ANO 07
IMPRESSO E ON-LINE - BOLETIM Nº 24
NOV/DEZ - 2013 E JAN - 2014
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Confira Também
Pesquisa
Debate
SUS
Unifesp divulga dados sobre famílias
de usuários de drogas Pág. 3
Liberação da maconha causa controvérsia
no mundo Págs. 6 e 7
Novo serviço se volta aos presos com
transtornos mentais Pág. 8
CANAL ABERTO
Sobrevivendo Na
EXPEDIENTE
crise
Saúde Mental em Foco é uma
publicação do SINDHOSP
Há anos a situação de crise acompanha os hospitais psiquiátricos no Brasil. Considerado um mal necessário, esses estabelecimentos têm recebido tratamento negativamente diferenciado em relação aos demais serviços de saúde que prestam assistência
pública aos usuários do SUS.
DIRETORIA:
Se já é de conhecimento público que as tabelas não são atualizadas de acordo com
a necessidade, na psiquiatria os valores são ainda mais achatados. Lembro-me do
tempo em que a diária hospitalar era remunerada em U$ 9,00 (nove dólares) e era
imperioso ter um reajuste para não fechar todos os hospitais do país. A situação de
precariedade era tamanha que os dirigentes dos serviços especializados se reuniram e
decidiram fazer uma entrega coletiva de leitos. A decisão gerou grande preocupação
por parte do Ministério da Saúde e a solução veio da noite para o dia. Foi criado
um Índice de Valorização Hospitalar (IVH) que mais que dobrou o valor da diária,
possibilitando a reorganização do setor por mais um tempo. Note-se que a solução
foi única para todos os hospitais psiquiátricos do país.
Editora:
Com o processo de municipalização da gestão, começou-se a criar um racha no
tratamento das instituições que, na grande maioria, passaram a não mais se reportar
ao Estado, mas sim ao município de sua localidade. É o preceito de dividir para
governar. Ademais, os hospitais têm naturezas jurídicas distintas; há os públicos, os
privados filantrópicos e os privados com fins lucrativos. Os públicos não dependem
apenas das diárias do SUS eis que têm aporte de capital para seus investimentos. Os
privados filantrópicos tiveram no passado subvenções, hoje menos, que ajudavam
no gerenciamento do cotidiano, além das isenções de praxe. Os privados com fins
lucrativos ficaram restritos às Autorizações de Internação Hospitalar (AIH), aumentando a defasagem em relação aos primeiros.
Carlos Eduardo, Thiago Alexandre
(Marketing)
Nesse sentido, há uma nítida sensação de expulsão do capital privado do setor saúde,
sobretudo pelo viés ideológico governamental que desestimula qualquer investimento na
área. Estando agora habilitados na gestão plena do sistema municipal, salvo exceções, os
hospitais estão submetidos ao gestor local, que varia de município para município. Tanto
há regiões de concentração de leitos especializados, como outras em que há carência
dos mesmos. Diversos são também os partidos políticos distribuídos pelos municípios,
o que provoca ainda mais a diferenciação no relacionamento com os serviços de saúde.
A partir daí, as soluções encontradas para a sustentabilidade do setor dependem das
referidas variáveis, o que confirma que não há mais saídas uniformes para os hospitais
em geral, mas sim uma a uma, que vai depender em princípio da necessidade local do
gestor, da natureza política do mesmo e da natureza jurídica do serviço.
Numa região de concentração de leitos psiquiátricos
do Estado de São Paulo, há uma política de fechamento dos prestadores no prazo previsto de três
anos. Noutra região em que há carência de vagas
para dependentes químicos, o gestor está fazendo
investimentos, com valores diferenciados de diária, o que tem propiciado avanços importantes no
tratamento aos portadores de transtornos mentais.
Não há, como se vê, uma política uniforme para
tratar a questão da saúde mental no Estado. E
nenhuma perspectiva de que este cenário se modifique. Enfim, sobrevivemos. E só.
* Ricardo Mendes coordena o departamento
de Saúde Mental do SINDHOSP
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EFETIVO
Yussif Ali Mere Jr. (presidente)
PESQUISA
28 milhões de pessoas tÊm algum
parente com dependência química
Divulgado em dezembro, levantamento nacional mapeou usuários em reabilitação
Ana Paula Barbulho (MTB 22170)
REdação E REVISÃO:
Ana Paula Barbulho, Aline Moura,
Fabiane de Sá e Rebeca Salgado
editoração eletrônica:
Colaboraram nesta edição:
Ricardo Mendes, coordenador de Saúde
Mental do SINDHOSP, e Carlos Eduardo
Silva (Marketing)
TIRAGEM:
2.000 exemplares
Circulação:
Entre diretores e administradores de
hospitais psiquiátricos e clínicas
PERIODICIDADE:
Trimestral
FOTOS MATÉRIA CAPA:
Thinkstock
DEMAIS FOTOS:
Thinkstock e divulgação
Correspondências para:
Assessoria de Imprensa
R. 24 de Maio, 208 - 9º andar
CEP: 01041-000 - São Paulo - SP
Tel. (11) 3331-1555 - Fax: (11) 3222-6914
[email protected]
O Levantamento Nacional de Famílias dos Dependentes Químicos (Lenad Família), realizado
pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)
e divulgado em 3 de dezembro, revelou um dado
preocupante: 28 milhões de pessoas no Brasil têm
algum parente em tratamento contra a dependência
química. A pesquisa teve como objetivo mapear
quem são os usuários que estão em reabilitação e
qual o perfil de suas famílias, além de registrar como
elas são impactadas ao ter um ou mais parentes
usuários de drogas.
De acordo com o pesquisador Ronaldo Laranjeira,
um dos coordenadores do estudo, “o conhecimento
destas informações é de fundamental importância
para o planejamento de tratamentos mais amplos e
eficientes e de políticas de saúde pública com foco no
amparo desta população”. O documento aponta que
as mulheres (66%) são responsáveis pelo tratamento
do dependente de álcool e/ou de substâncias ilícitas,
além de serem a maioria das entrevistadas (80%).
Elas ainda sofrem fortes impactos negativos e “têm
uma sobrecarga de cuidar do filho dependente e serem
responsáveis pelos cuidados da família”.
A maioria dos pacientes em tratamento tinha entre 12
e 82 anos, com média de idade de 32 anos. Entre as
substâncias utilizadas regularmente pelos pacientes,
o Lenad levantou que a maioria fazia uso de mais de
uma droga ao mesmo tempo, sendo mais da metade
consumidores de maconha (68%), álcool (62%),
cocaína (60,7%) e crack (42%). Entre os familiares
que relataram ter conhecimento que o paciente consumia droga, a pesquisa aponta que quase todos já
a utilizavam por um tempo médio de nove anos e
que a recusa por parte do dependente era o principal
motivo na demora em iniciar o tratamento. Somente
30% dos familiares procuraram ajuda assim que
souberam sobre o uso de substâncias pelo paciente.
Dos pacientes, quase um terço tinha ensino superior
incompleto ou completo.
O documento ainda aponta que 58% dos casos de internação foram pagos pelo
próprio familiar e o impacto do tratamento afetou 45,4% dos entrevistados. Em
9% dos casos houve cobertura de algum tipo de convênio. O uso de hospitais
públicos, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), foi citado por 6,5% das
famílias de usuários em reabilitação. Para 46,8% dos entrevistados, as más companhias influenciaram seu familiar no uso de drogas. Já 26,1% culpam a baixa
autoestima como responsável pela procura por entorpecentes.
Essa é a terceira pesquisa sobre o tema divulgada pela Unifesp. Em agosto de
2012, o Lenad revelou que cerca de 1,5 milhão de adolescentes e adultos usam
maconha diariamente no Brasil. Já em setembro do mesmo ano, pesquisadores
constataram que o país era o segundo consumidor mundial de cocaína e derivados, atrás apenas dos Estados Unidos. Mais de seis milhões de brasileiros já
experimentaram cocaína ou derivados ao longo da vida. Desse montante, dois
milhões fumaram crack, óxi ou merla alguma vez.
Já no ano de 2013, o segundo estudo realizado pela instituição apontou um aumento de 20% na quantidade de pessoas que consomem álcool frequentemente.
A pesquisa informou que 54% dos entrevistados alegaram consumir bebidas
alcoólicas uma vez na semana ou mais – aumento proporcional de 20% em
comparação ao Lenad de 2006. O crescimento foi maior entre as mulheres: 39%
das entrevistadas admitiam beber uma vez por semana ou mais (seis anos atrás
este índice era de 29%). Outro dado importante mostrou que 27% dos homens
que bebem com menos de 30 anos já se envolveram em brigas com agressão.
Ronaldo Laranjeira
MATÉRIA DE CAPA
MATÉRIA DE CAPA
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Experiências de ontem e hoje revelam
novos rumos possíveis no combate ao crack
Há um ano, o governo do Estado de São Paulo
lançou o famigerado Plantão Judiciário ao lado do
Cratod (Centro de Referência de Álcool, Tabaco e
outras Drogas), no centro da capital paulista. A ideia
era promover a internação, mesmo que compulsória, de dependentes sobretudo de crack. O anúncio
da medida gerou enorme polêmica, já que envolvia
Ministério Público, Tribunal de Justiça e Ordem dos
Advogados do Brasil. A impressão inicial era de que
juízes, de canetas em punho, estavam prontos para
mandar internar quem estivesse sob iminente risco
de vida. A desconfiança da sociedade com a iniciativa se justificava por conta da truculenta ação da Polícia Militar, meses antes, na tentativa de dispersar
usuários da região da cracolândia. A controvérsia
em torno da internação “forçada”, no entanto, logo
se dissolveu, dando lugar a um fenômeno: filas de
espera, de pessoas que buscavam desesperadamente
por ajuda. Em especial de familiares de dependentes químicos, clamando por vagas. A parceria acabou não internando ninguém deliberadamente. Mas
também não se tornou efetiva como se esperava.
“O que houve foram poucas internações voluntárias
e inúmeras involuntárias, feitas a partir da solicitação de um familiar do dependente para que esse
fosse internado e tratado, depois de o pedido feito
por escrito e aceito pelo médico psiquiatra. Foram
dias de filas e até hoje ainda temos um atendimento
intenso no Cratod”, explica o desembargador que
coordena o Plantão Judiciário desde o início de sua
implantação, Antonio Carlos Malheiros.
O plantão no Cratod faz parte do programa Recomeço do governo do Estado, que prevê inicialmente
um trabalho de abordagem social. A ação consiste na
abordagem do dependente de drogas, principalmente o crack, no resgate e oferecimento de proteção e
acompanhamento multiprofissional.
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A interferência do Judiciário neste trabalho, segundo Malheiros, tem sido muito
importante para que se consiga o tratamento adequado ao dependente químico.
“Não se tem outra maneira de se conseguir a vaga para o tratamento ideal e específico do dependente sem a intervenção do Judiciário. Então continuamos lá,
agora com um juiz, de segunda a sexta-feira, das 9h às 13h, para ajudar a equipe
de profissionais do Cratod e o Ministério Público a garantir o atendimento ao
usuário de drogas, principalmente de crack, que na maioria das vezes já se encontra em um estado deplorável”.
Segundo dados divulgados pela secretária estadual de Justiça e Defesa da Cidadania de São Paulo, Eloisa de Sousa Arruda, no jornal Folha de S. Paulo, no
início de janeiro, no primeiro ano do Plantão Judiciário houve apenas dois casos
de internação compulsória. Ao todo, foram 26.988 encaminhamentos, sendo
que 13.586 pessoas foram atendidas diretamente pelo Cratod. Para o coordenador de Políticas sobre Drogas, da Secretaria da Justiça, Mário Sérgio Sobrinho,
o objetivo do programa vem sendo alcançado de maneira satisfatória. “O serviço gratuito, sem burocracia, aproxima a população da Justiça e permite ao profissional dessa área compreender melhor como a dependência química atinge o
usuário e, normalmente, desestrutura sua família“. Para ele, no entanto, ainda
há muito a ser feito. “A manutenção das ações de prevenção e ampliação do
tratamento, com olhar voltado à reinserção social do dependente químico, são
as melhores opções para atender ao grave problema da dependência do álcool e
de outras drogas no Brasil.”
O governo paulista também pretende levar o programa Recomeço para o litoral
e algumas cidades do interior, como Campinas, Mogi das Cruzes e Santos, inicialmente, e, depois, para todo o Estado. Em maio passado deu mais um passo
e lançou o Cartão Recomeço, considerada uma iniciativa para assegurar a oportunidade de efetiva recuperação dos dependentes por meio de financiamento
de uma etapa crucial do tratamento. Após a fase de estabilização, os pacientes
são supervisionados em comunidades terapêuticas credenciadas pelo governo
ou em moradias assistidas. O crédito para o tratamento é de R$ 1.350 mensais,
depositado diretamente ao serviço contratado. O valor não é entregue ao dependente ou a seu familiar. A assessoria de Comunicação do governo do Estado não
informou quantos dependentes já foram atendimentos ou estão em tratamento
por intermédio do Cartão Recomeço. No entanto, desde o início do programa,
o governo esbarra no problema de leitos para a internação para o tratamento
de dependentes, seja em clínicas próprias ou em serviços contratados, custeados integralmente pelo tesouro estadual. Para o presidente da FEHOESP e do
SINDHOSP, Yussif Ali Mere Jr, o problema da falta de vagas se agravou nos últimos anos, e pode por em risco qualquer programa de reabilitação de usuários.
“O fechamento de leitos psiquiátricos compromete a assistência. É inegável
que, em algum momento, um usuário vai precisar de tratamento especializado,
e de internação. E as parcerias do governo do Estado para pactuar leitos com a
iniciativa privada só nos ajuda a reforçar a tese de que faltam leitos, sim”.
Em maio de 2013, o governo paulista informou manter 1.024 leitos especializados e que a meta era contar com mais de 1,3 mil leitos este ano. O investimento
total previsto era de R$ 250 milhões. Além disso, a Secretaria de Estado da
Saúde prometeu implantar, ainda em 2014, um grande centro de saúde para dependentes químicos na Rua Helvétia, no bairro de Santa Cecília, região central
de São Paulo, com emergência psiquiátrica e leitos de enfermaria para os casos
mais agudos de crises e intoxicação.
Apesar das ações anunciadas, já postas em prática, o problema do crack recrudesce em São Paulo, especialmente na capital. Em novembro último, os usuários que até então viviam em prédios abandonados e que foram demolidos na
região das ruas Dino Bueno, Barão de Piracicaba, Helvétia e Duque de Caxias,
ergueram barracos nas calçadas. O local passou a ser conhecido como “Favela
do Crack” e tornou-se a nova cracolândia.
Pressionada por moradores que sentiram a falta de liberdade e a presença do crack bater em suas portas, a administração municipal deu início, na primeira quinzena de janeiro, à operação Braços Abertos. A ação consiste em ofertar moradia,
alimentação e emprego a 400 dependentes químicos, moradores de rua. Sem a
presença da polícia, cerca de 300 pessoas que viviam na favela surgida ali há 90
dias começaram a se cadastrar no programa e a desmontar os próprios barracos.
A ação, estruturada pelas secretarias municipais da Saúde, Assistência Social,
Trabalho e Segurança Urbana, consistiu em alojar os dependentes químicos e
seus familiares que ali moravam em quartos de cinco hotéis reformados pela prefeitura. Os usuários de drogas têm de trabalhar uniformizados 4 horas diárias na
limpeza pública e também na zeladoria de parques públicos, e passar por mais
duas horas de capacitação profissional. Em troca, além do alojamento recebem
três refeições diárias, oferecidas no Bom Prato da região, e uma remuneração por
dia de trabalho de R$ 15, paga semanalmente, através de um cartão. No total, os
usuários receberão R$ 450 por mês. O pagamento pode ser sacado toda sexta-feira com o cartão. Se faltarem ao trabalho, R$ 15 são descontados por dia de ausência. Mas se um dia o dependente não for trabalhar porque não teve condições,
por causa da droga, mas for procurar ajuda na rede de saúde, segundo a secretária
de Assistência Social, Luciana Temer, ele vai receber o salário normalmente.
E é na questão da saúde que está a polêmica do programa, pois pouca coisa deve
mudar em relação ao que já vem sendo feito. O alvo das críticas está exatamente
aí, já que os dependentes não serão obrigados a fazer tratamento médico, mas
o que quiserem vão ser encaminhados. “O tratamento é para que essa pessoa
reconstrua sua vida e possa ver que ainda pode ser feliz. Que possa buscar no
trabalho a reestruturação dos amigos, da família e da saúde. Acho importante
para isso buscar o seu bem-estar integral”, afirma o secretário municipal da
Saúde, José de Filippi Junior.
Os programas de tratamento, em parceria com o governo do Estado, vão continuar. O que foi feito, segundo o secretário, foi o aumento na quantidade de leitos
Mário Sérgio Sobrinho
Yussif Ali Mere Jr.
de internação na rede de 18 hospitais já existentes
na cidade, e o comprometimento do governador de
vagas nas casas de transição e nas comunidades terapêuticas, além de vagas hospitalares nos casos de
internação em hospitais estaduais ou através de convênio firmado pelo Estado com instituições privadas.
A assessoria de Comunicação foi contundente ao afirmar que o objetivo da operação Braços Abertos não é
acabar com o vício dos dependentes químicos e, que
ao longo do programa, não será exigido deles nada
neste sentido. “O trabalho se desenvolverá sob uma
ótica de redução de danos”, segundo comunicado.
Uma entidade privada escolhida pela prefeitura está
acompanhando a operação, a ONG União Social
Brasil Gigante, que vai manter um agente monitorando cada grupo de 20 atendidos pelo programa.
“Se for observado que a pessoa não tem interesse em
participar, ela terá de sair do hotel”, explica Luciana.
Para o desembargador Antonio Malheiros, a iniciativa da prefeitura é “um gol de placa” e vai estimular
as internações voluntárias para o tratamento, além
da diminuição do consumo de drogas, principalmente na região central da cidade de São Paulo. “A
pessoa que começa a ser tratada como gente, limpa,
com trabalho, com dinheiro e com comida saudável
se sente mais digna. Esses dependentes do crack,
que passavam dias sem comer e vão ter três refeições por dia, vão querer mudar de vida”, aposta.
Mas ele ressalta que outras ações precisam ser feitas em conjunto para um efeito mais eficaz. “Prefeitura, Estado e governo federal precisam agir juntos.
Tem que ter a atuação nas áreas de fronteira do país
e divisa dos Estados para combater o tráfico de drogas; fazer a aproximação com as famílias desses dependentes para que os apoiem e ajudem a cuidar; e
proporcionar o tratamento de inúmeras doenças que
eles, em sua maioria, portam, como tuberculose,
sífilis, hepatite e aids. Não é tarefa fácil. Mas esta
operação que está sendo feita em São Paulo mostra
que existem caminhos.”
Dezesseis de janeiro foi o primeiro dia de trabalho
para cerca de 80 dependentes químicos na capital
paulista. Eles foram escolhidos, segundo a prefeitura, por apresentarem melhores condições de saúde
e manifestarem vontade imediata de atuar na varrição das ruas do centro da cidade. No entanto,
na hora do almoço, repórteres de veículos de
comunicação que acompanhavam a operação
flagraram uma dependente comprando droga
e outros consumindo. “Por isso digo que não
basta dar emprego, comida, moradia. Isso
tudo vai ter que culminar em um tratamento, mesmo que a médio e longo prazos, e a
prefeitura e o Estado precisam estar preparados para fazer os tratamentos em regime aberto e fechado, se for necessário”, diz Malheiros.
DEBATE
DEBATE
ajudar no tratamento da náusea em pacientes de câncer e aids, mas ressalvando
que outras aplicações da erva ainda precisam ser respaldadas por pesquisas.
Com relação a efeitos colaterais, a OMS diz que a droga eleva o risco de dano
cognitivo de longo prazo, doenças respiratórias e esquizofrenia.
A Onda
Verde
Diversas nações repensam a proibição
da maconha. Liberar é o caminho?
O debate é antigo, mas reacendeu sua chama nos
últimos meses, quando o Uruguai se tornou o primeiro país a legalizar o consumo e o cultivo de
maconha em seu território. Ao mesmo tempo, o
estado do Colorado, nos Estados Unidos, finalmente
anunciou a liberação da venda para recreação. A
medida fora votada em plebiscito em 2012 por seus
eleitores, e colocada em prática em janeiro último.
O próximo da lista será Washington, que já aprovou
a venda recreativa no papel. Em outros 21 estados
norte-americanos, o uso medicinal da droga é legal,
embora bastante restritivo.
O presidente do Uruguai, José Pepe Mujica, assinou a lei de legalização tendo como objetivo tirar o
poder do narcotráfico e reduzir a dependência dos
uruguaios de drogas mais pesadas. Pelo documento,
os uruguaios ou residentes, sendo maiores de 18 anos
e registrados como consumidores para uso recreativo
ou medicinal da maconha, poderão comprar a erva
em farmácias autorizadas. Também poderão cultivá-la, seguindo limites estabelecidos. Na concepção de
Mujica, a maconha foi regulada, e não legalizada.
Embora festejada por usuários, a medida causou
descontentamento. A Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes, órgão das Nações Unidas
responsável por supervisionar o cumprimento de
convenções sobre drogas, divulgou comunicado
oficial afirmando que o Uruguai, como signatário da
Convenção Única de 1961, viola o tratado. A convenção determina que os países se limitem a permitir que
a maconha seja usada apenas para fins terapêuticos e
medicinais. No entanto, países como Noruega, Suíça,
Equador e México – cujo ex-presidente Vicent Fox é
entusiasta da liberação – já mostraram insatisfação
com o texto de 1961, em crítica aos resultados da
guerra às drogas e de sua proibição.
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O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, também demonstrou temor
em relação às políticas de repressão, e declarou, ao New Yorker, no início deste
ano: “Como todo mundo sabe, fumei maconha quando garoto e acho que se trata
de um hábito ruim, um vício que não é muito diferente dos cigarros [de tabaco]
que fumei durante boa parte de minha vida adulta. Mas não acho que seja mais
perigoso que álcool". O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que hoje é
um defensor da liberação da erva, também afirmou que “o Brasil deve apoiar a
busca de modelos de regulação legal porque acredita-se na redução do poder do
crime organizado e ajuda na proteção da saúde e segurança das pessoas". Ele
ainda reconhece o fracasso das políticas de proibicionismo, citando-as como um
"desperdício de recursos públicos inestimáveis".
Na França, o medicamento Sativex – derivado da maconha – acaba de ser autorizado pela Agência Nacional de Segurança do país, o primeiro do gênero a receber
aval para venda. Desenvolvida no Reino Unido, a droga era comercializada até
então em seu país de origem, e na Alemanha.
Segundo Thiago Marques Fidalgo, psiquiatra que coordena o Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes (Proad) da Unifesp, estudos comprovam que
fumar maconha antes dos 15 anos de idade diminui o QI, mas que, após os 20
anos, a maconha não traz problemas cognitivos. "Essa diferença tem a ver com
a maturação do cérebro, porque na adolescência ele ainda está terminando de
se formar. Entre os 15 e os 20 anos é uma faixa nebulosa, onde não foi possível
comprovar qual o impacto. Ainda assim, consideramos uma idade de risco",
explicou, em entrevista ao UOL.
Para Fidalgo, apesar de a maconha não ter grande incidência de dependência, ela
tem potencial para viciar seus usuários. Estima-se que 10% dos que experimentam
a droga se tornam dependentes dela. "Em geral, quem começa mais cedo tem mais
risco de se tornar dependente, assim como de desenvolver quadros psicóticos,
de alucinações e delírios".
De acordo com o World Drug Report 2013, relatório idealizado pelo Escritório
das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, a expansão dos problemas associados
com novas substâncias psicoativas aumenta a possibilidade de impactos mortais.
Citando o Brasil, uma blitz realizada com aproximadamente 3.500 motoristas
descobriu que 4,6% deles atestaram positivo para alguma substância ilícita. Entre
os resultados positivos, 39% relataram uso de cocaína, 32% de maconha, 16%
de anfetaminas e 14% para benzodiazepinas. Em outro estudo no Brasil, testes
de drogas realizados em pacientes que deram entrada em prontos socorros após
acidentes de trânsito mostram que, em sua maioria, eles estavam sob maior efeito
de maconha do que de alguma bebida alcoólica. O relatório apontou também
que grande parte dos países da América Latina e do Caribe tem registrado uma
elevação em apreensões de cannabis nos últimos anos. Entre eles, o Brasil, que
apreendeu 155 toneladas da erva em 2010 e 174 toneladas em 2011, o terceiro
aumento consecutivo.
No Brasil, a maconha é proibida em todos os sentidos, inclusive para uso medicinal. A realidade do consumo, no entanto, revela como é fácil conseguir a droga.
A utilização do princípio ativo da maconha, o
THC, de maneira terapêutica ou medicinal,
não é novidade. Um dos primeiros artigos a abordar o tema, “Marihuana”,
foi publicado em 1969, na revista
Scientific American, pelo psiquiatra
Lester Grinspoon. Ele também
escreveu “Marihuana Reconsidered”, de 1971, e “Marihuana: The
Forbidden Medicine”, de 1993.
Grinspoon afirma que a cannabis é o remédio menos tóxico já
registrado na literatura médica
com potencial terapêutico para
uma infinidade de doenças. “Ela
será a penicilina de nosso tempo”,
afirmou, em entrevista à Folha.
A Organização Mundial da Saúde
(OMS), no entanto, divulgou comunicado reconhecendo que a maconha pode
José Pepe Mujica, presidente do Uruguai
Cerca de 1,5 milhão de adolescentes e adultos brasileiros usa maconha diariamente, segundo o último
Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad),
da Unifesp. Ainda segundo o estudo, mais de três
milhões de adultos - entre 18 e 59 anos - fumaram
maconha em 2011 e cerca de oito milhões de pessoas
já experimentaram a droga alguma vez. Apesar disso,
a maioria das pessoas é contra a legalização: 75%,
enquanto que apenas 11% apoia a causa.
Em julho de 2013, foi a vez de o Brasil receber um
projeto de lei que propõe a legalização do consumo.
Idealizado por consultores jurídicos do Growroom
Brasil, grupo ativista pela legalização da droga, o
projeto tem como proposta a regulamentação do
cultivo, comercialização e consumo de maconha
e seus derivados em todo o país, retirando a erva
da lista de substâncias controladas pela Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e propondo a criação da Agência Brasileira da Cannabis, entidade que seja responsável pela garantia
dos direitos dos cultivadores e usuários, além de
financiar pesquisas e estudos sobre o uso medicinal
e industrial da maconha, e promover a integração
entre as políticas de prevenção do uso abusivo e
inadequado da erva.
Para os defensores da liberação da maconha, reprimir
não é o melhor caminho. O ministro Luís Roberto
Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), em
entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, defendeu
a discussão sobre a descriminalização da maconha e
afirmou que a droga não transforma os usuários em
pessoas antissociais. Segundo ele, “os processos que
chegam ao STF sobre tráfico de drogas envolvem,
com regularidade, pessoas pobres e flagradas com
pequenas quantidades de maconha”. Em entrevista ao
jornal Zero Hora, a jornalista e ex-candidata a prefeita da cidade de São Paulo, Soninha Francine, afirmou
que o conservadorismo é o maior problema do país.
Ela comparou a maconha à adoção do divórcio, em
1977. “Aprová-lo seria inimaginável. Mas aconteceu
e, hoje, ninguém se recorda da polêmica. Pode haver
danos à saúde, nós sabemos, mas também há para
cigarros e bebidas alcoólicas. Daí a necessidade de
se enquadrar a maconha em uma série de obrigações,
com restrições de venda para menores, consumo e
publicidade”, disse.
Por outro lado, a legalização da maconha seria capaz
de impulsionar ainda mais o consumo de outros entorpecentes no Brasil, fortalecendo o tráfico e impactando a saúde pública, principalmente entre jovens e
adolescentes. Para o psiquiatra Ronaldo Laranjeira,
coordenador da Unidade de Pesquisa em Álcool e
Drogas na Faculdade de Medicina da Unifesp, “ao
traçar um paralelo com a experiência uruguaia, poderíamos nos aventurar com a próxima geração. Seria
uma espécie de experimento social sem a assinatura
de termo de consentimento, como se a população se
tornasse cobaia de um mercado estatal”.
DEU NA IMPRENSA
SUS cria serviço para presos
com transtornos mentais
O Ministério da Saúde anunciou em janeiro, por meio
da Portaria 94, a criação de um serviço especializado,
no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), para
atender presos com transtornos mentais, detidos ilegalmente em presídios, cadeias públicas e hospitais de
custódia. Uma portaria assinada pelo ministro da Saúde, Alexandre Padilha, e publicada no Diário Oficial,
instituiu o serviço, que prevê a criação nos estados de
um grupo formado por médico psiquiatra, psicólogo,
enfermeiro, assistente social e terapeuta ocupacional
para avaliar a situação dos detentos com transtornos.
A avaliação dos chamados incidentes de insanidade
mental passa a ser tratada em caráter de “urgência” e
não pode exceder a 30 dias. É uma forma de encurtar
uma longa fila de espera nos presídios e hospitais de
custódia e evitar o cárcere ilegal. A medida pretende
diminuir a quantidade de brasileiros que, mesmo com
absolvição da Justiça, continuam detidos em presídios em razão dos transtornos mentais. Eles cumprem
medidas de segurança aplicadas pelos juízes. Essas
medidas pressupõem atendimento psiquiátrico e
internações, se for o caso, em instituições de saúde.
No último relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que denunciou a realidade do presídio de
Pedrinha (MA), de dezembro de 2013, a situação de
presos com transtornos mentais foi mencionada como
fator de preocupação. Um grupo de 14 detentos, que
estava internado num hospital público na capital do Maranhão, foi devolvido
para Pedrinhas e ocupa uma cela próxima a um espaço onde houve decapitação
de presos. Apenas 38% da população carcerária brasileira recebe atendimento
primário financiado pela União. O atendimento em saúde mental é ainda mais
baixo, pela ausência de psiquiatras nas equipes.
A partir da publicação da portaria,
estão previstos R$ 10 milhões
ao financiamento das equipes
nos estados. Cada equipe
de profissionais poderá
contar com R$ 66 mil
mensais para financiar
o psiquiatra, o psicólogo, o enfermeiro, o
assistente social e o
terapeuta ocupacional
(ou um educador ou
sociólogo). A gestão
caberá às Secretarias
Estaduais de Saúde ou
mesmo aos municípios
interessados, que precisam aderir ao serviço e
apresentar uma proposta ao
Ministério da Saúde.
(Fonte: O Globo)
Vera Cruz
de Sorocaba
recebe crédito de R$ 4,5 milhões
A Prefeitura de Sorocaba encerrou 2013 com a liberação de recursos para custear despesas gerais referentes
ao mês de dezembro do Hospital Psiquiátrico Vera
Cruz. Conforme o decreto nº 20.923, o prefeito Antonio Carlos Pannunzio autoriza a suplementação de um
crédito no valor de R$ 4.550.723,00 para a quitação
de despesas restantes daquele hospital. De acordo
com a Secretaria Municipal de Governo e Segurança
Comunitária, esse valor suplementar é para assegurar
o pagamento das verbas rescisórias dos profissionais
que trabalham no Hospital Vera Cruz, conforme Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado entre
o município e o Ministério Público do Trabalho. Em
pouco mais de um ano, desde que o governo municipal
assumiu toda a gestão do hospital, já foram gastos R$
6.650.723,00. Uma decisão judicial liminar proferida
nos autos de uma ação civil pública obrigou a Prefeitura a assumir toda a gestão do Vera Cruz.
De acordo com o secretário de Governo e Segurança Comunitária, João Leandro da Costa Filho,
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o Instituto Moriah também já iniciou suas atividades no hospital e trabalha,
segundo ele, na contratação de profissionais da área da saúde que atuarão na
instituição. Desde janeiro de 2013, a prefeitura é a gestora do hospital, mas,
no segundo semestre do ano passado, abriu edital para contratar uma Organização Social (OS) para ser a responsável pela gestão do Vera Cruz por um
período de dois anos, já que a administração não teria como suportar a gestão
sozinha. O Instituto Moriah foi a única OS a atender às condições para assumir
o estabelecimento.
O contrato firmado com a OS prevê também a implantação e gerenciamento
de 12 residências terapêuticas e do Centro de Atenção Psicossocial (Caps-III).
A Prefeitura de Sorocaba gastará pouco mais de R$ 2 milhões por mês com a
gestão. O Hospital Psiquiátrico Vera Cruz de Sorocaba abriga atualmente 333
pacientes do sexo masculino. De acordo com a Secretaria da Saúde, o custo médio
mensal do hospital está em torno de R$ 800 mil. Deste total, 48,7% são cobertos
pela fatura do SUS, e os restantes 51,3% cobertos pela prefeitura. A intervenção
municipal foi determinada pela Justiça a partir de um pedido feito por um grupo
de promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado
(Gaeco) do Ministério Público do Estado de São Paulo.
(Fonte: Cruzeiro do Sul – Sorocaba)
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