O PAGAMENTO DE
ROYALTIES A
MUNICÍPIOS AFETADOS
POR CITY GATES
PAULO CÉSAR RIBEIRO LIMA
MAIO/2009
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Paulo César Ribeiro Lima
SUMÁRIO
1. Introdução
2. Legislação
3. Antes e depois da criação da ANP
4. Conclusões
O pagamento de royalties a Municípios afetados por city gates
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Paulo César Ribeiro Lima
1. Introdução
Esta Nota Técnica trata do não enquadramento de city
gates, por parte da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis
(ANP), como instalações de embarque e desembarque de gás natural para fins de
pagamento de royalties. City gates são instalações de transferência de custódia
do gás natural para uma concessionária estadual distribuidora.
2. Legislação
O art. 48 da Lei nº 9.478, de 6 de agosto, dispõe que a
parcela do valor do royalty, previsto no contrato de concessão, que representa 5%
da produção, correspondente ao montante mínimo referido no § 1º do art. 47,
deve ser distribuída segundo os critérios estipulados pela Lei nº 7.990, de 28 de
dezembro de 1989.
O art. 7º da Lei nº 7.990/1989 dispôs que o art. 27 e seus §§
4º e 6º, da Lei nº 2.004, de 3 de outubro de 1953, alterada pelas Leis nos 3.257, de
2 de setembro de 1957, 7.453, de 27 de dezembro de 1985, e 7.525, de 22 de
julho de 1986, tivesse a seguinte redação:
"Art. 27. A sociedade e suas subsidiárias ficam obrigadas a pagar a
compensação financeira aos Estados, Distrito Federal e Municípios,
correspondente a 5% (cinco por cento) sobre o valor do óleo bruto, do xisto
betuminoso e do gás extraído de seus respectivos territórios, onde se fixar a lavra
do petróleo ou se localizarem instalações marítimas ou terrestres de embarque ou
desembarque de óleo bruto ou de gás natural, operados pela Petróleo Brasileiro
S.A. - PETROBRÁS, obedecidos os seguintes critérios:
I - 70% (setenta por cento) aos Estados produtores;
II - 20% (vinte por cento) aos Municípios produtores;
III - 10% (dez por cento) aos Municípios onde se localizarem instalações
marítimas ou terrestres de embarque ou desembarque de óleo bruto e/ou gás
natural.
...................................................................
§ 4º É também devida a compensação financeira aos Estados, Distrito
Federal e Municípios confrontantes, quando o óleo, o xisto betuminoso e o gás
forem extraídos da plataforma continental nos mesmos 5% (cinco por cento)
fixados no caput deste artigo, sendo 1,5% (um e meio por cento) aos Estados e
Distrito Federal e 0,5% (meio por cento) aos Municípios onde se localizarem
instalações marítimas ou terrestres de embarque ou desembarque; 1,5% (um e
meio por cento) aos Municípios produtores e suas respectivas áreas geoeconômicas;
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1% (um por cento) ao Ministério da Marinha, para atender aos encargos de
fiscalização e proteção das atividades econômicas das referidas áreas de 0,5%
(meio por cento) para constituir um fundo especial a ser distribuído entre os
Estados, Territórios e Municípios.
....................................................................
§ 6º Os Estados, Territórios e Municípios centrais, em cujos lagos, rios,
ilhas fluviais e lacustres se fizer a exploração de petróleo, xisto betuminoso ou gás,
farão jus à compensação financeira prevista no caput deste artigo."
Observa-se, então, que, antes da promulgação da Lei nº
9.478/1997, a Petrobrás já pagava, a título de royalties, 0,5% do valor da
produção aos Municípios onde se localizassem instalações marítimas ou
terrestres de embarque ou desembarque de óleo bruto ou gás natural, tanto no
caso da produção em terra como na plataforma continental.
Esse pagamento, conforme estabelecido pela Lei nº
7.990/1989, foi regulamentado pelo Decreto nº 1, de 7 de fevereiro de 1991.
Transcreve-se, a seguir, o art. 19 desse Decreto, que, em seu parágrafo único,
estabelece uma definição para instalações de embarque e desembarque:
“Art. 19. A compensação financeira aos Municípios onde se localizarem
instalações marítimas ou terrestres de embarque ou desembarque de óleo bruto ou
gás natural será devida na forma do disposto no art 27, inciso III e § 4º da Lei
nº 2.004, de 3 de outubro de 1953, na redação dada pelo art. 7º da Lei nº
7.990, de 28 de dezembro de 1989.
Parágrafo único. Para os efeitos deste artigo, consideram-se como
instalações marítimas ou terrestres de embarque ou desembarque de óleo bruto ou
gás natural, as monobóias, os quadros de bóias múltiplas, os píeres de atracação,
os cais acostáveis e as estações terrestres coletoras de campos produtores e de
transferência de óleo bruto ou gás natural.”
Já o pagamento da parcela do valor do royalty que excede
5% e pode ir até 10% da produção tem como base legal o art. 49 da Lei nº 9.478.
De acordo com o inciso I desse artigo, 7,5% sobre a parcela do valor dos royalties
que exceder a 5% da produção de petróleo ou gás natural de cada campo é
destinado aos Municípios que sejam afetados pelas operações de embarque e
desembarque de petróleo e gás natural, na forma e critério estabelecidos pela
ANP, tanto quando a lavra ocorrer em terra ou em lagos, rios, ilhas fluviais e
lacustres quanto na plataforma continental.
Em razão desse mandamento legal, foi editada a Portaria
ANP nº 29, de 22 de fevereiro de 2001, que estabelece os critérios a serem
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adotados a partir de 1º de janeiro de 2002, para fins de distribuição dessa parcela.
Transcreve-se o art. 2º dessa Portaria:
“Art. 2º. O percentual de 7,5% (sete e meio por cento) previsto no artigo
anterior será distribuído a cada Município onde se localizar a instalação de
embarque e desembarque de petróleo ou gás natural, juntamente com os
Municípios pertencentes à zona de influência da instalação, na razão direta dos
volumes de petróleo e gás natural, expressos em volume de petróleo equivalente,
movimentados na respectiva instalação.
§ 1º. A distribuição a cada Município onde se localizar a instalação de
embarque e desembarque de petróleo ou gás natural, juntamente com os
Municípios pertencentes à zona de influência da instalação, será efetuada da
seguinte forma:
I - 40% (quarenta por cento) ao Município onde se localizar a instalação
de embarque e desembarque de petróleo ou gás natural.
II - 60% (sessenta por cento) aos Municípios pertencentes à zona de
influência da instalação.
§ 2º. Para os efeitos deste artigo, consideram-se instalações de embarque e
desembarque de petróleo ou de gás natural as estações terrestres coletoras de
campos produtores e de transferência de petróleo ou gás natural, as monobóias, os
quadros de bóias múltiplas, os quadros de âncoras, os píeres de atracação e os cais
acostáveis destinados ao embarque e desembarque de petróleo ou gás natural.
§ 3º. As instalações referidas no parágrafo anterior deverão fazer parte de
uma área de concessão contratada com a ANP ou deverão estar autorizadas pela
ANP nos termos dos arts. 56 e 57 da Lei nº 9.478, de 06 de agosto de 1997.
§ 4º. Para efeitos deste artigo pertencem à zona de influência de uma
instalação de embarque e desembarque de petróleo ou de gás natural:
I - os Municípios litorâneos que apresentarem limites geográficos pela linha
de costa com os Municípios onde se localizarem monobóias, quadros de bóias
múltiplas, quadros de âncoras, píeres de atracação e cais acostáveis destinados ao
embarque e desembarque de petróleo ou gás natural ou cuja linha de costa situe-se
num raio circundante de 10 km (dez quilômetros) das referidas instalações,
excluídos os Municípios onde se localizarem tais instalações;
II - os Municípios localizados às margens de lagos ou de baías onde se
localizarem monobóias, quadros de bóias múltiplas, quadros de âncoras, píeres de
atracação e cais acostáveis destinados ao embarque e desembarque de petróleo ou
gás natural, excluídos os Municípios onde se localizarem as referidas instalações;
III - os Municípios atravessados por rios ou localizados às margens de rios
onde se localizarem monobóias, quadros de bóias múltiplas, quadros de âncoras,
píeres de atracação e cais acostáveis destinados ao embarque e desembarque de
petróleo ou gás natural e situados a jusante das referidas instalações, excluídos os
Municípios onde se localizarem tais instalações.
§ 5º. Na hipótese de não se configurar nenhum Município pertencente à
zona de influência de uma instalação de embarque e desembarque de petróleo ou
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de gás natural, será distribuído ao Município onde se localizar tal instalação o
montante correspondente aos 60% (sessenta por cento) de que trata o inciso II do
§ 1º deste artigo.”
O parágrafo 2º do art. 2º da Portaria ANP nº 29/2001 repete,
a definição dada a instalações de embarque e desembarque de petróleo ou de
gás natural nos mesmos termos do Decreto nº 1/1991: “... consideram-se
instalações de embarque e desembarque de petróleo ou de gás natural as
estações terrestres coletoras de campos produtores e de transferência de
petróleo ou gás natural, as monobóias, os quadros de bóias múltiplas, os quadros
de âncoras, os píeres de atracação e os cais acostáveis destinados ao embarque
e desembarque de petróleo ou gás natural.”
Observa-se, então, que os royalties foram divididos em duas
parcelas:
-
a parcela de 5%, que é distribuída conforme estabelecido na Lei nº 7.990/1989
e regulamentado pelo Decreto nº 1/1991; e
-
a parcela excedente a 5%, que é distribuída conforme estabelecido na Lei nº
9.478/1997 e regulamentado pela Portaria ANP nº 29/2001.
Ressalte-se que há um pequena diferença conceitual entre
essas Leis. A Lei nº 7.990/1989, que diz respeito à parcela de 5%, destina 10%
dos royalties apenas a “Municípios onde se localizarem instalações marítimas ou
terrestres de embarque ou desembarque”.
Já a Lei nº 9.478/1997, no que diz repeito à parcela
excedente a 5%, destina 7,5% dos royalties aos “Municípios que sejam afetados
pelas operações de embarque e desembarque de petróleo e gás natural, na forma
e critério estabelecidos pela ANP”. Nesse caso, a Portaria nº 29/2001 destina 40%
ao Município onde se localizar a instalação de embarque e desembarque de
petróleo ou gás natural e 60% aos Municípios pertencentes à zona de influência
da instalação.
3. Antes e depois da criação da ANP
Antes da criação da ANP, a Petrobrás destinava parcela dos
royalties a Municípios onde se localizavam city gates. Como a expressão
“estações terrestres coletoras de campos produtores e de transferência de óleo
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bruto ou gás natural”, disposta no § único do art. 19 do Decreto nº 1/1991, permite
dupla interpretação, muito provavelmente a Petrobrás enquadrava city gate como
uma instalação de transferência de gás natural. Se esse gás natural fosse
totalmente ou parcialmente produzido no Brasil, o Município onde estivesse
localizado o city gate faria jus ao recebimento de royalties.
Depois da criação da ANP, por meio do §2º do art. 2º da
Portaria ANP nº 29/2001, estabeleceu-se a mesma definição para instalações de
embarque e desembarque de petróleo ou de gás natural dada pelo Decreto nº
1/1991. No entanto, a ANP deu uma interpretação mais restritiva que a Petrobrás
a essa definição.
A ANP expressou sua visão sobre essas instalações na
Nota Técnica SPG/ANP Nº 01, de fevereiro de 2001, cujo título é “Conceito das
Instalações Marítimas e Terrestres de Embarque ou Desembarque de Petróleo ou
de Gás Natural para Efeito de Distribuição de Royalties”.
Segundo essa Nota Técnica, o legislador restringiu a 5 os
tipos das instalações de embarque ou desembarque de óleo bruto ou de gás
natural:
1. as monobóias;
2. os quadros de bóias múltiplas;
3. os píeres de atracação;
4. os cais acostáveis e
5. as estações terrestres coletoras de campos produtores e de transferência de
óleo bruto ou gás natural.
A Petrobrás, muito provavelmente, deu outra interpretação
ao item 5 acima, desmenbrando-o da seguinte forma:
5. as estações terrestres coletoras de campos produtores;
6. as estações terrestres de transferência de óleo bruto ou gás natural.
Esse possível desmembramento feito pela Petrobrás,
quando da interpretação do Decreto nº 1/1991, é bastante racional e democrático,
pois permite que os royalties sejam distribuídos entre um maior número de
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Municípios, reduzindo, ainda que minimamente, a grande concentração hoje
existente.
Registre-se que, em apresentação feita em Audiência
Pública na Câmara dos Deputados no dia 2 de dezembro de 2008, intitulada
“Fundamentos para o NÃO enquadramento de Ponto de Entrega e Gasoduto
como Instalações de Embarque e Desembarque de Gás Natural para fins de
pagamento de Royalties aos Municípios”, a ANP defendeu que em ponto de
entrega (city gate) não se transfere gás natural nem se transita gás natural.
Ressalte-se, no entanto, que a própria ANP, no capítulo 14
(Glossário de Termos Técnicos), página 150, do documento “Guia dos Royalties
do Petróleo e do Gás Natural”, apresenta diferente definição para ponto de
entrega ou city gate:
“City gate ou Estação de Entrega e Recebimento de Gás
Natural ou Estação de Transferência de Custódia de Gás
Natural: conjunto de instalações contendo manifolds e
sistema de medição, destinado a entregar o gás natural
oriundo de uma concessão, de uma unidade de
processamento de gás natural, de um sistema de transporte
ou de um sistema de transferência, para a concessionária
estadual distribuidora de gás canalizado.”
Observa-se, então, que a apresentação feita pela ANP, ao
alegar que em city gate não se transfere e não se transita gás natural, entra em
contradição com a definição estabelecida em documento da própria Agência. De
fato, é completamente descabida a alegação da ANP, em sua apresentação na
Câmara dos Deputados, de que gás natural não transita por city gate.
Ressalte-se, ainda, que, ao contrário do defendido pela
ANP, é perfeitamente possível que city gates sejam consideradas “instalações
marítimas ou terrestres de embarque ou desembarque de óleo bruto e/ou gás
natural”, conforme previsto nas legislação.
É importante destacar, por fim, que tanto o Decreto nº
1/1991 quanto a Resolução ANP nº 29/2002 apresentam uma definição restritiva e
que permite dupla interpretação para o termo “instalações de embarque e
desembarque de petróleo e gás natural”. Assim sendo, esses instrumento
infralegais merecem reparos.
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4. Conclusões
As Leis nos 9.478/1997 e 7.990/1989 não devem permitir que
uma definição tão importante como a que diz respeito às instalações de embarque
e desembarque de petróleo e gás natural seja estabelecida por meio de
instrumentos infralegais, pois essas definições afetam diretamente a política
pública de distribuição dos royalties.
As atuais definições infralegais, dadas pelo Decreto nº
1/1991 e pela Portaria ANP nº 29/2001, não são adequadas e permitem dupla
interpretação, sendo possível, a partir da interpretação delas, tanto o pagamento
quanto o não pagamento de royalties a Municípios afetados pela instalação de
city gates.
Como a atual distribuição dos royalties apresenta uma
elevada concentração, seria mais sensato que se desse uma interpretação menos
restritiva ao conceito de instalações de embarque e desembarque de petróleo e
gás natural, de modo que essas instalações incluíssem os city gates em que
transitem gás natural produzido no País.
Sugere-se, por fim, que seja alterada a legislação vigente
com o objetivo de tornar claro o enquadramento de city gate e de outras
instalações de transferência como instalações de embarque e desembarque para
fins de pagamento de royalties, pois esse é o “espírito da lei”. Além disso, esse
enquadramento tornaria a distribuição dos royalties mais “democrática”.
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