação ao receio e à visão distorcida que os estudantes tinham em relação ao conhecimento matemático no início do curso. Ao final do curso de Pedagogia, os sujeitos modificaram sua relação com o conhecimento matemático. Considerações finais: A literatura vem apontando que os saberes docentes necessários ao exercício profissional dos professores são variados (SHULMAN, 1986; TARDIF, 2002). Entretanto, na análise histórica do curso de Pedagogia, observa-se um movimento de oposição a um tecnicismo que teria marcado o campo educacional nos anos 1970. Conforme aponta FIORENTINI (2008), em muitos casos as propostas de reformas curriculares assemelham-se a “projetos emergenciais”, que acabam se constituindo em práticas 1812 9 culturais permanentes. Os cursos de Pedagogia no Brasil passaram a oferecer apenas uma disciplina voltada para a instrumentação pedagógica voltada ao ensino da Matemática. Como consequência, (...) os concluintes desses cursos de formação docente não dominam sequer os conceitos e operações elementares relativos ao sistema de numeração decimal. Deixar para a formação continuada a solução desse problema é no mínimo uma irresponsabilidade das instituições formadoras e das políticas públicas (FIORENTINI, 2008, p. 57). GATTI e NUNES (2009) constatam que existe um vácuo no que se refere às disciplinas destinadas aos conteúdos que os professores dos anos iniciais deverão ensinar, apontando uma insuficiência na formação desses professores. Não parece ser adequada a justificativa de que os conteúdos seriam de domínio dos futuros professores. No caso do curso de Pedagogia, concluímos que há disputas históricas entre grupos que defendem o curso como ciência da educação, e grupos que defendem a docência como base da formação. Para GOODSON (1997, 2001), a construção social do currículo implica em um terreno de grande contestação, fragmentação e mudança, onde há interesses desses grupos. Deste modo, ampliar a carga horária de disciplinas de instrumentação pedagógica implicaria na retirada ou diminuição de disciplinas de outros campos. 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