INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E DE LETRAS
DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA
NEFE - Núcleo de Estudos e Pesquisas de Filosofia na Educação
Rua Benjamin Constant, 790 - Centro - Juiz de Fora - MG
Tel.: Departamento de Filosofia (032) 229-3107
A Filosofia para Crianças como alternativa para o ensino da Filosofia.
Comunicação a ser apresentada no Congresso
Internacional de Filosofia com Crianças e Jovens
— IX Encontro do ICPIC por Juarez G. Sofiste.
A Filosofia para Crianças como Alternativa para o Ensino da Filosofia1
Juarez Gomes Sofiste2
Resumo: O presente comunicação faz algumas considerações sobre o ensino da filosofia e apresenta o Programa de
Filosofia para Crianças do professor Matthew Lipman como alternativa para o ensino da filosofia no primeiro e
segundo graus.
Palavras-chave: filosofia, ensino,educação, pensar.
Abstract : This paper discusses the study of philosophy in the primary school and presentes the Matthew Lipman‟s
Program of Philosophy for Children as a satisfactory alternative to achieve the educational purposes of the discipline
called philosophy.
Key-words: philosophy, education, teaching, thinking.
Um dos primeiros problemas que se vê obrigado a abordar o estudioso do ensino
da filosofia é, diferentemente de qualquer outra matéria, o problema de sua necessidade
ou não, quer dizer: justifica-se o ensino da filosofia? Ora se a filosofia fosse um bem de
primeira necessidade ou se houvesse consenso em torno da sua importância, tal
questionamento seria inoportuno, visto que, provavelmente a filosofia se imporia por si
mesma. Ninguém, por exemplo, pergunta sobre a necessidade do ensino da língua
materna.
Do ponto de vista histórico, existe uma tendência muito forte na afirmação de que
as razões pelas quais a filosofia foi excluída do ensino médio são de ordem política e
ideológica. É nesta linha de pensamento, por exemplo, que a prof. Maria Teresa Penteado
Cartolano no livro Filosofia no ensino de 2o. grau, justifica a extinção de seu ensino.
Segundo a autora a partir do golpe político militar de 64, com a resolução (nº 36, de
30/12/68) do Conselho Estadual de Educação o campo de atuação da filosofia foi
limitado, tornando-a disciplina optativa em cada estabelecimento de ensino. Sua absoluta
extinção como disciplina foi pensadamente preparada através de uma série de leis,
decretos, pareceres e resoluções do Conselho Federal de Educação e do Conselho
Estadual de Educação do Estado de São Paulo, que, neste caso, centralizavam as decisões
1
Texto originalmente publicado na revista Ética e Filosofia Política do DFIL da UFJF. Vol. 3, nº 2- Julho
/ dezembro, 1998 p.103-119 com o título: “A Filosofia para Crianças e o Ensino da Filososfia.”
2
Professor do Departamento de Filosofia da UFJF
da área educacional. A legislação instituída na época era um reflexo das propostas
acordadas entre o MEC e USAID. A educação, segundo a autora, passa a ser tratada
como uma questão do desenvolvimento do país e da segurança nacional, a filosofia, não
atendendo a tais solicitações tecnoburocráticas e político-ideológicas, já não interessava
aos objetivos que se pretendiam instituir na estrutura do ensino brasileiro. A condição de
disciplina optativa, segundo previa a resolução n.º 376, de 30 de dezembro de 1968, veio
facilitar a supressão definitiva da filosofia em 1971, com a Lei 5692.3
Segundo o professor Sérgio Pereira da Silva “a filosofia perdeu o seu espaço,
como disciplina no ensino Médio, muito mais em função da ideologia técnicodesenvolvimentista que conquistou hegemonia entre os educadores, no final da década de
sessenta e durante a de setenta”.4 Para o professor nem sequer foi necessário um
dispositivo legal que proibisse a permanência do ensino da filosofia.
A princípio partilhávamos de tal leitura, mas cada vez aumenta nossa convicção
de que a filosofia “morreu” de morte “morrida” ou seja, pura e simplesmente não se
afirmou como necessária. Ora, se a razão fundamental da exclusão da filosofia é uma
certa perseguição política; por que, hoje, não havendo a tal perseguição, a filosofia
continua sendo excluída?
A partir da década de 70 teve início um grande debate em nível nacional sobre o
ensino da filosofia. A Editora Convívio em 1978 promoveu um Encontro Nacional de
Professores de Filosofia com o tema:
A filosofia e o ensino da filosofia, onde,
ironicamente, comentava-se que o objetivo do Encontro de Professores de Filosofia era
propor e defender a tese da supressão da filosofia em todos os níveis de ensino. Ou
como afirmou, não ironicamente, George Gusdorf
na conferência de
abertura do
encontro: “A filosofia e a universidade têm isto em comum: brilham neste mundo pela
sua ausência”.5
Como resultado deste grande debate tivemos, em primeiro lugar, uma corrida das
editoras na produção, sob encomenda, de livros didáticos para o ensino da filosofia e , em
segundo lugar,
a formação de grupos de estudos com a promoção de simpósios,
seminários, semanas de estudos, etc., o que resultou na produção de muito material sobre
CARTOLANO, Maria Teresa Penteado. Filosofia no ensino de 2o. grau. São Paulo: Cortez, 1985. Págs. 69-74
SILVA, Sérgio Pereira da. Exclusão e retorno do ensino da filosofia nas escolas públicas estaduais mineiras. Revista de Educação e
Filosofia, v. 11 - Nº 21 e22 - jan/jun e jul./dez. 1997. P. 83
5
A filosofia e o ensino da filosofia. Encontro Nacional de Professores de filosofia. São Paulo: Convívio, 1979. p. 19
3
4
3
a temática. Passados mais de vinte anos, o debate continua atual e o ensino da filosofia,
de acordo com nossa leitura, continua uma questão mal resolvida. Para tal uma pequena
olhada nas propostas veiculadas pelos defensores da filosofia para confirmarmos que seu
ensino ainda é um tema por demais confuso. O que esperar de uma disciplina da qual
não podemos dizer ao certo o que é, o que visa e a quem serve?
Assim, ao lado de entendê-la como uma super disciplina, de modo que, bastaria a
sua inclusão, por exemplo, no ensino médio e teríamos estudantes mais críticos e
reflexivos, temos propostas por demais audaciosas e, em geral, fora da realidade. Como,
por exemplo, o programa defendido pelo professor João Paulo Monteiro, segundo o
professor: 1- O ensino da filosofia no secundário deverá aliar o estudo da história da
filosofia com a discussão de temas filosóficos; 2- Os dois eixos acima mencionados
deveriam constituir o fundamento da organização educacional da área filosófica em nível
secundário. Tal organização deverá levar em conta a minoria de estudantes que mais
tarde optará pelos cursos de filosofia. Portanto, a preparação secundária em filosofia deve
fazer-se entre um máximo de disciplinas, destinadas sobretudo ao aluno que planeja fazer
mais tarde o curso universitário de filosofia, e um mínimo destinado aos outros
estudantes; 3- O conjunto mínimo de disciplinas deveria incluir uma iniciação à história
da Filosofia e uma outra mais voltada para a atualidade filosófica; 4- No extremo oposto
a este mínimo se situaria o conjunto máximo, composto de quatro disciplinas: História da
filosofia, Iniciação à filosofia atual, Lógica e filosofia da ciência, Filosofia Moral e
política.6
O documento do MEC, “Padrões de qualidade,”7 entende que o papel da filosofia
no ensino médio é prestar uma essencial contribuição, tanto para a “compreensão do
significado da ciência, das letras e das artes”, quanto para “o exercício da cidadania”. O
documento cobra dos cursos de filosofia uma especial atenção com a formação do
professor de filosofia, mas não apresenta novidade alguma em relação ao seu ensino.
De acordo com nossa hipótese de trabalho o sentido e a tarefa do ensino da
filosofia no primeiro e segundo graus é “Ensinar a Pensar”. Acreditamos que tal questão
MONTEIRO, João Paulo. O ensino da filosofia no segundo grau - A filosofia e o ensino da filosofia. Encontro Nacional de
Professores de filosofia. São Paulo: Convívio, 1979. págs. 69-84
6
Descrição da situação da área, padrões de qualidade e avaliação para fins de autorização de projetos de cursos de graduação em
filosofia. MEC/ Coordenação das comissões de especialistas de ensino. Comissão de especialistas de ensino de filosofia. CEEFILO.
Texto mimeografado. P.4
7
4
não foi suficientemente levada em consideração, tanto no nível dos debates quanto às
formulações das propostas de programas. E para nós esta é uma das principais causas do
fracasso do ensino da filosofia. Não aceitamos que foram perseguição política e
ideológica os principais fatores responsáveis pelo insucesso do ensino da filosofia no
primeiro e segundo graus. Não seria a confusão reinante em relação ao ensino da
filosofia, onde cada um faz o que lhe parece melhor, sua maior ameaça?
Partimos do pressuposto de que a questão do ensino da filosofia precisa de uma
mudança do eixo das discussões: ao invés de perguntarmos se é mais adequado trabalhar
com temas antigos ou modernos, se com história da filosofia ou lógica, se ética ou
metafísica, deveríamos perguntar como, apoiados na filosofia, promovermos uma
educação para o pensar?
Não se afirmando como necessária, buscam-se outras vias para garantir o ensino
da filosofia, como, por exemplo, pela obrigatoriedade da lei ou pela cobrança de seus
conteúdos no vestibular, o que consideramos
um verdadeiro absurdo, como já é
realidade na Universidade Federal do Triângulo.8
A obrigatoriedade do ensino da filosofia, pela força da lei ou qualquer outro
recurso, não é uma boa razão a demostrar que de fato ela não é uma necessidade
intrínseca? Se de fato fosse uma necessidade e se houvesse uma consciência de sua
importância seriam necessários sua imposição por força da lei ou cobrança de seus
conteúdos no vestibular?
O grande debate das ultimas três décadas sobre o ensino da filosofia, na verdade,
consistiu, também, num movimento de pressão para o retorno da filosofia na educação de
primeiro e segundo graus. Na perspectiva da legalidade podemos afirmar que o
movimento foi vitorioso, visto que, a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, ( Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1997), em seu artigo 36 determina, no
parágrafo primeiro, que “os conteúdos, as metodologias e as formas de avaliação serão
organizadas de tal forma que ao final do ensino médio o educando demostre: (...) III .
domínio dos conhecimentos de Filosofia e Sociologia necessários ao exercício da
cidadania”.
8
CASTR0, Rogério P. Ensino da filosofia no segundo grau. Informativo PUC- Minas. Ano II. Nº 170, setembro de 1997. P. 06
5
Na leitura do documento do MEC - “Padrões de Qualidade”- , afirma-se: “ De
qualquer maneira que seja regulamentado este artigo 36 da nova LDB, é evidente que o
ensino da Filosofia se expandirá de maneira rápida, tornando-se urgente mesmo o reforço
quantitativo e qualitativo dos cursos que preparam os professores para o ensino médio,
principalmente as Licenciaturas”. De acordo com a leitura que fazemos, a ausência da
filosofia, como disciplina regular, na educação de primeiro e segundo graus, não deve ser
imputada à falta ou não de uma legislação que a obrigue de forma compulsória, mas
deve-se, sobretudo, ao fato de ela própria não se impor como conteúdo necessário,
agradável e capaz de seduzir os próprios alunos. Mas por outro lado, achamos
absolutamente justas as recomendações do documento em relação à formação do
professor: “ Deverão merecer especial atenção as condições sob as quais o licenciado em
filosofa será formado, não se tratando de apenas “agregar” disciplinas ditas “pedagógicas
a um currículo mínimo de disciplinas ditas “específicas”, mas sim de produzir um
processo de formação integrada, que prepare o licenciado para o exercício de suas tarefas
didáticas na escola”.(MEC - Op. Cit. p.03)
Diante de um quadro minimamente indicado, podemos perguntar: já não é tempo
de justificar o ensino da filosofia pelos seus resultados, ao invés de lindas argumentações
ou pela obrigatoriedade da lei? Trabalhamos com a idéia de que a filosofia não é um
conteúdo a ser ensinado mas, ao contrário, como defende Lipman: a filosofia tem como
tarefa fundamental o ensinar a pensar e o caminho para tal é mediante o fazer filosofia.
Portanto não se trata de ensinar história da filosofia, ética , epistemologia, estética ou
qualquer outra disciplina filosófica no primeiro e segundo graus, tal tarefa é para
graduação e pós-graduação. Devemos, sim, buscar nestas disciplinas os elementos
necessários para construirmos uma educação para o pensar.
Neste sentido estamos tendo uma experiência significativa no Departamento de
Filosofia (DFIL) da Universidade Federal de Juiz de Fora. (UFJF). Depois de reavaliar
seus trabalhos e sua realidade acadêmica global, o DFIL
definiu coordenadas de
prioridades visando o aprimoramento de suas ações acadêmicas. Em relação à formação
do professor, diversas ações foram implementadas com o objetivo de melhorar a
qualidade da formação do futuro professor de filosofia. Dentre elas a criação e
implementação do Núcleo de Estudos e Pesquisa de Filosofia na Educação (NEFE) . Sob
6
minha coordenação estruturamos um “grupo de trabalho” que tem desenvolvido diversas
atividades sobre a temática, como por exemplo: pesquisa e extensão - “Filosofia no 2o.
grau: diagnóstico e propostas de ação”, registro 019184/95-60;
pesquisa e ensino-
Programa de aulas experimentais, registro nº 18239/96-03, pesquisa e ensinoPrograma de de Treinamento Profissional- Filosofia para crianças - registro nº 233071016099/96-67. Pesquisa - Leitura latino-americana do programa de filosofia para
crianças: Freire e Lipman , registro nº 14481/97-90.
Com o trabalho de pesquisa e extensão de 1995- Filosofia no segundo grau:
diagnóstico e propostas de ação - sentimos um certo desânimo em relação às
perspectivas do ensino da filosofia tal como vem sendo discutido e proposto. A partir de
então, iniciamos um processo de mudança em nossas ações, exorcizando o ensino da
filosofia tal como tradicionalmente se fez, ou seja, apenas conteudesco.
Os princípios que passaram a nortear nossas ações foram: 1- Não é a lei que
garantirá o sucesso do ensino da filosofia no primeiro e segundo graus; 2- O objetivo da
filosofia no primeiro e segundo graus não é a formação de filósofos, portanto, fica
descartada a idéia de estabelecer
programas a partir de disciplinas do curso de
filosofia.(cultura filosófica); 3- O papel da filosofia é contribuir na formação de
estudantes para que pensem melhor, isto é, sejam capazes de refletir com inteligência
sobre questões previamente definidas. 4- A importância e a necessidade da filosofia será
reconhecida quando os professores de filosofia tornarem esse saber desejado por aqueles
aos quais é dirigido. 5- O ensino da filosofia no primeiro e segundo graus deverá ser um
Programa de Educação para o Pensar.
Nossa aproximação com o programa de filosofia para crianças foi justamente por
entendermos que Matthew Lipman teve uma percepção brilhante ao buscar caminhos
concretos para
o ensino da filosofia. É o que estamos experimentando com
a
implantação do Programa de Lipman na rede pública e rede privada de educação de Juiz
de Fora. Assim sendo, indicamos os caminhos de Lipman como uma alternativa para o
ensino da filosofia no primeiro e segundo graus.
Por que Matthew Lipman?
7
Em primeiro lugar pela sua contribuição ao ensino da filosofia. Um dos aspectos
mais problemáticos no que diz respeito ao ensino da filosofia é o como fazer da aula de
filosofia, “filosofia” e não meramente cultura filosófica. Os trabalhos que estamos
realizando nesta área têm revelado que um dos problemas fundamentais, bem como uma
das razões para a não aceitação da filosofia é justamente o equívoco muito comum entre
nós, professores de filosofia , em confundir “filosofia” com “cultura filosófica”. Neste
sentido é pertinente a observação de Heidegger:
Os equívocos de que a filosofia se vê constantemente cercada são mais fomentados pelo que nós mesmos
fazemos, i é, pelos professores de filosofia. Com efeito, nossa tarefa habitual - justificada e até útil - consiste
em proporcionar certo conhecimento informativo das filosofias até agora surgidas, o que aparece como sendo
a própria filosofia, quando, no mínimo, é apenas ciência filosófica 9
Em geral os livros dedicados ao ensino da filosofia, principalmente os de segundo
grau e cursos básicos do ensino superior são roteiros de cultura filosófica. Como bem diz
o professor Regis de Morais, tais obras servem apenas para atenazar a vida e a cabeça
dos estudantes. “Uma coisa mumificada que não bule nem com o sangue nem com os
entusiasmos dos estudantes”.( Reflexão. PUCCAMP. Ano XV. jan/abr. de l989. p. 07)
Em relação à dificuldade acima indicada, o nosso interesse em relação a Matthew
Lipman é justamente pelo fato de entendermos que um dos grandes méritos de sua
proposta pedagógica é justamente o de apontar caminhos concretos de como “fazer
filosofia” e não apenas “cultura filosófica”.
Por outro lado, é evidente a contribuição da filosofia em relação à educação em
geral. Hoje é lugar comum o reconhecimento da importância da filosofia na construção
de uma educação para o pensar, como por exemplo na proposta de Conteúdos Básicos
para o Ciclo Básico de Alfabetização (CBA) da Secretaria de Estado da Educação de
Minas Gerais, que em relação aos Métodos de ensino propõe: “Defende-se, nesta
proposta curricular, a adoção de didáticas mais atualizadas no „aprender a aprender‟ ou
no „saber pensar‟, cujo móvel fundamental é a atitude de pesquisa”(p.17) Ou os
Parâmentros Curriculares Nacionais que propõem como um dos objetivos do ensino
fundamental que os alunos sejam capazes de: “questionar a realidade formulando-se
problemas e tratando de resolvê-los, utilizando para isso o pensamento lógico, a
HEIDEGGER, M. Einführung in die Metaphysik, Tubingen, 1953. P. 09. Citado por
existencial. EPU. p. 20
9
Luijpen, Introdução à fenomenologia
8
criatividade, a intuição , a capacidade de análise crítica, selecionando procedimentos e
verificando sua adequação.” (p.108)
A questão que colocamos é: Como fazer uma educação para o pensar? Como
ensinar a aprender? Como desenvolver a capacidade de análise crítica?
Indiscutivelmente a filosofia poderá dar grande contribuição a tal propósito. Mas,
como buscar na filosofia a sua verdadeira contribuição à educação? É justamente o que
Matthew Lipman indica no Programa de Filosofia para Crianças: o como fazer uma
educação para o pensar. E não seria este o objetivo fundamental da filosofia na educação
de primeiro e segundo graus?
Uma das teses de Lipman é a de que o pensar é uma atividade que não se adquire
espontaneamente, portanto precisa ser desenvolvida. E isso é justamente o que tematiza
em seu método inovador de educação para o pensar. Não se trata de “decorar” nomes de
filósofos e suas doutrinas, pois o projeto pedagógico de Lipman é a tentativa de uma
educação integral: seu programa aposta no diálogo, na “Comunidade de Investigação”, a
partir de histórias, especialmente preparadas para instigar nos alunos a dúvida e o hábito
de levantar e problematizar questões que nunca se fecham numa resposta pronta. Uma
educação calcada apenas na transmissão do conhecimento, segundo Lipman, é incapaz de
responder às exigências de uma sociedade em profundas transformações:
Na perspectiva do saber tradicional, o objetivo da educação é tomar as crianças ignorantes e torná-las cultas
através da transmissão do conhecimento possuído pelos adultos. (...) Embora seja um modelo perfeito para
uma tribo relativamente fixa- isto é, bem adaptada a um ambiente imutável- é virtualmente suicida para uma
sociedade em que a mudança ocorre numa velocidade tal que o conhecimento que nos capacita para trabalhar
com sucesso hoje será obsoleto daqui a uma década. (Lipman, 8 p.55)
O projeto pedagógico de Lipman é articulado na perspectiva da investigação. O
Programa de Filosofia para Crianças tem como meta fundamental a transformação da sala
de aula numa Comunidade de Investigação. Onde:
os alunos dividem opiniões com respeito, desenvolvem questões a partir das idéias de outros, desafiam-se
entre si para fornecer razões a opiniões até então não apoiadas, auxiliarem uns aos outros ao fazer inferências
daquilo que foi afirmado e buscar identificar as suposições de cada um. ( Lipman 09, p. 31)
9
A condição fundamental para a instauração da Comunidade de Investigação é o
diálogo que vai além da dimensão professor-aluno. Na Comunidade de Investigação o
diálogo passa a circunscrever todos os aspectos, fundamentalmente entre aluno-aluno e
aluno-professor. Nesta perspectiva o professor deixa de ser visto como autoridade
informacional. Diz Lipman:
Quando o professor é visto como uma fonte de informações, ... Isso cria um padrão de intercâmbio alunoprofessor que frustra o objetivo da filosofia para crianças porque mina a noção de Comunidade e, em seu
lugar, legitima a noção do professor enquanto autoridade informativa, e dos alunos enquanto aprendizes
ignorantes. Numa Comunidade de Investigação, professores e alunos estão juntos como co-investigadores, e o
professor tenta promover isto encorajando o intercâmbio aluno-aluno, tanto quanto aluno-professor. (Issao e
Guga, Manual do professor. P. 21)
Esta relação dialógica proporciona uma nova dimensão de afetividade, uma nova
compreensão do outro como agente facilitador para a construção do conhecimento e
coloca em cheque a postura do professor como único pólo de difusão do
saber,
significando assim que “o professor deve renunciar ao papel de autoridade informativa,
não ao papel de autoridade instrutiva”( Issao e Guga Op. Cit. p. 21) . O professor passa a
integrar-se como um participante cuja opinião não é conclusiva.
Com sua proposta de Filosofia para Crianças - Educação para o Pensar - o prof.
Lipman desenvolve uma metodologia que trabalha uma das questões que consideramos
ser uma das principais exigências da educação hoje: “ensinar a Pensar”. Trabalhamos
com a hipótese de que este é o sentido e a tarefa do ensino da filosofia no primeiro e
segundo graus, e que , portanto, os cursos de formação de professores de filosofia, no
Brasil, deveriam da uma especial atenção ao Programa de Filosofia para Crianças do
Professor Matthew Lipman.
BIBLIOGRAFIA:
01- ANTONIAZZI, Alberto. O filósofo volta ao mercado. Atualização, nº 9., p. 560566. 1978
02- ASSMAN, Hugo. Paradigmas educacionais e corporeidade. 2 ed. Piracicaba:
UNIMEP, 1995
03- ASSMAN, Hugo. Alguns toques na questão “O que significa aprender?” Impulso:
Revista de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Metodista de Piracicaba
Vol.10, 1997. N.º. 21. Págs.71-82
1
0
04- CABRAL, Roque. Filosofia no ensino secundário e na universidade.: continuidade
ou ruptura? Presença filosófica. Rio de Janeiro- Vol. XVI , nº 1. P. 109-114
05- CORDI, Cassiano et alii. Para filosofar. São Paulo: Scipione, 1995
06- GIANNOTTI, José Artur. Ser ou não ser professor de filosofia. Reflexão. Ano V, nº
p. 30-33. Set/dez, 1980
07- LAGUEUX, Maurice. Por que ensinar filosofia? Reflexão. Ano V, nº 18, p. 12-29
set/dez. 1980.
08- LIPMAN, Matthew. A filosofia vai à escola. Trad. Maria Elice de B. Prestes e Lucia S. Kremer. São Paulo:
Summus, 1990
09- --------O pensar na educação. Trad. De Ann Mary Fighiera Perpétuo. Petrópolis: Vozes, 1995.
10- LIPMAN, Matthew, SHARP, Ann Margaret e OSCANYAN, Frederick S. A filosofia na sala de aula. Trad. Ana
Luiza Falcone. São Paulo: Nova Alexandria, 1994
11- MARIA, Joaquim Parron. Novos paradigmas pedagógicos - para uma filosofia da educação. São Paulo: Paulus,
1996.
12- MORAIS, Regis de. Filosofia no 2o. grau: uma inovação que tomei aos antigos
Reflexão. Filosofia no 2o. grau. Campinas. Vol. XV. Nº 43. jan./abril/1989 p. 07
13- NAVIA. Ricardo J. El problema de la motivación en la enseñanza media de la
filosofia- La enseñanza media de la filosofia. Reflexão. Filosofia no 2o. grau.
Campinas. Vol. XV. Nº 43. p. 26-34. jan./abril/1989
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