BIOTECNOLOGIA PODE REDUZIR A INCIDÊNCIA DE ALERGIAS
ALIMENTARES
Ao contrário do que se prega, a biotecnologia pode ser utilizada para
reduzir a incidência de alergias alimentares.
Quem nunca sentiu uma coceira persistente, ou ficou com o corpo todo
"empipocado", e depois se lembrou de ter comido algo diferente, que talvez tenha
provocado uma reação alérgica? A situação pode ser considerada comum porque,
em todo o mundo, cerca de 2% da população adulta é alérgica a algum tipo de
alimento. Nas crianças, esse percentual chega a 8%. Além dos frutos do mar, o
amendoim, a soja, o leite, os ovos, os peixes, o trigo e as castanhas são
igualmente conhecidos por causar reações alérgicas nas pessoas, respondendo
por 90% dos casos, dos moderados aos severos, que podem levar à morte. Mas
não são os únicos vilões. Estudos indicam que mais de 160 alimentos podem
provocar alergias esporádicas.
Com a introdução dos alimentos transgênicos, conhecidos como alimentos
geneticamente modificados, na cadeia alimentar de alguns países como os
Estados Unidos e a Argentina, difundiu-se erroneamente a idéia de que eles
seriam mais propensos a provocar reações alérgicas nos consumidores. Ficou
particularmente notório um boato sobre um milho transgênico, liberado para uso
em ração animal, que teria sido inadvertidamente misturado com um milho para
consumo humano, ocasionando alergias nos indivíduos que consumiram tal
mistura. Entretanto, essa e outras estórias nunca foram cientificamente
comprovadas.
Até o momento, não há notícias de que transgênicos aprovados tenham causado
reações alérgicas. Pelo menos com relação às alergias alimentares, esses
produtos vêm se mostrando até mais seguros do que as espécies convencionais,
uma vez que passam por uma rigorosa avaliação de segurança, que envolve
muita pesquisa, estudos e análises laboratoriais.
Um dos componentes desse processo consiste na verificação do potencial que o
alimento tem de provocar alergias, o que requer uma série de testes. O primeiro
passo é checar a fonte do material genético, já que ela pode ser alergênica. Para
tanto, os técnicos procuram detectar, no produto, qualquer identidade e
similaridade de composição e estrutura com substâncias que sabidamente
produzem alergias ou são tóxicas. Depois, submetem-no ao teste de resistência à
digestão com pepsina, uma enzima produzida no estômago, uma vez que os
compostos alergênicos, entre outras características, resistem mais à digestão.
Dependendo do caso, recomendam-se ainda exames com o soro do sangue de
pacientes hipersensibilizados a certos grupos de materiais causadores de reações
alérgicas, além de testes cutâneos por punctura, testes com placebo e com
animais. Se for constatado que o material genético a ser utilizado apresenta
alguma semelhança com substâncias alergênicas, o projeto é descartado logo no
início, como já aconteceu inúmeras vezes. Entretanto, muitos dos exames
atualmente propostos ainda se encontram em fase de desenvolvimento e
validação (o que é necessário para garantir que todos os laboratórios estejam
utilizando exatamente a mesma metodologia e condições de análise e, assim,
produzirem resultados que tenham credibilidade e que possam ser comparados
entre si).
A Organização Mundial da Saúde reconhece que a engenharia genética oferece a
oportunidade de diminuir - ou mesmo de eliminar - nos alimentos os compostos
que provocam alergias. Tanto é assim que muitos pesquisadores têm se dedicado
a suprimir naturalmente os alergênicos presentes no trigo, no leite e até no
amendoim. Atualmente, também já se encontra em desenvolvimento uma
variedade de soja transgênica para não provocar reações alérgicas.
A biotecnologia é uma ferramenta poderosa que pode ser utilizada no combate a
outros males que afligem a humanidade e, na área de alimentos, não só para
reduzir alergias ou para produzir grãos tolerantes a herbicidas ou resistentes a
insetos. Para se ter uma idéia, está em curso o desenvolvimento de variedades de
banana e batata que funcionam como vacinas contra o Papilomavírus Humano
(HPV), um vírus sexualmente transmissível que pode causar câncer de colo de
útero, e também um tipo de tomate com alto teor de licopeno, um antioxidante que
pode reduzir o risco de câncer de mama e de próstata, assim como o de doenças
do coração. Em síntese, a biotecnologia está trabalhando para reduzir alguns
problemas de saúde, e não para agravá-los.
Edson Watanabe é engenheiro de alimentos, Ph.D. em Tecnologia de Alimentos
da Embrapa Agroindústria de Alimentos e conselheiro do CIB
Victor Augustus Marin é biólogo, Ph.D. em Biologia Vegetal da Embrapa
Agroindústria de Alimentos e conselheiro do CIB
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biotecnologia pode reduzir a incidência de alergias alimentares