RELATÓRIO DE EVENTO
Konrad-Adenauer-Stiftung e.V.
BRASIL
DANIEL EDLER
GUSTAVO BEZERRA
Setembro 2012
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IX Conferência de Segurança Internacional do Forte de Copacabana
SEGURANÇA E RESPONSABILIDADE EM UM MUNDO MULTIPOLAR
No dia 19 de setembro de 2012, a nona
atuação do bloco que, anteriormente, traba-
edição da Conferência de Segurança
lhava apenas na sua vizinhança mais imedi-
Internacional do Forte de Copacabana
ata, mas que se adaptou à nova realidade e
reuniu políticos, acadêmicos, militares,
passou a defender os princípios de demo-
diplomatas, intelectuais e representantes
cracia e respeito aos Direitos Humanos glo-
da sociedade civil da Europa, América
balmente.
Latina e EUA no Rio de Janeiro para debater temas relevantes sobre Segurança
A embaixadora europeia afirmou que as
Internacional.
vantagens que o bloco possui na busca pela
concretização de seus projetos advêm das
Boas-vindas
múltiplas ferramentas que empregam (militares, civis, financeiras, comerciais) e que
A mesa de abertura foi composta pela chefe
podem influenciar a realidade de uma ma-
da Delegação da União Europeia no Brasil, a
neira que a OTAN e outros atores (dadas as
embaixadora Ana Paula Zacarias, pelo pre-
suas limitações de instrumentos) não po-
sidente do Centro Brasileiro de Relações In-
dem. Ela lembrou ainda que essa estrutura
ternacionais (CEBRI), o embaixador Luiz
diplomática do bloco demorou a ser criada,
Augusto de Castro Neves e pelo Represen-
mas atualmente está operacional e é capaz
tante da Fundação Konrad Adenauer no
de coordenar atividades com outros atores
Brasil, Sr. Felix Dane.
(mesmo Estados membros da UE), principalmente de modo a evitar crises, como
Primeira a falar, a embaixadora Ana Paula
tem sido as atuações recentes para países
Zacarias afirmou que a delegação da União
como Irã e Síria.
Europeia no Brasil tem sido uma parceira no
projeto da Conferência de Segurança Inter-
A senhora Zacarias afirmou que a União Eu-
nacional do Forte de Copacabana nos últi-
ropeia tem um longo caminho no seu pro-
mos anos, pois este é uma das mais impor-
cesso de consolidação, principalmente com
tantes reuniões da América do Sul que dia-
o fortalecimento dos aspectos fiscal, eco-
loga com a Europa os temas de segurança.
nômico e político, que também são formas
Segurança e responsabilidade, lembrou a
de construir a segurança. Ela ressaltou a
embaixadora, são temas importantes que
importância dos parceiros para a atuação
estão em foco a alguns anos e que se fazem
externa da UE, e que um desses parceiros é
mais presentes quando levamos em consi-
o Brasil, com quem ela percebe que a Euro-
deração o mundo interdependente em que
pa compartilha diversos objetivos, interes-
as ameaças são globais e em que prover o
ses e valores, questões essenciais para que
acesso a vida digna é um desafio para todos
se leve adiante diálogos sobre segurança e
os países. A União Europeia (UE) tem inves-
política externa. A cooperação entre esses
tido esforços para a construção desse mun-
dois atores reforça a confiança mútua e
do melhor, principalmente após perceber a
possibilita que ela se estenda para outras
necessidade de mudança na estratégia de
áreas. Afinal, como destacou a embaixado-
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ra, ainda existem muitas possibilidades de
Gestão de Crises (CMPD) da União Europei-
cooperação.
a, Walter Stevens; pelo Subsecretário Geral
do Departamento de Operações de Paz das
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O embaixador Luiz Augusto de Castro Neves
Nações Unidas, Edmond Mulet; pelo contra-
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lembrou que se busca uma cooperação fru-
almirante e vice-ministro da Defesa da Re-
tífera para as duas regiões do planeta. Ele
pública do Peru, Mario César Sánchez De-
percebe que desde o fim da Guerra Fria o
bernardi e pelo tenente-coronel Jürgen
mundo está mais complexo nos seus temas
Menner, que representou o ministério da
e política, mas as burocracias diplomáticas
Defesa da Alemanha. A moderação coube
ainda funcionariam com os parâmetros do
ao embaixador José Botafogo Gonçalves,
período da Guerra Fria. Compreende-se que
vice-presidente emérito do CEBRI.
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foram muitos anos com esta dinâmica, mas
é surpreendente que um mundo de coope-
O diretor Walter Stevens ressaltou que o
ração e paz ainda não tenha emergido,
diálogo com os outros palestrantes traria
mesmo com mudanças significativas do ce-
importantes contribuições para as políticas
nário político internacional, como represen-
da União Europeia e vem em ótimo momen-
tado pela emergência da China. Os novos
to, no qual o bloco busca responder a ame-
desafios que surgem são imensos e têm de
aças globais e garantir os Direitos Huma-
ser resolvidos de forma multilateral com
nos. Segundo ele, é importante “multilate-
respostas globais, com o objetivo principal
ralizar” a multipolaridade: compartilhar a
de reduzir as assimetrias de poder e direi-
segurança global significar enfrentar a vio-
tos, que levem o mundo para uma realidade
lência globalmente, e por isso o bloco traba-
mais justa. O embaixador terminou sua fala
lha em parceria estreita com a ONU, com
afirmando que os palestrantes poderão con-
organizações regionais – especialmente com
tribuir com o diálogo para melhorar a coo-
a União Africana – e também com países
peração ao menos nas questões de segu-
como Turquia, Rússia e Brasil, parceiros
rança.
fundamentais no tema. Sobre a cooperação
com o Brasil, o Sr. Stevens lembrou da coo-
O representante de Fundação Konrad Ade-
peração entre as duas regiões na República
nauer no Brasil, Sr. Felix Dane, afirmou ser
Democrática do Congo e afirmou que a co-
uma honra abrir a IX Conferência de Segu-
munidade internacional aprendeu que con-
rança Internacional do Forte de Copacabana
flitos são complexos e multifacetados, o que
duas semanas após sua chegada ao Brasil,
significa dizer que nenhum ator sozinho
vindo de Ramallah. Segundo ele, a seguran-
consegue efetivamente por fim a um pro-
ça no Oriente Médio afeta a segurança de
blema desse nível, e que, para efetivamente
todo o mundo, e questões que antes eram
resolvê-lo é necessário combinar ferramen-
vistas como regionais atualmente têm con-
tas diplomáticas com ambientais e sociais:
seqüências globais. Necessitamos saber
essa seria a natureza de abordagens abran-
como podemos lidar com desafios de segu-
gentes para a solução de conflitos.
rança globais que afetam um mundo multipolar que deve ser, cada vez mais, multila-
Sobre a atuação da UE em conflitos, Walter
teral. O senhor Dane ressaltou a importân-
Stevens afirmou que é possível fazê-la a-
cia da parceria com o CEBRI e com a Dele-
primorar sua capacidade de lidar com esses
gação da UE no Brasil e expressou seu de-
desafios. A crise dos Bálcãs na década de
sejo de que dure muitos anos como institui-
1990 mostrou a necessidade de se avançar
ções incentivadoras do debate em temas de
e esse esforço foi feito de forma bastante
segurança do Brasil e da Europa. Em segui-
efetiva. Em 2012, ainda que pouco tempo
da, deu como aberta a conferência.
depois, já é possível notar a diferença de
atuação, principalmente pela entrada em
Painel de Abertura: Segurança e respon-
atividade do CMPD. Atualmente a UE conta
sabilidade em um mundo multipolar
com quinze missões civis e militares em operação, que fortalecem o Estado de direito,
O painel de abertura foi composto pelo dire-
treinam forças policiais, monitoram planos
tor do Departamento de Planejamento e
de paz, treinam Forças Armadas e comba-
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tem a pirataria, ajudando a melhorar a se-
Carta constitutiva da ONU. No entanto, sem
gurança mundial. Nenhuma das missões foi
esse tipo de cooperação não é possível res-
BRASIL
imposta, afirmou o diretor, mas senão im-
ponder aos desafios que se estabelecem. O
DANIEL EDLER
plementadas a partir de convite realizado
caso do Timor Leste foi um sucesso no qual,
GUSTAVO BEZERRA
pelas Nações Unidas. A criação do Serviço
após dez anos, as atividades da ONU come-
de Ação Externo da União Europeia (EEAS)
çam a encerrar-se.
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ajudou a consolidar o caráter de atuação
abrangente do bloco, principalmente porque
O Sr. Mulet afirmou que há programação
a prevenção funciona melhor do que o con-
futura no DPKO, com planejamento em dife-
trole de crises, e a EEAS favorece a aborda-
rentes estágios para o Sudão e o Sudão do
gem preventiva.
Sul, chamados por ele de 3S: Somália, Sahel e Síria, regiões nas quais se tem lições
O Sr. Stevens citou a percepção ampla so-
penosas do passado para tirar. O subsecre-
bre crise na atuação sobre pirataria no Nor-
tário lembrou que as ferramentas disponibi-
te da África. A situação era emblemática de
lizadas são dos anos de 1960 e de 1970,
ampla crise, tendo vista que decorreria da
mas que os desafios são muito maiores.
falta de estruturas políticas sólidas na regi-
Como melhorar a aplicabilidade e a eficiên-
ão, em especial na Somália. A operação
cia desses instrumentos? Existe, efetiva-
Atalanta, levada a cabo em 2008 em estrei-
mente, uma paz a ser mantida? A Comuni-
ta parceria com a ONU e com os EUA, obte-
dade Internacional estaria comprometida
ve grande sucesso na redução da pirataria
para resolver as crises? Estas foram algu-
na região. Neste sentido, a UE transformou-
mas das questões que o senhor Mulet fez
se em um importante provedor de seguran-
durante sua apresentação. Para ele, o Con-
ça internacional capaz de articular alianças
selho de Segurança da ONU (CS) muitas
com parceiros globais, regionais e locais pa-
vezes confere um mandato, mas os próprios
ra buscar soluções para crises atuais, e es-
países que o aprovam têm um projeto dife-
pera a oportunidade atuar em parceria com
rente daquele aprovado. Cria-se assim um
o Brasil.
dilema de enorme dificuldade para ser resolvido, realidade parecida com a do Congo.
Em seguida, o Subsecretário Geral do Departamento de Operações de Paz da ONU,
O Sr. Mulet lembrou que não existe qual-
Sr. Edmond Mulet, afirmou que a colabora-
quer tipo de regulação sobre o comércio de
ção de diferentes países e agências é es-
armamentos. Diferentemente do que ocorre
sencial, pois a ideia de parceria é central
com o comércio de café e bananas, os paí-
para a consecução de operações de manu-
ses que fabricam armas são os mesmo que
tenção de paz (OMP) que contam, atual-
pedem à ONU para reparar as violentas
mente, com 120.000 pessoas em campo,
conseqüências do seu comércio. Ele pediu
22.000 civis e um orçamento de US$ 7,5
que haja controle sobre esse comércio, e
bilhões para todas as operações. Segundo
que seja feito de maneira responsável. A
Mulet, as operações desse tipo também
ONU sozinha não tem capacidade de evitar
evoluíram e passaram a adequar-se às cri-
conflitos. Ele destacou que situações de vio-
ses contemporâneas, que tendem a ser in-
lência causam migração e refugiados, que
ternas e não mais entre Estados. Portanto,
buscam abrigo em todas as partes do mun-
assumiu-se agora também a função de mo-
do. Essa seria apenas uma dimensão das
nitorar transições políticas e a reconstrução,
conseqüências globais de conflitos locais.
a estruturação de Estado de Direito, as elei-
Seria preciso desenvolver de forma mais
ções e a governabilidade. Através dessa a-
consistente abordagens regionais para con-
tuação é possível manter a sustentabilidade
flitos, realidade para a qual UNASUL e o
da paz para fazer com que esta seja dura-
Brasil provêm bons exemplos de capacidade
doura. As OMP são apenas uma parte do
de articulação.
processo, que envolve diversas organizações e arranjos internacionais, situação que
O vice-ministro do Peru, Mario César Sán-
estabelece um duplo desafio, tendo em vis-
chez Debernardi, afirmou que o Peru está
ta que essa realidade não está prevista na
comprometido com a paz e a segurança in-
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ternacionais e que trabalha cooperativa-
internacional, no qual ainda há diversos de-
mente com a ONU na região para mantê-
safios, como o acesso a fontes energéticas,
BRASIL
las, a exemplo de sua atuação na missão de
mudanças climáticas e explosão populacio-
DANIEL EDLER
paz do Haiti (MINUSTAH). Ainda assim, ele
nal. Dessa forma, caberia às instituições in-
GUSTAVO BEZERRA
vê que existem regiões que continuam a
ternacionais articular a integração em te-
mostrar instabilidade, como a crise social
mas de defesa e segurança. A consolidação
que afeta o Oriente Médio e o impacto da
da UNASUL é ponto central desse processo,
falta de democracia em algumas regiões do
pois fortalece o diálogo regional e com ou-
mundo. O Sr. Sánchez Debernardi afirmou
tras regiões que estejam interessadas nas
que o modelo econômico em vigor atual-
ameaças globais percebidas atualmente.
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mente também prejudica, na medida em
que ajuda a espalhar a crise econômica. Pa-
Representante do Ministério da Defesa da
ra ele, o mundo inteiro estaria vivendo a
Alemanha, o tenente-coronel Jürgen Manner
realidade que os latino-americanos viveram
foi o último participante da mesa a falar. Ele
algumas décadas atrás.
analisou a reorientação das forças armadas
alemãs como forma de lidar com as mudan-
O vice-ministro considera que é preciso
ças nos desafios de segurança, questões
compreender as ameaças não tradicionais à
que devem ser discutidas de forma conjun-
paz. Na América do Sul elas estão relacio-
ta. Para ele, a política de segurança e reori-
nadas principalmente a violência decorrente
entação das forças armadas são dois lados
do tráfico de drogas, visto que na região
de uma mesma moeda. Até 1990 predomi-
quase inexistem conflitos inter-estatais. E
navam questões ligadas à Guerra Fria (GF)
por ser esta uma ameaça comum aos países
- OTAN versus Pacto de Varsóvia. Nessa po-
da região, busca-se articular por meio da
laridade, uma guerra provavelmente ocorre-
UNASUL uma solução conjunta, especial-
ria na Alemanha, o que gerava medo entre
mente porque a associação entre os cartéis
os alemães. Com o fim deste período, o
de drogas e os grupos terroristas ameaçam
mundo mudou. Os alemães não se prepa-
as bases das sociedades. O recente ciclo de
ram mais para uma guerra interplanetária,
crescimento econômico da região vem a-
mas para garantir a estabilidade no globo,
companhado da preservação da democracia,
realidade que seria impensável aos cidadãos
que favoreceu o desenvolvimento social.
alemães de vinte anos atrás. Hoje a Alema-
Todavia, a expansão econômica não signifi-
nha vive tempos de paz, rodeada por par-
ca, necessariamente, estabilidade social e o
ceiros. As forças armadas alemães devem
crescimento inclusivo. O Sr. Sánchez De-
estar preparadas para a própria defesa –
bernardi analisou a importância de parcerias
das fronteiras do país e da OTAN – mas isso
com grandes atores mundiais, como a Chi-
não pode ser definido apenas geografica-
na, a União Europeia e os EUA para ajudar a
mente. Acontecimentos em qualquer ponto
consolidar um bloco comum na América do
do planeta podem ter impacto rápido na Eu-
Sul que favoreça a governança. Contudo, as
ropa. Questões relativas ao Irã, ao Paquis-
diversidades da região impõem dificuldades.
tão e Afeganistão são exemplos de possíveis
No caso peruano, o país tem conseguido
ameaças futuras. Por isso, existe uma de-
avançar economicamente com inclusão so-
manda de reorganização da estrutura das
cial, o que comprovaria que a estratégia do
Forças Armadas, que precisam estar prepa-
presidente Ollanta Humala foi eficaz. Da
radas para diferentes cenários. Segundo o
mesma forma, busca-se essa eficácia para
Sr. Menner, é importante assumir respon-
evitar que a ameaça de terrorismo, que por
sabilidades globais e pensar nas capacida-
tanto tempo rondou o Peru, não se concre-
des de que se deve dispor, pois novos desa-
tize novamente. Outro ponto positivo é que
fios demandam novas respostas. Busca-se
a região está livre de armas nucleares e mi-
apenas a especialização em missões inter-
nas, decisão que depende da anuência dos
nacionais ou algo mais? Este é um ponto
diversos países.
estratégico que deveria ser pensado em todos os países europeus. Por exemplo, a Ho-
Os avanços regionais não podem servir de
landa acabou de renunciar aos tanques de
empecilho para que se perceba o contexto
combate.
5
A Alemanha precisa de forças armadas ca-
de estudos de defesa e política externa do
pazes de responder às exigências da UE e
American Enterprise Institute, Danielle Plet-
BRASIL
da OTAN. Portanto, que tenham ampla ga-
ka; pelo tenente-coronel Jügern Menner,
DANIEL EDLER
ma de ação: assistência em situações de
representante do Ministério da Defesa da
GUSTAVO BEZERRA
catástrofes, apoio a civis, intervenção hu-
Alemanha; e pelo coordenador da Escola de
manitária, luta contra terrorismo, operações
Ciências Sociais e História da Fundação Ge-
de estabilização, apoio a forças parceiras e
túlio Vargas de São Paulo, Oliver Stuenkel.
a defesa das próprias fronteiras. Isso signi-
A moderação ficou a cargo do Representan-
fica que devem contar com unidades profis-
te da Fundação Konrad Adenauer no Brasil,
sionais equipadas com tecnologia moderna,
Felix Dane.
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capazes de serem adaptadas a diferentes
circunstâncias e de operarem em conjunto
O Embaixador Patriota afirmou que o papel
com os aliados. Para ele, isso exigiria mu-
do Brasil no plano internacional é atuar de
dança significativa na mentalidade dos mili-
forma coerente com a sua política interna
tares. Essa transformação na realidade das
de combate à pobreza e redução das desi-
forças armadas alemães teria atraído a a-
gualdades. Para ele, a manutenção da regi-
tenção dos parceiros daquele país, que es-
ão sul-americana como área livre de armas
tariam introduzindo medidas semelhantes,
nucleares e de destruição em massa é outro
visto que uma simples adaptação da antiga
aspecto central ao projeto de política exter-
infra-estrutura não seria suficiente. É preci-
na almejado pelo Brasil. Ele ressaltou tam-
so reorientar as políticas e o papel desem-
bém a importância da ONU, embora a insti-
penhado pelas forças armadas. Não se bus-
tuição represente um formato que reflete a
caria mais o crescimento rápido, situação
realidade de poder de um mundo velho e
que tornaria o recrutamento obrigatório um
ultrapassado. Enquanto desafios, Guilherme
atraso. A busca seria por forças armadas
Patriota percebe que é necessário construir
altamente profissionais, situação em que as
um mundo com um modelo capitalista mais
forças de segurança em breve terão de
inclusivo, que consiga, eficientemente, a-
competir pelos jovens com a indústria.
branger dois bilhões de pessoas na economia mundial como consumidores.
Sobre a relação com parceiros, o tenentecoronel Menner falou da necessidade de a-
A Sra. Danielle Pletka defendeu a atuação
primorar a eficiência e a cooperação. Ele
externa dos EUA no mundo contemporâneo,
afirmou que com a reorientação das forças
e afirmou que o mundo é melhor hoje do
armadas será possível responder a desafios
que foi no passado, tendo em vista que e-
diferentes daqueles que os palestrantes an-
xistem mais democracias. Para ela, os EUA
teriores apresentaram. O impacto sobre os
ocupam espaço de liderança no cenário polí-
militares será grande, mas não haveria al-
tico internacional do mundo contemporâ-
ternativa à transformação das estruturas e
neo, isso a despeito de serem incompeten-
do papel das forças armadas.
tes no uso de softpower. Sobre a capacidade de hardpower do país, a pesquisadora
O evento contou, após o almoço, com ativi-
afirmou que o país é fraco (os modelos dos
dades simultâneas: a Conferência 1 com o
equipamentos bélicos seriam antigos e não
tema Estratégias e Ferramentas para Alcan-
mais capazes de atender a demanda con-
çar a Segurança Responsável, e o Workshop
temporânea). Os cortes previstos para o
3 sobre Potenciais Riscos Futuros para a
orçamento militar americano tendem a pio-
Segurança do Atlântico
rar o cenário e deixar o país mais fraco. Sobre a situação da OTAN, Pletka lembrou que
Conferência 1: Estratégias e ferramentas
há um compromisso entre os membros da
para alcançar a segurança responsável
aliança no sentido de contribuir com 2% do
orçamento do país para a Defesa, e segun-
A Conferência foi composta pelo embaixador
do ela, apenas os EUA e a Grécia cumprem
e assessor especial de política externa da
esse acordo. E no caso grego, o valor em
Presidência da República do Brasil, Guilher-
termos reais não é significativo, dado o im-
me de Aguiar Patriota; pela vice-presidente
pacto da crise do Euro sobre o orçamento
6
do país. Esta falta de compromisso seria um
Oliver Stuenkel, por sua vez, afirmou que a
motivo de fraqueza da instituição, que não
postura do Brasil sobre a situação da Líbia,
BRASIL
contaria com uma estrutura militar sólida
apesar de parecer confirmar a postura da
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nos países membros.
Rússia e da China, difere delas a partir do
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momento em que é feita a partir de outras
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O tenente-coronel Jügern Menner reforçou a
bases. Por exemplo, a articulação em rela-
necessidade dos países europeus aumenta-
ção à Responsabilidade de Proteger de-
rem a responsabilidade sobre as fronteiras
monstra a postura brasileira de tentar arti-
continentais, reduzindo a dependência que
cular novas bases para a atuação interna-
existe em relação aos EUA como maior po-
cional. Isso é essencial na política interna-
tência militar da ONU. A capilaridade das
cional, pois a recusa pela recusa poderia
fronteiras facilita o tráfico de armas entre os
fazer com que a realidade regredisse àquela
países. Esta situação é muito preocupante,
de meados da década de 1990, quando não
e é inconcebível que haja regimes de con-
havia a articulação da Responsabilidade de
trole sobre a exportação de bens como ba-
Proteger. Foi o imobilismo da sociedade in-
nana e café, mas que inexista qualquer tipo
ternacional que possibilitou situações como
de controle sobre o comércio de armas.
as de Ruanda e Kosovo.
O professor Oliver Stuenkel falou da Res-
A Sra. Pletka contestou a postura adotada
ponsabilidade de Proteger e os desafios que
pelo Professor Stuenkel. Para ela, a área
tal conceito traz no que tange à relação en-
cinzenta na qual o Brasil está é difícil de ser
tre os Estados soberanos. Para ele, a Ale-
definida, mesmo porque, no resultado das
manha é um caso à parte nos posiciona-
votações, pouco importaria a justificativa,
mentos dos países membros da União Euro-
dado que o resultado seria o mesmo. Ainda
peia sobre intervenções, pois é mais reti-
assim, mesmo que se considerasse essa di-
cente que os outros membros quando o as-
ferença na justificativa, como estabelecer
sunto é intervenção humanitária alhures. A
maneiras de fazer com que a posição brasi-
votação no Conselho de Segurança sobre a
leira não seja influenciada por aquela da
situação da Líbia, nesse sentido, seria em-
Rússia e da China? O mais importante para
blemática.
a analista é a premissa de que não haveria
benevolência em posicionamentos de políti-
Durante o debate, o Embaixador Patriota
ca internacional, portanto o Brasil teria inte-
afirmou que o Brasil tem contribuições para
resses em se posicionar contrário à inter-
um Conselho de Segurança da ONU refor-
venção na Líbia, embora não se saiba quais
mado, mas que essas respeitam as diferen-
são. Ela não se arrisca a identificá-los por-
ças existentes entre as capacidades milita-
que não conhece o suficiente da realidade
res dos Estados membros. Para ele, não se-
do país para fazer essa análise. Para ela, é
ria coerente cobrar que a contribuição brasi-
inconcebível ficar à espera de que a situa-
leira ocorra nos mesmos termos da contri-
ção da Síria, bem como aconteceu com a
buição dos Estados que tenham maior capa-
Líbia no ano passado, resolva-se sozinha.
cidade militar. O embaixador ressaltou que
Citando um analista da instituição à qual
o tempo político pode ser mais demorado do
está filiada, Pletka afirmou que não é possí-
que aquilo que eventualmente se deseja,
vel bater em alguma coisa se não se dispõe
mas reforçou que decisões açodadas não
de nada. Nesse sentido, a intervenção nos
favorecem a estabilidade da política interna-
dois países mediterrâneos seria um impera-
cional nem contribuem para a estruturação
tivo, um que foi conseguido (da Líbia) e ou-
de um cenário mais pacífico. Segundo o
tro que encontra muitas barreiras (da Síria).
Embaixador Patriota, o uso da força é um
instigador por definição da corrida arma-
O tenente-coronel Menner, citando o analis-
mentista e, portanto, de um cenário de
ta militar Karl Von Clausewitz, relembrou
maior instabilidade, ao invés de contribuir
que os meios militares são os últimos passí-
para a consolidação de um panorama de
veis de serem empregados em crises políti-
entendimento.
cas, e por isso a necessidade de debate acerca da sua utilização. Na sua análise, a
7
intervenção na Líbia foi um sucesso, o que
kozy. Os posicionamentos do atual presi-
mostrou ser um problema para o posicio-
dente francês, Françoise Hollande, continu-
BRASIL
namento adotado pelo governo da Alema-
am a apresentar divergências entre o go-
DANIEL EDLER
nha, que ficou com o ônus político de ter
verno francês e os projetos dos EUA. A ab-
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ficado de fora de um processo de transfor-
dicação dos EUA da aliança militar deixaria
mação bem sucedido como este.
aos franceses a responsabilidade de se tor-
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narem a consciência do mundo. De forma
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Para o professor Stuenkel não estaria tão
sarcástica, ela comentou: “os franceses?!
claro se a intervenção na Líbia fora um su-
Sério?...”
cesso ou um fracasso, mas esta seria uma
definição importante de ser feita com vistas
Perguntado sobre as dificuldades que uma
a não ficar preso em um choque de narrati-
possível reforma no Conselho de Segurança
vas sobre o que ocorreu no país mediterrâ-
da ONU poderia gerar a partir do congela-
neo. Para ele, a possibilidade da sociedade
mento do órgão, a exemplo do que ocorrera
internacional ver-se presa em tal debate
com a Liga das Nações, o embaixador Patri-
seria mais clara se a realidade política do
ota respondeu que o mundo é outro, que
mundo retornar aos moldes do imobilismo
não é possível comparar com a realidade
observado na primeira metade do século
contemporânea nem com o mundo do final
XIX.
da Segunda Guerra Mundial, muito menos
com aquele da Liga das Nações. Uma re-
Para o embaixador Patriota, um olhar em
forma do Conselho faz-se necessária, assim
retrospectiva indica que a atuação do Brasil
como a moderação no discurso político,
no Conselho de Segurança da ONU foi cor-
principalmente com a moderação de “fal-
reta, tendo em vista que a guerra civil da
cões”, seja no mundo ocidental, seja no
Líbia é alimentada por atores externos ao
mundo islâmico. Essa moderação política
país, e não propriamente um processo en-
passa pela necessidade de respeitar o Con-
dógeno, com motivações exclusivas de polí-
selho de Segurança como locus decisório,
tica interna. Ele acredita que a restauração
de não o ignorar como um espaço legítimo
democrática levada adiante na América La-
de tomada de decisão na área de segurança
tina entre as décadas de 1980 e 1990 pode
internacional. A possibilidade do Conselho
oferecer bom exemplo para a situação dos
não ser respeitado nas suas decisões políti-
países do Oriente Médio atualmente. Co-
cas abre precedentes graves que poderão
mentando sobre a responsabilidade interna-
ser utilizados futuramente por outros países
cional, o embaixador afirmou que o nosso
com interesses próprios que não tenham
processo de inserção internacional é um
seus interesses ratificados por decisões do
projeto de integração, e que isso já de-
Conselho.
monstra a importância da responsabilidade
internacional para o Brasil.
A Sra. Pletka falou sobre como as guerras
do Afeganistão e do Iraque criaram a ne-
Danielle Pletka lembrou que os EUA benefi-
cessidade de repor os equipamentos e re-
ciam-se da ordem liberal tal como ela existe
novar os estoques. Para ela, a campanha
nos dias atuais e, por isso, interessa aos
eleitoral para presidência dos EUA estava
estadunidenses arcar com os custos daí ori-
passando ao largo de debates sobre política
ginados. Independentemente do resultado
externa, situação que mudou a partir dos
das eleições presidenciais dos EUA, o país
recentes ataques às representações diplo-
continuará a fazer parte da OTAN e dos pro-
máticas dos EUA. Segundo a analista, have-
jetos ali levados a cabo. Para a analista, is-
ria grande expectativa sobre o debate entre
so é essencial para a posição estadunidense
os candidatos, que abordarão questões de
no mundo contemporâneo, pois abdicar de
política externa e internacional.
participar da OTAN seria abdicar de uma
parcela importante de poder. Os EUA absti-
Em uma análise sobre o futuro da seguran-
veram-se de participar da intervenção Líbia
ça internacional, o tenente-coronel Menner
pela forma como esta foi levada à frente
afirmou que em um futuro próximo o Irã
pelo então presidente francês, Nicolas Sar-
terá armas nucleares e que não resta muito
8
Konrad-Adenauer-Stiftung e.V.
a fazer quanto a isso. Para ele, a possibili-
para que as tropas consigam cumprir suas
dade de intervenções de Israel por meio de
missões.
BRASIL
ataques preventivos não afetaria, estrategi-
DANIEL EDLER
camente, este processo. Isso geraria o atra-
Workshop 3: Potenciais riscos futuros pa-
GUSTAVO BEZERRA
so em alguns anos do desenvolvimento final
ra a segurança no Atlântico
do artefato, ao invés do impedimento do
Setembro 2012
www.kas.de/brasil
acesso dos iranianos à bomba. Dessa for-
A mesa foi composta pela diretora da Divi-
ma, um ataque de Israel seria apenas pre-
são de Gestão de Conflito e Construção de
judicial para alcançar a paz na região. Neste
Paz do Instituto para Estudos de Segurança
sentido, ele acredita que a relação entre os
(ISS) da África do Sul, coronel Annette Lei-
EUA e Israel vai mudar, pois é insustentável
jenaar; pelo professor da Universidade Sci-
a manutenção do virtual seqüestro que e-
ences Po de Paris, Alfredo Valladão; pelo
xiste atualmente da agenda de política ex-
Contra-almirante e diretor da Escola de
terna dos EUA para o Oriente Médio, pelos
Guerra Naval da Marinha do Brasil, Cláudio
interesses de Israel.
Portugal de Viveiros; e pelo diretor de Estudos e Pesquisa do Instituto de Altos Estudos
Em sua análise sobre a situação contempo-
de Defesa Nacional da França, Michel Fou-
rânea da política internacional, o embaixa-
cher. A moderação coube ao professor do
dor Patriota afirmou que um dos problemas
Instituto de Relações Internacionais da PUC
mais sérios seria a seletividade na atuação
do Rio de Janeiro, Kai Kenkel.
em situações semelhantes. Questionado sobre a possibilidade dos incentivos atuais do
Annette Leijenaar destacou que o olhar para
governo brasileiro repetirem uma situação
o Atlântico Sul reflete duas partes: a África
de corrida armamentista com a Argentina
e a América do Sul. Precisa-se, portanto,
nos moldes daquela que se viu na década
abordar os dois lados para entender a ques-
de 1970, ele afirmou que essa não é uma
tão estratégica desta região. Segundo a
possibilidade, dado que o projeto que se
pesquisadora, mais de 90% do comércio na
tem de restabelecimento de política indus-
África é feito pelo mar, e a pesca ilegal teria
trial militar é com vistas a estabelecer uma
um custo econômico enorme para o conti-
cooperação entre os países vizinhos, princi-
nente, pelo seu caráter de ameaça de gran-
palmente por meio da construção de uma
de porte. As organizações regionais tem es-
cadeia produtiva que incorpore diversos paí-
tratégias para combater esse desafio, em
ses. Essa estratégia é feita com vistas à
especial a Comunidade Econômica dos Es-
compra de aviões, dado que um só país da
tados da África Ocidental (ECOWAS), mas
região não teria demanda capaz de gerar
não é clara a atuação individual dos Estados
escala que cubra os gastos de desenvolvi-
contra essas práticas.
mento dessa tecnologia. O exemplo disso é
o avião cargueiro que está sendo desenvol-
Segundo Leijenaar, a União Africana adotou
vido em uma parceria entre Brasil e Argen-
uma estratégia marítima conjunta que a-
tina.
barca uma lista de ameaças, inclusive ilícitas como tráfico, violações de meio-
Danielle Pletka, questionada sobre sua a-
ambiente e lavagem de dinheiro. A solução
presentação, na qual afirmou serem os EUA
que ela propõe é o compartilhamento da
mais fracos do que já foram, não levou em
zona marinha, cooperação para ferramentas
consideração a importância da recente in-
de monitoramento, políticas comuns para a
corporação de instrumentos novos, como os
pesca, tecnologia integrada para recursos
drones. Ela afirmou que estes não são ca-
humanos entre outros. A África precisaria
pazes de atender todas as missões existen-
de Marinhas mais fortes para fazer guarda
tes em uma guerra, pois são excelentes pa-
da costa do que Marinhas capacitadas para
ra assassinatos seletivos, mas não se pode
guerras.
simplesmente matar a todos os inimigos.
Ela considera ser necessário deter um bom
Sobre a atuação do Brasil em projetos na
contingente de pessoal e de instrumentos
África, a pesquisadora afirmou que existe a
cooperação para exercícios de segurança
9
multilateral de 1993, Atlasur. Além disso, a
Sexta: questão Antártica. O debate sobre a
segurança marítima é importante para os
exploração aumentaria e mudanças climáti-
BRASIL
debates entre os BRICS. Sobre a situação
cas seriam tema central a ser considerado,
DANIEL EDLER
específica da África do Sul, os constrangi-
principalmente a dúvida se os países da re-
GUSTAVO BEZERRA
mentos para o orçamento de defesa e au-
gião poderão administrar este espaço. A
sência de interesse político doméstico não
própria questão das Malvinas demonstra
Setembro 2012
permitem aumentar o orçamento.
que o espaço não é livre de conflitos arma-
www.kas.de/brasil
Em seguida, o Sr. Alfredo Valladão falou so-
Konrad-Adenauer-Stiftung e.V.
dos;
bre o aumento da densidade das relações
Sétima: alargamento do canal do Panamá.
no Atlântico Sul, o que demandaria mais
Tema que deve retomar centralidade, que
mecanismos de governança capazes de evi-
resultará em desafios para a governabilida-
tar conflitos e aumentar a cooperação. Ele
de do Caribe. Alguns países da região têm
enumerou as questões mais importantes
neste canal uma rota central para comércio.
para o Oceano.
UNASUL e Brasil devem ter políticas bem
elaboradas sobre isso, especialmente consi-
Primeira: energia. O Atlântico Sul está em
derando que apenas os EUA tem capacidade
vias de se transformar em uma das princi-
de controlar militarmente a região, embora
pais áreas de produção de hidrocarbonetos
ainda a veja como marginal.
do mundo, despertando o interesse mesmo
dos EUA. O professor também citou a possi-
Europa teria interesses pontuais no Atlânti-
bilidade de haver enorme quantidade de
co Sul, sobretudo aqueles que são países
minérios no leito marinho;
costeiros, pois o tráfico de drogas é um tema importante para eles, bem como a rota
Segunda: produção agrícola. Serão, de a-
comercial que deve aumentar com a expan-
cordo com ele, a África e a América do Sul
são do Canal do Panamá. O professor inclu-
que alimentarão o mundo nos próximos a-
iu a questão das Malvinas no mesmo escopo
nos;
de análise que a questão dos Estados falidos, como dois temas problemáticos para a
Terceira: rotas comerciais. A África é, pro-
Europa. No entanto, este continente teria
vavelmente, a próxima fronteira de cresci-
pouca capacidade de atuar na região, assim
mento econômico. Haveria apostas no mer-
como o Brasil tem enorme interesse mas
cado africano, o que tornaria as rotas atlân-
pouca capacidade de atuação até as praias
ticas pelo cabo uma das mais importantes
africanas. Para Valladão, os próprios africa-
do mundo, dado que os maiores navios de
nos deveriam ter interesse de olhar para o
transporte não passariam pelo canal de Su-
oceano com seriedade, mas suas capacida-
ez e a pirataria no Chifre da África também
des dependeriam de acordos. Seria preciso
serve para diminuir o fluxo nesta rota;
aumentar a cooperação para que juntos os
países do sul do Atlântico fossem capazes
Quarta: a criminalidade transnacional. O
de governá-lo. Alianças entre Estados e en-
tráfico de drogas da América do Sul até o
tre projetos regionais de integração seriam
Golfo de Guiné teria enorme impacto políti-
muito importantes nesse processo. Assim,
co na África. Criar-se-iam narcoestados com
interessaria ao Brasil fortalecer capacidades
conseqüências políticas graves. Por esse
militares da África. Essencial seria estender
motivo governos de países africanos de-
também os exercícios navais que são feitos
mandam que o Brasil tome posição mais
com os EUA. Os africanos e os europeus de-
firme no combate contra esta rota;
veriam ser incluídos para facilitar mais acordos entre os países do sul. O Brasil deve-
Quinta: fluxo de refugiados. O professor
ria incentivar exercícios no Caribe, atuando
Valladão perguntou-se qual seria a posição
em parceria com EUA e com a Europa.
brasileira se esse fluxo aumentasse substantivamente;
O oceano Índico e a China, segundo Valladão, também poderiam ter repercussão sobre o Atlântico. Brasil e África do Sul vis-
10
lumbrariam a parceria sob foco em segu-
com uma jurisdição internacional própria
rança na região, mas Índia teria a vanta-
para defini-la e combatê-la (Tratado da Ja-
BRASIL
gem de aumentar sua competição com a da
maica). A tendência é de que a pirataria a-
DANIEL EDLER
China. Para os dois grandes países do Atlân-
vance rumo à costa oeste da África e, pos-
GUSTAVO BEZERRA
tico Sul seria um problema porque se traria
sivelmente, à costa brasileira. A Marinha
um ator não–atlântico para participar da
deve estar atenta para evitar esse tipo de
dinâmica do oceano. Influenciaríamos a
ação;
Konrad-Adenauer-Stiftung e.V.
Setembro 2012
competição entre potências externas em
www.kas.de/brasil
uma área de interesse estratégico do país.
3) Novas ameaças. Eventos que vão ocorrer
Devemos refletir mais sobre os impactos
no Brasil aumentam ameaça do terrorismo
disso.
em nosso território. No mar, a preocupação
seria com plataformas de petróleo. Há tam-
O contra-almirante Claudio Portugal de Vi-
bém os conflitos transnacionais, que deveri-
veiros iniciou sua fala afirmando que a Polí-
am manter o Brasil em estado de atenção
tica de Defesa Nacional (PDN) estabelece a
para monitorar a entrada e saída de materi-
projeção do Atlântico Sul como central para
al ilícito por nossa costa.
o país e interessa ao Brasil fazer essa projeção de forma pacífica. Segundo o militar
Em seguida, ele falou sobre o SISGARAZ –
brasileiro, o Atlântico Sul por anos esteve
sistema de monitoramento da Amazônia
distante de disputas, mas o mundo come-
Azul – que é operado por civis e militares,
çou a lançar olhares sobre a região. A exis-
atuando como segurança, salvamento, con-
tência de depósitos polimetálicos e do pré-
trole de pesquisa científica e meteorologia.
sal reordenaram o tabuleiro da produção de
Abordando a questão da energia nuclear, o
energia e minério no mundo. Por exemplo,
diretor da Escola Naval afirmou que o Brasil
82% da produção de petróleo do Brasil vêm
vê isso como central, e busca desenvolver o
do mar.
submarino nuclear. Afinal, a capacitação da
indústria de defesa tem conseqüências posi-
O Atlântico deve ser um elemento de agre-
tivas para outros segmentos da economia
gação entre países da América do Sul e des-
nacional.
tes com a África. Neste caso, a pesca é uma
atividade fundamental para o Brasil e está
Michel Foucher iniciou sua apresentação
diretamente ligada ao Atlântico Sul. A de-
comentando sobre o perímetro do Atlântico.
manda de pescado deve aumentar e a ofer-
Para a Europa, Atlântico significaria o norte
ta não conseguirá seguir. Oceanos não são
e o tratado da OTAN, segurança coletiva
celeiros inesgotáveis. Estoques já estão bai-
com EUA e Canadá. Mas não haveria uma
xos e a proteção da vida marinha ainda não
questão central entre os países da região. A
foi incorporada como questão central para o
cooperação teria sido muito efetiva, por isso
país. O Brasil deveria assumir o protago-
teria que se olhar para o Sul. O analista
nismo no debate sobre o balanço da produ-
francês identificou uma crescente importân-
ção e limites sustentáveis da pesca no A-
cia das questões relativas aos mares e do
tlântico.
Atlântico Sul. Duas semanas antes da conferência, referendando a importância que as
No que tange às ameaças que poderiam
questões marítimas assumem para o conti-
pairar sobre nosso patrimônio, o contra-
nente europeu, a Comissão Europeia lançou
almirante falou que não seriam ameaças de
o livro verde sobre questões do mar. Ao fa-
países inimigos, apenas ameaças difusas,
lar sobre as rotas comerciais, o analista
sendo os principais temas:
francês elogiou a integração do Brasil às
principais rotas. O país teria rotas para o
1) Conflito armado: estaria a Estratégia Na-
Panamá, Europa, Ásia e África. Por isso,
cional de Defesa (END) passível de ser em-
considera que o Brasil necessitaria pensar
pregada como previsto?
de forma mais ampla e não ficar restrito
apenas à parte sul do Atlântico.
2) Pirataria: essa questão tem crescido e
não passaria desapercebida, mas contaria
11
Ao analisar o impacto na Europa, o Sr. Fou-
50 anos a Marinha brasileira trocaria expe-
cher afirmou que naquele continente a notí-
riências com a Marinha estadunidense. Os
BRASIL
cia sobre cooperação no Atlântico Sul é bem
EUA teriam transferido a operação Panamá
DANIEL EDLER
recebida, pois é vista como uma boa forma
e os exercícios no Caribe a um almirante
GUSTAVO BEZERRA
de combater ameaças à segurança. Esta
brasileiro. Todas as atividades da Marinha
situação deixa evidente que existem inte-
brasileira teriam observadores dos EUA e da
resses europeus compartilhados com Brasil
Europa. Haveria um grande intercâmbio de
e a África, que não estão restritos à explo-
informações e desenvolvimento de sistemas
ração dos recursos, mas com a construção
de dados e monitoramento compartilhado
de confiança mútua. A Europa buscaria coo-
da região.
Konrad-Adenauer-Stiftung e.V.
Setembro 2012
www.kas.de/brasil
peração política e operacional com os dois
lados do Atlântico Sul.
Michel Foucher afirmou haver uma política
externa estadunidense mais assertiva para
Uma pessoa da platéia perguntou: “O Minis-
a África. A IV frota segue essa lógica, au-
tério da Defesa do Brasil, nesta mesma con-
mentando a presença estadunidense na re-
ferência, se colocou bastante resistente a
gião. Mas a realidade global seria diferente.
qualquer diálogo com a Europa e a OTAN
EUA teriam redistribuído sua frota para au-
para cooperação na região. Em temas de
mentar a presença no Pacífico, compondo
segurança, há espaço para diálogo Brasil-
60% no Atlântico e 40% no pacífico.
Europa?” O professor Valladão afirmou que
o Brasil quer atuar no Atlântico Sul e neces-
Annette Leijenaar afirmou que o Brasil é
sidade de capacidade para operar. Por en-
percebido de forma positiva na costa da Á-
quanto não tem espaço para esta coopera-
frica, principalmente na África do Sul, de
ção, mas bloquear a região é insustentável
maneira que não é visto como um ator que
e não interessa ao país. Se não podemos
trará uma resposta ocidental - no sentido
assumir capacidade de governança, outros
pejorativo do termo. Parceiros africanos ve-
o farão.
riam uma parceria com o Brasil de forma
muito mais positiva, de resultados menos
O Contra-almirante Viveiros afirmou que o
vultosos para o desenvolvimento.
Brasil não quer proibir os demais de atuarem, mas garantir que a atuação seja multi-
Um funcionário da Petrobrás fez a pergunta:
lateral através da cooperação com Brasil,
“A pirataria no golfo da Guiné tem aumen-
América do Sul e África. Sozinhos, Europeus
tado e prejudica a expansão da presença
e EUA não serão capazes de ocupar o espa-
brasileira na região, principalmente na ex-
ço e não poderão combater as ameaças que
ploração de petróleo. Os piratas da Nigéria
eles identificam para si próprios. Por outro
e de Benin também são prejudiciais por fo-
lado, o Brasil já teria identificado a necessi-
carem principalmente em embarcações de
dade de capacitar-se e tem operado nesse
combustível. O que a Marinha faz quanto a
sentido, principalmente através do aprimo-
isso?” O Contra-almirante Viveiros afirmou
ramento da Marinha. Temos programas ou-
que a Marinha estaria atenta a isso, visto
sados, como o submarino. Com nossa capa-
que há constante troca de informações com
cidade melhorada, nenhum país poderá a-
os Estados africanos e o aumento de nossa
tuar ignorando os interesses brasileiros.
capacitação para preservar os interesses
brasileiros. Estudos e doutrinas para au-
O professor Kai Kenkel fez a pergunta:
mentar a participação do Brasil no combate
“Como a reativação da IV frota muda o jogo
à pirataria estariam sendo desenvolvidos
estratégico na região?” O Contra-almirante
para ajudar a combater esse problema.
afirmou que não se trataria de uma questão
de intimidação ou ameaça. Não foi uma no-
Michel Foucher afirmou que também a Fran-
va invenção, ela já existiu no passado e te-
ça teria enormes interesses na região, mo-
ria conduzido ações que estariam direciona-
tivo pelo qual haveria uma operação per-
das à costa ocidental da África. É uma res-
manente de frotas europeias na baia de
posta às ameaças de atores não-estatais, e
Guiné e próximo à Nigéria para lidar com
provê assistência humanitária. Há mais de
esse desafio.
12
Konrad-Adenauer-Stiftung e.V.
BRASIL
Conferência 2: Desafios e oportunidades
munidade Econômica dos Estados da África
para cooperação estratégica entre o Sul e
Ocidental (ECOWAS). A relação com a OTAN
o Norte
funciona do mesmo jeito, aumentando a
capacidade de ação da ONU. Da mesma
DANIEL EDLER
GUSTAVO BEZERRA
Setembro 2012
A mesa foi composta pelo Subsecretário Ge-
forma, seria fundamental ter a colaboração
ral do Departamento de Operações da Paz
dos governos locais, que poderão ajudar em
da ONU, Sr. Edmond Mulet; pelo diretor do
seus países.
Departamento de Pesquisa da NATO Defenwww.kas.de/brasil
ce College, Karl Heinz Kamp; e pelo Profes-
Os países do Norte já teriam percebido a
sor de Relações Internacionais da Universi-
importância de participar nestas ações, mas
dade do Estado do Rio de Janeiro, Williams
os países do Sul precisariam ser mais moti-
da Silva Gonçalves. A moderação coube ao
vados. O Sul não quer ser só instrumento
professor de Relações Internacionais da U-
das ações, mas participar dos debates de
niversidade de Brasília, Antonio Jorge Ra-
elaboração do conceito de intervenção e das
malho da Rocha.
decisões políticas em conceitos específicos.
Antonio Jorge começou as atividades fazen-
Para o diretor Kamp, a globalização também
do perguntas aos palestrantes: “Qual a vali-
ocorre nas políticas de segurança e uma das
dade da divisão entre Norte e Sul em um
principais atividades da OTAN hoje seria o
mundo atual, marcado por desigualdades
estabelecimento de parcerias no Golfo, na
tanto no Norte quanto no Sul? Não seria
Ásia e no Leste Europeu. Seriam parceria
melhor pensar em termos de países mais
principalmente operacionais, com tratados
desenvolvidos e menos desenvolvidos?
especificando-, mas que não focariam ape-
Mesmo nestes últimos há vantagens compa-
nas em temas militares, mas em ciberata-
rativas de grande valor estratégico.”
ques, segurança energética, proliferação de
armas nucleares e terrorismo. O Sr. Kamp
“A Conferência Rio +20 tomou nota das me-
assinalou que nem todos os parceiros seri-
tas do milênio e reforçou a lógica do desen-
am democráticos, e que a OTAN preferiria
volvimento sustentável. Deixou-nos um
não fazer parceria com eles, mas existem
possível arcabouço institucional que nos
países cruciais com os quais a parceria seria
permite promover crescimento econômico
inescapável. Ele afirma que a OTAN não tra-
com inclusão social e respeito ao meio am-
taria seus parceiros de forma igual, pois os
biente. Este é o desafio do século. Como
diferencia entre parceiros por necessidade
cuidar dos bilhões de seres humanos e tam-
(Uzbequistão, China) e parceiros por esco-
bém do meio ambiente? Realização desta
lha (aqueles que partilham de valores).
agenda é ameaçada pela crise econômica,
mas a Rio+20 aponta para o futuro que não
O diretor Kamp chamou atenção para o fato
pode ignorar a confluência destes temas.”
de que não haveria muitas ligações entre a
OTAN e a América do Sul. As relações mais
O Subsecretário Edmond Mulet afirmou que
claras seriam apenas com a Argentina,
haveria consenso de que ninguém é capaz
mesmo havendo potencial para mais parce-
de lidar individualmente com as questões de
rias. Kamp não as estaria defendendo, ape-
segurança global. Seria fundamental que a
nas apontando. Seria necessário que hou-
ONU trabalhasse com organizações regio-
vesse diálogo para que os atores de ambos
nais, que possuem mais conhecimento da
os lados descobrissem as perspectivas para
realidade local e permitiriam mais participa-
uma parceria. As se descobrir espaços de
ção e legitimidade às ações. Esta estratégia
diálogo, o Brasil certamente terá um papel
teria sido utilizada, por exemplo, em Darfur,
fundamental na resposta que será dada.
com a atuação da ONU em conjunto com a
União Africana. Mesmo no Haiti haveria uma
O Sr. Kamp defende que não haja percep-
cooperação ampla com países da região,
ções erradas sobre a OTAN, pois haveria
dado que setenta por cento das tropas vem
uma visão de que OTAN seria o braço ar-
de países latino-americanos. Na Libéria e na
mado dos EUA, que afetaria a soberania da
Costa do Marfim há cooperação com a Co-
América do Sul. Mas não é assim. A OTAN
13
Konrad-Adenauer-Stiftung e.V.
seria uma aliança política e militar de defesa
cional. Trata-se de uma posição bastante
composta por Estados comprometidos a a-
distinta da do Brasil.
BRASIL
judar-se mutuamente em caso de ataque
DANIEL EDLER
externo. A aliança tem atuado em outras
A atuação do Brasil entre os BRICS, com a
GUSTAVO BEZERRA
situações, como na Líbia, mas essa não se-
busca de mudança da ordem internacional,
ria sua razão de ser. Sendo uma aliança de
dificulta a relação com a OTAN. O Brasil de-
defesa, defende o território, as pessoas
fende o princípio da autodeterminação dos
dentro deste território (os terroristas, lem-
povos, visto como fundamental para a pro-
bra Kamp, atacam as pessoas e não os ter-
moção da democracia entre os Estados -
ritórios) e defende os interesses vitais dos
democracia não é importante apenas dentro
Estados membros (aspecto mais controver-
dos Estados. O poder armado, afirma o pro-
so).
fessor Gonçalves, deveria ser usado para
Setembro 2012
www.kas.de/brasil
dissuadir a utilização das forças armadas,
As missões de defesa da OTAN não excluiri-
não para ampliar os conflitos. A intervenção
am parceria com Rússia, mas esta não po-
na Líbia, levada a cabo pela OTAN, foi jus-
deria ir contra os interesses de defesa de
tamente o contrário. Em nome da defesa
algum Estado membro da OTAN. A institui-
dos Direitos Humanos um chefe de Estado
ção atua em escala global (África, Europa e
foi morto a pauladas no meio da rua. En-
Ásia), mas precisa trabalhar com consenso.
quanto se defendem os Direitos Humanos
Há enorme debate interno sobre muitos dos
de uns, os mesmos atores recusam-se a
temas de segurança. A OTAN não está nas
abrir as patentes para remédios de AIDS
mãos de nenhum Estado específico, pois é
que matam milhares na África. A posição do
regional com um horizonte global. Seria um
Brasil, por isso, dificilmente vai se aproxi-
grupo de Estados independentes e sobera-
mar daquela defendida pelos europeus.
nos, liderados pelos EUA, mas não dominados.
O professor Jorge Ramalho insistiu na pergunta: “como os senhores veêm a possibili-
Williams Gonçalves destacou as dificuldades
dade de cooperação? Há alguma?”
para cooperar com o Norte em temas de
segurança. Há uma sensação real de mu-
O diretor Kamp afirmou que haveria um ne-
dança na política internacional. A rápida as-
xo entre segurança e desenvolvimento, mas
censão da China é motor de grande parte
para a OTAN seria difícil lidar com estas di-
destas mudanças, pois implica na perda de
mensões conjuntamente. OTAN seria uma
posição hegemônica dos EUA (muito preju-
organização de defesa, por isso seria neces-
dicados pela crise econômica, mas também
sário que se trabalhasse com parceiros e
em crise política e intensificação do senti-
reconhecesse a abordagem mais abrangen-
mento antiamericano ao redor do mundo).
te da ONU. No entanto, a OTAN seria capaz
Para ele, a crise econômica europeia dividi-
de promover segurança militar em situações
ria a Europa em dois grupos: alguns como a
nas quais o desenvolvimento, por causa da
Alemanha, que se fortaleceriam com a pró-
violência, não poderia ocorrer. No Afeganis-
pria crise, e outros que enfrentariam os e-
tão e na Síria o argumento seria o mesmo.
feitos sociais mais severos dela. A formação
dos BRICS também é um sintoma destas
O professor Williams, no entanto, insistiu
mudanças. Tratar-se-ia de um grupo que
que há efetivamente um vínculo entre segu-
teria por objetivo remodelar a ordem inter-
rança e desenvolvimento. Isso seria reco-
nacional com vistas a deixá-la mais justa e
nhecido pela ONU desde a década de 1960.
equilibrada. Dessa forma, o Brasil estaria
Em 1967, quando o Grupo dos 77 obteve a
em uma posição muito diferente da OTAN.
criação da Unctad, a proposta era justa-
Com o fim da Guerra Fria, ao invés de aca-
mente nesse sentido: evitar que países
bar, a OTAN deixou de cuidar da segurança
mais pobres, indefesos ante a força bruta
de seus Estados-membros e teria passado a
do mercado, entrassem em colapso.
interferir em várias regiões do mundo, agindo como uma espécie de polícia interna-
Workshop 4: Livro Branco da Defesa e a
legislação internacional
14
Esta mesa contou com a presença do chefe
da política externa do país. Segundo ele, o
da Assessoria de Planejamento Institucional
Livro Branco não serve para nortear as rela-
BRASIL
do Ministério da Defesa do Brasil, General
ções do Brasil com outros Estados porque,
DANIEL EDLER
de Divisão Julio de Amo Júnior; pelo Diretor
de acordo com a Convenção de Viena de
GUSTAVO BEZERRA
do Centro de Direito Internacional (CEDIN),
1969 sobre Direito dos Tratados, recente-
Leonardo Nemer Caldeira Brant; pelo diretor
mente ratificada pelo Brasil, o país não pode
do Instituto de Estudos Europeus e membro
abster-se de obrigações internacionais a
do Departamento de Direito da Universidade
partir de legislação interna, pelo contrário,
de Saarland, na Alemanha, Torsten Stein; e
devem ser consoantes. Após essa explana-
pela professora do Departamento de Estu-
ção, o professor apresentou as diferenças
dos Globais e do Departamento de Econo-
entre as concepções monista e dualista so-
mia do Colby College (EUA), Patrice Franko.
bre Direito. A primeira apresenta dificulda-
A moderação coube ao coordenador da Es-
des porquanto percebe que tanto o Direito
cola Sérgio Vieira de Mello e do Grupo de
Interno quanto o Direito Internacional têm a
Análise de Prevenção de Conflitos GAPCon,
mesma origem comum e a partir dessa ma-
da Universidade Cândido Mendes, Clóvis
triz homogênea surgem esses dois ramos
Brigagão.
do Direito. As dificuldades aí presentes di-
Konrad-Adenauer-Stiftung e.V.
Setembro 2012
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zem respeito à forma de explicar um possíO professor Clóvis Brigagão saudou os pre-
vel conflito entre os dois direitos. O Dualis-
sentes dando-lhes boas-vindas, e questio-
mo, por sua vez, ao identificar o Direito In-
nou o motivo de não ter sido chamado para
ternacional e o Direito Interno como oriun-
auxiliar na escrita do Livro Branco, tendo
dos de fontes diferentes, possibilita que se
em vista que afirmou ser o fundador da á-
trabalhe com a noção de incorporação de
rea de Segurança Internacional no Brasil.
princípios e normas de uma fonte do direito
Em seguida passou a palavra ao General
para outra.
Julio Amo.
O professor Stein afirmou que o conceito de
O general apresentou o conceito de Livro
Responsibility to Protect não é e nem pode
Branco, que, para ele, pode ser muito útil
ser visto como uma carta branca para a a-
para a manutenção da paz, uma vez que
tuação e intervenção de atores na realidade
informa as capacidades de que dispõe o Es-
política de Estados, o que serviria para
tado e que esta capacidade não tem por ob-
romper por completo a noção de soberania
jetivo atacar outros países. Segundo o ge-
estatal. Para ele, a importância do Livro
neral, o termo White Paper é utilizado desde
Branco está em definir as normas de enga-
os séculos XV/XVI, mas o seu formato e in-
jamento do Estado que o publica, uma situ-
formações foram gradualmente sendo alte-
ação que, em teoria, suprimiria a importân-
rados ao longo do tempo. Em 1996, o Brasil
cia do Conselho de Segurança definir as di-
publicou o documento Estratégia de Defesa
retrizes para as operações de manutenção
Brasileira. Na década de 2000 essa estraté-
de paz, visto que cada Estado já teria publi-
gia foi revista e agora, em 2012, vai ser pu-
cadas as suas normas. Ao mesmo tempo,
blicado o primeiro Livro Branco da Defesa
torna mais fácil a responsabilização quando
do Brasil. De acordo com o General, embora
um Estado descumprir.
o Brasil seja um dos últimos países a publicar um Livro Branco, tendo em vista nosso
A professora Franko, por sua vez, ressaltou
histórico, somos pioneiros em legislação a-
as diferenças entre os temas de Segurança
presentando nossa concepção de Defesa.
Internacional que existem atualmente. Se-
Ele destacou também que a iniciativa do
gundo ela, é preciso analisar a realidade por
Livro Branco teve origem no Poder Legisla-
meio da interação entre três pontos: sobe-
tivo, e não no Ministério da Defesa.
rania, globalização e produção econômica
internacionalizada. Essa é o que ela definiu
O professor Leonardo Nemer afirmou que o
como a trindade impossível da economia de
Livro Branco é uma contribuição que se in-
defesa, em um paralelo com a trindade im-
sere no artigo 4º da Constituição brasileira,
possível da macroeconomia. A definição de
aquele que define os princípios norteadores
qual aspecto entre os três será preterido é
15
Konrad-Adenauer-Stiftung e.V.
central para a definição da estratégia de se-
nidade para oficiais cujos subordinados a-
gurança do Estado e para a postura que es-
jam de forma ilegal.
BRASIL
te assumirá internacionalmente. Essa reali-
DANIEL EDLER
dade implica que sempre haverá trade-off
GUSTAVO BEZERRA
entre esses três aspectos da economia de
Defesa.
O painel de encerramento foi composto pela
chefe da Delegação da União Europeia no
Setembro 2012
www.kas.de/brasil
Encerramento
Para Patrice Franko, o Brasil já tem poder e
Brasil, Embaixadora Ana Paula Zacarias;
participa dos fóruns internacionais mais im-
pela Diretora Executiva do Centro Brasileiro
portantes. Nosso setor de Defesa faz parte
de Relações Internacionais (CEBRI), Fátima
de uma cadeia produtiva e, portanto, é mui-
Berardinelli; e pelo Representante da Fun-
to difícil manter a autonomia, principalmen-
dação Konrad Adenauer no Brasil, Felix Da-
te porque o Brasil não tem demanda sufici-
ne.
ente para criar escala na produção de equipamentos militares.
A embaixadora Zacarias afirmou que haveria enorme interesse em continuar com a
Após as apresentações, Antônio Carlos Pe-
parceria estratégica entre União Europeia e
reira, editor-chefe do Estado de São Paulo,
Brasil em todas as suas dimensões. Não ha-
questionou sobre a necessidade de aumen-
veria apenas uma resposta para os desafi-
tar o orçamento do Ministério da Defesa,
os, devido à complexidade do mundo sem-
atualmente o segundo da Federação, como
pre em transformação. O desafio da confe-
forma de atender os projetos das forças
rência foi este: estabelecer um espaço de
armadas do país. O Sr. Pereira sugeriu que
diálogo. Apesar dos problemas, o mundo
se deva repensar o plano de carreira dos
estaria melhor porque há mais cooperação.
militares, incluindo aí o custei de oficiais a-
Nesse contexto, o Brasil seria um parceiro
tivos, reservistas e pensionistas, de forma a
cada vez mais interessante para a União
liberar mais verba para os projetos de mo-
Europeia, pois apresenta uma contínua ca-
dernização.
pacidade de evolução.
O general Júlio respondeu-lhe com as espe-
Fátima Berardinelli afirmou que o CEBRI es-
cificidades do orçamento militar, que tem
taria muito satisfeito com os resultados da
uma periodicidade diferente do orçamento
conferência que se encerrava. Os palestran-
dos demais ministérios, e afirmou que a si-
tes teriam sido capazes de trazer questões
tuação própria de contar com o pagamento
muito interessantes para o tema da segu-
de inativos no próprio orçamento do minis-
rança internacional. Promover debates é
tério é situação sui generis entre os outros
justamente a missão do CEBRI, e por isso o
ministérios, de forma que o orçamento da
objetivo de manter a parceria com a Funda-
Defesa tende a ser um dos maiores da Uni-
ção Konrad Adenauer para a execução da
ão.
Conferência do Forte de Copacabana.
O outro debate que precedeu o fim da mesa
Felix Dane afirmou que aquele foi um longo
foi levantado por uma aluna de direito da
e intenso dia, com discussões paralelas que
Universidade Rural do Rio de Janeiro que,
trouxeram as várias dimensões dos desafios
contrapondo a legislação penal militar brasi-
globais de segurança. Isso seria fundamen-
leira com as previsões existentes no Tratado
tal para aproximar as posições. Agradeceu a
de Roma que fundou o Tribunal Penal Inter-
todos os participantes, equipes e palestran-
nacional, questionava sobre a atualização
tes e deu por encerrado o evento, afirman-
daquele de forma a adequar-se a este, em
do esperar que esta experiência se repita
especial no que diz respeito à possibilidade
nos próximos anos.
de responsabilização penal de oficiais comandantes sobre as ações dos seus subordinados. Neste caso, o General Júlio afirmou
é um tema da alçada do Ministério da Justiça, mas combateu a noção de que há impu-
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nacional do Forte de Copacabana - Konrad-Adenauer