PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
VILMA SILVA LIMA
As regras da TV Universitária: lutas para a constituição de
um campo
DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
SÃO PAULO
2011
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
VILMA SILVA LIMA
As regras da TV Universitária: lutas para a constituição de
um campo
Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em
Ciências Sociais sob a orientação da Profa. Doutora Silvia Helena Simões
Borelli
DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
SÃO PAULO
2011
Banca examinadora
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Dedicatória
Ao meu maior e eterno mestre que soube ser parceiro no
exercício diário dessas lições: João Elias
Aos meus filhos, Rodrigo e Pedro e enteados Gabriel e Vitor
que este trabalho sirva de estímulo aos desafios da vida.
Agradecimentos
Seria impossível hierarquizar as dezenas de pessoas, que de uma forma ou de
outra, estiveram presentes nesta longa jornada.
Todas elas são especiais,
independentemente de sua participação ativa ou não na produção desse trabalho. E todas
merecem meus agradecimentos. Na certeza de cometer injustiças tentarei elencar seus
nomes não em ordem de importância, mas na medida em que eles e as imagens dessas
pessoas aparecerem em minha lembrança: Angela Fernandes, Samuel Paiva, Regina
Tavares, Luana Carregari, Gabriel Priolli, Adriano Adoryan, Eliana Nogueira, Mary
Wakabara, Sandra Botelho, Sandra Reimão, Ricardo Terra, Kelly Pereira, Daniela
Barbassa, Carlos Fernando, Luiz Alberto de Farias, Willian Santanna, Inês Conforto,
Marília Franco e tantos outros amigos queridos que para nomeá-los teria que ocupar o
espaço de outra tese. Agradeço também à minha família: Vera, Taynara, Tuany,
Rodrigo, Pedro, Val e os gêmeos.
Ao João Elias, mais do que agradecer e dedicar o trabalho, tenho que pedir
desculpas pelas noites mal dormidas, crises de choros e muitas vezes desespero.
À Silvinha, pelo apoio, orientação e indicação da Vera (um anjo que apareceu
em minha vida).
À Universidade Cruzeiro do Sul pelo apoio.
Aos amigos do Canal Universitário de São Paulo.
Aos amigos do Campus Virtual Cruzeiro do Sul.
E ao CNPQ, pela concessão da bolsa.
Resumo
LIMA, Vilma Silva. As regras da TV Universitária: lutas e constituição de um
campo. 2011. Tese (Doutorado) – Programa de Ciências Sociais, Pontifícia
Universidade Católica, São Paulo, 2011.
As relações entre os campos universitário/científico e o televisivo e as tensões
que se criaram para a constituição de um campo televisivo universitário são objeto deste
trabalho.
O objetivo principal do trabalho é a partir da análise do campo universitário e do
campo televisivo – compreender – o lugar ocupado pela tevê universitária na imbricação
com esses campos. Tomou-se como exemplo paradigmático as televisões universitárias
que fazem parte do Canal Universitário de São Paulo (CNU-SP), primeiro canal
universitário do País a fazer uso da Lei do Cabo (8.977) que em seu artigo 23
disponibiliza para uso gratuito das universidades de sua área de prestação de serviço um
canal de televisão.
A fundamentação teórica teve em Bourdieu e nos conceitos de habitus e campo
suas principais referências. A metodologia incluiu pesquisas bibliográficas e de campo
com 4 (quatro) agentes (diretores) das tevês universitárias que participam do CNU-SP.
Palavras-chave: televisões universitárias; universidade; televisão; habitus, campo
social
Abstract
LIMA, Vilma Silva. The rules of the University TV: struggles and constitution of a
field. 2011. Thesis (Ph.D.) - Program of Social Sciences, Catholic University, São
Paulo, 2011.
The relations between the camps university / scientific and the television and the
tensions that arose for the establishment of a television field are the subject of this
university.
The main objective of this work is based on the analysis of the university
campus and field television - understand - the role played by TV at university overlap
with those fields. Was taken as a paradigmatic example of the televisions that are part of
the University Channel University of São Paulo (SP-CNU), the first university channel
in the country to make use of theCable Law (8977) which in its Article 23 provides for
free use of universities its area of service a television channel.
The theoretical approach was in Bourdieu and the concepts of habitus and field
his main references. The methodology included literature searches and field with four
(4) agents(directors) of TV universities that participate in the CNU-SP.
Keywords: university TV; university; television; habitus; social Field.
Sumário
Introdução............................................................................................................................................. 16
Capítulo 1
1 Trajetórias do Campo Universitário ............................................................................................... 26
1.1 A Universidade: colocando o time em campo ..................................................................... 27
1.2 A Universidade na contemporaneidade ............................................................................... 34
1.3 A Universidade no mercado ou o mercado da Universidade .............................................. 37
1.4 Brasil – A Universidade tardia ............................................................................................ 41
1.5 Um raio X da Educação Superior ........................................................................................ 46
1.6 O campo Universitário ........................................................................................................ 60
Capítulo 2
2 O campo televisivo: formulações contemporâneas......................................................................... 67
2.1 A tevê e seus desdobramentos na vida em sociedade .......................................................... 68
2.2 Das aventuras de Chatô à tevê segmentada e digital ........................................................... 70
2.3 A televisão por assinatura.................................................................................................... 75
2.3.1 Tevê por assinatura e a distribuição dos sinais .................................................... 77
2.3.2 Distribuição por micro-ondas .............................................................................. 78
2.3.3 Distribuição por satélite ....................................................................................... 78
2.3.4 Distribuição por cabo .......................................................................................... 79
2.3.5 Distribuição pelo TVA – Serviço Especial de TV por Assinatura ...................... 80
2.3.6 Legislação ............................................................................................................ 80
2.4 A televisão segmentada ....................................................................................................... 81
2.5 Tevê digital .......................................................................................................................... 85
2.5.1 Panorama da tevê digital no mundo .................................................................... 90
2.6 A tevê brasileira e seus modelos: público, estatal e privado ............................................... 95
2.6.1 Os modelos públicos no contexto da digitalização ............................................ 103
2.7 O campo televisivo ............................................................................................................ 104
2.8 Universidade e televisão – tensões em campo .................................................................. 120
Capítulo 3
3 Televisão universitária: modos de fazer ........................................................................................ 124
3.1 A tevê educativa na contemporaneidade ........................................................................... 125
3.2 A televisão da universidade ............................................................................................... 135
3.2.1 A televisão universitária e seus agentes ............................................................ 139
3.2.2 O perfil das tevês universitárias do Brasil ......................................................... 142
3.2.2.1 Programação baseada no gênero discursivo............................................ 149
3.2.2.2 A tevê especializada: ciência e difusão do conhecimento ...................... 151
3.2.2.3 TV Universitária e a prática do ensino ................................................... 152
3.2.2.4 TV Universitária e a prática da pesquisa e da extensão .......................... 154
3.2.3 Tevê universitária: entre a ciência e o senso comum ........................................ 157
3.2.4 Há espaço para a universidade fazer tevê .......................................................... 160
Capítulo 4
4 Canal Universitário de São Paulo: antena coletiva para as tevês das universidades
Paulistanas ..................................................................................................................................... 163
4.1 Uma apresentação necessária ............................................................................................ 164
4.2 O aquecimento: CNU–SP: a universidade fazendo tevê ................................................... 165
4.3 Apresentação do Time: Habitus e dinâmicas do Canal Universitário de São
Paulo ........................................................................................................................................ 167
4.3.1 Apresentação do time: as tevês universitárias do CNU-SP ............................... 176
4.3.2 Apresentação do Time: diversidade de objetivos; convergência na
produção ............................................................................................................. 189
4.3.3 Apresentação do Time CNU-SP: os agentes em campo .................................... 192
4.4 Televisões Universitárias de São Paulo: apropriação das linguagens da
universidade pela televisão e da televisão pela universidade .......................................... 195
4.5 Pesquisa: O que está em jogo nas tevês universitárias de São Paulo ................................ 199
4.5.1 Apresentando os jogadores: pesquisa com diretores ......................................... 202
4.5.1.1 Coerências e incoerências em jogo ......................................................... 205
4.5.2 Os cartolas em campo: pesquisa com reitores ................................................... 214
4.6 Fim de jogo: resultados das pesquisas ............................................................................... 217
4.6.1 Agentes : trajetórias e disposições ..................................................................... 219
4.7 CNU-SP: uma tentativa de emancipação .......................................................................... 222
Considerações Finais .......................................................................................................................... 227
Referências .......................................................................................................................................... 231
Anexos
............................................................................................................................................. 245
Lista de Figuras
Figura 1 - Instituições Universitárias
Figura 2 - Regiões / Números de Instituições
Lista de Gráficos
Gráfico 1 - Número Instituições de Ensino – 2009
Gráfico 2 - Regiões / Evolução número de matrícula
Gráfico 3 - Regiões / Números de Inscritos
Gráfico 4 - Regiões / Número de Concluintes
Gráfico 5 – Evolução matrículas de Graduação
Gráfico 6 – Evolução Cursos / Região
Gráfico 7 - Oferecimento de Cursos Presencial e a Distância
Gráfico 8 - Professores
Gráfico 9 - Alunos / Professor Doutor
Gráfico 10 - Regiões /Doutor
Gráfico 11 – Assinante por tecnologia
Gráfico 12 –Políticos proprietários de RTV
Gráfico 13 - Audiência Nacional – 2008
Gráfico 14 - Quota de Mercado– 2008
Gáfico 15 - Números de emissoras comerciais por rede – 2008
Gáfico 15 - Números de emissoras comerciais por rede – 2008
Gráfico 16 – IES no Brasil
Gráfico 17 – Universidades com TV
Gráfico 18 – Estrutura da instituição
Gráfico 19 – Relação institucional
Gráfico 20 – Sistema operacional
Lista de Quadros
Quadro 1 - Normas e Regulamentação
Quadro 2 - Desaceleração do Crescimento das IES
Quadro 3 - Matrículas por Organização Acadêmica
Quadro 4 – 10 Maiores cursos
Quadro 5 - Número matrículas Período
Quadro 6 - As 10 Maiores Universidades do Brasil
Quadro 7 – Calendário da TV Digital no país
Quadro 8 – Padrões Tecnológicos
Quadro 9- Fim das transmissões analógicas (switch-off)
Quadro 10 – Vendas receptor digital
Quadro 11 - Fim das transmissões analógicas (switch-off)
Quadro 12 – Origem Familiar dos proprietários de TVs no Brasil
Quadro 13 - Outorgas de televisão controladas por políticos
Quadro 14 - Veículos das 4 maiores redes de TV e suas afiliadas
Quadro: 15 – Emissoras Educativas – vinculação
Quadro 16 - Assuntos Projeto Pauliceia em Debate
Quadro 17 - Desafio Brasil (agosto de 2005 a junho de 2006)
Quadro 18 - Cenário que compreende o espaço de produção das televisões universitárias
participantes do CNU-SP.
Quadro 19 – Agentes das tevês universitárias
Quadro 20 – Perfil dos Agentes do Campo
Quadro 21 – habitus dos entrevistados
Lista de siglas
ABEPEC - Associação Brasileira de Emissoras Públicas Educativas e Culturais
ABERT – Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão
ABMES - Associação Brasileira Das Mantenedoras Do Ensino Superior
ABTA - Associação Brasileira de TV por Assinatura
ABTU – Associação Brasileira de Televisões Universitárias
ADTB-T - Advanced Digital Television Broadcast-Terristrial
Anatel – Agência Nacional de Telecomunicações
Ancine - Agência Nacional do Audiovisual
ANDIFES- Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino
Superior
ATSC - advanced television systems committee
CDTB-T - Chinese Digital Television Broadcast-Terrestrial
CNN – Cable News Network
CNU-SP – Canal Universitário de São Paulo
COC – Curso Osvaldo Cruz
CONTEL - Conselho Nacional de Telecomunicações
CRUB - Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras
DMB-T - Digital Multimedia Television Broadcasting-Terrestrial
DTH – Direct to Home
DVB - digital video broadcasting
EAD – Ensino a Distância
EBC - Empresa Brasil de Comunicação
EDTV - Enhanced Definition Television
ENADE - Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes
EPCOM – Estudos de Pesquisa da Comunicação
FCBTV - Fundação Centro Brasileiro de TV Educativa
FCC - Federal Communications Commission
FNDC - Fórum Nacional para a Democratização da Comunicação
HDTV - High Definition Televisin
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IES – Instituições de Ensino Superior
INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
ISDB - integrated services digital broadcasting
ISDB-Tb - International System for Digital Broadcasting - Terrestrial Brazil
Lavid - Laboratório de Vídeo Digital
LDB - Lei de Diretrizes e Base
MEC - Ministério de Educação e Cultura
Minicom - Ministério das Comunicações
MMDS – Multipoint Multichannel Distribution System
MTV – Music Television
NBR – Canal de Televisão do Brasil
PBS - Public Broadcasting Service
PNE - Plano Nacional de Educação
RART - Rede Amazônica de Rádio e Televisão
RBS - Rede Brasil Sul de Televisão
RNCP - Rede Nacional de Comunicação Pública
SACI - Satélite Avançado de Comunicações Interdisciplinares
SARFT - State Administration of Rádio, Film and Television
SBT – Sistema Brasileiro Televisão
SBTVD - Sistema Brasileira de TV Digital
SDTV - Standard Definition Television
SEB – Sistema Educacional Brasileiro
SEED – Secretaria de Educação a Distância
SESC – Serviço Social do Comércio
SET - Sociedade Brasileira de Engenharia de Televisão e Telecomunicações
SINRED – Sistema Nacional de Radiodifusão Educativa
SMCC - Synchronized multi-Carrier CDMA
TVA - Serviço Especial de TV por Assinatura
TVE – Televisão Educativa
UHF – Ultra Hight Frequency
VHF – Very High Frequency
Introdução - Universidade e tevê no Brasil: caminhos cruzados
As esquinas nas quais universidade e tevê se cruzam são muitas. A
universidade surgiu nas décadas iniciais do Século XX como parte do processo de
modernização do país. O Estado foi inicialmente seu único mecenas e responsabilizouse por todas as etapas de sua implantação, orientada, num primeiro momento, para
atender a uma parcela privilegiada da sociedade (Bosi, 1992).
A tevê surgiu também em função do processo de modernização, fazendo parte
de ―[...] um importante período de mudanças na estrutura econômica, social e política‖
(Mattos, 2002:27). O mecenas de plantão, porém, foi o ―excêntrico empresário‖, Assis
Chateaubriand (Mello, 1994), que transformou a novidade tecnológica importada em
bem acessível a poucos que podiam comprar o aparelho e acessar as mensagens
audiovisuais. Segundo Mattos (2002:78), esta é a fase elitista da tevê brasileira1.
Tendo o Estado como catalisador de suas ações, tanto universidade quanto tevê
desenvolveram-se e ampliaram sua presença na sociedade brasileira. Coube ao Regime
Militar – 1964/1985 – definir os padrões existentes hoje para ambas. Para a
universidade, mudança radical em seus rumos: saíram os modelos implantados ao
longo da primeira metade do século XX, nos quais o Estado é o principal agente do
processo de organização e oferecimento de vagas, e entrou a iniciativa privada,
financiada pelas mensalidades e pelas verbas concedidas pelo Estado por meio de
bolsas, financiamentos e filantropia. Para a tevê, o Regime implantou, com dinheiro
público, a infraestrutura necessária, atraiu fabricantes dos aparelhos e organizou
vendas financiadas, o que possibilitou o acesso de grande parte das famílias brasileiras
ao meio de comunicação que se tornaria, a partir daí, o principal meio para veiculação
de ideias.
Sustentada pelo sistema publicitário a tevê serviu ao propósito de difundir os
valores da sociedade de consumo e, ao mesmo tempo, o ideário do Regime Militar.
1
SODRÉ (1997:95) relata que a ausência de uma estrutura comercial e a pequena audiência
formada pela elite foram fatores determinantes que levaram a tevê a enfatizar certos tipos de
programas. Por exemplo: em 1954, quando o televisor ainda era considerado um bem de luxo, o
IBOPE (Instituto Brasileiro de opinião Pública) divulgou que 48% dos proprietários de aparelhos
tinham assistido a uma apresentação de Ballet.
1
―Coincidentemente, nos anos sessenta, tanto a Unesco como os Estados Unidos
estavam aconselhando a utilização dos meios de comunicação de massa para promover
o desenvolvimento nacional‖ (MATTOS, 2002:27).
Para operar o sistema, o empresário ―excêntrico‖, foi substituído pela Rede
Globo, empresa organizada a partir de padrões técnicos, tecnológicos e estéticos de
emissoras dos EUA. A tevê deixou de ser uma aventura para ser um investimento
estratégico (Mattos, 2002), operado por empresas privadas, focadas em metas
mercadológicas e na eficiência operacional. O ―Padrão Globo de Qualidade‖, slogan
veiculado insistentemente, há décadas, pela Rede Globo, resume a filosofia adotada
pela empresa em sintonia com o Estado brasileiro, durante e depois do Regime Militar,
o que levou Mello (1994)2 a afirmar que a emissora tem uma vocação ―governista‖ e
Mattos (2002), a demonstrar a intervenção direta e indireta do Estado no
desenvolvimento da tevê no Brasil, principalmente a partir de 1964. Segundo este
autor ―O governo é quem decide até o tipo de tecnologia a ser utilizada‖ (Mattos,
2002:44).
Desde o seu início a tevê tem sido estudada a partir de vários pontos de vista,
dos mais pessimistas, "apocalípticos" (Eco, 1970), que enxergam a cultura de massa
como uma "anticultura", aos mais otimistas, "integrados" (Eco, 1970), que a veem
como um fenômeno, uma possibilidade de crescimento do campo cultural. A
universidade, por sua vez, também não escapa aos antagonismos de sua comunidade,
que ora a vê como guardiã da produção científica e cultural da sociedade e ora, como
ideário do neoliberalismo, tendo sido incorporada ao mercado como resultado do
processo de globalização (Bosi, 1992).
Dicotomias à parte, buscando uma reflexão acerca da televisão e da
universidade em tempos de globalização e de mudanças nos modelos vigentes, este
trabalho pretende superar as cisões existentes nas perspectivas das análises citadas.
Para isso, tem-se como objeto de estudo o Canal Universitário de São Paulo (CNUSP), que veicula a programação produzida por tevês de universidades paulistanas.
2
Geraldo Anhaia Mello, na versão escrita do documentário da televisão inglesa Channel 4, Brasil:
Beyond Citizen Kane, sobre a Rede Globo.
2
A proposta inicial para esta pesquisa tinha em vista aferir a recepção da
programação veiculada pelo CNU/SP. Porém, em 2007, o Canal Universitário de São
Paulo realizou uma pesquisa quantitativa encomendada pelas Instituições que o
compunham3. Tal pesquisa constatou que, depois de dez anos no ar, era irrelevante o
número de alunos e professores que viam a sua programação.
A pesquisa citada contribuiu para o redirecionamento desta tese, já que, de
posse dos dados, os quais, num primeiro momento, indicavam haver um
distanciamento entre tevê universitária e seu público de maior interface dentro do
segmento universitário, ou seja, professores e alunos, vários pressupostos foram
levantados: inadequação da programação; qualidade editorial e técnica; meio de
veiculação; entre outros. A perspectiva primeira de realização de uma pesquisa com
ênfase na recepção foi descartada, já que o público - alunos e professores - que seria o
foco, a audiência esperada do CNU/SP, não acompanha sua programação. Como fazer,
então, um estudo de recepção e analisar a programação de um canal que não é visto
por aqueles que seriam, aparentemente, seu "principal" público?
Neste momento é oportuno fazer um recorte, visando especificar algumas
posições: não se entende que o único público de um Canal Universitário sejam alunos
e professores. Estes constituem-se como público "idealizado", no entanto não se pode
esquecer os demais públicos, uma vez que o Canal Universitário de São Paulo é
veiculado por cabo e, em função disso, pode ser visto por qualquer telespectador,
desde que este tenha acesso a essa modalidade de tevê. Além disso, uma das
afirmações mais recorrentes junto aos produtores/diretores do setor, acerca da
recepção da programação, aponta para um público "zapeador", ou seja, aquele que, à
procura de uma programação não específica, ao passar pelo canal, permanece em
função de seu interesse pelo tema que está sendo exibido naquele momento.
Importante ressaltar que essa fragilidade verificada no CNU/SP é realidade em todos
os Canais Universitários do País, como pode ser observado nos documentos
produzidos pela Associação Brasileira de Tevês Universitárias - ABTU - e em
diversos fóruns do segmento4.
3
Material interno do CNU/SP, disponível para consulta na entidade.
Disponíveis em www.abtu.org.br. Tais documentos serão utilizados na análise da construção e
desenvolvimento da tevê universitária no Brasil, capítulo 3 desta tese.
3
4
Na busca de pistas que orientassem o desenvolvimento do trabalho, decidiu-se,
no primeiro semestre de 2008, pela realização de uma pesquisa experimental com (12)
doze pesquisadores-professores (sem vínculo com o CNU-SP), com o objetivo de
identificar assuntos relevantes que, em sua opinião, deveriam ser abordados numa tevê
universitária; além disso, questionou-se o conhecimento sobre o segmento Tevê
Universitária, introduzindo a entrevista com a pergunta: você conhece ou já ouviu
falar na tevê universitária?
Outro assunto abordado nessa entrevista foi a pré-disposição negativa da
academia em relação à televisão. Segundo Siqueira (2008 - Doc eletrônico),
analisando esse meio do ponto de vista da divulgação científica, o uso que se faz da
televisão no Brasil ainda é problemático. Uma possível explicação para essa ―prédisposição negativa‖, bem como para seu ―uso problemático‖ talvez seja a questão do
tempo televisivo. Para Bourdieu (1997), existe um ―elo entre o pensamento e o tempo‖
e, considerando que a tevê se submete à lógica do mercado, torna-se inimiga do
pensamento, criando, segundo o autor, a figura do fast-thinkers (pensadores rápidos),
que, a partir de ―ideias feitas‖, analisam temas diversos. O autor afirma ainda que,
visto tratar-se de ideias feitas, ou seja, opostas ao pensamento, não propiciam sequer a
comunicação. O pesquisador, diante da possibilidade de expor seus pensamentos na
tevê, vê-se num dilema: ocupar o espaço midiático correndo o risco de submeter o
conhecimento científico à lógica da tevê ou recusar-se e manter-se no âmbito das
formas de comunicação legitimadas pelo ethos científico.
A relação tevê/conhecimento científico suscitou diversas afirmações por parte
dos entrevistados. As ideias apresentadas demonstram haver relativo consenso entre
eles e as considerações de Bourdieu, ou seja, entendem que tevê e pensamento crítico
são incompatíveis, têm tempos e objetivos diferentes, habitus e ethos que os separam,
como pode ser observado nos excertos das entrevistas transcritos a seguir:
[...] não é que temos resistência ou medo em relação à TV, o fato é
que, ao falar na academia, no caso de interpretação errônea,
podemos voltar e esclarecer o assunto. Já na televisão isso não é
possível. [...] criticamente a academia é muito peculiar. 5
5
(áudio e vídeo) Prof. Dr. Marco Antonio Moreira - Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
em entrevista para esta pesquisadora-2008.
4
[...] o cientista é muito ensimesmado, é muito pela avaliação de seus
pares - esse sujeito virou ator de televisão (análise, segundo o
entrevistado da academia sobre aquele professor que tem prática de
aparecer na tevê). [...] nós não temos uma fala editada, como os
jornalistas gostam; respostas prontas em 30 segundos [...]6
Com base nos resultados pouco reveladores no que tange à programação, já
que nada do que foi sugerido apontou para mudanças ou ajustes relevantes, e, em
função das recorrentes queixas sobre o tempo da televisão, diferente do tempo da
academia, decidiu-se dar continuidade às pesquisas bibliográficas, buscando encontrar,
nos autores e em suas obras, algum caminho que levasse a novas respostas. O
autor/teoria que apresentou contribuição significativa para a proposta desta pesquisa e
trouxe à cena aspectos relevantes para o estudo do objeto foi Pierre Bourdieu, que, em
uma entrevista para a televisão do Collège de France, fez a seguinte reflexão, muito
próxima às obtidas na pesquisa mencionada:
Eu gostaria de tentar levantar aqui, na televisão, certo número de
questões sobre a televisão. Intenção um pouco paradoxal, já que
acredito que, em geral, não se pode dizer grande coisa na televisão.
[...] Parece-me que não se tem de aceitar essa alternativa absoluta
[...] Creio que é importante ir falar na televisão, mas sob certas
condições. Hoje, graças ao serviço audiovisual do Collège de
France, beneficio-me de condições inteiramente excepcionais: em
primeiro lugar meu tempo não é limitado; em segundo, o assunto de
meu discurso não me foi imposto [...] em terceiro, ninguém está ali,
como nos programas comuns, para me chamar à ordem, em nome da
técnica, em nome do público que não me compreenderá ou em nome
da moral da conveniência etc. (Bourdieu, 1997:15)
As dificuldades para realizar uma pesquisa de recepção da programação do
CNU/SP, pelas razões já expostas, levaram à mudança no viés do trabalho, que
deslocou seu foco para a compreensão do espaço ocupado pelas tevês universitárias a
partir dos estudos realizados por Bourdieu, os quais contribuíram para fundamentar
uma das hipóteses levantadas para a questão do distanciamento entre público
universitário e CNU-SP. Essa hipótese é a de que esse espaço ainda não está bem
delineado, visto que, em função de sua posição, as tevês universitárias aglutinariam
habitus de ambos os campos – universitário e televisivo: no âmbito acadêmico, não se
legitimariam como um elemento da universidade; e no âmbito televisivo, não se
comportariam ou se configurariam como um veículo de comunicação constituído de
6
(áudio e vídeo) Prof. Dr. José Peres Angotti - Universidade Federal de Santa Catarina, em
entrevista para esta pesquisadora-2008.
5
linguagem e objetivos próprios. As tevês universitárias, nessa perspectiva,
apresentariam dificuldades em definir seu campo, seu espaço de atuação.
Ao delimitar o cenário de atuação das tevês universitárias de São Paulo–
inseridas na tensão entre dois campos – pretendeu-se entender as práticas realizadas
em seu interior, bem como contextualizá-las junto aos campos televisivo e
universitário. Para esboçar o quadro de referência das tevês universitárias foi
necessária uma metodologia que identificasse a posição histórica dos canais
universitários em seu campo de poder; a estrutura interna destes; e a gênese dos
habitus dos indivíduos responsáveis por sua efetivação, uma vez que, para Bourdieu
(1998), habitus é visto como um princípio correspondente e mediador entre as práticas
individuais e a condição de existência.
A noção de campo, por sua vez, está vinculada às relações sociais instituídas
dentro do espaço pré-estabelecido para o "jogo" e o modo de pensar e agir dos
produtores/diretores
das
tevês
universitárias
demarca
a
posição
de
cada
instituição/indivíduo diante das estratégias engendradas pelos diversos atores sociais
envolvidos. É a partir destas relações de conflitos que se estabelecem as alianças, as
estratégias, os métodos, enfim, os caminhos da programação definida por esses
profissionais. A definição da fundamentação teórica tornou essencial buscar
referências que norteassem o estudo, no sentido de configurar os elementos que
compõem os campos – televisivo e universitário – bem como indicou a necessidade de
caracterizar as intersecções entre esses campos e sua influência sobre as tevês
universitárias.
O Canal Universitário de São Paulo (CNU-SP), objeto de estudo desta
pesquisa, é tomado como paradigma de tevê universitária no Brasil. O foco da análise
nas experiências do CNU/SP, uma modalidade de tevê criada em função da tecnologia
que possibilitou a veiculação de mensagens por outros meios além do ar, permitiu
tanto um aprofundamento no objeto em si quanto a generalização dos resultados.
Outro aspecto considerado relevante para a definição do objeto é que o CNU-SP é o
mais antigo na modalidade – por cabo –, considerado exemplo, uma vez que foi o
primeiro canal universitário a operar no Brasil por essa modalidade. Antes dele
existiam experiências isoladas, desenvolvidas por algumas poucas universidades. O
6
conceito de canal, no entanto, surgiu somente em 1997 com a união das nove
universidades fundadoras do CNU-SP (Thomaz, 2007).
A inauguração do Canal Universitário de São Paulo data de 10 de novembro de
1997, a partir da união de 09 (nove) instituições de ensino superior da cidade de São
Paulo (Mackenzie, PUC/SP, São Judas, Uniban, Unicsul, Unifesp, Unip, Unisa, USP).
O CNU-SP foi o primeiro a utilizar a prerrogativa da Lei de tevê por cabo (8.977) que,
em um de seus artigos, prevê a criação de um canal de tevê mantido e gerido pelas
universidades existentes nos municípios. O CNU-SP define-se como uma emissora de
televisão de caráter educativo e cultural, sem fins lucrativos, que tem como objetivo a
elevação intelectual do público telespectador (código de ética,1997).
Cabe exclusivamente ao CNU-SP, enquanto instituição, a difusão dos
programas produzidos pelas tevês (universidades) que o integram. Por isso, um
conceito bastante utilizado para denominá-lo é o de ―antena coletiva‖, termo que, no
decorrer do trabalho, será explicado. Tanto a administração quanto o financiamento do
Canal Universitário de São Paulo são de responsabilidade das universidades
integrantes, já que não há espaço na Lei para inserção publicitária. Além disso, sua
gestão ainda não foi profissionalizada, ou seja, não há uma administração, exclusiva,
do CNU/SP; toda a sua gerência ou ingerência é determinada pelas instituições que o
compõem. Uma organização bastante difícil, na medida em que há, num mesmo
espaço, e com isonomia, IES com orientações e objetivos diferentes (Lima, 2002).
Entendeu-se que para a realização do estudo em questão seria necessário adotar
uma metodologia articulada e organizada, visto tratar-se de dois assuntos - tevê e
universidade – de grande complexidade e relevância, amplamente explorados como
temas em pesquisas acadêmicas. Acompanha-se, neste sentido, o posicionamento de
Johnson (2004), segundo o qual a adoção de um plano metodológico que revise as
abordagens adotadas, que reconsidere os objetivos, a competência e limites do objeto,
pode apontar para perspectivas que permitam olhar a totalidade e não fragmentos.
Ainda segundo ele, cada abordagem pode apontar para diversos aspectos.
[...] um tipo particular de estratégia de definição que revise as
abordagens existentes, identificando seus objetos característicos e a
abrangência de sua competência, mas também os seus limites. Na
verdade não é de uma definição ou de uma decodificação que nós
precisamos, mas de ‗sinalizadores‘ de novas transformações. Não se
7
trata de uma questão de agregar novos elementos às abordagens
existentes (um pouco de Sociologia aqui, um tanto de Linguística
acolá), mas de retornar os elementos das diferentes abordagens em
suas relações mútuas (Johnson, 2004:19).
Diante do arcabouço de ideias apresentado e das inúmeras interpretações que
estas poderiam gerar, para organizar as atividades, elegeram-se, do ponto de vista
metodológico, quatro aspectos acerca do setor para serem observados, os quais
nortearam a pesquisa e orientaram as escolhas durante o processo de obtenção de
respostas. O primeiro deles diz respeito às condições históricas e sociais que
propiciaram a formação dos campos televisivo e universitário e, a partir desses, de
cerca de 150 tevês universitárias no Brasil; o segundo, à identificação do perfil dos
pensadores/pesquisadores/produtores, enfim, especialistas que diariamente são
responsáveis pela escolha e produção dos assuntos abordados pela programação do
CNU/SP; o terceiro, consequência do segundo, tem por objetivo refletir a questão dos
habitus dos produtores/diretores e da universidade impregnados na programação e na
dinâmica de produção dos programas; e o quarto e último elemento pesquisado buscou
identificar o posicionamento dos reitores das IES participantes do CNU-SP acerca do
papel da tevê universitária na missão dessas instituições. ―[...] a ação das obras sobre
as obras [...] sempre se exerce tão somente por intermédio dos autores cujas estratégias
devem considerar também sua orientação aos interesses associados à sua posição na
estrutura do campo‖ (Bourdieu, 1996:226).
A investigação realizada tem como eixo norteador as práticas dos
diretores/produtores, visando identificar seu poder de escolha e de decisão diante de
fatos oferecidos ora pelo campo televisivo ora pelo campo universitário/científico.
Para a utilização do critério de campo definido por Bourdieu, é necessária também a
identificação dos agentes e/ou das instituições responsáveis pela organização do setor
que estabelecem seus princípios, seus sistemas de avaliação, suas práticas e produções.
Segundo o autor, essas instituições são importantes para a recepção, visto que
asseguram sua existência e a dos agentes capazes de reproduzir e renovar os produtos.
―[...] a natureza das pressões externas, a forma sob as quais elas se exercem, créditos,
ordens, instruções, contratos, e sob quais formas se manifestam as resistências que
caracterizam a autonomia‖ (Bourdieu,1997:21).
8
Descrevem-se, a seguir, os procedimentos metodológicos adotados neste
trabalho:
Pesquisa secundária efetivada com o levantamento bibliográfico e estudo
de documentos do segmento;
Pesquisa primária envolvendo levantamento de informações por meio de
entrevistas – inquérito pessoal - com diretores de tevês universitárias.
A técnica adotada para obtenção das informações a serem utilizadas no
trabalho incluiu, como já relatado, um estudo de caso realizado junto ao Canal
Universitário de São Paulo. O procedimento compreendeu visitas a todas as
instituições integrantes, com a finalidade de observar os seguintes aspectos: rotina de
trabalho; habilidades; parque tecnológico; relacionamentos. Para as entrevistas,
utilizou-se um roteiro estruturado, visando identificar o lugar ocupado pelos
diretores/produtores no processo de sugestão de pautas e elaboração da programação,
uma vez que suas práticas tendem a se refletir nos produtos produzidos e veiculados
pelo Canal Universitário de São Paulo.
O principal objetivo definido para o estudo foi, a partir da análise do campo
universitário e do campo televisivo, e buscando fundamentação nos referenciais
teóricos de Pierre Bourdieu - em especial, os conceitos de campo e de habitus -,
compreender o lugar ocupado pela tevê universitária na imbricação com esses campos.
Pretendia-se, ao articular as noções de campo e habitus, entender,
primeiramente, como se processam as tensões que surgem com a convergência entre
os campos televisivo e universitário e, num segundo momento, analisar o surgimento
de práticas relativas a esses campos que incidiriam sobre o fazer televisivo
desenvolvido na modalidade universitária. Além disso, buscou-se identificar, com base
nos conceitos bourdianos, os elementos que caracterizam o lugar ocupado pela tevê
universitária, bem como estabelecer os nexos que explicam suas dinâmicas.
Para organizar e orientar as noções acerca dos temas, optou-se pela distribuição
dos dados obtidos e compilados, a partir das pesquisas, em quatro capítulos: o
primeiro deles, - Trajetórias do Campo Universitário – tem como objetivo apresentar
e refletir, com sustentação em uma análise bibliográfica e de dados secundários,
coletados em diversas fontes - órgãos governamentais, instituições de pesquisa, entre
9
outros - , o estado da arte do Campo universitário e científico. Para que essa reflexão
fosse profunda e metódica, considerou-se conveniente apresentar a estrutura atual
desse cenário.
No segundo capítulo, - O Campo Televisivo: Formulações Contemporâneas apresenta-se, tendo como alicerce uma pesquisa bibliográfica e documental, a
televisão no contexto contemporâneo. Para isso, buscaram-se dados relativos às
condições de sua implantação e desenvolvimento no país - quem eram seus agentes na
época; quais lutas se travaram para a distribuição das posições dentro desse campo.
Nesse capítulo dois aspectos relevantes foram abordados: a relação entre tevê pública
(canais universitários, canais legislativos, canais comunitários) e tevê privada; e o
contexto da digitalização da tevê e suas consequências são temas tratados neste
capítulo.
O terceiro capítulo, que recebeu o título - Televisão Universitária: Modos de
fazer – apresenta o estado da arte dos Canais Universitários brasileiros e indica dados
relevantes acerca do segmento. Além disso, expõe conceitos que ajudam a ampliar o
olhar sobre a televisão universitária.
No quarto e último capítulo – Canal Universitário de São Paulo: antena
coletiva para as tevês das universidades paulistanas –, com base em um estudo de
caso realizado por meio de observação e aplicação de um questionário estruturado,
apresentam-se o Canal Universitário de São Paulo, seus agentes, seus habitus, suas
dinâmicas, coerências e incoerências. Os dados coletados permitiram identificar e
apresentar o grau de autonomia que o canal universitário tem em relação aos campos
universitário e televisivo. Bourdieu, durante conferência em Paris (1997), afirma que
―o grau de autonomia de um campo tem por indicador principal seu poder de refração,
de retradução‖.
Os resultados do trabalho indicam que, depois de estranharem-se ao longo de
décadas, é possível ocorrer o encontro e a legitimação entre tevê e universidade a
partir da inserção de tecnologias que permitiram o surgimento de modalidades de tevê
de acesso pago, a universidade expandiu sua presença no campo televisivo, ampliando
as possibilidades de comunicação com a sociedade.
10
Capítulo 1 - Trajetórias do Campo Universitário
Este capítulo tem como objetivo apresentar e refletir, a partir de uma análise
bibliográfica, o estado da arte do campo universitário e científico. Para que esta
reflexão seja profunda e metódica, considerou-se conveniente apresentar a estrutura
atual deste grande cenário - Campo Universitário - por meio de pesquisas secundárias
realizadas nos setores afins. Os conceitos de Habitus e Campo, de Pierre Bourdieu,
perpassarão todo o capítulo, uma vez que se entende que ambos serão ponto de partida
para entender o complexo jogo que se produz nesse campo. ―Numa sociedade
desencantada, o reencantamento da universidade pode ser uma das vias de simbolizar
o futuro (...) Tal papel é uma microutopia. Sem ela, a curto prazo, a universidade só
terá curto prazo‖ (Santos,1994:200).
11
1.1 A Universidade: colocando o time em campo
O acúmulo do capital financeiro, a capacidade científica e o desenvolvimento
tecnológico são características fundamentais da globalização nos países desenvolvidos
e, atualmente, caracterizam-se como elementos diferencias nas relações internacionais.
Pode-se afirmar que o grande diferencial deste século reside no uso que as nações
fazem do conhecimento produzido.
A universidade, em qualquer lugar do mundo, apresenta-se como palco ideal
para esse desenvolvimento, uma vez que se configura como polo catalisador de ideias
que alimentam o desenvolvimento econômico, científico e tecnológico. Para Porcello
(2002), a universidade surgiu da necessidade de perpetuar o conhecimento, uma vez
que, antes dela, a educação ocorria a partir das práticas cotidianas. Estudar a
universidade é importante na medida em que ela se configura como locus no qual
grande parte da pesquisa básica das ciências fundamentais é produzida. Portanto
mostrar sua relevância significa explicitar suas contribuições como meio de acesso ao
conhecimento científico, como instrumento de cultura e de desenvolvimento social.
Este posicionamento está presente no Plano Nacional de Educação (PNE) de 2001,
que tem, como diretriz, a expansão com qualidade do ensino superior, entendendo que
cabe ao Estado a organização desse segmento da educação como fator essencial ao
desenvolvimento do país.
A instituição universitária adquiriu espaço relevante na vida cultural da
sociedade contemporânea, passando a representar o auge na hierarquia escolar,
configurando-se tanto como produtora de conhecimentos quanto como responsável
pela formação dos intelectuais que lidarão com esses conhecimentos e com a difusão
da cultura em diversos outros setores. Gramsci (1988:9) analisou o papel dos
intelectuais na sociedade. Para ele,
O enorme desenvolvimento alcançado pela atividade e pela
organização escolar (em sentido lato) nas sociedades que surgiram
do mundo medieval indica a importância assumida no mundo
moderno pelas categorias e funções intelectuais: assim como se
buscou aprofundar e ampliar a ―intelectualidade‖ de cada indivíduo,
buscou-se igualmente multiplicar as especializações e aperfeiçoá-las.
É este o resultado das instituições escolares de graus diversos,
12
inclusive dos organismos que visam a promover a chamada ―alta
cultura‖, em todos os campos da ciência e da técnica.
A escola é o instrumento para elaborar os intelectuais de diversos
níveis. A complexidade da função intelectual nos vários Estados
pode ser objetivamente medida pela quantidade das escolas
especializadas e pela sua hierarquização: quanto mais extensa for a
―área‖ escolar e quanto mais numerosos forem os ―graus‖ ―verticais‖
da escola, tão mais complexo será o mundo cultural, a civilização, de
um determinado Estado.
No Brasil, o papel dos intelectuais tem sido discutido ao longo da história,
havendo, desde o início do Século XX, reconhecimento da sociedade quanto à
importância destes para o desenvolvimento do país. A partir do Estado Novo 1937/1945 - há a profissionalização dos intelectuais que atuam dentro de setores do
Estado, principalmente educação e cultura, e, desde então, os ―especialistas‖ têm
presença cada vez maior para indicar políticas, ações e estratégias, tanto para o Estado,
quanto para o setor privado.
O desenvolvimento da ciência e da tecnologia é inerente ao mundo
contemporâneo e, em consequência dessa realidade, criou-se uma demanda por
profissionais qualificados para o desenvolvimento de pesquisas e projetos inovadores.
Para alguns pesquisadores, no Brasil, diferentemente do que ocorre na maior parte do
mundo, a universidade está relativamente apartada dessa realidade, mesmo ocupando,
desde 2007, a 15ª posição mundial de indexação de artigos em publicações
acadêmicas. Para Aranha (2008)7, o país não consegue transformar o conhecimento
produzido em produtos ou serviços disponíveis para o mercado e o grande desafio da
inovação consiste na efetivação de um trabalho que sintonize todos os atores
envolvidos nesse processo, ou seja, empresa, universidade e consumidores.
A falta de sintonia entre mercado e universidade é uma questão bastante
controversa, como demonstra Audy (2006), e intensamente discutida por diversos
setores da academia. Há aqueles que defendem a redefinição das relações entre
universidade e mercado, visando ao estabelecimento de uma mão dupla, e há aqueles
que intensificam as distâncias, uma vez que, para estes, os objetivos de ambos os
setores – mercado e universidade – são excludentes.
7
José Alberto Aranha, diretor do Instituto Gênesis – PUC Rio de janeiro – durante lançamento do
portal Innoversia, ocorrido no dia 03 de abril de 2009.
13
A universidade e a empresa são regidas por valores absolutamente
próprios e distintos. São diferentes os seus ciclos de tempo, os seus
objetivos e as suas motivações. No entanto, é necessário que haja
complementaridade entre elas, em proveito do todo social
(Marcovitch, 1999:15).
Se Marcovitch apresenta um posicionamento relativista, encontram-se autores
que propõem uma aproximação maior, como Audy (2006), que justifica ser necessário
às universidades obter novas fontes de receita e garantir sustentabilidade para
realização dos projetos de pesquisa e demais atividades acadêmicas. Já Chauí (2003),
numa direção oposta, acredita que as políticas da Educação superior pautadas pela
lógica de mercado produzem o que denomina de Universidade Operacional, ou seja,
aquela voltada para si mesma, que, em detrimento do saber científico, forma para o
mercado de trabalho.
O que se observa, independentemente das análises dos diversos autores acerca
da relação entre universidade e mercado, é que esta, vista como locus da produção de
conhecimento, tem papel fundamental na vida social, na medida em que seu
posicionamento, em relação a temas como economia, política e sociedade, pode
interferir na direção adotada pelo Estado. Cabe a ela não somente a formação de
profissionais competentes para atuarem no mercado de trabalho, mas, principalmente e
efetivamente, operar junto à comunidade no sentido de disseminar o conhecimento
produzido e produzir conhecimentos e técnicas que contribuam para desenvolvimento
da vida social.
Evidentemente, ao cumprir esse papel, a universidade pode contribuir para
atender demandas da sociedade, as quais, na maioria das vezes, existem em função de
opções políticas mais amplas, destacando, porém, que não cabe a ela um papel
funcional e tampouco a de substituta do poder público. Vista sob a ótica da autonomia
universitária, a relação com a sociedade deve ocorrer de forma mediada; visando,
única e exclusivamente, por meio de um diálogo permanente, à produção e à
disponibilização do conhecimento. Segundo Audy (2006:340),
À medida que a sociedade vai se tornando mais baseada no
conhecimento, as empresas vão mudando suas características e o
mercado de trabalho vai se tornando mais intensivo em
conhecimento, gerando demandas por um novo tipo de profissional.
Ao mesmo tempo a sociedade passa a esperar mais das
Universidades em termos de contribuições ao processo de
desenvolvimento econômico e social.
14
Se, por um lado, como visto, há destaque para o distanciamento entre mercado
produtivo e universidade, por outro, deve-se registrar que alguns segmentos da
sociedade civil têm espaço privilegiado junto à vida acadêmica – principalmente
aqueles menos favorecidos - proporcionando a abertura de novos campos de
investigação em várias áreas do conhecimento. Evidentemente que esse destaque aos
menos favorecidos se dá de modo instrumental, na medida em que as pesquisas
impulsionadas pelos principais órgãos buscam soluções para os problemas dessa
parcela da sociedade. A manutenção da parceria entre universidade e sociedade é
desejável e vista com bons olhos por ambas, já que essa relação reafirma valores da
democracia e da ética dos indivíduos. Essa questão - parceria entre universidade e
sociedade – será abordada com mais ênfase no capítulo 4, visto que a tevê
universitária, objeto deste trabalho, apresenta-se à sociedade e à universidade como
um elo entre ambas.
A inclusão de atividades de ―extensão‖ nos projetos que antes incluíam ensino
e pesquisa expressa a disposição de aproximar essas instituições da realidade das
maiorias para além da utilização dos produtos decorrentes das pesquisas científicas.
Para as universidades particulares, em especial, a extensão assume papel não
desprezível, porquanto conforma o principal eixo de construção de legitimidade e
expansão da ação institucional. Dos hospitais universitários ao atendimento em outros
setores da ―vida inteligente‖ – jurídico, psicológico, comunicacional –, procurou-se
apresentar à sociedade justificativa para a designação de instituição ―sem fins
lucrativos‖ que caracterizou, por muito tempo, a totalidade das universidades ―não
públicas‖ do país.
A universidade deve ser necessariamente ideológica e não
inevitavelmente ideológica, pois a qualidade política não é um
pacote que se compra ou se impõe, mas sim uma questão de opção
individual e social no horizonte da liberdade possível, ou seja, uma
conjuntura histórica que supõe a rejeição de propostas reconhecidas
como incorretas e a aceitação de outras abraçadas como a construção
prática de um compromisso político coletivo (Demo, 1994:43).
Se, por um lado, a questão da autonomia universitária e o distanciamento da
universidade dos ditames do mercado são referenciados, por outro, pesquisas apontam
a necessidade de reestruturação da universidade. As mudanças na educação não vêm
de hoje; seus objetivos vêm se alterando ao longo dos tempos: para os gregos
15
representava a felicidade; os medievais viam-na como salvação da alma; e a
modernidade a vê como empregabilidade e renda.
A função pública da universidade, com o livre exercício de docência,
pesquisa e serviços à comunidade, deve ser mantida, coerentemente,
dentro do contexto das exigências educacionais e das necessidades
de cultura e conhecimento de toda a sociedade. Todavia, a própria
qualidade do ensino e da pesquisa nas universidades públicas
brasileiras está sendo prejudicada por uma estrutura obsoleta, que
não premia qualidade, não atende necessidades do mercado de
trabalho, nem contempla a expansão do número de vagas oferecidas
e de atividades de extensão (Guralnik, 1998).8
Divergências à parte, há recorrências significativas nos discursos dos diversos
agentes acerca de temas relacionados ao papel da universidade: a questão da
autonomia, a necessidade de reestruturação, a aproximação ou não do mercado, a
qualidade no ensino ou, na maioria das vezes, a falta dela, os custos do sistema
universitário, entre outras. A crise do modelo, principalmente o público, é evidente. O
setor privado, apesar da demanda da sociedade e do apoio, inclusive econômico, do
Estado, também apresenta relevantes carências e limitações que preocupam o
segmento e alguns setores da sociedade civil que acompanham a expansão das
instituições de ensino superior brasileiras.
É esta situação que explica o alto nível de controvérsia que circunda
a educação superior privada brasileira. Em um extremo, estão os que
entendem existir uma contradição insanável entre os fins públicos da
educação e os interesses privados dos proprietários das instituições
privadas. Nesta perspectiva, seria inadmissível a existência de
instituições privadas de fins lucrativos, e a própria existência de um
setor privado é vista como questionável. A expansão do setor
privado e sua natureza frequentemente empresarial são percebidas
como uma aberração que caberia limitar ou coibir, sendo no máximo
tolerada como mal inevitável, mas nunca apoiada ou subvencionada.
No outro extremo estão os que defendem que as instituições
privadas, sobretudo as de natureza confessional, religiosa e
comunitária, desempenham função social relevante e deveriam ser
subvencionadas com recursos públicos, que não deveriam ser
limitados ao financiamento das instituições estatais. Finalmente, no
setor mais claramente empresarial, predomina a busca de uma
liberdade empresarial absoluta do setor privado, em que se considera
como abusivos quaisquer atos do poder público que busquem
8
Hernan Chaimovich Guralnick, Em nome da Rosa / Junho de 1998 – Disponível em:
http://ftp.abc.org.br/arquivos/chaimo_rosa.html
16
garantir a qualidade e regular a provisão de serviços do setor
(Schwartzman, J., Schwartzman, S., 2002).9
A crise pela qual passa a universidade no dias de hoje não é assunto exclusivo
da contemporaneidade, podendo-se afirmar tratar-se de um processo iniciado há
algumas décadas. Retornando à gênese desta ―crise‖, muito do que se debate hoje está
presente no Relatório Atcon10, que revelou o estrangulamento no canal de acesso à
universidade, quando milhares de jovens, apesar de aprovados nos exames, ficavam
fora da universidade em função de falta de vagas. A partir daí, a preocupação do
Estado foi a ampliação de vagas sem planejamento ou investimentos significativos.
Evidentemente outras questões devem ser consideradas, entre elas a de que, naquela
época, logo após o golpe de 1964, os militares vinculavam o progresso do país à
ideologia desenvolvimentista.
A educação, em todos os níveis, passou a ser responsável por promover o
sucesso do projeto político e foi reorganizada visando a adaptar-se ao princípio
norteador daquele tempo - o binômio ―segurança e desenvolvimento‖ – conceitoschave para se compreender as ações do Estado. Foi dessa maneira que, segundo
Shiroma et al (2002), o sistema educacional adaptou-se a uma concepção econômica
de desenvolvimento e transformou educador e educando em mercadorias que, se bem
moldadas, podem gerar lucros.
No final dos anos 1960, com base em estudos realizados, o Estado passou a
argumentar que o ensino privado superior cumpriria função complementar, visto que o
poder público não dispunha de mecanismos para arcar, isoladamente, com esse ônus.
Soma-se a isso a orientação do Relatório produzido pelo professor Rudolph P. Atcon
que, seguindo inspiração no modelo americano, disseminou a ideia de privatização
nesse nível de ensino. Como se pode verificar, a iniciativa privada entra nesse cenário
para suprir uma demanda reprimida. Essa iniciativa, segundo alguns especialistas da
época, possibilitaria atender a anseios da sociedade, sem onerar o Estado, como já
O ensino superior privado como setor econômico – Trabalho realizado em 2002 para o
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – Disponível em:
http://biblioteca.planejamento.gov.br/biblioteca-tematica-1/textos/educacao-cultura/texto-982013-o-ensino-superior-privado-como-setor-economico.pdf
10
Nome dado ao relatório produzido (1965/66) pelo professor norte americano – Rudolph P.
Atcon – que foi contratado pelo MEC para planejar mudanças no ensino superior brasileiro.
9
17
ocorrera no ensino nos níveis fundamental e médio, com resultados pedagógicos e
sociais discutíveis (Cunha, 1988).
Em decorrência dessa atitude, alguns resultados foram sentidos e perduram até
os dias de hoje: aumento no número de escolas privadas de ensino superior; acesso das
camadas menos favorecidas ao ensino superior; organização didática e pedagógica de
cursos distintos daqueles oferecidos pelas instituições públicas; questões de eficiência
e lucratividade em detrimento da qualidade do ensino.
[...] a massificação da empresa educativa de nível pós-secundário
trouxe consigo vários efeitos combinados: mesocratização da
matrícula, com crescente participação dos setores médios baixos em
carreiras curtas, médias e semiprofissionais; feminilização da
matrícula, que levou a uma distribuição mais equitativa da mesma
entre sexos, ainda que as carreiras profissionais de prestígio
permaneçam preponderantemente masculinas; regionalização da
matrícula, com crescente participação de instituições situadas fora da
capital ou das duas ou três maiores cidades de cada país;
terceirização da matrícula, que tende a concentrar-se na carreiras de
ciências sociais, educação, comércio e administração de empresas; e,
finalmente, privatização da matrícula (Brunner, 2001:28).
Posteriormente, segundo Chauí (2003), a reforma do Estado realizada no
período de 1995/1998 definiu alguns setores – Educação, Saúde e Cultura - como de
serviços não exclusivos do Estado, provocando, na Educação, algumas alterações
significativas: a educação superior deixou de ser direito e passou a ser serviço;
educação superior deixou de ser serviço público e passou a ser público e privado.
Além dessas alterações, segundo a autora, outra, ainda mais expressiva, foi
engendrada, definindo a universidade como organização social que presta um serviço
ao Estado e com ele mantém um contrato de gestão e não como instituição social11
como considerada até então.
Em outras palavras, a instituição se percebe inserida na divisão
social e política e busca definir uma universalidade (imaginária ou
desejável) que lhe permita responder às contradições impostas pela
divisão. Ao contrário, a organização pretende gerir seu espaço e
tempo particulares aceitando como dado bruto sua inserção num dos
11
A distinção entre instituição social e organização social é de inspiração frankfurtiana, feita por
Michel Freitag em Le naufrage de l'université. Paris: Editions de la Découverte, 1996.
18
polos da divisão social, e seu alvo não é responder às contradições, e
sim vencer a competição com seus supostos iguais (Chaui, 1999).
As universidades, inclusive as privadas, existentes antes da reforma do Estado,
precisaram passar por um processo de reestruturação para atuarem como organização
social. Nesse novo modelo, a eficiência na escola passou a ser produzir bastantes
resultados de modo planejado e gerenciado. Com isso, as instituições de ensino
superior passaram a perceber a educação não mais como um direito social e, sim,
como direito do consumidor. Neste novo cenário, o que passa a ser perseguido pelas
instituições de ensino superior privado é a visão empreendedora e a prestação de
serviço de resultados em detrimento da autonomia intelectual.
Neste contexto a universidade organização torna-se cúmplice de um mercado
que dita regras, já que este a sustenta. Neste novo cenário cabe à universidade
organizar-se, buscando estar sempre à frente de seu concorrente na busca de seu aluno,
agora cliente, que precisa ser valorizado como proprietário que elege, escolhe e
adquire mercadorias de diferentes tipos, entre elas a educação.
1.2 A Universidade na contemporaneidade
Atualmente proliferam pelo país estabelecimentos de ensino superior, tanto
públicos quanto privados, de tamanhos e qualidades diversos. O segmento conta com
mais de 160 mil professores com níveis de qualificação distintos, mais de cinco
milhões de estudantes com chances e competências desiguais. Na mesma linha de
diferenças e incoerências, o título de Universidade, que é determinado para
caracterizar instituições de ensino pós-secundário com características específicas, vem
sendo utilizado e atribuído a instituições indiscriminadamente. Enquanto, em outros
países, o título é usado para rotular instituições específicas, no Brasil, é sinônimo de
―faculdade‖. Legalmente, evidentemente, existem distinções claras e objetivas entre as
instituições de ensino, porém, na prática, todos são ―estudantes universitários‖, todos
têm ―nível universitário‖.
19
A ideia de Gustavo Capanema12 de uma Universidade modelo, que serviria de
padrão e paradigma com o qual todo o sistema de ensino superior deveria se igualar,
inverteu-se: ao invés de uma universidade padrão e outras de menor graduação, vê-se a
homogeneização. Porém, essa igualdade, que num primeiro momento pode parecer
positiva, por ser meramente formal, reforça ainda mais as desigualdades existentes
entre aqueles que estão em universidades de ponta e aqueles que estão nas demais
instituições.
Para Eunice Durham (2006), tanto os legisladores quanto os agentes presentes
neste campo estão afetados pelo ―mito da universidade‖, ou seja, acreditam que o
único modelo para o ensino superior seja o da universidade pública e gratuita que
associa ensino, pesquisa e extensão.
A força do mito faz com que se omitam da reflexão duas questões
fundamentais. A primeira é o fato de que as universidades, tanto do
Brasil como em todos os demais países, constituem um tipo
específico de instituição que coexiste, creio que necessariamente,
com outros tipos de estabelecimentos de ensino superior, como
faculdades de formação profissional, institutos tecnológicos, escolas
vocacionais e todo um enorme campo de cursos de menor duração,
genericamente denominados de pós-secundários. [...] A segunda é
que não se dá a devida consideração à profunda diversidade
existente no próprio conjunto das universidades brasileiras, que
integra, além das públicas, instituições privadas muito diversas,
incluindo as comunitárias e as lucrativas, a maioria das quais, aliás,
não preenche os requisitos constitucionais que definem as
universidades, porque não associa o ensino à pesquisa (Durham,
2006:84).
Segundo dados do último censo (2007) da educação, realizado pelo Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP -, órgão do
Ministério de Educação e Cultura - MEC –, há, no setor privado, predomínio de
instituições educacionais não universitárias, o que difere do paradigma considerado
ideal, ou seja, a organização do ensino superior em instituições universitárias - estas
IES representam 86,7% do setor. Outro dado a ser considerado é a questão relativa à
pesquisa, que quase não existe no setor privado, visto que a obrigatoriedade de sua
exigência concentra-se na instituição universitária; a instituição universitária dá ênfase
12
Gustavo Capanema, foi ministro da educação de 1937 a 1945, foi responsável pela organização
do ministério da educação nos moldes semelhantes aos praticados hoje.
20
a profissões mais clássicas e científicas, já o setor privado concentra-se nas profissões
sociais.
Para Schwartzman J. e Schawartzman S. (2002), dois pontos devem ser
destacados, uma vez que são periodicamente discutidos pelos analistas e estudiosos do
setor: a participação dos professores na gestão e decisões acadêmicas - quase nula - na
iniciativa privada e o fato de a atividade cultural e intelectual ser percebida como de
natureza altruística, ou seja, oposta à busca do lucro.
Pesquisas como a de Sampaio (2000) têm identificado com mais clareza as
funções pedagógicas e educacionais do setor, enxergando-o como um sistema de
educação superior de massas, heterogêneo e complexo, dentro do qual o modelo
tradicional não pode ser considerado mais do que uma parte de um todo mais
complexo.
Isso implica em rompimento com o ideário da universidade como paradigma
para o ensino, sendo possível afirmar que, no Brasil, há duas modalidades para o
ensino superior – o público e o privado – com formas de sociabilidade distintas, que se
complementam e que são pouco excludentes. O setor público, neste cenário,
configura-se como uma parte e não o todo e o setor privado como um participante
legítimo e não como um mal necessário como comumente é visto.
Inúmeras instituições de ensino superior privado, com o título e as
prerrogativas de Universidade, vêm surgindo no cenário brasileiro como parte de um
processo que tomou fôlego com a primeira Lei de Diretrizes e Base – LDB –,
regulamentada ainda nos anos 1960, e assegurou-se na Constituição de 1988, quando
se efetivou a profissionalização do setor.
Importante destacar que a legislação que regulamenta o setor de ensino no país,
seja ele público ou privado, baseia-se em dois instrumentos legais: a Constituição
Federal de 1988, especificamente nos artigos 207, 208, 213 e 218 e a Lei 9.394/96, Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Para Schwartzman J, Schwartzman S.
(2002), o excesso de regulamentação e normas impossibilita a sistematização de um
marco regulatório para o ensino superior privado. Segundo eles, no ano de 2001,
foram editados 234 documentos para o setor. Atualizando esses dados para 2007,
obtêm-se os seguintes resultados:
21
Quadro 1 - Normas e Regulamentação
Atos normativos sobre o Ensino Superior Privado Brasileiro
Documentos
2001
2007
Emenda Constitucional
1
0
Leis
10
5
Medidas Provisórias
22
1
Decretos
17
13
Resoluções
32
25
Portarias
94
66
Pareceres do Conselho de
Educação
58
9
Fonte: ABMES (Associação Brasileira de Mantenedores do Ensino Superior)
A regulamentação em questão diz respeito somente às instituições privadas
categorizadas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação em seu artigo 20 como:
particulares em seu sentido estrito; comunitárias; confessionais; e filantrópicas. No
passado, em função de questões fiscais, a maioria das instituições de ensino privadas
denominava-se como filantrópica ou sem fins lucrativos. Atualmente apenas cerca de
um terço dessas entidades enquadram-se nessas categorias, uma vez que, segundo seus
mantenedores, as vantagens são poucas e, além disso, a organização fica mais
suscetível à fiscalização governamental.
1.3 A Universidade no mercado ou o mercado da Universidade
―Grande negócio‖. É assim que, atualmente, vêm sendo tratadas as questões
relativas ao segmento do ensino superior no Brasil. Após o crescimento do número de
instituições privadas a partir de 1997, aproximadamente 13% ao ano, chegou-se ao
momento do investimento na profissionalização da gestão e da venda de ações na
bolsa de valores. De empreendimento de grupos familiares, passou-se às S/A da
educação.
22
A inserção da economia brasileira, a partir da década de 1990, no processo de
globalização, segundo Kuenzer (2001), apresentou impactos expressivos para a
educação em função, principalmente, das novas tecnologias de produção que exigiram
um redesenho dos processos de aprendizagem.
Em pesquisa realizada para o BNDES, Schwartzman, J., Schwartzman, S.
(2002) afirmam que o preço médio pago, anualmente, pelo aluno do setor privado é de
5.300 reais. Ao final do curso, em média de quatro anos, o discente poderia levar para
casa um carro popular, mas o que leva é um canudo e, na maioria das vezes, vazio, já
que até o certificado de conclusão de curso, na maior parte das instituições privadas,
tinha, até recentemente, custo adicional.
Em função do sucesso do setor, que movimenta mais de 20 bilhões anualmente,
investidores de outras áreas passaram a atuar neste segmento. A previsão dos
especialistas da área é de que, no período compreendido entre 2008 a 2012, cinco a
oito grupos educacionais abram seu capital. Isso se explica a partir de alguns fatores
que, inicialmente, parecem distintos, mas que, para o setor educacional, caminham
lado a lado: o econômico, que indica que o Brasil está vivendo momentos de
estabilidade e crescimento, mesmo em tempos de crise mundial, fazendo da bolsa
excelente negócio para a captação de recursos; o espaço para o crescimento13 do
número de alunos no ensino privado - atualmente são cerca de 5 milhões no país. Esse
crescimento tem algumas explicações: o aumento do PIB per capta, acesso maior ao
crédito e crescimento dos concluintes do ensino médio. E, para completar a equação, a
discussão acerca da participação de investimentos estrangeiros, que não encontrou
ressonância na última discussão sobre a reforma universitária e, consequentemente,
provoca interesse de investidores estrangeiros neste setor (Schwartzman, J.,
Schwartzman, S., 2002).
13
―A educação no Brasil está em expansão, já que possuímos atualmente apenas 12% da faixa de
18 a 24 anos da população brasileira nas escolas superiores, um índice ainda muito baixo perto dos
70% a 80% registrados nos países desenvolvidos, ou mesmo em relação aos nossos vizinhos. A
Bolívia, por exemplo, para surpresa de muitos, inclusive do mercado internacional, tem registrado
um crescimento no número de alunos matriculados no ensino superior bem maior que o nosso‖.
Declaração de A. Carbonari Netto, presidente do Grupo Anhanguera Educacional, em matéria
publicada na Revista Ensino Superior, de Agosto de 2008 –
Disponível em HTTP://revistaensinosuperio.uol.com.br/textos.asp?codigo=12195
23
As características deste segmento vêm sendo redesenhadas nas últimas décadas
em função do aumento do número de instituições de ensino, de matrículas, de cursos,
de funções docentes, etc. Além desses fatores, outra questão relevante diz respeito à
pluralidade das diversas realidades educacionais com formatos, vocações e práticas
acadêmicas diferenciadas.
A diversificação e a multiplicidade de instituições criaram um setor altamente
competitivo e fragmentado no qual realidades pedagógicas e econômicas distintas são
praticadas sem controle. A projeção de especialistas do setor é de que essa
fragmentação diminua, haja vista a concentração da direção destas IES nas mãos de
alguns mantenedores e a criação de grandes grupos educacionais. Segundo dados da
Hoper Consultoria (2008), cerca de 26% dos alunos estão matriculados nos 18
principais grupos de ensino. De 2007 para 2008, os dez maiores grupos da educação
registraram um aumento de 39% no número de alunos matriculados (de 640 mil para
889 mil).14
De acordo com o Ministério da Educação, existem, hoje, no país, 2.281
Instituições de Ensino Superior Privado, que, em função de suas dimensões e do
capital de giro envolvido nos negócios, vêm recebendo dos analistas do mercado
financeiro atenção especial. Segundo Petta (2007), ―Os analistas do mercado
informam aos investidores que educação superior é um bom negócio 15‖. Três grandes
grupos educacionais (Estácio de Sá, Anhanguera e Kroton Educacional) têm ações na
Bovespa há cerca de três anos. Além desses grupos, o SEB – Sistema Educacional
Brasileiro, que atua com a marca COC, atua na Bovespa. Além destes, outros grupos
educacionais preparam-se para abrir seu capital e investem na aquisição de outras
instituições16.
Questões econômicas fazem parte do dia a dia das sociedades e, atualmente,
estão presentes em discussões acerca da educação superior. Os resultados econômicos
sempre se fizeram presentes em todas as formas de civilização, podendo-se afirmar
14
GAZETA MERCANTIL 18/02/2009
Maria Clotilde Lemos Petta é professora licenciada da PUCCampi e secretária de Comunicação
Social da CONTEE – Confederação Nacional do Trabalhadores dos Estabelecimentos de Ensino.
16
Revista Ensino Superior, Agosto de 2008 – Disponível em
HTTP://revistaensinosuperio.uol.com.br/textos.asp?codigo=12195
24
15
que são inerentes à vida humana. A origem das universidades, ainda na Idade Média,
foi marcada por transformações de cunho econômico, político e cultural.
De acordo com Ponce (1989), sob a influência da nova burguesia, que exigia
espaço na vida intelectual europeia, a escola catedralícia foi o germe da universidade
que ocorreu por volta do século XI, em função da expansão do comércio e da
circulação de dinheiro. Antes disso, a educação superior ocorria em instituições
ligadas à Igreja, única autoridade no mundo medieval com competência para outorgar
o ius ubique docendi – titulação necessária para exercer o magistério.
As primeiras universidades17 surgiram com iniciativas oriundas de alguns
professores que, por diversos motivos, deixaram de se alinhar com as normas da Igreja
e fundaram corporações de ofícios - associações civis autônomas - que organizavam os
mais variados ofícios (de barbeiro a cirurgiões) a partir do conhecimento disciplinado
pela lógica. Ainda segundo Ponce (1989), as primeiras universidades podem ser
consideradas como reuniões livres de homens que se propunham ao estudo da ciência.
A Universidade, em qualquer lugar do mundo, desde a revolução burguesa,
configura-se como uma instituição pautada pela permanente reforma, buscando
soluções para o seu tempo. Para alinhar-se às necessidades da Revolução Francesa,
tornou-se profissionalizante ou napoleônica; para adequar-se ao movimento científico
da Prússia, tornou-se pesquisadora; e para responder às demandas de países em
desenvolvimento, entre o final do século XIX e XX, tornou-se de massas (Trindade,
2000).
A universidade tem, como característica, o princípio de reforma permanente,
porém nenhuma alteração ocorrida anteriormente tem sido tão profunda quanto as
ocorridas nas últimas décadas. Para Santos apud Germano, o ideal clássico de
universidade começa a se descaracterizar a partir dos anos 1960:
17
Precisar a origem das mais antigas universidades - Salerno, Bolonia, Paris, Montpellier, Orleáns
e Oxford - não é possível, no entanto seus registros remontam ao século XII. Já no século XIII,
encontramos constituídas as universidades de Angers e Toulouse (1229), na França; Cambridge na
Inglaterra (1209); na Espanha, Palencia (1212), Salamanca (antes de 1293) y Lérida (1300); em
Portugal, Coimbra e Lisboa (1288); na Itália, Pádua (1222), Nápoles (1224), Siena, Plasencia
(1246). Roma e Avignon tiveram universidade desde (1303). Na Alemanha e em Praga (1347),
Heidelberg (1385). Na Áustria, Viena (1365), em Polônia, Cracóvia (1364). Fonte: RUIZ –
Unisinos (Doc eletrônico).
25
[...] pelas inúmeras funções que passam a ser atribuídas a ela, que
vão desde a prestação de serviços (extensão), o fornecimento de
mão-de-obra qualificada, o fortalecimento da competitividade da
economia, a mobilidade social para os filhos de famílias operárias, a
preparação de pessoas para o exercício de liderança social, até o
estabelecimento de paradigmas de aplicação de políticas públicas
(Germano, 2001:226).
Segundo Eunice Durham (2006), o fortalecimento da universidade ocorreu a
partir da obtenção de uma bula papal consolidada por um decreto real ou imperial que
autorizava a outorga do diploma. Nascida na Europa, onde se consolidou com as
universidades de Bolonha e Paris, sua legitimação social foi uma questão de tempo.
Hoje, funda-se na autonomia do saber frente à religião e ao Estado.
As instituições universitárias, que surgiram como cenário para pensamentos de
vanguarda, romperam com o clero na Idade Média e chegaram à modernidade com a
missão de se opor à tradicional visão de criação, gestão e transmissão do saber. A
sociedade atual vê a universidade como guardiã do conhecimento e como elemento
decisivo para a inclusão social. Isso ocorre a partir do tripé ensino, pesquisa e
extensão, que norteia as instituições desde a segunda metade do Século XX. Dessa
forma, as universidades iniciam suas atividades exclusivamente voltadas ao ensino
(século XI), incorporam a pesquisa como tarefa essencial (Século XVII) e incluem o
terceiro item – extensão – já no século XX, aproximando o fazer acadêmico da vida
social. Nesse processo, a academia, segundo Audy (2006:343), ―tem convivido com as
tensões geradas pelo novo ambiente, envolvendo a sua missão de ensino (original),
pesquisa (primeira revolução) e desenvolvimento econômico e social (segunda
revolução)‖.
1.4 Brasil – A Universidade tardia
O ensino superior brasileiro é considerado, na América Latina, um caso
peculiar em função, principalmente, de dois fatores: o primeiro diz respeito à alta
qualidade de seus cursos, de suas escolas de pós-graduação e de seus programas de
pesquisa; o segundo, seu atraso, pois, em outros países da região, as universidades
26
surgem entre os séculos XVI e XIX, ao passo que as universidades brasileiras
começam a aparecer nos anos 1930 e 1940.
Contudo, os primeiros cursos superiores organizados no Brasil coincidem com
a chegada da Família Real ao país, em 1808. Nessa época a política de Portugal era
bastante restritiva às colônias no que concerne a questões relativas ao saber. As ordens
religiosas eram os núcleos responsáveis pela disseminação do conhecimento e da
cultura. Para entender a história das Instituições de ensino superior no Brasil, é
importante buscar explicações acerca do tema no final do século XIX, quando três
grandes forças políticas da época buscavam soluções para a implantação da
Universidade Brasileira.
Segundo Romano (1996), naquela época existia um grupo composto pela
igreja, outro pelos civis liberais e um terceiro pelos pensadores positivistas. Havia
grandes divergências quanto ao papel da universidade na vida política e social
brasileira: a igreja católica via na universidade a possibilidade de aumentar seus
quadros intelectuais; os liberais, orientados pelas Revoluções Francesa e Industrial,
buscavam uma universidade totalmente desvinculada da igreja; já os positivistas
entendiam que os brasileiros precisavam de ensino técnico.
Foi nesse contexto que o governo federal, em 1922, ou seja, cem anos após a
emancipação política e trinta e três anos após a substituição da monarquia pela
república, no Rio de Janeiro, criou, após junção das escolas politécnicas de medicina e
direito, a primeira universidade brasileira, recebida pela sociedade sem grande
interesse, visto que se deu para que fosse possível conceder ao Rei da Bélgica um
título de Doutor Honoris Causa em função de sua visita ao país.
[...] existia na época, a Universidade do Rio de Janeiro, mas só no
papel. Ela foi criada pelo presidente Epitácio Pessoa para, numa
demonstração de status cultural, receber o rei Alberto da Bélgica.
Mas o rei foi embora, passou poucos dias aqui e a universidade do
Rio foi fechada: já tinha cumprido seu papel (Azevedo apud Favero,
1977:30).
O estabelecimento da Universidade do Rio de Janeiro, mesmo que apenas no
papel, aguçou alguns questionamentos acerca do tema, possibilitando, à época, o
surgimento da Associação Brasileira de Educação, criada em 1924; a formação do
Ministério dos Negócios de Educação e Saúde Pública, em 1930; e a movimentação de
27
vários educadores e pesquisadores, com posicionamentos diversos, visando a reformas
educacionais que atendessem às novas necessidades da sociedade. Neste contexto, em
função de todo esse movimento, em 1932, foi apresentado um documento denominado
Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, que objetivava traçar as diretrizes de uma
nova política para a educação nacional em todos os níveis, aspectos e modalidades
(Azevedo, 1932).
Diante do atraso com que se configuraram as instituições universitárias no
Brasil, consideradas tardias por Schwartzman (2006)18, pois surgiram somente nos
anos 1930 e 1940, o país não participou de movimentos que ocorreram em outros
países da região, como afirma o autor citado:
Com isso, o ensino superior brasileiro permaneceu por muito tempo
imune ao movimento de ―reforma universitária‖ que, começando em
Córdoba, Argentina, em 1918, espalhou-se por muitos países da
região – Argentina, Peru, Uruguai, Venezuela, México – e
engendrou não só uma mescla peculiar de autonomia e politização
da universidade, mas também padrões acadêmicos que deixaram
bastante a desejar (Schwartzman, 2006).
Embora houvesse, segundo Romanelli (1996), experiências e tentativas
independentes para se organizar universidades em Minas Gerais, São Paulo, Paraná e
no Rio de Janeiro, na prática, as instituições educacionais do período configuravam-se
como a união de algumas escolas.
Os primeiros embriões para a organização das universidades brasileiras
também ocorreram nessa época. Onze anos após a criação da Universidade do Rio de
Janeiro – criada para oferecer o título ao Rei Belga - nasceu a primeira legislação que
visava a organizar o setor - Decreto 19.851, de 11 de abril de 1931 - que, segundo
Schwartzman (2006), tinha como missão controlar os padrões e os tamanhos das
profissões e, em função disso, criou controles rígidos de fiscalização. Tanto a
legislação quanto as práticas daquele período pressupunham a criação de uma
―universidade modelo‖, a partir da qual as demais seriam criadas.
18
Texto de uma conferência: ―The Flagship University and Development: The Role of ResearchOriented Universities in Middle-Income and Developing Countries‖, Boston College, June, 2005 e
publicado, simultaneamente, como Brazil‘s leading university: between intelligentsia, word
standards and social inclusion, em Philip G Altbach and Jorge Balán (ed.) Empires of knowledge
and development: the roles of research universities in developing countries (Baltimore, MD: Johns
Holpkins University Press, 2006).
28
É importante destacar que, ainda que existissem, no país, cursos superiores
realizados em instituições que não se caracterizavam como universidade, a primeira
instituição de ensino organizada, realmente, de acordo com o Estatuto das
Universidades Brasileiras foi a Universidade de São Paulo-USP, criada em 1934.
Nela, a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras consistia no cérebro do sistema, pois
possuía o objetivo de formar professores para o magistério secundário e, além disso, a
pesquisa configurava-se, nesse cenário, como suporte que perpassava todo o processo
didático pedagógico.
Portanto, 1934, não mais em função do servilismo político brasileiro, mas
como resultado da vontade e da luta de intelectuais brasileiros e franceses, nasceu a
Universidade de São Paulo, considerada, até hoje, umas das principais instituições de
ensino do país. Segundo Schwartzman (2005)19, ―A Universidade de São Paulo é a
principal Universidade de pesquisa e ensino de Pós-Graduação no Brasil, e sua
produção acadêmica é comparável à de várias das universidades consideradas de
classe internacional.‖
À universidade criada incorporaram-se as escolas superiores e os institutos de
pesquisas existentes, entre eles: Faculdade de Medicina, Faculdade de Direito, Escola
Politécnica, Escola Superior de Agricultura, Escola de Farmácia e Odontologia,
Medicina Veterinária, Instituto Butantã, Instituto de Pesquisas Tecnológicas.
É evidente que algumas razões explicam o sucesso da empreitada. O primeiro e
mais importante talvez seja o fato de o Estado de São Paulo, na época, configurar-se
como o mais significativo polo de desenvolvimento econômico do país, visto ser a
principal região de plantio e exportação cafeeira; além disso, mais tarde, tornou-se um
dinâmico centro industrial. Por outro lado, não se pode esquecer que a elite paulista
liderou a frustrada Revolução Constitucionalista. Segundo Schwartzman (2006), a
combinação entre riqueza e frustração certamente contribuiu para explicar as ambições
e os êxitos dos primeiros anos da Universidade de São Paulo. Um personagem
bastante significativo na constituição da USP é Júlio de Mesquita Filho, que descreve
as motivações para o empreendimento da seguinte forma:
19
Na conferência The Flagship University and Development: The Role of Research-Oriented
Universities in Middle-Income and Developing Contries, Boston College, june 2005.
29
Derrotados pela força das armas, sabíamos perfeitamente bem que só
pela ciência, e com um esforço contínuo, poderíamos recuperar a
hegemonia gozada na federação por várias décadas. Paulistas até os
ossos, tínhamos herdado dos nossos antepassados bandeirantes o
gosto pelos projetos ambiciosos e a paciência necessária para as
grandes realizações. Que monumento maior do que uma
universidade poderíamos erigir àqueles que tinham aceito o
sacrifício supremo para defender-nos do vandalismo que
conspurcara a obra dos nossos maiores, desde as bandeiras até a
independência, da Regência até a República? […] Saímos da
revolução de 1932 com o sentimento de que o destino tinha colocado
São Paulo na mesma situação da Alemanha depois de Jena, do Japão
depois do bombardeio pela marinha norte-americana, ou da França
depois de Sedan. A história desses países sugeria os remédios para
os nossos males. Tínhamos vivido as terríveis aventuras provocadas,
de um lado, pela ignorância e incompetência daqueles que antes de
1930 tinham decidido sobre o destino do nosso estado e da nossa
nação; de outro, pela vacuidade e a pretensão da revolução de
outubro [de 1930]. Quatro anos de contatos estreitos com os líderes
das duas facções nos convenceram de que o problema do Brasil era
acima de tudo uma questão de cultura. Daí a fundação da nossa
universidade, e mais tarde da Faculdade de Filosofia, Ciências e
Letras (Mesquita Filho, 1969 apud Schawartzman, 1991).
Desde a sua concepção, a Universidade de São Paulo foi uma organização
globalizada, buscando, nos centros mais avançados, os intelectuais para formar o seu
corpo docente. Naquela época, mais do que formar quadros competentes para fazer
crescer a economia, tinha-se, com meta, aproximar o Brasil, por meio da ciência e do
pensamento, da civilização europeia.
Nos anos 1940 outras universidades públicas e privadas foram formadas com a
fusão de faculdades isoladas. Em 1950, registravam-se cerca de 30 universidades em
todo o país, como demonstra Romano (1996).
Hoje, no Brasil, coexistem universidades e instituições de ensino superior
federais, estaduais, municipais e privadas. Menos de um século depois da criação da
primeira Universidade do Brasil (1922), o panorama do ensino universitário no país
mudou consideravelmente, com o crescimento vertiginoso do número de instituições
de ensino de nível superior, abrangendo, evidentemente, os setores público e privado.
No decorrer do tempo ocorreu uma mudança no perfil da Universidade
Brasileira que deixou de ser, majoritariamente, entidade pública para tornar-se
privada. Para Cristovam Buarque, ministro da Educação (2003 a 2004),
30
Houve um surpreendente crescimento do setor privado e uma
inesperada interiorização da universidade estatal, voltada, na sua luta
pela sobrevivência, para a defesa dos próprios interesses. A
universidade privatizou-se de duas formas: a predominância das
instituições privadas no número total de alunos e a perda de um
projeto social nacional por parte das universidades públicas
(Buarque, 2003:22).
A universidade, no Brasil, ganhou legitimidade somente na segunda metade do
século XX, profissionalizando a intelectualidade, sem, porém, manter vínculos com a
vida simbólica e material da sociedade brasileira (Bosi, 1991). Seja pela iniciativa do
Estado,
seja
pela
aparente
contradição
entre
ciência
e
cotidiano,
esse
―distanciamento‖, no geral, manteve-se.
No período em que, tardiamente, a universidade consolidava sua presença no
país como responsável pela formação dos quadros para a burocracia estatal e elites
políticas, a televisão, precocemente, instalava-se no país, participando da vida dos
brasileiros e disputando a hegemonia na formação da opinião pública, questão que será
aprofundada no capítulo 4, no qual se discutirão temas relativos às tensões que se
estabelecem entre o campo televisivo e o universitário.
1.5 Um raio X da Educação Superior
A universidade se materializa no corpo docente e discente, no
quadro técnico-administrativo, em sua estrutura física e em todos os
mecanismos que propiciam seu funcionamento. Assim, pensar a
universidade é pensar as pessoas concretas, corações e mentes que se
harmonizam em determinados aspectos e se antagonizam em outros
(Silva, 2002).20
Para o autor, a universidade não é uma entidade abstrata e constitui-se de um
campo de interesse no qual jogadores lutam para conquistar ou manter certas posições
e/ou poderes; em outras palavras, agora buscando referência em Bourdieu, pode-se
afirmar tratar-se de um ―palco de disputas‖.
20
Antonio Ozai da Silva – Apologia da Competência e a defesa da universidade pública –
Disponível em: http://www.espacoacademico.com.br/014/14pol.htm. Acesso em 25 de fevereiro de
2011.
31
Ainda visando à compreensão desse campo de poder, apresentam-se a seguir
dados do Censo da Educação Superior (2006, 2007 e 2009)21, produzido anualmente
pelo INEP, que tem por finalidade traçar uma radiografia da situação desse nível de
ensino no país. A partir destas informações será possível estabelecer análises precisas
relativas ao campo universitário, visto tratar-se de um documento oficial e bastante
criterioso em suas apurações. Para fins deste trabalho, dados relevantes do segmento
foram selecionados para a pesquisa ora realizada, portanto, não serão apresentados, na
íntegra, os resultados aferidos pelo INEP, mas, sim, aqueles considerados decisivos
para a pesquisa, análise e configuração do campo universitário.
O crescimento das instituições de ensino, no Brasil, vem sendo desacelerado,
ano a ano, nesta primeira década do Século XXI. Uma explicação possível é a
recorrente integração, por fusão ou compra, prática comum a partir de 2002, que tende
a gerar uma situação nova para o segmento, na medida em que provocará concentração
de escolas nas mãos de alguns poucos grupos de mantenedoras.
Ano
Quadro 2 - Desaceleração do Crescimento das IES
Total de IES
Percentual de crescimento
2002
1.637
2003
1.859
13,6%
2004
2.013
8,3%
2005
2.165
7,6%
2006
2.270
4,8%
2007
2.281
0,5%
2008
2.252
-2,03%
2009
2.314
0,5%
Fonte: Censo da Educação Superior 2007 – Ministério da Educação (INEP)
Como pode ser verificado pelo censo da Educação Superior em 2009, existiam,
no país, 2.314 instituições de ensino superior.
21
Os dados do Censo da educação são divulgados anualmente, no entanto, foi necessária a
utilização de informações de três anos diferentes, tendo em vista, que as informações não são as
mesmas de um ano para o outro. A cada nova edição o INEP dá prioridade para determinado
enfoque do processo. Por exemplo: no último Censo divulgado (2009) o foco foi na educação a
distância; em 2006 o foco maior foi no perfil do professor.
32
O número de instituições públicas cresceu, segundo dados do Censo 3,8%
(236/245) entre o período de 2008 a 2009, no entanto, no mesmo período as IES
privadas cresceram 2,6% (2.016/2.069).
Gráfico 1 - Número Instituições de Ensino – 2009
Fonte: Censo da Educação Superior 2009 – Ministério da Educação (INEP)
A figura 1 demonstra a divisão por categoria administrativa, ou seja, quantas
destas instituições tinham no ano de 2009 o título de universidade e quantas estavam
registradas como centros universitários (127), Faculdades isoladas (1.966) e Institutos
Federais e Cefets (35). Isso significa dizer, que 85% do ensino superior (1.966) está
concentrado em Instituições denominas Faculdades.
Figura 1 - Instituições Universitárias
TOTAL
IES NO BRASIL
2.281
186
2.128 OUTRAS ORG.
ACADÊMICAS
UNIVERSIDADES
92%
8%
Fonte: Censo da Educação Superior 2009 – Ministério da Educação (INEP)
33
Ainda assim, como demonstra o gráfico a seguir, em 2007 o número de
matriculados em IES com status de Universidades ultrapassava a casa dos 50%:
Quadro 3 - Matrículas por Organização Acadêmica
Organização Acadêmica
Matrículas
%
TOTAL
4.880.381
100,0
Universidades
2.644.187
54,2
Centros universitários
680.938
13,9
Faculdades integradas
1.555.256
31,9
Fonte: Censo da Educação Superior 2007 – Ministério da Educação (INEP)
A educação superior brasileira concentra grande número de matriculados num
pequeno número de instituições, para se ter uma ideia, em 2009, apenas 117 IES
detinham a matrícula de 2.505.670 alunos, ou seja, um pouco menos da metade, se
considerar-se que em 2009, segundo o censo, existiam no país 5.954.021 alunos
matriculados no ensino superior.
Para Bourdieu (1977), a educação perde seu papel de instância transformadora
e democratizadora, já que, no lugar de igualdade de oportunidade, meritocracia e
justiça social, passou-se à reprodução e à legitimação das desigualdades. Essa situação
fica evidenciada quando se observa a apresentação e a análise dos dados apurados pelo
INEP, no censo de 2007, e aplicados nos gráficos reproduzidos a seguir. A partir da
análise dos resultados é possível ratificar uma das hipóteses mais difundidas pelo
autor, que afirma haver relação entre sistema de ensino e estrutura das relações de
classe.
O que se percebe, com base nos dados apurados, é que a concentração do
número de escolas, de vagas, de matrículas, de concluintes e inscritos, no nível
superior, ocorre justamente na região mais privilegiada do Brasil, a região sudeste, na
qual há, também, predomínio da riqueza e urbanização. Ainda é possível apreender
deste cenário que, das dez maiores universidades do Brasil, oito estão situadas nessa
região.
34
Figura 2 - Regiões / Números de Instituições
2006: 412 (18,1%)
2006: 135 (5,9%)
2007: 422 (18,5%)
2007: 140 (6.1%)
2006: 1093 (48,1%)
2006: 243 (10,7%)
2007: 1.095 (48%)
2007: 249 (10,9%)
2006: 387 (17%)
2007: 375 (16,4%)
Fonte: Censo da Educação Superior 2007 – Ministério da Educação (INEP)
Gráfico 2 - Regiões / Evolução número de matrícula
Fonte: Censo da Educação Superior 2007 – Ministério da Educação (INEP)
35
Gráfico 3 - Regiões / Números de Inscritos
Fonte: Censo da Educação Superior 2007 – Ministério da Educação (INEP)
Gráfico 4 - Regiões / Número de Concluintes
Fonte: Censo da Educação Superior 2007 – Ministério da Educação (INEP)
36
O Número de matriculados na Educação Superior22 (graduação presencial +
ensino a distância) ultrapassava em 2007 a casa dos cinco milhões; destes, 4.880.381
estavam matriculados na graduação presencial. Atualizando os números para 2009
tem-se o seguinte: dos 5.954.021 alunos matriculados, 5.115.896 estão cursando
disciplinas em cursos da modalidade presencial e 838.125 na modalidade a distância.
Gráfico 5 – Evolução matrículas de Graduação
Fonte: : Censo da Educação Superior 2009 – Ministério da Educação (INEP
22
O INEP entende como Ensino Superior a soma dos dados obtidos nas avaliações da Graduação a
distância e Graduação presencial. Dados sobre a educação tecnológica foram abordados em
análises separadas.
37
Gráfico 6 – Evolução Cursos / Região
Fonte: Censo da Educação Superior 2007 – Ministério da Educação (INEP)
Pode-se afirmar que a educação superior se tornou um recurso social disputado
no mundo contemporâneo, uma vez que se consolidou como instrumento legítimo de
conservação social e princípio considerado adequado para o estabelecimento de
hierarquias. Tem-se a ilusão de que, a partir da escolarização, haverá uma chance
maior de ascendência social por meio da ocupação de cargos valorizados na estrutura
ocupacional. Para Bourdieu (1979), o valor de um título escolar depende da
capacidade do indivíduo de tirar proveito deste no grupo social ao qual pertence. A
isso, o autor deu o título de ―Lei do rendimento diferencial do diploma‖.
38
Quadro 4 – 10 Maiores cursos
Fonte: Censo da Educação Superior 2009 – Ministério da Educação (INEP)
A pesquisa divulgada em 2007 revelou que 62,6% dos alunos de graduação das
escolas públicas estavam matriculados no período diurno. No ensino privado, os
números invertiam-se, pois quase 70% dos matriculados encontravam-se no período
noturno.
Quadro 5 - Número matrículas Período
CAT. ADM.
DIURNO
DIURNO
NÚMERO
%
NOTURNO NOTURNO
NÚMERO
TOTAL
%
PÚBLICA
776.399
62,6 464.569
37,4
1.240.968
PRIVADO
1.094.449
30,1 2.544.964
69,9
3.639.413
TOTAL
1.870.848
38,3 3.009.533
61,7
4.880.646
Fonte: Censo da Educação Superior 2007 – Ministério da Educação (INEP)
Registrou-se um aumento de 6,3% no número de cursos de ensino superior
(graduação presencial + graduação a distância) em relação ao ano de 2006. Como em
quase todos os outros quesitos, aqui também, as IES privadas destacam-se como
responsáveis pela oferta de maior número de cursos.
39
Gráfico 7 - Oferecimento de Cursos Presencial e a Distância
30.000
25.000
20.000
15.000
10.000
5.000
0
2002
2003
2004
2005
2006
2007
Total
14.445
16.505
18.751
20.596
22.450
23.896
Federais
2.341
2.417
2.470
2.474
2.837
3.135
Estaduais
2.568
2.799
3.311
3.212
3.246
2.967
Municipais
380
482
520
578
591
642
9.156
10.807
12.450
14.332
15.776
17.152
Privadas
Fonte: Censo da Educação Superior 2007 – Ministério da Educação (INEP)
Para dar conta destes mais de cinco milhões de alunos matriculados, há,
segundo o Censo de 2009, 304.817 (trezentos e quatro mil oitocentos e dezessete) em
atividade. Desses 36% são mestres, 29% são especialistas
27% doutores e 8%
graduados. De acordo com os gráficos abaixo, pode-se perceber que nas instituições
públicas a soma de professores mestres e doutores corresponde 75% enquanto nas IES
privadas 55%. Destaque que, para as públicas maioria de doutores.
40
Gráfico 8 - Professores
Fonte: Censo da Educação Superior 2009 – Ministério da Educação (INEP)
As instituições de ensino com melhor relação professor doutor, segundo os
dados de 2006, por aluno são as federais - 1 doutor para cada 22,8 alunos. No outro
extremo, encontram-se as particulares com a pior relação - 1 doutor para cada 178,9
alunos.
Gráfico 9 - Alunos / Professor Doutor
Fonte: Censo da Educação Superior 2006 – Ministério da Educação (INEP)
Se essa relação for analisada a partir das regiões, mais uma vez percebe-se que
a sudeste leva vantagem - 1 doutor para cada 61 alunos.
41
Gráfico 10 - Regiões /Doutor
Fonte: Censo da Educação Superior 2006 – Ministério da Educação (INEP)
Outro dado relevante acerca do segmento é a questão do ranking das
instituições. Das dez maiores universidades, as quais respondem por quase 14% do
total das matrículas do país, apenas três são públicas.
Quadro 6 - As 10 Maiores Universidades do Brasil
Instituição
Localização
Rede de Ensino
Matrículas
Concluintes
Universidade
Paulista
São Paulo/SP
Privada
145.498
24.789
Universidade
Estácio de Sá
Rio de
Janeiro/RJ
Privada
116.959
17.093
Universidade
Nove de Julho
São Paulo/SP
Privada
84.398
4.573
Universidade
Bandeirante de
São Paulo
São Paulo/SP
Privada
69.074
9.385
Universidade
Presidente
Antônio Carlos
Barbacena/MG
Privada
57.291
10.953
Universidade de
São Paulo
São Paulo/SP
Pública
49.774
6.734
Universidade
Salgado de
São Gonçalo/RJ
Privada
47.853
9.469
42
Oliveira
Universidade
Luterana do
Brasil
Universidade
Estadual
Paulista Júlio de
Mesquita
Universidade
Federal do Pará
Canoas/RS
Privada
43.620
5.670
São Paulo/SP
Pública
32.204
5.803
Belém/PA
Pública
32.092
4.557
Fonte: Censo da Educação Superior 2007 – Ministério da Educação (INEP)
Ainda na linha do raio X da Educação Superior, é importante destacar que as
alterações não ocorreram somente nas instituições enquanto corporações educativas,
mas também, e significativamente, no perfil do jovem universitário. De acordo com
dados do ENADE - Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes - o crescimento
das IES privadas possibilitou o acesso dos estudantes de baixa renda ao curso superior.
Em 2006 foi apurado que 26% dos universitários ganhavam entre três e dez salários
mínimos; em 2004, esse percentual era de 21%.
Se, à primeira vista, esse crescimento parece positivo, para Bourdieu, porém, o
crescimento da taxa de escolarização forçará a concorrência entre os grupos sociais
pela posse dos capitais cultural e escolar, pois o número de postos de trabalho não
cresce proporcionalmente ao número de diplomados, o que, consequentemente,
segundo o autor, provocará desvalorização do certificado escolar. ―[...] os alunos ou
estudantes provenientes das famílias mais desprovidas culturalmente têm todas as
chances de obter, ao fim de uma longa escolaridade, muitas vezes paga com pesados
sacrifícios, um diploma desvalorizado.‖ (Bourdieu; Champagne, 1992:221)
Em decorrência desse aumento do grau de escolarização, os agentes deste
campo buscam deslocar suas estratégias, a fim de galgar níveis cada vez mais altos na
hierarquia acadêmica, ou, ainda, reforçar o que chamam, no meio, de ―ilhas de
excelência‖, ou seja, ramo de ensino elitizado (engenharias, medicina, etc) ou tipo de
escolarização mais seletiva ou mais rara (escolas internacionais ou bilingues, estudos
no exterior, etc) - processo denominado por Bourdieu (1998) de ―translação global‖.
43
Com essas estratégias, as distâncias que separam os agentes dentro do campo
alcançarão patamares cada vez mais elevados e difíceis de serem alcançados.
[...] um jovem da camada superior tem oitenta vezes mais chances de
entrar na Universidade que o filho de um assalariado agrícola e
quarenta vezes mais que um filho de operário, e suas chances são,
ainda, duas vezes superiores àquelas de um jovem de classe média.
(Bourdieu, 1998:41)
É certo que a universidade espelha as relações sociais existentes na sociedade
e, portanto, os conflitos gerados dentro dela expressam maniqueísmos universais e
particulares vividos pelos agentes fora da universidade. O crescimento das camadas
médias urbanas, consequência da industrialização e da urbanização, gerou um novo
contingente estudantil bastante heterogêneo. Por muitos anos a universidade recebeu e
formou os filhos das elites que, uma vez egressos da universidade, passavam a ocupar
os cargos mais relevantes no setor público e no privado. O acesso ao curso superior
por parte de um jovem oriundo de famílias sem recursos, de pessoas mais velhas já
inseridas no mercado e de mulheres, que era raro, hoje é bastante comum.
O ensino universitário, para a maioria dos brasileiros, configura-se como uma
utopia libertadora, ou seja, entende-se que, ao se obter um diploma de nível superior, o
agente protagonizará ascensão cultural e, prioritariamente, econômica. Para Bourdieu
(1999), esse mito não se sustenta, visto que a escola conserva as características sociais,
pois legitima as desigualdades existentes na sociedade. O ingresso à universidade é
marcado pela desigualdade social, haja vista que a classe dominante possui estrutura
bem maior (em alguns casos 80 vezes) que as outras classes sociais.
A escola - e o trabalho pedagógico por ela desenvolvido -, na perspectiva
bourdieusiana, só pode ser entendida, quando relacionada ao sistema das relações
entre classes, porquanto não se trata de uma instância neutra que transmite um
conhecimento superior às outras formas de conhecimento; a universidade não é a única
fonte do saber, e, assim sendo, desprezar o popular, o folclórico, em detrimento do
erudito é, no mínimo, um equívoco.
A seleção de significações que define objetivamente a cultura de um
grupo ou de uma classe como sistema simbólico é arbitrária na
medida em que a estrutura e as funções desta cultura não podem ser
deduzidas de nenhum princípio universal, físico, biológico ou
espiritual, não estando unidas por nenhuma espécie de relação
44
interna à natureza das coisas ou à uma natureza humana (Bourdieu;
Passeron, 1975:23).
1.6 O campo Universitário
―[...] a universidade também é o lugar de uma luta para saber quem,
no interior desse universo socialmente mandatário para dizer a
verdade sobre o mundo social (e sobre o mundo físico), está
realmente (ou particularmente) fundamentado para dizer a verdade.‖
(Bourdieu, 1990:116).
No Brasil o ensino superior, num espaço relativamente pequeno de tempo,
protagonizou significativas mudanças. Nos anos 1960, o sistema contava com
aproximadamente cem instituições de ensino, a maioria delas de porte médio ou
pequeno. Essas organizações eram responsáveis por formar os intelectuais da elite
nacional da época e, em geral, mantinham uma conduta de princípios ou, segundo
Bourdieu (1985), - um ethos23 - que orientava todos os processos da hierarquia escolar.
Na citação abaixo, Bourdieu chama atenção para a relação que se estabelece
entre o agente e a instituição da qual faz parte; no caso, o autor faz uma alusão ao
curso de filosofia e ao cenário francês, mas que pode ser transportado para a realidade
brasileira.
Produtos puros de uma instituição escolar triunfante, que concedia a
sua "elite" um reconhecimento incondicional, transformando, por
exemplo, um concurso escolar de recrutamento [...] numa instância
de consagração intelectual [...], essas espécies de crianças prodígios
se viam conferir por decreto, aos vinte anos de idade, os privilégios e
as obrigações do gênio. Numa França econômica e politicamente
diminuída, mas sempre tão senhora de si intelectualmente, podiam se
consagrar com toda inocência à missão que lhes atribuíam a
Universidade e toda uma tradição universitária habitada pela certeza
de sua universalidade: ou melhor, uma espécie de magistério
universal da inteligência (Bourdieu, 2005:57).
Incoerências e contradições, como foi visto, são inerentes às questões acerca da
universidade brasileira desde a sua criação até os dias de hoje. Segundo Santos (2005),
a universidade passa por uma crise formada a partir de três aspectos: o primeiro diz
respeito à legitimidade, haja vista a manutenção de um conhecimento hierarquizado e
de restrito acesso, por um lado, até a luta pela igualdade de oportunidade, por outro; o
23
Bourdieu caracteriza ethos como um sistema de valores implícitos e interiorizados, que contribui
para definir as atitudes face ao capital cultural e à instituição escolar.
45
segundo envolve uma questão de hegemonia, visto que não cabe mais ao Estado,
exclusivamente, a oferta do ensino superior e pesquisa, o que, consequentemente,
resulta em produção de conhecimento extrauniversidade; e o terceiro reside numa
questão puramente institucional que versa entre a contradição da autonomia
universitária e a pressão exercida pela lógica do mercado.
As questões de legitimidade, de hegemonia e institucionais relacionadas por
Santos (2005), para caracterizar a crise das universidades, somadas ao conceito de
campo desenvolvido por Bourdieu (1983), podem configurar-se como marcos iniciais
para o estudo que se pretende. O conceito de campo relaciona-se ao espaço temático
no qual se estabelecem relação de força mais ou menos desigual e onde os agentes
travam luta pela manutenção de suas posições. Para Bourdieu, é característica de um
campo possuir hierarquia interna, espaços estruturados de posições, objetos de disputa
e de interesses que são irredutíveis aos objetos, às lutas e aos interesses constitutivos
de outros campos.
O campo científico é sempre o lugar de uma luta, mais ou menos
desigual, entre agentes desigualmente dotados de capital específico
e, portanto, desigualmente capazes de se apropriarem do produto do
trabalho científico que o conjunto dos concorrentes produz pela sua
colaboração objetiva ao colocarem em ação o conjunto dos meios de
produção científicos disponíveis (Bourdieu, 1983:136).
A universidade configura-se como uma entidade que se materializa nos corpos
docente e discente, no quadro técnico e administrativo, enfim, em sua estrutura física e
administrativa, tendo suas práticas e ideias determinadas pela e para a sociedade e,
portanto, reproduz as relações e os conflitos vivenciados tanto pelos agentes internos
quanto pelos externos a este campo. O campo universitário configura-se como um
espaço no qual há diversos interesses em jogo e os jogadores têm posições diversas,
muitas vezes, consolidadas e, por isso, lutam para a manutenção ou conquista de
posições. Segundo Bourdieu (2000:85), ―o jogador é obrigado a tomar posição, a se
comprometer‖, em contexto no qual ―A única liberdade absoluta que o jogo concede é
a liberdade de sair do jogo por meio de uma renúncia heróica, a qual, a não ser que
crie outro jogo, não obtém a ataraxia senão à custa daquilo que é, do ponto de vista do
jogo e da illusio, uma morte social‖ (Bourdieu, 2000:85).
46
Apreende-se, portanto, que os agentes sociais fazem parte espacialmente de
determinados campos sociais e a posse de alguns capitais, entre eles o cultural24,
condiciona a posição que eles ocupam no campo. Assim, espera-se que cada jogador
conheça as regras do jogo dentro do campo social do qual faz parte. Evidentemente os
agentes sociais criam realidades, travam lutas e relações visando à imposição de seus
objetivos, porém sua influência está determinada em função da posição que ocupam
no espaço que pretendem transformar.
As práticas que ocorrem no campo universitário orientam-se para a obtenção
da autoridade científica, de status e, principalmente, do reconhecimento, o que, em
maior ou menor grau, determinará as táticas e as diretrizes do jogo científico. A
estruturação deste campo dá-se a partir de relações objetivas que se estabelecem entre
os diferentes agentes. A magnitude da estrutura do campo, entre eles o científico, é
medida em função da distribuição do capital - científico, social, político, artístico,
esportivo e econômico – entre os agentes. Segundo Bourdieu (1989), os portadores de
um quantum de capital (de qualquer natureza) optam por aceitar ou não as diretrizes da
sociedade, uma vez que o espaço social constitui-se de posições diversas, definidas em
função do tipo específico de capital que cada agente detém.
[...] falar de estratégias de reprodução não é atribuir ao cálculo
racional, ou mesmo à intenção estratégica, as práticas através das
quais se afirma a tendência dos dominantes, dentro de si mesmos, de
perseverar. É lembrar somente que o número de práticas
fenomenalmente muito diferentes organizam-se objetivamente, sem
ter sido explicitamente concebidas e postas com relação a este fim,
de tal modo que essas práticas contribuem para a reprodução do
capital possuído. Isto porque essas ações têm por princípio o habitus,
que tende a reproduzir as condições de sua própria produção,
gerando, nos domínios mais diferentes da prática, as estratégias
objetivamente coerentes e as características sistemáticas de um
modo de reprodução (Bourdieu,1989:386).
Se, por um lado, as questões relacionadas ao campo orientam-se pelas
dinâmicas das disputas ocorridas em seu interior, por outro, consubstanciam-se na
24
Bourdieu (1998) observa que o capital cultural pode se apresentar em três modalidades: a
primeira, a Objetivada, que diz respeito à propriedade de objetos culturais valorizados (livro /
obras de artes); a segunda, trata-se da Incorporada, que se relaciona à cultura legítima, ou seja,
aquela internalizada pelo indivíduo (habilidades linguísticas, crenças, conhecimentos,
comportamento) ligada à cultura dominante; a terceira e última delas, a Institucionalizada, que
compreende a posse de atestados que certificam a formação cultural.
47
estrutura do habitus dos agentes existentes no campo, visto que o agente/jogador
incorpora propriedades inerentes à lógica do campo. Para Bourdieu (2000), o habitus
configura-se como um núcleo de sistema de classificação da realidade que pode ser
desenvolvido ou incorporado pelos indivíduos dentro dos respectivos campos. Habitus
não é destino, embora, na maioria das vezes, seja entendido como um sistema gerado
no passado e direcionado para ação presente (Setton 2002).
O Conceito de habitus defendido por Bourdieu (1979, 1990, 1996, 1997, 1980)
consiste no princípio norteador de práticas e de representações articuladas a partir de
esquemas mentais construídos ao longo da trajetória do indivíduo.
[...] um sistema de disposições duráveis e transponíveis que,
integrando todas as experiências passadas, funciona a cada momento
como uma matriz de percepções, de apreciações e de ações – e torna
possível a realização de tarefas infinitamente diferenciadas, graças às
transferências analógicas de esquemas [...] (Bourdieu, 1983:65).
O conceito de habitus surge para conciliar a aparente oposição entre as
realidades externa e interna na busca de mediação entre o mundo objetivo e o mundo
subjetivo, visto como um sistema de esquemas individuais formado no mundo social
(estrutura) e na mente (estruturante). Trata-se, portanto, de uma matriz geradora de
práticas distintas e distintivas, fruto da incorporação da estrutura social e da posição
social de origem no interior do próprio sujeito.
Extrapolando a noção de habitus para a realidade acadêmica, seria como
questionar o que veste e como veste o intelectual, seu esporte e seu modo de praticálo, suas opiniões e suas maneiras de expressá-las. Evidentemente, seu consumo e
atividades seriam substancialmente diferentes dos de seus alunos, do corpo técnico
administrativo e até de alguns de seus pares, mas é fato que cada sujeito, em função de
sua posição social, vivencia uma série de experiências que estruturam seu
comportamento, o qual não precisa ser seguido indeterminadamente, visto não se
configurar como um conjunto inflexível de regras e, sim, como um princípio que pode
ser adaptado de acordo com a conjuntura.
A cada classe de posições corresponde uma classe de habitus (ou de
gostos), produzidos pelos condicionamentos sociais associados à
condição correspondente e, pela intermediação desses habitus e de
suas capacidades geradoras, um conjunto sistêmico de bens e de
propriedades, vinculados entre si, por afinidades de estilo. Uma das
48
funções da noção de habitus é a de dar conta da unidade de estilo
que vincula as práticas e os bens de um agente singular e de uma
classe de agentes (Bourdieu, 1979:21).
A ação educativa/universidade sempre se revestiu de uma complexidade
bastante exacerbada. Essa característica, na contemporaneidade, é ainda mais marcante
devido à presença, em função da ―democratização‖ do ensino, de jovens das mais
variadas origens sociais e culturais, sem falar das tecnologias da informação e da
comunicação. A realidade mudou, mas será que as escolas e os professores também
acompanharam essas mudanças? Como visto, as questões relativas à educação estão
subordinadas a um conjunto de pressupostos históricos que determinaram e ainda
determinam o processo de ensino e aprendizagem, e, evidentemente, esses mesmos
pressupostos também foram decisivos para a formação do Estado Brasileiro e do
habitus inerente a esse campo.
A instituição escolar, com raríssimas exceções, não dialoga com as realidades
sociais; sua estrutura basicamente seriada e predominantemente meritocrática, com
tempos e espaços rígidos, difere-se da realidade e dos habitus de seus alunos.
Florestan Fernandes (1979), ao refletir sobre a universidade, ressalta que, ―quando se
tentou instituir a ‗universidade‘, não se pensou em corrigir os defeitos estruturais da
‗escola superior‘, e a ‗universidade brasileira‘ assumiu o caráter de uma
conglomeração de escolas superiores‖. Se o habitus, como afirma Bourdieu, é o
princípio gerador e unificador de uma classe que traduz seu estilo de vida, escolhas e
práticas, talvez isso explique a dicotomia existente entre os interesses dos diversos
agentes desse campo.
O campo universitário caracteriza-se pelo enraizamento de velhos habitus,
muitas vezes cultivados propositalmente, para conferir status a seus agentes mais
célebres. Concebido para legitimar a dominação exercida pelas classes dominantes,
todas as práticas neste campo são orientadas pela busca da autoridade científica que
determina, entre outras coisas, o prestígio e o reconhecimento de seus pares. A busca
pela autoridade científica, na prática, produz o afastamento do professor pesquisador
do ensino e da extensão, uma vez que estes preferem permanecer em seus laboratórios
para obter maiores recursos financeiros, prestígio social e, consequentemente,
progressão funcional, o que, para Bourdieu (1983), denomina-se como lucro
simbólico, espécie de reconhecimento concedido pelos pares, no interior do campo.
49
Bourdieu (1984) entende o sujeito da ciência - o homo academicus - como
elemento do objeto da ciência, afastando-se da ilusão de ―intelectual‖ sem laços e nem
raízes, e o caracteriza a partir de interesses específicos (postos acadêmicos, contratos
de edição, reconhecimentos e gratidões), na maioria das vezes, imperceptíveis aos
olhos daqueles que não fazem parte deste universo. Para ele, os intelectuais são,
enquanto ‗detentores do capital cultural, um fragmento (dominado) da classe
dominante, e muitas de suas posições, em relação à política, por exemplo, devem-se à
ambiguidade de sua posição de dominados entre dominantes. A crítica de Bourdieu ao
homo academicus torna-se ainda mais severa, à medida que analisa a sedução causada
por produções supostamente científicas, por temas da moda.
Se, como diz Bourdieu, o habitus se apresenta em cada sujeito em função de
sua posição na estrutura social, o que provoca uma série de experiências que
estruturam internamente sua subjetividade, é importante destacar que as características
do professor no Brasil – reflexo das dicotomias existentes no ensino superior – não são
uniformes. Segundo Schwartzman; Balbachevsky (1997), existem três grupos de
docentes no país:
a) Nas instituições paulistas (de referência) e em menor grau nas federais professores mais qualificados, trabalhando em tempo integral, envolvidos em
pesquisas com financiamento próprio, com pouca participação sindical e
grande envolvimento acadêmico;
b) Nas instituições privadas e estaduais - professores com títulos de mestre e
especialização, trabalhando em tempo parcial, dando expressivo número de
aulas e prestando serviço ao setor;
c) Nas instituições públicas federais – predominância de professores de
qualificação média, estáveis, de tempo integral, com grande envolvimento em
atividades sindicais e corporativistas e produção científica relativamente
pequena.
A Instituição Universitária brasileira não forma uma única categoria com os
mesmos interesses, porém forjou-se a partir de um habitus característico de seus
agentes, que a legitimam em função da transmissão de conteúdos e cultivo de
avaliações de produtividade e competência, provocando seu distanciamento da
50
comunidade que a compõe e que a rodeia. Nesse cenário, a universidade orienta-se
pela geração, disseminação, ampliação e aplicação de conhecimentos, visando a dar
sentido à vida na sociedade e, para isso, é necessário o rompimento com velhas
fórmulas e conceitos. Esse campo é delimitado por muros, que num primeiro momento
o protege, mas também o afasta do caminho da socialização de suas produções. A tevê
universitária, objeto deste trabalho, coloca os agentes do campo universitário em
situações novas em relação àquelas desenvolvidas entre os muros, podendo significar
uma ampliação do campo.
Questões relativas à disseminação e à ampliação da atividade científica
constituem-se como temas amplamente discutidos nos diversos campos subjacentes ao
universitário. O ponto crucial desta discussão refere-se ao habitus dos agentes deste
campo que, normalmente, utilizam uma linguagem elitizada e de difícil entendimento
por parte daqueles que não compõem o campo. A autoridade científica, como visto,
legitima-se na luta concorrencial, travada entre os agentes do próprio campo, não
existindo espaço para julgamentos externos.
O estado da arte acerca da divulgação científica será amplamente discutido no
capítulo três, por ser o momento no qual se discutirá o espaço do Canal Universitário
neste amplo campo, entendido como um eficiente espaço para a divulgação científica,
na medida em que se constitui como uma vitrine pela qual as inúmeras possibilidades
acadêmicas podem ser descortinadas e divulgadas para a sociedade.
Neste primeiro capítulo discutiram-se aspectos relevantes da inserção da
universidade no Brasil. Na sequência, discutiremos a trajetória da televisão no Brasil,
para, no capítulo seguinte, analisar caminhos de convergência entre estes dois campos,
que teria ocorrido com a implantação das tevês universitárias.
51
Capítulo 2 - O campo televisivo: formulações
contemporâneas
Este capítulo tem como foco a apresentação, a partir de uma pesquisa
bibliográfica e documental, da televisão no contexto contemporâneo. Para isso
buscaram-se dados relativos às condições de sua implantação e desenvolvimento no
país – quem eram seus agentes na época; quais lutas se travaram para a distribuição
das posições dentro deste campo; a tevê pública (canais universitários, canais
legislativos, canais comunitários) X tevê privada; o contexto da digitalização da tevê e
suas consequências.
“Tire a televisão de dentro do Brasil e o país desaparece”
Eugênio Bucci, presidente da Radiobrás
52
2.1 A tevê e seus desdobramentos na vida em sociedade
A televisão é muito mais do que um aglomerado de produtos
descartáveis destinados ao entretenimento da massa. No Brasil, ela
consiste num sistema complexo que fornece o código pelo qual os
brasileiros se reconhecem brasileiros. Ela domina o espaço público
(ou a esfera pública) de tal forma, que, sem ela, ou sem a
representação que ela propõe do país, torna-se quase impraticável a
comunicação – e quase impossível o entendimento nacional. [...] O
espaço público no Brasil começa e termina nos limites postos pela
televisão [...] O que é invisível para as objetivas da TV não faz parte
do espaço público brasileiro. O que não é iluminado pelo jorro
multicolorido dos monitores ainda não foi integrado a ele
(Bucci,1997:9).
Exercendo fascínio em uns e repulsa em outros, a televisão está presente, direta
ou indiretamente, na vida dos brasileiros e exerce um papel decisivo na formação e nas
atitudes da sociedade. A tevê pode ser considerada uma vitrine pela qual o mundo é
descortinado em tempo real e as cenas do cotidiano do planeta são veiculadas,
atiçando a sensibilidade e a inteligência do sujeito. Nessa vitrine de acontecimentos,
fatos dispersos e inexplicáveis se sucedem – são imagens fragmentadas e, muitas
vezes, incompreensíveis do mundo que ajudam a formar a opinião de muitos
brasileiros. A televisão preenche o vazio social e é utilizada, pela maioria das pessoas,
como uma fuga para as dificuldades do cotidiano. Segundo Bourdieu (1997), a
televisão não manipula só pelo que transmite, mas, sobretudo, pelo que omite. E talvez
seja por isso que ele insista na tese de que a
[...] televisão tem uma espécie de monopólio de fato sobre a
formação das cabeças de uma parcela muito importante da
população. Ora, ao insistir nas variedades, preenchendo esse tempo
raro com o vazio, com nada ou quase nada, afastam-se as
informações pertinentes que deveria possuir o cidadão para exercer
seus direitos democráticos (Bourdieu,1997:23).
Antes as pessoas saíam às ruas ou ficavam nas janelas de suas casas para se
informarem sobre o que ocorria nas proximidades, na região e até mesmo no mundo.
A conversa cara a cara com os vizinhos e com os viajantes possibilitava a troca e a
renovação das informações. Hoje a janela é a tela da tevê; através dela é possível saber
tudo o que ocorre em tempo real e em todas as partes do mundo. De qualquer lugar e a
53
qualquer hora, através da televisão, pode-se saber desde a previsão do tempo até os
fatos que sacodem o mundo, como a queda do Muro de Berlin, o atentado de 11 de
setembro de 2001 ou uma final de uma copa do mundo de futebol. O conteúdo
oferecido pela programação televisiva passou a orientar a vida da maioria dos
cidadãos. Pessoas de todas as idades, condições econômicas e níveis intelectuais
vivem "ligadas na televisão". Segundo o IBGE (2008), dos 175 milhões de brasileiros
com mais de 14 anos, 49,2% assistem à tevê por mais de três horas ao dia. 25
Observa-se nas sociedades contemporâneas, marcadas pelo consumo, pela
massificação e pela violência, principalmente nos centros urbanos, o crescente
abandono dos espaços coletivos, com a rua perdendo seu aspecto de lazer e assumindo
um caráter utilitarista, de passagem e de transporte. Na contramão desse processo, a
vida íntima e familiar passa a ser cultuada, com atividades como o lazer e a
socialização, cada vez mais, restringindo-se ao ambiente familiar. Dessa forma, o
cidadão urbano contemporâneo também se encontra cada vez mais recolhido ao
espaço de sua casa, reduzindo seu convívio à família e a um pequeno grupo. No plano
subjetivo, esse contexto estimula o recolhimento afetivo das pessoas, em um processo
cada vez maior de ensimesmamento e restrição das suas relações interpessoais
(Sennet, 1989).
Nesse contexto de valorização da vida familiar e íntima e de desvalorização da
vida coletiva, pode-se entender a influência da televisão na contemporaneidade,
pensando no trabalho relativo à instituição do espaço imaginário e na mediatização da
esfera pública, pois, na expressão de Soares (1994), na atualidade encontramos o
espaço público mediatizado. A televisão colabora para a "reorganização do homem
com o ambiente" por meio de um processo complexo: reforça o espaço privado ao
estimular a vida familiar, muitas vezes até solitária, em frente ao aparelho; veicula
"notícias e imagens" do que acontece "na rua", simulando, de certa forma, a
participação do indivíduo na vida pública. Ao transmitir o que acontece fora do
convívio familiar, ou seja, na rua, ocorre a interpretação do ocorrido, transformando,
na maioria das vezes, a versão em realidade. Segundo Marilena Chaui (2006), a
25
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2008, do Instituto Brasileiro de
Geografia
e
Estatística
(IBGE),
divulgado
em
31/03/2010.
Disponível
em
http://www.abril.com.br/noticias/brasil/ibge-43-acima-14-veem-tv-mais-3h-dia-981447.shtml
54
sociedade capitalista pós-moderna somente consegue produzir simulacros. E o
simulacro é o espetáculo ―[...] quando capturado, produzido e enviado pelos meios de
comunicação‖. Ainda segundo a autora:
[...] multimídia potencializa um fenômeno que já tínhamos frisado
ao nos referirmos à televisão, qual seja, a indistinção entre as
mensagens e entre os conteúdos. Como todas as mensagens estão
integradas em um mesmo padrão cognitivo e sensorial, uma vez que
educação, notícias e espetáculos são fornecidos pelo mesmo meio, os
conteúdos se misturam e se tornam indiscerníveis. (Chaui, 2006:43).
A televisão, tal qual vemos hoje, pode ser considerada como um dos aparelhos
ideológicos mais centrais e abrangentes da sociedade contemporânea, configurando
um aparente paradoxo entre manutenção do status quo e incentivo à mudança, motivo
que levou Althusser (1985) a designar, como Aparelho Ideológico do Estado de
Informação, aquele que inclui a imprensa, o rádio e a televisão.
2.2 Das aventuras de Chatô à tevê segmentada e digital
Quase sessenta anos já se passaram após a chegada dos 200 aparelhos de tevê
importados por Assis Chateaubriand e espalhados pela Cidade de São Paulo em
setembro de 1950. A televisão chegou ao Brasil, após cinco anos de consolidação nos
três principais países do mundo, por meio da TV Tupi, primeira tevê do país; a
primeira da América Latina e a quarta do mundo (Castro, 2006:49)26. Sua chegada ao
Brasil, segundo Mattos (2002:27), coincidiu com o começo de um importante período
de mudanças na estrutura econômica, social e política do país e do mundo.
O fim da Segunda Guerra Mundial, no plano externo, e do Estado Novo, no
interno, levaram o Brasil a reorganizar diversos setores da vida social, e a implantação
da televisão no país fez parte do processo, caracterizado, conforme Muniz Sodré
26
Trabalho realizado a convite do Governo Federal, no ano de 2005, por um grupo de
pesquisadores ligados à linha teórica da Economia Política da Comunicação e dos Estudos
Culturais Críticos.
55
(1971:24), pelo desenvolvimento industrial, por grandes projetos, pelo populismo
getulista, pela ampliação do proletariado e da classe média urbana, formada por
membros de uma aristocracia decadente e por famílias de migrantes e de imigrantes.
Durante esse período, o país sofreu uma série de transformações econômicas,
centradas principalmente na industrialização, o que contribuiu para intensificar o
processo de modernização das cidades brasileiras.
A gestação do processo de criação da tevê brasileira data de 1949, quando
Chateaubriand adquiriu, da RCA Victor, os equipamentos necessários para a
efetivação de uma emissora e nomeou quatro diretores para implantá-la (Mattos,
2002:49). No entanto é importante ressaltar que as táticas para a sua implantação
foram promovidas dois anos antes, quando os Diários Associados passaram a
desenvolver estratégias, objetivando, além, evidentemente, do treinamento de seus
―radioatores‖, a popularização dos atores e a publicidade do novo veículo. Para se ter
uma ideia, meses antes de a tevê Tupi entrar efetivamente no ar, os jornais e revistas
dos Diários Associados passaram a divulgar que estava para chegar ao país a televisão
ou o ―cinema a domicílio‖, maneira que encontraram para tentar explicar ―aquele
símbolo de modernidade‖ (Simões, 1986).
Neste mais de meio século, muitas coisas mudaram e, do amadorismo
característico das primeiras transmissões, passou-se a ―modelos‖ extremamente
complexos e profissionais do fazer televisivo. Em termos cronológicos, identifica-se
que cada década transcorrida teve características próprias e marcantes para o
desenvolvimento do veículo de comunicação de maior presença na sociedade desde os
anos 1970. Segundo Mattos (2002:), a origem e o desenvolvimento histórico da
televisão no Brasil compreendem seis fases.
A fase elitista (1950 a 1964), quando a televisão ainda era considerada um
artigo de luxo, destinado a uma parcela bastante pequena da população, ou
seja, um bem disponível somente à elite econômica. Neste período, há que se
registrar que o preço de um televisor era três vezes maior que o da mais
sofisticada radiola da época (Mattos, 1982) e pouco menor que o de um carro.
Além disso, não existia no país uma indústria de componentes para os
televisores, fazendo com que até mesmo as válvulas fossem importadas dos
56
EUA (Sodré, 1977). Nesta fase havia destaque para uma programação cultural
bastante intensa. Em 1954, o IBOPE divulgou que 48% dos proprietários de
aparelho de televisão tinham assistido pela televisão, pelo menos, a uma
apresentação de balé. Porém, em 1958, a fim de expandir o tamanho da
audiência, as emissoras abandonaram a programação cultural (Revista Veja,
1970:63). Gabriel Cohn (Apud Mattos, 2002) escreveu que, durante os anos
1950, a televisão brasileira foi elitista, enquanto a vida política foi marcada
pelo populismo. Já, durante os anos 1960, a programação televisiva deu
destaque a programas populares, enquanto, em total contraste, a vida política
do país já havia se afastado da prática populista.
A fase populista (1964 a 1975) foi marcada pela grande influência política.
Segundo Mattos (2002), o golpe de 1964 comprometeu diretamente os meios
de comunicação de massa, visto que o sistema político e a situação
socioeconômica do país foram alterados em função da adoção de um novo
modelo econômico que visava a um acelerado crescimento nacional. Coube à
televisão, neste período, o papel de difusora da ideologia do regime. Ainda
durante a década de 1960, impulsionadas pela ideia de desenvolvimento
econômico, as indústrias eletrônicas começaram a produzir aparelhos
televisores. A televisão, nesta fase, foi considerada um exemplo de
modernidade. Em 1968, para intensificar as vendas, o governo instituiu uma
política de crédito que permitia adquirir um televisor em 12, 24 ou 36 meses;
com isso, o número de telespectadores aumentou significativamente e a
televisão passou a definir-se como veículo publicitário nacional, por meio do
qual a indústria podia apresentar seus bens de consumo. Esse período, que
corresponde à segunda etapa do desenvolvimento da televisão, foi marcado
pela profissionalização do segmento e pela adoção do modelo de gestão
baseado nos padrões de administração das tevês norte-americanas.
A fase do desenvolvimento tecnológico (1975 a 1985) foi determinada por
alguns fatos que alteraram a dinâmica da esfera pública: o fracasso eleitoral de
1974, quando a ARENA, partido base do regime, elegeu somente seis
senadores versus dezesseis do MDB, partido de oposição; o fechamento do
Congresso Nacional em 1977; a publicação das reformas políticas e jurídicas; o
57
início do processo de abertura. Nesta fase, a autoridade política foi bastante
presente na programação televisiva, pois, a partir dos anos 1970, o governo
começou a expressar preocupações com a influência dos conteúdos dos
programas veiculados. As redes eram constantemente lembradas de suas
responsabilidades para com a cultura e com o desenvolvimento nacional. Foi
durante essa fase que a nacionalização da programação televisiva passou a ser
perseguida. Segundo Mattos (2002), o governo queria substituir a violência dos
enlatados
americanos
por
programas
mais
amenos.
Para
isso,
foi
disponibilizado crédito nos bancos oficiais, isenções fiscais, coproduções (TV
Educativa, Embrafilmes), além da concentração da publicidade oficial em
algumas empresas. Esta foi a fase da padronização da programação televisiva
em todo o país e da solidificação do conceito de rede de televisão.
Nas três primeiras fases do desenvolvimento da televisão brasileira, tanto a
publicidade quanto o governo tiveram uma participação preponderante:
A televisão transformou-se também no maior e mais importante
veículo publicitário do país e as corporações multinacionais se
tornaram os seus maiores anunciantes [...] o conteúdo transmitido
neste período sofreram influências tanto do governo como dos
anunciantes através das agências de publicidade (Mattos, 2002:115116)
Ao final da terceira fase, o campo televisivo contava com quatro redes
comerciais operando em escala nacional (Globo, Bandeirantes, Manchete e SBT), duas
regionais (Record e Brasil Sul) e uma rede estatal (TV educativa).
A fase da transição e da expansão internacional (1985 a 1990) caracterizou-se
pela transição do regime militar para o regime civil, no qual as principais
mudanças no setor das comunicações decorreram da promulgação da
Constituição de 1988, que legisla, inclusive, sobre a comunicação social. Esse
período foi marcado, antes da publicação da Carta Máxima, pelas inúmeras
concessões de rádio e televisão ocorridas entre 1985 e 1988, quando foram
outorgadas 90 concessões de canais de televisão. Nesta fase, percebe-se uma
maior competitividade entre as grandes redes, o contínuo avanço em direção ao
mercado internacional e maior maturidade técnica e empresarial.
58
A fase da globalização e da TV paga (1990 a 2000) foi o período em que o
país buscava a modernidade a qualquer custo e a televisão adaptou-se aos
novos rumos da redemocratização. Foi nesta fase do desenvolvimento da tevê
que duas novas leis foram aprovadas e representaram dois grandes marcos para
a história da comunicação no país: Lei 8.389, de 30 de dezembro de 1991, que
regulamenta o Conselho de Comunicação Social, e a Lei 8.977, de 6 de janeiro
de 1995, que regulamenta a tevê por cabo. Pode-se afirmar que, nos últimos
dez anos do século passado, a televisão brasileira sofreu inúmeras
transformações, e a tevê por assinatura teve papel decisivo na mudança do
perfil desse veículo. Há que se destacar que, em função do impacto do Plano
Real, as camadas mais pobres da população tiveram seu poder aquisitivo
aumentado, o que gerou aquecimento nas vendas de novos televisores e
culminou com o crescimento das audiências das classes C, D e E. Essa nova
audiência, bem como o fato de grande parte da audiência das classes A e B
terem migrado para a tevê por assinatura, acirrou a briga entre as redes de tevê
aberta.
Na disputa pela audiência C, D, e E que, apesar de menos qualificada, é
quantitativamente maior, as emissoras apelaram para os programas popularescos,
sensacionalistas, e também passaram a lançar mão de sexo e violência [...] (Mattos,
2002:150).
A fase da convergência e da qualidade digital inicia-se no ano 2000, com
perspectivas tecnológicas nunca antes vistas. Esse período vem sendo marcado
pela interatividade cada vez
maior dos
veículos
de comunicação,
principalmente entre a televisão, a internet e outras tecnologias da informação.
Segundo vários especialistas, um passo bastante importante diz respeito ao
desenvolvimento da tevê digital brasileira, que vai além da superação da
qualidade de som e imagem. O que se promete são outros serviços, inclusive
navegação na internet. Segundo Mattos, a ideia de uma televisão do futuro foi
apresentada, em 1999, no Canadá:
59
A ideia de que a televisão do futuro chegará aos lares via internet, através de
diversos canais de acesso ao sistema, por cabo de fibra óptica ou através de sinal
enviado diretamente por satélite, foi apresentada pela primeira vez em 1999, por
Robert Herbold, vice-presidente executivo da Microsoft Corporation, em depoimento
durante um congresso mundial organizado pela Iafei – The International Association
Of Financial Executives Institutes, em Vancouver, Canadá, cujo tema central foi:
―sucesso Global: desafios e oportunidades‖. Segundo suas previsões, num futuro não
muito distante, o cidadão, ao ligar o aparelho de TV, estará automaticamente
conectado a todo tipo de informação, como televisão e arquivos de imagens gravadas,
podendo acessar, através do telefone, com ou sem imagem, mensagens que hoje
chegam em sua maior parte via internet (Mattos, 2002:152).
A força da tevê no Brasil pode ser entendida a partir de, pelo menos, dois
aspectos. O primeiro deles diz respeito à baixa escolaridade dos telespectadores:
segundo o Datafolha (2004), apenas 25% dos brasileiros com mais de 15 anos
dominam plenamente a leitura; 8% são analfabetos; 30% são classificados como
analfabetos funcionais, ou seja, aqueles que leem, mas não entendem o conteúdo dos
textos e 37% conseguem identificar uma informação curta, mas não vão além disso
(Dimenstein, 2004). O segundo aspecto refere-se ao fato de que, por não saber ler,
grande parte dos brasileiros compreende o país e o mundo por meio da televisão.
Bucci (1997) explica o valor da tevê em países como o Brasil:
A importância da televisão numa sociedade, atualmente, é
diretamente proporcional às taxas de analfabetismo e
subdesenvolvimento. A influência do veículo tende a ser maior na
pobreza do que na riqueza, maior em continentes como a América
Latina do que nos Estados Unidos. [...] nos países mais ricos, a
Imprensa escrita, a família e a escola fazem a mediação da influência
da televisão, e há leis que estabelecem limites para as grandes redes
(Bucci, 1997:15).
2.3 A televisão por assinatura
A televisão brasileira, desde seu início, vem introduzindo significativas
modificações tecnológicas e ampliando sua ação na sociedade. Os anos 1990 foram
ricos nesse aspecto, apresentando novas possibilidades de acesso à produção e à
60
veiculação de mensagens, em função de novas tecnologias de transmissão. É nesse
cenário que novos modelos de transmissão televisiva começaram a ocupar o espectro.
O modelo de televisão paga pelos telespectadores, e não apenas pelos
anunciantes, é tão antigo quanto o próprio meio em questão. Apesar disso, grandes
discussões éticas e técnicas foram travadas, já que há a necessidade de convencer o
telespectador a pagar por algo que tradicionalmente é gratuito e, ao mesmo tempo,
encontrar um meio de restringir o sinal aos não assinantes.27
A história faz constar que a televisão por assinatura surgiu na década de 1940,
nos EUA, para resolver problemas de recepção de sinais da tevê aberta. No Brasil, a
história foi semelhante, já que também surgiu para resolver problemas de ordem
técnica: fazer com que a tevê aberta chegasse às cidades serranas do Rio de Janeiro
com boa qualidade de imagem e som. Essas cidades passaram a ser atendidas por uma
rede de cabos coaxiais que transportavam os sinais depois de serem recebidos por
antenas que simulavam a cabeça de rede (espécie de headend)28.
Se o Brasil foi o primeiro país da América Latina a implantar a tevê, foi o
último país a ter o sistema de tevê por assinatura29. Para Hoineff (1998), esse atraso
tem algumas justificativas: a primeira delas diz respeito à hegemonia das redes
abertas; a segunda está relacionada à pequena capacidade cultural da sociedade
brasileira; a terceira e última justificativa reside no limitado espírito empreendedor dos
envolvidos no negócio das comunicações no país, uma vez que, ainda segundo esse
27
Quando falamos em ―gratuito‖, falamos acerca do serviço de distribuição via satélite – como o
Direct to Home / DTH –, que utiliza o ar público sem pagar nada. Segundo Duarte (1996), o
Comitê de Comércio do Senado (dos EUA , em 1958) requereu à FCC (Federal Communication
Commission) que parasse os testes com TV paga até que o congresso decidisse o que fazer com a
questão. Isso fez com que, na época, qualquer teste com TV paga pelo ar fosse bloqueado. Cabe
lembrar que, naquele momento, os testes com TV por assinatura via cabo, que não precisavam de
autorização do FCC, continuavam a todo vapor.
28
Central onde ficam todos os equipamentos de imagem da empresa, de onde se gerencia toda a
operação.
29
A primeira regulamentação ocorreu em 1985, quando José Sarney e Antonio Carlos Magalhães,
respectivamente, Presidente da República e Ministro das Comunicações, assinaram o decreto
95.744/85.
61
autor, os empresários deste setor sempre dependeram do Estado para desenvolver as
atividades da área.
A tevê por assinatura, segundo Brittos (2001), define-se como um sistema de
transmissão de imagens e som que utiliza qualquer meio de emissão de sinais
codificados, sendo acessado mediante pagamento.
2.3.1 Tevê por assinatura e a distribuição dos sinais
Desde 1817, quando o químico sueco Jakob Berzelius descobriu o selênio,
muitas coisas relativas às tecnologias de transmissão de imagens mudaram – da tevê
colorida à transmissão digital.
No Brasil, a partir dos anos 1980, quem tem possibilidade para pagar e manter
uma assinatura mensal pode optar pelas seguintes tecnologias de transmissão: microondas (MMDS), satélite (DBS, DTH) e cabo. Este último, atualmente, configura-se
como o suporte mais popular entre os sistemas de distribuição de sinais encontrado no
país. Há ainda uma quarta possibilidade, no entanto, pouco relevante em função de sua
pequena expressão no segmento – UHF – codificado com apenas um canal de
programação.
O gráfico a seguir indica a hegemonia da tecnologia do cabo.
Gráfico 11 – Assinante por tecnologia
Fonte: ABTA março 2010
62
2.3.2 Distribuição por micro-ondas
MMDS - Multipoint Multichannel Distribution System
Esse modo de distribuição de sinal, a mais antiga forma de oferecimento de
tevê paga (1991 – grupo Abril), configura-se de maneira similar à de uma emissora de
televisão, ou seja, recebe, codifica e transmite os sinais das programadoras por meio
de micro-ondas terrestres.
O número de canais deste tipo de sistema é inferior ao do cabo – 31 (trinta e
um) analógicos -, no entanto espera-se que, com a implantação da tevê digital, sua
capacidade seja ampliada. O custo do MMDS é pequeno, visto que suas antenas são
instaladas à medida que surgem novas solicitações.
Essa tecnologia foi regulamentada, no Brasil, pelo Decreto n.º 2.196, de 1997,
como uma das modalidades do Serviço Especial de Telecomunicações. Os sinais do
MMDS cobrem uma área com raio de até 50 quilômetros, levando a programação
tanto às áreas urbanas quanto às rurais. Permite também a transmissão de programação
local, pois o headend está situado no local da prestação do serviço.
2.3.3 Distribuição por satélite
DTH – Direct to Home
Esse modo de distribuição de sinal ocorre a partir da instalação de uma
miniantena parabólica e de um receptor/decodificador na residência do assinante. O
sinal é emitido diretamente de um satélite. O custo desse sistema é bastante alto, já que
envolve aluguel de espaço em satélite. A grande diferença do DTH em relação ao cabo
e ao MMDS é a não inserção de programas com conteúdo local, uma vez que a
programação do DTH é a mesma para todos os assinantes de sua área de cobertura,
que se dá em nível nacional ou até mesmo continental. Todos os serviços desse tipo de
transmissão usam sinais digitais, visando a um melhor aproveitamento do espaço que
63
ocupa nos satélites. Assim como o MMDS, o DTH também é regulamentado pelo
decreto 2.196.
2.3.4 Distribuição por cabo
A rede de cabo é o sistema de distribuição de sinal de tevê por assinatura mais
utilizado no país, como foi demonstrado pelo levantamento realizado pela ABTA Associação Brasileira de TV por Assinatura. Apesar de o preço de instalação ser o
mais alto em relação aos demais sistemas, deve-se levar em conta, no entanto, que
uma rede de cabo pode ser utilizada para outros serviços, como transporte de dados,
acesso à internet, telefonia, etc.
Em São Paulo o primeiro sistema de distribuição de sinais de tevê por cabo
ocorreu no ano de 1976, com a implantação de um sistema de cabos que distribuía sete
canais de VHF em São José dos Campos.
O sistema de distribuição por cabo combina cabos ópticos e coaxiais. Os
ópticos, que são os mais sofisticados e caros do sistema, transportam o sinal de
headend (cabeça de rede) até os hubs (distribuidores) secundários. A partir daí, os
sinais ópticos são transformados em sinais elétricos que transportam os sinais, via
cabos coaxiais, até a residência dos assinantes, por via aérea ou subterrânea.
O serviço de tevê por cabo cobre, basicamente, as áreas urbanas e permite a
transmissão de programação com conteúdo local, já que o headend está situado no
local da prestação de serviço da operadora.
Para que o assinante receba o sinal da tevê por cabo, o televisor deve ser
compatível para receber sinais do cabo e, além disso, utilizar um conversor, 30 que
recebe os sinais e os torna compatíveis com o aparelho.
30
Em caso de canais codificados, será necessário, em lugar de um conversor, um decodificador.
64
2.3.5 Distribuição pelo TVA – Serviço Especial de TV por Assinatura
UHF – Ultra Hight Frequency
O canal UHF localiza-se acima do VHF (tevê aberta) e abaixo do sinal da tevê
por cabo. Essa modalidade de tevê foi criada em 1988, na gestão do Presidente José
Sarney, e previa a distribuição de sons e imagens para assinantes com sinais
codificados. No decreto de criação (95.744/88) estava prevista também a transmissão
de parte da programação via sinal aberto, ou seja, para todos os cidadãos que
recebessem sinal da tevê aberta. Atualmente 25 (vinte e cinco) grandes grupos têm
licença para transmitir por meio dessa modalidade de tevê, entre eles destacam-se a
RBS, a Abril, o Globo, o Dia.
Se hoje essa modalidade de tevê tem sido vista como bom negócio, já que tem
as mesmas características da tevê digital (sinais codificados em canais UHF) e pode
levar a tevê móvel para o celular, em sua fase inicial foi considerada um grande
fracasso, pois, logo após sua implantação, chegaram ao país as tevês distribuídas por
cabo, satélite e micro-ondas. Das vinte e cinco licenças autorizadas a transmitirem em
UHF, quatro estão em São Paulo, cinco estão no Rio de Janeiro, duas em Porto Alegre,
três em Curitiba, cinco estão em Belo Horizonte, duas em Brasília (DF), uma em
Fortaleza (CE), uma em Salvador (BA), uma em São Luis (MA) e uma em Itapemirim
(ES).
2.3.6 Legislação
As tevês por assinatura, no Brasil, são regulamentadas pelas seguintes leis,
normas e regulamentos:
Lei Geral das Comunicações (Lei 9.472/97);
Lei do Cabo (Lei 8.977/95);
Norma de TV por cabo (Norma 13/96 – REV97);
65
Norma do MMDS (002/94 – REV97)– Multipoint Multichannel Distribution
System;
Regulamento do Cabo (Decreto 2.206/97);
Regulamento dos Serviços Especiais (Decreto 2.196/97);
Norma do DTH – Direct to Home (008/97).
O serviço de tevê por assinatura, no caso do cabo, é autorizado por meio de
concessão, após processo licitatório solicitado à Anatel – Agência Nacional de
Telecomunicações. Para os sistemas MMDS e DTH, não é dada concessão, e sim uma
autorização.
A Anatel divulga, por meio de editais publicados no Diário Oficial da União e
nos principais jornais, a relação das localidades para as quais os serviços serão
licitados e, a partir daí, as empresas interessadas em participar do processo podem se
candidatar e participar. No caso de inexistência de interessados, a Anatel permite que
qualquer cidadão, desde que cumpra as exigências legais, candidate-se a uma outorga.
Esse pedido é levado à consulta pública e, caso não haja manifestações em contrário, a
concessão pode ser dada. Essa prática tem por objetivo dar condições para que todos
os municípios tenham, pelo menos, uma concessão de tevê paga.
2.4 A televisão segmentada
As sociedades na modernidade veem suas estruturas serem alteradas
diariamente em função da tecnologia, que teima em mudar a vida e o cotidiano de
parcelas significativas da população. Passamos pela primeira, segunda, terceira e já
estamos na quarta onda, na qual as transformações de cunho econômico, social e
cultural apoiam-se, sobretudo, nas evoluções tecnológicas acentuadas no início deste
século.
Foram, de fato, revoluções no sentido de que um grande aumento
repentino e inesperado de aplicações tecnológicas transformou os
processos de produção e distribuição, criou uma enxurrada de novos
produtos e mudou de maneira decisiva a localização das riquezas e
do poder no mundo, que, de repente, ficaram ao alcance dos países e
66
elites capazes de comandar o novo sistema tecnológico (Castells,
2001:53).
Todo esse cenário de economia em tempo real, resultado da alta tecnologia
existente em todas as áreas e setores, oculta novas formas de consumo e exclusão. A
sociedade vive a fase de uma ―economia altamente segmentada que funciona por
conexão e desconexão.‖31 O padrão econômico baseado no consumo de massa vem
sendo substituído pelo consumo segmentado. Essa tendência, reforçada pelo impacto
das tecnologias de distribuição dos sinais de tevê, contribuiu para uma crescente
segmentação do setor televisivo.
Em 1996, quando o pesquisador Luiz Guilherme Duarte escreveu É Pagar
para Ver – A TV por Assinatura em Foco, a tevê segmentada era apresentada pelo
autor como um modelo diferenciado, visto que oferecia uma programação
diversificada, direcionada a ―nichos‖ específicos do mercado, diferentemente do que
ocorria com a tevê aberta, que produzia uma programação muito mais generalista e
com foco na audiência de massa.
Já Borelli e Priolli (2000:101), em A deusa ferida: por que a globo não é mais
a campeã absoluta de audiência, citando Dominique Wolton, também indicam que a
tevê segmentada apareceu em oposição à tevê generalista. No entanto ressaltam que a
segmentação não é algo novo, mas, sim, uma prática comum, presente desde o
surgimento das grandes redes.
O fenômeno da segmentação, desta forma, não é novo em televisão
nem é exclusivo das tevês pagas, já que a grade de programação das
TVs abertas também permite uma estratégia, muitas vezes bem
sucedida, criando uma segmentação por faixa etária, por gênero e até
mesmo por classe social. Assim, por exemplo, a parte da manhã é
tradicionalmente reservada aos programas infantis e a parte da tarde
é, majoritariamente, dedicada aos chamados programas femininos
(Borelli; Priolli, 2000:101).
Para eles, assim como para Duarte, a segmentação tem relação com a ideia de
uma programação diferenciada, visando alcançar pessoas ou grupos distintos.
31
CASTELLS, Manuel. Entrevista virtual. In: Dossiê Castells. Disponível no portal El Varapalo:
www.elvarapalo.com/modules/wfsection/article.php?articleid=25.
67
Segundo Duarte (1996), a tevê segmentada chegou ao Brasil, efetivamente, nos
anos 1980, com a CNN e a MTV, que focavam sua programação em nichos
específicos do mercado32.
Borelli e Priolli (2000) destacam, como exemplos de segmentação da tevê
aberta transmitida pelo sistema UHF, as seguintes iniciativas: MTV, que dirigia sua
programação para o público jovem; Rede Mulher, com programação voltada para
mulher; Rede Vida, que dirigia sua programação ao público ligado à Igreja Católica;
Rede Gospel, que dirigia sua programação à comunidade evangélica; Shoptur, canal
de compras; e Canal 21, ligado à Rede Bandeirantes, que oferecia uma programação
baseada em jornalismo e em filmes.
Com a chegada da tevê por assinatura, no início dos anos 1990, a tevê
segmentada teve impulso bastante relevante. Desde então o título de ―segmentada‖
vem sendo utilizado pelas redes de tevê paga para selecionar o público e oferecer ao
anunciante um grupo de consumidores menos heterogêneo. Segundo a ABTA Associação Brasileira de Televisão por Assinatura - a audiência da tevê paga é mais
segmentada, o anunciante sabe com que tipo de telespectador está interagindo, e, em
função disso, a exposição do produto é personalizada e a eficácia das mensagens,
maior.
Por ser um serviço pago, a tevê por assinatura favorece a segmentação de seu
público, tanto pelo alto volume de canais, quanto pela diversidade de programas. Isso
ocorre desde o início das operações dessa modalidade de tevê e permanece como
característica fundamental para a definição de estratégias das operadoras. É importante
ressaltar, no entanto, que houve uma mudança significativa quanto ao financiamento
de tal serviço, que, no início das transmissões no Brasil, tinha, como principal fonte de
renda, a mensalidade paga pelo assinante, cabendo à publicidade participação menor.
32
CNN – Cable News Network e MTV – Music Television –, à época, ambas transmitiam em
UHF.
68
Atualmente não é bem isso que se vê; um estudo33 feito pela Pro Teste para o
Ministério Público Federal, no início de 2010, indica que um dos canais de tevê paga,
em São Paulo, chegou, num período bastante curto, a preencher a sua grade de
programação com cerca de 20% de veiculação de publicidade.
Uma possível explicação para esse fato pode ser encontrada na própria
legislação brasileira, que é omissa a respeito desta questão. O Código Brasileiro de
Telecomunicações prevê limite de 25% da grade de programação para veiculação de
publicidade na tevê aberta. Sem que haja regras que definam limites, o segmento da
tevê paga insere mensagens publicitárias de acordo com suas ―vontades‖,
abandonando a promessa inicial de oferecer programação sem interrupções, um
diferencial apresentado inicialmente como vantagem em relação à tevê aberta e
―gratuita‖.
O segmento, atualmente, oferece duas possibilidades para que o telespectador
não veja qualquer tipo de publicidade na tevê brasileira: a primeira delas é adquirir
programação exclusiva, por meio do Pay-per-view34, que dá ao telespectador, a partir
de um pagamento extra, ou seja, fora do contrato com a operadora de tevê, o direito de
assistir a determinados eventos, filmes ou programas; a outra é por meio do video on
demand35, um serviço que dá ao telespectador a possibilidade de ver um filme no
momento que desejar, evidentemente, pagando por isso.
33
A Pro Teste é uma entidade civil sem fins lucrativos, apartidária, independente de governos e de
empresas, e tem como objetivo a defesa do consumidor no Brasil. No início de 2010, realizou
pesquisa junto a cinco canais de TV por assinatura e constatou que, em média, o consumidor está
submetido a 15% de publicidade durante a programação, ou seja, paga pela programação e é
obrigado a assistir a uma carga cada vez maior de comerciais. O estudo apontou que, no canal
infantil Nickelodeon, por exemplo, a média de comerciais durante a programação é de 19,64%; e
na Fox 23%. Foram monitoradas e gravadas as programações da MTV, Nickelodeon, Sport TV,
Fox e GloboNews. Esses canais foram escolhidos de forma aleatória pela Pro Teste, visando a
abranger o público infantil, jovem e adulto. Foi gravada toda a programação transmitida nos dias
03 e 04 de março, durante 24 horas, por uma empresa de monitoramento de TVs, contratada pela
Pro Teste. O estudo feito como uma contribuição à consulta pública "televisão por assinatura e
transparência das relações de consumo: quantidade de programação, quantidade de publicidade e o
direito do consumidor à informação‖, promovido pelo Ministério Público Federal (MPF).
34
Pay-per-view ou Pagar-para-ver, sigla PPV, é o nome dado a um sistema no qual os que
assistem à televisão podem adquirir uma programação específica. Neste caso, a programação é
vista, ao mesmo tempo, por todos os que a compraram.
35
Vídeo sob demanda que utiliza a tecnologia digital via telefone ou banda larga, possibilitando ao
usuário o acesso ao conteúdo contratado na hora em que desejar.
69
Como parte do processo de implantação da tevê por assinatura, surgiram os
canais universitários, objeto dos capítulos 3 e 4 deste trabalho. Esses canais
caracterizam-se como veículos segmentados pelos quais instituições de ensino
superior difundem informações dirigidas, basicamente, ao segmento universitário
(Priolli, 1998).
2.5 Tevê digital
A convergência entre telefonia, telecomunicações, informática e produção de
conteúdos audiovisuais, observada nas últimas décadas do século XX, serve de pano
de fundo para uma possível compreensão da tevê digital, vista como uma plataforma
tecnológica capaz de realizar a integração de inúmeros serviços de comunicação.
Atualmente existem três padrões diferentes de tevê digital difundidos em todo o
mundo, os quais, inclusive, foram testados por especialistas brasileiros durante o
período de definição do padrão brasileiro de tevê digital.
Padrão americano ATSC (advanced television systems committee): em
operação no Canadá, Coreia do Sul e Taiwan. Trabalha com HDTV, ou seja,
em alta definição. O sistema americano garante a melhor imagem, porém
restringe a transmissão a um só programa por canal e não há possibilidade de
tevê móvel e portátil.
Padrão europeu DVB (digital video broadcasting): modelo adotado por todos
os países europeus. Trabalha com três configurações de imagens – HDTV
(High Definition Television - Televisão de Alta Definição), EDTV (Enhanced
Definition Television - Televisão de Definição Aprimorada) e SDTV (Standard
Definition Television – Televisão de Definição Padrão) –, assim, não limita o
número de programas a serem oferecidos. O conversor é o mais barato do
mercado, porém apresenta problemas de interferência de ruídos.
Padrão japonês ISDB (integrated services digital broadcasting), que, segundo
especialistas brasileiros, é o mais completo e flexível de todos. Está em
desenvolvimento desde 1999, sendo o Japão o único país a adotar o sistema.
70
Segundo especialistas, as características do ISDB são muito parecidas com as
do padrão americano e é o sistema que apresenta maior eficácia na recepção
móvel e portátil.
Além dos três padrões descritos acima, é importante ressaltar que existem, na
China, cinco padrões de transmissão terrestre em fase de testes. São eles: DMB-T
(Digital Multimedia Television Broadcasting-Terrestrial); CDTB-T (Chinese Digital
Television Broadcast-Terrestrial); ADTB-T (Advanced Digital Television BroadcastTerristrial; SMCC (Synchronized multi-Carrier CDMA). Todas essas possibilidades
foram apresentadas ao SARFT (State Administration of Rádio, Film and Television),
órgão chinês equivalente à ANATEL aqui no Brasil.
As primeiras discussões acerca da digitalização dos sinais de televisão no
Brasil ocorreram em 1994, quando a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e
Televisão e a Sociedade Brasileira de Engenharia de Televisão e Telecomunicações
(ABERT / SET) realizaram estudos sobre as tecnologias disponíveis. A primeira
emissora de tevê a realizar testes no novo sistema foi a Rede Globo, em 1997,
exibindo o último episódio da série Mulher em padrão digital.
Focando seus estudos nos três sistemas (ATSC, DVB e ISDB), a Anatel,
segundo Becker (2005), iniciou suas pesquisas sobre tevê digital e mercado de
telecomunicações em 1998. A Agência avalizou, ainda, a iniciativa ABERT / SET,
dando continuidade ao trabalho que vinha sendo desenvolvido. O objetivo inicial das
pesquisas era escolher um dos três padrões para ser adotado no Brasil. Nesse período,
o desenvolvimento de um sistema nacional estava totalmente fora de questão. Assim,
em 1999, foram importados os equipamentos necessários para testar os três sistemas
de transmissão.
A ideia de um padrão estritamente brasileiro só foi efetivada, segundo Becker
(2005), após a finalização dos testes com os três modelos, a partir do Decreto 4.901,
de 26/11/04, que definia um Comitê de Desenvolvimento (CD), um Grupo Gestor
(GG) e um Comitê Consultivo (CC), visando ao estabelecimento do modelo de
referência para a televisão digital no Brasil. Segundo o decreto, as pesquisas geradas
pelos grupos em questão deveriam ser fundamentadas em estudos técnicos,
econômicos, regulatórios e sociais e que, ao final, pudessem viabilizar soluções e
71
tecnologias compatíveis com as características do País. O decreto previa ainda a
constituição dos modelos de exploração, ou seja, os modelos de serviços e de negócios
e também a implantação do plano de transição da tevê analógica para a digital,
gerando conhecimentos para os diversos agentes envolvidos: governo, emissoras,
indústrias, empresas de software e de serviços e sociedade.
Para Becker (2009), o documento norte dessa nova fase da pesquisa, além de
guiar a transição do sistema analógico para o digital, evidenciou a preocupação com a
inclusão social por intermédio da tevê e com o desenvolvimento da indústria nacional.
O decreto deixou claro que a tevê digital seria uma ferramenta com finalidades sociais,
não uma simples evolução tecnológica que atendesse apenas a interesses
mercadológicos ou econômicos.
Em 2006, com a publicação do Decreto Presidencial de número 5.820, o
governo brasileiro pôs fim às discussões sobre o padrão tecnológico a ser adotado pelo
país. Esse decreto previa uma cooperação entre Brasil e Japão na busca de um modelo
que atendesse às especificidades brasileiras. Até se chegar a esse entendimento, vários
debates foram travados, dos quais participaram, além de diferentes agentes sociais,
pesquisadores da área da Comunicação de longa data, como descreve Castro (2009).
O Decreto, além de deliberar sobre as tecnologias componentes do ISDB-Tb
(International System for Digital Broadcasting - Terrestrial Brazil), título comercial
adotado pelo SBTVD (Sistema Brasileira de TV Digital), também prevê as regras de
implantação da tevê digital no Brasil, determinando, em sete anos, o limite para que o
sinal digital cubra todo o território nacional. Com isso ficou estabelecido que, em
2016, toda transmissão terrestre no Brasil deverá ser digital e as concessões de canais
analógicos devolvidas pelos operadores privados à União. Além disso, o mesmo
documento define que a tevê digital brasileira terá alta definição, mobilidade,
portabilidade, multiprogramação e interatividade.
Para desenvolver e implementar plenamente o ISDB-Tb, foi criado o Fórum do
SBTVD-T, composto por representantes do setor de radiodifusão, do setor industrial e
da comunidade científica e tecnológica, entre outros. O principal objetivo do Fórum é
promover
a
definição,
desenvolvimento,
planejamento
da
implantação
e
implementação dos padrões técnicos voluntários e obrigatórios do ISDB-Tb. Com a
72
viabilização da tecnologia digital na radiodifusão de tevê (TV Digital Terrestre), o
telespectador poderá optar por uma das seguintes situações:
Continuar a receber a tevê aberta da forma atual, utilizando a sua tevê
analógica;
adquirir um conversor (set top box) que permitirá receber o sinal digital e
convertê-lo para um formato de vídeo e áudio disponível em seu receptor de
tevê;
adquirir um aparelho de tevê novo que já incorpore o conversor.
As transmissões de televisão por sinal digital começaram a partir de São Paulo
e são estendidas para o resto do país progressivamente (quadro abaixo). Os
conversores que possibilitam aos televisores comuns receberem os sinais digitais
podem ser encontrados em lojas de eletrodomésticos e eletrônicos, bem como os
televisores preparados para a tevê digital. Espera-se que, até dezembro de 2016, a tevê
digital substitua, totalmente, a tevê analógica no país. Assim, como ocorreu nos EUA,
quando isso acontecer no Brasil, toda a transmissão analógica será interrompida e será
necessário ter um conversor ou um televisor compatível com o sistema para poder
assistir aos programas de tevê. Haverá mudanças para as emissoras de televisão, que
deverão ter os equipamentos apropriados para transmissão em sinal digital, e para os
consumidores, que deverão ter os aparelhos de tevê compatíveis com a tecnologia para
receber os sinais de televisão.
73
Quadro 7 – Calendário da TV Digital no país
Calendário da TV Digital no país
2006 29 de junho: Governo decide adotar padrão japonês para a TV Digital
2007 Julho: começam a ser vendidos os primeiros conversores de sinal
analógico-digital
2 de dezembro: começam as transmissões do sinal digital para a Grande
São Paulo
2010 Primeiro semestre: Belo Horizonte, Brasília e Rio de Janeiro começam a
receber o sinal digital
Segundo semestre: Salvador e Fortaleza
2011 O sinal digital passa a ser obrigatório em todas as capitais
2013 Transmissoras e retransmissoras de todas as cidades do país são obrigadas
a passar o sinal digital
2016 O sinal analógico de televisão sai do ar. Quem não tiver um aparelho HD
ou um conversor de sinal, não poderá ver tevê
Fonte: Anatel
O sucesso da implantação da tevê digital depende, em grande parte, da
disponibilidade de conversores (set top box) com preços baixos, acessíveis para a
população, o que só é possível com grandes escalas de produção. Esta é uma das
justificativas para se adotar um padrão único de tevê digital para o Brasil.
Poucas tecnologias foram tão esperadas quanto a tevê digital. Esperava-se a tão
prometida convergência entre duas importantes invenções do homem: a televisão e a
internet; um “hiper” terminal de lazer e serviços on line e interativo estava por vir.
Mas não foi bem o que ocorreu. Mais de três anos se passaram desde o discurso do
Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva – 2003-2010 – em 02 de dezembro
de 2007, durante a inauguração da tevê digital na cidade de São Paulo, porém pouca
coisa, efetivamente, mudou. Nenhuma emissora desenvolveu programação interativa,
74
um dos maiores diferenciais entre a tevê digital e a analógica, e a mobilidade e a
portabilidade, duas promessas recorrentes nos discursos sobre a tevê digital, ocorreram
somente em testes36. O impacto mais substancial e perceptível diz respeito à qualidade
de som e de imagem para aqueles que adquiriram aparelhos capazes de receber o sinal
digital ou para assinantes de tevê por cabo.
A tevê digital pode ser entendida como o quarto grande marco da televisão
brasileira. Inicialmente vieram as transmissões inaugurais, quando, em 200 pontos da
cidade de São Paulo, pôde-se assistir à primeira exibição da televisão brasileira, com o
programa TV na Taba; em dezembro de 1959, começou a operar o primeiro
equipamento de vídeo tape na emissora carioca TV Continental, o que alterou a
maneira de se fazer televisão e proporcionou novos rumos à sua história; em 31 de
março de 1972, a tevê em cores entrou efetivamente em operação; trinta e cinco anos
depois, entrou em operação a tevê digital, que prometeu revolucionar o modo de ver e
fazer televisão no Brasil, configurando-se como o quarto marco histórico da televisão
brasileira. ―A TV digital é uma mudança de paradigma que afeta diversos segmentos.
Não só a radiodifusão, mas também a telefonia, internet, os fabricantes de eletrônicos,
entre outros‖ (Marcelo Zuffo, professor da Escola Politécnica da Universidade de São
Paulo).37
2.5.1 Panorama da tevê digital no mundo
36
Em 1998 foi celebrado um convênio entre a ABERT (Associação Brasileira de Emissoras de
Rádio e Televisão), a SET (Sociedade de Engenharia de Televisão) e a Universidade Presbiteriana
Mackenzie com o objetivo de comparar o desempenho dos três sistemas de TV Digital: ATSC,
DVB-T ISDB-T. O convênio teve o patrocínio financeiro da empresa NEC do Brasil, através de
incentivos
fiscais
concedidos
pelo
Ministério
da
Ciência
e
Tecnologia.
Para a execução dos testes, a Universidade Presbiteriana Mackenzie montou um laboratório dotado
de instrumentos de última geração, tais como: transmissor de TV digital, emulador de ruído
térmico, emulador de interferências por multicaminhos, emulador de ruído impulsivo, medidores
de taxa de erro de bits, etc. Ao mesmo tempo, enquanto eram realizados os testes de laboratório,
também foram feitos testes práticos em campo. Foi utilizado um transmissor digital no canal 35 da
faixa de UHF, com antena instalada na torre da TV Cultura, em São Paulo. A Universidade
Presbiteriana Mackenzie equipou uma viatura com instrumentos de medição, tendo sido realizados
testes de recepção em aproximadamente 150 localidades da grande São Paulo. Os testes se
estenderam entre novembro de 1998 e maio de 2000. O relatório final foi entregue à ANATEL,
como subsídio técnico para uma futura decisão sobre o sistema de TV Digital a ser adotado no
Brasil.
37
EUA, Europa e Japão: conheça os três padrões de tevê digital, por Daniela Moreira, repórter do
IDG Now! Publicada em 13 de fevereiro de 2006, às 09h48, atualizada em 13 de fevereiro de
2006, às 11h24.
75
A implantação da tevê digital no mundo, assim como no Brasil, passará por
uma era de transição, que deverá durar entre 10 e 15 anos. Nesse período, as emissoras
transmitirão dois canais de 6 MHz, simultaneamente, sendo um analógico e outro
digital.
A transição das duas tecnologias já é realidade em vários países do mundo. A
seguir descreve-se a situação em algumas áreas do mundo:
América Latina
Quadro 8 – Padrões Tecnológicos
País
Padrão
Implantação
A implantação do modelo Americano teve início em 2004.
México
ATSC
O final do processo está previsto para 2022, com o desligamento
dos sinais analógicos.
A implantação do modelo ―nipo-brasileiro‖ (modelo híbrido
japonês+brasileiro) teve início em 2007.
Brasil
ISDB-T
O final do processo está previsto para 2016, com o desligamento
dos sinais analógicos.
A implantação do modelo europeu teve início em 2007.
DVB-T
Uruguai
e DVBH
O final do processo ainda não está previsto. Com a eleição do atual
presidente José Mujica cogita-se a possibilidade de alteração do
modelo europeu para o sistema japonês.
A implantação do europeu teve início em 2007.
Colômbia
DVB-T O final do processo está previsto para 2020, com o desligamento
dos sinais analógicos.
A implantação do modelo híbrido (japonês+brasileiro) teve início
Peru
ISDB-T em 2009.
O final do processo está previsto para 2024, com o desligamento
76
dos sinais analógicos. O Peru tornou-se o primeiro (23/04/2009)
país na América do Sul a aderir ao padrão denominado nipobrasileiro.
A implantação do modelo híbrido (japonês+brasileiro) teve início
em 2009.
Argentina
ISDB-T O final do processo ainda não foi previsto. A Argentina tornou-se o
segundo (28/08/2009) país na América do Sul a aderir ao padrão
denominado nipo-brasileiro.
O governo do Chile anunciou, em 14 de setembro 2009, a adesão
Chile
ISDB-T ao padrão ISDB-T. A previsão é de que as primeiras transmissões
digitais no país sejam realizadas a partir de 2010.
O governo da Venezuela anunciou, no dia 6 de outubro de 2009, a
Venezuela ISDB-T decisão de adotar sistema japonês de televisão digital. O sistema de
televisão analógico deverá ser desativado no país em 2018.
Em 26 de março 2010, o governo do Equador anunciou a adesão
ao sistema ISDB-T. Com a decisão, o Equador tornou-se o sexto
Equador
ISDB-T país da América Latina a aderir oficialmente ao padrão. O prazo de
implantação do sistema é estimado em sete anos e o desligamento
definitivo das transmissões analógicas deverá acontecer em 2017.
O país está testando, pelo menos, três sistemas de televisão digital.
Cuba
-
Embora, não tenha prazo fixo para que seja tomada uma decisão,
espera anunciar o padrão até o final deste ano.
Costa
Rica
-
O Brasil vem discutindo a possibilidade de adoção do padrão
ISDB-T na Costa Rica.
77
EUA & Canadá
Nos Estado Unidos, as transmissões da tevê digital ocorreram a partir de 2002
e, em 12 de junho de 2009, a transmissão analógica foi encerrada definitivamente. Já,
no Canadá, a exibição por meio do sistema digital deverá ocorrer a partir de 2011.
Europa
No continente europeu, a transmissão digital já foi implementada em 21 países
membros da comunidade europeia (Áustria, Bélgica, Bulgária, República Tcheca,
Dinamarca, Alemanha, Estônia, Grécia, Espanha, França, Hungria, Itália, Lituânia,
Luxemburgo, Malta, Países Baixos, Letônia, Finlândia, Suécia, Eslovênia e Reino
Unido).
Em outros cinco países (Chipre, Irlanda, Polônia, Portugal e Eslováquia), a
implantação da tevê digital teve início em 2010.
Quadro 9- Fim das transmissões analógicas (switch-off)
Switch-off
Julho de 2009
2010
Países
Luxemburgo, Países Baixos, Finlândia, Suécia, Alemanha,
Bélgica (flandres) e em grande parte da Áustria
Estônia, Dinamarca, Espanha, Malta, Eslovênia e restante da
Áustria
Bélgica, Bulgária, Chipre, República Tcheca, Grécia, França,
Entre 2010-2012
Hungria, Itália, Lituânia, Letônia, Portugal, Romênia, Eslováquia
e Reino Unido.
2015
Polônia
2017
Rússia
Fonte: Forrester Research - Jul/07 e Portal da União Europeia
78
Ásia e Oceania
No Japão a tevê digital terrestre se tornou disponível em todas as capitais em
dezembro de 2006, apenas três anos após o seu lançamento em 2003. O número de
domicílios que pode receber a tevê digital no Japão atingiu 39,5 milhões (84%) em
2006. Até dezembro de 2006 já haviam sido vendidos 17,3 milhões de receptores de
tevê digital terrestre, como apresentado na tabela a seguir.
Quadro 10 – Vendas receptor digital
Vendas
2006
até 2006
até 2007
TVs Digitais
5.485
10.667
19.219
Gravadores Digitais
1.926
2.817
5.702
102
296
430
1.413
3.506
5.099
PCs
-
-
974
Total
8.925
17.286
31.424
Tuners
TV a cabo STBs
Fonte: Dibeg/JEITA
A TV Digital no Japão apresenta a seguintes características:

HDTV – alta definição

Multiprogramação – programação simultânea

Mobilidade – capacidade de capitação de imagem em movimento

TV Interativa – transferência de dados, áudio e vídeo

Broadcasting de dados – transmissão de dados

Advanced caption – qualidade superior captação das imagens
79
Quadro 11 - Fim das transmissões analógicas (switch-off
Switch-off
Países
24/07/2011
Japão
2012
Coréia do Sul
2013
Astrália
2015
Índia
2012
Hong Kong
2015
China
Fonte: Forrester Research - Jul/07 e Portal da união Européia
2.6 A tevê brasileira e seus modelos: público, estatal e privado
A constituição federal brasileira faz referência, em seu artigo 223, a três
distintos modelos de televisão: o estatal, o público e o privado. Ainda segundo a
Constituição, esses modelos, apesar de diferentes, são complementares.
Art. 223 - Compete ao Poder Executivo outorgar e renovar
concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão
sonora e de sons e imagens, observado o princípio da
complementaridade dos sistemas privado, público e estatal.
As redes de televisão privadas, no Brasil, já existem há pelo menos 60 anos.
Estão muito bem estruturadas e fornecem uma programação que segue o modelo
comercial, definindo-se exatamente por seu vínculo com o mercado, com a audiência e
com o sistema publicitário. As redes estatais ou governamentais (TV Senado, TV
Câmara, TV Justiça, etc) são aquelas utilizadas pelos governos, nos âmbitos federal,
estadual e municipal, para prestação de contas à população. Já a rede pública saiu do
80
papel a partir de 2007 com a chegada da tevê digital. Há, neste campo, formulações,
como a de Orlando Senna38 (2006), que contribuem para aprofundar equívocos acerca
da caracterização de tevê pública e estatal, já que, segundo ele, existem centenas de
canais públicos de tevês, entre os quais estão as tevês educativas e culturais abertas e,
por cabo, as universitárias, as comunitárias e as institucionais dos poderes Legislativo,
Judiciário e Executivo. Como se pode observar, o público e o estatal são relacionados
como semelhantes.
Outra formulação é a de Lemos, Carlos e Barros (2008), para os quais a tevê
pública é um serviço que deve funcionar independente do Estado, tanto do ponto de
vista burocrático, quanto de produção e emissão de conteúdos. Cruvinel (2008) diz
que, diferentemente da tevê comercial, a tevê pública deve oferecer uma programação
com ênfase na informação artística, cultural, científica e educacional. Deve ainda
espelhar a diversidade territorial, abrir espaço para o debate de questões de interesse
público, incorporar informações sobre as realidades regionais e valorizar a produção
das tevês públicas associadas. Ela tem que representar os brasis dentro do Brasil.
Em um artigo publicado no Jornal Folha de São Paulo, em 2007, Jorge da
Cunha Lima39, numa tentativa de diferenciar as três modalidades de tevê, diz que o
produto da televisão pública é a programação, tendo como ponto de referência a
formação crítica do telespectador; em relação à televisão comercial, diz que a regra é a
audiência, baseada no entretenimento; e finaliza dizendo que na televisão estatal, o
produto é a divulgação de ações e atos do Poder Executivo.
Porém um estudo mais aprofundado sobre o assunto demonstra que os modelos
estatal e público, na maioria das vezes, podem se confundir. Por exemplo, segundo
Rangel (2007)40, a TVE do Rio, a TV Cultura e a TV Nacional são consideradas, ao
mesmo tempo, públicas e estatais. Em função disso, muitos pesquisadores têm dito
que no Brasil não há um modelo de tevê pública e, sim, algumas tevês de caráter
público. Essa dificuldade de se distinguir claramente as diferenças de ambos os
modelos reside principalmente na questão do financiamento e da autonomia. É
38
Orlando Senna foi Secretário do Audiovisual do Ministério da Cultura no período de 2003 a
2007 e, a partir de dezembro de 2007, tornou-se diretor geral da TV Brasil
39
FSP de São Paulo, Tendências e Debates. TV estatal não é TV pública. 05/04/2007
40
Diretor Presidente da Agência Nacional do Audiovisual (Ancine), Manoel Rangel. Durante o I
Fórum de Nacional de TVs Públicas.
81
importante destacar que, mesmo não fazendo parte do modelo de tevê estatal, aquele
que, segundo Cunha (2007), tem como produto as ações e atos dos três poderes, as
tevês públicas são dotadas de verbas governamentais.
Segundo Miola (2008:72):
No Brasil, a estrutura do sistema de radiodifusão é extremamente
verticalizado, concedendo pouca autonomia às empresas públicas,
que dependem das políticas de comunicação federais e as estratégias
estaduais de investimento e controle. Em qualquer situação,
evidencia-se a importância de mecanismos independentes do Estado
de regulação e fiscalização atividades de radiodifusão.
Para Leal Filho (2007)41, o sistema estatal é formado pela NBR, que é a tevê
do executivo, representada pela Voz do Brasil, que tem seu espaço diário para
informar a sociedade sobre os poderes executivo, legislativo e judiciário, e pela
Agência Brasil, que funciona como uma agência de notícias da União, além das
emissoras do legislativo e do judiciário, cuja programação é, geralmente, transmitida
pelas tevês por assinatura.
Na tentativa de diferenciar esses modelos, entendeu-se, para fins deste estudo,
a tevê pública como uma emissora sem fins lucrativos, de gestão subordinada à
sociedade civil organizada e independente de governos; e a tevê estatal como aquela
diretamente vinculada ao Estado, ou seja, diretamente subordinada ao governo,
configurando-se também como uma ―possibilidade‖ de tevê pública. Assim, como
afirma Bucci (2007), a tevê estatal deve ser uma modalidade da tevê pública, ou seja,
deve ser independente de qualquer partido que esteja no governo. Para Orlando Senna,
a tevê pública se constitui como:
[...] uma janela de acesso estratégico para o contato da população
com a mais vasta gama de bens e serviços culturais, constituindo um
canal privilegiado para a valorização e a universalização do
patrimônio simbólico nacional. A rede de emissoras públicas é uma
opção de grande potencial como veículo difusor da produção
audiovisual oriunda dos distintos agentes culturais da sociedade,
assegurando a expressão de nossa rica diversidade cultural,
assegurando a prática da democracia (Senna, 2006:10).
41
Laurindo Lalo Leal Filho, professor e pesquisador - Durante o I Fórum Nacional de TVs
Públicas, realizado em Brasília no ano de 2007.
82
Segundo Leal Filho (2007), diferentemente do que ocorreu na Europa, no Brasil,
as tímidas iniciativas para implantar serviços públicos de radiodifusão foram
continuamente vinculadas ao modelo comercial, atuando, sempre, de forma
complementar a ele (o que, aliás, está previsto na Constituição Federal) ou, ainda,
ocupando os espaços que não atraíam os interesses da iniciativa privada. Com isso
pode-se afirmar que a história da radiodifusão, desde seu início, teve, como
característica, a prevalência dos interesses do mercado em detrimento do interesse
público; essa particularidade pode ser percebida nos processos de consolidação do
rádio e, posteriormente, na formação da televisão.
O rádio, que em sua fase inicial – entre 1920 e 1935 – teve financiamento
significativo por parte de seus ouvintes, foi paulatinamente assumindo um caráter mais
comercial. A introdução, na década de 1930, de aparelhos mais baratos possibilitou a
ampliação do público ouvinte e, em consequência disso, a mídia tornou-se mais
atraente para os negócios. Esse processo, evidentemente, foi se consolidando a partir
de alterações na legislação que permitiram o aumento do percentual de tempo
destinado à publicidade durante a programação: em 1932, o espaço permitido era de
10%; em 1952, 20%; e, posteriormente, com a aprovação do Código Brasileiro de
Telecomunicações (CBT), em 1962, 25% (Ortiz, 2006:39-40).
O Governo de Vargas, ainda que tivesse uma visão centralizadora e uma
expectativa de utilização da radiodifusão como instrumento ―na promoção da
educação e transmissão da palavra oficial‖ (Ortiz, 2006:51), mostrou-se hesitante no
momento de implantar um sistema de radiodifusão sob controle do Estado. Segundo
Ortiz, a contribuição do Estado naquele período foi decisiva para consolidar a
desordem histórica entre interesse público e interesse privado:
Apesar de sua tendência centralizadora, tinha que compor com as
forças sociais existentes (neste caso o capital privado, que possuía
interesses concretos no setor de radiodifusão). Não deixa de ser
sugestivo observar que a própria Rádio Nacional, encampada pelo
governo Vargas, praticamente funcionava nos moldes de uma
empresa privada. Seus programas (música popular, radioteatro,
programas de auditório) em nada diferem dos outros levados ao ar
pelas emissoras privadas. [...] quando se olha a porcentagem da
programação dedicada aos chamados ―programas culturais‖,
observa-se que eles não ultrapassam 4,5%. Por outro lado, entre
83
1940 e 1946, o faturamento da emissora, graças à publicidade, é
multiplicado por sete. Ao que tudo indica, a acomodação dos
interesses privados e estatais se realiza no seio de uma mesma
instituição sem maiores problemas (Ortiz, 2006:53).
Segundo Leal Filho (2007), esse destaque de Ortiz é a referência histórica mais
significativa para entender a absoluta falta de limites entre o público e o privado na
radiodifusão brasileira.
Hoje ela (radiodifusão) se dá com o financiamento do Estado às
empresas concessionárias dos serviços de televisão sob as formas de
publicidade, patrocínios, renúncias fiscais, isenções alfandegárias,
entre outras (Leal Filho, 2007:04).
A análise do Decreto 24.655/34 evidencia a política do governo Vargas para o
serviço de radiodifusão, com a formação de uma Rede Nacional de Radiodifusão, o
controle das outorgas pelo governo e a exploração econômica do setor. Ainda nesse
decreto, estabelecem-se as exigências técnicas para a exploração da radiodifusão. Na
opinião de Jambeiro (2002:16), ―este foi certamente um fator importante na introdução
e consolidação do poder econômico na mídia eletrônica‖, pois
[...] a exigência de obrigações técnicas que só poderiam ser
cumpridas mediante vultosos recursos financeiros não só reduziu
drasticamente o número de concorrentes como favoreceu a
concentração de emissoras nas mãos de poucos. Foi graças a isto que
Assis Chateaubriand conseguiu organizar a primeira rede brasileira
privada de emissoras, a partir de 1938. Em 1945, ele contava com 15
emissoras de rádio, além de jornais, revistas, editora de livros e
agências de notícias (Jambeiro, 2002:15).
O nascimento da televisão na década de 1950 teve, como referência
econômica, cultural e política, o rádio; porém, diferentemente deste, a televisão no
Brasil nasceu como empreendimento comercial (modelo que segue hegemônico até os
dias de hoje), ainda que considerada, desde seu início, como um serviço público, como
descrito por diversos autores que analisam a história da tevê no país, alguns citados
neste item do texto.
Segundo Leal Filho (2007)42, as iniciativas em torno da implantação de um
serviço público podem ser consideradas marginais, diante da desproporção da
abrangência de acesso existente entre ela e o sistema comercial. O mesmo autor
42
Trabalho apresentado ao Grupo de Trabalho ―Economia Política e Políticas de Comunicação‖,
do XVI Encontro da Compós, na UTP, em Curitiba, PR, em junho de 2007.
84
destaca, ainda, que a história da radiodifusão pública é reduzida; para ele, é possível
destacar, dessa história, apenas cinco momentos significativos: a fundação da Rádio
Sociedade do Rio de Janeiro, em 1923; a implantação da Fundação Padre Anchieta,
em São Paulo, em 1969; a promulgação da nova Constituição da República, em 1988;
a aprovação da lei número 8.977, Lei do Cabo, em 1995; e o lançamento pelo
Ministério da Cultura do 1º. Fórum Nacional de TVs Públicas, em 2006.
A primeira tevê pública de cunho educativo/cultural de que se tem notícia é a
TV Universitária do Recife,43 que nasceu na Universidade Federal de Pernambuco, em
1968, como um dos veículos do Núcleo de TV e Rádios Universitárias daquela
universidade. Seu objetivo primordial era o de ampliar os horizontes da informação, da
cultura e da educação.
Numa tentativa de buscar traçar o campo da tevê pública no Brasil, buscou-se,
a partir de uma pesquisa secundária, identificar, em primeiro lugar, quantas e,
posteriormente, quais são essas tevês e onde estão localizadas. Observou-se, no
entanto, que as informações acerca deste segmento são absolutamente conflitantes. Em
um trabalho realizado em 2005, a convite do Governo Federal, publicado em 2006, um
grupo de pesquisadores ligados à linha teórica da Economia Política da Comunicação
e dos Estudos Culturais Críticos realizou uma pesquisa com essa finalidade. Nesse
trabalho, publicado como ―Cartografia Audiovisual Brasileira de 2005‖, organizado
por Castro (2006), encontra-se a seguinte informação acerca deste segmento de tevê:
―[...] elas (TVs Públicas) começaram no Brasil no final dos anos 1960 com uma
programação institucional, com programas dirigidos às escolas como se fossem aulas,
para ajudar a escola e o professor‖ (p.112). Como se pode ver, nesse trabalho, tevê
pública e tevê educativa são sinônimos; ora fala-se de tevê educativa, ora de tevê
pública. Ainda no mesmo trabalho, segundo Beth Carmona, ex-presidente da TVE/RJ:
[...] há mil emissoras educativas espalhadas pelo Brasil de maior ou
menor alcance entre as geradoras e retransmissoras. ―1.500
municípios brasileiros estão perto das TVs educativas e representam
27% dos municípios e dos domicílios com TV. Atingimos 15
milhões, sendo esse um número que pode ser maior‖. Isso significa
quase 38% da população e dos domicílios com TV são atingidos pela
43
Atualmente, a TV Universitária integra a Rede Pública de Televisão e atinge 98 milhões de
telespectadores em todo Brasil. A rede, formada a partir da criação da Abepec - Associação
Brasileira das Emissoras Públicas Educativas e Culturais - possui 22 emissoras afiliadas e
transmite sua programação para Pernambuco e parte dos estados que, com esse, fazem divisa.
85
programação das TVs educativas no momento de transmissão
simultânea (Carmona apud Castro, 2006;113).
Durante palestra no Senado Federal, em 2006, Beth Carmona44 apresentou as
seguintes emissoras como de caráter público:
TVs Educativas e Culturais ligadas ao SINRED e à ABEPEC
TVs Universitárias ligadas à ABTU
TVs Escola ligadas ao SEED MEC
STV ligada ao SESC
Futura ligada à Fundação Roberto Marinho
TV Câmara ligada às câmaras dos deputados
TV Senado ligada ao Senado Federal
TV Justiça ligada ao Ministério da Justiça
NBR ligada à Radiobrás
TVs Comunitárias
Em 2009, a TV Brasil mapeou as tevês públicas de todo o mundo. No Brasil,
segundo esse mapeamento, existem 25 tevês públicas45:
Aperipê TV - Fundação Aperipê de Sergipe
TV Aldeia Rio Branco - Fundação Televisão e Rádio Cultura do Amazonas
TV Antares - Fundação Universidade Estadual do Piauí
TV Brasil _ TV Brasil
TV Brasil Central - TV Brasil Central
TV Ceará - Fundação de Teleducação do Ceará – FUNTELC
TV Cultura Belém - Fundação de Telecomunicações do Pará – FUNTELPA
TV Cultura Manaus - Fundação Televisão e Rádio Cultura do Amazonas
44
Beth Carmona, em 2006, em palestra no Senado Federal, afirmou que as tevês públicas de maior
destaque no mundo são a BBC (Inglaterra), PBS (EUA), ARD e ZDF (Alemanha), visto que todas
elas têm tradição, independência, credibilidade e, principalmente, continuidade de gestão e
propostas relevantes. Já, na America Latina, segundo Carmona, esta modalidade de tevê nunca se
configurou por inteiro.
45
Informação disponível em http://www.tvbrasil.org.br/tvspublicas/aperipetv.asp
86
TV Cultura SC - Fundação Catarinense de Difusão Educativa e Cultural
Jerônimo Coelho
TV Cultura SP - Fundação Padre Anchieta
TVE Bahia - Instituto de Radiodifusão Educativa da Bahia – IRDEB
TVE Maceió - Instituto Zumbi dos Palmares
TV Brasil Pantanal - Fundação Jornalista Luiz Chagas de Rádio e Televisão
TVE Paraná - Rádio e Televisão Educativa do Paraná
TVE Vitória - Rádio e Televisão Espírito Santo - Centro Cultural Carmélia N.
Souza
TVE RS - Fundação Cultural Piratini - Rádio e Televisão
TV Miramar - Fundação Virginius da Gama e Melo
TV Palmas - Fundação Universidade do Tocantins - Instituto de Radiodifusão
Educativa
TV Pernambuco - TV Pernambuco
TVU João Pessoa – UFPB
TV Universidade Cuiabá- UFMT
TV Universitária Natal / RN - Superintendência de Comunicação Universitária
TV Universitária Recife - Núcleo de TV e Rádio – UFPE
TV Universitária de Roraima - Fundação Universidade Federal de Roraima –
Núcleo de Rádio e TV Universitário
Rede Minas - TV Minas Cultural e Educativa - Belo Horizonte/MG
A tevê pública brasileira é compreendida, para o escopo desta pesquisa, como
aquela que possibilita a diversidade de pontos de vista, a partir de expressão das
diferentes vozes que compõem a sociedade, de forma a abranger uma maior gama de
conteúdos e experimentações, visando tratar temas de interesse dos cidadãos do
conjunto das localidades que formam o país. Trata-se de um campo complexo e
estimulante. E, ainda que tenha em comum essa aura pública, inclui emissoras com
especificidades bastante distintas e processos próprios. Talvez em função dessas
87
características, somadas, evidentemente, à novidade que trata essa modalidade de tevê,
seja tão difícil se encontrar, na literatura e em pesquisas de dados secundários,
definições consolidadas a respeito desta questão. Para se ter uma ideia, somente em 03
de maio de 2010, ou seja, quase três anos após a efetivação da primeira televisão de
cunho propriamente público do país – a TV Brasil data de 02/12/2007 –, a Rede
Nacional de Comunicação Pública - RNCP, formada pelos quatro canais da Empresa
Brasil de Comunicação – EBC, por sete emissoras universitárias46 e por 15 emissoras
públicas estaduais, entrou no ar.
A breve apresentação da trajetória da tevê pública no Brasil realizada neste
item buscou identificar as principais características desta modalidade de tevê, uma vez
que o Canal Universitário de São Paulo, objeto de estudo deste trabalho, é
compreendido como parte do campo público de televisão e, como tal, deve ser
analisado.
2.6.1 Os modelos públicos no contexto da digitalização
A chegada da tecnologia digital permite colocar em pauta, mais uma vez, o
papel da tevê pública no Brasil. É preciso, segundo Carmona (2006), construir um
projeto único de tevê pública para o país, visando fomentar a produção nacional e
garantir conteúdo de qualidade por todo o território nacional, contribuindo, assim, para
a inclusão social e a democratização da comunicação.
A formação da primeira televisão de cunho público, a TV Brasil, bem como da
Rede Nacional de Comunicação Pública, deu-se, entre outros fatores, em função do
espaço criado pela digitalização dos sinais de tevê. Com a digitalização, novos agentes
passaram a reivindicar acesso ao espectro digital.
Ainda que haja esse espaço garantido pela tecnologia, vários pesquisadores
veem com desconfiança essa possibilidade ―mesmo com a garantia de um espaço para
46
Tevês operadas pelas Universidades Federais (Pernambuco, Rio Grande do Norte, Mato Grosso,
Paraíba, Roraima, Rondônia e Amapá)
88
as TVs públicas no espectro digital, o perigo da complementaridade permanece (Leal
Filho, 2007). Ou seja, se houver apenas a disponibilização de espaços, sem uma
política efetiva que defina com clareza os direitos e os deveres das tevês públicas, esta
modalidade de tevê tende a continuar, simplesmente, complementando o papel e a
missão das tevês comerciais.
Outra possibilidade seria a tecnologia digital configurar-se para essa
modalidade de tevê como uma oportunidade para potencializar novas outorgas, novos
espaços para exposição, na medida em que há espaços ociosos no espectro; a produção
nacional, regional e de utilidade pública pode ser incentivada e racionalizada,
possibilitando interação imediata entre os conteúdos. Além disso, a inclusão digital a
partir das escolas poderia ser efetivada com a TV Educativa Digital, haja vista que o
governo federal criou um canal específico para tratar de questões educativas,
denominado ―Canal da Educação‖.
2.7 O campo televisivo
Para delimitar o campo televisivo é preciso recorrer às observações de
Bourdieu, que, em seu clássico texto ―Questões de Sociologia‖, define campo como:
[...] espaços estruturados de posições (ou de postos) cujas
propriedades dependem das posições nestes espaços, podendo ser
analisadas independentemente das características de seus ocupantes.
[...] há leis gerais dos campos: campos tão diferentes como o campo
da política, o campo da filosofia, o campo da religião possuem leis
de funcionamento invariantes (Bourdieu, 1983:89, grifo do autor).
Pode-se depreender, dos excertos citados, que campo compreende um espaço
social no qual seus sujeitos se engajam em relações recíprocas. Esclarece, ainda, que
campos muito diferentes apresentam propriedades comuns entre si.
A teoria em questão pode ser vista como uma tentativa de demonstrar que onde
se pensava haver um sujeito livre, agindo de acordo com sua aspiração mais imediata,
existe, na verdade, um espaço de forças estruturadas que molda a capacidade de ação e
de decisão de quem dele participa.
89
[...] quanto mais se avança na análise de um meio, mais se é levado a
isentar os indivíduos de sua responsabilidade – o que não quer dizer
que se justifique tudo o que se passa ali -, e quanto melhor se
compreende como ele funciona, mais se compreende também que
aqueles que dele participam são tão manipulados quanto
manipuladores (Bourdieu, 1997:21).
O conceito não imobilista, definido por Bourdieu como um campo de luta,
coaduna-se perfeitamente à intenção de pensar a televisão como um espaço de poder
constituído e constituidor de significados hegemônicos e contra-hegemônicos.
Segundo Bourdieu, a televisão constitui-se como campo simbólico e tecnológico que
se autorrecicla, recriando a cada momento o seu contrato de audiência, como
dispositivo ora consensual ora dissensual, um dispositivo lábil, multiforme, na
expressão de Noël Nel (1997).
Antes da apresentação do estado da arte deste campo, constituído a partir de
1950, considerou-se conveniente buscar as referências acerca dos atores envolvidos
em sua formação. Tal caminho se justifica em função do que Bourdieu define como
habitus, entendido como o conjunto das disposições inconscientes que estariam
presentes em distintos sujeitos, levando-se em conta – o que é determinante – que tais
disposições seriam o resultado da interiorização de complexas estruturas objetivas
presentes numa sociedade.
[...] um sistema de disposições duráveis e transponíveis que,
integrando todas as experiências passadas, funciona a cada momento
como uma matriz de percepções, de apreciações e de ações – e torna
possível a realização de tarefas infinitamente diferenciadas, graças às
transferências analógicas de esquemas [...] (Bourdieu, 1983:65)
Ora, condições sociais distintas produzem nos sujeitos disposições distintas e,
consequentemente, habitus de classe: grupos identificáveis de subjetividades que,
partilhando certas características em comum, articulam-se por esta via indireta com as
diferenciadas posições objetivas das classes sociais.
90
Quadro 12 – Origem Familiar dos proprietários de TVs no Brasil
Nome
Emissora
Origem social
Formação
Francisco de Assis
TV Tupi
Mãe tem origem em
Direito
Chateaubriand
tradicional família de
Bandeira de Mello
senhores de engenho
(Assis
nordestinos. Pai foi chefe de
Chateaubriand)
polícia, inspetor de alfândega
e magistrado na Paraíba.
João Batista Amaral
TV Rio
(Pipa Amaral)
João Jorge Saad
Mario Wallace
TV
Filho de imigrante sírio,
Direito
Bandeirantes
pequeno comerciante de
(incompleto)
TV Guanabara
tecidos. Fez fortuna com
TV Excelsior
comércio de tecido e no ramo
(ações)
imobiliário de SP.
TV Excelsior
Tradicional família paulista
Simonsen
Paulo Machado de
ligada à exportação de café
TV Record
Direito
Carvalho
Roberto Pisani
TV Globo
Marinho (Roberto
Classe média. Pai foi
Ensino
jornalista.
Secundário
Marinho)
Rubens Berardo
Jornalista
TV
Industrial e usineiro de
Continental
Pernambuco
Senor Abravane
TV Studios
Filho de imigrante judeu
Técnico em
(Silvio Santos)
TV
pequeno comerciante
Contabilidad
e
Record (ações)
Victor Costa
TV Paulista
Filho de imigrantes Italianos.
91
Petraglia Geraldini
Iniciou sua vida profissional
(Victor Costa)
no teatro e no rádio
Fonte: Sonia Wanderley
A análise da origem social dos privilegiados com concessão de canais de
televisão, desde a origem da tevê brasileira, aponta, segundo a pesquisadora Sonia
Wanderley47 (2005), para uma diferenciação bem de acordo com as mudanças que
vinham se processando na sociedade brasileira desde a década de 1950.
Eles são representantes de tradicionais famílias ligadas à economia
de exportação de gêneros primários ou membros de segmentos das
classes médias, descendentes de imigrantes, que fizeram fortuna
trabalhando com atividades comerciais. Seus filhos buscam na
educação formal, principalmente com o bacharelado em Direito,
desenvolver atividades profissionais de interesse para a manutenção
do status quo. Encontraram na política de concessões o acesso ao
poder político ou ao status almejado (Wanderley, 2005:03).
Como se pode verificar, a disputa pelo direito de explorar emissoras de
televisão, já na década de 1950, demonstrava sua capacidade na produção de
significados. Tal distinção tornar-se-ia fundamental em um momento no qual o embate
de diferentes projetos de inclusão do país na ordem internacional provocava disputas
também no campo simbólico.
A televisão, desde suas origens na primeira metade do século XX, vem
significando para o indivíduo contemporâneo, muitas vezes, a única possibilidade de
participação de um tempo histórico, de acesso às mais diversas experiências de
realidade, informação e comunicação. ―Caminha-se cada vez mais rumo ao universo
em que o mundo social é descrito-prescrito pela televisão. A televisão se torna o
árbitro do acesso à existência social e política‖ (Bourdieu, 1997:29). Para Duarte
(2004):
[...] ao converter o mundo em acontecimentos acessíveis ao
cotidiano planetário, a televisão não só pauta o que é realidade como
a reduz ao discurso, manifesto em textos que se constroem na interrelação de diferentes sistemas intersemióticos e intermidiáticos.
Somente a aceitação desse caráter inequivocamente discursivo da
televisão pode, ao meu ver, trazer luz a muitas das questões
polêmicas atualizadas por essa mídia. (Duarte, 2004:11).
47
Professora de Prática de Ensino de História e Diretora da COMUNS (Diretoria de Comunicação
Social) da UERJ e professora de História Contemporânea na UGF. Graduada em Jornalismo pela
ECO/UFRJ e História pela UERJ; fez Mestrado e Doutorado em História Social, na UFF/RJ.
92
O campo televisivo surge imbuído de paradoxos: do ponto de vista
institucional,
divide-se
entre
canais
generalistas
e
temáticos,
líderes
ou
complementares, abertos ou por cabo; do prisma econômico, destrincha-se em canais
públicos, ou privados/comerciais; do ponto de vista social, discute-se a sua
democratização, o seu poder, a sua influência no espaço público midiatizado.
No mercado televisivo aberto, segundo Castro (2006), circulam anualmente 3
(três) bilhões de dólares, quantia dividida entre as seis principais redes privadas
nacionais - Globo, SBT, Bandeirantes, Record, CNT e Rede TV (ex-Manchete). Juntas
possuem 138 grupos afiliados e controlam 668 veículos, entre tevês abertas e por
assinatura.
O campo televisivo está desmembrado entre grupos econômicos familiares,
além de ter sido repartido, nas últimas décadas, entre cerca de 80 políticos de
diferentes regiões do país. Este fato, segundo Castro (2006), tem prejudicado as
possibilidades de uma comunicação democrática e independente, além de se
configurar como uma relação incestuosa das emissoras com o mundo político, visto
que inclui um discurso midiático atrelado ao jogo de negociações políticas e
econômicas.
[...] a democracia consiste em submeter o poder político a um
controle. É essa a sua característica essencial. Numa democracia não
deveria existir nenhum poder político incontrolado. Ora, a televisão
tornou-se hoje em dia um poder colossal; pode mesmo dizer-se que é
potencialmente o mais importante de todos, como se tivesse
substituído a voz de Deus (Popper, 1995:29).
O chamado ―coronelismo eletrônico‖ (Santos; Caparelli, 2005) pode ser
observado em distintas regiões do país. Para exemplificar tal caracterização, o quadro
abaixo expressa a realidade da região Centro-Oeste em 2005.
93
Quadro 13 - Outorgas de televisão controladas por políticos:
Geradora
RTV
Quantidade
% total
Quantidade
% total
DF
1
9,10%
3
11,53%
GO
10
62,50%
213
42,68%
MS
1
9,09%
8
3,22%
MT
3
33,30%
23
8,02%
15
30,60%
247
23,17%
Total
Fonte: Ministério das Comunicações, 2005.
O projeto Donos da Mídia48 identificou os políticos que possuem participação
direta em emissoras de rádio e TV. O gráfico abaixo separa o total de políticos sócios
por cargo.
Gráfico 12 –Políticos proprietários de RTV
Desde o início, a tevê caracterizou-se como concessão do Estado. A concepção
dos governos militares (1964-1985) de fazer a televisão aberta chegar a todos os
pontos do país converteu o Estado em importante distribuidor destes sinais a partir de
48
http://donosdamidia.com.br/inicial
94
critérios políticos. Existem pelo menos cinco tipos de concessões, como a de
Radiodifusão de Sons e Imagens (geradoras), os serviços de Retransmissão de TV
(RTV), os serviços de Televisão por Assinatura (TVA), as concessões de TV por Cabo
ou os serviços de Distribuição de Sinais Multiponto/Multicanal (MMDS).
No que diz respeito às emissoras de TV aberta que geram programação,
registram-se cinco grupos nacionais (Rede Globo, Bandeirantes, Record, SBT e Rede
TV) e cinco regionais (RBS, na região Sul; Organizações Jaime Câmara - OJC, no
Centro-Oeste; Rede Amazônica de Rádio e Televisão - RART, na Região Norte;
Zahran, no Estado do Mato Grosso; e Verdes Mares, no Nordeste).
Âmbito Nacional
Rede Globo de Televisão
Fundação: 26 de abril de 1965
Fundador: Roberto Marinho
Mantenedora: Organizações Globo
Proprietário: Roberto Irineu Marinho
Presidente: Roberto Irineu Marinho
Cidade de Origem: Rio de Janeiro
Sede: Rio de Janeiro
Cobertura: 98,44% território nacional
Grupos Afiliados: 35 Grupos
Veículos: 340 veículos de Comunicação
Rede Bandeirantes de Televisão
Fundação: 13 de maio de 1968
Fundador: João Jorge Saad
95
Mantenedora: Grupo Bandeirantes de Comunicação
Proprietário: Johnny Saad
Presidente: Johnny Saad
Cidade de Origem: São Paulo
Sede: São Paulo
Cobertura: 98% território nacional
Grupos Afiliados: 22 Grupos
Veículos: 166 veículos de Comunicação
Rede Record de Televisão
Fundação: 27 de setembro de 1953
Fundador: Paulo Machado de Carvalho
Mantenedora: Central Record de Comunicação
Proprietário: Edir Macedo
Presidente: Alexandre Rapo
Cidade de Origem: São Paulo
Sede: São Paulo
Cobertura: 98% território nacional
Grupos Afiliados: 30 Grupos
Veículos: 142 veículos de Comunicação
Sistema Brasileiro de Televisão
Fundação: 19 de agosto de 1981
Fundador: Silvio Santos
Mantenedora: Grupo Silvio Santos
Proprietário: Silvio Santos
96
Presidente: Daniela Beyruti
Cidade de Origem: Rio Janeiro (TVS) São Paulo (SBT)
Sede: São Paulo
Cobertura: 98% território nacional
Grupos Afiliados: 37 Grupos
Veículos: 195 veículos de Comunicação
Rede TV
Fundação: 15 de novembro de 1999
Fundador: Amilcare Dallevo / Marcelo Carvalho
Mantenedora: Grupo Tele TV
Proprietário: Amilcare Dallevo / Marcelo Carvalho
Presidente: Amilcare Dallevo
Cidade de Origem: São Paulo
Sede: São Paulo
Cobertura: 82% território nacional
Grupos Afiliados: 12 Grupos
Veículos: 37 veículos de Comunicação
Quadro 14 - Veículos das quatro maiores redes de TV e seus grupos afiliados
Rede
TV RAFM RAOC RAOM RAOT TVCom MMDS DTH TVAs
105
76
11
52
4
9
2
1
SBT
58
70
1
39
2
1
10
1
Band
39
48
5
44
3
13
1
Record
46
51
2
31
RedeTV
15
10
7
Globo
2
Canal
TVA Jornal Revista Radcom Total
17
33
27
12
2
1
340
1
195
11
166
3
9
142
2
3
37
Fonte: Donos da Mídia
97
Dos principais grupos do setor de rádio e TV no país, segundo Caparelli e
Lima (2004:29), poucos não são sócios (afiliados) das Organizações Globo. Os
grandes conglomerados de mídia (Globo/Record/SBT/Bandeirantes/Rede TV) operam
em distintos ambientes, como mídia impressa, eletrônica e mais recentemente internet,
apostando na convergência tecnológica e nas possibilidades de produção de conteúdos
para celulares e para a tevê digital. Os autores destacam, ainda, outros cinco grupos
familiares ligados à comunicação que desenvolvem suas ações principalmente na
mídia impressa.
Famílias que atuam (principalmente) na mídia impressa
Civita (Abril/SP)
Mesquita (OESP/SP)
Frias (Grupo Folha/SP)
Martinez (CNT/PR)
A estruturação do campo das maiores redes privadas de TV aberta ocorre, de
acordo com o EPCOM – Estudos de Pesquisa da Comunicação, da seguinte forma:
Rede Globo
Vista como a maior rede de TV do país e também a quinta maior do mundo;
aglutina o maior número de veículos de comunicação em todas as modalidades:
TV, rádio e jornal (sem contar servidor internet, página web);
tem quase o dobro de empresas de mídia que o SBT, que ocupa o segundo
lugar;
é o único grupo, entre as demais redes, que tem todos os tipos de mídia;
tem o maior número de grupos diversificados – TV, rádio, jornal;
a maioria dos principais grupos regionais de mídia são seus afiliados;
está presente em todos os Estados;
98
o grupo Cabeça-de-rede49 tem 86% dos seus veículos concentrados na região
Sudeste;
no seu conjunto, apresenta uma disseminação equilibrada pelas diversas
regiões, sem concentração excessiva nos pequenos mercados.
Rede SBT
Considerada a rede que apresenta uma programação mais popular;
está presente em todo o país;
tem o maior número de associações com grupos regionais, sendo integrada por
37 grupos afiliados;
o grupo Cabeça-de-rede só tem TV, diferentemente da Rede Globo;
está fortemente concentrada na região Norte.
Rede Record
Propriedade de família paulista, Machado de Carvalho, por décadas, no último
período passou a fazer parte de grupo proprietário da Igreja Universal do Reino
de Deus;
apresenta grande concentração na Região Sudeste;
o grupo cabeça-de-rede é o que mais detém veículos de comunicação próprios
em todas as regiões do país em comparação com as demais redes;
controla também duas redes de TV segmentadas: a Rede Mulher (três
emissoras) e a Rede Família (duas emissoras).
Rede Bandeirantes
Bastante concentrada na Região Nordeste;
a maior parte de seus Grupos Afiliados limita-se à mídia eletrônica.
49
Responsável pela geração dos sinais de imagem e/ou som que serão retransmitidos pelas
afiliadas ou participantes da rede.
99
Rede TV!
Dispõe de cinco emissoras de TV e 12 grupos afiliados;
quase dois terços de seus veículos localizam-se nas Regiões Norte e CentroOeste;
é a rede com menos presença na Região Sudeste;
seus grupos afiliados limitam-se à mídia eletrônica.
No campo televisivo, uma questão que não pode ser deixada de lado é o índice
de audiência. Segundo Bourdieu, nas salas de redação do campo midiático há uma
―mentalidade-índice-de-audiência‖ (1997:37), visto que por toda a parte se pensa em
termos de sucesso comercial; o mercado é a instância que legitima a legitimação.
Para as empresas de comunicação, a audiência é o amplo argumento para a
conquista de anunciantes e de efetivação do poder econômico, uma das finalidades do
processo.
Gráfico 13 - Audiência Nacional – 2008
Fonte: Mídia dados 2009
A importância da audiência para as emissoras de TV é bastante grande.
Bourdieu (1997:37) define índice de audiência como ―uma medida da taxa de
audiência de que se beneficiam as diferentes emissoras‖. Muitos pesquisadores,
inclusive Bourdieu, dizem que as emissoras de televisão se renderam às pesquisas de
opinião.
100
O índice de audiência exerce um efeito inteiramente particular sobre a
televisão: ele se re-traduz na pressão da urgência. A concorrência entre os jornais e a
televisão e a concorrência entre as televisões tomam a forma da concorrência pelo
furo, para ser o primeiro (Bourdieu, 1997:39).
É importante ressaltar, no entanto, que a guerra pelos índices de audiência não
é um fato novo e tampouco restrito à televisão, ocorrendo igualmente nos outros
meios. Ainda segundo Bourdieu (1997), ―essa medida‖ tornou-se o juízo final do
jornalismo até em espaços mais autônomos. Os jornais de grande circulação, visando
reconhecer sua cota de mercado, buscam aferir com regularidade seus números de
tiragem e vendagem. Buscando uma aproximação com Bourdieu, esse modelo de ação
sugere a presença de um habitus específico do campo, ou seja, seria habitus dos
agentes do campo midiático a prática corrente de guiar as suas ações institucionais
pelos índices de audiência. Já na década de 1970, o notável apresentador Chacrinha50,
considerado um fenômeno da televisão brasileira, tinha sua performance balizada nos
indicativos de audiência.
Depreende-se dos dados do gráfico sobre audiência, bem como das afirmações
apresentadas ao longo deste capítulo, que, além dos lucros financeiros, resultados da
competência individual dos agentes, o prêmio aos primeiros colocados no Share51 dos
veículos é a possibilidade de manipulação de uma grande massa humana, orientada em
suas escolhas pessoais, políticas, culturais etc. e, assim, intervindo nesses campos. Na
interpretação de Bourdieu (1997), a televisão constitui-se num importante instrumento
de manutenção da ordem simbólica. A atual posição da Rede Globo é de total
hegemonia. A rede de televisão administrada pelas organizações Roberto Marinho
teve faturamento líquido, em 2009, de 7,7 bilhões de reais, ou seja, quase o triplo da
segunda rede com maior faturamento em 2009, a Rede Record, com 2,15 bilhões de
reais. Um fator bastante importante que merece destaque e talvez explique o contínuo
crescimento do mercado da radiodifusão (TV e rádio) é a possibilidade jurídica, a
partir da medida provisória 70/02, que regulamentou em 30% a participação do
50
Quem faz esta afirmação é Walter Clark, relatando o processo de formação da Rede Globo em
CLARK, Walter e PRIOLLI, Gabriel. O Campeão de Audiência. São Paulo: Nova Cultural/Best
Seller, 1991. Pág. 81- 82.
51
Termo utilizado em Marketing para se referir à participação de determinada empresa de
mercado.
101
investidor estrangeiro neste mercado. Segundo a cartografia do audiovisual – Castro
(2006:101) –, ―essa situação tem reforçado uma tendência de transnacionalização das
empresas de radiodifusão, que se tornaram multimídias e passaram a atuar em várias
áreas da comunicação‖.
A hegemonia da Rede Globo na preferência dos brasileiros vem de longa data,
mas é importante que se diga que na última década, em função de diversos problemas,
a emissora vem enfrentando dificuldades para manter o status de líder absoluta de
audiência. Abaixo se destacam alguns dos principais fatores para essa ―ameaça‖:
investimentos mal dimensionados em negócios como a TV por cabo, portal na
internet e internet de alta performance;
inadequação de sua estrutura familiar a um mercado aberto, competitivo e
global;
sucessão do comando da organização pelos herdeiros do patriarca fragilizou a
empresa;
alteração nos hábitos das classes C, D e E brasileiras, principalmente no que se
refere à aquisição do segundo aparelho televisor no domicílio, o que
possibilitou novos habitus dos telespectadores;
acessibilidade à internet, que amplia seu público e investimentos publicitários
em ritmo muito maior que os demais meios.
Essas afirmações estão presentes em diversos trabalhos de pesquisadores que
estudam a televisão brasileira, dentre os quais destacam-se Santos e Caparelli, 2005;
Bolaño, 2005; e Castro, 2006; além de Simões, 2003, que afirma:
O Campo Organizacional dos Media está mapeado de uma forma
que obrigue a Rede Globo a tomar a dianteira de alguns aspectos em
relação à concorrência, uma vez que está correndo riscos de perder a
sua hegemonia enquanto rede nacional de televisão e, até mesmo, de
comprometer sua saúde financeira e sua própria existência. A
necessidade de defender a sua posição de hegemonia faz com que a
Globo busque, hoje, redefinir seus programas de acordo com a nova
realidade. Dentre as medidas, a necessidade de unificar o discurso,
mantendo a linha editorial sob domínio da rede (Simões, 2003:69).
102
Desde que a mídia televisão passou a desempenhar papel de destaque na
sociedade, a publicidade firmou com ela parceria fundamental, portanto pode-se
afirmar que a conexão entre o campo televisivo e o mercado publicitário é bastante
estreita e, em função disso, faz-se mister apresentar, ainda que de forma panorâmica,
essa imbricação. Como pode ser observado no gráfico abaixo, a televisão obtém a
maior fatia dos investimentos publicitários no Brasil, concentrando quase 60% das
verbas publicitárias.
Gráfico 14 - Quota de Mercado dos Meios de comunicação - 2008
Fonte: Mídia dados 2009
As TVs abertas no Brasil representam um mercado consolidado, apresentando
um panorama que o coloca entre os de maior concentração econômica da América
Latina.
103
Em relação às emissoras de TV aberta que geram programação, destaca-se que
apenas três grupos nacionais estão em quase 100% do território brasileiro 52. É possível
observar ainda que os grupos regionais estão em mãos de famílias de políticos ou
possuem parceria com as principais redes de TV, dominando mais de 70% dos locais
nos quais atuam. Isso significa que eles têm uma grande influência política e cultural
nos seus estados e regiões.
Gáfico 15 - Números de emissoras comerciais por rede – 2008
Fonte: Mídia dados 2009
Como se pode observar no gráfico, o ―coronelismo televisivo‖ mantém-se,
apesar das profundas mudanças que ocorreram no país desde o fim do Regime Militar,
em 1985. A concentração das concessões para atuação no campo indica o grau de
organização dos agentes do campo, que, reunidos em torno da ABERT, fazem valer
seus interesses, muitas vezes em oposição a segmentos que desejam a democratização
da televisão brasileira.
52
No caso da Rede Brasil (RBS), sua programação televisiva só não atinge 0,3% dos domicílios
com televisão nos Estados de Rio Grande do Sul e Santa Catarina; considerando que a Organização
Jaime Câmara atinge 180 municípios com a TV Anhanguera, o que implica que ela só não se faz
presente em 66 municípios dos 246 do Estado de Goiás; a Rede Amazônica de Rádio e Televisão
ainda não conseguiu levar sua programação, por enquanto, a 47 municípios dos 167, ou seja: a
quatro do Amazonas, 29 de Rondônia, nove do Amapá, dois do Acre e três de Roraima; no caso do
Grupo Zahran, como atua em 190 municípios, ele só não conquistou 26 dos 216 de Mato Grosso e
Mato Grosso do Sul; e no caso do Grupo Edson Queiróz, com a TV Verdes Mares, faltam-lhe
somente 8% do Ceará para serem conquistados. Dados obtidos em artigo de Eula Cabral (2005).
104
2.8 Universidade e televisão – tensões em campo
Para abordar as questões relativas às tensões existentes entre os campos
televisivo e universitário, considera-se adequado utilizar uma afirmação da diretora do
Departamento de Tecnologia Educacional da Fundação Roquete Pinto (Leite, 1998),
no ano de 1998, quando da realização do I Fórum de Televisões Universitárias.
Segundo ela:
No início das TVs educativas, tentou-se reproduzir a escola, através
da TV. Pensava-se que bastaria levar a tradicional aula da escola
para a televisão que estaria garantida a aprendizagem dos alunos.
Seria só colocar o professor na tela (o teleprofessor) dando aula para
os alunos que o sucesso se faria presente. [...] Em um segundo
momento histórico, já no final dos anos 70 e início dos anos 80, a
sociedade vive um período de crítica ideológica aos meios de
comunicação de massa, quando o politicamente correto seria
―desligar a TV‖. A televisão era vista como um poderoso meio de
massificação e dominação, e tudo que nela aparecia estava
implicitamente condenado, principalmente pela academia (Leite,
1998:24 grifo nosso).
Essas palavras permitem uma reflexão, acerca da importância da televisão na
sociedade, que possibilita observar que a televisão e a escola, apesar de serem
instituições com características diferentes, podem se integrar. Essa argumentação é
reiterada por Marcovitch, que diz:
Aproveitar mais a mídia eletrônica é um processo inovador e
possível dentro da atual realidade. Temos tratado até agora a escola e
a televisão como rivais. Os pais alertam os jovens para diminuírem o
seu tempo de televisão para poder estudar. Por que não transformar
essa rivalidade em complementação? Como fazer com que o tempo
dedicado à televisão, sem prejuízo do lazer que sempre é necessário,
também seja útil para o aprendizado? (Marcovitch, 1998: 83).
Se é válida e oportuna a comparação entre TV e Escola, já que ambas mantém
alguns pontos de cruzamento, uma vez que cabe às duas a função de informar e
educar, é preciso, no entanto, resguardar essas instituições naquilo que lhes é inerente.
Tevê e escola configuram-se como realidades distintas uma da outra, seja pela suas
origens, seja pelas suas naturezas. Tevê e escola não são perfeitamente
complementares, nem se mostram como radicalmente contraditórias. Se o objetivo
principal da escola é promover a educação formal, na qual está compreendida também
a informação, cabe à tevê, fundamentalmente, propiciar lazer e divertimento ao
105
público por meio da informação e, ainda, por que não dizer, por meio de propostas
educativas de caráter não-formal. Não se pode esquecer, que "se a escola impõe", "a
TV oferece", e que "a escola foi feita para um tempo sem televisão" (Chalvon, 1979).
Ainda que presente nos lares53 de praticamente todos os brasileiros, a televisão
tem seu potencial educacional ainda pouco utilizado, de fato, nas instituições de
Ensino. A experiência televisiva faz parte do cotidiano de professores e alunos e,
apesar dos diferentes papéis que possuem na sociedade, a tevê e a escola têm
aproximações, pois, enquanto a tevê detém um grande potencial de comunicação, a
escola, embora não centralize mais a transmissão do saber e da cultura como fazia no
passado, ainda mantém a função de formação do aluno. Bourdieu (1998) vê, na escola,
o ambiente ao qual as crianças chegam com variadas quantidades e qualidades de
conhecimento trazidas de casa, além de várias "heranças", como a postura corporal e a
habilidade de falar em público. Atualmente, muitos desses conhecimentos são
adquiridos no consumo televisivo. São habitus que se estabelecem a partir das relações
desenvolvidas como telespectador e que interferem em diversas áreas da vida – moda,
cultura, ideologia –, caracterizando um tempo no qual televisão é sinônimo de
orientação para o cotidiano, o que acaba por influenciar os percursos formativos
desenvolvidos no ambiente escolar.
A escola, enquanto instituição de educação formal, ao longo de sua existência,
protagonizou três diferentes papéis: num primeiro momento, o de redentora,
responsável por grandes mudanças individuais e sociais; num segundo, o de
reprodutora das desigualdades sociais, ou seja, reforço ao status quo, uma espécie de
predestinação; e atualmente é vista como dialética, capaz de reproduzir e de
transformar (Saviani, 2003). Bourdieu (1998), no entanto, entende que a escola se
configura como sendo um espaço de reprodução das estruturas sociais e de
transferência de capitais de uma geração para outra, papel que a televisão desempenha
em conjunto com as demais instituições contemporâneas.
53
No Brasil, há 162,9 milhões de pessoas que moram em domicílios com televisão colorida —
32,3% a mais do que os 123,2 milhões que estão em domicílio com rede coletora de esgoto ou
fossa séptica. Fonte: Programa da Nações Unidas para o Desenvolvimento 24/05/2010
106
Segundo Napolitano (2003), desde o século XIX até meados do século XX, a
escola foi considerada hegemônica no processo de formação e transmissão de valores,
atitudes e conteúdos de conhecimentos básicos. No entanto, esse processo teria sido
paulatinamente ―compartilhado‖ com a mídia, especialmente com a televisão, que
apresenta uma mescla de interesses ideológicos e comerciais: ―[...] boa parte dos
objetivos e dos papéis tradicionais da escola se transferiu para a TV, acirrando a crise
da instituição escolar e o questionamento de sua eficácia e lugar nas sociedades de
massa contemporâneas‖ (Napolitano (2003:18). Segundo Eco (1970), a televisão, vista
como um dos fenômenos de nossa civilização, deve ser estudada a partir de suas
manifestações, mas também encorajada nas suas tendências mais válidas. Na
perspectiva de Baccega (2000), a televisão faz com que o ambiente escolar deixe de
ser um lugar privilegiado, ―[...] sacralizado de acesso à informação e ao conhecimento
e passe a ser um espaço onde o ‗aprendente‘ desenvolve a capacidade de interrelacionar informações construindo e reconstruindo conhecimentos‖ (Baccega,
2000:43).
A televisão proporciona ao cidadão oportunidades sem precedentes de
progresso em sua capacidade de registrar, comunicar, pensar, raciocinar, consumir,
etc. Num momento em que a educação necessita aperfeiçoar recursos tecnológicos
para prender a atenção do aluno da geração imagética, ou geração Y 54, a televisão e a
universidade têm as condições necessárias para trabalhar de forma colaborativa,
utilizando-se da linguagem televisiva para disseminação do conhecimento científico e
da cultura universitária, para atender às novas necessidades no campo da educação,
criadas pela demanda de novos conhecimentos e, principalmente, pelas mudanças da
contemporaneidade, entre as quais se destacam o intenso consumo audiovisual e a
circulação de mensagens que relacionam o local e o global, vinculando o cidadão a
complexos sistemas de difusão, formas e conteúdos que caracterizam a ―sociedade do
espetáculo‖.
54
O conceito de ―geração Y‖ surgiu, nos Estados Unidos, para delimitar as novas características e
hábitos dos jovens que nasceram no final da década de 70 ou início dos anos 80. As gerações
anteriores, denominadas baby boom e geração X, são os pais (ou até mesmo avós) dos jovens da
geração Y. Tapscott (1999) define a geração Y como sendo a parcela de indivíduos que nasceu
entre 1977 e 1997.
107
Discutir televisão na universidade não é tarefa fácil; produzir é um desafio
ainda maior. Ainda assim muitas instituições de ensino superior têm se lançado na
difícil tarefa de tornar público aquilo que a universidade pensa e produz por meio da
mídia televisiva. Talvez se possa atribuir às televisões universitárias o que Bourdieu
(1997) chamou de meios subversivos. As tevês universitárias estão na contramão da
mídia aberta e tradicional, uma vez que não se submetem ao índice de audiência. Para
Bourdieu, a televisão não pode ser vista como um meio homogêneo:
[...] há os pequenos, os jovens, os subversivos, os importunos que
lutam desesperadamente para introduzir pequenas diferenças nesse
enorme mingau homogêneo imposto pelo círculo (vicioso) da
informação circulando de maneira circular entre pessoas [...]
(Bourdieu, 1997:36)
Nessa passagem o autor refere-se ao jornalista free-lancer. Para Bourdieu esse
tipo de profissional, jovem, sem vínculo formal com os órgãos de imprensa, buscaria
romper o círculo vicioso ao propor pautas ou interpretações que não atenderiam aos
critérios de noticiabilidade da mídia comercial. Segundo Bourdieu tais iniciativas
fracassarão em virtude de não atenderem os critérios definidos pelas empresas de
comunicação, que, em grande parte, se resumem aos índices de audiência, que balizam
o funcionamento da televisão e dos principais meios de comunicação de massa.
A partir dessas considerações, é preciso verificar se a televisão universitária,
nas condições atuais dos campos nos quais atua, caracteriza-se como alternativa e
propõe habitus que incorporem os potenciais de mudança observados em função das
relações e tensões entre os campos televisivo e universitário. A discussão acerca
desses temas será retomada no capítulo 4, no qual as relações entre universidade e tevê
universitária serão amplamente analisadas.
108
Capítulo 3 – Televisão universitária: modos de
fazer
Este capítulo apresenta, também, a partir de uma pesquisa bibliográfica e
documental, o estado da arte dos Canais Universitários Brasileiros. Além disso, reflete
sobre sua realidade no complexo jogo que se estabelece no cenário no qual dezenas de
instituições se aventuram.
109
3.1 A tevê educativa na contemporaneidade
Ao iniciar mais um capítulo desta pesquisa, novamente, busca-se amparo
conceitual na teoria de campo de Bourdieu. Pode-se afirmar que a tevê educativa,
junto com outras de caráter público, configura-se como um subcampo, parte de um
campo maior, o da televisão; este, por sua vez, constitui-se, como determina a Lei, a
partir dos três sistemas de radiodifusão: o público, o estatal e o privado.
Segundo Bourdieu (2005), uma empresa55 constitui-se de um subcampo que
goza de uma relativa autonomia em relação ao campo que a engloba.
As estratégias das empresas não dependem somente da posição que
elas ocupam na estrutura do campo. Elas dependem, também, da
estrutura das posições de poder constitutivas do governo interno da
firma ou, mais exatamente, das disposições (socialmente
constituídas) dos dirigentes agindo sob pressão do campo do poder
no seio da firma e do campo da firma em toda sua totalidade (que se
pode caracterizar através de índices, tais como a composição
hierárquica da mão de obra, o capital escolar e, particularmente,
científico do quadro executivo, o grau de diferenciação burocrática,
o peso dos sindicatos, etc.) (Bourdieu, 2005:42).
Para entender a constituição e consolidação de um subcampo em determinado
campo, Bourdieu sugere que se analise tanto o subcampo, em relação ao campo,
quanto o próprio subcampo, enquanto um campo relativamente autônomo.
Notadamente, o campo televisivo está situado em um campo ainda maior que é o da
Comunicação Social, porém, em função de sua importância para a sociedade, ganhou
autonomia e legitimidade em relação ao campo da Comunicação Social. Pode-se
observar isso em várias partes do mundo, no entanto, no Brasil, a tevê tem presença
decisiva em diversas áreas. Desde os anos de 1970, a tevê é um importante
instrumento econômico, cultural e ideológico. É também objeto de estudos em
diversas áreas do conhecimento. Já o subcampo da televisão educativa (TVE), no qual
se podem incluir os canais universitários, essa autonomia e presença é quase ínfima.
55
Em função de seus estudos sobre o mercado de casa própria na França, Bourdieu (2005) propõe
uma teoria econômica como ciência histórica. Para ele, o mercado é o produto da construção social
da oferta e da construção social da demanda, para as quais o Estado contribui decisivamente, em
particular nos aspectos jurídicos (Bourdieu, 2005).
110
A história das televisões educativas no mundo e no Brasil está vinculada
diretamente à história da televisão como um todo. Tanto no modelo americano quanto
no europeu, as tevês educativas foram decorrência imediata do aparecimento deste
meio. A televisão, na Europa, nasceu pública, vinculada às ideias da teoria crítica,
diferentemente dos Estados Unidos, país no qual o meio surgiu no bojo de teorias que
buscaram compreender as funções da tevê para a sociedade e, particularmente, para os
proprietários, interessados em desenvolver propósitos comerciais. Se na Europa a tevê
deveria cumprir sua função de formar um cidadão crítico de sua sociedade, com
informações suficientes para tomar decisões em seu benefício e do coletivo e sem fins
lucrativos e comercias, nos EUA, nasceu como auxiliar de um sistema econômico em
expansão, em busca da demanda reprimida com o pós-guerra (Gordon, 1967).
As implicações do modo como cada nação enxergou o meio ficam evidentes ao
se analisarem as TVEs dentro do contexto da radiodifusão. Nos países em que o
modelo de referência é o americano, ou seja, com fim comercial e de incentivo ao
lucro, as TVEs erguem-se às margens do processo. Nos EUA56, por exemplo, a tevê
educativa ficou limitada às instituições de ensino, e seu uso circunscrito, basicamente,
a circuitos fechados, ou seja, ao próprio ambiente acadêmico. A rede americana Public
Broadcasting Service (PBS), que congrega as emissoras públicas com fins educativos
e culturais, surgiu em 1967 e, até hoje, é limitada em sua abrangência e atuação
(Intervozes, 2009). Por outro lado, na maior parte dos países da Europa, nos quais
coube ao Estado o gerenciamento da TV em benefício do cidadão, o que implica na
utilização do meio sem distinção de classe, sem qualquer fim comercial e voltado para
a formação social do indivíduo, a tevê já nasceu educativa.
56
Registros históricos sugerem que as primeiras transmissões do que se pode chamar de tevê
educativa ocorreram em 1932, quando alguns professores e estudantes de uma universidade
localizada no centro-oeste dos Estados Unidos comunicaram-se por meio de uma estação
experimental criada por alunos de engenharia eletrônica. Essa estação veiculou cerca de 400
programas, incluindo cursos de arte, taquigrafia, engenharia, arte dramática, entre outros, no
período de 1932 a 1939. A partir de tal experiência, várias outras universidades americanas se
interessaram pela novidade, já que, mesmo havendo dificuldades relativas à qualidade técnica e à
aquisição dos aparelhos receptores, a televisão educativa inseriu-se na vida das pessoas, atraindo-as
para o consumo das mensagens audiovisuais. (Lima, 2002:43)
111
O rádio e a televisão são veículos da produção cultural de um povo
ou de uma nação e, para exercerem essa tarefa, não podem ser
contaminados por interferências políticas ou comerciais. Ainda que
marcada por uma forte dose de purismo, foi essa a concepção que
sustentou durante quase sessenta anos o modelo de rádio e de
televisão adotado na Europa ocidental (Leal Filho, 1997:17).
Esta exposição acerca do modelo europeu de televisão revela que, na intenção,
as televisões europeias nasceram com foco no cidadão e, consequentemente, mais
próximas de um conceito de tevê educativa. Contudo é importante observar que o
modelo adotado pelos europeus não resistiu à era dos satélites – a tevê americana
atravessou oceanos e aportou na casa dos cidadãos europeus. Com isso, em pouco
tempo, as tevês estatais europeias foram obrigadas a se adaptarem. Recentemente,
inclusive, abriram espaço para comercialização e processos de privatização.
Algumas peculiaridades do caminho das TVEs, no entanto, são singulares e
devem ser lembradas. Trata-se de uma trajetória que carrega em si paradoxos e
dilemas, transcendendo as tevês convencionais, no que tange tanto à amplitude de
análise quanto à complexidade do seu contexto. Não é uma história autônoma, e o seu
desenvolvimento é marcado por inúmeras influências. Pode-se dizer que a televisão
comercial, em curto tempo, começou a andar com suas próprias pernas, recursos e
conquistas. Já a televisão educativa esteve sujeita a tantos fatores que sua história se
organiza a partir de fusões de outras histórias. O movimento das tevês educativas
permeia a relação entre comunicação e educação, as oscilações teóricas de ambas as
áreas, os períodos histórico-sociais, o desenvolvimento dos modelos americano e
europeu de se fazer e pensar televisão, entre outros aspectos relevantes para a história
do meio.
Com relação, especificamente, ao conceito de televisão educativa, segundo
Gordon (1967), no início das reflexões acerca deste tema, o conceito televisão
educativa não dizia respeito às emissoras voltadas para fins educacionais, mas, sim, a
toda forma de veiculação, via televisão, de programas e projetos que visavam ao
ensino. ―O uso popular permitiu ao termo televisão educativa compreender quase todo
tipo de programa educacional de televisão, apresentado para qualquer finalidade
educativa ou que tente ensinar alguma coisa‖ (Gordon, 1967:14).
112
Ainda que sem especificar limitações de alcance ou desvendar qualquer pista
sobre a programação, o conceito estabelecido pela Federal Communications
Commission - FCC57, nos EUA, em 1963, para o Serviço Fixo de Televisão Educativa,
constituiu-se como o embrião do que se entende como a finalidade de uma tevê
educativa. Segundo esse órgão, a finalidade primordial deste modelo de tevê é
transmitir matéria educativa visual e sonora a determinados locais receptores: escolas
públicas e particulares, faculdades e universidades e outros centros de instrução para a
educação formal dos alunos (Burke, 1974:151).
Nota-se, nessa definição, uma característica bastante peculiar no que diz
respeito à tevê educativa norte-americana, em comparação à europeia e à brasileira. A
televisão educativa americana está diretamente vinculada a instituições de ensino ou
de interesse social. Já, nos países da Europa, as próprias emissoras são as responsáveis
pela programação educativa e esta é veiculada a toda sociedade indiscriminadamente.
No Brasil, a opção foi pelo total atrelamento ao Estado: os colaboradores são
funcionários públicos, suas diretorias são indicadas pelo governo, sua programação é
definida nos padrões de controle social e de políticas governamentais. No entanto, sua
veiculação abrange todo cidadão que disponha de sinal de tevê.
No Brasil, essa modalidade de tevê surgiu após duas décadas da chegada da
tevê ao país, quando, em 1967, o Conselho Nacional de Telecomunicações (CONTEL)
aprovou o Decreto Lei nº 236, de 1967, instituindo a existência da televisão educativa,
cujo objetivo era a divulgação de programas educacionais sem caráter comercial ou de
publicidade. Segundo Valente (2009), essa modalidade de tevê nasceu da intenção dos
militares de constituir um sistema de educação de massa através da televisão,
corroborado pela acelerada industrialização e consequente carência de mão de obra
qualificada a partir de meados dos anos 60. Nesse sentido, a TVE foi vista como um
veículo capaz de massificar a educação, na medida em que ela apoiaria a educação
formal e permitiria que parcela da população excluída do sistema oficial de ensino
fosse incluída (Beltrán 2002). ―Os meios de radiodifusão e televisão são meios
eficientes para realizar programas educativos destinados a grupos de população
distribuídos sobre grandes extensões territoriais (MEC 1982:17).
57
Órgão regulador do campo de telecomunicações e radiodifusão dos Estados Unidos. Entre suas
competências registra-se a fiscalização do espectro norte-americano de radiodifusão e a atribuição
de canais de rádio, tevê e serviços de telefonia. Equivale, aqui no Brasil, à ANATEL.
113
Sobre o mesmo assunto, numa outra direção, Fradkin (2003) acredita que a
tevê educativa foi criada sem planejamento e, portanto, sem um norte que a
direcionasse.
A televisão educativa foi implantada, no Brasil, sem obedecer a um
planejamento que decorresse de uma política setorial de Governo.
Algumas emissoras tiveram como raiz de sua criação razões de
ordem política, outras deveram sua existência à tenacidade
individual de idealistas, e poucas foram as que surgiram com
objetivos explicitamente definidos (Fradkin 2003:56).
A radiodifusão educativa, no Brasil, nasceu a partir da consolidação da Rádio
MEC (Ministério da Educação e Cultura), nome dado à Rádio Sociedade do Rio de
Janeiro, que, em 1936, foi doada ao governo federal, por Edgar Roquete Pinto, que
vinculou a transferência à manutenção de seu caráter educativo e à vinculação
administrativa da emissora ao Ministério da Educação e Cultura. Até hoje a emissora
vem sendo operada pelo executivo federal nesses moldes.
Segundo Valente, o principal estímulo para o surgimento de um conjunto de
televisões de caráter educacional, diferentemente do que aconteceu em outros países,
não ocorreu em função da necessidade de informação, cultura e entretenimento, visto
que as tevês comerciais tinham legitimidade nesse tipo de conteúdo, e, sim, pela
―demanda por educação, visto que o país experimentava, na época, uma
industrialização bastante acelerada e para a qual não havia mão de obra qualificada
num cenário de crescimento populacional relevante‖ (Valente, 2009:270).
Em 1967, além do Decreto-Lei nº. 236, que legislava acerca das tevês
educativas, foi criada a Fundação Centro Brasileiro de TV Educativa (FCBTVE),
órgão voltado ao fomento da programação educativa. Nesse mesmo período, iniciou-se
a implantação de emissoras de caráter educativo por parte dos governos estaduais, com
a criação da primeira tevê educativa do país, a TV Universitária do Recife. Logo
depois, em 1969, o governo do Estado de São Paulo adquiriu a TV Cultura, do grupo
Diários e Emissoras Associados, e organizou a emissora que se tornaria a mais bem
sucedida entre suas congêneres estaduais. Enquanto os governos estaduais construíam
suas televisões educativas, o governo federal, por meio da FCBTVE, atuava como um
centro de produção de programas educativos. Para referendar essas produções, em
1972, o Ministério da Educação – MEC - implantou o Programa Nacional de
114
Teleducação (Prontel), que passou a coordenar e organizar as atividades de
teleducação no país.
Em 1973, a FCBTVE produziu João da Silva, a primeira novela pedagógica
destinada aos alunos do ensino de 1º Grau, atual ensino fundamental, que,
curiosamente, foi veiculada primeiramente por emissoras comerciais - TV Globo e TV
Rio. Somente em 1976, após a criação da TVE do Rio de Janeiro, que ocorrera um ano
antes, ou seja, em 1975, a obra passou a ser veiculada por uma tevê educativa.
Segundo Valente (2009:271), a TVE do Rio de Janeiro constituiu-se como ―janela de
veiculação da produção da FCBTVE‖. Esse modo de administrar a programação
educativa, por parte do governo federal, porém, começou a mudar ao longo da década
de 1970, mais precisamente, a partir de 1975, com a aprovação da Lei nº. 6.301, que
institui a Empresa Brasileira de Radiodifusão (Radiobrás), órgão responsável pela
exploração dos serviços de rádio e TV do governo e da TVE do Rio de Janeiro. A
partir daí, o executivo federal passou a atuar como operador direto de emissoras e não
mais apenas como produtor de conteúdo.
De 1968 em diante, com a inauguração das primeiras televisões educativas, e
com a disponibilidade de canais exclusivos58 para emissoras dessa natureza, muitas
Secretarias de Estado da Educação interessaram-se pela implantação de sua televisão.
Segundo Fradkin (2003), entre os anos de 1967 e 1974, surgiram nove emissoras
educativas, cuja razão social e vinculação eram as mais diversas, como pode ser
verificado no quadro abaixo, citado por Fradkin, (2003:56):
58
―[...] em 1965 o Ministério da Educação solicitou ao Conselho Nacional de Telecomunicação
(Contel) a reserva de 100 (cem) canais de televisão para fins educativos – 50 VHF e 50 UHF)‖
(Nunes, 1987).
115
Quadro: 15 – Emissoras Educativas - vinculação
Emissora
Razão Social
Vinculação
TVE do Amazonas
Fundação Pub. Estadual
Sec. Comunicação
TVE do Ceará
Fundação Pub. Estadual
Sec. Educação
TVE do Espírito Santo
Fundação Pub. Estadual
Sec. Educação
TVE do Maranhão
Fundação Pub. Estadual
Sec. Educação
TVU de Pernambuco
Universidade Federal
Ministério da Educação
TVE do Rio de Janeiro
Fundação Pub. Federal
Ministério da Educação
TVU do Rio G. do Norte
Universidade Federal
Ministério da Educação
TVE do Rio G. do Sul
Admin. Direta Estadual
Sec. de Educação
TV Cultura de São Paulo
Fundação Priv. Estadual
Sec. de Cultura
No entanto, mesmo considerando o crescimento - mais de uma ao ano - em tão
pouco tempo de existência, e, portanto, o interesse que o empreendimento provocou
nos estados, não se pode desconsiderar as críticas em relação ao seu desenvolvimento.
Segundo Carmona (2006), as televisões educativas criadas na década de 1970 foram
usadas como tábua de salvação para a educação e como instrumento político.
No Brasil, há mais de quatro décadas no ar, essa modalidade de tevê continua
merecendo debates acalorados e, muitas vezes, apaixonados acerca de sua missão e
qualidade.
Miola (2009:45), citando a Comissão Carnegie, que analisa a tevê
educativa dos EUA, faz constar que, ―[...] na soma do que apresenta, [a televisão] é
profundamente educativa, como o é a própria vida, e tanto mais porque não há um
sumário formal que possamos consultar para apurar o que aprendemos‖. Tal afirmação
deixa evidente a necessidade de analisarmos a televisão educativa brasileira, que
apresenta deficiências relativas a diferentes aspectos, como sustentação financeira,
descontinuidade de gestão, falta de legitimidade e de reconhecimento do seu papel
social. Esse diagnóstico fica evidente na avaliação de Jambeiro:
116
A despeito de tanto suporte legal, a TV educativa atravessou a
segunda metade do século XX desacreditada e fortemente criticada
por ineficiência; chegou-se a dizer que ela gastava muito dinheiro
para fazer nada. Sua programação carece de coerência. [...] No que
se refere a sua missão educativa, alguns críticos argumentam que
com os recursos que ela gastou durante sua existência teria sido mais
barato e provavelmente mais eficiente pagar um professor particular
para cada um de seus alunos, ou mandá-los estudar nas melhores
escolas privadas (Jambeiro, 2001:124).
A programação nessa modalidade de tevê teve, como base de formato, a
reprodução do modelo convencional da sala de aula, ou seja, a lousa e o giz. Pouco se
criou. Ocorreu, na verdade, uma transposição simples do que se fazia em sala de aula
para a mídia televisiva. As aulas eram veiculadas, basicamente, pela manhã, com
conteúdos da educação formal, o que causava desinteresse para o restante da
audiência. Este modelo, segundo observa Fernández (2002:161), demonstrou- se
incompatível com a realidade educacional e as especificidades da mídia televisiva: ―a
cobertura maciça da mídia é incongruente com a audiência segmentada dos
telealunos‖. No ambiente escolar, por sua vez, esses programas igualmente não
cumpriam seus objetivos educacionais pela carência de equipamentos de recepção nas
salas de aula, de videotecas e de formação dos professores.
É importante, também, destacar que a própria legislação referenda o modelo
educativo como reprodutor de ―aulas, conferências e debates‖ (decreto 236, de 28 de
fevereiro de 1967). Acerca deste modelo, previsto em lei, Muylaert afirma que:
A TV Cultura optou por ser uma televisão de cunho educativo, mas
não strictu sensu, que são programas educativos por sua própria
natureza. Mas o que é importante é que nós temos a preocupação de
que a televisão seja educativa em toda a sua programação [...] eu falo
de programas que deem uma contribuição para a sociedade e, para
isso, nós procuramos sempre pesquisar, fazer painéis, pesquisas
qualitativas, onde a gente busca saber como essa programação esta
sendo recebida e quais são os anseios da sociedade em nosso estado
[...] O conceito da TV educativa é um conceito que está se
modificando no mundo inteiro [...] Quando a gente faz um
documentário sobre o Marechal Rondon, sobre energia elétrica, que
leva meses para fazer e ninguém faz, esse programa é educativo [...]
aqui se repassa todo o conceito de TV educativa, sem ser o velho
conceito que afugenta o telespectador (Muylaert, 1995:83).
117
Somente a partir da década de 1970 compreendeu-se que a linguagem
televisiva é mais eficiente quando usada a partir da ficção e da identificação
emocional, cabendo, portanto, a conceituação e a rememoração à linguagem escrita.
A TV opera com uma linguagem lúdico-afetiva e dramática, que tem
características associativas, polissêmicas, sugestivas e glamurosas, e
que envolve mais a fantasia e o desejo, do que a razão analítica; ou
seja, a linguagem televisiva tem uma eficácia própria, que pode ser
complementar e enriquecedora, mas não é sinônimo da linguagem
verbal e escrita da escolaridade, nem a substitui (Fernández,
2002:163).
Leal Filho (1997), em relação a esse assunto, diz que o surgimento do sistema
educativo de televisão, no Brasil, foi de interesse das emissoras privadas, pois, com a
tevê educativa, elas se viram desobrigadas das tarefas culturais e educacionais exigidas
por lei. A legislação brasileira, referendada pela constituição de 1988, ratificou o
caráter público das tevês quando, em seu Artigo 221, fez constar que a televisão – aqui
se referindo a todas as modalidades de tevê, independentemente de ser educativa ou
não – deve:
1. Dar preferência a finalidades educativas, artísticas culturais e informativas;
2. Promover a cultura nacional e regional e estimular a produção independente que
objetive sua divulgação;
3. Regionalizar a produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais
estabelecidos em lei;
4. Respeitar valores éticos e sociais da pessoa e da família.
Na teoria todas as tevês - públicas, estatais ou privadas - têm fins educativos,
porém, não é isso que ocorre; o que se vê é um grande distanciamento do que diz a lei,
uma vez que as emissoras privadas têm sua programação orientada pela audiência, o
que leva à busca incessante por mais telespectadores e valorização dos espaços
publicitários em detrimento de uma programação que tenha autonomia em relação aos
índices de audiência. Para Bourdieu (1997), o índice de audiência exerce um efeito
absolutamente particular sobre a televisão. As tevês estatais, por outro lado, na maioria
das vezes, configuram-se como uma espécie de vitrine eletrônica, pela qual as ações
governamentais são apresentadas à sociedade.
118
Seguindo o modelo dos EUA, a televisão brasileira jamais foi entendida como
um bem público. A tevê, de acordo com a legislação, mesmo em se tratando de um
serviço de utilidade pública, baseado em concessões, sempre esteve na esfera da
exploração privada, permanecendo o Estado como regulador das atividades. Com isso,
estimulou-se uma produção de massa vinculada ao entretenimento, compatível com os
parâmetros ditados pelo mercado de consumo. Para Lopes (2000), a televisão
brasileira atingiu um padrão de excelência, no que tange à qualidade técnica e estética,
que a coloca entre as mais bem conceituadas do mundo. No entanto essa mesma
eficiência não é vista quando se trata dos aspectos jurídicos relativos à sua
regulamentação. Sobre a legislação brasileira afirma:
[...] comparada à legislação de outros países, a brasileira é de um
laconismo que reflete com perfeição a falta de consciência da
relevância do meio televisivo no mundo contemporâneo e,
consequentemente, a responsabilidade social subjacente ao exercício
desta atividade (Lopes, 2000:167).
A constituição de 1988, ainda que considerada democrática, não constituiu
grandes avanços para a radiodifusão; em vez disso garantiu privilégios aos
concessionários. A legislação existente é obsoleta, varia entre o autoritarismo absoluto
e o paternalismo, não garante a qualidade do serviço prestado e tampouco o direito ao
cidadão de ser bem informado e de ter acesso à diversidade cultural. A garantia de se
ter reservado espaço para programas educativos, como consta na legislação, é
absolutamente ignorada.
Considerando a televisão educativa como um subcampo do campo televisivo,
procurou-se demonstrar neste subitem, utilizando as teorias de Bourdieu, que a
autonomia de um subcampo em relação ao seu campo de referência ocorre a partir do
processo de legitimação de seus agentes, de sua estruturação, da distribuição dos
capitais, do ―modus operandi‖, ou seja, dos habitus dentro deste subcampo. A partir
dessas concepções, é possível depreender, pela história e configuração da tevê no
Brasil, que o campo televisivo, amplamente consolidado e legitimado nos diversos
segmentos da sociedade, tende a manter a relação de hegemonia em relação ao
119
subcampo da tevê educativa, que, como se procurou demonstrar, não logrou obter
autonomia e, portanto, tende a seguir uma trajetória de menor importância no contexto
sociocomunicacional brasileiro.
Importante destacar, ainda, que a razão apresentada pelo Estado, à época do
Regime Civil-Militar (1964-1985) – reproduzir a sala de aula na tevê –, mostrou-se
ineficaz e a educação formal universalizou-se com a ampliação do campo escolar, para
o qual a televisão contribuiu como meio de acesso à informação e à cultura, levadas
para as salas de aula, pelos alunos, como parte do repertório e da experiência de vida,
em uma sociedade cada vez mais mediada. Esse assunto será discutido com maior
profundidade no quarto capítulo deste trabalho, uma vez que se entende a televisão
universitária como uma mídia educativa e sobre a qual os reflexos de todos os
sucessos e insucessos das mídias educativas recaíram.
3.2 A televisão da universidade
Para compreensão do termo televisão universitária, buscou-se, como
parâmetro, a definição da Associação Brasileira de Televisões Universitárias – ABTU
– que, em seu estatuto, define a tevê universitária como:
[...] aquela produzida por Instituições de Ensino Superior (IES) e
transmitida por canais de televisão (abertos ou pagos) e/ou por meios
convergentes (satélites, circuitos internos de vídeo, Internet etc.),
voltada estritamente à promoção da educação, cultura e cidadania
(Priolli e Peixoto, 2004:22).
Essa definição é importante na medida em que delimita a compreensão de tevê
universitária também na perspectiva deste trabalho de pesquisa. Outro recorte
importante a ser feito diz respeito a questões relativas às diferenças semânticas, dentro
da lei do cabo (8.977), das expressões Instituições de Ensino Superior e Universidade.
Essa questão foi bastante discutida nos primórdios do segmento, quando muitos dos
envolvidos na formação dos canais universitários, entre eles os que propunham a
implantação do que viria a ser do CNU-SP, entenderam que a lei determinava que
apenas ―universidades‖ podiam fazer parte dos canais universitários. Em função disso,
a ABTU fez questão de evidenciar que qualquer IES que transmitisse e produzisse
120
programas de caráter cultural e educacional poderia ser considerada uma televisão
universitária.
A televisão universitária de Recife, vinculada à Universidade Federal de
Pernambuco, foi a pioneira da tevê educativa do Brasil e também a primeira tevê
universitária do País. Tinha, como missão primordial, a promoção da educação, num
momento em que o analfabetismo alcançava mais da metade da população. Em 1972,
a Universidade Federal do Rio Grande do Norte também recebeu uma concessão de
tevê para transmissão das aulas do Projeto Satélite Avançado de Comunicações
Interdisciplinares – SACI. Ambas as tevês configuram-se como as precursoras das
tevês universitárias no país. Assim, a primeira concessão pública para uma emissora
de tevê educativa no Brasil foi dada à Universidade, apesar do desprestígio da
televisão, ícone da cultura de massas, dentro da Academia, guardiã da cultura erudita.
Ainda que a primeira tevê denominada universitária tenha nascido há mais de
40 anos, não é possível dizer que a tevê universitária começou no Brasil em 1967,
visto que as emissoras operadas pelas universidades na radiodifusão (TV aberta, nas
frequências VHF ou UHF) não ofereciam ao telespectador uma programação
especificamente produzida na universidade ou em seu entorno, características
essenciais pela definição da ABTU, aqui, reproduzida anteriormente. Segundo Priolli e
Peixoto:
No conceito adotado pela ABTU (Associação Brasileira de
Televisão Universitária), a Televisão Universitária é aquela
produzida no âmbito das IES ou por sua orientação, [...]. Uma
televisão feita com a participação de estudantes, professores e
funcionários, com programação eclética e diversificada, sem
restrições ao entretenimento, salvo aquelas impostas pela qualidade
estética e a boa ética. Uma televisão voltada para todo o público
interessado em cultura, informação e vida universitária, no qual
prioritariamente se inclui, é certo, o próprio público acadêmico e
aquele que gravita no seu entorno: familiares, fornecedores,
vestibulandos, gestores públicos da educação, etc. (Priolli e Peixoto,
2004:5)
A ligação dessas tevês com suas universidades era, apenas, administrativa e
financeira, até porque, consideradas as suas limitações de capacidade de produção,
grande parte de seu conteúdo vinha de outras produtoras. A maior parte dessas tevês
tem sua programação baseada nas produções da TV Cultura de São Paulo e da TVERJ.
121
Segundo matéria publicada pela Revista Ensino Superior (edição 91), as
primeiras instituições de ensino superior a veicularem programas com as
especificidades características da tevê universitária apontadas por Priolli e Peixoto
foram a Universidade Federal de Santa Maria, (Rio Grande do Sul), que opera a TV
Campus, e a Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), que até hoje compartilha o
Canal Universitário com outras universidades paulistanas.
Antes de se apresentar o estado da arte deste segmento, faz-se necessário, para
uma melhor compreensão das suas características, identificar as diferenças entre tevê
universitária e canal universitário. Até 1995, o sistema de distribuição televisiva
adotado pelo Brasil era o da Radiodifusão, aberto e gratuito, no qual uma mesma
empresa tinha como responsabilidade a produção, programação e também a
distribuição dos conteúdos. Na veiculação do sinal por cabo, o processo dá-se de
maneira diferente. O tráfego do sinal deixa de ser responsabilidade do produtor de
conteúdo e passa a ser uma responsabilidade das concessionárias dos canais por cabo.
Desta forma, a denominação tevê universitária cabe à IES que produz o conteúdo e a
denominação canal, ao órgão que empacota e envia os conteúdos à concessionária
local de tevê por assinatura. Para facilitar o entendimento, toma-se como exemplo o
Canal Universitário de São Paulo, que recebe, empacota e envia os conteúdos
produzidos por Instituições de Ensino à concessionária de tevê por assinatura e esta os
envia aos telespectadores que têm acesso a tal modalidade no município de São Paulo.
Quando se pensa em tevê universitária, normalmente se faz alusão à tevê por
cabo, uma vez que foi, por meio dessa possibilidade de veiculação televisiva, que as
tevês universitárias se efetivaram e é, por meio dessa modalidade, que a maior parte
das televisões universitárias dissemina a sua programação. Esse meio de veiculação de
programas realizados por instituições de ensino é bastante importante, porém não é o
único. Como já foi dito no segundo capítulo, existem várias maneiras de concessão de
televisão e várias maneiras, também, para a distribuição dos sinais. Apesar de o
objetivo central desta pesquisa ser trabalhar com a tevê universitária do município de
São Paulo (que é organizada segundo os parâmetros da Lei de tevê por cabo), abaixo,
122
resumidamente, apresentam-se as outras várias possibilidades de veiculação de sinal
de tevê universitária.
Via sinal aberto – VHF ou UHF
Bastante abrangente, pois qualquer canal e/ou televisão dentro da área de
recepção de seu transmissor pode receber sua programação. O serviço disponibilizado
é gratuito. Esse sistema é mais conhecido como televisão aberta. Para obter uma
concessão VHF ou UHF, a instituição de ensino tem que obter uma outorga de uso de
um canal. Pouquíssimas tevês ou canais universitários utilizam essa modalidade de
veiculação de programação.
Via cabo, tevê paga
As universidades, dentro dos limites das operadoras de televisão por cabo,
podem utilizar o espaço que será acessível a todos os assinantes, independentemente
do plano escolhido. A Lei diz que as universidades devem compartilhar o uso desse
canal, porém somente em algumas cidades ela foi considerada dessa maneira. Na
maioria das cidades, entendeu-se que qualquer instituição de ensino superior poderia
utilizar o serviço. Atualmente encontra-se em trâmite no Congresso Nacional um
projeto de Lei que visa substituir ―universidade‖ por ―instituição de ensino superior‖,
para que não haja qualquer dúvida na interpretação da Lei. 59 Essa modalidade de
veiculação é a mais utilizada pelas tevês e/ou canais universitários.
Por satélite
As Instituições interessadas em utilizar esse recurso devem alugar um canal de
satélite. Nesses casos, a cobertura da programação deixa de ser local e passa a ser
nacional, podendo, inclusive, ser ampliada para outros países da América Latina; isso,
se houver a utilização de um receptor especial que capte os sinais. Esse modo de
exibição também é bem pouco utilizado em função do investimento necessário.
Pela internet
Para utilizar esse meio, a instituição de ensino deve ter uma estrutura de
hardware bastante potente. O alcance é planetário. Atualmente não há legislação sobre
59
No Canal Universitário de São Paulo, quando de sua criação, só foi permitida exclusivamente a
entrada de universidades, ocorrendo, então, um consenso sobre tal deliberação. Hoje, entretanto, há
controvérsias, entre os integrantes do CNU/SP, sobre o assunto.
123
essa utilização, portanto não há restrições legais. A qualidade de transmissão de
imagens é relativa.
Em circuito interno
Esse meio fica restrito ao campus e/ou campi das instituições, porém não pode
ser desconsiderado, já que mesmo intramuros circula, dentro das IES, um número
expressivo de indivíduos.
3.2.1 A televisão universitária e seus agentes
A constituição de canais universitários é resultado de intensas disputas que
ocorreram na sociedade brasileira no início dos anos 1990, processo que culminou na
promulgação da Lei 8.977, em 1995. Dentre os participantes desse intenso processo,
destacam-se, como agentes, órgãos do Estado e da sociedade civil que serão
apresentados a seguir.
No âmbito do Estado:
Ministério das Comunicações (Minicom)
É o órgão do poder Executivo Federal responsável pela elaboração, realização
e controle das políticas públicas na área das telecomunicações.
Secretaria de Serviços de Radiodifusão
Integra o Minicom com a responsabilidade de administrar as concessões de
Rádio e de Televisão aberta, abrangendo desde as questões relativas às licitações até a
operação do sistema.
Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel)
Vinculada
ao
Ministério
da
Comunicação,
é
uma
autarquia
administrativamente independente, financeiramente autônoma e que não se subordina
hierarquicamente a nenhum órgão do Governo. Criada em 1997 para, entre outras
124
funções, viabilizar o atual modelo das telecomunicações brasileiras e para fazer
cumprir o Plano Geral de outorgas.
Empresa Brasileira de Comunicação – EBC
Criada em 2007, com o objetivo de unificar e gerir, sob controle social, as
emissoras federais já existentes, instituindo o Sistema Público de Comunicação, e,
além disso, articular e implantar a Rede Nacional de Comunicação Pública. Em sua
página na internet, apresenta-se como uma empresa criada para suprir uma lacuna no
sistema brasileiro de radiodifusão, com o objetivo de implantar e gerir os canais
públicos, aqueles que, por sua independência editorial, distinguem-se dos canais
estatais ou governamentais.
No âmbito da Sociedade Civil:
Fórum Nacional para a Democratização da Comunicação - FNDC
Criado em 1991 - como movimento social - e posteriormente transformado em
entidade (1995), o Fórum congrega entidades da sociedade civil para enfrentar
problemas relativos à área das comunicações no país.
Associação Brasileira de Televisões por Assinatura – ABTA
Entidade Civil sem fins lucrativos, com atividades relacionadas à prestação de
serviços aos agentes ligados ao setor da televisão paga. Tem, como associados
representantes das operadoras, fornecedores de equipamentos, prestadores de serviços
e as programadoras. Sua atuação está concentrada na representação do segmento junto
aos órgãos públicos.
Associação Brasileira de Emissoras Públicas Educativas e Culturais – ABEPEC
Entidade de direito privado, sem fins lucrativos, que reúne emissoras de
televisão educativa e cultural do país. Atualmente congrega 21 emissoras geradoras de
caráter educativo e cultural, não comercial.
Associação Brasileira de Televisão por Assinatura – ABTU
Associação de direito privado, com caráter público e sem fins lucrativos,
integra as instituições de ensino superior e de pesquisa, públicas e privadas, com
produção regular de televisão. A entidade é a responsável pela articulação política do
125
segmento, integrando os esforços das IES, no sentido de favorecer o intercâmbio de
experiências entre as tevês universitárias.
Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras – CRUB
Associação Civil, sem fins lucrativos, que congrega as universidades
brasileiras. O Conselho tem como objetivo integrar, por meio de seus reitores, as
universidades brasileiras, fortalecer a sua autonomia e buscar o aperfeiçoamento da
Educação Superior.
Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior –
ANDIFES
Associação Nacional que representa as instituições federais de ensino superior
na interlocução com o governo federal, com as associações de professores,
funcionários, estudantes e sociedade em geral. Desde 2003, por meio da Rede IFES,
organiza as questões relacionadas aos veículos de comunicação das instituições
federais de ensino. Atualmente a Rede IFES vem pleiteando, junto ao governo federal
(MEC), uma subfrequência do Canal de TV Nacional para transmitir a TV
universitária em canal aberto. Desde 2008, um protótipo desenvolvido pela rede tem
sido testado.
Associação Brasileira Das Mantenedoras Do Ensino Superior - ABMES
Representa os mantenedores das instituições de ensino do país, tendo como
objetivo preservar, proteger e defender o segmento privado de educação superior junto
aos órgãos governamentais e a sociedade civil.
O cenário dos canais universitários admite, hoje em dia, uma gama variada de
agentes, cujas ações vão desde a realização de serviços específicos, relativos à
produção e veiculação dos objetos audiovisuais, até a congregação de iniciativas,
projetos e experiências desenvolvidos pelas próprias instituições ou, ainda, o
desenvolvimento e a implementação de metas e políticas relativas ao segmento da
televisão universitária. Tais agentes participam de um ou de ambos os campos –
universitário e televisivo –, o que tende a ampliar as tensões entre os campos. Os
agentes descritos e os demais, que compõem o campo televisivo universitário, serão
objeto de análise no capítulo 4.
126
3.2.2 O perfil das tevês universitárias do Brasil
Na tentativa de buscar entender o complexo jogo que se trava no cenário no
qual as tevês universitárias organizam seus habitus, apresenta-se, nas próximas
páginas, o estado da arte desse setor. Para Bourdieu (1988), a construção do campo
efetiva-se a partir de generalizações que vão, pouco a pouco, sendo efetuadas
Os dados que na sequência serão apresentados foram extraídos basicamente de
três trabalhos realizados por pesquisadores da área da tevê universitária. O primeiro,
coordenado por Carvalho (2002), envolveu um grupo de estagiários da TV PUC de
Campinas (SP) e teve como objetivo mapear o cenário da televisão universitária no
Brasil, apontando a existência de aproximadamente 30 instituições de ensino superior
com produção regular de programas de TV. O segundo, coordenado por Priolli e
Peixoto (2004), atualizou os dados de 2002 e concluiu que, após dois anos da
realização da primeira pesquisa, 85 instituições de ensino superior tinham tevês em
sua organização; o relatório destaca a organização dessas tevês em rede aberta, no
cabo, em ambos os sistemas e em circuito interno:
São contabilizados, até o momento, pelo menos trinta e um canais de
cabodifusão mantidos por sessenta e quatro Instituições de Ensino
Superior, sendo onze canais compartilhados por várias
Universidades [...] e vinte canais exclusivos, ou seja, ocupados por
apenas uma Instituição de Ensino Superior. Operando em
radiodifusão, temos mais doze canais, dirigidos por outras nove
Instituições. Com exibição de suas programações em canais abertos
e fechados (cabodifusão e radiodifusão) há trinta e seis canais,
ligados a treze Instituições de Ensino Superior. Em MMDS (microondas) existe a TV FAG, de Cascavel (PR). Ao todo, são oitenta e
cinco Instituições de Ensino Superior ocupando setenta e três canais
de televisão no Brasil. (Priolli; Peixoto, 2004:5, grifos nossos).
O terceiro e mais atualizado trabalho foi realizado por Ramalho (2010), que,
entre 2008 a 2009, coordenou, com apoio da ABTU, uma pesquisa que visava
atualizar os dados existentes e traçar um perfil do segmento quanto à sua
institucionalização, financiamento, conteúdo e formas de veiculação.
A pesquisa coordenada por Ramalho teve, como ponto de partida, o portal do
INEP, que, em 2009, registrava a existência de 2.495 instituições de ensino no país
(universidades, centros universitários, institutos, faculdades e fundações). A partir
127
desse universo, a pesquisadora, juntamente com a ABTU, buscou localizar os
telefones de todas as instituições registradas, conseguindo contato com 1662 IES.
Ao iniciarmos os contatos, deparamo-nos com o segundo problema:
erros de informação no registro, como números com algarismos
insuficientes ou que remetiam a outros assinantes (açougues, casas
comerciais ou residências, por exemplo). Isso demandou um esforço
imprevisto, levando a confirmações em sites por meio de
ferramentas de busca, o que nem sempre se mostrou eficiente, pois
muitas não se apresentam na Internet. E, ainda, mesmo que o
número estivesse correto, frequentemente as ligações eram
transferidas para uma média de cinco ramais diferentes, até
conseguirmos concretizar contatos que pudessem oferecer
informações qualificadas – normalmente nos departamentos de
Marketing ou na coordenação de cursos de Comunicação (Ramalho,
2010:86).
Gráfico 16 – IES no Brasil
Segundo a pesquisa, das 1.662 instituições de ensino superior contatadas, 151
responderam positivamente à questão da existência de tevê universitária. Cabe
esclarecer, no entanto, que se considerou como resposta positiva tanto aquela IES que
128
tem espaço próprio para veiculação, quanto aquela que produz apenas um único
programa para veiculação em outros canais. Excluíram-se, desta contagem, aquelas
instituições que produzem trabalhos para a postagem/veiculação, exclusivamente, no
Youtube ou qualquer outra rede social.
Segundo a pesquisa, a região que concentra o maior número de tevês
universitárias é a sudeste.
Gráfico 17 – Universidades com TV
Acompanhando o ritmo de expansão do ensino superior no país e mantendo a
tendência de concentração das atividades comunicacionais nas regiões sul e sudeste, a
maioria das tevês universitárias no país também se localiza nessas regiões.
129
A pesquisa revelou que 72% das tevês universitárias estão localizadas em
instituições de ensino com título de universidade60.
Gráfico 18 – Estrutura da instituição
Ainda que a maior parte das tevês universitárias esteja ligada a universidades,
um ponto que merece destaque é a questão da subordinação dessas televisões no
organograma das instituições:
60
Para as 151 instituições de ensino superior que responderam, via fone, positivamente a respeito
da existência de televisões universitárias, foi enviado, via email, um questionário visando traçar o
perfil dessas televisões. O retorno, segundo a pesquisadora, foi de apenas 35 IES. Isso explica a
alteração da base da amostra dos gráficos apresentados na sequência.
130
Gráfico 19 – Relação institucional
Como se pode perceber, apenas quatro das trinta e cinco instituições que
responderam à pesquisa vinculam sua tevê às pró-reitorias. Porém é importante
destacar que, ainda que a maior parte das tevês universitárias esteja presente em
Universidades, por excelência, centros de pesquisa, nenhuma das tevês das escolas
respondentes vincula sua programação à pró-reitoria de pesquisa.
A partir dessa observação, vários pressupostos podem ser inferidos, entre eles o
distanciamento entre tevê e universidade, que se fez presente desde a criação e a
orientação da tevê para a massa. Além disso, esse afastamento entre tevê e pesquisa é
muito prejudicial para a televisão universitária, na medida em que é nessa área que a
maioria das experimentações é efetivada. Os reflexos desta cisão ficam evidentes na
programação das tevês universitárias, que se configura como uma tentativa de imitar a
programação e a linguagem da tevê aberta. Pouco se cria ou se experimenta nas
televisões universitárias. ―[...] o limite de um campo é o limite dos seus efeitos ou, em
outro sentido, um agente ou uma instituição faz parte de um campo na medida em que
nele sofre efeitos ou que nele os produz [..].‖ (Bourdieu, 2000:32).
131
Sobre a questão das plataformas de veiculação, a pesquisa revelou que 37% das
tevês universitárias veiculam sua programação exclusivamente por meio de
cabodifusão. Isso é explicado, tendo em vista que o segmento teve impulso com a
efetivação da Lei 8.977, que organizou a exploração do serviço e fez constar, em seu
artigo 23, que as operadoras do serviço, dentro de sua área de abrangência, deveriam
disponibilizar canais para uso compartilhado dos seguintes setores: universidade;
câmara dos deputados; assembleia legislativa; senado federal; órgãos educativos;
comunidade e supremo tribunal federal.
Gráfico 20 – Sistema operacional
Pelo gráfico, é possível visualizar a concentração da exibição pela radiodifusão
e também constatar que as possibilidades de veiculação dos sinais das tevês têm
ocorrido pelos diversos meios; aliás, é relevante ressaltar que existem tevês que
transmitem sua programação por mais de uma plataforma de exibição. Segundo
Ramalho (2010), das 35 respostas ao questionário, 13 (37%) estão exclusivamente no
cabo, mas 27 (78%), além do cabo, veiculam seus programas também em rede aberta,
na internet ou em circuito interno.
132
Segundo Bourdieu (1988), as lutas daqueles que pretendem assumir posições
ou daqueles que pretendem manter suas posições dentro do campo envolvem a
distribuição e a posse de um capital específico. Desta forma, identificar as maneiras de
financiamento das tevês universitárias é relevante, na medida em que, segundo a lei do
cabo, as operadoras devem apenas disponibilizar os canais para acesso, não havendo
compromisso de repassar verba ou subsidiar qualquer tipo de gastos, como ocorre em
outros países. Segundo Ramalho (2010), a maior parte dos gastos das tevês é suprida
pela IES ou sua mantenedora, no caso das particulares. Apenas a TV Viçosa (MG),
Ligada à Universidade Federal de Viçosa, alegou manter-se a partir de apoio cultural e
lei de incentivo.
No tocante a patrocínio e financiamento, é importante lembrar que as tevês
universitária,s em todo o país, seguem o previsto no decreto lei 236/67, que proíbe a
transmissão de qualquer propaganda, direta ou indiretamente, bem como o patrocínio
aos programas, mesmo que nenhuma propaganda seja feita através dos mesmos. Na
avaliação de Cruvinel (2009)61, "esse item do decreto precisa ser removido. É mais um
filhote da ditadura sobrevivente. Ele é um entulho autoritário que trava todo o modelo
público de televisão".
Em um país que conheceu apenas o financiamento dos sistemas de
comunicação pelo mercado publicitário, permanecem em aberto as questões relativas à
televisão pública, uma vez que esta não tem a mesma dinâmica das tevês comerciais –
a audiência, como critério básico e essencial de sua existência. O dilema permanece:
obter financiamento por parte do Estado e, como decorrência, o atrelamento às
dinâmicas das políticas públicas para o segmento, ou curvar-se aos valores do
mercado. Qualquer que seja a alternativa escolhida, cabe lembrar que fazer televisão
envolve altos custos, que, no caso das tevês universitárias, até o momento, são
responsabilidade das universidades que participam do segmento. Estas, que têm como
atividade-fim ensino e pesquisa, investem na tevê como parte de suas estratégias de
marketing, objetivando obter reforço institucional.
61
Durante debate no II Fórum Nacional das TVs Públicas, ocorrido em Brasília, em Maio de 2009
133
Apesar do que está definido na lei, os participantes dos canais universitários – e
também tevês públicas, como a Cultura de São Paulo - têm buscado parcerias e formas
de financiamento para além das verbas estatais ou de mantenedoras a elas destinadas.
3.2.2.1 Programação baseada no gênero discursivo
A programação dos canais universitários é, predominantemente, baseada no
discurso a partir de programas gravados, em estúdio, com a presença de um
especialista. Além deste, outro formato bastante comum são os documentários
(Ramalho, 2010).
Segundo Martinho (1999), as tevês universitárias privilegiam programas
educativos. Para a pesquisadora, que acompanhou a programação do canal
universitário de São Paulo por duas semanas, a Categoria Educação conta com 62%,06
do total dos programas veiculados. Na outra ponta, ou seja, 3,45% está a Categoria
Entretenimento. Os gêneros mais recorrentes durante o período de análise foram
Ciência e Informativo, respectivamente, com 61,12% e 57,15% de veiculação.
Programas com foco no entretenimento, na ficção e em transmissões ao vivo
são raros. Uma explicação talvez seja a falta de recursos financeiros para fazer frente
aos custos de produção. Para Priolli e Peixoto (2004), existem duas explicações para o
que eles entendem como ―desequilíbrio de gêneros‖: a primeira ligada à produção
clássica do saber por parte da academia, e a outra relacionada ao baixo orçamento das
emissoras.
Sendo o reino da palavra por excelência, o território privilegiado dos
discursos, a universidade sente-se mais à vontade – e talvez cumpra
melhor a sua finalidade – quando se utiliza de debates, entrevistas e
palestras para comunicar-se pela TV. Mas deve-se considerar,
também, e de forma muito objetiva, que esses são os formatos de
produção mais simples e barata que a televisão oferece. Uma
entrevista custa uma ínfima fração de um teleteatro, por exemplo.
[...] Para emissoras de caixa sempre baixo, e ainda imaturas
tecnicamente, como as universitárias, há, portanto, gêneros de
programação ainda inacessíveis. Ao menos, numa escala de
produção mais industrial (Priolli; Peixoto, 2004:7).
134
Programas institucionais em formato de ―revista eletrônica‖, com temáticas
voltadas às atividades acadêmicas e administrativas, também estão presentes em,
praticamente, todas as grades de programação das tevês universitárias, o que não causa
surpresa, já que um dos objetivos que justifica o investimento é a possibilidade de a
universidade se apresentar à sociedade, e a ―propaganda institucional‖ faz parte desse
contexto. Para reforçar essa linha de argumentação, apresenta-se, na sequência, uma
afirmação de Sidney Stroch Dutra62, ex-reitor da Universidade de Santo AmaroUNISA, uma das primeiras a integrar o Canal Universitário de São Paulo, acerca dos
motivos que levaram a UNISA a investir na tevê universitária: ―[...] reforço
institucional em primeiro lugar [...] forma de a universidade exercer esse papel de
catalisadora e gerenciadora dos espaços educacionais existentes na sociedade.‖ (grifo
nosso).
Acerca dos assuntos tratados na programação dos canais universitários, é
importante destacar que os mais comuns se relacionam à educação e à cultura em
geral. Além disso, as origens destes conteúdos e ou notícias são as próprias
universidades. Ainda que alguns temas possam ser retirados da pauta dos veículos de
comunicação de massa, ao serem discutidos pelos especialistas, ganham leitura e
estética próprias da universidade.
[...] a televisão universitária é um dos excelentes meios de ligação
entre a sala de aula e os locais de trabalho, lazer e moradia. Ela é
uma extensão das bibliotecas, dos laboratórios, dos eventos
científicos e esportivos (Paviane, 1998:17).
Talvez seja essa a grande contribuição que as tevês universitárias possam dar à
sociedade, vale dizer, diferenciar-se completamente do modelo de informação
oferecido pelas tevês comerciais, apresentando aos telespectadores interpretações
fundamentadas no conhecimento científico. Esse viés possibilitou, por exemplo,
produções conjuntas entre as tevês universitárias integrantes do canal universitário de
São Paulo, quando professores e pesquisadores de todas as instituições que
participavam do canal, à época (2003/2006), puderam realizar debates e mesasredondas, a partir da iniciativa do projeto Globo Universidade, da Rede Globo de
Televisão, no qual cada uma das tevês (na época nove) sediou debates com
62
Sidney Storch Dutra, reitor da Universidade de Santo Amaro, durante entrevista concedida a esta
pesquisadora, em agosto de 2002.
135
transmissão ao vivo pelo CNU. No primeiro momento (2003/2004), discutiram-se
aspectos históricos, culturais e sociais de São Paulo, por ocasião dos 450 anos da
cidade, e, posteriormente, (2005/2006) tratou-se de propostas e soluções para
problemas brasileiros. Dados mais concretos acerca desses projetos serão apresentados
no capítulo quatro, quando, efetivamente, se tratará das especificidades do Canal
Universitário de São Paulo.
3.2.2.2 A tevê especializada: ciência e difusão do conhecimento
Uma das possibilidades criadas em função das Tecnologias da Informação e
Comunicação – TICs – foi a televisão por assinatura que passou a concorrer com os
clássicos canais de tevê aberta, isso ainda nos anos 1980, quando os primeiros sinais
de segmentação de mercado começaram a ser visíveis nos Estados Unidos e no Brasil.
Com isso, os modelos tradicionais de televisão viram-se forçados a se adaptarem à
nova realidade, na qual os competidores praticam segmentação para estabelecer suas
posições no mercado. Dessa forma, deu-se oportunidade para a criação de inúmeros
canais com foco em segmentos ainda pouco explorados, como o universitário.
A partir dessa possibilidade, a universidade brasileira, segundo Priolli e
Peixoto (2004), muito rapidamente, foi abandonando antigos preconceitos contra a
televisão e passou a confiar no potencial dessa mídia para a difusão de informação,
cultura, educação e cidadania.
A mesma universidade brasileira, que levou quase 20 anos para
admitir que a televisão podia ser um objeto sério de pesquisa
acadêmica (a TV surgiu no país em 1950 e apenas no final dos anos
1960 apareceram os primeiros estudos sobre ela, no campo da
sociologia e da comunicação), agora dá um grande salto em seu
processo de compreensão do fenômeno televisual e se põe, ela
mesma, a fazer TV (Priolli; Peixoto, 2004:6).
Desde 2007, em função dos projetos para digitalização da tevê no país,
governo, pesquisadores e sociedade vêm tentando entender e compreender a
importância da tevê pública e a possibilidade de ampliar sua atuação no espectro
136
televisivo. A tevê universitária, como parte desse subcampo (entendendo a tevê
pública como subcampo da televisão), igualmente, busca seu reconhecimento por parte
da comunidade acadêmica, na qual, num primeiro momento, estão seus principais
agentes. Se esse meio quer dialogar com a sociedade, deve, fundamentalmente,
comunicar-se com a sua comunidade. Por outro lado, não se pode imaginar uma tevê,
que pode veicular além dos ―muros‖ da academia, produzir com vistas, apenas, à
comunidade interna (alunos, professores e afins). Por meio da televisão, a universidade
pode se apropriar de um novo espaço de diálogo com a sociedade, podendo utilizá-lo
tanto na difusão do saber produzido quanto no caminho inverso, ou seja, alimentar-se
do vasto conhecimento produzido pela sociedade brasileira, numa via de duas mãos.
3.2.2.3 TV Universitária e a prática do ensino
A maior ou menor presença da prática do ensino das tevês universitárias
depende da orientação de cada instituição. Segundo o reitor da Universidade do Vale
do Rio dos Sinos (RS), Padre Marcelo Fernandes Aquino (2009)63, a TV Unisinos
deve ―transpirar‖ a questão pedagógica:
Nossa TV e rádio têm que perseguir cada vez mais a sinergia com
nossos cursos; nossos alunos participam dos estúdios, que são os
laboratórios, e estamos tensionados cada vez mais no
aperfeiçoamento dos projetos pedagógicos pela inclusão dos
professores na dinâmica profissional da TV (Aquino, 2009).
A discussão acerca da possibilidade de a tevê universitária configurar-se como
um espaço para aprendizagem já vem de longa data. Paviani (1998), em uma das
primeiras publicações do setor, diz que ―[a TV universitária] pode, sem dúvida, servir
aos fins didáticos e de aprendizagem do fazer televisão, porém sem deixar de atuar no
âmbito maior das funções da universidade [ensino, pesquisa e extensão]‖ (Paviani,
1998:17).
63
Aquino, em palestra no XI Fórum Brasileiro de TVs Universitárias, realizado em Brasília, nov.
2009.
137
Em 2003, durante fórum realizado em Florianópolis, Gabriel Priolli64 defendeu
que os projetos de tevê devem constituir-se de núcleos autônomos pois:
[...] como trabalho laboratorial, o grande problema está nas
propostas de trabalho, que refletem muito mais as preocupações de
alunos e professores naquele momento do que propriamente o
atendimento aos interesses do público que está do outro lado, a
comunidade. Olham para o próprio umbigo. Falta uma compreensão
de qual é o papel da TVU enquanto extensão universitária produtora
de conhecimento [...] Ou fazemos a comunicação da universidade,
ou não somos TV universitária, mas órgão laboratorial do curso
(Priolli, 2003).
No mesmo evento, Castro avalia positivamente a presença de estudantes na
produção da tevê: ―são eles que nos fazem pensar a cada dia de uma maneira diferente.
O aluno passa a exigir do profissional concursado, que há 15 anos faz do mesmo jeito,
que abra a cortina da sua sala‖. Para a pesquisadora essa participação contribui para a
construção de uma programação interdisciplinar, na medida em que se pode ter, numa
mesma equipe, ―alunos de História, Engenharia, Artes Cênicas, inseridos no processo
de aprendizagem‖.
Tendo participado do processo de implantação da TV Unicsul, que veiculou
programação pelo Canal universitário de São Paulo durante 11 (onze) anos, a presente
pesquisadora acredita que pode haver um diálogo bastante eficiente entre a produção
para o canal universitário e a formação do futuro profissional. Isso não significa
simplesmente a transposição dos resultados ocorridos nos laboratórios para o ambiente
midiático. A tevê universitária pode configurar-se
como
espaço para o
amadurecimento profissional, tão importante quanto as técnicas ensinadas em sala de
aula. Entendidas desta forma, as tevês universitárias devem cumprir a mesma função
pedagógica para os cursos de Comunicação que os hospitais universitários, para os
alunos de medicina ou os núcleos de práticas jurídicas para os alunos de direito.
3.2.2.4 TV Universitária e a prática da pesquisa e da extensão
64
Priolli, em palestra no VII Fórum Brasileiro de TVs Universitárias, realizado em Florianópolis,
out. 2003.
138
Como já foi dito, o distanciamento entre a tevê da universidade e a área de
pesquisa é bastante presente no segmento. A tevê vê-se apartada desse setor desde a
sua criação. Segundo Priolli (1998), a universidade brasileira levou quase 20 anos para
admitir que a televisão podia tornar-se um objeto sério de pesquisa acadêmica. Sobre o
papel específico da tevê universitária na área da pesquisa, as referências são escassas.
Isso se reflete também nas pesquisas realizadas acerca deste segmento. Isso preocupa
alguns raros pesquisadores.
Outro autor, Brasil (2002), considera que a tevê universitária, sem o caráter de
inovação, corre o risco de ser uma cópia – muitas vezes de má qualidade – das tevês
comerciais. Segundo Maria Pia Mendes, diretora de programação do Canal
Universitário do Rio de Janeiro, durante palestra no XI Fórum Brasileiro de TVs
universitárias, realizado em Brasília, em 2009, ―fazer televisão universitária é fazer
televisão e ponto, e transformá-la em uma TV experimental pode afastar a audiência‖.
A diretora apregoa, ainda, que os canais universitários devem diferenciar-se pela
qualidade do conteúdo e ressalta que os programas oriundos da pesquisa, ou seja,
aqueles mais experimentais devem ocupar uma faixa específica da programação.
Ainda que pareçam opostas, ambas as opiniões devem ser consideradas, na
medida em que a universidade é o espaço privilegiado da pesquisa e, portanto, a
televisão desta instituição deve refletir isso. Contudo, a tevê não pode perder de vista
que o receptor já internalizou o modelo de programação da TV comercial, e, talvez,
uma ruptura muito drástica desse padrão possa, efetivamente, afastar ainda mais a
audiência. Outra questão que igualmente não pode ser descartada é que pesquisar
novos formatos exige tempo para maturação, testes e verificação de resultados, o que é
inviabilizado em função do baixo orçamento das tevês universitárias.
Mesmo considerando tal distanciamento, algumas iniciativas de apoio e
envolvimento das tevês universitárias junto à pesquisa merecem destaque. Em 2003, a
TV USP associou-se a um grupo de pesquisadores que, em um trabalho
transdisciplinar, discutiu os mais variados aspectos relacionados à tevê digital. A TV
Unisinos (RS), desde 2009, estabelece parceria com o Grupo de Pesquisa
―Comunicação, Economia Política e Sociedade‖ – CEPOS – do Programa de Pós139
Graduação em Ciências da Comunicação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos,
e, em conjunto, produziram uma série de reportagens sobre o uso de instrumentos
convergentes de comunicação pelos moradores de um bairro da cidade de São
Leopoldo. Num outro viés, a estrutura das tevês universitárias configurou-se como
locus de experimentação, quando, em 2002, cinco anos antes da implantação da tevê
digital no Brasil, foi realizada uma transmissão digital do sinal da TV da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte para o estande do Ministério da Ciência e Tecnologia,
durante uma Feira de Inovação Tecnológica. Também, em São Paulo, entre 1998 e
2000, a tevê da Universidade Presbiteriana Mackenzie participou de testes para
implantação da tevê digital, ao testar parâmetros para a mobilidade, característica
prevista no modelo de tevê digital em implantação no Brasil.
Ainda na área da pesquisa, outra iniciativa que merece destaque é a parceria
estabelecida entre a Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP) e a Associação
Brasileira de Televisão Universitária (ABTU), que, juntas, tentam implantar uma rede
de intercâmbio de TVs Universitárias (RITU), com o objetivo de possibilitar o efetivo
exercício de compartilhamento da programação dessas tevês. O projeto envolve o
Lavid (Laboratório de Vídeo Digital)65 – responsável pela programação do software –
e as TVs das seguintes universidades: Universidade Federal da Paraíba (PB),
Pontifícia Universidade Católica de Campinas (SP); Universidade de Campinas (SP),
Universidade de São Paulo (SP), Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP); Canal
Universitário de Niterói (RJ), Universidade Federal de Santa Catarina (SC),
Universidade Federal Fluminense (RJ), Centro Universitário de Belo Horizonte (MG),
Universidade Federal de Minas Gerais (MG), Universidade Metodista de Piracicaba
(SP) e a DoctumTV (MG).
Outro viés que se destaca é que as tevês universitárias exibem, regularmente,
resultados de pesquisas realizadas no âmbito das IES, às quais estão vinculadas,
configurando-se como veículo de divulgação científica, área já consolidada na mídia
brasileira. A diferença é que, nas tevês universitárias, os temas são tratados com tempo
para apresentações mais aprofundadas e temas que não têm apelo para audiência são
abordados sob a ótica da ciência.
65
O Lavid faz parte da RNP e pertence à Universidade Federal do Rio Grande do Norte. É
coordenado pelo professor Guido Lemos de Souza Filho (UFPB).
140
Tais iniciativas não configuram um trabalho conjunto entre tevê e
universidade, no sentido da produção e divulgação do conhecimento científico, antes
reiterando a inexistência de um projeto de tevê que se insira no processo da produção
do conhecimento e em sua divulgação.
Considerando o tripé ensino, pesquisa e extensão, definido como objetivos da
universidade contemporânea, a tevê universitária pode ser compreendida como um
instrumento da extensão educacional, uma vez que pode mostrar à comunidade externa
aquilo que ocorre na vida acadêmica.
Ramalho (2010), citando Ortiz, diz que, embora seja um objetivo legítimo, a
utilização da tevê universitária como meio de divulgação do saber científico pode
levar a uma compreensão reducionista das potencialidades deste meio ―É uma visão
instrumental sobre a comunicação, e um veículo não é somente um difusor de
informações; pode ir além‖. Castro (2003) atribui à tevê universitária uma ―dimensão
política‖, no momento em que se abre para viabilizar a produção de conteúdo por
outros grupos da sociedade, contribuindo, assim, para a formação de telespectadores
mais críticos.
A televisão universitária insere-se nas realidades das universidades com amplas
possibilidades de, por um lado, caracterizar-se como uma ação extensionista e, por
outro, significar uma apropriação do fazer televisivo por novos atores, abrindo brechas
para novos usos da televisão por parte de uma sociedade que, desde os anos 1950,
acostumou-se a entender esse meio como sinônimo de oligopólio comercial. Paiva
complementa:
Eu sempre imagino o quanto seria educativo que os jovens, a partir
de suas escolas, grupos, igrejas etc., saíssem do mero lugar de
consumidor de imagens e discursos para o de produtor. Imagine o
quanto essa audiência passiva iria se transformar em crítica e
analítica. Quem produz aprende a ver, a analisar (Paiva, 2004:152).
Pode-se entender que a tevê universitária configura-se como meio de extensão,
quando, em vez de somente transmitir valores ou prestar serviços, abre espaço para as
expressões da comunidade, tanto interna quanto externa, fazendo a mediação entre as
demandas da sociedade e o conhecimento acadêmico.
141
3.2.3 Tevê universitária: entre a ciência e o senso comum
A TV Universitária não pode falar de si nem pode falar para si. Ela
tem que falar para a sociedade, senão nem precisaria ser televisão
(Lima, 1998:21).
O destino da Universidade tem sido objeto de pesquisa de todos aqueles que
estão envolvidos com o saber científico. A Universidade é um bem público e está
sujeita ao Estado, que, no caso das IES públicas, é seu financiador e, no caso das
privadas, seu regulador. Portanto as transformações que ocorrem na sociedade
certamente se refletem na Universidade. De acordo com Santos (2005:114), a
especificidade da Universidade, enquanto bem público, consiste em ser ela a
instituição que liga o presente ao médio e longo prazos, pelo conhecimento e pela
formação que produz e pelo espaço público privilegiado de discussão aberta e crítica
que constitui. Santos (2003) afirma, ainda, que a Universidade exprime o modo de
funcionamento da sociedade, por isso nota-se, no interior da instituição universitária a
presença de opiniões, atitudes e projetos conflitantes que exprimem as contradições
existentes na sociedade. Essa ligação entre Universidade e Sociedade talvez possa ser
explicada pelo fato de que, desde seu nascimento, a Universidade foi considerada uma
instituição social, ligada a uma prática social formada a partir do reconhecimento
público de suas atribuições, num princípio de autonomia perante outras instituições.
O século XXI exige da Universidade, segundo Romano (2006), um papel mais
aberto e sintonizado com as demandas da sociedade, principalmente nos países em
desenvolvimento como o Brasil. Nesse contexto, cabe à universidade uma atuação que
considere as desigualdades e que ajude a promoção da inclusão social. Se, no passado,
a Universidade teve a missão de formar a elite, atualmente, recebe novas demandas.
Jamais como hoje a universidade foi pensada como parte da
economia. Jamais como hoje o conhecimento, a ciência e a
tecnologia foram tão valorizados como mercadoria capital a ser
apropriada
hegemonicamente
pelas
grandes
corporações
globalizadas e no interesse dos países centrais (Sguissardi,
2005:215).
142
Nesse novo cenário, a TV Universitária pode exercer um papel fundamental,
seja na difusão de informações úteis à comunidade acadêmica ou à sociedade em
geral, seja criando oportunidades educativas para ambas.
A televisão configura-se como o maior meio de comunicação do país66, visto
que, para boa parte da população, constitui-se como principal fonte de conhecimento
de fatos relevantes da sociedade brasileira. Nas últimas décadas, vem ganhando espaço
e assumindo papel expressivo para além do âmbito da difusão, sobretudo no da
abertura de horizontes para a reflexão que transforma o pensar e o fazer de tantos
cidadãos brasileiros. Neste ambiente de ampliação de espaço, fica evidente a
contribuição das tevês universitárias que, ao possibilitarem o diálogo entre duas
instituições tão importantes – a televisão e a universidade – assumem, de fato, seu
papel
na ampliação
do
campo do conhecimento,
tão imprescindível
ao
desenvolvimento da sociedade.
A integração de tantas vozes, por meio do diálogo entre tevê e universidade,
permitiu à tevê adentrar no mundo da universidade e, à universidade, no da
comunicação. A partir dessa integração, ambas - tevê e universidade - ganham, na
medida em que se cria uma atmosfera singular para a reflexão crítica e experimentação
de novas linguagens, formatos e narrativas, além de contribuir, criticamente, para a
formação de um novo profissional de comunicação alinhado às necessidades da
sociedade. A tevê universitária, neste sentido, pode configurar-se como um espaço
para o rompimento do fluxo natural e cômodo das ideias dos telespectadores, ao
provocar movimento, alertar, mostrar novos modelos, causar estranheza, ou seja,
colocá-los diante da realidade que transborda dentro e fora dos muros das
universidades. ―Se a gente tem um instrumento desse porte na mão, que esse
instrumento não seja apenas um instrumento do nosso narcisismo, mas uma
oportunidade de aumento da visão que a sociedade, a partir desse auxílio, possa ter de
si mesmo.‖ (Lima, 1998:21).
66
De acordo com os dados do IBGE 2001, dos 5506 municípios brasileiros, 93% não possuem
salas de cinemas; 85% não têm museus e teatros; e 25% não dispõem de bibliotecas. No entanto a
mesma pesquisa indica que 98% do território nacional dispõem de canais de tevê.
143
A tevê universitária, como já afirmado anteriormente, para participar de
maneira ativa da vida da IES à qual está ligada, deve estar baseada no tripé ensino,
pesquisa e extensão. No âmbito do ensino, com a participação de professores e alunos,
ocorre na produção de conteúdo; na pesquisa, pelas possibilidades de experimentação
no campo da comunicação e do desenvolvimento tecnológico; e na extensão, ao
estabelecer um vínculo direto com a comunidade. Por meio desse veículo, a
universidade
tem
a
possibilidade
de
estabelecer
um
diálogo
com
a
comunidade/sociedade enquanto instrumento pedagógico. O desafio é ampliar seu
foco e trazer a sociedade para dentro desta tevê e, consequentemente, para dentro da
universidade. Considerando que, atualmente, o saber científico, as formas de
conhecimento e de cultura são entendidos e acessados enquanto formas de linguagem
e para alcançar a sociedade, a utilização das narrativas da televisão constitui-se
técnicas eficazes e já incorporadas pela sociedade.
Alguns cientistas (Carl Sagan e Marcelo Gleisen – apud Paviani, 1998)
acreditam que a televisão deva empenhar-se na educação científica da sociedade, pois
contingentes significativos dos telespectadores, ainda que a ciência seja uma
característica do mundo moderno, são cientificamente analfabetos.
A ciência está presente nas políticas governamentais, na segurança
dos transportes, na realização de transplantes, na produção de
remédios, de alimentos e etc. Apesar disso, veiculam-se informações
mais de caráter pseudocientífico, capazes de despertar admiração de
telespectadores do que aspectos verdadeiramente fantásticos da
ciência (Paviani, 1998:18).
A pluralista e complexa sociedade contemporânea não se agrada em ser uma
massa passiva e uniforme como diagnosticavam os pensadores da escola de Frankfurt.
A tevê, neste contexto, está tão segmentada e tematizada quanto a sociedade. A
linguagem que perdurou por meio século não atende às expectativas do telespectador.
A lealdade às emissoras e sua programação desmoronou em função do controle
remoto/―zapping‖, das possibilidades abertas pela digitalização, da existência de
variados canais e método de gerenciamento da programação (Appel, 1998).
A homogeneização de tempo e assunto não condiz com a atual sociedade,
marcada por controvérsias múltiplas, tendências díspares, níveis sociais, econômicos e
culturais distintos. Desde o final do século passado não só a maneira de utilizar o
aparelho de tevê mudou, mas, sobretudo, a forma de se relacionar com ela.
144
Nessa perspectiva a tevê universitária poderia promover um ambiente
permanente de ação-reflexão, propiciado pela pesquisa realizada nas universidades.
Se todas as televisões podem colocar mais ciência nas suas
programações, muito mais o deve fazer uma televisão universitária.
Não basta apresentar notícias sobre a universidade ou entrevistar
autoridades da administração acadêmica (como faz a maioria dos
jornais universitários). Divulgar a instituição apenas sob o enfoque
administrativo, chamando a atenção sobre os eventos não é
suficiente. É necessário que os méritos de um relatório de pesquisa,
de uma tese de doutorado, etc. possam ser notícia, informação
relevante para a vida social e econômica (Paviani, 1998:18).
A ligação entre essas duas instituições (tevê e universidade), que no passado se
estranharam, no futuro pode se configurar um promissor e bem sucedido casamento e
gerar, inclusive, frutos para a sociedade, na medida em que, juntos, poderiam romper
com a esquizofrenia do Ibope (Bourdieu, 1997) e ceder lugar para métodos mais
criativos e inteligentes, capazes de pensar e produzir uma televisão que atenda, de
maneira mais adequada, às demandas da sociedade.
3.2.4 Há espaço para a universidade fazer tevê
O primeiro mito que se deve questionar acerca da televisão universitária é o da
vinculação desta no organograma das IES. A televisão universitária pertence à IES e
não a um determinado setor, seja ele administrativo ou pedagógico. Segundo Priolli e
Peixoto (2004), são múltiplas as formas pelas quais os núcleos de tevê se integram às
estruturas acadêmicas.
Existe a recorrência de três modelos de subordinação dos núcleos de tevê ao
organograma da IES. O primeiro, quando a tevê é vinculada à Faculdade de
Comunicação, ou mais especificamente, aos cursos de televisão ou jornalismo. Nesses
casos, os autores destacam: ―o projeto de TV se implanta, desde o início,
‗departamentalizado‘, ou seja, dominado por um dos setores da instituição, em
desequilíbrio com os demais, ou mesmo em prejuízo deles.‖ Nesta configuração, a
tevê universitária é compreendida em sua dimensão laboratorial e exclusiva da área de
comunicação, cabendo às demais áreas a função de fonte e objeto de cobertura
145
jornalística. Neste cenário, segundo Priolli, ―quem tem a tevê não é a IES, mas "o
pessoal da comunicação".
O segundo deles, quando o vínculo estabelecido é com a Assessoria de
Comunicação (geralmente externa). Nesta situação, a tevê institui-se como um
instrumento de apoio ao marketing institucional. A ligação desses núcleos com as
várias áreas das IES é quase inexistente e, quando existe, é frágil. Existem, ainda,
aquelas tevês que terceirizam a produção e não mantêm vínculo algum com o espaço
acadêmico. Nestes casos, para Priolli, quem tem a tevê não é a IES e, sim, a reitoria ou
a mantenedora.
O terceiro modelo, que, segundo Priolli e Peixoto, é o mais adequado à tevê
universitária, é aquele no qual se constitui um núcleo autônomo, definido no
organograma da IES e subordinado à direção universitária, porém sem vínculo com os
órgãos estruturais (departamentos, faculdades, centros), e às instâncias intermediárias
de decisão: conselhos universitários, conselhos de ensino e pesquisa, conselhos de
administração e finanças, etc. Neste modelo, segundo Priolli, o objetivo das tevês não
é o de fazer marketing institucional, não é o de servir como órgão laboratorial de
determinado curso, mas, sim, produzir uma programação equilibrada e equidistante
que atenda às diversas áreas da IES e que fomente a participação de toda a
comunidade acadêmica. Nesse caso, quem tem a tevê é, efetivamente, a IES.
Identificado o espaço ocupado pela televisão universitária, outro mito, acerca
do setor, que precisa ser discutido é a conceituação da televisão universitária. O que é,
afinal, televisão universitária? Uma visão equivocada, por exemplo, vem da mídia
brasileira, que a relaciona à prática laboratorial. Desta forma, a tevê universitária seria
subalterna também à tevê educativa (partindo do pressuposto de que já o é da tevê
comercial), na medida em que sua pretensão não poderia ultrapassar as fronteiras do
processo formativo de estudantes de comunicação (Priolli e Peixoto, 2004).
Definir a televisão universitária não é apenas uma questão de exatidão
metodológica, valor que já seria muito importante à universidade. Trata-se de uma
necessidade fundamental para guiar a programação que ela deve perseguir e, em
consequência, a estrutura que deve assumir, a aspiração que deve ter, e as articulações
que deve buscar com os setores da comunicação, da educação e da cultura. Essa
146
preocupação é algo bastante incomum no segmento, pois pesquisas realizadas indicam
que muitas das instituições envolvidas produzem televisão, mas têm pouca clareza
sobre sua natureza e finalidade. Esta afirmação é ratificada pela pesquisa de Ramalho
(2010), que verificou, em sua etapa inicial, a existência de 151 tevês universitárias,
porém, em outra etapa, na qual as informações acerca dessas tevês exigiam maior
elaboração, apenas 35 IES se dispuseram a posicionar as tevês em seus projetos
institucionais, bem como explicitar claramente a natureza desse meio.
Por meio da tevê universitária, o saber científico apropria-se de um novo
espaço de diálogo com a sociedade, podendo utilizá-la tanto na difusão do saber
produzido quanto no caminho inverso, alimentando-se do conhecimento disponível na
comunidade, atuando como elo de ligação entre os saberes desenvolvidos nos diversos
segmentos da sociedade.
Conforme preconiza a Associação Brasileira de TVs Universitárias (ABTU), as
tevês devem ser
[...] um ambiente privilegiado para a reflexão crítica [...] reafirmando
seu compromisso com a produção de conteúdo voltado para a
educação, à promoção da cultura e do desenvolvimento regional,
constituindo-se também num espaço para a pesquisa e
experimentação de novas linguagens, formatos e narrativas, além de
contribuir criticamente para a formação de um novo profissional de
Comunicação20 (FÓRUM NACIONAL DE TV‘S PÚBLICAS I,
2006:61).
Para além do ―dever ser‖ da citação, observa-se, no desenvolvimento da tevê
universitária no Brasil, a ausência de um projeto mais abrangente, capaz de fazer esta
modalidade de tevê chegar à população em geral em condições de contribuir para que
as potencialidades do meio sejam, também, utilizadas para finalidades educativas.
Desta forma, os objetivos propostos pela ABTU permanecem como utopia a ser
perseguida, num ambiente marcado pela hegemonia da tevê feita para a audiência,
como afirma Bourdieu (1997).
147
Capítulo 4 - Canal Universitário de São Paulo:
antena coletiva para as tevês das universidades
Paulistanas
Neste capítulo apresentam-se, baseado em um estudo de caso, realizado por
meio de observação e aplicação de um questionário estruturado, o Canal Universitário
de São Paulo, seus agentes, seus habitus, suas dinâmicas, coerências e incoerências.
148
4.1 Uma apresentação necessária
Na redação dos capítulos anteriores, a pesquisa baseou-se em dados
secundários, o que contribuiu para apresentar os cenários nos quais a televisão e a
universidade estão inseridas. A partir daqui, além de dados secundários, apresentar-seão também informações baseadas nos mais de dez anos de convívio da presente
pesquisadora67 com o objeto – Canal Universitário de São Paulo (CNU-SP) - e na
pesquisa de campo realizada com diretores das tevês que integram o CNU-SP.
Com foco na neutralidade, a investigação científica, por influência do
pensamento cartesiano, por muito tempo, foi pautada pela necessidade do
distanciamento do pesquisador em relação ao objeto. Atualmente, em função da
complexidade dos sistemas sociais, esse tipo de abordagem, por si só, certamente, não
dá conta das dinâmicas presentes na realidade que se vive hoje. A sociedade, na atual
configuração, não carece do distanciamento do cientista; ao contrário, sua inserção no
objeto de estudo, muitas vezes, pode facilitar o entendimento do que está implícito.
A preocupação, durante todo o desenvolvimento desta pesquisa, foi buscar o
que havia de estranho no que era tão presente no dia a dia desta pesquisadora. Para Da
Matta, o dilema que se apresenta na relação pesquisador-objeto pode assim ser
compreendido:
[...] o problema é, então o de tirar a capa de membro de uma classe e
de um grupo social específico para poder – como etnólogo –
estranhar alguma regra social familiar e assim descobrir o exótico no
que está petrificado dentro de nós pela reificação e pelos
mecanismos de legitimação (Da Matta, 1978:28).
Partindo dos pressupostos do autor, ainda que ele seja específico ao falar da
etnologia, a presente pesquisadora procurou estranhar o universo da pesquisa, no qual
esteve inserida por mais de dez anos. Um dos exercícios mais presentes durante a
elaboração desta tese foi o de assumir a proximidade e, ao mesmo tempo, exercitar o
distanciamento. O trabalho científico compõe-se de uma atividade dialógica e
ideológica, na qual pesquisa e pesquisador se constituem mutuamente; isso, porque o
processo de produção do conhecimento é marcado pelo permanente diálogo. Para
67
De 1997 a 2008, a pesquisadora dirigiu a TV UNICSUL, uma das tevês integrantes do CNU-SP,
foi diretora de Marketing do CNU/SP. Realizou pesquisa e representou, por diversas vezes, o
segmento em congressos e em outros eventos.
149
chegar até este ponto da produção, intensos diálogos com múltiplas vozes
(documentos, autores, orientações, entrevistas, entre outras) foram travados. Ainda que
a construção do texto e a leitura destes diálogos tenham autoria, diversos agentes e
contextos contribuíram para a posição assumida. Acredita-se, assim como Japiassu
(1981), que a produção de conhecimento não é neutra uma vez que o agente intervém
e transforma os contextos. O trabalho que ora é apresentando foi pautado na ética e no
compromisso social. Durante todo o processo, a distância necessária, para que todos os
cruzamentos e análises ocorressem dentro do rigor que a ciência necessita, foi
mantida.
4.2 O aquecimento: CNU – SP a universidade fazendo tevê
Iniciando a análise proposta para este capítulo, buscam-se referências em
Arlindo Machado, que afirma que a televisão é o que se fizer dela.
Na minha opinião, a televisão é e será aquilo que nós fizermos dela.
Nem ela, nem qualquer outro meio, estão predestinados a ser
qualquer coisa fixa. Ao decidir o que vamos ver ou fazer na
televisão, ao eleger as experiências que vão merecer a nossa atenção
e o nosso esforço de interpretação; ao discutir, apoiar ou rejeitar
determinadas políticas de comunicação, estamos, na verdade,
contribuindo para a construção de um conceito e uma prática de
televisão. O que esse meio é ou deixa de ser não é, portanto, uma
questão indiferente às nossas atitudes com relação a ele. Nesse
sentido, muitos discursos sobre a televisão às vezes me parecem um
tanto estacionários ou conformistas, pois negligenciam o potencial
transformador que está implicado nas posturas que nós assumimos
com relação a ela; e ―nós‖, aqui, abrange todos os envolvidos no
processo: produtores, consumidores, críticos, formadores, etc.
(Machado, 2000:12).
Como já afirmado, os canais universitários brasileiros ganharam força a partir
da década de 1990, no bojo da segmentação da televisão brasileira, com a
possibilidade de oferecer alternativas à produção televisiva, contribuindo, assim, para
romper com a ―pré-destinação‖ à qual se refere Machado em relação ao meio. A ideia,
desde o início, foi a de produzir programas que rompessem com o status quo, o que
150
vai ao encontro das afirmações de Magalhães68 (2009), que vê as televisões
universitárias como um modelo na contramão do modelo hegemônico.
No momento de sua criação, a maior parte das tevês que sublocaram o espaço
do Canal Universitário de São Paulo tinha como missão produzir uma televisão que,
segundo Franco (2006), se apresentasse como uma janela através da qual as atividades
de ensino, pesquisa e extensão fossem visíveis à sociedade e possibilitassem ao
cidadão contribuinte conhecer as atividades que financia com pagamento de impostos
e delas participar com opiniões e perguntas. Essa missão, inclusive, está expressa no
documento de criação da TV USP e viria a ser o ideal perseguido por várias tevês que,
à época, faziam parte do CNU-SP.
Produzir na contramão do modelo hegemônico, como afirma Magalhães
(2009), foi o grande desafio das tevês fundadoras do CNU-SP. A decisão, na época,
foi propor um diálogo entre mídia aberta e acadêmica. A partir de um olhar mais
apurado sobre a realidade, buscou-se apresentar à sociedade temas do cotidiano que,
muitas vezes, eram pautados pela grande mídia, mas, no CNU-SP, apresentados com a
especialização e olhar da universidade. O fato de não ter compromisso com a
audiência e tampouco com patrocínio abria um leque que, segundo Franco (2006),
embriagava os produtores e diretores (no caso, a referência é feita à equipe de
profissionais fundadores da TV USP – mas isso pode ser generalizado às demais
equipes de tevê das outras universidades).
Passada a euforia de sua criação, a tevê universitária paulistana ainda padece
de incompreensão por parte da universidade, que ora a vê como máquina de fazer
doidos, ora como mídia eficientíssima. Segundo Priolli (2007), a universidade não
consegue apreender a amplitude do meio [a televisão] e, por isso, hesita diante dele,
quando ele se oferece a seu uso. O resultado dessa incompreensão fica evidente no
descaso com que muitas universidades tratam suas tevês. Em muitas universidades
paulistanas, após quase treze anos no ar, fica evidente que a tevê ainda não foi
68
Cláudio Márcio Magalhães, presidente da ABTU (Associação Brasileira de Televisão
Universitária), é jornalista, professor universitário, mestre em Comunicação Social e doutor em
Educação
pela
UFMG.
Disponível
em:
http://diplomatique.uol.com.br/artigo.php?id=493&PHPSESSID=7344ed5e82e51d5534f731688bd
39468 – acesso em: 20 fev2010.
151
assumida pela comunidade acadêmica e tampouco se configura como objeto de
interesse de todos os cursos, professores, estudantes ou servidores. As televisões das
universidades de São Paulo, como as dos demais municípios brasileiros, com
raríssimas exceções, constituem-se de núcleos de produção de alguns setores isolados
da academia. Poucas se apresentam como uma tevê que expressa o pensamento da
universidade como um todo.
Em 2007, ao completar dez anos no ar, o CNU-SP mereceu cobertura de várias
mídias do segmento universitário e televisivo. Segundo Murano (2007), em uma
dessas matérias, ―A iniciativa, que a princípio era vista com bons olhos em virtude de
seu pioneirismo, com o tempo acabou tornando-se alvo de críticas devido ao caráter
desarticulado de sua programação e por subestimar seu próprio potencial‖. As
principais críticas que se faz ao CNU-SP dizem respeito a três fatores: falta de unidade
da programação, visto que cada universidade dá a seus programas o tratamento que
julga mais adequado, o que acaba dificultando a criação de uma identidade para o
canal; o fato de se impedir que outras instituições de ensino superior façam parte do
canal; e a falta de voz deste meio dentro das próprias universidades.
4.3 Apresentação do time: habitus e dinâmicas do Canal Universitário de São
Paulo
O Canal Universitário de São Paulo surgiu em 1997 a partir da prerrogativa de
veicular a produção acadêmica e estreitar os laços entre as instituições de ensino e a
comunidade em geral, que, normalmente, se via afastada da extensa produção
científica efetivada nas diversas universidades do município de SP. Ao longo destes 13
(treze) anos, ainda que o papel do CNU/SP seja objeto de diversas controvérsias, sua
missão educativa dificilmente tem sido questionada. Considerado uma extensão da
pesquisa acadêmica, o CNU/SP foi concebido como lugar privilegiado da "tradução"
do conhecimento científico para o grande público.
152
Há mais de uma década no ar, apresenta-se como uma emissora de televisão de
caráter educativo e cultural, sem fins lucrativos, com foco na elevação intelectual do
público telespectador.
O Canal Universitário de São Paulo se define como uma emissora de
televisão educativa, cultural, informativa e comunitária. Sem fins
lucrativos, seu diferencial para outras emissoras da mesma natureza
é levar o conhecimento e o debate acadêmico para fora dos campi.
Um meio de comunicação em que universidade e sociedade possam
interagir (Thomaz, 2007:15).
A história do CNU-SP, que teve sua programação exibida a partir de novembro
de 1997, confunde-se com a da Lei que lhe possibilitou a existência (8.977). Após
diversos estudos e discussões acerca do tema, em 03 de abril de 1997 ocorreu o que se
pode chamar de primeira e efetiva reunião Deliberativa do CNU-SP, com a presença
de 10 (dez) representantes de universidades do município de São Paulo. Essa reunião
foi considerada como primeiro passo para efetivar o Canal Universitário de São Paulo,
o primeiro do país a se beneficiar do dispositivo da Lei do Cabo, que determina, em
seu artigo 23, inciso I, letra E, a disponibilização gratuita de um canal para ser
compartilhado entre as universidades do município da prestação de serviço da
operadora de tevê. A Lei (8.977) que instituiu o Serviço de TV por Cabo no país foi
aprovada em 06/01/1995, no entanto só foi regulamentada em 14/04/1997, ou seja,
poucos dias após a assinatura de cooperação entre as 10 (dez) universidades
interessadas em participar de um canal de tevê.
A iniciativa de criação de uma tevê universitária no município de São Paulo
partiu da possibilidade existente na lei e por iniciativa do então reitor da Universidade
Presbiteriana Mackenzie, Claudio Lembo, que, após analisar a redação da Lei, enviou
a 16 (dezesseis) instituições de ensino superior que se enquadravam nas prerrogativas
previstas pela Lei, quais sejam, ser universidade e estar sediada no município de São
Paulo, uma carta convite em que apresentava a proposta da criação do Canal
Universitário de São Paulo.
É importante abrir, aqui, um parêntese para tratar de uma questão já discutida
anteriormente. Os mentores do CNU-SP, à época, entenderam a redação da Lei stricto
sensu, ou seja, restringiram a entrada ao CNU-SP somente àquelas instituições de
ensino que tinham o título de universidade, deixando de fora (sequer foram
153
convidadas) grandes instituições de ensino que poderiam se interessar pela empreitada.
Ainda hoje, para ter acesso ao CNU-SP, uma das condições exigidas é o título de
Universidade, portanto instituições como Fundação Armando Álvares Penteado,
Fundação Cásper Líbero, Fundação Getúlio Vargas e muitas outras, ainda que tenham
desejo de participar da programação, são impedidas em função da interpretação da lei.
Essa questão não foi alterada mesmo após a abertura de diversos precedentes - há que
se registrar que, em outras cidades, canais universitários foram criados e liberados às
escolas de ensino superior e todas, universidades ou não, atuam em conjunto. O Canal
Universitário da cidade do Rio de Janeiro é um exemplo de interpretação que permite
a participação de diferentes modelos de IES.
No livro organizado pelas universidades integrantes do CNU/SP para
comemorar os dez anos do empreendimento, essa leitura da lei, mais uma vez, foi
ratificada:
O CNU segue à risca a Lei do Cabo, que determina que o canal é
reservado às universidades sediadas na capital paulista. No entanto
instituições de ensino superior são bem vindas e podem
eventualmente participar da programação por meio de parcerias,
convênios ou coprodução com alguma das universidades
mantenedoras do CNU. (Thomaz, 2007:23).
Depreende-se, dessa citação, que as instituições de ensino superior que não
tenham o status de universidade podem, ―eventualmente‖, participar do CNU-SP,
desde que conveniadas ou em coprodução com uma das universidades integrantes.
Fica evidente, portanto, que as IES do município de São Paulo mantiveram a
interpretação inicial, não aceitando instituições que não tivessem o status de
universidade como mantenedoras do CNU-SP.
Voltando à história do Canal Universitário de São Paulo, após o envio da carta,
onze instituições responderam, e, destas, 09 (nove) deram início à programação do
canal em novembro de 1997: PUC – Pontifícia Universidade Católica (a única entre o
grupo a ter experiência na produção e exibição de produtos televisivos)69; USP –
Universidade de São Paulo; Universidade Mackenzie; Uniban – Universidade
Bandeirantes; UNICSUL – Universidade Cruzeiro do Sul; UNIFESP – Universidade
69
A TV PUC teve sua programação iniciada dois anos antes, em 1995, com a série Diálogos
Impertinentes, textos produzidos por alunos e professores, transmitida via satélite pela NET. A
série contou com patrocínio do SESC e era produzida em copatrocínio com a Folha de São Paulo.
154
Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina; UNIP – Universidade Paulista;
UNISA – Universidade de Santo Amaro; e USJ – Universidade São Judas. Já não
fazem mais parte desse grupo a UNIFESP e a UNICSUL que, por questões
administrativo-financeiras, solicitaram, por tempo indeterminado, afastamento do
canal. No entanto, juntou-se ao grupo, em 2006, a Universidade São Marcos. Desta
forma, atualmente (2011), o CNU-SP organiza seu conteúdo a partir da programação
de 08 (oito) universidades.
A organização do Canal ocorre a partir das definições estabelecidas por um
Conselho Gestor, órgão máximo de deliberação, formado por 18 (dezoito) membros,
sendo 09 (nove) titulares e 09 (nove) suplentes, que se responsabiliza pelas grandes
decisões: ingresso de universidades, grade de programação, orçamento, aplicação do
código de ética, etc. A reitoria de cada universidade indica as pessoas que devem
ocupar os cargos de titular e suplente. Anualmente são escolhidos o presidente e o
vice-presidente. Além deste órgão, há também uma Diretoria Executiva que, por sua
vez, é o braço operacional do Conselho Gestor. Formada por 09 (nove) membros, um
de cada universidade, tem como missão organizar o expediente do canal, ou seja,
responsabilizar-se pela organização e operação efetiva do canal; é o órgão responsável
por manter o canal no ar. Anualmente os membros do Conselho elegem um
Coordenador para a Diretoria Executiva. Existem universidades que indicam apenas
um único nome para compor ambos os órgãos. Esta estrutura pretende orientar as
ações relativas a questões coletivas que afetam o canal como um todo. Já a direção das
tevês universitárias de cada universidade é estruturada e composta livremente pelas
instituições associadas ao CNU-SP, não havendo qualquer regra definida pelo Canal
acerca deste assunto. Em alguns casos, há acúmulo de função de diretor da tevê com a
de membro da Diretoria Executiva e até mesmo do Conselho Gestor.
Por três anos as operações do CNU-SP foram centralizadas na Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo. A partir de 1999 passou a funcionar em sede
própria, situada no bairro do Butantã, em São Paulo. Atualmente veicula 24 horas de
programação diária, que pode ser sintonizada por todos os assinantes de tevê por cabo
do município de São Paulo, por meio das operadoras NET, canal 11, e TVA, canal 71.
155
Compete ao Canal, exclusivamente, a disseminação dos programas produzidos
pelas oito tevês que, atualmente, o integram. Em função disso, um conceito bastante
utilizado para denominá-lo é o de ―antena coletiva‖, isto é, um meio técnico de difusão
de sons e imagens que distribui, no caso, a programação de oito tevês diferentes. Daí,
inclusive, o conceito de Canal Universitário e não Televisão Universitária. Há que se
registrar que, durante o período (13 anos), poucas produções foram assinadas,
efetivamente, pelo CNU-SP.
Nesse sentido, alguns poucos exemplos podem ser citados. Atualmente, a cada
meia hora, o Canal introduz, entre os programas produzidos pelas universidades,
programação própria. São ―programetes‖ de, no máximo, dois minutos que abordam
diversos temas. Além desses ―programetes‖, destaca-se, como programação efetiva do
CNU-SP, o programa Conexão Universitária, uma espécie de revista eletrônica
veiculada todos os sábados, com reprise aos domingos.
A cooperação entre as universidades que compõem o CNU-SP, no sentido de
buscar uma programação única e uniforme, é bastante insignificante. Ainda assim,
algumas iniciativas merecem destaque, na medida em que universidades com focos e
objetivos diferentes tentaram buscar integração por meio de atividades comuns, que, à
época, contribuíram para o fortalecimento do consórcio. Uma dessas iniciativas foi a
―Faixa Quatro‖, um horário, na grade de programação, reservado para quatro
instituições70 que, em lugar de produzirem isoladamente toda a sua programação,
buscaram o desenvolvimento de produtos conjuntos. Outro exemplo foi o programa 4
X 4, que, no período de 2000 a 2005, foi produzido pelas tevês PUC, Unicsul, Unifesp
e USP. Pode ainda ser lembrado o especial do aniversário de cinco anos do Canal,
quando as nove universidades se reuniram e produziram o Conexão Universitária, com
sete episódios especiais (posteriormente passou a ser produzido pela equipe de
produção do Canal e continua a ser veiculado).
Ainda sobre parcerias para produção de programas, dois eventos merecem
destaque: o projeto Pauliceia em Debate e Desafio Brasil, ambos promovidos em
parceria entre as tevês participantes do CNU-SP e a Rede Globo de Televisão. O
70
Universidade Cruzeiro do Sul, Universidade de São Paulo, Pontifícia Universidade Católica e
Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina
156
primeiro deles, denominado SP 450 anos – Pauliceia em Debate -, ocorreu em função
do aniversário da Cidade de São Paulo, no período de setembro de 2003 a maio de
2004; o projeto previa a produção de uma série de nove – um em cada universidade –
debates acerca de aspectos históricos, culturais e sociais da cidade de São Paulo.
Os assuntos tratados nos debates do Projeto Paulicéia em Debate foram:
UNIVERSIDADE
ASSUNTO
MEDIADOR CNU
MEDIADOR
GLOBO
PUC
HISTÓRIA
GABRIEL PRIOLLI
PAGLIA
25/09/03
UNIBAN
ERNESTO
ECONOMIA
JOSÉ NELLO
TONICO
FERREIRA
23/10/03
UNICSUL
ETNIAS
20/11/03
CULTURAS
UNIFESP
SAÚDE
E
JOSÉ M. FILHO
WILLIAN
WAACK
VANDA MARTINS
GRAZIELA
AZEVEDO
17/12/03
USP
EDUCAÇÃO/CIEN
MARCELLO
SÔNIA BRIDI
22/01/04
C/TEC
ROLLEMBERG
MACKENZIE
ARQUITETURA E
ALESSANDRA
ALBERTO
16/02/04
URBANISMO
PEREIRA
GASPAR
UNIP
MEIO AMBIENTE
SÉRGIO AZEVEDO
CÉSAR TRALLI
SÃO JUDAS
ARTE
CLAUDIO
SANDRA
27/05/04
CULTURA
GONÇALVES
ANNENBERG
18/03/04
E
Quadro 16 - Assuntos tratados nos debates do Projeto Pauliceia em Debate
157
O Projeto ―Desafio Brasil‖, produzido entre agosto de 2005 e junho de 2006,
também a partir de uma parceria entre Rede Globo e Canal Universitário de São Paulo,
levou à produção de uma série de debates, veiculados ao vivo pelo CNU-SP, acerca de
diversos problemas enfrentados pelos brasileiros.
Os assuntos tratados nos debates do Projeto Desafio Brasil foram:
UNIVERSIDADE
ASSUNTO
MEDIADOR CNU
MEDIADOR
GLOBO
PUC
EDUCAÇÃO
24/08/05
FERNANDO
LUIS
CARLOS
ALTERMEYER
AZENHA
JR
UNIBAN
VIOLÊNCIA
JOSÉ
11/05/06
UNICSUL
CULTURA
NELLO
MARQUES
SALARO
JOSÉ M. FILHO
ZECA
20/11/03
UNIFESP
CAMARGO
SAÚDE
06/06/06
USP
ENERGIA
MARCELO
RODRIGO
MEDEIROS
BOCARDI
EDMILSON
18/04/06
MACKENZIE
VALMIR
URBANIZAÇÃO
16/03/06
M.
RODRIGO
DOS SANTOS
VIANNA
CARLOS
NEIDE DUARTE
GUILHERME
MOTA
UNIP
MEIO AMBIENTE
24/11/05
PAULO
HENRIQUE
SANDRA
A.
ANEMBERG
PEIXOTO
SÃO JUDAS
EMPREGO
20/10/05
RENDA
E
JOIMAR
CARLOS
MENEZES
TRAMONTINA
Quadro 17 - Desafio Brasil (agosto de 2005 a junho de 2006)
158
Ambos os projetos merecem destaque, na medida em que representaram
iniciativas inéditas efetivadas somente em São Paulo. Além disso, possibilitou aos
integrantes das tevês um aprendizado único, visto que até 2003 somente a TV PUC
havia tido a experiência de transmissão ao vivo. Em 2004, motivado pela polêmica
gerada em função da reforma universitária, foi ao ar pela primeira vez o UNIVERSUS,
uma série de debates, ao vivo, gerados diretamente pelo CNU-SP, caracterizando uma
outra experiência de produção conjunta.
A programação do Canal Universitário de São Paulo, ou seja, aquela produzida
pelas televisões universitárias, é composta, basicamente, por programas de debate,
entrevistas e documentários. A origem das pautas ocorre geralmente dentro da própria
universidade. Os temas, ainda que bem diversos, giram em torno da educação e da
cultura, destaque para medicina, quando a Unifesp ainda fazia parte do grupo.
Na tela do CNU, o conhecimento de professores, pesquisadores,
educadores e estudantes chega a um público mais amplo. Teses
acadêmicas de mestrado, doutorado ou pós-doutorado, pesquisa em
andamento, projeto de ação social ou comunitária, perfis de
professor e personalidades culturais de destaque, entre outras
atividades culturais que acontecem nas universidades, são os
conteúdos veiculados com regularidade pelo CanalB (Thomaz,
2007:15).
Cada universidade participante do Canal tem entre cinco e seis exibições
diárias de 28 minutos, de acordo com a grade de programação atual. Os horários são
sorteados anualmente e são seguidos à risca por todas as instituições. Cada uma delas
tem exatamente o mesmo tempo na grade de programação e pode organizá-lo como
julgar mais conveniente. Cada televisão produz, em média, duas horas e meia de
programação inédita, que são distribuídas na grade durante a semana. Portanto, a
reprise é bastante grande. Se considerássemos o mínimo de exibição diária,
corresponderia a 35 inserções semanais, portanto há, no mínimo, 30 horas de reprise
para cada universidade produtora.
Ainda que o número de reprise seja considerado bastante grande, a qualidade
da programação veiculada pelo CNU-SP é bastante reconhecida pela comunidade
audiovisual. Corrobora esta afirmação o fato de, ao longo destes 13 (treze) anos, as
tevês participantes do consórcio terem recebido diversos prêmios.
159
A programação continua aprimorando sua qualidade, e não raro
obtém prêmios importantes em festivais de cinema e vídeo. Nas
últimas quatro edições do festival de Gramado, no Rio Grande do
Sul – o mais conceituado prêmio nacional -, o Canal Universitário de
São Paulo recebeu prêmios pelas produções de suas TVs, assim
como aconteceu em festivais como o Cinecien 2006 – Festival de
Cinema e Vídeo Científico do Mercosul – e os prêmios ABS de
Jornalismo e Alexandre Adler de Jornalismo Científico, conquistado
em 2005 (Thomaz, 2007:23).
Por sua responsabilidade de prestar serviços públicos de educação, de
valorização da cultura e da informação, as emissoras educativas, culturais e
universitárias podem ser financiadas por verbas públicas federais, estaduais e
municipais, por contribuição espontânea e direta dos telespectadores, pela venda de
produtos e subprodutos. Contudo o CNU-SP71 é, fundamentalmente, mantido pelas
universidades que o compõem, por meio de uma contribuição mensal de R$ 5.000,00
(cinco mil reais). Estima-se que cada universidade invista cerca de R$ 500.000,00
(quinhentos mil reais) por ano para manter a sua programação no ar (Thomaz 2007).
Ainda que não seja um valor alto para uma emissora de tevê, trata-se de um valor
considerado grande pela maioria das universidades.
Assim como nos canais educativos, a propaganda comercial também é proibida
nos Canais Universitários. No entanto é importante lembrar que, no caso do CNU-SP,
por ter sua programação exibida via cabo, a legislação que o regula é diferente. Segue
o previsto na norma 13/97, criada para organizar questões relativas ao patrocínio de
programas das tevês dos chamados Canais Básicos de Utilização Gratuita, uma vez
que a lei (8.977) é omissa no que se refere a essa questão72. A referida norma proíbe a
propaganda comercial, no entanto permite o patrocínio de programas, sem, contudo,
especificar o que significa ―patrocínio‖.
71
O CNU-SP já contou com investimentos em apoio cultural de diversas instituições, com
destaque para o Banco Real, Zip Net e KA Solution.
72
O arcabouço legal que trata dos canais universitários é formado por uma Lei Federal, um
Decreto Regulatório e uma Norma Operacional, editada pela ANATEL. A Lei 8.977/95 é bastante
genérica e só se refere ao canal universitário para promover sua criação no Artigo 23; o Decreto
2206/97 regulamenta a entrega do sinal do canal; e a Norma Operacional 13/97 trata das questões
relativas a patrocínios.
160
A captação de recursos nas tevês universitárias de São Paulo e em todo o país
ainda se configura como uma prática incomum, em função, principalmente, da falta de
prática por parte das universidades e da visão equivocada que muitas IES têm do que
seja a venda de espaço publicitário. Muitas das universidades, principalmente as
públicas, têm dificuldade nesse item do processo.
―[...] vender publicidade na
televisão universitária não significa, necessariamente, ‗mercantilização da educação‘
ou abastardamento da sua missão formadora da cidadania‖, como acentua o
diagnóstico setorial apresentado pela ABTU durante o I Fórum Nacional de TV‘s
Públicas (2006:56).
Segundo dados do diagnóstico setorial já citado (Ibidem:70) ―as IES nem
sabem o que cobrar como patrocínio, e que formato de produto dar em troca, pelo
valor recebido. A iniciativa privada apenas ‗ajuda‘ a televisão universitária, em vez de
investir nela, como poderia – e deveria‖. Ainda que essa falta de orientação e de
organização se evidencie na citação apresentada, é importante ressaltar que, num outro
trecho do documento produzido pela ABTU, consta que o setor movimenta perto de 20
milhões anuais, o que não é desprezível para um segmento no qual fazer tevê não é a
atividade fim.
4.3.1 Apresentação do time: as tevês universitárias do CNU-SP
Para entender o cenário que foi apresentado no item anterior, é necessário
compreender e conhecer as tevês que participam do Canal Universitário de São Paulo.
Na sequência serão apresentadas as tevês que, atualmente, fazem parte do CNU-SP,
com o objetivo de tentar encontrar pontos de convergência e, evidentemente, de
divergências que permeiam esse cenário carregado de tensões e disputas.
161
TV USP
A televisão da Universidade de São Paulo, a única estadual do canal,
apresenta-se como uma ponte entre a universidade de São Paulo e a
sociedade. Está vinculada à Coordenadoria de Comunicação Social,
setor que congrega todos os veículos de comunicação da
Universidade. Segundo seu site, tem como objetivo abrir as portas da USP à
sociedade, por meio da divulgação dos diversos serviços que a instituição oferece à
população. Além disso, busca levar ao público o conhecimento gerado na universidade
e circunscrito aos limites da instituição. A TV USP define-se como uma televisão que
busca aprofundar a reflexão sobre assuntos do cotidiano, promovendo a mediação
entre universidade e sociedade (Thomaz 2007). A participação de alunos e professores
na tevê USP ocorre de acordo com a necessidade das pautas previstas. Não há conexão
efetiva entre os cursos e a tevê, ou seja, a tevê não tem ligação com este ou aquele
curso; configura-se como um veículo da universidade como um todo. A partir de 2010
a tevê da Universidade trabalha em rede, o que permite compartilhar produções entre
os campi da instituição. Atualmente, conta com 12 funcionários (CLT) e 14 estagiários
(alunos da ECA).
Produção:
Contraponto – Neste programa, diversos assuntos acerca dos principais
problemas brasileiros são abordados a partir do ponto de vista de
pesquisadores e pensadores. O Programa é produzido pela PUC-RJ e exibido, em São
Paulo, pela TV USP.
PGM - Revista eletrônica, que tem por objetivo democratizar o
conhecimento acadêmico e cultural da Universidade de São Paulo e
aprofundar temas ignorados ou superficialmente abordados pela mídia comercial.
Cada edição traz cultura, ciência, opinião e um espaço para a experimentação de
linguagens e formatos audiovisuais.
Trajetória - Programa sobre a memória viva dos professores e
pesquisadores da Universidade de São Paulo. A proposta consiste em
apresentar um convidado especial para falar sobre sua vida acadêmica, sua relação
com a universidade, comentar pesquisas e refletir sobre temas da atualidade.
162
Traquitana – O programa visa refletir acerca do mercado audiovisual
brasileiro.
HCTV - Programa da TV USP especializado em saúde. Produzido pela
HCTV, traz notícias, entrevistas e curiosidades sobre o universo da saúde
com base no conhecimento dos profissionais do maior complexo hospitalar da
América Latina, o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
Quarto Mundo - Programa produzido por um grupo de jovens estudantes
do ensino médio que recebem oficinas de formação da TV USP, em
parceria com a revista Viração.
Especiais – A TV USP disponibiliza um espaço de sua programação para exibição de
Documentários, coproduções e Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC) de alunos da
USP. Os Especiais promovem debates sobre assuntos de interesse da sociedade e
expõem temas da atualidade de forma criativa e a partir do ponto de vista da
universidade.
TV São Judas
A TV São Judas é um projeto ligado à Pró-reitoria de Extensão da
Universidade São Judas Tadeu (USJT). Desde o início no CNU-SP,
tem como característica marcante a participação de alunos e
professores em sua produção. A tevê desta universidade, uma das
mais antigas instituições privadas da cidade de São Paulo, exibe os programas
produzidos em laboratórios durante as aulas dos cursos de Comunicação Social. Por
meio deste projeto, a USJT acredita atingir todos os seus públicos de interesse, já que,
com sua programação, pode mostrar ao público do Canal Universitário e ao
telespectador "casual", a produção de professores e pesquisadores da universidade e a
experimentação dos alunos (http://www.usjt.br/midia/tv/ - acesso em 10/01/2011). Além
disso, disponibiliza ao aluno dos cursos de Comunicação Social da universidade um
espaço para mostrar os trabalhos desenvolvidos durante o curso.
A dinâmica da programação é a seguinte: os alunos de quarto ano de
jornalismo, com orientação e supervisão dos professores de telejornalismo, produzem
163
programas com 28 minutos de duração. Cabe aos alunos de radialismo a produção de
vídeos, documentários, ficções, musicais, "drops" e outros formatos. Além desses
programas, outros são produzidos por um grupo de professores e estagiários que
compõem a equipe efetiva da TV São Judas no Canal Universitário de São Paulo
Produção:
Antenados - Programa de debate, no qual alunos, professores e convidados
debatem diversos temas.
Arteletra – O objetivo do programa é apresentar e discutir temas acerca de
literatura, música e arte.
Coletiva - Vários entrevistadores, alunos de jornalismo da USJT,
questionam um convidado. A produção tem como foco mostrar ao
telespectador os diversos ângulos de um mesmo assunto ou fato.
Direito e Políticas Públicas – Série de programas que visam debater o
papel do Direito na implementação das Políticas Públicas.
Educação Continuada para Professores Lego – O programa é resultado de
uma parceria entre a TV São Judas e a Divisão Educacional da Lego
Education, e prevê a produção de programas para subsidiar a capacitação de
professores do Projeto Lego de Educação e Tecnologia. Este projeto tem como
produtores a equipe da TV São Judas.
Espaço Comunicação – Neste programa, os alunos de Radialismo,
Jornalismo, Desenho Industrial e Educação Artística da Universidade São
Judas Tadeu apresentam seus trabalhos e explicam as motivações e interesses que os
levaram a escolher os temas dos programas.
Imprensa em Debate – O programa abre espaço para a discussão e análise da
atuação da mídia nos acontecimentos de repercussão na sociedade.
Produzido e apresentado por alunos de jornalismo.
Pauta Aberta - Programa de entrevistas cuja pauta deve atender a critérios
de interesse e atualidade.
164
Pesquisa & Ação - O programa trata das inovações tecnológicas, de
pesquisas e estudos acadêmicos e das ações que a universidade desenvolve
junto às comunidades.
TV Uniban
A tevê da Universidade Bandeirante subordina-se, juntamente com
os demais veículos de comunicação da UNIBAN, à Academia
Paulista Anchieta, mantenedora da Universidade Bandeirante de São
Paulo. Declara-se como um espaço no qual docentes e alunos podem
trocar e divulgar informações de relevância para a sociedade e para a universidade.
Sediada no campus de São Bernardo do Campo, a programação desta tevê é veiculada
também nos canais universitários de Osasco e do Grande ABC. A ligação com os
cursos da instituição acontece na medida em que professores e alunos participam,
como convidados, de suas pautas. Não há participação efetiva de alunos e professores
na produção de seus conteúdos.
Produção:
Curtas do Brasil - Painel da produção audiovisual brasileira de diversos
gêneros.
UNIBAN Discute - A cada programa, um professor da UNIBAN aborda
assuntos relevantes e contundentes do cotidiano da sociedade.
P2 - Programa de entrevista que aborda o comportamento, traz os mais
variados assuntos ligados ao esporte, artes e meio ambiente.
Palestra UNIBAN – Neste espaço, as palestras realizadas na Universidade
são divulgadas e apresentadas para toda a sociedade.
Musicban - Espaço que apresenta a trajetória artística de cantores e
bandas.
165
Referências - A cada programa, uma personalidade é convidada a falar de
sua trajetória de vida pessoal e profissional.
Revista UNIBAN - Revista eletrônica de variedades que mostra notícias e
informações de interesse da comunidade acadêmica.
Salada Mista – O programa apresenta matérias com temáticas como
cultura, saúde, lazer e entretenimento.
TV PUC
Criada em 1991, a tevê da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo veiculava sua programação por meio de um circuito interno,
somente para o campus Monte Alegre. Em 1994, o projeto foi
revitalizado, visando à promoção da educação a distância. Nesta nova
configuração, a exibição da programação ficou a cargo da NET, que instalou 30
pontos de recepção. A aceitação do projeto foi tão positiva que a NET, a partir de
1995, passou a veicular programas produzidos pela TV PUC também a seus
assinantes, portanto a TV PUC foi a primeira produtora universitária do país a
produzir programas e veiculá-los na tevê por cabo. Desde a sua fundação, está
vinculada diretamente à reitoria; configura-se como um espaço autônomo e funciona
como uma produtora dentro da universidade. A participação dos alunos e professores
dos cursos de Comunicação Social é restrita. A TV PUC apenas abre espaço para a
exibição de trabalhos considerados de destaque. Os alunos podem fazer estágio e
acompanhar todas as etapas de produção de um programa, no entanto não há nenhum
vínculo entre a TV PUC e os cursos de Comunicação. Mais que uma vitrine do
pensamento universitário, a tevê da Pontifícia Universidade Católica pretende ser uma
ferramenta de trabalho para professores e estudantes, orientando-os no uso da
linguagem audiovisual para a comunicação com o grande público. Das oito
universidades do Canal é a única a declarar que o seu público alvo não é a comunidade
acadêmica: ―O público da TV PUC está fora da universidade, mas tem interesse em
viver esse ambiente. Para a direção da TV PUC a reflexão e o debate dos campi são
divulgados, mobilizando a universidade para a TV. Mas o ponto de chegada está do
lado de fora‖ (Thomaz, 2007:50).
166
Produção:
Nova Stella Ciência em Debate - Uma iniciativa do programa de História de
Ciência do Centro de Ciências Exatas e Tecnologia da PUC-SP. O Programa
coloca a ciência em foco sob múltiplas perspectivas.
Diálogos Impertinentes: No ar desde 1995, trata-se de um ciclo de debates
mensais, reunindo, a cada edição, dois expoentes da cultura brasileira. Parceria
entre PUC-SP, Jornal Folha de S. Paulo e SESC-SP. Tem como apresentadores
o professor Mário Sérgio Cortella, ex-Secretário de Educação do município de
São Paulo, e os jornalistas Caio Túlio Costa e Nélson Ascher.
Diálogos Impertinentes (Nova Série) - Produzido também em parceria entre a
TV PUC, Jornal Folha de S. Paulo e SESC-SP. Nesta versão, o programa é
exibido, com exclusividade, pelo SESCTV. O programa aborda questões
filosóficas ligadas à cultura e ao comportamento. É apresentado por Suely
Rolnik e Fernando Altemeyer, professores da PUC-SP, com participação dos
jornalistas Caio Túlio Costa e Nélson Ascher.
Diversidade - Resultado de uma parceria entre o CRP SP (Conselho Regional
de Psicologia) e a TV PUC-SP, o programa reúne três convidados para um bate
papo sobre um tema relacionado à Psicologia.
Novolhar – A cada edição o programa discute temas da realidade brasileira a
partir do ponto de vista de jovens em situação de vulnerabilidade social. Todas
as etapas de produção são desenvolvidas pelos próprios jovens, desde a pauta
até a edição. Com a supervisão de profissionais de educação e vídeo, o
programa é realizado em parceria com a Secretaria Municipal de Assistência
Social, Computer Associates, Fluxo Design, Apocalípticos Cinema e Vídeo,
Grupo Santander Banespa e TV PUC. No ar desde Abril de 1999.
167
Intercâmbio – Espaço reservado para a divulgação de vídeos, reportagens e
trabalhos audiovisuais realizados em universidades e/ou instituições culturais
brasileiras, com as quais a TV PUC mantém acordos de permuta de
programação.
Fatos e Focas – Espaço/Título destinado à veiculação de trabalhos
laboratoriais dos estudantes do curso de Jornalismo da PUC-SP, assim como de
vídeos produzidos por alunos de outros cursos da universidade ou de outras
instituições.
PUC Ao Vivo - Professores da PUC-SP participam, ao vivo, comentando os
fatos do dia, da semana ou de assuntos controversos.
TV Mackenzie
A programação da TV Mackenzie é coordenada pela Reitoria da
Universidade
e
subordina-se
à
Mantenedora
(Instituto
Presbiteriano Mackenzie), da qual o Centro de Rádio e Televisão
é um departamento. Com o oferecimento do curso de jornalismo,
a partir do ano 2000, a participação de alunos e professores foi
intensificada. Atualmente, há cerca de uma dezena de alunos de
Jornalismo, Radio e TV e Engenharia que participam da produção dos programas.
Além disso, os professores e funcionários são estimulados a participarem das pautas.
A TV Mackenzie apresenta-se como um veículo em sintonia com a missão da
instituição que prevê o estímulo ao diálogo crítico com a atualidade política, social,
econômica e cultural.
168
Produção:
A gente Explica – Pequenas matérias inseridas no meio da programação que
visam esclarecer diversos assuntos do cotidiano das cidades modernas.
Vozes e Sons – Neste programa, obras musicais sacras são apresentadas e
comentadas pelo maestro do Mackenzie Parcival Módolo.
Fora de série – Espaço para a veiculação dos melhores trabalhos dos alunos
do Mackenzie.
Cidadania para Todos – Uma parceria entre TV Mackenzie e Secretaria de
Justiça de São Paulo, o programa discute os direitos do cidadão.
Café Pensamento – Programa em que, a partir de debates, temas acerca da
filosofia e cultura são abordados.
Conceitos em Foco – Nesta produção, assuntos que envolvem o cotidiano
da sociedade são discutidos por diversos especialistas.
Contraponto – Programa de entrevista apresentado pelo Chanceler da
universidade, que analisa diversos temas sob o olhar da fé cristã.
Macknotícias: Revista eletrônica com assuntos ligados à instituição.
Além desses programas, em 2009, a TV Mackenzie firmou uma parceria com o
Canal Futura que prevê a cobertura jornalística na cidade de São Paulo e a produção
de quadros específicos voltados para a área de Educação e Saúde. A produção é
veiculada diariamente no Jornal da Futura, em rede nacional e, posteriormente, é
inserido no programa Macknotícias.
169
TV Unisa
A TV Unisa está ligada à Pró-Reitoria de Extensão Comunitária, mas
as pautas são decididas em conjunto, entre a Reitoria e as PróReitorias. Atualmente, é a única TV do CNU-SP a estar ligada ao
projeto de educação a distância. Segundo seu coordenador – Claudio
Lemos, em entrevista dada à pesquisadora especialmente para este trabalho – o know
how adquirido com a produção para o Canal Universitário de São Paulo permitiu que a
tevê colaborasse para a implantação da educação a distância na Universidade.
Inclusive afirma que essa atividade financia a manutenção da TV Unisa no CNU.
Atualmente a TV Unisa é a responsável pela produção das matérias jornalísticas que
são veiculadas nas aulas ministradas ao vivo pelos professores da Unisa Digital. A
participação dos alunos e professores ocorre na medida da necessidade das pautas.
Não há participação na concepção dos programas ou qualquer vínculo com a
graduação.
Produção:
Informe-se – Neste programa os alunos e estagiários da Unisa têm a
oportunidade de colocar em prática as teorias aprendidas em sala de aula, a
partir de discussões de temas do cotidiano.
Marketing Esportivo – Programa de entrevista no qual se discutem questões
relativas à área da publicidade e propaganda.
Conexão Saúde – Programa de entrevista com foco na área da saúde.
Informe-se/Pos Factum – Programa produzido pelos alunos da Unisa, no
qual alunos e professores discutem assuntos do cotidiano da população.
170
TV UNIP
A estrutura e a equipe utilizada pela tevê da Universidade Paulista, a
maior universidade particular do Canal, são as mesmas do Canal CBI
– Canal Brasileiro de Informação (UHF), pertencente ao mesmo
grupo que mantém a Universidade. Está ligada à Vice-Reitoria de
Extensão Comunitária da Universidade e exibe sua programação em outras praças
além de São Paulo. Atualmente participa do Canal Universitário de Campinas (CNC),
do Canal Universitário de Bauru (CNUB) e do Canal Universitário de Ribeirão Preto.
A participação dos alunos e professores na produção dos programas é inexistente. Não
há qualquer vínculo com o ensino. A TV UNIP é totalmente independente da
graduação ou da pós-graduação.
Produção:
Estação Saúde - Programa de entrevistas, com profissionais da área de
saúde, apresentado pelo médico Drauzio Varella, que discute temas
relacionados à saúde.
Opinião Livre - Programa de entrevistas e debates sobre assuntos variados,
que abrangem cultura, qualidade de vida e outros setores da sociedade.
Jornal das Profissões - Programa de entrevistas e reportagens sobre
diversas áreas profissionais.
TV São Marcos
A TV São Marcos, vinculada à Universidade São Marcos,
incorporou-se ao Canal Universitário de São Paulo em dezembro de
2006. Com sede no bairro do Tatuapé, em São Paulo, a TV São
Marcos declara-se com a missão de oferecer audiovisual educativo
de qualidade e de capacitar seus professores e alunos para o uso das ferramentas da
comunicação eletrônica.
171
Produção:
Contato Direto – O programa dá visibilidade aos eventos ocorridos dentro
dos campi da universidade.
Ciências do Corpo – Programa de entrevistas sobre temas sobre a
medicina, saúde e qualidade de vida.
Debate Aberto – Programa de Debates e/ou entrevistas sobre diversos
temas gerais da cultura e do conhecimento.
Mundo Marinho – No formato de Revista eletrônica o programa busca
alertar e informar sobre a sensibilidade dos vários ecossistemas marinhos
e terrestres.
Autores & Obras – Programa no formato entrevista que traz um bate-papo
sobre grandes autores da literatura brasileira.
Psicologia sem Fronteiras - Programa de entrevista, que fala sobre saúde e
desenvolvimento psicossocial.
Reporter São Marcos – Programa de reportagens de interesse geral e
entrevistas especiais.
Além dessas tevês, participaram por mais de uma década do CNU-SP as tevês
de duas universidades: Universidade Federal Paulista, com produção voltada a
questões do universo da medicina e da saúde – Chek-up – e Unicsul, que exibia no
CNU-SP programação com foco na produção de alunos e jornalismo crítico e cultural
– Refletor, Extensão.doc.
Visando facilitar a análise do que foi descrito anteriormente, apresenta-se, na
sequência, um quadro com as principais conclusões acerca do cenário que compreende
o espaço de produção das televisões universitárias participantes do CNU-SP.
172
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Quadro 18 - Cenário que compreende o espaço de produção das televisões universitárias
participantes do CNU-SP.
173
4.3.2 Apresentação do time: diversidade de objetivos; convergência na produção
Desde o surgimento e concretização dos primeiros canais universitários e,
consequentemente, de suas tevês universitárias, diversos foram os modelos editoriais e
estruturais adotados, como reflexo da origem - pública e privada - das instituições, que
opõem um modelo teoricamente possuidor de maior autonomia na estruturação de um
perfil editorial independente a outro identificado com marketing e autopromoção de
instituições que objetivam retorno, se não financeiro, ao menos institucional.
Evidentemente que essa oposição pode ser definida entre prioridade pelo
interesse público, ligado à formação cidadã, e interesse privado, ligado ao interesse
comercial. Não se trata, no entanto, de um entendimento único e absoluto, no qual não
se considera que uma instituição, ainda que privada, não tenha interesse público ou, na
outra ponta, que uma instituição pública não tenha interesse comercial de se
autopromover. Sobre isso, Fernandes (2003) afirma que os programas de caráter
jornalístico das televisões universitárias destacam fatos ligados à realidade das
comunidades nas quais se inserem, o que confere às tevês um caráter local, em certas
circunstâncias, o que não pode ser generalizado, já que das universidades que atuam
em canais universitários vêm demandas pela disseminação de questões de interesse
público, muitas vezes, mais abrangentes que aquelas relacionadas ao local no qual a
IES está implantada. Na cidade de São Paulo, palco do CNU-SP, há tantas questões de
interesse geral a serem discutidas pela comunidade acadêmica e disseminadas pelas
tevês das universidades, que os temas de interesse local ficam, muitas vezes, em
segundo plano. Talvez se possa, aqui, utilizar o conceito de glocal, que muito tem sido
discutido, no sentido de posicionar a comunicação entre os temas de interesse local ou
regional e os de amplitude nacional ou internacional. Por outro lado, a mesma
pesquisadora revela a tendência à divulgação de aspectos institucionais, muitas vezes
de caráter mercadológico, característica essencial dos mercados contemporâneos nos
quais as IES atuam, competindo com suas congêneres na busca por alunos e na
sociedade em geral, da qual pretende obter apoio e legitimidade.
174
A programação das televisões que compõem o Canal Universitário de São
Paulo, na mesma direção das tevês de caráter público e das demais televisões
universitárias do Brasil, busca inspiração em temas relacionados às questões sociais,
educativas e culturais. Sobre a linha editorial dos programas, fica evidente a qualquer
cidadão com o mínimo de informação acerca do assunto [televisão] que não existe
critério. Fernandes corrobora essa afirmação, pois, segundo ela, após realização de
pesquisa de campo com as televisões universitárias, ―Os resultado obtidos apontam
que, em geral, não há uma conduta padrão e os programas e pautas podem ser
sugeridos por diferentes atores ou instâncias da Instituição‖ (Fernandes, 2003:127).
Ainda que não tenha sido feita uma análise minuciosa acerca da atual
programação, uma vez que se realizou uma verificação nas sinopses apresentadas
pelas televisões universitárias da Cidade de São Paulo para divulgar seus programas, é
possível afirmar - em função da atuação desta pesquisadora no CNU-SP, bem como a
partir de trabalhos realizados por outros pesquisadores - que a programação do Canal
Universitário de São Paulo, seguindo inclusive a realidade dos canais universitários
como um todo, privilegia programas educativos nos formatos de debates e entrevistas
em estúdio. Segundo pesquisa73 realizada por Martinho, 62,06% dos programas
veiculados pelo CNU-SP enquadram-se na categoria educação contra 24,14% na
categoria jornalismo, 10,35% na categoria serviços e apenas 3,45% na categoria
entretenimento.
Outra informação importante que fica evidente após análise dos dados
coletados acerca da relação das tevês com os Cursos de Comunicação é que as tevês
universitárias vinculadas aos CNU/SP, na maioria das vezes, não estabelecem relação
com os professores e alunos, configurando-se basicamente como um exibe que escoa a
programação efetivada nos laboratórios dos cursos. Nesse sentido, as tevês
universitárias apresentam-se como um laboratório de aprendizagem com o escopo de
oferecer aos alunos do curso de Comunicação Social horas de práticas dentro de uma
emissora de televisão - um laboratório que qualifica a aprendizagem dos alunos – ou
seja, um laboratório para as disciplinas da matriz curricular. Para Castro; Coutinho
73
Pesquisa realizada por Mércia David Martinho, em 1999. A pesquisadora analisou a
programação do CNU-SP de março a junho de 1999.
175
(2008), a televisão universitária, utilizada como ambiente de aprendizagem, é vista
como laboratório de aprendizagem para alunos de Comunicação Social na medida em
que a universidade permite que esses estudantes participem dele. Outra constatação
percebida é que, em nenhuma das IES participantes do CNU/SP, a tevê da
universidade é percebida como um laboratório para pesquisa acerca do meio, com o
objetivo de investigar o fazer televisivo ou, até mesmo, a produção de programas a
partir de pesquisas que trabalham o universo televisivo, por exemplo. O que se vê na
programação dos canais universitários, visto que essa realidade se faz presente na
programação de todas as tevês, é a repetição de fórmulas já consagradas na tevê
comercial.
Numa perspectiva pluralista, a participação do corpo discente daria
espaço para a experimentação e a quebra de paradigmas do fazer
televisivo. Ocorre que, nos programas observados, há pouco de
inovação de linguagem. Tanto nos programas jornalísticos, quanto
nos de entretenimento é possível perceber a similaridade com os
modelos da tv convencional. Felizmente, há exceções. Elas se dão no
momento que projetos experimentais de conclusão de curso ou
derivados de oficinas de criação são veiculados na tv universitária.
Esses programas não possuem uma regularidade na transmissão, o
que pode indicar que os alunos com repertório têm dificuldade em
produzir trabalhos com qualidade, por falta de recursos estruturais e
técnicos (Mello, 2004)74.
A tevê universitária deve desempenhar papel institucional, desse modo não
pode servir a esse ou àquele curso e tampouco pode se reduzir a um canal
experimental. Ela pode servir aos fins didáticos e de aprendizagem sem, no entanto,
deixar de atuar no âmbito das funções da universidade.
74
No período de 5 a 11 de abril de 2004, a pesquisadora observou a programação do Canal
Universitário de São Paulo, visando à produção do artigo: As sombras na caverna da Televisão
Universitária, apresentado no Congresso da ALAIC - Asociación Latinoamericana de Investigadores
de la Comunicación daquele ano.
176
4.3.3 Apresentação do time CNU-SP: os agentes em campo
Como apresentado no capítulo 3, o cenário dos canais universitários admite,
hoje em dia, uma vasta e variada gama de agentes, entendidos, aqui, à luz da teoria
bourdiana, como aquele que age e luta dentro de seu campo de interesse. No capítulo
foram descritos os agentes relacionados ao Estado e a alguns setores organizados da
sociedade civil. Daquele primeiro mapeamento, destaca-se o FNDC, que participou
ativamente da luta pela democratização da comunicação e, consequentemente,
interferiu na criação das centenas de televisões universitárias que hoje em dia estão em
funcionamento no país. Além desses, existem outros que se relacionam com o
segmento de maneira intensa; suas práticas, ou como diz Bourdieu, seus habitus,
interferem sobremaneira no modo como as lutas se travam. Conhecer esses agentes é
oportuno, pois, segundo Bourdieu (2008), aquele que ingressa num campo deve saber
dominar seus códigos e suas regras internas.
A definição de espaço social, disseminada na Sociologia, é utilizada para
designar basicamente o campo de inter-relações sociais, no qual todo o sistema de
interações se registra em um ambiente em que se associam o lugar, o social e o
cultural. Para Bourdieu (1989), a Sociologia pode se apresentar como topologia social,
visto que representa o ―mundo social em forma de um espaço (com várias dimensões)
constituído na base de princípios de diferenciação e distribuição constituídos pelo
conjunto das propriedades que atuam no universo social considerado‖ (Bourdieu,
1989:133). Portanto, para o autor, o espaço social é apresentado como um lugar de luta
de forças, onde ―os agentes e grupos de agentes são assim definidos pelas posições
relativas neste espaço‖ (Ibidem:134). Desta forma, define o mundo humano como um
espaço no qual as relações são construídas de acordo com as posições que os agentes
ocupam no jogo e com a avaliação que deles fazem os atores sociais.
Sem a intenção de reduzir a teoria de Bourdieu, nos próximos parágrafos, fazse um exercício de buscar estratégias para estender o olhar acerca da realidade
socioespacial do ―jogo‖ da produção de programas para o Canal Universitário de São
Paulo. No sentido mais amplo, ou de acordo com o conceito de Bourdieu, no seu
177
―macrocosmo‖
75
, o estudo e as estratégias já foram empreendidos, quando foram
apresentados, nos capítulos anteriores, os campos da universidade, da televisão e da
televisão educativa. Cabe agora delimitar o objeto deste trabalho, buscando entendê-lo
em seu ―microcosmo‖.
A partir de tais conceitos, infere-se que, no macrocosmo e no microcosmo nos
quais a televisão universitária gravita e organiza suas ações, encontram-se órgãos
públicos, empresas privadas, associações, entidades de classe, colaboradores,
mantenedores, alunos, professores, reitores, enfim uma gama variada de atores com
diversas influências e atuação no ambiente de produção e desenvolvimento das
televisões universitárias da cidade de São Paulo. No quadro abaixo, destacam-se
aqueles agentes considerados essenciais para as tevês universitárias.
Agentes
Tipo de
relacionamento
Objetivo
Nível de
dependência
Resultados
esperados
Expectativas
dos agentes
Funcionários
(técnicos)
Legal
Produtividade
Essencial/
Estratégica
Reconhecimento
Salários justos
Diretores
Legal
Produtividade
Essencial/
Estratégica
Fornecedores
Negócio /
Legal
Qualidade
Produtos
Essencial
Dedicação
Lealdade
Comprometimento
Dedicação
Lealdade
Comprometimento
Observância
dos contratos
Professores
Parceria
Participação e
audiência
Não
Essencial
Estratégica
Alunos
Parceria
Participação e
audiência
Não
Essencial
Estratégica
Reitorias
Outras TVUs
Parceria /
Reconhecimento
Social /
Político / Legal
Parceria /
Parceria/
Não
Essencial
Estratégica
Não
Reconhecimento
Salários justos
Cumprimento
de
contratos
Conhecimento Reconhecimento
adaptado à
e exposição
linguagem
televisiva
Contribuir na
Espaço para
formação do
experimentação
aluno
e programação
segmentada
Legitimação
Imagem
na
institucional e
comunidade
extensão
acadêmica
Produção de
Produção de
75
Para Bourdieu (2004), todo campo é um microcosmo autônomo dentro de um macrocosmo
social.
178
Social /
Concorrência
Político / Legal
Outras TVs
Parceria /
Parceria/
Social /
Concorrência
Político / Legal
Mantenedores
Legal
Reconhecimento
Assinantes
Tvs
Parceria
Participação e
audiência
Imprensa
Parceria /
Social /
Político / Legal
Ser fonte para
matérias
Essencial
Estratégica
Não
Essencial
Estratégica
Essencial/
Estratégica
Não
Essencial
Estratégica
Estratégica
qualidade
qualidade
Produção de
qualidade
Produção de
qualidade
Legitimação
na
comunidade
acadêmica
Programação de
Qualidade /
Exposição
diferenciada da
marca
Programação de
qualidade /
Variedade
Espaço para
experimentação
de novas
linguagens
Contribuir na
formação do
cidadão
Exposição
positiva na
mídia
Quadro 19 – Agentes das tevês universitárias
No mapeamento identificaram-se aqueles agentes que se apresentam como
determinantes para a existência e sustentação das tevês universitárias de São Paulo e,
por conseguinte, do Canal. Evidentemente esse mapeamento não esgota (nem é o
objetivo deste trabalho) a lista de agentes que, de uma forma ou de outra, se
relacionam com o CNU-SP e suas tevês, mas dá pistas e pode servir como ponto de
partida para outros estudos. O mapeamento efetivado é importante, na medida em que,
segundo Bourdieu (1984), o que dá suporte aos campos são: as formas de ser; o
conhecimento do mundo; e as relações de força entre os agentes (indivíduos ou
grupos) e as instituições que lutam pela hegemonia que concede o poder de impor
regras e reorganizar o capital específico de cada campo.
Tal mapeamento tem a função de identificar, como orienta Bourdieu (1989), as
posições que alguns agentes ocupam no espaço previsto para o ―jogo‖ dentro do
campo. Para isso, utilizou-se o estudo realizado por França (2004), o qual identifica os
públicos essenciais como aqueles dos quais a organização depende para a sua
existência, ou seja, que são imprescindíveis para a sua sobrevivência e para a execução
de suas tarefas/atividades fins. Já os públicos não essenciais são definidos, pelo autor,
como aqueles que se constituem como muito importantes, no entanto, a organização
não depende deles para a execução de suas atividades.
179
Como pode ser verificado no quadro, outro conceito foi atribuído para precisar
o nível de dependência das televisões universitárias com os públicos identificados.
Como visto, para França (2004), o que determina o nível de envolvimento, ou seja, o
critério de ser ou não essencial é o fato de o público participar da execução da tarefa
fim da organização. Para a análise, foi incluída a noção de ―dependência estratégica‖,
visto que a relação de um agente, em determinado ponto de vista, pode ser essencial,
mas não estratégica e, numa outra análise, pode ser não essencial, mas estratégica.
Designaram-se como estratégicos aqueles agentes cujas ações podem alterar a posição
das televisões universitárias na composição de seu campo de atuação.
O quadro acima revela a amplitude das relações que se estabelecem no espaço
de atuação das tevês que integram o CNU-SP. Se fossem considerados os demais
agentes que transitam nos campos de convergência [a universidade e a televisão],
essas relações ampliar-se-iam ainda mais. A inter-relação entre os agentes
apresentados acima (microcosmo), somada à atuação dos outros organismos/agentes
da esfera pública e privada (macrocosmo) que foram apresentados no capítulo 3,
constitui uma vasta teia de processos e ações que geram reflexos diretos e indiretos no
desenvolvimento das televisões universitárias de São Paulo e, consequentemente, no
Canal Universitário. Deste item do trabalho, como dito anteriormente, constaram os
principais agentes que gravitam nos espaços de produção das tevês que compõem o
CNU-SP, no entanto, a pesquisa concentrar-se-á, basicamente, em dois deles: diretores
e reitores.
4.4 Televisões Universitárias de São Paulo: apropriação das linguagens da
universidade pela televisão e da televisão pela universidade
Para Orlandi (1990:12), ―Compreender é saber que o sentido pode ser outro‖.
Desta forma, pode-se afirmar que nenhum texto, mesmo sendo ele apenas uma
palavra, uma imagem ou um som, possui apenas um sentido. Linguagem é prática
social, portanto o que, num primeiro momento, parece ser o sentido correto pode ser
apenas o sentido legitimado ou hegemônico.
Compreender a apropriação das
linguagens da televisão pela universidade e da universidade pela televisão faz sentido,
180
uma vez que, como já explicitado, todas as universidades participantes do Canal
Universitário de São Paulo apresentam-se como uma vitrine, através da qual o
discurso científico deve ser refletido ou apresentado à sociedade como um todo.
Nesta direção, Bourdieu (1997:18) afirma, citando Husserl, que os cientistas
são funcionários da humanidade, pagos pela sociedade para descobrirem coisas e,
portanto, faz parte de suas obrigações tornarem público o que se descobre. Esse
objetivo – tornar públicas a produção e as reflexões da universidade - está presente,
como foi visto, em todas as missões e/ou objetivos das tevês universitárias
participantes do CNU-SP e deveria também estar presente na missão de todas as
instituições de ensino superior, visto que, de acordo com a LDB (Lei n. 9394), em seu
artigo 43, inciso IV, a educação superior tem como finalidade promover a divulgação
de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da
humanidade e comunicar o saber por meio do ensino, de publicações ou de outras
formas de comunicação. Apesar disso, a consulta feita às missões definidas pelas IES
que compõem o CNU/SP revelou não haver qualquer menção à comunicação como
finalidade daquelas instituições.
Uma das grandes barreiras para a socialização das produções acadêmicas está
relacionada ao purismo e, muitas vezes, elitismo da linguagem utilizada pelos agentes
do campo universitário, o que provoca afastamento daqueles que não pertencem a ele.
A maior parte da população brasileira, quando se depara com produções acadêmicas,
sente dificuldade em interpretar as informações, tendo em vista não possuir o código
linguístico próprio do campo científico. Por outro lado, muitos pesquisadores também
padecem da mesma dificuldade, quando suas pesquisas são pautadas pela televisão e
estes precisam organizar suas descobertas em outros códigos que não o científico.
Ainda sobre a linguagem e a postura que o cientista deve ter, Bourdieu escreve
o seguinte:
Com a televisão, estamos diante de um instrumento que,
teoricamente, possibilita atingir todo mundo. Daí certo número de
questões prévias: o que tenho a dizer está destinado a atingir todo
mundo? Estou disposto a fazer de modo que meu discurso, por sua
forma, possa ser entendido por todo mundo? Será que ele merece ser
entendido por todo mundo? Pode-se mesmo ir mais longe: ele deve
ser entendido por todo mundo? (Bourdieu, 1997:18).
181
Ainda que a origem da linguagem da televisão e da universidade seja o texto
escrito, é preciso reconhecer que existem diferenças substanciais, ocorridas,
principalmente, em função da mudança da situação da comunicação: o binômio
falante/ouvinte difere do binômio escritor/leitor. Na televisão, em função do veículo
ser audiovisual, a imagem fala, muitas vezes, mais do que o texto ou palavras; além
disso, pode-se contar com recursos de luz, movimentos de câmeras e enquadramentos
que reforçam o que está sendo dito. Segundo Preti (1991), a linguagem televisiva é
contextualizada e vale-se de recursos de natureza linguística e situacional.
O discurso universitário/científico depende do ato de escrever, pois pauta-se
por convenções linguísticas de natureza sintática. Para Preti (1991), a escrita é
descontextualizada, no sentido de que não depende de uma situação de comunicação.
Sobre essa questão, Preti (1991) afirma que alguns poucos gêneros televisivos
se aproximam das características do texto escrito dentro do rigor da norma culta.
A rigor, apenas alguns gêneros de programa, como os de caráter
educativo ou telejornalismo, configuram um estilo marcado por um
planejamento verbal mais cuidadoso, pequena ocorrência de
repetições, estruturas sintáticas mais de acordo com as regras
gramaticais, levando a um resultado que definiríamos como uma
linguagem falada culta mais tensa, própria das situações formais
(Preti, 1991:234).
A televisão universitária, como um todo, optou, em função de diversos fatores,
pela produção de programas com viés educativo no gênero jornalístico, no qual o
planejamento gramatical/culto está presente. Um estudo realizado por Prioli e Peixoto
(2004) dá pistas para a compreensão desta opção.
Sendo o reino da palavra por excelência, o território privilegiado
dos discursos, a universidade sente-se mais à vontade e talvez
cumpra melhor a sua finalidade quando se utiliza de debates,
entrevistas e palestras para comunicar-se pela TV. Mas deve-se
considerar, também, e de forma muito objetiva, que esses são os
formatos de produção mais simples e barata que a televisão oferece.
Uma entrevista custa uma ínfima fração de um teleteatro, por
exemplo. E não carece de profissionais especializados. Para
emissoras de caixa sempre baixo e ainda imaturas tecnicamente,
como as universitárias, há, portanto, gêneros de programação ainda
inacessíveis. Ao menos, numa escala de produção mais industrial
(Prioli e Peixoto, 2004:24)
182
Se a televisão comercial opta por uma programação pautada no entretenimento
e na informação rápida e sem aprofundamento, ou seja, citando Bourdieu (1997), pelos
fatos-ônibus76, as tevês universitárias podem representar um avanço, no sentido de
aproximar a população do universo acadêmico brasileiro, já que, fazendo parte da
universidade, têm condições de levar ao público não universitário as experiências e
vivências do mundo acadêmico.
A maior estranheza entre essas duas instituições (televisão/universidade)
percebida nestes 13 (treze) anos de Canal Universitário de São Paulo, diz respeito ao
tempo. Na televisão tudo é muito rápido. Para Bourdieu (1997), o tempo é algo raro na
televisão, tudo deve ser dito e feito num tempo determinado e com enfoque dirigido. A
universidade, por sua vez, necessita de tempo, haja vista configurar-se como uma
instituição voltada para o educar, o saber, o conhecer, o pensar. Sua esfera é a da
ciência e a da cultura, das artes e das letras. Se, como diz Bourdieu (1997), a televisão
é o espaço das coisas fúteis, menos importantes, que oculta coisas preciosas, a
televisão universitária insere-se neste circuito com amplas possibilidades de, por um
lado, caracterizar-se como uma ação extensionista, visto que divulga o conhecimento
científico e, por outro, configurar-se como uma possibilidade de apropriação do fazer
televisivo por novos atores, abrindo nichos para novos usos da televisão por uma
sociedade que, desde os anos 1950, acostumou-se a entender esse meio como
sinônimo de monopólio comercial.
Para Bourdieu (2002), existe ambiente para esse tipo de iniciativa. Ao ser
questionado se havia espaço para a televisão universitária desafiar as grandes redes de
distribuição e interpretação da realidade, o pesquisador respondeu:
Se tivéssemos apenas o mercado atual, imediato, a maior parte das
coisas interessantes seriam arrasadas de saída. Então é preciso lutar
para que o mercado não destrua todos os nichos e para que haja
espaço para mercados interiores. O sistema escolar continua sendo
um dos nichos possíveis, apesar da concorrência do privado: ele
oferece a dedicação, pessoas que acreditam, além de recursos,
76
Os fatos-ônibus são fatos que não devem chocar ninguém, que não envolvem disputa, que não
dividem, que formam consenso, que interessam a todo mundo, mas de um modo tal que não tocam
em nada de importante (Bourdieu, 1997:23).
183
certamente não muito grandes, mas que permitem que se façam
77
coisas (Bourdieu, 2002:47).
A pesquisadora Martinho (1999), após realização de pesquisa de recepção da
programação do CNU-SP, afirma que os formatos e gêneros utilizados pelas tevês
universitárias da cidade de São Paulo aproximam-se da linguagem televisiva
―deixando de lado o estilo sala de aula‖. Na mesma pesquisa, afirma, ainda, que a
tarefa não é fácil, na medida em que propor ao cientista que exponha seu
conhecimento por meio de outros recursos que não o texto é um desafio para o próprio
cientista e para os produtores.
O discurso acadêmico a partir da televisão universitária pode ter seu espaço
comunicacional ampliado e atualizado e, por sua vez, o discurso televisivo pode
constituir-se de novos paradigmas.
4.5 Pesquisa: o que está em jogo nas tevês universitárias de São Paulo
A televisão pode ser considerada um dos mais proeminentes fenômenos sociais
contemporâneos. Tal afirmação pode ser confirmada pelas vultosas cifras econômicas
que o meio movimenta, pelas centenas de milhares ou mesmo milhões de
telespectadores que apreciam diariamente sua programação e, por conseguinte,
consomem os produtos anunciados por ela, ou ainda pela sua relevância como
influente divulgador de ideologias e ditador de regras e modos. Essas leituras, por si
só, já serviriam para que se imaginassem as inúmeras tensões que o campo produz.
Quando, a esse já tenso campo, incluem-se as especificidades e idiossincrasias da
universidade e de seus agentes, as relações ficam ainda mais intensas.
Para compreender esse emaranhado de vertentes relacionadas aos campos
universitário e televisivo surgiram as mais requintadas matrizes sociológicas, e a
escolha de uma delas para o trabalho requereu certo cuidado, uma vez que uma teoria
pode ser indicada para observar determinado fenômeno, mas pode impor limitações ou
77
Entrevista realizada por Maria Andréa Loyola, em 27 de outubro de 1999, e publicada pela
Editora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, em 2002. A entrevista foi exibida pelo Canal
Universitário do Rio de Janeiro, em 2000.
184
restrições a outros. O modelo de análise sociológica escolhido para esta discussão,
como já dito nos capítulos anteriores, foi a de Pierre Bourdieu, uma vez que suas
teorias são indicadas para compreender tanto um campo quanto outro.
O autor formulou o conceito de campo com a finalidade de torná-lo um
paradigma teórico que fosse adequado à análise de diferentes universos. O conceito de
campo foi empregado repetidamente e em espaços sociais distintos, tais como na
literatura, na alta costura, na filosofia, na política, e outros.
Ao analisar diferentes campos, Bourdieu verificou que existem semelhanças
estruturais e funcionais entre eles; assim, inferiu ser possível transferir os
conhecimentos obtidos na análise de um campo para interrogar outro campo. Nessa
perspectiva, o autor compreendeu que os campos têm, concomitantemente, atributos
particulares e leis comuns, ou, segundo o autor, normas invariantes.
A presente pesquisa, valendo-se da teoria de Bourdieu, procura averiguar a
possibilidade de o Canal Universitário de São Paulo constituir-se como um campo. Ao
estudar o espaço social do esporte, buscando compreender a existência ou não de um
campo esportivo, o autor faz o seguinte questionamento:
[...] existe um espaço de produção dotado de uma lógica própria, de
uma história própria, no interior do qual se engendram os ―produtos
esportivos‖, isto é, o universo das práticas e dos consumos
esportivos disponíveis e socialmente aceitáveis em um determinado
momento? (Bourdieu, 1983a:136).
Também este trabalho, guiado pelas mesmas inquietações de Bourdieu, buscou
informações para verificar, nos espaços de produção das tevês universitárias de São
Paulo, a existência de história e lógicas próprias; de um espaço estruturado; e de
dominantes e dominados.
Para compreender as lógicas, as histórias e as especificidades das tevês
universitárias, foi preciso, num primeiro momento, buscar informações acerca dos
campos que se inter-relacionam com as tevês integrantes do Canal Universitário de
São Paulo. Nos capítulos anteriores procurou-se apresentar a história de cada campo
[universitário/televisivo]. Essa opção metodológica configurou-se como elemento
fundamental para a compreensão das lutas que se travam no cenário e das relações
existentes no mundo da produção das televisões universitárias. Para Bourdieu (1989),
185
a história ocorrida nos campos configura-se como produto de uma luta, na medida em
que as lutas que foram travadas no passado continuam no presente e no futuro desses
campos, manifestando-se em todas as suas dimensões e formando o habitus
incorporado em cada um deles. Sobre, especificamente, essa questão, Bourdieu diz
que o ser social se define como ―aquilo que foi; mas também que aquilo que uma vez
foi ficou para sempre inscrito não só na história, o que é óbvio, mas também no ser
social, nas coisas e nos corpos‖ (Bourdieu, 1989:100).
Visando à compreensão dos campos que fazem fronteiras com as tevês
universitárias, foi efetivado, a partir de pesquisas secundárias realizadas com base em
diversas fontes documentais, o levantamento dos dados apresentados até esta etapa da
tese. As informações organizadas possibilitaram a apreensão dos elementos
estruturantes presentes nos campos universitário, televisivo e televisivo educativo.
As pesquisas efetuadas, fonte de dados empíricos, confirmaram a existência de
conflitos e tensões nas relações entre as televisões universitárias de São Paulo e suas
instituições de fronteira. Todo o aparato documental organizado e analisado forneceu
muitas pistas relevantes, porém insuficientes, para a análise pretendida. Visando à
obtenção de dados mais consistentes, optou-se pela realização de entrevistas
semiestruturadas com os diretores de quatro das tevês universitárias de São Paulo.
A escolha desses agentes ocorreu tendo em vista que esses profissionais, dentro
do organograma de uma tevê universitária, têm papel importantíssimo. A primeira
diretora da TV USP, Marília Franco (2006: 08), define o diretor de uma tevê
universitária como aquele que:
[...] propõe, orienta, supervisiona e responde por tudo o que acontece
no desenvolvimento da produção e da difusão dos programas.
Gerencia e garante as condições administrativas, financeiras e
técnicas para a realização da programação. Analisa, avalia e planeja
para garantir o presente, pensando o tempo todo no futuro. Necessita
de sensibilidade, já que não há verba para pesquisa de audiência, de
perceber o que está dando certo na programação, o que precisa
melhorar e o que tem de mudar, acabar, recriar. Deve estar
permanentemente atualizado e atento às inovações tecnológicas e
saber a hora em que ainda dá para aguentar a velha máquina e
quando a mudança é indispensável para garantir a qualidade mínima
do trabalho. Precisa manter a equipe motivada e unida. Tem de
propor disciplina e hierarquia, sem tolher a iniciativa e a
criatividade, pois, sem isso, a TV não irá para frente; também ter
186
plena consciência e eterna vigilância de que o desentendimento no
set de gravação aparece na tela, das formas mais inesperadas [...]
4.5.1 Pesquisa: apresentando os jogadores
Para a construção do protocolo metodológico, levou-se em consideração que,
em função da lei, diversas universidades com condições, propósitos e características
diferentes, estão juntas num único canal. Sendo assim, procurando dar espaços para as
diversas universidades e, portanto, para as variadas especificidades de voz, foi feito o
seguinte recorte:
Universidade Presbiteriana Mackenzie – Entidade confessional
Entrevistado: Daniel De Thomaz
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – Entidade Comunitária
Entrevistado: Julio Wainer
Universidade de Santo Amaro – Entidade Particular
Entrevistado: Francisco Claudio G. Lemos
Universidade de São Paulo – Entidade Pública
Entrevistado: Prof. Dr. Pedro Henrique Ortiz
Antes de apresentar os resultados efetivos da pesquisa realizada, é importante
voltar ao conceito que balizou todo o processo investigativo, a fim de não gerar
qualquer dúvida. Todo o esforço empreendido para a pesquisa deu-se no sentido de
buscar definir o lugar da televisão universitária a partir dos estudos dos campos:
universitário e televisivo. Estudar o campo a partir das orientações bourdianas obriga a
buscar, também em Bourdieu, outro conceito, considerado por ele o par lógico da
teoria de campo. O autor apresenta o habitus como uma natureza incorporada, como
um princípio gerador das práticas efetivadas, como fundamento da regularidade de
condutas.
O autor concebeu a definição de habitus em função da necessidade empírica de
apreender as relações de afinidade entre o comportamento dos agentes e as estruturas e
187
condicionamentos sociais, ou seja, estruturas e condicionamentos existentes nos
campos. O conceito surge como um mediador: conciliar a oposição entre as realidades
exteriores e as realidades individuais.
Partindo do princípio de que habitus se configura como a subjetividade
socializada (Bourdieu, 1992:101) e que a relação entre indivíduo e sociedade está
imbricada entre o individual/pessoal e o subjetivismo, a pesquisa de campo foi
estruturada e analisada.
A pesquisa realizada dividiu-se em três partes: na primeira, com foco mais
específico no perfil do diretor, buscou-se conhecer sua formação acadêmica e
experiências anteriores; na segunda, num viés mais institucional, procurou-se
respostas para as seguintes questões: em que medida o habitus, as
tomadas de
posição, as escolhas que os diretores assumem na produção diária das tevês
universitárias, na relação com a comunidade, na opção por essa ou aquela pauta, são
práticas sociais que fazem parte do ethos do profissional; na terceira e última parte,
visando entender como esses agentes pensam o segmento, foi pedido que eles falassem
acerca das perspectivas para o futuro do canal.
A técnica utilizada foi a de entrevista pessoal gravada em áudio e vídeo,
realizada a partir de um roteiro previamente definido. Apesar da estruturação do
roteiro, destaca-se a atuação da própria pesquisadora, que assumiu condição interativa
em dinâmica de diálogo, durante
Considerando que foi realizada uma pesquisa do tipo qualitativa, ou seja,
aquela na qual o pesquisador desenvolve conceitos, ideias e entendimentos a partir de
padrões encontrados nos dados, em vez de coletar dados para comprovar teorias,
hipóteses e modelos preconcebidos [Reneker, 1993], a aferição dos dados ocorreu a
partir da abordagem interpretativa e buscou compreender o fenômeno em função das
informações obtidas por meio das respostas dos diretores.
Para o entendimento das posições dos agentes, optou-se pela transcrição direta
das falas dos diretores. A intenção foi apresentar, sem qualquer tipo de interferência
ou modificação na forma e no conteúdo, o que foi captado nas entrevistas. Os trechos
selecionados destinam-se a análises dos temas que serão abordados neste item do
trabalho. A íntegra das entrevistas consta dos anexos da pesquisa.
188
No processo de compreensão deste cenário, adotou-se como fonte para o
diagnóstico, além das respostas obtidas na pesquisa de campo, a análise dos textos
escritos pelos reitores das universidades que faziam parte do Canal Universitário de
São Paulo quando da comemoração de seus dez anos no ar. Esses depoimentos foram
publicados no livro ―CNU a universidade que você assiste há 10 anos‖. Para a
interpretação desta análise, utilizaram-se os procedimentos metodológicos da análise
de conteúdo, que, segundo Bardin (2009), configura-se como ―[...] um conjunto de
técnicas de análise das comunicações que utiliza procedimentos sistemáticos e
objetivos de descrição do conteúdo das mensagens‖. Desta forma, a AC configura-se
como um método que trabalha com a palavra, permitindo, de forma prática e objetiva,
produzir inferências acerca dos conteúdos comunicados.
Como componente do habitus, o ethos, segundo Bourdieu, assume a função de
princípios interiorizados que guiam a conduta dos agentes do campo de forma
inconsciente. Esses princípios podem ser adquiridos a partir de vários pressupostos,
entre eles a formação escolar. A primeira parte da pesquisa realizada com os diretores
teve como objetivo traçar o perfil desses profissionais, uma vez que o campo de
produção de conteúdos midiáticos tem regras específicas que, muitas vezes, se
encontram em seus próprios agentes e nas suas relações com os demais.
Dos quatro entrevistados, três deles (Lemos - Unisa, Thomaz – Mackenzie e
Ortiz - USP) são jornalistas de formação; destes, dois têm títulos de mestre ou doutor
(Mackenzie e USP) e apenas Ortiz se declarou com experiência no fazer televisivo.
Isto pode ser observado a partir da analise do quadro a seguir.
Instituição Idade
Formação
Professor
Lattes
Titulação
Tempo
Outras
cargo
experiênciastelevisivas
PUC
48
Arquiteto
Sim
Sim
5 anos
Não
Jornalista
Sim (não Sim
9 anos
Sim
Doutor
na USP)
Graduado
USP
45
189
MACK
Jornalista
Não
Não
13 anos
Não
Não
Não
12 anos
Não
Mestre
Unisa
49
Jornalista
Graduado
Quadro 20 – Perfil dos Agentes do Campo
Num primeiro momento da análise, a questão da ausência de experiências
anteriores pode parecer um fator negativo, visto que o fazer televisivo dos diretores
entrevistados concretizou-se a partir dos referenciais encontrados nas próprias tevês
universitárias, porém, ao se analisar a mesma questão a partir das perspectivas de
habitus, de Bourdieu, tem-se outra interpretação desta mesma situação, já que, para
ele, a televisão exerce no jornalista, em função da lógica do comércio simbolizada
pelos índices de audiência, uma total influência. Além disso, o autor vê o habitus
como um esquema individual formado a partir de disposições estruturadas (campos) e
estruturantes (mentes) adquiridas nas e pelas experiências vividas. Portanto, se não
houver habitus anteriores, essas ―disposições‖ poderão ser formadas diretamente no
ambiente de produção das televisões universitárias, as quais, como já dito, não balizam
suas produções em função do índice de audiência.
4.5.1.1 Coerências e incoerências em jogo
No roteiro da pesquisa78, realizada no formato inquérito pessoal, entre 2009 e
2010, também foram solicitadas informações acerca do modelo organizacional dessas
tevês. Mais especificamente procurou-se conhecer a estrutura física de produção
dessas tevês. Segundo informações dos quatro agentes pesquisados, indo na mesma
direção de todas as tevês participantes do CNU-SP, as universidades possuem
estrutura física exclusiva para as tevês universitárias, ou seja, não há qualquer relação
78
As entrevistas foram gravadas em áudio. O conteúdo, na íntegra, em CDROOM, faz parte dessa
tese como anexo.
190
de compartilhamento com os laboratórios de tevê das IES. Todas as falas obtidas como
resposta a essa questão levam a deduzir que as tevês universitárias se comportam
como uma produtora dentro da universidade.
Lemos (2010): [...] ela [a TV] tem toda a estrutura técnica de uma TV normal,
temos ilha de edição, temos Kits de Externas, temos carro, temos sinal de satélite
para transmitir ao vivo; então, temos toda a estrutura de uma TV.
Um recorte necessário a esse item da pesquisa diz respeito à possibilidade de
transmissão ao vivo. Somente a TV Unisa, atualmente, tem condições de transmitir ao
vivo sua programação, tendo em vista que utiliza os recursos da Unisa Digital, órgão
responsável pelas produções audiovisuais para os cursos oferecidos na modalidade a
distância. Ambos os setores, TV e o Complexo audiovisual da Unisa Digital estão
concentrados num único local e isso facilita a atuação e a otimização dos recursos.
Como já dito em outro trecho deste capítulo, a TV Unisa configurou-se como fonte de
inspiração para a concepção do núcleo audiovisual:
Lemos (2010) [...] a TV foi a base para o ensino a distância. A experiência da
televisão permitiu à Unisa propiciar aos alunos do EAD um ensino a distância
diferenciado
O número de funcionários das tevês pesquisadas gira entre 8 e 25 pessoas;
entre eles percebe-se a presença, nas quatro universidades, de técnicos, estagiários,
porém em nenhuma delas há professores envolvidos diretamente na produção de
conteúdos:
Ortiz (2010): [...] em São Paulo, a TV USP tem atualmente 12 funcionários (8 de
nível superior e 4 de nível técnico) e 14 vagas para estagiários.
Os funcionários destacados pelo diretor como tendo formação de nível superior
são, basicamente, jornalistas e produtores que, em momentos anteriores, foram
estagiários da TV USP. Uma das características das tevês universitárias é buscar sua
mão de obra na própria universidade e formá-la a partir de suas especificidades e
necessidades. Os motivos para essa ação são vários, desde a necessidade de formação
de um profissional com características mais humanísticas, já que vão trabalhar com
um público específico, até questões de cunho econômico, pois contratar alguém de
fora do meio universitário pode significar um gasto incompatível com o veículo. Os
salários praticados pelas IES para esse segmento de colaboradores, normalmente, é
191
abaixo do mercado, o que provoca um ―turnover‖ bastante grande nas tevês
universitárias.
Ainda na tentativa de compor a estrutura organizacional das tevês participantes
do CNU, perguntou-se aos diretores a qual setor da universidade a tevê estava ligada e
como ocorria o relacionamento, considerando a hierarquia estabelecida. O
questionamento envolveu, também, a inserção da tevê e sua aceitação pelas demais
áreas da IES. Ratificando as colocações da autora no início deste capítulo, quando
indicou a concentração das vinculações das tevês no topo das organizações, todos os
diretores apontaram a reitoria como o órgão ao qual as tevês se reportam, com exceção
da TV Mackenzie, que se reporta à vice-reitoria. A TV USP está, segundo seu diretor,
vinculada à Coordenadoria de Comunicação Social da Universidade, como os demais
veículos da instituição; esta, por sua vez, subordina-se à reitoria
Ortiz (2010): [...] a CCS é um órgão central da universidade e seu coordenador
responde diretamente à Reitoria.
Quanto ao relacionamento com os órgãos aos quais estão subordinadas, bem
como à comunidade acadêmica como um todo, há unanimidade em dizer que as tevês
de suas universidades são vistas com respeito e que a relação entre todos os envolvidos
é bastante positiva. Todos os entrevistados declaram-se livres para a proposição de
pautas diversas. Ainda que haja o vínculo institucional, há total liberdade para a
produção:
Lemos (2010): [...] eles [reitoria] dão opinião de pautas, mas não temos que seguir
obrigatoriamente nada.
Ortiz (2010): [...] temos total autonomia em nosso trabalho, sem ingerências
políticas ou institucionais de qualquer segmento da universidade.
Thomaz (2010): [...] nunca houve qualquer tentativa de censura, inclusive nós já
fizemos programas polêmicos aqui. Já fizemos programas sobre homossexuais,
sobre cachaça, sobre drogas na classe média [...] e passou numa boa. Nunca houve
problema, o máximo que já aconteceu foi [...] em um segundo momento a
chancelaria propor um programa para dar o seu parecer institucional a respeito do
tema, mas nunca se deixou de veicular nada.
Wainer (2010): [...] jamais interferem em conteúdo; a gente tem liberdade para
fazer. Também sabemos que a gente vai ser avaliado de acordo com a nossa
produtividade.
192
Sobre essa questão, faz-se necessário relativizar. A autonomia à qual se
referem os entrevistados diz respeito aos conteúdos abordados na programação, porém
é preciso destacar que a autonomia dentro de uma televisão universitária está sempre
subordinada à autossustentabilidade orçamentária. Nenhum dos diretores das tevês
entrevistadas declarou ter orçamento próprio; ao contrário, as quatro tevês sobrevivem,
basicamente, de verbas oriundas da própria universidade. Mesmo a TV PUC, que, no
passado, foi autônoma, hoje, segundo seu diretor, ―gasta mais do que traz‖. Portanto a
autonomia à qual se referem os diretores diz respeito ao reconhecimento oficial que
têm enquanto mídia institucional e aos procedimentos de seleção de temas e
abordagem destes nos programas. Ratificando esse argumento, o diretor da TV PUC
diz a esse respeito:
Wainer (2010): [...] tendo autonomia, não precisa de muito. Sei que não temos
verba ilimitada; quando tenho contrato firmado, ou seja, vai entrar dinheiro, aí a
PUC é rápida; ou seja, se houver mais contrato, você tem mais espaço e agilidade.
Sobre a relação entre a tevê e os cursos de Comunicação Social, todos os
entrevistados, ainda que declarando haver boas relações, revelam inexistirem vínculos,
reflexo do que ocorre na maioria das tevês universitárias de São Paulo. Dos
entrevistados, somente o diretor da TV Unisa diz manter estreita relação com os
cursos.
Lemos (2010): [...] nós somos a única televisão universitária que os alunos usam
todos os recursos que nós temos no canal universitário. Tanto que os alunos de
jornalismo e radialismo entram ao vivo no canal universitário [...] e é legal que
cria uma interação e é uma experiência de TV.
Essa importância dada à experimentação não fica evidente nas demais
entrevistas:
Wainer (2010): [...] o aluno de comunicação, aqui da PUC, não vê muita graça em
ter uma bolsa para trabalhar conosco; eles querem ganhar uma bolsa para outro
veículo que os instigue mais, porque a televisão é muito mecânica; toda hora tal
dia fazer câmera, não é muito criativo na sua operação técnica. Tô falando dos
nossos alunos da PUC, de jornalismo, não temos rádio e TV, mas se tivéssemos,
não sei se eles gostariam. Não é um trabalho criativo, inovador; é repetitivo. TV é
uma repetição, é uma fórmula nova, mas que se repete depois a cada semana, a
cada dia.
A participação de outros setores da universidade na gestão, administração e
produção das tevês, segundo seus diretores, ocorre de maneira bem superficial.
193
Segundo os entrevistados, a participação se dá, de modo esporádico, nas apresentações
e/ou em aparição em programas. Mesmo tendo espaço pré-definido para os diversos
setores da universidade, segundo Wainer (2010), os professores ainda ―têm medo de
mostrar a cara‖.
A programação das tevês dirigidas pelos entrevistados segue a mesma linha das
tevês universitárias como um todo. Não houve qualquer declaração relevante que
apontasse para algo inovador. Em todas as falas evidenciaram-se pautas com foco na
sociedade a partir do pensamento da universidade.
Ortiz (2010): [...] na TV USP procuramos produzir TV Universitária de qualidade.
Considerando que o foco deste trabalho é identificar se, entre os campos
universitário e televisivo, há espaço para a televisão universitária, saber em que
medida os diretores das tevês universitárias são influenciados pelas pautas, habitus e
linguagens das tevês abertas é bastante adequado. A seguir são transcritas algumas
afirmações dos entrevistados quanto à influência da tevê aberta sobre suas condutas:
Wainer (2010): [...] não adianta, simplesmente, copiar para querer ser igual.
Lemos (2010): [...] a influência é muito pouca.
Thomaz (2010): [...] a gente não se prende a isso, não; a gente procura desenvolver
o nosso próprio formato, até porque não teria sentido a gente fazer uma coisa
similar a que é feita na TV aberta, porque nós não temos os recursos necessários
para isso.
Ortiz (2010): [...] na TV USP procuramos produzir TV Universitária de qualidade,
nos atentando a padrões de qualidade técnica, estética e de conteúdo que herdam
alguns conceitos da TV aberta, porém nos dedicamos mais a produzir televisão
dentro do âmbito do campo público de TV, ou seja, televisão educativa,
informativa, cultural, não comercial.
Ainda que timidamente, com exceção do diretor da TV Mackenzie, os demais
entrevistados, de uma forma ou de outra, admitem a influência da teve aberta em sua
programação. Essas respostas lacônicas talvez tenham uma explicação: o fato de, com
exceção do diretor da TV USP, todos os outros diretores terem formação na própria
tevê universitária que dirigem, ou seja, o habitus da tevê aberta talvez não esteja
incorporado nos agentes. Para Nogueira e Nogueira (2004), os indivíduos, ao
incorporarem um habitus,
194
[...] agiriam orientados por uma estrutura incorporada, um habitus,
que refletiria as características da realidade social na qual eles foram
anteriormente socializados. Instala, assim, uma importância à
dimensão do aprendizado passado e afirma que este está no princípio
do encadeamento das ações; portanto, a prática é resultado de um
habitus incorporado a partir de uma trajetória social (Nogueira e
Nogueira, 2004:33).
Quando se questionou acerca da programação, mais uma vez as respostas
confirmaram as informações já apresentadas anteriormente a partir do levantamento de
dados secundários, ou seja, segundo os entrevistados, o foco da programação
concentra-se nos temas Educação e Cultura no formato entrevista, com cerca de duas
horas e meia de produção semanal.
É interessante confrontar um dado acerca desses temas. Entre 2001 e 2002, a
presente pesquisadora realizou um estudo sobre o CNU-SP no qual identificou que as
tevês participantes do consórcio, à época, produziam, de forma inédita, entre duas e
duas horas e meia de programação semanalmente (LIMA, 2002). Isso significa dizer
que depois de dez anos passados, a capacidade de produção dessas tevês quase não se
alterou. Na apresentação de cada tevê universitária, relacionou-se uma significativa
quantidade de títulos por tevê. No entanto, essa variedade de títulos não está presente
na produção semanal, a qual, seguindo o regulamento do CNU-SP, mantém-se em
duas horas e meia, o que acarreta o já apresentado problema da reprise de programas
além da ausência de padronização na exibição dos títulos, pois, como há diversidade
destes, as tevês os exibem de acordo com sua capacidade de produção. Considerando a
cultura televisiva existente, marcada pela existência de uma grade de programação
com horários fixos de exibição, a grade flutuante do CNU-SP configura mais uma
dificuldade de fidelização do telespectador.
Outro viés da pesquisa procurou entender o grau de conhecimento que os
diretores dessas tevês têm de seu público receptor, com a intenção de identificar para
qual público os programas são direcionados. As respostas foram genéricas: ―público
em geral‖; ―zapeador‖, ―todo mundo‖, ―segmentos universitários‖.
Wainer (2010): [...] por quem tá em casa zapeando.
Lemos (2010): [...] na última pesquisa que a gente fez resultou em 140 mil
pessoas/dia passando pelo canal universitário.
195
Thomaz (2010): [...] a TV Mackenzie quer falar com todo mundo; a gente não fala
nem faz distinção de público.
Ortiz (2010): [...] pretendemos reforçar a presença do CNU e seu alcance junto
aos segmentos universitários (alunos de graduação e pós-graduação, professores e
funcionários) e o público em geral.
Com base nas falas dos diretores, é possível afirmar que falta a eles clareza em
identificar os públicos receptores. Alguns dizem, explicitamente, que os alunos não
assistem à programação de suas tevês. A análise dessa questão deixa a impressão de
que há um consenso entre as tevês acerca deste tema. O conformismo com a situação é
claro.
Wainer: (2010): [...] o aluno não vê. Ele já passa quatro horas e meia aqui;
quando chega em casa a última coisa que ele quer ver é a gente.
Lemos (2010): [...] em minha opinião, não temos linguagem e nem formação para
falar com o jovem. O jovem ou está na universidade ou está passeando ou
estudando.
Como parte das comemorações de dez anos de existência do Canal
Universitário, em 2007, foi realizada uma pesquisa junto às instituições de ensino
integrantes do CNU-SP para tentar saber o grau de conhecimento de seus alunos e
professores sobre a programação do Canal. Já naquela época, identificou-se que 51%
dos entrevistados (alunos, professores, funcionários) nunca tinham ouvido falar no
canal. Dos 49% que se declararam conhecedores do canal, 45% disseram que já
haviam assistido a ele. Isso significa que apenas 25% da comunidade interna já
assistiu, mesmo que esporadicamente, à programação do CNU-SP.
Essa falta de conhecimento sobre o público alvo de sua programação vem
sendo discutida desde que o Canal foi posto no ar. Gabriel Priolli, principal articulador
do setor, em entrevista para a presente pesquisadora, em 2002,79 disse que grande parte
das universidades que fazem televisão, atualmente, não enfrenta o debate conceitual,
além de ter pouca clareza sobre a natureza e a finalidade do que oferecem ao público.
Como produzir sem saber para quem? Num primeiro momento essa situação
parece incoerente e sem sentido. Nestes mais de dez anos no ar, a questão que norteou
a produção das tevês foi: com quem eu penso que falo ou com quem eu gostaria de
79
Entrevista realizada para a produção da dissertação de mestrado – agosto / setembro
2002.
196
falar. Ou seja, busca-se um público ideal para a programação do canal. Essa maneira
de se fazer tevê, que num primeiro momento pode parecer excêntrica – característica
atribuída à administração de Assis Chateubriand à frente dos Diários Associados - ou
amadora, tem respaldo científico. Os produtores cinematográficos, por exemplo,
fazem muitas suposições a respeito de seus públicos. Para resolver esses dilemas, os
estudiosos do cinema criaram o ―modo de endereçamento‖ (Ellsworth, 2001) que, de
uma maneira bem simplificada, diz respeito à necessidade de endereçar alguma
comunicação (texto ou ação) a alguém. De maneira consciente ou não, é desta forma
que a programação dos canais universitários tem sido produzida, ou seja, com vistas a
um público ideal, na medida em que não há verbas para que, periodicamente, sejam
feitas pesquisas, como ocorre nas tevês comerciais.
Com características de um condomínio, o canal universitário de São Paulo
junta, num único espaço, instituições com características e objetivos diferentes.
Atualmente, participam do CNU-SP oito universidades que direcionam suas ações e
programações para caminhos que, na maioria das vezes, não se cruzam. Para entender
como ocorrem as relações entre as IES integrantes do CNU-SP, foi perguntado aos
diretores como eles avaliam a convivência entre as diversas instituições. Os quatro
diretores inquiridos avaliam como amistosa, no entanto destacam o fato de não
conseguirem efetivar qualquer programação em conjunto.
Lemos (2010): [...] uma relação de condomínio, onde todas têm um interesse geral de
um canal universitário, onde tudo é feito em consenso, mas cada universidade tem
interesses individuais que são de suas reitorias.
Thomaz (2010): [...] o canal universitário, ele, hoje, é muito mais um ponto de
encontro de trocas de experiência e discussões sobre programação e dali pra frente
todos voltam para a sua casa e habilitam ou não aquilo que interessa.
Wainer (2010): [...] atualmente, não há parceria para a efetivação de programas
conjuntos.
Ortiz (2010): [...] procuramos criar espaços de cooperação e coprodução entre as tevês
e voltamos recentemente a produzir um programa do canal, o Conexão Universitária.
Nossas decisões são tomadas nesses dois colegiados (CG e DE) e procuramos sempre a
busca do consenso ou a aprovação da maioria.
Em uma análise mais aprofundada, conclui-se que o maior entrave do
segmento está na questão da efetivação de uma programação conjunta, ou seja, que
seja assinada pelo Canal Universitário de São Paulo e não pelas tevês individualmente.
A efetivação de uma programação conjunta mais homogênea significaria a redução do
197
tempo de exposição das tevês e ampliação da exposição do CNU-SP. Convém lembrar
que, sobre esse tema, em trabalho realizado entre 2001 e 2002 pela presente
pesquisadora, ficou demonstrado que uma das motivações que levou as universidades
a aderir ao empreendimento foi, de fato, a exposição da imagem institucional. Uma
programação efetivada pelo CNU-SP, em conjunto com as demais IES, significaria a
diminuição da exposição de imagem individualmente.
A incapacidade de planejar e agir em conjunto, para além da mera exposição da
marca, leva, também, à ausência de uma visão do potencial produtivo do Canal
Universitário de São Paulo, que inclui, no mínimo, oito ilhas de edição, mais de 100
funcionários, 8 unidades de externas, 8 estúdios para gravação e uma verba anual de
R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais) apenas para produção dos programas. Em
termos comparativos, no segmento de tevês públicas, pode-se citar a TV Cultura de
São Paulo, que tem uma verba de cerca de R$150.000.000,00 (cento e cinquenta
milhões de reais) anuais, incluindo despesas com pessoal.
Com a finalidade de verificar a opinião dos diretores sobre as perspectivas para
o setor, pediu-se que os entrevistados expusessem, num exercício de futurologia, o que
eles imaginam para o segmento num futuro próximo. As respostas convergiram no
sentido da necessidade de investimento para que o empreendimento alcance novos
patamares.
Lemos (2010): [...] eu não vejo o CNU com perspectivas maiores, a não ser que ele
tenha uma parceria muito grande.
Thomaz (2010): [...] tudo para funcionar tem que ter capital; você nunca vai conseguir
fazer uma coisa sem investimento.
Ortiz (2010): [...] o CNU está mais uma vez em um momento de redefinições [...]
Queremos estabelecer novas parcerias e captar apoios culturais para o canal.
Wainer (2010): [...] acho que o CNU é uma janela de visibilidade de uma
universidade, um espaço de compartilhamento, o espaço de TV mais a internet não vai
ser tão disputado como já foi.
Sobre esse quesito, é interessante destacar o fato de que nenhum dos
entrevistados tenha citado a possibilidade de o canal utilizar o espectro digital. Em
2006, com o decreto (5820) de implantação da TV Digital no Brasil, foi préestabelecido que o Estado ficasse com possibilidade de exploração direta de 4 canais canal do executivo, canal da educação, canal da cultura e canal da cidadania. A não
198
citação dessa questão é ainda mais grave, se for considerado que dois dos
entrevistados são integrantes da ABTU, a qual, desde a implantação da TV Digital no
país, tem como bandeira principal garantir um espaço no espectro digital para as
televisões universitárias.
4.5.2 Os cartolas em campo: pesquisa com reitores
Com o objetivo de identificar o grau de valorização que as reitorias atribuem às
suas tevês universitárias, faz-se, a seguir, uma análise do conteúdo das comunicações
efetivadas pelos principais gestores das televisões universitárias integrantes do CNUSP durante as comemorações dos 10 anos do Canal Universitário. As falas foram
publicadas no livro organizado por Thomaz, em 2007, obra já utilizada na
fundamentação teórica deste trabalho em outros momentos.
Para iniciar esta fase do trabalho, algumas observações são importantes: serão
analisadas 10 (dez) comunicações, pois, em 2007, ainda faziam parte do CNU-SP a
Unicsul e a Unifesp; permanecem, em 2011, no cargo, os autores de seis instituições;
houve alteração na configuração da gestão nas seguintes universidades: PUC, Unifesp,
Unisa e USP; das dez comunicações, nove foram assinadas pelas reitorias, com
exceção para o Mackenzie, que teve o texto assinado pelo vice-reitor.
Como sugere Bardin (2009), uma possibilidade de se proceder a uma análise de
conteúdo é fazer uso da categorização de temas. Os textos publicados são passíveis de
tematização, o que será feito a partir da determinação daquilo que foi tratado pelos
reitores e que remete ao que está sendo analisado neste trabalho.
Importante destacar que, no livro citado, foi dado um espaço de até duas laudas
para que a opinião das reitorias a respeito do CNU-SP pudesse ser apresentada. Nesse
espaço, os dez reitores formularam suas hipóteses acerca do papel da tevê universitária
em suas gestões.
Isso posto, apresenta-se e analisa-se, a seguir, o conteúdo publicado no livro de
comemoração de 10 (dez) anos do CNU-SP.
199
O primeiro tema que se destaca nos discursos publicados é o papel da tevê
como um espaço democrático de construção e disseminação do saber. Exemplificam
essa temática as falas dos reitores:
[...] o canal universitário representa possibilidade de irradiação do conhecimento
produzido. Veras (2007: 123 - PUC)
[...] a produção televisiva deve estar voltada cada vez mais para a cidadania e para
a democratização da informação e do conhecimento. Mesquita (2007: 124 - USJT:)
[...] os programas apresentados contribuem para aproximar sociedade e
universidade, por meio de veículo de grande alcance, com é a televisão. Vilela
(2007: 133 – USP)
A construção e disseminação do conhecimento são temas de grande relevância
para as sociedades contemporâneas, e a universidade, por sua história e inserção
social, assume essa tarefa como seu principal objetivo. As tevês das universidades
herdam esse compromisso, e ocupantes das reitorias reiteram esse papel e desejam que
suas tevês cumpram aquilo que delas se espera: a democratização do conhecimento.
Outro tema relevante, que é recorrente nos textos publicados, versa sobre a
importância de uma televisão dentro do espaço acadêmico, o que pode ser verificado
nas citações relacionadas abaixo.
[...] o CNU é, por assim dizer, uma extensão da sala de aula, pois amplia o
espectro da interação aluno – professor. Bicudo (2007: 126 – USM)
[...] é inegável a contribuição do CNU-SP, que, permitindo diálogo entre duas
instituições tão importantes – a universidade e a televisão -, assume, de fato, seu
papel na ampliação do universo do conhecimento. Marquesi (2007: 128 – Unicsul)
[...] o CNU exibe a um público crescente muito do que há de mais interessante em
nossa produção acadêmica. Fagundes Neto (2007: 130 – Unifesp)
No que se refere a essa questão, os reitores demonstram uma crença na
capacidade da tevê universitária de preencher o hiato historicamente construído entre
conhecimento científico e senso comum, representados, respectivamente, pela
universidade e pela tevê comercial. Para eles, a tevê universitária faria a integração
entre eles
A relação da tevê universitária com o ensino e a pesquisa é tema presente na
maioria das comunicações analisadas, como pode ser verificado pelos excertos
destacados abaixo.
200
[...] e é fato notável que a forma da comunicação televisiva teve influência
importante na educação, afetando inclusive as práticas em sala de aula. Di Genio
(2007: 131 – Unip)
[...] a TV Unisa é uma importante ferramenta que auxilia no processo educacional
da sociedade e amplia conceito de informação e cidadania. Silva (2007: 132 –
Unisa)
[...] o seu conteúdo complementa aquilo que é ministrado nos cursos da
instituição. Pinto Filho (2007: 127 – Uniban)
Como instituição social, a universidade assume a responsabilidade de atuar
com clareza no tripé ensino, pesquisa e extensão. Dadas as dificuldades para a
realização de pesquisas e para a posterior incorporação dos seus resultados no
mercado, os dirigentes das IES que participam do CNU-SP entendem que a tevê
poderia ser um canal para disseminação dos resultados das pesquisas e para divulgação
das ações de extensão, tão caras ao sistema de ensino superior brasileiro.
Outro tema que aparece com frequência diz respeito à preparação para o
mercado de trabalho, como pode ser verificado pelas seguintes falas:
[...] a TV Unisa oferece a seus estudantes a oportunidade de colocar em prática as
teorias ensinadas na sala de aula. Silva (2007: 132-Unisa)
[...] a oportunidade que têm os alunos do Mackenzie em utilizar esta importante
ferramenta para o seu aprimoramento [...] para a busca de uma boa colocação no
mercado de trabalho. Ronzelli Jr. (2007: 122 – Mackenzie)
[...] preparar o estudante com as melhores ferramentas para o exercício de suas
atividades futuras. Veras (2007: 123 – PUC)
Sobre esse assunto é relevante comentar que as tevês das universidades
públicas (Unifesp e USP) que, a época, faziam parte do CNU-SP não fazem qualquer
menção à relação entre tevê e preparação para o mercado de trabalho. Destaca-se
também a contradição entre a afirmação dos reitores da PUC e do Mackenzie e o
depoimento dos diretores das tevês dessas instituições. Enquanto os reitores destacam
a importância da TV na formação para o mercado de trabalho, os diretores informam
não haver qualquer relação dessa natureza, uma vez que a participação dos alunos é
bastante restrita e pouco relevante para a sua formação.
201
4.6 Fim de Jogo: resultados das pesquisas
Os resultados obtidos a partir da apuração do inquérito pessoal realizado junto
aos diretores das tevês universitárias de São Paulo, em consonância com os dados
apurados a partir da pesquisa documental, permitem que algumas considerações sejam
anunciadas.
Para a interpretação desses dados, mais uma vez, busca-se fundamentação em
Bourdieu (2008), que considera o habitus como um princípio gerador do saber prático,
ou seja, um conhecimento que se traduz em ações. Considerando que a expressão do
habitus fica evidente ao relacioná-la à estrutura do campo, optou-se por apresentar,
num primeiro momento, as interpretações feitas acerca da estrutura das tevês,
englobando os recursos humanos, a linha editorial e a posição no organograma da
universidade.
As pesquisas realizadas revelam que as iniciativas para a implementação das
tevês universitárias vêm se ampliando. Em treze anos, houve um crescimento
significativo no número de universidades que detêm uma unidade de tevê; em 1997,
existiam, no país, segundo dados da ABTU, 25 unidades de tevê instaladas em
universidades; em 2010, segundo a mesma entidade, tem-se notícia de 151 tevês no
segmento universitário. Esse crescimento, no entanto, não foi notado na mais
importante cidade do país; ao contrário, o Canal Universitário de São Paulo, que já
agregou 10 universidades, hoje conta com a participação de oito IES. Ainda assim,
todos os envolvidos destacam a necessidade de ações que visem à sua sustentação,
uma vez que a principal fonte de recursos ainda são as mantenedoras das
universidades, e de ações no sentido de construir alternativas e meios para promover a
integração entre essas tevês e suas comunidades.
A falta de conhecimento sobre o segmento, dentro das próprias universidades
que fazem parte do consórcio em São Paulo, é realidade desde sua implantação, porém
informações efetivas a esse respeito foram obtidas, em 2007, quando, a partir da
encomenda das próprias tevês universitárias, uma pesquisa foi realizada e constatou
que nem dentro de sua instituição a tevê era conhecida.
202
Sobre a estrutura técnica, foi apurado que todas as tevês têm recursos
próprios, sem precisar dividi-los com os laboratórios dos cursos de Comunicação
Social e, quanto ao aspecto da subordinação, constatou-se que as tevês subordinam-se
aos órgãos máximos da instituição, ou seja, às reitorias e/ou pró-reitorias.
Em relação aos recursos humanos, notou-se o predomínio de equipes
formadas por pessoas jovens, recém saídas da universidade. O envolvimento dos
professores é bem reduzido, limitando-se, normalmente, a configurar-se como fonte
para os diversos temas desenvolvidos nos programas das tevês. A participação dos
alunos, na maior parte das vezes, ocorre a partir de duas possibilidades: ou o aluno é
estagiário da tevê de sua universidade ou seus trabalhos são veiculados no espaço
destinado à programação da instituição em que estuda.
A pesquisa realizada aponta para uma relação amistosa entre tevês e
comunidade acadêmica, porém percebeu-se um distanciamento entre as equipes de
tevê e os demais setores da universidade. A relação mais estreita ocorre, mesmo,
entre os professores e alunos dos cursos de Comunicação, em função, provavelmente,
das afinidades entre os públicos.
Quanto à programação, apurou-se que as produções refletem a missão do
canal, que se coloca como veículo de comunicação dos assuntos universitários ou,
ainda, como uma vitrine pela qual a universidade é revelada para a sociedade. Os
assuntos abordados nos programas exprimem, de fato, o que a universidade pensa e,
na maioria das vezes, o que produz. Ainda que não tenha sido o foco deste trabalho
avaliar a programação das tevês universitárias, cabe uma observação quanto à
concentração dos programas no formato debates gravados em estúdio. Destaca-se,
ainda, a pouca capacidade de produção inédita – cerca de 3 horas semanais – o que se
configura como uma fragilidade bastante grande do segmento, visto que, para suprir
essa carência, ou a universidade reprisa indiscriminadamente seus produtos ou firma
convênios com outras emissoras educativas e privadas para completar sua grade.
203
4.6.1 Agentes: trajetórias e disposições
Buscando compreender as trajetórias e as disposições dos agentes em relação
às tevês de suas universidades e ao CNU-SP, considerou-se, para além das pesquisas
realizadas, o conhecimento que a entrevistadora tinha em relação aos pesquisados.
Afinal, por mais de dez anos, ela esteve entre esses agentes, trabalhando num mesmo
projeto. Nesse contexto, os processos de socialização familiar, escolar e profissional
foram considerados para a análise que segue.
Percebeu-se que, embora os profissionais entrevistados (três deles) pertençam
a uma mesma classe profissional (jornalismo), são bastante heterogêneos, no tocante
às experiências de vida, às condições de existência, aos volumes e estruturas de
capital, aos títulos escolares, às instituições nas quais estudaram.
Considerando às condições atuais de existência, as diferenças ficam ainda
mais evidentes, tendo em vista as especificidades de cada uma das instituições. Os
salários dos diretores flutuam muito de uma universidade para outra. Além disso,
existem questões como acúmulo de funções e ou projetos de extensão que podem ser
agregados aos rendimentos dos diretores.
Outro fator preponderante que agrega diferenças significativas nesse quesito condições de existência - diz respeito à origem familiar. Um dos pressupostos que
orientou a pesquisa realizada com os diretores e, posteriormente, a apuração de seus
resultados, foi o de que a socialização inicial, ou seja, os habitus adquiridos em suas
primeiras experiências, vivenciadas no contexto familiar, seriam, em suas trajetórias
de vida, os responsáveis pela constituição do habitus orientador de suas práticas.
Bourdieu (2000) ressalta que o habitus é consequência de um longo processo de
aprendizagem formal ou informal a que todo agente está submetido desde seu
nascimento.
Nessa perspectiva pode-se concluir que a função da família na formação do
habitus do indivíduo é muito importante, uma vez que é ela [a família] a responsável
por inserir, num primeiro momento, o sujeito neste ou naquele grupo social.
Considerando a importância do núcleo familiar para a estruturação do habitus dos
204
diretores, buscaram-se informações sobre do meio social no qual viveram a infância,
sobre o que faziam seus pais e a influência que estes tiveram em sua formação. Parte
dessas informações consta do quadro a seguir. Outras informações utilizadas na
Pedro
02 Sim
Pompeia Média (oeste)
Pública
Idade de ingresso no
mercado de trabalho
Escola (pública ou
privada)
Classe social
declarada
Universitários
(irmãos)
Região de moradia
Número de Filhos
(pai)
Profissão
(pai)
Formação
Entrevistado
análise têm origem na relação desta pesquisadora com os entrevistados.
2º
Grau
Gráfico
16 anos
Daniel
2º
Grau
Vendas
03 Sim
Central Média
Privado +
Público
18 anos
Julio
3º
Grau
Engenheiro
02 Sim
Jardins
Média
+
Privada +
Pública
21 anos
Claudi
2º
o Grau
Telégrafo
02 Sim
Cidade Média Ademar
Pública
21 anos
(3 níveis)
Quadro 21 – habitus dos entrevistados
No quesito origem familiar dos diretores, concluiu-se que as condições de
existência na infância e adolescência eram bem próximas, do ponto de vista
econômico, cultural e social. Todos os entrevistados foram unânimes em dizer que
suas famílias, ainda que de origem simples (exceto uma), deram, durante todo o
período de formação escolar, muita importância à educação e, dentro de suas
limitações, sempre os estimularam a estudar, o que foi interpretado, pelos diretores,
como a condição ―sine qua non‖ para a origem de suas disposições para a formação
em nível superior.
No que tange ao processo de socialização primária, a pesquisa possibilitou,
ainda, ratificar algumas perspectivas apontadas por Bourdieu. Observou-se que o
volume de capital econômico das famílias refletiu-se nas escolhas dos
estabelecimentos de ensino nos quais seus filhos estudaram. Outro ponto observado
205
diz respeito à possibilidade de aquisição de um maior volume de capital cultural,
tanto em sua forma material (livros, quadros, etc.) quanto em experiências
significativas para a perpetuação do capital cultural familiar (viagens, cursos de
línguas estrangeiras, etc.).
Durante a apuração dos dados, outro ponto que mereceu destaque diz respeito
à formação dos diretores e o reflexo dessa formação nos seus habitus profissionais.
Para Bourdieu (2004), a escola constitui-se como instituição capaz de possibilitar ao
sujeito categorias de pensamentos que servem de guia para suas escolhas. Nessa
perspectiva, cada pessoa sofre processos distintos de socialização ao longo de sua
vida, dentre os quais se destacam a escolarização - habitus secundários - que vão se
somando aos habitus primários, adquiridos no seio familiar. ―[...] do mesmo modo
que a religião nas sociedades primitivas, a cultura escolar propicia aos indivíduos um
corpo comum de categorias de pensamento que tornam possível a comunicação‖
(Bourdieu, 2004:205).
Os habitus adquiridos ao longo do período de formação de cada um dos
entrevistados ficam evidentes ao se analisar a trajetória, a equipe e o direcionamento
dado às pautas, assim como a estrutura das tevês universitárias dirigidas por eles.
Nesse sentido destacam-se as programações construídas e dirigidas por esses
diretores de acordo com sua formação intelectual.
Pelas informações obtidas ao longo deste trabalho e da pesquisa com os
diretores, é possível inferir que os habitus desses agentes interferem no fazer
televisivo, ou seja, afirma-se que a história de vida e as perspectivas profissionais
desses agentes influenciam decisivamente a programação das tevês que dirigem. É
preciso, no entanto, enfatizar que há diversos habitus agindo, em convergência ou
não, nas tevês que compõem o CNU-SP, fazendo com que um jogo de poder e
tensões ocorra, refletindo-se nos resultados efetivos da programação levada ao ar,
bem como nas relações que se estabelecem entre os jogadores envolvidos no
processo.
Trajetórias de vida dos diretores, somadas ao perfil das IES, são fatores
decisivos para a produção televisiva. Um diretor de tevê universitária deve produzir
uma programação que atenda a interesses, muitas vezes, conflitantes; ao longo dos 13
206
anos do CNU-SP, observaram-se mudanças institucionais que levaram a mudanças na
direção e no direcionamento das tevês. Como exemplos podem ser citados alguns
casos: a USP, que manteve, por grande período, uma docente de longa trajetória na
instituição e, posteriormente, optou por colocar, na direção, um profissional com
menos experiência docente e perfil substancialmente diferente, o que, no entanto, não
levou a mudanças efetivas na programação daquela tevê, ficando os hábitus do novo
ocupante da direção como responsáveis por mudanças no processo e não no
resultado. Outro caso é o da PUC/SP, única instituição com experiência em tevê
anterior ao CNU/SP, que foi dirigida, durante aproximadamente uma década, por um
profissional com trajetória em tevês comerciais e públicas. Mudanças no perfil da
instituição levaram-na a modificar substancialmente a participação da tevê daquela
universidade no CNU/SP e, também, sua capacidade de produção para outros fins. O
profissional que substituiu o primeiro diretor foi escolhido dentro do novo
posicionamento dado pela IES e tratou de adequar a produção aos objetivos
institucionais e à sua trajetória e seu habitus. Em outro registro, mudanças
estratégicas por parte de duas IES fundamentais à trajetória do CNU/SP – Unifesp e
Unicsul – levaram suas mantenedoras a deixarem o canal, em 2007 e 2008,
respectivamente. Isso ocorreu, mesmo havendo, por parte dos diretores dessas tevês e
de diversos outros agentes, posicionamento contrário a essa decisão e a favor da
permanência no canal. Nesses casos a mudança de rumos deveu-se a fatores não
controláveis pelos diretores, na medida em que instâncias superiores – reitorias ou
mantenedoras – tomaram a decisão unilateralmente.
4.7 CNU-SP: uma tentativa de emancipação
As possibilidades de análises, abertas pela abordagem da tevê universitária a
partir das concepções de Bourdieu, das pesquisas e do que foi construído nos
primeiros capítulos, direcionam a entender as tevês que compõem o CNU-SP a partir
de quatro perspectivas:
TVU como subcampo da universidade;
207
TVU como subcampo da televisão;
TVU como subcampo resultante da intersecção do campo universitário e
do campo televisivo;
TVU como campo.
As duas primeiras perspectivas indicam a subordinação da tevê universitária a
um dos campos já constituídos, ambas válidas na medida em que a TVU subordina-se
às normas destes campos e não tem autonomia, mesmo que relativa, e tampouco
legitimidade junto ao público externo para configurar-se como um campo autônomo.
A partir daí cabe discutir se a tevê seria um subcampo da universidade ou do campo
televisivo.
A terceira caracterização indica algo tanto mais complexo; a construção de
um subcampo como resultado de práticas e habitus de dois campos. Nesta
configuração, a tevê universitária constituir-se-ia como um subcampo resultante
daquilo que se constrói naqueles campos citados.
A última caracterização leva à compreensão da tevê universitária como campo
independente, o que, pelos argumentos apresentados até agora, indicando a
dependência daquela em relação ao campo universitário, se revela como uma
possibilidade inadequada para o tempo presente, pois:
A comunidade acadêmica não a reconhece como integrante de suas
práticas;
O campo televisivo, predominantemente comercial, não se relaciona com
ela e não a legitima;
O público de interesse, principalmente alunos e professores, não participa
de suas atividades nem mesmo, assiste a ela;
A sociedade civil não influencia e não é influenciada por ela;
Apenas a universidade é responsável por seu financiamento;
208
Ela mantém-se atrelada aos objetivos institucionais das universidades.
Servindo como guia orientador, o resultado dessa investigação orienta-nos a
apontar a televisão universitária como um subcampo do campo universitário, embora
receba influências bastante peculiares e relevantes do campo televisivo. Essa
afirmação parte do pressuposto de que a autonomia de um subcampo é relativa e
subordinada a um campo maior e mais poderoso, no caso o da universidade. Na
pesquisa realizada com os agentes do campo, todos foram unânimes em dizer que
têm autonomia editorial, no entanto nenhuma das tevês universitárias de São Paulo
tem recurso próprio, ou seja, todas dependem de verbas vindas das mantenedoras.
Considerando que fazer tevê não é a atividade fim das instituições, pode-se inferir
que a autonomia é bastante relativa.
Trabalha-se com a ideia de subcampo, entendendo ser essa a configuração
atual das tevês participantes do Canal Universitário de São Paulo. A tevê
universitária constitui-se como um subcampo da universidade, tendo em vista sua
integral dependência do campo universitário, que a enxerga como mais um veículo de
comunicação com a sociedade.
Essa definição apoia-se no seguinte argumento: a tevê universitária é um
canal de comunicação das universidades e esse posicionamento adquiriu maior
significado no sistema organizacional universitário em razão do Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Superior (SINAES), instituído pela Lei nº 10.861, de 14 de
abril de 2004, que contempla, em suas dimensões de análise, a comunicação com a
sociedade. Ainda assim, foi apurado que somente a Universidade Mackenzie faz
constar em seu Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) dados acerca da tevê.
Nas demais IES, ainda que alocadas em destaque na hierarquia escolar, não há
reconhecimento da tevê como um órgão realmente importante para as instituições.
Este argumento traz uma definição do Estado, por meio do Ministério da
Educação, que fixa que a universidade deve necessariamente comunicar-se com a
sociedade, portanto a tevê universitária seria mais um veículo para a comunicação
com os públicos de interesse das IES, da mesma forma que as revistas acadêmicas, os
sites, os livros e as rádios.
209
Em relação ao campo televisivo, a tevê universitária desenvolve práticas e
habitus característicos desse campo: formatos, linguagem, participação de
profissionais especializados, veiculação no cabo, práticas de produção.
Portanto o percurso da pesquisa leva a afirmar que, nas atuais circunstâncias,
a tevê universitária configura-se como subcampo do campo universitário, pois não
tem autonomia nem relativa, submetendo-se totalmente ao campo universitário.
Corrobora esta afirmação a trajetória de duas tevês que fizeram parte do CNU-SP
durante 10 anos: TV Unicsul e TV Unifesp, que, desde o início das produções do
canal, se destacaram no modo de fazer e constituíram-se, por diversas vezes, como
exemplo de fazer televisivo universitário, sendo utilizadas como referência para
novas tevês do segmento e reconhecidas por instâncias externas ao meio
universitário, que a elas concederam diversos prêmios. As tevês dessas universidades
deixaram de fazer parte do CNU-SP por não mais atenderem aos objetivos das
instituições, a despeito de seu reconhecimento tanto interno quanto externo.
A perspectiva de análise adotada,em consonância com a afirmação de
Machado, citado no início deste capítulo, considera que a televisão é aquilo que se
fizer dela, ou seja, não há resultados definitivos para a compreensão de seu papel na
sociedade. Avalia-se, também, que o cenário atual das comunicações no Brasil
apresenta possibilidades nunca antes vistas ou experimentadas, que os brasileiros
estabelecem relações tecnológicas nunca antes pensadas e vive-se um momento de
convergências entre mídias.
A tecnologia tem, continuamente, desde os anos 1970, apresentado
possibilidade de expansão dos sistemas de televisão, inclusive o universitário e, a
partir da digitalização do sinal, isso ganhou força, levando a sociedade a discutir o
papel da tevê e as alternativas que poderiam desenvolver-se à margem do dominante
modelo de tevê comercial.
A possibilidade aberta pela digitalização dos sinais, de levar a programação
das tevês universitárias para além do cabo, pode se constituir como uma nova
configuração para essas tevês, que chegariam a todos os cidadãos brasileiros e não
somente àqueles que podem pagar para ver tevê. Isso poderia, num futuro próximo,
levar as tevês universitárias a conquistar uma autonomia relativa, na medida em que
210
prescindiriam das verbas de suas mantenedoras, algo que hoje não acontece. Talvez,
assim, merecessem a classificação de campo televisivo universitário.
Com autonomia, verba própria e presença em todos os lares brasileiros, o
problema deste campo [tevês universitárias] seria a construção de uma programação
que aproximasse a comunidade externa das instituições educacionais. A tecnologia
facilita a produção televisual e isso tem levado à proliferação de mensagens, porém a
sociedade brasileira está, nesse campo, à beira da entropia, que pode tornar o
conjunto da produção televisiva ininteligível para o telespectador. Diante de tal
emaranhado, este teria grandes dificuldades para selecionar ao que assistir e, mais
ainda, para decodificar aquilo que é exibido. Talvez seja o momento de se efetivar o
que foi escrito no artigo 2 - inciso d – do decreto (6283/1934) de criação da
Universidade de São Paulo, que determina, como função da USP, ―realizar a obra
social de vulgarização das ciências, das letras e das artes, por meio de cursos
sintéticos, conferências, palestras, difusão pelo rádio, filmes científicos e
congêneres‖80.
80
Decreto 6283/34 | Decreto nº 6.283, de 25 de janeiro de 1934 de São Paulo. Disponível em:
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/225246/decreto-6283-34-sao-paulo-sp. Acesso em
27set.2010
211
Considerações Finais - Universidade e tevê, intersecções entre campos
A erudição e a tecnologia mais moderna não tiram, por si sós, o
homem da barbárie e da opressão. Apenas dão-lhe mais um ―meio de
vida‖, isto é, um meio de defesa e ataque na sociedade da
concorrência. (Bosi; 1992: 342)
Erudição e tecnologia, universidade e televisão: construção e disseminação do
conhecimento são temas que perpassaram o trabalho desenvolvido ao longo de quatro
capítulos. Como exemplo paradigmático, o Canal Universitário de São Paulo
representa um ciclo que se fecha e, ao mesmo tempo, abre um novo. A tevê nasceu
como resultado da pesquisa, que possibilitou a existência do novo meio, afastou-se da
cultura erudita em busca da audiência e voltou a ela como parte integrante da
comunidade acadêmica a partir da criação das tevês universitárias.
Esse longo ciclo realizou-se no Brasil em algumas poucas décadas – entre 1950
e 1995 – período em que o país se transformou profundamente e as culturas buscaram
adaptar o cidadão às novas formas de sociabilidade e de manifestação da vida. No
cenário do Brasil do Século XXI, tanto tevê quanto universidade têm significativa
participação na sociedade brasileira, que a elas dedicou grandes investimentos e delas
espera retorno para sobreviver na ―sociedade da concorrência‖.
O percurso de ambas – tevê e universidade – revela convergências mais que
divergências. A Universidade, implantada tardiamente no Brasil, nas primeiras
décadas do Século XX, ocupou-se, prioritariamente, da formação das elites com base
em IES públicas, número restrito de vagas e destaque para instituições do eixo Rio São Paulo. A inexistência de projetos de universalização da educação básica, o que só
ocorreria a partir dos anos 1930, favoreceu a manutenção de uma cultura baseada na
oralidade. Pressões para ampliação do ensino superior, nos anos 1960, levaram o
Estado a canalizar a oferta de vagas para IES privadas. Durante os anos 1970 e 1980,
isso ocorreu lentamente. A partir dos anos 1990, seguindo orientações do Banco
Mundial, no contexto do neoliberalismo, consolidou-se um sistema de ensino superior
no qual as vagas eram oferecidas, majoritariamente, em IES privadas. Resumindo: a
universidade surgiu pública e elitista e consolidou-se como serviço oferecido, por
instituições sociais ou empresas, a diversos segmentos da população, com
financiamento público e investimento pessoal.
212
No Brasil, a tevê surgiu no início da década de 1950. Foi a primeira da
América Latina. Como registram os historiadores do segmento, não havia condições
tecnológicas, técnicas e sociais para sua implantação. Sua primeira fase foi elitista, no
conteúdo e no acesso. Posteriormente, o ambiente cultural do país favoreceu sua
implantação, na esteira do sucesso do rádio. Em um país de analfabetos, o audiovisual
seria essencial para fazer chegar as novidades do mundo moderno a grandes parcelas
da população. Nos anos 1960, o Regime Militar investiu na tevê para que ela se
tornasse o porta-voz da integração nacional, de acordo com os interesses do Estado.
Dinheiro público e operação privada levaram à universalização da tevê nos anos 1970.
As relações entre universidade e tevê revelam haver convergências em suas
trajetórias e a tevê universitária poderia consolidar um processo de construção de um
novo campo, o da tevê universitária. Esse segmento, neste início de século, momento
em que o conhecimento é valorizado pelo conjunto da sociedade, poderia atuar para
disseminar saberes produzidos pela cultura erudita das IES e atrair a sociedade para a
discussão de temas relevantes a partir dessa cultura.
A hegemonia do modelo de tevê comercial, com prioridade no divertimento
fácil, e de IES que têm a tevê universitária como parte do marketing institucional, até
o momento, inviabilizou a consolidação do campo "TV Universitária", mantendo o
segmento, como demonstrado neste trabalho, como um subcampo da universidade.
Afirma-se isso em função, principalmente, de dois aspectos: o primeiro é a ausência de
autonomia, mesmo que relativa, da tevê universitária em relação ao campo
universitário, devido à total dependência que essa tevê tem de financiamento por parte
das IES, o que a coloca a serviço de projetos particulares destas; o segundo aspecto
relevante é a inserção da televisão universitária, no campo científico, como veículo de
comunicação com os públicos de interesse das IES e como parte das atividades de
extensão da universidade, o que distancia a tevê dos segmentos ensino e pesquisa,
responsáveis pela produção do conhecimento.
Como instituições que disputam espaço na sociedade de acordo com as regras
do mercado do ensino superior, as universidades, atualmente, caracterizam-se como
prestadoras de um serviço regulado pelo Estado. Para Bosi (1992:341),
213
Se o projeto educacional brasileiro fosse realmente democrático, se
ele quisesse penetrar, de fato, na riqueza da sociedade civil, ele
promoveria a um plano prioritário tudo quanto significasse, na
cultura erudita (universitária ou não), um dobrar-se atento à vida e à
expressão do povo, e, igualmente, tudo quanto fosse uma reflexão
sobre as possibilidades, ou as imposturas, veiculadas pela indústria e
pelo comércio cultural.
Consolidados, os campos - universitário e televisivo - produziram inúmeras
intersecções ao longo das seis décadas de existência da tevê no Brasil, mesmo
estranhando-se, pois o primeiro faz parte da cultura erudita e tem habitus próprios,
bastante diferentes daqueles que passaram a caracterizar o campo televisivo, integrante
da cultura de massas. À medida que esta última ampliou sua presença no cotidiano da
população, tornou obrigatória a inserção de diversos de seus aspectos como tema de
pesquisa do campo científico, mantendo as tensas relações deste com o campo
televisivo.
Uma abordagem das intersecções entre os campos científico e televisivo
revelaria:
Presença do conhecimento científico no campo televisivo como forma de
explicação da realidade, convivendo com outras formas de saber, como a
religiosa e do senso comum. Intelectuais e especialistas, ligados ou não à
universidade, são cotidianamente requisitados pela cultura de massa para
apresentar à sociedade razões científicas para os fatos definidos como
relevantes no contexto da notícia;
Desenvolvimento de produtos e serviços para o campo televisivo, fruto da
pesquisa realizada no âmbito do campo científico;
Legitimação do conhecimento científico a partir de sua disseminação por
meio do campo televisivo;
Presença do campo televisivo no processo ensino-aprendizagem, de tal
forma que as informações disseminadas pela tevê passam a ser abordadas
pelo campo científico, seja para reforçar conteúdos, formas e valores, seja
para rejeitá-los. Segundo Bosi (1992:322), ―[...] uma política de educação
de um número alto de brasileiros talvez deva passar forçosamente pelos
meios de comunicação de massa‖;
214
Utilização da produção e da linguagem audiovisual nas estratégias de
ensino-aprendizagem;
Realização de pesquisa pelo campo científico, tendo o campo televisivo
como objeto de estudo, gerando conhecimento sobre este último e produtos
– eventos, livros, produção audiovisual;
Participação do campo televisivo como parte do campo científico, com a
existência de tevês universitárias integradas às IES como veículo de
comunicação.
Tais intersecções não são suficientes para configurar um campo, no caso, o da
tevê universitária, mantendo-se esta como subcampo, desdobramento ou herança dos
campos televisivo e universitário. Recebe do campo televisivo linguagem, tecnologia,
habitus, ethos. Com o campo científico compartilha habitus, ethos e a ele se
subordina.
A história recente deixa em aberto o futuro da tevê universitária no Brasil. Um
país integrado pela televisão ainda não foi capaz de integrar esse fundamental meio de
comunicação à cultura erudita e ao campo científico, mantendo, entre eles,
estranhamentos e desconfianças.
A ampliação das possibilidades de participação no campo televisivo,
proporcionada pela legislação criada para organizar o segmento de tevê por cabo, nos
anos 1990, fez com que, em todas as regiões do país, IES incluíssem a televisão como
parte de seus projetos. A partir dali, uma intensa movimentação ocorreu, fazendo
convergir conhecimentos e práticas de ambos os campos, por vezes reunindo
profissionais com trajetórias que se cruzaram nos caminhos da educação e da
comunicação, estabelecendo um tenso jogo, apenas iniciado. Caberá aos novos e
antigos jogadores dar sequência ao jogo, levando à constituição do campo da televisão
universitária ou à manutenção desta modalidade como subcampo do campo científico
universitário.
215
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ANEXOS
Áudios das entrevistas realizadas.
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As regras da TV Universitária: lutas para a constituição de um campo